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A respeito do impasse estabelecido, a Coroa portuguesa acreditava que a
execução do tratado de limites estava sendo dificultada, na verdade, pelos jesuítas, que
teriam ficado tão poderosos, ao longo dos anos, tanto na América portuguesa quanto na
espanhola, “que seria necessário romper com elles huma guerra difficil, para a referida
execução ter o seu devido effeito.”
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Segundo os portugueses, as tropas dos dois monarcas estavam em marcha, no
ano de 1752, para fazerem as mútuas entregas das aldeias da margem oriental do rio
Uraguai, e da Colônia do Sacramento, quando foram surpreendidos pelos padres da
Companhia, pedindo a suspensão necessária para os índios das referidas aldeias
colherem seus frutos e se transmigrarem mais comodamente às suas habitações, no que
foram atendidos. Contudo, tal pedido seria uma estratégia dos religiosos para ganharem
tempo para melhor se armarem e prepararem os índios para a rebelião, com a finalidade
de se conservarem naquilo que os lusitanos chamavam de usurpação dos territórios e de
seus habitantes. Assim, logo que terminaram tais pretextos, e os comissários das duas
Cortes intentaram avançar para fazerem as mútuas entregas, descobriram fortes
oposições. Sobre o episódio relata Gomes Freire, escrevendo ao Marquês de Val de
Lyrios, em 24 de março de 1753:
“V. Excellencia com as cartas, que recebe, e com os Avisos, ou chegada do Padre
Altamirano, entendo acabará de persuadirse que os Padres da Companhia são os
sublevados. Se lhes não tirarem das Aldeas os seus Santos Padres (como elles os
denominão) não experimentaremos mais do que Rebelioens, insolências, e desprezos
[...] Isto que nos fazia horror, depois da experiência da Campanha o temos já por
indubitável.”
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Visto isso, no final do ano de 1753 e início do seguinte, nas conferências de
Castilhos, os dois principais comissários, Gomes Freire e Marquês de Val de Lyrios,
História. Universidad Complutense. 2000; BETHELL, Leslie (org.). História da América Latina: A
América Latina Colonial I, vol. 1. São Paulo: Edusp; Brasília: Fundação Alexandre de Gusmão, 1997;
CORTESÃO, Jaime. Alexandre de Gusmão e o Tratado de Madrid, vol. 2. Lisboa: Livros Horizonte,
1984; EINSENBERG, José. As Missões Jesuíticas e o Pensamento Político Moderno: Encontros
culturais, aventuras teóricas. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2000; GANSON, Bárbara. The Guarani Under
Spanish Rule in the Río de la Plata. Standford, Califórnia: Standford University Press, 2003; HAUBERT,
Máxime. Índios e jesuítas no tempo das Missões. São Paulo: Companhia das Letras/Circulo do Livro,
1990; LEITE, Serafim. História da Companhia de Jesus no Brasil, tomo VII, séculos XVII-XVIII.
Assuntos Gerais. Rio de Janeiro: Instituto Nacional do Livro, 1949, entre outros autores. Não podemos
deixar de nos remeter ainda ao importante conjunto documental intitulado Manuscritos da Coleção de
Angelis: do Tratado de Madrid à conquista dos Sete Povos (1750-1802), vol. VII, Rio de Janeiro:
Biblioteca Nacional, 1969, que contém muitas fontes para o estudo do tema.
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“Relação régia de 1757”. In: Collecção dos breves pontifícios e leis régias desde o anno 1741, sobre a
liberdade das pessoas, bens e commercio, das Índias, do Brazil, dos excessos dos jesuítas, até 1758.
Biblioteca Nacional de Portugal, Coleção Pombalina, cód. 457, num. IV, p. 1.
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“Relação régia de 1757”. In: Collecção dos breves pontifícios e leis régias desde o anno 1741, sobre a
liberdade das pessoas, bens e commercio, das Índias, do Brazil, dos excessos dos jesuítas, até 1758.
Biblioteca Nacional de Portugal, Coleção Pombalina, cód. 457, num. IV, pp. 4-5.