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uma mulher feminina e também as pessoas de fora não diriam , se não me conhecem. E como
nesse ambiente de trabalho são só quatro horas por dia, então tu entra numa sala de aula, e tu
vê o pessoal só quinze minutos no intervalo, então não tem uma relação mais duradoura,
digamos assim...então eu sou enrustida no ambiente de trabalho (Patrícia)
“Eu prefiro me manter assim se ninguém perguntar, aqui do meu trabalho ninguém sabe,
tem só uma menina que sabe” (Odila)
Os relatos de Patrícia e Odila nos mostram o receio e o medo que a articulação entre
trabalho e revelação da homossexualidade traz para estas entrevistadas. O medo da deterioração
das relações no trabalho, ou mesmo a sua perda, faz com que as estas mulheres usem de recursos
como a dissimulação ou beneficiem-se de uma “heterossexualidade presumida”, já que a
referência social para os papeis de homens e mulheres é a heterossexualidade. Ao perceberem
isso e o fato de não apresentarem marcas corporais ou estilos que tornem a homossexualidade
evidente, usam estes recursos de proteção como forma de manterem-se asseguradas.
Entretanto, este esforço de controle das situações de vida, a divisão de amigos/as (aqueles
que podem saber e aqueles que não), as invenções de estratégias para evitar o assunto, as
respostas evasivas, os segredos que tem que manter uma coerência no tempo demandam uma
energia psíquica intensa. A incorporação na norma pela via do assujeitamento apaixonado
descrito por Butler (1997) pode ajudar a entender falas que revelam um sentimento incorporado
de ilegitimidade do afeto e do desejo homossexual.
“A gente evita um pouco... Acho que por isso mesmo. É, esse negócio de mão dada, beijo
e abraço. É mais como se fosse amiga mesmo. Não em locais gays sim, daí agente liberado né.”
(Lúcia)
“E também para pessoas mais de idade que tem mais dificuldade de entender, não
precisa agredir eles, assim, andar de mão ou beijando. E também não preciso mostrar pros
outros que a pessoa que ta comigo é minha, porque não é minha, ninguém tem posse de ninguém,
né?! Então assim, tá comigo, tá comigo, confio na pessoa, não preciso abraçar, não preciso
beijar para mostrar que eu sou o que eu sou e nem com quem eu estou.” (Odila)
“Não eu acho que eu seria em qualquer ambiente. Em qualquer ambiente a minha atitude
seria... Eu sou uma pessoa discreta, eu me considero, pelo menos. Eu não tenho necessidade de
sair na rua de mão dada e ficar se beijando. Claro, tem situações, no cinema alguma coisa
assim, ou num bar mesmo, num lugar hetero, que tu gostaria de estar mais próxima da pessoa,
de beijar, enfim, de ficar mais a vontade...Mas eu naturalmente não tenho esta necessidade de
que saibam que eu sou gay....mas confesso que se tivessem rumores, alguma coisa, eu não
negaria mas eu ficaria em cima do muro, entende? Eu não negaria “não eu não sou” mas
também não diria „sim, eu sou”. Porque negar alguma coisa assim eu nunca neguei, sabe? Mas
também fiquei em cima do muro por que negar uma coisa....se alguém me perguntar e eu