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pormenorizadas. Destas transformações, sobrevém um questionamento central a toda teoria
marxista, que passa por “encaixar” o proletariado fabril não mais como única força
revolucionária existente, tendo de analisar, no interior das mudanças no capitalismo do século
XX, a presença cada vez mais acentuada do Estado e seu papel no próprio setor produtivo-
industrial, redefinindo toda a estrutura de classes.
A esse quadro, nas últimas décadas, se acrescenta a reforma capitalista
neoliberal, com suas inelutáveis transformações do sistema historicamente determinado. O que
parece conduzir, no entendimento de alguns estudiosos, o pensamento marxista para o campo das
reformas. Daí autores como Jacob Gorender (1998), por exemplo, questionarem os limites e
potencialidades: será que o marxismo, e as diferentes correntes no bojo de sua composição, se
vêm frente a seu maior obstáculo, quando questionadas sobre o modelo liberal, posto que ora
deixam de lado a ruptura estrutural como tal, pensando efetivamente em reformas da estrutura
capitalista
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É claro que a dificuldade de se entender, no interior desse quadro
contemporâneo, os “novos sujeitos” para um processo de politização revolucionário está
colocada. A constatar a pequena burguesia, resistente ao processo efetivo de proletarização, o
trabalho informal, a prestação de serviços, a questão do campesinato e o próprio trabalhador
assalariado, como fora levantado. A esfera do trabalho assalariado, em suas várias instâncias,
continua perdendo conquistas significativas diante da globalização sob a égide do capital
financeiro e seu “parasitismo” (GORENDER, 1998, p.63). A atualidade se defronta com a
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O pensamento reformista não poderia deixar de ser mencionado neste trabalho, ainda que como breve nota,
sobretudo pelo debate acerca da ruptura estrutural e da questão “reforma ou revolução?”. Contra a proposta
revolucionária enquanto ruptura estrutural violenta, o revisionismo de Bernstein (1997), as mudanças viriam de
encontro a um fundamento que partiria assim do próprio capitalismo, desmentindo certas previsões marxistas, apesar
de se apoiar no teor do seu pensamento. Em seu Postulados do Socialismo, Bernstein limitava, por assim dizer, o
alcance do materialismo histórico onde criticava, por exemplo, a teoria marxista do valor-trabalho. Tendo as idéias,
os imperativos éticos, um valor interventor no curso da história, em vez de expulsá-las, o socialismo deveria integrá-
las, e não fazer da luta de classes e da transformação econômica o único “motor e coração” da história, como deixa
claro em uma de suas obras: “Às palavras ‘concepção materialista da história’ aderem ainda todas as falsas
interpretações e equívocos que estão intimamente ligados ao conceito de materialismo. O materialismo filosófico, ou
materialismo da ciência natural, é determinista, num sentido mecânico. A concepção marxista da história não o é.
Atribui ao fundamento econômico da vida das nações uma influência determinante, mas condicionada, sobre as
formas que esta vida adquire” (BERNSTEIN, 1997, p.41). À luz das reflexões deste autor, a concentração industrial,
como prevista por Marx, não produziu seu efeito maciço de desapossamento dos pequenos burgueses, tanto quanto a
ação operária travou a proletarização anunciada, pois, no limiar do pensamento de Bernstein, afastaria a teoria do
próprio Marx da assertiva real de compreensão da sociedade, e sua importância enquanto pensamento. Importantes
pontos que constituíam a prova que faltava para a afirmação de que as reformas são efetivamente eficazes,
contrariando o paradigma de revolução como ruptura estrutural.