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nos seus relatos das trajetórias até a instituição.
A partir de então, o grupo entra na discussão sobre não se dever contar para todo
mundo o que aconteceu (a violência que seus/suas filhos/as sofreram). Aqui, Adriana diz que
“Muitas vezes eu acho que não é bom falar”, mas que tem situações que são permitidas falar
para alguma pessoa, desde que ajude de alguma forma em suas questões. As participantes
começam a criar particularidades (BILLIG, 2008) sobre para quem e quando devem contar,
como por exemplo, quando precisarem de pessoas que sirvam de testemunha. Camila então
relata a particularidade que envolveu a situação em que precisou contar seu caso:
Como, é (.) como eu falei a semana passada- da (.) da morte da minha filha
(.) da- que minha filha teve (.) eu- foi uma das coisas que eu aprendi só.
Não, eu num vo- eu num vou contar- mainha diz que foi por vergonha.
Porque (.) eu fui (.) eu fui acusada (.) e depois de quatro meses- quatro
meses, a (.) eles viram que eu não tinha nada a ver. Que não tiveram provas
concretas. E (.) eu me isolei, fiz assim: “não, eu não vou contar porque não
vai adiantar eu contar pra alguém (.) num vão me ajudar”. Aí foi quando eu
(.) corri atrás de uma pesso- de um (.) um profissional pra me ajudar, aí foi
quando teve terapia de grupo. Foi lá num- na Agamenon Magalhães, na
Policlínica que fica em Afogados ((bairro)). Aí foi em terapia de grupo eu
comentei- eu conversei com a psicóloga, pensei que a psicóloga ia toda
semana, como eu tenho agora, ia ter aquele acompanhamento individual (.)
não, ela me encaminhou prum (.) em- em grupo. Aí nesse dia eu tava
grávida do meu menino de quatro meses, e tive uma briga com minha irmã,
que ela não aceitava que minha mãe- é (.) que eu tivesse dentro de casa.
Era pra minha mãe ter botado eu pra fora com barriga e tudo [Pedro:
Uhum] E eu só ia só final de semana na casa de mainha por causa que
também eu morava com meu tio. Aí foi quando num desespero, no calor do
desespero, no calor da briga, eu cheguei na sala e comentei o que
aconteceu com minha filha. E (.) aí fez assim, como a gente faz agora, aí
quando terminou, aí saiu, quando s- eu só vi as costas, né? Aí eu escutei
atrás: “ó, então foi- é (.) no caso foi essa menina aí, que foi pra Santa Luzia”
((Centro de Atendimento Socioeducativo Santa Luzia, destinado a
adolescentes infratoras)). Que na época, o nome é o Santa Luzia que tem,
né? Mas tem um nome específico, parece que é Fundac ((Fundação
Estadual da Criança e do Adolescente)) também, que a menina- (.) que tem.
“Que foi pra Fundac, num sei o que da Fundac”. Pronto, dali eu num fui
porque num- num me ajudou em nada, a psicóloga não me ajudou. Aí eu
pou me isolei e num contei pra ninguém. Quando eu vim desabafar o que
aconteceu com a minha filha (.) foi- eu acho que é por causa disso que eu
tenho- o- (.) assim, o meu sentimento assim, às vezes é- é confuso [Pedro:
Uhum] É confuso. Eu num- eu acho assim, que ele é confuso. Que o- como
eu passei quatro anos guardando (.) guardando isso, eu vim contar pra
alguém, e esse alguém que venha m- que- que me ajudou (.) que foi Karen
lá da- que é assistente social lá do HR ((Hospital da Restauração)), que ela
pou me ajudou (.) foi (.) da- e juntou com o caso de Otávio ((filho)), que eu
vi que assim, não, aí eu vou tá (.) eu vou tá segura= [Lúcia: =Amparada] Eu
vou tá amparada. Aí foi- é- é (.) é isso que eu t- que eu tô querendo dizer.