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Conforme a conclusão de Segato (2006, p. 233): “Teme-se e evita-se a discussão do
projeto de cotas no meio acadêmico brasileiro porque se trata de um campo de
discussões apaixonadas que expõem claramente a persistência de oposições
irredutíveis a respeito do que é positivo para a nação”.
Pelo que foi possível constatar a partir das citações anteriores, a idéia de
mestiçagem não se apresenta, para os representantes da retórica conservadora,
compatível com situações conflituosas. Pelo contrário, foi ela que proporcionou a
existência de uma convivência amistosa entre os “diferentes” no Brasil. Esse é um
dos motivos da não-aceitação das cotas por parte de muitos cientistas sociais. O
principal argumento por eles utilizado é de que as cotas trarão o conflito, que
anteriormente não existia. A possibilidade de conflito provoca uma espécie de curto-
circuito na forma de interpretação das relações sociais no Brasil.
O incitamento a situações de conflitos
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não diz respeito exclusivamente a
esse tipo de ação afirmativa, pois a mesma argumentação é utilizada com relação à
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É isso que podemos observar na citação abaixo, feita em uma audiência pública organizada pelas
Comissões de Constituição e Justiça e de Finanças e Tributação da Assembléia Legislativa para
discutir sobre os impactos e reflexos gerados na economia do Estado de Santa Catarina em virtude
do impasse gerado pelos quilombos, realizada no dia 8 de março de 2007, às 18 horas, no
município de Campos Novos. No caso em questão, a Associação Quilombola da Invernada dos
Negros está solicitando ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – SC (Incra/SC) a
regularização e a titulação das suas terras em conformidade com o Decreto 4887, de 2003, que
prevê a identificação, regularização e titulação de terras de comunidades remanescentes de
quilombos. O Incra/SC iniciou o processo de regularização dessas terras em 2006. Mas o processo
tem provocado o acirramento de conflitos em torno do reconhecimento do direito a terras coletivas
dessa comunidade no contexto local.
O Sr. Presidente (deputado Romildo Titon) - Primeiramente fará o uso da palavra o senhor Luiz
Carlos Manica, presidente da Associação dos Legítimos Proprietários de Terras da Antiga Fazenda
São João, por até 10 minutos.
O Sr. Luiz Carlos Manica – Boa tarde a todos. Gostaria de agradecer aos deputados essa aula de
cidadania. Santa Catarina está dando um exemplo muito grande, e gostaria que todos os estados o
seguissem. Gostaria de entregar ao deputado Romildo um abaixo-assinado com mais de seis mil
assinaturas, colhidas pelos nossos associados, reclamando o nosso direto à propriedade privada, o
direito de ir e vir, um tratamento igual, como disse muito bem o procurador federal aqui presente.(O
senhor Luiz Carlos Manica faz a entrega de vários documentos ao deputado Romildo Titon,
presidente da audiência pública e da Comissão de Constituição e Justiça.). Quero entregar
também algumas cartas que recebi de diversas entidades aqui de Campos Novos manifestando-se
favoráveis à nossa associação: Rotary Clube de Campos Novos; Associação Rural e Cultural
Camponovense; Cocam; Sindicatos de Produtores Rurais de Campos Novos; Lions Clube Campos
Novos; Lions Clube Centenário; Câmara de Dirigentes Lojistas de Campos Novos; ARLS Silêncio e
Fraternidade; Cooperativa de Campo Novos, a CooperCampos. Por fim, agrega-se a esses
documentos todos uma nota de esclarecimento vinda dos Sindicatos dos Trabalhadores das
Indústrias de Construção e Imobiliário de Campos Novos. Hoje estamos aqui não por vontade
própria, estamos aqui porque fomos colocados nessa situação. Nós estávamos muito tranqüilos
trabalhando em nossas propriedades (grifo meu), e hoje estamos aqui vendo o nosso direito de
propriedade privada... São 192 escrituras que serão anuladas, ou melhor, desapropriadas. Onde
está o direito à propriedade privada das pessoas aqui presentes? Vocês gostariam que entrassem
em suas casas e dissessem "meu amigo, saia daqui porque agora tem outro dono, e vou te pagar o