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UNIBRASIL – FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL
FACULDADE DE DIREITO
FABIANO NEGRISOLI
RESTRIÇÕES INCONSTITUCIONAIS A DIREITOS
FUNDAMENTAIS DOS TRABALHADORES
CURITIBA
2009
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FABIANO NEGRISOLI
RESTRIÇÕES INCONSTITUCIONAIS A DIREITOS
FUNDAMENTAIS DOS TRABALHADORES
Dissertação apresentada ao programa de
Mestrado em Direito, na área de
concentração Direitos Fundamentais e
Democracia, na linha de pesquisa
Constituição e Condições Materiais da
Democracia, da UNIBRASIL Faculdades
Integradas do Brasil, para obtenção do grau
de Mestre.
Orientador: Prof. Dr. Wilson Ramos Filho
CURITIBA
2009
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FABIANO NEGRISOLI
RESTRIÇÕES INCONSTITUCIONAIS A DIREITOS
FUNDAMENTAIS DOS TRABALHADORES
Dissertação apresentada ao programa de
Mestrado em Direito, na área de concentração
Direitos Fundamentais e Democracia, na linha de
pesquisa Constituição e Condições Materiais da
Democracia, da UNIBRASIL Faculdades
Integradas do Brasil, para obtenção do grau de
Mestre.
COMISSÃO EXAMINADORA
_________________________________________
Prof. Dr. Wilson Ramos Filho
UNIBRASIL – Faculdades Integradas do Brasil
_________________________________________
Professor Doutor Célio Horst Waldraff
_________________________________________
Professor Doutor Eduardo Milléo Baracat
Curitiba, 10 de março de 2009
AGRADECIMENTOS
Agradeço, primeiramente, ao meu orientador, Professor Doutor Wilson Ramos Filho,
por despertar o interesse pelo Direito do Trabalho, nos tempos da graduação e,
agora, pela dedicação que prestou na leitura dos textos e pelas recomendações de
alteração.
Agradeço a todos os colegas de escritório, em especial aos amigos Marcelo Giovani
Batista Maia e Leandro Herleinn Muri, que, durante o curso de mestrado e nos
períodos de afastamento para a elaboração dessa dissertação, “seguraram as
pontas”.
Finalmente, agradeço a minha esposa querida, Priscilla Maria de Andrade, por toda
paciência nestes dois últimos anos e pelas palavras confortantes nos momentos
difíceis
RESUMO
Os direitos fundamentais demandam um desenvolvimento que pode acarretar a sua
restrição ou limitação. Isso não é possível como necessário. O problema é que a
existência de restrições nem sempre é reconhecida, o que implica um menor
controle, conforme a dogmática específica. O reconhecimento das restrições ou
limitações depende da concepção acerca da estrutura dos direitos fundamentais e
da amplitude do suporte fático ou âmbito de proteção de tais direitos. A opção por
uma estrutura de regras e de um suporte tico restrito dos direitos fundamentais
implicará a aceitação das conclusões da teoria interna: inexistência de restrições aos
direitos fundamentais e inocorrência de colisões envolvendo estes. “A priori”, o
conteúdo de tais direitos será definido, seja por meio de delimitações legais ou
recorrendo-se à teoria dos limites imanentes. Por outro lado, o reconhecimento dos
direitos fundamentais como regras e princípios e com um suporte fático amplo levará
à aceitação das conclusões da teoria externa, ou seja, os direitos fundamentais
podem ser restringidos ou limitados e estão em permanente tensão, o que leva a
uma série de colisões envolvendo esses direitos. Nesse contexto, as restrições aos
direitos fundamentais poderão ocorrer basicamente por expressa disposição
constitucional, por reserva legal expressa e por reserva tácita, para resolver os
conflitos envolvendo tais direitos. A vantagem da aceitação das conclusões da teoria
externa está na necessidade de sempre observar os “limites dos limites” (reserva
legal, princípio da proporcionalidade e conteúdo essencial), que são a forma de
controlar a constitucionalidade dessas restrições ou limitações e de solucionar suas
colisões, dando objetividade e racionalidade ao desenvolvimento dos direitos
fundamentais. Em que pese toda essa discussão acerca das restrições e limites dos
direitos fundamentais e da existência de dogmática específica, isso não tem sido
observado pelo Tribunal Superior do Trabalho, como se verifica em quatro casos
específicos: reconhecimento da estabilidade da empregada gestante somente
quando o empregador tem conhecimento e quando confirmado o estado de gravidez
e quando não reconhecia a existência do direito à reintegração; a limitação do
número de dirigentes sindicais, para fins de estabilidade (Súmula 296/TST); a
possibilidade de monitoramento do e-mail do empregado por parte do empregador; e
a Súmula 85/TST, quando admite o acordo tácito e o acordo escrito direto com o
empregado, quando determina o pagamento exclusivamente do adicional em
algumas hipóteses, bem como quando insinua a compensação de 1 hora extra por 1
hora de descanso (1x1) e não 1 hora extra por 1 hora e meia de descanso.
Palavras-chaves: direitos fundamentais; restrições; teoria interna; teoria externa;
“limites dos limites”; direitos fundamentais dos trabalhadores; decisões do Tribunal
Superior do Trabalho.
RESUMEN
Los derechos fundamentales requieren un desenvolvimiento que puede implicar una
restricción o limitación de los mismos. Eso no solo es posible como es necesario. El
problema es que la existencia de restricciones no siempre es reconocida y eso
implica en un menor control de las mismas, conforme la dogmática específica. El
reconocimiento de las restricciones o limitaciones depende de la concepción acerca
de la estructura de los derechos fundamentales y de la amplitud del suporte de
hecho o ámbito de protección de tales derechos. La opción por una estructura de
reglas y de un suporte de hecho restricto de los derechos fundamentales implicará
en la aceptación de las conclusiones de la teoría interna: inexistencia de
restricciones a los derechos fundamentales y no ocurrencia de colisiones
envolviendo estos. “A priori” el contenido de tales derechos deberá de ser definido,
por las delimitaciones legales o recorriendo a la teoría de los límites inmanentes. Por
otro lado, el reconocimiento de los derechos fundamentales como reglas y principios
y con un suporte de hecho amplio levará a la aceptación de las conclusiones de la
teoría externa, o sea, los derechos fundamentales pueden ser restringidos o
limitados y están en permanente tensión y esto leva a una serie de colisiones
envolviendo a los mismos. En ese contexto, las restricciones a los derechos
fundamentales pondrá ocurrir básicamente por expresa disposición constitucional,
por reserva legal expresa y por reserva tácita, para resolver los conflictos
envolviendo tales derechos. La ventaja de la aceptación de las conclusiones de la
teoría externa esta en la necesidad de siempre observarse los límites de los limites
(reserva legal, principio de la proporcionalidad y contenido esencial), que son la
forma de controlar la constitucionalidad de esas restricciones o limitaciones y
solucionar sus colisiones, dando objetividad y racionalidad al desenvolvimiento de
los derechos fundamentales. En que pese toda esa discusión acerca de las
restricciones y límites de los derechos fundamentales y da existencia de dogmática
especifica, eso no ha sido observado por el Tribunal Superior de lo Trabajo, como se
verifica en cuatro casos específicos: reconocimiento de la estabilidad de la empleada
gestante solamente cuado el empleador tiene conocimiento y cuando confirmada la
gravidez y cuando no se reconocía el derecho a la reintegración; la limitación del
numero de dirigentes sindicales, para fines de estabilidad (Súmula 296/TST); la
posibilidad de controle del correo electrónico del empleado por parte del empleador;
y la Súmula 85/TST, cuando admite el acuerdo tácito, el acuerdo escrito directo con
el empleado, cuando determina el pagamento solo del adicional de hora extra en
algunas hipótesis, bien como cuando insinúa la compensación de una hora extra por
una hora trabajada (1x1) y no una hora extra por una hora y media de descanso.
Palabras-claves: derechos fundamentales; restricción; teoría interna; teoría
externa; límites de los límites; derechos fundamentales del trabajador;
decisiones del Tribunal Superior del Trabajo.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 8
2 RESTRIÇÕES E LIMITAÇÕES AOS DIREITOS FUNDAMENTAIS ..................... 15
2.1 SOBRE A ESTRUTURA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS .............................. 15
2.2 O SUPORTE FÁTICO, ÂMBITO DE PROTEÇÃO OU EXTENSÃO DOS
DIREITOS FUNDAMENTAIS .................................................................................... 21
2.3 TEORIAS SOBRE A POSSIBILIDADE DE RESTRIÇÕES ................................. 27
2.3.1 Teoria interna .................................................................................................. 27
2.3.2 Teoria externa ................................................................................................. 38
2.4 TIPOLOGIA DAS “RESTRIÇÕES” OU “LIMITAÇÕES” ....................................... 42
2.4.1 Limites imanentes .......................................................................................... 51
2.4.2 Colisões envolvendo direitos fundamentais ............................................... 56
3 LIMITES DOS LIMITES ......................................................................................... 61
3.1 SOBRE OS “LIMITES DOS LIMITES” AOS DIREITOS FUNDAMENTAIS ......... 61
3.2 A RESERVA DE LEI RESTRITIVA ..................................................................... 64
3.3 PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE ........................................................... 70
3.3.1 Questões preliminares e fundamento .......................................................... 70
3.3.2 Os subprincípios da proporcionalidade ....................................................... 76
3.3.2.1 O subprincípio da adequação do meio .......................................................... 77
3.3.2.2 O subprincípio da necessidade do meio ........................................................ 81
3.3.2.3 O subprincípio da proporcionalidade em sentido estrito ................................ 83
3.4 DEVER DE PROTEÇÃO AO NÚCLEO ESSENCIAL .......................................... 91
4 A POSTURA DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO EM RELAÇÃO ÀS
RESTRIÇÕES AOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DOS TRABALHADORES ....... 106
4.1 ESTABILIDADE DA EMPREGADA GESTANTE ............................................... 106
4.2 O LIMITE DO NÚMERO DE DIRIGENTES SINDICAIS .................................... 113
4.3 O MONITORAMENTO DO E-MAIL DO EMPREGADO PELO EMPREGADOR120
4.4 A SÚMULA 85 DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO ............................ 129
4.4.1 O pagamento apenas do adicional de horas extras .................................. 131
4.4.2 A compensação 1x1 ..................................................................................... 136
4.4.3 O acordo tácito e o acordo escrito como autorizadores da compensação
................................................................................................................................ 138
5 CONCLUSÃO ...................................................................................................... 147
REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 150
8
1 INTRODUÇÃO
A dissertação aborda o tema da possibilidade dos poderes executivo,
legislativo e judiciário interferirem nos direitos fundamentais, desenvolvendo-os por
meio de concretizações, limitações e restrições, considerando que isso não é
possível, como necessário, pois os direitos fundamentais não são absolutos.
Haveria uma ampla série de fatores que levam ao rechaço de uma visão
totalitária dos direitos fundamentais, dentre elas a universalidade e o conjunto dos
direitos. De acordo com a universalidade, os direitos fundamentais são atribuídos a
todas as pessoas, não sendo possível, então, uma fruição permanente e simultânea
sem que haja uma ordenação para coexistência. E, pelo conjunto, significa que os
direitos fundamentais estão inseridos num ordenamento complexo e plural e devem
ser coordenados com os outros direitos
1
. A conjugação desses dois elementos leva
à tendência dos direitos fundamentais chocarem-se, o que, por decorrência, leva à
necessidade de restrições recíprocas
2
.
Além disso, as normas de direitos fundamentais teriam um caráter bastante
genérico e abstrato (baixa densidade normativa), o que as tornaria dependentes do
legislador ordinário, que deverá intervir, por meio da concretização e limitação ou
1
Segundo Konrad Hesse, os direitos fundamentais teriam várias camadas de significado. Eles
seriam, por um lado, direitos subjetivos, direitos do particular e, também, garantiriam um instituto
jurídico ou a liberdade de um âmbito da vida. Por outro lado, os direitos fundamentais seriam
elementos fundamentais da ordem objetiva da coletividade. Nesse contexto, a tarefa das limitações
de direitos fundamentais é de coordenar mutuamente as condições da vida, as garantias dadas pelos
direitos fundamentais e outras condições da vida essenciais para a coletividade. Trata-se de uma
coordenação de direitos de liberdade e outros bens jurídicos”. A Constituição só efetuaria uma
pequena parte disso e confiaria ao legislador essa atividade pelas formas de possibilidade de
limitação. Isso leva à “(...) produção e conservação de uma conexão de ordem, na qual tanto as
liberdades jurídico-fundamentais como aqueles outros bens jurídicos ganham realidade. Na medida
em que as determinações, que protegem a ambos, em seu alcance material cruzarem uma a outra,
ou colidirem uma com a outra, limitação de direitos fundamentais é, fundamentalmente, produção de
concordância prática”. HESSE, 1998, p. 228 passim. No mesmo sentido, José Carlos Vieira de
Andrade, para quem a limitação dos direitos fundamentais e o fato de que não seriam absolutos não
seria novidade. Segundo ele, “Não o o na sua dimensão subjectiva, porque os preceitos
constitucionais não remetem para o arbítrio do titular a determinação do âmbito e do grau de
satisfação do respectivo interesse, e também porque é inevitável e sistémica a conflitualidade dos
direitos de cada um com os direitos dos outros. E, podemos dizê-lo, nunca se sustentou que o
fossem, já que mesmo na época liberal-individualista se entendida que os direitos fundamentais (cada
um dos direitos e os direitos de cada um) tinham como limite a necessidade de assegurar aos outros
o gozo dos mesmos direitos” e “Não o são também enquanto valores constitucionais, visto que a
Constituição não se limita a reconhecer o valor da liberdade: liga os direitos a uma idéia de
responsabilidade social e integra-se no conjunto dos valores comunitários”. ANDRADE, 2004, p. 283.
2
Cf. PEREIRA, 2006, p. 133-134.
9
restrição. Por outro lado, ao mesmo tempo em que essa intervenção, o legislador
deverá atuar de modo a preservar ao máximo o direito fundamental afetado
3
.
Para Luis Aguiar de Luque, uma série de questões que demonstram a
possibilidade de limitar os direitos fundamentais. Ele apresenta três:
a) primeiro, pela necessidade de articulação dos direitos fundamentais com
os direitos dos demais;
b) segundo, a própria norma constitucional que prevê o direito fundamental
pode, em determinadas circunstâncias, estabelecer os limites e isso
decorre da unidade interpretativa da Constituição (aqui haveria a tese dos
chamados limites intrínsecos);
c) por fim, a possibilidade e necessidade de se estabelecer limites para além
daquele constitucionalmente declarados
4
.
Conforme observa Konrad Hesse, a Constituição não é uma unidade
concluída, regulando somente aquilo que aparece como importante, sendo que todo
o resto é tacitamente pressuposto ou deixado a cargo da configuração ou
concretização pela ordem jurídica. Essas questões seriam deixadas abertas de
forma consciente para a livre discussão, decisão e configuração
5
.
Segundo o mesmo autor, por outro lado, os elementos da Constituição
dependem um do outro e repercutem uns sobre os outros, sendo que a união e
consideração de toda a Constituição levam à configuração concreta da coletividade
pela Constituição. O princípio da unidade da Constituição não significa que não haja
tensões e contradições, porém, sim, que a Constituição somente pode ser
completamente compreendida e exatamente interpretada se ela for entendida como
unidade e que está dirigida mais para ordenação do conjunto do que para
demarcação e exclusão
6
. Para Konrad Hesse, o princípio da unidade da Constituição
significa que
(...) todas as normas constitucionais devem ser interpretadas de tal modo
que contradições com outras normas constitucionais sejam evitadas.
Somente uma tal resolução do problema corresponde a esse princípio, que
3
Cf. DIMOULIS; MARTINS, 2008, p. 148.
4
LUQUE, 1993, p. 09 passim.
5
HESSE, 1998, p. 39.
6
Ibid., p. 38-39.
10
se mantém em consonância com as decisões fundamentais da Constituição
e se preserva da restrição unilateral a aspectos parciais
7
.
Rafael Naranjo de la Cruz, além da necessidade de convivência do homem
com o conjunto social, fala no princípio da unidade da Constituição. Observa ele
que, na atualidade, a categoria dos limites dos direitos fundamentais é considerada
como uma conseqüência da unidade da Constituição. A norma constitucional
protege direitos e bens que, em abstrato, provocam uma série de colisões. Todavia,
é inaceitável, na aplicação do texto, que uma mesma conduta esteja e não esteja
protegida definitivamente pela norma constitucional. Os conflitos, então, reclamam
uma solução, como se a Constituição não tivesse discrepâncias internas. Por isso,
diante da colisão, os direitos envolvidos podem sofrer uma restrição em seu âmbito
de extensão máxima, por uma interpretação sistemática da norma constitucional
8
.
Nesse quadro, o parlamento tem o papel de “definir”, por exemplo, até onde
vão as variadas liberdades (de expressão, de imprensa, de opinião etc.) ou a
propriedade privada. No campo relativo aos direitos fundamentais do trabalhador,
por exemplo, em que medida haverá “remuneração do trabalho noturno superior à
do diurno” (art. 7º, inc. IX, da CF/88) ou a “licença paternidade” (art. 7º, inc. XIX, da
CF/88).
Consoante Luiz Fernando Calil de Freitas, embora não haja no Brasil norma
específica sobre a temática das restrições
9
, parte-se do pressuposto de que os
direitos fundamentais não podem ser absolutos e são restringíveis ou limitáveis.
Escreve:
7
HESSE, 1998, p. 60.
8
NARANJO DE LA CRUZ, 2000, p. 73-74.
9
Noutros paises, regramento específico, nas respectivas constituições. Na Alemanha, no artigo
19.1, que prevê: “Quando, segundo esta Lei Fundamental, um direito fundamental for restringido por
lei ou em virtude de lei, essa lei será aplicada de maneira geral e não apenas para um caso particular.
Além disso, a lei deverá especificar o direito fundamental afetado e o artigo que o prevê. 2. Em
hipótese nenhuma um direito fundamental poderá ser afetado em sua essência”. Na Espanha, no
artigo 53.1, que prevê: Os direitos e liberdades reconhecidos no Capítulo II do presente Título
vinculam todos os poderes públicos. Apenas por lei, que em todo o caso deverá respeitar o seu
conteúdo essencial, poderá ser regulado o exercício de tais direitos e liberdades, que serão
protegidos de acordo com o previsto no artigo 161, 1, a).”. Em Portugal, no artigo 18, que prevê: “Os
preceitos constitucionais respeitantes aos direitos, liberdades e garantias são directamente aplicáveis
e vinculam as entidades públicas e privadas. 2. A lei pode restringir os direitos, liberdades e
garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao
necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos. 3. As leis
restritivas de direitos, liberdades e garantias têm de revestir carácter geral e abstracto e não podem
ter efeito retroactivo nem diminuir a extensão e o alcance do conteúdo essencial dos preceitos
constitucionais”.
11
(...) é amplamente majoritária a consciência, detida mesmo pelo leigo, no
sentido de que direitos, sejam eles quais forem, não se devem ter por
absolutos nem estão imunes a limitações e restrições. Mais do que isso, é
tradição histórica no meio jurídico pátrio a aceitação da validade de normas
infraconstitucionais restritivas a direitos fundamentais e do caráter não
necessariamente incompatível para com a Constituição Federal das
restrições que a eles estabeleçam
10
.
O conceito de restrição, aliás, seria familiar e não problemático, no sentido de
que sua prática seria comum. Entretanto, o problema não estaria nisto, mas “(...) na
definição dos possíveis conteúdos e extensão dessas restrições e na distinção entre
restrições e outras coisas como regulamentações, configurações e
concretizações”
11
.
A questão é controversa porque a discussão acerca dos limites dos direitos
fundamentais passa pelo problema da força vinculante dos enunciados
constitucionais, ou seja, pergunta-se quando será admissível limitações em posições
subjetivas que foram proclamadas ao máximo nível normativo
12
. Como observa
Gilmar Ferreira Mendes, a idéia de restrições ou limitações aos direitos
fundamentais traria um problema de possibilidade lógica dessas restrições
13
.
Nesse contexto, de acordo com a dogmática de Direito Constitucional, uma
restrição a um direito fundamental deverá respeitar alguns critérios, os “limites dos
limites”, que são de caráter formal e material, quais sejam, a reserva de lei, o
princípio da proporcionalidade e o conteúdo essencial, sob pena de
inconstitucionalidade. Aparentemente, isso seria tranqüilo, caso as restrições fossem
possíveis somente nos casos em que a Constituição expressamente restringisse o
direito ou autorizasse o legislador a restringir e caso toda intervenção legislativa
fosse considerada uma restrição.
Isso, contudo, o é o que ocorre. casos, por exemplo, que exigem que o
Poder Judiciário ou Legislativo resolva colisões envolvendo direitos fundamentais
14
10
FREITAS, 2007, p. 16. No mesmo sentido, Wilson Antônio Steinmetz indica que os direitos
fundamentais não são absolutos e ilimitados. Por conta disso, no campo da dogmática dos direitos
fundamentais, há uma intensa investigação sobre seus limites, o que passa pelas restrições ou
limitações legislativas, os limites imanentes, a concorrência acumulativa e a colisão de direitos
fundamentais. STEINMETZ, 2001, p. 17 passim.
11
ALEXY, 2008, p. 276.
12
Cf. LUQUE, 1993, p. 11.
13
MENDES, 2004, p. 25.
14
Para Edilsom Pereira de Farias, por conta dos direitos fundamentais serem heterogêneos, com
conteúdo aberto e variável, apenas revelado no caso concreto e nas relações dos direitos entre si,
freqüente choque entre eles. Por exemplo: saúde pública (art. 6º, da CF/88) e livre locomoção (art. 5º,
12
e, em se tratando propriamente de colisões, questiona-se quais os critérios que
devem ser observados. Por outro lado, quem rejeite a existência de colisões
envolvendo direitos fundamentais.
Além disso, para alguns, quando o legislador intervém num direito
fundamental está somente delimitando, concretizando ou revelando limites, o que
não significaria propriamente uma restrição
15
. O problema é que quando se
considera o desenvolvimento como sendo uma concretização ou delimitação, por
não serem restrições ou limitações, a princípio, esse desenvolvimento não estaria
sujeito àqueles “testes”, os “limites dos limites”.
O fato de que os direitos fundamentais não são absolutos é pacifico, mas isso
implica a discussão sobre o seu desenvolvimento, que pode ser pela regulação,
concretização, conformação, limitação ou restrição. Além disso, no caso das colisões
entre direitos fundamentais, a solução pode significar apenas uma declaração dos
limites imanentes, “afastando a existência” de colisões ou, reconhecendo e
propondo uma solução propriamente dita, por meio da aplicação do princípio da
proporcionalidade, que pode ser, ou não, acompanhado da ponderação.
Considerando essas questões, controvérsia entre duas teorias: a interna e
a externa. A opção por uma das duas teorias depende da concepção acerca da
estrutura dos direitos fundamentais, regra ou princípio e do âmbito de proteção do
direito fundamental, amplo ou restrito.
A opção por uma dessas formas ou conceitos implicará significativa mudança
metodológica no controle de constitucionalidade desse desenvolvimento dos direitos
fundamentais.
A dissertação pretende tratar de toda essa temática; mas, além disso,
pretende-se demonstrar que o Tribunal Superior do Trabalho, embora tenha
interferido no desenvolvimento dos Direitos Fundamentais, em quatro casos
XV, da CF/88); patrimônio cultural (art. 216, §1º, da CF/88) e direto de propriedade (art. 5º, XXII, da
CF/88). Segundo o mesmo autor, ao legislador, caberá a solução do conflito quando o texto
constitucional remete à lei ordinária (reserva de lei na Constituição). No caso de direitos fundamentais
não sujeitos à reserva legal, a solução ficaria a cargo do juiz ou tribunal e a solução será tomada no
caso concreto e, portanto, em nível individual. FARIAS, 1996, p. 93-94.
15
Como indica Jorge Reis Novais, seria possível construir inúmeras modalidades de intervenção nos
direitos fundamentais, contudo, em termos práticos, é muito difícil encontrar critérios sólidos de
distinção. Segundo ele, fala-se em “(...) confomação/concretização/restrição (BACHOF),
determinação ou criação de conteúdo/intervenção restritiva (LERCHE), conformação/delimitação
(HABERLE), conformação/concretização/delimitação (HESSE), conformação/restrição (ALEXY),
regulações de conteúdo/regulações neutrais/regulações de tempo, lugar e modo (jurisprudência e
doutrina norte-americanas), regulação/desenvolvimento/limitação (jurisprudência e doutrina
espanholas)
.
NOVAIS, 2003, p. 173.
13
importantes (estabilidade do dirigente sindical e da empregada gestante,
monitoramento do e-mail do empregado e a compensação de horas extras), não
observou toda a questão ou dogmática que envolve a matéria.
A dissertação, então, abordará, preliminarmente, a discussão a respeito da
estrutura dos direitos fundamentais, concebidos como regras e princípios (2.1) e o
âmbito de proteção desses direitos, que pode ser restrito ou amplo (2.2). Superadas
as preliminares, abordam-se as teorias sobre a possibilidade de restrições aos
direitos fundamentais: teoria interna (2.3.1) e teoria externa (2.3.2), considerando
que a opção por uma ou outra depende das duas questões anteriores. Em seguida,
expõe-se uma tipologia sobre a intervenção dos direitos fundamentais, que seriam
de quatro tipos, demonstrando a importância do reconhecimento da existência das
restrições (2.4) e as “soluções” ou construções que abordam o tema das colisões
envolvendo direitos fundamentais: limites imanentes (2.4.1) e as colisões
propriamente ditas (2.4.2).
Após a exposição de todas as concepções acerca das possibilidades de
restrições dos direitos fundamentais e colisões envolvendo esses direitos, aborda-se
o tema dos critérios que devem ser observados para que tais restrições sejam
constitucionais, bem como os critérios para a solução das colisões envolvendo
direitos fundamentais os “limites dos limites”: princípios da reserva legal (3.1);
princípios da proporcionalidade (3.2), com seus subprincípios: adequação (3.2.1),
necessidade (3.2.2) e princípio da proporcionalidade em sentido estrito (3.2.3); e a
preservação do conteúdo essencial (3.3).
Finalmente, considerando as restrições e os limites das restrições, chega-se
ao objetivo do trabalho que é, considerando a possibilidade das restrições e
adotando-se as concepções mais coerentes com a exigência de objetividade e
racionalidade no controle dessas restrições, analisar as opções do Tribunal Superior
do Trabalho naquelas quatro situações: a estabilidade provisória da empregada
gestante (4.1); a estabilidade do dirigente sindical (4.2); a decisão envolvendo o
conflito entre os direitos fundamentais de propriedade e de privacidade, do
empregador e do empregado, respectivamente, no caso do monitoramento do e-
mails deste no ambiente e horário de trabalho (4.3); e, por fim, a Súmula 85 do TST,
que se refere à jornada de trabalho, pagamento de horas extras e compensação
(4.4).
14
Com isso, pretende-se demonstrar que o Tribunal Superior do Trabalho não
está suficientemente atento às questões e à dogmática que envolvem o tema das
restrições aos direitos fundamentais e as colisões em relação a tais direitos.
15
2 RESTRIÇÕES E LIMITAÇÕES AOS DIREITOS FUNDAMENTAIS
2.1 SOBRE A ESTRUTURA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS
Antes de se adentrar, propriamente, nas concepções a respeito da
possibilidade das restrições, conforme apontam as teorias interna e externa, há
necessidade de uma abordagem sobre a estrutura dos direitos fundamentais,
questionando se eles possuem a estrutura de regras, a estrutura de princípio ou uma
estrutura mista, podendo ser regras ou princípios
16
.
Segundo Martin Borowski, a distinção entre regras e princípios pode ajudar na
solução dos problemas da dogmática dos direitos fundamentais e tem com o tema
da restrição uma clara relação
17
. No mesmo sentido escreve Robert Alexy, para
quem a distinção entre regras e princípios
(...) é a base da teoria da fundamentação no âmbito dos direitos
fundamentais e uma chave para a solução de problemas centrais da
dogmática dos direitos fundamentais. Sem ela não pode haver nem uma
teoria adequada sobre as restrições a direitos fundamentais, nem uma
doutrina satisfatória sobre as colisões (...)
18
.
Ocorre que se uma norma é tida como regra, necessariamente será não
limitável. Se ela é tida como princípio, ela será necessariamente limitável. Se um
direito é garantido por uma regra, ele estará garantido por uma norma não suscetível
de ponderação. Quando se fala de regras, então, não existiriam colisões, havendo
um conteúdo plenamente determinado. Pelo contrário, se os direitos estão
garantidos mediante princípios, eles são limitáveis e as normas que restringem a
realização de um princípio são restrições
19
.
16
Cf. ALEXY, 2008, p. 85 et. seq. Ver também BOROWSKI, 2003, p. 47 et. seq. NOVAIS, 2003, p.
121 et. seq.
17
BOROWSKI, 2000, p. 41.
18
ALEXY, op. cit., p. 85. No mesmo sentido, CANOTILHO, 2003, p. 1255.
19
Cf. BOROWSKI, op. cit., p. 42. Segundo o autor, La restricción consiste em que algo, ordenado
prima facie por el princípio, no vale definitivamente”. Essa restrição pode ser realizada mediante
regras e princípios. Veja-se que, a regra restritiva deve sempre estar amparada por um princípio
fundamental. É o que escreve o autor, “En todo caso de restricción de un derecho fundamental porvía
de una regla legal, éste tiene que estar sustentada por principios constitucionales. Esto explica
igualmente cómo es posible la restricción de derechos fundamentales mediante leyes. Si la restricción
de un derecho fundamental radicara en la ley, no podría ella nunca ser eficaz. Las libertades
16
No mesmo sentido, Luis Prieto Sanchís, para quem o núcleo dessa discussão
reside em como são tratadas as ações do poder, as leis: como limites ou como
delimitações. O autor escreve:
El limite se configura así como externo al derecho y éste, a su vez, adopta
uma doble fisonomía: antes de la ponderación presenta un carácter abierto,
potencial o prima facie y sólo después de la ponderación se transforma en
cerrado, real o definitivo del derecho será coincidente con el atribuido prima
facie; si, en cambio, la ley y, por tanto, el límite se acredita como justificado,
el contenido definitivo será más reducido que el aparente o prima facie. Por
el contrario, si pensamos en términos de delimitación, los derechos ya no
operan como principios sino como tipos normativos cerrados desde el
enunciado constitucional, de manera que las normas reguladoras ya no son
consideradas como límites externos, sino como concreciones o
especificaciones del derecho constitucionalmente acuñado, con la
importante consecuencia de que ya no requieren ponderación alguna, pues
se mueven fuera de lo que es el derecho en sí. Aquí no procede hablar de
derechos prima facie y derechos definitivos; son todos definitivos
20
.
A principal distinção entre regras e princípios, para os fins perseguidos nessa
dissertação, é a distinção entre direitos definitivos e direitos prima facie e a
caracterização dos princípios como mandamentos de otimização
21
.
As regras são garantias de direitos (ou imposição de deveres) definitivos;
os princípios garantem direitos prima facie. Isso quer dizer que se um direito é
garantido por uma norma que tenha estrutura de regras, ele será definitivo e deverá
ser realizado totalmente, caso a regra seja aplicável e não haja uma exceção. No
caso dos princípios, o se fala numa realização sempre total. Em geral, a
realização será parcial, porque uma diferença entre aquilo que é garantido prima
facie e aquilo que é garantido (ou imposto) definitivamente
22
.
Por serem comandos definitivos as regras exigem uma realização completa, o
que não acontece com os princípios. As regras são normas que são sempre
satisfeitas ou não-satisfeitas. Se uma regra vale, deve-se fazer exatamente o que ela
exige. Ao contrário, como mandamentos de otimização, os princípios exigem que
fundamentales son aseguradas por normas constitucionales. Una restricción mediante normas legales
de inferior jerarquía dentro de la pirámide del ordenamiento jurídico, vulneraría el principio de
primacía de la Constitución. Pero si la restricción se funda materialmente en los principios
constitucionales que la sustentan, se presenta formalmente una colisión de normas de igual jerarquía
que puede ser resuelta mediante ponderación”.
20
PRIETO SANCHÍS, 2003, p. 221.
21
Cf. SILVA, 2006, p. 27. Sobre essa distinção e outras, entre, princípios e regras, ver: ÁVILA, 2001,
p. 05 et. seq. BARCELLOS, 2008, p. 70-83. BONAVIDES, 2008, p. 255 et. seq. SARMENTO, 2001, p.
50 et. seq. PEREIRA, 2006, p. 99 et. seq. DWORKIN, 2002, p. 35 et. seq. TORRES, 2002, p. 424-
425.
22
Cf. SILVA, loc. cit.. Ver também, ALEXY, 2008, p. 104.
17
algo seja feito na maior medida do possível, ou seja, os princípios podem ser
realizados em diversos graus. A realização pretendida é a máxima, mas isso
pode ocorrer se as condições fáticas e jurídicas forem ideais. A dificuldade estaria no
fato de que dificilmente um princípio não encontrará barreira na proteção de outro
princípio ou de outros princípios
23
.
Considerando essa diferenciação, num modelo puro de regras, as normas de
direito fundamental devem ser entendidas como comandos absolutos e
incondicionais e isso impediria a ponderação (que inclusive é criticada) e os direitos
fundamentais seriam direitos irrestringíveis. Nesse modelo, as colisões são
solucionadas de 3 formas:
a) pela invalidade de pelos menos uma das normas;
b) uma delas seria não aplicável ao caso;
c) constrói-se uma exceção
24
.
Para Robert Alexy, as referidas soluções devem ser rejeitadas. A primeira
com base na hierarquia constitucional e na idéia de que a constituição deve ser
levada a sério. A segunda tem o problema de que o caminho é a interpretação. A
ponderação, que seria o método aplicável, contudo, deve ser feita de forma aberta e
não leva a uma compreensão estrita do âmbito de proteção, visando à não aplicação
de uma norma. Por fim, a terceira, baseada na exceção, levaria a uma concepção
bizarra, porque cada direito fundamental seria cercado de uma série de exceções e
isso não seria uma exceção. Ainda, uma intervenção que ocorre por lei não poderia
ser admitida, sob pena de uma série de abusos
25
.
O modelo puro de princípios, por sua vez, não levaria a sério a Constituição,
desconsiderando que as disposições constitucionais são diferentes, com graus de
densidade e abertura diversos
26
. Esse modelo ligava-se à idéia de que os direitos
fundamentais seriam meros comandos programáticos. Atualmente, ele vincula-se à
idéia de que os direitos fundamentais podem, em qualquer caso, ser submetidos à
ponderação, sendo regras apenas os resultados dessa ponderação. O problema,
23
Cf. SILVA, 2006, p. 27. Ver também, ALEXY, 2008, p. 90-91.
24
Cf. ALEXY, 1999, p. 75.
25
Ibid., p. 75-77. Sobre outras objeções ao modelo puro de regras, considerando a existência de
direitos fundamentais garantidos sem reserva, de direitos fundamentais com reserva simples e
direitos fundamentais com reserva qualificada. Ver, do mesmo autor, Id., 2008, p. 123-132.
26
Cf. Ibid., p. 121-123.
18
aqui, é que se estabelece uma flexibilidade excessiva na aplicação dos direitos
fundamentais, além do que se desconsidera o grau de densidade e abertura
variáveis das Constituições
27
.
Por fim, como não se pode adotar um modelo puro de regras ou um modelo
puro de princípios, recorre-se a um modelo misto, com regras e princípios. Esse
modelo seria o mais adequado, porque considera as diferentes disposições
constitucionais e é mais apto para a solução dos conflitos entre os direitos
fundamentais
28
. No mesmo sentido, Jane Reis Gonçalves Pereira, para quem,
inclusive, esse seria o modelo “(...) mais adequado para orientar a interpretação do
sistema de direitos fundamentais estatuídos na Constituição de 1988”
29
.
Como observa Martin Borowski, o modelo que concebe os direitos
fundamentais como regras e também como princípios sofre uma série de objeções.
Nenhuma delas seria correta
30
.
A primeira objeção seria que os direitos fundamentais entendidos como
princípios poderiam levar a uma moralização desmedida do direito constitucional.
Isso seria infundado, especialmente porque os princípios jurídico-fundamentais são
normas jurídicas e têm todos os critérios de validade próprios do ordenamento
jurídico. Caso contrário, não seriam direito vigente
31
.
A segunda objeção refere-se à inexistência da racionalidade da ponderação,
em especial porque permitiria chegar-se a diversos resultados sobre o peso e grau
27
Cf. PEREIRA, 2006, p. 126-127.
28
Cf. ALEXY, 2008, p. 136 et. seq.
29
A autora também escreve que: “(...) por exemplo, a Constituição estabelece comando de igualdade
com graus de concreção diversos. A isonomia é versada de forma bem aberta no Preâmbulo, e em
termos um pouco mais precisos no artigo 5º, inciso I. O texto constitucional enuncia, ainda, diversas
concretizações do cânone isonômico, aludindo à igualdade de direitos entre trabalhadores com
vínculo e avulsos (art. 7º, XXXIX), determinando a igualdade de acesso aos cargos, empregos e
funções públicas (art. 37, I), definindo que os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são
exercidos igualmente pelo homem e pela mulher (art. 226, §5º) e estabelecendo que os filhos,
havidos ou não da relação de casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos, proibidas
quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação”. PEREIRA, loc. cit. Além disso, como
indica Daniel Sarmento, “(...) a distinção entre regras e princípios possui especial relevância, que
normalmente as cartas constitucionais valem-se destas duas espécies de normas. (...) a adoção de
um sistema constitucional que se alicerçasse exclusivamente sobre princípios, carrearia ao
ordenamento um dose inaceitável de incerteza e insegurança, que a aplicação dos princípios
opera-se de modo mais fluido e menos previsível do que as regras. De outra banda, a instituição de
um modelo que se fundasse unicamente sobre regras, não dará conta da crescente complexidade
das situações que a Constituição propõe-se a tutelar, pois engessaria o intérprete e o legislador
infraconstitucional, subtraindo-lhe a maleabilidade necessária à acomodação dos conflitos que
naturalmente se estabelecem, em casos concretos, entre diversos interesses concorrentes”.
SARMENTO, 2001, p 54.
30
BOROWSKI, 2000, p. 44-49.
31
Cf. Ibid., p. 44-45.
19
de afetação de um princípio, bem como sobre o grau de precedência. Isso, contudo,
não seria decorrente da ponderação, mas de todo procedimento decisório de
perguntas. A ponderação, no entanto, seria o melhor procedimento
32
.
A terceira objeção afirma que, se a restrição dos direitos fundamentais está
baseada exclusivamente em princípios constitucionais, a atividade legislativa
democraticamente legitimada seria mera execução da Constituição. Aqui, o processo
democrático perderia seu significado. Entretanto, segundo o autor, a ponderação
tem em conta um princípio adicional, ou seja, deve-se seguir as decisões do
Legislador democraticamente legitimado. Haveria um âmbito de discricionariedade
do Legislador, dentro do qual seria livre. Fora do referido âmbito, o legislador estaria
sujeito à Constituição. Assim, o resultado da ponderação não poderia vulnerar o
princípio democrático
33
.
A quarta objeção considera que haveria uma vinculação demasiadamente
fraca do legislador. Todavia, os direitos fundamentais como princípios o são
“enunciados programáticos”, ou seja, normas não vinculantes para o legislador.
sim uma vinculação geral de todo poder político aos direitos fundamentais
34
.
Por fim, a quinta objeção refere-se à impossibilidade de atingimento do bem
comum. Isso porque a interpretação dos direitos fundamentais como princípios,
levaria à concepção de que o reconhecimento do princípio de liberdade negativa
tornaria impraticáveis as medidas para o bem comum. Contudo, a teoria dos direitos
limitáveis não implica uma preferência ou necessária predominância de
determinados princípios
35
.
32
Cf. BOROWSKI, 2000, p. 46-47.
33
Cf. Ibid., p. 47-48. Por isso, quando se tratar da ponderação, será apresentado como um dos
critérios, a prevalência das regras sobre os princípios.
34
Cf. Ibid., p. 48-49.
35
Cf. Ibid., p. 49-50. Outras três objeções são relatadas por Robert Alexy: 1- afirma-se que
colisões, entre princípios, que podem ser resolvidas por meio da declaração de invalidade de um
deles; 2- existem princípios absolutos, que não podem ceder por uma ponderação; 3- o conceito de
princípio é muito amplo. Das três, a que parece mais relevante é a segunda. Segundo Robert Alexy,
não princípios absolutos, mas princípios fracos e princípios extremamente fortes. Se houvesse um
princípio absoluto, as normas de direitos fundamentais não poderiam estabelecer limites a ele. Além
disso, se o princípio absoluto garante direitos, situações em que os direitos de cada indivíduo,
fundamentados por esses princípios, teriam que ceder em favor dos direitos, também fundamentados
pelo princípio absoluto. Disso tem-se que, ou os princípios absolutos não são compatíveis ou os
direitos individuais não podem ser garantidos a mais de um direito. Por exemplo, o princípio da
dignidade humana. Esse princípio desperta a impressão de um caráter absoluto, mas não é. Essa
impressão decorre do fato de que a dignidade humana também pode se tratar como regra, além de
princípio e do fato de existir um amplo grupo de condições de precedência que conferem altíssimo
grau de certeza para esse princípio. O autor escreve: “O fato de que, dadas certas condições, ele
prevalecerá com maior grau de certeza sobre outros princípios não fundamenta uma natureza
absoluta desse princípio, significando apenas que, sob determinadas condições, razões jurídico-
20
A importância de todo o tema e da discussão sobre regras e princípios no
campo das restrições e limites importa porque “(...) entender os direitos como regra
leva a concebê-los como comandos absolutos, insuscetíveis de serem restringidos,
enquanto o modelo de princípios conduz à concepção de que os direitos
fundamentais são passíveis de restrição”
36
.
No mesmo sentido, Virgilio Afonso da Silva, segundo quem e tratando da
discussão que vem à frente, se os limites de cada direito, para a teoria interna, são
algo interno dele, ou seja, os limites são imanentes e se o conteúdo e a extensão do
direito não dependem de fatores externos e não sofrem influência de possíveis
colisões, em termos de estrutura normativa, os direitos fundamentais são regras.
a teoria externa, por outro lado, tem uma relação intima com os princípios. Este autor
escreve:
Um princípio, compreendido como mandamentos de otimização, é, prima
facie, ilimitado. A própria idéia de mandamento de otimização expressa essa
tendência expansiva. Contudo, em face da impossibilidade de existência de
direitos absolutos, o conceito de mandamento de otimização já prevê que a
realização de um princípio pode ser restringido por princípios colidentes.
reside a distinção, exposta anteriormente, entre o direito prima facie e o
direito definitivo. Essa é a distinção que a teoria externa pressupõe
37
.
O ponto fundamental, para efeitos dessa dissertação, é que a concepção de
um modelo misto, de regras e princípios, porque leva à concepção da teoria externa
acerca das restrições, apresenta a melhor metodologia para o controle das
restrições aos direitos fundamentais
38
, como ficará claro.
constitucionais praticamente inafastáveis para uma relação de precedência em favor da dignidade
humana”. ALEXY, 2008, p. 110-116.
36
PEREIRA, 2006, p. 127. No mesmo sentido, MORAES, 2000, p. 60. ALEXY, 2008, p. 278.
MENDES, 2004, p. 26. Dentre outros.
37
SILVA, 2006, p. 37 passim. Corroborando a observação anterior, tem-se Jorge Reis Novais, que
acrescenta que a inovação da concepção estaria nas conseqüências dogmáticas no domínio da
teoria dos limites aos direitos fundamentais. Como as normas constitucionais também podem ter a
natureza de princípios, os direitos nelas sustentados se convertem em direitos definitivos após a
ponderação com princípios opostos. Até ai, os princípios são apenas direitos prima facie”. A própria
natureza das normas de direitos fundamentais, enquanto princípios, fundamenta a cedência, a
restrição, a conversão de um direito “prima facie” em não-direito definitivo, como resultado de
ponderação com princípios opostos. O autor acrescenta também que essa ponderação vem
associada a uma teoria da argumentação e fundamentação jurídica e que as teorias anteriores teriam
um modelo de regras. NOVAIS, 2003, p. 322-353.
38
Cf. indica SILVA, 2006, p. 49.
21
2.2 O SUPORTE FÁTICO, ÂMBITO DE PROTEÇÃO OU EXTENSÃO DOS
DIREITOS FUNDAMENTAIS
A área de proteção de um direito fundamental é a extensão de proteção que
um direito fundamental atinge. Aqui, distinguem-se dois conceitos e isso dependerá
da concepção que se tem do suporte fático: a área de proteção e a área de proteção
efetiva.
Conforme indica José Joaquim Gomes Canotilho,
O âmbito de protecção significa que um bem é protegido, mas, nesse
âmbito, podem intervir medidas desvantajosas de entes públicos ou de
entes privados, que, mesmo sendo lícitos, carecem de justificação e de
limites. O âmbito de garantia efectiva é o domínio dentro do qual qualquer
ingerência, pública ou privada é ilícita
39
.
Ocorre que se se partirem das premissas da chamada teoria interna: direitos
fundamentais como regras e suporte fático restrito, o âmbito de garantia e o âmbito
de proteção definitivo são o mesmo. Por outro lado, quando se parte das premissas
da teoria externa: normas de direitos fundamentais como regras e princípios e
suporte fático amplo, o âmbito de garantia e o âmbito de garantia efetivo não são a
mesma coisa. A metódica para definição dos âmbitos seria a seguinte:
(1) em primeiro lugar, analisa-se se existe uma intervenção restritiva dos
poderes públicos ou de sujeitos privados no âmbito de protecção de um
direito (...); (2) em segundo lugar, investiga-se se a intervenção restritiva
obedece às exigências formais e matérias legitimadoras da intervenção
restritiva (ex.: fundamento legal, direito concorrente, proporcionalidade da
intervenção) (...). Se partimos das premissas da chamada teoria externa, o
âmbito da garantia efectivo é o âmbito de protecção definitivo depois de
estabelecidas as restrições. Se elegermos a teoria interna, o âmbito de
garantia efectivo é o que resulta de um cuidadoso recorte dos limites que a
priori (limites imanentes) subtraem ao âmbito de proteção de determinadas
acções, posições, comportamentos. O problema está em que, nos casos de
colisões entre direitos, não é fácil delimitar o âmbito de protecção e o âmbito
39
CANOTILHO, 2008, p. 199-200. Segundo o mesmo autor, “As normas consagradoras de direitos
fundamentais protegem determinados ´bens´ ou domínios existenciais´ (ex.: a vida, o domicílio, a
religião, a criação artística). Estes ´âmbitos` ou ´domínios´ protegidos pelas normas garantidoras de
direitos fundamentais são designados de várias formas: ´âmbito de proteção´ (´Schutzbereich´),
´domínio normativo´ Normbereich´), ´pressupostos de facto dos direitos fundamentais´
(Grundrechtstatbestände)”. Id., 2003, p. 1262.
22
de garantia efectico, pela simples razão de que a intervenção restritiva
surge associada ao próprio exercício de um direito
40
.
Nesse contexto, segundo Rafael Naranjo de la Cruz, somente com a definição
clara do âmbito máximo de extensão do direito fundamental permite chegar-se à
noção do conflito entre bens e direitos reconhecidos na Constituição. Por outro lado,
uma definição do âmbito delimitado pelo direito fundamental em termos amplos pode
levar ao aumento de hipóteses de colisão. Isso porque quanto maior o alcance do
direito fundamental, maior as possibilidades de conflito
41
.
Daí o debate sobre a amplitude do âmbito de proteção.
Friedrich Müller, considerando o que denomina de Teoria Estruturante do
Direito
42
, apresenta uma teoria que teria esse objetivo, ou seja, delimitar
corretamente o âmbito de proteção do direito fundamental. Este autor, por meio do
que entende ser uma adequada delimitação dos direitos fundamentais, consideraria
que seriam excluídas as hipóteses de colisão que são conflitos aparentes. Somente
quando uma situação aparentemente conflitiva não puder ser resolvida mediante a
determinação do alcance do direito fundamental, recorre-se ao princípio de
concordância prática, que seria preferível à ponderação
43
.
Na determinação do alcance do direito fundamental, intervém o texto da
norma e a realidade, que levariam ao âmbito normativo. Os âmbitos normativos
participam na normatividade prática e vice-versa, como elementos co-determinantes.
Onde o alcance material do âmbito normativo termina ou onde é limitado, finaliza seu
40
CANOTILHO, 2008, p. 199-200.
41
NARANJO DE LA CRUZ, 2000, p. 55.
42
Para Friedrich Müller, somente com a interpretação e aplicação do direito podem ser obtidas as
normas, ou seja, desde o âmbito da realidade que se regula. Para ele, as normas e os fatos não
podem ser considerados de forma separada, sendo que a relação entre o Direito e a realidade deve
ser feita em função dos casos concretos, a partir da concreção hermenêutica ou legal. O dualismo
entre a norma e a realidade é substituído pela norma que integra a realidade. Nessa estrutura,
vários elementos, sendo os mais característicos: âmbito normativo e o programa normativo. Segundo
essa estrutura, a indeterminação dos direitos fundamentais implica que eles não podem ser
esgotados no texto da norma. Eles devem ser concretados em relação ao caso concreto. A norma,
então, não é identificada com o texto normativo, sendo mais ampla que o texto. Com isso, Müller
procura, buscando superar as concepções puramente formalistas, uma norma que leve em conta a
realidade, ou seja, através do âmbito normativo. O programa normativo é o texto que se relaciona
com o âmbito normativo, ou seja, o setor da realidade. O âmbito normativo deve ser entendido como
o suposto de fato material. A norma determinada materialmente estará constituída, então, pela
conexão de elementos estruturais do programa normativo e determinados desde a realidade social.
Os direitos fundamentais são, então, garantias configuradas materialmente, através da sua regulação
constitucional desde o programa normativo até o âmbito normativo. Cf. GAVARA DE CARA, 1994, p.
107-108. Sobre a Teoria Estruturante da Norma, ver MULLER, 1989, p. 111-126; e Id., 2003, p. 315-
327.
43
NARANJO DE LA CRUZ, 2000, p. 56.
23
conteúdo de validade. O critério básico para determinar o alcance do direito
fundamental seria a especificidade. Um direito fundamental será lesionado se houver
incidência sobre o protegido especificamente por ele. O ponto chave, portanto,
nessa teoria, seria o que seja o exercício específico de um direito fundamental. Uma
forma de exercício não será específica quando se pode demonstrar que lhe falta a
conexão material com a estrutura do âmbito normativo. O decisivo seria o
estruturalmente essencial, necessário para o âmbito normativo inscrito
objetivamente. Para Müller, se as possibilidades específicas ficarem abertas para
trocas não se limita nada específico. A isso seriam unidos outros critérios como a
forma típica de manifestação de um direito ou critérios históricos, políticos, jurídicos
que foram garantidos
44
.
Para Rafael Naranjo de la Cruz, Müller acertaria porque demonstraria a
importância da correta percepção do que seja o alcance do direito fundamental, no
sentido de que determinadas hipóteses deixam de ter o caráter de restrição.
Todavia, ele não concorda com as conclusões, porque haveria um estreitamento
injustificado do alcance do direito fundamental. Além disso, os critérios para definir o
que seja especifico de um direito fundamental, para determinar a delimitação, na
verdade, realizam uma restrição “disfarçada”, sem a necessidade de submissão ao
mecanismo de garantia e controle aplicáveis aos limites. Para Naranjo de la Cruz,
então, não se evita um conflito entre bens e direitos constitucionais, apenas eles são
dissimulados e isso aumentaria a carga de subjetividade
45
.
Juan Carlos Gavara de Cara observa que Müller não procura determinar até
que ponto pode ser limitado um direito fundamental, mas que se pode desenvolver o
conteúdo de um direito fundamental, que deve ser determinado a partir das formas
típicas desse direito, ou seja, a especificidade referida. Juan Carlos Gavara de
44
Cf. NARANJO DE LA CRUZ, 2000, p. 55-58.. Segundo ALEXY, 2008, p. 313, “O que Müller quer
dizer com isso pode ser percebido por meio de seus exemplos. Especialmente instrutivo é o caso do
pintor que pinta em um cruzamento viário movimentado. A solução proposta por Muller é a seguinte:
pintar, enquanto tal, é protegido pelo art. 5º, §3º, !, da Constituição alemã; o aspecto ´pintar em um
cruzamento viário´ não é, contudo, protegido. Por conseguinte, uma lei que proíba o pintar em um
cruzamento viário não estreitaria qualquer ´forma de ação específica protegida pelo direito
fundamental´, ela não restringiria qualquer ´possibilidade específica de açã do âmbito normativo.
Essa lei seria dirigida ´contra uma ão inserida nos arredores da liberdade artística (...), mas que
não pertence a seu âmbito normativo´. Uma tal lei não representaria ou possibilitaria, portanto, uma
intervenção e não seria necessária, por isso, qualquer reserva legal. O mesmo valeria ´para uma
proibição de pregação ou uma proibição de expressão de opinião política no cruzamento viário
reiteradamente mencionado´ ou para um ´músico que à noite, na rua ou em um apartamento com
paredes finas, improvisa suas composições para trombone´”.
45
NARANJO DE LA CRUZ, loc. cit.
24
Cara afirma, entretanto, que, com Muller, a delimitação das ações protegidas,
dependentes dos conceitos de âmbito de garantia, âmbito de proteção, âmbito
normativo e alcance de um direito fundamental, significa uma derivação da
qualidade deles. Tenta-se, a partir do âmbito técnico-jurídico, indicar que as ações
do titular do direito fundamental têm limite no âmbito material e pessoal do direito
fundamental. Ocorre que o exame dos critérios para a determinação desse âmbito
normativo implica derivações imanentes, ou seja, internas e o escritas do próprio
direito fundamental
46
.
Robert Alexy rejeita a tese apresentada por Müller e apresenta uma tese
ampla do suporte fático, que segundo ele, “(...) é uma teoria que inclui do âmbito de
proteção de cada princípio de direito fundamental tudo aquilo que milite em favor de
sua proteção”
47
.
Segundo Robert Alexy, as teorias restritas do suporte fático não excluiriam da
proteção do direito fundamental um jogo de razões e contra-razões, ou seja, a
necessidade e o resultado de uma ponderação. A teoria ampla, pelo contrário,
colocaria no âmbito protegido tudo aquilo em favor de cuja proteção fala o respectivo
princípio fundamental. E, mesmo que essa amplitude implique um aumento da
ponderação, isso não seria ruim. Ocorre que a teoria ampla conduz a um modelo de
dois âmbitos: um de casos potenciais e um de casos reais. Nesta concepção, um
caso pode sair do âmbito da dúvida, de um potencial direito fundamental para não
ser mais duvidoso e transformar-se mediante uma decisão, argumentação e ou
práxis, num caso real
48
.
Com essa teoria, Robert Alexy pretende, o que não ocorreria com uma
concepção estreita da hipótese fática, que algum caso possa transformar-se num
caso real de direito fundamental. A vantagem da teoria estaria justamente nisso, ou
seja, viria associada a um eficaz sistema de controle da atuação dos poderes
constituídos e da coerência lógica, dando uma explicação fundada e operativa para
as restrições
49
.
Luis Prieto Sanchís concorda com a proposta do suporte fático amplo, nos
moldes postos anteriormente. Para ele, como há uma indeterminação do Direito, ou
seja, “zonas de penumbra”, não haveria critério seguro para permitir discernir
46
GAVARA DE CARA, 1994, p. 107 passim.
47
ALEXY, 2008, p. 322.
48
Ibid., p. 322 et. seq.
49
Ibid., p. 322-329.
25
quando uma obrigação jurídica representa um limite ao direito e quando é uma
interferência na mera liberdade natural. Para o autor, a única resposta satisfatória
nesse campo leva aos caminhos da ponderação e a tese de Alexy sobre o suporte
fático. Ele escreve: “Estas consideraciones hablan en favor de una teoría amplia del
supuesto de hecho como la planteada por Alexy, que supone una interpretación
amplia de los enunciados relativos a derechos, (…)”
50
.
Rafael Naranjo de la Cruz discorda da amplitude apresentada por Robert
Alexy, mas reconhece que a delimitação do direito fundamental deve ser ampla.
Para o autor espanhol, quando são utilizados termos abertos, não se pretende fixar
as noções no momento de promulgação das Constituições, mas deixar a
possibilidade do desenvolvimento progressivo da vida social. Uma interpretação
ampla, nesse contexto, favoreceria a própria estabilidade da Constituição. Para ele
Una interpretación reductora del ámbito de delimitación del derecho
fundamental presenta la aparente ventaja de evitar potenciales conflictos
entre los distintos bienes o derechos constitucionales. Sin embargo, esta
consecuencia no debe ser valorada positivamente. En realidad, de esta
forma no se evita el conflicto, sino más bien se disimula, con lo que ello
implica de mayor libertad del intérprete de cara a su resolución, al cubrir con
el manto de ficticia objetividad lo que no es sino fruto de una valoración
relativa de bienes enfrentados. Se evita de este modo la argumentación
requerida para una tal valoración, impidiendo, además, el control de la
decisión
51
.
José Carlos Vieira de Andrade também rejeita expressamente a tese ampla
do suporte tico. Segundo ele, na construção de Robert Alexy, a limitação toma um
sentido muito amplo, que consome a colisão de direitos ou de direitos e valores.
Para ele, boas razões para proceder a uma delimitação substancial do âmbito
normativo por interpretações. José Carlos de Vieira de Andrade, então, na busca do
suporte fático, recorre ao que denomina de limites imanentes. Embora rejeite um
modelo pré-formativo (teoria interna), conforme ele, deve-se admitir um interpretação
do âmbito de proteção, que exclua os conteúdos que possam considerar de plano
constitucionalmente inadmissíveis. Para o autor,
Essa delimitação substancial justifica-se, desde logo, pela vantagem prática
de evitar que venha a considerar-se como uma situação de conflito de
direitos aquela em que o conflito é apenas aparente: não tem sentido fazer
uma ponderação, que pressupõe a consideração de dois valores, quando
50
PRIETO SANCHIS, 2003, p. 247.
51
NARANJO DE LA CRUZ, 2000, p. 61.
26
estamos perante um comportamento que não pode, em caso algum,
considerar-se constitucionalmente protegido, pois que, não existindo à
partida um dos direitos, a solução só pode ser a da afirmação total do
outro
52
.
Aparentemente, os autores brasileiros aproximam-se da concepção proposta
por José Vieira de Andrade, preferindo falar em limites imanentes, para uma
delimitação do suporte fático
53
.
Por fim, Virgilio Afonso da Silva defende o modelo do suporte fático amplo.
Para ele, esse modelo, por alargar o âmbito de proteção dos direitos fundamentais
ao máximo e considerar toda e qualquer regulamentação como um potencial ou real
restrição, traz muitos benefícios. Esse modelo colocaria o problema às claras, no
sentido de que os direitos fundamentais são restringíveis e fazendo isso impõe um
ônus argumentativo àquele que implementa a restrição. Esse ônus da
argumentação, por outro lado, não está presente nos modelos que “rejeitam” as
restrições, os quais utilizariam de modelos que apenas encobrem os limites, como é
o caso das regulamentações, delimitações, concretizações etc. e dos limites
imanentes. Para o autor, no caso do suporte fático restrito, algumas ações, estados
ou posições jurídicas que poderiam ser, em abstrato, subsumidas no âmbito de
proteção, são consideradas não garantidas
54
.
52
Para esse mesmo autor, a interpretação restritiva justifica-se ainda para assegurar plenamente o
núcleo essencial, reforçando a dignidade da pessoa humana e os valores comunitários básicos. Os
perigos das teorias principiológicas seria enfraquecer axiologicamente o sistema, porque ao falar em
imperativos de optimização é como se não houvesse valores intocáveis. Para Andrade (2004, p. 287-
291), então, a lei restritiva, porque categoria autônoma, somente é possível nos casos em que seja
expressamente prevista pelos preceitos constitucionais. A limitação fora dessas hipóteses deve ser
outra coisa. Considerando isso, os critérios de limitação são diferentes: o legislador, na restrição,
opera por meio da proporcionalidade e ponderação; na resolução abstrata, pauta-se por critério de
harmonização. O grau de fiscalização também será diferente: no primeiro, como há autorização
constitucional (restrição) o legislador tem um certo espaço próprio de avaliação e de decisão; no caso
de uma situação abstrata de colisão, porque mera interpretação, a limitação está sujeita naturalmente
a um reexame judicial.
53
Conforme restará demonstrado no tópico 2.4.1 – limites imanentes.
54
O autor aponta como exemplos na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal os seguintes: (...)
quando o Min. Celso de Mello afirma, no HC 70.814, que ´a cláusula tutelar da inviolabilidade do sigilo
epistolar não pode constituir instrumento de salvaguarda de práticas ilícitas´, ou quando o Min.
Maurício Corrêa sustenta, no HC 82.424, que ´um direito individual não pode servir de salvaguarda de
práticas ilícitas, tal como ocorre, por exemplo, com os delitos contra honra´, (...)”. Nesse casos,
exclusão de condutas a priori do âmbito de proteção de alguns direitos fundamentais (art. 5º, XII e IV).
Isso nem sempre é tão simples. Por exemplo, “Quando o Min. Sepúlveda Pertence afirma que o sigilo
bancário não é garantido pela ´intimidade protegida no inciso X do art. da Constituição Federa
(...)”, ele estaria excluindo uma conduta do âmbito de proteção. A conseqüência, contudo, aqui, não é
pequena, porque, de acordo com ela, não importa a proteção que a lei ordinária criou e que poderá
abolir quando quiser, sendo que, para isso, não precisará fundamentar. Isso porque “(...) se o sigilo
não é protegido pelo direito à privacidade ou por qualquer outra norma de direito fundamental –,
isso significa que intervenções nesse sigilo, ou a sua total abolição, são questões meramente legais e
27
Considerando o exposto e como a intenção é testar algumas decisões do
Tribunal Superior do Trabalho e demonstrar que passam longe das discussões
acerca da restrição do direitos fundamentais do trabalhador, embora o façam, é mais
apropriada a adoção de uma concepção do suporte fático amplo, bem como de uma
concepção mista dos direitos fundamentais, como regras e princípios.
Adianta-se, por exemplo que, no caso do monitoramento do e-mail do
empregado, no local e horário de trabalho, pelo empregador, duas possibilidades:
a- ou o direito fundamental de privacidade contempla o e-mail do empregado nessas
circunstâncias e, neste caso, há um conflito entre o direito de propriedade do
empregador e direito de privacidade do empregado; ou b- afirma-se que o direito de
privacidade não comporta essa situação e como não direito fundamental, não
conflito e o empregador pode fazer o que quiser, em nome do direito de propriedade
e considerando os contornos desta. Restará demonstrado, contudo, os problemas e
conseqüências que uma opção limitadora do direito de privacidade, neste caso, com
base no direito de propriedade, pode trazer.
2.3 TEORIAS SOBRE A POSSIBILIDADE DE RESTRIÇÕES
2.3.1 Teoria interna
A teoria interna pressupõe a não-limitação dos direitos fundamentais, ou seja,
a idéia de restrições ou limitações externas aos direitos fundamentais é inadmissível.
Os direitos fundamentais, cuja restrição não é expressamente autorizada pela
Constituição (reserva legal), não podem ser objeto de limitações legislativas, mas
apenas de delimitações, que revelam o conteúdo normativo constitucionalmente
previsto
55
.
Consoante observa Jorge Reis Novais, os limites, na teoria interna, não são
externos (diferenciando da teoria externa), mais sim concretizações, no sentido de
excluídas, portanto, do controle de constitucionalidade”. Nesse contexto, o que se falar em
restrição. SILVA, 2006, p. 25 passim.
55
Cf. PEREIRA, 2006, p. 140.
28
que as fronteiras são reveladas a partir de dentro do direito, ou seja, limites
imanentes aos direitos fundamentais. Não há, então, a figura de uma restrição
legítima. No exterior das fronteiras, não há direito fundamental. Em contrapartida, no
interior, dentro dos limites demarcados, qualquer intervenção é lesão. Daí, a
denominação teoria interna. Como escreve este autor: “A legislação feita com base
nas reservas não trataria, com efeito, de constituir limites, mas de interpretar ou
revelar as fronteiras do conteúdo constitucional dos direitos fundamentais”
56
.
Para Friedrich Klein, não está correto o uso do termo restrições no campo dos
direitos fundamentais. Conforme observa Robert Alexy,
Klein opõe-se à concepção, ´associada ao termo ´restrição´ a direitos
fundamentais (...) a partir de uma perspectiva superficial ´naturalista´´,
segundo a qual ´os direitos fundamentais enquanto algo permanente por
força de sua pré-estabilidade ou por força de sua garantia jurídico-
constitucional seriam restringidos (relativizados)´. Uma ´tal relação entre o
estabelecimento e a restringibilidade de disposições de direitos
fundamentais´ não poderia existir ´nos termos da leis da lógica pura´, ´de
acordo com a lógica pura [não haveria] restrições das disposições de
direitos fundamentais, mas apenas definições dessas disposições´
57
.
De acordo com Konrad Hesse, “Como as garantias de liberdade jurídico-
fundamentais são fundamentadas pela Constituição, assim podem os limites dessas
garantias encontrar sua base somente na Constituição.” Para ele, então, por conta
da importância dos direitos fundamentais, a limitação desses direitos deve estar na
Constituição escrita. A limitação não é possível por uma cláusula geral, apenas por
reserva individuais, sendo que os limites serão apenas revelados, conforme as
previsões da própria Constituição
58
. Este autor escreve:
Cada direito fundamental encontra seu limite principalmente lá onde termina
seu alcance material. Esse limite é, uma vez, uma questão do seu ´âmbito
da norma´, isto é, daquela parte da muitas vezes, juridicamente já
moldada –, ´realidade´, que é o objeto da garantia, (...). Em segundo lugar,
pode ele ser uma questão da restrição por ordens normativas adicionais
eventuais que estão contidas na garantia do direito fundamental mesma (...).
Esse limites imanentes aos direitos fundamentais devem ser determinados
por interpretação; eles o, muitas vezes, objeto da organização do direito
fundamental pelo legislador
59
.
Ainda,
56
NOVAIS, 2003, p. 313-314.
57
ALEXY, 2008, p. 276-277.
58
HESSE, 1998, p. 250.
59
Ibid., p. 251.
29
A questão sobre o alcance de um direito fundamental torna necessária, por
conseguinte, uma análise cuidadosa do ´âmbito da norma´, uma tarefa que
frequentemente é não-compreendida e, a favor da questão sobre outros
limites, precipitadamente descuidada. Muitas vezes, entretanto, problemas
de direitos fundamentais já se deixam resolver sobre a base de uma tal
análise e então é errôneo colocar a questão, se um direito fundamental está
limitado, sob outros pontos de vista” e “Na medida em que o legislador
normaliza os limites, traçados pela Constituição, da liberdade jurídico-
fundamental em leis ordinárias, ele mesmo não limita essas liberdades; ele
comprova só declaratoriamente limites já traçados
60
.
Em sentido semelhante aos anteriores, mas referindo-se ao artigo 53.1, da
Constituição da Espanha, que prevê que “somente por lei, que em todo caso deverá
respeitar seu conteúdo essencial, poderá regular-se o exercício dos direitos e
liberdades, Ignácio de Otto y Pardo questiona o que seria essa atividade de
regulação. Como regular não é o único modo que as normas podem incidir sobre os
direitos fundamentais, caberia, aqui, a discussão clássica da divisão sobre as
reservas:
a) se se referem ao simples exercício;
b) se é uma limitação desde fora de um direito;
c) se é uma configuração ou delimitação do direito.
Definida qual é a atividade a que se refere o artigo, determinará o limite para a
atividade legislativa sobre direitos fundamentais
61
.
A regulação do exercício, contida no art. 53.1, seria entendida, por alguns,
como habilitação do legislador para limitar os direitos fundamentais e liberdades
públicas. Logo, nessa concepção, os direitos fundamentais não estariam submetidos
apenas aos limites expressos nas normas constitucionais, mas também àqueles que
forem justificados na proteção dos direitos e bens constitucionais, ou seja, a uma
limitação genérica estabelecida de forma tácita. Por conta desse entendimento,
entraria em cena a ponderação, que não seria uma boa alternativa, porque não se
sabem quais são os bens “contrapostos” (por conta da indeterminação desse
conceito) e quais são as regras de ponderação
62
.
60
HESSE, 1998, p. 251.
61
OTTO Y PARDO, 1988, p. 103-104.
62
Cf. Ibid., p. 107-111.
30
Para o autor espanhol, a relação de bens, valores e pesos deveria resultar da
própria Constituição de maneira expressa. Se não for assim, a decisão deve ser em
favor de um ou outro com base na ponderação e isso levaria a insegurança e juízos
de valor subjetivos, colocando em perigo a unidade da Constituição e a prioridade
hierárquica. Além disso, para ele, o princípio da unidade da Constituição não
permitiria uma efetiva ponderação
63
.
Essas dificuldades decorreriam do conceito de limites aos direitos
fundamentais que, em verdade, não significariam a limitação de um direito
constitucionalmente reconhecido, mas delimitação conceitual do conteúdo mesmo
do direito. O que se chama de proteção de outro bem constitucional não exigiria uma
limitação externa dos direitos e liberdade
64
.
Por exemplo, para Otto y Pardo,
Para justificar por qué no se puede establecer un laboratorio con explosivos
en una casa de vecindad no hace falta argumentar con la limitación de la
libertad de creación científica y técnica, y ello porque nadie puede
considerar que las normas prohibitivas de la instalación de ese laboratorio
son normas limitativas de esta libertad. La sanción impuesta a un
funcionario abandona su trabajo para asistir a una reunión o a misa no es,
obviamente, limitación alguna a los correspondientes derechos
fundamentales
65
.
Ao se delimitar o alcance da proteção que presta o direito constitucional, os
problemas (colisões e ponderação), antes referidos como limitação para proteger
outros bens, são na realidade problemas de interpretação sistemática e unitária da
Constituição, sem a necessidade de ponderação entre bens e valores e
hierarquização. Há, somente, um exame do conteúdo de cada um das normas.
Considerando isso, os direitos não são limitáveis, porém isso não significa que sejam
ilimitados. Um direito ilimitado seria um não direito, pois um direito ou liberdade,
fundamental ou não, ampara aquilo que ampara e nada mais. Há, então, limite e
fronteiras, os limites intrínsecos. Com isso, pretende-se dizer que o direito resulta
limitado, em rigor delimitado, porque o limite resulta da própria norma
constitucional
66
.
63
Cf. OTTO Y PARDO, 1998, p. 121.
64
Cf. Ibid., p. 137.
65
Cf. Ibid., p. 139.
66
Cf. Ibid., p. 143-144.
31
O art. 53.1, assim, não poderia ser interpretado como uma reserva geral de
limitação, mas autorização para delimitação, porque os limites advêm da própria
constituição
67
.
Segundo Peter Haberle, de acordo com uma opinião dominante, a “restrição”
seria legitimada a partir de interesses públicos e comunitários. Essa concepção
estaria errada e a rmula das “restrições” seria uma simplificação equivocada
68
.
Para ele, as limitações aos direitos fundamentais decorrem do cruzamento dos
interesses públicos e privados, no sentido de que a tutela da vida, da liberdade e da
propriedade seria uma exigência legítima do indivíduo e da comunidade. Há,
consoante ele, em verdade, uma coincidência de interesses
69
. Nesse contexto, a
legislação de reserva é conformação dos direitos fundamentais e toda limitação a
tais direitos tem ao mesmo tempo caráter de conformação, porque “(...) si los
derechos fundamentales, que son garantizados precisamente (también) a favor del
individuo, son realmente ´conformados´, ello redunda en provecho, en especial
medida, de sus titulares”
70
.
Para os adeptos da teoria interna, então, eventuais previsões normativas
seriam elementos negativos meramente declaratórios do direito, pois a legislação
seria um mecanismo de interpretação e revelação dos limites máximos de conteúdo
e para além disso não haveria direito fundamental. Ao legislador caberia, então,
conformar o conteúdo do direito, o que implica a potencialização do seu papel.
67
Cf. OTTO Y PARDO, 1998, p. 152.
68
Para Peter Haberle, os direitos fundamentais estão caracterizados por um cruzamento entre
interesses públicos e privados, no sentido de que a Constituição somente poderia desenvolver sua
força unificadora e de regulação se garantir direitos aos favorecidos e também a todos os cidadãos.
HABERLE, 2003, p. 25.
69
Ibid., p. 26.
70
Dentre outros, cita-se dois ejemplos do autor: 1- La ´intervencion´ en la integridad física que se da
en el caso de vacunación obligatoria tiene lugar no sólo en interés de la comunidad. Más bien, es
también objetivo de esta intervención proteger a vacunado frente a muchos mayores peligros. Dicho
de otro modo, la obligación de vacunación, con el objetivo propuesto, sirve precisamente al
mantenimiento de la incolumidad corporal”; e 2- “Las regulaciones y ´límites´ en el ámbito de la
libertad de profesión se suelen legitimar exclusivamente desde los intereses de la comunidad.
También aquí, sin embrago, son necesarias diferenciaciones. Las condiciones objetivas de admisión
existen – por supuesto, sólo de forma inmediata – exclusivamente en interés de la comunidad.
Distinto es, sin embargo, el caso de las condiciones subjetivas de admisión. Las normas jurídicas que
establecen requisitos de idoneidad y conocimientos profesionales existen también en interés de los
titulares de derechos fundamentales; pues no se puedes ejercer muchas profesiones sin la
correspondiente formación teórica y práctica. El ejercicio de la profesión seria ´imposible´ o
´inapropriado´. Al regular el legislador tales prescripciones, muestra al mismo tiempo a los titulares de
derechos fundamentales la vía que, de todos modos, es ya presupuesto ´tacito´ para el ejercicio de la
profesión en cuestión. (…) Se trata lo de tener presente que el legislador, al adoptar determinadas
regulaciones de la profesión, crea ´tipos de profesiones´ que, por su parte, son útiles para el propio
titular de derechos fundamentales. También aquí sirve el legislador de reserva, al mismo tiempo, al
interés, correctamente entendido, del individuo”. Ibid., p. 25-32.
32
De acordo com Peter Haberle, o legislador, no campo dos direitos
fundamentais, teria dupla função: 1- a limitação e 2- a conformação, sendo que
todas as disposições de direitos fundamentais seriam suscetíveis e necessitariam de
limitações legislativas, de conformação e precisão de conteúdo pela lei, no sentido
de que “El legislador está para ello al servicio del correspondiente derecho
fundamental afectado. La Constitución presupone su actividad como evidente y, por
tanto, no sólo como permitida, sino también como ordenada”
71
.
Por outro lado, as garantias dos direitos fundamentais também teriam um
duplo sentido:
a) implicam na proibição de lesões aos direitos fundamentais (limites ao
legislador);
b) são mandatos dirigidos ao legislador para conformar cada direito
fundamental em particular.
Com isso,
(...) el legislador que conforma los derechos fundamentales del modo
descrito los dota de su correspondiente contenido esencial, es decir, crea
complejos de normas y concretos institutos jurídicos que pertenecen a la
esencia del correspondiente derecho fundamental o (y) crea las condiciones
para que cada uno de los titulares del derecho fundamental esté en
situación de hacer uso de la esencia de su libertad
72
.
Nesse contexto, o legislador que limita os direitos fundamentais concretiza os
limites, conforme sua essência e transforma em realidade uma parte do conteúdo
essencial de tais direitos. A importância da legislação seria que
Si faltase a los derechos fundamentales el subnivel del ordenamiento
jurídico que está jerárquicamente por debajo de la Constitución, quedarían
sin eficacia, figurarían ´en el papel´. Los derechos fundamentales cuyos
límites no fuesen concretizados por el ´ordenamiento jurídico general´ y que
no fuesen conformados por las normas creadas por el legislador, quedarían
condenados a la insignificancia. (…) Sin ellas, el derecho fundamental no
tendría existencia”. Ainda, “(…) la Constitución se transforma en la
´Constitución´ en el pleno sentido de la palabra por medio de la actividad del
legislador de conformación y de limitación de los derechos fundamentales.
73
71
HABERLE, 2003, p. 169.
72
Ibid., p. 170-171.
73
Ibid., p. 168-172.
33
Jane Reis Gonçalves Pereira exemplifica muito bem o que os adeptos da
teoria interna querem dizer com os limites imanentes dos direitos ou as delimitações:
(...) o foco de análise é a determinação dos confins dos direitos, ou seja, de
sua esfera normativa ou âmbito de proteção, que decorre da adequação do
fato à norma. Assim, ao invés de afirmarem que a liberdade de expressão é
limitada pelo direito à honra e à imagem, ou que a ordem pública limita o
direito de manifestação, os adeptos dessa tese sustentarão que as
condutas humanas são ou não protegidas pelos direitos, ou seja, que estão
ou não incluídas em suas esferas de proteção
74
.
Martin Borowski observa que, se o direito, como não limitável, tem seu
alcance definido de antemão, sua restrição se torna impossível
75
.
José Joaquim Gomes Canotilho, referindo-se a Martin Borowski, descreve 11
argumentos de 14 dos utilizados pelos adeptos da teoria interna para rechaçar a
teoria externa
76
. Aqui, apenas 7 deles serão referidos, por estarem bastante ligados
às pretensões do trabalho.
O primeiro que interessa é o argumento da contradição lógica. De acordo com
esta crítica, afirma-se que um ato não poderia ser, ao mesmo tempo, conforme o
direito e contrário ao direito. A teoria externa, por um lado, proclamaria um direito
ilimitado e, por outro lado, declararia inadmissível o exercício do mesmo direito,
porque admite as restrições. Essa contradição lógica levaria a existência de um
conteúdo prima facie de um direito ser simultaneamente um definitivo não direito. No
entanto, a afirmação de que um direito, considerado prima facie, possa ceder, em
virtude de ponderação ou balanceamento para a proteção de outros bens com ele
coincidente, não é um problema. Isso porque esse direito prima facie não é um
direito definitivo. A ponderação, considerando o peso dos direitos, evitará a
contradição lógica
77
.
O segundo acusa a teoria externa de ideais irrealistas, porque ela estaria fora
da realidade, uma vez que a aceitação de um direito sem limites não existe num
sistema jurídico real. Entretanto, isso não é bem assim, porque, nos resultados
74
PEREIRA, 2006, p. 142-143.
75
BOROWSKI, 2003, p. 69-70. Como escreve esse mesmo autor, “La restricción de un derecho es
una disminución o una reducción del derecho. Algo que es del contenido del derecho antes de su
restricción deja de serlo luego de dicha restricción” Id., 2000, p. 32.
76
CANOTILHO, 2008, p. 203-214. Sobre as críticas ver também NOVAIS, 2003, p. 309-310.
77
Cf. CANOTILHO, op. cit., p. 203-204.
34
finais, a teoria não aponta para soluções irrealistas, porque parte de direitos
ilimitados prima facie e não afirma que haja direitos ilimitados
78
.
O terceiro argumento liga-se a uma vinculação comunitarista, no sentido de
que a teoria externa seria uma teoria de posições individualistas que desprezaria as
dimensões comunitárias. Essa afirmação também estaria equivocada. Primeiro,
muitos autores da teoria interna se assumiriam próximos de posições personalistas,
ou seja, a compreensão não liberal dos direitos pessoais não é um pressuposto da
teoria interna. Segundo, este modo de ver as coisas seria tendencialmente redutor.
A teoria externa quer dizer apenas que primeiro nascem os direitos e as normas
garantidoras e, depois, estabelecem-se normas restritivas
79
.
O quarto argumento, que seria o da liberdade constituída, acusa o esquema
“direito-restrição” de teoria externa de colocar o legislador como o agente da
restrição e que poderia até ser visto como inimigo dos direitos fundamentais.
Primeiro, a conformação pode ser concretizadora, clarificadora, densificadora e
constitutiva de direitos, não apenas restritiva. Segundo, a idéia de que somente a lei
pode restringir direitos exprime uma idéia contrária, baseada na tradição liberal. Por
fim, a lei restringe também para proteger outros direitos. Some-se, ainda, que a idéia
de direitos prima facie e direitos definitivos permitem reconstruir a tarefa do
legislador como otimizador e hamonizador, o que não leva a um legislador limitador
inimigo dos direitos fundamentais
80
.
O quinto argumento passa pela discussão da hierarquia de normas. A teoria
externa admitiria a restrição de direitos fundamentais por leis ordinárias, o que
significa uma sobreposição destas sobre aquelas. Nesse contexto, a teoria externa
garantiria, ao nível da Constituição, determinados direitos e, depois, toleraria
restrições por meio de normas inferiores. Essa argumentação seria redutora. Isso
porque o legislador, muitas vezes, visa à concordância, densificação e ponderação
otimizadoras de direitos, muitas vezes em colisão. Além disso, muitos direitos têm
uma grande abertura material e postulam tarefas de concordância e ponderação,
não num esquema superior e inferior, constitucional e ordinário, mas em metódicas
concretamente concretizadoras das dimensões materiais dos direitos
81
.
78
Cf. CANOTILHO, 2008, p. 205.
79
Cf. Ibid., p. 206-207.
80
Cf. Ibid., p. 208.
81
Cf. Ibid., p. 209-210.
35
O sexto argumento indica que haveria deslealdade por parte da teoria
externa, porque prometeria muito e daria pouco. Ela criaria ilusões ao afirmar que
determinados comportamentos, atos ou situações são expressão ou manifestação
de direitos, mas depois confessaria que não são. Entretanto, a perspectiva de
direitos prima facie responde a essa criação de falsas expectativas
82
.
Finalmente, o argumento da força vinculativa. Como a teoria externa permite
distinguir direitos prima facie e direitos definitivos poderia pagar um preço alto por
isso. Porque se os direitos como princípios alicerçam-se numa metódica de
concretização aberta à ponderação e balanceamento, isto seria feito à custa da
relativização vinculativa dos próprios direitos. Além disso, essa acentuação
principialista deslocaria para os tribunais a garantia do direito que deveria ser obtida
ao nível da mediação concretizadora do legislador. Entretanto, como se observou, a
teoria externa o prega uma radicalização entre princípios e regras, além do que a
maior racionalidade metódica das regras, no caso de conceitos abertos, não conduz
a soluções diferentes da metódica dos princípios
83
.
A maioria dessas críticas parte dos pressupostos descritos no início do
trabalho, ou seja, a concepção das normas de direitos fundamentais como regras e
de um suporte fático restrito.
Robert Alexy indica que, enquanto na teoria externa tem-se o direito em si e o
direito restringido, na teoria interna não haveria duas coisas
84
. Não um direito e
sua restrição, mas um direito com um determinado conteúdo. O conceito de restrição
seria substituído pelo conceito de limite e dúvidas sobre esse limite e sua extensão
não seriam sobre sua restrição, mas sobre seu conteúdo. Quando se fala em
restrições no lugar de limites, fala-se em restrições imanentes
85
e isso implica a
concepção dos direitos fundamentais exclusivamente como regras e a partir de
suporte fático restrito.
82
Cf. CANOTILHO, 2008, p. 211.
83
Cf. Ibid., p.213-214.
84
Para Martin BOROWSKI (2000, p. 33), há, também, na teoria interna, uma dupla análise e “dois
elementos”: o conteúdo aparente e o conteúdo verdadeiro. Considerando essa teoria, há necessidade
de provar se o conteúdo aparente do direito é também seu conteúdo verdadeiro. Então, aqui também
um duplo exame. Ele escreve: “Primero se examina si, a la luz del caso concreto, el ámbito del
contenido aparente del derecho ha sido afectado. En caso afirmativo, debe decidirse se el contenido
aparente del derecho también vale como contenido verdadero. La diferencia fundamental consiste,
sin embargo, en que el contenido aparente no abarca ninguna posición normativa”
85
ALEXY, 2008, p. 277-278.
36
Para essa concepção, os direitos fundamentais sem reserva legal não têm
outras limitações além daquelas que resultam do seu próprio conteúdo que será
descoberto com a análise do âmbito da norma e de seus limites imanentes. No
contexto dessa teoria, então não existem as denominadas colisões de direitos e
inexiste a necessidade de ponderação de bens ou valores, pois os limites são parte
integrante do direito fundamental. Nesse contexto, então, não restrição de direito
fundamental ou colisão entre os direitos fundamentais, sendo os limites imanentes e
o conteúdo do direito definidos desde a compreensão que se tem da norma de
direito fundamental
86
, ou seja, “a priori”.
A teoria interna, segundo Jorge Reis Novais, seria inatacável do ponto de
vista lógico. Contudo, em termos práticos, ela favorece a legitimação de qualquer
particular concretização dessa atividade restritiva. Considerando isso, um controle
formal não é possível, pois se os limites imanentes não são verdadeiras restrições,
não lhes é exigível que preencham os requisitos formais que a Constituição
prescreve para as restrições
87
.
Para Martin Borowski, na prática, as teorias interna e externa seriam a mesma
coisa. Entretanto, a diferença está na perspectiva e não no resultado, o que traz
reflexos metodológicos importantes, como na verificabilidade do teste de
constitucionalidade. Na teoria interna, o controle se partindo do pressuposto de
que a legislação sempre é constitucional. A lei, em princípio, sempre estaria de
acordo com a Constituição. Na teoria externa, o controle é mais fácil, pois, como não
convergência de conteúdo, pergunta-se como se resolve a ilegitimidade da
intervenção legislativa (pois aqui, toda intervenção seria restritiva). Os limites seriam
formais e materiais, do que se cuidará mais adiante
88
. Como escreve o autor,
La respuesta es que se trata de dos formas diferentes de describir
exactamente el mismo fenómeno. En la restricción de derechos
86
FREITAS, 2007, p. 81-82.
87
Observa o autor que, para a teoria interna, se os direitos fundamentais têm consagração na
Constituição formal, então sua restrição é impossível. A pretensa atividade restritiva será sempre
concretização, revelação, delimitação ou conformação de conteúdos, sob pena de contradição lógica,
e serão concebidos como implícita ou imanente. Se pela superioridade da Constituição temos duas
possibilidade, concretização/delimitação ou violação, então a dificuldade dogmática de uma
amputação, compressão ou restrição está resolvida: não restrições legítimas. Há, portanto,
vantagens de coerência de fundamentação, mas na prática inconvenientes. Ocorre que a
necessidade de controle não desaparece, apenas se desloca. Há o problema de se saber se se tem o
exercício de direito fundamental ou sua mera aparência ou uma concretização/delimitação do
conteúdo ou uma violação desse conteúdo. Obra citada. p. 317 a 320.
88
BOROWSKI, 2003, p. 94-96
37
fundamentales, un principio iusfundamental es limitado mediante la
expedición de una ley. El acento está aquí en que el deber prima facie de un
principio se torna en un deber definitivo. Mediante la expedición de la ley se
produce igualmente una configuración del derecho infraconstitucional. Se se
habla, en cambio, de una ´configuración iusfundamental se coloca el acento
en la formación de derecho infraconstitucoinal en el ámbito del derecho
fundamental. Sin embargo, los principios fundamentales que vinculan
materialmente al Legislador en el proceso de la configuración son a su vez
restringidos por la legislación. Quien pone el acento en el derecho
fundamental, habla de una restricción; quien acentúa el derecho
infraconstitucional, habla de una configuración en el sentido arriba
mencionado
89
.
A teoria interna, então, teria a crítica baseada na experiência. Haveria uma
dificuldade em precisar os contornos dos direitos de forma inequívoca. E, ainda que
isso fosse factível, ela desconsideraria o caráter restritivo das normas jurídicas e das
decisões jurídicas, o que importa em dispensar técnicas de controle das limitações
aos direitos (como a reserva de lei, proporcionalidade e conteúdo essencial)
90
.
Além disso, a teoria interna, embora tente simplificar a questão, não obtém
sucesso na empreitada, porque ela também depende da justificação e da
ponderação. É o que observa Luis Prieto Sanchís, segundo o qual a questão está na
justificação. Este autor escreve:
Desde mi punto de vista, y si nos tomamos en serio la fuerza vinculante de
los conceptos constitucionales, la tarea de justificar que una ley restrictiva
constituye un límite legítimo al derecho fundamental resulta del todo
semejante a la empresa de justificar que esa misma ley constituye una
interpretación plausible del concepto que opera como límite interno o criterio
delimitador del derecho. Todo depende, en suma, de la justificación de la ley
restrictiva a la luz del bien constitucional que le sirve de cobertura: si existe
tal justificación, tanto da decir que se trata de un mite legítimo o de una
actuación ´fronteriza´ pero no limitadora; y, a la inversa, si no existe,
también es indiferente decir que la ley es inconstitucional porque limitó lo
que no podía limitar, o porque delimitó mal lo que en principio sí podía
configurar” e “En suma, el núcleo de la cuestión está en el respaldo
constitucional de una medida que limita o que es fronteriza con las
libertades (…)
91
.
Em verdade, o direito e seu limite dependerão de uma ponderação, no sentido
de se saber se a medida está adequada, é necessária e proporcional. Considerando
89
BOROWSKI, 2000, p. 54-55.
90
Cf. PEREIRA, 2006, p. 159-160. No mesmo sentido escreve Gilmar Ferreira Mendes (2004, p. 30-
31), para quem, tratando da polêmica entre as teorias interna e externa e sobre a concretização ou
conformação e as restrições, “(...) o problema central das reservas ou restrições legais é o problema
da sua limitação” e ”A formulação assaz imprecisa de garantia individual ou a outorga ao legislador de
responsabilidade pela sua concretização podem esvaziar por completo o significado dos direitos
individuais em determinada ordem constitucional”.
91
PRIETO SANCHÍS, 2003, p. 226-229.
38
isso, não vantagens na nomenclatura utilizada pela teoria interna, sendo mais
comum e intuitivo o termo limites e restrição do que delimitação ou configuração
92
.
Em resumo, porque os direitos fundamentais são concebidos como regras e
porque o suporte tico ou âmbito de proteção é restrito, a teoria interna não admite
limitações ou restrições externas aos direitos e a lei somente delimita ou concretiza
conteúdo constitucional. A identificação dos casos em que o direito deve incidir, ou
seja, a fixação do suporte fático, deve ser feita por meio da análise do seu conteúdo
constitucionalmente estabelecido, especialmente pelos limites imanentes e, assim,
como o conteúdo está previamente definido, recusa-se, também, a ocorrência de
colisões de direitos.
2.3.2 Teoria externa
Ao contrário da teoria interna, para a teoria externa
93
os direitos fundamentais
sofrem restrições ou limitações.
Nos termos da teoria externa, há o âmbito de proteção e o âmbito de proteção
efetivo e concebem-se os direitos fundamentais como direitos ilimitados, que podem
ser restringidos, sendo que toda e qualquer limitação ou restrição deve observar
determinados pressupostos formais e materiais, o que é passível de discussão
judicial quanto à sua constitucionalidade
94
. De acordo com a teoria externa, duas
coisas, o direito e sua restrição: “(...) o direito em si, não restringido, e, em segundo
lugar, aquilo que resta do direito após a ocorrência de uma restrição, o direito
restringido
95
.
Na teoria externa, não há a identidade entre o âmbito de proteção do direito
fundamental e o seu âmbito de garantia efetivo, como ocorre com a teoria interna. O
âmbito de proteção seria toda a esfera da vida que o direito fundamental desenvolve
uma função de proteção e qualquer intervenção que se verifique deve preencher,
92
PRIETO SANCHÍS, 2003, p. 226-229.
93
Segundo Jane Reis Gonçalves Pereira, no Brasil, os autores, direta ou indiretamente, defenderiam
as premissas da teoria externa. A jurisprudência do STF também teria uma inclinação nesse sentido.
PEREIRA, 2006, p. 150.
94
Cf. FREITAS, 2007, p. 139.
95
ALEXY, 2008, p. 277.
39
sob pena de ilegitimidade, os requisitos formais e materiais, como a reserva de lei, o
princípio da proporcionalidade e a preservação de um núcleo essencial
96
.
Por este modelo, a Constituição consagra os direitos fundamentais,
delimitando o âmbito de proteção, mas por meio das cláusulas de reserva, coloca-os
à disposição dos poderes, de forma condicional, permitindo que intervenham. Assim,
há uma distinção, nessa concepção, entre limites dos direitos fundamentais, que são
as fronteiras reveladas ou colocadas ao originário âmbito de proteção, por meio da
própria Constituição. E, intervenções nos direitos fundamentais, que são as medidas
pelas quais os poderes constituídos intervêm no âmbito de proteção, com
preenchimento ou não dos requisitos constitucionais. Trata-se, portanto, de uma
teoria externa porque os “(...) limites e restrições são constritivamente colocados de
fora, o externos ao conteúdo do direito fundamental em si e, daí, a designação de
teoria externa”
97
.
Parte-se de um determinado âmbito da vida ou âmbito potencial de proteção
abrangido por um direito fundamental e após apurados os contornos jurídicos do
direito fundamental ou dos limites, chega-se ao âmbito de proteção
98
. Delimitado o
conteúdo, descrevem-se os diferentes tipos de situações jusfundamentalmente
protegidos e nesse domínio protegido intervêm as restrições. O que resta do âmbito
de proteção será denominado de âmbito de garantia efetivo. Como indica Jorge Reis
Novais
(...), do âmbito de protecção, deduzida a ocorrência, efectiva ou potencial,
de restrições legítimas, chega-se, finalmente, ao âmbito definitivo de
proteção ou âmbito de garantia efectivo relativamente ao qual toda a
intervenção estatal desvantajosa será configurada como restrição
ilegítima, como violação de direito fundamental
99
.
Repita-se que, conforme observa Jane Reis Gonçalves Pereira, a teoria
externa seria correlata ao modelo da ponderação e da teoria dos princípios. Se os
direitos fundamentais são princípios, ou seja, comandos “prima facie”, é possível que
96
NOVAIS, 2003, p. 299.
97
Cf. Ibid., p. 299-301.
98
Observe-se que o âmbito de proteção restrito e âmbito de proteção muito amplo, conforme
concepções defendidas por Friedrich Müller e Robert Alexy, respectivamente e conforme exposto no
item 2.2 desta dissertação. contudo, concepções que podem ser denominadas de âmbito de
proteção amplo ou não tão amplo, como no caso da utilização do conceito de limites imanentes por
adeptos da teoria externa, como José Carlos Vieira de Andrade e alguns autores nacionais (itens 2.2
e 2.4.1).
99
NOVAIS, op. cit., p. 304.
40
sejam restringidos. Haveria a norma “prima facie” e uma norma que estabelece uma
restrição. O direito definitivo viria depois do raciocínio ponderativo. Além disso, por
essas razões, a teoria externa é incompatível com o modelo de regras
100
.
Entretanto, contrariando uma lógica entre as premissas da teoria interna e
teoria externa, Peter Haberle, embora preconize uma irrestringibilidade dos direitos
fundamentais, aponta para a necessidade da ponderação. Segundo ele, porque os
direitos fundamentais integram-se reciprocamente num sistema unitário e estão
numa relação de recíproco condicionamento com outros bens, o seu conteúdo e
seus limites serão atingidos considerando outros bens. O princípio para
determinar esse conteúdo e limites e por meio do qual se solucionam os conflitos, é
o princípio da ponderação de bens
101
. Este autor escreve:
En la interpretación de un derecho fundamental hay que tomar en
consideración los valores jurídicos protegidos a través de las leyes
generales; en la revisión del efecto limitador sobre los derechos
fundamentales de las leyes generales hay que tomar en cuenta el especial
contenido axiológico del derecho fundamental en cuestión. Con el llamado
efecto intercambio entre el derecho fundamental y las leyes generales que
tiene lugar de modo específico para cada derecho fundamental se
deducen el contenido y límites de los derechos fundamentales
102
.
Embora recorra à ponderação, esse autor também utiliza o conceito de limites
imanentes. Os limites imanentes, que seriam a essência e o conteúdo constitucional
se identificariam com o conteúdo essencial, irrestringível. Esses limites imanentes
seriam atingidos por meio da ponderação
103
.
Essa fórmula soa estranha.
Como indicada Jane Reis Gonçalves Pereira, na teoria anterior, preconiza-se
a não restringibilidade dos direitos fundamentais e a ponderação, além de haver
inconvenientes e contradições. Primeiro, se os limites dos direitos existem, não
haveria conflito. Segundo, se a ponderação é um método para determinar o
conteúdo dos direitos fundamentais, eles não existem desde o início. Por fim, se o
legislador concretiza limites que existem, haveria um peso excessivo para as leis
reguladoras, o que implica um controle menos severo da atividade legislativa
104
.
100
PEREIRA, 2006, p. 151. Em que pese a discussão acerca da possibilidade da ponderação de
regras. Sobre isso ver ÁVILA, 2006, p. 51 et. seq. e BARCELLOS, 2008, p. 56 et. seq.
101
HABERLE, 2003, p. 33-34.
102
Ibid., p. 33 passim.
103
HABERLE, 2003, p. 34 passim.
104
PEREIRA, 2006, p. 152-154.
41
José Carlos Vieira de Andrade também associa elementos das teorias externa
e interna. Para ele, os direitos não sujeitos à reserva legal seriam irrestringíveis no
plano abstrato, por conta do artigo 18 da Constituição Portuguesa, segundo a qual
as restrições aos direitos fundamentais somente o possíveis nos casos
expressamente autorizados na Constituição. Por outro lado, seria possível recorrer-
se à ponderação para solucionar conflitos de direitos fundamentais no plano
concreto, como, por exemplo, “(...) no conflito entre a liberdade de expressão e o
direito de informação dos jornalistas, de um lado, e o direito à reserva da intimidade
da vida privada e familiar, do outro lado, (...)”. O autor, então, distingue 3 categorias:
a) a delimitação do âmbito de proteção constitucional, para definir o seu
objeto e o conteúdo principal, no qual se enquadra sua concepção de
limites imanentes ou intrínsecos de um direito fundamental;
b) a restrição do conteúdo do direito, operada pela intervenção normativa
abstrata do legislador, ou seja, as leis restritivas;
c) por fim, a limitação ou harmonização dos direitos, liberdade e garantias,
decorrentes da colisões de direitos ou dos conflitos entre direitos e valores
constitucionais comunitários
105
.
A teoria externa, partindo dos direitos fundamentais como princípios e de um
suporte fático ou âmbito de proteção amplo, ao reconhecer que os direitos
fundamentais podem ser restringidos, possibilita uma melhor metodologia para o
controle dessas restrições. Se existem restrições aos direitos fundamentais e se elas
não são incomuns, há necessidade do controle delas, o que é feito pelos “limites dos
limites”, tratados à frente. Por isso, neste trabalho, opta-se pelas conclusões da
teoria externa, porque, com ela, a análise da constitucionalidade das opções
tomadas pelo Tribunal Superior do Trabalho, no caso da limitação do número de
dirigentes sindicais estáveis, da estabilidade da empregada gestante, do
monitoramente e controle do e-mail do empregado e da Súmula 85, é mais
controlável e racional.
105
ANDRADE, 2004, p. 302.
42
2.4 TIPOLOGIA DAS “RESTRIÇÕES” OU “LIMITAÇÕES”
Os direitos fundamentais demandam um “desenvolvimento” legislativo; resta
saber em que medida isso é possível e o que esse desenvolvimento, no campo das
restrições, pode significar.
Um dos problemas na análise da questão, como exposto, está no fato de
que a nomenclatura utilizada não é padrão. Como foi indicado na introdução, fala-
se em conformação, concretização, restrição, delimitação, regulação,
desenvolvimento, intervenção etc., sem que haja um critério sólido de distinção
106
.
No Brasil, a nomenclatura também não é padrão. Por exemplo, Guilherme
Peña de Moraes trata de regulação, configuração, restrição e limitação, como
conceitos deferentes
107
; Wilson Antônio Steinmetz afirma que o desenvolvimento dos
direitos fundamentais pode ser feito pela restrição (ou intervenção ou limitação) e a
configuração (ou conformação)
108
; Gilmar Ferreira Mendes fala em restrição e
concretização ou conformação
109
; Dimitri Dimoulis e Leonardo Martins falam em
intervenções permitidas, intervenções proibidas, concretizações, restrições e
limitações
110
.
106
Rafael Naranjo de la Cruz (2000, p. 32-34) é um dos que apontam essa dificuldade, de forma
expressa. Segundo ele, os direitos fundamentais possuem três círculos concêntricos. Desde o
externo, o primeiro seria a “delimitação”; o segundo seriam os “limites” e o terceiro seria o conteúdo
essencial”. A primeira demarcação separa o que entra no âmbito de proteção do direito fundamental e
o que não entra. O que é direito fundamental e o que nada tem a ver com ele. Como a necessidade
de convivência em sociedade exige recíprocas limitações dos direitos fundamentais, fala-se de limites
a eles. Assim, para atingir a delimitação dos direitos, a atenção deve ser dirigida aos limites. Como
nem todo o âmbito delimitado pelo direito constitucional é suscetível de ser protegido e como nem
todo o direito pode ficar à disposição do legislador, um mínimo de espaço para estes direitos, que
seria um núcleo irredutível, o núcleo essencial. Tudo isso, embora pareça fácil, demanda uma grande
dificuldade, porque passa por questões como interpretação jurídica, concreção de enunciados,
grande número de conceitos jurídicos indeterminados e questões de delimitação e limitação.
107
O autor escreve: “De um lado, a regulamentação do exercício consiste no estabelecimento das
possibilidades de concretização de um direito fundamental. “De outro lado, a configuração
corresponde à definição do conteúdo de um direito fundamental. Por fim, a restrição equivale à
afetação do conteúdo de um direito fundamental, reduzindo-o a um determinado limite que, sem a
intervenção da legislação infraconstitucional, não seria verificado. A propósito, a restrição distingue-se
da limitação, porquanto a restrição refere-se ao exercício em sI das faculdades inerentes ao conteúdo
do direito; a limitação, ao revés, já integra o conteúdo do direito´”. MORAES, 2000, p. 63.
108
Segundo o autor referido, a conformação ou configuração e a regulação não seriam uma
necessidade jurídica, porque os direitos fundamentais possuem eficácia imediata, mas se trataria de
uma necessidade prática para maior efetividade. Considerando isso, necessidade de um critério
para diferenciar a restrição da configuração. A questão, então, seria saber se existe um critério claro,
preciso e seguro. A partir daí, o autor utiliza-se da diferenciação proposta por ALEXY, 2008, p. 27
passim.
109
MENDES, 2004, p. 17.
110
DIMOULIS; MARTINS, 2008, p. 152, por exemplo.
43
Visando expor a questão, adota-se determinada sistematização
111
.
Os direitos fundamentais objetivam regulamentar uma determinada situação
ou relação real, um conjunto de fatos. Essa área de regulamentação seria composta
de dois elementos:
a) a descrição da situação ou a relação fática, de cunho social;
b) a indicação de uma decisão ainda que genérica do constituinte a respeito
dessa situação.
Dentro do círculo da área de regulamentação, a Constituição Federal protege
determinadas situações, indicando os casos nos quais a área de regulamentação
não goza de proteção constitucional, excluindo-os, da tutela constitucional. Chega-
se, com isso, à área de proteção, que é menor que a de regulamentação. O primeiro
filtro, então, deve ser a constatação dos exatos limites da área de proteção do
direito
112
, ou seja, antes se verifica sobre o exercício do direito, se há a faculdade do
titular comportar-se ou deixar de se comportar conforme os elementos da área de
proteção do direito
113
.
Os problemas começam quando se constata a invasão na área de proteção
de um direito fundamental. Para que haja uma intervenção, basta que haja uma
ação ou omissão que impeça parcialmente a prática de um comportamento dentro
dessa área de proteção
114
.
As intervenções, nesse contexto, podem ser permitidas e o permitidas.
Uma intervenção será permitida em quatro hipóteses, podendo configurar-se numa
restrição ou numa concreção:
111
Cf. Ibid., p. 136-164.
112
Cf. Ibid., p. 136. Repita-se que definir a área de proteção do direito é outro grande problema. A
opção por uma área restrita, ou um suporte fático restrito, indica que o autor é adepto da teoria
interna e não admite restrições. Por outro lado, a opção por uma área de proteção ampla, ou suporte
fático amplo, indica que o autor é adepto da teoria externa. Isso, contudo, não é uma regra, por conta
daqueles que falam em limites imanentes e restrições.
113
Cf. Ibid., p. 137. No mesmo sentido, Canotilho (2003, p. 448-449), para quem, os direitos
fundamentais têm como referente determinados setores da realidade social. Ao articular-se um direito
fundamental com determinado âmbito da realidade social, chega-se ao âmbito de proteção de um
direito fundamental. Por exemplo, no âmbito da vida, está abrangido ou compreendido pelos direitos
fundamentais o âmbito de proteção desses direitos. Contudo, o âmbito de proteção é uma coisa e o
conteúdo juridicamente garantido desse direito é outra. Por exemplo, a liberdade de reunião tem
como âmbito de proteção material a reunião de pessoas no contexto da vida coletiva, mas, só se
garante, em termos jurídico-constitucionais, as reuniões pacíficas e sem armas.
114
Cf. DIMOULIS; MARTINS, 2008, p. 146.
44
a) se o comportamento não se situar na área de proteção do direito
115
;
b) se representar a concretização de um limite constitucional mediante lei;
c) quando uma norma infraconstitucional restringe o direito fundamental de
forma permitida pela Constituição mediante a reserva legal ou quando a
própria constituição restringe diretamente o Direito;
d) se dois direitos fundamentais ou um direito fundamental do indivíduo e um
princípio de interesse geral colidem (espécie de intervenção que será
tratada mais à frente).
As hipóteses “b” e “c” seriam intervenções legislativas. A “dseria administrativa ou
judicial. A “a” não seria uma intervenção. Não se verificando nenhuma das quatro
hipóteses indicadas, a intervenção será proibida
116
.
As concretizações mediante lei ocorrem porque alguns direitos fundamentais
são enunciados de forma bastante genérica, como é o caso da garantia de
propriedade (art. 5º, caput e inc. XXII, da CF/88)
117
. Não há, neste caso, sequer uma
definição do conteúdo. Em tais casos, a lei infraconstitucional deve concretizar o
direito fundamental e a Constituição oferece ao legislador um amplo poder de
definição
118
.
Observe-se que, mesmo no caso das concretizações problemas, porque
qualquer concretização poderá significar uma limitação, como por exemplo, quando
o legislador define quais bens não podem ser objeto de propriedade. Por isso,
115
Novamente, insiste-se: aqui se insere o debate acerca da amplitude dessa proteção.
116
Cf. Ibid., p. 149-151.
117
Como observa Gilmar Ferrreira Mendes, nem todas as normas restringem ou limitam poderes e
faculdades. Algumas visam completar, densificar e concretizar direito fundamental. Por exemplo, a
disciplina ordinária do direito de propriedade material e intelectual, do direito de sucessões (art. º, XXII
XXXI), proteção do consumidor (art. 5º, XXXII) e o direito a proteção judiciária (art. 5º, XXXV, LXVII
– LXXII). Segundo ele, os direitos individuais que têm o âmbito de proteção instituído direta e
expressamente pelo ordenamento exigem uma reflexão diferenciada. A vida e a manifestação de
opinião, por exemplo, preexistem à disciplina jurídica. Ao contrário, o direito de propriedade e o direito
da herança não teriam qualquer sentido sem as normas legais. Como se confia ao legislador a
definição desses direitos fundamentais, fala-se em regulação ou conformação, ao invés de restrição.
Não é raro que o constituinte confira ao legislador ordinário um amplo poder de conformação, como,
por exemplo, as hipóteses do artigo 5º, incisos XXVI, XXVII, XXVIII, XXXVIII, LXXVI, LXXVII. Este
autor escreve: “É que as normas legais relativas a esses institutos não se destinam, precipuamente, a
estabelecer restrições. Elas cumprem antes relevante e indispensável função como normas de
concretização ou de conformação desses direitos”. MENDES, 2004, p. 17-18.
118
Cf. DIMOULIS; MARTINS, 2008, p. 152.
45
sempre deverá ser verificada a eventualidade de a lei concretizadora estar limitando
um direito de forma inconstitucional
119
-
120
.
Robert Alexy posiciona-se nesse sentido, embora utilize a terminologia
configuração. Segundo ele, nem todas as normas de direito ordinário que tenham
como objeto um direito fundamental são uma restrição. Isso tem significado prático,
porque uma norma que não restringe um direito fundamental não precisa ser
justificada. Uma norma não-restritiva no âmbito de um direito fundamental é uma
norma que configura esse direito. Porém, isso não ajudaria na definição da diferença
entre restrição e configuração. A configuração pode ser concebida de forma ampla e
seria entendida como a totalidade das regulamentações no âmbito dos direitos
fundamentais. Aqui, então, seriam abarcadas as restrições. A configuração, por
outro lado, pode ser entendida como contraposta à restrição. Neste caso, a
configuração não pode ser uma norma mandatória ou proibitiva, mas apenas de
competência, porque normas que expressam deveres ou proibições têm caráter
restritivo. De competência, seriam, por exemplo, as normas sobre institutos de direto
civil. Resta uma questão ainda, que é saber se em alguns casos as meras
configurações podem se tratar de uma restrição também. Como isso ocorre, deve
ser utilizado o critério da não-inibição, que “(...) pressupõe que sempre que um
sopesamento orientado pela máxima da proporcionalidade seja necessário (caso
real de direitos fundamentais) ou simplesmente possível (caso potencial) não se
pode falar em uma configuração, pois se trata de uma restrição”. Para Robert Alexy,
então, deve-se adotar um conceito restrito de configuração e um conceito amplo de
restrição, porque, assim, haveria adequação às exigências de racionalidade na
fundamentação dos casos envolvendo direitos fundamentais
121
122
.
119
Cf. Ibid., p. 152-153. Estes autores escrevem “Destarte, não é possível estabelecer uma linha de
demarcação clara entre a concretização e a limitação mediante reserva legal (...). Em ambos os
casos, o aplicador deve realizar um exame de constitucionalidade antes de aplicar norma que
regulamente direitos fundamentais”.
120
Ressalte-se, novamente, que essa problemática também depende do debate do âmbito de
proteção. Se o âmbito de proteção é amplo, as intervenções provavelmente terão o caráter de
restrição e deverão ser testadas. Se o âmbito de proteção é restrito, a intervenção legal terá caráter
de concretização, conformação, delimitação etc e dnão haveria necessidade de teste, porque se
trata da revelação dos limites constitucionais.
121
ALEXY, 2008, p. 332-340.
122
No mesmo sentido, posicionam-se Rafael Naranjo de la Cruz (2000, p. 70), para quem, como a
distinção não é fácil, “(...) entre lo que se trata de un límite y lo que no es sino actuación
conformadora del derecho no es siempre del todo nítida, y pueden aparecer casos de difícil
catalogación. Creemos que, de plantearse alguna duda al respecto, se debe optar por aplicar a la
regulación legal el régimen de los límite de los derechos fundamentales, que, por ser más exigente
con la actuación legislativa, favorece una mayor eficacia del derechos fundamental”. Gavara de Cara
46
Virgilio Afonso da Silva possui o mesmo posicionamento do autor anterior,
especialmente porque parte da concepção dos direitos fundamentai como regras e
princípios e do suporte fático amplo. Segundo ele,
(...) todos os direitos fundamentais são restringíveis e todos os direitos
fundamentais são regulamentáveis. Em geral, é até mesmo difícil – às vezes
impossível – distinguir o que é restringir e o que é regulamentar direitos. Em
vista disso, a conclusão, (...), pode ser a seguinte: se tudo é restringível,
perde sentido qualquer distinção que depende da aceitação ou rejeição de
restrições a direitos (...)
123
.
Em conclusão, as restrições e concretizações dos direitos fundamentais,
nesta tipologia, devem observar os “limites dos limites”, ou seja, os requisitos de
constitucionalidade.
Adianta-se que, dos quatro casos que se pretende analisar, o que mais se
aproxima dessa hipótese é o caso da estabilidade da empregada gestante (item
4.1), na medida em que a Constituição Federal prevê a estabilidade e o Tribunal
Superior do Trabalho pode definir o que seja a confirmação: no caso, o que seja
essa confirmação poderia ser definida como uma concretização. Da mesma forma,
aparentemente, como não reserva legal, a Súmula 85/TST (item 4.4) também
poderia ser inserida nessa categoria. Isso, contudo, não é tranqüilo, pois ela pode
ser inserida no tipo dos conflitos envolvendo direitos fundamentais.
O segundo tipo é a intervenção mediante reserva legal, que é a restrição ou
limitação direta ou expressamente autorizada. Muitas disposições constitucionais
(1994, p. 158 passim), segundo quem o principal problema das leis de desenvolvimento dos direitos
fundamentais é que o legislador pode realizar um desenvolvimento de duas formas: 1- pela
intervenção, que num sentido amplo significa a modificação normativa ou factual o contraria à
Constituição de alguns dos elementos que compõem o direito (titular, destinatário e objeto); 2- a
configuração, que seria a dotação de conteúdo material de alguns dos elementos configuradores do
direito fundamental ou da sanção vinculada. Ela seria a determinação do conteúdo ou fixação da
forma de exercício e das garantias processuais de um direito. A intervenção incide de maneira
negativa, porque pressupõe que as normas vão restringir seu objeto. Esse tema é tratado com o tema
dos limites. Segundo ele, entretanto, qualquer ato de desenvolvimento dos direitos fundamentais está
sujeito ao controle de constitucionalidade material com base na cláusula do conteúdo essencial. J. J.
Gomes Canotilho (2003, p. 1263-1264) também aponta essa dificuldade. Segundo ele, nem todas as
normas restritivas são restritivas, pois normas que pretendem completar, complementar,
densificar, concretizar, o conteúdo fragmentário, vago, aberto, abstrato ou incompleto dos direitos
fundamentais. Para o autor, então, diferença entre essas normas. Por exemplo, segundo ele,
“Entende-se por normas legais restritivas aquelas que limitam ou restringem posições que, prima
facie, se incluem no domínio de protecção dos direitos fundamentais. As normas legais
conformadoras completam, precisam, concretizam ou definem o conteúdo de protecção de um
direito fundamental”. A dificuldade, contudo, está no fato de que a conformação deve deixar
imperturbado o âmbito de proteção do direito fundamental.
123
SILVA, 2006, p. 47.
47
garantem direitos fundamentais com ressalvas (restrições diretamente
constitucionais) ou com uma reserva legal
124
, mediante a rmula “nos termos da
lei”
125
. A reserva legal, então, permitirá ao legislador introduzir limites ou restringir a
área de proteção do direito
126
.
A segunda hipótese que se pretende analisar poderia enquadrar-se nesse tipo
e é a reserva legal que limita o direito fundamental de estabilidade dos dirigentes
sindicais e não intervenção da organização dos sindicatos (item 4.2). Nos termos da
lei, o número de dirigentes sindicais com direito de estabilidade provisória é de
apenas sete. Observe-se, entretanto, que não se trata de uma reserva legal
expressa, porque, quando a Constituição dispõe “nos termos da lei” (art. 8, VIII),
refere-se a “falta grave”.
Até aqui, então, aparentemente, não haveria problema. As concretizações e
restrições ou limitações mediante reserva de lei estariam justificadas na constituição
de forma expressa e estariam sujeitas ao controle da legitimidade, no sentido de que
os direitos individuais, porque de hierarquia constitucional, somente podem ser
limitados por expressa disposição constitucional (imediata) ou mediante lei ordinária
promulgada com fundamento mediato na própria Constituição Federal (mediata). Em
qualquer hipótese haveria incidência dos “limites dos limites” É claro, partindo-se do
pressuposto de que os direitos fundamentais podem ser restringidos, porque, se as
reservas legais forem autorizações para delimitações, apenas, cai-se na discussão
acerca dos limites imanentes.
O problema, entretanto, é que a possibilidade de uma colisão envolvendo
direitos fundamentais e outros bens constitucionais legitimaria o estabelecimento de
restrição a um direito fundamental não submetidos a reserva legal expressa
127
.
124
A reserva legal poderá ser simples ou qualificada. No caso da reserva legal simples, o legislador
constituinte remete ao legislador a tarefa de posteriormente limitar o conteúdo inicialmente amplo do
direito tal como na norma fundamental, sem acrescer qualquer espécie de delimitação; exemplos: VI,
VII, XV, XLV e XLVI, do artigo 5º, da CF/88. No caso da reserva legal qualificada, condições
especiais, objetivos a serem concretizado ou os meios de que se deverá valer o legislador
infraconstitucional, como, por exemplo, art. 5º, inc. XIII e XXIV, da CF/88.
125
Segundo Gilmar Ferreira Mendes (2004, p. 15-16), a idéia de restrição seria comum no âmbito dos
direitos individuais. A Constituição Federal de 1988, além do princípio geral de reserva legal, contida
no art. 5º, II, refere-se expressamente à possibilidade de se estabelecerem restrições legais, através
de diversas expressões, como “nos termos da lei”, “nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer”,
“atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer”, “salvo nas hipóteses previstas em lei”.
Outras vezes, a norma constitucional faz referência a um conceito indeterminado, como a cláusula da
“função social”.
126
Cf. DIMOULIS; MARTINS, 2008, p. 153-154.
127
MENDES, 2004, p. 40. Segundo este autor, a questão estaria facilitada pela cláusula de reserva
legal subsidiária contida no art. 5º, II, da CF/88. Entretanto, a ação limitadora deveria ser realizada
48
Considerando a possibilidade de colisão envolvendo direitos fundamentais e
outros bens constitucionais, tem-se a autorização para a restrição ou limitação do
direito fundamental tácita, o que seria chamado de reserva legal tácita ou indireta,
porque não se utiliza a fórmula “nos termos da lei”
128
. A restrição estaria autorizada,
mesmo ausente a reserva legal, por uma questão lógica e razoável, ou seja,
implicitamente autorizada
129
130
, porque considerar ilegítima a limitação, em face da
com todo tipo de cautela. Dimitri Dimoulis e Leonardo Martins (2008, p. 158-159) não concordam com
a afirmação de que o art. 5º, II, da CF/88 inclui uma reserva legal subsidiaria para autorizar as
restrições sem reserva legal expressa, porque careceria de fundamento (nota. 35). Para esses
autores, a questão poderia ser resolvida de duas formas: 1- mediante a interpretação sistemática da
área de proteção de cada direito; 2- recorrendo-se a outras normas constitucionais que autorizariam a
intervenção. Paulo Ricardo Schier (2005, p. 223-228) também discorda dessa posição. Segundo este,
as restrições de direitos fundamentais, segundo a dogmática constitucional, podem ser admitidas
somente (i) nos casos expressamente admitidos pela Constituição; (ii) não existe cláusula geral de
admissão de restrição; (iii) a restrição pode se dar pelo próprio constituinte originário ou nos casos
em que este autorizou expressamente pela via da lei; (iv) não pode a lei restritiva devolver o juízo de
restrição à Administração Pública; (v) só poderá ser legítima se for para salvaguardar outro direito
fundamental ou outro interesse ou bem constitucionalmente protegido; (vi) as leis restritivas devem ter
caráter geral e abstrato; (vii) devem estar vinculadas ao princípios da preservação do núcleo
essencial. Para ele, inexiste uma cláusula geral que possibilite as restrições. Caso contrário, as lutas
sociais e políticas de pouco adiantariam se os direitos fundamentais pudessem ser restringidos. Certo
é que cabe ao parlamento a formação legislativa dos direitos fundamentais, havendo uma liberdade
de conformação, mas a atividade de restrição tem sentido diverso. O parlamento não tem essa
autorização. Os direitos, liberdades e garantias fundamentais não são concessões, nem tampouco
resto de direitos que só podem ser afirmados quando não haja outros interesses mais nobres, como
os públicos. Os direitos fundamentais privados, em verdade, integram a noção do que seja interesse
público.
128
Cf. DIMOULIS; MARTINS, 2008, p. 154-155. Os autores apresentam como exemplo o artigo 5º, IX,
da CF/88, que garante a liberdade de locomoção. Esse direito, embora o dependa de
concretização, não significa que a Constituição não permitiu nenhuma limitação legal nessa liberdade.
J. J. Gomes Canotilho (2003, p. 450), apresenta uma tipologia semelhante. Segundo este autor, as
restrições de direitos fundamentais podem ser de três ordens: “(...) (1) restrições feitas directamente
pela Constituição; (2) restrições feitas por lei mas expressamente autorizadas pela Constituição; (3)
restrições operadas através de lei mas sem autorização expressa da Constituição”. Referindo-se à
última hipótese, o autor escreve que Estamos perante os casos mais difíceis quer em sede de
legitimidade constitucional (justificação) quer no plano da modelação concreta do âmbito de proteção
e do conteúdo juridicamente garantido. De qualquer modo, também aqui podem existir mediações
restritivas. Não se compreenderia, por exemplo, que o direito de manifestação (art. 45.º, 2), embora
consagrado no texto constitucional sem quaisquer restrições constitucionais directas e sem
autorização de lei restritivas, não pudesse ser restringido por lei, proibindo-se desde logo, as
manifestações violentas e com armas”.
129
Para Edilsom Pereira de Farias (1996, p. 75-76), 3 tipos de restrições: 1- as estabelecidas
diretamente pela Constituição (art. 5º, incisos XI, XVI e XVII, da CF/88); 2- as estabelecidas por lei
autorizada pela constituição (reserva de lei, que pode ser qualificada ou simples por exemplo, art.
5º, XXIV e XXXII, da CF/88 respectivamente); 3- as estabelecidas indiretamente pela Constituição
(implícitas), que seriam as não expressamente previstas, mas admitidas implicitamente.
130
O objetivo de Jorge Reis Novais (2003, p. 13-44), em seu texto, é tratar dessa questão, como fica
claro na introdução. Segundo ele, a Constituição portuguesa de 1976, no artigo 18º, n.º 02, traz a
proibição constitucional de restrições não expressamente previstas aos direitos fundamentais. Isso
quer dizer que o legislador carece de autorização expressa para, sob a forma de lei, afetar de forma
desvantajosa os direitos, liberdades e garantias. Aparentemente, de acordo com o artigo em questão,
os direitos fundamentais sem reservas, se não houver nada expresso, são irrestringíveis. Para o
autor, isso não é razoável. Segundo ele, a preocupação estava ligada à idéia de que “(...) o legislador
constitucional do pós-guerra se defronta é com o facto de, designadamente após as lições das
49
ausência de reserva legal, seria inobservar outras normas constitucionais. Como
indica Luiz Fernando Calil de Freitas, “(...) resulta que plenamente aceitável a
aposição posterior de limites ao conteúdo ou restrições ao exercício de direito
fundamental por norma infraconstitucional, ainda que a norma jusfundamental não
contenha expressa reserva legal”
131
.
Essa categoria, contudo, apresenta uma série de dificuldades. Algumas
teorias negariam essa possibilidade, mas acabam, na prática, aceitando a limitação.
Luiz Fernando Calil de Freitas denominou isso de “admissibilidade de limitações não
expressamente autorizadas enquanto delimitação a priori do conteúdo dos direitos
fundamentais”. As teorias que recusam a restrição sem reserva legal, mas ao
pretenderem resolver questões lógico-jurídicas decorrentes da absoluta rejeição a
limites, admitem-nos. Aqui, insere-se a doutrina dos limites imanentes e a concepção
restritiva da previsão normativa dos direitos fundamentais
132
.
Assim, mesmo na falta de previsão legal, o legislador pode intervir na área de
proteção dos direitos, introduzindo limitações. Haveria, aqui, três formas para isso:
a) tentar estabelecer uma “concordância prática”;
b) as intervenções baseiam-se na teoria dos limites imanentes que
decorreriam do princípio da unidade do texto constitucional;
c) por fim, a possibilidade seria para pôr fim no choque do exercício da
liberdade tutelada com interesses constitucionais ou direitos fundamentais
colidentes
133
.
trágicas experiências de autoritarismo e ditadura no século XX, não poder mais entregar os direitos
fundamentais aos poderes políticos, incluindo ao legislador democraticamente legitimado”. Por outro
lado, nenhum legislador constitucional poderia pretender ou conseguiria regular, precisa e
minuciosamente, as condições futuras de concretização dos direitos fundamentais e da necessidade
de compatibilização com outros bens. Ou seja, como escreve, “(...) ele não podia regular
antecipadamente todas as possíveis colisões entre direitos fundamentais e outros bens carentes de
protecção nem podia, sequer, prever a sua ocorrência”. Então, para o autor, se a possibilidade ou
necessidade de reconhecimento de limitações ou restrições aos direitos fundamentais em casos não
expressamente previstos, resta fundamentar dogmaticamente a ocorrência de tais restrições
131
FREITAS, 2007, p. 151.
132
Ibid., p. 148.
133
É o caso de Robert Alexy (2008, p. 286-292), para quem, porque têm hierarquia constitucional, os
direitos fundamentais podem ser restringidos somente por normas de hierarquia constitucional ou em
virtude delas. Nesse contexto, restrições a direitos fundamentais são normas de hierarquia
constitucional ou normas infraconstitucionais, cuja criação é autorizada por normas constitucionais.
As restrições de hierarquia constitucional são as restrições diretamente constitucionais. As restrições
infraconstitucionais são restrições indiretamente constitucionais. Além da tipologia das restrições,
a restrição e a cláusula restritiva. Uma cláusula restritiva é a parte de uma norma de direito
fundamental que diz como o suporte fático do direito fundamental foi ou pode ser restringido. Essas
cláusulas restritivas podem ser escritas ou não escritas. Para o autor, expressões como
50
A tipologia apresentada é importante porque a “(...) liberdade é mais ampla no
caso dos direitos fundamentais com reservas legais simples, menos ampla no caso
dos direitos fundamentais com reservas legais qualificadas e restritíssima no caso
dos direitos fundamentais sem reserva”
134
.
“pacificamente e sem armas”, “todos os alemães”, “armado” e “fontes acessíveis a todos” devem ser
consideradas como restrições definitivas a direitos fundamentais estabelecidos diretamente pela
Constituição. No caso das restrições por direito infraconstitucional, que são as indiretamente
constitucionais, elas decorrem de expressões como “cujo objetivo ou cuja atividade sejam contrário às
leis penais”, “prescrições das leis gerais”, “disposições legais para a proteção da juventude” e “direito
à honra pessoal”. A expressão mais clara seriam as cláusulas de reserva explícita, que autorizam
expressamente intervenções e restrições. A reserva poderá ser simples e qualificada. Estas são as
normas que estão à disposição do legislador ordinário. Por fim, as restrições constitucionais podem
ser feitas por cláusulas não-escritas. Essas cláusulas têm relação com a restrição de caráter de
princípio, como os princípios fundamentais colidentes e outros princípios de hierarquia constitucional
(outros valores). Segundo Jane Reis Gonçalves Pereira (2006, p. 209-214), a classificação de Robert
Alexy não comporta todas as espécies de forma clara. Por isso propõe a classificação das restrições
dos direitos fundamentais em: i- restrição expressamente estatuída pela Constituição: por meio de
cláusulas restritivas explícitas (art. 5º, incisos XVI, IV, XV, XVII, XLVI); ii- restrições expressamente
autorizadas pela Constituição, que podem ser por reserva legal simples (art. 5º, incisos XV, XVIII) ou
qualificada (art. 5º, incisos XIII e XII); iii- restrições implicitamente autorizadas pela Constituição, que
podem ser a- os conceitos indeterminados e institutos jurídicos sujeitos à regulação legal (art. 5º,
XLIII, LXVII, XI) - nestas hipóteses uma configuração legislativa que pode legar a restrições; e 2-
os conflitos entre direitos fundamentais e bens constitucionalmente legítimos. Para J. J. Gomes
Canotilho (2003, p. 1274-1275), não existe um padrão ou critérios de soluções de conflitos de direitos
válidos em termos gerais e abstratos. Nesse caso, deve-se reconhecer a existência de colisões
envolvendo direitos fundamentais e a ponderação no caso concreto seria, assim, necessária.
134
DIMOULIS; MARTINS, 2008, p. 164. Como conceitua Gavara de Cara (1994, p. 160), En el caso
de las reservas de ley ordinaria será válida cualquier tipo de modificación siempre que no entre en
contradicción con la Constitución y esté justificada en la misma. En las reservas de ley cualificada se
debe examinar si se han cumplido los presupuestos y objetivos establecidos en la norma que
establece el derecho fundamental y si dicho desarrollo esen contradicción con la Constitución y
suficientemente justificado en el propio texto constitucional”.
51
2.4.1 Limites imanentes
A questão dos limites imanentes já foi abordada no transcurso do texto.
Entretanto, como é muito referida e porque também pode gerar confusão, que é
utilizada por adeptos da teoria interna e da teoria externa, merece um tópico
específico.
A imanência significa o que é inerente, natural e necessário e imanentes
seriam aquelas características que estão vinculadas e não podem ser separadas do
objeto
135
.
A imanência seria o que está dentro do âmbito delimitado, o que não vai além
de si mesmo ou o que está contido dentro. O recurso a essa teoria conduz à
identificação de que o âmbito de delimitação do direito fundamental e o de seus
limites sejam a mesma coisa, fundindo-se numa coisa só: os limites imanentes.
136
De um ponto de vista clássico, as intervenções e limitações dos direitos
fundamentais são somente admissíveis para compatibilizar a liberdade de um com a
liberdade dos demais. Esta idéia de compatibilização é a base para o
desenvolvimento do pensamento da imanência dos direitos fundamentais. Nesse
contexto, haveria os limites imanentes e os exmanentes. Estes seriam os limites
escritos e previstos no próprio texto. O imanentes seriam os limites não escritos
137
.
Como indica Daniel Sarmento,
Tais limites, que representam a fronteira externa dos direitos fundamentais,
podem estar definidos expressamente na Constituição, ou dela decorrerem
implicitamente, sendo neste caso inferidos da análise da proteção
outorgada pela Lei Maior a outros direitos e valores da mesma estatura. (...)
a fixação dos limites imanentes é anterior à resolução dos conflitos (...)
138
.
Os limites imanentes seriam, então, aqueles limites que, desde sempre,
desde dentro, os direitos fundamentais possuem. Isso quer dizer que as normas
135
Cf. GAVARA DE CARA, 1994, p. 273.
136
Cf. NARANJO DE LA CRUZ, 2000, p. 86.
137
Cf. GAVARA DE CARA, op. cit., p. 273-274.
138
SARMENTO, 2001, p. 38-39.
52
constitucionais de direito fundamental, ao estabelecerem tais direitos, definem as
respectivas fronteiras
139
.
Esse conceito, então, aparece, quase sempre, entre os adeptos da teoria
interna.
Os limites imanentes são apontados como sendo:
a) limites de não-perturbação, no sentido de que cada direito seria limitado
pela existência de outros direitos, evitando abusos e prejuízos
140
;
b) exigências mínimas da vida em sociedade, que seriam os direitos dos
outros, a moral ou a ordem pública, enquanto valores elementares para
uma vida em comunidade, uma “cláusula de comunidade”
141
;
c) leis gerais, no sentido de que os direitos fundamentais estão
(imanentemente) limitados por elas, ou seja, pelas normas ordinárias
imperativas, designadamente civis ou penais
142
.
139
Cf. FREITAS, 2007, p. 83. O autor escreve: “(...) o que se busca conhecer é quais sejam as formas
ou modos de exercício de tal direito que estão incluídos no respectivo âmbito de proteção que,
possuindo os direitos fundamentais limites imanentes (...) nem todos os modos de exercício, nem
todas as formas pensáveis do direito estão abrangidas na previsão normativa”.
140
Segundo Juan Carlos Gavara de Cara (1994, p. 278-279), a partir da sua teoria sobre o abuso de
direito, H.-U. Gallwas tentou desenvolver uma teoria da imanência de caráter geral. Segundo ele, o
abuso de direito seria qualquer forma de exercício de um direito que não possa ser subsumida na
norma. Essas ações corresponderiam somente aparentemente com o exercício do direito, sendo que,
em realidade, seriam apenas a utilização do direito contraria a sua função específica, por isso um
abuso do direito. O problema desta teoria estaria na divisão entre o exercício de um direito
fundamental admissível e o inadmissível que depende de pré-compreensões e valorações subjetivas.
Estas idéias atuariam de forma imanente em relação aos direitos fundamentais.
141
A cláusula de comunidade foi desenvolvida pelo Tribunal Superior Administrativo alemão. Segundo
essa cláusula, um direito fundamental não poderia ser invocado quando coloca em perigo um bem
jurídico necessário para a comunidade. Estes bens são qualificados como imanentes ou incluídos no
interior dos direitos fundamentais, como inerentes a eles. A crítica a essa cláusula era no seguinte
sentido: implicaria decisionismo e arbitrariedade, pois implicava a proteção posterior dos interesses
individuais em face dos interesses comunitários; afetaria a segurança jurídica, pois seria uma espécie
de conceito branco; implicava na transferência de competência do legislador para o tribunal;
autorizava um limite com a ausência de um fundamento constitucional. Observa o autor que o
Tribunal Constitucional somente aceita limites quando podem ser justificados na própria Constituição,
admitindo-se como justificação a existência de direitos fundamentais colidentes de terceiras pessoas
e a proteção de outros valores jurídicos de caráter constitucional. Para tanto, o tribunal recorre a
critérios interpretativos sistemáticos e ao princípio da unidade da Constituição. Cf. Ibid., p. 173
passim.
142
Para Peter Haberle (2003, p. 51 passim), os limites das leis gerais são os limites dos direitos
fundamentais conforme à essência. O conteúdo e os limites dos direitos fundamentais obtêm-se a
partir de uma interpretação sistemática da Constituição, no sentido de que os valores jurídicos têm
uma intima conexão, sendo que a parte individual reflete-se no todo. Se os limites admissíveis aos
direitos fundamentais são deduzidos do efeito recíproco desses direitos com os bens jurídicos
limitadores, necessita-se de uma fórmula mais estreita. A fórmula dos limites imanentes seria
apropriada, porque seria manifesta a concreção dos limites admissíveis aos direitos fundamentais
como não sendo algo que vem de fora. Observe-se que, nesse processo, a determinação dos limites
imanentes é feita por meio da ponderação O autor escreve: “El legislador que concretiza los límites
53
Aparentemente, os resultados da visão imanente dos limites dos direitos
fundamentais não deveriam ser necessariamente rechaçados. Entretanto, o principal
efeito seria o relaxamento dos requisitos exigíveis para a restrição de tais direitos, ou
seja, os direitos ficam à disposição da apreciação daquele que restringe.
Isso quer dizer que “(...) la aplicación de la teoría de los límites inmanentes
puede conducir a unas conclusiones similares a as que se obtienen de la distinción
entre delimitación y límite”
143
.
O conceito de imanência indica que os direitos possuem determinadas
características. Se isso é assim, a noção de conflito que origem à limitação dos
direitos fundamentais desaparece. Isso porque se o direito possui dentro de si o fator
que o limita, oculta-se a situação conflitiva que pode implicar a sua restrição. Desse
modo, não há como aplicar o princípio da proporcionalidade em sentido amplo,
porque não há sentido questionar algo que seria inseparável da coisa.
144
Os limites imanentes, entretanto, embora seu uso seja mais coerente com os
adeptos da teoria interna, também aparecem nos adeptos de teorias externa
145
.
Para José Carlos Vieira de Andrade, “(...) os direitos fundamentais têm os
seus limites imanentes, isto é, as fronteiras definidas pela própria Constituição que
os cria ou recria (mesmo quando os recebe)”
146
. Esses limites imanentes seriam
apresentados como conflitos de direitos e valores constitucionais ou como colisões
de direitos, entretanto, não seriam a mesma coisa
147
. Para este autor, a
inmanentes a los derechos fundamentales, no lesiona éstos, no los ´relativiza´, sino que los reafirma y
asegura, los ´determina´, más bien. Los límites inmanentes son ´consecuencia´ del concepto de
derecho fundamental”.
143
Cf. NARANJO DE LA CRUZ, 2000, p. 94.
144
Cf. Ibid., p. 96.
145
Embora esse conceito não devesse fazer parte de adeptos dessa teoria. Como indica Virgilio
Afonso da Silva (2006, p. 37), os limites imanentes não o passíveis de convivência com termos
como restrição a direitos, abuso de direito ou sopesamento, porque, quando se parte da teoria
interna, que elaborou o conceito, que sustenta que direito e limites são uma coisa só, isso exclui
fatores externos impondo restrições.
146
ANDRADE, 2004, p. 292.
147
Cf. Ibid., 294-295. Este autor escreve: “Por exemplo, terá sentido invocar a liberdade religiosa para
efectuar sacrifícios humanos ou, associada ao direito de contrair casamento, para justificar a
poligamia ou a poliandria? Ou invocar a liberdade artística para legitimar a morte de um actor no
palco, para pintar no meio da rua, ou para furtar o material necessário à execução de uma obra de
arte? (...)” e “Nestes, como em muitos outros casos, não estamos propriamente numa situação de
conflito entre o direito invocado e outros direitos e valores, por vezes expressos através de deveres
fundamentais: é o próprio preceito constitucional que não protege essas formas de exercício do direito
fundamental, é a própria Constituição que, ao enunciar os direitos, exclui do respectivo programa
normativo a protecção esse tipo de situações”. O autor prefere considerar a existência de limites
54
apresentação de determinadas situações como colisões seria criticável, porque se
trataria de um problema de interpretação de cada um dos direitos fundamentais no
contexto global das normas constitucionais. Deve-se perguntar se o programa
normativo inclui ou não um certo modo de exercício, ou seja, até onde vai o domínio
de proteção da norma
148
.
A concepção dos limites imanentes, como concebida por José Carlos Vieira
de Andrade, é acompanhada por Wilson Antônio Steinmetz. Como o autor anterior,
este afirma que a maioria dos autores não faz uma diferenciação entre limites
imanentes e colisão de direitos fundamentais, o que estaria errado. Segundo ele, os
limites imanentes são distintos das colisões de direitos fundamentais caso
justifiquem-se restrições legislativas sem reserva de lei. Ele afirma que “(...) o
legislador poderá instituir limites aos direitos fundamentais sem reserva de lei,
porque tais limites são imanentes ao sistema dos direitos fundamentais e à
Constituição como um todo (...)”
149
.
Conforme observa Jane Reis Gonçalves Pereira, contudo, os limites
imanentes, quando operados por adeptos da teoria externa, nada mais seriam que o
âmbito máximo de proteção do direito. Em verdade, segundo ela, tudo depende da
concepção que se adota. Para quem admite a impossibilidade de restrição dos
direitos fundamentais não sujeitos a reserva legal, a tendência seria afirmar que os
limites imanentes são limites internos, que se confundem com a esfera de proteção
imanentes implícitos, sempre que se possa afirmar, com segurança e em termos absolutos, que não é
pensável em caso algum a Constituição proteger um certo bem.
148
ANDRADE, 2004, p. 292-297.
149
STEINMETZ, 2001, p
. 43.
Suzana de Toledo Barros (2003, p. 162 passim) possui entendimento
semelhante, embora isso não fique muito claro. Ela admite a existência de restrições aos direitos
fundamentais, mas também fala em limites imanentes. Segundo a autora, existem as restrições
expressas e as tácitas, que seriam os chamados limites imanentes dos direitos fundamentais ou
limites constitucionais não escritos. A sistemática seria a seguinte: a- restrições ou limites expressos:
diretamente pela Constituição e indiretamente, pela lei; b- restrições ou limites implícitos (limites
imanentes). Para ela, os limites constitucionais não-escritos ou limites imanentes estariam
relacionados com os problemas de conflitos. Aqui, deveriam ser tomados em consideração dois
princípios de interpretação constitucional que se acham correlacionados.: o princípio da unidade da
Constituição e o princípio da concordância prática. No mesmo sentido, Dimitri Dimoulis e Leonardo
Martins (2008, p. 159), embora rejeitem a idéia de limites imanentes, uma vez que excluem do âmbito
de proteção determinadas condutas. Gilmar Ferreira Mendes (2004, p. 77) também tem postura
semelhante, sem mencionar o termo limites imanentes, observando que muitas questões seriam
apenas conflitos aparentes, daí a necessidade da precisa identificação do âmbito de proteção. Por
exemplo, para ele, é inadmissível que a poligamia seja fundamentada na liberdade de religião; que a
liberdade científica seja exercida em detrimento do patrimônio alheio ou que se pratique um
assassinato no palco em nome da liberdade artística O autor escreve: “Tem-se, pois, autêntica
colisão apenas quando um direito individual afeta diretamente o âmbito de proteção de outro direito
individual”.
55
do direito (teoria interna)
150
. Para quem admite a restringibilidade, os limites seriam
limites externos, estranhos ao conteúdo do Direito (teoria externa).
Considerando isso, certos autores sequer abordam o tema, como Alexy e
Borowski. Isso porque a idéia de limites imanentes como resultado de restrições ou
ponderações soa contraditória
151
. Jane Reis Gonçalves Pereira escreve:
(...) i) ou se adota a teoria interna, entendendo-se que tais limites estão
preestabelecidos na Constituição, e então são mesmo intrínsecos e
inerentes, ii) ou se entende que os direitos são restringíveis, estando
sujeitos a ponderações e limitações, e, então, os limites que resultam das
restrições não podem ser chamados de imanentes, precisamente porque
são apurados a posteriori
152
.
Daí mais adeptos da teoria interna manejarem o conceito. Ou seja, a idéia de
limites intrínsecos encontra-se no cerne da concepção que recusa a restringibilidade
dos direitos não submetidos à reserva legal
153
.
A crítica à teoria dos limites imanentes é a mesma que se faz ao suporte
fático restrito, porque, como a estrutura dos princípios é aberta e flexível e não
150
A identificação dos limites internos, âmbito de proteção e limites imanentes, em verdade, como
observa Gavara de Cara (1994, p. 159 passim), não pode acontecer. Caso isso seja admitido,
ensejo a toda a confusão que se quer superar. Como observa este autor, dois tipos de limites: os
internos e os externos. Os limites internos seriam aqueles que servem para determinar o conteúdo do
direito e se aplicam aos casos em que o exercício do direito não pertence ao âmbito jurídico
específico, uma situação de não direito. Por exemplo, o direito de reunião pacifica e em armas
impede que se possa exercer o direito de reunião de forma violenta ou com armas. Os limites internos
estariam expressos no texto constitucional e não seriam supostos de delimitação. Eles poderiam ser
assim considerados somente nos casos em que o texto fixe o alcance e o conteúdo do direito, ou
seja, “(...) lo que no sea subsumible en el supuesto de hecho del derecho no son límites, sino
supuestos de no derecho”. Os limites externos ou intervenções em sentido estrito são normas
infraconstitucionais que modificam algum dos elementos configuradores do direito fundamental. Os
limites externos são impostos pelo ordenamento ao exercício legítimo e ordinário dos direitos
fundamentais. O principal problema aqui, entretanto, é a existência dos limites implícitos, que são
justificados pela necessidade de proteger outros direitos fundamentais ou outros bens
constitucionalmente protegidos. Para o autor, os limites implícitos o podem ser considerados como
pressupostos para a teoria dos limites imanentes. Esta teoria pretende que, ao estarem dentro de um
ordenamento, os direitos fundamentais devem conciliar-se com os restos dos bens jurídicos. Os
limites implícitos devem proteger bens constitucionais e a teoria dos limites imanente dirige-se à
proteção de bens infraconstitucionais. Para ele, ainda, os limites internos estão expressos no texto
constitucional, o podendo ser considerados supostos de limitação dos direitos fundamentais em
sentido estrito. Todavia, os limites internos foram identificados com os limites imanentes. Isso
possibilitava a existência de limites internos aos direitos fundamentais sem que estivessem
estabelecidos direta e expressamente pela Constituição.
151
Cf. PEREIRA, 2006, p. 191.
152
Ibid.
153
Cf. Ibid.
56
possui um campo de incidência bem delimitado, essa tarefa de delimitação prévia,
ou a priori, é muito difícil, senão impossível
154
.
2.4.2 Colisões envolvendo direitos fundamentais
Além das restrições ou limitações aos direitos fundamentais, de forma direta
ou por reserva legal expressa, elas podem advir da colisão entre direitos
fundamentais.
Aqueles que não querem admitir a existência de colisões entre os direitos
fundamentais recorrem ao conceito de limites imanentes ou à concepção de um
suporte tico restrito. Quem opta pela concepção do suporte tico amplo,
inevitavelmente deverá enfrentar a temática das colisões envolvendo direitos
fundamentais.
A hipótese do monitoramente do e-mail do empregado pelo empregador (item
4.3), porque implica num conflito entre os direitos à privacidade daquele e o direito à
propriedade deste, enquadra-se neste tipo.
Como decorrência das características expostas no primeiro tópico, os
conflitos entre princípios não podem ser resolvidos pelos critérios tradicionais de
resolução de antinomias critério cronológico, critério da especialidade e critério
hierárquico –, aplicáveis as regras.
Como indica Daniel Sarmento, o critério cronológico não serve porque as
normas da Constituição o editas em um único momento. O critério da
especialidade serve para os casos em que envolvem normas antagônicas do tipo
geral e especial e que se aplica no caso das antinomias do tipo total-parcial
(quando o âmbito de validade de uma norma está compreendido no interior do
âmbito de validade de outra). Essa espécie, contudo, não é comum entre os
princípios constitucionais, que normalmente implicam em antinomias parcial-parcial
(quando as normas ostentam âmbitos de validade em parte igual e em parte
diferente). Por fim, o critério hierárquico também não é aplicável, porque, ainda que
154
Cf. SARMENTO, 2001, p. 39-40. Este autor como exemplo os princípios que regem a ordem
econômica brasileira, no art. 170, da Constituição Federal. Fora de qualquer contexto fático, não é
possível definir os limites dos princípios da livre iniciativa, busca do pleno emprego, defesa do
consumidor etc, a fim de evitar a possibilidade de conflitos no caso concreto.
57
algumas normas tenham um maior destaque, não autorização expressa da
Constituição para que sejam escalonadas em diferentes graus. Além disso, a
inexistência de hierarquia absoluta entre as normas constitucionais decorre do
princípio da unidade da Constituição
155
.
A diferença entre regras e princípios, então, fica clara nos casos das colisões
e conflitos. “Um conflito entre regras somente pode ser solucionado se se introduz,
em uma regra, uma cláusula de exceção que elimine o conflito, ou se pelo menos
uma das regras for declarada inválida”. Ao contrário das regras, as colisões entre
princípios são solucionadas de forma diversa. Quando dois princípios colidem, um
deles terá que ceder e isso não significa que será declarado inválido, nem que
deverá ser introduzida uma cláusula de exceção. Isso é possível porque o conflito
entre princípios ocorre na dimensão de peso
156
.
Essas colisões somente poderão ser resolvidas considerando o caso
concreto.
Segundo Robert Alexy
157
, as colisões de direitos fundamentais podem ser
estrita ou ampla. Ela será denominada estrita quando a colisão ocorrer entre direitos
fundamentais apenas. Colisões de direitos fundamentais em sentido estrito ocorrem
quando o exercício ou a realização de um direito fundamental de um titular tem
conseqüência negativa sobre outros direitos fundamentais de outros titulares. Essas
colisões podem tratar-se dos mesmos direitos fundamentais
158
ou de direitos
fundamentais diversos
159
.
155
Observa o autor que uma exceção, que se refere às emendas constitucionais. Nesse caso, o
novo princípio, introduzido por uma emenda constitucional, poderá revogar, no todo ou em parte, o
anterior, desde que este não seja uma cláusula pétrea. O critério hierárquico, por outro lado, implica
na rejeição da emenda, caso ela pretenda revogar uma cláusula pétrea. SARMENTO, 2001, p. 41.
156
ALEXY, 2008, p. 93-94.
157
Id., 1999, p. 68-69.
158
Haveria quatro tipos de colisões de direitos fundamentais idênticos. 1- quando está, em ambos os
lados, afetado o mesmo direito fundamental. Por exemplo, quando dois grupos hostis pretendem
manifestar-se, no mesmo local e ao mesmo tempo, e perigo de confronto. 2- quando um direito de
defesa liberal de um confronta-se com o direito de proteção de outro. Por exemplo, atira-se num
seqüestrador para salvar a vida do refém. Aqui, o direito à vida do seqüestrador e de outro a do
refém. Por outro lado, a vida do refém poderia ser salva apenas atendendo-se as exigências do
seqüestrador. Há, contudo, um dever de proteção diante dos demais cidadãos, que exigem que o
Estado não faça nada que venha a estimular outros seqüestros. 3- quando um direito fundamental
tem um lado negativo e outro positivo. Por exemplo, a liberdade de crença, que significa a prática de
uma crença, como também não ter uma crença e ser poupado de praticar uma. Exemplo disso seria o
Estado poder ordenar que nas salas de aula de escolas públicas se coloque uma cruz. 4- quando se
acrescenta ao lado jurídico de um direito fundamental um fático. Por exemplo, o auxílio de custas
processuais. Se considerada a igualdade jurídica, quando o Estado não financia o pagamento, pobres
e ricos são tratados iguais. Considerada, contudo, a igualdade fática, um tratamento desigual. Se
o Estado fomenta, trata-se os ricos juridicamente de outra forma. Isso depende então do
58
A colisão será ampla quando ocorrer entre direitos fundamentais e qualquer
outra norma ou princípio que tenha como objeto bens coletivos
160
.
Segundo Juan Carlos Gavara de Cara, “La colisión de derechos
fundamentales se da cuando el ejercicio de un derecho fundamental por parte de un
titular impide o perjudica el ejercicio de otro derecho fundamental de otro titular,
siendo indiferente que se trate del mismo derecho o de otro distinto” e “Los conflictos
entre derechos fundamentales y bienes jurídicos constitucionales se dan cuando el
ejercicio de un derecho fundamental implica una contradicción o un perjuicio de un
bien jurídico protegido por el texto constitucional”
161
.
As colisões que se cuidam são, então, aquelas que envolvem conflitos entre
direitos fundamentais e direitos fundamentais e outros bens constitucionais.
A dificuldade está em se saber quando e qual o direito ou bem de
prevalecer no caso de uma colisão. Como indica Robert Alexy, todas as soluções de
colisões somente podem ser feitas de uma maneira, que é a limitação ou sacrifício
de um direito. Não fórmulas gerais e abstratas, pois não e não pode haver
uma preferência de um direito a outro de forma abstrata. A questão deverá, então,
ser resolvida por meio do caso concreto, com observância dos princípios da
proporcionalidade, com especial ênfase para a ponderação
162
.
entendimento acerca do princípio da igualdade, pois se ela for a fática e a jurídica, haveria um
paradoxo. ALEXY, 1999, p. 69-70.
159
Entre as colisões de direitos fundamentais diferentes de titulares diferentes, a colisão da liberdade
de manifestação de opinião com os direitos fundamentais do afetado pela opinião teria destaque.
Ainda, quando o considerados os direitos de liberdade e igualdade, como no caso de aplicar a
proibição de discriminação à ordem jurídica. Por exemplo, colisão entre a autonomia privada do
empregador e o direito de tratamento igual do empregado. Ibid., p. 70-71.
160
Exemplo desse tipo de colisão seria em que proporção e como o legislador pode proibir ao
proprietário o aproveitamento de seu terreno que prejudique a água subterrânea. Tem-se aqui bem
coletivo ecológico em confronto com o direito à propriedade. Os bens coletivos também não são só
adversários, podendo aparecer pressupostos. Por exemplo, o dever da indústria de tabaco colocar
advertências sobre o prejuízo à saúde em seus produtos. Trata-se de uma intervenção na liberdade
de exercício profissional dos produtores de tabaco, um direito fundamental. A justificação está na
proteção da saúde da população, um bem coletivo. Ibid., p. 68 passim. No mesmo sentido, Edilsom
Pereira de Farias (1996, p. 93-94), que fala em dois tipos de colisões de direitos fundamentais. Uma
delas seria denominada de colisão entre os próprios direitos fundamentais. Aqui, o exercício de um
direito fundamental colide com o exercício de outros direitos fundamentais. Por exemplo, a liberdade
artística, intelectual, científica ou de comunicação (art. 5º, IX, da CF/88) pode entrar em colisão com a
intimidade, a vida privada, a honra ou a imagem das pessoas (art. 5º, X, da CF/88). A outra ele
denomina de colisão entre os direitos fundamentais e outros valores constitucionais. Aqui, há a
colisão entre os direitos fundamentais e outros valores constitucionais individuais contrapostos a
interesses da comunidade, reconhecida, também, pela Constituição. Saliente-se que, trata-se
exclusivamente daqueles protegidos pela Constituição. Escreve o autor: Somente a necessidade de
salvaguardar estes últimos justifica a restrição de direitos fundamentais quando colidentes com
valores comunitários”.
161
GAVARA DE CARA, 1994, p. 288-289.
162
ALEXY, 1999, p. 73.
59
A opção e necessidade do método da ponderação também são apontadas por
Daniel Sarmento. Segundo este, a resolução dos conflitos entre princípios requer
uma análise da situação concreta, porque esse tipo de tensão só pode ser analisado
considerando as variáveis fáticas. A técnica de decisão que, sem desconsiderar os
aspectos normativos, atribui relevância às questões fáticas é a ponderação
163
.
Num primeiro momento, verifica-se se o caso concreto está compreendido na
esfera da proteção de um princípio e, caso esteja, passa-se à ponderação
propriamente dita. Com ela, o intérprete impõe compressões recíprocas sobre os
bens jurídicos protegidos, objetiva chegar a um ponto ótimo, com vista que a
restrição seja mínima, observando que “O nível de restrição de cada bem jurídico
será inversamente proporcional ao peso que se emprestar, no caso, ao princípio do
qual se deduzir, e diretamente proporcional ao peso que se atribuir ao princípio
protetor do bem jurídico concorrente”
164
.
Conforme Robert Alexy, como os direitos fundamentais são vinculativos, ou
seja, possuem justiciabiliade
165
e como os direitos fundamentais têm caráter de
163
SARMENTO, 2001, p. 55.
164
Ibid., p. 56.
165
O problema das colisões desapareceria caso se declare que todas as normas de direito
fundamentais não vinculam, no sentido de que seriam apenas problemas políticos ou morais. Uma
solução, assim, no Brasil, seria inaceitável, por conta do artigo 5º, §1º, da CF/88, que declara todos
os direitos fundamentais como diretamente aplicáveis. Mas, além disso, a justiciabilidade de tais
direitos deve ser sempre exigida, porque os “Direitos fundamentais são essencialmente direitos do
homem transformados em direito positivo” e A institucionalização inclui necessariamente
justicialização”. Outro caminho, seria afirmar que a justiciabilidade não precisa ser total ou ampla, no
sentido de que ela está nos direitos clássicos e não nos direitos fundamentais. Essa solução também
não serve, porque o problema das colisões não estaria totalmente solucionado; colisões estatal-
sociais restariam possíveis, caso a maioria parlamentar tivesse tal projeto; o social teria diante do
liberal pouca força; e as colisões estatal sociais só não teriam lugar caso o legislador renunciasse
completamente à atividade social. A principal razão para se rejeitar a eliminação da justiciabilidade
está na possibilidade da eliminação do direito constitucional. Se algumas normas não são levadas a
sério é difícil fundamentar porque outras normas devem ser levadas. Haveria, aqui, uma ameaça de
dissolução da constituição. ALEXY, op. cit., p. 73-74.
60
princípios
166
, a solução para os conflitos que os evolvem pode ser a
ponderação
167
.
A finalidade de uma ponderação em direitos fundamentais é, então, averiguar
entre os interesses de caráter superior aquele que tem preferência na situação de
conflito. A crítica a essa “opção” pelos conflitos envolvendo direitos fundamentais
para justificar as restrições estaria na necessidade de resolvê-los mediante a
ponderação, que estabeleceria uma preferência, sem estabelecer regras sobre a
utilização da argumentação e pelo princípio da proporcionalidade
168
.
A ponderação será novamente tratada no próximo capítulo (item 3.3.2.3),
como subprincípio do princípio da proporcionalidade, ou seja, um dos limites dos
limites.
166
Pela definição da teoria dos princípios, estes são normas que ordenam que algo seja realizado em
uma medida tão ampla quando possível. Eles seriam mandamentos de otimização, ou seja, podem
ser preenchidos em graus distintos, sendo que a medida depende das possibilidades fáticas e
jurídicas (estas são determinadas por regras e princípios opostos). Esse preenchimento em graus
leva ao procedimento da ponderação para a solução da colisão de princípios. Escreve: “Um é do tipo
teórico-normativo, o outro, metodológico. Quem efetua ponderação no direito pressupõe que as
normas, entre as quais é ponderado, têm a estrutura de princípios e quem classifica as normas como
princípios deve chegar a ponderações. A discussão sobre a teoria dos princípios é, com isso,
essencialmente, uma discussão sobre a ponderação”. Já as regras são normas que ou são cumpridas
ou não cumpridas. Se ela valw, é ordenado que se faça aquilo que ela pede. As regras são
mandamentos definitivos e a forma de aplicação é a subsunção. ALEXY, 1999, p. 74-75.
167
Luis Prieto Sanchís (2003, p. 216) associa a necessidade da ponderação a determinadas
concepções acerca do papel da Constituição e que se ligam à discussão das concepções sobre o
neo-constitucionalismo. Segundo ele, (...) el juicio de ponderación puede verse como una pieza
esencial del neoconstitucionalismo, de un modelo de organización política que quiere representar un
perfeccionamiento de Estado de Derecho, dado que si es un postulado de este último el sometimiento
alcance también al legislador; y no sólo por la vía del recurso abstracto contra leyes, sino, sobre todo,
convirtiendo los principios y derechos constitucionales en parámetros de enjuiciamiento
independientes para resolver cualquier género de conflicto”.
168
GAVARA DE CARA, 1994, p. 283-285.
61
3 LIMITES DOS LIMITES
3.1 SOBRE OS “LIMITES DOS LIMITES” AOS DIREITOS FUNDAMENTAIS
Os limites e restrições, considerados os direitos fundamentais como regras e
princípios e um suporte fático amplo, são possíveis e necessários. Por outro lado, os
direitos fundamentais o podem ficar à disposição do legislador ou julgador, sob
pena de perderem seu significado. Para tanto, há limites para as restrições ou
limitações. Com isso, pretende-se diluir aquela contradição aparente apontada em
algumas passagens do capítulo anterior. A atividade de desenvolvimento dos
direitos fundamentais, portanto, está sujeita a limitações: são os “limites dos limites”.
Dimitri Dimoulis e Leonardo Martins alertam para a necessidade de tais limites
e escrevem:
se afirmou acima que a possibilidade de limitar um direito fundamental
mediante intervenções não é ilimitada. Se fosse reservado ao legislador o
poder de concretizar as reservas legais conforme seu entendimento e
avaliação política, os direitos fundamentais abstratamente garantidos
poderiam perder qualquer significado prático. A garantia constitucional
restaria, em última instância, inócua, abandonando-se, na prática, o
princípio da supremacia constitucional.
169
Além disso, a admissão da restringibilidade dos direitos fundamentais traria
um paradoxo. Isso porque se a constitucionalização dos direitos visa fazê-los atuar
como mecanismo de contenção do poder estatal, a noção de que podem ser
limitados implica uma contradição. Isso, então, é resolvido com a idéia de que a
atividade limitador também é limitada. Daí os “limites dos limites”, expressão da
dogmática germânica, que seriam obstáculos normativos que restringem a
possibilidade de o poder público limitar os direitos fundamentais
170
171
.
169
DIMOULIS; MARTINS, 2008, p. 167.
170
Cf. PEREIRA, 2006, p. 297 et. seq.
171
Como afirma Ingácio de Otto y Pardo (1988, p. 126-127), os limites dos limites existem porque se
assim não fosse, os direitos fundamentais não teriam nenhuma resistência frente aos demais bens
constitucionalmente protegidos. Ocorre que por conta do princípio da unidade da Constituição, não é
lógico supor que um direito afirme-se contraditoriamente frente a outros bens constitucionalmente
protegidos e daí a necessidade de admitir seu caráter limitável. Porém, necessidade de uma
concordância entre todas as normas, no sentido de que nenhum direito pode ser sacrificado
62
Segundo Jorge Reis Novais, as restrições, qualquer que seja o tipo, têm que
preencher os requisitos constitucionais, formais e materiais, “(...) os chamados,
recorrendo à terminologia germânica, limites aos limites dos direitos fundamentais”
172
. Como indica José Joaquim Gomes Canotilho, “Depois de determinado o âmbito
de protecção e averiguada a existência de uma autêntica restrição através de lei,
cumpre verificar se a lei restritiva preenche os requisitos constitucionais fixados”
173
.
Por previsão expressa da Constituição de Portugal, segundo o autor
português, as restrições
(...) não podem violar os princípios da necessidade ou indispensabilidade,
da generalidade e da abstracção e têm que observar as garantias da não
retroactividade, da não diminuição da extensão e do alcance do conteúdo
essencial dos preceitos constitucionais e da reserva de lei parlamentar
174
.
De toda sorte, consoante ele, esse princípios e garantias, mesmo que a Constituição
não previsse nada, pelo fato de se tratar de requisitos decorrentes do princípio da
repartição própria do Estado de direito, seriam obrigatórios
175
.
O ordenamento alemão, como o português, expressamente, também trata da
questão. Na Alemanha, a previsão está contida no artigo 19, da Constituição, que
traria, por conta da redação, várias idéias gerais:
a) a possibilidade de limitações;
b) a necessidade de lei (ou em virtude de lei);
c) o legislador teria a competência geral;
d) prévia habilitação constitucional;
e) necessidade de se citar o direito fundamental;
f) resguardo do conteúdo essencial.
inteiramente. Nesse contexto, os limites dos limites inserem-se como necessidade de justificação,
porque uma limitação que desconheça o direito por definição nunca poderá ser justificada
172
NOVAIS, 2003, p. 727.
173
CANOTILHO, 2003, p. 451.
174
NOVAIS, loc. cit. No mesmo sentido, observa Edilsom Pereira de Farias (1996, p. 77). Para ele,
com base no art. 18, n.º 02 e 03, da Constituição Portuguesa de 1976, as restrições ou limites às
restrições seriam: a- a restrição tem que ser autorizada pela Constituição; b- deve limitar-se ao
necessário para salvaguardar outros direitos, ou seja, trata-se de máxima da proporcionalidade ou
princípio da proibição do excesso, que seriam a limitação feita por lei ou com base na lei, adequada
(apropriada), necessária (exigível) e proporcional (com justa medida); c- as leis têm de se revestir de
um caráter geral e abstrato, ou seja, não podem ser individuais e concretas; d- não podem ter efeitos
retroativos; e e- não podem diminuir a extensão e o alcance do núcleo essencial.
175
Cf. NOVAIS, loc. cit.
63
Em Portugal, conforme disciplina do artigo 18, da Constituição portuguesa de 1976,
além dos requisitos contidos no ordenamento alemão, as restrições devem limitar-se
ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente
protegidos e não podem ter efeitos retroativos
176
. Na Espanha, não haveria regra
específica
177
, embora o artigo 53.1 da Constituição fale em regulação, mediante lei e
conteúdo essencial.
No Brasil, embora não haja regramento específico, as restrições também
estão sujeitas a limites formais e materiais. É o que observa Luiz Fernando Calil de
Freitas, para quem
(...) ainda que não expressa em nossa Constituição qualquer normatização
acerca dos limites a serem observados na limitação e restrição aos direitos
fundamentais, a respectiva necessidade é decorrência implícita da norma
constante no caput do artigo da Constituição da República, segundo a
qual República Federal do Brasil é um Estado Democrático de Direito
178
.
No mesmo sentido, escreve Jane Reis Gonçalves Pereira, segundo a qual
Na ordem constitucional brasileira não existe referência expressa ao regime
jurídico das restrições fundamentais. Não obstante, tais garantias defluem
do caráter supremo e vinculante das disposições de direito fundamental e
do princípio do Estado de Direito, uma vez que consubstanciam exigências
fundamentais a proteção dos direitos e liberdade constitucionais
179
.
Esses limites passam pela discussão do princípio da reserva de lei restritiva,
pelo princípio da proporcionalidade e pelo dever de proteção do conteúdo
essencial
180
.
176
Cf. LUQUE, 1993, p. 14.
177
Segundo Luis Aguiar de Luque (op. cit., p. 15-16), a Constituição espanhola seria menos clara e
sistemática que aquelas duas, o que daria mais possibilidade para o estabelecimento de limites aos
direitos fundamentais. Entretanto, este autor vai apresentar como limites dos limites os mais
consagrados, ou seja, também na Espanha há necessidade de observância dos limites dos limites.
178
FREITAS, 2007, p. 186.
179
PEREIRA, 2006, p. 300-301.
180
Os autores apontam outros limites, além dos três abordados. Segundo Luis Fernando Calil de
Freitas (op. cit., p. 213-223) as restrições seriam inconstitucionais caso desrespeitem o dever de
razoabilidade, o princípio do o-retrocesso social e, por fim, a dignidade humana. Jorge Reis Novais
(2003, p. 729 et. seq.) fala em princípio da proibição de excesso (que inclui: princípio da idoneidade
ou da aptidão; princípio da indispensabilidade ou do meio menos restritivo; princípio da razoabilidade;
princípio da determinabilidade - na dimensão de proibição do excesso; além da garantia do conteúdo
essencial e do princípio da proporcionalidade); princípio da igualdade (que inclui: exigência de
generalidade e abstração das leis restritivas); princípio da proteção da confiança (que inclui proibição
de retroatividade das leis restritivas). José Carlos Vieira de Andrade (2004, p. 312 et. seq.) afirma que
a lei restritiva deve ser geral, abstrata e irretroativa, em regra. Ainda, apesar de não haver referência
expressa na Constituição Portuguesa, a lei restritiva, por conta da função da reserva de lei formal,
64
3.2 A RESERVA DE LEI RESTRITIVA
A reserva de lei para as restrições aos direitos fundamentais estaria
fundamentada nos artigos 5º, II, 62, II, “a”, 68, §1º, II, da CF/88, além do princípio do
Estado Democrático de Direito e da conseqüência gica por conta da necessidade
dos direitos expressamente sujeitos à reserva de lei
181
.
A reserva da lei seria norma limitadora das possibilidades de limites e
restrições aos direitos fundamentais
182
.
Hoje, seria aceita a idéia de que os direitos fundamentais somente podem ser
restringidos por meio de lei em sentido formal, sejam restrições expressamente
autorizadas, sejam restrições autorizadas implicitamente
183
. A lei formal seria
sempre aquela proveniente dos órgãos dotados, pelo Constituinte, de atribuição
legiferante. Chega-se a denominar isso de princípios da “reserva de lei restritiva”
184
.
deve ter uma densidade suficiente, ou seja, um certo grau de determinação do seu conteúdo. Ingo
Wolfgang Sarlet (2007, p. 440-467) fala também de um princípio da proibição de retrocesso, em
especial no que se refere aos direitos fundamentais sociais. Dentre outros. Neste trabalho, entretanto,
não serão tratados todos os limites apontados pela doutrina, porque referem-se a particularidades
das Constituições respectivas, porque não são tratados por todos os autores, como ocorre com os
três limites abordados e porque não afetarão na análise das quatro hipóteses decididas pelo Tribunal
Superior do Trabalho e na conclusão do trabalho.
181
Cf. FREITAS, 2007, p. 187 e PEREIRA, 2006, p. 305.
182
Cf. FREITAS, loc. cit.
183
Veja-se que, mesmo quando se adota a teoria dos limites imanentes, o princípio da reserva legal é
apontado como necessário, como questão inerente aos “limites dos limites imanentes”. Como afirma
Mariano Bacigalupo (1993, p. 312), questiona-se quanto aos “limites imanentes”, se eles delimitam ou
traçam a extensão do âmbito de proteção do direito fundamental ou se, pelo contrário, limitam
verdadeiramente o campo de garantia do direito. A resposta tem importância porque leva a
necessidade ou não da reserva de lei genérica. Como escreve o autor, “Si se sostiene que los ´límites
inmanentes´ tan sólo trazan la extensión del ámbito de protección del derecho, no podrá operar la
reserva de ley para la limitación del mismo y lo deberá haber si se afirma lo contrario”. A
formulação dessa conclusão teria sentido antes. O autor observa, contudo, que ela perdeu a
importância a partir do momento que o Tribunal Constitucional Alemão passou a adotar a teoria da
essencialidade. Ocorre que, atualmente, independentemente dos limites imanentes traçarem apenas
a extensão do âmbito de proteção do direito ou de que o limitem, a reserva de lei genérica deverá
operar em todo caso. Isso porque seria essencial para a realização dos direitos fundamentais tanto o
traçado da extensão do seu campo de garantia como sua limitação. Para o autor, então, se é assim, a
distinção entre os direitos fundamentais que estão submetidos a reserva de limitação legal e aqueles
outros que não estão, seria reduzida ao fato, já que em todo caso somente o legislador pode limitá-lo,
de que os primeiros são para salvaguardar bens ou valores que não tenham caráter constitucional e
os segundos quando o bem ou valores tenha caráter constitucional.
184
PEREIRA, 2006, p. 302-303. Segundo observa Clèmerson Merlin Clève (2000, p. 67-70),
atualmente, o direito constitucional admite o exercício de parte da função legislativa pelo Executivo.
Assim, segundo o critério formal, a lei não é apenas aquela editada pelo Poder Legislativo. No atual
65
Com indica Guilherme Peña de Moraes, as restrições sempre dependem de
uma reserva legal expressa ou devem estar baseadas numa lei, no sentido de que,
na hipótese de colisão, quando reserva legal expressa, deve ser feita a restrição
por lei, pois “(...) a determinação do alcance material dos direitos em conflito deve
ser realizada pelo legislador infraconstitucional, de acordo com os limites, explícitos
ou implícitos, contidos na Constituição”. E, na hipótese de colisão, sem reserva legal
expressa, a restrição deveria ser feita com base numa lei, ou seja, “(...) a
determinação do alcance material dos direitos em conflito deve ser estabelecida pelo
intérprete, com atenção aos, dentre outros, princípios da unidade da Constituição, de
concordância prática e da razoabilidade”
185
.
Observe-se que, para Luiz Fernando Calil de Freitas, não é suficiente que se
trate de lei, “(...) é preciso que a lei seja clara, geral e abstrata, voltada à produção
de efeitos no futuro, (...)”
186
. Nesse contexto, a restrição legislativa somente será
válida se for clara, determinada, geral e abstrata, sendo que tais exigências ligam-se
ao Estado Democrático de Direito.
Gilmar Ferreira Mendes fala em limitações implícitas para apresentar a
proibição de leis restritivas de conteúdo casuístico ou discriminatório. Isso quer dizer
que as restrições devem ser estabelecidas por lei que atendam aos requisitos da
generalidade e da abstração. Essas exigências derivariam do postulado material da
contexto, todo ato emanado dos órgãos aos quais a Constituição atribua função legislativa, se
praticado no uso dessa competência, será lei, ou seja, o critério é a origem e a forma determinados.
Escreve: A lei, portanto, no Estado contemporâneo, é definida pela sua origem (alargada), forma e
força. Não mais pelo seu conteúdo ou em virtude de seus atributos (generalidade, abstração,
impessoalidade)”. A Constituição brasileira continua o autor, adotaria um conceito material de lei,
significando ato, em geral normativo, capaz de inovar a ordem jurídica (ato legislativo), ou seja, com o
sentido de ato dotado de força de lei. No Brasil, fora a emenda constitucional, todas as espécies
elencadas no art. 59 da Constituição Federal são lei. “Quanto às demais espécies normativas, são lei,
enquanto emanações de órgãos dotados de competência legislativa (atos legislativos). Algumas são
lei material, orgânica e formalmente. Outras assumem apenas uma ou duas dessas características.
Mas todas são lei. Como se pode perceber, o conceito de lei vem sofrendo profundo processo de
mutação”. Por outro lado, se todas essas espécies são atos legislativos, conforme convencionou-se,
apenas a lei complementar e a ordinária são leis formais. O autor escreve: Trata-se de estabelecer,
em virtude de convenção firmada pelos juristas, a distinção entre lei (ato legislativo) gênero e lei
formal (ato legislativo) – espécie. Ora, a lei formal (emanação do Poder Legislativo, detento da função
legislativa ordinária), que exprime no contexto democrático pluralista um processo público geral (já
que dele participa a generalidade dos sujeitos políticos), não é outra coisa senão o modo como se
coordena o maior número de interesses particulares”. Assim, “(...) a lei formal é espécie de ato
legislativo definida pela origem (ato do Congresso Nacional), pela forma (forma de lei complementar
ou ordinária), pelo procedimento (devido processo legislativo: ato público em que o debate prece a
vigência), pela força (força ativa e passiva de lei), assim como pela natureza (ato complexo)”.
185
MORAES, 2000, p. 66.
186
FREITAS, 2007, p. 189.
66
igualdade, que veda o tratamento discriminatório ou arbitrário e traduz uma
exigência do Estado de Direito democrático
187
.
Segundo José Joaquim Gomes Canotilho, uma lei restritiva seria
inconstitucional quando:
a) impor restrições aos direitos, liberdades e garantias de uma pessoa ou de
várias pessoas determinadas;
b) impor restrições a uma pessoa ou a um círculo de pessoas que, ainda que
não determinadas, podem ser determináveis por intermédio da
conformação intrínseca da lei e tendo em conta o momento de sua entrada
em vigor.
Observe-se que o critério não é a formulação ou o enunciado da lei, mas o seu
conteúdo e respectivos efeitos
188
.
A maior controvérsia, nesse campo, fica por conta da possibilidade da
Administração Pública editar medidas restritivas.
Para Jane Reis Gonçalves Pereira, o princípio da reserva legal significa a
impossibilidade de a Administração Pública adotar medidas restritivas de direitos
fundamentais sem fundamental legal ou Constitucional. No Brasil, não um
conjunto de preceitos regulamentando a questão das limitações, contudo, o art. 5º,
II, da CF/88, estampa, de forma genérica, o princípio da legalidade na sua dimensão
de reserva de lei. Além disso, a exigência de lei formal pode ser extraída, em matéria
de direitos fundamentais, de outros dispositivos, como art. 62, II, que veda a edição
de medidas provisórias em matérias de nacionalidade, cidadania e direitos políticos
e o artigo 68, §1º, II, que proíbe a delegação em matérias de nacionalidade, direitos
políticos, direitos individuais e eleitorais. Por fim, a reserva de lei seria uma
conseqüência lógica por conta da necessidade do direitos expressamente sujeitos à
reserva de lei. Se isso é aplicável quando autorização expressa, também deve
ser naquelas implícitas
189
. Para ela, a noção da reserva legal, então, tem duas
conseqüências:
187
MENDES, 2004, p. 73-74.
188
CANOTILHO, 2003, p. 455.
189
PEREIRA, 2006, p. 305.
67
a) a impossibilidade de se estabelecerem delegações normativas nessa área;
b) a impossibilidade de a lei conferir ao Administrador o poder de decidir,
discricionariamente, acerca das restrições concretas a direitos
fundamentais
190
.
Ressalte-se que, a mesma autora afirma que esse princípio deve ser
matizado, por conta de atos tipicamente discricionários e da crise da repartição de
funções. Isso implica no fato de que não é possível uma resposta apodíctica
191
.
Da mesma forma, Dimitri Dimoulis e Leonardo Martins defendem que a lei
deve ser aquela editada pelo Parlamento, a lei formal. Estes autores, entretanto,
admitem que o legislativo delegue ao executivo algumas tarefas, por conta do art. 68
da Constituição Federal de 1988
192
.
Para Jorge Reis Novais, a reserva de lei deve ser admitida num sentido
amplo, ou seja, haveria casos em que a “lei administrativa” deveria ser admitida.
Segundo o autor, por conta das transformações estruturais do Estado
contemporâneo, haveria necessidade da “lei administrativa”. Isso porque, a reserva
de lei “anterior”, ou seja, do parlamento, seria estruturalmente incompatível na
atualidade.. Isso porque, “(...) na passagem do Estado liberal para o Estado social e
democrático de Direito, se alteraram as concepções relativas ao âmbito de liberdade
individual constitucionalmente protegida (...)”. Teria havido um alargamento espacial
e funcional da reserva de lei clássica. Além disso, a separação de poderes, originária
do dualismo/rivalidade entre Parlamento e Executivo também teria sido
relativizada
193
.
Considerando o princípio da reserva de lei, continua Jorge Reis Novais, cabe
ao legislador parlamentar antecipar as colisões envolvendo direitos fundamentais e
resolvê-los normativamente. Há, todavia, outras situações que estes requisitos não
foram, não podem ou não devem ser integralmente preenchidos. Nestes casos, pode
ser que uma solução constitucionalmente adequada tem ou deve ser encontrada
pelos poderes constituídos. É certo que, com o tempo, o legislador democrático
preencha as lacunas, mas restasempre alguma margem irredutível. Ou seja, não
é pelo fato de inexistir uma lei restritiva que a colisão de bens não tem de ser
190
PEREIRA, 2006, p. 306.
191
Ibid., p. 307.
192
DIMOULIS; MARTINS, 2008, p. 161-162.
193
NOVAIS, 2003, p. 823 et. seq.
68
resolvida. Segundo o autor, o apego formalista a uma concepção rígida da reserva
de lei poderá conduzir à impossibilidade de decisão constitucionalmente
adequada
194
.
Para tentar resolver essa questão, nesse campo, ainda, fala-se numa teoria
da essencialidade. Conforme observa Juan Carlos Gavara de Cara, para determinar
o alcance de uma lei, na utilização de uma reserva de lei, o Tribunal Constitucional
alemão elaborou a teoria da essencialidade. Segundo essa teoria, o Parlamento
deve adotar, em todos os âmbitos e no âmbito dos direitos fundamentais, as
decisões básicas, importantes ou essenciais. Isso quer dizer que o Parlamento não
precisa adotar todas as decisões de uma maneira completa no desenvolvimento
normativo do direito fundamental, de tal modo que exclua o desenvolvimento por
parte do Executivo. Assim, caberia ao Legislativo as decisões básicas mediante lei e
ao Executivo a adoção das decisões não básicas mediante regulamento
195
.
Nesse contexto, como observa Luis Fernando Calil de Freitas, a
administração poderá atuar no âmbito de direitos fundamentais para resolver
conflitos entre normas constitucionais, nos casos concretos. O que não se pode
admitir, contudo, é a atuação do administrador restringindo direitos fundamentais de
forma genérica, abstrata e impessoal. O autor escreve:
Destarte, a prática de atos que importe afetação desvantajosa de direitos
fundamentais sem expressa ou implícita autorização constitucional e legal
fica impossibilitada, sem embargo de poder à Administração Pública, para
194
NOVAIS, 2003, p. 841-842.
195
Segundo o mesmo autor, para o Tribunal em questão, as fórmulas originárias sobre a reserva de
lei, baseadas na liberdade e propriedade devem ser abandonadas, devendo ser fixado um novo
fundamento, com um caráter democrático e com base no princípio do Estado de Direito. Nesse
contexto, a reserva de lei do Parlamento deve ser delimitada a decisões do essencial. Segundo o
Tribunal, ainda, o conceito do que seja essencial não pode ser uniforme e fixo e dependerá daquele
que o próprio Parlamento determinar. Nesse contexto, a possibilidade de adoção de decisões por
parte do executivo no âmbito de reserva de lei em matéria de direitos fundamentais dependerá de
uma autorização legal, da compatibilidade constitucional e que o Legislativo já tenha adotada a
decisão básica essencial. Os critérios para a compatibilidade dessa autorização seriam: as medidas
adotadas frente aos perigos e problemas que se trata de solucionar; da importância do bem jurídico
constitucional que se trata de proteger; e dos mecanismos de regulação adotados no passado em
relação ao mesmo problema. Embora haja tais critérios, dificuldade em determinado o que é
essencial, tendendo a doutrina a definir como aquilo que o Tribunal diz que é e o Tribunal a dizer que
é aquilo que o Parlamento considera. Essa teoria sofre algumas objeções: a- representaria uma nova
definição da relação entre a competência de intervenção em um direito fundamental e a obrigação de
intervenção por parte do Poder Legislativo; b- haveria uma certa variação na relação entre reserva de
lei geral e reserva de lei em matéria de direitos fundamentais. A primeira admite certos graus de
relatividade e a segunda exigia uma estrita lei formal que se estendia à regulação de todos os
aspectos de desenvolvimento do direito. Com a teoria da essencialidade, a reserva de lei em matéria
de direitos fundamentais não seria entendida de forma distinta; c- fazem-se necessárias novas
relações entre lei e regulamento. Ibid., p. 154-158.
69
solucionar casos concretos afetos às suas atribuições, ter acesso direto às
normas constitucionais se e quando ocorrentes colisões de direitos
fundamentais. Em tais situações, a mesma autorização implícita à lei
restritiva, possibilita o ato administrativo que veicula ponderação dos bens
em conflito de molde a concretizar as normas constitucionais aplicáveis à
espécie. O que não se admite como possível é a atuação do
administrador com foros de restrição genérica, abstrata e impessoal, eis que
tanto somente a lei pode chegar em decorrência do princípio da legalidade.
Nesse sentido, o recurso legislativo ao uso de cláusulas gerais e conceitos
jurídicos indeterminados possibilita à Administração concretizar a norma a
partir de ponderações efetivadas com base nas circunstâncias do caso
concreto. Tais atos administrativos, por certo, submetem-se ao controle
judicial feito a partir do princípio da proporcionalidade
196
.
Com isso, o autor quer dizer que, num caso concreto, mesmo inexistindo
previsão expressa legislativa, o poder público pode usar o poder de polícia para
proibir que uma casa noturna realize, por exemplo, um espetáculo. O que não se
admite é a normatização, por ato que não seja lei em sentido formal, visando
salvaguardar outros bens constitucionais. Isso cabe, somente, ao Legislativo
197
.
Além disso, como indica Jane Reis Gonçalves Pereira, o controle de
constitucionalidade, intenso nos casos em que as reservas legais são implícitas,
será mais intenso ainda na atuação do Poder Executivo. A autora escreve:
De fato, o poder de conformação do legislador manifesta-se de modo
particularmente claro no caso das reservas legais expressas. Mas ainda nos
casos em que os direitos não ostentam reservas explícitas, um espaço
de decisão no qual o legislador pode efetivar ponderações, havendo certa
margem de manobra para coordenar a proteção dos direitos individuais e a
promoção de metas coletivas. quando se trata de aferir a legitimidade
constitucional da atuação do Poder Executivo, essa noção não é aplicável,
cabendo um controle mais intenso por parte do Judiciário
198
.
Resumindo, a restrição ou limitação aos direitos fundamentais, em regra, por
conta de um princípio da reserva de lei restritiva, significa a reserva de lei do
parlamento, ou seja, a lei em sentido formal e material (abstrata e geral). Em
qualquer outra situação, por conta da necessidade de uma relativização desse
princípio, o controle por parte do Poder Judiciário deverá ser potencializado.
196
FREITAS, 2007, p. 188. No mesmo sentido, PEREIRA, 2006, p. 308-309.
197
FREITAS, loc. cit. É o que consta na nota de n.º 691: “Figure-se aqui a hipótese de que casa
noturna realize espetáculos que, de alguma forma, exponham pessoas a situações ofensivas à
dignidade humana. A inexistência de expressa previsão legislativa em tal sentido, a nosso juízo, o
obsta de forma absoluta a que o poder público, no exercício do poder de polícia, pratique ato
administrativo tendente a fazer cessar tal atividade. O que não seria admissível é a normatização, por
ato que não seja lei em sentido formal, de tais comportamentos: tal tarefa, por certo restritiva de
direitos fundamentais, ainda que visando à proteção de outros ou de bens constitucionalmente
protegidos, incumbe ao Poder Legislativo”.
198
PEREIRA, op. cit., p. 310.
70
Tratando-se de direitos fundamentais, toda uma dogmática especial, não
podendo tais direitos ficarem à disposição da Administração Pública ou do Judiciário.
No presente trabalho, será demonstrado, por exemplo, que a Súmula 85 do
Tribunal do Trabalho cria” uma restrição ao direito fundamental, desrespeitando o
princípio da reserva legal de lei restritiva, ao admitir que, em determinadas
hipóteses, de forma geral e abstrata, as horas extras prestadas sejam remuneradas
apenas com o adicional e não com a hora cheia, mais o adicional. No máximo, o
Tribunal poderia, no caso concreto, resolver conflitos envolvendo direitos
fundamentais
199
.
3.3 PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE
3.3.1 Questões preliminares e fundamento
O princípio da proporcionalidade também é um dos limites dos limites dos
direitos fundamentais e é referido por todos os autores que tratam da matéria.
Embora haja referência maciça, não muito consenso. Os autores discutem sobre
199
Observe-se que toda vez que houver referência ao princípio da reserva legal, pode-se argumentar
que ele estaria bastante relativizado. Neste caso, a edição de súmulas não seria tão grave.
Entretanto, a questão não tem sido tratada dessa forma. Por exemplo, a recente discussão sobre a
base de lculo do adicional de insalubridade. Segundo o artigo 7º, inciso XXIII, é devido o
pagamento do adicional de remuneração para as atividades consideradas insalubres. Até pouco
tempo, o Tribunal Superior do Trabalho entendia que o adicional de insalubridade incidiria sobre o
salário mínimo, conforme entendimento contido na Súmula 228, ou seja, considerava constitucional a
redação do artigo 192, da CLT. Entretanto, ambos, Súmula e artigo celetista, em razão do artigo 7º,
inciso IV, da CF/88 e da Súmula Vinculante do Supremo Tribunal Federal, de 04/05/2008, foram
considerados inconstitucionais. Então, o Tribunal Superior do Trabalho modificou a Súmula 228, em
junho de 2008, afirmando que o adicional deveria incidir sobre o salário base ou contratual, ou seja,
sobre todas as verbas salariais, salvo se houver critério mais vantajoso fixado por meio de convenção
coletiva. Contudo, após a interposição de uma Reclamação Constitucional (n.º 6266) pela
Confederação Nacional da Indústria, a Súmula 228/TST, alterada, teve sua aplicação suspensa,
porque não haveria lei permitindo a referida interpretação, ou seja, não haveria lei permitindo a
incidência do adicional de insalubridade sobre todo o salário base. Segundo o Ministro Gilmar
Mendes, presidente do Supremo Tribunal Federal, a nova redação estabelecida para a Súmula
228/TST revela aplicação indevida da Súmula Vinculante 4, porquanto não permitiria a substituição
do salário mínimo pelo salário básico no cálculo do adicional de insalubridade sem base normativa.
Resumindo, a interpretação está suspensa e, agora/novamente, as empresas podem continuar
aplicando no cálculo do adicional de insalubridade as mesmas bases que vinham praticando, dentre
as quais o salário mínimo. Com tudo isso, demonstra-se que o princípio da reserva legal ainda tem
sua aplicação garantida. Cf. FEIJÓ, 2008. FEIJÓ; TEIXEIRA, 2009. FEIJÓ, 2009.
71
sua origem, terminologia, fundamentos e sobre seus subprincípios: adequação,
necessidade e proporcionalidade em sentido estrito.
A questão terminológica apresenta dois problemas. O primeiro refere-se à
referência “princípio”, no sentido de se saber se se trata de um princípio
propriamente dito.
Segundo Virgilio Afonso da Silva, a utilização do termo princípio pode ser
errônea, especialmente quando se adota o conceito de princípio em contraposição
ao conceito de regra jurídica. O alerta tem fundamento no fato de que o princípio da
proporcionalidade não pode ser considerado um princípio, uma vez que não pode
produzir efeitos variados, que deve ser aplicado de forma constante. Nesse
contexto, o autor prefere o termo regra, utilizando regra da proporcionalidade
200
.
Esse alerta é feito, também, por Robert Alexy, por isso prefere xima da
proporcionalidade:
A máxima da proporcionalidade é com freqüência denominada ´princípio da
proporcionalidade´. Nesse caso, no entanto, não se trata de um princípio no
sentido aqui empregado. A adequação, a necessidade e a
proporcionalidade em sentido estrito não são sopesadas contra algo. Não
se pode dizer que elas às vezes tenham precedência, e às vezes não. O
que se indaga é, na verdade, se as máximas parciais foram satisfeitas ou
não, e sua não-satisfação tem como conseqüência uma ilegalidade. As três
máximas parciais devem ser, portanto, consideradas como regras
201
.
Humberto Ávila, por sua vez, utiliza o termo dever, referindo-se a dever de
proporcionalidade. Segundo este autor, o dever de proporcionalidade não é uma
norma-princípio e não é uma norma-regra. O dever de proporcionalidade seria um
postulado
202
. Virgilio Afonso da Silva não concorda com o termo “dever”, embora não
seja equivocado, porque
O termo é, sem dúvida, correto, mas limita-se a contornar o problema e não
resolve. Se se fala em dever, fala-se em norma. Normas são ou regras, ou
200
SILVA, 2002, p. 25.
201
ALEXY, 2008, p. 117, nota 08.
202
Para Humberto Ávila (2001, p. 23-25), o dever de proporcionalidade não é princípio pelas mesmas
razões expostas no texto e não é regra porque não estabelece um conteúdo à conduta humana ou à
aplicação de outras normas. Segundo ele, “O dever de proporcionalidade consiste num postulado
normativo aplicativo”, porque “(...) impõe uma condição formal ou estrutural de conhecimento concreto
(aplicação) de outras normas. Não consiste numa condição no sentido de que, sem ela, a aplicação
do Direito seria impossível. Consiste numa condição normativa, isto é, instituída pelo próprio Direto
para a sua devida aplicação. Sem obediência ao dever de proporcionalidade não há a devida
realização integral dos bens juridicamente resguardados. É dizer: ele traduz um postulado normativo
aplicativo como aqui se estipula”.
72
princípios. Como foi visto, no que diz respeito à sua estrutura, o dever de
proporcionalidade não é um princípio, mas um regra. O termo mais
apropriado, então, é regra da proporcionalidade (...)
203
.
Por outro lado, o termo “princípio” também é usado para dar uma conotação
especial, visando conferir importância a um conceito, ou seja, não como
contrapostos ao conceito de regra
204
.
Como não nenhum óbice nesse sentido, desde que o se confunda com
a distinção feita no item 2.1 desta dissertação e até porque a maioria dos autores faz
referência ao princípio, a terminologia que aqui será utilizada será princípio da
proporcionalidade e subprincípios.
Outra questão quanto à terminologia, refere-se à utilização do princípio da
proporcionalidade como sinônimo do princípio da razoabilidade. Essa questão é
mais problemática e poderia levar à sua utilização como mero instrumento retórico.
Como observa Jane Reis Gonçalves Pereira, a possibilidade de tratar ou não
os princípios da razoabilidade e proporcionalidade como sinônimos é controvertida.
De acordo com ela, o único consenso seria que ambos estão vinculados à idéia de
justiça, de moderação e racionalidade, sendo parâmetros para aferição da
constitucionalidade de atos administrativos, decisões judiciais e leis
205
.
Na doutrina brasileira, inclusive, haveria grande tendência em considerar a
razoabilidade e a proporcionalidade como categorias intercambiáveis, inclusive as
decisões do Supremo Tribunal Federal não estabeleceriam distinção entre os dois
princípios
206
.
Nesse grupo, enquadra-se Luis Roberto Barroso, que se refere ao princípio
da razoabilidade. O princípio da razoabilidade (que, em linha gerais, manteria
relação de fungibilidade com o princípio da proporcionalidade) teria a origem e o
desenvolvimento ligados à garantia do devido processo legal material, o que
remeteria ao direito norte-americano. Na Europa continental e no Brasil, conforme o
autor, a referência é ao princípio da proporcionalidade
207
.
203
SILVA, 2002, p. 26.
204
Ibid.
205
PEREIRA, 2006, p. 312.
206
Ibid., p. 314.
207
Segundo o autor, no direito norte-americano, o princípio do devido processo legal é marcado por
duas grandes fases: uma estritamente processual e outra de cunho substantivo. Ao lado do princípio
da igualdade perante a lei, a versão substantiva tornou-se um importante instrumento da defesa dos
direitos individuais. Por essa versão, procede-se ao exame da razoabilidade e da racionalidade das
normas jurídicas e dos atos do Poder Público em geral, no sentido de que a cláusula enseja a
73
Para Virgilio Afonso da Silva, o princípio da razoabilidade e o princípio da
proporcionalidade não são a mesma coisa, inclusive a origem não seria a mesma.
Segundo este autor, a regra da proporcionalidade no controle das leis restritivas de
direitos fundamentais surgiu com a jurisprudência do Tribunal Constitucional Alemão
e não é uma simples pauta, no sentido de que os atos estatais devem ser razoáveis.
O princípio da proporcionalidade possui uma estrutura racionalmente definida, com
elementos independentes
208
.
O problema da confusão seria que, como o princípio da razoabilidade
significaria um argumento retórico, no máximo uma análise de compatibilidade entre
meios e fins, a sua utilização é menos criteriosa e não sistemática. A sistematicidade
do princípio da proporcionalidade estaria garantida pela observância dos seus
subprincípios da adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito
209
.
Inclusive, para Dimitri Dimoulis e Leonardo Martins, não há necessidade de se
perquirir sobre um eventual princípio da razoabilidade. De acordo com eles, “O
controle apurado da adequação da medida absorve o controle da razoabilidade.
Uma medida não razoável jamais pode ser considerada adequada, mas muitas
verificação da compatibilidade entre o meio empregado pelo legislador e os fins visados e a aferição
da legitimidade dos fins. Somente se presentes as condições, pode-se admitir a limitação do direito
individual. Naquele país, o reconhecimento da dimensão substantiva teria passado por três fases
distintas e a utilização ou não da dimensão substantiva dependia muito de questões políticas,
conforme utilização por parte da Suprema Corte. O autor observa que, no Brasil, a trajetória do
principio da razoabilidade teria sido acanhada, por conta do apego a certos dogmas da separação de
poderes. Entretanto, ao longo do tempo, houve aplicação, especialmente de forma implícita ou até
inconsciente. A Constituição de 1988, como as outras, não traz referência expressa. Ocorre que, nos
trabalhos da Assembléia Nacional Constituinte, referente à Constituição de 1988, o princípio da
razoabilidade constou, expressamente, de diversos projetos, inclusive o que foi, ao final, aprovado
pela Comissão de Sistematização, no art. 44. A redação final da Constituição de 1988, entretanto,
não faz menção expressa ao princípio, mas traz o art. a cláusula do devido processo legal, no
inciso LIV. Nesse contexto, haveria duas linhas de pensamento. Um primeiro, baseado na tradição
alemã, para quem o princípio integra o direito constitucional brasileiro, devendo ser aplicado em
qualquer caso, porque inerente ao Estado de Direito. Um segundo, baseado na doutrina norte-
americana, extrai o princípio da cláusula do devido processo legal, por conta do caráter substantivo
da cláusula. BARROSO, 1996, p. 125 passim. No mesmo sentido, Suzana de Toledo Barros (2003, p.
71-75), segundo a qual os americanos falam em princípio da razoabilidade e os alemães utilizam o
termo proporcionalidade ou proibição de excesso para designar o mesmo princípio. José Afonso da
Silva (2000, p. 340) também faz referência ao princípio da razoabilidade, fundado na cláusula do
devido processo legal e que põe em destaque a relação meios e fins.
208
Cf. SILVA, 2002, p. 30-31. No mesmo sentido, ÁVILA, 2001, p. 03 passim.
209
SILVA, op. cit., p. 31. No mesmo sentido, STEINMETZ, 2001, p. 192 e PEREIRA, 2006, p. 312 et.
seq. Ricardo Lobo Torres (2002, p. 427 passim), define a razoabilidade de forma semelhante, mas
significativa importância ao princípio que, em conjunto com a ponderação, seria um dos princípios de
legitimação de todos os outros princípios constitucionais, sendo que A legitimação do Estado de
Direito; fundado no contrato social e na liberdade, igualdade e fraternidade, que havia chegado ao
impasse no período de vigência do positivismo jurídico (de meados do séc. XIX a meados do séc.
XX), renova-se sob a perspectiva do séc. XX. A legitimação passa fundar-se no neocontratualismo e
na afirmação procedimental da liberdade, da justiça e da segurança jurídica, o que postula a
intermediação dos princípios formais da ponderação e da razoabilidade, entre outros”.
74
medidas razoáveis podem revelar-se inadequadas para alcançar o propósito
almejado”
210
.
Quanto ao fundamento, no Brasil, como em grande parte dos textos
constitucionais, não há menção expressa ao princípio, mesmo assim, ele é aplicável.
A Constituição Federal de 1988 teria assimilado as tendências do Direito
Constitucional mundial, pós guerra mundial, dando ênfase à dignidade humana,
concebendo-a como princípio fundamental do Estado Brasileiro (art. 1º) e aos
direitos e garantias fundamentais, conferindo-lhes aplicabilidade imediata (art. 5º,
§1º) e expectativa de expansão (at. 5º, §2º)
211
. A Constituição de 1988 também
previu a garantia de eternidade (art. 60, §4º, inc. IV), o princípio da reserva legal (art.
5º, inc. II), o princípio da proteção judiciária (art. 5º, inc. XXXV), instrumentos
processuais tendentes a coibir omissão legislativa (art. 5º, inc. LXXI), ação direta de
inconstitucionalidade por omissão (art. 103, §3º) e explicitou a garantia do devido
processo legal para restrição da liberdade ou da propriedade (art. 5º, inc. LIV). O
princípio da proporcionalidade teria assento justamente nesse contexto normativo.
Ele seria uma garantia especial, que traduziria a exigência da necessidade,
adequação e justa medida, objetivando a máxima eficácia e otimização dos vários
direitos fundamentais concorrentes
212
.
Para Paulo Bonavides, o fundamento para o princípio da proporcionalidade
está no Estado de Direito. Conforme ele, a adoção desse princípio seria a nota mais
distintiva do “novo” Estado de Direito, um Estado de Direito material. Esse princípio
teria a grande capacidade de conciliar o direito formal com o direito material, visando
210
DIMOULIS; MARTINS, 2008, p. 210.
211
Para Dimitri Dimoulis e Leonardo Martins (op. cit., p. 193), a aplicabilidade da proporcionalidade
teria dois argumentos. O primeiro seria o vínculo direto do legislador aos direitos fundamentais, por
conta do art. 5º, §1º, da CF/88. O legislador, por esse vínculo, deve respeitar, ao mesmo tempo,
todos os direitos fundamentais e, em caso de colisão, tem o poder e dever de limitar os direitos
fundamentais na estrita medida do necessário, ou seja, ele deve otimizar o exercício dos direitos
fundamentais. O caminho para tanto é respeitar o critério da proporcionalidade”. O segundo
fundamento possível estaria no art. 5º, §2º, da CF/88, que reconhece garantias e direitos
fundamentais não previstos na Constituição. A proporcionalidade seria decorrência da necessidade
de harmonizar os direitos fundamentais com bens jurídicos conflitantes contemplados pelo texto
constitucional com os seus limites ou entre os direitos fundamentais que colidam por conta do
controle das intervenções legislativas.
212
Cf. BARROS, 2003, p. 95-97. A mesma autora, entretanto, apresenta, também, como fundamentos
do princípio em questão a reserva legal e o Estado de Direito. Segundo ela, o princípio da
proporcionalidade complementaria o princípio da reserva legal (art. 5º, inc. II), de modo a convertê-lo
em princípio da reserva legal proporcional ou devido processo legal substancial. Ocorre que a reserva
legal não é suficiente para evitar a edição de leis excessivas ou desnecessariamente restritivas. Não
ficou ao livre critério do legislador ordinário estabelecer restrições. Por fim, a proporcionalidade seria
um princípio concretizador do Estado de Direito, que sempre buscou meios técnicos para a defesa
dos direitos fundamentais.
75
prover exigências de transformações sociais, que seriam juridicamente
incontroláveis caso não fosse concebido
213
. Para ele, um novo Estado de Direito
decorre da plenitude da constitucionalidade material e o princípio da
proporcionalidade estaria inserido nessa constitucionalidade, sendo o instrumento
mais poderoso de garantia dos direitos fundamentais contra possíveis e eventuais
excessos nos espaços abertos pela Constituição pelas reservas de lei
214
.
Segundo Virgilio Afonso da Silva, essa gama de dispositivos (inclusive aponta
outros mais que seriam indicados por autores) pode até exigir que a atividade
legislativa e executiva seja controlada. Entretanto, não há resposta para a razão de
esse controle ser feito pela aplicação do princípio ou regra da proporcionalidade e
não por outro método. Ocorre que uma fundamentação jurídico-positiva estaria
fadada a ser infrutífera nesse campo
215
.
Humberto Ávila chega a afirmar que a busca por uma fundamentação jurídico-
positiva decorre de uma interpretação e aplicação equivocada do princípio
216
.
A exigibilidade da proporcionalidade para a solução de colisões entre direitos
fundamentais não estaria num dispositivo, mas na estrutura dos direitos
fundamentais
217
.
É o que escreve Robert Alexy:
Afirmar que a natureza dos princípios implica a máxima da
proporcionalidade significa que a proporcionalidade, com suas três máximas
parciais da adequação, da necessidade (mandamento do meio menos
gravoso) e da proporcionalidade em sentido estrito (mandamento do
sopesamento propriamente dito), decorre logicamente da natureza dos
princípios, ou seja, que a proporcionalidade é deduzível dessa natureza
218
.
213
BONAVIDES, 1994, p. 282.
214
Para esse autor, ainda, além de estar fundamentado no Estado de Direito o princípio da
proporcionalidade também é fundamento do Estado do Direito. Ibid., p. 289. Para ele, além disso, o
princípio da proporcionalidade encontra assento em vários dispositivos constitucionais, como incisos
V, X e XXV do art. 5º, IV, V e XXI, do art. 7º, §3º, do art. 36, inciso IX, do art. 37, dentre vários outros.
Por outro lado, na qualidade de princípio constitucional ou princípio geral de direito, que busca evitar
arbítrios do poder, ele estaria implícito e positivo no Direito Constitucional. Por fim, ele também fluiria
do art. 5º, §2º, da CF/88. Id., 2008, p. 434-436.
215
SILVA, 2002, p. 43.
216
ÁVILA, 2001, p. 04.
217
SILVA, op. cit., p. 43-44. Segundo este, “Se se admite que a grande maioria dos direitos
fundamentais são princípios, (...) admite-se que eles são mandamentos de otimização, isto é, normas
que obrigam que algo seja realizado na maior medida possível, de acordo com as possibilidades
fáticas e jurídicas. E a análise da proporcionalidade é justamente a maneira de se aplicar esse dever
de otimização ao caso concreto. É por isso que se diz que a regra da proporcionalidade e o dever de
otimização guardam uma relação de mútua implicação”. No mesmo sentido, ÁVILA, loc. cit.
218
ALEXY, 2008, p. 116-117.
76
A máxima da proporcionalidade seria uma implicação lógica e normativa dos
princípios. Enquanto mandatos de otimização, os princípios exigiriam as máximas da
adequação, da necessidade e da proporcionalidade em sentido estrito, ou seja,
devem ser realizados na melhor medida possível, segundo as possibilidades fáticas
e jurídicas existentes
219
.
3.3.2 Os subprincípios da proporcionalidade
As principiais discussões, aqui, envolvem os subprincípios do princípio da
proporcionalidade, que, normalmente, seriam ignoradas pelos Tribunais
220
.
O princípio da proporcionalidade possui três dimensões
221
, subprincípios ou
princípios parciais adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito
–, que atuam de forma subsidiária, no sentido de que se deve observar a ordem em
que serão examinados, sob pena de não se chegar ao próximo.
A análise da necessidade só será feita se constatada a adequação do meio
utilizado ao fim pretendido. Se a análise do exame da adequação demonstre que o
meio utilizado é inadequado, o princípio da proporcionalidade restará afetado e se
torna desnecessário o exame dos demais subprincípios. Se o meio é adequado,
passa-se à análise da sua necessidade. Se o meio for considerado desnecessário,
ou seja, for considerado exagerado, porque existe um meio menos agressivo e que
219
ALEXY, 2004, p. 38. No mesmo sentido, STEINMETZ, 2001, p. 171. PEREIRA, 2006, p. 322.
Bacigalupo (1993, p. 300), para quem esse princípio decorreria também do princípio do Estado de
Direito e mais tarde da própria essência dos direitos fundamentais.
220
Cf. SILVA, 2002, p. 34. Com isso, o autor quer dizer também que toda vez que se afirma que deve
ser observado o princípio da razoabilidade, desconsidera-se esses subprincípios. Essa deficiência
está presente, por exemplo, no julgamento do Tribunal Superior do Trabalho sobre o monitoramento
do e-mail do empregado pelo empregador. Este Tribunal, embora tenha feito referência ao princípio
da proporcionalidade, no julgamento, não mencionou os subprincípios que devem ser observados
(item 4.3 desta dissertação).
221
Como aponta Virgilio Afonso da Silva (op. cit., p. 35), nessa campo, haveria três tendências
diversas: 1- adota-se a divisão em 3 sub-regras; 2- adota-se apenas as duas primeiras e aqui
estariam os críticos do sopesamento; 3- identifica-se um elemento adicional, que seria a análise da
legitimidade dos fins que a medida questionada pretende atingir. Segundo Dimitri Dimoulis e
Leonardo Martins (2008, p. 198-199), o exame da proporcionalidade deve ser feito em quatro passos
sucessivos: 1- licitude do propósito perseguido (avalia-se o caráter constitucionalmente aceitável do
propósito a que se quer chegar com a intervenção é lícito); 2- licitude do meio utilizado (o meio não
poderá ser reprovado pelo ordenamento constitucional); 3- adequação do meio utilizado e 4-
necessidade do meio utilizado. Os autores rejeitam expressamente o princípio da proporcionalidade
em sentido estrito.
77
produz o mesmo resultado, novamente, o princípio da proporcionalidade estará
afetado e a medida é considerada inconstitucional. Novamente, é desnecessário o
exame da proporcionalidade em sentido estrito. Somente se o meio for adequado e
necessário, passa-se ao exame do subprincípio da proporcionalidade
222
.
O princípio da proporcionalidade passa, portanto, pelo subprincípio da
adequação; subprincípio da necessidade e subprincípio da proporcionalidade em
sentido estrito.
3.3.2.1 O subprincípio da adequação do meio
O princípio da adequação do meio também é denominado de princípio do
emprego do meio necessário para o fim buscado ou da idoneidade, da pertinência
ou aptidão.
A adequação do meio empregado significa saber se o meio possibilita o
alcance do propósito buscado
223
. Esse princípio estabelece que, no caso concreto,
verifique-se se a afetação desvantajosa foi produzida com o emprego de meio apto a
promover o atingimento da finalidade buscada, no sentido de se saber se o meio
eleito é útil, idôneo, apto, apropriado à promoção do resultado pretendido
224
.
Observe-se que para Dimitri Dimoulis e Leonardo Martins, antes da análise da
adequação, que seria um terceiro passo, devem ser seguidos outros dois, que seria
a perquirição sobre a licitude do propósito perseguido e a licitude do meio
utilizado
225
. Primeiro, avalia-se o caráter constitucionalmente aceitável do propósito a
que se quer chegar com a intervenção, ou seja, se é lícito. Segundo os autores,
interessa apenas a questão da conformidade entre o fim (e o meio) e o ordenamento
222
Cf. FREITAS, 2007, p. 207. No mesmo sentido, Virgilio Afonso da Silva (2002, p. 34),
complementando que A impressão que muitas vezes se tem, quando se mencionam as três sub-
regras da proporcionalidade, é que o juiz deve sempre proceder à análise de todas elas, quando do
controle do ato considerado abusivo. Não é correto, contudo, esse pensamento. É justamente na
relação de subsidiariedade acima mencionada que reside a razão de ser da divisão em sub-regras.
Em termos claros e concretos, com subsidiariedade quer-se dizer que a análise da necessidade só é
exigível se, e somente se, o caso já não tiver sido resolvido com a análise da adequação; e a análise
da proporcionalidade em sentido estrito é imprescindível, se o problema já não tiver sido
solucionado com as análises da adequação e da necessidade”.
223
Cf. DIMOULIS; MARTINS, 2008, p. 206.
224
Cf. FREITAS, op. cit., p. 208.
225
DIMOULIS; MARTINS, op. cit., p. 199-205.
78
jurídico vigente. O termo licitude do fim (e do meio) seria no sentido de autorização
constitucional para busca, ou seja, se o fim é constitucionalmente admitido e se o
mesmo vale para o meio escolhido. Em resumo, exige-se que o fim não entre em
choque contra nenhum dispositivo em sentido formal, ou seja, contra a ordem
jurídica constitucional. O segundo seria constatar se o meio não poderá ser
reprovado pelo ordenamento constitucional.
Jane Reis Gonçalves Pereira, de forma diferente, analisa a idoneidade do
meio e fim em conjunto com a adequação. Para ela, então, o subprincípio da
adequação significa que toda restrição aos direitos fundamentais deve ser idônea
para o atendimento de um fim constitucionalmente legítimo
226
. Isso implica o
preenchimento de dois requisitos:
a) atingimento de um fim constitucionalmente legítimo;
b) que seja um meio instrumentalmente adequado à obtenção desse fim.
O primeiro passo então deve ser:
a) identificar qual o fim buscado pela medida restritiva;
b) verificar se este fim é consentâneo com o sistema constitucional
227
.
Após a existência da legitimidade, exige-se que seja aferida a aptidão da
medida para o atendimento do objetivo perseguido, ou seja, se os instrumentos são
adequados. Isso se busca com base em referências ticas, cabendo ao Judiciário
ter em consideração o conhecimento científico e as convicções sociais vigentes no
momento da decisão
228
.
A análise, aqui, será do ponto de vista técnico, exclusivamente, considerando
conhecimentos científicos sobre o ambiente natural e social ou os derivados da
experiência
229
.
Laura Clérico fala em versões bil e forte desse subprincípio
230
. Pela forte, o
subprincípio será atendido se o meio for eficaz para atingir o fim pretendido de forma
226
Segundo a autora, sobre o fim constitucionalmente legítimo, controvérsia se são aqueles fins
que não são proibidos explícita ou implicitamente pela Constituição ou se são legítimos apenas os
fins efetivamente autorizados pelo sistema constitucional. PEREIRA, 2006, p. 325.
227
Ibid.
228
Cf. Ibid., p. 329.
229
Cf. NARANJO DE LA CRUZ, 2000, p. 103.
79
plena. Para a concepção débil, o meio deveria apenas contribuir para o atendimento,
ou seja, pode ser apenas parcial. A maioria da doutrina adotaria a concepção
débil
231
.
Com base na concepção débil, “(...) o controle judicial do requisito da
idoneidade deve pautar-se por uma ´lógica de evidência´, isto é, os Tribunais devem
invalidar decisões legislativas apenas naqueles casos em que se revelem
manifestamente inadequadas para a obtenção dos fins colimados”
232
.
Para Luis Prieto Sanchís, a falta de adequação está ligada a interferências
gratuitas ou claramente ineficazes. O autor escreve:
(...) dado el carácter fundamentalmente técnico y empírico del juicio de
idoneidad, procede mantener también un criterio respetuoso con el
legislador: no se trata de imponer en vía jurisdiccional las medidas más
idóneas y eficaces para alcanzar el fin propuesto, sino tan sólo de excluir
aquellas que puedan acreditarse como gratuitas o claramente ineficaces
233
.
Segundo Virgilio Afonso da Silva, a discussão acerca do atingimento do
objetivo de forma total ou parcial por parte do meio empregado decorre de um erro
de interpretação das decisões do Tribunal Constitucional Alemão. Para o autor, o
verbo alemão que é utilizado para designar a adequação seria “fördern”, que
significaria fomentar e não alcançar como estaria sendo traduzido. Assim, o
adequado não é somente o meio que leva ao alcance do objetivo, mas o meio
utilizado que fomenta a busca de um objetivo, promove, ainda que ele o seja
completamente alcançado
234
.
Outra discussão relevante seria sobre a verificação do subprincípio com base
numa perspectiva “ex ante” ou “ex post”, ou seja, se deve ser feita com base nos
conhecimentos vigente à época da elaboração da norma (“ex ante”) ou no momento
230
Apud PEREIRA, 2006, p. 329.
231
Cf. Ibid., p. 330.
232
Ibid. Possui esse entendimento Rafael Naranjo de la Cruz (2000, p. 103), para quem o meio eleito
pode servir parcialmente a realização da meta, não havendo a necessidade de que a realize
completamente.
233
PRIETO SANCHIS, 2003, p. 200.
234
O autor escreve: (...) de fato, o verbo fôrdern não pode ser traduzido por alcançar. Fördern
significa fomentar. Adequado, então, não é somente o meio com cuja utilização um objetivo é
alcançado, mas também o meio com cuja utilização a realização de um objetivo é fomentada,
promovida, ainda que o objetivo não seja completamente realizado” (p. 36). Assim, “(...) uma medida
somente pode ser considerada inadequada se sua utilização não contribuir em nada para fomentar a
realização do objetivo pretendido” SILVA, 2002, p. 37. Segundo ele, Suzana de Toledo Barros (2003,
p. 78) e Wilson Antônio Steinmetz (2001, p. 150) cometeriam esse erro, o que os aproximaria da
concepção forte do princípio.
80
da apreciação de sua constitucionalidade (“ex post”). Isso quer dizer que a
verificação “ex ante” considera os conhecimentos disponíveis no momento da
aprovação da norma. De acordo com a verificação “ex post”, a análise considera os
conhecimentos disponíveis no momento da apreciação da constitucionalidade,
utilizando, inclusive, informações concernentes aos efeitos que a norma produziu.
Boa parte orientar-se-ia a favor da perspectiva “ex ante”, mas isso implicaria em
desconsiderar a inconstitucionalidade superveniente
235
.
Nesse sentido, escreve Jorge Reis Novais:
De nossa parte, concordando com a atribuição da devida relevância aos
juízos de prognose feitos no momento em que o autor da restrição
representa os seus previsíveis efeitos, não nos parece justificar-se
qualquer condescendência para com os poderes públicos responsáveis pela
restrição, não apenas a partir da altura em que o juiz comprova a inaptidão
da medida restritiva e essa é também posição sustentada por doutrina
significativa , mas também a partir do momento em que os mesmos
poderes públicos poderiam, objectivamente, ter verificado a inidoneidade do
meio e, não havendo razões para, num e no outro caso, crer na
reversibilidade da situação, devessem tê-lo anulado. Significa isto que o
decurso do tempo pode criar circunstâncias de verificação que determinem
que uma medida restritiva cujos efeitos se destinem a perdurar, ainda que
não seja considerada inapta no momento da sua criação à luz dos
prognósticos feitos com base nos conhecimento e experiência disponíveis
e, por esse facto, não inconstitucional ex tunc –, se venha a revelar inidónea
e, como tal, inconstitucional a partir do momento em que essa verificação foi
ou poderia objectivamente ter sido feita
236
.
Em sentido contrário, escreve Suzana de Toledo Barros, para quem
O exame da idoneidade da medida restritiva deve ser feito sob o enfoque
negativo: apenas quando inequivocadamente se apresentar como inidônea
para alcançar seu objetivo é que a lei deve ser anulada. Sob esse prisma, é
lícito que o legislador se equivoque acerca do desenvolvimento de seu
prognóstico. E é exatamente à conta da possibilidade de erro de prognose
legislativa que se sustenta deva a adequação ser aferida no momento em
que o legislador tomou a sua decisão, a fim de que se possa estimar se,
naquela ocasião, os meios adotados eram apropriados aos objetivos
pretendidos
237
.
Independentemente das polêmicas expostas, o meio será adequado se
houver uma conexão fundada em hipóteses comprovadas pela realidade. Os meios
que o tiverem uma conexão fundada em hipóteses comprovadas pela realidade,
235
Cf. PEREIRA, 2006, p. 334-335, que adota uma perspectiva “ex post”.
236
NOVAIS, 2003, p. 739-740.
237
BARROS, 2003, p. 80.
81
ou seja, inadequados, serão considerados desproporcionais, logo
inconstitucionais
238
.
3.3.2.2 O subprincípio da necessidade do meio
O subprincípio da necessidade do meio refere-se à proibição de adoção de
meio excessivamente gravoso, ou seja, que produza uma afetação desvantajosa
que poderia ser menor, caso o meio fosse outro
239
.
O princípio da necessidade decorre do fato de que o princípio da adequação
poder levar à aceitação de meios muito repressivos, ou seja, de uma ampla gama de
meios, muitas vezes desproporcionais. Daí a necessidade de se verificar a
necessidade do meio empregado
240
. Esse segundo princípio está ligado ao fato de
que a ação do filtro anterior é muito escassa
241
.
Esse segundo exame está ligado ao caráter negativo do princípio da
adequação, que, em verdade, detecta apenas os meios que não são idôneos para
atingir o fim pretendido
242
.
O legislador deve optar, então, pela restrição que seja menos lesiva para os
direitos fundamentais, por meio de uma análise comparativa entre os diversos
meios. Além de uma análise de elementos de caráter empírico, a análise de
caráter valorativo. A valoração material ocorre porque a análise da gravidade de uma
limitação, em relação a outra, implica num juízo de valor
243
.
O atendimento ao requisito da necessidade teria duas fases:
a) exame para saber se os meios cogitados são igualmente idôneos ao
adotado pelo legislador;
238
Cf. DIMOULIS; MARTINS, 2008, p. 205.
239
Cf. FREITAS, 2007, p. 209.
240
Cf. DIMOULIS; MARTINS, op. cit., p. 215. Veja-se que para esses autores o critério da
necessidade é decisivo e permitiria realizar um controle profundo e exigente, decidindo, ao final, se o
meio é proporcional aos propósitos que se perseguem.
241
Cf. NARANJO DE LA CRUZ, 2000, p. 103.
242
Cf. ALEXY, 2004, p. 41.
243
Cf. NARANJO DE LA CRUZ, op. cit., p. 104 passim.
82
b) perquirir se algum desses meios afeta os direitos fundamentais em menor
escala
244
.
Na primeira fase, busca-se a escala de idoneidade e se um coeficiente de
idoneidade. Jane Reis Gonçalves Pereira escreve:
(...) em primeiro lugar, é preciso que o meio alternativo usado como
parâmetro de comparação ostente um grau superior ou idêntico de
idoneidade ao daquele empregado pelo legislador; e, em segundo lugar, a
comparação entre o meio alternativo e o meio cuja constitucionalidade é
questionada deve ser promovida desde todas as perspectivas possíveis
245
.
Os meios de difícil efetivação ou com custos muito elevados
246
devem ser
excluídos. O meio escolhido pelo legislador será rejeitado apenas se sua idoneidade
for igual ou menor que o meio alternativo e se tiver maior onerosidade que o meio
alternativo
247
.
Na segunda fase, analisa-se a onerosidade, que pode ser vista do ponto de
vista material, temporal, espacial e pessoal. Do ponto de vista material, analisa-se a
intensidade e a dimensão da repercussão negativa; do ponto de vista temporal e
espacial, analisa-se a incidência do gravame no tempo e no espaço; e do ponto de
vista pessoal, analisa-se se a medida apenas afeta as pessoas cujos interesses
devem ser sacrificados. Por fim, deve ser adicionado o critério da probabilidade, que
se refere a menor ou maior possibilidade de um meio revelar-se lesivo
248
-
249
.
Wilson Antônio Steinmetz fala de quatro essenciais, no princípio da
necessidade:
a) ingerência ou intervenção mínima;
b) haveria ou pode haver uma medida alternativa menos gravosa (princípio
da desconfiança);
244
Cf. PEREIRA, 2006, p. 339.
245
Ibid., p. 340.
246
Para DIMOULIS; MARTINS, 2008, p. 222, a questão dos meios menos onerosos não pode ser
aceita como premissa inquestionável. O problema dependerá do “quantum” da maior onerosidade.
247
Cf. PEREIRA, op. cit., p. 341.
248
Cf. Ibid., p. 342.
249
Como afirma Robert Alexy, no caso da necessidade, problemas de prognósticos e, muitas
vezes, aparecem meios mais benignos ao direito fundamental afetado, mas que implicam na restrição
de um terceiro princípio. ALEXY, 2004, p. 43-46. Semelhante alerta é apresentado por DIMOULIS;
MARTINS, op. cit., p. 208. Esses casos levariam a uma maior margem de atuação do legislador.
83
c) comparabilidade dos meios ou das medidas de restrição (se adota o
critério da menor prejudicialidade, se houver empate, verifica-se qual é o
meio ou medida mais eficaz);
d) um juízo empírico indica qual é o meio menos prejudicial
250
.
Por fim, como indicam Dimitri Dimoulis e Leonardo Martins, a verificação da
necessidade seguiria a regra do ônus argumentativo. De acordo com esta regra, a
premissa da necessidade de uma medida pode ser falseada por quem demonstre a
existência de um meio que seja menos intenso, com quem recai o ônus da
argumentação. De todos os meios adequados, somente aquele que interferir no
direito fundamental de forma menos intensa seo necessário. Os demais, embora
adequados, são desnecessários e desproporcionais, logo inconstitucionais
251
.
3.3.2.3 O subprincípio da proporcionalidade em sentido estrito
O dever de proporcionalidade em sentido estrito seria a relação custo
benefício existente entre o resultado obtido e a afetação desvantajosa
252
.
Enquanto os subprincípios da adequação e da necessidade implicam na
exigência da maior realização possível em relação às possibilidades fáticas, o
subprincípio da proporcionalidade em sentido estrito buscaria a maior realização das
possibilidades jurídicas
253
. Por isso, a proporcionalidade em sentido estrito expressa
o que significa a otimização em relação aos princípios que jogam em sentido
contrário.
A aplicação dos dois princípios anteriores não resolve as questões de
conflitos. Ocorre que o princípio da necessidade complica-se no momento em que
a existência de distintas opções, em face de diversas implicações entre bens ou
direitos que estão relacionados ou à margem do direito fundamental limitado e
daquele protegido. Por exemplo, uma medida alternativa adotada, igualmente apta,
mas menos limitadora, pode implicar simultaneamente depreciar outros bens. A
250
STEINMETZ, 2001, p. 151.
251
DIMOULIS; MARTINS, 2008, p. 216.
252
Cf. FREITAS, 2007, p. 211.
253
ALEXY, 2004, p. 48.
84
restritiva, por sua vez, pode ter uma carga inferior de restrição em outros bens. Dai a
necessidade desse terceiro subprincípio
254
.
O subprincípio da proporcionalidade em sentido estrito expressa a lógica do
raciocínio ponderativo e seria a parte final do processo de solução da antinomias
entre princípios constitucionais. Segundo esse princípio, “(...) uma restrição a direitos
fundamentais é constitucional se pode ser justificada pela relevância da satisfação
do princípio cuja implementação é buscada por meio da intervenção”
255
. Ou seja,
“(...) efetivar uma comparação entre o grau de afetação do direito fundamental e a
importância da realização do princípio que a ele antagoniza e que serve de
fundamento à restrição”
256
. Isso quer dizer que a medida restritiva deve compensar
os prejuízos que desta advenham para os direitos fundamentais.
O princípio em questão trata da ponderação. Segundo Luis Prieto Sanchís,
Ponderar es, pues, buscar la mejor decisión (la mejor sentencia, por
ejemplo) cuando en la argumentación concurren razones justificatorias
conflictivas y del mismo valor. En consecuencia, la ponderación parte da la
igualdad de las normas en conflicto, dado que, si no fuese así, si existiera
un orden jerárquico que se pudiera deducir del propio documento normativo,
la antinomia podría resolverse de acuerdo con el criterio jerárquico” e “(…)
en el caso concreto debe triunfar una de las razones en pugna, pero sin que
ello implique que en otro no deba triunfar la contraria. La ponderación
intenta ser un método para la fundamentación de ese enunciado de
preferencia referido al caso concreto (…)
257
.
Como informa Ana Paula de Barcellos, a ponderação teria três etapas:
a) a identificação das normas relevantes em conflito e o seu agrupamento
conforme a solução que sugiram;
b) exame das circunstâncias concretas do caso e as suas repercussões
sobre as normas;
254
Cf. NARANJO DE LA CRUZ, 2000, p. 107. No mesmo sentido, Suzana de Toledo Barros (2003, p.
84-85), para quem, muitas vezes, o juízo de adequação e necessidade não são suficientes para
determinar a justiça da medida restritiva, porque não se consegue, com eles, indicar se o meio
utilizado encontra-se em razoável proporção com o fim perseguido, numa idéia de equilíbrio entre
valores e bens. Segundo a autora, “(...) o juiz, quando considera adequada a relação entre
determinada restrição e o fim a que se destina, ou mesmo quando reconhece a inexistência de outro
meio menos gravoso que pudesse conduzir ao mesmo resultado, nem por isso esa chancelar uma
providência que imponha ônus demasiados ao atingido. situações em que é plenamente possível
identificar um desequilíbrio na relação meio-fim, sem que se possa concluir pela desnecessidade da
providência legislativa, porque não esem causa a existência de outra medida menos lesiva, mas,
sim, a precedência de um bem ou interesse sobre outro”.
255
PEREIRA, 2006, p. 346.
256
Ibid..
257
PRIETO SANCHÍS, 2003, p. 189-190.
85
c) exame dos grupos de normas e a repercussão dos fatos sobre eles, a fim
de se apurar o peso que devem ser atribuídos aos diferentes elementos.
Considerada a distribuição dos pesos, define-se o grupo de normas que deve
prevalecer. Em seguida, decide-se se a intensidade dessas normas e se a solução
indicada deve prevalecer em detrimento dos demais
258
.
O que se tem é uma comparação entre os efeitos negativos e os efeitos
positivos da medida, buscando-se a atribuição de pesos, em concreto e abstrato
259
.
Robert Alexy observa, entretanto, que em grande parte dos casos a solução
não será simples. Haverá, muitas vezes, a necessidade de outros argumentos e é
bem possível que não haja acordo sobre a solução. Isso, contudo, não é objeção à
ponderação, mas uma qualidade universal dos problemas práticos e normativos
260
.
O peso concreto seria a intensidade da restrição e o grau de promoção do
princípio que a justifica. Isso que dizer que, quanto mais severa for a restrição, mais
será o seu peso concreto e quanto maior for o grau de satisfação do princípio
antagônico, mais será o peso concreto. O peso abstrato é medido por meio de um
processo de valoração da sua importância material no âmbito do ordenamento e
liga-se ao grau de fundamentalidade do direito, ao grau de humanização e dignidade
e aos valores basilares do constitucionalismo. Ou seja, “(...) devem ser tido em
consideração, na atribuição do peso abstrato do direito, sua capacidade de contribuir
para a implementação do princípio da dignidade humana, do princípio da autonomia,
do princípio democrático e do princípio da igualdade”
261
.
Após realizada a atribuição de pesos aos princípios, promove-se uma
comparação entre a relevância da restrição e a importância da realização do fim que
esta promove, estabelecendo-se uma relação de precedência condicionada entre os
princípios. Essa relação de precedência é dada pela Lei de ponderação
262
.
A ponderação é objeto de várias críticas. Como aponta Daniel Sarmento,
dentre as críticas direcionadas à ponderação de bens, as mais comuns seriam três:
258
BARCELLOS, 2008, p. 57-58.
259
Cf. PEREIRA, 2006, p. 347.
260
ALEXY, 1999, p. 78.
261
Cf. PEREIRA, op. cit., p. 348-349.
262
Cf. Ibid., p. 350.
86
a) o método da ponderação implicaria num esvaziamento dos direitos
fundamentais, ao torná-los relativos e subordinados a uma espécie de
“reserva da ponderação”;
b) haveria, com a ponderação, uma inconsistência metodológica, que traria
apenas um procedimento formal, sem oferecer pautas materiais para a
solução dos casos e isso implicaria critérios irracionais e sem objetividade
às decisões, conferindo ao juiz uma margem exagerada de
discricionariedade;
c) o método da ponderação acarretaria a outorga de um poder excessivo ao
Judiciário, em detrimento do Legislativo, o que levaria a um déficit de
legitimidade democrática no processo decisório
263
.
Wilson Antônio Steinmetz, além dessas críticas, fala também na ameaça da
separação de poderes, que pode ser respondida com a terceira crítica
264
.
Segundo este último autor, quanto ao princípio da separação de poderes,
O exame de proporcionalidade é um limite a intervenções nos direitos
fundamentais contrárias à Constituição ou nela não justificadas. Não se
pode invocar a separação de poderes para deixar em aberto a possibilidade
de os direitos fundamentais ficarem à livre disposição do legislador.
Seria evidente que o poder democraticamente legitimado pelo voto pudesse eleger
os meios e os fins, todavia isso deve ocorrer nos limites da legitimidade
constitucional e, nesse contexto, cabe ao Judiciário controlar a constitucionalidade
dessa produção normativa
265
.
No mesmo sentido, Paulo Bonavides, para quem a limitação dos poderes do
legislador não vulnera o princípio da separação de poderes, porque a autonomia, a
faculdade política decisória e a liberdade do legislador para eleger, conformar e
determinar fins e meios é mantida. O que ocorre é que ele passa a ser gerido pelos
valores e princípios estabelecidos na Constituição. Essas limitações do legislador
apenas configuram a supremacia da Constituição sobre a lei. Segundo esse autor,
os fins políticos não podem contrariar os valores e princípios constitucionais. Um
desses princípios seria o princípio da proporcionalidade, não escrito, cuja
263
SARMENTO, 2001, p. 67-68.
264
STEINMETZ, 2001, p. 194 et. seq.
265
Ibid., p. 196.
87
observância independe de explicitação no texto da Constituição, pertencendo à
natureza e essência mesma do Estado de Direito
266
.
Por fim, como indica Daniel Sarmento, a ponderação pressupõe que, no caso
concreto, inexiste uma regra legislativa resolvendo o conflito. De acordo com ele, a
presença de norma infraconstitucional inibe o juiz de efetuar a ponderação, pois este
deverá acatar aquela realizada pelo legislador, a não ser que a considere
inconstitucional. Neste caso, a cautela deve ser redobrada, a fim de se evitar que o
juiz, não eleito, imponha suas opções políticas e ideológicas
267
.
A primeira crítica, segundo Daniel Sarmento, também não procede, porque o
método da ponderação de bens visa justamente ao contrário, ou seja, busca evitar o
esvaziamento dos direitos fundamentais. O esvaziamento ocorreria caso se
adotasse uma hierarquia normativa entre os princípios constitucionais. Certo é que a
coexistência de diversos direitos fundamentais e outros princípios constitucionais
impõe um certa relativização de alguns, para que haja uma convivência
harmônica
268
.
O segundo argumento, de cunho metodológico, é o mais sério.
Como indica Ana Paula Barcellos, o grande problema do processo de
ponderação é que ele confere um poder muito amplo, porque todo o processo
depende de questões subjetivas. A questão, então, de maior relevância nessa
matéria é o estabelecimento de parâmetros de controle normativos e
argumentativos
269
.
Consoante Dimitri Dimoulis e Leonardo Martins, a ponderação se daria entre
vantagens e desvantagens jurídicas para os bens jurídicos encontrados, como uma
espécie de sistema axiológico, com escala de valores constitucionais e isso não
existira. Conforme os autores, não há como estabelecer uma classificação de
direitos fundamentais, com indicação de qual deve prevalecer. Além disso, a tarefa
não pode ser feita, porque preferências subjetivas e porque a justificação dos
valores superiores em relação a outros é possível. Por exemplo, o direito à vida, que
é colocado como o mais valioso. As próprias constituições admitem a guerra e a
pena de morte em nome do interesse coletivo. No Brasil, por exemplo, a vida
266
BONAVIDES, 1994, p. 282-283.
267
SARMENTO, 2001, p. 72. Aqui, insere-se um dos parâmetros de ponderação, conforme sugerido
por Ana Paula Barcellos, tratados a frente.
268
Ibid., p. 69.
269
BARCELLOS, 2008, p. 59.
88
aparece no mesmo patamar que mais quatro direitos fundamentais: liberdade,
igualdade, segurança e propriedade e, como estes, está sujeita a igual submissão
aos “termos seguintes” (art. 5º, caput, CF)
270
.
Em que pese as argumentações em sentido contrário, para estes autores falta
uma medida objetiva para a ponderação
271
.
Para Daniel Sarmento, a ponderação concede certa discricionariedade ao
julgador, trazendo com isso uma certa dose de insegurança à ordem jurídica. Porém,
não haveria melhor saída e, além disso, a discussão acerca do subjetivismo não
seria nova no Direito, sendo que um juiz neutro e passivo, aplicador mecânico, é
apenas um mito, que não retrata a realidade. Some-se, ainda, que no plano
constitucional, lida-se com questões políticas e normas abertas, o que torna esse
subjetivismo mais comum
272
.
Segundo o mesmo autor, o método da ponderação pode ser aferido por
critérios racionais e a legitimidade da decisão pode ser conferida por meio da
justificação das restrições, inclusive com observância do princípio da
proporcionalidade na integralidade. Finalmente, o resultado final pode ser analisado,
considerando a tábua de valores da Constituição
273
. Portanto, se jamais será
atingida uma objetividade, também não é verdade que o método pode ser acusado
de puramente subjetivo e irracional. Observe-se, ainda, que a segurança jurídica
270
DIMOULIS; MARTINS, 2008, p. 224-226.
271
Os autores apresentam outras 3 objeções, aparentemente, menos relevantes. Uma objeção seria
de cunho político e inspiração neoliberal. Segundo essa, os conflitos entre direitos deveriam ser
resolvidos de forma espontânea pela sociedade, pelo mercado e pelos acordos entre interessados.
Essa crítica, contudo, baseada na rejeição do Estado intervencionista, não é convincente. Essa
posição desconsidera as normas que impõem a intervenção do legislador e que o Estado tem
competência para decidir que direito deve prevalecer. Além disso, uma omissão levaria a antinomias
jurídicas e criaria uma situação semelhante ao estado de natureza. Por fim, as considerações e
finalidade políticas não podem contrariar as normas jurídicas. Outra objeção indica que
necessidade de contenção do Judiciário, porque este não pode recorrer a ponderações para decidir
de forma contraria a decisões de legislador. A existência de uma Constituição aberta não significa que
o Judiciário pode decidir a melhor forma quando o legislador se posicionou. Para esses autores, o
Judiciário somente poderá modificar uma decisão legislativa por um argumento racional. E, para eles,
“A proporcionalidade stricto sensu é uma construção irracional, dada a impossibilidade jurídica de
quantificar e comparar os direitos fundamentais, decidindo qual possui maior ´peso´ no caso concreto”
e assim “(....) deve ser rejeitada como elemento do exame da proporcionalidade”. Finalmente,
segundo os autores, haveria uma inutilidade do exame da proporcionalidade em sentido estrito,
porque sua utilização tem sido dispensada, porque a proporcionalidade tem sido confirmada quando
o meio é tido como necessário. Ibid., p. 226-231.
272
SARMENTO, 2001, p. 69-70.
273
Para Gilmar Ferreira Mendes (2004, p. 95), por exemplo, embora a Constituição não tenha
privilegiado determinado direito, os valores vinculados aos princípios da dignidade da pessoa humana
assumem peculiar relevo. Escreve: “Assim, devem ser levados em conta, em eventual juízo de
ponderação, os valores que constituem inequívoca expressão desses princípios (inviolabilidade de
pessoa humana, respeito à sua integridade física e moral, inviolabilidade do direito de imagem e da
intimidade)”.
89
tende a aumentar com o tempo, pois casos semelhantes serão julgados, o que
consagrará soluções e cristalizará algumas regras de preferência
274
.
Conforme Robert Alexy, a suposta irracionalidade da ponderação seria
resolvida pela lei correspondente, que é a lei da ponderação: “quando maior é o grau
da não satisfação ou de afetação de um dos princípios, tanto maior deve ser a
importância da satisfação do outro”
275
. Essa lei implicaria a realização de três
passos:
a) primeiro, define-se o grau da não satisfação ou de afetação de um dos
princípios;
b) segundo, define-se a importância da satisfação do princípio em sentido
contrário;
c) define-se se a importância da satisfação do princípio contrário justifica a
afetação ou a não satisfação do outro
276
.
Robert Alexy demonstra que o emprego dessa forma é pautado por juízos racionais.
Isso porque seria viável escalonar a intensidade das intervenções nos direitos
fundamentais de forma a qualificá-las como leves, dias ou graves, podendo se
estabelecer um resultado racional para a ponderação
277
.
Ana Paula de Barcellos apresenta dois parâmetros que deveriam ser
verificados preliminarmente nas ponderações. Segundo ela, por conta de duas
distinções entre regra e princípios, que se referem à estrutura e à função, o primeiro
parâmetro deve ser o de que “(...) as regras (constitucionais e infraconstitucionais)
têm preferência sobre os princípios constitucionais”
278
. O segundo parâmetro seria
274
SARMENTO, 2001, p. 71.
275
ALEXY, 2004, p. 48.
276
Ibid., p. 49.
277
Robert Alexy (op. cit., p. 49-50) argumenta, contra as críticas, que com os três passos seria
possível juízos racionais e como a ponderação não exige sempre uma decisão exata do legislador,
este teria margens. Pela tese moderada, com a ajuda da ponderação, certamente, pode-se
estabelecer um resultado de maneira racional e que esteja justificado. O autor fala, então, de
intervenções em grau fraco, médio e forte nos direitos fundamentais, com exemplo e trata de
fórmulas, pretendendo racionalizar a sua proposta.
278
BARCELLOS, 2008, p. 69. Para a autora, a distinção relevante seria de caráter estrutural.
Segundo ela, as regras descrevem comportamentos, sem ocupar-se dos fins que as condutas podem
realizar. Os princípios, ao contrário, estabelecem estados ideais, objetivos a serem alcançados, sem
indicar quais ações devem ser praticadas para isso. Outra forma que passa pela discussão da
estrutura, refere-se aos efeitos que pretendem tais normas pretendem produzir. As regras
estabelecem desde logo os efeitos, de forma determinada e específica (condutas). Os princípios são
diversos, pois, ainda que os fins sejam determinados, o que não ocorre sempre, não definição das
90
que, diante de um conflito que exija a ponderação, os direitos fundamentais devem
preponderar sobre os demais enunciados normativos e normas
279
.
Observe-se aqui, que, pelo menos, no caso da jornada de trabalho,
compensação e horas extras, quando se identifica o conteúdo essencial, considera-
se também esses dois parâmetros (item 4.4 desta dissertação).
A violação ao princípio da proporcionalidade em sentido estrito ocorrerá
quando houver a restrição a um direito em escala maior do que a promoção de outro
direito. Fala-se aqui em um controle de evidência, ou seja, “(...) uma intervenção
legislativa pode ser invalidada quando for possível afirmar, de forma patente e
inequívoca, que a gravidade da restrição ao direito fundamental é maior que a
relevância da promoção do fim perseguido”
280
.
Isso não leva a entender que, sempre que houver duvida, a restrição deve ser
declarada inconstitucional. Deve haver aqui uma ponderação entre o direito
fundamental restringido e o princípio da liberdade de ação do legislador. Isso levaria
condutas necessária e exigíveis para isso. Nesse contexto, do ponto de vista técnico, as regras não
foram concebidas para serem ponderadas. Os princípios, pelo contrário, podem ser mais ou menos
adimplidos, podendo o ser de formas variadas. Considerando isso, o primeiro parâmetro preferencial
decorre do fato de que as regras têm preferência sobre os princípios constitucionais, porque sua
estrutura não é adequada para sofrer ponderações. Além disso, o outro critério para justificar a
prevalência das regras, em relação ao princípio, nas ponderações, refere-se a função. Segundo a
autora, a harmonia de um sistema jurídico depende do equilíbrio entre segurança e justiça e, nesse
contexto, princípios e regras desempenham cada um papel diferente. As regras têm uma maior
relação com a segurança, a estabilidade e a previsibilidade. A justiça, por sua vez, depende de
normas mais flexíveis, que são os princípios, porque permitem uma melhor adaptação ao caso
concreto. Esse modelo é simplificado, porque há princípios que propugnam exatamente o valor
segurança, como o princípio da legalidade e porque regras que foram criadas por questões de
justiça. Isso, contudo, não afasta a sua utilidade. Isso quer dizer que quanto mais normas-regras
houver, o sistema será mais seguro, previsível e estável, mas será mais difícil a adaptação a
situações novas. Quanto mais normas-princípios, mais será a flexibilidade, porém crescerá a
insegurança, por conta da imprevisibilidade e a falta de uniformidade. Quanto mais a quantidade de
normas e princípios for equilibrada, mais haverá segurança e justiça. O equilíbrio, contudo, não
depende somente dessa quantidade, mas também dos operadores, que devem considerar que as
regras não foram feitas para serem ponderadas. Essas duas diferenciações levam a uma
preponderância da regra no caso de ponderações em relação aos princípios.
279
BARCELLOS, 2008, p. 108. Robert Alexy (2008, p. 105 passim) também aponta essa
necessidade, ressalvando como a autora, que isso não é uma primazia rígida. Para o autor, “Um
princípio cede lugar quando, em um determinado caso, é conferido um peso maior a um outro
princípio antagônico. uma regra não é superada pura e simplesmente quando se atribui, no caso
concreto, um peso maior ao princípio contrário que sustenta a regra. É necessário que sejam
superados também aqueles princípios que estabelecem que as regras tenham sido criadas pelas
autoridades legitimadas para tanto devem ser seguida e que não se deve relativizar sem motivo uma
prática estabelecida”. E, ainda, (...) a vinculação à Constituição significa uma submissão a todas as
decisões do legislador constituinte. É por isso que as determinações estabelecidas no nível das
regras têm primazia em relação a determinadas alternativas baseadas em princípios”. Claro que essa
primazia não é rígida. Ou seja, “Na verdade, aplica-se a regra de precedência, segundo a qual o nível
das regras tem primazia em face do nível dos princípios, a não ser que as razões para outras
determinações que não aquelas definidas no nível das regras sejam tão fortes que também o
princípio da vinculação ao teor literal da Constituição possa ser afastado.”
280
PEREIRA, 2006, p. 356.
91
à segunda lei da ponderação “quando mais intensa a intervenção num direito
fundamental, tanto maior deve ser a certeza das premissas que sustentam a
intervenção”
281
. Ou seja, quando mais incertas, maior a margem de atuação do
legislador e quanto mais severa a restrição, mais intenso deve ser o controle
efetivado pelo tribunal
282
.
Para Robert Alexy, as objeções metodológicas são corretas se pretendem
demonstrar que a ponderação não leva a um único resultado. Elas, contudo, seriam
incorretas se pretendem provar ou demonstrar que o procedimento é irracional. Para
ele, a ponderação é racional e isso restaria demonstrado com a lei de colisões e a lei
de ponderação
283
.
3.4 DEVER DE PROTEÇÃO AO NÚCLEO ESSENCIAL
O último dos limites dos limites às restrições aos direitos fundamentais, que
interessa para os objetivos dessa dissertação, é a proteção ao núcleo essencial dos
direitos fundamentais.
As Constituições Alemã (artigo 19)
284
, Espanhola (artigo 53)
285
e Portuguesa
(artigo 18)
286
têm previsão expressa no sentido de que o conteúdo essencial dos
direitos fundamentais deve ser preservado no caso de restrições
287
.
281
ALEXY, 2004, p. 93.
282
PEREIRA, 2006, p. 357.
283
Defesa semelhante é apresentada por Luis Prieto Sanchís (2003, p. 191 passim), para quem,
embora não se possa negar o caráter valorativo e a margem de discricionariedade da ponderação,
isso não significa que a ponderação encubra arbitrariedades judiciais. Pelo contrário, ela significa uma
exigência suplementar de argumentação. Observe-se que para esse autor a ponderação confunde-se
com o que aqui se denominou de princípio da proporcionalidade e é formada por quatro passos. Além
dos três aqui intitulados, o autor inclui a necessidade de que a medida tenha um fim
constitucionalmente legítimo para fundamentar a interferência na esfera de outros princípios ou
direito. Finalmente, para esse autor, a necessidade de ponderação esligada à idéia de unidade da
Constituição. Para ele, a virtude da ponderação estaria no estimulo à interpretação, no sentido de que
as normas constitucionais não têm uma relação de independência ou hierarquia, mas de continuidade
e efeitos recíprocos. Escreve: (...) la necesidad de la ponderación comienza desde el momento en
que se acepta que no existen jerarquías internas en la Constitución o, lo que es lo mismo, que los
distintos principios carecen de un peso autónomo y diferenciado y sólo posuen una vocación de
máxima realización que sea compatible con la máxima realización de los demás”. Segundo Daniel
Sarmento (2001, p. 72), “(...) o método da ponderação de bens não é irracional, antidemocrático, nem
tampouco amesquinha o valor e a dimensão dos direitos fundamentais. Muito pelo contrário, trata-se
de mecanismo legítimo e indispensável para o bom funcionamento de uma Constituição que se
pretende aberta”.
284
“(...) Em hipótese nenhuma um direito fundamental poderá ser afetado em sua essência”.
92
A cláusula do conteúdo essencial teria ampla acolhida no plano doutrinário e
jurisprudencial
288
, aparecendo nas diversas sistematizações dos limites dos limites,
sendo ele um limite intransponível
289
.
Considerando esse limite, a lei que o respeitar o conteúdo essencial do
direito restringido será inconstitucional
290
.
Não consenso, entretanto, sobre a amplitude e sobre a definição do que
seja o núcleo essencial dos direitos fundamentais.
285
“(...) Apenas por lei, que em todo o caso deverá respeitar o seu conteúdo essencial, poderá ser
regulado o exercício de (...)”.
286
“(...) e não podem ter efeito retroactivo nem diminuir a extensão e o alcance do conteúdo essencial
dos preceitos constitucionais”.
287
Segundo Magdalena Lorenzo Rodriguez Armas (1996, p. 121-123), a preocupação pelo conteúdo
essencial dos direitos fundamentais tem sua origem no pós segunda guerra mundial e por conta dos
estragos decorrentes, com a introdução do artigo 19.2 na Lei Fundamental de Bonn. A origem da
cláusula estaria nos primeiros anos do século XX, antes da República de Weimar, quando se falava
de uma perfeição humana. No campo jurídico, tem-se a Constituição de Wiemar de 1919, que seria
uma criação quase perfeita do ponto de vista da construção técnico-jurídica. Entretanto, ela estaria
totalmente divorciada da realidade. Embora não aborde as causas do nascimento dos movimentos
extremos, como o nacional socialismo, esse movimento seria o antecedente imediato da preocupação
pelo conteúdo essencial. Segundo a autora, algo claro para o constituinte alemão do Pós-Guerra
seria a preocupação existente com as atrocidades do III Reich e a existência de um sentimento de
culpabilidade. Escreve: “Si algo quedó claro al constituyente alemán de la II Posguerra Mundial, es
que las atrocidades del III Reich ocupan un capítulo proscrito en la historia más reciente de Alemania:
borrar los acontecimientos vividos durante el período de dominación de Adolf Hitler, quedaba fuera
del alcance del pueblo alemán. Muchos desearon eliminar se sus conciencias el sentimiento de culpa
impregnado profundamente en sus corazones. Ni lo uno ni lo otro fue posible. Podría afirmarse, sin
riesgo de aventurar conjeturas, que ese sentimiento de culpabilidad ha sido heredado por posteriores
generaciones a as que no agrada, todavía hoy, hablar de ciertos temas relacionados con el
holocausto provocado por el nacionalsocialismo”. Nesse contexto, aborda-se a necessidade de
resgatar um valor esquecido nos anos anteriores: a dignidade humana. Esta, então, passa a ocupar
um lugar privilegiado na Lei Fundamental (artigo 1º). Haveria, com isso, uma revalorização, nos textos
constitucionais, como conseqüência da Segunda Guerra, tanto da Alemanha, como Portugal e
Espanha, de uma série de valores, que foram aderidos à normas fundamentais, marcando uma nova
época no Direito. No mesmo sentido ALFONSO, 1981, p. 169.
288
Cf. PEREIRA, 2006, p. 366.
289
Cf. SCHIER, 2007, p. 67.
290
Ibid. Segundo Ignácio de OttoyY Pardo (1988, p. 126), “La garantía del contenido esencial es límite
porque limita la posibilidad de limitar, porque senala un límite más allá del cual no es posible la
actividad limitadora de los derechos fundamentales e de las libertades blicas”. Segundo Ana Maria
Ávila Lopes (2004, p. 07), baseada em Gavara de Cara, “(...) a garantia do conteúdo essencial foi
criada para controlar a atividade do Poder Legislativo, visando evitar os possíveis excessos que
possam ser cometidos no momento de regular os direitos fundamentais”. Jane Reis Gonçalves
Pereira (2006, p. 367), conceitua o conteúdo essencial “(...) como o âmbito de proteção do direito que
é inviolável à ação legislativa”. Para Gilmar Ferreira Mendes (2004, p. 43), “(...) o princípio da
proteção do núcleo essencial destina-se a evitar o esvaziamento do conteúdo do direito fundamental
decorrente de restrições descabidas, desmensuradas ou desproporcionais”. Segundo Rafael Naranjo
de la Cruz (2000, p. 130), “(...) el círculo constituido por el contenido esencial se manifesta como
obstáculo insalvable para cualquier intento limitador proveniente de los poderes públicos. Es, como se
ha venido denominando de forma tradicional em la doctrina, un ´límite de los límites´ de los derechos
fundamentales”.
93
Nesse contexto, identificam-se, pelo menos, quatro teorias sobre a cláusula
do conteúdo essencial: teoria objetiva, contraposta à teoria subjetiva e a teoria
relativa, contraposta à teoria absoluta; há, ainda, algumas teorias mistas.
Entre a teoria objetiva e a teoria subjetiva, discute-se o objeto do conteúdo
essencial. Se o conteúdo essencial se dá de forma objetiva em relação ao direito em
si ou de forma subjetiva, em relação ao sujeito que se vale da proteção
291
. Para a
teoria objetiva, a definição do núcleo essencial passa pela verificação do direito
fundamental objetivamente considerado, como instituição jurídica abstrata. Para a
teoria subjetiva, a definição deve ser feita concretamente, em favor do direito
subjetivo
292
.
No caso da teoria objetiva, a garantia apenas protege o texto constitucional e
não os direitos que dele defluem. Isso porque visa-se à tutela do significado geral
que os direitos fundamentais ostentam no ordenamento jurídico. Neste caso, em
algumas situações, no caso concreto, o direito é afastado para a implementação de
outro. A principal crítica, portanto, refere-se ao fato de que a cláusula do cleo
essencial perde todo o seu sentido útil
293
.
Segundo José Carlos Vieira de Andrade, considerando o artigo 18, da
Constituição Portuguesa, a proteção do núcleo essencial,
(...) tem de entender-se como referido não ao direito, mas ao preceito
constitucional essa, de resto, a letra da Constituição), enquanto norma de
valor e garantia. O limite ao poder legislativo residirá, então, em não poder
ele atentar contra as exigências (mínimas) de valor que, por serem a
projecção da idéia de dignidade humana, constituem o fundamento (a
essência) de cada preceito constitucional nesta matéria. O que o legislador
não pode, sob pena de ultrapassar este limite absoluto, é destruir ou
restringir gravemente a liberdade física em geral ou a intimidade do cidadão
comum. Não pode é subverter ou desfigurar o valor e a garantia
constitucionais ínsitos em cada um dos diversos preceitos relativos aos
direitos fundamentais
294
.
Assim, admite-se a anulação dos direitos subjetivos de certos indivíduos, em
determinadas circunstâncias, mas nunca de forma ilimitada, abrangendo a todos ou
a generalidade dos domínios da vida
295
.
291
Cf. FREITAS, 2007, p. 196.
292
Cf. Ibid., p. 195.
293
Cf. PEREIRA, 2006, p. 369.
294
ANDRADE, 2004, p. 307.
295
Ibid.
94
Dentro da teoria subjetiva, a cláusula do conteúdo essencial evitaria a
violação dos direitos fundamentais como direitos subjetivos, cabendo analisar-se em
cada caso o que resta do direito em causa. O mérito da teoria seria assegurar às
pessoas uma esfera da proteção inviolável, mas, como a anterior, não explica as
situações em que os direitos fundamentais são totalmente restringidos ou
descumpridos
296
.
Propõem-se, então, alternativas mistas, em especial, motivadas pela natureza
e importância dos direitos fundamentais.
Para Konrad Hesse, o há razão para opções do tipo ou esta ou aquela
proteção, quando se trata das teorias objetiva e subjetiva, porque elas seriam
complementares, em razão da dupla dimensão objetiva/subjetiva dos direitos
fundamentais. O autor escreve:
A outra questão, se sob o núcleo absolutamente protegido dos direitos
fundamentais deve ser entendido o núcleo dos direitos fundamentais como
direitos subjetivos ou aquele de sua qualidade como garantias de conexões
de funções objetivas, não se deixa, por causa da correlação estreita de
ambos, responder no sentido de um ou-ou, mas também não no de um não-
só-mas-também. Sempre deve, sem dúvida, a função do direito fundamental
ficar conservada para a vida social em conjunto´, porque uma limitação que
abolisse essa função nunca pode ser proporcional. Em geral, também uma
limitação de direitos fundamentais, que elimina quase ou completamente
uma liberdade garantida jurídico-fundamentalmente entre o particular, será
desproporcional e, por causa disso, incompatível com o artigo 19, alínea 2,
da Lei Fundamental. Há, todavia, casos excepcionais nos quais, para o
particular, de um direito fundamental, segundo uma fórmula frequentemente
empregada, pode ´quase nada mais restar´, nos quais, porém, a limitação
de direitos fundamentais não viola o conteúdo essencial do direito
fundamental, porque ela é proporcional, como, por exemplo, a ordem de
internação de um doido perigoso em um estabelecimento fechado
297
.
Outra discussão refere-se ao alcance do conteúdo desse limite.
296
PEREIRA, 2006, p. 370. No mesmo sentido, Luiz Fernando Calil de Freitas (2007, p. 200) que
escreve: (...) do ponto de vista lógico, resultaria insubsistente qualquer possibilidade de proteção à
dimensão subjetiva se norma jusfundamental, objetivamente considerada, pudesse ter o núcleo
essencial do direito fundamental que institui livremente afetado de forma desvantajosa. Por outro
lado, igualmente sem sentido seria a hipótese de admitir-se a proteção apenas direcionada à
perspectiva objetiva, aceitando-se toda e qualquer afetação desvantajosa ao exercício de hipótese
fática incluída no núcleo essencial do direito fundamental. Na primeira hipótese a afetação objetiva da
norma jusfundamental redundaria na afetação desvantajosa da dimensão subjetiva; na segunda
alternativa, estar-se-ia retirando à norma objetivamente considerada a possibilidade de produzir
direito subjetivo”. E Luis Prieto Sanchís (2003, p. 232).
297
HESSE, 1998, p. 268. Robert Alexy (2008, p. 297) sustenta o mesmo posicionalmente, para quem
a natureza dos direitos fundamentais levaria a uma coexistência de uma teoria subjetiva e de uma
teoria objetiva.
95
A teoria relativa do conteúdo essencial apregoa que este não pode ser
determinado de forma indiscriminada, abstratamente, para todas as hipóteses, de
forma definitiva. A definição do conteúdo essencial, de cada direito fundamental,
estará condicionada por outros interesses jurídicos. Segundo essa concepção, toda
restrição exige uma justificação, no sentido de que o conteúdo essencial resulta de
uma ponderação com aqueles bens que justificam a restrição, ou seja, não se
trabalha com a idéia de um elemento fixo e permanente identificável. Essa
ponderação é feita com base no princípio da proporcionalidade
298
.
Conforme Robert Alexy, as teorias absolutas seriam contraditórias, porque a
afirmação de que não razões mais importantes que justifiquem uma determinada
restrição está correta. Contudo, para tanto, as terias absolutas apóiam-se nas teorias
relativas. Isso porque o é possível excluir princípios contrapostos, porque para se
falar de uma proteção absoluta não se pode perder de vista o fundamento relativo
dessa proteção. Para este autor, como o cleo essencial estará protegido se a
limitação ou restrição estiver justificada, com base no princípio da proporcionalidade,
ele será variável e dependerá de cada caso concreto
299
.
Em favor da teoria relativa, argumenta-se que a sua compreensão facilita a
proteção ótima do direito fundamental, já que o protege o que se encontra no
núcleo duro, mas todo o direito. Esta solução levaria a um melhor equilíbrio entre os
direitos fundamentais do indivíduo e os interesses da generalidade
300
.
Se o conteúdo essencial será definido pela aplicação do princípio da
proporcionalidade e nem sempre seo mesmo, o conteúdo essencial não aparece
como uma barreira autônoma, mas sim como um reforço do princípio da
proporcionalidade. A teoria relativa, então é criticada porque o conteúdo essencial
não aparece como critério autônomo e porque usa a metodologia da ponderação.
Isso levaria a uma flexibilidade e tornaria supérflua uma garantia que teria sido
consagrada de forma autônoma
301
.
298
Cf. FREITAS, 2007, p.196-198. No mesmo sentido, escreve Jane Reis Gonçalves Pereira (2006,
p. 371-372).
299
Diga-se que para Robert Alexy (2008, p. 301), a garantia do conteúdo essencial alemã não cria,
em relação à máxima da proporcionalidade, nenhum limite adicional à restringibilidade dos direitos
fundamentais. Ela seria equivalente a uma parte da proporcionalidade, no sentido de ser mais uma
razão a favor dessa máxima.
300
Cf. NARANJO DE LA CRUZ, 2000, p. 140.
301
Cf. PEREIRA, op. cit., p. 375.
96
Segundo Luis Prieto Sanchís, a teoria relativa teria como ponto fraco a idéia
de que, mesmo diante da cláusula do conteúdo essencial, poderia ser admitido o
sacrifício completo do direito
302
.
A teoria absoluta, por sua vez, propaga que o conteúdo essencial pode ser
determinado independentemente do caso concreto, existindo uma esfera
permanente do direito fundamental que constitui seu núcleo essencial. Nessa
concepção, então, há duas partes no direito fundamental: uma essencial, inviolável e
outra não essencial, que pode ser objeto de restrição
303
.
Consoante José Carlos Vieira de Andrade, a proteção deve ser absoluta, no
sentido de que o núcleo essencial seria um mínimo de valor inatacável e não poderia
ser afetado mesmo que um bem seja considerado superior. Com isso, o autor visa
evitar que o legislador invoque uma aparência com esse fim; conforme o autor, não
pode ser reduzido à idéia de proporcionalidade. Esse limite absoluto seria a
dignidade da pessoa, do homem concreto como ser livre, no sentido de que “A
dignidade do homem livre constitui para nós a base dos direitos fundamentais e o
princípio da sua unidade material”
304
305
.
302
PRIETO SANCHÍS, 2003, p. 233.
303
Segundo Luciano Parejo Alfonso (1981, p. 175 passim), considerando uma decisão do Tribunal
Constitucional Espanhol (de 13 de fevereiro de 1982, sobre a Lei reguladora do Estatuto de Centros
Escolares), a opção seria pelo caráter absoluto do conteúdo essencial, porém dentro de cada direito
fundamental. Segundo ele, contudo, o conteúdo essencial depende do momento histórico e das
convenções admitidas pelos especialistas, o que possibilitaria uma adaptação evolutiva no tempo.
Ressalta, entretanto, que de acordo com a mesma decisão, o certo seria que haverá lesão do
conteúdo essencial “(...) cuando la imagen del derecho que proyecta su regulación legal no es
recognoscible con precisión y en sus rasgos determinantes como perteneciente a la categoría
abstracta teórica de dicho derecho o cuando, aun siendo recognoscible como tal, aparece el derecho
en la regulación legal sujeto a limitaciones o dificultades de ejercicio más allá de lo razonable o
despojado de la protección necesaria”. Para este autor, considerando a decisão que comenta, os
limites dos direitos fundamentais seriam os seguintes: a- limites imediatamente derivados da
Constituição ou que são estabelecidos por ela mesma; b- limites mediatos ou imediatamente
derivados da Constituição pela necessidade de preservar ou proteger outros direitos fundamentais; c-
limites mediatos ou indiretamente derivados da Constituição pela necessidade de proteger ou
preservar outros bens constitucionalmente protegidos. Nesse contexto, o alcance do conteúdo
essencial como limite constitucional dos limites seria genérico, o que teria três significados. a- o
primeiro sentido seria que a exigência de respeito ao conteúdo essencial aplica-se a todos os direitos
fundamentais, ou seja, deve ser observado na hipótese de reserva de lei ou não. b- o segundo
sentido refere-se aos outros limites dos direitos fundamentais. Como se viu, os direitos fundamentais
podem ser limites expressos e específicos. Ocorre que, em nenhum caso, a garantia do conteúdo
essencial pode deixar de ser observada. O autor escreve: “(...) debe entenderse también en sentido
de ´limite de limites´, es decir, limite último, residual e infranqueable, de cualesquiera limites propios
de los derechos fundamentales o que legítimamente puedan ser impuestos a éstos”. c- finalmente, o
terceiro sentido refere-se à questão sobre tratar-se de uma condição relativa ou absoluta. Para ele, o
conteúdo essencial teria caráter absoluto.
304
ANDRADE, 2004, p. 306.
305
Segundo Gavara de Cara (1994, p. 218), por exemplo, o conteúdo essencial de todo direito
fundamental seria identificado por nter Dürig com a dignidade humana. Para este, a conseqüência
97
Para a teoria absoluta, então, o núcleo essencial de cada direito fundamental
é fixo, independentemente do caso concreto. Por outro lado, essa teoria é criticada
porque não explica as situações em que o sacrifício de um direito e também não
indica de forma clara e determinada o que demarcaria o núcleo essencial
306
.
De acordo com Luis Prieto Sanchís, a teoria absoluta teria as seguintes
dificuldades:
a) primeiro, brinda uma proteção não necessária, pois se tais direitos têm
uma natureza constitucional, a lei não poderia chegar a lesioná-los em sua
essência;
b) essa proteção absoluta pode levar à diminuição do nível das garantias,
porque se for entendido que o conteúdo essencial está respeitado, a lei
pode operar livremente na esfera do direito entendida como não essencial.
Então, toda lei que limite o conteúdo adjetivo ou periférico deveria ser
considerada legítima, ainda que arbitrária ou não justificada;
c) se os direitos fundamentais operam como princípios e o como regras, a
teoria absoluta conduza a resultados contraditórios, porque uma
intervenção pode reputar-se legítima à luz da ponderação, ou seja,
justificada, mas ilegítima à luz do conteúdo essencial, ou seja, “(...) el
tratamiento de los derechos como principios hace ineviable la idea de
derechos absolutos”
307
.
Virgilio Afonso da Silva, em sentido semelhante ao anterior, vai mais além e
rejeita a tese de que o núcleo essencial sempre deva ser preservado, porque para
ele a necessidade da dupla garantia: princípio da proporcionalidade e conteúdo
essencial gera incongruências. Segundo o autor, uma expectativa de que a
utilização do método da ponderação de bens e interesses pode ser feita desde que
não implique esvaziamento do conteúdo essencial é complicada. Em casos
específicos, após a aplicação da proporcionalidade, nada resta de um determinado
direito, como por exemplo, quando alguém tem seu sigilo telefônico devassado e
é que o titular do direito fundamental não pode ser considerado como um objeto da atividade estatal.
Nesse contexto, o conteúdo essencial será afetado quando o titular for tratado como um objeto da
atividade estatal.
306
Cf. PEREIRA, 2006, p. 373.
307
PRIETO SANCHÍS, 2003, p. 232-233.
98
suas conversas interceptadas ou quando se proíbe a exibição de determinado
programa de televisão ou a publicação de determinada matéria jornalística. É claro
que, nos exemplos indicados, pode-se recorrer à idéia de limites imanentes, mas
aqui é uma questão de suporte fático restrito e o argumento seria simples. Porém, se
houver referência à ponderação, exclusão da tese do suporte fático restrito ou
dos limites imanentes e não como fundamentar-se o fato de que a garantia do
conteúdo essencial foi violada. Isso ocorre porque se exige uma dupla garantia,
proporcionalidade e conteúdo essencial
308
.
No debate entre as teorias relativa e absoluta, também teorias
intermediárias.
Para Konrad Hesse, uma proteção contra limitações desproporcionais
efetuaria também uma proteção absoluta do núcleo essencial. Para tanto, a
proporcionalidade deveria ser entendida como a perseguição de uma finalidade, que
seria o direito fundamental limitado. O autor escreve:
Na discussão sobre a interpretação indicada no artigo 19, alínea 2, da Lei
Fundamental, é sustentada tanto a concepção, que a restrição proíbe
limitações desproporcionais como esta, que a determinação subtrai o
´núcleo essencial absolut dos direitos fundamentais da disposição do
legislador. A partir do ponto de vista aqui defendido, a proibição de
limitações desproporcionais efetua também uma proteção absoluta do
´núcleo essencial´ dos direitos fundamentais, naturalmente, sob o
pressuposto, que proporcionalidade seja entendida não no sentido de
uma perseguição de uma finalidade econômica, mas que a admissibilidade
de tal perseguição de uma finalidade, exatamente, também seja aferida ao
direito fundamental a ser limitado. Desse modo, são evitadas as debilidades
de ambas as concepções, ou seja, por um lado, uma relativização do artigo
19, alínea 2, da Lei Fundamental, por outro, o abandono dos direitos
fundamentais, que estão sob reserva legal, à disposição discricional do
legislador, que deve violar o ´núcleo essencial absoluto´ a ser
determinado não facilmente
309
.
Peter Haberle também apresenta uma teoria que procura mesclar conceitos
da teoria relativa e da teoria absoluta. Segundo ele,
Los límites inmanentes son los límites que se corresponden con el
contenido esencial o cercan a éste” e “Con la determinación de los límites
conformes a la esencia y, por ello, de los límites de las ´leyes generales´ se
precisa el contenido esencial de los derechos fundamentales, pues los
límites inmanentes cercan este contenido esencial
310
.
308
SILVA, 2006, p. 44-45.
309
HESSE, 1998, p. 267 passim.
310
HABERLE, 2003, p. 58 passim.
99
Isso quer dizer que mediante a definição dos limites imanentes também se
chega ao conteúdo essencial, pois a delimitação do direito fundamental, efetuada
pela ponderação, corresponde e encerra o conteúdo essencial. Para o autor, como
um efeito recíproco entre os direitos fundamentais, a ponderação de bens
determinará o conteúdo essencial. Isso porque o que seria próprio do conteúdo
essencial de um direito fundamental pode ser determinado por meio de uma
reflexão sobre os conteúdos essenciais de outros bens. Do conflito recíproco entre
os direitos fundamentais, interpreta-se o conteúdo essencial. Por outro lado, o autor
observa que a ponderação aqui defendida não significaria a renúncia das noções e
objetivos da teoria absoluta. Segundo ele, ela permitiria proteger de forma absoluta o
âmbito de liberdade fundamental com base em valorações. Segundo o autor, o
absoluto não pode conduzir à idéia de que o direito fundamental está diretamente na
Constituição. Ele é determinado precisamente desde o sistema coordenado do
conjunto constitucional. Esse âmbito será plenamente protegido
311
.
Finalmente, para Luis Prieto Sanchís, como não é possível determinar
abstratamente e de modo definitivo o conteúdo essencial de cada direito, podendo
somente se falar de justificação ou ponderação, essa garantia seria apenas um
argumento em branco. Entretanto, isso não quer dizer que ela seja supérflua. Para
ele, a garantia do conteúdo essencial desempenha duas funções:
a) a exigência de ponderação, no sentido de que, quanto mais se sacrifica
um direito e quanto mais se aproxima do núcleo ou essência, mais será a
exigência de justificação pela medida limitadora. Nesse contexto, a
cláusula do conteúdo essencial não seria uma exigência autônoma ou
suplementar, mas uma razão a mais a favor da ponderação;
b) ela serviria como argumento contraposto aos argumentos econômicos ou
conseqüencialistas presentes na ponderação. o se trataria de preservar
uma parte do direito, como esfera intocável, deixando o legislador livre
para a configuração da outra parte. Trata-se, sim, de comprovar ao final da
regulação legislativa se o direito pode ser reconhecido como um direito
311
HABERLE, 2003, p. 58-66. Essa posição pode ser criticada porque se os conteúdos dos limites
fazem parte do próprio conteúdo do direito e não são colocados de fora, não se pode falar de
conteúdo essencial. Dessa forma, a consideração de um determinado limite como imanente pode
servir para atravessar essa barreira. NARANJO DE LA CRUZ, 2000, p. 97.
100
constitucional, ou seja, como aquele direito que fora tutelado pela
Constituição.
Veja-se que para esse autor, a obrigação do conteúdo essencial não é um aspecto
chave. O aspecto chave estaria na exigência de justificação de qualquer medida a
disposição restritiva
312
.
Considerando o debate entre as teorias absoluta e relativa, tem-se que o
problema da questão da justificação está no fato de que a cláusula de conteúdo
essencial perderia sua característica de garantia autônoma, tornando desnecessária
a previsão expressa
313
.
É o que aponta Mariano Bacigalupo, para quem a garantia do conteúdo
essencial teria perdido sua operatividade em virtude do princípio da
proporcionalidade. Conforme o autor, isso ocorre porque, caso se passe pela
verificação prévia, que geralmente é a prova da proporcionalidade, o invasão
do conteúdo nuclear ou núcleo duro do direito fundamental limitado. Haveria,
segundo ele, ainda, uma certa autonomia porque, em alguns casos, demonstra-se a
necessidade de manter a garantia do conteúdo essencial como critério autônomo.
Todavia, hoje em dia, seria difícil não se reconhecer que a garantia do conteúdo
essencial tenha ficado reduzida a um “(...) filtro subsidiario y acessorio del principio
da proporcionalidad, por muy necesaria que, ciertamente, sea tal función”
314
.
Ressalte-se que, nem sempre, a garantia de preservação do núcleo essencial
é vista de uma forma positiva.
Ignácio de Otto y Pardo sustenta que a existência do núcleo essencial cria,
em verdade, um paradoxo, pois ao mesmo tempo em que essa garantia persegue o
fortalecimento dos direitos fundamentais, também leva a uma direção oposta, ou
seja, de enfraquecimento. No caso da teoria relativa, a relativização seria manifesta,
312
PRIETO SANCHÍS, 2003, p. 235-238.
313
Nesse sentido, escreve Jane Reis Gonçalves Pereira (2006, p. 375-376), para quem do ponto de
vista metodológico, a teoria relativa seria a mais adequada para explicar os casos concretos. A sua
adoção, contudo, implica em tirar um sentido autônomo da garantia. Escreve: “(...) ou se entende que
o núcleo essencial é uma grandeza absoluta, caso em que não critérios consistentes que
permitam demarcá-lo, nem tampouco é possível explicar inúmeras situações em que a compressão
dos direitos é inevitável; ou se entende que se trata de uma garantia relativa – equivalente à
exigência de proporcionalidade das restrições mas então se torna imperativo reconhecer que o
conteúdo essencial é, em última análise, um instituto desvestido de sentido jurídico útil autônomo, no
máximo, desempenhar um papel de reforço da exigência de justificação nas hipóteses em que os
direitos sofram restrições severas”.
314
BACIGALUPO, 1993, p. 301-302.
101
porque exige apenas um discurso contra ou a favor da norma que regula o
conteúdo. No caso da teoria absoluta, haveria uma proteção singularizada, pois se
um núcleo duro, também uma parte periférica, totalmente desprotegida
315
.
Essa discussão teria levado a discussões sobre a relativização dos direitos
fundamentais, não de forma negativa, mas como afirmação de historicidade e
exigência de constante atualização de um direito
316
.
No Brasil, como ocorre com os outros “limites dos limites”, também não
previsão expressa quando à proteção do núcleo essencial. Resta saber se ele deve
ser observado.
Para Dimitri Dimoulis e Leonardo Martins, inexiste a necessidade de
preservação do núcleo essencial no caso das restrições. Estes autores escrevem:
(...) a ausência de disposição expressa, assim como a particular dificuldade
em estabelecer o conteúdo nuclear de um direito leva à conclusão de que
inexiste tal requisito limitador das intervenções legislativas. Como se verá,
todas as limitações impostas ao direito pelo legislador devem satisfazer o
critério da proporcionalidade que tutelará conteúdos essenciais do direito
limitado. Mas a isso não deve ser acrescentado um dever autônomo de
315
Segundo o autor, uma zona limitável e outra, essencial, inacessível a limitação. Hoje, contudo,
o legislador somente pode limitar um direito fundamental se estiver constitucionalmente habilitado e
sempre na medida deste; além disso, todo limite deve ser justificado; e, por fim, a justificação não
pode implicar um inteiro sacrifício do direito. Considerando isso, chega-se ao problema teórico da
garantia do conteúdo essencial, uma vez que, se a limitação por si já está limitada pela
necessidade de justificação, o conteúdo essencial não agregaria nada. E, na medida em que se
considere o conteúdo essencial como algo distinto da justificação, o resultado será a relativização dos
direitos fundamentais. Por isso, nunca se poderá abrir mão da justificação. Obra citada. p. 128 a 129.
No mesmo sentido, Rafael Naranjo de la Cruz (2000, p. 78), para quem os poderes públicos estão
vinculados aos direitos e liberdades e esta vinculação estende-se a todo o direito fundamental e não
somente ao conteúdo essencial. Essa vinculação implica a necessidade de considerar
inconstitucional toda e qualquer atividade legislativa que implique uma limitação por si só, ou seja,
deve sempre haver uma justificação.
316
Luciano Parejo Alfonso (1981, p. 170) também visualiza um duplo caráter, sem que isso implique
prejuízo aos direitos fundamentais. O duplo caráter significaria um negativo e um positivo. O negativo
estaria ligado à idéia de proibição e limitação do legislador em relação ao direito fundamental. O
positivo seria o de afirmação dos direitos fundamentais. O autor escreve: “(...) la garantía de un
contenido esencial en determinados derechos constitucionales ofrece, como es claro, tanto un
aspecto negativo de prohibición o limitación al legislador ordinario cuanto positivo de afirmación de
una sustancia inmediatamente constitucional en dichos derechos; aspectos que se reconducen a la
fijación en el máximo nivel normativo de un orden material de valores en el que se expresan los
superiores que informan la totalidad del ordenamiento y que constituye el suporte mismo de la
decisión constituyente entendida como un todo”. Ana Maria Ávila Lopes (2004, p. 14) aponta a
contradição levantada por Ignácio de Otto y Pardo e observa que essa relativização pode ser vista de
forma positiva. Segundo a autora, O pensamento de Otto y Pardo tem provocado interessantes
discussões a respeito da relativização dos direitos fundamentais em virtude da incorporação da
garantia do conteúdo essencial em um sistema no qual já existe o controle de constitucionalidade das
leis. A doutrina e a jurisprudência têm predominantemente aceito a relativização, que não sob o
ponto de vista negativo, mas, justamente, como a afirmação da historicidade e da exigência da
constante atualização de um direito”.
102
preservar um suposto núcleo que aumentaria o risco de avaliações
subjetivas da constitucionalidade de leis regulamentadoras
317
.
Por outro lado, no Brasil, porque não previsão expressa da garantia do
núcleo essencial, não necessidade de enfrentar todas as incoerências colocadas
nos tópicos anteriores. Não há, aqui, o problema de explicar porque uma garantia
expressamente positivada o ostenta significado jurídico autônomo e
independente. Assim a teoria relativa, aqui, poderia ser incorporada com maior
facilidade
318
.
Jane Reis Gonçalves Pereira escreve:
(...) a idéia de conteúdo essencial pode ser identificada com algumas regras
argumentativas insertas na aplicação do princípio da proporcionalidade em
sentido estrito, as quais jogam como razões em favor da preservação dos
direitos no processo de ponderação. Essa leitura é compatível com o
sistema de direitos fundamentais estatuído na Constituição de 1988,
podendo ser de grande valia no esforço de racionalização da jurisprudência
nessa seara
319
.
O conteúdo essencial teria apenas, então, uma missão discursiva, levando a
regras argumentativas
320
.
Entretanto, segundo Luiz Fernando Calil de Freitas,
(...) uma interpretação conjunta dos enunciados do artigo 60, §4º, IV, do
artigo 5º, I, do artigo 1º, III, e do artigo 4º, II, todos da Constituição da
República, conduz à conclusão de que o núcleo essencial dos direitos
fundamentais goza de proteção no sistema constitucional brasileiro
321
.
317
DIMOULIS; MARTINS, 2008, p. 168.
318
Cf. PEREIRA, 2006, p.376 et. seq.
319
Ibid., p. 382.
320
Em sentido semelhante, Ana Maria D´ Ávila Lopes (2004, p. 08), para quem a garantia do
conteúdo essencial seria apenas complementar aos princípios da ponderação de bens e da
proporcionalidade.
321
FREITAS, 2007, p. 195. No mesmo sentido Suzana de Toledo Barros (2003, p. 104), para quem
“(...) o princípio da proporcionalidade é concretizado diretamente da essência dos direitos
fundamentais e a ausência da cláusula sobre o conteúdo essencial dos direitos fundamentais em
nossa Constituição o obsta o seu reconhecimento”. Alem disso, para ela, a cláusula traria um
reforço da fundamentalidade de alguns direitos. Considerando o debate entre as teorias relativa e
absoluta, afirma que uma não eliminaria a outra. Antes disso, uma conciliação significaria avanço na
interpretação dos direitos fundamentais. Ela escreve que: “(...) Para não se permitir o relativismo
constante do conteúdo desses direitos – o que poderia gerar uma ineliminável distorção de fins
contrária à idéia de proteção é necessário julgar as razões das restrições a partir de um dado
previamente fixo (conteúdo essencial), embora se deva valorizar uma solução que, prestigiando a
concordância prática entre os vários bens concorrentes, possa definir limites mais elásticos aos
direitos (mais além ou mais aquém daquilo que teoricamente se poderia prever como limite absoluto),
dada a situação apresentada).
103
Da mesma forma, Paulo Ricardo Schier, em que pese argumentos de uma filosofia
garantista assumida pela Constituição de 1988, a fundamentação da preservação do
núcleo essencial, no Brasil, estaria vinculada de forma direta à compreensão da
extensão das cláusulas pétreas, por conta da redação do artigo 60, §4º, da CF/88:
“não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir (...)”
322
.
José Joaquim Gomes Canotilho, analisando a cláusula de irreversibilidade
como método de proteção dos direitos fundamentais (como a contida na
Constituição Brasileira, art. 60, §4º), afirma, também, que ela teria como grande
função a reafirmação do cleo essencial dos direitos fundamentais. Conforme o
autor, os limites materiais de revisão incidem sobre os princípios e sobre a disciplina
material dos direitos, não sobre a formulação lingüística. Como, para ele, um
núcleo duro, um núcleo essencial comum irrevisível ou um complexo de núcleos
essenciais, sempre se colocará a questão de saber o que pode e o que não pode
ser objeto de leis de revisão. Essa resistência dos núcleos essenciais dos direitos
fundamentais poderia significar que se pretende estabelecer, quanto a eles, um
reforço de proteção. Entretanto, se os direitos fundamentais podem ser objeto de leis
de revisão, como fica a declaração de irrevisibilidade. Ocorre que o núcleo essencial
ou os núcleos essenciais não resistem às leis de revisão por conta da cláusula de
irrevisibilidade, mas porque eles não podem ser intangíveis, pelo caráter de direito
superior. Considerando isso, o método dessa cláusula de barreira parece não ter
grande relevo. No entanto, ela teria três funções:
322
Como observa o autor, as cláusulas pétreas são barreiras de proteção contra a ação do poder
constituinte revisor, resguardando determinados bens constitucionais e direitos. Essa proteção
alcança eventual atividade de redução de direito direta ou virtual, pois serão inconstitucionais as
emendas que, diretamente, afrontem as cláusulas pétreas e as emendas que as afetem
tendencialmente. Escreve: “Nesta seara, portanto, qualquer intervenção do poder reformador que
direta ou indiretamente atingir a existência de um direito fundamental consagrado como pétrea será,
inequivocadamente, inconstitucional”. Considerando isso, se a afetação, mesmo que virtual, do
direitos fundamentais, é vedada ao poder constituinte derivado, seria certo que ela alcança a
atividade do legislador infraconstitucional. O raciocínio seria o de que, se o pode o mais – poder de
emenda –, também não é possível o menos – atuação do legislador. Escreve: “Trata-se, logo, de uma
leitura que em certa medida busca evitar certa espécie de fraude à Constituição. Com isso tem-se
que, uma vez reconhecida a legitimidade do legislador ordinário no sítio da afetação restritiva dos
direitos fundamentais, esta autorização o configura, sob hipótese alguma, um ´cheque em branco´.
Ao realizar sua atividade, evidentemente legítima no plano constitucional, de restrição e delimitação
do campo eficacial dos direitos fundamentais, não estará o legislador autorizado a tudo, eis que, se
diretamente ou indiretamente, mesmo que sob o pretexto de realização de ponderação constitucional
autorizada explícita ou implicitamente, mesmo que imbuído das melhores intenções, abolir (restrição
excessiva) direitos fundamentais, restará configurada a inconstitucionalidade. Logo, a tutela do núcleo
essencial, na Constituição de 1988, encontra fundamentação na proteção das cláusulas pétreas,
sendo dela uma decorrência. Este é o sustentáculo de aplicação do referido princípio em nosso
sistema”. SCHIER, 2007, p. 69-70.
104
(1) funções de clarificação da positividade constitucional dos limites
materiais implícitos (´núcleos essenciais´); (2) funções de individualização
das normas constitucionais infringidas para efeitos de fiscalização
jurisdicional sucessiva das leis de revisão; (3) função de advertência política
e constitucional quanto à bondade intrínseca ou material de projectos de leis
de revisão perturbadores das dimensões fundamentais dos direitos,
liberdades e garantias.
323
Finaliza-se com Paulo Ricardo Schier, para quem a preservação de um dever
autônomo do núcleo essencial do direito restringido tem sentido. Isso porque a
jurisdição constitucional, no Brasil, é muito diferenciada, no sentido de que a
percepção do intérprete constitucional com relação à dogmática dos direitos
fundamentais no Supremo Tribunal Federal é diferente daquela prevalente nos
demais Tribunais e na primeira instância
324
. Nesse contexto, a defesa da existência
de um dever de tutela do núcleo essencial poderia encorajar o aplicador do direito a
reconhecer situações de inconstitucionalidade que não reconheceria. Alerta-se,
entretanto, que essa defesa possui caráter pedagógico e serviria, pelo menos, para
alertar o intérprete de que as cláusulas pétreas vão além de uma proteção exclusiva
contra emendas. Também seria um lembrete de que a atividade de restrição
legislativa não possui um cheque em branco
325
326
.
323
Para o autor, “No fundo, a articulação das dimensões constitutivas essenciais (´os princípios´, os
´núcleos essenciais´) com as dimensões declarativas de irrevisibilidade permite uma aproximação
constitucionalmente mais sustentada à discutida intangibilidade do catálogo de direitos, liberdades e
garantias”. Além disso, o relevo prático da cláusula estaria associado a nível do ônus da prova.
Segundo o autor, quem propõe a supressão de um preceito formulador de um direito fundamental
deverá demonstrar que a eliminação do texto escrito não implica em redução dos princípios ou núcleo
essencial do bem protegido. Finalmente, conclui que: Em rigor, ela não proíbe a restrição de direitos,
liberdades e garantias através de leis de revisão, o que colocaria as leis de revisão com mais limites
do que as próprias leis ordinárias restritivas (cfr. art. 18º/2). Impede, porém, que o ´legislador
constitucional´ aproveite a natureza constitucional da lei de revisão para ultrapassar o limite de
qualquer direito: o núcleo essencial”. CANOTILHO, 2008, p. 139-144.
324
Para o autor, haveria “(...) uma maior dificuldade de manipulação de categorias da dogmática dos
direitos fundamentais fora do âmbito dos tribunais superiores”. Aqueles estariam contaminados por
leituras positivistas, relutariam em reconhecer os direitos fundamentais implícitos, resistiriam à
aplicação dos princípios da proporcionalidade, impediriam o acesso direito à constituição e
valorizariam demasiadamente o papel da lei em detrimento da Constituição. SCHIER, 2007, p. 71.
325
Ibid.
326
Magdalena Lorenzo Rodriguez Armas (1996, p. 233-236), faz bela defesa da necessidade de
manutenção da cláusula do conteúdo essencial. Segundo ela, em verdade, hoje, não se tem certeza
qual seja o conteúdo essencial, até porque esse conceito precisaria de um estudo constante. De toda
sorte, seria prudente defender-se a estabilidade do conteúdo essencial contra uma postura tendente
a eliminá-lo dos textos constitucionais, por considerá-lo um resíduo dos efeitos do segundo pós-
guerra. Para ela, o “(...) contencial puede servir plenamente en la defensa del Estado de Derecho. Si
no queremos incurrir en errores cometidos en el pasado, propiciadores de los desastres beligerantes
conocidos por todos, aprendamos a reconocer la potencialidad de un instrumento (a nuestro alcance)
como el contenido esencial: ¡démosle eficacia plena y así conoceremos ese potencial!”. Embora, para
ela, seja quase impossível definir o conteúdo essencial, diante dum Estado cada vez mais
105
Certo é que, qualquer afetação do conteúdo essencial do direito fundamental
é inconstitucional e não dúvidas de que em alguns casos, essa violação será de
fácil verificação.
Neste trabalho, restará demonstrado que o Tribunal Superior do Trabalho não
está atento à dogmática dos direitos fundamentais. Além disso, ao menos no caso
do artigo 7º, inciso XVI, da Constituição Federal, quando trata da remuneração das
horas extras, restará demonstrado que a identificação do conteúdo essencial é de
fácil realização e isso evitaria a determinação do pagamento apenas do adicional de
horas extras ou a compensação de 1 hora extra por 1 hora de descanso.
interveniente, ele é um grande instrumento de defesa. Escreve: hoje “(...) el Estado-aparato se
convierte en una maquinaria potente que interviene cada vez con mayor intensidad en la vida de la
comunidad. En este sentido, no es arriesgado considerar la protección del contenido esencial de los
derechos fundamentales y libertades pública como el arma al que hace un momento nos referíamos:
arma anti-tirania de los poderes públicos”. Considerando isso, a autora fornece um conceito: “El
contenido esencial es la expresión jurídico-positivada de valor intrínseco de cada uno de los derechos
fundamentales y libertades públicas que reconoce la Constitución española, resultado de la
conjunción entre el valor da dignidad humana (´fundamento del orden político y de la paz social´) y el
núcleo radical do propio de cada derecho o libertad que tiene que ver con sus manifestaciones
particulares (internas y externas o relativas a su ejercicio)”. Assim, para a autora, cada uma das
normas de direitos fundamentais daria dados, elementos e pistas desse conteúdo. A essas normas
seriam somados os protagonistas dos direitos fundamentais, como órgãos e grupos, como é o caso
do Tribunal Constitucional e da doutrina constitucional. Finalmente, para evitar que o tempo e as
circunstâncias impliquem uma relativização do conteúdo essencial, porque se trata de um conceito
modificável, a autora agrega a dignidade humana. Para ela então, além das particularidades de cada
norma, (...) el núcleo del contenido, su elemento más contencial y primero es la propia ´dignidade
humana´, valor que es absoluto en cualquiera de la coordenadas de tiempo o espacio que se quiera
contemplar”.
106
4 A POSTURA DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO EM RELAÇÃO ÀS
RESTRIÇÕES AOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DOS TRABALHADORES
O objetivo do presente trabalho é demonstrar que o Tribunal Superior do
Trabalho não está suficientemente atento nas questões que se referem às restrições
aos direitos fundamentais do trabalhador.
Quatro exemplos ilustram a questão: a estabilidade da empregada gestante; o
número de dirigentes sindicais; a possibilidade de monitoramente do e-mail do
empregado pelo empregador e a compensação de horas extras, com pagamento
apenas do adicional, de 1 hora extra trabalhada por 1 hora de descanso e mediante
acordo tácito ou escrito direto com o empregado.
Por se concordar que necessidade de transparência da matéria, adota-se
as concepções principais da teoria externa, não de uma forma definitiva, mas com
vistas a testar a constitucionalidade das questões indicadas, porque tais conclusões
trazem maior objetividade e racionalidade na questão das restrições aos direitos
fundamentais. Considerando isso, para efeitos desse trabalho, os direitos
fundamentais dos trabalhadores serão concebidos como um modelo misto, de regras
e princípios e partindo-se de um suporte fático amplo e, portanto, restringíveis.
4.1 ESTABILIDADE DA EMPREGADA GESTANTE
A empregada gestante tem direito à estabilidade provisória, conforme
previsão contida no artigo 10º, inciso II, alínea “b”, do ADCT/88:
Art. 10. Até que seja promulgada a lei complementar a que se refere o art.
7º, I, da Constituição:
(...)
II – fica vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa:
(...)
b) da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco
meses após o parto.
Trata-se de um direito fundamental que procura preservar a dignidade da
mulher, como mãe e do nascituro. Como escreve Airton Pereira Pinto,
107
Em razão da condição sexual, na forma do comando constitucional, em seu
art. 5º, caput e inciso I, não deverá haver distinção de direito quando este
não depender de condição especial, em razão da particularidade do sujeito
a ser protegido.
O direito fundamental que se agiganta contra diferenciações entre sujeito,
que podem e deve ter condições iguais ao ser violado, propicia a quebra da
ética social das garantias. O julgador ao tomar conhecimento de despedida
de gestante deve reintegrá-la ao seu posto de trabalho, reparando injusta e
arbitrária violência à sua dignidade e à do nascituro
327
.
A estabilidade é a vantagem jurídica do empregado, de caráter permanente,
em virtude de alguma circunstância, que assegura de forma indefinida o nculo de
empregado, independentemente da vontade do empregador
328
. No caso da
empregada gestante, entretanto, não uma estabilidade de forma indefinida, mas
provisória, ou seja, uma garantia no emprego. A garantia no emprego é a vantagem
jurídica do empregado, de caráter transitório, em virtude de alguma circunstância, no
caso, a gravidez, que assegura o vínculo de empregado por um lapso de tempo,
independentemente da vontade do empregador
329
.
Como indica Amauri Mascaro Nascimento:
(...) a estabilidade no emprego, assim considerado o direito do empregado
de manter o emprego mesmo contra a vontade do empregador, salvo
causas previstas em lei. É a estabilidade no sentido jurídico. Esta subdivide-
se em estabilidade definitiva e estabilidade transitória, aquela produzindo
efeitos para toda a relação de emprego, esta somente enquanto persistir um
causa especial que a motiva
330
.
Isso quer dizer que, atualmente, a empregada gestante, desde a concepção
ou confirmação da gravidez, não pode ser dispensada, salvo o cometimento de justa
causa. Caso seja dispensada, a empregada poderá postular a imediata reintegração
no emprego
331
.
Anteriormente, entretanto, o Tribunal Superior do Trabalho, por meio de
Súmulas, criou algumas restrições a esse direito fundamental. Uma delas era a
impossibilidade da reintegração da gestante. Segundo o entendimento do tribunal,
327
PINTO, 2006, p. 182.
328
Cf. DELGADO, 2006, p. 1242.
329
Cf. Ibid., p. 1248-1249. No mesmo sentido MAIOR, 2008, p. 471 et. seq. CARVALHO, 2007, p. 503
et. seq. MARTINS, S., 2008, p. 391 et. seq.
330
NASCIMENTO, 2001, p. 585.
331
Cf. Ibid., p. 761.
108
aquele direito fundamental asseguraria somente o direito aos salários e vantagens
correspondentes ao período e reflexos
332
. Como observou Airton Pereira Pinto,
Quanto à estabilidade da gestante em seu trabalho, a orientação do
Tribunais Superiores no País tem dado pouca atenção à tutela
socioeconômica que o comando pretendeu imprimir. Titubeiam no momento
de garantir o direito ao emprego, aplicando-se o direito constitucional. O
legislador constituinte não quis valorar a indenização do período de
estabilidade, mas desejou orientar a sociedade de que é salutar a garantia
do emprego da mulher, naquelas condições, sem prejuízo de outras.
Chamados a opinar sobre a estabilidade da gestante com direito à
reintegração, em caso de dispensa imotivada, pois segundo a norma
constitucional ela tem ´direito à licença maternidade sem prejuízo do
emprego´, os Tribunais têm vacilado em não ver naquela norma um direito
humano social fundamental da mulher. O seja, mesmo após a promulgação
da Constituição Federal garantindo proteção de emprego, a Súmula n. 244
do TST ainda não foi revogada, ou revisada, para dar compreensão melhor,
em consonância com a nova ordem constitucional
333
.
Hoje, contudo, o Tribunal Superior do Trabalho admite a reintegração
334
.
Outra restrição, autorizada por Orientação Jurisprudencial, referia-se à
necessidade de comunicação ao empregador da gravidez. Segundo o antigo
entendimento do Tribunal Superior do Trabalho, o empregador não precisava
conhecer o estado de gravidez para que houvesse direito à estabilidade, salvo
previsão contrária em acordo coletivo. Ou seja, caso o acordo coletivo exigisse que o
empregador fosse comunicado sobre a gravidez e isso não tivesse ocorrido, a
empregada gestante não tinha direito à estabilidade
335
.
Após decisão em sentido contrário, por parte do Supremo Tribunal Federal
336
,
o Tribunal Superior do Trabalho reviu sua posição, revogando aquela Orientação e
colocando o item I, na atual redação da Súmula 244: “I O desconhecimento do
332
Cf. OLIVEIRA, 2007, p. 467. Antiga redação da mula 244 do TST: “A garantia de emprego à
gestante não autoriza a reintegração, assegurando-lhe apenas o direito a salários e vantagens
correspondentes ao período e seus reflexos”.
333
PINTO, 2006. p. 218.
334
Cf. OLIVEIRA, loc. cit. Atual redação da Súmula 244/II do TST: “A garantia do emprego à gestante
autoriza a reintegração se esta se der durante o período de estabilidade. Do contrário, a garantia
restringe-se aos salários e demais direitos correspondentes ao período de estabilidade”.
335
Cf. Ibid. De acordo com a O.J. 88: “Gestante. Estabilidade provisória. O desconhecimento do
estado gravídico pelo empregador, salvo previsão contrária em norma coletiva, não fasta o direito ao
pagamento da indenização decorrente de estabilidade (art. 10, II, b, ADCT)”.
336
Segundo a ementa da decisão, “A empregada gestante tem direito subjetivo à estabilidade
provisória prevista no art. 10, II, “b”, do ADCT/88, bastando, para efeito do acesso a essa iderrogável
garantia social de índole constitucional, a confirmação objetiva do estado fisiológico de gravidez,
independentemente, quanto a este, de sua prévia comunicação ao empregador, revelando-se írrita,
de outro lado e sob tal aspecto, a exigência de notificação à empresa, mesmo quando pactuada em
sede de negociação coletiva”. Supremo Tribunal Federal. Rel. Celso de Melo, processo n.º 448.572-
SP. Agravo de Instrumento.
109
estado gravídico pelo empregador não afasta o direito ao pagamento da indenização
decorrente da estabilidade (art. 10, II b, do ADCT).”
As duas restrições anteriores eram inconstitucionais e demonstram a não
aplicação da dogmática específica do direito constitucional para tais casos, ou seja,
verificabilidade de tais restrições quanto ao princípio da reserva legal, princípio da
proporcionalidade e preservação do conteúdo essencial.
Antes, todavia, de demonstrar a afirmação anterior, o que coadunaria com
os objetivos propostos do trabalho, resta indicar uma outra discussão corrente sobre
a empregada gestante, que se refere à “confirmação da gravidez”.
Para alguns, quando o dispositivo constitucional prevê que o termo inicial da
estabilidade provisória é “a confirmação da gravidez” está referindo-se à confirmação
médica até eventual demissão, ou seja, desconsiderando aquelas hipóteses em que
a própria empregada desconhece a gravidez. É o que afirma Francisco Antonio de
Oliveira:
A nova redação deveria premiar a exigência de confirmação objetiva do
estado fisiológico. Ao assim não fazer, incentivará que a gestante não faça
a confirmação e ajuíze ação muitos meses depois, buscando a reintegração
com todos os direitos, inclusive salários atrasados.
Pelo princípio da razoabilidade, essa confirmação deveria ter um prazo para
que o empregador não tivesse conhecimento, por ausência de confirmação,
pudesse colocar a gestante sob a égide da Previdência.
Do modo como ficou a redação, aplica-se a culpa objetiva na sua inteireza,
bastando o estado gravídico, ainda que o empregador não tenha tomado
conhecimento ou mesmo que, por ocasião da dispensa, nem a gestante
tivesse conhecimento do seu estado gravídico.
(...)
Em resumo: A Excelsa Corte, ao proibir a indicação de prazo para
confirmação em norma coletiva, não liberou a necessidade de confirmação.
De resto, nesse sentido o comando constitucional (art. 1-, I, b, ADCT).
Dissemos nos Comentário aos precedentes normativos e às orientações
jurisprudenciais do TST (2. ed., RT, 2004, p. 240-243), que a redação da
Orientação Jurisprudencial 88 da SDI-1, na nossa opinião, deveria ser a
seguinte: ´O desconhecimento do estado gravídico pelo empregador não
afasta o direito ao pagamento da indenização decorrente da estabilidade
(art. 10, II, c, do ADCT), desde que confirmada a gravidez´
337
.
337
OLIVEIRA, 2007, p. 468. No mesmo sentido, BORBA; BORBA, 1995. CARVALHO, 2007, p. 511.
Este último, entretanto, reconhece que o Supremo Tribunal Federal condiciona a estabilidade apenas
ao fato objetivo da gravidez. Escreve: “Como o preceito normativo não contém palavras vazias de
algum significado, sempre preferimos entender que a aquisição de estabilidade se dava a partir de
quando a empregada obtinha, por meio idôneo, a confirmação de sua gravidez, ainda que dela o
tivesse conhecimento o empregador. Mas a já referida posição do STF, que detém qualificadamente a
guarda do texto constitucional, no sentido de condicionar a estabilidade apenas ao fato objetivo da
gravidez, parece prevalecer”.
110
No mesmo sentido, Sérgio Pinto Martins, que vai um pouco mais além,
afirmando expressamente que se a empregada desconhece sua gravidez, não
haveria direito à estabilidade:
Desconhecendo a empregada a sua gravidez quando da dispensa, menos
ainda teria condições de saber o empregador. O empregador não tem como
ser responsabilizado se a empregada não o avisa de que está grávida. Não
se pode imputar a alguém uma conseqüência a quem não deu causa. Na
data da dispensa não havia qualquer óbice à dispensa da trabalhadora, pois
naquele momento não estava comprovada a gravidez ou era impossível
constatá-la. Logo, não houve dispensa arbitrária com o objetivo de obstar o
direito à garantia de emprego da gestante
338
.
Todos esses entendimentos, da mesma forma que os anteriores do Tribunal
Superior do Trabalho, restringem, inconstitucionalmente, o direito fundamental à
estabilidade provisória da empregada gestante, em especial, nos casos em que esta
não saiba da gravidez. A confirmação da gravidez a que se refere o artigo
constitucional não é e não poderia ser o teste de gravidez, mas a confirmação da
data em que se deu a concepção.
Conforme indica Jorge Luiz Souto Maior, “A aquisição de tal direito por parte
da gestante independe de ter havido comunicação expressa ao empregador, pois a
obrigação decorrente por parte do empregador é de natureza objetiva, isto é, não
depende de que tenha a ciência do fato em si da gravidez”
339
.
Como isso, quer-se dizer que a expressão “confirmação” indica a data da
concepção, aporque o objetivo da norma é de impedir a dispensa da trabalhadora
338
MARTINS, S., 2008, p. 407. Aliás, para esse autor, inclusive, como dúvidas sobre o significado
da palavra “confirmação”, o entendimento anterior, segundo o qual havia necessidade de informar o
empregador sobre a gravidez, caso houvesse norma coletiva nesse sentido, estaria correto. Segundo
este autor, “Algumas normas coletivas estabelecem que a empregada tem de comunicar ao
empregador dentro do período de 30 dias após o término do contrato de trabalho, para ter direito ao
emprego. Decorrido o referido prazo, há a perda do direito. Entendo que essa determinação da norma
coletiva não viola a Constituição, que não é clara sobre o significado da palavra ´confirmação´, que
pode, portanto, ser interpretada e complementada pela via negocial. Pode-se entender que as partes
são livres na estipulação de regras trabalhistas, conforme o art. 444 da CLT, desde que não
contrariem as normas de proteção ao trabalho. No caso, não se está contrariando qualquer norma de
proteção ao trabalho, pois controvérsia sobre a palavra ´confirmação´ contida no ADCT, além do
que traz maior segurança à relação jurídica entre empregado e empregador”.
339
MAIOR, 2008, p. 483. No mesmo sentido Alice Monteiro de Barros (2002, p. 325), que escreve:
“Continuamos nos filiando às correntes doutrinárias e jurisprudencial segundo as quais a gravidez da
empregada se vincula à teoria do risco objetivo, do risco social, porquanto o Direito do Trabalho o
protege, simplesmente, o conhecimento da gravidez, nem sua divulgação, mas a gestação, na sua
grandeza biológica. O termo ´confirmar´ não altera o critério objetivista, sufragado pelos Tribunais do
Trabalho, segundo os quais a ´garantia de emprego´ e a licença-maternidade independem da
comunicação da gravidez ao empregador”.
111
grávida e, embora haja a proteção da empregada gestante, a maior proteção visada
seria a do nascituro
340
.
Os entendimentos anteriores do Tribunal Superior do Trabalho, no sentido de
não ser possível a reintegração no emprego da empregada gestante, bem como a
possibilidade de cláusula coletiva exigindo a comunicação do empregador da
gravidez, para gerar o direito à estabilidade, tratava-se de nítida restrição a um
direito fundamental, tanto que foram modificados. Da mesma forma, o entendimento
que exige a confirmação para viabilizar eventual reintegração, no sentido desta não
ser possível caso a empregada desconheça seu estado, trata-se de uma restrição.
Em todos esses casos, não se observam os requisitos para a possibilidade de
restrição, ou seja, os “limites dos limites”, pelo que as restrições deveriam ou devem
ser consideradas inconstitucionais.
No caso da Orientação Jurisprudencial e da Súmula do Tribunal Superior do
Trabalho, ao se permitir a criação da exigência de uma comunicação e impedir a
reintegração da empregada, em qualquer hipótese, cria-se uma nova figura. Em
nenhum desses casos referência ao dispositivo constitucional ou uma
interpretação de âmbito de proteção, por exemplo. Trata-se, portanto, de uma
inovação ou criação, que ofende o princípio da reserva legal. No caso da dúvida
sobre o que significa o termo “confirmação”, a questão poderia ser resolvida no caso
concreto. Se a questão for sumulada, impedirá nas hipóteses em que a empregada
desconhece a gravidez, eventual Recurso de Revista
341
, implicando, também, uma
violação ao mesmo princípio. Por exemplo, casos em que a mulher somente
percebe o estado gravídico quando está muito próximo de dar à luz e um
entendimento, como o combatido, inviabilizará o principal objetivo do artigo
constitucional. Por isso, deve-se evitar, na ausência de lei, uma decisão em caráter
geral e abstrato, como restou demonstrado no tópico sobre as reservas de lei.
Segundo, as “interpretações” indicadas não visavam atingir salvaguardar um
outro direito fundamental ou bem constitucional, portanto, são inadequadas. No
máximo, o direto de propriedade do empregador e a livre iniciativa
342
. Isso porque,
340
Cf. decisão citada na nota de número 109 por MAIOR, 2008, p. 483.
341
Aqui, como não há essa Súmula, não se tratará dessa afirmação de forma mais detida. Entretanto,
quando for tratada a questão do dirigente sindical, ficará mais claro o que se quer dizer com isso.
342
Como afirma Airton Pereira Pinto (2006, p. 219), “A falta desta efetiva proteção contra o
desemprego, em período comprovadamente delicado e difícil da empregada que decide ser mãe, com
incremento pelo Estado de políticas públicas de incentivo à manutenção de seus postos de trabalho,
pelas empresas, demonstra um paradoxo entre a existência de normas constitucionais de garantia e a
112
sob o ponto de vista empresarial, afirma-se que a estabilidade seria uma restrição ao
poder de comando do empregador, que fica impossibilitado de agir livremente,
dispensando o empregado no momento que julgar oportuno e sem maiores
entraves. Afirma-se, também, que o empregado estável pode acomodar-se,
deixando de realizar corretamente seu trabalho e levando a prejuízos
343
.
Caso as medidas indicadas sejam consideradas adequadas, passa-se à
análise da necessidade. No caso da impossibilidade da reintegração, com
pagamento dos salários e vantagens do período correspondente, não
necessidade desta medida. Ambas, reintegração ou pagamento de salários, em
tese, podem acarretar os mesmos prejuízos a um suposto direito fundamental ou
bem constitucional a ser protegido, portanto, era desnecessária. Quanto aos óbices
para a geração do direito à estabilidade, talvez, sim, houvesse preservação de um
direto de propriedade do empregador e a livre iniciativa, nos moldes acima
indicados.
Contudo, aparentemente, nenhuma dessas medidas passa pelo crivo da
proporcionalidade em sentido estrito. Além de não garantirem um direito fundamental
expresso, eliminam o princípio da dignidade humana, da mãe e do nascituro, porque
impossibilitam o sustento de ambos, inclusive porque, no caso da impossibilidade de
restrição, indicava-se que não deveriam ser deferidas medidas liminares que
visassem garantir, imediatamente, o sustento da empregada grávida. Isso tudo em
nome do comando do empregador e de um suposto acomodamento do empregado.
O peso maior, aqui, parece ser aquele que visa proteger a dignidade da mãe e da
criança. Acresça-se que a prevalência das regras sobre os princípios e a prevalência
dos direitos fundamentais considerando a dignidade humana devem ocorrer, como
indicado no tópico 4.2.3.3 desta. No caso, o artigo que prevê a estabilidade não
deixa muita margem sobre os pressupostos, conseqüências e objetivos.
Finalmente, qualquer uma das três restrições afeta o conteúdo essencial do
direto fundamental, que no caso pode ser entendido como a dignidade humana da
mãe e do nascituro, uma vez que, em nome de uma livre iniciativa e direito de
inefetiva valorização que o Estado, Poder judiciário e a sociedade têm dispensado ao tema da
proteção da família, da mulher, da criança e do adolescente. Propende maior valor aos interesses
econômicos das empresas que aos interesses sociais”.
343
Cf. NASCIMENTO, 2001, p. 590.
113
propriedade do empregador, impede-se ou se restringe a garantia de sustento da
mãe e da criança no período de gestação e pós-gestação
344
.
Com isso, demonstra-se que o Tribunal Superior do Trabalho, nos dois
primeiro casos, não estava atento aos requisitos para a admissão de restrições aos
direitos fundamentais.
4.2 O LIMITE DO NÚMERO DE DIRIGENTES SINDICAIS
A Constituição Federal de 1988, no artigo 8º, inciso VIII, veda a dispensa do
empregado dirigente sindical, enquanto durar seu mandato, salvo o cometimento de
falta grave:
Art. 8º. É livre a associação profissional ou sindical observado o seguinte:
(...)
VIII é vedada a dispensa do empregado sindicalizado a partir do registro
da candidatura a cargo de direção ou representação sindical e, se eleito,
ainda que suplente, até um ano após o final do mandato, salvo se cometer
falta grave nos termos da lei.
Esse dispositivo garante, então, a estabilidade provisória ou garantia no
emprego do dirigente sindical e tem como objetivo evitar represálias por parte do
empregador em razão de serem postulados direitos para a categoria e para
possibilitar a própria negociação.
Isso quer dizer que e conforme o artigo constitucional, em regra, o empregado
eleito dirigente somente poderá ser dispensado, a partir do registro da candidatura
até após 1 ano do encerramento do mandato, no caso de cometimento de um fato
que ensejo à justa causa e após a apuração mediante inquérito judicial. Caso
contrário, se a dispensa for imotivada, o empregado poderá postular sua
reintegração no emprego. É o que escreve Amauri Mascaro Nascimento:
344
Quando se tratar da Súmula 85/TST, a questão da definição do conteúdo essencial, mesmo
considerando a polêmica entre a teoria relativa e a teoria absolta, ficará clara. As considerações feitas
naquele ponto serão aplicáveis aqui. Embora este tópico seja importante, como a matéria está
parcialmente superada, os argumentos sobre o conteúdo essencial foram deixados para a Sumula
que ainda está em vigor.
114
Havendo falta grave apurada em inquérito judicial perante a Justiça do
Trabalho, é lícita a rescisão do contrato de trabalho. A dispensa imotivada é
nula de pleno direito, ainda que acompanhada de todos os pagamentos
devidos ao empregado estável. Reintegração no emprego é o direito do
estável quando ilegalmente afastado, não de forma cautelar, mas através de
reclamação trabalhista, caso em que, uma vez reintegrado, fará jus a todos
os direitos do período de afastamento, como se a relação de emprego o
tivesse sido interrompida
345
.
A Consolidação das Leis do Trabalho, entretanto, no artigo 522, limita o
número dos dirigentes sindicais, nos seguintes termos:
Art. 522. A administração dos sindicatos será exercida por uma diretoria
constituída, no máximo, de sete e, no mínimo, de três membros e de um
conselho fiscal composto de três membros, eleitos esses órgãos pela
assembléia geral.
O artigo 8º, inciso I, da Constituição Federal, por outro lado, proibiu qualquer
interferência ou intervenção na organização dos sindicatos:
Art. 8º. É livre a associação profissional ou sindical, observado o seguinte:
I – a lei não poderá exigir autorização do Estado para a fundação de
sindicato, ressalvado o registro no órgão competente, vedadas ao Poder
Público a interferência e a intervenção na organização sindical.
Essa situação é apontada como um conflito entre os dispositivos
constitucionais e o dispositivo celetista. É o que observa Jorge Luiz Souto Maior:
No que tange ao número de dirigentes do sindicato, há nítido conflito entre a
norma constitucional que veda a interferência e a intervenção na
organização sindical (art. 8º, inciso I) e o art. 522, da CLT, que determinava
que a administração do sindicato será exercida por uma diretoria constituída
no máximo de sete e no mínimo de três membros e de um Conselho Fiscal
composto de três membros, eleitos esses órgãos pela Assembléia Geral´.
Ora, pela Constituição está proibida ao Poder blico qualquer interferência
na organização sindical e não interferência maior que esta de fixar o
número dos membros da diretoria do sindicato
346
.
Num primeiro momento, a jurisprudência teria entendido que o artigo celetista
era inconstitucional, porque implica uma interferência proibida pela Constituição.
Entretanto, por conta de supostos abusos cometidos por alguns sindicatos, passou-
345
NASCIMENTO, 2001, p. 862. No mesmo sentido, MAIOR, 2008, p. 479. CARVALHO, 2007, p.
504.
346
MAIOR, op. cit., p. 479-480.
115
se a decidir em sentido contrário
347
. O Tribunal Superior do Trabalho, mais tarde,
sumulou a matéria (369, inciso II):
369. DIRIGENTE SINDICAL. ESTABILIDADE PROVISÓRIA.
(...)
II – O art. 522 da CLT, que limita a sete o número de dirigentes sindicais, foi
recepcionado pela Constituição Federal de 1988.
Nesse contexto, não se tem reconhecido a estabilidade de outros dirigentes
sindicais além da quantificação contida no artigo 522 da CLT
348
.
Por conta do que se viu nos capítulos anteriores, o artigo 522 da CLT
restringe dois direitos fundamentais dos trabalhadores: a estabilidade do dirigente
sindical e a não interferência e intervenção pelo poder estatal na organização
sindical, além de outros de forma reflexa.
Na hipótese, como não se trata de uma reserva legal, que o artigo 8º, inciso
I, quando dispõe “nos termos da lei” está se referindo às hipóteses de falta grave, a
liberdade de restrição é mais reduzida. Isso quer dizer que o poder Judiciário deve
exercer um maior controle no que tange à restrição, porque, no caso, a restrição
somente pode ser fundamentada numa autorização legal tácita para salvaguardar
outros direitos fundamentais ou outros bens constitucionais.
Como visto no capítulo 3, todas as restrições devem observar o princípio da
reserva legal, o princípio da proporcionalidade e a preservação do conteúdo
essencial.
Na hipótese, aponta-se que a reserva legal exercida (não duvidas sobre o
fato de que o princípio da reserva legal foi observado) está baseada na prevenção
de eventuais abusos que os sindicados possam realizar e assegurar o direito do
empregador de exercer seu direito de dispensa ou de não dar garantia de emprego.
347
Cf. MAIOR, 2008, p. 480.
348
Cf. CARVALHO, 2007, p. 507. Arnaldo Süssekind é um dos que concorda com a limitação contida
no artigo 522 da CLT. Segundo ele, “Sempre entendemos que o direito do empregador de denunciar
o contrato de trabalho, respeitando, obviamente, as normas legais pertinentes, só pode ser limitado
por lei. Dtermos concluído, com Délio Maranhao, que ‘enquanto a lei não dispuser prevendo outros
critérios de limitação do número de diretores do sindicato, de prevalecer a norma do art. 522 da
CLT, sob pena de sujeitar-se o empregador, na relação contratual com seu empregado, ao arbítrio da
entidade sindical, o que não se coaduna, obviamente, com a própria idéia de direito´. Depois de
decisões contraditórias, sobretudo no âmbito dos Tribunais Regionais do Trabalho, o TST, através da
SDC, afirmou: ´a recepção pelo art. 8º da Constituição Federal, dos arts. 522 e 543 da CLT, limitando,
portanto, a estabilidade dos dirigentes sindicais ao número previsto em lei´, tranqüilizando, nesse
sentido, a jurisprudência da mais alta Corte trabalhista. E a Suprema Corte, em acórdão da lavra do
Ministro CARLOS VELLOSO, confirmou esse entendimento”. SÜSSEKIND, 2004, p. 386.
116
É o que afirma Sérgio Pinto Martins, para quem o entendimento contido na
Súmula está correto, porque teria o objetivo de evitar abusos, no sentido de evitar
manobras por parte dos sindicatos visando assegurar o direito de estabilidade para
apadrinhados e a perpetuação no poder, por meio da extensão da garantia a um
número excessivo de pessoas
349
. Segundo este mesmo autor, o artigo 522 da CLT
também visaria garantir os direitos e liberdade dos outros, no caso, dos
empregadores em não dar garantia de emprego
350
. Com base nisso, esse autor
procura justificar a restrição ao direito fundamental em questão:
Ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa a não ser em
virtude de lei (art. 5º, II, da Constituição). Esse preceito deve ser
interpretado sistematicamente com o inciso I do artigo da mesma norma.
Logo, é possível que a lei ordinária estabeleça certas limitações, para a
garantia do exercício de direitos, não havendo qualquer irregularidade.
Nada impede, portanto, que a lei ordinária limite certas situações. (...) A
Constituição não restringe o número de dirigentes sindicais, nem essa é
matéria constitucional, que fica a cargo da lei ordinária. No caso do art. 522
da CLT, não intervenção do Estado, mas mera disciplina por parte da lei.
O direito de a lei limitar o número de dirigentes sindicais não excede a
autonomia interna do sindicato, pois atinge direitos e liberdades de outros
(dos empregadores em dar garantia de emprego), que devem ser protegidos
por lei
351
.
Os direitos fundamentais ou bens constitucionais que se pode estar cogitando
devem ser, então, a possibilidade de o empregador dispensar todos os empregados,
mediante o pagamento da multa de 40% do FGTS e as verbas rescisórias,
considerando o artigo 7º, inciso I; o direito de propriedade do empregador, art. 5º,
caput e inciso XXII, porque é dono do negócio, e a livre iniciativa, art. 170, todos da
Constituição Federal de 1988.
Observe-se que o argumento do abuso de direito não pode ser aceito, porque
não pode ser pressuposto. Como escreve Jorge Luiz Souto Maior,
349
MARTINS, 2007, p. 263.
350
Ibid., p. 262.
351
Ibid. O Supremo Tribunal enfrentou a matéria, entretanto, a fundamentação do acórdão é
semelhante à utilizada por Sérgio Pinto MARTIS, ou seja, não se faz referência ao princípio da
proporcionalidade, embora se esteja diante de uma restrição a um direito fundamental. Nos termos do
acórdão, “A liberdade sindical se nos limites da lei. A observância, aliás, dos limites da lei é
característica do Estado de Direito. Permitir que o sindicato, em nome da liberdade sindical, possa
criar direitos, em detrimento da outra parte, quando disposição legal estaria a impedir essa
ocorrência, seria fazer tabula rasa do princípio da legalidade que deve ser observado nas relações
entre Estado e indivíduo, associações e entre entidades sindicais”. Supremo Tribunal Federal (2ª
Turma). n.ª 193.345-3. Recurso Extraordinário.
117
Não como pressupor o abuso, impedindo que o direito seja exercido, a
porque a figura do abuso pressupõe o exercício do direito. O abuso, por
definição, pressupõe a existência de um direito. Assim, o abuso, no caso, só
pode ser configurado pelo uso indevido da condição de dirigente sindical e
da proteção jurídica que lhe é conseqüente. Se o trabalhador exercer,
efetivamente, uma função sindical relevante para a categoria, não se pode
impor-lhe óbice jurídico
352
.
A questão deve ser resolvida com base no princípio da proporcionalidade e
seus subprincípios.
O fim pretendido é limitar o número de dirigentes sindicais estáveis e isso,
num primeiro momento, sem muita reflexão, aparentemente, o artigo 522 da CLT
realiza. Nesse sentido, é o que escreve Sérgio Pinto Martins:
O princípio da razoabilidade mostra que o número de membros do sindicato
deve ser razoável, que é o que faz a CLT. Caso não se estabelecesse um
limite, o sindicato poderia formar uma diretoria com todos os membros da
categoria, conduzindo à situação de todos serem estáveis, o que o seria
razoável. Da mesma forma, seria desarrazoada uma reunião de diretoria
com inúmeros membros, que mais se assemelharia a uma assembléia
353
.
No mesmo sentido Francisco Antonio de Oliveira, para quem:
O item sumular é oportuno, pois existe uma tendência de alargar-se o
benefício a um número bem maior de dirigentes sindicais com o objetivo de
buscar a segurança no emprego. Entretanto, sem que a normatização para
a espécie seja modificada, a conclusão razoável é a de que a Constituição
atual recepcionou o preceito expresso no art. 522 da CLT
354
.
Em tese, a medida é adequada se fosse concebida apenas para fomentar a
limitação do número de dirigentes sindicais. Por outro lado, o desmembramento de
determinados sindicatos, para que seja possível a correta representação de uma
base muito grande, pode implicar o aumento do número de empregados estáveis.
Neste caso, o artigo, que procura limitar o número de empregados estáveis pode
levar ao efeito contrário, além de reduzir e muito a força e representatividade dos
sindicatos. Porém, além disso, a medida não garante a livre iniciativa ou o direito de
propriedade, porque a estabilidade não foi criada em detrimento desses direitos.
Como escreve Jorge Luiz Souto Maior, a estabilidade não necessariamente significa
352
MAIOR, 2008, p. 480.
353
MARTINS, 2007, p. 262.
354
OLIVEIRA, 2007, p. 653.
118
um entrave para o direito de propriedade ou a livre iniciativa do empregador, nem
significa também a possibilidade de o empregado fazer o que bem entender:
(...) se o empregado é estável no emprego essa situação por si não
constitui nenhum mal, muito pelo contrário. É preciso criar a cultura de se
conviver com o instituto de estabilidade, tanto por parte do empregador
quanto por parte do empregado, pois a estabilidade não significa nenhum
empecilho à realização dos objetivos empresariais do empregador ao
mesmo tempo em que não se constitui uma carta branca para o empregado
descumprir suas obrigações pertinentes à relação de emprego. Não se
nega, como dito, que alguns sindicatos tenham cometidos abusos, criando
cargos de direção sem nenhuma relevância para a ação sindical, mas os
abusos devem ser examinados caso a caso e nesse exame o parâmetro
não é o art. 522, que, nitidamente, não fora recepcionado pela Constituição
Federal (...)
355
.
A medida, assim, tem mais razões para ser considerada inadequada e,
portanto, inconstitucional.
Todavia, supondo-se que a medida seja adequada, quanto à necessidade,
não se imagina outra que possa ser usada, com a mesma eficácia, para limitar o
número de dirigentes sindicais. Se se pretende que sejam apenas 10, o artigo
cumpre esse papel. Por outro lado, outras medidas que garantem a livre iniciativa
e o direto de propriedade e não inferem na liberdade sindical, ou seja, a medida é
desnecessária. Como exposto, a estabilidade não pode ser considerada,
necessariamente, um mal.
O artigo, entretanto, não passa pelo crivo do princípio da proporcionalidade
em sentido estrito. Considerando os princípios da liberdade sindical e o direito de
propriedade do empregador, em conjunto com a livre iniciativa, não parece correto
impedir que demandas sejam levadas aos tribunais superiores, por meio de Recurso
de Revista ou Recurso Extraordinário, limitando, assim, “abstratamente”, o número
de dirigentes sindicais.
De fato, pode-se admitir que o legislador pode indicar o número de dirigentes
sindicais estáveis, mesmo em face do contido no art. 8º, inciso I, da CF/88 e dos
princípios da adequação e necessidade. No entanto, o número de 10 dirigentes nem
sempre será proporcional.
Como indica Jorge Luiz Souto Maior, o entendimento contido da mula do
TST está equivocado, porque
355
MAIOR, 2008, p. 481.
119
Ampliar o número de pessoas estáveis não é um mal, muito pelo contrário.
O abuso não está na integração de um maior número de pessoas no
sindicato, tendo como efeito a aquisição de estabilidade especial, conferida
pelo inciso VIII, do art. , pois a constituição livre de um sindicato é o
exercício de um direto constitucional
356
.
Em muitos casos, por conta do grande número de empregados que são
representados por um único sindicato, 10 dirigentes é muito reduzido. Como observa
Jorge Luiz Souto Maior,
(...) uma categoria profissional, geralmente, não é formada apenas por
empregados de uma única empresa. A categoria abrange, por imposição
constitucional, no mínimo a extensão de um Município. Assim, os dirigentes
se diluem entre vários empregadores. A partir dessa constatação, ademais,
o limite máximo de 10 (dez) dirigentes (7 membros na Diretoria e 3 no
Conselho Fiscal) sequer parece razoável para vários sindicatos com enorme
número de representados. Ademais, se a preocupação é limitar o número
de estáveis, isso de fato não se dá, pois o efeito é subdivisão da categoria,
com a criação de vários sindicatos muito deles sem representatividade
alguma. O ideal é a formação de sindicatos fortes e sólidos e não de
sindicatos de fachada
357
.
Conforme já observado, a estabilidade não necessariamente significa um
entrave para o direito de propriedade ou a livre iniciativa do empregador, nem
significa a possibilidade de o empregado fazer o que bem entender. Entretanto, pelo
contrário, em vários casos, em detrimento dos trabalhadores e dos sindicatos, a
limitação do número de dirigentes sindicais pode significar um entrave na luta por
melhores condições de trabalho e a implementação e preservação de vários direitos.
O artigo 522 da CLT, então, se não pode ser declarado que é inconstitucional,
em abstrato, ao menos, em determinadas hipóteses, ou seja, em concreto, se
inconstitucional, por desrespeito ao princípio da proporcionalidade em sentido
estrito. Além do que, no caso concreto, caso constatado o abuso por parte de
determinados sindicatos, a estabilidade prevista no artigo constitucional poderá ser
ponderada e afastada. A regra restritiva poderá sobrepor-se.
Ocorre que, como a Súmula 269/I/TST declara constitucional o artigo, isso
impede que sindicatos com uma base muito grande questionem a
constitucionalidade em concreto do artigo, por ofensa ao princípio da
proporcionalidade. Isso porque, embora caiba Recurso de Revista contra uma
decisão proferida por um Tribunal Regional, o recurso dificilmente seadmitido, por
356
MAIOR, 2008, p. 480.
357
Ibid., p 480-481.
120
conta da barreira criada por outra Súmula, a de número 333, segundo a qual “Não
ensejam recursos de revista (...) decisões superadas por interativa, notório e atual
jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho”. Segundo a Súmula, o artigo 522
da CLT sempre é constitucional.
Considerando todo o exposto, resta demonstrado que o Tribunal Superior do
Trabalho, neste caso, não observou a dogmática específica para a admissão de
restrição aos direitos fundamentais, admitindo de forma geral e abstrata uma
restrição sem considerar a necessidade de observância do princípio da
proporcionalidade.
4.3 O MONITORAMENTO DO E-MAIL DO EMPREGADO PELO EMPREGADOR
Recentemente, o Tribunal Superior do Trabalho enfrentou uma questão que
foi apontada como sendo um conflito entre o direito de propriedade do empregador e
o direito de privacidade do empregado. Na hipótese, discutia-se uma justa causa
imputada porque o empregado estava remetendo, do seu e-mail corporativo, no local
e horário de trabalho, fotos com mulheres nuas.
O empregador, utilizando-se de provas obtidas com o acesso ao e-mail do
empregado, demitiu este com a alegação de justa causa. Em primeira instância a
justa causa foi revertida, com base no artigo 5º, inciso X e XII da Constituição
Federal que prevêem:
art. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes:
(...)
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das
pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral
decorrente de sua violação;
(...)
XII - é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações
telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último
caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer
para fins de investigação criminal ou instrução processual penal;
E, porque, a prova foi obtida por meio ilícito.
121
O recurso ordinário da empresa foi julgado procedente e a justa causa foi
mantida.
O empregado interpôs Recurso de Revista.
Na hipótese, dentre os dispositivos constitucionais citados, ou seja, dentro do
direito fundamental de privacidade, enquadra-se o e-mail do empregado, porque se
trata de uma comunicação privada
358
. Por outro lado, o envio de mensagens, via
correio eletrônico, depende de um computador, um contrato de acesso e todo o
aparato técnico, que tem custos e um proprietário, que é a empresa. Aponta-se,
então, um conflito entre direito de privacidade do empregado e direito de
propriedade do empregador.
Considerando esse conflito, verificam-se três posições bem claras.
Uma que declara a possibilidade de monitoramento e rastreio do correio
eletrônico do empregado. Trata-se, por exemplo, do posicionamento de Arion Sayão
Romita, para quem o direito de privacidade não é e não pode ser absoluto. Segundo
ele, o STF admite a violação quando se tem a
(...) suspeita da prática de infração penal (...) e das comunicações que
comprometem a moral e os bons costumes, ou seja, em todas as hipóteses
que aviltem o interesse social ou se trate de proteger ou resguardar direitos
ou liberdade de outrem, também constitucionalmente assegurados
359
.
Ocorre que, segundo Arion Sayão Romita, seria freqüente, na prática, o
empregado utilizar o computador da empresa para receber mensagens criminosas,
envolvendo a exploração de sexualidade infantil, enviar mensagens humorísticas ou
pornográficas, enfim, usar o meio para fins pessoais e particulares, alheios ao
trabalho e mesmo incompatíveis com este
360
. Para ele, o entendimento de que os e-
mails dos empregados jamais poderão ser violados, no sentido de que uma conduta
nesse sentido, por parte do empregador, seria uma interferência na vida privada do
trabalhador, abusiva e contrária à boa-fé objetiva que deve imperar na relação
358
Conforme apontam OLIVEIRA NETO; COELHO, 2003, p. 189. Para eles, a CF/88, além de
assegurar o direito à privacidade, assegura o sigilo de correspondência, no art. 5º, inc. XII. Como o
texto fala em sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das
comunicações telefônicas, extensão ao e-mail, porque este é uma forma de comunicação privada.
No mesmo sentido, entende Victor Drumond, para quem o enquadramento deve ser o mais amplo
possível e nesse contexto o correio eletrônico é comunicação privada e como tal estaria protegido
pela Constituição, porque enquadrado na correspondência e comunicação de dados. Ou seja, “(...) é
matéria constitucionalmente prevista e protegida a privacidade nos meios comunicacionais (e não
comente na Internet)”. DRUMMOND, 2003, p. 84-85.
359
ROMITA, 2007, p. 303.
360
Ibid., p. 304.
122
contratual, estaria equivocada. Para o autor, esta posição é insustentável
361
, porque
ela poderia gerar abusos inadmissíveis e abrir ensejo à prática de atos ilícitos
362
.
Outra posição, intermediária, admite a ingerência do empregador nos e-mails
do empregado, por conta do direito de propriedade. Ela seria intermediária,
entretanto, porque essa ingerência dependeria da autorização do empregado.
Conforme Victor Drummond, para tanto, há necessidade de alguns pressupostos:
a) a empresa deveria comunicar que toda e qualquer mensagem poderá ser
lida pelo departamento de informática;
b) a empresa deve comunicar aos funcionários que eles podem ter acesso a
qualquer correio particular que lhes diga respeito, sem que sejam
observados ou acedidos por parte da empresa e que esta nunca poderá
ter acesso a eles.
Por conta disso, a empresa poderia limitar um conteúdo a circular, razoável e que
não cause o alegado congestionamento na rede.
Este autor escreve:
Deste modo a empresa mantém seu controle sobre seu próprio aparato e os
funcionários possuem sua liberdade de comunicação com a devida
privacidade. O direito de propriedade da empresa fica preservado, bem
como o direito à privacidade dos funcionários resta intacto. Não
penetração no estado de privacidade dos funcionários
363
.
361
Arion Sayão Romita (2007, p. 305-307) apresenta quatro distinções que seriam suficientes para
fundamentar sua posição: 1- o e-mail não se identifica com a correspondência postal, de sorte que a
proteção constitucional do sigilo de correspondência não se aplica ao chamado correio eletrônico
(mas, como é comunicação e como o sigilo também é protegido pela Constituição, os e–mails
enviados ou recebidos pelo empregado estariam cobertos pela proteção do sigilo de comunicação);
2- a função social do contrato (art. 421, do CCB) exige o fiel cumprimento das obrigações, as quais se
regem pelos princípios da execução de boa-fé e da confiança recíproca, que se traduzem nos
deveres de lealdade, fidelidade e obediência; 3- quanto à possível ilicitude da prova (já que o uso
para fins particulares ensejaria a justa causa do empregado), o poder de fiscalização do empregador
poderia ser validamente exercido, através de programas de computador; 4- cogita-se da inserção de
uma cláusula contratual que permite ao empregador fiscalizar, mas para o autor esta seria
despicienda, porque o controle derivaria do poder de direção.
362
Ibid., p. 304-305.
363
DRUMMOND, 2003, p. 90. No mesmo sentido, Henrique de Faria Martins (2008), para quem a
privacidade do empregado não pode ser derrogada por contrato, contudo ela não seria absoluta.
Escreve: “A caixa de correios eletrônicos utilizada pelos empregados não deve ser considerada
privativa, pois a utilização adequada da mesma seria para receber e enviar e-mails cujos assuntos
deveriam ser relacionados exclusivamente ao trabalho desenvolvido pelo respectivo empregado na
empresa”. Para ele, então, havendo aviso e anuência prévia por escrito do empregado, pode haver o
monitoramente e/ou leitura do conteúdo dos e-mails do empregado. Além disso, “No local de trabalho,
o empregador tem uma preocupação legítima para que o empregado não divulgue informações
confidenciais da empresa a outrem ou que não transmita e-mails com conteúdo não apropriado que
123
Por fim, uma terceira posição rejeita qualquer ingerência do empregador no e-
mail do empregado, mesmo que haja autorização.
Para Alberto Emiliano de Oliveira Neto e Luciano de Toledo Coelho,
considerando os dispositivos do Código Civil de 2002 que tratam da função social do
contrato e da vedação do abuso de direito, bem como da boa-fé objetiva, o
empregador não pode ter essa ingerência, ou seja, não pode monitorar e acessar o
correio eletrônico do empregado. Segundo eles, “As teorias que justificam o poder
diretivo devem ser revistas. Não se pode aceitar que a propriedade dos meios de
produção, por exemplo, justifique a violação de garantais fundamentais do indivíduo,
asseguradas constitucionalmente”
364
.
Estes autores, inclusive, rebatem o posicionamento de Arion Sayão Romita.
Para eles, concordando com este último autor, o uso do computador da empresa,
em hora e loca de expediente, para transmissão de conteúdo pornográfico ou não
relacionado com o trabalho, implica em justa causa. Contudo, o problema está na
forma pela qual o empregador fará a prova. Eles, então, concluem: “Certamente, a
violação do e-mail pessoal do trabalhador faltoso não poderá ser admitida. Não
dúvida de que existem outras maneiras de verificar o comportamento faltoso desse,
maneiras que não violem as garantias constitucionais e os princípios do novo Código
Civil”
365
.
Para Alberto Emiliano de Oliveira Neto e Luciano de Toledo Coelho, porque
os direitos de personalidade são indisponíveis, dentre os quais se inserem o direito à
privacidade, não possibilidade de autorização ou cláusula contratual permitindo a
monitoração ou acesso aos e-mails
366
.
não sejam relacionados ao trabalho, tais como materiais pornográficos ou piadas para não
sobrecarregar a rede da empresa causando, em alguns casos, a perda de conexão resultando ou não
recebimento de arquivos importantes ou na necessidade de aquisição de placas de memória para
ampliação da capacidade dos sistemas. Sem mencionar o recebimento de vírus que podem vir
anexados a e-mails e que podem causar um dano irreparável, como foi o caso do vírus ´I Love You´.
Em contrapartida, o empregado espera que sua vida privada será devidamente respeitada pelo
empregador, inclusive com relação às informações contidas em sua caixa de correios eletrônicos”.
Segundo o autor, então, informada a forma de utilização do e-mail, com fiscalização e monitoramento
e mediante ciência e autorização do empregado, a prática seria possível
364
OLIVEIRA NETO; COELHO, 2003, p. 196.
365
Ibid., p. 198.
366
Escrevem: “Os e-mails dos empregados, ainda que versem sobre assuntos que não tenham
ligação com a atividade laboral, jamais poderão ser violados, inclusive nos casos em que houver
previsão contratual vedando a utilização do correio eletrônico para assuntos particulares. Eventual
cláusula inserida no contrato de trabalho nesse sentido será tida como nula, ante a presunção de
coação no momento da contratação”. Ibid., p. 200.
124
No mesmo sentido, o posicionamento de Antonio Silveira Neto e Mario
Antonio Lobato Paiva, para quem
(...) é inadmissível a interceptação de mensagens eletrônicas dos
empregados no âmbito da empresa, com intuito de verificar o seu conteúdo,
mesmo quando o propósito de se evitar atos ilícitos. Faz-se necessário
ordem judicial para que o e-mail possa ser lido, sob pena de violação da
regra constitucional esculpida no art. 5º, inciso XII, da Carta Política
367
.
O Tribunal Superior do Trabalho posicionou-se sobre a matéria e entendeu
que a utilização de e-mail enviado pelo empregado não se trata de prova ilícita e
pode ser utilizado para fundamentar eventual rescisão por justa causa. A ementa do
acórdão foi a seguinte:
PROVA ILÍCITA. ´E-MAIL´ CORPORATIVO. JUSTA CAUSA. DIVULGAÇÃO
DE MATERIAL PORNOGRÁFICO. 1. Os sacrossantos direitos do cidadão à
privacidade e ao sigilo de correspondência, constitucionalmente
assegurados, concernem à comunicação estritamente pessoal, ainda que
virtual (´e-mail´ particular). Assim, apenas o e-mail pessoal ou particular do
empregado, socorrendo-se de provedor próprio, desfruta da proteção
constitucional e legal de inviolabilidade. 2. Solução diversa impõe-se em se
tratando do chamado ´e-mail´ corporativo, instrumento de comunicação
virtual mediante o qual o empregado louva-se de terminal de computador e
de provedor da empresa, bem assim do próprio endereço eletrônico que lhe
é disponibilizado igualmente pela empresa. Destina-se este a que nele
trafeguem mensagens de cunho estritamente profissional. Em princípio, é
de uso corporativo, salvo consentimento do empregador. Ostenta, pois,
natureza jurídica equivalente à de uma ferramenta de trabalho
proporcionada pelo empregador ao empregado para a consecução do
serviço.3. A estreita e cada vez mais intensa vinculação que passou a
existir, de uns tempos a esta parte, entre Internet e/ou correspondência
eletrônica e justa causa e/ou crime exige muita parcimônia dos órgãos
jurisdicionais na qualificação da ilicitude da prova referente ao desvio de
finalidade na utilização dessa tecnologia, tomando-se em conta, inclusive, o
princípio da proporcionalidade e, pois, os diversos valores jurídicos
tutelados pela lei e pela Constituição Federal. A experiência subministrada
ao magistrado pela observação do que ordinariamente acontece revela que,
notadamente o ´e-mail´ corporativo, não raro sofre acentuado desvio de
finalidade mediante a utilização abusiva ou ilegal, de que é exemplo o envio
de fotos pornográfica. Constitui, assim, em última análise, expediente pelo
qual o empregado pode provocar expressivo prejuízo ao empregador. 4. Se
cuida de ´e-mail´ corporativo, declaradamente destinado somente para
assuntos e matérias afetas ao serviço, o que está em jogo, antes de tudo, é
o exercício do direito de propriedade do empregador sobre o computador
capaz de acessar à INTERNET e sobre o próprio provedor. Insta ter
presente também a responsabilidade do empregador, perante terceiros,
pelos atos de seus empregados em serviço (Código Civil, art. 932, inc. III),
bem como que está em xeque o direito à imagem do empregador,
367
SILVEIRA NETO; PAIVA, 2003, p. 12-13. Concorda-se com este posicionamento, especialmente
porque os argumentos, que serão trazidos ao final do artigo, demonstram a inconstitucionalidade de
posição diversa e da decisão tomada pelo Tribunal Superior do Trabalho. Esse posicionamento é
“mais proporcional”.
125
igualmente merecedor de tutela constitucional. Sobretudo, imperativo
considerar que o empregado, ao receber uma caixa de ´e-mail´ de seu
empregador para uso corporativo, mediante ciência prévia de que nele
somente podem transitar mensagens profissionais, não tem razoável
expectativa de privacidade quanto a esta, como se vem entendendo no
Direito Comparado (EUA e Reino Unido). 5. Pode o empregador monitorar e
rastrear a atividade do empregado no ambiente de trabalho, em ´e-mail´
corporativo, isto é, checar suas mensagens, tanto do ponto de vista formal
quanto sob o ângulo material ou de conteúdo. Não é ilícita a prova assim
obtida, visando a demonstrar justa causa para a despedida decorrente do
envio de material pornográfico a colega de trabalho. Inexistência de afronta
ao art. 5º, incisos X, XII e LVI, da Constituição Federal” (Autos de n.º 00613-
2000-013-10-00-7)
368
.
Segundo a decisão, o “e-mail” corporativo é uma ferramenta de trabalho e o
que estaria em questão seria o exercício do direito de propriedade do empregador e
a sua responsabilidade perante terceiros por atos de seus empregados, dentre
outros argumentos colocados abaixo.
Há, portanto, um conflito de direitos fundamentais: a privacidade do
empregado versus o direito de propriedade do empregador e como tal deveria ser
resolvido.
De duas, uma: o Tribunal pode entender que não direito de privacidade
neste caso, considerando que essa hipótese fática não faz parte do suporte fático do
direito fundamental a privacidade; ou o Tribunal pode reconhecer que há uma
restrição ao direito fundamental e, assim, deveria utilizar a dogmática especifica,
averiguando se a medida utilizada está adequada ao princípio da proporcionalidade.
Na hipótese, o Tribunal afirmou que “o empregado, ao receber uma caixa de
´e-mail´ de seu empregador para uso corporativo, mediante ciência prévia de que
nele somente podem transitar mensagens profissionais, não tem razoável
expectativa de privacidade”. Portanto, na hipótese, houve uma limitação do suporte
fático, o implicando um conflito com o Direito de Propriedade. Ressalte-se,
entretanto, que não parece que seja essa a intenção do Tribunal. A leitura integral
do acórdão demonstra a procura de argumentos para dar um peso maior ao direito
de propriedade do empregador.
De toda sorte, o problema é que, seguindo o raciocínio do suporte fático
restrito, uma simples comparação descarta o afastamento do direito de privacidade.
Por exemplo, os banheiros também são de propriedade da empresa e nem por isso
se admite a instalação de câmeras neles para vigiar as atividades em tais locais. Da
368
Tribunal Superior do Trabalho (1ª Turma). único: 00613-2000-013-10-00. Agravo de
Instrumento.
126
mesma forma, os telefones são de propriedade do empregador e ninguém admite a
utilização de escutas telefônicas sem autorização judicial
369
.
Na hipótese, então, a solução deve partir de um suporte fático amplo, sob
pena de se admitir que as duas hipóteses anteriores também não fazem parte do
direito de privacidade. A utilização de um suporte fático amplo implica a colisão entre
o direito de privacidade do empregado e o direito de propriedade do empregador;
isso requer a utilização de dogmática específica.
Observe-se que num dos votos, houve referência aos princípios da
proporcionalidade. Como se infere no corpo do acórdão,
No Brasil, penso que não razão par adotar solução diferente. Sem mais,
é imperativo notar também que não direito absoluto e que na concepção
de direito justo repousa a necessidade de observância do princípio da
proporcionalidade como mecanismo destinado a evitar a excessiva proteção
a um direito em detrimento de outro (destacamos).
A tentativa e referência ao princípio da proporcionalidade estão certas, mas,
infelizmente, a referência foi apenas retórica, porque o princípio não foi aplicado a
sua integralidade, ou seja, contemplando seus subprincípios.
Os principais argumentos utilizados para justificar o monitoramente e rastreio
do e-mail corporativo do empregado seriam os seguintes:
a) toda a estrutura de utilização do e-mail pertence à empresa e os dados
seriam de sua propriedade;
b) o poder de direção do empregador, que implica o direito de organização,
controle e disciplina, admite a interceptação das mensagens;
c) como a empresa é responsável pelos atos dos seus empregados, contra
terceiros, a fiscalização seria legítima;
d) o e-mail não implica privacidade, porque pode ser lido por qualquer
administrador do provedor pelo qual passou a mensagem
370
.
Cada um dos argumentos utilizados para autorizar o monitoramento e rastreio
dos e-mails dos empregados não pode ser admitido
371
.
369
SILVEIRA NETO; PAIVA, 2003, p. 11.
370
Conforme apontam SILVEIRA NETO; PAIVA, loc. cit. Esses argumentos estão quase que na
integralidade presentes na ementa do acórdão do Tribunal Superior do Trabalho.
371
Conforme rebatem SILVEIRA NETO; PAIVA, loc. cit.
127
O poder de direção, por si só, não justifica a autorização para o
monitoramento e controle, porque o direito à privacidade trata-se de um direito
fundamental, que também deve ser preservado. A intromissão na esfera intima para
o exercício do poder de direção seria abuso de direito.
Além disso, segundo Antonio Silveira Neto e Mario Antonio Lobato Paiva:
(...) o monitoramento do e-mail do empregado impede o exercício do direito
à liberdade de expressão, do direito à crítica e até de reflexão sobre as
condições de trabalho. De sorte que, a interceptação das mensagens
impede que o trabalhador possa discutir, com os demais as formas de
desempenho das funções, os desgostos com os superiores, a desconfiança
de uma prática ilícita e a reivindicação por melhores condições de trabalho.
Permitir o acesso ao conteúdo das mensagens é exigir um comportamento
dócil e conformista do empregado diante do órgão empresarial, que nos
tempos atuais tem por obrigação atuar de maneira ética e de acordo com
uma finalidade social que não se resuma a consecução do lucro, puro e
simples. O monitoramento irrestrito do conteúdo das mensagens eletrônicas
conduz a um controle abusivo sobre a personalidade do trabalhador
372
.
Quanto à possível responsabilização da empresa por atos do empregado, não
leva necessariamente à autorização para invasão da privacidade. instrumentos
tecnológicos menos invasivos que podem evitar danos a terceiros, no sentido de se
usar programas que impeçam o envio de mensagem a endereços não cadastrados,
rastreio de maneira impessoal de palavras ofensivas, desde que com prévio
comunicado, proibição, por códigos, do envio de imagens ou arquivos anexos
determinados. Veja-se que a proibição da leitura não significa a impossibilidade de
fixação de regras e vedações para a utilização da correspondência eletrônica.
Por fim, embora o administrador do sistema possa facilmente ver o conteúdo
do e-mail, isso não quer dizer que as comunicações eletrônicas não estão
amparadas pelo direito à privacidade. Como no caso do correio eletrônico, de igual
forma a comunicação por telefone, celular ou fixo, também pode ser facilmente
interceptada e ouvida. Nem por isso, argumentou-se que a proteção conferida pela
Constituição seria descabida ou impertinente no último caso.
Acresça-se, finalmente, que, além de tudo que foi exposto, há, ainda, um
porém. O empregado ao se comunicar com terceiros pode estar enviando
372
SILVEIRA NETO; PAIVA, 2003, p. 11.
128
informações inerentes e relacionados a sua privacidade. Na outra ponta, por sua
vez, há alguém que possui um estado de privacidade e que deve ser preservado
373
.
Considerando todo o exposto, parece que se admitir o monitoramento e
rastreio dos e-mails do empregado, ainda que corporativo, trata-se de uma restrição
ilegítima ao direito fundamental à privacidade. A medida é desproporcional por afetar
os subprincípios da adequação, da necessidade e da proporcionalidade em sentido
estrito.
A leitura e acesso ao conteúdo dos e-mails dos empregados são adequados
para evitar alguns daqueles pontos indicados como justificadores, como, por
exemplo, o envio de fotos de mulheres nuas ou a prática de alguns atos ilícitos.
Entretanto, nem sempre vai evitar que a rede fique congestionada ou que todos os
atos ilícitos contra terceiros sejam evitados.
Por outro lado, o teste da necessidade parece ser derradeiro, porque
outros meios, bem menos agressivos, que passam longe da necessidade de
restringir o direito à privacidade, que podem garantir a produtividade ou evitar envio
de mensagens com conteúdo inapropriado, por exemplo. Esses meios, inclusive, ao
impedir o envio de determinados arquivos podem ser amais eficazes para evitar
envio de mensagens e controlar conteúdos, evitando, inclusive o congestionamento
da rede, porque todos os e-mails serão verificados.
Finalmente, caso a medida fosse considerada adequada e necessária, o
custo benefício da medida, ao se violar a privacidade do empregado, no caso
específico, não está demonstrado. Não necessariamente o direito de propriedade
deve prevalecer sobre a privacidade dos empregados e de terceiros, estranhos à
relação de emprego.
Observe-se que em determinadas circunstâncias o empregador poderá
conhecer o conteúdo do e-mail dos seus empregados. Essa hipótese deverá,
contudo, ser tratada como exceção.
É o que escrevem Antonio Silveira Neto e Mario Antonio Lobato Paiva:
373
Trata-se de objeção apresentada por Victor Drummond (2003, p. 91), que escreve: “Neste sentido,
não se pode alegar que haja uma política de informação por parte da empresa de que as mensagens
venham a ser observadas, examinadas ou monitoradas. Pouco importa, para quem não faz parte dos
quadros da empresa, se existe um alerta para que alguém possa vir a examinar as mensagens por
tratar-se de um correio eletrônico de terceiro que não é seu interlocutor. Ora, ao fazer incidir dados ou
informações pessoais em mensagens eletrônicas, o interlocutor do funcionário não pode ser
surpreendido com a interferência de terceiros, sendo a prática destas, violação de privacidade”.
129
(...) o e-mail dos trabalhadores na empresa é um instrumento de trabalho e,
em determinadas circunstâncias e com determinadas políticas, é possível
que o empresário possa conhecer o conteúdo desses e-mails em situações
de abuso a respeito das quais haja indícios objetivos de que estão sendo
perpetrados. Esses indícios devem ser baseados em critérios objetivos
como, por exemplo, a freqüência no número de comunicações de caráter
pessoal, ou o título próprio das mensagens no caso do correio eletrônico.
Nesses casos, se o empresário tiver um indício objetivo de que está sendo
produzida uma situação de abuso deverá ser permitido o controle,
estabelecendo o mínimo de garantias exigíveis, por parte do trabalho, a
respeito de seus direitos
374
.
O que não se pode nunca admitir é o controle de forma indiscriminada.
Como escrevem Alberto Emiliano de Oliveira Neto e Luciano de Toledo
Coelho,
(...) o empregador por mais que seja proprietário dos computadores e
softwares que integram o estabelecimento comercial, não encontra no
direito de propriedade a autorização para violar as correspondências
eletrônicas de seus empregados. Não é razoável que o direito de
propriedade do empregador prevaleça sobre o direito à intimidade e à
privacidade do empregado
375
.
Assim, qualquer prática, entendimento ou decisão que autorize a verificação e
monitoramento do e-mail do empregado, de forma indiscriminada, ainda que seja um
e-mail corporativo, parece ser inconstitucional, porque se trata de restrição ilegítima
do direito fundamental à privacidade do empregado em relação a seus e-mails, por
violar diretamente o princípio da proporcionalidade.
Resta demonstrado que, neste caso, o Tribunal Superior do Trabalho não
estava, também, devidamente atento à dogmática específica das colisões entre
direitos fundamentais.
4.4 A SÚMULA 85 DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO
As últimas hipóteses que se pretende demonstrar são aquelas disciplinadas
pela Súmula 85 do Tribunal Superior do Trabalho.
374
SILVEIRA NETO; PAIVA, 2003, p. 12.
375
OLIVEIRA NETO; COELHO, 2003, p. 199.
130
A Constituição Federal de 1988, no artigo 7º, incisos XIII e XVI, dispõe que
“são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à
melhoria de sua condição social” à “duração do trabalho normal não superior a oito
horas diárias e quarenta e quatro semanais” e à “remuneração do serviços
extraordinário superior, no mínimo, em cinqüenta por cento à do normal”. Num dos
dispositivos, a Constituição também prevê a possibilidade da compensação ou de
um regime compensatório, no sentido de que a duração do trabalho não pode ser
diferente daquela prevista, “(...) facultada a compensação de horários (...) mediante
acordo ou convenção coletiva de trabalho”:
Art. 7º. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais além de outros que
visem à melhoria de sua condição social:
(...)
XIII duração do trabalho não superior a oito horas diárias e quarenta e
quatro semanais, facultada a compensação de horários e a redução da
jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho;
(...)
XVI remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo, em
cinqüenta por cento à do normal;
A Súmula 85 do Tribunal Superior do Trabalho trata de toda essa matéria e
tem a seguinte redação:
n.º 85. “COMPENSAÇÃO DE JORNADA
I. A compensação de jornada de trabalho deve ser ajustada por acordo
individual escrito, acordo coletivo ou convenção coletiva.
II. O acordo individual para compensação de horas é válido, salvo se houver
norma coletiva em sentido contrário.
III. O mero não-atendimento das exigências legais para a compensação de
jornada, inclusive quando encetada mediante acordo tácito, não implica a
repetição do pagamento das horas excedentes à jornada normal diária, se
não dilatada a jornada máxima semanal, sendo devido apenas o respectivo
adicional.
IV. A prestação de horas extras habituais descaracteriza o acordo de
compensação de jornada. Nesta hipótese, as horas que ultrapassarem a
jornada semanal normal deverão ser pagas como horas extraordinárias e,
quanto àquelas destinadas à compensação, deverá ser pago a mais apenas
o adicional por trabalho extraordinário.
Três pontos dessa disposição são restrições inconstitucionais, por não
observarem a dogmática específica e devem ser questionados
376
. A Súmula 85 do
Tribunal Superior Trabalho admite:
376
Ressalte-se que a Consolidação das Leis Trabalhistas traz outras restrições, como, por exemplo, a
exclusão da jornada dos minutos que a antecedem e sucedem (“Art. 58. §1º. Não serão descontadas
nem computadas como jornada extraordinária as variações de horário no restrito de ponto não
131
a) em algumas hipóteses, o pagamento exclusivo do adicional;
b) de forma implícita, a compensação 1 para 1, ou seja, uma hora extra
trabalhada significaria apenas 1 hora extra de descanso;
c) o acordo direto com o empregado, inclusive o acordo tácito.
4.4.1 O pagamento apenas do adicional de horas extras
A jornada de trabalho é o lapso temporal diário em que o empregado fica à
disposição do empregador em virtude do contrato de trabalho, sendo que ela mede a
principal obrigação do empregado, o tempo de prestação de trabalho, de
disponibilidade, perante o empregador. Por outro lado, a jornada é a medida da
principal obrigação obreira (prestação de serviços) e a medida da principal vantagem
empresarial (apropriação dos serviços pactuados).
377
A Constituição prevê, expressamente, que a jornada diária será de no máximo
oito (08) horas e a semanal de quarenta e quatro (44) horas. E, de acordo com o
artigo constitucional, toda jornada extraordinária será devida com sobre-
remuneração. Isso significa que a nona (9ª) e décima horas (10ª), se for o caso,
devem ser pagas como horas extraordinárias: hora cheia, mais adicional.
378
O
adicional deve ser no mínimo de cinqüenta por cento, como determina a
excedentes de cinco minutos observado o limite máximo de dez minutos diários”); o tempo
despendido até o local de trabalho (“Art. 58. §3º. “O tempo despendido pelo empregado até o local de
trabalho e para o seu retorno, por qualquer meio de transporte, não será computado na jornada de
trabalho, salvo quando, tratando-se de local de difícil ou não servido por transporte público, o
empregador fornecer a condução”); ou empregado que exerce o cargo de confiança (“Art. 62. Não
são abrangidos pelo regime previsto neste capítulo: (...) II os gerentes, assim considerados os
exercentes de cargos de gestão, aos quais se equiparam, para efeito do disposto neste artigo, os
diretores e chefes de departamento ou filial”). Aqui, a análise será limitada à Súmula.
377
Cf. DELGADO, 2006, p. 830. No mesmo sentido, DALLEGRAVE NETO, 1997, p. 17.
NASCIMENTO, 2001, p. 695.
378
Para ilustrar o que se quer dizer, exemplifica-se matematicamente: um empregado que trabalha 44
horas semanais e recebe R$ 1.000,00 (um mil reais) por mês, terá como salário hora o valor de R$
4,54 (quatro reais e cinqüenta e quatro centavos), caso o divisor adotado seja o 220. Ou seja, cada
hora trabalhada equivale a R$ 4,54. Todas as suas horas extras, salvo previsão mais favorável,
deverão ser remuneradas com o valor de R$ 6,81 (seis reais e oitenta e um centavos). Isso porque se
pega a hora cheia R$ 4,54, mais 50% (R$ 2,27 – dois reais e vinte e sete centavos), que totalizam R$
6,81.
132
Constituição, podendo ser mais favorável, conforme previsão especial (acordo ou
convenção coletiva e contrato de trabalho, por exemplo).
379
Os itens “III” e “IV da súmula admitem o pagamento apenas do adicional em
algumas hipóteses.
A lei não traz nenhuma previsão nesse sentido. É o que afirma, inclusive,
Sérgio Pinto Martins, para quem “A lei não dispõe que deve ser pago apenas o
adicional”. E,
Se a prestação de horas extras habituais descaracteriza o acordo de
compensação, as horas que ultrapassam o módulo semanal devem ser
pagas como extras, isto é, paga-se a hora mais o adicional. Quanto àquelas
destinadas à compensação, paga-se apenas o adicional eo a hora.
Entendo que foi descaracterizado o acordo de compensação, tudo é nulo,
devendo haver o pagamento da hora e do adicional. O verbete tipifica
situação injusta para o empregado que presta serviços extraordinários e
recebe apenas o adicional, quando na verdade todas as horas excedentes
de oito diárias e 44 semanais já são consideradas como extras, sendo que o
empregado foi contratado para trabalhar apenas dentro dos limites
mencionados
380
.
No mesmo sentido, o entendimento de Francisco Antonio de Oliveira:
O acordo de compensação de jornada firmado pelas partes não cumprido
pelo empregador descaracteriza avença e impõe ao trabalhador carga de
trabalho superior. De conformidade com a Súmula ora sob comento, as
horas destinadas à compensação somente serão remuneradas pelo
adicional. Não nos parece razoável minimizar o comportamento daquele que
não deu cumprimento ao contrato e impôs carga maior de trabalho, com
concentração de toxinas, premiando com o pagamento apenas do adicional.
Descumprindo o contrato firmado para a compensação de horas, razoável é
que o empregador pague o excesso como horas extras
381
.
Os dois itens, quando permitem apenas o pagamento do adicional, violam o
princípio da reserva legal, ou seja, sob o aspecto formal a restrição é
inconstitucional, porque não há previsão para pagamento apenas do adicional.
379
Cf. DELGADO, 2006, p. 847.
380
MARTINS, 2007, p. 55.
381
OLIVEIRA, 2007, p. 182. Em sentido contrário escreve Emílio Rothfuchs Neto (2002, p. 187), para
quem “Quando a compensação se faz irregularmente, sem acordo escrito, por exemplo, mas
observado o limite de 10 horas diárias e respeitada a carga semanal, deve ser levado em conta que o
empregado teve as horas remuneradas de forma simples, dentro do salário contratual pago pelo
empregador, ficando este a dever-lhe, pela horas excedentes de cada dia, apenas o respectivo
adicional e não o pagamento da hora acrescida. As horas trabalhadas estavam pagas no salário
contratual do empregado, visto que este não excedeu os limites permitidos para o trabalho, nem no
dia, nem na semana, mas, apenas porque não foram observadas as exigências formais de validade
deste regime, devem ser pagas como extras as excedentes em cada dia. Como a hora já estava paga
pelo salário normal, devido será apenas o respectivo adicional. Este entendimento foi consagrado no
Enunciado nº 85 da Súmula do TST”. No mesmo sentido que o último, ABUD, 2008, p. 128.
133
Por outro lado, suponha-se que, neste caso, trata-se de mera interpretação.
Passa-se, então, para análise do princípio da proporcionalidade. No caso, é difícil
adivinhar qual direito fundamental ou bem constitucional o Tribunal Superior do
Trabalho está querendo preservar
382
. Observe-se que não motivo para que o
empregador observe a Constituição ou as exigências legais, no que se refere à
compensação, pois meros descumprimentos da lei implicariam apenas o pagamento
do adicional
383
. Aparentemente, isso é um indicativo de que o princípio da
proporcionalidade está sendo violado também. Some-se a isso que, o artigo 7º,
inciso XVI, parece estar estruturado como regra, ou seja, aplicam-se os dois critérios
sugeridos no tópico sobre a ponderação (3.3.2.3).
Por fim, na presente hipótese, parece não haver vidas de que o núcleo
essencial do direito fundamental não é observado.
Em que pese a controvérsia acerca do que seja o conteúdo essencial,
aparentemente, em alguns dos direitos parece que seu conteúdo mínimo está
claramente definido. Como observa Luis Fernando Calil de Freitas
384
, o âmbito de
proteção e o núcleo essencial dependem de se tratar o direito fundamental de
prestações negativas e prestações positivas, no sentido de que o cleo essencial
dos direitos de defesa e direitos a prestações demandam um tratamento
diferenciado.
Como indica Ingo Wlofgang Sarlet, a Constituição de 1988 acolheu os direitos
fundamentais sociais, reconhecendo seu “status” de autênticos direitos
fundamentais. Nesse contexto, a eles é aplicável a norma contida no art. 5º, §
385
.
Considerando isso, por conta da posição que eles estão situados, cabe observar que
382
Como indicam Orlando Gomes e Élson Gottschalk, a própria exigência da realização de horas
extras pode ser considerada como uma limitação da duração diária do trabalho e isso é feito em
interesse do empregador. Segundo esses autores, “O trabalho extraordinário exigido para fazer em
face do aumento da produção, no interesse do empregador, é a mais importante derrogação ao
princípio da limitação da duração diária do trabalho. A permissão está subordinada, porém, a: 1º) um
máximo de duas horas diárias excedentes por dia e 12 semanais; 2º) pagamento de um sobre-salário
mínimo a partir de 50% superior à hora normal; 3º) celebração de acordo ou convenção coletiva”.
GOMES; GOTTSCHALK, 2008, p. 302. No mesmo sentido, Amauri Mascaro Nascimento, para quem
“(...) o movimento trabalhista modificou substancialmente a atitude dos homens diante do problema,
com a ação vigora pela limitação das horas diárias de trabalho e com um início, posterior, incipiente,
de participação dos operários em pequenas atividades culturais e esportivas, nos países de maior
desenvolvimento, e com as intervenções do rádio, cinema, televisão etc. Aos poucos a necessidade
de dosagem entre tempo de trabalho e tempo livre passa a constituir uma exigência legal, de tal modo
que hoje ninguém mais duvida da imperatividade desse equilíbrio, meio de eficaz e salutar evolução
dos povos”. NASCIMENTO, 2001, p. 697-698.
383
Cf. OLIVEIRA, 2007, p. 182.
384
FREITAS, 2007, p. 201-204.
385
SARLET, 2006b.
134
na clássica dicotomia, sem excluir de outros critérios de classificação, entre direitos
de defesa e direitos a prestações, nem sempre os direitos sociais implicaram direitos
a prestações. Como observa este autor, os direitos fundamentais sociais podem ser
entendidos como uma dimensão específica dos direitos fundamentais, pois visam
fornecer os recursos fáticos para uma efetiva fruição das liberdades e têm como
objetivo a garantia de uma igualdade e liberdade real, compensando as
desigualdades sociais. Eles, então, reclamariam, assim, uma postura ativa do
Estado. Entretanto, essa firmação não está de todo acertada, porque nem todos os
direitos a prestações são direitos sociais e nem todos os direitos sociais se limitam a
uma dimensão prestacional. Exemplo disso seriam os direitos sociais previstos nos
artigos a 11 da CF/88 e que podem ser reconduzidos ao grupo dos direitos de
defesa
386
.
O problema dessa classificação é que as duas categorias distinguem-se
sobre o aspecto da positivação e isso afeta na análise dos requisitos formais e
materiais da legitimidade das restrições. Os direitos de defesa (direitos negativos)
não costumam ter a plena eficácia e aplicabilidade questionadas; já os direitos
prestacionais, habitualmente necessitam de uma concretização legislativa, ou seja,
têm cunho eminentemente programático.
387
Considerando isso, partindo-se da teoria absoluta ou da teoria relativa, não
parece haver dúvida de que o ponto inicial será sempre o pagamento da hora
acrescida de 50%, no caso de horas extras. Em ambas as teorias, considerando a
hipótese trazida pela Súmula, “não-atendimento das exigências legais” ou “a
prestação de horas extras habituais” e o comando constitucional, parece claro que
deve haver o pagamento das horas, acrescido do adicional, sob pena de violação do
núcleo essencial e de inconstitucionalidade.
386
O autor escreve: “(...) podemos afirmar, em síntese, que a denominação de direitos sociais, à luz
de nossa Constituição, não se prende pelo menos não exclusivamente - ao fato de que se cuida de
posições jurídicas a prestações materiais do Estado, mesmo que no cumprimento de sua função
como Estado Social, ou mesmo ao fato de que se trata de direitos conferidos a uma determinada
categoria social (como ocorre com os direitos dos trabalhadores). (...) entendemos que a
denominação de direitos fundamentais sociais encontra sua razão de ser na circunstância comum
aos direitos sociais prestacionais e aos direitos sociais de defesa de que todos consideram o ser
humano na sua situação concreta na ordem comunitária (social), objetivando, em princípio, a criação
e garantia de uma igualdade e liberdade material (real), seja por meio de determinadas prestações
materiais e normativas, seja pela proteção e manutenção do equilíbrio de forçar na esfera das
relações trabalhistas. (...) como direitos à libertação da opressão social e da necessidade”. SARLET,
2006b.
387
Ibid.
135
Como observa José Joaquim Gomes Canotilho, a aplicação imediata de
alguns direitos fundamentais depende da determinabilidade do direito. Se o direito
estiver determinado, ele terá validade, efetividade e vinculabilidade
388
. Na hipótese
da realização de horas extras, sem compensação, não resta dúvidas de que a
conseqüência imediata é o pagamento das horas extras, que significa a hora cheia,
mais o adicional.
Além disso, como indica Luis Fernando Calil de Freitas, referindo-se a Beatriz
Gonzáles Moreno,
(...) as normas jusfundamentais prestacionais podem impor ao legislador
determinadas limitações objetivas à sua liberdade de conformação, a
principiar pelas mais evidentes que decorrem da circunstância de que
alguns de seus enunciados contêm especificações conceituais que os
fazem mais específicos, claros e precisos do que os direitos de defesa.
Relativamente a alguns direitos fundamentais de cunho prestacional, a
própria literalidade do enunciado da norma constitucional permite, desde
logo, prefigurar o âmbito de proteção com as hipóteses fáticas protegidas e
o efeito dessa proteção, do que decorre a possibilidade de estabelecimento
do núcleo essencial
389
.
Nessa categoria “especial”, Luis Fernando Calil de Freitas inclui o inciso XVI.
Para ele, o respectivo teor literal permite ao intérprete/aplicador desde logo delimitar
388
Segundo o autor, no direito constitucional europeu, até meados do século XX, as normas de
direitos fundamentais eram normas enfraquecidas, porque dependiam de regulamentação. Nesse
contexto, os direitos degradavam-se juridicamente e eram tidos como declarações político-
constitucionais. Em termos dogmáticos, eles dependiam da reserva de lei. Nas constituições do pós-
guerra, pretende-se a aplicabilidade imediata de tais direitos, com reforço da normatividade, tornando
clara 1- a natureza de direitos constitucionais e 2- sua força normativa, independentemente de uma
lei concretizadora. Isso que dizer que os direitos fundamentais valem: “(1) como norma normata e não
apenas como norma normans; (2) prima facie, aplicam-se directamente sem necessidade de uma
auctoritatis interpositio, sobretudo na forma interpositio legislatoris; (3) prima facie, constituem direito
actual e eficaz”. Essa afirmação significa que “(1) a aplicabilidade directa não significa que as normas
garatidoras de direitos, liberdades e garantias configuram direitos subjectivos , num sentido clássico
de direitos absolutos, mas, (2) de qualquer modo, elas conferem ao particular o direito de invocarem
estas normas consagradoras de direitos e, neste sentido, afirma-se que os direitos fundamentais
transportam em regra direitos subjectivos; (3) a aplicabilidade directa não dispensa um grau suficiente
de determinabilidade, ou seja, um conteúdo jurídico-constitucional, em que se defina o âmbito de
protecção de um direito fundamental e os respectivos efeitos jurídicos e, ainda, as dimensões
fundamentais das restrições necessárias à harmonização de direitos conflituantes”. Quando não se
puder recortar o conteúdo do direito quanto ao âmbito de proteção e quanto aos efeitos jurídicos, há
necessidade de uma lei densificadora. O ponto, então, é a questão da determinabilidade, no sentido
de que as normas que forem determináveis são diretamente aplicáveis. A determinabilidade,
entretanto, é uma questão de juridicidade, uma questão de segurança, uma questão de igualdade
jurídica, uma questão de legislação e um pressuposto do próprio sistema de direitos fundamentais.
Aqui, interessa a última questão, no sentido de que os pressupostos, para tornar suficientemente
preciso e determinável, são 1- os pressupostos de fato; 2- as conseqüências ou efeitos jurídicos; 3 as
cláusulas restritivas do âmbito de proteção. Determinados os pressupostos, garante-se a validade,
efetividade e vinculatividade das normas de direitos fundamentais. CANOTILHO, 2008, p. 145-148.
389
FREITAS, 2007, p. 203.
136
o suporte fático que lugar à aplicação da norma e às respectivas conseqüências
jurídicas e, neste caso, também, definir-se o conteúdo essencial do direito
390
.
Repita-se, ainda, que um dos critérios propostos para a ponderação, caso
haja necessidade, é a preponderância, em geral, das regras.
O Tribunal Superior do Trabalho, portanto, não observou a dogmática
constitucional, autorizadora das restrições, quando possibilitou o pagamento apenas
do adicional de horas extras. Neste caso, a restrição é inconstitucional.
4.4.2 A compensação 1x1
Trata-se de polêmica que não está presente na maioria dos textos.
Aparentemente, por conta de uma leitura apressada do artigo 59 da CLT, a
compensação deveria ser entre 1 hora extra trabalhada por 1 hora extra de
descanso.
Entretanto, não é isso que a lei indica.
De acordo com o parágrafo segundo, “podeser dispensado o acréscimo de
salário”, ou seja, o empregado não receberá as horas extras e seus reflexos, porque
terá a “correspondente diminuição em outro dia”. Resta saber, então, o que significa
uma “correspondente diminuição”.
390
O autor escreve “São exemplos de tal situação, no sistema constitucional vigente no Brasil, dentre
outras, as previsões do artigo 7º, incisos I, IV, VI, VII, VIII, IX, X, XIII, XIV, XV, XVI, XVII, XVIII, XXI,
XXV, XXIX, XXX, XXXIII, XXXIV, todos da Constituição da República. Não se pode deixar de referir
que, alguns dos exemplos mencionados tratam mais propriamente de direitos a prestações negativas,
e, muito embora arrolados pelo legislador constituinte dentre os denominados direitos sociais, não
têm cunho prestacional positivo sendo, no máximo, classificáveis com maior rigor como direitos à
proteção ou direitos a prestações normativas e direitos à organização e ao procedimento. De
qualquer sorte, dentre os exemplos elencados, sem qualquer sombra de dúvida os incisos IV, VII, VIII,
IX, XV, XVI, XVII, XVIII, XXI, XXV, XXIX cuidam-se efetivamente de direitos sociais prestacionais em
relação aos quais o respectivo teor literal permite ao intérprete/aplicador desde logo delimitar o
suporte fático que dá lugar à aplicação da norma e às respectivas conseqüências jurídicas. Tal
fenômeno se dá, na esteira do pensamento de ALEXY, em razão de que a adscrição de regras aos
princípios dissolve sua natural vagueza, amplitude e abstração, dando lugar à maior definição e
determinabilidade que é típico das regras, o que possibilita sua aplicação com recurso à subsunção,
que tais normas pela estrutura (preceito + conseqüência) e pelos conteúdos que veiculam
(proibição, obrigação ou faculdade) o mais facilmente concretizáveis. É dizer, quando a norma
contém a um só tempo princípio e regras, o legislador constituinte já ponderou relativamente a
determinados limites de conteúdo do direito fundamental, com o que resulta menos laboriosa a tarefa
de definir-se o conteúdo essencial do direito em questão”. Nota de rodapé n.º 741. FREITAS, 2007, p.
203.
137
Como exposto, em que pese a controvérsia acerca do que seja o conteúdo
essencial, aparentemente, em alguns dos direitos parece que seu conteúdo mínimo
está claramente definido. Este é o caso das horas extras.
Segundo a Constituição, artigo 7º, inciso XVI, “a remuneração do serviço
extraordinário” será de “no mínimo” 50%. Isso significa que, toda hora extra
trabalhada deve ser remunerada com mais uma hora e o adicional: hora cheia, mais
o adicional. Como também indicado, esse artigo pode ser reconduzido ao grupo
dos direitos de defesa e tais direitos não costumam ter a plena eficácia e
aplicabilidade questionadas.
Considerando isso, partindo-se da teoria absoluta ou da teoria relativa, não
dúvida de que o ponto de partida de qualquer discussão que envolva horas extras e
compensação é o de que toda hora extra significa o pagamento da hora cheia, mais
adicional de 50%, sob pena de violação do núcleo essencial e de
inconstitucionalidade.
Observe-se, por derradeiro, que a compensação de horas extras tem suas
origens naquilo que se denominou de “semana inglesa”. Como observa Sérgio
Ferraz, ainda sob a vigência da Constituição anterior, que previa, expressamente,
apenas a duração do trabalho diário como sendo no máximo de oito horas (art. 165,
inciso VI) e o repouso semanal remunerado (art. 165, inciso VII), ou seja, 48 horas
semanais, adotou-se, no Brasil, a prática de redução ou suspensão do trabalho nos
sábados. Como escreve o autor,
Generalizou-se, entre nós, a adoção do costume de suspender o trabalho,
ao início da tarde de sábado, o que acarreta evidentemente uma redução na
duração semanal do serviço. A origem desse costume, localizada na
Inglaterra, fez com que a ele se atribuísse a denominação de semana
inglesa ou sábado inglês
391
.
A redução do trabalho no sábado, no entanto, não implicava o acréscimo da
jornada noutros dias. Caso isso ocorresse, esse acréscimo deveria ser
acompanhado com a devida reparação. É o que escreve o mesmo autor:
A redução ou supressão do trabalho aos sábados, em decorrência das
fontes que foram citadas, não pode, contudo, acarretar o acréscimo da
jornada nos dias anteriores sem qualquer reparação, eis que, como vimos
há pouco, o conceito de jornada normal, como até mesmo etimologicamente
391
FERRAZ, 1977, p. 20.
138
não poderia deixar de ser, refere-se ao dia e não à semana. Assim,
qualquer hora prestada além da jornada normal, ainda que coubesse dentro
do quantitativo semana global, a que originariamente o empregado, será
considerado trabalho extraordinário para efeito da incidência das regras
específicas relativas a este assunto
392
.
Com isso se quer dizer que, em toda compensação de horas extras, seja
individual, seja por instrumento coletivo, deve-se prever que ela será sempre de 1
hora, por 1 hora, mais meia, ou seja, a cada duas horas extras trabalhadas, o
empregado deve descansar 3 horas
393
. Em resumo, a “correspondente diminuição”
significa, por conta de não haver o pagamento de salário e reflexos, não a
compensação da 1 hora extra, por uma hora de descanso, mas sim a compensação
de 1 hora extra, por 1 hora e meia de descanso.
Caso isso não seja observado, o comando que determina uma jornada diária
máxima e que determina o acréscimo de 50% sobre a hora normal, ou seja, o
conteúdo essencial será violado e a medida deve ser declarada inconstitucional.
4.4.3 O acordo tácito e o acordo escrito como autorizadores da compensação
A compensação ainda tem mais dois pontos controversos:
a) o instrumento que permite a implementação do regime compensatório;
b) limite temporal para a compensação.
392
FERRAZ, 1977, p. 20.
393
Essa questãofoi observada por outros autores. Como indica José Eduardo Alcântara, na prática
e na generalidade dos casos, a compensação é feita hora por hora (1x1), sem referência à
compensação do percentual de 50%, que se refere ao desgaste do trabalho excedente e o que
tornaria razoável a compensação 1x1,5 (1 hora trabalha em excesso compensada por 1,5 hora de
descanso). Não se concorda, entretanto, com a necessidade de proposta legal nesse sentido, como
sugerido por este autor, pois, nos termos da Constituição, qualquer compensação deve observar esse
critério, sob pena de ser uma restrição inconstitucional. Segundo o autor, “A legislação ordinária
poderia, ainda, determinar que, na compensação entre horas trabalhadas e horas de folga, fosse
obedecida a regra que premaior valor (acréscimo de, no mínimo 50%), ao trabalho prestado além
do limite de oito horas diárias (art. 7º, inciso XVI, da CF/88). Dessa forma, em um regime de banco de
horas anual, cada hora trabalhada com extrapolamento da jornada máxima legalmente estabelecida
deveria ser compensada por, no mínimo, 1h30 de folga (ou outra proporção mais benéfica prevista
em instrumento normativo), conforme sugere Jorge Luiz Souto Maior, que ainda complementa
propondo que o banco de horas obedeça a uma ordem: primeiro a concessão do descanso e após
sua compensação com horas em sobrejornada”. ALCÂNTARA, 2003, p. 91 passim.
139
A princípio somente a primeira questão interessa, contudo, alguns entendimentos
sobre a fundamentação do instrumento que deve ser usado passa pela discussão do
limite temporal.
Atualmente, caso não se questione a constitucionalidade
394
da lei, vige a
sistemática anual da compensação de horários, ou seja, permite-se a pactuação de
horas suplementares dentro do ano, além de outras disposições, como se infere na
redação do artigo 59, §2º, da CLT:
Art. 59. A duração normal do trabalho poderá ser acrescida de horas
suplementares, em número não excedente de duas, mediante acordo
escrito entre empregador e empregado, ou mediante contrato coletivo de
trabalho.
§1º Do acordo ou do contrato coletivo de trabalho deverá constar,
obrigatoriamente, a importância da remuneração da hora suplementar, que
será pelo menos 50% superior à hora normal.
§2º. Poderá ser dispensado o acréscimo de salário se, por força de acordo
ou convenção coletiva de trabalho, o excesso de horas em um dia for
compensado pela correspondente diminuição em outro dia, de maneira que
não exceda, no período máximo de um ano, à soma das jornadas semanais
de trabalho previstas, nem seja ultrapassado o limite máximo de dez horas
diárias.
§3º Na hipótese de rescisão do contrato de trabalho sem que tenha havido a
compensação integral da jornada extraordinária, na forma do parágrafo
anterior, fará o trabalhador jus ao pagamento das horas extras não
compensadas, calculadas sobre o valor da remuneração na data da
rescisão.
§4º Os empregados sob regime parcial não poderão prestar horas extras.
Assim, a princípio, somente serão pagas as horas extras, em caso de regime
de compensação, que não forem compensadas, caso descumpra-se o acordo de
compensação e em caso de rescisão (§3º, do artigo 59 da CLT).
No que se refere ao instrumento autorizador do regime compensatório, há três
posições:
a) aqueles que admitem que o acordo pode ser tácito;
b) aqueles que exigem o acordo coletivo e a convenção coletiva para validar
a compensação;
c) aqueles que admitem o acordo escrito direto com o empregado.
394
A questão não será tratada, porque não há referência sobre ela na Súmula 85 do Tribunal Superior
do Trabalho.
140
O acordo tácito é minoritariamente aceito. Parece, todavia, flagrante a sua
inconstitucionalidade, pois expressa referência à necessidade de um acordo no
artigo constitucional. Por ser minoritariamente aceito, cuidar-se-á com mais cuidado
do debate tratando da necessidade do acordo ser direto com o empregado ou da
necessidade de ser negociado coletivamente. A controvérsia surge por conta do
artigo constitucional fazer referência a “acordo ou convenção coletiva”.
Nesse contexto, a opção do Tribunal Superior do Trabalho, que admite a
restrição ao pagamento das horas extras pela via do acordo individual, é
inconstitucional.
Nos instrumentos negociais coletivos estariam os únicos títulos jurídicos
válidos para instauração desse regime, em face do que prevê a Constituição Federal
de 1988. Esta é a posição, inclusive, de Sérgio Pinto Martins, que recorre a uma
interpretação gramatical. Ele escreve:
Entendo que o adjetivo coletiva, que qualifica o substantivo convenção, diz
respeito tanto à convenção como ao acordo, até mesmo em razão da
conjunção empregada no texto, que mostra a alternatividade tanto da
convenção como do acordo serem coletivos. A palavra coletiva deve
concordar com a palavra imediatamente anterior, que é feminina, mas
aquela se refere também ao acordo. Por esse raciocínio, o acordo deve ser
coletivo e não individual
395
.
A Constituição Federal está referindo-se a “acordo coletivo” e “convenção
coletiva”. Esse posicionamento, ainda, está baseado no revisor gramatical da
Constituição:
O filólogo Celso Cunha, que fez a revisão gramatical da Constituição,
entende que a última palavra numa frase deve concordar com a anterior, se
esta for feminina. São seus os exemplos: ´Comprei uma gravata e um
chapéu escuro´, ´Estudo o idioma e a literatura portuguesa´. Na verdade, o
que o constituinte pretendeu foi apresentar sinônimos para as mesmas
expressões. Por isso usou a expressão acordo ou convenção coletiva no
inciso XIII do artigo 7º, negociação coletiva no inciso XIV, convenção e
acordo coletivo no inciso VI e convenção e acordo coletivo no inciso XXVI,
tudo do mesmo artigo. O objetivo do constituinte foi o de não ser repetitivo,
não empregando expressões repetidas, adotando variações ou sinônimos.
Fazendo a interpretação das palavras empregadas na CLT, verificamos que
o legislador ordinário usa a expressão acordo escrito para designar o acordo
individual feito pelo empregado para prorrogação da jornada de trabalho,
como se observa do artigo 59 da CLT. A antiga Súmula 108 do TST fazia
também essa distinção para a compensação de horários de trabalho,
usando a expressão acordo escrito para o acordo individual e acordo
coletivo ou convenção coletiva para a norma coletiva, sendo estas últimas
395
MARTINS, 2007, p. 53.
141
as formas de compensação do horário de trabalho da mulher. Com base
nessa orientação, seria possível dizer que o constituinte, ao fazer
referência a acordo, quis se referir a acordo coletivo e não a acordo escrito
ou individual, até mesmo para prestigiar a participação dos sindicatos nas
negociações coletivas (art. 8º, VI, da Constituição)
396
.
No mesmo sentido, Dallegrave Neto, para quem o acordo de compensação é
um negócio jurídico bilateral, acessório do contato de trabalho, em que as partes
declaram a vontade de regulamentarem determinadas relações jurídicas cujos
efeitos o ordenamento jurídico legítima. Assim, afirma que não como admitir
manifestação volitiva tácita. Entende, ainda, que é necessária a assistência sindical,
fundamentando seu entendimento em questões gramaticais e princípios visados
pela Constituição. Para ele, além da questão gramatical, amparam esse
entendimento, os princípios e valores constitucionais, os quais valorizam e
reconhecem as Convenções e Acordos Coletivos de Trabalho (art. 7º, XXVI).
Arrematando a questão, escreve:
Na prática, o Acordo Compensatório pode até ser celebrado diretamente
entre empregado e empregador; contudo, faz-se necessário estar
referendado no instrumento normativo. Se, por exemplo, o ACT ou a CCT
da categoria prevê a compensação de jornada em sua cláusula 7ª, podem,
então, as partes, com fulcro nessa cláusula, celebrarem acordo escrito de
compensação, devidamente assinado pelo obreiro e pelo preposto do
empregador
397
.
Para Amauri Mascaro Nascimento, independentemente do lapso temporal, a
compensação sempre deverá ser formalizada por meio de negociação coletiva com
o sindicato. Segundo ele, “A compensação ampla, quinzenal, mensal ou, até mesmo,
não de horas, mas de dias não é inconstitucional, desde que formalizada por meio
da negociação coletiva com o sindicato, que, certamente, estabelecerá os limites em
cada caso julgados oportunos”
398
.
Observe-se que as reservas legais expressas podem ser simples ou
qualificadas. No caso, não se trata de uma reserva legal, mas de uma autorização
para a restrição ao pagamento das horas extras, por meio da compensação, desde
que haja uma acordo coletivo e uma convenção coletiva. Isso quer dizer que a
396
MARTINS, 2007.
397
DALLEGRAVE NETO, 1997, p. 22..
398
Ressalte-se, apenas, que esse texto do autor foi escrito quando não havia, ainda, a previsão do
regime de compensação anual. NASCIMENTO, 2001, p. 705. No mesmo sentido, rechaçando a
opção pelo acordo individual, SÜSSEKIND, 2004, p. 457-458. SUSSEKIND et al., 2002, p. 797.
ROTHFUCHS NETO, 2002, p. 187-188. FRANÇA, 1997, p. 7. ALCÂNTARA, 2003, p. 107.
142
Constituição previu uma “restrição qualificada”, ou seja, não pode ser qualquer
acordo, mas o acordo coletivo e a convenção coletiva.
Considerando isso, a medida não respeita o princípio da reserva legal, porque
não há previsão para o acordo escrito direto com o empregado.
De toda sorte, quem admita a existência do acordo individual, pelo que se
analisa outro dos limites dos limites. A admissão de uma interpretação de que a
Constituição refere-se ao acordo individual não passa pelo crivo do princípio da
proporcionalidade.
Para alguns, portanto, bastaria um acordo bilateral escrito. Ter-se-ia, aqui,
como observa Maurício Godinho Delgado, dois argumentos
399
:
a) a redação da Constituição;
b) o benefício do empregado
400
.
Sobre o primeiro argumento, escreve:
399
DELGADO, 2006, p. 855-859.
400
outros argumentos, como o de que a intromissão de dirigentes sindicais apenas retiraria a
maleabilidade da lei. É o que escreve Almir Pazzianotto Pinto (1999): “Não julgo indispensável que
haja acordo coletivo para instituição de ´banco de horas´. Basta o ajuste individual, feito previamente
e por escrito. Tornar obrigatória a intervenção do sindicato que na maioria das vezes se resume à
intromissão de alguns dirigentes põe a perder o objetivo da lei, que é dar maleabilidade às relações
individuais de trabalho em matéria relativa a horário diário, possibilitando a empregados e
empregadores, dentro dos limites constitucionais, ajustar a duração da jornada. Atraindo a aplicação
do Título VI da CLT e exigindo convocação de assembléia geral, elaboração de documento com as
exigências do art. 613, depósito, registro e arquivo no órgão competente do Ministério do Trabalho, o
acordo coletivo afastará a maioria das empresas, que, se pudessem tratar diretamente com os
empregados, se utilizariam rotineiramente do sistema de compensação previsto pela Medida
Provisória”. Para Cláudia José Abud, o instrumento autorizador das compensações é o acordo escrito
individual. Segundo ela, embora o método gramatical deixe vidas, o método lógico-sistemático e a
interpretação teleológica não deixariam, sendo que, quanto a este último, a compensação seria
claramente mais favorável ao empregado e porque a celebração de convenção e acordo coletivo em
pequenas empresas é difícil viabilidade. A autora escreve: “Aponta-se, também, que antes da
vigência da atual Norma Ápice, as regras de direito do trabalho eram muito mais rígidas. Ao tratar do
instituto da compensação, o legislador ordinário somente previa a compensação semanal, como, por
exemplo, a compensação dos sábados e das pontes, em feriados. Essas modalidades de
compensação são claramente mais favoráveis ao empregado, pois ampliam seus dias de
disponibilidade familiar e social. Por isso, não seria razoável concluir que a Constituição, pretendendo
criar ordem jurídica mais favorável ao empregado como se do art. 7º, caput –, restringisse o
acordo usualmente benéfico a eles. Esses modelos de compensação sempre foram utilizados nas
empresas e aceitos pela jurisprudência por meio de acordo escrito individual, pois trazem evidentes
benefícios ao empregado. Nesses casos, que são utilizados até hoje, não há uma prorrogação
exagerada de horas, o empregado não fica exposto a longo tempo de prestação de serviços, por isso
não necessidade de tutela sindical. Sabe-se, também, que a convenção e o acordo coletivo de
trabalho são instrumentos mais raros de celebração no âmbito de empresas de pequeno porte, assim
como são proibidos em entidades de direito público. Por esses motivos, é razoável interpretar que a
Constituição Federal optou por tornar viável o regime de compensação através de acordo individual”.
ABUD, 2008, p. 109-110.
143
(...) conjugava a aplicação dos métodos gramatical, lógico-sistemático e
teleológico na leitura do mencionado dispositivo magno. Sustentava que o
referido inciso XIII fala em ´facultada a compensação de horários e a
redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva do trabalho´
(grifos acrescidos). Propositadamente a nova Carta teria colocado o verbete
acordo afastado da qualificação (e restrição) coletivo (aliás, coletiva
concorda com o feminino convenção), o que permitiria induzir-se que
pretendeu conferir à palavra a dubiedade de acepções que propicia (acordo
bilateral ou acordo coletivo) tal como ocorria com o velho §2º do art. 59
da CLT (que mencionava ´acordo ou contrato coletivo´)
401
.
Argumentava-se, ainda, que a Constituição, no artigo 7º, incisos VI e XIV fala
em “convenção ou acordo coletivo” e “salvo negociação coletiva”, respectivamente.
Por outro lado, a compensação de jornada seria benéfica ao empregado pois
ampliaria seus dias de disponibilidade pessoal.
Considerando esses dois argumentos, pode-se afirmar que o acordo
individual para compensação seria um meio adequado. Ele atingiria sua finalidade,
que é possibilitar que a empresa reformule horários, visando com isso ganhos de
produtividade e evitando prejuízos, com maior mero de horas por dia, quando
maior produção e compensando quando a produção está baixa. Além disso, a
medida também traria o benefício do empregado.
Entretanto, nem sempre haverá benefício para o empregado
402
. Alguns
empregados poderão não ter interesse na prestação de horas extras ou na
compensação e mesmo assim se sentirão “coagidos” a aceitar um acordo nesses
moldes. Resta saber, então, se a medida é necessária.
401
DELGADO, 2006, p. 656.
402
Como aponta José Eduardo Alcântara (2003, p. 90 passim), os benefícios do empregado são
bastante questionáveis. Segundo ele, “A experiência demonstra que as variações de horários
autorizadas por um sistema de jornada em que se admite a flexibilidade (como a compensação anual,
por exemplo) são quase sempre determinadas e em conformidade com os interesses do empregador,
sendo pouco aproveitada como fator de maior liberdade ao empregado para cumprimento de sua
jornada de trabalho. As constantes variações de horário, ademais, podem gerar desorganização da
vida social do empregado, uma vez que restringem a participação regular em outras atividades
alheias a seu trabalho, inclusive aquelas voltadas para a própria qualificação profissional. Mesmos os
defensores da jornada flexível admitem que ´a inconstância da duração da jornada ou períodos
prolongados de redução ou aumento desorganizam a vida dos empregados´, de tal sorte que essa
maior ´liberdade´ de horários tem-se revelado, na prática, muito mais benéfica ao empregador que
aos trabalhadores. A menor duração do trabalho em algumas semanas são compensadas com
trabalho excedente da carga normal em outras, de modo que não há como se verificar nessa
circunstância alguma vantagem efetiva para os empregados”. Por outro lado, os ganhos para os
empregadores não seriam questionáveis. Como observa o mesmo autor, “(...) no sistema legal
brasileiro, a compensação de jornada é extremamente vantajosa ao empregador, porquanto este
pode se ver livre não apenas do pagamento das horas extras em si, mas também de todas as
repercussões salariais decorrentes desse pagamento”.
144
A medida alternativa, aqui, seria o acordo coletivo e a convenção coletiva.
Essa medida, como a outra, salvaguarda ambos os interesses, de empregadores e
empregados e não traz um custo maior. Os fins atingidos serão os mesmos. Por
outro lado, ela não deixa o empregado à margem do empregador, ou seja, procura
evitar que o empregado que não tenha interessa no acordo de compensação
oponha-se a ele
403
. Considerando isso, por significar uma medida menos gravosa
que a anterior, o acordo individual é desnecessário e, portanto, inconstitucional.
Acresça-se que o acordo individual pode dar guarida para condutas de
empregadores mal intencionados, que, em contratos de pequena duração,
negociariam diretamente com o empregado a compensação e poderiam jogar para o
final o pagamento das horas extras, adiando a remuneração por alguns meses
404
.
Finalmente, supondo-se que a medida fosse adequada e necessária, resta
saber se o acordo individual passa pelo crivo do princípio da proporcionalidade em
sentido estrito.
Para Maurício Godinho Delgado, independentemente de outras discussões
possíveis, o regime compensatório, necessariamente, ao ser anual, deixou de ser
403
Segundo Airton Pereira Pinto (2006, p. 165-166), “Para as empresas ainda compensa fazer uso
das horas extraordinárias, porque uma equivocada tendência de flexibilização do exercício e
efetivação dos direitos que regem as relações do trabalho humano, que têm o sujeito como meio e
não como fim do direito. institutos jurídicos como banco de horas, contratos a tempo precário com
redução de direitos, sistema de compensação de horas, acordos para prorrogação de jornada, como
políticas superficiais, imediatistas e individualistas, que não atacam os problemas sociais e
econômicos, impondo aos direitos sociais dos trabalhadores a tarefa de assumir as conseqüências de
problemas conjunturais o uma violência, porque em nada estavam as causas desses problemas e
cada vez mais corroem as proteções sociais da população brasileira. É nessa situação que as
convenções e acordo coletivos de trabalham ficam cada vez mais legitimadas, quando o utilizadas
como instrumentos jurídicos autônomos capazes de resolver problemas de natureza relacional e até
social entre empregadores e trabalhadores. Pela utilização desses importantes instrumentos
autônomos de criação legislativa, a redução de jornada semanal tem acontecido em diversos
Estados do País e com diversas categorias, embora não ocorrendo redução salarial, permitindo
vislumbrar um sintomático avanço nas relações entre empregados e empregadores”. No mesmo
sentido, escreve José Eduardo Alcântara (2003, p. 107), para que “Parece-nos oportuno, como
finalização da análise do tema, apresentar algumas sugestões tendente à imposição de limites
razoáveis à flexibilização da jornada de trabalho. a primeira delas seria vincular a flexibilização à
negociação coletiva, a fim de que a entidade sindical representativa da categoria profissional
pudesse, em melhores condições, avaliar e decidir sobre a conveniência da adoção de um sistema de
jornada flexível ou da implantação de um regime de compensação anual de jornada. De qualquer
forma, a tutela sindical é o mínimo razoável para que se possa aceitar exceções à disciplina geral da
jornada de trabalho (...)”.
404
Cf. alerta feito por Augusto César Leite de Carvalho (2007, p. 298), que escreve: se o ajuste for
individual “(...) estaremos a aquiescer com a conduta de empregador inescrupuloso que, mantendo
alta rotatividade entre os seus empregados, todos com contrato de curta duração, poderia obter, no
processo admissional e protegido pela ameaça de desemprego que ronda a vida social, a
concordância expressa do empregado no sentido de que toda a sua sobrejornada seria compensada
em até um ano. Ao final do breve contrato, pagaria as horas extras excedentes como horas
extraordinárias e teria, assim, adiado a remuneração de tais horas por vários meses...”.
145
figura favorável ao empregado. Como observado, o mecanismo compensatório
anual permite, a princípio, a pactuação de horas suplementares que extenuem o
trabalhador, por semanas e meses, o que cria riscos adicionais inevitáveis à saúde e
segurança, ao contrário do que prevê o artigo 7º, XXII, da CF/88. Perdeu-se, então,
o caráter de vantagem trabalhista e qualquer argumento nesse sentido deve ser de
pronto rejeitado, pois “A agressão que propícia à saúde, higiene e segurança
laborais obscurece o sentido favorável ao trabalhador de que era ele
classicamente dotado”
405
.
Para esse autor, então, embora na aparência pareça preservar a validade do
simples acordo bilateral escrito (pois, a lei repete o escrito na CF/88), deve ser a
convenção ou o acordo coletivo de trabalho, pois, hoje, não se trataria de um
mecanismo favorável ao empregado
406
. Escreve:
(...) no instante em que o legislador infraconstitucional criou, no país, novo
tipo de regime compensatório, distinto daquele até então vigorante e,
adicionalmente, prejudicial à saúde e segurança da pessoa humana
prestadora de serviços empregatícios, não pode determinar que tal regime
prejudicial, redutor de direitos e vantagens trabalhistas, seja pactuado sem o
manto protetivo da negociação coletiva. Se não se acatar a tese da
inconstitucionalidade dessa nova figura (tese de substância, em face do
texto do art. 7º, XXII, da Carta de 1988), não se poderá, pelo menos,
permitir que ela se implemente sem os instrumentos formais da negociação
coletiva, uma vez que se sabe não ser viável à transação meramente
bilateral que estipula redução de direitos no ramo justrabalhista pátrio.
407
E,
Isso significa que o regime de compensação anual previsto pelo novo art. 59
da CLT (o chamado banco de horas) somente pode ser pactuado pelos
instrumentos formais da negociação coletiva trabalhista, em virtude de a
Constituição da República não permitir que a transação meramente bilateral
pactue medida desfavorável à saúde e segurança obreira
408
.
405
DELGADO, 2006, p. 864.
406
Embora com fundamentação diversa, Francisco Antonio de Oliveira (2007, p. 181) tem a mesma
conclusão: Todavia, a Constituição, embora faculte a compensação de jornada por meio de acordo
coletivo ou convenção coletiva, não proíbe o acordo individual. E onde a Constituição não proíbe, a lei
ordinária pode proibir. Entretanto, a MP 2.164-41, de 24.8.2001, de nova redação ao §2º do art. 59 da
CLT, tornando-se conforme à norma Constitucional. Vale dizer, fechou a porta ao acordo individual” e
“(...) Todavia, ao se ler o inciso XXVI, tem-se claramente que o termo ´acordo´, constante do inciso
XIII, é o coletivo e não o individual. Verifica-se, também, que o tema estava de alguma maneira
pacificado, exigindo que o acordo fosse sempre coletivo”.
407
DELGADO, op. cit., p. 866-867.
408
Ibid., p. 867.
146
Considerando o exposto, pesando a saúde do trabalhador (artigos , 7,
inciso XXII e XXVIII) e o incentivo para a negociação coletiva (art. 7º, incisos VI, XIV,
XXVI dentre outros), bem como os contornos e escolhas constitucionais e o “grande
medo” no que tange à extensão da jornada (art. 7º, incisos XIII e XIV) em conjunto
com a sua dignidade, em conflito com os interesses de produtividade e aumento de
produção, o peso maior parece ser o empregado. Isso indica a necessidade do
acordo coletivo ou convenção coletiva para qualquer compensação de horas.
Nesse contexto, o acordo individual não pode ser aceito, porque é
desproporcional, devendo ser considerado inconstitucional
409
.
Observe-se que, eventualmente, o caso concreto pode indicar mais razões
para que o acordo individual, ou até tácito, seja aceito, como, por exemplo, períodos
pequenos, para alguns feriados ponte, sábados, pequenas empresa, um único dia
etc. Não problema nisso. O problema está na decisão geral e abstrata tomada
pelo Tribunal Superior do Trabalho, que desconsidera toda a dogmática indicada,
bem como o fato de que sua decisão pode inviabilizar uma discussão em nível
superior, seja por ele mesmo ou pelo Supremo Tribunal Federal.
409
Haveria, inclusive, a intenção de se adotar o acordo individual para as hipóteses de compensação
semanal e ajuste coletivo para a compensação anual ou banco de horas. Entretanto, o é isso que
se tem notado e não é isso o que consta da Súmula. Por outro lado, a compensação, nos termos da
Constituição, sempre deverá ser entabulada mediante acordo escrito e com mediação do sindicato da
categoria. Essa intenção é apontada por Augusto César Leite de Carvalho (2007, p. 302), que
escreve: “Existe, contudo, a clara intenção de adotar o ajuste individual somente para o acordo
semanal de compensação de jornada, não o permitindo para o banco de horas que se preste à
compensação de horas de trabalho com base em períodos mais extensos. Comentando a nova
redação da Súmula 85 do TST na página virtual daquela Corte, em 28/10/2003, o Ministro Vantuil
Abdala explicou: ´Isso é diferente do banco de horas, que é um acordo para se compensar horas
trabalhadas a mais de maneira global. No chamado banco de horas, nós entendemos que é
necessária a participação do sindicato, até para fiscalizar se essa compensação global es
efetivamente sendo observada´”.
147
5 CONCLUSÃO
As normas de direitos fundamentais podem ser concebidas como regras,
como princípios ou como regras e princípios e o seu âmbito de proteção pode ser
restrito ou amplo. A conjugação do entendimento de tais concepções leva à adoção
dos entendimentos da teoria interna ou teoria externa sobre as restrições dos
direitos fundamentais.
A concepção das normas de direitos fundamentais como regras e com um
âmbito de proteção restrito implica a adoção da teoria interna, ou seja, os direitos
fundamentais são irrestringíveis e não entram em colisão. No máximo, o que se tem
são delimitações dos direitos fundamentais ou revelação dos limites imanentes, o
que sempre é feito “a priori”. Como não restrições aos direitos fundamentais e
nem colisões envolvendo tais direitos, diminui-se a eficácia ou se inviabiliza o
controle de constitucionalidade na interferência dos direitos fundamentais.
Pelo contrário, a concepção de que as normas de direitos fundamentais têm a
estrutura de regras e princípios e de que seu âmbito de proteção é amplo leva às
conclusões da teoria externa, ou seja, os direitos fundamentais podem ser
restringidos e estão em constante colisão, entre si ou com outros bens
constitucionais.
Aparentemente, as conclusões da teoria externa enfraquecem os direitos
fundamentais, mas isso não é assim. Porque são fundamentais, a restrição de tais
direitos e solução das colisões envolvendo-os dependem do preenchimento de
requisitos formais e materiais de constitucionalidade, os “limites dos limites”. Caso
não se reconheça a existência de tais situações, elas serão resolvidas de outras
formas, ou pior, elas serão apenas mascaradas.
Os “limites dos limites”, mais comuns, são o princípio da reserva legal, o
princípio da proporcionalidade, formado pelos subprincípios da adequação, da
necessidade e da proporcionalidade em sentido estrito e pela preservação do núcleo
essencial. Isso quer dizer que, se existem restrições e colisões envolvendo direitos
fundamentais, ambas devem passar pelos testes desses “limites dos limites”. Nesse
contexto, deve-se reconhecer a existência de restrições e colisões envolvendo
direitos fundamentais, inclusive com um conceito amplo de restrições, visando, com
isso, a um maior controle das interferências em tais direitos. Com isso se quer dizer
148
que, chegando-se a primeira grande conclusão, a metodologia da teoria externa é
mais eficaz, objetiva e racional no controle de constitucionalidade das interferências
nos direitos fundamentais. Ora, se as restrições e colisões envolvendo os direitos
fundamentais existem, elas devem ser controladas, sob pena de
inconstitucionalidade, pelo contrário, se elas não existem, não necessidade de
controle. Por outro lado, as delimitações e a revelação de limites imanentes, que
evitariam a existência de restrições e colisões envolvendo os direitos fundamentais,
embora estejam sujeitas a algum tipo de controle de constitucionalidade, como a
justificação, não se sabe exatamente qual é esse controle.
Considerando a opção pelas conclusões da teoria externa, no campo das
restrições aos direitos fundamentais e considerando a existência e necessidade de
observação dos “limites dos limites”, o Tribunal Superior do Trabalho não está
devidamente atento a esta matéria. Nos quatro exemplos abordados, as opções
tomadas pelo Tribunal Superior do Trabalho, embora impliquem restrições a direitos
fundamentais dos trabalhadores, não observam os requisitos de
constitucionalidades, os “limites dos limites”.
No caso da estabilidade da empregada gestante (artigo 10º, inciso II, do
ADCT), a impossibilidade de reintegração e a necessidade de comunicação do
empregador, bem como a confirmação da gravidez mediante um teste respectivo
significam restrições que ofendiam e ofendem o princípio da reserva legal, o
princípio da proporcionalidade e a preservação do conteúdo essencial desse direito
fundamental.
No caso da estabilidade do dirigente sindical, conforme previsão da Súmula
269/I/TST, quando se reconhece a constitucionalidade do artigo 522 da CLT, que
restringe os direitos fundamentais previstos no artigo 8º, incisos I e VIII, da
Constituição Federal de 1988, a Súmula também é inconstitucional. Trata-se da
admissão de uma restrição, de forma geral e abstrata, de uma restrição a direito
fundamental que não observa o princípio da proporcionalidade.
No caso da autorização para o monitoramente do e-mail do empregado, pelo
empregador, no local e durante o horário de trabalho, não houve observância do
princípio da proporcionalidade. Considerando que o e-mail do empregado está
protegido pelos direitos fundamentais de privacidade (art. 5º, inc. X, da CF/88) e pelo
sigilo das comunicações (art. 5º, inc. XII, da CF/88) e que há uma dogmática
específica para eventual restrição e limitação de tais direitos, o monitoramente e
149
rastreio do mesmo, pelo empregador, não pode ser autorizado ou admitido de forma
indiscriminada. O posicionamento que entende por essa possibilidade é
inconstitucional, porque se trata de uma restrição ilegítima ao direito fundamental de
privacidade e sigilo de comunicação. A restrição é ilegítima porque ofende um dos
limites dos limites (sem prejuízo da análise dos demais limites), que é o dever de
proporcionalidade, em seus três subprincípios.
Finalmente, o Tribunal Superior do Trabalho, quando determina o pagamento
apenas do adicional de horas extras, em algumas hipóteses e quando insinua que a
compensação é de 1 hora extra trabalhada, por 1 hora de descanso, viola o
conteúdo essencial do artigo , inciso XVI, sem prejuízo da análise dos demais
limites dos limites, pelo que essa restrição é inconstitucional. Da mesma forma, a
admissão do acordo tático e escrito direto com o empregado viola o princípio da
reserva legal. De toda sorte, uma interpretação nesse sentido implicaria ofensa ao
princípio da proporcionalidade. Esses acordos nem sempre serão benéficos ao
trabalhador, não são necessários porque a via coletiva é viável e mais segura ou
nem sempre os interesses da empresa, maior beneficiária, em regra, das
compensações, devem prevalecer, especialmente porque a compensação, em
grande escala, pode afetar outros direitos fundamentais, em especial, a saúde dos
trabalhadores.
Em resumo, a segunda grande conclusão é que, nos quatro casos abordados,
as interferências do Tribunal Superior do Trabalho significaram restrições
inconstitucionais de direitos fundamentais dos trabalhadores, porque não observa a
dogmática específica, em especial, os “limites dos limites”.
150
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