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Na síntese do julgado, a decisão do Superior Tribunal de Justiça sobre a
responsabilidade do Estado de indenizar produtores de açúcar e álcool, em face dos prejuízos
causados pelos planos econômicos Funaro, Bresser, Verão, Collor I e II, se desenvolve em
torno dos seguintes eixos: intervenção do Estado no domínio econômico, responsabilidade
objetiva do Estado.
A intervenção do Estado na economia é permitida quando necessária aos imperativos
da segurança nacional, relevante interesse coletivo, na forma em que a lei estabelecer. E como
agente normativo e regulador da atividade econômica a intervenção se dá, na forma da lei, nas
funções de fiscalização, incentivo e planejamento, obrigatório para o setor público e
indicativo para o setor privado, conforme o disposto nos artigo 173 e 174 da Constituição
Federal de 1988. Essa intervenção deve respeitar os fundamentos e princípios da ordem
econômica contidos no artigo 1º, inciso IV; artigo 170 e incisos, de tal forma que não venha a
tolher os princípios da livre iniciativa, livre concorrência e do livre jogo dos mercados.
O julgado reconhece que a intervenção equivocada do órgão estatal (Instituto do
Açúcar e do Álcool) ao estabelecer preços dos produtos comercializados pelo setor sucro-
alcooleiro, abaixo dos custos de produção, trouxe prejuízos para ao setor cabendo, portanto,
indenização. O agravante no caso é que o próprio órgão estatal, não adotando os custos de
produção do levantados por instituição de renome nacional, a Fundação Getúlio Vargas,
cartéis, trustes e outras deformações que caracterizam a concentração do poder econômico nas mãos de uma ou
de poucos. Essas deformações da ordem econômica acabam, de um lado, por aniquilar qualquer iniciativa,
sufocar toda a concorrência e por dominar, em conseqüência, os mercados e, de outro, por desestimular a
produção, a pesquisa e o aperfeiçoamento. Em suma, desafiam o próprio Estado, que se vê obrigado a intervir
para proteger aqueles valores, consubstanciados nos regimes da livre empresa, da livre concorrência e do livre
embate dos mercados, e para manter constante a compatibilização, característica da economia atual, da
liberdade de iniciativa e do ganho ou lucro com o interesse social. A intervenção está, substancialmente,
consagrada na Constituição Federal nos arts. 173 e 174. Nesse sentido ensina Duciran Van Marsen Farena
(RPGE, 32:71) que “O instituto da intervenção, em todas suas modalidades encontra previsão abstrata nos
artigos 173 e 174, da Lei Maior. O primeiro desses dispositivos permite ao Estado explorar diretamente a
atividade econômica quando necessária aos imperativos da segurança nacional e ou a relevante interesse
coletivo, conforme definido em lei. O segundo outorga ao Estado, como agente normativo e regulador da
atividade econômica, o poder para exercer, na forma da lei as funções de fiscalização, incentivo e
planejamento, sendo esse determinante para o setor publico e indicativo para o privado”. Pela intervenção o
Estado, com o fito de assegurar a todos uma existência digna, de acordo com os ditames da justiça social (art.
170 da CF), pode restringir, condicionar ou mesmo suprimir a iniciativa privada em certa área da atividade
econômica. Não obstante, os atos e medidas que consubstanciam a intervenção hão de respeitar os princípios
constitucionais que a conformam com o Estado Democrático de Direito, consignado expressamente em nossa
Lei Maior, como é o principio da livre iniciativa. Lúcia Valle Figueiredo, sempre precisa, alerta a esse respeito
que “As balizas da intervenção serão, sempre e sempre, ditadas pela principiologia constitucional, pela
declaração expressa dos fundamentos do Estado Democrático de Direito, dentre eles a cidadania, a dignidade
da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa” (DIÓGENES GASPARINI, in Curso de
Direito Administrativo. 8 Edição, São Paulo: Saraiva, p. 629/630).