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a falta de instrumentos e recursos adequados para a investigação policial; a inflação penal, o
baixo número de operadores do direito (juízes, promotores, defensores públicos, delegados de
polícia)
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e as condições sub-humanas do sistema carcerário, entre outros, fazendo com que a
execução penal não tenha nenhum caráter ressocializador
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e atue tão somente como um braço
forte e repressor do Estado (aliás, o único conhecido por essa população). Não bastasse isso,
as teorias disponíveis para a grande maioria dos operadores não possuem ferramentas capazes
de contribuir para o desvelamento dos fenômenos que cada vez mais assombram a população.
É justamente em relação a este último fator, especialmente a partir da superpopulação
carcerária
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, em que se produzem e reproduzem ações criminosas, em um mecanismo de fluxo
e refluxo, que a ação estatal acaba por não contribuir com nenhum resultado no sentido de
minimizar a alimentação desse grande organismo criminal
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.
Assim, vale destacar o pensamento de Roxin para quem, in verbis:
como é o lugar para onde se manda. Há quem se delicie com o sofrimento imposto, imaginando o que está
acontecendo com os autores de certos tipos de crimes.” (SOUZA, 2006, p.12)
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Não se desconhece o relato do sociólogo Edmundo Santos Coelho, ao apontar a existência das facções em
meados de 1983. Salienta o referido autor: O primeiro confronto direto das duas facções deu-se na noite de 12 de
abril de 1983, quando houve um tiroteio na 3º galeria da Ilha Grande, da manhã do dia 13 à tarde do mesmo dia,
foram assassinados cinco internos, quatro dos quais em unidades do complexo penal da rua Frei Caneca [...].
Naquela noite, ficara declarada guerra aberta entre as facções; para a administração do sistema penal, começava
o problema de como isolar os grupos, em meio a uma crescente onde de violência. (2005, p. 127).
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“O crime organizado construiu seu formato, estabeleceu seus códigos, criou uma nova linguagem, avançou
sobre funcionários de presídios, sobre juízes, policiais, promotores, advogados e jornalistas. Conseguiu
atemorizar a todos, paralisar cidades, causar a expectativa dos dias seguintes.[...]Esse é o mundo do crime
moderno, que transforma presídio em escritório, líderes de facções em patrões, dominados em empregados,
cemitérios em valas de teorias. A função da prisão nunca foi essa. Solução, ela deixou de ser. Estranho,
enigmático mundo. (SOUZA, 2006, p.14)
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Só aparentemente está à disposição do sujeito escolher o sistema de valores ao qual adere. Em realidade,
condições sociais, estruturas e mecanismos de comunicação e de aprendizagem determinam a pertença de
indivíduos a subgrupos ou subculturas, e a transmissão aos indivíduos de valores, normas, modelos de
comportamento e técnicas, mesmo ilegítimos. (BARATA, 1999, p. 74).
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“Dados fornecidos pelo Departamento Penitenciário Nacional, indicam, no Brasil, um déficit de mais de
135.000 vagas. Dos 336.358 presos existentes no país, 262.710 cumprem pena em penitenciárias sob condições
precárias. Ocorrem em média duas rebeliões e três fugas por dia. São 345 mil mandados de prisão expedidos e
não cumpridos, em um país em que são praticados mais de 1 milhão de crimes por ano. Ainda segundo o
departamento penitenciário nacional (DEPEN), o Brasil possui 175 estabelecimentos prisionais em situação
precária, sendo necessária a construção de mais de 130 prisões para que não haja superlotação, a um custo médio
de US$ 15 milhões de dólares para cada unidade prisional construída. Segundo dados publicados pela Fundação
Internacional Penal e Penitenciária, o Brasil é o país da América Latina com a maior população carcerária, bem
como com o maior déficit de vagas vinculadas ao sistema prisional brasileiro. O México ocupa o segundo lugar
neste ranking com 151.724 presos e um déficit de 38.214 vagas, seguido da Colômbia e do Chile, com um déficit
de 8.074 vagas para um montante de 39.985 presos”. (PORTO, 2005. p.21).
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[...] “é importante destacar que está em andamento no Rio de Janeiro uma forte crise dentro das facções. Por
conta disso, existem sim uma “lei do silêncio” entre os presos e os agentes penitenciários e autoridades da SEAP
sobre a dimensão do problema das facções. Somente em setembro de 2005, pelo menos três presos de grande
importância do CV foram assassinados pelo coletivo.Um quarto integrante da facção foi salvo de um
enforcamento por um guarda penitenciário. Dos quatro casos, apenas um teve alguma exposição nos jornais:o
assassinato do traficante de armas e drogas conhecido como Marquinho Niterói”. (CALDEIRA, Revista de
Ciências Criminais, n.º 23, 2006, p.111).