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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
CENTRO DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO-UFPB
Iolanda Carvalho de Oliveira
RELAÇÕES DE PODER COMO EXPRESSÃO DE PRÁTICAS
(RE) CONSTRUÍDAS NO CONTEXTO DA ESCOLA
João Pessoa, agosto de 2008
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Iolanda Carvalho de Oliveira
RELAÇÕES DE PODER COMO EXPRESSÃO DE
PRÁTICAS (RE) CONSTRUÍDAS NO CONTEXTO DA ESCOLA
Tese de Doutorado apresentada como requisito
parcial para a obtenção do título de Doutora
em Educação, no Programa de Pós-graduação
em Educação, na Universidade Federal da
Paraíba, linha Políticas Públicas, sob a
orientação da Profª Drª Emília Maria da
Trindade Prestes, no ano de 2008.
João Pessoa, agosto de 2008
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Ficha catalográfica– Biblioteca Central Julieta Carteado
Área de concentração: Educação
Linha de Pesquisa: Políticas Educacionais
Titulação: Doutorado em Educação
Banca Examinadora:
Data da Defesa: 29 de agosto de 2008
Programa de Pós-graduação em Educação
948 r
Oliveira, Iolanda Carvalho de
Relações de poder como expressão de práticas (re)
construídas no contexto local da escola/Iolanda Carvalho de Oliveira,
- João Pessoa 2008.
84p.
Orientadora: Emília Maria da Trindade Prestes
Tese (Doutorado) UFPB/CE
1. Escolas Públicas, - Ba, 2. Ensino Médio, 3.
Relações de poder, 4. Educação.
UFPB/E CDU: 37.057(813-8) (043)
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Iolanda Carvalho de Oliveira
Tese aprovada em 30/ 08/ 2009
BANCA EXAMINADORA
_______________________________________
Profª. Drª. Emília Maria da Trindade Prestes – UFPB
ORIENTADORA
______________________________________________
Prof. Dr. José Franscisco de Melo Neto
EXAMINADOR
______________________________________________
Prof. Dr. Wilson Honorato Aragão - UFPB
EXAMINADOR
_____________________________________________
Prof. Dr. Júlio César Cabrera Medina-UEPB
EXAMINADOR
_____________________________________________
Prof. Dr. Flávio Lúcio Rodrigues Vieira – PPGH/UFPB
EXAMINADOR
5
AGRADECIMENTOS
Inicialmente, os agradecimentos institucionais. À UFPB, que me
acolheu durante os anos da pesquisa, possibilitando a conclusão da
tese;
À minha orientadora, Profª DEmília Maria Prestes, pela confiança e
sabedoria em dosar o tempo e, não menos importante, por seus
cuidados e paciência durante todo o processo;
Aos estudantes, professores, coordenadores e diretores das escolas da
rede pública de Salvador-Bahia, cuja colaboração se tornou
fundamental para as implicações e os resultados gerados durante o
processo deste trabalho investigativo;
A todos os professores das disciplinas do Curso de Doutorado e
demais colegas da segunda turma 24, bem como aos amigos
próximos;
À minha família, formada por crianças, adolescentes e jovens adultos
e, especialmente, por minha mãe e meu pai, que têm me ensinado
sobre a importância de me deixar conduzir inteiramente por meu
espanto e admiração diante das adversidades e obstáculos impostos
pela vida, mas igualmente pelo desejo de continuar lutando pela
conquista de novos conhecimentos e realização de meus sonhos;
Enfim, a todos aqueles que, de alguma maneira, contribuíram para a
construção e a realização desta pesquisa: minha dedicatória e prova de
meu reconhecimento!
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RELAÇÕES DE PODER COMO EXPRESSÃO DE PRÁTICAS (RE) CONSTRUÍDAS
NO CONTEXTO DA ESCOLA
RESUMO
Esta investigação objetivou compreender como se processam as relações de poder
e de seus efeitos, no cotidiano da escola pública, na rede estadual de Salvador - Bahia, Brasil.
Como conseqüência deste objetivo principal, o estudo também propõe como objetivos
específicos: (1) identificar e analisar as percepções sobre relações de poder entre professores e
estudantes da escola de ensino médio; (2) analisar os micromecanismos específicos de
ocorrência das relações de poder que expressam dominação-sujeição; (3) analisar os modos de
resistência do e ao poder entre os diferentes agentes da escola. Busca-se compreender os
mecanismos de dominação e sujeição presentes nas práticas da escola que inviabilizam a
construção de uma escola democrática. Como referencial teórico do estudo apoiou-se nas
abordagens de Michel Foucault, Gilles Deleuze e Michel De Certeau, através das categorias
relações de poder, dominação-sujeição, objetivação-subjetivação e resistência. Adotou-se
como metodologia as entrevistas e os grupos focais, em escolas da rede publica de Salvador -,
e a análise de documentos oficiais. Podemos concluir com os resultados obtidos que nas
escolas estudadas as relações de poder são semelhantes aos tipos de relações produzidas na
sociedade. Estas relações explicitam dominação e sujeição que não se constituem de
mecanismos fixos, mas de mecanismos flexíveis capazes de serem modificados.
Palavras-chave: Escolas Públicas. Ensino Médio. Relações de poder. Resistência.
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RELACIONES DE PODER COMO EXPRESIÓN DE LA PRÁCTICA (RE)
CONSTRUÍDAS EN EL CONTEXTO DE LA ESCUELA
RESUMEN
Esta investigación tuvo como objetivo estudiar las relaciones de poder y sus
efectos durante el cotidiano de las escuelas públicas en la red estatal de Salvador Bahía,
Brasil. Para mejor entendimiento de estas relaciones fueron estudiados los siguientes
objetivos específicos: (1) identificar y analizar las percepciones de las relaciones de poder
entre maestros y alumnos de escuelas secundarias, (2) analizar as incidencias especifica de la
micromecanismos específicos de ocurrencia de las relaciones de poder que expresa la
dominación sometimiento, (3) analizar las formas de resistencia y del poder entre los
diversos actores em la escuela. Trate de comprender los mecanismos de dominación y
sumisión de estas prácticas de la escuela para prevenir la construcción de una escuela
democrática. Como un marco teórico del estudio se basa en planteamientos de Michel
Foucault, Gilles Deleuze y Michel De Certeau, por categorías de las relaciones de poder,
dominación, sumisión, cosificación, la subjetivación y resistencia. La metodología adoptada
fueron entrevistas e grupos focales en escuelas en la red publica de Salvador BA, y análisis
de documentos oficiales. Podemos concluir con los resultados obtenidos, que en las escuelas
estudiadas las relaciones de poder son similares a los tipos de relaciones producidos en la
sociedad. Estas relaciones, producen modos de dominación que no constituyen mecanismos
fijos, pero los mecanismos flexibles que puedan ser modificados.
Palabras clave: Escuelas Públicas, de alta escuela, las relaciones de poder, la resistencia.
8
Relations de pouvoircomme expression de pratiques
(re)construites dans le contexte scolaire
Résumé
Cette recherche a pour objet de comprendre comment se jouent les relations de pouvoirs et
leurs effets au quotidien dans les écoles publiques du réseau étatique à Salvador-BA. Comme
conséquence de cet objectif principal, l’étude propose aussi comme objectifs spécifiques: 1.
Identifier et analyser les perceptions au sujet des relations de pouvoir entre professeurs et
étudiants du cycle d’orientation; 2. Analyser les micromécanismes spécifiques présents dans
les relations de pouvoir qui expriment domination-assujettissement; 3. Analyser les modes de
résistances et de pouvoir entre les différents agents de l’école. Nous cherchons à comprendre
les mécanismes de domination et d’assujettissement présents dans les pratiques de l’école qui
empêche la construction d’une école démocratique. Comme référence théorique l’étude
s’appuie sur les travaux de Michel Foucault, Gilles Deleuze et Michel de Certeau, à travers les
items ; relations de pouvoir, domination-assujettissement, objectivation-subjectivation et
résistance. Nous adoptons comme méthodologie les entretiens et groupes choisis dans les
écoles du réseau publique Salvador-BA, et l’analyse de documents officiels. Avec les résultats
obtenus, nous pouvons conclure que dans les écoles observées les relations de pouvoir sont
semblables aux types de relations que nous retrouvons dans la société. Ces relations traduisent
domination et assujettissement qui ne sont pas faits de mécanismes fixes, mais de mécanismes
flexibles susceptibles d’être modifiés.
Mots-clefs: Ecoles Publiques, Cycle d’orientation, Relations de pouvoir, Résistance
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LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Ilustração 1- Registro fotográfico do Instituto Central de Educação Isaías Alves ..................28
Ilustração 2 - Registro fotográfico do Colégio Estadual Senhor do Bonfim ..........................29
Ilustração 3 - Registro do Centro Educacional Edgard Santos ................................................30
Ilustração 4 - Registro fotográfico dos grupos focais organizados nas escolas ......................32
Ilustração 5 - Registro fotográfico do processo de esclarecimentos junto aos grupos ............33
Ilustração 6 - Registro fotográfico dos professores que participaram do grupo focal .............34
Ilustração 7 - Registro fotográfico dos alunos que participaram do grupo focal ....................35
Ilustração 8 - Procedimentos empregados no grupo focal .......................................................36
Ilustração 9 - Registro fotográfico da aplicação do Roteiro de imagem nos grupos focais.....37
Ilustração 10 - Registro do Modelo do roteiro interativo ........................................................38
.Ilustração 11 - Registro das discussões em dupla para responder questões do roteiro............39
Ilustração 12 - Registro fotográfico de um dos 12 grupos focais onde os dados foram
recolhidos .................................................................................................................................40
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SUMÁRIO
RESUMO
ABSTRAT
LISTA DE TABELAS
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
INTRODUÇÃO......................................................................................................................................................13
CAPITULO 2. PROBLEMA DE INVESTIGAÇÃO E HIPÓTESE E PERCURSO METODOLOGICO ..........16
2.1 Da problemática da Pesquisa.............................................................................................................................16
2.3 Dos objetivos do estudo....................................................................................................................................21
2.4 Do referencial teórico ......................................................................................................................................22
2.5. O Percurso Construído na Pesquisa.................................................................................................................25
2.5.1 As fases de campo..........................................................................................................................................26
2.5.1.1 Fase de mapeamento das escolas: .............................................................................................................26
2.5.1.2 Fase de acesso às escolas: .........................................................................................................................27
2.5.1.4 Fases da coleta de dados............................................................................................................................31
2.5.1.4.1 Entrevistas ...............................................................................................................................................31
2.5.1.4.2 Grupo Focal: ..........................................................................................................................................32
2.5.1.5 O processo de planejamento com grupos focais........................................................................................33
2.5.1.5 Os participantes dos grupos focais ...........................................................................................................34
2.5.1.6 Os procedimentos utilizados ao optar pela técnica do grupo focal............................................................36
2.6 Procedimentos para a apreensão e análise de dados.........................................................................................40
CAPITULO 3. CONSTRUTOS ANALÍTICOS DO PODER................................................................................41
3.1. O caminho analítico apontado por Foucault .................................................................................................. 41
3.2. As relações de poder explicitam relações de dominação.................................................................................42
3.3. Diagramas que perpassam os campos sociais .................................................................................................43
3.4 Recondução de um diagrama disciplinar para um diagrama do controle ........................................................45
3.5 Diagrama da sociedade de controle ................................................................................................................ 49
3.6 Relações de Poder e resistência inscrita numa determinada conjuntura histórica ...........................................52
11
3.7 Microrresistências na trama complexa das relações de poder..........................................................................54
CAPITULO 4 – DADOS RELACIONADOS ÀS RELAÇÕES DE PODER (RE) CONSTRUIDAS NO
CONTEXTO ESCOLAR .......................................................................................................................................56
4.1 Disciplina: instrumento de dominação e controle.............................................................................................57
4.1.1. As técnicas disciplinares..............................................................................................................................58
4.1.2 Violência que se impõe através das técnicas punitivas e disciplinares..........................................................60
4.2 Autoridade hierárquica .....................................................................................................................................66
4.2.1 Autoridade e poder na avaliação ...................................................................................................................68
4..3. .Relações de poder e possibilidade de resistência.......................................................................................... 70
4.4. Ética e poder.....................................................................................................................................................75
CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................................................................77
REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICA......................................................................................................................80
ANEXOS ................................................................................................................................................................85
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ACERTOS E DESACERTOS
Acredito que tudo o que se faz com boa intenção deve ter o aval dos
bons propósitos.
O pesquisador, na sua investigação científica, sente-se impulsionado
pela força de vontade ou vocação a penetrar no universo,
completamente desconhecido, a fim de retirar dele subsídios que são
transformados em elementos e sustentáculos para o progresso da
humanidade.
A pesquisa científica, por exemplo, ajuda-nos a indicar os meios de
como devemos nos proteger para continuarmos a viver.
Entretanto, o mundo não navega apenas no mar dos acertos. Em
alguns programas de pesquisa, acontecem erros, falhas nos seus
procedimentos, mesmo sendo dirigidos por bons objetivos.
Nesse caso, devemos ser compreensivos, humanos e reconhecidos
quanto às nossas limitações. É claro que, no mundo da ciência, os
pesquisadores se empenham para que tudo seja programado,
previamente projetado, porque não acredito que o homem queira
nadar no mar escuro dos desacertos.
Todo ser humano está fadado aos acertos e aos desacertos. Creio que
todo homem de ciência está preparado para tal. O mais curioso é que,
como a vida é cheia de controvérsia e profundo labor, infelizmente
nem tudo pode ser somente acertos. Onde há o acerto, há também, em
dose menor, o desacerto.
João de Deus S. Oliveira
13
1. INTRODUÇÃO
O tema deste trabalho é o poder. Pretendo tratá-lo analiticamente, considerando
esse fenômeno sob o prisma da relação social, entendida em sua dimensão objetiva e
subjetiva. Assim, o objeto de estudo são as relações de poder tais como se dão na escola
capitalista brasileira. A análise enfoca cinco escolas públicas do Ensino Médio em Salvador-
BA- e privilegia a dimensão objetiva-subjetiva, em especial, as manifestas relações de poder
sob a forma de percepções individuais dos agentes escolares acerca das diferentes práticas
formais e informais e seus efeitos.
Analisar essas manifestações, enquanto relação de poder, é aprender os nexos com
a estrutura de dominação e sujeição e não perder a reconfiguração específica de cada um
desses tipos de manifestação de relação de poder. Essa relação compreende práticas sociais,
comportamentos, desenvolvimento cognoscitivo e emoções individuais, modalidades
constitutivas da escola capitalista.
As relações de poder, na escola pública, guardam os limites e atualizam as
dominações e sujeições no capitalismo. Em outras palavras, na escola pública, muitas das
características das relações de poder, ainda que mantidas nas suas peculiaridades, são
semelhantes a outras relações sociais, por ser capitalista.
O interesse pela temática especificando a escola deve-se, em princípio, à
circunstância de ser docente do Ensino Médio, condição que me permitiu observar, como
professora de Filosofia, as dificuldades frequentemente associadas às interações e relações
entre os sujeitos escolares. Essas dificuldades de interação, diálogo e vivência dizem respeito
às condições relativas às relações de poder, tema que passou a merecer a atenção e a ser
proposto como tema-problema desta pesquisa, cujas vias de análise são direcionadas para
saber como se estruturam essas relações no âmbito escolar, pelo prisma das estratégias sociais
de dominação e sujeição, o que é fundamental para se refletir sobre o comportamento da
sociedade na manifestação dessas relações, razão pela qual estou interessada no modus
operandi, isto é, em conhecer de que modo se processam as relações de poder no âmbito
escolar e qual é o significado que a resistência no corpo dessas relações recobre para os
agentes escolares.
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Na abordagem dessa questão, visamos superar as perspectivas reprodutivistas
e unilaterais sobre o exercício do poder, uma vez que a
instituição escolar não pode ser
vista apenas como reprodutora das relações advindas do plano da macroestrutura, mas
também dessas relações em dimensões objetivas e subjetivas.
Autores como Althusser (1974), Bourdieu e Passeron (1976), afirmam que a
cultura da escola é resultado das relações sociais de produção e que essa mesma escola,
através de mecanismos de dominação e de poder, realiza um trabalho de inculcação
ideológica, para formar pessoas que tenham condições de se adaptar à estrutura social e
política, de forma harmoniosa, pacífica e ajustável
, em termos normativos, sem o exercício
dialético da força, suscitada por Foucault nas suas teorias, quando analisa que o poder não é
apenas um modo de sujeição ou dominação, é também um mecanismo que incita a
transformação – é algo que produz uma reação.
Para tanto, a metodologia privilegiada é a qualitativa, que permite a percepção dos
participantes desse processo, como alunos, professores e demais membros da Escola. A
intenção é trazer à luz as percepções que são construídas sobre as relações de poder que se
processam na escola e permitem resistir e transpor as limitações e coerções características do
cotidiano escolar instituído a partir da experiência de resistência.
O tema da presente tese se limitou a uma discussão sobre relações de poder, na
perspectiva de Foucault, para chegar a uma compreensão geral da problemática dessas
relações, no contexto da escola. Subdividimos a tese em três capítulos: no primeiro, uma
apresentação geral do trabalho, a explicitação do lugar teórico, a partir do qual foi realizado o
estudo, a problemática, bem como as etapas e os procedimentos metodológicos.
O segundo capítulo indica as balizas conceituais com referência à concepção de
poder foucaultiana, focalizando o poder enquanto dominação, apontando para uma
pluralidade de poderes, que caracteriza a sociedade contemporânea. Serão mencionadas
características que atravessam as relações de poder e a propagação das tecnologias de controle
social, imprescindíveis para o desenvolvimento da sociedade capitalista, aspecto que se insere
dentro das reflexões sobre a resistência aos micropoderes que ocorrem no local.
O terceiro capítulo propõe analisar e tratar os dados coletados, de forma a prepará-
los para as análises a serem feitas, e enfatizar as percepções dos agentes escolares sobre
relações de poder
na escola, identificando
as características e práticas particulares que
incitam sujeição ou
dominação e, contraditoriamente, uma transformação, uma reação.
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O último capítulo é dedicado às considerações finais decorrentes das análises
dos resultados obtidos. Esse capítulo encerra com a identificação de lacunas que devem
ser alvo de investigações futuras.
16
2. PROBLEMA DE INVESTIGAÇÃO, HIPÓTESE E PERCURSO METODOLÓGICO
2.1 Da problemática da pesquisa
O esforço de compreensão das atuais relações de poder existentes dentro de
instuições escolares específicas, em Salvador-BA, ressalta a necessidade de uma investigação
mais orientada para a trama móvel das relações de poder e, consequentemente, para
possibilidades de resistência dentro da escola, numa dimensão relevante na identificação do
que é exatamente essa instituição escolar.
O problema das relações de poder, intrinsecamente ligadas à dominação como
tema de análise científica, tem fixado a atenção dos cientistas sociais, que esse é um
problema inerente às situações societárias em geral e, nesse sentido, presente também na
sociedade. Portanto, sob esse aspecto, as relações de poder são fenômenos submetidos a
diferentes análises e abordagens teóricas.
Então, na contemporaneidade, o que muda quando se estudam as relações de
poder que vêm acompanhadas da história das diferentes civilizações? Parece possível afirmar
que existe uma mudança na estrutura das relações de poder que acontece em todos os níveis
da sociedade, visíveis nos conflitos políticos, étnicos, raciais, religiosos e de gênero, que vêm
se multiplicando, configurando o caráter novo e recorrente dessas relações no cotidiano da
vida social. Essa rotinização das relações de poder, à proporção que emergem no cotidiano
dos indivíduos, adquirem uma relativa visibilidade como fenômeno sociológico e também
educacional.
As relações de poder são originadas nas relações sociais e se concretizam nas
práticas, inclusive nas escolas. O exercício do poder é orientado por relações interpessoais
diretas, desencadeando uma rede de relações em que todos concretamente podem exercer
poder de formas visíveis e diretas, ou vice-versa. As redes de relações ficam, a cada dia, mais
ramificadas e dispersas nos microespaços da escola: sala de aula, sala do diretor, sala de
professores, secretaria, sala da diretoria, biblioteca, laboratório de informática, auditório e
demais ambientes.
Essa rede de relações não está fora das redes de relações sociais que entrecruza os
vários ambientes da escola e os micropoderes que sustentam as redes de relações nos níveis:
micro, meso e macro.
17
Evidentemente, o poder que existe em todos os níveis de relações sociais não é de
caráter apenas macro, mas também de caráter micro, tem uma dinâmica própria e, por
conseguinte, muitas vezes, não representa (muito menos reproduz) as relações do macro.
Trata-se de perceber nas relações de poder existentes no universo macro da
sociedade a interação com o nível macro, contemplando relações multidimensionais de poder
em diferentes níveis espaciais. Assim, as relações de poder veiculadas na sociedade permitem
pensar o micro, e não apenas o macro, ou seja, os elementos moleculares de sua realização
que comprovam as teias dos micropoderes largamente disseminadas na sociedade e nos
microespaços da família, do trabalho e da escola. Os professores estão descobrindo que os
alunos não aceitam pacificamente imposições, ameaças de notas baixas e suspensão, como
muitos faziam antigamente. Hoje, são os alunos que, em algumas situações, fornecem o
enquadramento do professor na sala de aula até mesmo com ameaça, exercendo seu poder de
coerção.
Entender essa condição ambígua em que a escola se encontra é primordial para se
compreenderem os processos dialéticos do exercício do poder, já que, na escola, os indivíduos
e grupos são devidamente controlados pelos mecanismos de poder constituídos na própria
escola, ao mesmo tempo em que reproduz mecanismos estruturados pela sociedade nas suas
relações.
Os mecanismos de produção e reprodução social garantem a estrutura de poder
organizada na escola, através de processos, como o disciplinar e o de vigilância. A disciplina
e a vigilância se apoiam numa estrutura escolar mais rígida e estável, que procura garantir a
obediência e a domesticação do corpo discente. Na escola, todos os profissionais se inserem
nessa lógica, são vigiados e, ao mesmo tempo, vigiam. Essa vigilância ocorre desde a própria
estruturação física da escola até a forma de gestão adotada, onde os cargos se organizam num
escalonamento de supervisão, a exemplo do diretor, que supervisiona o professor, e o
professor que controla o diretor.
O poder também é exercido por meio de uma rede de controle que é, inclusive,
regulamentada pelo Estado, por meio das regras institucionais e de um sistema burocrático
que dificulta a mudança da estrutura hierárquica, de relação de dominação e sujeição de
alguns sobre outros. E assim, destaca Foucault (1999, p.52), que “São todos esses
mecanismos e todos esses aparelhos de dominação que constituem o pedestal efetivo do
aparelho global constituído pelo aparelho escolar”.
18
As relações de poder entre os indivíduos têm uma dimensão articulada com os
processos históricos enfatizados na própria lógica do poder, que não é linear, mas comporta
uma dimensão dinâmica, multirreferencial e dialética, as quais são determinadas pelas
especificidades do contexto em que estão sendo exercidas. Isso significa que o poder está
relacionado ao contexto social em que as relações se desenvolvem, tomando direções e
sentidos específicos.
Por essa razão, neste trabalho, tentam-se perceber
processos complexos
permeados
por contradições que o inerentes aos processos sociais que abrigam tendências opostas,
originárias do mesmo processo ou realidade. Na sociedade, as relações de poder são
construídas por indivíduos que interagem e, retroativamente, são construídos pela sociedade.
Pela recursividade, rompe-se com a ideia linear de causa/efeito, produto/produtor.
Para melhor compreender os processos de relacionamento, parece relevante
refletir sobre os processos recursivos aos quais se refere Morin, para quem “um processo
recursivo é um processo em que os produtos e os efeitos são ao mesmo tempo causas e
produtores daquilo que os produziu” (MORIN, 2001, p. 108). Tudo o que é produzido volta,
de alguma forma, sobre o seu produtor, pois “os produtos e efeitos gerados por um processo
recursivo são, ao mesmo tempo, co-causadores desse processo” (MORIN, 2002, p. 102).
Esse princípio recursivo é utilizado, ao se perceber que, nas estruturas de poder o
de sistema de dominação-sujeição, também é legitimado pelas suas próprias vítimas por
aqueles que a ele estão submetidos. Dessa forma, todos são alvos, alimentando o sistema de
dominação-sujeição, aspectos que suscitaram o nosso interesse para compreender como se
processam as relações de poder na escola, tanto em suas dimensões objetivas quanto nas
subjetivas.
O tema de nossa pesquisa é, inegavelmente, instigante, porquanto se constitui um
assunto que tem suscitado inúmeros estudos, no sentido de procurar entender as estruturas das
relações de poder que inter-relacionam aspectos objetivos e subjetivos da vida cotidiana. Isso
se reflete no âmbito da pesquisa educacional, pois percebemos que, apesar dessa diversidade
de estudos sobre relações de poder, chama a atenção o fato de a maioria deles tratar de
aspectos macrossociais, que dão conta mais das lutas de classe e menos dos aspectos
microssociais centrados na dinâmica própria das instituições.
Assim, nosso objetivo, ao percorrer o debate teórico sobre a temática, consiste em
apontar os aspectos objetivos e subjetivos inerentes às relações, especialmente quando a
19
dominação e a sujeição ocupam posição de destaque nesse processo. Para isso, procedeu-se a
uma revisão sintética dos conceitos de poder com bases dinâmicas de poder, entendido
enquanto relações de dominação que os homens produzem entre si.
Na visão de autores como: HORKHElMER&ADORNO(1985), WEBER (1997),
HARD&NEGRI(2001), DELEUZE(1992), FOUCAULT(1984), GUATTARI(2004) e
PASSETTI (2008),os processos de dominação e de controle coexistem com um conjunto de
práticas institucionais de governo, tais como vigilância, inspeção, legislação, regulação,
controle e doutrinação. O controle parece ser um conceito central para se entenderem as
dinâmicas de relações de dominação atuais, diluídas dos cercados institucionais, e que
sinalizam para uma mudança no modo pelo qual o poder marca seu espaço de circunscrição.
Considerando que as relações de poder se expandem por todas as outras formas de
relações cotidianas, é importante que possamos discutir a questão do poder, que se constrói e
reconstrói nas vivências cotidianas da escola. Boaventura (2002, apud Foucault) reconhece a
existência de diferentes formas de poder fora do Estado, que tendem a não se limitar a
qualquer lugar exclusivo nem a um território, em particular, nem a alguma instituição
específica.
Numa revisão de literatura sobre relações de poder, específicas da escola, são
relevantes os estudos de Veiga-Neto (2004), a partir do ponto de vista de Foucault, que
apresenta operadores das relações dentro da própria escola, o que a torna um espaço de
contradições. Resende (1995) trabalha, mais especificamente, as relações de poder no
cotidiano escolar, em que a escola é vista como um espaço para o exercício do poder que,
consequentemente, interfere na relação ensino-aprendizagem, e o estudo pertinente de Côrtes
(2004), que trata das relações de poder e das tecnologias políticas em funcionamento dentro
da Escola, particularmente do poder disciplinar e seus mecanismos de controle do tempo, do
espaço e dos corpos. Seu trabalho aponta o teatro libertário e experimental como alargador
das brechas, no poder disciplinar, e potencializador de processos singulares de subjetivação.
Além dos autores citados, existem várias contribuições para analisar a escola
como máquina de controle invisível, que visa produzir subjetividades, como o estudo de Prata
(2001), que articula a produção da subjetividade contemporânea com as relações de poder que
circulam na escola, não somente na relação professor-aluno, mas, sobretudo, em relação à
discussão sobre o lugar que a instituição escolar ocupa na configuração social da atualidade.
Castro(1994), no estudo das relações de poder em escolas da rede pública, conclui
20
que o poder simbólico é vivenciado, nas escolas, por atores que procuram transformar em
capital simbólico as outras espécies de capital que possuem. Os atores da escola transformam
esse capital em moedas de competência e habilidades que lhes vão permitir o exercício do
poder simbólico na escola, tornando-o manifesto. Magalhães Júnior (2004) analisa a escola
como um espaço da disciplina da transgressão. O autor aponta ser a escola não um lugar do
saber do professor e da passividade dos alunos, mas uma arena de enfrentamento e de disputa.
Beskow (2006), em sua pesquisa sobre a Sujeição Contemporânea na Escola,
desvela toda a sutileza e a perversidade próprias da produção capitalista, que se empenhou em
equipar territórios subjetivos, fazendo uso dos indivíduos, dos meios de comunicação e das
instituições, como a escola, espaço onde se evidencia uma invisível violência simbólica, em
que o sujeito que sofre tal violência fica inibido para contribuir com a construção de capital
social, uma vez que assume e vive uma cultura na qual se produz uma subjetividade
capitalista diante da dinâmica global.
Encerrando esta sessão, faz sentido ressaltarmos os estudos empíricos que
enfocam as relações de poder, especificamente nas escolas públicas, num plano específico de
relações de dominação complexas, que fazem com que não haja divisão linear entre
dominadores e dominados. Todos dominamos e somos dominados, em algum momento.
Dentro desse aspecto, surge a hipótese de que, nas diferentes escolas, existem relações de
dominação, por meio das quais se vinculam dimensões objetivas e subjetivas das relações de
poder.
A dinâmica das relações de poder apresenta-se como um elemento importante em
seus contornos, para tecer uma estrutura objetiva e subjetiva, que promove formas de
dominação que podem ser revertidas, na atualidade, em dinâmicas de controle cada vez mais
sutis e perversas, na sociedade capitalista. Por isso, o termo “relações de poder” é estudado,
revisando o trânsito das sociedades disciplinares às sociedades de controle, como nos fizeram
ver Foucault (1977) e Deleuze (1992), frente à dominação que se mostra como cada vez mais
desterritorializada e intensa e que coexiste com um clima de resistência contra o poder. Mas,
como refere Foucault, “consequentemente, essa resistência não está nunca numa posição de
exterioridade em relação ao poder" (1988, p. 91).
A resistência não é nunca oposta ao poder. Desse modo, as estratégias poderiam
ser mais frutiferamente tratadas em termos do conceito de recusa, que tem, na atualidade,
possibilidades de êxito, em função de recusar os mecanismos hegemônicos da sujeição.
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Deste modo, os processos de resistência, construídos de forma cotidiana,
implicam movimento constante, relações de poder e dominação complexas, constituídas
sobre bases desiguais e hierarquizadas, em que exercemos formas de opressão, dominação,
controle e gestão, em relações de classe, raça, sexo, idade, necessidades especiais, opção
sexual, peso corporal, entre outros.
2.3 Dos objetivos do estudo
Em termos amplos, o objetivo geral desta tese é analisar como se processam as
relações de poder e seus efeitos no cotidiano das escolas públicas de Ensino Médio em
Salvador-BA. Para isso, o estudo também propõe como objetivos específicos: identificar a
concepção de poder, a partir de perspectivas apontadas por Michel Foucault; apontar as
características específicas das relações de poder; identificar modalidades de relações de poder
que vigoram hoje nas escolas e se estruturaram na perspectiva da dominação e da sujeição;
identificar mecanismos de poder, existentes dentro das instituições escolares dos dias atuais, e
verificar como é que ocorre a resistência ao poder na escola.
Para atingir esses objetivos, no projeto da pesquisa foram sistematizados eixos
norteadores, que serviram de orientação tanto para o levantamento de informações quanto
para sua análise.
O primeiro eixo de estudo é o modus operandi das relações de poder, que se
processam através de dimensões objetivas e subjetivas construídas cotidianamente e que
ressaltam, ocultam ou negam dominação e sujeição, preferências, escolhas e ações
individuais, o esforço consciente, sujeito determinado, mecanicamente submetido às
condições objetivas em que ele age.
O segundo eixo recompõe relações hierárquicas e disciplinares, no jogo de forças
de alerta para o poder disciplinar exercido na escola, não estando numa relação de
dependência direta, apenas com as grandes estruturas jurídico-políticas de uma sociedade.
O terceiro eixo envolve dimensões estratégias e táticas que constituem a
resistência ao poder que atravessa a escola. O poder disciplinar pode neutralizar/reduzir os
efeitos do contrapoder, que formam resistência ao poder que quer dominar.
Considerando esses eixos da pesquisa, o objeto deste estudo se fundamenta nas
relações de poder que ocorrem na escola, suas especificidades e contradições. Para orientar
22
esse percurso de investigação, nos tópicos seguintes, apresentaremos referências teóricas e
metodológicas utilizadas no trabalho.
2.4 Do referencial teórico
Com a finalidade de desvelar as relações de poder, na escola pública de Ensino
Médio, utilizaremos como arcabouço teórico os estudos com bases dinâmicas de poder-
dominação-controle (FOUCAULT, 1977, DELEUZE, 1992; CERTEAU, 1994).
A orientação que adotamos ressalta a tríade conceitual de poder, dominação e
resistência.Essa tríade de conceitos lança luzes sobre o que, para Foucault, estaria
fundamentando as práticas sociais, em que a dominação é aquela de maior precisão, quando
se trata de estudos de ordem empírica, e é possível identificar, em maior ou em menor grau,
sua presença na ação de relações de poder no âmbito das práticas sociais.
Sem dúvida, nem toda prática social apresenta uma estrutura que implica a
dominação. Mas, na maioria de suas formas, a dominação desempenha um papel
considerável, construída a cada dia num âmbito do cotidiano, produzindo efeitos que afetam
todo o campo social e pode se dar nas mais variadas relações.
O referencial teórico ou o eixo epistemológico escolhido para essa investigação
constitui uma abordagem teórica, que aborda a escola como uma instituição na qual se fazem
presentes formas de relações sociais ligadas a um modo particular de exercício do poder. Há,
aqui, uma intenção de utilizá-la para a elucidação da temática proposta, mostrando a sua
vitalidade. Nessa abordagem, uma adoção simplificada da analítica do poder numa
conjunção de conceitos e noções oriundas de outras matrizes epistemológicas.
Na perspectiva foucaultiana, a epistemologia estaria relacionada com as práticas
sociais e as relações de poder. Para indagar pelos efeitos de poder que consolidam práticas
sociais e modos de subjetivação, Foucault inspira-se na genealogia de Nietzsche, utilizando o
conceito de vontade de poder para refletir sobre a formação dos saberes inscrita nos espaços.
Suas pesquisas genealógicas indagam a proveniência dos mecanismos de controle que
surgiram na sociedade industrial e os motivos que fazem com que esses mecanismos se
modifiquem para atender a novas demandas.
23
Nas pesquisas epistemológicas, que realiza no início da década de 70, Foucault
aponta para uma fragmentação do poder exercido em níveis mais periféricos da sociedade.
Para a genealogia, o poder não está essencialmente vinculado ao aparelho do Estado e não
constitui uma propriedade ligada ao sistema político. Foucault mostra, ao contrário, que o
próprio Estado aparece como efeito de conjunto ou resultante de uma multiplicidade de
engrenagens e de focos que se situam num nível bem diferente e que constituem, por sua
conta, uma microfísica do poder.
A existência de outros poderes diversos, inscritos do Poder do Estado,
poderes locais, específicos, circunscritos a uma pequena área de
atuação e até com certa autonomia em relação aos macropoderes
estatais, embora se articulem com eles das formas mais diversas.
(CÔRTES, 2004, p.40)
Apesar de os estudos sobre o aparelho de Estado serem importantes, é necessário
perceber que uma rede de micropoderes multidirecionais, dentro da hierarquia de controle
discretos, quase invisíveis. Dentro dessa perspectiva, Foucault propõe uma analítica daquilo
que foge das teias do poder do Estado, articulando e integrando os diferentes focos de poder
(Estado, escola, prisão). Através da genealogia, Foucault mostrou que, antes de reproduzir, a
escola
1
produziu, e continua produzindo, um determinado tipo de sociedade situada entre
confinamentos”.
A escola era considerada por Foucault como uma das instâncias da sociedade
disciplinar, na medida em que funcionou como uma maquinaria para a produção do sujeito
moderno. Hoje, constata-se que, nas escolas, a ênfase na lógica disciplinar está dando lugar à
ênfase na lógica do controle, que usa um conjunto de mecanismos de controle que podem
também sinalizar mudança e permanência nas relações de poder, que surgem fora do poder
central e tendem a ser mais emergentes entre pessoas e grupos nos vários âmbitos da escola.
Entretanto, hoje, a lógica que dá sustentação à concepção e à educação, segundo Pretto (1999,
p.3), é uma lógica ainda centrada na ideia de ordem, de reação linear.
Você impõe um padrão, obriga o estudante a buscar coisas para se
enquadrar no padrão. Se uma grade, não se viabiliza o pensar. E a
escola é cheia de grades: a grade que cerca o terreno, a grade de
horários, a grade curricular.
1
A Escola surgiu como instituição, como agora é concebida, em meados do Século XVI e princípios do século
XVII, suas raízes repousam na antiguidade de todos os povos, desenvolvida e sustentada, desde sempre, pela
igreja, pelo estado e pela sociedade.
24
Nessa lógica do controle, o esquema de grades é mais cômodo, faz parte da velha
lógica linear, que se insere de modo complexo na escola pública. Há um incremento nas
formas de controle devido aos novos métodos, técnicas e práticas normalizadores e
homogeneizantes, que se refletem em todos os campos sociais e, portanto, no escolar.
Podemos dizer, em conformidade com Foucault, que, no campo de domínio da
escola, intensificam-se, cada vez mais, técnicas e estratégias que lhe são próprias e
constitutivas de modos de subjetivação.
Na escola, além da intensificação de controles, temos indícios de outra dimensão
do jogo de forças que constituem pontos de resistência articulados, de acordo com estratégias
de poder, através do uso de estratégicas que refutam a ideia de um controle total, absoluto. A
resistência surge exatamente onde ocorre uma luta de força, na qual estamos colocados uns
em relação aos outros, em posições estratégicas nunca fora das relações de poder. Dessa
forma, as relações de poder institucionalizadas são construídas e reconstruídas pelas
resistências que lhes são impostas, ou seja, alteram-se a partir de resistências que lhes
opomos.
O segundo ponto de apoio teórico está calcado no pensamento de Michel de
Certeau. A reflexão que esse filósofo francês efetuou acerca do cotidiano é útil, para se pensar
sobre antidisciplina, estratégia e tática, aferida na maneira como indivíduos ordinários
experimentam a realidade que os circunda, focados em perspectivas e tendências
microscópicas. Sua análise contribui para a problematização do caráter tático ou estratégico
ligado ao cotidiano escolar, considerando a perspectiva da análise com interesse no exercício
de um “não poder”, isto é, com as formas subterrâneas de conviver com normas e regras
impostas, instituídas por um lugar das práticas de poder.
O terceiro ponto de apoio é Gilles Deleuze, que nos fornecerá elementos para a
análise do fenômeno que elegemos como objeto de investigação. Ele operará como mediação,
equilibrando as teorias de Foucault e de Certeau, nas quais baseou seu ataque à diferenciação
sujeito/objeto e tentou nos mostrar uma ordem política que coloca sua força acima do plano
interativo das forças sociais.
25
2.5
O PERCURSO CONSTRUÍDO NA PESQUISA
O percurso metodológico da presente pesquisa caracteriza a abrangência e os
desafios do estudo, a qual se caracteriza como de natureza qualitativa. No âmbito desse
processo, consideramos conveniente apresentar o percurso construído com a utilização de um
conjunto de imagens fotográficas, que indicam um registro memorialístico circunscrito no
âmbito da pesquisa educacional.
O documento fotográfico desempenha as funções de ilustrar e adicionar, e não,
subtrair as narrativas de um percurso construído no cotidiano das escolas públicas. Isso
significa mostrar a trajetória metodológica da pesquisa, cujo objetivo, como é próprio do
método, é o de promover a análise de aspectos fundamentais das relações de poder. O
desenvolvimento da pesquisa envolveu as fases de diagnóstico situacional; campo de
observação e coleta de dados. Nessa perspectiva, os procedimentos metodológicos de coleta
de informações adotados foram em uma combinação das técnicas de entrevista e dos grupos
focais. A aplicação da técnica do grupo focal pode se dar através da combinação de outros
instrumentos de coleta de dados.
Hoje, podemos analisar, nesse percurso, as vantagens e as desvantagens de se
trabalharem temas tão controversos e sérios, como relações de poder, cujo estudo não fora
revestido de neutralidade e inércia, encontrou-se encharcado de significados específicos em
26
que os valores foram postos no processo de investigação. Sobre esse aspecto, Gusmão (2001,
p. 81) aponta que “a questão da subjetividade encontra-se por inteiro em toda essa discussão
e, como tal, é parte integrante da pesquisa, necessitando, porém, ser objetivada como
condição de se tornar fonte de conhecimento”.
A reflexão sobre esse aspecto é de fundamental importância, até porque a
pesquisa, apesar de suas características rígidas, não tem como fugir aos componentes de
produção de subjetividade, a qual continua sendo uma das questões que perseguem os
pesquisadores da área de educação, dos depoimentos orais, é sempre singular e traz consigo
traços da “subjetividade”.
O enfrentamento dos processos subjetivos, vistos como oposição à objetividade,
são influências recebidas do paradigma dominante, que descaracterizam a subjetividade, sem,
muitas vezes, destacá-lo como um conceito complexo que abrange múltiplas dimensões nem
lhe impor mutilações ou reduções. Por essas razões, compreende-se que a pesquisa, segundo
Neubarn (2001), abrange “um elo complexo e recursivo entre as condições que envolvem o
conhecimento em sua criação e processo individuais, sociais, míticos e emocionais”.
Por fim, em seu percurso, a pesquisa de campo traz à tona a necessidade de um
compromisso efetivo com formas de conhecimento que não seja estático, substancializado e
universal, mas que permita a criação de novas perguntas acerca das práticas, por meio das
quais os seres humanos exercem a dominação e a sujeição.
2.5.1 As fases de campo
2.5.1.1 Fase de mapeamento das escolas
Através dos contatos feitos por meio das entrevistas, nas instituições antes
citadas, foi possível obter um mapeamento detalhado do número e da localização das escolas
que ofertam a modalidade de Ensino Médio, através do qual identificamos as escolas
públicas, distribuídas em diferentes localizações, a maioria delas em bairros periféricos da
cidade. Para a amostra, selecionamos treze escolas, especificamente as que constavam no
diagnóstico a que tivemos acesso através do Projeto Cuida Bem de Mim, do Liceu de Artes e
Ofícios.
27
2.5.1.2 Fase de acesso às escolas
O primeiro acesso ao campo se deu com visitas às seguintes escolas públicas de
Ensino Médio, situadas na cidade de Salvador-Ba: Colégio Estadual Senhor do Bonfim,
Colégio Estadual Ypiranga, Colégio Estadual Severino Vieira, Colégio Estadual Odorico
Tavares, Colégio Estadual Antônio Carlos Magalhães, Escola Parque, Centro Educacional
Edgard Santos, Colégio Estadual Manoel Novaes, Colégio Estadual José Barreto, Colégio
Estadual Carlos Santana, Instituto de Educação Isaías Alves, Colégio Estadual Carneiro
Ribeiro Filho, Colégio Estadual Carlos Santana e Colégio Central, onde apresentamos o
projeto de pesquisa e solicitamos ao diretor de cada uma delas a autorização para desenvolver
a pesquisa.
Como critério para a escolha das escolas, estabelecemos que seriam selecionadas
aquelas que haviam autorizado a realização da pesquisa. Consideramos importante atuar em
escolas cujos dirigentes fossem mais atentos e sensíveis à atividade de pesquisa, em seu papel
na construção de conhecimentos.
Essa fase se caracterizou pela delimitação do campo. Portanto, o estudo foi
desenvolvido no Instituto Central de Educação Isaías Alves, Centro Educacional Edgard,
Colégio Estadual Senhor do Bonfim Santos, Escola Parque ou Centro Educacional Carneiro
Ribeiro, todas, instituições que compõem a rede estadual de ensino médio no município de
Salvador, no Estado da Bahia.
De acordo com dados fornecidos pela Secretaria Estadual de Educação da Bahia, o
estado conta com 955 unidades de Ensino Médio, sendo 884 em área urbana. O município de
Salvador conta com 139 dessas instituições educacionais.
Nesse sentido, a amostra foi composta por cinco desses espaços, que instituem,
em sua materialidade, um sistema de valores, símbolos, signos, códigos e regras, que fazem
parte de um agenciamento maior de construção e consolidação de práticas desses mesmos
lugares. Portanto, os espaços escolares podem ser considerados como lugares praticados, ou
seja, espaços produzidos pela prática escolar.
No conjunto, esses espaços escolares são materializados em prédio, com suas
divisões e subdivisões internas, quais sejam: o pátio, a sala de aula, a diretoria, sala de
reuniões; o auditório, a biblioteca. Sob esse panorama abaixo, trazemos imagens para registrar
a passagem por esses espaços.
28
Ilustração 8- Registro fotográfico do Instituto Central de Educação Isaías Alves
O atual Instituto Central de Educação Isaias Alves situado no Barbalho foi criado
pelo Decreto 37, em 14 de abril de 1836, com o nome de Escola Normal da Bahia, dedicada à
formação de professores, sendo inaugurada no ano de 1842, no Teatro São João da Sé, no
bairro de Nazaré.
29
Ilustração 9 – Registro fotográfico do Colégio Estadual Senhor do Bonfim
O Colégio Estadual Senhor do Bonfim, está situado na comunidade Fazenda
Garcia, bairro cujo nome tem sua origem fundada na fazenda do Conde Garcia D’Ávila. A
porteira da fazenda ficava na área do atual colégio. Essa escola foi inaugurada em 7 de abril
de 1965. Foi implantado o Ensino Médio, com o Curso Pedagógico ou Magistério em 1967.
30
Ilustração 10 –Registro fotográfico do Centro Educacional Edgard Santos
O Centro Educacional Edgard Santos, está localizado no Bairro dos Barris, essa
Escola funciona no atual prédio desde 1993, sendo classificada como escola de porte
especial.O Barris é um tradicional bairro do centro de Salvador, antes chamado fonte dos
barris.
31
2.5.1.4 Fases da coleta de dados
Essa fase se caracterizou pela delimitação dos instrumentos de coleta de dados,
que agrega as técnicas de pesquisa da entrevista e de grupo focal com as quais se estabelece
uma estrutura participativa e ativa das pessoas envolvidas no problema investigado.
2.5.1.4.1 Entrevistas
Nessa etapa, foram realizadas entrevistas do tipo semi-estruturadas, com o
objetivo de coletar informações sobre os projetos e programas implementados na Secretaria
de Educação do Estado, nas escolas. A primeira entrevista foi realizada com a Coordenadora
de Projetos Intersetoriais, cujas informações proporcionaram uma visão ampla acerca dos
programas e projetos em execução na rede pública. Tivemos acesso ao Projeto Cuida Bem de
Mim, que contempla um conjunto de ações educativas que refletem os problemas das
relações internas na escola pública.
O segundo entrevistado foi um dos membros da coordenação pedagógica do
Projeto, que funciona no Liceu de Artes e Ofícios. Após a entrevista, tivemos acesso ao
relatório evolutivo com o diagnóstico sobre os problemas vinculados ao ambiente escolar.
Foram aplicados 2.127 questionários, envolvendo estudantes, professores e diretores, de treze
escolas da rede pública estadual. Foi fornecida uma relação constando nomes e endereços
dessas escolas, para que procedêssemos às visitas.
A terceira entrevista foi com o diretor de imprensa e divulgação do Sindicato dos
Trabalhadores em Educação do Estado da Bahia (APLB), com o objetivo de coletar
informações sobre o quadro mais geral das mobilizações e dos acontecimentos, no campo da
educação na Bahia. Durante o processo da entrevista, colhemos dados acerca do quadro de
mobilização dos professores na discussão do Plano Estadual de Educação, na Bahia que, até
outubro de 2005, não havia sido votado na Assembléia Legislativa do Estado.
32
2.5.1.4.2 Grupo focal
Para a coleta das informações a respeito do objeto de estudo, optamos pela
técnica de grupo focal, que cumpriu a finalidade de “extrair das atitudes e respostas dos
participantes do grupo sentimentos e opiniões que se constituiriam num novo conhecimento”,
(GALEGO E GOMES 2005, p. 178) acerca desse estudo.
Em síntese, o grupo focal foi desenvolvido como um tipo especial de estudo em
grupo, utilizado para se entenderem as diferentes percepções acerca das relações de poder, no
contexto da instituição escolar. A tônica dos participantes dos grupos focais implicou
diferenças (sexo, idade, escolaridade, diferenças culturais, estado civil e outros), tendo como
traço comum importante para o estudo os cuidados éticos construídos nas sessões de grupos
focais.
Ilustração 11 - Registro fotográfico dos grupos focais organizados nas escolas
33
2.5.1.5 O processo de planejamento com grupos focais
A fase de planejamento do grupo iniciou com um planejamento, adequado à
proposta do estudo. De acordo com os aspectos práticos de planejamento, esse fora realizado
de forma flexível, de acordo com as necessidades dos participantes.
Antes da sessão de grupo focal, foi preciso definir a unidade de análise e elaborar
questões. Por sugestão dos professores, fizemos contato com os alunos e as alunas em sala de
aula, numa visita às diferentes turmas das cinco escolas, com o objetivo de apresentar a
pesquisa e esclarecer suas possíveis dúvidas. A definição dos participantes da pesquisa
ocorreu depois que esclarecemos os propósitos e a dinâmica do estudo, com foco no tema das
relações de poder. A ideia era de que eles se sentissem confortáveis, para decidir se
participariam ou não do estudo e fornecer informações mais significativas sobre a escola.
Ilustração 12 - Registro do processo de esclarecimentos junto aos grupo
34
2.5.1.5 Os participantes dos grupos focais
A coleta de dados para uma pesquisa pode ser realizada por meio de estudos que
envolvem a participação de alunos e de professores em processos grupais. Em todo o
processo, contamos com a presença de 12 professores que atuam nas escolas públicas, na
cidade de Salvador. Esses professores são formados em Matemática, História, Geografia,
Física, Química, Arte e Educação Física e enfrentam grandes dificuldades na prática de sala
de aula.
Ilustração 13 – Registro fotográfico dos professores que participaram do grupo focal
35
Contamos, ainda, com a participação de 289 alunos, um número que abrange uma
diversidade, em relação à faixa etária, ao sexo, à religião e à raça, tendo em comum o fato de
serem jovens que residem em bairros periféricos da região metropolitana de Salvador.
Ilustração 14 – Registro fotográfico dos alunos que participaram do grupo focal
36
2.5.1.6 Os procedimentos utilizados ao optar pela técnica do grupo focal
A pesquisa proporcionou o processo de discussão em 12 grupos focais, técnica
que oferece informações qualitativas que revelam experiências, sentimentos, percepções e
valores dos sujeitos. Como se trata de uma técnica qualitativa, não-diretiva, conduzimos a
discussão inspirada em técnicas de entrevista não-direcionada, numa convergência de
informações que nos levaram a identificar signos das relações de poder produzidas em cada
uma das escolas, num trabalho de estudo intenso, como ilustrado no registro fotográfico.
O grupo focal requer procedimentos que permitam estratégia de recolha de
informação. Segundo Galego e Gomes (2005, p. 178), “a finalidade principal dessa
modalidade de pesquisa é extrair das atitudes e das respostas dos participantes do grupo
sentimentos e opiniões”
Por sua própria natureza, o grupo focal se configura como um conjunto de pessoas
reunidas para avaliar conceitos ou identificar problemas. Como já mencionado, nesse trabalho
de grupo, o objetivo é identificar percepções e sentimentos acerca de um determinado assunto.
Por essa razão, é importante esclarecer que existem diferenciações entre as ideias de grupos
focais e entrevistas grupais, como aponta Gondim (2002), ao estabelecer que, diferentemente
da entrevista grupal, que é mais diretiva, já que estabelece uma relação dual com cada
participante, o grupo focal não é diretivo. Seu papel é apenas o de facilitar o processo de
conversação entre os membros de um grupo, deslocando seu interesse para as respostas que se
produzem nas discussões grupais desencadeadas sobre um determinado assunto.
Na condução dos grupos focais, foram adotados alguns procedimentos para
introduzir a discussão sobre as relações de poder, obedecendo ao seguinte esquema, conforme
ilustração abaixo:
Ilustração 8 - Procedimentos empregados no grupo focal
ROTEIRO
IMAGEM
ROTEIRO
INTERATIVO
37
Para a realização oficinas, optamos pelas salas ou auditórios onde houvesse vídeo
e DVD, o que permitiu que o trabalho fosse desenvolvido sem que houvesse a interrupção do
fluxo de discussão.
Para a condução dos grupos focais, foi estruturado um roteiro de imagem e o
roteiro interativo, utilizados em cada um dos doze grupos, para facilitar a discussão entre os
participantes. O que denominamos de “roteiro de imagens” é uma sequência de imagens em
movimento, que retrata uma série de acontecimentos vivenciados no interior da escola
pública, e que muito ajudou na fluidez do processo de discussão.
Ilustração 9 – Registro fotográfico da aplicação do Roteiro de imagem nos grupos focais
38
O roteiro de imagem teve uma duração de cinco minutos, cuja produção de
imagens foi extraída das videografias: Azucrinando, Arte e Educação, Flauta mágica e Cuida
Bem de Mim, vídeo baseado na peça de teatro de Luiz Marfuz e Filinto Coelho, produção do
Liceu de Artes e Ofícios da Bahia, com os fatos e diálogos inspirados em depoimentos reais
de alunos, professores e diretores da Rede Estadual de Ensino da Bahia. Através desse roteiro,
foi possível captar sutilezas que estão instauradas no exercício das relações de poder, num
conjunto de situações ali elencadas, com o intuito de conduzir os participantes a identificarem,
a partir das imagens, o conjunto de eventos, incidentes e acontecimentos presentes no vídeo,
que levam à ocorrência ou ao desenvolvimento do fenômeno de poder. O fenômeno, por sua
vez, é a ideia central, o evento, acontecimento ou incidente sobre o qual um grupo de ações ou
interações é dirigido ou está relacionado. O contexto ali tratado, como um grupo específico de
propriedades que pertencem ao fenômeno, e as condições intervenientes nos planos micro e
macro estruturais, que se apoiam nas estratégias que pertencem ao fenômeno.
Elaborou-se um roteiro com questões que serviram de guia para todos os grupos.
Nesse processo, depois que os participantes respondiam às questões, cada grupo as
apresentava, para que procedêssemos à discussão.
Ilustração 10 – Registro do Modelo do roteiro interativo
39
O roteiro interativo consta de uma sequência de perguntas que diferem do
tradicional questionário, aplicado, não raras vezes, sem nenhum cuidado prévio acerca do
entendimento das questões em estudo.
As questões constantes no roteiro interativo foram suscitadas da seguinte forma:
"Descreva um fato ou acontecimento que você vivenciou e que possa configurar-se como uma
situação específica de relações de poder”. Procuramos, a partir das respostas obtidas, construir
uma primeira referência de como alunos e professores do Ensino Médio “refletem” ou
“traduzem” práticas específicas de relações de poder, no âmbito da escola. A discussão sobre
essa questão se fez relevante quando da coleta e da análise dos dados e das informações. É
importante, porém, levar em conta as dificuldades que essa técnica apresenta, que a adoção
de grupos focais requer muita reflexão, como deve acontecer com o emprego de qualquer
técnica.
Ilustração 11– Registro das discussões em dupla para responder questões do roteiro
40
2.6 Procedimentos para a apreensão e a análise dos dados
A análise dos dados foi realizada com base na codificação temática dos dados
recolhidos nos grupos focais e nas entrevistas, que são de natureza qualitativa.
Ilustração 12– Registro fotográfico de um dos 12 grupos focais onde os dados foram
recolhidos
Isso implicou que os dados fossem analisados de forma qualitativa, ou seja, sem
um tratamento estatístico envolvido, mas com um conjunto de procedimentos que visam
organizar os dados acerca das questões que se relacionam com o estudo das relações de poder,
no âmbito específico da escola. O primeiro procedimento repousa nos depoimentos dos
participantes do grupo, que vão, assim, ilustrar os acontecimentos principais. No processo de
análise, adotamos os métodos indutivo e dedutivo, simultaneamente, em que as categorias se
formam a partir dos dados, visando adequar melhor os procedimentos de sua coleta aos
objetivos da pesquisa.
41
,
3. CONSTRUTOS ANALÍTICOS DO PODER
3.1. O caminho analítico apontado por Foucault
Em sua analítica, o filosofo francês, Michel Foucault, propõe uma análise radical
e crítica dirigida à prática produtiva do poder. A emergência dessa vertente crítica abre um
novo horizonte para a compreensão do poder operacionalizável no âmbito das relações dos
discursos, das atitudes e das escolhas.
O domínio da microfísica não é o das grandes instituições e das práticas
supostamente constantes, mas o das relações desiguais e móveis. Seus
múltiplos exercícios são disseminados na pluralidade dos pequenos
elementos na trama sócio-histórica. Para a microfísica, não
transcendência face às práticas do poder, posto que os jogos de poder são
circulares, se tramam em sua própria trama, perfazendo uma lógica aberta e
indefinidamente desdobrável. Desse modo, nada nem ninguém está fora dos
mecanismos de poder. Todos estão desempenhando um papel diferenciado
no campo das relações nele existentes. (SIQUEIRA, 2007, p.7)
O poder, como se pode inferir, não funciona independente dos indivíduos, exerce-
se, em todas as partes, em cada relação. Nesse sentido, funde-se na complexa rede de relações
de força operante em todos os níveis da sociedade, como nos fez ver Foucault (1979 p.88-89).
Parece-me que se deve compreender o poder, primeiro, como a
multiplicidade de correlações de forças imanentes ao domínio onde se exerce
e constitutivas de sua organização; o jogo que, através de lutas e
afrontamentos incessantes as transforma, reforça, inverte; os apoios que tais
correlações de força encontram umas nas outras, formando cadeias ou
sistemas ou, ao contrário, as defasagens e contradições que as isolam entre
si; enfim, as estratégias em que se originam e cujo esboço geral ou
cristalização institucional toma corpo nos aparelhos estatais, na formulação
da lei, nas hegemonias sociais.
O poder consiste em relações de forças multipontuais e difusas em vários pontos,
que marcam a aplicação de uma ação, sempre instável e não-localizável, passando, a todo
instante, por todos os lugares e espaços. Nesse sentido, compreende-se que as relações de
força fundadas em experiências compartilhadas e vividas opera, continuamente, nas
instituições e nas relações informais, ou seja, nas várias redes de relacionamentos familiares,
afetivas, étnicas, éticas e de gênero, numa sociedade determinada.
42
Foucault pensa o poder, não como originário de uma única fonte, mas que é
exercido em escala ltipla, entre diversas instituições, como a escola, por exemplo,
constituída por múltiplas relações de poder. Nas relações de poder contidas nesse espaço, o
poder disciplinar demonstra toda a sua eficácia, que se deve ao uso de dispositivo capaz de
mantê-las.
No caso específico da Escola, o poder disciplinar tornou-se um elemento
fundamental no processo de assujeitamento (dominação) de todos aqueles que, diretamente,
têm algo a ver com a escola. Portanto, as relações de poder tecidas nesse espaço derivam de
vários dispositivos utilizados pelo poder disciplinar fundamentado, como nos fez ver Pacheco
(2003,p.1), “no rigor da organização e distribuição espacial dos/as alunos/as, no cumprimento
dos prazos e horários, (...) na aplicação de provas e sanções diversas”.
Nesse processo, é necessário ressaltar que o poder se constitui de práticas sociais
que são construídas por múltiplas correlações, que abrangem toda a complexidade das
relações sociais. Assim, o que define as características do poder, em determinado momento e
lugar, é a própria dinâmica da relação à qual estão subjacentes os choques das ações de
dominação e das reações de dominados. Entretanto sabemos que, na relação social, toda
prática é um lócus de (re) produção, em que, em algumas situações, somos os oprimidos e, em
outras, os opressores.
Em síntese, o poder é substancialmente uma relação que se compõe de
contradições, antagonismos e ambiguidades, que não podem ser entendidos como fatos
isolados na sociedade.
3.2 As relações de poder explicitam relações de dominação
A dominação acha-se, em parte, disseminada na sociedade, no âmbito da esfera
cotidiana, nas relações entre os indivíduos. As tensões e ambiguidades da dominação não
apenas enfocam a dominação, em si, mas também evidenciam os mecanismos de sujeição por
meio dos quais ela é produzida e inscrita nas subjetividades das pessoas, antes, porém,
impregnada na esfera social.
Em sua análise sobre as relações de poder, Foucault constata que essa prática é
corporificada, sendo o corpo, portanto, o lugar onde se inscrevem as disputas pelo poder,
porquanto é nele que a dominação se materializa. É o “lócus” do exercício do poder que
43
implica uma relação de dominação, cujo foco é a pessoa (o sujeito). Nessa relação, o sujeito
incorpora a lógica interna da dominação que circula, não fica nas mãos de alguém (ou de
alguns). Isso implica uma relação em que, ora se está dominando, ora se está dominado.
Portanto, a eficácia dessa dominação está também nos dominados, que se integram como
partes da dominação, sem terem consciência disso.
Assim, podemos compreender a dominação sob dois aspectos: na sua dimensão
objetiva, cravada nos fatos em si; e na sua dimensão subjetiva, instituída entre outras práticas.
Concomitantemente, as práticas de dominação fazem parte da dinâmica cotidiana atual,
operam-se sem que sejam percebidas como tais. Nessa perspectiva, as formas de dominação
presentes nas relações circulam na rede social, em níveis variados, funcionando de modo
circulante. Nesse processo, as pessoas estão, a cada momento, em posição de exercer o poder,
ou mesmo de serem submetidas a ele. Portanto, a dominação é o resultado das relações de
poder que perpassam os mais diversos diagramas sociais.
3.3 Diagramas que perpassam os campos sociais
Para melhor compreender as relações geradoras de poder, achamos conveniente
fazer referência sobre o diagrama de Foucault, mencionado por Deleuze. Essa noção, que
Foucault denomina de diagrama, é desenvolvida com ênfase em seus estudos sobre o
Panóptico, determinado abstratamente por um diagrama ou máquina abstrata imanente a todo
campo social.
Trata-se, portanto, de um funcionamento social que torna o poder presente e
visível em toda parte, inventa novas engrenagens, impõe um funcionamento
ideal, enfim, um modelo generalizável de funcionamento, uma maneira de
definir as relações de poder com a vida cotidiana dos humanos. Esse
esquema de funcionamento, portanto, "... não deve ser compreendido como
um edifício onírico; é o diagrama de um mecanismo de poder levado à sua
forma ideal" (1977, p.181).
O diagrama, ou máquina abstrata informal, funciona como causa imanente dos
agenciamentos concretos formais, em que o poder opera um enquadramento de todo o campo,
normalizando, gerindo a vida. As sociedades antigas também tinham diagramas, com outras
matérias e funções, que diferem dos atuais diagramas que configuram a sociedade capitalista.
O diagrama concebido por Foucault
é um modo de pensamento, exploratório, que ultrapassa a
linearidade operativa para se organizar por relações, por associações. Essa é a dimensão dada
44
por ele ao poder diagramático, de onde deriva o do Panóptico de Bentham, onde o poder se
exerce no espaço e pelo espaço, que configura uma máquina antes social do que técnica, ou
seja, máquina abstrata. Foucault trabalha com ênfase em seus estudos sobre o Panóptico, que
é determinado abstratamente por um diagrama.
O Panóptico, como uma máquina abstrata, é a causa dos agenciamentos
concretos que são os dispositivos, a exemplo da escola, vista como máquina social, que
opera por tecnologia material e educacional. Por outro lado, a escola pode, em outras épocas,
ter outras formas de existência que difere da que a constitui atualmente.
Cada diagrama seleciona os instrumentos necessários para os
agenciamentos concretos que efetiva. A escola, o hospital, a prisão, em
outras épocas, podem ter tido apenas uma existência marginal. Só passam a
existir como dispositivo quando um novo diagrama social, como o
disciplinar, faz com que ultrapassem seus limiares tecnológicos. (GOMES
& BARROS, 2002, p. 12.)
Para Gilles Deleuze, o diagrama é profundamente instável ou fluente, misturando,
incessantemente, matérias e funções de maneira a constituir mutações.
Todo diagrama está em devir. [...] Ele faz a história desfazendo as realidades
e as significações antecedentes, constituindo outros tantos pontos de
emergência ou de criatividade, outras tantas conjunções inesperadas, outros
tantos contínuos improváveis. (1998, p.10)
O caráter abstrato dos diagramas está desatrelado da funcionalidade das coisas, da
localização pontual da fonte do poder e da forma fixa das estruturas, visto que assume a
fluidez. No diagrama, uma força se exerce sobre outras forças para combinar e compor,
recortar o detalhe e enquadrar uma multiplicidade espaço-temporal instável e fluida, de modo
a constituir um novo tipo de realidade, um novo modelo de verdade.
As relações de força se estendem por todo o campo social e se atualizam em seus
efeitos. Elas são multipontuais e difusas em vários pontos; são forças móveis, que não se
constituem como forma a que se tenha acesso e, por isso, são diagramáticas, não passam pelas
formas, mas por pontos, que marcam a aplicação de uma força (ação e reação), um efeito
sempre local e instável, como afirma Deleuze (1998 p. 59-60).
45
É profundamente instável ou fluente, misturando incessantemente matérias e
funções de maneira a constituir mutações. [...] Todo diagrama está em devir.
[...] Ele faz a história desfazendo as realidades e as significações
antecedentes, constituindo outros tantos pontos de emergência ou de
criatividade, outras tantas conjunções inesperadas, outros tantos contínuos
improváveis. Ele duplica a história com um devir.
O diagrama de forças é uma multiplicidade espaço-temporal e, por isso, torna-se
instável, flutuante, não funciona para representar um mundo pré-existente, ou seja, opera
constituindo conjunturas inesperadas e contínuas improváveis. Então, o exercício de poder
não é um dado institucional, não tem esse caráter localizável; está sempre em processo, num
conjunto de estratégias materializadas em práticas. Esse aspecto está relacionado com o fato
de que, na sociedade, as relações de poder, ou de forças, são difusas e heterogêneas.
Essas ideias, cunhadas por Foucault (1979), permitem que se considerem
múltiplas formas de determinada aplicação do poder, que remetem a certo número de táticas
eficazes e sistemáticas, que funcionam como multiplicidade de relações de forças e se
configuram de forma abstrata e fluida.
Cada diagrama social tem um "regime de subjetividade" ou, como refere
Foucault, "modos de subjetivação” do ser humano na nossa cultura. Para Gomes(2002,
p.12), o conceito de subjetividade visa, exatamente, “embaralhar as dicotomias sujeito-
objeto, indivíduo-sociedade, corpo-psiquismo, interior-exterior”. É uma noção inseparável da
noção de produção, cujas máquinas sociais de sua produção são muito variadas.
Subjetividade, portanto, fabricada e modelada. Nesse sentido, o indivíduo está situado no
entrecruzamento de múltiplos componentes de subjetividade, de múltiplos vetores de
formação de subjetividade.
3.4 Recondução de um diagrama disciplinar para um diagrama do controle
A sociedade disciplinar corresponde ao diagrama de um processo tecnicista,
atinge o ápice da dominação do controle num espaço determinado, que se exerce em um
contínuo. Foucault aborda a diferença instaurada pela sociedade disciplinar e o surgimento de
um novo diagrama - o da disciplina, característico do sistema de poder.
46
Mas o que é próprio das disciplinas, é que elas tentam definir em relação às
multiplicidades uma tática de poder que responde a três critérios: tornar o
exercício de poder o menos custoso possível (economicamente, pela parca
despesa que acarreta; politicamente, por sua discrição, sua fraca
exteriorização, sua relativa invisibilidade, o pouco de resistência que
suscita); fazer com que os efeitos desse poder social sejam levados a seu
máximo de intensidade e estendidos tão longe quanto possível, sem fracasso,
nem lacuna; ligar enfim esse crescimento “econômico” do poder e o
rendimento dos aparelhos no interior dos quais se exerce. (1977, p. 191).
A disciplina, de acordo com Foucault, é apresentada como uma multiplicidade de
técnicas que, em conjunto, constituem um dos múltiplos esquemas para se exercer o poder.
Essas técnicas produzem um processo de dominação que converge com normalização,
individualismo e vigilância, que
permitem o controle minucioso das operações do corpo, como
ressalta Foucault
(1977, p.127).
[...] as disciplinas se tomaram, no decorrer dos séculos XVII e XVIII
fórmulas gerais de dominação. [...] O momento histórico das disciplinas
é o momento em que nasce uma arte do corpo humano, que visa [...] a
formação de uma relação que no mesmo mecanismo o toma tanto mais
obediente quanto é mais útil, e inversamente. [...] a disciplina fabrica
assim corpos submissos e exercitados, corpos 'dóceis'. A disciplina
aumenta as forças do corpo (em termos econômicos de utilidade) e
diminui essas mesmas forças (em termos políticos de obediência) [...]
dissocia o poder do corpo; faz dele por um lado uma 'aptidão', uma
'capacidade' que ele procura aumentar, e inverte por outro lado a
energia, a potência que poderia resultar disso, e faz dela uma relação de
sujeição estrita.
Esses são métodos disciplinares, vinculados a uma tecnologia política que produz
sujeição, em um trabalho que se exerce sobre os corpos e os produzem. A disciplina é uma
tecnologia difusa, instrumento multiforme que atravessa instituições e as relaciona ao mesmo
tempo. Foucault fez ver como essas técnicas menores, implementadas nas instituições,
permitiram baixo grau de exigências do diagrama da disciplina, estabelecendo então novas
relações de dominação, ou seja, de poder.
[...] com o panoptismo, temos a disciplina - mecanismos: um dispositivo
funcional que deve melhorar o exercício do poder tornando-o mais rápido,
mais leve, mais eficaz, um desenho das coerções subtis para uma sociedade
que está por vir. O movimento que vai de um projeto ao outro, de um
esquema da disciplina de excepção ao de uma vigilância generalizada,
47
repousa sobre uma transformação histórica: a extensão progressiva dos
dispositivos de disciplina ao longo dos séculos XVII e XVIII, sua
multiplicação através de todo o corpo social, a formação do que se poderia
chamar grosso modo a sociedade disciplinar. (1977, p.173)
Esses enunciados de Foucault apontam para o surgimento de um novo diagrama
instaurado pela sociedade disciplinar, que passou a utilizar técnicas disciplinares de forma
muito mais flexível, que viriam a compor novas expressões de exercício de poder.
Foucault observa que a propagação das tecnologias de controle, na sociedade,
advém de diversas instituições e não seria um atributo exclusivo do aparelho do Estado,
expande-se para o campo social, através de processos flexíveis de controle.
Enquanto, por um lado, os estabelecimentos de disciplina se multiplicam,
seus mecanismos têm uma certa tendência a se desinstitucionalizar, a sair
das fortalezas fechadas onde funcionavam e a circular em estado livre; as
disciplinas maciças e compactas se decompõem em processos flexíveis de
controle, que se pode transferir e adaptar (1977, p.186).
Isso significa que as lógicas e técnicas disciplinares antes vistas nas prisões, nos
hospitais se estenderam, progressivamente, a outros campos da sociedade, convertidas, por
sua vez, em processos flexíveis de controle. Assim, na sociedade disciplinar, os
agenciamentos se comunicam na máquina abstrata que lhes confere uma
microssegmentaridade flexível e difusa, de forma que eles todos se parecem. Desse modo,
Foucault deixou pistas sobre o panoptismo, que se constituiu como modelo estratégico de
controle disciplinar em diversas instituições. A proposta inicial da conjuntura arquitetônica do
panóptico tem como princípio o controle e a vigilância a todo instante, exercidos numa rede
de instituições que Foucault denomina de "instituições de sequestro", criadas para fixar os
indivíduos aos aparelhos de produção, na sociedade capitalista, articulando a permanente
recorrência do ciclo processual que garante sua eficácia.
Outra pista deixada por Foucault em “Vigiar e punir” diz respeito ao controle que
se exerce sobre os corpos para modelar indivíduos inseridos num sistema de sujeição. Essa
sujeição pode ser calculada e utilizada em diferentes processos em que se materializa o poder
disciplinar.
Veiga-Neto (2001), ao discutir a disciplinarização do corpo, aponta que ela
consiste no controle da postura corporal, dos hábitos e das atitudes dos alunos e das
48
alunas, para que, através da atenção, da participação e da concentração, o processo de
ensino e aprendizagem se desenvolva satisfatoriamente.
Acerca desse aspecto, Varela (1996) também nos mostra que a disciplina do
corpo favorece a produção social dos sujeitos, através das "tecnologias de produção de
subjetividades específicas", que o também "tecnologias de individualização que
estabelecem uma relação com o corpo", tornando-o, ao mesmo tempo, útil. Vale dizer
que a disciplina do corpo, envolvendo o tempo, o espaço e o movimento dos sujeitos,
caminha no sentido da determinação e da imposição, com base em condicionantes
externos que, apreendidos, incorporados e introjetados, produzem condutas
autorreguladas e sujeitos autodisciplinados.
Referindo-nos aos estudos foucaultianos, podemos dizer que a produção de
sujeitos e corpos autodisciplinados passa pelos dispositivos das "tecnologias de
dominação" e das “tecnologias do eu” ou “tecnologias de si", no sentido de autorregular e
autodisciplinar os sujeitos em suas ações rotineiras e cotidianas.
Noutra instância, Veiga-Neto(2001) nos fala, respectivamente, sobre a
disciplina como "eixo dos saberes" e "produção dos saberes”. Esse autor explicita que a
distribuição dos conhecimentos em categorias hierarquizadas resulta de processos sociais.
O arranjo dos saberes em disciplinas resulta de processos sociais, em que
entram em jogo mecanismos complexos de valorações e distribuições
simbólicas, legitimação, exclusões, distinções, etc. Em outras palavras,
as disciplinas não nascem naturalmente; elas não são descobertas ao
longo de um suposto avanço do conhecimento humano. Elas são
inventadas; elas servem para que, entre outras coisas, se possam dar
sentidos ao mundo. (VEIGA-NETO, 2001, p.46).
A estruturação de saberes
em disciplinas
resulta unicamente de um processo que
segue critérios de hierarquização, em um processo contínuo e contraditório para melhor
atender à rede dos saberes/poderes, que se tornam cada vez mais complexos e abrangentes na
sociedade em que vivemos.
49
3.5 Diagrama da sociedade de controle
Sociedade de controle é o termo que Gilles Deleuze utilizou para caracterizar um
tipo de sociedade que vinha se desenvolvendo após a Segunda Guerra Mundial, como uma
espécie de derivação, desdobramento da sociedade disciplinar. Para Fourezzier (2002, p.77), a
sociedade de controle instaura mecanismos que se caracterizam-se por uma modulação que
funciona “como uma moldagem auto-deformante, que muda continuamente, a cada instante,
ou como uma peneira cujas malhas mudam de um ponto a outro”. A modulação significa a
superação do confinamento, do molde produtor de subjetividades.
Assim, a sociedade de controle seria uma espécie de modulação constante e
universal, que atravessaria e regularia as malhas do tecido social. Nessa formulação, o poder
seria mais ilocalizável, disseminado numa ação dispersa, numa rede planetária, difusa, que
opera por máquinas, “que não é uma evolução tecnológica sem ser, mais profundamente, uma
mutação do capitalismo”.
É uma mutação bem conhecida que pode ser resumida assim: o
capitalismo do século XIX é de concentração, para a produção, e de
propriedade. Por conseguinte, erige a fábrica como meio de confinamento, o
capitalista sendo o proprietário dos meios de produção, mas também
eventualmente proprietário de outros espaços concebidos por analogia (a
casa familiar do operário, a escola). [...]É um capitalismo de sobre-produção.
Não compra mais matéria-prima e já não vende produtos ele quer vender são
serviços, e o que quer comprar são ações. não é um capitalismo dirigido
para a produção, mas para o produto, isto é, para a venda ou para o mercado.
Por isso ele é essencialmente dispersivo. (DELEUZE, 1992, p.226)
Nessa análise, Deleuze traz à luz as formas que adquirem a substituição acelerada
de um capitalismo de circulação e de comunicação para o capitalismo de produção centrada
na exploração apenas do trabalho industrial assalariado. Para ele, as mutações tecnológicas da
idade da informatização planetária são relacionadas a uma mutação do capitalismo que não
poderia se servir de outro discurso de legitimação senão daquele, puramente horizontal, do
mercado (do neoliberalismo esclarecido ao anarco-capitalismo iluminado: o da Internet...), de
outra prática de dominação senão aquela, puramente imanente, do controle social em variação
e modulação contínuas.
50
Trata-se, efetivamente, de um elemento de mudança geral na maneira pela qual o
poder marca o espaço, na passagem da modernidade à pós-modernidade, como denota
Castells
(1997, p. 397)
[...] corresponde adequadamente aos novos modos de atuação do poder
[reação ao controle expresso pelo poder através das redes]. Nenhuma forma
de poder parece ser tão sofisticada quanto aquela que regula os elementos
imateriais [simbólicos] de uma sociedade: informação, conhecimento,
comunicação. O Estado hoje está se tornando uma verdadeira matriz
onipresente, modulando-os continuamente segundo variáveis cada vez mais
complexas.
Côrtes, ao se referir às estruturas e aos mecanismos de funcionamento em ambas
as sociedades, a disciplinar e a de controle, diz que, apesar de atuar com técnicas bastante
diferentes, complementam-se, interpenetram-se, superpõem-se.
É um erro acreditar que ao se instaurar o que Deleuze chamou de sociedade
de controle todos os mecanismos da sociedade disciplinar estariam
superados. Concordo que a tendência é de que se desenvolvam novos
dispositivos que venham a superar os disciplinares, aliás, as crises vividas
por esses últimos atualmente são inegáveis indícios dessa possível
superação. Mas crise não significa morte. As instituições disciplinares estão
ainda bem vivas e cumprindo suas funções de concentrar, distribuir no
espaço, ordenar no tempo e compor no espaço-tempo uma força produtiva
que deve ter um efeito superior à soma das forças elementares. (CÔRTES,
2004, p. 70)
É importante perceber que, na sociedade de controle, o aspecto disciplinar não
desaparece, apenas muda a atuação das instituições que produzem novas circunstâncias, uma
nova situação, que faz ressurgirem novas formas de controle, que substituem as antigas,
calcadas num sistema fechado.
Essas novas formas além de "ultra-rápidas" também têm a característica de
possibilitarem a incidência de controle sobre os indivíduos mesmo em
espaços abertos: produções farmacêuticas, industriais, midiáticas e de
marketing; manipulações genéticas; movimentações financeiras; as empresas
e suas lógicas substituindo as fábricas; os sistemas de prêmio por
produtividade e salários por mérito, moduláveis, substituindo os salários
estáticos; a rivalidade e a competitividade cada vez mais impostas nas
relações produtivas contrapondo os indivíduos ao invés de um corpo de
operários, o que facilitava as resistências; a formação permanente tendendo a
substituir a escola e o controle contínuo da própria sociedade substituindo o
51
exame; eis alguns dos meios pelos quais se dão e se darão essas novas
formas de controle. (CÔRTES, 2004)
A sociedade de controle é melhor entendida, não em oposição à sociedade
disciplinar, mas como uma disciplina aumentada exponencialmente, por meio de novas
formas mais móveis e fluidas. Para Hardt, a sociedade de controle deveria ser identificada,
antes de mais nada, com a atual crise das instituições sociais, a crise da família, a crise da
fábrica, a crise da escola, dentre outras instituições.
A crise contemporânea das instituições, entretanto, implica que os muros que
previamente delimitavam o espaço social destas instituições estão se
desintegrando. Neste processo, as lógicas disciplinares não desapareceram,
em vez disso, elas se generalizaram por todo o campo social, não mais no
espaço limitado das instituições. Por exemplo, a lógica capitalista do regime
da fábrica é exercitada não apenas dentro dos muros da fábrica, mas por toda
a sociedade (aumentando nas formas de trabalhos precários ou não-integrais).
O mesmo processo de generalização tende a ser verdade para a lógica da
prisão, a lógica familiar e outros regimes disciplinares. (HARDT, 1996, p. 1)
Na sociedade de controle, a disciplina não desapareceu, mas “desterrou-se em
controles siderais”,fluindo de todos os lados e por todas as direções. Em se tratando de
controle social, esse o seria entendido como uma prática exercida pelo Estado, por
empresas ou qualquer outro sujeito, para manter a ordem social, mas como uma
multiplicidade de técnicas de produção das subjetividades. Assim, o controle social deixa de
ter uma abordagem de um saber juridico-politico referente ao poder do Estado e suas
instituições, inserindo-se no campo da microfisica do poder. O controle social,
à
luz da
inspiração foucaultiana, é visto como produção de subjetividades e rejeita a ideia de
repressão, para operar na produção dos sujeitos nas lutas e nos afrontamentos sociais,
imprescindíveis às tramas que envolvem as relações sociais na contemporaneidade. Nesse
contexto, é ilustrativo o exemplo dos meios de comunicação, na sua modalidade reticular de
organização, pois criam novos hábitos, provocando uma desterritorialização do quadro
tradicional da vida individual e coletiva.
[...] as novas tecnologias possibilitam novas formas de sociabilidade,
modificam antigas formas, criam situações diferenciadas para a ação e
52
interação e, portanto, reestruturam as relações existentes entre as
instituições e organizações e a sociedade da qual elas fazem parte.
(BARICHELLO, 1998, p. 4)
Os processos comunicacionais demarcam seu posicionamento estratégico de
um bem material ou simbólico, dotado de valores, que se enraíza nas expectativas geradas
pela convivência, uma “sensação de liberdade” que alimenta e fortalece o controle. A
sensação de que somos livres alimenta e reforça nosso investimento nessa “liberdade” de
ter acesso a participar, poder circular e consumir. Tal liberdade, por sua vez, oferecida pelo
capitalismo, segundo Chevitarese (2004), “é experimentada como participação contínua,
pela produção crescente de mecanismos que possibilitem a “sensação” de que se está
“atuando e decidindo” politicamente, em “defesa da democracia e da liberdade”.
Logo, indagamos sobre qual a localização da resistência, na atual sociedade de
controle, o que depende de uma revisão daquilo que ela tornou na contemporaneidade o
investimento na sujeição, que se reveste de “intensificação na ocupação das energias das
partes vitais do corpo, alimentando-o de política democrática”. Segundo Passeti (1999, p. 20).
“não como conter sujeições ainda que o projeto democrático possa parecer adequado a
alguns e momentaneamente a muitos”. Com isso, as formas de poder se tornam cada vez
menos geograficamente localizáveis, exigindo que se flagre o surgimento de novas formas de
produzir resistência, resultantes das mudanças que vêm ocorrendo na sociedade.
3.6 Relações de Poder e resistência inscrita numa determinada conjuntura histórica
Neste tópico, são abordados aspectos essenciais relativos às práticas de
resistência, suas ambiguidades e perspectivas. A construção das práticas de resistência
constituem-se em complexo processo, que podem, portanto, ser analisadas através de
estratégias de lutas contra o sujeitamento que marca uma relação de poder.
[...] não existe uma relação de poder sem os meios de evacuação ou eventual
fuga. Toda relação de poder implica, pelo menos em potência, uma
estratégia de luta, na qual as duas forças não são sobrepostas, não perdem a
sua natureza específica... Cada um para o outro constitui uma espécie de
limite permanente, um ponto de inversão possível (FOUCAULT, 1995,
p.234).
53
A resistência à forma de poder não se restringe às contestações contra a
exploração econômica ou a dominação de classes; elas tomam também a forma da negação
das técnicas de assujeitamento e de biopoder operados pelos Estados modernos.
Em última análise, vamos observar uma luta eficaz contra a dominação, o
assujeitamento e, contra as diversas formas de subjetividade e de submissão. Dentre os vários
aspectos colocados, é lícito afirmar que o poder se exerce sobre "sujeitos livres" e que tem,
diante de si, um campo de possibilidades dos afrontamentos e das resistências.
[...] para resistir, é preciso que a resistência seja como o poder. Tão
inventiva, tão móvel, tão produtiva quanto ele. Que, como ele, venha de
"baixo" e se distribua estrategicamente. [...] Não coloco uma substância
da resistência face a uma substância do poder. Digo simplesmente: a
partir do momento em que uma relação de poder, uma
possibilidade de resistência. Jamais somos aprisionados pelo poder:
podemos sempre modificar sua dominação em condições determinadas e
segundo uma estratégia precisa (FOUCAULT, 1979, p. 241).
A resistência supõe ato e exercício, que intensificam as lutas que se passam em
torno do poder, os focos de resistência cujo efeito obriga à recondução e ao contrapoder.
Assim, tratar a questão da resistência, Moreira Neto (2001, p.2) aponta que na compreensão
de Foucault, os pontos de resistência não se apresentam “como um processo dialético de
causa e efeito ou como um quadro binariamente estabelecido onde às relações de poder
impõem e são modificadas pela ação da resistência”. Deste modo, as relações de poder, não se
situam num campo específico, não são propriedade de uns, dos dominados, pelo contrário, se
insere dentro de um campo mais amplo das práticas sociais.
Foucault, ao invés de dar uma justificação para a resistência, tenta apontar o que
ela permite a partir de dois modelos: um subjacente à resistência como tática de inversão, que
tem por base a ideia de que o conflito é inerente a essas relações, de cunho eminentemente
estratégico, e o outro, que é a estética da existência, baseado no modelo governamental de
poder. Nesse particular, advém sua tese crucial de sua fase ética: a atitude de modernidade
deságua numa estética de existência, através da qual é o próprio sujeito que se toma objeto de
sua invenção e autoconstituição. Para Foucault, seria impossível desvincular a autonomia do
sujeito da articulação entre vida e arte. A estética da existência vem a ser o ápice de uma
operação ética, enquanto atitude de modernidade. Uma forma de ética como a preconizada por
54
Foucault representa um pensamento e uma ão possíveis apenas a segmentos determinados
do universo social.
3.7 Microrresistências na trama complexa das relações de poder
A originalidade da obra de Michel de Certeau está justamente em como ele inverte
a forma de interpretar as práticas culturais contemporâneas, recuperando as microrresistências
e microliberdades que deslocam fronteiras de dominação, nascida da prática do cotidiano.
Certeau nos mostra que “o homem ordinário” inventa o cotidiano com mil
maneiras, e isso se dá graças ao que ele chama de “artes de fazer”, “astúcias sutis”, “táticas de
resistência”, que vão alterando as relações, as práticas impostas pelas políticas culturais. Ao
atribuir às práticas o estatuto de objeto teórico, Certeau busca encontrar os meios para
“distinguir maneiras de fazer”, para pensar as práticas cotidianas, supondo, no ponto de
partida, que elas são do tipo tático. Essa análise das práticas pode ser captada como
antidisciplina.
Este trabalho procura dialogar com os pressupostos certeaunianos e indagar quais
as especificidades da antidisciplina, no dia-a-dia, por meio de inúmeras sutilezas e táticas, que
Certau tão bem sabe improvisar e inscrever as tramas das relações. Em seu livro, “A invenção
do cotidiano”, Michel de Certeau (1994, p. 175), com os conceitos de antidisciplina, tática e
estratégia, afirma suas preocupações, que se dirigem no sentido de “(...) acompanhar alguns
dos procedimentos multiformes, resistentes, astuciosos e teimosos que escapam à
disciplina sem ficar mesmo assim fora do campo onde se exerce”.
É sobremaneira significativa a contribuição de Michel de Certeau com o
funcionamento de múltiplas "táticas" articuladas dentro do cotidiano, as quais constituem
uma série de procedimentos que usam as referências de um lugar próprio, cujos movimentos
táticos transformam em espaços dinâmicos.
Chamo de tática a ação calculada que é determinada pela ausência de um
próprio. Então nenhuma delimitação de fora lhe fornece a condição de
autonomia. A tática não tem por lugar senão o do outro. E por isso deve
jogar com o terreno que lhe é imposto tal como o organiza a lei de uma
força estranha. Não tem meios para se manter em mesma, à distância, numa
posição recuada, de previsão e de convocação própria: a tática é
movimento. (1994, p.100)
55
A “tática” é, para Certeau (1994, p. 46), um cálculo que não pode contar com um
próprio, com “uma fronteira que distingue o outro como totalidade visível”. Ele assevera que
onde as táticas se constituem, proliferam-se “as astúcias e as combinações de poderes sem
identidade, legível, sem tomadas apreensíveis, sem transparência racional impossíveis de
gerir”.
Desse modo, Michel Certeau discute sobre as diversas astúcias e ticas utilizadas
pelos indivíduos para escaparem dos disciplinamentos e fundarem microliberdades,
produzidos por um movimento que se insere na rede relacional, inseparável do "contexto",
espaço onde se movimentam. A tática é o movimento dentro do campo de visão do inimigo
no espaço por ele controlado. É, portanto, a arte do mais fraco. “Sem lugar próprio, sem visão
globalizante, cega e perspicaz, como se fica no corpo a corpo sem distância, comandada pelos
acasos do tempo”, a tática se exerce na “ausência do poder”, à espreita, aguardando o
momento certo para agir nos espaços da ordem dominante, ao contrário da estratégia,
“organizada pelo postulado de um poder” (CERTEAU, 1994, p.25).
As estratégias são as ações e as relações de força, ou seja, postulam um lugar
suscetível de ser circunscrito como algo próprio e, portanto, capaz de servir de base para uma
gestão de suas relações com uma exterioridade de alvos ou ameaças.
Chamo de estratégia o cálculo das relações de forças que se torna possível a
partir do momento do momento em que um sujeito de querer e isolável de
um ambiente . Ela postula um lugar capaz de ser circunscrito como algo
próprio e portanto capaz de servir de base a uma gestão de suas relações
com uma exterioridade distinta. (CERTEAU, 1994, p. 46)
As estratégias são pensadas como o cálculo ou a manipulação das relações de
força. Elas permitem a um sujeito de querer e poder postular um lugar do querer e do poder
próprios, como por exemplo, dominar seus lugares, controlar.
Nesse sentido, Certeau contribui para uma análise que evidencia a atividade de
“fazer com”, ou seja, os movimentos astuciosos das práticas e suas maneiras de utilizar
resistências à disciplina imposta por um lugar de poder.
56
4 DADOS RELACIONADOS ÀS RELAÇÕES DE PODER (RE) CONSTRUÍDAS NO
CONTEXTO ESCOLAR
O objetivo fundamental deste capítulo é evidenciar o que se entende por poder e,
mais especificamente, entendê-lo por meio de diferentes práticas construídas na escola
pública da rede estadual, no município de Salvador, Bahia. Com esse propósito, o texto se
apoia nos registros das informações coletadas na pesquisa, provenientes de diversas fontes,
coletadas em diferentes etapas, através do grupo focal.
Tomamos como pistas as percepções dos professores e de estudantes do ensino
médio, quanto às práticas construídas de forma mais explícita, que correspondem ao modo
operandi” ou “modalidades” de relações de poder.
Na análise dos dados, para evidenciar as percepções dos professores e dos
estudantes, usamos a legenda (GF), seguida do respectivo número (GF-1 a 12), indicando o
grupo de onde decorre a fala ou o depoimento acerca das relações de poder. Para
operacionalizar a análise dos dados do estudo, foi empregada uma codificação temática, que
organiza as informações coletadas. É uma estrutura aberta, em que categorias foram sendo
incorporadas ao longo da pesquisa. O quadro abaixo apresenta os conceitos utilizados e as
principais definições adotadas.
Quadro I – Práticas sociais como instrumentos de determinada modalidade de poder
DISCIPLINA
Instrumento de dominação e controle destinado a suprimir ou
domesticar os comportamentos divergentes.
AUTORIDADE
Modalidade de relações de poder própria da estrutura
hierárquica, em respectiva relaçăo com o exercício da
autoridade. Os agentes escolares estão distribuídos nas
funções, conforme escalonamento hierárquico.
RESISTÊNCIA
Práticas de focos, resistências, levantes e surpresas, como um
movimento que é tido como estranho.
ESTRATÉGIA
Ação calculada, compreendida como
cálculo (ou manipulação) das relações de força
TÁTICA
Micro exercícios práticos de oposição, a partir do que Certeau
chama de “astúcias sutis”. Têm a ver com os processos de
criações anônimas, utilizando “maneiras de fazer” que visam
ações efêmeras e intervenções.
ÉTICA
É a possibilidade de apontar o sujeito que constitui a si
próprio como sujeito das práticas sociais.
57
4.1 Disciplina: instrumento de dominação e controle
Neste tópico, são retomadas as formas de poder exercidas na escola, implicadas
questões disciplinares, que colidem com o poder disciplinador, o que não exclui a técnica
disciplinar, mas que a embute e a modifica, parcialmente, noutra escala, noutra superfície, por
instrumentos totalmente diferentes.
Nos depoimentos, a disciplina constitui um elemento intraescolar, produto das
relações estabelecidas entre os diversos agentes da realidade escolar. Na escola pública,
um complexo disciplinar, e para se compreender o que é disciplina, que se estender sobre
o conjunto de atividades que visam exercer alguma espécie de influência sobre o
comportamento dos alunos, para o autocontrole e a responsabilidade, por sua conduta, como
expressa o depoimento abaixo:
O problema de "indisciplina" deverá estar baseado em técnicas que
capacitem os alunos para o autocontrole e a responsabilidade por sua
conduta. (GF-12)
A disciplina é pensada enquanto uma técnica que traz à tona a noção de atividade
subjetivante para tornar os alunos aptos a não se desviarem de uma conduta padrão,
desejável para o bem comum da escola, como sugere este depoimento da professora.
Consideramos que, na escola, a disciplina não deve ser considerada como
um sistema de sanções e de punições. Deve ser uma ação positiva de nossos
professores, para manter um bom clima, na sala de aula, de respeito à ordem
e às boas maneiras. (GF-3)
Nessa fala, a disciplina é tomada como uma ação positiva dos professores para
ajustar os alunos às exigências de convivências próprias da vida escolar, num minucioso
controle da atividade na sala de aula, exercendo o poder disciplinar, normatizador e
subjetivante. Essa operação pode ser a produção de uma série de condutas adequadas,
formulada, sistematicamente, em um discurso contínuo, cujos mecanismos e efeitos são
difusos também na escola, em que todo um investimento no corpo, que marca um sistema
de sujeição.
58
4.1.1. As técnicas disciplinares
A disciplina, como ressalta Foucault, não pode se identificar com uma instituição
nem com um aparelho. Ela é um tipo de poder, “uma modalidade para exercê-lo que
comporta todo um conjunto de instrumentos, de técnicas, de procedimentos, de níveis de
aplicação, de alvos; ela é uma "física" ou uma "anatomia" do poder, uma tecnologia” (1977,
p. 177), para disciplinar os movimentos dos agentes escolares em suas atividades.
Nos depoimentos dos entrevistados, observamos, atentamente, as minúcias das
normas da escola, funcionando também como um poderoso dispositivo subjetivante que
envolve um universo de códigos, que são internalizados, como expressa esta fala:
Nós, professores, temos que cumprir horário, temos que mostrar que o aluno
está aprendendo, temos que fazer o registro de notas na caderneta e controlar
as faltas dos alunos. Na escola, tem regra para tudo, reforçando assim a sua
função reguladora das nossas ações. (GF-12)
Essas são normas e regras formais que têm um caráter impositivo, estruturadas e
codificadas, inscritas geralmente em suportes oficiais. Tais normas e regras, formalmente
produzidas na escola como normas éticas ou de conduta, são originárias não apenas de leis,
decretos e sistematizações advindas da Secretaria de Educação do Estado da Bahia, mas
também da própria formulação dos agentes escolares.
Esse aspecto é ressaltado neste discurso:
No seu funcionamento, cada escola estabelece normas gerais. Nesta escola,
o aluno que danificar o patrimônio escolar será obrigado à indenização e
serão aplicados os procedimentos das normas. (GF-12)
Dessa forma, as normas e regras estabelecidas para os alunos são também para os
professores, através dos métodos e das técnicas entendidos como um conjunto de regras
éticas que circulam nas relações. Isso pode ser observado no depoimento da professora sobre
alguns dos regulamentos internos da escola:
A escola a direção instituíram, como regras internas de funcionamento, em
que o critério para entrada de alunos atrasados será estabelecida pelo
professor, o uso de uniformes como obrigação para todas as séries em
qualquer atividade no cotidiano escolar, o aluno deve aguardar na sala de
59
aula a chegada do professor e não danificar o mobiliário ou efetuar
pichações em qualquer bem da escola. (GF-12)
Esse depoimento aponta para as regras elaboradas pela escola com os mais
diversos procedimentos, que tornam explícitas
proibições
integradas no regimento da escola.
São inúmeros os exemplos reveladores de convivência na comunidade escolar, através de
determinadas regras: sair da sala de aula com autorização do professor; não utilizar ou
portar material potencialmente perturbador da ordem ou dos trabalhos escolares; não sair das
dependências da escola sem autorização; não promover jogos e rifas sem prévia autorização
da direção da escola; não manifestar ações ostensivas de namoro ou que demonstrem
intimidade física; não usar o telefone celular e aparelhos eletrônicos, durante as aulas; não
promover algazarras ou distúrbios nos corredores e pátios; não levar para a escola livros,
impressos, gravuras ou escritos considerados imorais.
Essas são regras estipuladas no regimento escolar, um documento que disciplina
as relações de todos os envolvidos no processo escolar, que traz, também, as sanções e os
recursos cabíveis para os que infringirem regras formais de convívio. Essas regras são
fortemente moduladas pelo contexto cultural e passam a ser aplicadas, verbalmente, na sala de
aula, como comenta o aluno:
O aluno ficará perplexo se noutra aula for ser advertido, subitamente, pelo
professor por ter usado o boné na sala de aula. Nesta escola, é proibido usar
boné, touca ou gorro, em sala de aula, laboratório e em outros espaços
físicos. (GF-1).
Essas são normas avulsas, postas em prática, nos diferentes âmbitos da escola,
mesmo sem estarem integradas ao regimento da escola, passando a compor um conjunto de
regulamentos escolares, refletidos para controlar ou corrigir as operações do corpo. Foucault
(1977, p.118 ) aponta e que “o corpo é objeto de investimentos tão imperiosos e urgentes: em
qualquer sociedade, o corpo está preso no interior de poderes muito apertados, que lhe
impõem limitações, proibições ou obrigações.” O autor esclarece também que são novas
essas técnicas. Para ele, “não se trata de cuidar do corpo, em massa, grosso modo, como se
fosse uma unidade indissociável, mas de trabalhá-lo detalhadamente: de exercer sobre ele uma
60
coerção sem folga, de mantê-lo ao nível mesmo da mecânica movimentos, gestos, atitudes”
(ibid.1977, p.118).
A norma, como entende Foucault, circula na sociedade como um dispositivo de
caráter regulamentador, visando sempre a uma ordem disciplinar, impondo valores ao corpo e
aos acontecimentos da sociedade. Ele refere que se pode considerar que as normas “estão no
próprio fundamento da sociedade e de seu equilíbrio, enquanto são uma série de mecanismos
para desequilibrar definitivamente e em toda parte as relações de poder; daí o fato de nos
obstinarmos a fazê-las passar pela forma humilde, mas concreta de qualquer moral, enquanto
elas são um feixe de técnicas físico-políticas” (FOUCAULT, 1977, p.184). As normas, dentre
outros dispositivos, passam a ser instituídas dentro de um cunho moral, pontuando extremos
em termos de adestramento dos corpos, para neutralizar possíveis conflitos, que circulam
numa rede de relações.
Na escola, essas são práticas que dão sustentação ao “poder disciplinar” explícito
ou implícito no tecido social, instaurando, mediante processos constantes, a disciplinarização
dos corpos dos indivíduos, tentando sempre, na medida do possível, garantir a obediência e a
docilidade, na submissão mais eficiente possível, sustentada, como nos fez ver Foucault
(ibid, p. 177), “por mecanismos miúdos, cotidianos e físicos, por todos esses sistemas de
micropoder essencialmente assimétricos, que constituem as disciplinas”, que comportam
todo um conjunto de instrumentos, de técnicas de procedimentos, ou seja, uma tecnologia
que passa pelo que parece minúsculo - as pequenas relações do cotidiano.
Assim, as normas criam, ao mesmo tempo, o conceito de proibição, que articula a
escola às convenções. São, em torno das convenções, represálias interpretadas como castigo
e punição.
4.1.2 Violência que se impõe através das técnicas punitivas e disciplinares
Analisamos a violência, de acordo com as proposições teóricas de Michel
Foucault, a qual mantém um vínculo estreito com a temática do poder. Ele propõe que ela seja
analisada como “um domínio de relações entre indivíduos ou grupos relações que podem
recorrer a técnicas e procedimentos diversos de coerção”. (1995, p. 243)
61
A violência está associada ao modo de punir e se volta para os mecanismos
disciplinares próprios das sociedades modernas, delimitados em seus efeitos positivos, como
tática de dominação orientada pelo investimento do corpo, por relações de poder.
A violência, como concebe Foucault, “[...] age sobre um corpo, sobre as coisas;
ela força, ela submete, ela quebra, ela destrói; ela fecha todas as possibilidades” (1995, p.
243). Isso não significa que o exercício do poder prescinda da violência, mas que essa é uma
atividade final, um efeito que pode ser percebido nas situações cotidianas da escola, por vias
distintas: estrutural/institucional e comportamental/relacionais.
Na escola, a dimensão da violência no exercício do poder se por meio de
tecnologias políticas do corpo, quando ele é atravessado por um poder regulador, um discurso
ou um conhecimento que o ajusta, impondo limitações, autorizações e obrigações. O corpo,
na escola, é perpassado por vários discursos e por alguns mecanismos e técnicas de controle.
É através das mais variadas táticas e técnicas, ou seja, das "tecnologias políticas do corpo",
que se inculcam os padrões de comportamento ao corpo, em todas as suas relações.
Em Foucault (1977, p. 25), o corpo é investido por relações de poder e de
dominação; sua constituição como força de trabalho é possível se preso a um sistema de
sujeição para que se torne força útil e, ao mesmo tempo, corpo produtivo e corpo submisso.
Percebe-se, assim, que a escola é um lugar também apropriado para a difusão das tecnologias
políticas do corpo.
Na escola, há uma série de técnicas que se fazem mostrar como elementos
operadores e como legitimadores do controle do corpo.Várias dessas técnicas estão
relacionadas à utilização do corpo, para obtenção de disciplina, à cisão corpo/mente, à
imobilização do corpo, no ambiente escolar, e à seleção e exclusão dos corpos no confronto
com os diferentes e com as diferenças no ambiente escolar.
Em Salvador, nas Escolas de Ensino Médio, local de nossa pesquisa, observou-se,
através das informações coletadas, que as condições de ser corpo dos alunos foi, por vezes,
utilizada e manipulada, a fim de se obter disciplina, por meio de sistemas punitivos que,
embora não recorram a castigos violentos, utilizam métodos de trancar ou corrigir:
Os portões sempre ficam trancados. Os funcionários da escola ficam
circulando e, à porta, sempre uma concentração de alunos, na calçada da
escola, próximo ao portão, que foram impedidos de sair. (GF-6).
62
Foucault permitiu-nos diagnosticar contornos dessa violência, na difusão das
tecnologias políticas do corpo, inscritas numa mecânica que não “trata de cuidar do corpo em
massa, [...] mas de trabalhá-lo detalhadamente; de exercer sobre ele uma coerção sem folga,
de mantê-lo ao nível mesmo da mecânica” (FOUCAULT,1977, p.118), em que o corpo está
preso no interior de poderes que não apenas lhe impõe limitações, proibições e obrigações,
mas também punições e novas técnicas de violência, como relatado a seguir:
Nesta escola, ainda hoje, ocorrem punições ilegais, como suspensões e
expulsões. (GF-10)
Esse depoimento retrata a disciplinarização, através do poder disciplinar, em que a
punição apresenta um efeito de positividade do poder na eficácia e eficiência do seu uso, nos
vários domínios de sua aplicação, através de mecanismos de punição, como sugere o
depoimento abaixo:
Havia, nesta escola, diferentes regras de punição a serem cumpridas. Se você
tivesse uma falta grave, você era castigado. Agora temos punições leves
como: advertência oral e escrita, suspensão das aulas e cancelamento de
matrícula, quando o caso assim o exige. (GF-12)
Na escola, usam-se essas formas de punição porque não se podem tolerar certos
atos tidos como antissociais, e às pessoas que nele se empenham seria negada a oportunidade
de o fazerem uma segunda ou terceira vez. Apesar dos efeitos temporários, a punição é
comumente empregada no controle do comportamento, com o objetivo de eliminar atitudes
indesejáveis.
Na sala de aula, ainda hoje, alguns professores utilizam punições como
forma de controle para o exercício da autoridade. (GF-10)
Embora, em algumas escolas, os professores usem a punição, como, por exemplo,
medidas corporais, atualizam ou realizam outros procedimentos de punição, através de
ameaças, repreensões, abuso de autoridade, investidas de rigidez, através de sanções que
favorecem formas de controle. Entretanto, temos que considerar que, na escola, continua-se a
punir por razões bastante diversas, como retratam os depoimentos abaixo:
63
O professor recorre à punição quando se sente criticado, ridicularizado, e
agredido na sala de aula. (GF-2)
Aqui, existem situações em que os alunos vão à desforra com professores
que os puniram com uma expulsão da sala de aula ou, mesmo, lhe deram
uma nota baixa. (GF-2)
Nota-se que, na escola, uma variabilidade e complexidade de situações punitivas
chama a atenção, e a pessoa que foi punida nem por isso se encontra menos inclinada a
proceder de determinado modo e evitar a punição, que é humilhante para quem sofre.
Esses processos punitivos, que estão em funcionamento nas escolas, ainda nos
dias atuais, sugerem que devemos partir de sua estrutura institucional, mas, de modo algum,
limitarmo-nos, mas, ir a fundo nas práticas sociais, cada vez mais, disseminadas, entre os
agentes da escola, como se observa no depoimento:
Na escola, a punição termina sendo usada por qualquer pessoa, mesmo
existindo uma decisão sobre quem deveria usá-la. (GF-5)
Podemos, assim, enfatizar os sentimentos morais que sustentam muitas práticas da
punição geradora de agressividade, que são destrutivas, invertem o modo de perceber essas
práticas, apenas em torno das regras referidas ao ato transgressivo e ao ato desviante, mas,
para a própria comunidade escolar, no modo como cada pessoa reage a certas condutas.
Para Foucault, trata-se de localizar numa série de situações:
Técnicas sempre minuciosas, muitas vezes íntimas, mas que têm sua
importância: porque definem um certo modo de investimento político e
detalhado do corpo, uma nova "microfísica" do poder. (...) Pequenas astúcias
dotadas de um grande poder de difusão, arranjos sutis, de aparência inocente,
mas. profundamente suspeitos, dispositivos que obedecem a economias
inconfessáveis, ou que procuram coerções sem grandeza, o eles entretanto
que levaram à mutação do regime punitivo, no limiar da época
contemporânea. (FOUCAULT,1977, p. 120)
Nesse modelo foucaultiano, a punição tem vários elementos culturais,
interpretados como instrumentos de dominação, controle, subjetivação e técnicas de poder.
Todos esses elementos são importantes para o entendimento atual do que de cultural na
práticas e nos mecanismos punitivos que se traduzem em violência. Portanto, a violência que
ocorre no âmbito institucional abriga uma série heterogênea e complexa de práticas, como de
ameaças verbais, que operam com códigos que são lidos para advertir, assustar, intimidar e
amedrontar, nas mais diversas situações do dia-a-dia escolar, como apontam estes relatos:
64
Alguns alunos tiveram a má experiência de sofrer ameaças de alunos mais
velhos, dentro da escola. Sabemos que são casos isolados, que acontecem
muito raramente; mas acontecem. (GF-11).
Presenciamos, na escola, agressões mútuas, entre alunos, insultos, empurrões
e ameaças (GF-11).
Essas são situações de ameaça ou de intimidação, dirigidas por alunos contra
alunos, que ocorrem em vários espaços da escola, onde a punição ocorre com frequência e
favorece a agressividade, como um modo aceitável de resolução de conflitos. As ameaças
verbais, identificadas nos dados empíricos, referem-se aos empurrões, aos insultos com
palavras ou gestos, que não deixam de ser também uma forma de violência.
O cotidiano da escola permite que se sinta, de perto, a violência que, para
Foucault, está diretamente ligada ao corpo que resvala o comportamento agressivo, como
recurso para resolver um conflito, como expressam os relatos seguintes:
Pelo fato de o professor ter corrigido a prova, com dois cimos a menos, o
aluno agrediu o professor, que entrou em coma devido às pancadas que
levou com uma cadeira, e a escola ficou toda suja de sangue. (GF-10)
Um dos fatos conhecidos e que acontece também nesta escola é que alunos
agridem professores por causa de décimos e por causa de outras coisas. (GF-
10)
As estratégias são mobilizadas para resolver os conflitos na escola, por meio do
comportamento agressivo, que infringe dano físico ou psicológico ao outro. Entretanto, é
importante considerar que, na maioria das vezes, os agentes escolares escolhem estratégias
não violentas para resolver os conflitos interpessoais:
.
Aluno bate com força na cara do Professor por causa de uma discussão na
sala de aula (GF-11).
Essas formas de violência física dizem respeito a um conjunto de práticas que
invadem a privacidade do indivíduo atingindo-o e, em última instância, o seu próprio corpo.
Na relação social, esse tipo de violência é o excesso de poder que impede o reconhecimento
do outro mediante o uso da força, da coerção e da ameaça, provocando algum tipo de dano em
65
graus variáveis. Não se trata só de atitudes agressivas, mas de uma circunstância que intimida,
gradualmente, às vezes pelo medo. A violência nas escolas também assume a forma de brigas,
frequentemente, associadas à intimidação verbal:
Fui tirar algumas dúvidas com a coordenadora pedagógica sobre o estágio e
ela mim (sic) atendeu de forma muito grosseira, gritando comigo. (GF-6)
O diretor, por conta do seu constante mau humor, trata os alunos e até
mesmo os professores de forma grosseira (GF- 6).
Um colega foi perguntar para um professor por que ele estava faltando tanto,
o professor deu uma resposta grosseira. (GF-10).
Esses são atos que contradizem as regras de boa convivência: ameaças,
empurrões, grosserias, palavras ofensivas, atos de excesso, agressão contra o professor, como
bater-lhe na cara, que se verificam no exercício de cada relação de poder presente nas relações
estabelecidas na escola.
Na complexidade das relações sociais, que estão presentes no espaço social da
escola, existem também as práticas de violência contra o patrimônio, sendo mais frequentes,
nas escolas pesquisadas, os atos de depredação de muros, janelas, paredes e salas de aula, e
de destruição de bens, em particular, as cadeiras, como sugerem os depoimentos:
Os alunos começam a depredar a escola, criando um clima de insegurança
para a comunidade escolar, manifestando, de alguma forma, o seu
descontentamento e a sua revolta (GF-11).
Um aluno do Centro Educacional Edgar Santos jogou uma carteira do
segundo andar do colégio. (Estudantes, GF-11).
Esses atos de depredação da escola com a dilapidação do próprio espaço escolar,
embora em reduzido número, têm sido associados à violência de gangues juvenis, formadas
por jovens e adolescentes que foram, ou se sentem, excluídos da instituição escolar, mas que,
por vias transversas, querem ser incluídos no espaço escolar. Segundo Graciani, há “um
desencontro entre a instituição escolar e as particularidades culturais das populações pobres,
desencontro que precisa ser substituído por um relacionamento denso entre a escola e a
coletividade local na qual está inserida”. (1995, p. 145)
66
4.2 Autoridade hierárquica
Os dados da pesquisa revelaram outra modalidade em que o exercício do poder se
na forma de autoridade hierárquica, baseando-se numa relação social de poder, na posição
derivada de uma hierarquia. Logo, entendemos por hierarquia a institucionalização da
autoridade dentro da escola. O professor, ao falar em hierarquia dentro da escola, comenta
que, “no topo da hierarquia da escola, estão diretores, coordenadores, professores e o
conselho de pais”.
Dentro do contexto normativo, a escola, como instituição, legitima o estabelecido,
compondo um quadro hierárquico dentro da burocracia escolar. Logo, a autoridade é
instituída e reproduz uma hierarquia.
Autoridade é a base de qualquer tipo de organização
hierarquizada, sobretudo no sistema escolar, significando o direito e a capacidade de
comandar, impondo e decidindo, mesmo contra o gosto da maioria, como sugere o
depoimento abaixo:
A decisão de fazer a camisa do estágio repercutiu com muitos conflitos
entre os alunos, em função das diversidades de gostos, o que levou a direção
a definir o padrão, mesmo contra o gosto da maioria. (GF-1).
A autoridade hierárquica está estreitamente relacionada com o enfraquecimento
dos que o têm autoridade, sobre quem se exerce a autoridade, já que aqueles que têm esses
símbolos de autoridade concentram o poder de decisão nas suas mãos, o que quer dizer que os
alunos se convertem em executores, seguindo as ordens da direção. Esse aspecto é ressaltado
no relato a seguir:
A situação de poder, que houve em nossa turma, foi a troca da professora de
História. Pois, apesar de nós, alunos, não aceitarmos o Professor Ricardo,
ou seja, o “diretor” trocou por ter o poder.(GF-2).
Atualmente, a direção vem promovendo mudanças de professores, sem
respeitar a opinião dos alunos, sem a mínima consideração de, em tempo
hábil, manter-nos informados de tais mudanças. (GF-4).
O diretor, como demonstram os relatos, concentra a faculdade de exercício legal
do poder, direcionando e determinando as decisões sobre mudança dos professores na escola,
sem “escutar” os alunos, o que torna mais simples e sem obstáculos o exercício da
autoridade.
67
Foucault (1979) afirma que a formação da sociedade disciplinar está ligada a um
ensino submetido à hierarquia autoritária. As hierarquias fazem com que uns dependam de
outros, culpem o dependente pela sua própria dependência e, depois, usem essa mesma
dependência para justificar ainda mais o exercício do poder.
Os diretores, que assumem uma posição de dominação relativa aos alunos,
tendem a definir as características daqueles que lhes são subordinados, o que não significa
que os alunos estejam sempre em uma posição subordinada de não poderem agir por si
próprios, condenados a um estado de dependência e resignação às hierarquias estabelecidas
na
escola:
Sobre a escolha do uniforme, tínhamos opiniões diversas e cada um queria
opinar e interferir, gerando assim muita divergência. Os alunos, no final,
passaram a contestar os encaminhamentos do diretor, por não estar de
acordo com suas ideias, que decidiu por todos os alunos da escola. (GF-1)
Os dados deixaram também evidente que diretores que adotam posturas
diferentes da que foi explicitada e que existem aqueles que mesclam atitudes consideradas
mais democráticas com outras mais autoritárias. Nesse caso, a professora observa:
A direção desta escola é flexível, procura desenvolver um trabalho conjunto
com a coordenação pedagógica e com os professores, discutindo
alternativas e aceitando inclusive modificações que sejam viáveis, para
conter a indisciplina na escola. Mesmo quando exerce sua autoridade
procura fazer isso de forma sutil. (GF-12)
Esse é um modo de preservar também a rotatividade das responsabilidades,
respeitando uma escala hierárquica de autoridade, que reflete na sala de aula, e muitos
professores, na sua relação com os alunos, apoiam-se na imposição de hierarquia de
autoridade, como mostram estes depoimentos:
O professor mandou o aluno calar a boca na nossa sala. (GF-12).
Os professores, nem sempre, permitem em sala de aula que nós
alunos questionemos, tiremos dúvidas e nos posicionemos.
(GF-12).
68
Esses fatos evidenciam que, em sala de aula, a relação ocorre na forma apenas de
colaboração e circularidade, que acontecem por meio da relação hierárquica existente entre as
partes. Nesse caso, pode-se falar que, mesmo na sala de aula, o exercício da autoridade pode
ser revestido de autoritarismo, a favor do princípio de sujeição à autoridade do professor.
4.2.1 Autoridade e poder na avaliação
A escola, por outro lado, funciona dentro de uma lógica perversa dessa hierarquia
vertical dominante e vai produzindo alguns procedimentos, alguns instrumentos, alguns
processos mais formais de avaliação classificatória, que têm como eixo fundamental a
produção de uma hierarquia dos alunos. Sobre esse aspecto, Esteban (1999, p. 88) aponta
para a avaliação classificatória como uma das modalidades fundamentais na produção de
hierarquia na esfera escolar:
Essa avaliação vai estar muito articulada a uma pedagogia, que alguns
chamam da “pedagogia do exame”, em que todos os procedimentos
pedagógicos vão estar atravessados por práticas que visam ao controle e à
classificação. Dessa forma, nós vamos ter uma avaliação que, a partir de
um padrão predefinido, vai criando mecanismos de verificação do ponto
em que cada estudante ou que cada grupo e cada setor se encontram, de
acordo com aquele padrão que é tomado como referência. [...] criando todo
um conjunto de procedimentos, não só de avaliação, mas todo um conjunto
de procedimentos pedagógicos que vão estar alimentando essa ideia da
hierarquia — e que estão também sendo alimentados por essa hierarquia —
e nós vamos estabelecendo algumas pautas que são, por princípio,
excludentes. (ESTEBAN, 1999, p.88)
Isso mostra que o exercício do poder é também proveniente das atribuições que
os professores têm na escola, que os autorizam ao exercício de uma autoridade formal, que
faz com que ponha em funcionamento a avaliação, que tem, por princípio, a produção de uma
hierarquia que classifica e seleciona os alunos, como se observa neste depoimento:
Os professores, através do sistema de provas, avaliam o aluno, o que
significa manter a turma sob o jugo de testes, provas, trabalhos, através de
classificações que, na maioria das vezes, parecem-nos injustas. (GF-11).
69
Nas escolas, a aplicação da avaliação envolve todo um ritual de conduta
disciplinar com os alunos. Essa avaliação, atrelada à produção de saber, torna-se um elemento
pertinente para o exercício do poder, como denota este relato:
Uma discussão na sala de aula ocorreu pelo fato de o professor aplicar uma
prova e dar notas baixas para todo mundo, isso porque a turma havia
reclamado, em sala, que não tinha entendido nada sobre o assunto dado por
ele; por esse fato, a atitude do professor foi injusta (GF-5).
Dessa forma, a análise do poder se orienta para a dimensão dos operadores
concretos de sujeição dos indivíduos. Um deles é a avaliação, em que se percebe a existência,
consentida, de uma indiscreta e intensa perspicácia do poder. Foucault considera que “o
poder, quando se exerce em seus mecanismos finos, não pode fazê-lo sem a formação, a
organização e sem pôr em circulação um saber.” (1999, p.40)
Esses fatos revelam sutis e produtivos mecanismos de poder, em que se observa,
na atitude do professor, na sala de aula, uma série de coerções disciplinares sobre os alunos,
o que se constitui um elemento de sujeição e de dominação, como demonstram estas falas:
Os professores faltam muito, acumulam matéria e depois querem fazer
prova (GF-12).
Nesses últimos dias, praticamente não houve aulas, mas quando se chega ao
final da unidade, mesmo sem fazer reposição dos conteúdos, os professores
fazem prova cobrando todos os assuntos que eles dizem terem dado. (GF-
12).
O professor de Física, quando entrou no colégio, quis ir logo passando
prova sem se preocupar se nós sabíamos alguma coisa (GF-6).
As práticas de avaliação estão marcadas por tensão, na própria dinâmica da sala
de aula, que cria um conjunto de procedimentos, não só de avaliação, mas de um conjunto de
procedimentos que alimentam essa ideia da hierarquia, sem levar os alunos à aquisição do
saber.
Como explica Barlow (2006, p.153), isso se manifesta de diferentes maneiras,
“seja pela proclamação pública dos resultados (notas cifradas, classificação por ordem de
mérito, “quadro de honra” etc.), seja por sinais distintivos (cruzes, fitas, etc.), seja, enfim,
concedendo nas salas de aula “lugares de honra” para os melhores alunos”.
70
A escola não escapa de mecanismos hierárquicos de controle; continua a
funcionar como uma máquina de ensinar, mas também de hierarquizar (FOUCAULT, 1977,
p. 134). Dessa forma, as relações de poder e de hierarquia vivenciadas desdobram-se em
lutas veladas, que tornam essas relações complexas e conflituosas, em que os indivíduos
estão sempre em posição de exercer o poder.
4.3 Relações de poder e possibilidade de resistência
Na condução deste estudo, as reflexões neste tópico giram em torno das categorias
de táticas e estratégias presentes na escola, que é entendida como um ambiente onde se
formalizam as práticas sociais e que, por sua vez, sofre influências exteriores. Essas práticas
devem ser analisadas enquanto operações, como manifestações de tática e de estratégia. As
estratégias fazem parte da dominação ideológica e apontam para uma resistência; as táticas
apontam para a multiplicidade de práticas articulatórias e antagônicas que se caracterizam
pela informalidade.
Foucault afirma que o poder atravessa todas as relações, num processo
microfísico, marcando-os, fabricando-os, atingindo em cheio suas subjetividades e, a partir
disso, sujeitando-os, sendo possível também afirmar que toda relação é relação de poder, mas
não se limita a isso, porquanto muito mais entranhado nas entrelinhas do cotidiano da
escola, sinalizando que um mundo de relações de afetos, interações e comunicações que
marcam todos os que a compõem e que vivem nela.
No ambiente escolar, os estudantes buscam, o tempo todo, possibilidades de
movimento e de expressão: levantam, caminham, sentam, ouvem, veem, falam, mesmo
quando não são autorizados, e, até mesmo, saltam, gritam, pulam, correm, fogem, colam e
reinventam as suas realidades, pensando escapar aos esquadrinhamentos que intencionam
restringi-lo. De forma geral, eles desenvolvem um grau notável de habilidades para fugir da
escola, de acordo com sua própria vontade. Virtualmente, eles fazem seu próprio dia, partindo
daquilo que é oferecido pela escola.
Os alunos fogem da escola para livrarem-se da aula, ficam perambulando
pelos corredores à procura de diversão. (GF-3)
Quando a professora fica de costas para a lousa, a maioria dos alunos, que
se sentam no fundo, sai sem a permissão da professora. (GF-10).
71
A escola estava praticamente vazia, na sala havia poucos alunos, mesmo no
horário da chamada, quando normalmente os alunos estão presentes. (GF-
12).
Essas são "táticas" articuladas dentro do cotidiano, assumidas pela criatividade
dispersa; tática dos grupos ou dos indivíduos, tornando-se uma rede "antidisciplinar", que leva
a escola a buscar mecanismos mais eficientes de "podar" esses corpos, regular seus
movimentos e deixá-los aprisionados, através do disciplinamento adestrador, para que sejam
reduzido a movimentos previsíveis, conformados, submissos.
Foucault traz subsídios para uma noção de poder, que tem como elemento central
a resistência, que se apresenta como uma rede de forças em exercício no cotidiano. Do mesmo
modo, sabendo que as relações de poder estão ao alcance de dominantes e dominados,
nenhum interlocutor se subjuga completamente às forças que o atacam, porque ele detém a
capacidade de resistir, fazendo com que o outro também seja confrontado pelo seu exercício
de poder na escola.
O cotidiano da escola está marcado pela dinâmica das relações de poder;
analisar esse fenômeno, na realidade situada na escola, não é tão simples.
(GF-5).
Michel Foucault (1979) chama a nossa atenção justamente para o fato de as
práticas sociais não se difundirem apenas verticalmente, impostas de cima para baixo, mas
também horizontalmente, através de uma malha de relações sociais, inclusive as de poder,
cujas estruturas sofrem mutações periódicas, para se adaptarem às novas circunstâncias
sociais e históricas que, inevitavelmente, surgem.
O exercício do poder nada mais é do que um processo de lutas múltiplas e
contínuas, como são descritas pelos próprios alunos, nos seus mais ínfimos detalhes: “...
Manifestação no pátio da escola... /... abaixo-assinado para retirar uma professora, segundo
mostra a fala a seguir:
Estudantes fizeram manifestação no pátio da escola. A manifestação foi
para entregar o abaixo-assinado, a fim de tirar a professora de História da
escola, que agia de forma a constranger os alunos em sala de aula. (GF-11)
72
Essa resistência é intensiva e extensiva a vários pontos da escola, e se não houver
um lugar privilegiado para o seu acontecimento, pode ser no pátio ou em qualquer outro
espaço, que não existe um ponto único, nem resistência única, mas resistências, que estão
dentro da escola, como revelam os relatos orais:
Os alunos se mobilizaram e fizeram protesto, no pátio, por não quererem
aceitar qualquer tipo de imposição da direção da escola, que não quer
reconhecer nossos direitos e por isso não respeita os alunos e nem escuta
nossas reivindicações. (GF-07)
Houve o movimento dos alunos nesta escola, pedindo a mudança da direção
da instituição. A indicação da diretora foi feita pelo deputado estadual
Lomanto Júnior, que decidiu por apoiar de maneira irrestrita a permanência
da diretora na escola, sem ela estar realizando um bom trabalho. (GF-08)
Durante a pesquisa, detectamos pontos e focos de resistência, disseminados no
espaço da escola, provocando protestos, reivindicações e alguns tipos de mobilização.
Entretanto, esses são pontos de resistência móveis, que percorrem os próprios indivíduos, que
intensificam conjuntos heterogêneos de práticas, pontuais e, por vezes, inesperadas, que
servem a diversas causas, inclusive contra injustiças, como apontado a seguir:
Aqui, nesta escola, os alunos reivindicam quando existe uma injustiça em
relação a ele, isso pelo fato de conhecer seus direitos, não concordam que a
entrada na escola dos alunos seja permitida se estiverem uniformizados.
(GF7)
Outro aspecto importante a registrar é que os alunos demonstram ser capazes de
desenvolver astúcias e táticas contra as injustiças e o controle exercido, que permanece sendo
a base dos conflitos na convivência na escola. Foucault (2004b, p.276) não concebe as
relações de poder como um circuito fechado ou unidirecional. Ele considera que só são
possíveis tais relações com o coeficiente de força que cada sujeito tem ao seu alcance, na
interação com os outros, construindo sempre estratégias, realizando movimentos, compondo
alianças, através de movimentos efetivos de exercício de poder. Uma das táticas que os alunos
empregam para sair do isolamento é o grêmio estudantil, como relatado abaixo:
O grêmio estudantil, aqui na escola, capaz de pôr em funcionamento
movimentos de participação de alunos, atuando diretamente na
73
desconstrução das relações hierárquicas de poder, através da aceitação da
diversidade de opiniões e interesses dos segmentos de alunos. (GF-11)
O grêmio estudantil, aqui na escola, manifesta-se contra qualquer injustiça
cometida pelos diretores e pelos professores, daí porque existem direções de
escolas que não aceitam o Grêmio como instituição, e sem argumentar
fecham as portas da escola para seu funcionamento. (GF-11)
O grêmio estudantil constitui um meio de participação dos alunos na vida
escolar. É um espaço de discussão, o que permite enxergá-lo como uma iniciativa dos alunos,
com vistas a romper relações hierárquicas de poder na escola. O pano de fundo do grêmio
estudantil é funcionar como instância de representação dos alunos, dentro da unidade escolar.
O aluno relata que escolas em que “os estudantes estão despertando uma consciência
política da importância que um Grêmio tem dentro da escola".
Na escola, as entidades de representação são, certamente, a codificação estratégica
desses pontos de resistência, que tornam possível que, potencialmente, vários alunos sejam
detentores e destinatários do poder. Nos próximos relatos, os alunos sinalizam para a
necessidade de um organismo que reagruparia as formas de resistência, oferecendo a essa uma
unidade para a realização da chamada codificação estratégica de atividades de mobilização na
escola.
Quando falamos do grêmio é porque acreditamos na importância de o
estudante ter uma representação dentro da sua escola. De modo geral, os
estudantes não são considerados pela direção, temos que estar na escola e
também na rua, nos movimentos estudantis da cidade, onde se realizam
passeatas e atividades de mobilização em escolas públicas. (GF-11)
Tivemos várias conquistas, na escola, que só foi possível através do grêmio,
em reuniões com todos os segmentos para buscar melhoria na qualidade da
merenda escolar e para as atividades esportivas e lúdicas, na quadra da
escola, funcionarem durante todo o ano. (GF-11).
As bases de organização, que passaram a ser construídas dentro da escola, através
de Grêmios de Estudantes de Salvador, exercem as relações de poder, mas não de forma
sobredeterminada. Resiste-se ao poder e ao seu exercício capilarizado da Secretaria de
Educação, ao conduzir os lugares e os instrumentos de luta; unir-se em protesto contra aquilo
que se reconhece como intolerável, como por exemplo, o fato que motivou o
protesto,
organizado pelos grêmios, contra o encerramento do Agrupamento de Escolas, juntou dezenas de
alunos, pais e responsáveis junto aos portões do estabelecimento escolar.
74
Essas formas de resistência que, episodicamente, emergem na escola, servem para
operar deslocamentos em que a resistência é coextensiva e absolutamente inventiva. Na
escola, as movimentações dos alunos não podem deixar de ser levadas em consideração,
que interagem com a institucionalidade, buscando assegurar algum espaço autônomo para
articulação da própria identidade. Estratégia ou identidade, ação e racionalidade estratégica ou
ação e racionalidade expressiva, eis, portanto, as dimensões dessas ações operantes e atuais,
no espaço escolar, onde se circunscreve, concretamente, uma situação estratégica, ou ações
estratégicas.
As estratégias compõem um conjunto de situações, que surgem a cada momento, e
que podem ser compreendidas de forma processual. A estratégia é entendida como um
curso de ação, cujo processo envolve modificações e permanências nas formas de relações de
poder. Foucault (1995, p. 234) sugere uma nova economia das relações de poder, mais
empírica, mais diretamente relacionada à nossa situação presente e que implica usar as formas
de resistência contra as diferentes formas de poder, como um ponto de partida.
Nas escolas, detectamos resistências e lutas específicas dos professores contra a
forma particular de poder, de coerção, de controle que se exerce sobre eles. Através de
medidas educativas, impostas às escolas e aos professores, o tom do protesto é rotulado como
reações corporativas estabelecidas através de forma de luta, que apresenta diversos métodos
(greve e contestação), como descrito a seguir:
Os professores desta escola foram à Praça da Piedade protestar, e no
conjunto de queixas estão salários, precariedade das instalações físicas
dos estabelecimentos e da falta de material de ensino. (GF-12)
Em outros termos, os professores protestam contra o regime de poder através de
vários pontos de ataque, disseminados nos mesmos lugares onde ele se exerce, no cotidiano
da escola. Esse protesto não é apenas em direção ao Estado ou ao grupo que está no poder,
mas ao próprio poder, tal como se exerce, independente de o seu dirigente ser o governo
estadual.
Na escola, o movimento, seja ativo ou passivo, acontece a partir mesmo do lugar
onde os agentes escolares se encontram, pois ali funciona uma pluralidade do poder.
Entretanto, as lutas, em torno dos problemas enfrentados pela escola, são plenamente sociais,
pelo fato de estarem voltadas também "para fora", estabelecendo novos canais de visibilidade
na sociedade da qual fazem parte:
75
A manifestação na Praça da Piedade contou com a presença dos
professores, mas também dos alunos dos diversos colégios da rede
estadual de ensino de Salvador, para protestar sobre os problemas das
escolas na rua (GF-12).
Pais de aluno também estavam presentes e mobilizados na
manifestação da piedade, para impedir que as aulas fossem paralisadas
por conta da falta de condições de infra-estrutura (GF-12)
No interior da escola e fora dela, essas lutas reivindicatórias apontam
potencialidades da ão coletiva constituída pela ação conjunta de professores, alunos,
funcionários e pais de alunos, através do jogo mútuo das práticas coletivas. Essas lutas são
fundadas numa dimensão estratégica da ação coletiva, que não é apenas corporativa, como faz
crer a opinião pública, que rotula a dimensão política da contestação dos professores, com
interesses corporativos, para que seus direitos se façam valer.
As formas de luta que ocorrem na escola são demarcadoras do grau de intensidade
de determinados protestos e revoltas, comumente percebidas em termos de negação: resistir
quer, simplesmente, dizer não. Na analítica foucaultiana, a resistência segue um processo de
criação, apenas existem por estarem onde está o poder. Foucault reforça que a efetividade da
resistência ocorre porque ela funciona em todos os níveis do poder, atingindo-o em sua
operação e funcionamento, e a sua eficácia se encontra, justamente, por residir no mesmo
terreno das relações de poder. Nesse caso, temos que atentar para o que de específico na
forma estratégica, que recobre os processos de luta, construídos a partir de situações dadas,
em termos de resistências imediatas que não obedecem a um calendário hierárquico definidor
de sua posição, já que é potencialmente presente e infinitamente aberta.
4.4 Ética e poder
A ética, para Foucault, é a possibilidade de apontar o sujeito que constitui a si
próprio como sujeito das práticas sociais. Ele assevera que a compreensão da ética surge
enquanto procedimentos e técnicas de subjetivação e de tecnologias de si. A subjetivação é a
dimensão propriamente ética da moral; diz respeito à constituição de um ethos em que o
indivíduo se transforma em sujeito de uma conduta moral, conforme expressa esta fala:
Os alunos estão mais rebeldes, não escutam ninguém, fazem o que
pensam. (GF-8)
76
Na escola, ética e poder fazem parte das relações sociais e, por isso, mesclam-se
cotidianamente na experiência vivida pelos alunos que, ao passar para o exercício pleno do
poder, constroem seus códigos, nem sempre úteis, mas que fazem parte da própria
convivência social, como sugerem os relatos abaixo
:
Um aluno jogou uma bomba bem forte no Colégio, que chamou à atenção de
todos; esse foi um ato de vandalismo. (GF-2)
Era a aula de História quando soltaram duas bombas no pátio. As bombas
não são para machucar, só pra assustar. ( GF-12)
Os alunos dominam e soltam bombas na escola e ninguém faz nada. Muitos
saem rindo, achando aquilo muito legal, algo que talvez acabe com a rotina
da escola. (GF-12)
Na escola, o conjunto dos indivíduos no exercício do poder age de acordo com os
princípios da ética, que estão no circuito da sociedade, chegam a justificar esse exercício com
razões adequados aos valores do neoliberalismo. Sobre esse aspecto, professores ressaltam
que, na escola, os códigos de conduta surgem pelo fato de os alunos se sentirem no direito de
pensar e agir a seu modo, como relata a professora:
Hoje, na escola, existe uma ética entre os alunos de muitos direitos e poucos
deveres. Cada um tem o dever de pensar antes de tudo em si mesmo. (GF-?)
Deste modo, as éticas, constituídas na escola, cederam espaço a uma ética definida
em torno de cada indivíduo, o que prescreve limites de ideias justas, de atos equilibrados e de
comportamentos responsáveis. Por isso, regulamentar a ética em um código não é um
processo sem contradições. Isso porque o modo de atuação ético na escola instiga não a
obediência a um conjunto de regras e valores prescritos, mas, sobretudo, modos de vida,
maneiras de existir.
Para ser ético e agir eticamente, o homem precisa tomar conhecimento de si
próprio, já que não uma ética baseada em lições morais, mas voltada para a consciência do
que é, o que possibilita problematizar a natureza das relações que constituem o tecido atual
das nossas sociedades e o modo como são reproduzidas.
77
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Tentamos, ao longo deste estudo, proceder a uma discussão em torno das relações
de poder, ligadas ao contexto da Escola Pública, tendo como pano de fundo para as nossas
reflexões práticas vivenciadas pelos professores, alunos e demais profissionais do ensino
médio, em Salvador, no Estado da Bahia. Nesse sentido, nossa contribuição se destinou a
identificar relações de poder diretamente ligadas à escola, que tem seu cotidiano marcado
dentro de tais práticas.
As conclusões sobre as relações de poder analisadas neste estudo não podem ser
generalizadas, mas guardadas as limitações e possibilidades científicas de um estudo que pode
servir de auxílio à compreensão da realidade das escolas públicas de Ensino Médio.
Do ponto de vista teórico, procuramos, inicialmente, demonstrar que o poder é
algo inerente às relações sociais, e não, um bem materializado. Funciona na rede de relações,
podendo ser exercido de modo diferenciado em cada relação ou contexto. Assim, esta
pesquisa nos conduz a adotar concepções mais complexas sobre o poder e as contradições
inerentes à forma como é exercido.
Verificamos, ao longo deste estudo, que as relações de poder se manifestam em
atos objetivos (dominação-sujeição), determinados por mecanismos (técnicas) adaptativos,
voltados para a dimensão subjetiva (interioridade).
Constatamos, ainda, que existem circunstâncias particulares que envolvem cada
escola. Entretanto, encontramos referências comuns relativas às relações de poder que não
decorrem de uma forma linear, variando de uma prática a outra; o desenvolvimento dessas
relações, na escola, depende, sobremaneira, das circunstâncias que a rodeiam; as relações de
poder são marcadas por muitas flutuações de pequenos acontecimentos, que revelam as outras
facetas do dia-a-dia, especialmente da vida escolar.
De uma forma geral, os resultados obtidos na pesquisa (pelo menos, nesta
pesquisada) indicam que o cotidiano da escola é permeado pelas relações de poder, numa
escala de dominação-sujeição que, severamente, constrange a ação dos indivíduos, cerceando,
sobretudo, a sua capacidade de redefinir os limites sociais em que estão inseridos. Entre um
extremo e outro, uma enorme variedade de práticas que permitem perceber esses dois
fenômenos.
78
A característica da dominação-sujeição não confere exatamente estabilidade, e a
permanência no bojo das relações de poder é mais episódica, pois descreve relações de
imposição e de conflito, em consonância com mecanismos que podem constranger e/ou
viabilizar sua ação.
Isso nos faz também pensar em relações de poder portadoras de atributos
absolutamente contraditórios. De um lado, as que promovem a dominação e sujeição, e
outras que permitem aos diferentes agentes escolares participarem do processo de elaboração
das regras a que se submeterão.
Por fim, cabe comentar a maneira pela qual "dominação" e "sujeição" aparecem
sob os signos da ideologia, da violência e da disciplina. Isso faz pensar que as relações de
poder na escola, em geral, continuam produzindo e reproduzindo dominações e sujeições,
contribuindo, portanto, mesmo que de forma contraditória, para reações e resistências que
ajudam a reverter ou mesmo a subverter muitas das situações concretas, vivenciadas no dia-a-
dia escolar.
Essa perspectiva permite se pensar a dominação de forma complexa e não mais
estabelecida unilateralmente, e refletir sobre como os agentes escolares se enfrentam e se
aliam no espaço escolar e podem alterar o curso das relações.
No conjunto de percepções sobre relações de poder, foram encontradas formas de
como o poder é exercido e são geralmente personalizadas através das relações interpessoais
hierárquicas, em que o diretor é o seu principal interlocutor. São relações mais impositivas e
centralizadas, controlando por ordens diretas as ações e os modos de ser e de agir dos
profissionais.
Existe, também, aquela personalização advinda pela frequência com que o poder é
exercido por determinadas pessoas. Mas, juntamente com essa personalização, momentos
em que o poder é despersonalizado - não se sabe, na relação, quem poderá exercê-lo.
Quanto à hipótese formulada, verificou-se que a possibilidade de que, na escola
pública, as relações de poder explicitam uma dupla relação de dominação e sujeição, que não
se baseia em regras delimitadas e fixas, mas podem ser alteradas, confirmam-se neste estudo,
porquanto constatamos, empiricamente, diferentes formas de relações de poder, tendo em
vista que a dominação-sujeição é obtida por meio dos instrumentos da violência e da
ideologia, ambas funcionando através de sutis mecanismos. Pelo postulado de Foucault, um
79
poder não opera pela ideologia, o que é refutado neste estudo, nos resultados obtidos nas
análises.
Por outro lado, verificamos outra manifestação "notável" de resistências
"diretas", reagindo, sobretudo, contra as regras que são feitas para todos. Essas
resistências
operam estruturalmente as relações de poder, aglutinam-se, em geral, sob duas formas - a
individual e a coletiva e se externam com absoluta dissimulação de atos, formas e objetivos
dinâmicos, em que se relacionam componentes de relações de forças.
Limitações deste estudo e recomendações para futuros estudos
Uma das limitações deste estudo encontra-se na sua reduzida amostra: cinco
escolas. Por essa razão, as conclusões a que chegamos se aplicam apenas a elas, tratando-se
por isso de um estudo exploratório. Por outro lado, a amostra deste trabalho engloba apenas
professores e alunos de ensino médio de cinco escolas da rede estadual. Assim sendo, não
podemos estender os resultados obtidos a outras escolas. Acresce, ainda, que este trabalho
abarcou duas dimensões das relações de poder - a objetiva e a subjetiva - faltando, por isso,
uma análise mais aprofundada e pormenorizada da última dimensão. Apesar disso, tal
dimensão pôde evidenciar traços importantes das relações de poder, trazendo contribuições
para o entendimento que temos sobre o funcionamento dessas mesmas relações, através de um
rol de estratégia; tática; linguagens carregadas de valores e julgamentos; regras do diálogo e
vínculos sociais e afetivos em que emergem posicionamentos extremados e explosões
emocionais intensas e agressivas.
Tratando-se das limitações deste estudo, pensamos que componentes
comportamentais, afetivo e cognoscitivo são dimensões que se devem considerar em trabalhos
futuros. Também seria importante que estudos próximos procurassem abranger uma maior
diversidade de profissionais das instituições escolares. Além disso, seria também pertinente
que futuros trabalhos acompanhassem as relações de poder, o que contribuiria para o
aprofundamento do tema em análise.
80
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