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A moça fechou as pálpebras, vencida pelo seu delicioso
entorpecimento, e estendeu-se de todo no chão, de barriga para o ar,
braços e pernas abertas.
Adormeceu. Começou logo a sonhar [...] E viu-se nua, toda nua,
exposta ao céu, sob tépida luz de um sol embriagador, que lhe batia
de chapa sobre os seios.[...] E suspirando, espreguiçou-se toda num
enleio de volúpia ascética.
Lá do alto o sol a fitava obstinadamente, enamorado das suas
mimosas formas de menina .
Ela sorriu para ele, requebrando os olhos, e então o fogoso astro
tremeu e agitou-se, e, requebrando os olhos, e então o fogoso astro
tremeu e agitou-se, e, desdobrando-se, abriu-se de par em par em
duas asas e principiou a fremir, atraído e perplexo. Mas de repente,
nem se de improviso lhe inflamassem os desejos, precipitou-se lá de
cima agitando as asas, e veio, enorme borboleta de fogo, adejar
luxuriosamente em torno da imensa rosa, em cujo regaço a virgem
permanecia com os peitos franqueados.
E a donzela, sempre que a borboleta se aproximava da rosa, sentia-se
penetrar de um calor estranho, que lhe acendia, gota a gota, todo o
seu sangue de moça.
E a borboleta, sem parar nunca, doidejava em todas as direções, ora
fugindo rápida, ora se chegando lentamente, medrosa de tocar com as
suas antenas de brasa a pele delicada e pura da menina.
Esta, delirante de desejos, ardia por ser alcançada e empinava o colo.
Mas a borboleta fugia.
Uma sofreguidão lúbrica, desensofrida, apoderou-se da moça; queria
a todo custo que a borboleta pousasse nela, ao menos um instante, um
só instante, e a fechasse num rápido abraço dentro das suas asas
ardentes. Mas a borboleta sempre doida, não conseguia deter-se: mal
adiantava, fugia logo, irrequieta, desvairada de volúpia.
- Vem! Vem! Suplicava a donzela, apresentando o corpo. Pousa um
instante em mim! Queima-me a carne ao calor das tuas asas!
E a rosa, que tinha ao colo, é que parecia falar e não ela. De cada vez
que a borboleta se avizinhava com suas negaças, a flor arregaçava-se
toda, dilatando as pétalas, abrindo o seu pistilo vermelho e ávido
daquele contato com a luz.
-Não fujas! Não Fujas!Pousa um instante!
A borboleta não pousou; mas, num delírio, convulsa de amor, sacudiu
as asas com ímpeto e uma nuvem de poeira dourada desprendeu-se
sobre a rosa, fazendo a donzela soltar gemidos e suspiros, tonta de
gosto sob aquele eflúvio luminoso e fecundante.
Nisto, Pombinha soltou um ai formidável e despertou sobressaltada,
levando ambas as mãos ao meio do corpo. E feliz, e cheia de susto ao
mesmo tempo, a rir e chorar, sentiu o grito o grito da puberdade sair-
lhe afinal das entranhas, em uma onda vermelha e quente.A natureza
sorriu-lhe comovida [...] abençoando a nova mulher que se formava
para o mundo.
Percebemos que para Aluisio Azevedo tanto quanto para Júlio Ribeiro a
menstruação trazia desejo e prazer sexual ao corpo feminino, demonstrando o quanto
este corpo ainda precisava ser desvendado pelos “homens da ciência” do período.