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Universidade de Brasília
Instituto de Letras
Departamento de Línguas Estrangeiras e Tradução
Programa de Mestrado em Lingüística Aplicada
AVALIAÇÃO E PRODUÇÃO COLABORATIVA
DE MATERIAL DIDÁTICO:
Uma proposta para a formação continuada de professores de LE
MARIA NATÉRCIA ALENCAR
Brasília, DF
2006
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2
MARIA NATÉRCIA ALENCAR
AVALIAÇÃO E PRODUÇÃO COLABORATIVA
DE MATERIAL DIDÁTICO:
Uma proposta para a formação continuada de professores de LE
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Lingüística Aplicada do Departamento
de Línguas Estrangeiras e Tradução da Universidade
de Brasília, como requisito parcial à obtenção do título
de mestre em Lingüística Aplicada.
Orientadora: Profa. Dra. Percília Lopes Cassemiro dos
Santos
Brasília, DF
2006
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3
Maria Natércia Alencar
AVALIAÇÃO E PRODUÇÃO COLABORATIVA DE MATERIAL DIDÁTICO:
Uma proposta para a formação continuada de professores de LE
BANCA EXAMINADORA
_________________________________________________________
Presidente: Profa. Dra. Percília Lopes Cassemiro dos Santos - UnB
_________________________________________________________
Examinadora Externa: Profa. Dra. Maria Cristina Faria Delacorte - UFG
________________________________________________________
Examinador Interno:Prof. Dr. José Carlos Paes de Almeida Filho – UNB
_____________________________________________________________
Suplente: Profª. Drª. Cynthia Ann Bell dos Santos - UnB
Brasília, 17 de janeiro de 2006.
4
RESUMO
Este estudo apresenta uma pesquisa que identifica e analisa os conteúdos e os tipos
de reflexões geradas durante o processo de avaliação e produção colaborativa de material
didático, de quatro professoras de inglês. Além disso, a pesquisa busca saber como as
participantes avaliam a relevância desse processo para sua formação profissional continuada.
Para a coleta e análise dos dados são adotados os princípios da pesquisa qualitativa.
A realização desta pesquisa fundamentou-se nas teorias sobre reflexão e
colaboração. Apesar das diferentes interpretações, a abordagem reflexiva apresenta-se como
um caminho profícuo para o desenvolvimento profissional. A colaboração, por sua vez,
começa, também, a ser vista como uma estratégia de grande efeito nos processos de formação
de professores.
Os resultados demonstram que a ação colaborativa leva os professores a refletir
tanto sobre questões da sala de aula quanto sobre as mudanças impostas pelo mundo
globalizado. Evidenciou-se, também, a importância da criação de espaços em que os
professores possam, por meio do diálogo, buscar junto a seus pares refletir cada vez mais
criticamente sobre as questões que os afligem e que enfrentam isoladamente.
Em suma, este estudo ressalta a importância do desenvolvimento de uma política
de formação continuada de professores de língua estrangeira, para que eles possam sair do
isolamento profissional em que aparentemente se encontram.
Palavras chaves: Reflexão, colaboração, formação continuada, ensino-aprendizagem.
5
ABSTRACT
This study identifies and analyses the contents and kinds of reflections generated
during the collaborative process of evaluation and production of didactic material of four
English teachers. Moreover, it aims at knowing how the four participants evaluate the
importance of this process to their education. To collect and analyze the data we adopted the
principles of qualitative research.
The framework for this study was based on reflection and collaboration theories.
Despite the different interpretations, the reflective approach is seen as advantageous in the
professional development of teachers. Collaboration, in turn, is also becoming a powerful
strategy for teacher education.
The findings showed that the collaborative action led the teachers to reflect on
their pedagogical practice as well as on the changes imposed by globalization. It was also
found there was a need to create specific places where teachers and their peers, can reflect
critically through dialogue, about issues they are concerned about and which they face
isolated from one another.
In brief, this research emphasizes the importance of a foreign language in-service
teacher education policy, so they can come out of the professional isolation in which they
seem to be.
Key words: Reflection, Collaboration, In-service education, Teaching-Learning
6
SUMÁRIO
1 CAPÍTULO I - INTRODUÇÃO...................................................................................... 11
1.1 Justificativa ................................................................................................................ 13
1.2 Objetivos e perguntas de pesquisa ................................................................................ 15
1.3 Metodologia ....... .......................................................................................................... 16
1.4 Organização deste trabalho........................................................................................... 16
2 CAPÍTULO II – FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA..... .................................................. 17
2.1 Revisitando o papel do professor de LE: uma perspectiva histórica introdutória ....... 17
2.1.1 Desenvolvimento profissional de professores de LE................................................. 22
2.1.2 Abordagem reflexiva ................................................................................................. 26
2.1.3 Aprendizagem colaborativa ....................................................................................... 31
3 CAPÍTULO III – METODOLOGIA DA PESQUISA .................................................... 34
3.1 Estudo de caso............................................................................................................... 34
3.2 Contexto da pesquisa .................................................................................................... 35
3.3 Parâmetros Curriculares Nacionais............................................................................... 36
3.4 Participantes ................................................................................................................ 38
3.4.1 As Supervisoras ........................................................................................................ 38
3.4.2 As Professoras ........................................................................................................... 38
3.5 Procedimentos e instrumentos utilizados na pesquisa .................................................. 39
3.5.1 Gravação em áudio. ................................................................................................... 40
3.5.2 Questionário............................................................................................................... 41
3.5.3 Entrevistas ................................................................................................................ 42
3.6 Procedimento de análise ............................................................................................... 42
4 CAPÍTULO IV – ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS......................................... 45
4.1 Análise do processo de avaliação colaborativa de material didático............................ 45
4.1.1 Escolha e papel do livro didático............................................................................... 45
7
4.1.2 Organização das unidades do livro didático .............................................................. 49
4.1.3 Conceito de ensinar e aprender uma LE .................................................................... 53
4.1.4 Visões do projeto político-pedagógico da rede municipal de ensino ........................ 56
4.2 Análise do processo de produção colaborativa de material didático ........................... 58
4.2.1 Escolha e delimitação do tema................................................................................... 58
4.2.2 Procedimentos............................................................................................................ 59
4.2.3 Análise contextual...................................................................................................... 63
4.2.4 Objetivos do projeto................................................................................................... 64
4.2.5 Avaliação ................................................................................................................ 65
4.2.6 Dificuldade dos professores....................................................................................... 67
4.2.7 O papel dos alunos..................................................................................................... 68
4.3. Análise das entrevistas................................................................................................. 69
4.3.1 Isolamento profissional.............................................................................................. 69
4.3.2 Novos conhecimentos ................................................................................................ 71
5 CAPÍTULO V – CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................... 74
5.1 Retomando as perguntas de pesquisa............................................................................ 74
5.1.1 Qual o tipo de reflexão e os conteúdos abordados durante o processo de
avaliação e produção colaborativa de material didático? ................................................... 74
5.1.2 Quais as percepções dos sujeitos de pesquisa a respeito da relevância do
processo de avaliação e produção colaborativa de material didático, para sua formação
continuada? ................................................................................................................ 76
5.2 Implicações deste estudo para a formação continuada de professor de LE.................. 77
5.3 Limitações desta pesquisa e sugestões para pesquisas futuras ..................................... 77
5.4 Considerações finais ..................................................................................................... 78
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS................................................................................ 79
ANEXOS ................................................................................................................ 86
8
Aos professores de língua estrangeira
que buscam no trabalho colaborativo um
caminho para desenvolver-se
profissionalmente.
9
AGRADECIMENTOS
Ao Martin, pelo amor e companheirismo.
Aos meus pais, irmãos, sobrinhos e cunhados, por estarem sempre ao meu lado incentivando e
compreendendo os momentos de ausência.
A todos os amigos e colegas de trabalho do Projeto Línguas que tanto me apoiaram, e em
especial a amiga Suzy Mara Gomes Rosa por sua colaboração incondicional.
À professora Deise Nanci, mentora e coordenadora do PECEC-LEs que não se cansa de abrir
caminhos para que nós professores tenhamos espaço para nos desenvolvermos
profissionalmente.
A todos os professores do Programa de mestrado em Lingüística Aplicada da UNB, e, em
especial a professora Maria Luíza Ortiz pela doçura e alegria com que sempre me recebeu.
À professora Percília Santos, minha orientadora, pela paciência, compreensão e contribuição
para meu crescimento profissional.
Às professoras participantes .
Aos professores que aceitaram participar da banca examinadora deste estudo.
10
LISTAS DE ABREVIATURAS E SIGLAS
PECEC-LEs - Projeto de Extensão Comunitária de Educação Continuada em Línguas
Estrangeiras
PCNs - Parâmetros Curriculares Nacionais
P1 – professora 1
P2 – professora 2
P3 – professora 3
P4 – professora 4
S1 – supervisora 1
S2 – supervisora 2
LE – Língua Estrangeira
11
CAPÍTULO I
INTRODUÇÃO
Se ação e reflexão, como constituintes
inseparáveis da práxis, são a maneira humana de
existir, isso não significa, contudo, que não estão
condicionadas, como se fossem absolutas, pela
realidade em que está o homem.
Paulo Freire (1983, p.17)
Segundo Pessoa (2002), a globalização e suas repercussões políticas e socioculturais
impõem uma nova gica, um novo modo de pensar e agir no mundo contemporâneo. Essas
mudanças influenciam as mais variadas áreas das relações humanas, inclusive a educação.
Contudo, apesar do rompimento das inúmeras barreiras comerciais, econômicas,
culturais e das restrições à livre circulação de informações entre países, (Rajagopalan, 2003) a
globalização não assume concretamente um compromisso com a diminuição dos problemas
sociais, e, nesse sentido, contribui significativamente com a manutenção de conflitos e
contradições que dificilmente serão superados sem a intervenção de projetos políticos
comprometidos, não somente com a mundialização do mercado, mas principalmente com as
necessidades e dificuldades contextuais de cada país.
Sendo nosso foco de estudo a educação e especificamente, a formação continuada do
professor de língua estrangeira (doravante LE), notamos que os conflitos e contradições nessa
área podem ser decorrentes do fato de que os professores deparam-se com a necessidade
urgente de buscar/construir conhecimentos que os auxiliem a lidar com as novas exigências e
expectativas que a competência profissional requer. Porém, essa busca pelo desenvolvimento
profissional continuado nem sempre é respaldada pelas políticas educacionais de forma
efetiva, criando, assim, uma certa “angústia” entre muitos educadores que se sentem solitários
nas suas jornadas pedagógicas.
12
Para Rajagopalan (2003), a mola propulsora de todas essas instabilidades e
contradições – presentes, segundo ele, na linguagem e conseqüentemente nas relações entre os
povos e as pessoas encontra
-
se no excesso de informação que nos circunda, provocando o
que ele chama de “crise de identidade lingüística”. No caso dos professores de LE e
especificamente do professor de língua inglesa as pressões são ainda maiores, pois a língua,
nesse caso, representa não um objeto de ensino-aprendizagem, ou o elemento mediador do
conhecimento, mas também um instrumento de imposição colonialista.
Na área de formação continuada de professores de línguas estrangeiras, várias
pesquisas (García, 1999; Celani, 2004; Machado, 2004) apontam a necessidade de oportunizar
aos docentes momentos para que eles conheçam novos paradigmas, reflitam sobre a educação
e sobre o papel do professor como ator social no contexto escolar. O foco na formação do
professor mostra-se, hoje, como uma tendência tanto nacional como internacional (Almeida
Filho, 1999; Leffa,2001; Gimenez,2002; Celani,2003; Richards and Nunan,1990; Garcia,1999
e Novoa,1992). E, em contraposição ao modelo de treinamento surge, mais fortemente a
partir dos anos 90, o conceito de professor reflexivo. Apesar das críticas e das diferentes
interpretações, esse conceito tem-se mostrado bastante fértil em nosso país. Na verdade, o
conceito de professor reflexivo já nos foi apresentado nas discussões trazidas por Paulo
Freire, que o associava ao profissional comprometido com a sociedade e, portanto, sujeito de
suas ações. Para Paulo Freire (1983,p.21) “na medida em que o compromisso não pode ser um
ato passivo, mas práxis ação e reflexão sobre a realidade –, inserção nela, ele implica
indubitavelmente um conhecimento da realidade”
Se assumirmos a perspectiva freiriana de reflexão, nosso papel, como professores
formadores, é de ajudar nossos professores, em pré-serviço ou em serviço, a organizar
reflexivamente o pensamento. E, segundo esse mesmo autor, o caminho para essa ação
encontra-se no diálogo, entendido como a relação horizontal de amor e humanidade.
A possibilidade de acompanhar de perto os conflitos e as contradições no contexto
educacional permite nos questionar se parte de suas causas não estão ligadas aos valores
capitalistas de competitividade e qualidade total, tão em voga nos dias de hoje, e que tanto
diferem da perspectiva freiriana. O tema desta pesquisa surgiu desse contato, dessas
indagações e da percepção de que a crise anunciada pelas mudanças do mundo moderno
atinge diretamente o sistema educacional brasileiro e seus professores, que na maioria das
vezes encontram-se desarticulados politicamente e sem possibilidades de compartilhar suas
experiências e refletir sobre seu desenvolvimento profissional.
13
Pretende-se, nesta pesquisa, investigar os tipos de reflexão, gerados durante o curso
“Avaliação e produção colaborativa de material didático e temas transversais”, oferecido pelo
Projeto de Extensão Comunitária de Educação Continuada em Línguas Estrangeiras- PECEC-
Les, na cidade de Goiânia, GO. As quatro participantes são todas professoras de língua
inglesa da rede municipal de ensino do Estado de Goiás. É também objetivo deste estudo
verificar como os sujeitos de pesquisa avaliam a relevância de suas reflexões,
colaborativamente produzidas, para seu desenvolvimento profissional.
O interesse maior desta pesquisa é explorar uma perspectiva de formação de
professores que tenha como princípio a reflexão crítica e a aprendizagem colaborativa.
A fim de contextualizar a questão da formação do professor de língua estrangeira este
estudo traça um breve histórico sobre o papel do professor de LE e sobre o processo de
reconhecimento profissional da área. Esta pesquisa e a interpretação dos dados realizaram-se
sob duas diferentes perspectivas teóricas. A primeira delas diz respeito à abordagem reflexiva.
A noção de reflexividade de forma alguma é nova ou una; contudo, atualmente insere-se
como um dos mais relevantes elementos de formação profissional dos professores
(Bartlett,1990; Alarcão, 1996). A segunda perspectiva refere-se à aprendizagem colaborativa,
entendida como um processo essencialmente social, no qual a busca coletiva pelo consenso
constitui-se como elemento principal durante as negociações. Na aprendizagem colaborativa,
a autoridade sai das mãos do professor e passa também para as mãos de cada sujeito da
negociação (Dewey,1975 apud Comeaux, 1991, p.153). A noção de Vygotsky (1996) da zona
de desenvolvimento proximal ilustra, a nosso ver, a força da interação no processo de
desenvolvimento crítico/reflexivo do pensamento e na mudança de hábitos e habilidades.
1.1 Justificativa
Nosso trabalho na formação de professores e na coordenação de grupos de formação
continuada levou-nos a investigar as necessidades apresentadas pelos alunos-professores. Em
ambos os contextos o que nos chamou atenção foi o interesse desses docentes em interagir
com professores e colegas em busca de apoio e principalmente de saber “como” desenvolver
determinadas atividades com seus alunos. Poderíamos dizer que essa busca por receitas e
técnicas de ensino é resquício dos “famosos treinamentos” de professores, comuns até hoje. O
fato é que embora os porquês e o que é ensinado sejam questionamentos muito mais
relevantes, tanto para professores quanto para alunos, a angústia dos primeiros em não saber
14
como agir em sala de aula, diante das dificuldades de cada contexto, os faz supervalorizar
questões técnicas. De acordo com Bartlett (1990, p.205)
Tornar-se crítico implica que como professores tenhamos que transcender
as questões técnicas do ensino e ir além das necessidades de melhorar nossas
técnicas instrucionais. Isso efetivamente significa que temos que ir além do nível
do “como fazer”, que tem um valor utilitário limitado, para questionar “o que” e
“por que”, que levam em consideração técnicas instrucionais e gerenciais não
como um fim em si mesmo, mas como parte de objetivos educacionais mais
amplos.
1
Passar do nível técnico para uma reflexão mais profunda a respeito do processo de
ensino aprendizagem de LE requer o desenvolvimento de propostas que venham atender a
necessidade que, para eles apresenta-se como principal, ou seja “o como fazer” e a partir daí
será possível levá-los a refletir sobre os conceitos de língua e de ensino-aprendizagem,
fundamentais para sua formação.
Nossa proposta de formação continuada tem por objetivo propiciar um espaço em que
os professores possam trocar experiências e refletir sobre os conceitos que estão presentes nas
técnicas, nos temas, nos livros, enfim nos materiais por eles utilizados. Nossa preocupação
advém de nossas observações e dos resultados de pesquisas que apontam que “o livro didático
se constitui numa força central e monolítica dentro do processo geral de aprendizagem de
língua estrangeira na escola pública” (Almeida Filho e Consolo, 1990 apud Almeida Filho et
al, 1991, p.68).
A ação colaborativa de avaliação e produção de material didático pode ser mais uma
forma de aproximar a discussão teoria e prática e propiciar a interação entre professores de
LE, pois, segundo Celani e Collins (2003, p.72), “O isolamento em que se encontram os
professores de inglês, freqüentemente impedidos, por suas condições de trabalho, de
conversar com seus pares e desenvolver trabalhos conjuntos” caracteriza-se como um dos
fatores relacionados aos problemas da área de ensino de LE.
Segundo Marcelo (1998, p.51) “A pesquisa sobre formação de professores tem
crescido quantitativa e qualitativamente”. No Brasil, atualmente, muitas pesquisas têm sido
realizadas com objetivo de rediscutir questões consideradas relevantes para a formação do
1
Becoming critical means that as teachers we have to transcend the technicalities of teaching and think beyond
the need to improve our instructional techniques. This effectively means we have to move away from the “how
to” questions, which have a limited utilitarian value, to the “what” and “why” questions, which regard
instructional and managerial techniques not as ends in themselves but as a part of broader educational
purposes. Bartlett (1990, p.205)
15
professor de línguas estrangeiras. Dentre elas destacam-se as voltadas para os seguintes
temas: crenças (Barcelos,1995), análise de abordagem (Almeida Filho,1999), aspectos
políticos da formação de professores de LE (Leffa,2001), professor pesquisador (Moita
Lopes,2002) e linguagem e reflexão (Magalhães,2004). Apesar da variedade e da pertinência
dos temas abordados por nossos pesquisadores, poucas pesquisas foram realizadas nessa área
tomando como ponto de partida a atividade colaborativa (Comeaux,1991). Por tratar-se de um
tema relativamente novo, pensamos ser importante para a formação de professores o estudo
das contribuições que esse tipo de interação pode trazer. Além disso, pesquisas dessa natureza
podem possibilitar a troca de experiências e contribuir para a criação de programas de
desenvolvimento profissional, em que os professores possam colaborativamente construir
conhecimento e refletir sobre as questões ligadas à educação. As perguntas e os objetivos que
apresentamos a seguir são, portanto, fruto dessas reflexões.
1.2 Objetivos e perguntas de pesquisa
O principal objetivo desta pesquisa foi examinar as reflexões de um grupo de 4
professoras de inglês, em escolas municipais, geradas a partir da avaliação e produção
colaborativa de material didático. Os objetivos específicos são:
Identificar e analisar as reflexões originadas durante o processo de avaliação e
produção colaborativa de material didático.
Descrever a percepção dos professores sobre a relevância de suas reflexões durante o
processo de avaliação e produção colaborativa de material didático, para sua formação
profissional continuada.
As perguntas de pesquisa são:
Qual o tipo de reflexão e os conteúdos abordados durante o processo de avaliação e
produção colaborativa de material didático?
Quais as percepções dos sujeitos de pesquisa, a respeito da relevância do processo de
avaliação e produção colaborativa de material didático, para sua formação profissional
continuada?
16
1.3 Metodologia
Por tratar-se de uma pesquisa que objetiva identificar e analisar as reflexões
produzidas colaborativamente durante o processo de avaliação e produção de material
didático, este estudo caracteriza-se como um estudo de caso, pois segundo Lüdke e André
(1986, p.17), seu “interesse... incide naquilo que ele tem de único, de particular, mesmo que
posteriormente venham a ficar evidentes certas semelhanças com outros casos ou situações”.
Para possibilitar a triangulação e validação dos dados (Seliger & Shohamy,1989;
Lakatos e Marconi,1991; Nunan,1992) os instrumentos utilizados para coletá-los foram:
questionários, gravações em áudio e entrevista. As unidades de análise desta pesquisa são as
reflexões geradas a partir da produção e avaliação colaborativa de material didático, assim
como as percepções das professoras a respeito desse processo no qual estiveram envolvidas.
1.4 Organização deste trabalho
Depois de traçar uma visão geral da pesquisa, este estudo apresenta uma
fundamentação teórica composta de quatro subdivisões: 1) Revisitando o papel do professor
de LE: Uma perspectiva histórica introdutória; 2) Desenvolvimento profissional do professor
de LE; 3) Abordagem reflexiva e 4) Aprendizagem colaborativa.
Em seguida, temos o capítulo intitulado “metodologia” com algumas considerações
sobre a pesquisa qualitativa e estudo de caso, o contexto, os participantes e os instrumentos
utilizados na pesquisa. Além disso, apresentam-se as categorias adotadas para análise dos
dados.
No capítulo seguinte são apresentados os resultados obtidos da análise dos dados: 1)
do momento da avaliação colaborativa do material didático; 2) da produção colaborativa de
materiais; e 3) das entrevistas com as professoras, sujeitos de pesquisa.
Por fim, nas considerações finais são retomadas as perguntas de pesquisa com suas
limitações e contribuições para estudos futuros.
17
CAPÍTULO II
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Este capítulo tem como objetivo apresentar o referencial teórico que se mostrou
pertinente para esta pesquisa. Inicialmente, optamos por expor as raízes históricas do papel do
professor no ensino de LE. Depois, abordamos o desenvolvimento profissional de professores
e a abordagem reflexiva como perspectiva contemporânea na formação dos professores. Por
fim, uma vez que nosso interesse se volta, também, para a aprendizagem colaborativa,
discutiremos os pressupostos fundamentais para a teoria sociocultural.
2.1 Revisitando o papel do professor de LE: uma perspectiva histórica introdutória
Desde as antigas civilizações, os homens demonstram interesse e necessidade de
aprender outros idiomas. Independente das razões políticas, comerciais, sociais, econômicas
ou militares as línguas serviram e servem de mediadoras para quase todas as ações
interacionais do ser humano. Inicialmente, segundo Cestaro (1997) “supõe-se que as primeiras
aprendizagens de uma língua estrangeira aconteceram em meio natural pelo contato direto
com estrangeiro”. Contudo, havia também a preocupação em sistematizar o ensino e a
aprendizagem de algumas línguas estrangeiras, especialmente em situações de conquistas
territoriais, como o caso dos romanos que aprenderam o grego em função do prestígio daquela
civilização.
Paralelamente às mudanças políticas sociais e econômicas do mundo, que
influenciaram e influenciam diretamente as razões para aprendermos uma língua estrangeira
(LE), surgem diferentes tipos de ensino dessas línguas. As concepções de língua e ensino-
aprendizagem seguem, portanto, o curso das transformações ocorridas nas sociedades. E o
papel do professor de LE será definido a partir dessas três concepções.
18
De acordo com Chagas (1967), no século XV, com a invenção e o aperfeiçoamento da
imprensa, novos rumos foram dados ao processo de ensino-aprendizagem das línguas. O
“método natural”, com ênfase na linguagem oral, perde seu lugar para a tradução. O objetivo
era traduzir as obras clássicas de origem greco-romanas. Essa alteração de foco, da linguagem
oral para a escrita, impulsionada, principalmente, por questões econômicas e políticas, era
o início de uma longa trajetória de mudanças na história do ensino-aprendizagem das LE.
Questões relacionadas à formação ou ao papel do professor de LE, certamente não são
preocupações presentes no Renascimento. Os mestres da época eram, em sua maioria, padres
e evangelizadores, ou seja, pessoas ligadas à igreja. E, apesar do declínio do latim e da
ascensão das línguas vernáculas, durante mais de três séculos o ensino das línguas manteve-
se, sem grandes reações, baseado na tradução e na gramática.
Nossa investigação a respeito do papel do professor ao longo da história do ensino de
línguas estrangeiras terá início exatamente a partir do método gramático-tradução, também
conhecido como método tradicional.
Além do método gramático-tradução, nos deteremos também no método direto, no
áudio-lingual e na abordagem comunicativa. Certamente outros métodos e abordagens
também foram importantes, porém para o que nos propusemos neste capítulo, acreditamos
que ao visitarmos esses quatro, teremos feito uma retrospectiva satisfatória, para mostrar as
mudanças na compreensão do que venha a ser o papel do professor de LE.
No método gramático-tradução (MGT), a língua escrita era o objeto de estudo. E para
desvendá-la, era necessário conhecer sua estrutura gramatical, sendo que esse estudo era feito
a partir da leitura e traduções de textos literários e de memorização de vocabulário. O aluno
deveria aprender, de forma consciente, sobre a língua, numa relação de dependência com
aquele que detém o conhecimento, o professor. Dessa forma, o papel do professor nessa
abordagem era predominantemente de provedor de informações, de controlador de ações e de
tudo que acontece na sala de aula. Para ser professor, era preciso saber sobre a língua as
regras gramaticais responder as perguntas dos alunos e corrigir seus erros. O professor era
como um líder, com poderes para controlar todo o processo de aprendizagem, que era visto
como algo a ser transmitido de forma passiva e gradativa (Larsen-Freeman, 1986).
De acordo com Richard e Rodgers (1986), vários fatores contribuíram para a rejeição
do método MGT e defesa do método direto (MD). Dentre eles destacam-se o aumento de
oportunidades de comunicação entre os europeus e a tentativa de estudiosos, tais como
Montaigne e Sauver em desenvolver o ensino da ngua estrangeira a partir de um método
denominado natural, ou seja, baseado na aprendizagem da língua materna. Dessa forma,
19
abriu-se espaço para as reações individuais de especialistas no ensino de línguas em vários
países da Europa. Dentre os principais defensores do método direto estão Harold Palmer
(1917, 1921), Otto Jespersen, Emile de Sauzé (1904) e o americano Maximilian Berlitz, que
em 1878 fundou, nos Estados Unidos, uma escola particular de línguas, com grande sucesso
comercial.
Ao contrário do MGT, o MD previa o uso da língua oral. As instruções em sala de
aula deveriam ser dadas exclusivamente na língua alvo, sem interferência da língua materna.
O aluno era levado a praticar as quatro habilidades (compreensão e produção oral e escrita), a
partir de diálogos situacionais e exercícios de pergunta-resposta, respeitando a seqüência
ouvir, falar, ler e escrever.
Outro fator importante no MD é que a gramática deveria ser ensinada indutivamente.
O aluno primeiro teria contato com situações e fatos da língua que o levariam a sua
sistematização.
O professor, nessa abordagem tinha praticamente o mesmo papel que no MGT. Ele
continuava sendo o centro do processo de ensino-aprendizagem. Era ele quem definia toda a
seqüência da aula mantendo seu controle a partir da interação professor-aluno. A única
diferença dizia respeito ao tipo de conhecimento que ele detinha. No método direto não
bastava saber sobre as regras, era preciso ter também a competência lingüística (oral), pois era
o professor que deveria servir de modelo lingüístico ao aprendiz. Aliás, impedir que o
professor lançasse mão da língua materna e exigir que ele mesmo tivesse uma alta
proficiência na língua estrangeira foi, segundo Richard e Rodgers (1986), um dos fatores que
levou esse método ao declínio, principalmente na escola pública. Além dos professores não
terem condições de sustentar as expectativas dos procedimentos de ensino que essa proposta
trouxe, outras limitações foram apontadas. Para o lingüista aplicado inglês Henry Sweet
(1899) a ausência de uma base metodológica, que sistematizasse questões como pronúncia,
ensino gradativo, partindo do mais fácil para o mais complexo, constituiu o ponto crucial de
sua ineficácia.
No período de 1920 a 1930, tanto nos Estados Unidos quanto na Europa, estudos
continuaram a ser feitos. Nos Estados Unidos, após uma longa investigação a respeito do
ensino de línguas nas mais diferentes instituições de ensino, concluiu-se que a escola
secundária precisava de uma abordagem de leitura, com fins estritamente práticos. Já na
Europa, as atenções estavam voltadas para o desenvolvimento de fundamentações científicas
que sustentassem o ensino oral do inglês como língua estrangeira. Mas os rumos de uma nova
abordagem para o ensino de línguas foram dados por questões militares. Novamente,
20
impulsionados por razões práticas e utilitárias, os Estados Unidos, ao entrarem na Segunda
Guerra Mundial, mobilizaram as universidades de todo o país para a criação de um programa
de ensino de línguas voltado especificamente para a oralidade. Os bons resultados desse
programa e a ascensão do país no cenário mundial levaram os lingüistas a uma pesquisa mais
aprofundada sobre o ensino de inglês como segunda língua / língua estrangeira. O método
áudio-lingual é, portanto, resultado daquele contexto. Suas bases de sustentação partiram,
segundo Richard e Rodgers (1986,p.47) da “combinação de uma teoria lingüística estrutural,
da análise contrastiva, de procedimentos orais e da psicologia behaviorista”.
A teoria da linguagem de base estruturalista, representada por Bloomfield (1933),
trouxe como princípio básico a compreensão de que língua é fala, não escrita. Na prática, esse
princípio resultou em longas exposições a diálogos gravados. E a seqüência ouvir, falar, ler e
escrever era fundamental para a aprendizagem automática da língua. A concepção
behaviorista de aprendizado foi de suma importância para a definição de alguns princípios
desse método. Para os behavioristas a língua é um conjunto de hábitos que se consolidam a
partir da seqüência mecânica de estímulo, resposta e reforço. Por isso, os exercícios traziam
estruturas compartimentadas, e, a partir de repetições, acreditava-se que se chegaria a sua
automatização e conseqüentemente à aprendizagem.
Embora o método áudio-lingual a princípio pareça uma retomada do método direto,
na prática as diferenças na sua sistematização refletem sua proximidade com a lingüística
estrutural e a psicologia behaviorista. Essa diferença, a nosso ver, exerceu uma influência
direta no papel do professor. É certo que, assim como nos métodos anteriores, ele continua
exercendo o papel de controlador do processo de ensino-aprendizagem, mas a forma de
controlar esse processo nunca foi tão cerceada. Nesse método, o livro texto, ou melhor, o
pacote de ensino, constitui uma espécie de camisa de força tanto para o aluno quanto para o
professor, que passou a ser um “servidor de manual escolar” (Santomé. 1998, p.178).
Os mesmos princípios que foram responsáveis pelo sucesso desse método,
paradoxalmente, foram também alvos de críticas decisivas para seu declínio. As concepções
de língua e de aprendizagem sustentadas pelo estruturalismo e behaviorismo, tanto na teoria
quanto na prática, já não serviam mais como paradigmas. Para o humanismo e o
cognitivismo, somos capazes de pensar nosso processo de aprendizagem de maneira a
construir significados e não somente como um mero processo mecânico de repetição.
Assim, as décadas de 1960 e 1970 foram um período de transição e crise. Apesar das
novas concepções trazidas pelos lingüistas gerativo-transformacionais, da negação ao
21
audiolingualismo e do surgimento de vários métodos, um novo paradigma de ensino de língua
era mais do que uma necessidade.
Foi nesse período de crise que a abordagem comunicativa começou a dar seus
primeiros passos. Segundo Richards e Rodgers (1986,p.64) as novas dimensões da linguagem
foram impulsionadas principalmente por lingüistas (John Firth,1957; M.A.K.Halliday,1975),
sóciolingüistas (Dell Hymes,1972; John Gumperz,1972; William Labov,1972) e Filósofos
(John Austin,1962; John Searle,1969). Surgiu então uma nova visão de língua, que analisava
e tratava tal fenómeno não como um conjunto de frases, mas como um conjunto de eventos
comunicativos” (Leffa, 1988, p.224).
De acordo com Richards (1998, p.40), nos anos 1970 a literatura a respeito do ensino
comunicativo de línguas não demonstra ligações com questões empíricas ou com resultados
de pesquisas. Seus argumentos, segundo ele, estavam muito mais voltados para a
compreensão dos princípios da abordagem e suas implicações para o ensino de língua.
Para Finocchiaro e Brumfit (1983, apud Richards 1998, p.40) os princípios gerais da
abordagem comunicativa são:
O significado é primordial.
A contextualização é uma premissa básica.
Aprender uma língua é aprender a se comunicar.
Busca-se a comunicação efetiva.
Tentativas de comunicação devem ser encorajadas desde o início.
A competência comunicativa é o objetivo almejado.
Variação lingüística é um conceito central nas matérias e na metodologia.
A seqüência do ensino é determinada por qualquer deliberação de conteúdo, função ou
significado que mantenha interesse.
A língua é criada pelos indivíduos através de tentativa e erro.
Fluência e uma fala compreensível são os objetivos primeiros; acuidade é observada
no contexto.
A motivação intrínseca virá a partir do interesse no que está sendo comunicado.
Aproximadamente, três décadas se passaram desde que as primeiras idéias sobre o
ensino comunicativo foram divulgadas. Muitas críticas a essa nova abordagem foram
formuladas, principalmente no que diz respeito a sua materialização. Contudo, tais críticas
parecem muito mais preocupadas em fazer a substituição “segura” de um modelo de ensino,
22
do que entender que a grande diferença está exatamente no fato de que essa abordagem o
traz um modelo a ser seguido.
As mudanças anunciadas pela abordagem comunicativa vão muito além de simples
procedimentos pedagógicos. Estes vêm como reflexo da compreensão que se tem da
abordagem. Sobre isso Almeida Filho (2001, p.22) diz que, “é no sentido de visão de mundo
que creio existir o melhor potencial para explicarmos um paradigma de abordagem como a
fomal/gramatical ou a comunicativa/sócio-interativa.”
A visão de mundo preconizada nos princípios da abordagem comunicativa busca a
desconstrução de velhos conceitos para dar lugar a discussões mais voltadas para “a
valorização de fatores afetivos como motivação e atitudes, e a aceitação de conflitos como
lugares de partida para o trabalho de aprender os usos do discurso humano, seja ele em que
língua for” (Almeida Filho, 2002, p.42-3).
Nesse sentido, a redefinição do papel do professor foi de fundamental importância. Na
abordagem comunicativa, ele saiu do centro e passou a ser parte do grupo. Ele “perdeu o
controle” do processo de ensino-aprendizagem e passou a preocupar-se também com o
próprio desenvolvimento profissional, como ator social em constante construção de
conhecimento.
Como pudemos ver, ao longo deste breve histórico, o professor de LE teve seu papel
definido em função do status, das necessidades e interesses que o ensino de línguas (clássicas
ou modernas) ocupou na história da humanidade. Assim como os conceitos de língua, ensinar
e aprender, o papel do professor está ligado a uma visão de mundo que, entre outras coisas,
define a forma como interagimos uns com os outros e com o próprio conhecimento.
2.1.1 Desenvolvimento profissional de professores de LE
Antes de falar sobre as tendências na área de formação e desenvolvimento
profissional, de professores de língua estrangeira, é relevante lembrar que o conceito de
professor de LE como profissional é bem recente.
Na verdade, as bases dessa nova profissão foram criadas com o Movimento da
Reforma, que tinha como objetivo, de acordo com Chagas (1967, p.85), “apresentar
tendências renovadoras do ensino de línguas à época”. Segundo esse autor:
a reintensificação dos estudos pedagógicos e o aperfeiçoamento das
pesquisas relacionadas com a linguagem oral, se como é certo forneciam os
elementos de cunho imediato para a ‘modernização’ do ensino das línguas, não
23
constituiriam, por si sós, fatores bastante poderosos para impor transformações
profundas naquele setor se, para tanto, não concorresse uma causa mediata
geral, ampla e irresistível a Revolução Industrial de que em última análise a
nova Pedagogia e a nascente Fonética eram também decorrência palpáveis.
Pode-se dizer, portanto, que o Movimento da Reforma aconteceu, em grande parte, em
função das novas exigências da sociedade industrial. Uma nova concepção de vida começava
a moldar-se logo na segunda metade do século XIX. E era nesse momento que o ensino de
línguas estrangeiras passava a fazer parte do currículo de muitas escolas européias. A partir
daí, segundo Celani (2001, p.29), a base de uma profissão estava criada... “Pela primeira vez
oferecia-se ao ensino de línguas algo irrecusável – uma abordagem científica”.
Segundo Howatt (1984 apud Celani, 2001, p.29), além das contribuições das pesquisas
realizadas na área, e em especial as desenvolvidas por Harold Palmer
2
(1917, 1921) e Michael
West
3
(1953), outros acontecimentos se faziam necessários para a consolidação da existência
de uma profissão autônoma. Uma dessas condições era a criação de cursos especiais para
professores de língua estrangeira.
Embora o Instituto de Educação da Universidade de Londres, já em 1932, tenha criado
o primeiro curso de Inglês como língua estrangeira, “foi no período do pós-guerra, até
1960, que (...) se deu a consolidação da profissão” (Howatt,1984 apud Celani, 2001, p.30).
Aliás, é preciso considerar o conceito de “profissão” a partir de alguns autores ligados
a formação de professores, sejam eles de língua estrangeira ou não. Por exemplo, Wallace
(1991, p.05) aponta algumas condições para se falar de profissão. Para ele,
para merecer o título de profissão, qualquer ocupação deve ter as
seguintes características: uma base de conhecimento científico; um período
rigoroso de estudo formal; uma noção de serviço público; altos níveis de
conduta profissional; e a habilidade de atuar de maneira competente em tarefas
específicas .
Perrenoud (2002), por sua vez, lembra que a partir do século XIX esse ofício
passou, gradualmente, a ser objeto de uma verdadeira formação, sendo, no primeiro momento,
centrado basicamente no domínio dos saberes a serem ensinados e, mais recentemente,
2
Lingüista aplicado, britânico, um dos líderes responsáveis pelo desenvolvimento de uma base mais cientifica
para uma abordagem de ensino oral de línguas (Richards & Rodgers.1986, p.31).
3
Especialista no ensino de línguas, britânico, desenvolveu as primeiras pesquisas com intuito de apresentar
uma base científica e racional para a escolha do conteúdo vocabular de um curso de línguas (Richards &
Rodgers.1986, p.32).
24
começou-se a conceder certa importância ao domínio teórico e prático dos processos de
ensino-aprendizagem visando a uma formação realmente profissional. Para esse autor (2002,
p.10) “todas as profissões são ofícios, ainda que o inverso não seja verdadeiro”. E no caso do
professor, o processo, por ele chamado de profissionalização, prevê uma mudança de atitude
no que diz respeito à construção da autonomia. Para Perrenoud, “está o cerne do conceito
de profissionalização, o qual incita a formação de pessoas competentes para saber “o que
devem fazer” sem serem limitadas estritamente por regras, diretrizes, modelos, programas,
horários e procedimentos padronizados” (op.cit.,p.11–12).
O conceito de profissão apresentado por Perrenoud (2002), remete-nos a duas outras
condições colocadas por Howatt (1984 apud Celani, 2001) para se caracterizar uma profissão
autônoma, quais sejam: o estabelecimento de instituições responsáveis por representar e
fornecer condições para a comunicação entre os professores e o compromisso com as pesquisa
e sua influência na transformação da sociedade.
No que diz respeito à primeira dessas condições, Celani (2001, p.31) apresenta-nos
algumas datas que demonstram o quão recente são as conquistas voltadas para a consolidação
da profissão do professor de LE:
A Association Internationale de Linguistique Appliquée (AILA), em 1946;
a British Association of Applied Linguistic (BAAL), em 1966 e a American
Association of Applied Linguistics (AAAL), em 1977. No Brasil, começam a
aparecer foros específicos com a criação do primeiro Encontro Nacional de
Professores Universitários de Língua Inglesa (ENPULI), em 1979, com a
criação da Associação de Lingüística Aplicada do Brasil (ALAB), em 1990 e com
a criação de inúmeras associações estaduais de professores de várias línguas
estrangeiras.
Ao discutirmos os conceitos de desenvolvimento profissional do professor de língua
estrangeira é importante também revermos conceitos que são, ao mesmo tempo, anteriores e
concomitantes a essa discussão. Referimo-nos aos conceitos de educação e conhecimento. No
positivismo, a educação estava vinculada à aplicação de técnicas empiricamente testadas e
generalizadas a qualquer contexto. E, nesse sentido, o conhecimento não passava de
resultados de pesquisas científicas, pré-estabelecidos para que o professor pudesse colocar em
prática. A função do professor era somente a de aplicação de modelos pré-determinados. E,
sendo assim, os cursos oferecidos aos professores tinham o compromisso de treiná-los para
que pudessem aplicar com sucesso tais propostas.
25
Numa outra perspectiva, temos a educação reflexiva que objetiva trazer o diálogo
entre questões gerais da sociedade e do processo de ensino-aprendizagem do dia-a-dia da sala
de aula. A visão de educação e conhecimento presente nessa abordagem faz o caminho
contrário daquele que acabamos de ver no positivismo. As práticas sociais, fora e dentro da
escola, são o ponto de partida para a organização do currículo e dos procedimentos
pedagógicos. O professor, então, deve receber uma formação que o leve a refletir sobre suas
práticas e seu reflexo na construção e reformulação dos valores sociais.
Os três grandes modelos de formação profissional apresentados por Wallace (1991) a
nosso ver ilustram bem como as visões de educação e conhecimentos foram historicamente
concretizadas. O primeiro modelo é definido pelo autor como modelo de mestria (craft model)
e tem como princípio básico a imitação. O formando aprende ao imitar as técnicas e ao seguir
os conselhos e instruções de um professor mais velho e experiente na profissão. Segundo
Stones e Morres (1972 apud Wallace 1991), essa era a forma como a prática educativa estava
organizada até mais ou menos o fim da Segunda Guerra Mundial.
O segundo e o terceiro modelo denominados respectivamente de modelo da ciência
aplicada (The applied science model) e modelo reflexivo (The refletive model) são, segundo
Wallace, baseados na teoria do sociólogo americano Donald A. Shön (1987), sendo que o
primeiro é denominado por Shön (1987) como “modelo da racionalidade técnica”. Sua
principal característica é a aplicação, por parte dos profissionais, de pesquisas e resultados de
experimentos, desenvolvidos por peritos das mais diversas áreas, para a resolução de
problemas sobre o ensino. Embora muitas críticas já tenham sido formuladas a esse modelo,
Wallace (1991) afirma que ele ainda é o modelo que mais prevalece nos programas de
formação profissional.
O ultimo modelo, o reflexivo, foi desenvolvido por Wallace (1991) e, segundo ele, é
um modelo alternativo para a formação de professores, pois parte da idéia de que uma
formação profissional estruturada deveria incluir dois tipos de conhecimento: o conhecimento
recebido que inclui os construtos mentais dos formandos, adquiridos a respeito dos elementos
científicos necessários nas pesquisas e o conhecimento experiencial, que se caracteriza pelo
conhecimento desenvolvido na e pela ação.
Assim, Wallace (1991) propôs um modelo que levasse em consideração tanto a
experiência quanto as bases científicas de uma profissão.
Vários autores têm se dedicado ao tema da reflexão. Dentre os pioneiros estão J.
Dewey (1959) e D. Schön (1987). Trataremos, a seguir, do pensamento desses e de outros
26
autores a respeito dessa abordagem, que traz consigo o germe da contemporaneidade no que
se refere à formação do professor de LE.
2.1.2 Abordagem reflexiva
Ao associarmos o termo reflexão às discussões mais atuais da educação, não estamos,
com isso, dizendo que essa temática seja nova, ou fruto do momento em que vivemos. Talvez
o que tenha tornado esse termo tão corriqueiro nos dias de hoje foi o fato de ele ser reflexo
das imposições do atual modelo sócio-econômico.
Na verdade, na década de 1930, o filósofo americano John Dewey (1859–1952)
influenciava o movimento pedagógico do início do século, com sua definição sobre as
diferentes formas de pensar. Para Dewey (1959, p.13), “o chamado pensamento reflexivo é a
melhor maneira de pensar. É uma “espécie de pensamento que consiste em examinar
mentalmente o assunto e dar-lhe consideração séria e consecutiva”. O ato de pensar,
característica exclusiva do ser humano, é considerado por Dewey (1959) como ação rotineira
e descomprometida com um exame mais profundo das questões de interesse social e
individual. Segundo esse filósofo, ao pensarmos, sem o comprometimento de um exame mais
minucioso, estamos sujeitos a reproduzir crenças e a nos submeter às ideologias dominantes.
Para ele (op.cit., p.18), “o pensamento reflexivo faz um ativo, prolongado e cuidadoso
exame de toda crença ou espécie hipotética de conhecimento, exame efetuado à luz dos
argumentos que apóiam e das conclusões a que chega.”
Dewey (1959) faz uma diferenciação entre atitudes que se voltam para a formulação
de “juízos com base em mero costume, tradição, preconceito e atitudes”. De acordo com esse
autor (op.cit., p.42), ao formularmos “juízos com base em mero costume, tradição e
preconceito”, estamos evitando o esforço de pensar reflexivamente. Por isso, segundo ele,
algumas atitudes morais são essenciais para o desenvolvimento do ato de pensar de maneira
reflexiva: a abertura de espírito, a sinceridade e a responsabilidade. A abertura de espírito
refere-se à capacidade de reconhecer a existência de diferentes posicionamentos diante de
uma questão. A sinceridade, é o real envolvimento em uma determinada causa ou objeto,
sendo que esse envolvimento ultrapassa o nível das expectativas externas e passa a fazer parte
de um compromisso pessoal. A responsabilidade, embora concebida como traço moral mais
do que como recurso intelectual, é uma atitude de compromisso com a significação da ação
educativa.
27
Ao diferenciar as formas de pensar e ao caracterizar o pensar reflexivo como
fundamental para o contexto educacional Dewey (1959) chama atenção, naquela época,
para a importância da análise de nossas crenças e de suas conseqüências em nossa ação.
Segundo ele, a reflexão nos leva a ter consciência do que fazemos quando agimos.
Outro autor que tem influenciado bastante a área de formação de professores é Donald
Shön (1987). Contudo, segundo Alarcão (1996, p.11)
“os interesses de D. Shön não se têm centrado sobre a formação de
professores... seus interesses giram à volta de três temas muito atuais: por um
lado o conceito de profissional que tem de ser eficiente a quem se pedem contas;
por outro lado, o da relação entre a teoria e a prática; e finalmente, a temática
da reflexão e da educação para a reflexão”.
Embora suas preocupações não tenham sido voltadas especificamente para a formação
de professores, as questões que ele aborda são, sem dúvida, de fundamental importância para
essa área. Ao discutir a formação de profissionais da arquitetura, música e psicanálise, Shön
(1987) observa detalhadamente os passos dos professores formadores dessas áreas, e retira daí
suas considerações e críticas ao paradigma da educação profissionalizante, que enfatiza a
aprendizagem de técnicas. Para Shön (1987) além do conhecimento e da técnica, os
professores formadores devem ter sensibilidade para chamar atenção dos formandos para o
fato de que situações novas, ambíguas e confusas podem surgir e quase sempre teremos que
recorrer a algo mais do que à simples aplicação das técnicas e teorias para resolvermos. Ao
propor uma epistemologia da prática, Shön (1987) defende situações práticas como
componente para a formação do futuro profissional. É, portanto, a partir dessas conclusões
que surgem em sua obra a noção da prática reflexiva, que é por ele explicada a partir dos
seguintes conceitos: conhecimento na ação (knowing–in–action), reflexão na ação (refletion–
in–action), reflexão sobre a ação (refletion–on– action), e reflexão sobre a reflexão na ação
(refletion on refletion-in–action).
O conhecimento na ão é o saber que os profissionais demonstram ter na realização
de uma ação. A reflexão na ação é o ato de reformularmos nossa ação no momento em que ela
se realiza. A reflexão sobre a ação, é o ato de revermos mutuamente uma ação passada com o
objetivo de avaliá-la. A reflexão sobre a reflexão na ação tem como objetivo levar o
profissional a um engajamento com as ações futuras.
28
Embora o pensamento de Shön (1987) tenha sido fundamental para a questão da
educação reflexiva, parece-nos relevante analisar seus desdobramentos na visão de educação e
formação profissional e nas pesquisas realizadas nessa área.
Com o objetivo de esclarecer as diferentes concepções da prática reflexiva,
Zeichner(1994) aponta algumas das diferentes noções de reflexão presentes na literatura sobre
formação de professores:
reflexão antes, durante e depois da ação
reflexão sobre o ensino
reflexão sobre as condições sociais que influenciam o ensino
reflexão como atividade privada
reflexão como prática social
Esse mesmo autor identifica, com base em suas análises dos tradições de reforma no
século XX, nos Estados Unidos, cinco variedades da prática do ensino reflexivo: 1) Uma
versão acadêmica, que enfatiza a reflexão sobre as questões relativas às disciplinas e sua
compreensão por parte dos alunos; 2) Uma versão de eficiência social, que busca a aplicação
de estratégias de ensino sugeridas por pesquisadores; 3) Uma versão desenvolvimentista, que
prioriza o ensino voltado para os interesses dos alunos; 4) Uma versão sócio-construtivista,
que destaca a importância da reflexão sobre o contexto social em sala de aula, que venha
contribuir com a igualdade e a justiça social e 5) Uma versão genérica, que defende uma
reflexão em geral, sem muitas definições sobre em que a reflexão deveria se focalizar.
Para esse autor, apesar das diferentes prioridades de cada tradição de ensino reflexivo,
elas (as tradições) não se excluem mutuamente, mas separadamente não apresentam uma base
moral suficiente para a educação. Segundo ele, um bom ensino e uma boa formação de
professores precisa atender a todos os elementos focalizados nas várias tradições.
No Brasil, o tema da formação de professores já fazia parte do contexto educacional.
Contudo, Pimenta (2002) nos chama atenção para a influência, no início dos anos 1990, de
pesquisas na área de formação de professores, a partir das contribuições de Shön (1987), com
a difusão do livro Os professores e sua formação, de organização do português Antonio
Nóvoa (1992). Segundo a autora, a rápida propagação dessas pesquisas e experiências deu-se
em função de nos encontrarmos envolvidos com questões profundamente inquietantes como:
“a valorização da escola e de seus profissionais nos processos de democratização da sociedade
29
brasileira; a contribuição do saber escolar na formação da cidadania; ... o trabalho coletivo; as
condições de trabalho e de estudo (de reflexão), de planejamento...” (Pimenta, 2002, p.35)
Em seu artigo “Professor reflexivo: construindo uma crítica” Pimenta (2002) nos
apresenta uma análise crítica do conceito de professor reflexivo. Para essa autora, a fertilidade
dessa temática tem se estabelecido como uma tendência nas pesquisas em educação. Por isso,
Pimenta (2002) nos adverte para os riscos de se considerar a perspectiva da reflexão como
suficiente para a resolução dos problemas da prática. Em Zeichner e Liston (1993), ela
identifica a crítica à reflexão desenvolvida por Shön (1987). Conforme esses autores, no
entender de Pimenta (2002), seu enfoque (o de Shön) é reducionista e limitante, pois se aplica
a profissionais individuais, ignorando o contexto institucional.
Também em Peréz Gómez (1992), Pimenta (2002) encontra argumentos que
reafirmam a preocupação em transformar a prática dos professores a partir de uma perspectiva
crítica, “evitando que a ênfase no professor não venha a operar, estranhamente a separação de
sua prática do contexto organizacional no qual ocorre” (2002, p.24). Por fim, Contreras
(2002) destaca-se no ponto de vista de Pimenta (2002), por apresentar críticas e possibilidades
a epistemologia da prática.
Dentre as preocupações que a autora apresenta, a respeito da fertilidade da abordagem
reflexiva no Brasil, notamos que o cerne de sua crítica encontra-se no que ela chama de
“apropriação generalizada da perspectiva da reflexão” (idem, p.45). Há, segundo ela, uma
tendência em adotarmos a perspectiva reflexiva sem um trabalho de contextualização que, por
sua vez, leva á superficialidade do tema. Os resultados dessa perspectiva podem ser
identificados, conforme a autora, na tecnização da reflexão que se configura a partir do
“individualismo da reflexão, da ausência de critérios externos potenciadores de uma reflexão
crítica, da excessiva (e mesmo exclusiva) ênfase nas práticas, da inviabilidade da investigação
nos espaços escolares e da restrição desta nesse contexto” (Pimenta 2002,p.43).
Ao abordarmos a questão da reflexão em nossa pesquisa, partilhamos com Pimenta
(2002) as mesmas preocupações. Por isso, nosso trabalho toma como referencial as seguintes
possibilidades, apontadas por ela, em direção à formação reflexiva crítica do professor.
A reflexão entendida como prática social e não limitada ao indivíduo.
A prática como objeto de análise e elemento imprescindível para
(re)significação
4
das teorias .
4
Aproveito aqui o sentido que deu Baktin (1986, p.121) a esse termo “... a sobreposição de significados sobre
significados, voz sobre voz, fortalecendo através da união (mas não identificação), a combinação de muitas
vozes (uma galeria de vozes) que aumentam a compreensão.
30
A escola como espaço de pesquisa, realizada em trabalho colaborativo
entre pesquisadores das universidades e profissionais da escola.
A compreensão dos professores sobre sua condição de profissionais
comprometidos com o coletivo.
A busca por uma política de desenvolvimento profissional de professores,
que visa a emancipação e a valorização de seus saberes e a construção de
um espaço escolar que reflete, pesquisa e mantém em constante análise
suas práticas.
Na leitura que fizemos de Pimenta (2002) e Contreras (2002) notamos que entre
esses e outros autores da educação uma forte preocupação em considerar o fato de que “o
homem é um ser de raízes espaço–temporais” Freire (1983, p.61) e por isso nas palavras de
Paulo Freire (1983, p.61) “nenhuma ação educativa pode prescindir de uma reflexão sobre o
homem e de uma análise sobre suas condições cultuais. Não educação fora das sociedades
e não há homens isolados”.
A questão do isolamento profissional nos tem chamado bastante a atenção, pois apesar
de a globalização ter democratizado o acesso à informação e a comunicação ter se tornado
mais fácil com as novas tecnologias, segundo o que afirma Pessoa (2002, p.42)
Pode-se dizer que o trabalho de professores é muito solitário, não por
causa da própria rotina escolar, mais também pela falta de tempo para se
envolverem em atividades de desenvolvimento profissional. Esse quadro se
agrava nas escolas públicas, e especialmente na área de língua estrangeira,
pois, na maioria dessas escolas, apenas um professor para essa disciplina, e
esse professor, para garantir uma sobrevivência mínima, trabalha dois ou três
turnos. Isso sem contar o fato de que os coordenadores pedagógicos das escolas
raramente têm algum conhecimento sobre ensino de língua estrangeira.
Nota-se que não uma política de formação continuada que propicie a esses
professores um espaço para que possam interagir e de forma colaborativa promover seu
crescimento profissional e intelectual. Segundo Sarason (1982 apud Pessoa, 2002, p.42) “O
professor está sozinho com seus problemas e dilemas, contando, na maioria dos casos, apenas
com os próprios recursos e prescindindo de veículos interpessoais disponíveis para fins de
estímulo, mudança ou controle”. Por isso, consideramos de suma importância a discussão
sobre a aprendizagem colaborativa, pois, assim como Paulo Freire (1983), acreditamos que
31
não como sairmos da condição de massificados e consumidores de teoria senão a partir da
reflexão sobre nossa própria condição. E esse nível de reflexão a nosso ver é mais facilmente
desenvolvido quando o fazemos de maneira colaborativa. Temos então a seguir algumas
considerações sobre a aprendizagem colaborativa.
2.1.3 Aprendizagem colaborativa
A interação caracteriza-se como uma ação comum tanto ao seres humanos, como aos
animais. O que torna o homem mais evoluído é sua capacidade de utilizar a linguagem (verbal
e não verbal) para comunicar-se e a capacidade de utilizar instrumentos com um propósito.
Segundo Vygotsky (1996), a linguagem é uma ferramenta psicológica que se constitui nas e
pelas práticas sociais. O sistema cognitivo de um indivíduo é, para ele, resultado da
comunicação em grupos sociais. Vygotsky (1996) contribuiu significativamente para a
epistemologia socioconstrutivista. A presença dessa visão pode ser encontrada também no
trabalho do filósofo e educador americano John Dewey (1959). Para este, a aprendizagem
ocorre quando os indivíduos estão inseridos em uma comunidade. Os aprendizes não
aprendem se estiverem isolados. As práticas discursivas são, de acordo com Vygotsky (1996)
e Dewey (1959), ferramentas fundamentais para o desenvolvimento do pensamento e da
linguagem.
A concepção de formação continuada de professores, que buscamos como modelo,
enfatiza uma interação dialógica em que professores formadores e professores alunos possam
juntos construir suas interpretações. Segundo Celani (2003, p.76) “o que os programas estão
procurando é um modelo interacional no qual todos os participantes estejam envolvidos na
construção de explicações e significados para as possíveis contradições entre suas intenções e
suas ações”.
A ação colaborativa é, a nosso ver, o modelo interacional que favorece a
transformação do contexto educacional, pois sua dinâmica tanto pode levar professores
quanto alunos a interpretar suas ações considerando o contexto em que estão inseridos. A
formação crítico-reflexiva do professor passa por uma proposta de reflexão colaborativamente
sustentada, ou seja, em que os participantes tenham oportunidades de apresentar e negociar
seus posicionamentos. Para Celani (2003, p.78), “os conceitos de colaboração e reflexão
envolvem uma visão de co-autoria e co-construção que envolverá necessariamente a
reconstrução dos conceitos de ensino-aprendizagem”.
32
De fato, se observarmos os conceitos utilizados para falar sobre aprendizagem, ao
longo da história do ensino de línguas estrangeiras, perceberemos que dependendo da
corrente teórica/filosófica, eles se assemelham ou se diferenciam quando relacionados a
alunos e professores. Por exemplo, durante muito tempo a idéia de “treinamento” esteve
presente tanto na aprendizagem do aluno quanto na do professor. Em contrapartida, a própria
divisão demarcada nos conceitos ensino-aprendizagem - “o professor ensina o aluno aprende
- parece delimitar campos diferentes, que não se misturam ou se alternam. Atualmente, essa
diferenciação parece diminuir à medida que o processo de formação continuada de
professores passa a ser visto “... não como um processo de transmissão de conhecimentos
científicos efetivados pelo formador-pesquisador, mas como um local de reflexão sobre as
práticas do professor...” (Machado, 2004, p.225). Assim, ver o professor como um ser em
constante construção de conhecimento torna termos como construção de conhecimento,
aprendizagem colaborativa, reflexão e identidade adequados para ambos, alunos e
professores.
O avanço percebido na fala de Machado (2004) e em muitos outros autores que
desenvolvem pesquisas nessa linha faz parte de uma visão de formação de professor como
espaço para construção de conhecimento. E, nessa perspectiva, a atividade colaborativa tem
um papel fundamental. De acordo com Vygotsky (1996), o conhecimento é produzido a partir
da co-participação social dos indivíduos na resolução de uma tarefa, e é mediado
principalmente pela linguagem. Ao trabalhar na avaliação e produção colaborativa de material
didático, os professores participantes e formadores-pesquisadores estão construindo
conjuntamente conhecimentos, pois, à medida que refletem colaborativamente sobre suas
práticas, analisam criticamente seus posicionamentos e conceitos sobre língua e ensino-
aprendizagem de uma LE.
Alguns autores como Horwitz et al (1997), Bruffee (1999) e Figueiredo (2003)
optaram por usar os termos “aprendizagem colaborativa” e “aprendizagem cooperativa”
intercambiavelmente. Em nosso trabalho, norteamos a proposta de formação continuada de
professores a partir do entendimento de Oxford (1997, p.443), sobre aprendizagem
colaborativa.
A aprendizagem colaborativa tem uma base filosófica sócio-construtivista
que vê a aprendizagem como construção de conhecimento em um contexto social
33
e que, portanto, leva à aculturação dos indivíduos dentro de uma comunidade de
aprendizagem (tradução nossa).
5
O conceito de aprendizagem cooperativa, para Oxford (1997), refere-se à aplicação de
um conjunto de técnicas em sala de aula que podem levar os aprendizes a uma
interdependência que os conduza a um desenvolvimento cognitivo e social. Assim, enquanto a
cooperação apresenta-se como um modelo mais estruturado e prescritivo a colaboração, por
sua vez, têm suas raízes na filosofia sócio-construtivista e o conhecimento como uma
construção resultante do diálogo reflexivo.
Também Pessoa (2002), ao apresentar as diferenças entre os conceitos de cooperação e
colaboração, aponta a colaboração como uma ação com muito mais chances de contribuir com
o desenvolvimento profissional de professores, tendo em vista que a atitude de colaboração
pode surgir naturalmente em situações de reflexão interativa de professores.
5
Collaborative learning has a ‘social constructivist’ philosophical base, which views learning as construction of
knowledge within a social context and which therefore encourages acculturation of individuals into a learning
community. Oxford (1997, p.443)
34
CAPÍTULO III
METODOLOGIA DA PESQUISA
Neste capítulo, discutimos, inicialmente, as características da metodologia adotada
nesta pesquisa. Em seguida, descrevemos o contexto pesquisado, fornecendo um perfil dos
participantes e, por último, apresentamos os instrumentos e procedimentos de pesquisa
utilizados.
3.1 Estudo de caso
Conforme foi mencionado na introdução, o objetivo principal deste estudo é examinar
as reflexões de um grupo de professores de Inglês geradas a partir da avaliação e produção
colaborativa de material didático. A seleção prévia do foco desta pesquisa e o número
reduzido de participantes nos permitem apontar o estudo de caso como metodologia
adequada. Segundo Nunan, (1992), o estudo de caso assemelha-se à etnografia na sua base
filosófica, metodológica e por estudar os fenômenos em seu contexto. O que o distingue da
etnografia, para esse autor, é o fato de que o estudo de caso é geralmente mais limitado em
seu escopo, e não precisa necessariamente estar preocupado com o contexto cultural do
fenômeno sob investigação(Nunan, 1992).
“Os estudos de caso visam à descoberta... Essa característica se fundamenta no
pressuposto de que o conhecimento não é algo acabado, mas uma construção que se faz e
refaz constantemente” (Lüdke & André 1986, p.18). Por isso, embora a escolha do processo
de avaliação e produção de material didático tenha sido previamente definida, como foco
desta pesquisa, não sabíamos quais reflexões poderiam surgir como resultado desse processo
colaborativo e nem qual a importância que esse tipo de interação representaria para a
formação continuada de professores.
35
O estudo de caso, apesar de sua natureza limitada e específica, tem a vantagem de
dispor de diversos instrumentos de coleta de dados, podendo também “servir a pesquisas com
diferentes propósitos” (Gil, 1999, p.73). Dentre as vantagens sugeridas por Adelman et al
(1976 apud Nunan, 1992), destacamos a de que o estudo de caso pode representar uma
multiplicidade de pontos de vista e oferecer suporte para interpretações alternativas.
Assim como a pesquisa do tipo etnográfico, o estudo de caso vem ganhando crescente
aceitação na área de educação, principalmente pelo seu potencial dentro de um paradigma de
pesquisa qualitativa.
Para Nunan (1992), se por um lado a distinção entre as abordagens qualitativas e
quantitativas possa ser simplista, por outro elas os reais, pois representam diferenças na sua
base filosófica. Enquanto a pesquisa quantitativa parte de uma noção positivista que a
pesquisa com a função de mostrar os fatos e a verdade, independente do pesquisador, a
qualitativa questiona a noção de uma realidade objetiva.
De acordo com Erickson (1990), há uma gama de teorias e métodos nas abordagens
voltadas para a pesquisa na área de educação que, apesar de ligeiramente diferentes,
apresentam fortes semelhanças umas com as outras. Mas, o autor argumenta que o que
determina uma pesquisa é muito mais a intenção e o conteúdo do que os procedimentos de
coleta de dados.
A pesquisa qualitativa, segundo Bogdan e Biklen (1982 apud André e Ludke, 1986, p.
13), “envolve a obtenção de dados descritivos, coletados no contato direto do pesquisador
com a situação estudada, enfatiza mais o processo do que o produto e se preocupa em relatar a
perspectiva dos participantes”. Nossa intenção, neste estudo, é discutir o conteúdo das
reflexões produzidas durante o processo de avaliação e produção colaborativa de material
didático, assim como saber qual a importância desse processo para o desenvolvimento das
participantes. Compartilhamos com Erickson (1990) a idéia de que, enquanto participantes
observadores aprendemos mais sobre o mundo e conseqüentemente sobre nós mesmos.
3.2 Contexto da pesquisa
A pesquisa foi realizada com um grupo de quatro professores da rede municipal de
ensino, participantes do Projeto de Extensão Comunitária de Educação Continuada em
Línguas Estrangeiras- PECEC-LEs.
36
O PECEC-LEs visa trabalhar com docentes de língua estrangeira na educação básica,
assim como estagiários e monitores de LE, com intuito de viabilizar a formação continuada
dos mesmos, considerando suas realidades e necessidades.
Esse projeto é promovido gratuitamente pela Universidade Católica de Goiás, em
conjunto com outras instituições voltadas para o ensino-aprendizagem de LE. Os cursos
acontecem no prédio onde funciona o centro de línguas da Universidade Católica de Goiás em
Goiânia com variações de dias e horários ao longo da semana.
Os trabalhos realizados são desenvolvidos por meio de módulos semanais, presenciais
e a distância, objetivando a prática reflexiva e interativa, o aprimoramento da fluência oral e
escrita em línguas, a preparação de projetos, entre outros.
A proposta do curso que oferecemos é de avaliação e produção de material didático e
traz como referencial teórico os Parâmetros Curriculares Nacionais enfocando principalmente
os temas transversais.
A escolha deste contexto deu-se a partir de três fatores. O primeiro deles é o fato de
ser uma iniciativa que conta com a colaboração de profissionais de várias instituições, o que o
caracteriza como um projeto essencialmente colaborativo. Em segundo lugar, consideramos
importante um projeto que abre espaço para a formação continuada do professor de LE. E,
por último, o fato de que os professores que procuram esse projeto o fazem por livre e
espontânea vontade, que não nenhuma imposição por parte da direção das escolas ou
secretaria de educação.
3.3 Parâmetros Curriculares Nacionais
A discussão dos temas transversais no curso que oferecemos no PECEC-LEs e em
nossa pesquisa justifica-se por tratar-se de um documento relativamente recente e que, apesar
dos esforços do Ministério da Educação e Cultura (MEC) para divulgá-lo e torná-lo acessível
a todos os professores, ainda encontramos docentes que pouco ou nada sabem a seu respeito.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) foram lançados pelo MEC no ano 1998,
com o objetivo de ser um ponto de apoio teórico-metodológico para a educação brasileira.
De acordo com os PCNs de língua estrangeira do ensino fundamental
“Este documento procura ser uma fonte de referência para discussões e
tomada de posição sobre ensinar e aprender Línguas Estrangeiras. Portanto,
não tem um caráter dogmático, pois isso impossibilitaria as adaptações exigidas
37
por condições diversas e inviabilizaria o desenvolvimento de uma prática
reflexiva.” (PCN,1998, p.19)
A concepção de língua presente nos PCNs assume a língua como um
instrumento/mecanismo de comunicação construído historicamente, fixado culturalmente,
sendo que esse instrumento é ideológico e dialógico. A língua se realiza na interação com o
outro e é por meio dela que o sujeito se constitui como tal. Assim, aprender uma ngua é
entrar em contato com fatores sociais que caracterizam o modus vivendi de uma determinada
comunidade. Então, ao aprendermos LE constatamos outras construções históricas,
ideológicas, culturais e dialógicas que nos propiciam possibilidades de alargar nossos
conhecimentos sobre o mundo em que vivemos.
Segundo os PCNs (1998), o ensino-aprendizagem de LE é função da escola e direito
do cidadão. Porém, para fazer valer esse direito, precisamos buscar implementar o ensino-
aprendizagem na área de LE de modo que o aluno perceba que sua formação plena (isto é, a
formação que contempla as condições humanas, físicas, mentais, afetivas, estéticas e lúdicas)
passa também pelos conhecimentos obtidos nesse campo.
Os PCNs propõem esse tipo de educação que perpassa o desenvolvimento intelectual e
abrange, também, a dignidade da pessoa humana, a igualdade de direitos, a participação e a
co-responsabilidade pela vida social e que contra valores e práticas sociais, que de alguma
forma contradigam ou se oponham aos direitos do cidadão. Para tanto, foram escolhidos os
chamados “Temas Transversais” com a finalidade de mostrar, analisar, debater, refletir e
criticar questões extremamente presentes no cotidiano da sociedade. Entendemos que a
inclusão desses temas traz para a sala de aula conhecimentos e discussões, nas mais diversas
disciplinas, que auxiliem o aluno a se inserir no mundo, buscando sua autonomia e não
somente vivendo à margem deste, de forma alienada. Os Temas Transversais propostos para
serem trabalhados na escola são: Ética, Meio-Ambiente, Pluralidade Cultural, Saúde,
Educação Sexual, Trabalho e Consumo. Espera-se que, através desses temas, seja possível
abranger as relações humanas nas variadas dimensões da vida social de forma ética, didática e
colaborativa.
38
3.4 Os Participantes
Por tratar-se de uma pesquisa de observação participativa, ou seja, a pesquisadora atua
como supervisora dos trabalhos, além da descrição das professoras participantes, segue
também a descrição das duas supervisoras, sendo uma delas a pesquisadora.
Para resguardar suas identidades, optamos por identificá-las como S1 (supervisora 1),
S2 (supervisora 2), P1 (professora 1), P2 (professora 2), P3 (professora 3) e P4 (professora 4).
3.4.1 As Supervisoras
S1 tem 32 anos, concluiu sua graduação na Universidade Federal de Goiás no ano
1997. Fez especialização em Língua Inglesa e atualmente é mestranda do programa de
Lingüística Aplicada na Universidade de Brasília. Desde sua graduação atua como
coordenadora de um centro de línguas. Nos anos 2001, 2003 e 2004 prestou serviço na
Universidade Estadual de Goiás como professora no curso de Letras. Atualmente, além da
coordenação do centro de línguas, dedica-se a um trabalho voluntário no PECEC-LEs.
S2 tem 46 anos, concluiu sua graduação em 1998. Fez especialização em Língua
Inglesa e atualmente é mestranda no programa de Lingüística Aplicada na Universidade de
Brasília. É coordenadora de um centro de línguas, ministrou aulas no curso de Letras de
uma universidade pública e desde março de 2004 ministra cursos para professores como
voluntária em um projeto de extensão.
3.4.2 As Professoras
P1 tem 48 anos, concluiu sua graduação em 1980 em uma universidade pública.
Trabalha na escola municipal desde 1982 e atualmente ministra aulas no período matutino
com ciclo 2 e no noturno coordena o programa de escolarização de jovens e adultos também
no município. É professora aposentada pelo ensino particular.
P2 tem 51 anos, concluiu sua graduação em uma universidade pública em 1981. Logo
em seguida (1982) ingressou como professora na escola municipal. Atualmente, ministra
aulas no período matutino no ciclo 2 e noturno com escolarização de jovens e adultos.
39
P3 tem 28 anos, graduou-se em 1998 em uma universidade particular e é professora na
rede municipal de ensino desde 2001. Atualmente trabalha no turno matutino com ciclo dois
6
e no noturno de à série. Já atuou também como professora no curso de Letras de uma
universidade pública.
P4 tem 35 anos, concluiu sua graduação em 1993 em uma universidade pública.
Trabalha como professora na rede municipal desde 1994. Atualmente, atua no período
vespertino, no ciclo 3. Há dois anos trabalha também na rede particular no período matutino
cm 8ª séries.
3.5 Procedimentos e instrumentos utilizados na pesquisa
O curso “Avaliação e produção colaborativa de material didático e temas transversais”
teve início no dia 13 de agosto de 2004. Somente no terceiro encontro conversamos com as
professoras a respeito da pesquisa, pois nem todas as que iniciaram continuaram no curso até
o final do semestre. Apesar do curso ter sido oferecido no semestre anterior, a demanda era
imprevisível, podendo contar com um máximo de 30 alunos. Nesse semestre tivemos apenas
4 participantes. Embora o número seja pequeno se comparado à quantidade de vagas, as
participantes mostraram-se extremamente comprometidas, inclusive no quesito assiduidade.
O curso que oferecemos, intitulado Avaliação e Produção de Material Didático e
Temas Transversais, foi organizado em dez encontros semestrais, de duas horas cada. Nos
cinco primeiros encontros levantamos as necessidades e expectativas das professoras
participantes, discutimos suas concepções de língua, de ensinar e de aprender uma língua
estrangeira e fizemos leituras e discussões sobre a proposta dos PCNs, principalmente no que
diz respeito aos temas transversais. Nos encontros seguintes, iniciamos o trabalho de análise
6
“Os ciclos de formação são uma forma de representar prioridade de uma educação progressiva, sem retenção,
que busca ir daquilo que o educando/a já conhece para o sistematizado historicamente, e depois voltar deste para
o já conhecido, só que agora redimencionado significativamente a vida deles”.(Secretaria Municipal de
Educação de Goiânia-GO)
Diferentemente da orientação contida nos Parametros Curriculares Nacionais, que faz opção por quatro ciclos de
dois anos cada um, a Rede Municipal de Educação de Goiânia, fez opção por três ciclos de três anos cada um
deles. Estando organizado de seguinte forma:
Fase de desenvolvimento Idade Ciclo
Infância 6, 7 e 8 anos e 11mêses I
Pré-adolescência 9, 10 e 11 anos e 11 mêses II
Adolescência 12,13 e 14 anos III
40
de livros didáticos, dando preferência àqueles utilizados pelas professoras e, na seqüência,
partimos para a produção de projetos temáticos.
Para a análise dos livros didáticos, buscamos saber, primeiramente, os critérios que as
professoras consideravam importantes analisar. Então, apresentamos um modelo de análise
baseado nas categorias adotadas por Almeida Filho et al (1991, p.68). São elas:
(1) História da publicação da série, (2) Os aspectos ideológicos salientes
nos temas e tópicos das amostras da língua-alvo, (3) Correção lingüística e a
propriedade comunicativa das amostras e exercícios e, (4) Os conceitos de
linguagem, de aprender, e de ensinar línguas contidos neste material.
Com base nessas categorias, esperava-se que as professoras analisassem o livro
didático de forma crítica, pois, segundo Pereira (2000, p.7), “no geral os conteúdos dos livros
didáticos não são criticados, mas aceitos como verdade inquestionável.”
A proposta de iniciar o curso com discussão teórica não significa que a teoria em
questão devesse ser prescritiva. A intenção foi construir, juntamente com as professoras
participantes, uma visão crítica das concepções presentes nos PCNs (1998), observando sua
relevância no contexto de ensino.
3.5.1 Gravação em áudio
Após a primeira parte do curso que se constituiu basicamente de leituras e discussões
teóricas, iniciamos o trabalho de avaliação colaborativa de material didático. Esse foi o
momento que escolhemos para iniciar as gravações em áudio. Além de levantar os critérios
apontados pelas professoras ao avaliar o material didático, partimos também das categorias de
análise apontados por Almeida Filho et al (1991). Ao trazer as categorias para auxiliar as
professoras no processo de avaliação, acreditamos que fornecemos subsídios para as
reflexões, o que a nosso ver não interfere no objetivo principal da pesquisa.
Por tratar-se de um grupo pequeno e homogêneo, em termos de realidade de ensino,
não separamos em grupos menores. As discussões foram realizadas com as quatro professoras
e as duas supervisoras. Essa escolha nos trouxe dificuldades no momento da transcrição, pois,
embora tenhamos chamado a atenção das professoras para a necessidade de falarmos sempre
uma por vez, no embalo das discussões isso foi esquecido tornando difícil e às vezes quase
impossível compreendermos trechos das gravações. Felizmente, esse fato, apesar de dificultar
nosso trabalho, não impediu que transcrevêssemos a maior parte das falas.
41
Nossa expectativa, de acordo com a programação que fizemos para o curso, era de
dois encontros para avaliação, dois para a produção e no fechamento do curso faríamos as
entrevistas. Novamente, questões que fugiram ao nosso controle, tais como seminários
oferecidos a todos os participantes do PECEC-LEs, nos fizeram rever a programação.
Tivemos assim, um encontro para avaliação, um para produção e no último encontro
realizamos as entrevistas individuais.
As gravações do processo de produção de material didático foram realizadas
novamente com todas as participantes no mesmo grupo. Nessa ocasião tentamos montar dois
grupos, mas as participantes pediram para formarmos um grupo só, tendo em vista que suas
produções teriam que ser apresentadas no encontro seguinte, no seminário realizado pela
coordenação do PECEC-LEs para as apresentações das produções dos vários cursos
oferecidos. Esse fator, influenciou bastante as reflexões produzidas naquele momento, pois
além de pensar no processo de ensino-aprendizagem, para o qual suas produções estavam
voltadas, tiveram também que se organizar para apresentá-las às colegas dos outros cursos.
Esse elemento novo, a princípio, nos deixou bastante preocupada, mas depois avaliamos como
positivo para nossa pesquisa. Primeiro, por que houve por parte das professoras um cuidado
ainda maior em explicar cada procedimento escolhido e, segundo, porque as fez sentir que o
fruto de suas discussões e produções poderiam alcançar uma dimensão maior, à medida que
eram compartilhadas com professores dos vários cursos oferecidos pelo PECEC-LEs.
A produção de material teve como referencial a proposta de temas transversais
presente nos PCNs. O tema escolhido, a água, partiu dos professores e todo o
desenvolvimento do projeto, desde a escolha dos textos e atividades, foi fruto das negociações
no trabalho colaborativo.
3.5.2 Questionário
Escolhemos um modelo de questionário semi-aberto (anexo 2), com o objetivo
primeiro de promover uma discussão a respeito dos conceitos que as professoras participantes
traziam sobre língua, ensinar e aprender. Visamos, também, usar as informações registradas
no questionário para reforçar/validar as fornecidas pelas gravações e pela entrevista realizada
no final da pesquisa. Contando com mais esse instrumento pudemos realizar a triangulação
dos dados.
42
3.5.3 Entrevistas
Ao optar pela entrevista como um dos nossos instrumentos de coleta de dados,
compartilhamos com Dione e Laville (1999, p.187-8), a opinião de que ela
oferece maior amplitude do que o questionário, quanto à sua organização:
esta não estando mais irremediavelmente presa a um documento entregue a cada
um dos interrogados, os entrevistadores permitem-se, muitas vezes, explicitar
algumas questões no curso da entrevista, reformulá-las para atender às
necessidades do entrevistado.
Utilizamos a entrevista semi-estruturada com objetivo de saber como as professoras
avaliam a relevância da avaliação e produção colaborativa de material didático para sua
formação profissional continuada. Para esse fim elaboramos as seguintes perguntas:
1. O que a levou a participar da produção colaborativa de material didático?
2. Como foi participar da produção colaborativa de material didático?
3. Especificamente o que foi mais e menos produtivo?
4. Que sugestão você daria na organização desse tipo de prática?
5. Houve mudanças na sua prática em sala de aula decorrente das reflexões feitas
durante a produção colaborativa de material didático? Em caso afirmativo, quais?
6. Você se sente melhor trabalhando com um livro didático ou com o material produzido
colaborativamente? Por quê?
3.6 Procedimentos de análise
Logo que terminamos a coleta e a transcrição dos dados começamos a fazer as
primeiras observações a respeito do material de que dispúnhamos. Dessa forma, iniciamos
nossa análise com os dados das transcrições referentes ao processo de avaliação e de produção
colaborativa de material didático. Em seguida, analisamos os dados das entrevistas. Os dados
coletados pelo questionário não tiveram um tratamento específico, pois objetivavam, como
foi dito anteriormente, reafirmar e/ou negar conceitos e reflexões a respeito dos tópicos
discutidos durante o curso. Por isso, seus dados estarão presentes nos momentos da análise
em que eles se fizerem necessários.
43
Para fazer a análise dos dados transcritos, tanto da avaliação, quanto da
produção colaborativa de material didático, buscamos em primeiro lugar levantar os
conteúdos que se tornaram objeto de reflexão. Para tanto, selecionamos os pontos em que as
professoras se detiveram, ou porque sentiram necessidade ou porque foram instigadas pelas
supervisoras. Assim, os conteúdos do processo de avaliação de material didático foram
denominados de reflexões sobre:
1) A escolha e o papel do livro didático;
2) A organização das unidades do livro didático;
3) Os conceitos de ensinar e aprender uma língua estrangeira;
4) As visões do projeto político pedagógico da rede municipal de ensino.
E os conteúdos do processo de produção colaborativa de material didático foram
denominados de reflexão sobre:
1) escolha e delimitação do tema;
2) procedimentos – a) como iniciar o projeto;
b) utilização da língua materna e da língua alvo;
c) organização dos alunos;
3) análise contextual;
4) objetivos do projeto;
5) avaliação;
6) dificuldades dos professores;
7) papel dos alunos;
Para identificar quais os tipos de reflexão partimos de uma categorização
predeterminada. Seguimos, então, a divisão apresentada por Van Manen (1977). Para ele, a
reflexão pode ser dividida em três diferentes níveis: a técnica, a prática e a crítica:
A reflexão técnica preocupa-se mais com os meios. O “como fazer” é o
principal elemento das discussões entre os docentes.
A reflexão prática leva em consideração os objetivos e pressupostos teóricos
presentes no processo de ensino-aprendizagem.
A reflexão crítica visa a valorização de critérios éticos e morais nos objetivos
educacionais. Busca um modelo de ensino-aprendizagem que acima de tudo
leve à autonomia e ao questionamento das práticas e papéis sociais.
44
Para análise dos dados das entrevistas, resolvemos partir dos pontos em comum, ou
seja, dos mais comentados nas respostas das participantes. Os dados das entrevistas nos
remeteram aos seguintes tópicos:
1. isolamento profissional
2. novos conhecimentos
Após a apresentação do contexto da pesquisa, e dos instrumentos e procedimentos de
coleta e análise dos dados, passaremos, no capítulo seguinte, para a análise e discussão dos
resultados desta pesquisa.
45
CAPÍTULO IV
ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS
Este capítulo está subdividido em três partes. Na primeira e na segunda parte,
identificamos e analisamos os conteúdos e os tipos de reflexão gerados durante a avaliação e
produção colaborativa de material didático. Na terceira e última parte, discutimos as
percepções dos sujeitos de pesquisa, com relação à relevância do processo de avaliação e
produção colaborativa de material didático, para sua formação profissional continuada.
4.1 Análise do processo de avaliação colaborativa de material didático
Nessa análise, apresentamos os conteúdos das reflexões produzidas durante esse
processo e os classificamos de acordo com os níveis técnico, prático e crítico (Van Manen,
1977). São eles: 1) Escolha e papel do livro didático; 2) Organização das unidades do livro
didático; 3) Conceito de ensinar e aprender uma língua estrangeira; 4) Visões do projeto
político pedagógico da rede municipal de ensino.
4.1.1 Escolha e papel do livro didático
Ao iniciar a seção de avaliação de material didático sentimos que, apesar das nossas
instruções em direção ao levantamento de critérios para se fazer uma avaliação, as professoras
mantiveram colocações firmes sobre a falta de autonomia dos professores de LE no que diz
respeito à escolha do material a ser utilizado. Ao que nos parece, uma tentativa de deixar
claro que os livros já utilizados ou que serão em breve utilizados não foram escolhidos por
elas.
S1: - Mas vocês chegaram a fazer uma avaliação desses livros?
P4: - Na escola, onde?
46
S1: - Não, a diretora, os professores etc.
P1: - Não, não, foi pelo preço mesmo. Realmente foi pelo preço, ninguém escolheu esse livro.
A prefeitura que escolheu, porque na verdade o que ocorre na prefeitura é o
seguinte:..., os profissionais não estão discutindo “isso, isso e isso”, já vem tudo
decidido, na verdade eles fazem a reunião pra mascarar o negócio, porque na verdade
já ta tudo decidido.
Ah! Ah! Ah!
Ai, você suas opiniões, eles nem param para te escutar. Então você anota, eles
levam pra lá e depois volta tudo o contrario do que foi falado.
Esse livro que foi adotado ninguém estava querendo ele.
S1: - No momento de fazer a avaliação deste material, o que vocês levantaram como ponto
positivo, num livro ou noutro, vocês lembram?
P2: - Não, não deu tempo não, foi muito rápido. Ah!ah!ah!
Não, eram muitos livros e a gente deu uma olhada superficial porque eram muitos
exemplares. A gente olhou tudo muito rápido.
S1: - Mas algum critério vocês tiveram, gente, para dizer que este aí estava em último lugar,
vocês não lembram?
P2: - É a gente deu uma folheada antes né, nos autores; alguns a gente já conhecia.
A P1 diz abertamente que a voz dos profissionais, ou seja, dos professores não está
sendo ouvida como deveria. Há, segundo ela, um mascaramento, uma falsa democratização,
pois na verdade o processo de escolha do material não visa levar seriamente em consideração
a opinião dos professores. A proposta de avaliação que é levada para a escola, segundo a P2,
chega muito em cima da hora. E sendo tudo tão rápido torna-se impossível para os professores
realmente fazer uma avaliação séria.
Na época em que esta pesquisa foi realizada, a escola municipal de Goiânia tinha
acabado de decidir retomar o uso do livro didático para a disciplina de língua inglesa. Por
isso, algumas professoras traziam uma opinião formada sobre essa mudança. Na fala a
seguir, vemos que a P2 expõe uma crítica ao sistema de ciclo. Segundo ela, com este sistema
e sem o uso de um livro, os alunos ficam sem um material que possa motivá-los. Ela cita a
falta de figuras como fator importante e que o livro de alguma forma pode ajudar. Mas
enfatiza que defende a volta do livro “como um apoio, um incentivo a mais”.
P2: - Eu acho que o ciclo agora fica muito preso a textos, quase não tem nada assim em
figura.
S1: - Você acha que eles sentem falta disso?
47
P2: - (...) ah eu acho que eles gostam de figura sim, tanto é que quando a gente traz os livros
eles ficam doidinhos querendo levar pra casa.
S1: - Então tu acha que é positivo a volta do layout da figura dos livros?
P2: - Eu acho positivo sim, não o livro como um todo, mas ele como um apoio, um incentivo
a mais.
Apesar da pertinência da P2 em defender a volta do livro como mais um elemento
motivador, seu discurso parece equivocado na compreensão da proposta de ciclo. Para ela, é o
ciclo que determina o trabalho “muito preso a textos”.
Além de refletir sobre os pontos positivos da retomada do livro didático, as
professoras remontam colaborativamente as idas e vindas do livro/apostila no contexto
municipal. Parecem contar uma história em que seus papéis pouco ou nada têm a ver com as
decisões tomadas, que, como foi dito anteriormente, um “mascaramento” no que diz
respeito à participação dos professores para a escolha de materiais.
P1: - Eu também concordo com ela. Aliás, não é a volta do livro, mas é a introdução do
livro. Nunca tivemos o livro de inglês não.
P2: - Agora eu acho produtiva também.
S1: - Na prefeitura?
P2: - É, na prefeitura, porque agora a gente tem um livro pra rede toda.
S1: - Então quer dizer que, na realidade, há muito tempo atrás já não tava legal.
P2: - Na época que os alunos compravam livro, o professor escolhia um e eles
compravam.
P1: - Ah, é mesmo! Eu lembro.
P2: - depois veio o livro do governo e não tinha o de inglês, então foi quando cortou,
parece que cada um(...)
P4: - Você lembra da apostila?
P2: - A apostila foi depois. No meu entender foi depois. Porque quando eu comecei na rede
sumiu, né?
P4: - Aí, a gente adotou a apostila.
P1: - Quando a gente adotava haviam(sic) pouquíssimos na sala. Porque era assim,
comprava-se (sic) todos os livros, aí se sobrasse dinheiro comprava o de inglês, né?
P2: - É.
P1: - Então eram pouquíssimos os alunos que tinham.
P2: - Então veio a apostila, depois caiu, era o que a gente escolhia (...) era uma coisa
que.
48
S1: - Mas esses livros eram escolhidos por vocês ou simplesmente vocês tinham que
utilizar?
P2: - Era escolhido pela escola.
S2: - Mas era escolhido por professores em conjunto ou só pela coordenação da escola?
P2: - Bom, eu particularmente nunca cheguei a escolher porque sempre que eu chegava nas
escolas eles tinham adotado os livros, então eu continuava com o que estava,
porque é difícil pra eles comprarem e às vezes eles já tinham do irmão.
Outra questão que as professoras levantaram ao remontar o histórico do livro didático
no município, diz respeito ao lugar que a LE ocupou e ocupa no currículo escolar de um modo
geral. Este ponto fica claro quando a P1 diz Porque era assim, comprava-se (sic) todos os
livros, aí se sobrasse dinheiro comprava o de inglês né”?
A situação no ensino privado é apresentada pela P4. Ela relata que os professores não
tiveram tempo de escolher o material, já que no caso dessa instituição houve um concurso e
por isso os livros foram escolhidos previamente por uma outra instituição. A professora
demonstra esperança de que após dois anos de uso desse livro possam escolher outro matrial;
S2: - Vocês não tinham feito nenhum treinamento não teve nenhuma reunião alguma coisa
assim pra vocês falarem sobre (...)
P4: - Não, porque nós nem tivemos tempo de escolher. Não fomos nós que escolhemos. Quem
escolheu foi a católica que escolheu.
P1: - O de vocês?
S1: - A universidade católica que escolheu o livro da escola?
P4: - É porque é o SESC né, aí o SESC fez o concurso.
S1: - Ah! Sim, sei.
P4: - Então não tinha pessoal ainda para escolhendo os livros. É, vai ter que usar mais
uns 2 anos. Eu acho que mais uns 2 anos que a gente vai ter que usar parece.
S1: - Quer dizer depois de usar esse livro você vai escolher?
P4: - É.
Embora não haja uma comparação explícita sobre a escolha do material didático na
escola pública e na escola particular, ao apresentar sua experiência na escola particular, P4
acaba enfocando a semelhança entre o que ocorre nas duas instituições em relação a esse
assunto.
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As reflexões dessas professoras a respeito da escolha e do papel do livro didático na
escola pública municipal trouxeram, indiretamente, à tona questões fundamentais para a
formação continuada do professor de LE. A principal delas diz respeito às políticas de ensino
para essa área. Segundo Paiva (2003, p.54) “Apesar de todos os setores da sociedade
reconhecerem a importância do ensino de língua estrangeira, as políticas educacionais nunca
lhe asseguraram uma inserção de qualidade em nossas escolas”. E, sendo assim, não nos causa
estranhamento o fato de que as professoras não tenham tido realmente voz no momento da
escolha do material didático. Fica subentendido que o papel delas restringe-se à aplicação do
que foi determinado por outros. Pensamos que essa prática, além de refletir um descaso com a
formação continuada do professor de LE, demonstra também a crença de que o papel desse
professor ainda é de aplicador de pacotes pedagógicos prontos e acabados como no método
áudio-lingual. É possível observar isso em suas falas, pois apesar de muito interessadas na
escolha de material, esses profissionais parecem não saber exatamente como fazê-lo:
S1: - Mas algum critério vocês tiveram, gente, para dizer que este aí estava em último lugar,
vocês não lembram?
P2: - É, a gente deu uma folheada antes né, nos autores; alguns a gente já conhecia.
Apesar de as professoras não terem conseguido ir além da constatação de que
tradicionalmente suas opiniões, na escolha do material, não têm sido consideradas, o fato de
conseguirem levantar um tópico tão relevante para seu desenvolvimento profissional, nos
permite classificar suas reflexões no nível crítico, pois elas voltam-se para questões éticas e
morais, no que se refere ao papel do professor de LE.
4.1.2 Organização das unidades do livro didático
Ao analisar a organização do livro didático, as professoras questionaram a respeito da
seqüência e da pertinência dos temas encontrados. O exemplo a seguir ilustra o início dessas
reflexões.
P1: - (...) então vem nacionalidade, emprego, profissões, depois que vem a família. Eu
acredito que seja mais ou menos essa seqüência, às vezes muda de seqüência um
pouquinho de um livro pro outro. Mas geralmente são esses temas que a gente trabalha
na 5ª série.
S1: - E depois. Vocês acharam algum erro?
P2: - Eles poderiam trabalhar a família primeiro e não móveis e objetos.
50
P1: - Eu também acho, porque família tá mais próximo.
P4: - Mas quando eu for trabalhar o livro eu posso trocar a seqüência(...)
S1: - O que foi? Eu não entendi?
P1: - Ela estava falando assim, que se ela achar que a família é mais importante do que a
escola ela salta e vai lá pra unidade cinco. Ai eu falei pra ela que às vezes o
vocabulário vai sendo introduzido gradativamente. Então como é que ela pula da
unidade um e vai para a cinco?
P2: - O tema família vai trabalhar o pronome pessoal, e aqui no início ele entra com
alfabeto.
P4: - Então eu não entro com pronome se eu não quero entrar, eu deixo ele pra depois.
Segundo a P1 existe uma seqüência temática previsível nos livros didáticos. Ela parece
tê-los memorizado e, apesar de ser favorável que o tema família seja mais importante e por
isso, como sugeriu P2, deva vir primeiro, contraditoriamente ela defende essa seqüência, pois
quando ouve a P4 dizer que pula unidades conforme achar necessário, ela indaga sobre a
quebra na gradação vocabular. Também P2 expõe a desordenação gramatical que irá ocorrer
com a alteração feita pela colega. Apesar dos questionamentos de P1 e P2, P4 não volta atrás,
ela simplesmente responde que caso decida não entrar com determinado tópico gramatical ela
o deixará para um outro momento.
Podemos identificar nos depoimentos que acabamos de apresentar e nos que traremos
a seguir, uma movimentação em direção à co-construção de conhecimento e resignificação de
crenças e práticas educacionais. Segundo Celani (2003, p.78) “A ação colaborativa
pressupõe... ir contra os significados estabelecidos pela cultura da escola e implícito ou
explicitamente mantidos pelos educadores...”.
Ao analisar a continuidade do diálogo entre as professoras podemos inferir que elas
vão influenciando umas as outras de forma a explicitar suas inseguranças e rever seus
conceitos. Como é o caso de P4 e P1:
S1: - Ah! Você tá pensativa, o que você pensou agora?
P4: - Ai, gente,, eu não sei, eu acho que eu tô largando tanto a gramática de lado que eu
até sentindo.
S1: - É?
P4: - Muito.
S1: - E você esta notando um contraste?
P4: - Eu tô, eu acho que estou trabalhado muitos textos.
(...)
51
S2: - Você acha que os personagens não são significativos?
P1: - Os personagens não são. Há uma variedade de personagens que não são significativos.
Eu acho que o volume da edição ocupa muita coisa, por exemplo, família, números,
nacionalidades, países.
S2: - Excesso de temas?
P1: - Eu acho que é excesso de tudo, vocabulário, conteúdo, de texto, personagens.
S2: - Um hum?
P1: - Nossa senhora! Uma grande variedade de personagens, de tópicos, aqui também tem
nacionalidade.
A P4, que a princípio parecia tão segura de sua prática, expressa uma certa incerteza
diante das colocações das colegas. Já P1, que anteriormente levantava dúvidas sobre o
posicionamento de P4 em relação à quebra da seqüência gramatical e vocabular que os livros
trazem, demonstra ter reavaliado tal preocupação e passa a questionar os excessos que ela
percebe naquele livro. Vejamos as conclusões a que chegam as professoras a respeito do livro
em análise.
P1: - Então, afinal de contas vamos vê quantos textos tem essa unidade, um, dois, três e uma
parte do (...).
- Quatro, cinco, e um texto ...
P4: - Nessa unidade?
S2: - Você acha muito?
P1: - Numa unidade eu acho, porque fica enjoativo.
P4: - Acho que é muito exercício gramatical, eu prefiro mais aquele de (...)
S2: - Excesso de estrutura?
(...)
S2: - Mais alguma coisa até aí?
P2: - Eu acho que diminuiu os tópicos e jogou uma grande variedade em um só, porque
sendo grande daria doze títulos e aqui só tem oito.
P4: - Oito o quê? Unidades?
P4: - Você tá falando do livro todo, né?
P2 - É, tipo assim, o autor jogou muita coisa numa unidade e se tivesse diversificado
poderia dar mais tópicos.
S2: - Aham
52
P2: - Mais unidades e não ter grandes variedades num tópico.
P1: - Tirar um pouco dos tópicos daquela unidade e por em outros tópicos. É, porque ele fez
esta observação abaixo olha, pedir aos alunos que desenhe ou façam colagem numa
folha à parte representando uma família pouco usual.
P2: - Un hum ficou ruim né?
P1: - Dê nome aos personagens, escreva orações com gravuras. Então “pouco usual”, a
gente poderia trocar para colocar a família deles.
P2: - Unhum. E tirar o termo “pouco usual”. É, de repente o aluno que encaixa nessa
família pouco usual ai vai se sentir...
P1: - É, nossa, de repente tem um que se encaixa aí? E vai dizer, “eu sou pouco usual”. O
quê que ele quis dizer? Ele fez confusão com pouco usual, será que essa família hoje
em dia é pouco usual?
P4: - É
P1: - Se a gente for parar pra pensar no número de mães solteiras, de avós que criam os
netos, será que ela é pouco usual? Sem contar que às vezes os pais que vivem juntos às
vezes não é tão bom assim, principalmente aqueles pais que vivem brigando perto dos
filhos. Às vezes é até melhor...
S1: - Já dá pra fazer uma discussão sobre família bem mais profunda.
P1: - E no caso podemos trabalhar novos relacionamentos como padrasto, madrasta ...
A partir desses excertos percebemos que o processo de reflexão colaborativa levou as
professoras a refletir sobre suas práticas e conceitos de forma a reafirmá-los ou negá-los. A
possibilidade de interagir com colegas da área parece ter propiciado a discussão necessária
para a manutenção mais consciente de determinadas práticas e a negação de crenças e
conceitos. A P1, que inicialmente mostrava uma preocupação com a manutenção da
organização temática do livro, passa a questionar fortemente o excesso de textos e a fazer
sugestões nesse sentido. P4, depois de questionar sobre sua postura com relação à gramática,
logo em seguida não se intimida em criticar o excesso de exercícios gramaticais, levando-nos
a inferir que suas preocupações foram atenuadas pelas opiniões trazidas pelo grupo. Elas
constroem uma proposta de reformulação de unidades e fazem uma crítica à forma como o
tema família está sendo abordado.
Nos exemplos mostrados, os depoimentos das professoras demonstram uma maior
ênfase na reflexão prática. A temática sobre a organização do livro didático estava prevista,
tendo em vista que essa discussão fazia parte da programação do curso. O que não sabíamos
era o nível de reflexão que os professores poderiam atingir ao discutir esse assunto. O fato de
53
utilizarmos as categorias de Almeida Filho et al (1991) foi, a nosso ver, um fator decisivo,
pois mesmo que as docentes pouquíssimas vezes tenham verbalizado alguma dúvida na
compreensão dessas categorias, o processo de análise seguiu como se elas tivessem
consciência da teoria formal que estava por traz de suas ações, críticas e sugestões.
4.1.3 Conceito de ensinar e aprender uma LE
Assim como era esperada uma discussão sobre a organização das unidades temáticas
do livro didático, também tínhamos como expectativa que as professoras reconhecessem as
concepções de ensinar e aprender uma LE no material didático. Na verdade, queríamos saber
se, a partir das discussões teóricas e do contexto de atividades colaborativas, elas iriam de
alguma forma refletir, a ponto de questionar e reformular seus próprios conceitos.
A fim de saber quais as influências que suas concepções sofreriam em função do
contexto já descrito, utilizamos inicialmente alguns dados coletados pelo questionário no
início do curso para depois confrontá-los às reflexões do processo de avaliação de materiais.
Vejamos esses registros no exemplo a seguir:
Ensinar uma língua estrangeira é:
P1 - Ter uma compreensão teórica da linguagem e também quanto ao uso dela.
P2 - Transmitir conhecimento de determinada língua.
P3 - Levar ao aluno o conhecimento de uma outra cultura, de uma forma diferente de
expressar de um modo diferente de viver e que acima de tudo a língua é o elo da
comunicação entre as pessoas.
P4 - Poder estar auxiliando meus alunos a entender/compreender e aprofundar um assunto,
um conteúdo através de uma segunda língua (dentro das ciências, história, geografia,
matemática etc.).
Segundo Almeida Filho (2002), uma das tarefas que aguardam o professor de LE é a
produção e a seleção de materiais de ensino. Esse mesmo autor também afirma que a
abordagem de ensinar do professor que via-de regra orienta decisões quanto a materiais é
resultado de um conjunto de crenças, pressupostos e princípios sobre linguagem, ensinar e
aprender. Partindo dessa visão, vislumbramos a possibilidade de trazer nos exemplos a seguir
uma mostra de como essa análise colaborativa de material pode contribuir com a elucidação
dos conceitos presentes nos materiais e na abordagem de ensinar.
54
S2: - Bom, qual, vocês acham que é, o conceito de aprender e de ensinar deste livro, que
vocês falaram, que é estruturalista e que está ensinando a língua pela língua, sem
contexto nenhum. O quê que é ensinar, o que é aprender?
P2: - Ensinar é passar conhecimento e aprender é distinguir isso.
S1: - Para elas (as autoras) ou isso é um conceito seu?
S2: - Para essas autoras aí, segundo o que elas fizeram no livro. Você ta falando segundo
você ou segundo as autoras?
P2: - Uai, para as autoras, e pra mim também.
S1: - Para você, ensinar é passar conhecimentos? De língua?
P2: - É.
S1: - Então é assim. Abre a cabecinha do aluno e passa seu conhecimento para ele?
P2: - É, ensinar né.
S1: - Unhum
P2: - A gente tem aquela idéia de transmitir.
S1: - A concepção delas é a de transmitir ou a de construção do conhecimento, você acha
que elas trazem essa idéia de interação?
P4: - É a idéia de transmissão, de transmitir.
S1: - Por quê?
P1: - É igual os números aqui, a idéia de decorar vocabulário, repetir, o que mais? De
construir mesmo eu não vi nenhum exemplo. Aliás, no finalzinho quando pede pra
eles falarem sobre a família deles, uma expectativa de interação (...) uma pequena
produção (...)
P4: - É por que eu acho que quando a gente constrói a gente acaba aprendendo. Da forma
que ela colocou aqui não pra aprender. Então igual aqui... naquele momento...
principalmente o gramatical. que ela colocou um monte junto. Eu vou estar só..., eu
encaixo ali... vou até aprender naquele momento, mas depois eu vou tá esquecendo
rapidinho.
P1: - É o tal do envolvimento, que o aluno se envolve. Como a gente comentou aqui de
colocando, chamando, sim a gente vai construindo, ampliando... agora, dessa
forma aqui a gente repete, repete... a gente brinca... e não aprende nunca . Nem
precisa pensar tanto, porque é uma coisa meio mecânica. É, você olha uma coisa aqui,
e completa ali.
Em resposta aos questionamentos de S2, P2 identifica sua concepção de ensinar com a
concepção trazida pelas autoras do livro didático. A impressão que temos é de que ela está
surpresa de estar sendo questionada sobre algo que para ela parece ser óbvio, ou seja, ensinar
55
é igual a passar ou transmitir conhecimentos. A prova de que isso deve ser uma verdade que
ela não põe em dúvida é que a mesma resposta verbalizada nas discussões está presente
também por escrito em seu questionário. Não sabemos qual o reflexo das colocações das
colegas sobre esse assunto, pois daí em diante P2 manteve-se em silêncio. Talvez no
momento da produção de material didático possamos observar alguma manifestação sua a
esse respeito.
Ao analisarmos as respostas das professoras no questionário sobre o que é ensinar uma
língua estrangeira, percebemos que a P1 e a P2 relacionam ensino a conhecimento teórico e
transferência do mesmo. Nesse sentido, o papel do professor, para elas, é central pois detém o
conhecimento que será repassado para os alunos. a P3 e a P4 parecem ver o ensino de LE
muito mais como um processo de reflexão sobre outras culturas e sobre a função da língua em
nossa própria formação e na relação com os outros.
Ao contrário de P2, P1 e P4 demonstraram querer expandir e exemplificar com partes
do livro a diferenciação entre construção e transmissão de conhecimento levantada pela S1.
Aliás, as reflexões que elas encadearam a partir daí e que mostraremos logo adiante,
corroboram o pensamento de Dewey (1959), a respeito das atitudes fundamentais para a ação
reflexiva. A abertura de espírito, segundo ele, é uma delas e refere-se ao desejo de considerar
as várias alternativas possíveis, e reconhecer a possibilidade de equívoco mesmo nas mais
arraigadas crenças.
P4: - Na, o gente, eu tô (...) tem um esporte aqui o Hilux, é aquele andar entre as arvores (...)
então eu não sabia disso, eu fui estudar e tudo, cheguei e fui contar uma historinha
aí levei o maior fora.
S1: - ... a comunicação, ela acontece muito mais rápido hoje, então quer dizer que este aluno
ta muito mais bem informado do que a gente sobre determinado assunto. A gente tem
que pensar o que fazer com essa informação, que discussão levantar pra esse aluno
porque ele tem muito mais informação do que a gente.
P4: - Nossa, e como.
P1: - Agora os computadores vão chegar, vem alguém pra tomar conta do laboratório de
informática, eles falam: “pode deixar ou eu sei”. E sabem mesmo. Então eu falo
pra eles que eu não sei nada, porque eu tenho dificuldade.
S1: - Pede pra eles te ensinar.
P1: - Eu peço e falo mesmo que eu não sei nada, mas é ruim.
S1: - O quê?
P1: - Não é que seja ruim você falar que não sabe, é ruim você não saber usar.
S1: - Um hum, claro.
56
P1: - É, eles vivenciam isso também em casa, os pais deles têm essa dificuldade de lidar com
o computador.
P3: - E eles se sentem tão bem quando auxiliam o professor, ensinam... Eles acham o
máximo.
Trazer para discussão as dificuldades que são enfrentadas na sala de aula e que são
reflexo do mundo moderno foi a forma que as professoras encontraram de dizer que não são
as únicas detentoras do conhecimento e da informação e que, portanto, querendo ou não elas
se vêem obrigadas a reformular seus conceitos e assumir uma relação de co-construção de
conhecimento. Os alunos, segundo P1, estão acostumados pois o choque de gerações é
vivenciado por eles em suas casas. Para P3 essa troca faz bem para a relação professor e aluno
já que “
eles se sentem tão bem quando auxiliam o professor
”.
Em termos de reflexão, consideramos a discussão anterior como voltada mais para as
questões práticas. uma tentativa de relacionar a prática, exemplificando nos livros e em
suas próprias experiências as teorias sobre ensinar e aprender. Realmente, os relatos
interativos sobre os fatos ocorridos na aula, a respeito do conhecimento que os alunos dessa
nova geração já trazem, revelam uma busca por explicações, tendo como referência as
influências externas ao contexto escolar, que justifiquem a revisão de seus conceitos e
práticas. É como se elas dissessem que os alunos não são mais os mesmos, o que esperam
da escola hoje não é mais o que esperavam os alunos de outrora.
4.1.4 Visões do projeto político-pedagógico da rede municipal de ensino
Assim como as críticas levantadas anteriormente, as vantagens que as professoras
apontam a respeito da proposta político-pedagógica da escola municipal indicam uma
intenção de dizer o lugar de onde estão falando, ou seja, dizer que a experiência nesse
contexto as torna mais preparadas para avaliar as diferentes realidades.
A principal vantagem apontada pelas professoras toca no ponto que elas mais
criticaram, isto é, na autonomia. A contradição é que a mesma instituição que as desconsidera
no momento de decidir se adota ou não um livro didático, liberdade quase que total nas
formas de utilização desse material. Na comparação que veremos a seguir, as professoras
tomam como parâmetro suas experiências em instituições privadas e o depoimento de um
colega que observa o quanto os alunos da prefeitura são mais críticos do que da escola
estadual.
57
P1: - É, na escola particular quando a gente vai fazer o planejamento... bom, quando eu
pegava o livro adotado, e olhava as unidades... tantas unidade, quantas aqui, 8?...
então a gente dividia 4 para o semestre 4 para o segundo e tinha que dar porque se
os pais chegassem no final do ano, e tivesse 20 páginas sem usar, eles falavam: “ah
compra o livro caro e nem usa tudo”.
...
P4: - Tem um colega meu que trabalha na prefeitura e no estado, um dia desses ele tava
comentando a diferença dos nossos alunos da prefeitura.
S1: - Por quê?
P4: - Por que os da prefeitura são mais críticos, por que a gente consegue trabalhando
isso com eles.
S1: - Você acha que isso é fruto dessa proposta temática... que de alguma forma aprofunda
mais?
P1: - Dessa abertura que a gente tem, sabe, de não ficar presa ao livro.
P4: - Quer dizer, a gente não vai ficar presa ao tema família só, mais a gente vai
trabalhando o que é a família realmente, essa “pouco usual” aqui. O que
necessariamente é isso. E essa família ideal, será que ela é tão ideal assim?
P1: - Ideal pra quem?
Para Contreras (2002, p.267), em se tratando de avaliar as reformas atuais, o risco
de que
Esses supostos ganhos podem ser aparentes se apenas gerar processos de
discussão sobre os modos da prática educativa, sem capacidade de decisão
sobre os porquês e os caminhos, que têm de ser aceitos, ou sem capacidade para
intervir nas condições em que transcorre a escolaridade. O êxito político dessas
reformas depende precisamente de que os professores aceitem essas limitações
como um ganho.
As reflexões das professoras durante esse processo de avaliação de material didático
parecem estar sempre a um passo de atingir o nível crítico. Elas mantêm suas reflexões no
nível prático e quando conseguem se aprofundar parece-nos que a habitual praticidade impede
a verticalização de alcançar um grau mais crítico. Contudo, assim como Contreras (2002,
p.267), acreditamos que
A introdução de processos coletivos de trabalho nas escolas pode se
transformar em um fator desencadeador da reflexão crítica. Da mesma maneira
que a burocratização e o controle administrativo em que se define esta tarefa
58
pode ser o fator-chave na limitação do desenvolvimento crítico da análise de
nossa prática.
4.2 Análise do processo de produção colaborativa de material didático
A proposta de produção colaborativa de material didático é, sem dúvida, uma ação de
planejamento e como tal “oferece uma visão das atividades cognitivas dos professores como
profissionais” (Clark e Petterson, 1993, p.267). O planejamento os leva a refletir sobre suas
futuras ações, a partir das experiências de ações vivenciadas. Ao analisar os dados do
processo de produção colaborativa, observamos que muitos dos tópicos discutidos são os
mesmos considerados por alguns autores (Brown, 1994; Ur,2000) como essenciais em um
plano de aula. Apresentamos a seguir os conteúdos das reflexões geradas durante esse
processo. São eles:
1) escolha e delimitação do tema;
2) procedimentos – a) como iniciar o projeto
b) utilização da língua materna e da língua-alvo
c) organização dos alunos;
3) análise contextual;
4) objetivos do projeto;
5) avaliação;
6) dificuldades dos professores;
7) papel dos alunos;
4.2.1 Escolha e delimitação do tema
Dentre os temas transversais, o escolhido pelas professoras foi o meio ambiente. Ao
serem questionadas quanto ao sub-tema, disseram que seria sobre a água, pois iriam
aproveitar o fato de haver uma campanha nacional em prol da conscientização do uso racional
da água. Acreditam também que o fato de os alunos estarem trabalhando esse tema em
outra disciplina facilita o trabalho delas. Não questionaram se o tema seria interessante para
os alunos. Os critérios de escolha parecem mais voltados para suas necessidades como
professores.
59
P4: - É, não é muito difícil não, porque alguns professores já falaram sobre isso, então eles
já estão preparados.
S1: - Então vocês estão pensando no tema geral meio ambiente e o sub-tema água? Por
quê?
P1: - Por que este ano é o ano da campanha da água. Durante todo este ano nós falamos
sobre isso.
P3: - É a questão da conscientização dos alunos com relação à economia de água.
4.2.2 Procedimentos
A preocupação com os procedimentos, isto é, o formato do projeto, foi, sem dúvida,
um dos principais elementos motivadores de discussão. Entretanto, notamos que o modelo de
produção colaborativa levou as professoras para além da escolha de procedimentos. A
necessidade de negociar suas sugestões fez com que refletissem um pouco mais. Vejamos
agora as questões que mais as inquietaram no que diz respeito a procedimentos.
a) Como iniciar o projeto
A dúvida na verdade era qual entre tantas idéias seria a melhor maneira de iniciar o
projeto. As professoras trazem várias idéias e as vão apresentando quase que ao mesmo
tempo. Não uma argumentação explícita e em nenhum momento elas discutem os
conceitos teóricos que estariam por trás das atividades propostas. Os excertos a seguir
ilustram essa situação:
P4: - Acho que nós poderíamos começar com alguma figura, alguma coisa assim. Fica
confuso, será? Vamos pensar primeiro. Estou colocando uma possibilidade.
...
P1: - Eu acho até que a gente poderia trabalhar a música (...)
P4: - Quer dizer, pode ser qualquer musica pra tá finalizando?
P1: - Mas eu falo a letra da música como uma interpretação, entendeu?
P3: - Mais eu acho essa música legal, ela chama atenção pros problemas. Ajudaria muito.
P1: - Ah é.
P3: - A gente pode começar com a música e no final fechar também com ela.
...
P3: - Agora eu to lembrando que tem um cartaz em casa desse tamanho sobre a
reciclagem do lixo.
...
60
P4: - Que tem aquele House Keeper da (...) do mundo?
P3: - É aquele mesmo.
P4: - A gente vai tá colocando só pra colocar mesmo, pra tá ilustrando?
...
P4: - (...) eles chegam a gente vai e oferece água.
...
S1: - Eu gostei achei interessante isso ai, você chegar com uma bandeja de água por que
não?
P2: - A gente coloca água numa vasilha de vidro.
...
S1: - Eu to interessada em saber qual pergunta vocês vão fazer para eles.
P1: - Se a água está fresquinha, se matou a sede.
P3: - Além de tomar água no que mais ela é usada no nosso dia-a-dia.
Se a gente for analisar a água faz parte do nosso dia a dia, você pensa que acabou a
água, nossa que transtorno, você não pode fazer nada, não lava vasilha, não toma
banho, nem cozinhar, não lava roupa, não lava o banheiro, nem aula tem, às vezes,
quando acaba água.
...
P4: - Vamos perguntar então primeiro, por que a gente servindo aquilo e depois quais
são as outras necessidades.
...
P1:- A gente vai botar pergunta por pergunta?
A atividade escolhida acaba sendo algo que foi sugerido como brincadeira, mas como
S1 valoriza a idéia e diz que seria interessante utilizá-la, elas acatam a possibilidade e passam
a discutir como desenvolvê-la na prática. Percebemos, nesse momento, que elas esperam e
supervalorizam a opinião das supervisoras, como se a palavra final fosse delas, pois o
desenrolar da discussão acontece à medida que as supervisoras dão seu parecer ou fazem
algum questionamento com intuito de guiar a continuidade da produção.
b) Língua materna ou língua-alvo
Essa questão é levantada por uma das professoras e daí em diante, em vários outros
momentos, elas discutem se é possível trabalhar daquela forma usando a língua-alvo. P4
demonstra que sua preocupação com o uso da língua-alvo é no sentido de definir o melhor
momento para usar uma ou outra. A questão parece ser resolvida em um breve diálogo em que
P1 chega à conclusão de que muitas vezes podemos subestimar a capacidade dos alunos.
61
Concluem também que estarão presentes para ajudá-los, caso tenham dificuldades e que o
importante é dosar a língua-alvo de acordo com o nível da turma.
P1: - Eu vou colocar esse aqui em inglês ou em português (...)?
P1: - Não, they try, try to talk, try to write.
S1: - Vocês acham que para começar, tem material aqui em português, ou vocês acham
que tem que ser em inglês?
...
S1: - Bom, eu só estou levantando isso para vocês pensarem na realidade de vocês, vocês é
que vão decidir, o que vocês acham?
P4: - Eu acho que muitos vão conseguir, mas aqueles que não conseguirem a gente vai
auxiliando.
P3: - Pelo menos eles vão tentar, não é?
P1: - Engraçado,é que a gente pensa, será que eles vão conta? Aí, um dia eu dei um
texto sobre ecologia. O texto tinha muitas palavras parecidas, então eu dei o texto e
pedi que eles fossem lendo. Quando eu fui fazer perguntas, eu não li nada fiquei por
ali, deixei que eles trabalhassem sozinhos com o texto. Quando eu fui fazer algumas
perguntas em português, eles responderam tudo que tinha no texto, eles conseguiram
entender.
...
P4: - Então a gente faz grupos de 2, 3 ou 4.
P3: - Vai distribuir as perguntas, eles vão discutir?
P2: - Português ou inglês?
P4: - As perguntas em inglês, a discussão não é fácil fazer em inglês.
S1: - Depende dos níveis, tem níveis diferentes, como é que é?
P1: - Tem, tem 5ª, 6ª, 7ª e 8ª é bem diferente do matutino de 1ª a 4ª série.
P3: - E depende muito, tem 5ª série que o nível é melhor que o da 8ª.
P4: - E pra tá discutindo algo em inglês eles não discutem em grupo, não adianta.
c) Organização dos alunos
Inicialmente, não nenhuma divergência quanto às sugestões de desenvolver
atividades em pares ou em grupos. O que nos permite constatar que esse modelo já faz parte
de suas rotinas. Ao contrário disso, a sugestão de mobilizar os alunos para realizarem uma
pesquisa provoca alguns conflitos. Enquanto a P4 relata suas experiências positivas com
grupos de pesquisa, as outras professoras não parecem estar certas de que em suas escolas isso
62
poderia ser tão produtivo. Elas apontam suas dificuldades e chegam a levantar como
justificativa as diferenças de região em que cada uma trabalha. A relevância dessa discussão
encontra-se no fato de que leva as professoras a expor suas dificuldades, seus conceitos e a ter
contato com experiências diferentes. A P4 além de narrar com entusiasmo sua experiência,
chega a fazer uma avaliação do porquê, na escola das colegas, essa proposta não está tendo
êxito. Ela diz “Na minha escola todos os professores estão trabalhando dessa forma, de
repente é o que está faltando.”
S1: - E aí, vocês decidiram se vai ser em pares ou eles podem formar um grupão.
P4: - Eu acho que é bom.
S1: - Bom o quê?
P4:- Trabalhar em grupos
P3: - Acho que grupo de 4 ou 5 pessoas.
P4:- A gente vai ter que vê primeiro a quantidade de pessoas
...
P4: - Então a gente faz grupos de 2, 3 ou 4.
P3: - Vai distribuir as perguntas, eles vão discutir?
...
S1: - E depois pra essa discussão o que vocês fazem?
P4: - Abre o grupão.
S1: - Como é que vocês podem fazer isso de forma que cada aluno ou que o grupo se
engaje na discussão e até na pesquisa.
P4: - Eles podem apresentando em outras turmas, cada turma trata de um tópico e
depois essa turma vai ta apresentando na outra. A da apresenta na 8ª, a da
apresenta na 6ª essas abordagens todas.
...
P3: - No ciclo eu acho que pra fazer melhor, agora à noite eu acho complicado dividir
em grupo pra eles trabalharem.
S1: - É..., por quê?
P2: - É muito difícil, agora por exemplo, é uma época que os professores dão bastante
trabalho. Às vezes a gente vai dar aula, e eles estão fazendo trabalho de geografia na
minha aula, então não prestam atenção nenhuma.
...
P4: - Porque lá na minha escola no município tem muito isso, acontece muito.
Eles estão acostumados, essa coisa deles pesquisarem e apresentarem, isso eles
gostam, gostam tanto que quando você....... pede dizem, oba! Agora tem trabalho.
...
63
P2: - No noturno então eles não apresentam de jeito nenhum. Eu acho então que está
dependendo da região, não é?
P4: - Porque todos os professores estão trabalhando dessa forma, tanto que .já se criou o
hábito de fazer, de repente é o que faltando... E eu vou falar, eles gostam demais,
demais mesmo.
S1: - Você acha que é positivo em termos de aprendizagem?
P4: - Muito mais, porque eles fizeram uma pesquisa sobre as olimpíadas, eles falaram
tanta coisa que eu nem sabia, eles apresentaram, a apresentou na 6ª, a
apresentou na 7ª, e isso, essa troca foi muito gratificante, eu percebi que eles
aprenderam muito, inclusive eu aprendi com eles.
4.2.3 Análise contextual
Este tópico surgiu como conseqüência do anterior. Elas discutem como adequar suas
propostas à realidade de suas escolas. Nota-se que as reflexões caminham em duas direções.
Uma, representada pela P4 que enfatiza as necessidades e dificuldades dos alunos e a outra
nas vozes de P1 e P2 que tentam justificar-se tomando como base suas limitações pessoais e
também do contexto escolar.
P4: - Eu acho que depende da nossa realidade. Se eu acho que o meu aluno não pode
pesquisar em casa, se ele não tem condições de tá encontrando com grupo, ai a gente
vai ter que levar mais material pra eles trabalharem em sala, mas se eu acho que eles
podem pesquisar em casa, biblioteca, filme ou até se reunindo em grupo, fica melhor
ainda mais rico, ainda.
...
P4: - ... mas é o que a P3 falando, a gente não tem um texto que responda estas
perguntas.
S1: - A gente não tem aqui e agora.
P2: - É, mas voce vê o jornal, sai sempre.
S1: - Será que na Internet a gente não consegue, vocês tem acesso a Internet?
P3: - Não, tem, mais na escola os alunos não teriam, então quer dizer o professor que teria
que levar alguma coisa.
P2: - Mas às vezes a gente não tem tempo pra pesquisar...
S1: - Então você acha que ficaria inviável tá levando todos os textos?
P3: - É, estariam levando só alguns.
P2: - Mas eu teria que limitar as perguntas mais relacionadas com o texto.
64
P1: - Não, mas sai muito no jornal não é, porque a gente fica assim muito, é uma aula né,
que a gente tem que preparar?
P4: - Na sua escola tem biblioteca?
P1: - Na escola a gente tem acesso ao jornal, até no almanaque sai tanta coisa sobre esse
assunto.
A conclusão que P1 parece chegar é que a escola oferece subsídios para que
professores e alunos adquiram material de pesquisa. Aliás, até P2 sugere que é possível
utilizar materiais disponibilizados pela mídia. Mas de acordo com P1 o que as impede não é a
falta de material, mas o fato de que isso implica em que elas terão que se dedicar mais ao
preparo das aulas.
4.2.4 Objetivos do projeto
Espera-se que os objetivos de uma aula ou de um projeto sejam os primeiros a serem
definidos. Contudo, não foi o que aconteceu durante a produção colaborativa. quase no
meio do projeto toca-se no assunto dos objetivos. Ao serem questionadas, as professoras
demonstram ter segurança quanto ao objetivo geral, e incertezas quanto aos objetivos
específicos. Sua segurança quanto ao objetivo geral demonstra uma ligação direta com o
tema, e talvez por isso não sentiram necessidade de expô-lo. É como se a escolha do tema
transversal trouxesse consigo um objetivo educacional predeterminado. Por outro lado, P3
demonstra um certo temor em mencionar tópicos gramaticais para os objetivos específicos,
nos levando a crer que ela desconsidera as questões gramaticais no caso de um projeto
temático.
S1: - Ah! Então vamos colocar esse objetivo aqui pra gente voltar sempre nele e depois a
gente se estas atividades que a gente desenvolve são coerentes com este objetivo e
qual que é o objetivo dessa temática.
P1: - Valorização da água.
P2: - Conscientizar nossos alunos da importância da água em nossas vidas.
S1: - Então o objetivo é um trabalho de conscientização, tem um objetivo mais específico?
...
P1: - Leitura de texto.
S2: - Com essa leitura você quer que eles façam o quê?
P3: - Adquiram conhecimento sobre o assunto.
P1: - Trabalhar estruturas.
65
P3: - Não, estrutura não.
S1: - Estrutura também por que não? O texto não é cheio de estruturas, não pode ser um
objetivo especifico, por que que não pode?
...
P1: - Eles vão adquirir vocabulário da língua estrangeira.
4.2.5 Avaliação
O sentido de avaliação que parece prevalecer entre as professoras é de avaliação
contínua. Contudo, essa constatação é esclarecida após uma longa e confusa discussão
sobre o que poderia ou não ser considerado como tarefa avaliativa. A P3 sugere alguns jogos e
tarefas escritas relacionadas aos temas que eles estão pesquisando/apresentando. A P1, então,
questiona se essas tarefas não poderiam ser uma forma de avaliar o que eles aprenderam. A P3
explica que não havia pensado nessas tarefas como avaliação, mas principalmente como
motivação, pois seriam competições que os levariam a ficar mais atentos ao que os outros
grupos apresentaram. A P1 insiste dizendo que de qualquer forma é uma maneira de observar
se houve aprendizagem. A P3 sua sugestão muito mais como um elemento motivador do
que como um instrumento avaliativo. Por fim, a P3 acaba concordando que, embora não seja
esse o objetivo principal das tarefas que ela sugeriu, elas podem sim servir para avaliar a
produção e/ou conhecimento. A discussão é concluída quando a P2 afirma que Em todo
momento você avaliando. De um jeito ou de outro todas as etapas devem ser avaliadas
né?
A discussão demonstra que as professoras começam a questionar o “porquê” e não só
o “como”. O desejo de definir o objetivo das tarefas reflete o início de um processo de
reflexão mais aprofundado.
P4: - Depois a gente pode fazer assim uns games, joguinhos, cruzadinhas. Uma atividade
escrita.
S1: - Em que momento você acha que eles fariam isso aí?
P1: - Eu acho que isso aí poderia ser uma avaliação.
P3: - Não é para avaliar não, é pra depois das apresentações.
P1: - Mas não é uma avaliação pra ver se eles...
...
S1: - pelo que a P3 falou os games e os jogos seriam mais ou menos pra o que eles
conseguiriam assimilar das apresentações dos outros.
...
66
P3: - E poderia trocar, por exemplo,.. você faz umas perguntas sobre o grupo do outro pra
ver se realmente entenderam.
S1: - Uma competição?
P3: - É, porque eles ficam mais ligados, porque depois eles vão ter que saber o que os
outros apresentaram porque você tá falando que é avaliação.
P1: - Eu acho que não é uma avaliação pra da nota, mas uma forma da gente avaliar se
houve aprendizagem.
P1 - É isso.
P3: - Eu acho que incentiva um pouco a competição assim a participação aliás, a
competição depois com as perguntas valendo um brinde.
...
P3: - Eu não pensei nisso como uma avaliação.
S1: - É mais uma checagem.
P3: - É faz parte do projeto mesmo .Adquire conhecimento.
P1: - Mas não deixa de ser uma avaliação.
Não é, o grupo que ganhar igual você tá dizendo, vai competir o grupo que ganhar é
porque conseguiu aprendizagem melhor do que o que perdeu?
S1 - Será? Eu não acho.
P1: - Então não seria uma avaliação, seria uma metodologia?
P2: - É, porque você já vai lançando pra eles olharem e prestarem atenção, porque
depois vai ter perguntas para os grupos sobre o outro grupo O grupo que mais ....
P1: - Então você vai tá chamando a atenção de um grupo para fazer perguntas para o
outro.Eu acredito que assim já está preparando para uma avaliação, não é? É
colega?
...
S1: - Bom, mais se for avaliação por que que não pode ser avaliação?
P1: - Eu acho que pode sim.
: - Por que ela acha que não, né? Ela acha que é uma motivação, não é Rose?
P3: - Eu nunca falei que não, mais eu pensei não dá esse nome de avaliação.
P1: - Não, mais a gente não dando, a gente acha assim que através desses games você
pode avaliar.
P3: - Aê, pode.
...
P2: - A apresentação você pode avaliando. Tudo é ... em todo momento você
avaliando. De um jeito ou de outro todas as etapas devem ser avaliadas, né?
67
4.2.6 Dificuldade dos professores
Pouco antes de terminarmos o projeto, as professoras fazem uma reflexão sobre as
dificuldades que as impedem de fazer um trabalho melhor.
P3: - Eu acho bom, só que eu acho pesado pra gente tá procurando tanto material assim.
P2: - Às vezes a gente quer, mas no dia-a-dia não dá.
P1: - Olha, eu quero deixar uma coisa clara aqui, eu vou falar do que eu sinto que é a
maioria do ensino da rede .Não é que a gente tenha preguiça de pesquisar, não é isso.
Nós temos carga dobrada então, se a gente tivesse tempo a gente poderia trabalhar
em grupo, mas também eu não estou justificando, porque eu acho que nada justifica.
que a gente tem uma carga horária tão pesada que não tempo da gente
preparar uma aula boa. A gente tem o material, é só pra pesquisar.A gente tem coisas
boas, não é? A nossa escola tem biblioteca, tem jornal, faz assinatura de bons jornais
.O problema é que nós damos aula todos os dias, matutino e noturno, fora que a
tarde não temos tempo de preparar aula, porque nós temos outras atividades também.
P3: - É e aí a visão dos projetos, você tem que ser muito realista porque a gente tem muitas
idéias boas às vezes até colocar em pratica... nem a gente conta de cumprir com o
que a gente colocou, então eu acho que é pior pra gente é até frustrante.
S1: - ...o que pode facilitar é esse trabalho em conjunto...
...
P1: - Um hum, tanto que esses cursos ajudaram muito a gente, muito mesmo.
S1: - Você acha?
P1: - Muito, a gente tem trocado experiência tá sendo muito, muito legal.
P2: - E na escola, por exemplo, eu leciono de manhã, então eu nunca encontro com a
professora de inglês, porque tem uma no noturno, então não tem jeito de trocar
experiência.
S1: - Vocês fazem um trabalho isolados.
P2: - É, acaba que é isolado.
Ao dizer que acham as propostas e idéias boas e interessantes para trabalhar com seus
alunos, mas que fogem de suas possibilidades, pois implicam dedicação de tempo, de preparo
que elas não dispõem, as professoras demonstram saber exatamente que problemas enfrentam.
Demonstram também ter clareza de que não vão poder responder às expectativas educacionais
e nem as suas próprias se não houver alguma mudança nessa estrutura de trabalho dos
professores.
68
A procura por um curso onde possam de alguma forma começar a pensar como mudar
essa realidade foi a resposta das professoras, pois segundo elas estão isoladas.
4.2.7 O papel dos alunos
Após discutirem sobre suas dificuldades e apontarem suas participações no curso
como uma busca por apoio, as professoras começaram a refletir sobre como os alunos
poderiam atuar mais ativamente nas aulas. A opinião da P4 é que ao trazer material ou até
mesmo produzir tarefas uns para os outros, os alunos estariam aprendendo mais e elas não
ficariam superatarefadas.
P4: - A melhor coisa para desenvolver essa atividade é jogar pra eles, pra ver o que eles
conseguem trazer de material.
S1: - Quer dizer, é um trabalho de colaboração do aluno.
P4: - É.
P3: - Exatamente, eu acho que isso é importantíssimo. Às vezes a gente sabe de um texto ou
daquela música, mas a gente não lembra e eles estão ouvindo música todos os dias.
...
P4: - Por isso que é bom essa apresentação, também nas outras salas, porque eles vão ficar
muito mais bem preparados.
...
P4: - Eles próprios podem está fazendo a cruzadinha, porque às vezes a gente não tem
tempo de trabalhar.
S1: - Um grupo faz cruzadinha pro outro grupo?
P4: - É, eu fiz isso, é muito bom, fiz eu disse, “não preencham ai, é outra turma que
vai resolver”.
As propostas de P4 não são comentadas a fundo e com exceção de P3 as outras
professoras não se manifestam. Na verdade, as propostas de P4 revelam um aprofundamento a
respeito do que elas discutiram, durante a avaliação de material, sobre o perfil do aluno de
hoje. A P4 parece concluir que os alunos não são tão passivos e que esperam também um
ambiente de ações colaborativas, ou seja, esperam um outro modelo de ensino não mais
centrado no professor.
Por tratar-se de uma ação colaborativa em que os conteúdos discutidos poderiam ser
suscitados tanto pelas supervisoras quanto pelas professoras , o que os diferenciou foi o tipo
de reflexão que cada um provocou. O conteúdo das reflexões do processo de produção
69
colaborativa de material didático reflete uma tendência dos professores em manter suas
reflexões no nível técnico e prático, mas com indícios de que buscam uma avaliação das
práticas numa perspectiva social mais ampla.
4.3. Análise das entrevistas
Nesta seção analisamos as entrevistas das professoras, realizadas logo após o término
do curso. Embora as entrevistas tenham ocorrido individualmente, as respostas apresentaram
consonâncias que nos permitiram selecionar dois tópicos como representativos: 1) isolamento
profissional e 2) novos conhecimentos.
4.3.1 Isolamento profissional
A visão das participantes sobre a importância de interagir com colegas e professores
da mesma área revela que parecem acreditar que esse curso pode realmente ajudá-las, já que
se encontram em situação de isolamento profissional. De acordo com as professoras a
possibilidade de trocar experiências, materiais e idéias sobre as questões de dia a dia, pode
motivá-las e ajudar nas resoluções de problemas, muitas vezes análogos.
A P1 avalia o curso como um elemento motivador da melhoria da sua prática. Ela diz
que pretende continuar no ano que vem, no módulo 2, o que nos leva a inferir que ela
considera sua formação como um processo contínuo, pois indicações de que esteja
insatisfeita com o nível de reflexão atingido durante o processo de avaliação e produção
colaborativa de material didático, como podemos conferir no excerto a seguir.
P1 : Eu gostei muito e pretendo continuar no ano que vem no módulo II,
porque... a gente troca tantas experiências que fica até mais motivada para
melhorar ainda mais nossas aulas.
...
Eu acho, tenho a impressão que ano que vem o curso pode ser melhor
ainda, porque ele vai ser mais longo. Assim podemos aprofundar mais um
pouco em todos os assuntos que a gente já viu. Pois nesse semestre o curso
teve praticamente 20h de duração e no semestre que vem terá a duração de
40h, então acho que tudo o que a gente viu vai aprofundar mais.
70
A resposta de P2, assim como a de P3 demonstra claramente como as
professoras valorizam esse contato com professores da mesma área. No caso de
P2 percebemos uma alegria ainda maior, pois além de poder trocar experiências
ela teve oportunidade de rever colegas do tempo da faculdade. Talvez, para P2,
esses encontros não tenham funcionado somente como um ponto de apoio, mas
também como um resgate da sua própria história profissional.
P2 : Foi muito bom, eu gostei! Aqui a gente encontra colegas, daí trocamos
experiências. “
S1 : Você não faz isso na escola?
P2 : Não...não. Porque na escola, nesse período, tem eu de professora de inglês. E aqui
não, a gente encontra professores da mesma área. Às vezes encontra colegas que
estudou junto há muitos anos. Então é diferente.
P3: - Ah! Foi muito bom, foi muito produtivo. Porque eu estava, muito tempo sem ter
contato com professores de inglês...
tem eu de professora de inglês de manhã e à noite. Tem uma à tarde , mas nós não
temos contato. Meu objetivo era trocar idéias, conversar, porque eu acho isso
importante. então assim com esse título eu achei que a gente juntos poderia buscar
soluções, propostas para serem utilizadas em sala de aula no dia a dia mesmo na sala
de aula.
Ao contrário das outras professoras, P4 fala claramente da importância do apoio da
supervisora e do trabalho colaborativo. Ela aponta esse “apoio” recebido no curso como
elemento fundamental para encorajá-la a realizar mudanças. E, embora ela não use o termo
“colaboração”, avalia positivamente os procedimentos no curso, que, segundo ela, “coloca a
gente pra pensar”.
P4: - Nossa! Eu acho que foi muito bom, não porque eu estou aqui perto de você, mas eu
percebi que cresci muito e aprendi também. Eu comecei a olhar o outro lado (...) vocês
mostraram naquele dia que nós avaliamos realmente. Aquilo foi um lado que eu não
tinha olhado. A gente olhou com mais profundidade.
...
P4: - Eu queria agradecer demais. Foi muito bom. Eu acho que a gente aprofundou muito no
assunto. Às vezes a gente chegava quase a, (talvez essa palavra seja um pouco
exagerada) “delirar”, ia no fundo do poço. Eu acho que isso é muito... faz a gente
crescer.
S1: - Os delírios?
71
P4: - É. Coloca a gente pra pensar. Eu acho que a maneira que vocês fizeram isso foi muito
bom, de nos colocar para trabalhar, para pensar.
...
P4: - Eu acho que esse apoio que a gente tem ajuda a encarar e logo tentar
S1: - Encarar a mudança?
P4: - É, a mudança, porque às vezes você fica com medo de achar que será que eu to
fazendo, mudando sozinho? E você; (referindo se a supervisora) não, vai, faz isso!
Então você(eu) cria mais coragem.
Os depoimentos das professoras corroboram os estudos de Celani (2003, p.71) onde a
autora diz haver “uma grande lacuna no atendimento oficial a professores de inglês”. Ela
destaca como cerne do problema o tipo de formação de professores oferecido pelas
universidades e o isolamento em que se encontram os professores em serviço.
4.3.2 Novos conhecimentos
Além de apontar o isolamento profissional como uma das questões que as aflige e,
que, o curso vem de alguma forma ajudar a resolver, as professoras demonstram , também,
ter consciência da necessidade de construir novos conhecimentos. O tema da busca por novos
conhecimentos é uma constante em seu discurso . Elas vêem o curso como um espaço para
seu desenvolvimento profissional, pois têm a oportunidade de se aprofundar. Sobre isso as
professoras relatam o seguinte:
P1: - Temas Transversais, acho que hoje em dia todos os projetos que a gente trabalha
devem estar de acordo com esses temas transversais. Pois é, muitos anos que eu
venho trabalhando, mas eu pensei e resolvi me aprofundar mais, porque a educação, e
não somente a educação tudo, tudo hoje se encontra voltado para isso, entende?
P2: - É porque eu queria adquirir mais conhecimento, novas idéias para mudar um pouco.
Eu gosto de estar mudando para ver se vai melhorando, porque a disciplina hoje em
dia está muito difícil. Então a gente tem que buscar novos caminhos pra ver se faz
melhor.
P3: - Bom, eu achei mais produtivo a questão de a gente analisar os temas transversais, que
no dia a dia a gente não encara pra estudar, porque é cansativo e ninguém gosta da
teoria. Então é por isso que eu achei bom, achei positivo nesse sentido, porque é uma
forma da gente tá tendo a oportunidade de ler, pensar, refletir trocando idéias sobre os
temas transversais.
72
P4: - Eu acho que a gente sempre tem uma dificuldade de tá avaliando todas as coisas , e de
tá aprendendo um pouco mais realmente e tá sabendo escolher melhor, porque às vezes
você acha que algo funciona e às vezes não funciona na prática, então era realmente
pra tá procurando um caminho.
Ao citar os temas transversais, P1 e P3 demonstram, dessa forma, interesse pelo
estudo ou aprofundamento na forma de aplicá-los. Embora P1 afirme trabalhar com
projetos algum tempo, podemos perceber que dúvidas sobre a maneira como ela os
desenvolve e se sua prática está mesmo de acordo com a proposta dos PCNs.
Dentre as muitas críticas formuladas aos PCNs, uma delas parece evidenciar-se na fala
dessa professora. Trata-se do fato de que apesar dos esforços do MEC e de algumas
instituições engajadas na implementação dos PCNs, grande parte dos professores, tanto da
rede particular como da rede pública, tem dificuldades em fazer a transposição didática dos
referenciais teóricos dos PCNs. Segundo Dourado e Obemark (2001), os professores
apresentam dificuldades em entender a maioria dos objetivos do ensino de línguas
estrangeiras e muitos deles ainda desconhecem esses referenciais propostos pelo MEC. De
acordo com Paiva (2003, p.62),
A política nacional para ensino de LE se limita à aprovação da legislação
e à publicação dos PCNs, pois esses textos não são acompanhados de ações
efetivas para valorizar o ensino de nguas. A ausência de preocupação com o
ensino de LE é refletida ainda em outras decisões políticas, tais como a não
distribuição de livros didáticos para o ensino de LE pelo MEC, e a exclusão da
avaliação desse conteúdo nos exames nacionais criados após a LDB de 1996.
Quando P4 diz “... A gente sempre tem uma dificuldade de avaliando
*
todas as
coisas né”, nos permite considerar que a avaliação do material didático lhe possibilita
construir novos conhecimentos que a ajude na sua prática diária. A professora parece perceber
que essa avaliação merece um rigor maior, pois, segundo ela, é importante “...tá sabendo
escolher melhor porque às vezes você acha que algo funciona e, às vezes, não funciona na
prática...”
São vários os estudos (Almeida Filho& Consolo 1990, Consolo 1992, Pereira 2000)
que voltam suas atenções para os livros/materiais didáticos de LE utilizados nas escolas
públicas brasileiras. Observamos que essas pesquisas quase sempre chegam à conclusão de
*
grifo meu
73
que os livros didáticos sob avaliação pouco contribuem para a “construção ou geração de
insumo no cenário da aula de língua estrangeira na escola pública”, (Consolo 1992, p.46). A
fala de P4 nos chama a atenção para o fato, constatado nessas pesquisas, de que o foco na
formação do professor é fundamental, pois, por mais que os livros/materiais didáticos sejam
reformulados, é preciso que o professor tenha condição de avaliá-los para saber adequá-los a
seu contexto. Nas considerações finais de sua pesquisa Consolo (1992, p.46) recomenda que
“se invista na formação de profissionais ligados ao ensino de LE no cenário escolar
brasileiro. O professor tem certamente um papel fundamental no direcionamento das aulas, e
pode utilizar-se de bons materiais...”
P2 comenta que “queria ter novos conhecimentos, novas idéias para mudar um
pouco”. Esse desejo de mudança, ao que nos parece, está diretamente ligado à questão da
indisciplina dos alunos que, segundo ela, é uma das grandes dificuldades encontradas em seu
dia a dia. Ao repetir a palavra novo/nova duas vezes, P2 demonstra saber da necessidade de
buscar nos novos paradigmas, possíveis respostas para os problemas do cotidiano da sala de
aula. A procura por cursos como o de avaliação e produção de material didático, além de
refletir a consciência dessa professora sobre as mudanças do mundo e, conseqüentemente, das
relações sociais, revela também um pedido de socorro, pois detectar a necessidade de
mudança não vem necessariamente seguido por um saber fazer diferente. E nesse sentido o
trabalho colaborativo pode representar um ponto de apoio. Para Faustini (2001,p.214), “uma
grande vantagem do trabalho colaborativo é que a colaboração encoraja a aprendizagem ativa
e uma participação mais reflexiva no processo de aprendizagem de professores e alunos”.
74
CAPÍTULO V
CONSIDERAÇÕES FINAIS
No presente capítulo serão retomadas as perguntas de pesquisa que nortearam este
estudo. Discutiremos também, as limitações de nossa pesquisa, bem como as implicações
para a formação continuada de professores de língua estrangeira e para futuras pesquisas
sobre reflexão e colaboração.
5.1 Retomando as perguntas de pesquisa
O elemento motivador desta pesquisa foi o desejo de contribuir para a formação
continuada de professores de LE. Retomaremos a seguir as perguntas que guiaram nossa
busca em direção a esse objetivo.
5.1.1 Qual o tipo de reflexão e os conteúdos abordados durante o processo de avaliação e
produção colaborativa de material didático?
Ao identificarmos os conteúdos das reflexões, constatamos que elas poderiam ser
organizadas em dois blocos, um relacionado com questões imediatas da sala de aula e outro
voltado para as condições contextuais/sociais que influenciam o ensino. No primeiro bloco
foram colocados os seguintes conteúdos:
organização das unidades do livro didático
conceito de ensinar e aprender uma língua estrangeira
escolha e delimitação do tema
procedimentos - como iniciar o projeto
- utilização da língua materna e da língua-alvo
- organização dos alunos
75
avaliação
objetivos do projeto
Já no segundo bloco temos:
escolha e papel do material didático
visões do projeto político-pedagógico da rede municipal de ensino
análise contextual
dificuldades dos professores
papel dos alunos
Por tratar-se de uma análise em grupo seguida de planejamento, as reflexões que
prevaleceram foram as denominadas antes da ação. Contudo, em vários momentos as
professoras refletem sobre ações passadas como subsídio para avaliarem as ações futuras que
estão sendo definidas.
Tendo identificado o conteúdo das reflexões, passamos a sua localização quanto aos
níveis alcançados. Os resultados indicaram a presença dos três níveis de reflexão, com maior
incidência do nível prático. A reflexão técnica pôde ser percebida quando as discussões foram
a respeito da escolha e delimitação do tema, de como iniciar o projeto e dos objetivos do
projeto. Nesses momentos notamos uma tendência a colocar em prática algo que foi tido
como certo. A preocupação maior era com a eficiência dos resultados. Já a reflexão prática
esteve presente em todos os outros conteúdos, pois é possível perceber, nos mesmos, uma
centralização nas necessidades funcionais e a busca pela compreensão de fatos. Com exceção
da discussão a respeito de ensinar e aprender uma ngua estrangeira, os outros conteúdos
foram avaliados sem nenhuma relação com teoria formal. Entretanto, algumas referências
a questões conjunturais que indicam uma tentativa de contextualizar os problemas e eventos
da prática. Por fim, identificamos a presença da reflexão crítica ainda que de forma tímida e
desorganizada. As professoras, em alguns momentos, além de identificar as contradições
presentes nas ações educacionais, demonstram engajamento na reorganização das próprias
ações. Como exemplo, temos o momento em que as professoras estão discutindo sobre a
escolha do livro didático, e também sobre a organização das unidades, abordando questões de
estereótipo sobre família e, ainda, quando falam das limitações profissionais impostas pelas
políticas educacionais.
76
Na verdade, não objetivamos dizer onde começa ou termina um ou outro nível de
reflexão. Procuramos sim, identificar, a partir dos conceitos de Van Manen (1977) sobre
níveis de reflexão, sua presença durante o processo de avaliação e produção colaborativa de
material didático. À vista disso, acreditamos que ambientes onde a ação colaborativa ocorre
têm grandes chances de propiciar reflexões críticas com dimensões político-epistemológicas
(Pimenta, 2002).
5.1.2 Quais as percepções dos sujeitos de pesquisa a respeito da relevância do processo
de avaliação e produção colaborativa de material didático, para sua formação
continuada?
Quando questionadas sobre a relevância do processo de avaliação e produção
colaborativa de material didático para sua formação continuada, as professoras pareceram
avaliá-lo conforme as necessidades que sentiam ou que lhes eram impostas pela conjuntura
social e econômica. Segundo Contreras (2002,p.151)
São cada vez maiores as funções atribuídas ao ensino, pretendendo-se que
os docentes atendam a esferas da educação cada vez mais difusas e ambíguas
(Ortega,1992), e onde se espera que a educação respostas a problemas cada
vez mais complexos sobre as crises econômicas, sociais e culturais de nossa
sociedade (Apple, 1989b). Isto faz com que aumente nos professores o
sentimento de responsabilização e culpa em relação ao que no fundo são
problemas complexos de ordem institucional e social (Smyth, 1987b).
A busca por pares mais competentes (Vygotsky, 1996) foi apresentada pelas
professoras como uma saída para enfrentarem os problemas que se apresentam no dia-a-dia
da sala de aula. Evidencia-se em suas avaliações um pedido de socorro, tanto para as ações de
ordem prática quanto para as teóricas. Querem construir juntas conhecimentos que possam
auxiliá-las a desconstruir práticas e conceitos, por isso buscam o aprofundamento num
documento (PCNs de LE) que se faz presente pelo que representa hierarquicamente.
Talvez a importância atribuída ao trabalho colaborativo esteja também
relacionada à crise de identidade lingüística sugerida por Rajagopalan (2003), conforme
discutimos no início deste trabalho. Nos questionamos se essa busca espontânea das
professoras por um curso dessa natureza não seria, também, uma tentativa de redescoberta da
disciplina que ministram e, conseqüentemente, da própria profissão.
77
5.2 Implicações deste estudo para a formação continuada de professor de LE
O trabalho de avaliação e produção colaborativa de material didático, apesar de partir
de uma questão diretamente ligada ao contexto de sala de aula, não pretendeu limitar-se a
este, mas sim tomá-lo como ponto de partida. Ao apresentarem a necessidade de
aprofundamento, as professoras demonstram que as avaliações e produções realizadas
colaborativamente despertaram o desejo de ir além do senso comum em suas reflexões.
Contudo, esta experiência configura-se apenas como uma das fases para uma formação
reflexiva, tendo em vista que, de acordo com alguns autores (Dewey,1959; Schön,1987;
Wallace,1991) para que haja reflexão é preciso haver um movimento cíclico em que os
professores estejam continuamente refletindo sobre questões teóricas e práticas, de maneira
que uma seja elemento motivador para a revisão da outra.
O paradigma reflexivo além de prever fases, tais como as apresentadas por Schön
(1987), pauta-se também e principalmente pela possibilidade de levar os professores a refletir
intencionalmente e colaborativamente a partir da prática. As reflexões produzidas durante o
processo de avaliação e produção colaborativa de material didático demonstram que esse
espaço configura-se como lugar para que o professor exponha os pontos de vista e
redimensione seus objetivos, colocando-os em negociação permanente. Ao terem a
oportunidade de participar de discussões que lhes possibilitem refletir sobre suas ações com
outros olhos, os docentes abrem possibilidades para que essas ações tenham um novo
significado à medida que são relacionadas com contextos além da sala de aula e da escola.
Além disso, segundo Comeaux (1991), ao propiciarmos a aprendizagem colaborativa e a
discussão a respeito da sua relevância, podemos estar dando aos professores a oportunidade
de refletir sobre conhecimento e ensino. Assim, os resultados desta pesquisa corroboram as
sugestões de outras pesquisas (Ortenzi, 1997 e Pessoa, 2002) que mostram que as professoras
necessitam de espaços como esse, pois têm muito a refletir sobre suas ações, muito a
aprender com o outro e também muito a contribuir no que diz respeito às questões
educacionais.
5.3 Limitações desta pesquisa e sugestões para pesquisas futuras
No decorrer desta pesquisa, nos deparamos com algumas limitações. A primeira delas
refere-se à coleta de dados. Nesse caso, tanto o processo de avaliação quanto o de produção
78
de material didático foram aligeirados em função de mudanças no calendário do Projeto de
Extensão Comunitária de Ensino de Línguas Estrangeiras (PECEC-LEs). Assim, a quantidade
de materiais analisados foi reduzida e somente um projeto foi produzido, sendo que a
proposta inicial era que as professoras rediscutissem suas avaliações e produções. Embora
esse fato não tenha inviabilizado a pesquisa, sentimos que o aprofundamento das reflexões
ficou comprometido, como foi exposto pelas próprias participantes.
Outra limitação diz respeito ao número pequeno de sujeitos, não permitindo maiores
generalizações desta pesquisa. Todavia, acreditamos que as discussões produzidas podem ser
úteis para a realização de outros estudos sobre a formação continuada de professores de
língua estrangeira.
Sugerimos, então, que sejam realizados estudos mais aprofundados a respeito de
processos de ações colaborativas entre professores. Sugerimos também, como continuidade
para esta pesquisa, a investigação dos efeitos das reflexões produzidas durante os processos
de avaliação e produção colaborativa de material didático, na prática pedagógica dos
professores. E finalmente, propomos que também as reflexões dos professores formadores,
geradas em processos colaborativos, possam ser foco de investigação, pois a posição de
formador não os isenta de rever seus conceitos e posicionamentos.
5.4 Considerações finais
As tarefas colaborativas propostas durante este estudo ofereceram aos sujeitos um
contexto de aprendizagem que lhes propiciou o engajamento no processo de reflexão sobre a
prática pedagógica de uma maneira interativa. Assim, com base no que foi discutido e nos
estudos de outros pesquisadores (Celani, 2003; Comeaux,1991), que vêem a ação
colaborativa como componente importante para a formação (inicial ou continuada) dos
professores, acreditamos ser este um processo que pode propiciar a desconstrução de vários
conceitos e principalmente dos conceitos de ensino-aprendizagem, levando-nos na direção do
que diz Paulo Freire (1996, p.25)
É preciso que, pelo contrário, desde os começos do processo, ficando
cada vez mais claro que, embora diferentes entre si, quem forma se forma e re-
forma ao formar e quem é formado forma-se e forma ao ser formado. É neste
sentido que ensinar não é transferir conhecimentos, conteúdos, nem formar é
ação pela qual um sujeito criador dá forma, e estilo ou alma ao corpo indeciso e
acomodado.
79
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86
ANEXOS
QUESTIONÁRIO INFORMATIVO – ANEXO 1
Nome completo:_____________________________________________________________
Idade: __________ Instituição e ano de conclusão de graduação: ______________________
Endereço: _________________________________________________________________
Telefone: __________________________________________________________________
Escola: ____________________________________________________________________
Endereço da escola: __________________________________________________________
Telefone: __________________________________________________________________
Turno: ____________________________________________________________________
Seriação ou ciclagem: ________________________________________________________
Mês/ano de admissão como professor (a) de inglês na rede municipal de ensino: __________
__________________________________________________________________________
Outras instituições em que leciona (especificar o tempo de trabalho em cada uma): ________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
87
QUESTIONÁRIO INICIAL – ANEXO 2
1) Ensinar Língua Estrangeira é...
2) Ensinar uma Língua Estrangeira envolve ...
3) Qual o papel do professor de Inglês?
4) Enumere de 1 a 6 as atividades abaixo, de acordo com o grau de relevância das
mesmas no seu trabalho diário em sala de aula.
( ) Reading
( ) Speaking
( ) Listening
( ) Writing
( ) Grammar
( ) Translation
Por que? ________________________________________________________
5) Você considera o livro didático o instrumento chave para o ensino de línguas? Por
quê?
6) Que materiais você sugeriria para ser usado nas aulas de línguas? Por quê?
88
TRANSCRIÇÃO DAS ENTREVISTAS – ANEXO 3
Entrevista com P1:
S1: - O que te levou a vir fazer esse curso de avaliação e produção de material didático?
Por que você escolheu fazer esse curso?
P1: - Por causa do título, Temas Transversais, acho que hoje em dia todos os projetos que a
gente trabalha devem estar de acordo com esses temas transversais. Pois é, há muitos anos
que eu já venho trabalhando, mas eu pensei e resolvi me aprofundar mais, porque a
educação e o somente a educação, tudo, tudo hoje se encontra voltado para o ensino,
entende?!
S1: - Então você veio em busca de um aprofundamento relativo aos PCNs, e como foi
participar desse curso?
P1: - Eu gostei muito e pretendo continuar no ano que vem no módulo II, porque...
S1: - Você acha que o curso atendeu essa tua expectativa?
P1: - Eu acho, principalmente nesse finalzinho com esse projeto que nós apresentamos hoje,
porque eu estava acostumada a fazer projeto para trabalhar, mas era um projeto para se
trabalhar durante o ano todo, o semestre , o bimestre; e de repente foi tão fácil desenvolver
esse projeto da “Água”, rápido e fácil de desenvolver, o que facilita a sua aplicação.
S1: - Então você estava me dizendo que esse projeto é diferente do que você estava
acostumada a desenvolver...
P1: - É porque eu estava costumada a trabalhar um projeto mais longo, que abrangesse mais
subtemas e que durava quase o ano todo, um semestre ou um semestre. Daí eu percebi que
eu posso trabalhar um projeto menor, que gaste menos tempo , tanto para elaborar quanto
para ser aplicado. E que dá resultado, você percebe na produção dos meninos.
S1: - Especificamente, o que você acha que foi mais produtivo nesse curso, para você, ou
menos produtivo?
P1: - Bom, muitos anos atrás quando eu já estava terminando meu curso, nós vimos essa
parte de análise de livros que eu acho muito importante. Com o tempo, como eu fiquei
muito tempo sem trabalhar com livro em sala de aula, a gente fez questão até de como
analisar livros, então essa parte eu também achei muito importante, fazer análise de livro.
E do projeto também eu achei muito importante, tudo o que a gente viu.
S1: - Você daria alguma sugestão na organização desse tipo de proposta de produção e
avaliação de material, na organização mesmo do curso. Que sugestão você daria?
P1: - Para o curso?! Eu acho, tenho a impressão que ano que vem o curso pode ser melhor
ainda, porque ele vai ser mais longo. Assim podemos aprofundar mais um pouco em todos
os assuntos que a gente viu. Pois neste semestre o curso teve praticamente 20h de
89
duração e no semestre que vem terá a duração de 40h, então acho que tudo o que a gente
viu vai aprofundar mais, inclusive dá pra gente ver mais coisas.
S1: - Você acha que houve mudança na sua prática que foi reflexo dessas discussões, você
acredita que isso provocou mudança na tua sala de aula, na tua postura?
P1: - Provocou sim, eu acho que quando a gente participa desses encontros, a gente fica mais
motivada, a gente trocou muitas experiências em todos os cursos. A gente troca tantas
experiências que fica até mais motivada para melhorar ainda mais nossas aulas.
S1: - Você disse que trabalhou um tempo com projetos sem o livro didático. Na sua
opinião, você acha que o trabalho com o livro didático facilita? O que você pensa a
respeito do uso ou não do livro didático?
P1: - Eu acho que ele facilita e os meninos sentem a necessidade de ter o livro como apoio, mas
eu não gosto de ficar muito presa ao livro; e na prefeitura a gente tem essa liberdade de
voltar, ir pra frente, voltar novamente, esse é um ponto positivo. Agora um ponto negativo
é você ficar muito presa ao livro!
Entrevista com P2:
S1: - Eu quero saber por que você veio/resolveu fazer esse curso: “Produção e avaliação
de material didático”?
P2: - É porque eu queria adquirir mais conhecimento, novas idéias para mudar um pouco. Eu
gosto de estar mudando para ver se vai melhorando, porque disciplina hoje em dia está
muito difícil. Então a gente tem que buscar novos caminhos pra ver se faz melhor, né?
S1: - E como é que foi esse curso para você? Você encontrou o que você esperava?
P2: - Foi muito bom, eu gostei! Aqui a gente encontra colegas, daí trocamos experiências.
S1: - Você não faz isso na escola?
P2: - Não...não. Porque na escola, nesse período, tem eu de professora de inglês. E aqui não,
a gente encontra professores da mesma área. Às vezes encontra colegas que estudou
junto a muitos anos. Então é diferente.
S1: - O que você acha que foi mais produtivo ou menos produtivo nesse curso?
P2: - Achei que foi tudo muito bom.
S1: - Ah é, se você pudesse dar uma sugestão na organização desse curso, o que você
sugeriria?
P2: - Bom eu mudaria o início, foi um pouco monótono, depois foi que você foi pegando o
teórico, depois você foi assim melhorando, no final foi ótimo.
90
S1: - Você acha que na sua prática em sala de aula aconteceu alguma mudança que foi
reflexo desse curso, das reflexões que a gente fez ali ou não, você acha que ainda não
deu tempo?
P2: - Não deu tempo ainda, o tempo é pouco, tivemos pouco tempo por causa do conselho e
tudo que acaba virando um tumulto, então o tempo da gente tem que ser ano que vem.
S1: - Você trabalha com o livro didático?
P2: - Não, na prefeitura a gente não tem.
S1: - E o que você acha desse trabalho? Na sua opinião tem que ter o livro didático, o que
você acha disso?
P2: - Eu gosto de trabalhar com o livro didático, porque o aluno tendo o material em mãos é
diferente, dá para você traduzir mais. Agora quando você depende de levar um texto, você
conseguir editar e passar a tempo de você trabalhar, eu digo não não sai na hora que você
precisa, tudo isso impede que você trabalhe mais rápido.
S1: - Falando sobre o projeto que vocês desenvolveram, de que forma você trabalharia
esse projeto de acordo com a sua realidade?
P2: - Tá, porque é um termo que pode ser trabalhado sempre. Eu acho que desde o início do ano
até o final.
S1: - Você acha que os alunos vão ter interesse?
P2: - Eu acho que sim, porque a água é algo que está presente na nossa vida.
S1: - Tudo bem, e teria alguma coisa que você gostaria de sugerir, de acrescentar?
P2: - Na verdade, eu gostei muito e gostaria de agradecer a oportunidade de poder participar do
encontro.
Entrevista com P3:
S1: - Por que você veio fazer esse curso de produção e avaliação de material didático? O
que te chamou atenção? O que te levou a fazer esse curso?
P3: - Por que eu estava, muito tempo sem ter contato com professores de inglês e eu acho
isso importante, aí surgiu a oportunidade de fazer esse curso.
S1: - Na sua escola você não tem contato com outros professores?
P3: - Não, tem eu de professora de inglês de manhã e à noite. Tem uma à tarde, mas nós não
temos contato, então meu objetivo era trocar idéias, conversar porque eu acho isso
importante então assim com esse título eu achei assim que a gente juntos poderia buscar
soluções propostas para serem utilizadas em sala de aula no dia a dia mesmo na sala de
aula.
S1: - Aquela coisa meio prática, né?
91
P3: - Assim eh, eu vim por isso, né.
S1: - E como foi participar?
P3: - Ah! Foi muito bom, foi muito produtivo.
S1: - Você participou de vários grupos, né?
P3: - É, e todos foram ótimos, positivos, eu acho que todo contato que a gente tem toda troca de
idéias, tudo é valido, material assim, tudo né.
S1: - Un hum, mas assim pra você nesse curso específico teve alguma coisa que foi mais
produtivo ou algo que foi menos produtivo, o que você sentiu que foi mais ou menos
produtivo aí?
P3: - Bom, eu achei mais produtivo a questão de a gente analisar os temas transversais, que no
dia a dia a gente não encara pra estudar, porque é cansativo e ninguém gosta da teoria.
Então é por isso que eu achei bom, achei positivo nesse sentido, porque é uma forma da
gente tá tendo a oportunidade de ler, pensar, refletir trocando idéias sobre os temas
transversais.
S1: - jóia. Você tem alguma sugestão na organização desse curso? Você acha que ele
poderia ser organizado de uma outra forma? O quê que você sugere?
P3: - A sugestão que eu tenho assim é que nós fizemos o projeto na última aula, né, eu achei
meio atropelado, então a sugestão que eu daria é pra gente fazer assim mais projeto, né, a
questão de produção mesmo dos projetos que eu achei muito bom.
S1: - Aham, começar mais cedo a produção de projeto, gastar mais aulas.
P3: - Anhan, isso
S1: - Você sentiu alguma mudança na tua pratica, você acha que houve alguma mudança
na tua prática de sala de aula, decorrente desse contato aqui com esse grupo ou
dessas reflexões que você fez durante esse curso? Você acha que alguma coisa refletiu
na tua pratica? O que exatamente? Se não...
P3: - Olha, o tempo ainda é curto porque a mudança ela é meio lenta mesmo né, mas assim por
exemplo o projeto eu já tô pensando em aplicar.
S1: - É?
P3:- É, e já houve assim uma pequena mudança de minha parte, porque a gente para pra pensar
um pouco sobre o que foi discutido, por exemplo deixa eu se eu consigo te explicar,
quando vai ministrar a aula mesmo antes a gente tenta parar um pouco, pensar antes, né,
planejar melhor.
S1: - Pensou no que foi discutido?
P3: - Isso, nos temas principalmente.
S1: - E como é que é, você trabalha com livros didáticos?
P3: - Eu comecei em setembro, porque os livros chegaram em agosto, , e em setembro eu
comecei é a primeira experiência que tenho com livro didático.
92
S1: - Como é que foi, deu muito trabalho, ou você prefere trabalhar sem livro? Como é
que foi?
P3: - Olha, eu achei bom, porque é uma forma dos alunos terem contato com material mais
original, vamos dizer assim, porque antes não tinha contato nenhum, nem com livro, nem
com dicionário, nem com nada, né, que não pra você ficar no livro didático, é
cansativo, eu percebi isso, né, cansa um pouco.
S1: - Você acha que da pra trabalhar com projeto e com livro?
P3: - Acho que sim, até quando você propõe trabalhar um projeto, você pode buscar ajuda
no livro, , se tem alguma coisa ou se não você deixa o livro de lado, né, o livro é
ótimo, ajuda muito.
S1: - Mas você não acha que de alguma forma ele pode restringir a atenção do professor?
P3: - depende do professor, né, de como que ele vai usar o livro, né, se ele, e também assim
de toda equipe, porque assim na prefeitura a gente fica bem à vontade com o livro, a gente
não tem que seguir o livro, então não tem assim aquela cobrança, né, então é muito
positivo, por exemplo, lá onde que eu tô, eu fico muito a vontade com o livro, isso é muito
bom, então da pra você tomar iniciativa, então não tá legal você muda a prática.
Entrevista com P4:
S1: - O que te levou a vir fazer esse curso? Por quê?
P4: - Por que eu acho que a gente sempre tem uma dificuldade de tá avaliando todas as coisas,
né, e de tá aprendendo um pouco mais realmente, né e tá sabendo escolher melhor porque
às vezes você acha que algo funciona e às vezes não funciona na prática, então era
realmente pra tá procurando um caminho, né.
S1: - Uma forma de poder avaliar esse material que você usa.
P4: - Uh hum, porque às vezes você usa um material e acha que tá bom, né, mas você percebe
também que não tem um resultado tão bom assim né, no fundo no fundo é porque o
material não deve ser tão bom né.
S1: - Ou adequado.
P4: - É!
S1: - E como foi participar dessa produção, dessa avaliação colaborativa com o pessoal,
com o grupo?
P4: - Nossa! Eu acho que foi muito bom, não porque eu estou aqui perto de você, mas eu
percebi que cresci muito e aprendi também. Eu comecei a olhar o outro lado (...) vocês
mostraram naquele dia que nós avaliamos realmente. Aquilo foi um lado que eu não tinha
olhado. A gente olhou com mais profundidade.
93
S1: - Especificamente, o que você acha que foi mais produtivo e menos produtivo nesse
projeto?
P4: - Eu acho que deveríamos ter mais tempo para ter visão mais (?)... aí nós poderíamos estar
analisando outros materiais, eu acho que a gente avaliou pouco, eu vi, mas será que eu vou
conseguir avaliar sozinha aquilo depois, então eu acho que a se a gente tivesse se
encontrado mais vezes, certamente teria sido bem melhor.
S1: - Você pretende fazer o módulo II?
P4: - Que sugestão você daria então para que ... do curso? Talvez seria o uso do livro. Não,
acho que é isso mesmo.Acho que tem dar continuidade.
S1: - Você Acha que houve alguma mudança na sua prática em, função das reflexões que
você fez no curso? Você acha que houve reflexo, você sentiu isso? Você pensou a
respeito disso?
P4: - Houve, tanto é que durante as aulas quando eu perguntava, será que eu posso, será que
está mudando (lá na frente no fim do livro) e você sempre colocava e dava aquele apoio:
___ não vai, continua. Esse eu tô dando um exemplo, mas muitas vezes eu fiz isso. Eu
acho que esse apoio que a gente tem ajuda a encarar e logo tentar, né?!
S1: - Encarar a mudança?
P4: - É, a mudança, porque às vezes você fica com medo de achar, será que eu só tô fazendo,
mudando sozinho? E você; (referindo se a supervisora) não, vai, faz isso! Então você(eu)
cria mais coragem.
S1: - Você sentiu na tua sala de aula ou não sentiu? Um resultado dos alunos...
P4: - Tentei mudar, eu acho que foi assim, do meio do ano foi o quê? Setembro quase, então foi
pouco tempo, mas eu acho que no ano que vem da pra colocar isso mais em prática.
S1: - Você se sente melhor trabalhando c livro didático ou com esse material que
produzimos? Você acha que dá pra trabalhar os dois juntos? Como é que você vê
isso?
P4: - Eu acho que só o livro didático não é bom, eu acredito que é bom ter sempre um apoio.
Livro didático porque, por enquanto, os pais ainda precisam, eles acham que o aluno
precisa disso, mas acho que podemos trabalhar com os dois. Eu queria agradecer demais.
Foi muito bom. Eu acho que a gente aprofundou muito no assunto. Às vezes a gente
chegava quase a, (talvez essa palavra seja um pouco exagerada) “delirar”, ia no fundo do
poço. Eu acho que isso é muito... faz a gente crescer.
S1: - Os delírios?
P4: - É. Coloca a gente pra pensar. Eu acho que a maneira que vocês fizeram isso foi muito
bom , de nos colocar para trabalhar, para pensar…
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