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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Anegreice Valério
A constituição da Teoria da Mente: estudo longitudinal sobre uso de termos mentais em
situação lúdica e desempenho em tarefas de crença e crença falsa.
DOUTORADO EM EDUCAÇÃO: PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO
Tese apresentada à Banca Examinadora da
Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo, como exigência parcial para obtenção
do título de Doutor em Educação: Psicologia
da Educação, sob a orientação da Profª. Drª.
Maria Regina Maluf.
SÃO PAULO
2008
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Banca Examinadora
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Agradecimentos
À Profª Drª Maria Regina Maluf, orientadora sempre presente, pela dedicação,
incentivo e apoio constantes.
À Profª Drª Yara Castro por sua disposição em nos atender e contribuir com seus
conhecimentos estatísticos e ao LIAP / PUC que tem fornecido ajuda aos pós-graduandos ao
possibilitar a assessoria da Profª Yara.
Às Profª Drª Acácia A. A. dos Santos, Profª Drª Maria das Graça B. B. Dias, Profª Drª
Tânia M. Sperb e Profª Drª Wanda M. J. Aguiar, pelas contribuições feitas no exame de
qualificação.
À Profª Drª Sara Del Prete Panciera, pela valiosa contribuição no julgamento das
manifestações verbais das crianças.
À Maura, Simone, Cilene, Maria José e Fernanda pelo companheirismo e pelas valiosas
“dicas”.
Aos membros da escola que abriu as portas para que este estudo se realizasse: diretores
Profª Marlene O. R. Vieira e Profº Drº Alexandre T. Vieira, pela acolhida e apoio;
professoras Sandra, Daniela, Débora, Cássia, Rosete, Leila, Eliane e Ana Paula por
generosamente terem me aproximado das crianças; equipe técnica e administrativa da escola
Mary, Janaína, Jeane, Isabel Cristina por todo apoio logístico e informações concedidas.
Ao meu marido e minha filha, que me ampararam durante todo o percurso.
E, principalmente, às surpreendentes e extraordinárias crianças que participaram deste
estudo: por me permitirem rir, brincar, vibrar e aprender com elas.
Agradecemos o apoio da CAPES, que financiou parte desta pesquisa.
RESUMO
VALÉRIO, A. (2008). A constituição da Teoria da Mente: estudo longitudinal sobre uso
de termos mentais em situação lúdica e desempenho em tarefas de crença e crença falsa.
199 p. Tese (doutorado) - Programa de Estudos Pós-graduados em Educação: Psicologia da
Educação, Pontifícia Universidade de São Paulo, São Paulo.
Compreender estados mentais como desejos, emoções e crenças é importante para o êxito de
nossas relações cotidianas. A aquisição e o desenvolvimento dessa habilidade são aspectos
que têm sido estudados sob o nome de Teoria da Mente. Estudar as primeiras manifestações
dessa compreensão pode colaborar para entender esse desenvolvimento. A presente pesquisa
é um estudo longitudinal com o objetivo central de examinar a constituição da teoria da
mente das crianças. Outro objetivo, de caráter prático, é oferecer subsídios para a promoção
de atividades escolares favorecedoras desse desenvolvimento. Participaram da pesquisa 58
crianças, 29 meninos e 29 meninas, entre 1a11m e 3a7m, de uma escola de educação infantil
que atende crianças de NSE médio e alto. Os participantes foram acompanhados por 18
meses, em quatro coletas, com intervalos de 6 meses, por meio de dois procedimentos: a)
observações em situações lúdicas - as crianças foram vídeo-gravadas brincando em grupos de
quatro; b) aplicação de tarefas - as crianças responderam individualmente a tarefas de crença
e crença falsa. As verbalizações foram transcritas, submetidas ao software SPAD-T para
tratamento e categorizadas segundo o tipo de atribuição de estados mentais. O desempenho
nas tarefas foi submetido à Análise Fatorial. Os resultados mostraram que as atribuições mais
precoces de estados mentais ao outro ocorreram aos 2a5m (emoção), 2a7m (desejo) e 3a2m
(crença). Foram encontradas diferenças em relação ao período de aquisição de termos
relativos à crença. Os termos mentais mais utilizados foram os verbos gostar, querer e saber.
Outras palavras utilizadas com freqüência foram medo, feliz e triste no final do segundo ano
de vida e pensar, conhecer, mentir e enganar durante o terceiro ano. A análise fatorial
revelou que houve influência da idade nesse desenvolvimento e encontrou diferentes perfis
de desenvolvimento. Os resultados dos dois conjuntos de dados (manifestações verbais e
desempenho em tarefas) foram utilizados na análise intra-individual de 10 participantes e, em
todos os casos, se complementaram na explicação do comportamento de cada criança.
Palavras-chave: crença falsa; teoria da mente; desenvolvimento cognitivo; educação infantil.
ABSTRACT
VALÉRIO, A. (2008). A constituição da Teoria da Mente: estudo longitudinal sobre uso
de termos mentais em situação lúdica e desempenho em tarefas de crença e crença falsa.
199 p. Tese (doutorado) - Programa de Estudos Pós-graduados em Educação: Psicologia da
Educação, Pontifícia Universidade de São Paulo, São Paulo.
Understanding mental states such as desires, emotions and beliefs is important for the
success to our every Day relationships. The acquisition and development of this ability are
aspects that have been studied under the name of theory of mind. To study the first
manifestations of this comprehension can enable to understand this development. The central
objective of this research is to examine the constitution of children’s theory of mind. Another
objective, a practical one, is to offer assistance for the promotion of activities that favor this
development. 58 preschool children of a medium-high socioeconomic level, 29 boys and 29
girls between 1;11 to 3;7 year-olds, were followed for 18 months in 4 gatherings with
intervals of 6 months through two procedures: a) observation in playful situation – kids were
videotaped playing in groups of 4; b) they were given tasks, kids answered individually to
tasks of belief and false belief. Verbalizations were typed and submitted to software SPAD-T
for treatment and categorization according to the type of attribution of mental states. The
performance in the tasks was submitted to the Factorial Analysis. The results showed that the
attributions more precocious of mental states to the other one happened at 2 years 5 months
(emotion), 2 years and 7 months (desire) and 3 years and 2 months (belief). Differences were
found in relation to the period of acquisition in terms related to belief. The most used terms
were the verbs gostar (to like), querer (to want) and saber (to know). Other words frequently
used were medo (fear), feliz (happy) and triste (sad) at the end of the second year of life and
pensar (to think), conhecer (to know), mentir (to lie) and enganar (to cheat) during the third
year of life. The factorial analysis revealed that there was age influence in this development
and found different profiles of development. The results of both groups of data (verbal
manifestations and task performance) were used in the intra-individual analysis of 10
participants and, in all cases, were complemented in the explanation of the behavior of each
child.
Key words: Theory of mind; false-belief; cognitive development; children’s preschooler
education.
Sumário
Página
Índice de Tabelas ......................................................................................................................... i
Índice de Figuras .......................................................................................................................... i
Índice de Anexos .......................................................................................................................... ii
Apresentação ..............................................................................................................................
1
1. Referencial Teórico ...........................................................................................................
4
1.1 Teoria da Mente: quadro geral .................................................................................. 4
1.2 Relações entre linguagem e compreensão de estados mentais: o papel da cultura .... 5
1.2.1 A linguagem como elemento importante na aquisição de uma teoria da
mente ..............................................................................................................
7
1.3 Manifestações da compreensão de estados mentais: recursos de pesquisa ............... 14
1.3.1 A atribuição de estados mentais manifestada pelo uso de termos mentais .... 14
1.3.2 A atribuição de estados mentais manifestada por tarefas .............................. 20
1.3.2.1 Atribuição de crença e crença falsa ............................................... 20
1.3.2.2 Distinção entre aparência e realidade ............................................ 33
1.4 O uso simultâneo dos dois recursos: uma combinação possível ............................... 36
1.5 Estudos longitudinais ................................................................................................. 37
2. Problema e Objetivos ........................................................................................................
42
3. Método ................................................................................................................................
46
3.1 Local e Participantes .................................................................................................. 46
3.2 Delineamento da pesquisa ......................................................................................... 47
3.3 Instrumentos e Procedimentos ................................................................................... 47
3.3.1 Observação das crianças em situações lúdicas em pequenos grupos ............ 47
3.3.2 Aplicação individual de tarefas de crença e crença falsa ............................... 49
3.3.3 Cuidados metodológicos e éticos ................................................................... 51
3.4 Procedimentos de Análise .......................................................................................... 51
3.4.1 Dados provenientes da observação das crianças em situações lúdicas .......... 51
3.4.1.1 Construção dos critérios de análise ............................................... 51
3.4.1.2 Tratamento dos dados .................................................................... 55
3.4.2 Dados obtidos pela pontuação das crianças nas tarefas ................................. 60
4. Resultados ..........................................................................................................................
61
4.1 Resultados obtidos pela observação das crianças em situações lúdicas, em grupos 61
4.1.1 Manifestações da atribuição de desejo ao outro ............................................ 65
4.1.2 Manifestações da atribuição de emoção ao outro .......................................... 77
4.1.3 Manifestações da atribuição de caráter ao outro ............................................ 87
4.1.4 Manifestações da atribuição de crença ao outro ............................................ 90
4.2 Resultados obtidos pela aplicação individual de tarefas crença e crença falsa ......... 104
4.2.1 Distribuição dos participantes em três clusters .............................................. 105
4.2.2 Distribuição dos participantes em sete clusters ............................................. 108
4.3 Estudos de caso: análise intra-individual de algumas crianças ................................. 111
4.3.1 Ausência de manifestações verbais com algum tipo de atribuição de
estados mentais ao outro, ao longo da duração do estudo ............................
112
4.3.2 Pontuações mais baixas nas tarefas, considerando-se a somatória de todas
as tarefas aplicadas .......................................................................................
113
4.3.3 Manifestações verbais de atribuições de crença ao outro desde a primeira
coleta .............................................................................................................
115
4.3.4 Manifestação mais precoce da atribuição ao outro de emoção, desejo ou
crença ............................................................................................................
117
4.3.5 Pontuações mais altas nas tarefas, considerando-se a somatória de todas as
tarefas aplicadas ............................................................................................
119
4.3.6 Síntese 120
Conclusões e Considerações Finais ...........................................................................................
122
Referências Bibliográficas .........................................................................................................
134
Anexos .........................................................................................................................................
140
Índice de Tabelas
Tabela 1 -
Exemplos de histórias utilizadas nas diferentes tarefas para avaliação da
capacidade de atribuição de crença ao outro (Weelman & Bartsch, 1998) .. 29
Tabela 2 -
Distribuição das quatro coletas ao longo dos 18 meses do estudo ............... 47
Tabela 3 -
Histórias escolhidas, por coleta, com explicitação dos personagens ............ 49
Tabela 4 -
Distribuição das tarefas aplicadas por coleta ................................................ 50
Tabela 5 -
Número de sessões e total de participantes por coleta .................................. 55
Tabela 6 -
Comparativo das locuções verbais expressas nas quatro coletas, por
participante .................................................................................................... 61
Tabela 7 -
Número de crianças que expressaram os diferentes tipos de compreensão
de estados mentais (desejo, emoção, caráter e crença) ao longo do estudo .. 63
Tabela 8 -
Medidas descritivas das idades dos participantes por cluster, na
distribuição em três clusters .......................................................................... 105
Tabela 9 -
Medidas descritivas das idades dos participantes por cluster, na
distribuição em sete clusters ......................................................................... 108
Índice de Figuras
Figura 1 -
Esquema representativo do raciocínio crença-desejo (Wellman e Bartsch,
1988:241) ...................................................................................................... 27
Figura 2 -
Esquema explicativo dos critérios para escolha e classificação das
manifestações orais das crianças ................................................................... 52
Figura 3 -
Esquema explicativo dos critérios definitivos para escolha e classificação
das manifestações orais das crianças ............................................................ 54
Figura 4 -
Nuvem de pontos com a distribuição dos participantes nos três clusters .....
105
Figura 5 -
Média das idades por cluster, em três clusters .............................................. 106
Figura 6 -
Média do número de acertos por coleta, em três clusters ............................. 106
Figura 7 -
Nuvem de pontos com a distribuição dos participantes nos sete clusters ..... 108
Figura 8 -
Média das idades por cluster, em sete clusters ............................................. 109
Figura 9 -
Média do número de acertos por coleta, em sete clusters ............................. 109
i
Índice de Anexos
Anexo 1 -
Histórias contadas para as no início das sessões lúdicas nas quatro
coletas: texto integral das versões utilizadas ............................................. 140
Anexo 2 -
Tarefas de atribuição de estados mentais aplicadas ................................... 146
Anexo 3 -
Protocolos de aplicação das tarefas nas quatro coletas .............................. 151
Anexo 4 -
Parecer do Comitê de Ética da PUC-SP .................................................... 156
Anexo 5 -
Transcrições das sessões lúdicas vídeo-gravadas: uma sessão transcrita
como exemplo de cada coleta .................................................................... 157
Anexo 6 -
Transcrições das sessões lúdicas vídeo-gravadas, organizada por criança
para tratamento pelo software SPAD-T (exemplo de sessão transcrita de
cada coleta) ................................................................................................ 169
Anexo 7 -
Lista geral de palavras geradas pelo software SPAD-T a partir das
transcrições das sessões lúdicas vídeo-gravadas, organizadas por criança
para tratamento (exemplo de lista da primeira coleta) ............................... 176
Anexo 8 -
Exemplo de um fragmento da listagem geral de locuções verbais
contendo algum termo mental ou outra da palavra escolhida (arquivo
corda) ......................................................................................................... 186
Anexo 9 -
Tabelas das locuções verbais emitidas nas situações lúdicas .................... 188
ii
1
Apresentação
“Interagir com uma criança autista inteligente e que
verbaliza, pode ser uma experiência que chama a atenção para o
seguinte: descobrimos que falamos em metáforas! Pergunte se ela irá
“lhe dar uma mão”, e ela lhe responderá que precisa das duas mãos
e que não pode cortar uma delas para lhe dar. Diga que sua irmã
está chorando amargamente, com os olhos saltados, e ela procurará
ansiosamente pelos olhos dela no chão. Peça a ela para ler um texto
em voz alta e ela irá, forçosamente, gritar até o final. Essas
interpretações ao pé da letra são feitas seriamente, e nos dizem algo
importante sobre autismo e sobre a maneira como normalmente nos
comunicamos.”
(Happé, 2006)
Este pequeno fragmento de Francesca Happé traz uma reflexão sobre nosso
modo de comunicação e suas conseqüências. Ao observar as interpretações autísticas de falas
corriqueiras do cotidiano, podemos nos questionar sobre as habilidades humanas necessárias
à compreensão do discurso alheio, quando esse discurso é composto por metáforas e frases
ditas por ‘força de expressão’. Se uma criança autista compreende tudo “ao pé da letra”, o
que leva a criança normal a interpretar para além da fala em si, considerando a intenção do
falante embutida em seus dizeres? Que capacidade é essa que permite ao ser humano
compreender seus próprios estados mentais, além dos alheios, interpretando desejos,
emoções, intenções e crenças?
Compreender enganos, metáforas, intenções, desejos, convicções, fazer previsões
sobre os próprios atos e o das pessoas que nos rodeiam, pode ser especialmente importante
para o bom êxito nas relações que travamos em nosso cotidiano. A habilidade em atribuir
pensamentos e sentimentos com o objetivo de predizer e explicar comportamentos tem sido
estudada por autores de diferentes áreas do conhecimento, como a Psicologia, a Psiquiatria,
Neurologia, Etologia.
Na Psicologia Cognitiva, tem sido usada a denominação Teoria da Mente para
designar o conjunto de estudos dedicados a compreender a gênese e desenvolvimento dessa
capacidade. Para Rivière e Núñez (2001), “como uma primeira aproximação ao tema,
2
podemos dizer que uma Teoria da Mente é um subsistema cognitivo, que se compõe de um
suporte conceitual e mecanismos de inferência, e que cumpre no ser humano a função de
manejar, predizer, e interpretar a conduta.”. Dias (1993) aponta que a crença ou expectativa
das pessoas talvez seja mais preponderante na definição de suas ações do que, propriamente,
a consideração das circunstâncias físicas reais. Assim, estudar o modo como se configuram
tais previsões pode colaborar para a melhor compreensão de como surge e por quais
mudanças passa a compreensão humana sobre os estados mentais.
Movidos por trabalhos da primatologia que pesquisavam a cognição animal (Premack
& Woodruff, 1978; De Wall, 1982), os primeiros estudos se dedicaram à construção de um
meio para investigar o desenvolvimento da capacidade de conceber a mente alheia e quais
comportamentos poderiam representar a manifestação dessa concepção. Criou-se, então, a
tarefa de crença falsa (Wimmer & Perner, 1983), na qual a criança deve prever a ação de um
personagem em função do conhecimento, diferente da realidade, que este tem sobre uma
situação.
O termo teoria da mente apareceu na literatura pelo menos por duas vias. Wellman
(citado por Astington & Baird, 2005), trabalhando na área da metacognição, usou o termo
para referir a concepção das crianças sobre a cognição humana. Provavelmente mais
conhecido, é o uso do termo por Premack e Woodruff (1978), que o apresentaram em seu
estudo sobre a cognição dos primatas. Foi então que os autores definiram teoria da mente
como um sistema de inferências que pode ser utilizado para predizer o comportamento pela
atribuição de estados mentais a indivíduos. Esta definição foi rapidamente tomada e aplicada
a crianças (Astington & Baird, 2005).
Na tentativa de compreender melhor quais habilidades precisam estar disponíveis para
permitir à criança saber que os estados mentais que ela não “vê” (como emoções, desejos e
crenças) influenciam o comportamento das pessoas, os pesquisadores da teoria da mente têm
retomado alguns aspectos de questões já abordadas anteriormente por importantes autores da
psicologia. Têm se ocupado, ainda, em retomar investigações sobre como e quando as
crianças passam a ter pensamentos sobre seu próprio pensamento e o dos outros, além de
como e quando a concepção das crianças sobre o pensamento se aproxima a dos adultos
(Leadbeater & Raver, 1995).
Atualmente, muitos pesquisadores (Bruner, 1990, 1997; Carrithers, 1991; Deleau,
1996; Dunn, 1991; Siegal; 1999) têm salientado a importância da linguagem e da cultura
nesse desenvolvimento, sinalizando para a necessidade da realização de trabalhos
transculturais e longitudinais. Vêm também vislumbrando novas perspectivas em relação ao
3
delineamento metodológico das pesquisas apresentando, como uma alternativa à aplicação de
tarefas, a observação das crianças em diversas situações de interação (Carrithers, 1991;
Dunn, 1991). Porém, ainda são poucos os estudos que investigaram a atribuição de estados
mentais num enfoque longitudinal.
Este trabalho se propõe a contribuir com o conjunto de estudos da área, focando
alguns dos aspectos mais prementes da literatura: a observação de crianças no curso do
desenvolvimento, em interação em situações lúdicas e, por outro lado, pela aplicação de
tarefas.
4
1. Referencial Teórico
1.1 Teoria da Mente: quadro geral
Os estudos da Teoria da Mente têm origens na Primatologia e Etologia; Neurologia e
Psiquiatria; e na Psicologia. Trabalhos sobre as habilidades de resolver problemas (Premack
& Woodruff, 1978) e protagonizar disputas políticas dos chimpanzés (Goodall, 1991),
estudos voltados para as habilidades de relacionamento social dos autistas (Surian, Baron-
Cohen & Van der Lely, 1996), pesquisas envolvendo a capacidade dos surdos para
compreender jogos de palavras e metáforas (Deleau, 1996), têm contribuído para as
investigações sobre a compreensão dos estados mentais humanos.
A preocupação central dos pesquisadores da psicologia que se dedicam a Teoria da
Mente está intimamente ligada a uma pergunta bastante específica: quando e como aparece
nas crianças a habilidade de compreender o pensamento dos outros, diferenciando-o do seu
próprio?
A capacidade humana de compreender a conduta alheia, e a sua própria, em relação
aos estados mentais, apóia a integração da criança na vida social. Desde cedo a criança é
sensível às emoções expressas pelos outros: já a partir do final de seu primeiro ano, segue a
linha do olhar de outra pessoa indicando ter percebido a que o outro está atento; aos 18
meses, infere as intenções do outro como os desejos, e é capaz de conduzir-se em função
destes desejos (Décarie & Ricard, 2002). Aos 24 meses, por exemplo, dá ao outro algo que
gosta, ainda que ela própria não goste desta coisa (Astington & Gopnik, 1991).
Só mais tardiamente é que a criança atribui estados de crença ao outro: a partir deste
momento, parece compreender que a mente se constitui de representações da realidade, que o
conhecimento da realidade não é imediato, e que as representações da realidade podem ser
falsas. Assim, no início do quinto ano, muitas crianças são capazes de predizer o que o outro
vai fazer não apenas em função da realidade tal como ela é, mas através da representação que
esta pessoa tem, ainda que esta representação não corresponda à realidade (Deleau, Maluf &
Panciera, no prelo).
Entender todo esse processo, isto é, entender como as crianças se desprendem de suas
próprias convicções a respeito de algo para atribuir a outra pessoa uma convicção diferente
da sua própria tem sido central nos estudos. Assim, o empenho em compreender a capacidade
das crianças para interpretar desejos, emoções, intenções, ironias, enganos; e de predizer
ações alheias e seus próprios atos em função dessa interpretação, fizeram com que
5
pesquisadores da psicologia do desenvolvimento se envolvessem em estudos que, nos
últimos trinta anos, formaram esse conjunto que tem sido denominado de teoria da mente.
1.2 Relações entre linguagem e compreensão de estados mentais: o papel da cultura
Acho as pessoas complicadas... sempre conversam usando
metáforas. Aqui estão alguns exemplos de metáforas: morri de rir;
ela era a menina dos seus olhos; tivemos um dia de cão; o cachorro
bateu as botas... Acho que isso deveria ser considerado mentira
porque um cachorro não é como um dia e também não usa botas. E
quando tento fazer uma imagem da frase na minha cabeça, isso me
confunde todo porque imaginar uma menina dentro dos olhos de
alguém não tem nada a ver com gostar muito de alguém e isso acaba
me fazendo esquecer sobre o que a pessoa estava falando.”
(Haddon, 2004: 27-28)
A convicção de que a linguagem é elemento basilar no desenvolvimento da
compreensão dos estados mentais se justifica por diferentes motivos e é sustentada por
pesquisadores ligados às teses que defendem que há influência da cultura no
desenvolvimento (Dunn, 1988; Dunn, Brown, Slomkowski, Tesla & Youngblade, 1991;
Nelson, 1996). Para eles, como a linguagem é um sistema simbólico da cultura, é ela que
possibilita às crianças elaborar conhecimentos não manifestos no exercício da comunicação.
Tal exercício implica em atividades conjuntas com o uso de termos mentais, fornecendo uma
base para esses conhecimentos. Nessa perspectiva, nos encontramos diante de reflexões sobre
um conhecimento tácito.
“De fato, o significado atribuído à maioria das ações dos
participantes de qualquer encontro cotidiano depende do que eles
dizem uns aos outros, antecipadamente, simultaneamente ou após
terem agido. Ou do que eles são capazes de pressupor sobre o que os
outros diriam, dado um contexto específico.” (Bruner, 1990: 26)
6
Sob o ponto de vista de Bruner, o conjunto de experiências práticas ligadas às
atividades próprias de sua cultura forneceria representações de base e permitiria à criança
organizar representações num segundo tempo. Assim, o desenvolvimento da noção de crença
na criança estaria intimamente ligado à cultura e à linguagem que estão constituídas em seu
entorno.
Deleau, Maluf e Panciera (no prelo) apontam que vários estudos mostraram que as
habilidades das crianças para atribuir estados mentais dependem, pelo menos em parte, do
léxico da língua materna. Apresentam um estudo feito com as crianças Quechua
(Vinden,1996), cujos resultados apontam que elas são capazes de responder facilmente a
tarefas de aparência/realidade
1
, mas mais dificilmente a tarefas de crença falsa e, ao mesmo
tempo, que existem, nessa comunidade, várias maneiras de designar um objeto de acordo
com a sua aparência e que não existe um termo diferente para expressar saber e crer.
Apresentam, reciprocamente, outra pesquisa cujo resultado demonstra que a
compreensão da crença falsa parece facilitada nas crianças que têm o chinês como língua
materna, pela existência de uma diferença entre verbos que exprimem crenças verdadeiras ou
falsas (Deleau, Maluf & Panciera, no prelo).
Assinala-se, dessa forma, a importância de estudos transculturais. A realização de
trabalhos que envolvem populações provenientes se diferentes contextos culturais é
importante para que se possa investigar melhor a compreensão da criança sobre a mente em
diferentes contextos e situações sociais. Poder-se-ia também obter um maior grau de
confiabilidade nos resultados que já foram encontrados ou até contestá-los e, ainda, elucidar
a controvérsia entre diferentes posições teóricas como inatistas e culturalistas (Dias, 1993).
Nessa linha, Feldman (1992) aponta que as coisas e eventos que a criança encontra ao
se deparar com o mundo estão carregados de significados interpretados pela cultura. Por isso,
não se pode explicar o desenvolvimento cognitivo como um resultado de um processo da
ação meramente física, na qual os esquemas reflexivos originais da criança são
desenvolvidos num processo solitário de adaptação. Por outro lado, a ausência de situações
sociais demanda que se descrevam os elementos e padrões da cultura à qual as crianças estão
inseridas.
Para Bruner (1990), o caminho intelectual da criança não corresponde ao caminho da
elaboração de uma teoria. Ele aponta que a criança passa por um processo de enculturação e,
por meio da aquisição da ‘psicologia popular’ e da interação com o mundo social em que
1
As tarefas de aparência-realidade objetivam avaliar a capacidade da criança em distinguir e relacionar
aparência e realidade. Exemplos, pressupostos e implicações serão apresentados e discutidos mais à frente.
7
vive, ela passaria a compreender os estados mentais e as intenções das pessoas com quem
convive.
Nessa perspectiva, é preciso considerar todos os fatores que precedem o ‘sucesso’ da
criança nos testes de crença falsa, isto é, precisamos olhar para o período anterior em que a
criança faz menções aos temos mentais e, até mesmo, para as relações que ela estabelece em
seu primeiro ano de vida.
Os autores dessa orientação concordam que, para que seja possível compreender os
estados mentais, nossos e dos que convivem conosco, é necessário compreender “como a
linguagem, em toda a sua complexidade lingüística, é utilizada no cumprimento de suas
inúmeras funções” (Bruner, 1997: 93).
1.2.1 A linguagem como elemento importante na aquisição de uma teoria da mente
Há pesquisadores que defendem que, para uma melhor compreensão dos estados
mentais, precisaríamos analisar a ‘narrativa’ dos interlocutores num ato de conversação. Para
eles, a análise do modo como se configura a narrativa, pode importar mais do que a avaliação
das competências individuais que têm sido analisadas nos estudos sobre a compreensão da
mente pelas crianças (Carrithers, 1991).
Astington e Jenkins (1995), ao investigar se haveria uma relação entre a idade mental
verbal e o sucesso das crianças em tarefas que avaliavam a capacidade de atribuir ao outro
uma crença falsa (as chamadas ‘tarefas de crença falsa’
2
), acharam que as crianças que têm
bom desempenho em pelo menos uma das tarefas têm idade verbal mínima de 4 anos e 1
mês. Porém, esse resultado ainda não é suficiente para afirmar que é a linguagem a
responsável pelo sucesso, pois a medida “idade mental verbal” é composta (aparecem
sintaxe, fluidez, raciocínio verbal...) e não se sabe que atividades podem estar associadas.
Em outro estudo, as mesmas autoras (Jenkins & Astington, 1996) apontaram que
parece haver uma relação entre o tamanho da família de uma criança e sua compreensão da
crença falsa. Porém, essa relação não poderia ser justificada pela habilidade da linguagem.
Os resultados mostraram uma correlação positiva entre o desempenho das crianças no teste
2
As tarefas de crença falsa têm por objetivo avaliar a capacidade das crianças de atribuir a outra pessoa uma
crença, mesmo que diferente da sua própria e/ou de uma situação facilmente comprovada por observação. Por
exemplo, apresenta-se à criança uma história onde algo acontece na ausência de um dos personagens e espera-se
que a criança preveja a ação desse personagem considerando seu desconhecimento dos fatos. Mais adiante,
apresentaremos detalhadamente as tarefas mais conhecidas e nos aprofundaremos em seus pressupostos e
implicações.
8
de crença falsa e o número de irmãos que elas têm. Como em estudos anteriores, os
resultados também apontaram que não há diferença se seus irmãos são mais novos ou mais
velhos, nem qual é a proximidade entre a idade da criança é a de seus irmãos. As autoras
concluem que a compreensão da crença falsa está fortemente associada à habilidade
lingüística e que teoria da mente e linguagem não se desenvolvem independentemente uma
da outra. Contudo, apontam que o fato de haver relação entre o número de irmãos e o
entendimento da crença falsa, especialmente em crianças menos habilitadas lingüisticamente,
sugeriria que a teoria da mente das crianças é mais que uma habilidade lingüística. O modo
como a família se apresenta desempenharia um papel positivo para as crianças cujo nível de
linguagem é menos elevado (Jenkins & Astington, 1996).
Por último, as pesquisas mostram que não há sucesso nas tarefas de crença falsa antes
que a criança atinja certo nível de desenvolvimento em suas habilidades verbais. Assim,
pode-se concluir que as crianças que desenvolvem mais cedo uma competência
conversacional devem apresentar também uma capacidade mais precoce de atribuir crenças
ao outro. Reciprocamente, não se pode afirmar que as crianças cuja competência
conversacional é limitada apresentam uma aquisição mais tardia da noção de crença. Essas
são, fundamentalmente, as questões centrais das quais os estudos vêm se ocupando.
Nessa tentativa, várias pesquisas vêm se esforçando para mostrar que se há
dificuldade na linguagem, há na crença. Para tanto, dois grupos especiais de crianças
pesquisadas têm sido alvo de atenções. Um deles é formado por crianças que apresentam
surdez profunda precoce sem distúrbios associados: por serem surdas precoces, são crianças
que não têm acesso à linguagem oral. Assim, é um grupo interessante do ponto de vista da
pesquisa, por conta da restrição da linguagem. O outro grupo que também tem interessado às
pesquisas é o que se constitui de participantes autistas. O interesse justifica-se em função de
algumas características específicas, como a dificuldade das crianças autistas em termos de
resposta social ou de interação com seus pares (crianças ou adultos) e por conta de sua
indisposição ou incapacidade de seguir as “regras” estabelecidas para a comunicação verbal.
Em diferentes trabalhos (Baron-Cohen, Leslie & Frith, 1985; 1986) observa-se que os
autistas fracassam maciçamente (com um índice médio de aproximadamente 80%) nas
tarefas de crença falsa. Surgem, então, duas perguntas: o que levaria as crianças autistas a um
desempenho tão baixo? O que diferenciaria as crianças que não conseguem responder
adequadamente as tarefas das que, sendo também autistas, conseguem?
Na tentativa de entender o ‘sucesso’, isto é, na busca de uma justificativa para o
índice de 20% de acerto, Eisenmajor e Prior (1991), mostram que os autistas que obtêm
9
sucesso na tarefa têm idade verbal mental de 9 anos. Além disso, concluem que e os que têm
idade verbal mental de 7 ou 8 anos obtêm melhor desempenho quando são utilizadas palavras
de apoio na elaboração das perguntas.
Portanto, esses resultados apontam para uma ligação entre o nível de desenvolvimento
da linguagem e o sucesso na crença falsa. Porém, deve-se atentar que, em alguns casos,
mesmo com uma boa linguagem, os autistas apresentam dificuldade de encadear conversação
de modo ágil, de usar pronomes como ‘tu’ e ‘eu’, que dizem respeito ao uso da linguagem
numa conversa. Assim, mesmo considerando a existência de uma íntima relação entre
linguagem e teoria da mente, não é possível considerar que a linguagem é o fator
fundamental.
Peterson e Siegal (1995) usaram o protocolo da crença falsa em sua forma clássica
(Baron-Cohen, Leslie & Frith, 1985) com um grupo de crianças surdas. Compararam seus
dados com os encontrados em estudos anteriores, realizados com crianças autistas. Os
resultados mostraram um atraso grande das crianças surdas com 17% de sucesso numa idade
média de 10 anos. O que é ligeiramente comparável com o índice obtido entre crianças
autistas com idade mental verbal de 9 anos.
Boa parte das pesquisas com crianças surdas e autistas é recente (se concentram nas
duas últimas décadas) e ainda objeto de debates. Muitas vezes, os critérios de pontuação das
tarefas não são os mesmos, as estratégias ou termos utilizados na aplicação se diferenciam,
enfim, as condições de comparabilidade dos resultados ainda não são satisfatórias. O que se
pode constatar, é que esses trabalhos tendem a se tornar cada vez mais informativos,
rigorosos e comparáveis. Há autores que encontraram resultados diferentes (Deleau, 1998)
que mostram um atraso menor do que foi apresentado por Peterson e Siegal (1995). Essa
distinção foi atribuída a diferenças nos protocolos e nos critérios de atribuição de pontos.
De qualquer forma, é possível observar que o processo dos surdos é mais lento em
comparação ao processo dos ouvintes, no que se refere ao desenvolvimento da noção de
crença. Todos os estudos que têm investigado esse aspecto indicam um atraso dos surdos em
relação à compreensão dos estados mentais e vão também na mesma direção, quando
observamos a relação entre idade verbal e sucesso na tarefa de crença falsa: na medida em
que aumenta a idade verbal há mais sucesso na crença falsa e quando aumenta a dificuldade
de linguagem, aumenta a dificuldade na crença falsa. Mesmo assim, tem-se ainda um quadro
muito diverso, pois há muitos sucessos individuais entre os surdos antes mesmo das mesmas
idades dos ouvintes, o que aponta para o cuidado que temos que ter com comparação de
10
grupos feita por médias e sugere a necessidade de se trabalhar com diferenças individuais e
não apenas com médias de grupos.
Outro problema é a reflexão sobre o que está em jogo na situação particular dos
surdos. Além da diferenciação nos resultados há também divergências na forma de explicá-
los, uma vez que subsistem distintos modelos explicativos. Em relação ao baixo desempenho
apresentado pelas crianças surdas, ao analisar os fatores que dizem respeito às dificuldades
identificadas, há autores que defendem que a dificuldade não é por ‘falta de linguagem’, mas
porque essas crianças têm más condições de estimulação em virtude da surdez. Não haveria
motivo para afirmar que o atraso está em função da linguagem: a justificativa seria a pouca
estimulação pela qual passam as crianças, a dificuldade resultaria da diminuição global dos
estímulos.
Mais uma possibilidade de compreender o problema é considerar que há também o
fato de que as crianças surdas teriam falta de conhecimento social independentemente de seu
desenvolvimento cognitivo: toda a informação que não foi dada a ela explicitamente não
estaria disponível. Elas não teriam estabelecido, através do meio, a relação entre os estados
mentais e a realidade. Por exemplo, não entenderiam ‘mal-entendidos’. Há uma carência de
conhecimento sobre a vida social.
Há ainda uma terceira possibilidade de enxergar o problema, que é a pouca
contribuição nas conversações. Normalmente, as pessoas em geral não solicitam aos surdos,
crianças ou adultos, que façam contribuições e participem da evolução do conteúdo de uma
conversa. Dessa forma, não se desenvolveria uma compreensão sobre os atos de
comunicação intencional.
Para que fosse possível justificar o conjunto de resultados, seria preciso formular uma
hipótese mais precisa sobre o que pode estar em jogo do ponto de vista da linguagem e ser
muito cuidadosos nas diferenças interindividuais dentro dos grupos. Supondo que a hipótese
fosse, por exemplo, a de que o que falta aos surdos é a informação social, para investigá-la,
seria necessário elaborar uma tarefa específica para saber quais crianças aparentam ter mais
informação social e quais aparentam ter menos. Então, tentar observar se as crianças que têm
mais esse tipo de informação têm também sucesso mais precoce na tarefa de crença falsa.
Mas, seria mais importante e mais informativo, procurar dentro dos grupos o que justificaria
as diferenças.
De qualquer maneira, fica clara a importância de ser alguém que participa de
conversas. O que o surdo normalmente vive é a participação em conversas incompletas,
desprovidas de pormenores ou particularidades. Pode-se pensar que a restrição nessas
11
conversas pode ter conseqüências na atribuição de crença, pois em atividades que envolvem a
noção de crença os interlocutores ajustam conversas, esclarecem mal-entendidos,
confrontam-se e discutem pormenores. O que não pode ser feito por surdos da mesma
maneira.
Uma última questão importante nesse conjunto de considerações merece atenção
especial. Qual seria a influência da utilização da linguagem de sinais para o desenvolvimento
da noção de crença?
Michael Siegal vem estudando as possíveis influências provocadas pelo uso da
linguagem de sinais na compreensão dos estados mentais. Ao comparar surdos que usam
linguagem de sinais precocemente com os que não usam, percebeu uma diferença grande
entre os que aprenderam logo e os que aprenderam tardiamente. Baseando-se nesse dado,
pode-se afirmar que não basta apenas saber a linguagem de sinais. Deleau, em curso
ministrado na Universidade de São Paulo em maio de 2002, afirmou que não basta conhecer
a sintaxe de uma linguagem: é importante tê-la vivido como um aprendizado da língua
materna e que não tenha sido ensinada explicitamente.
Resta, diante dessa afirmação, perguntar sobre o que se aprende junto com o
aprendizado da língua materna que não vem junto com o ensino de outras linguagens de
forma explícita. Deleau, reportando-se ao culturalismo de Bruner, afirma que o que viria com
a aprendizagem da língua materna seria algo que viria junto com o processo de enculturação.
Diante do que foi exposto até agora, tem-se como resultado comum a convicção de
que há relação entre o conhecimento dos estados mentais e a compreensão da comunicação
intencional: o bom desenvolvimento da linguagem contribui para uma melhor compreensão
dos estados mentais.
Por ourto lado, pode-se também perguntar se é mesmo importante conhecer estados
mentais para nos comunicarmos com eficácia. É possível observar que, para se comunicar
bem, o locutor deve saber como se dirigir a determinadas pessoas nas diferentes situações,
saber fazer solicitações, saber informar e saber até em que momentos é melhor ficar calado.
O locutor hábil é o que compreende as condições implícitas que surgem nas diversas
circunstâncias e sabe como funcionam as convenções sociais, isto é, as normas que regem os
atos de conversações. Ele dispõe desse conhecimento de modo seletivo e apropriado ao
contexto onde se dá cada encontro entre falantes. Portanto, é sim necessário ter uma
compreensão da mente para ser hábil na comunicação cotidiana. Talvez seja esse o
conhecimento que a criança adquire junto à aprendizagem da língua materna.
12
Alguns autores (Deleau, 1999; Deleau & Guehenneuc, 1999; Siegal, 1999) têm
defendido que a experiência das práticas conversacionais implica o estabelecimento de
convenções sobre as maneiras de co-referenciar (convenções sobre as cadeias ou correntes
dos atos verbais e não verbais) e a elaboração de uma representação do que o interlocutor
(outro ou ele mesmo) sabe, imagina, infere, a respeito das circunstâncias determinadas de
uma troca. São problemas que precisam ser investigados: a) quando a criança começa a
entender o quanto é importante identificar e interpretar os recursos e intenções de seu
interlocutor ao se comunicar; e b) como a criança utiliza esse entendimento para se tornar
mais hábil em seus atos de conversação (Deleau, 1996; Deleau & Guehenneuc, 1999).
Contudo, essas pesquisas não têm se preocupado com atos de conversação que
necessariamente são acompanhados de uma tomada de consciência, pois seriam assim mais
ligadas a estudos sobre conhecimentos metapragmáticos. Deleau (1999) afirma que a
disponibilidade desse tipo de conhecimentos apóia a compreensão do funcionamento das
conversações. Ressalta-se que nessas pesquisas, não é o signo isolado e arbitrário que está no
centro da análise, mas as palavras trocadas e sua função no contexto da troca. Não é o signo
nem mesmo o enunciado que é o alvo, mas o discurso como forma de atividade conjunta
(Deleau,1998).
Grice (1975) sustenta que um “princípio cooperativo” é a base de uma comunicação
efetiva. Segundo esse princípio é necessário que os interlocutores realizem, nos atos de
conversação, contribuições conversacionais tal como forem exigidas, por uma intenção aceita
ou pela direção das trocas da conversa na qual estão envolvidos. Assim, de acordo com esse
princípio, o autor apresenta regras que levam os falantes a: a) falar não mais nem menos que
é solicitado; b) tentar falar a verdade e evitar mentira; c) ser relevante e informativo; d) evitar
ser obscuro ou ambíguo.
Paul Grice procurou mostrar que essas regras criam uma “lógica” na conversação que
envolve conhecimento das implicações contidas na linguagem natural. Na comunicação entre
adultos, que são experientes em manter conversações, é usual a compreensão mútua de que
as regras podem ser quebradas para fazer o que o autor refere como “implicações
conversacionais”. Por exemplo, adultos sabem que os interlocutores podem estar
desinformados e enunciar o óbvio com a intenção de ironia, ou podem ser redundantes e falar
mais que o necessário para sondar uma resposta inicial, independente da polidez ou
curiosidade, a fim de obter do interlocutor uma opinião genuína. Além do mais, ser
inteiramente informativo pode, freqüentemente, violar a regra da quantidade, isto é, a regra
de “não falar mais que o necessário”. Afirmar tudo isso explicitamente pode violar a regra da
13
quantidade, que trata de como as implicações aparentemente são compreendidas mutuamente
devido à experiência dos falantes. Embora alguns tenham visto a abordagem de Grice com
reservas, as regras propostas por ele podem ser vistas como “regras conversacionais práticas,
baseadas na experiência” (Siegal, 1999).
Conseqüentemente, a comunicação efetiva entre falantes e ouvintes envolve um
fundamento comum no conhecimento sobre o tempo, local e membros da comunidade que
permite uma representação mental mútua do contexto para a compreensão, isto é, de certa
forma exige a compreensão dos estados mentais do outro. Além disso, exige uma
compreensão sintática, semântica e pragmática.
A investigação sobre a compreensão conversacional das crianças tem se dividido no
estudo dessas três dimensões: a sintática, a semântica e a pragmática. Na dimensão sintática,
os estudos vêm investigando a compreensão da sintaxe complementativa pelas crianças, isto
é, a habilidade das crianças em construir e lidar com enunciados que exigem complemento.
Na dimensão semântica o foco de estudo é a representação dos conceitos, isto é, as variações
de significado nas diferentes linguagens. Não é a quantidade da conversa, mas seu conteúdo e
função que importam (Le Sourn-Bissaoui & Deleau, 2001). A terceira dimensão, a
pragmática, diz respeito ao uso que fazemos da linguagem (Panciera, Valério & Maluf, no
prelo). Por exemplo, utilizar a forma interrogativa para fazer um pedido e não uma pergunta
direta (‘Você poderia me dizer as horas?’ - forma interrogativa para pedir - no lugar de ‘Que
horas são?’ – pergunta) ou ampliar a força enunciativa do locutor com enunciados enfáticos
(‘Eu já não havia dito que você deveria...’ no lugar de simplesmente ‘Você deveria...’ ).
Souza (2006) aponta que as investigações sobre a forma como as crianças utilizam-se
da linguagem podem fornecer elementos importantes sobre o processo de aquisição da teoria
da mente. As singularidades dessa comunicação, os pormenores da linguagem que as
crianças utilizam para se referir a estados mentais, podem contribuir revelando dados novos à
pesquisa. Na literatura, ainda há muitas divergências na discussão sobre quais aspectos da
teoria da mente recebe influência da linguagem e de que forma tal influência é exercida.
A autora afirma que novos trabalhos que esquadrinhem as possíveis relações entre
teoria da mente e linguagem “só têm a acrescentar ao conhecimento atual e podem vir a
ajudar os pesquisadores na busca de respostas” (Souza, 2006: 393).
14
1.3 Manifestações da compreensão de estados mentais: recursos de pesquisa
As pesquisas em teoria da mente tem se apoiado primordialmente em dois tipos de
dados: desempenho das crianças em tarefas de atribuição de estados mentais e utilização de
termos mentais pelas crianças em situações diversas. A maioria das pesquisas têm se apoiado
nas tarefas, mas há trabalhos que se concentram nas expressões verbais das crianças.
1.3.1 A atribuição de estados mentais manifestada pelo uso de termos mentais
Uma vertente nos estudos sobre a capacidade de atribuição de estados mentais tem se
ocupado em desenvolver trabalhos que observam as crianças em situações espontâneas e não
pela aplicação de tarefas.
Os estudos de tipo naturalístico não são muito freqüentes. O que se tem visto é a
análise das falas das crianças em interações de diversos tipos: brincando com amigos de
mesma faixa etária em pequenos grupos na escola ou em casa (Jenkins & Astington, 2000;
Kramer & Gottman, 1992); em conversas cotidianas com os pais ou irmãos mais velhos
durante as refeições ou em brincadeiras (Dunn, Brown, Slomkowski, Tesla & Youngblade,
1991; Shatz, Wellman & Silber, 1983; Slomkowski & Dunn, 1996). Há estudos em as
próprias mães são treinadas a observar o comportamento das crianças em diferentes situações
(Zanh-Waxler, Radke-Yarrow, Wagner & Chapman, 1992)
Uma perspectiva que pode ser observada nesse corpo de estudos é a investigação
sobre a compreensão de verbos mentais. Roazzi e Arcoverde (1997) afirmam que o
conhecimento e utilização de verbos relacionados aos atos mentais demonstrariam que as
crianças possuem uma teoria da mente.
Segundo Astington e Gopnik (1991), é possível falar sobre estados internos sem falar
sobre a mente. Por exemplo: fome, sono, calor e frio representam estados internos ligados às
sensações. Porém, a percepção e a emoção parecem próximas aos estados internos mentais.
Por exemplo: ver, olhar, perceber, enxergar, estar feliz, gostar, amar, querer parecem termos
ligados à mente. Os verbos que expressam atos mentais - saber, pensar, acreditar, imaginar,
fazer-de-conta, descobrir - são exemplos claros de verbos que se referem exclusivamente à
nossa capacidade de identificar estados mentais internos (Roazzi & Arcoverde, 1997). Estes
são todos termos que, segundo as pesquisas, as crianças adquirem por volta dos 2 anos de
15
idade. Termos cognitivos geralmente vêm depois, mas antes de terem 3 anos, crianças
também usam palavras como saber, pensar, lembrar.
É importante olhar cuidadosamente o uso de termos mentais pelas crianças, uma vez
que esse uso pode ser somente idiomático ou conversacional. Na frase ‘Você sabia que...’,
normalmente utilizada no discurso oral como expressão idiomática para introduzir um novo
assunto, não há referência verdadeira a um estado mental.
Shatz, Wellman e Silber (1983) desenvolveram um estudo cujo pressuposto era o de
que se os adultos utilizam termos mentais para uma variedade de funções conversacionais em
que não havia verdadeiramente referência direta a um estado mental (seu uso era apenas por
força de expressão’), então o mesmo deveria acontecer com as crianças. Os autores
apresentam, a título de exemplo, o uso na língua inglesa de pausas na fala que são
preenchidas com a expressão ‘you know’ e expressões usadas para abrandar uma ordem ou
pedido ‘I think I...’. Neste caso os termos mentais ‘know’ e ‘think’ não traduzem realmente
nenhum ato mental.
A pesquisa de Shatz, Wellman e Silber (1983) investigava como os termos mentais
são utilizados por crianças de 2 anos e 4 meses a 4 anos em seu discurso espontâneo. Foram
observados dois grupos diferentes de participantes. No primeiro, 157 crianças foram
observadas durante 20 meses, em sessões que duravam de 20 a 30 minutos de conversação,
aproximadamente 2 vezes por semana na hora de comer ou brincar. A observação era feita
quando as crianças estavam em interação com um ou ambos os pais. Segundo os autores, em
raras ocasiões outros adultos ou crianças estiveram presentes.
No segundo grupo, 30 crianças (15 meninos e 15 meninas) eram observadas em casa,
em interação com a própria mãe, em 4 diferentes ocasiões e em intervalos de 2 meses. A cada
observação, 20 ou 30 minutos de diálogo eram gravados enquanto criança e mãe brincavam.
Na primeira visita, as crianças tinham de 2 anos a 2 anos e 6 meses. Na última, de 2 anos e 6
meses a 3 anos.
Em ambos os casos, as falas foram transcritas e agrupadas em dois tipos de análise.
Na primeira, apareciam os termos mentais que foram utilizados pelos participantes, a
freqüência com que cada termo apareceu e em qual idade (em meses) se deu a primeira e a
última ocorrência.
16
Na segunda, os termos foram agrupados segundo algumas categorias: ‘estado
mental’, ‘expressão de desejo’, ‘modulação da asserção’, ‘dirigindo a interação’,
‘esclarecimento’, ‘ação-memória’ e ‘eu não sei’.
3
Ao observar os termos mentais, organizados na primeira análise em uma tabela, vê-se
que em sua maioria, compõem-se de verbos (know, think, mean, forget, remember, guess,
pretend, dream, bet, hope, trick, wonder, wish, figure, believe, understand, suppose – do
mais freqüente para o menos freqüente), seguidos de substantivos (idea, dream, trick) e do
adjetivo (pretend).
O estudo permitiu concluir que os verbos mentais começam a encontrar seu espaço na
fala das crianças durante o terceiro ano de vida. Porém, eles não são primeiramente usados
para referir estados ou processos mentais internos, pois é muito provável que as crianças os
utilizem sem que os compreendam. Além do mais, é improvável que as crianças tenham uma
compreensão dos estados mentais e simplesmente não se refiram a eles em seus diálogos
naturais cotidianos. Assim, seria prematuro concluir que o uso dos termos mentais seria
precursor da compreensão de estados mentais pela criança, sem que outras pesquisas
complementem esses dados. Para os autores, é necessário investigar com maior cuidado a
habilidade das crianças em usar essas palavras ao se referir aos estados mentais das pessoas e
para contrastar estados mentais com a realidade por volta dos 3 anos.
Roazzi e Arcoverde (1997) debruçaram-se sobre essas questões e apontaram que há
uma classificação desses verbos quanto aos diferentes graus de certeza que podem expressar
(aspecto pragmático) e quanto à pressuposição de seu complemento, chamada fatividade
(aspecto semântico)
4
. Em seu trabalho, Antonio Roazzi e Rossana Arcoverde objetivaram
verificar o entendimento de duas categorias de verbos mentais - os fativos saber e descobrir
e os contrafativos fazer-de-conta e fazer acreditar - a partir de questões que verificavam a
habilidade das crianças em julgar o valor de verdade do complemento do verbo e a
habilidade das mesmas crianças em julgar o grau de certeza expresso pelos verbos mentais.
3
Os nomes dados às categorias apresentadas representam termos que: a) estado mental – se referem a
pensamentos, memórias ou conhecimentos; b) expressão de desejo – expressam desejos; c) modulação da
asserção – definem o grau de certeza com que o locutor faz uma asserção; d) dirigindo a interação – focam a
conversação ou dão ênfase à interação entre os falantes; e) esclarecimento – esclarecem ou solicitam
esclarecimentos; f) ação-memória – são verbos de memória e conhecimento que se referem a ações ou omissão
de ações; g) eu não sei – são usados meramente como expressão idiomática de negação. É a própria expressão
“eu não sei” muito utilizada sem complemento.
4
A idéia de fatividade foi atribuída à Kiparsky e Kiparsky (1970) que a apresentou em um estudo ligado à
lingüística. Os verbos fativos pressupõem a verdade de seu complemento (saber, conhecer, descobrir). Os
contrafativos, ao contrário, pressupõem a falsidade do complemento (fazer-de-conta, fazer acreditar). E, os não
fativos (achar, pensar, imaginar, crer e supor), não pressupõem a verdade ou falsidade do complemento
(Roazzi e Arcoverde, 1997).
17
As crianças, entre 3 e 7 anos, foram examinadas individualmente e, diante de uma
sentença complexa, respondiam a duas perguntas. Por exemplo, diante da sentença ‘Paulo
sabe que Bruna está brincando com seu cachorrinho’, que apresenta o verbo fativo saber,
perguntou-se à criança: (a) ‘Então, Bruna está brincando com seu cachorrinho?’ e (b) ‘Já
que Paulo sabe, Paulo tem certeza que Bruna está brincando com seu cachorrinho?’ ou
‘Paulo não tem certeza que Bruna está brincando com o seu cachorrinho?’
Na pergunta (a), as respostas poderiam ser: sim, não se pode ter certeza e não.
Visava-se então a atribuição do valor de verdade do complemento. Na pergunta (b),
procurava-se julgar o grau de certeza do verbo matriz e a respostas poderiam ser: certamente
não, pode ser que não, não se sabe, pode ser que sim e certamente sim.
Os resultados demonstraram que, por volta dos 4 anos, as crianças são capazes de
produzir e compreender alguns verbos mentais, diferenciar verbos fativos dos não-fativos e
julgar expressões de certeza desses verbos. Contudo, a partir dos 5 anos começa a se formar,
de modo mais consciente, o entendimento dos verbos fativos e contrafativos. Tal
compreensão vai se tornando melhor aos 6 e 7 anos.
Roazzi e Arcoverde (1997) lembram que Harris (1975) encontrou que, dos 7 aos 11
anos, as crianças ainda não compreendem o verbo fativo know, enquanto eles próprios
encontraram que a partir dos 4 anos as crianças passam a apresentar um certo domínio dos
verbos fativos saber (correspondente ao verbo know) e descobrir.
Esses autores apontam também, como resultado das pesquisas, que as crianças de 3 a
7 anos possuem um entendimento melhor dos verbos fativos do que dos contrafativos. Tais
resultados implicariam que as crianças pequenas parecem estar conscientes do significado
fativo dos verbos saber e descobrir. Nas pesquisas, elas mostraram-se capazes de assinalar os
valores de verdade do complemento de acordo com a propriedade da fatividade destes
verbos. Os resultados sugerem também a existência de uma progressão no entendimento da
fatividade dos verbos pelas crianças, o que seria uma indicação de que a compreensão dessa
propriedade de pressuposição dos verbos teria características desenvolvimentistas.
Os autores propõem que mais estudos sejam realizados para que possamos verificar,
entre outras, as seguintes questões: a) a utilização de sentenças inseridas em um ‘contexto’,
que permitam às crianças inferir sobre a questão implícita da pressuposição, poderia resultar
numa melhora em seu desempenho?; b) as crianças seriam capazes, além de distinguir os
verbos (fativos, contrafativos e não fativos), de explicar este reconhecimento? A partir de que
idade?
18
Outro estudo brasileiro encontrado foi a pesquisa desenvolvida por Alves (2003).
Com o objetivo de “evidenciar e verificar que mudanças qualitativas ocorrem no uso de
termos mentais”, no período em que a literatura aponta como fase de desenvolvimento da
teoria da mente, e para perceber o que há no uso de termos mentais por crianças de 2 a 5 anos
em interação com suas mães e colegas que já possuem teoria da mente (com idades entre 6 a
8 anos), Alves (2003) estudou uma amostra de 24 crianças, entre 2 e 6 meses e 5 anos.
Os participantes foram submetidos a dois tipos de situações: na primeira, a
examinadora disponibilizava brinquedos como jogos de montar, bonecos, carrinhos, quebra-
cabeças, massa de modelar etc., para que criança e mãe brincassem. Na segunda situação, a
examinadora propunha a confecção de trabalhos manuais em parceria (criança e mãe) com o
material disponibilizado (cola, tesoura, papéis variados, revistas, lápis, borracha etc.). As
mesmas situações eram propostas nas interações da criança com os colegas mais velhos.
Os resultados demonstram que as crianças mais novas utilizam, em sua maioria,
termos mentais referentes aos próprios estados mentais, já as mais velhas utilizam-nos
também ao fazer referências aos estados mentais de outras pessoas. Outro dado verificado foi
que as crianças mais novas fazem usos de termos mentais predominantemente nas situações
de interação com a mãe. A forma como a interação verbal das mães com as crianças ocorre
parece favorecer o uso. Já crianças mais velhas fazem uso dos termos mentais referindo-se a
si e aos outros, tanto nas interações com suas mães como com colegas, havendo uma
variabilidade na função e contexto com que os termos são empregados. As crianças mais
velhas também utilizaram expressões que demonstraram uma compreensão dos estados
mentais como internos e dependentes de fontes informativas.
Ainda há poucos estudos sobre o uso de termos mentais pelas crianças em língua
portuguesa. Souza (2006) sugere que um caminho possível para dar continuidade às
investigações brasileiras sobre o uso de termos mentais, é estudar a aquisição de alguns
desses termos, em particular, dos verbos saber e pensar. A autora pergunta sobre quando
essas palavras surgiriam no vocabulário das crianças brasileiras e argumenta que seria
interessante investigar se há influência na compreensão dos estados mentais por uma
característica peculiar à língua portuguesa: há, em português, dois termos distintos para
referir diferentes usos dos verbos think e know. No português há duas traduções possíveis
para a palavra inglesa know: pode ser traduzida por saber (“Eu sei onde está minha bola”) ou
conhecer (“Eu conheço aquele menino”). O termo think também permite duas traduções:
pensar (“Eu não penso como você”) ou achar (“Eu acho que tirei uma boa nota”). Assim,
mais uma vez, há novas possibilidades para a pesquisa sobre teoria da mente no Brasil.
19
No cenário internacional, Harris (1996) aponta que “há hoje provas consideráveis de
que as crianças muito novas são capazes de relatar adequadamente seus desejos, crenças e
emoções. Além disso, elas comentam os próprios estados psicológicos antes de comentar os
de outras pessoas.” (p.52)
Utilizando expressões verbais manifestadas pelas crianças, em particular, expressões
carregadas de termos mentais, Harris (1996) procurou argumentar que há quatro suposições
que demonstrariam que as crianças são conscientes de seus próprios estados mentais e que,
usando um mecanismo que depende essencialmente da imaginação, são capazes de projetá-
los sobre outras pessoas.
A primeira suposição é que as crianças em idade pré-escolar têm consciência de seus
próprios estados mentais. A imaginação das crianças permite a elas a capacidade de simular,
dotando suas bonecas de estados mentais, é a segunda suposição apresentada pelo autor. A
terceira suposição é que as crianças não confundem os desejos, crenças e emoções de faz-de-
conta que atribuem às bonecas com os reais – o que implica que a criança não confunde seus
próprios estados mentais com os de outra pessoa. A última suposição do autor é que essa
capacidade de simular permite às crianças uma compreensão imaginativa dos estados mentais
de outrem – assim, com base nas premissas do faz-de-conta, as crianças podem imaginar as
reações emocionais do outro que, de fato, tem tal desejo ou crença (quarta suposição).
Harris expõe e defende seus argumentos apoiado em resultados de diferentes
pesquisas, todas amparadas na fala das crianças, e conclui:
“Por fim, pode-se creditar às crianças uma compreensão
como que teórica da mente. Elas explicam e prevêem o
comportamento e a emoção das pessoas por meio da consideração
das relações existentes entre conceitos tais como crenças e desejos.
Não se limitam a detectar associações empíricas entre situações e
reações. Mas, para evocar tais conceitos, a criança não precisa
postular entidades não observáveis. As crianças pequenas possuem
crenças e desejos, e são capazes de declará-los. Sua compreensão
da psicologia baseia-se em sua própria experiência, e não numa
dedução feita a partir de um conjunto de postulados teóricos.”
(Harris, 1996:75)
20
As pesquisas aqui descritas concordam em diferentes aspectos, porém ainda não há
consenso entre os pesquisadores sobre o tempo exato de aquisição do significado dos verbos
mentais e sobre como a compreensão desses termos pelas crianças permite a expressão e
comunicação de seus próprios estados mentais e os dos outros.
Como consenso, tem-se que o entendimento sobre como as crianças compreendem e
utilizam os verbos mentais é necessário para os estudos que tentam explicar os processos
envolvidos no desenvolvimento da noção de crença e da compreensão dos estados mentais.
1.3.2 A atribuição de estados mentais manifestada por tarefas
O delineamento metodológico das pesquisas tornou-se um dos grandes desafios dos
estudos sobre a compreensão de estados mentais. A pesquisa de Wimmer e Perner (1983)
tornou-se reconhecidamente um marco seminal na área, pois apresentou um procedimento
viável para a coleta de dados empíricos sobre essa compreensão. A partir desse trabalho,
criaram-se novos caminhos metodológicos.
A seguir, serão descritas algumas das mais conhecidas tarefas apresentadas na
literatura. Tais tarefas não se destinam apenas à avaliação da habilidade das crianças em
atribuir crenças falsas, mas voltam-se também para a verificação da capacidade de
compreender desejos, emoções e intenções alheias, além habilidade de distinguir entre
aparência e realidade em relação a objetos. Inicialmente, serão apresentados trabalhos que se
apoiaram nas ‘tarefas de crença falsa’ mesmo que tenham utilizado outros instrumentos
simultaneamente. Por ora, o enfoque residirá na apresentação de tarefas voltadas para a
avaliação da atribuição de uma crença falsa ao outro e, só nos próximos itens, discutimos
sobre outros tipos de tarefas.
1.3.2.1 Atribuição de crença e crença falsa
Um dos aspectos mais relevantes na investigação sobre a concepção das crianças a
respeito da mente, que se transformou em um grande desafio para os pesquisadores, é a
capacidade de atribuição de crença. A literatura aponta que no período de 4 a 6 anos parece
emergir uma habilidade cognitiva que não pode ser considerada apenas como uma
conseqüência do desenvolvimento da memória ou da capacidade de processamento do
21
cérebro humano. Trata-se da habilidade das crianças em compreender as crenças de outra
pessoa e entender como, a partir dessas crenças, esta pessoa se comportará (Wimmer &
Perner, 1983). Além disso, as crianças parecem adquirir a habilidade de representar e falar
sobre as crenças de uma outra pessoa, independentemente dessa crença ser verdadeira ou
não. A importância da capacidade de representar a crença falsa de outra pessoa consiste no
uso dessa representação como uma referência para interpretar ou antecipar as ações de outras
pessoas (Jou & Sperb, 2004).
Para Wimmer e Perner (1983), “se alguém (P1) é capaz de predizer a ação de outro
indivíduo (P2) a partir da crença falsa de P2 e não a partir da ocorrência real, então P1
compreende os estados mentais como representações da realidade e como causa da
conduta”. Dessa forma é que os autores justificam a importância de se avaliar a capacidade
das crianças por meio da obtenção de respostas válidas nos testes de crença falsa.
Segundo esses autores, para demonstrar que uma criança é capaz de atribuir crença ao
outro, é necessário mostrar que ela claramente atribui a essa pessoa crenças que são
diferentes do que de fato está ocorrendo, o qual é conhecido pela criança e não pela pessoa
em questão; investigar se ela atribui, de fato, crenças ao outro ou, simplesmente, assume que
o outro tem as mesmas crenças que as suas próprias. Se a criança pode reconhecer que uma
pessoa agirá fundamentada em sua crença que é falsa porque não corresponde ao real estado
de coisas, que só a criança conhece, então sabemos que ela lhe atribuiu uma crença falsa.
Uma forma simples de verificar isso seria contar para a criança uma história na qual os dados
permitem inferir que o protagonista tem uma crença diferente da realidade, claramente
conhecida pela criança, mas não pelo protagonista, e observar a capacidade da criança de
prever a ação desse protagonista.
No artigo que acabou se tornando uma importante referência, Wimmer e Perner
(1983) trouxeram para a área um novo modelo de pesquisa dentro da tradição experimental,
pois muitos outros estudos surgiram a partir dele. Embora o termo e o modelo da crença falsa
tenham sido apresentados por Wimmer e Perner (1983), o termo também foi adotado por
outros autores (Bretherton, Mc New & Beeghley-Smith, 1981; Wellman, 1985), que
ajudaram a identificar o tipo de estudos que comporiam o campo da teoria da mente das
crianças (Astington & Gopnik, 1991).
22
As tarefas de crença falsa
Wimmer e Perner, 1983
A tarefa mais antiga, a tarefa original criada por Wimmer e Perner (1983), conta a
história de um menino e seu chocolate. Nela, o menino Maxi e sua mãe estão juntos quando
ele guarda uma barra de chocolate num certo armário (I). Quando Maxi sai, sua mãe pega a
barra e guarda-a num outro armário (II). Os participantes devem indicar onde Maxi procurará
seu chocolate quando retornar. Pergunta-se à criança:
‘Onde Maxi vai procurar o chocolate quando voltar? Por quê?’
Somente quando os participantes estão aptos a representar a crença falsa de Maxi (que
não sabe que sua mãe colocou o chocolate em II e pensa, portanto, que irá encontrá-lo em I),
apesar do que eles próprios sabem sobre a situação (que o chocolate está em II), é que estão
aptos a apontar corretamente o armário (I).
Ao apresentar a tarefa, os autores salientam que esse procedimento testa se a criança
tem uma representação explícita e definitiva sobre a crença falsa do outro, com a vantagem
de não envolver, na estrutura do enunciado, o uso de verbos mentais (não se diz, por
exemplo, ‘No que Maxi acredita?’) e, tampouco, exigirem a verbalização de seu próprio
conhecimento sobre a crença do outro. Os recursos utilizados são bonecos, objetos e cenários
adequados para que se possa controlar o entendimento da tarefa pela criança e o fator
memória. Além disso, cria-se uma situação mais motivadora para o participante.
Duas outras versões da história são apresentadas ainda no mesmo artigo. Na primeira,
é introduzido o irmão de Maxi, que também quer o chocolate. O irmão pergunta a Maxi (que
erroneamente acredita que o chocolate está em I) onde ele está. Maxi dá, então, uma
informação errada a seu irmão. Uma vez apresentada a situação, pergunta-se à criança:
‘Onde Maxi vai dizer para o irmão que o chocolate está?’
A resposta correta a essa questão depende da interpretação correta da intenção de
Maxi de dar a informação errada. De forma intencional, a resposta que Maxi pensa estar
errada (‘O chocolate está em II’), levará o irmão ao lugar correto. Os autores pretendiam com
essa versão, criar uma forma de atrair os participantes para realizar uma interpretação
incorreta, a ‘egocêntrica’. Na última versão dessa história, quem aparece é o avô de Maxi. O
menino pede ao avô para ajudá-lo e tem a intenção explícita de dizer a ‘verdade’ sobre o
lugar onde está o chocolate.
Com essas variações, os autores queriam colocar à prova o grau de certeza que as
crianças têm de uma representação explícita e definitiva sobre a crença falsa do outro. Eles
23
justificam tais alterações nas tarefas afirmando que as interpretações e antecipações têm que
ser restritas à área da crença do outro. Acrescentam que, para que isso ocorra, a representação
da crença da outra pessoa tem que estar firmemente estabelecida.
Baron-Cohen, Leslie e Frith, 1985
Outra tarefa bastante conhecida foi apresentada por Baron-Cohen, Leslie e Frith
(1985) num estudo que pretendia avaliar a atribuição de crença em crianças normais e em
crianças autistas. Em ambos os casos, os autores trabalharam também com crianças
portadoras de Síndrome de Down, como grupo controle. O objetivo principal era avaliar se as
crianças autistas seriam capazes de empregar uma teoria da mente e que diferenças de
desempenho apresentariam em relação às crianças normais.
Nela, são apresentadas duas amigas, protagonistas da história, Sally e Anne. Primeiro,
confirma-se se as crianças sabem o nome de cada boneca e não os confundem. Sally coloca
uma bolinha de gude em sua cesta. Quando ela sai da cena, Anne transfere a bolinha da cesta
colocando-a dentro da caixa. Então, quando Sally volta à cena, o experimentador pergunta:
‘Onde Sally vai procurar sua bolinha de gude?’
Duas questões para controle também são apresentadas:
a) Onde está realmente a bolinha de gude?’ (questão para avaliar o conhecimento
sobre a realidade) e
b) ‘Onde estava a bolinha de gude no início?’ (questão para avaliar a memória).
Os autores afirmam que essas questões são essenciais para assegurar que a criança
tem ambos os conhecimentos: do lugar real onde está a bolinha e a exata memória do local
prévio. Novamente, eram utilizados bonecos, objetos e cenários na apresentação à criança.
Esta tem sido uma tarefa muito replicada, com algumas variações, em outros
trabalhos (Dias, 1993; Dias, Soares & Sá, 1994; Jenkins & Astington, 1996; Siegel &
Beattie, 1991). Alguns pesquisadores que a utilizaram incluíram o termo ‘primeiro’ ao se
perguntar à criança:
‘Onde Sally vai procurar primeiro sua bolinha de gude?’
Para Siegal e Beattie (1991), sem o uso do termo ‘primeiro’ a criança poderia estar
respondendo com a perspectiva de que o entrevistador esteja se referindo ao lugar onde Sally
encontraria a bolinha, em vez de se referir ao lugar onde Sally a procuraria por acreditar que
está a bola.
Muitas variações dessa tarefa podem ser encontradas na literatura hoje. Algumas
delas nem se destinam mais à avaliação da capacidade de atribuição de uma crença falsa a
24
outrem, mas à avaliação da capacidade de atribuição de desejos, intenções e emoções dos
personagens em relação à situação dada. Implicações dessas variações serão discutidas mais
adiante.
No Brasil, foi desenvolvido por Roazzi e Santana (1999) um estudo com 72 crianças
de nível socioeconômico médio, entre 4 e 5 anos, cujo objetivo era avaliar a idade de
aquisição da habilidade das crianças de distinguirem seus próprios estados mentais dos
estados mentais dos outros e, se essa habilidade dependia do ator envolvido: inanimado
(boneca) x animado (outras crianças). Os autores investigavam, entre outras coisas, se uma
criança examinada em uma tarefa de crença falsa envolvendo outra criança, responde
assumindo um papel de ator que participa ativamente da ação. Também, se, em contrapartida,
uma criança examinada em uma situação tradicional de crença falsa envolvendo bonecos,
responde assumindo mais um papel de observador passivo. Para tanto, a tarefa envolvia
simultaneamente dois experimentadores e duas crianças, uma como participante da pesquisa
e outra como parceira.
As crianças com idade mais próxima de 4 anos apresentaram desempenho bem
inferior ao do apresentado pelas crianças cuja idade já se aproximava dos 5 anos.
Observando-se os baixos escores das crianças de 4 anos, os autores justificaram
argumentando que o tipo de material utilizado na tarefa apresentou um efeito dispersivo: as
crianças se envolviam mais com o material do que com a própria tarefa. Com essa
observação, esses autores nos levam a refletir mais cuidadosamente sobre os critérios
necessários à elaboração de tarefas para as crianças.
Em 1999, Roazzi e Santana apontaram a necessidade de novos estudos,
principalmente no Brasil, para detectar a influência da cultura sobre o desenvolvimento dessa
habilidade. Contrastaram seus resultados com os de Dias (1993), que também investigou a
capacidade de crianças brasileiras para a atribuição de crença por meio de três tarefas
diferentes, e concluíram que as diferenças não são significativas na faixa etária de 4 anos.
Uma das tarefas aplicada por Dias (1993) era também uma adaptação da tarefa de Baron-
Cohen, Leslie e Frith (1985) e a outra, criada por Hogrefe, Wimmer e Perner (1986), descrita
a seguir.
Hogrefe, Wimmer e Perner (1986)
A tarefa de Hogrefe, Wimmer e Perner foi mais uma tarefa que se tornou muito
conhecida e, logo após, já replicada por Perner, Leekman e Wimmer (1987). Mais difundida
na forma em que usa ‘os bombons Smarties’, ela avalia a expectativa da criança sobre algo,
25
no caso, o conteúdo de uma caixa. O procedimento, nessa tarefa, é o de apresentar para a
criança uma caixa fechada (uma embalagem muito conhecida pelas crianças por conter
bombons muito populares na Inglaterra, os Smarties) e perguntar a ela qual seria o conteúdo
da caixa – ao que as crianças sempre respondem que são bombons, conforme previsto. A
seguir, abre-se a caixa e a criança pode observar que o que há lá dentro, na realidade, é um
lápis. Fecha-se novamente a caixa, na frente da criança, e pergunta-se a ela: ‘Uma outra
criança vai entrar aqui na sala agora. Quando eu perguntar a ela o que há na caixa, o que
você acha que ela responderá?’
Como controle, antes da pergunta teste, lança-se duas questões. A primeira (‘O que há
mesmo dentro da caixa?’) procura investigar se a criança realmente sabe o que a caixa
contém. A segunda, por sua vez, busca verificar se a criança lembra o que acha sobre o
conteúdo da caixa antes de ter visto seu interior (‘O que você pensou que havia na caixa
assim que a viu pela primeira vez?’).
Quando Dias (1993) utilizou essa tarefa no Brasil, no lugar de bombons, usou os
conhecidos chicletes Ping-Pong. Sua pesquisa envolveu um grupo de 90 crianças, sendo 30
de orfanato, 30 de NSE baixo e outras 30 de NSE médio, e utilizou também a tarefa de Sally
e Anne. Como resultado, encontrou uma diferença entre os grupos de crianças com as quais
trabalhou. Um dos grupos, as de crianças do orfanato, apresentou a habilidade de predizer
ações baseadas nas crenças somente a partir dos 6 anos, o que não aconteceu com os outros
dois grupos de crianças, que já apresentavam essa habilidade aos 4 anos. Concluiu, então,
que o baixo desempenho do primeiro grupo de crianças pode ser justificado pela
“inadequação de comunicação que resultou na incompreensão por parte dessas crianças da
intenção real do experimentador” (Dias, 1993: 597).
Em novo artigo, um ano depois, apresentou outra pesquisa que visava avaliar o
quanto aspectos lingüísticos foram variáveis importantes no trabalho de 1993. Neste estudo,
Dias, Soares e Sá (1994), as mesmas tarefas do trabalho de Dias com modificação das
estruturas lingüísticas na pergunta e maior interação entre experimentador e criança.
Foram participantes desse estudo 30 crianças entre 4 e 6 anos, todas residentes em
orfanato. O experimentador criava uma aproximação com as crianças, brincando com ela
usando os materiais das tarefas, com a finalidade de proporcionar uma melhor interação entre
eles.
Além disso, foram feitas as seguintes modificações nos enunciados das perguntas:
a)“Onde Silvia irá procurar a bola?” (pergunta feita no trabalho de 1993) por
26
“Qual o primeiro lugar em que Silvia vai procurar sua bola de gude assim que ela voltar?
Em sua cestinha ou na caixa de papelão?” (pergunta de 1994);
b)“O que ele(a) dirá que tem dentro da caixa?” (pergunta de 1993) por
“O que ele(a) vai dizer que tem dentro da caixinha assim que eu perguntar a ele(a), como fiz
com você?” (pergunta de 1994);
c) “Onde o E2 irá procurar o chiclete quando ele/ela voltar” (pergunta de 1993) por
“Qual é o primeiro lugar em que ele(a) vai procurar o chiclete assim que voltar?” (em
1994).
Como resultado, as autoras encontraram que ‘a média de acertos das crianças de
orfanato, nas tarefas modificadas, foi significativamente superior do que a das crianças de
orfanato, na tarefa original, e similar ao das crianças de NSE médio e baixo’ (Dias, Soares
& Sá, 1994: 226). Assim, as autoras concluem que para analisar o conhecimento das crianças
sobre a mente, em especial quando os sujeitos pertencem a meios socioculturais diferentes,
deve-se levar em conta o significado que elas atribuem às questões utilizadas.
Ao analisar os diferentes estudos realizados sob o modelo da crença falsa no Brasil,
depara-se ainda com algumas questões em aberto. As diferenças lingüísticas entre o
português e o inglês influenciariam no desempenho das crianças nas mesmas tarefas? A
utilização de seres animados no lugar de inanimados influenciaria as diferenças entre as
performances obtidas ao longo das faixas etárias? Até que ponto o desempenho das crianças
de 3 anos não é prejudicado pela linguagem utilizada nas tarefas?
Buscando refletir sobre essas questões, em 2004, Jou e Sperb publicaram uma
pesquisa que tinha por objetivo investigar a aquisição e desenvolvimento da teoria da mente
de 58 crianças dos 3 aos 5 anos, aplicando três tipos de tarefas (crença falsa, crença e
aparência/realidade
5
), cada uma delas apresentada em duas modalidades: padrão e facilitada.
Nessa pesquisa, as crianças eram convidadas a justificar suas respostas dadas à tarefa de
crença falsa, o que possibilitaria, segundo as autoras, uma reflexão sobre sua primeira
resposta evidenciando as estratégias na solução e, conseqüentemente, melhores condições de
expressar sua real capacidade. Como resultado, as crianças tiveram um número
significativamente maior de acertos quando foram convidadas a justificar a primeira resposta
dada (Jou & Sperb, 2004).
5
Como já foi dito, as tarefas que buscam verificar a habilidade da criança em distinguir aparência de realidade
em objetos serão apresentadas e discutidas a seguir.
27
Wellman & Bartsch, 1988
O artigo de Henry Wellman e Karen Bartsch, publicado em 1988, apresentou três
estudos sobre a compreensão precoce da crença pela criança.
O objetivo era investigar os conhecimentos das crianças sobre ações mentais como
pensamento, conhecimento e suposições. Como interesse principal em sua investigação, os
autores buscavam compreender quando e como a compreensão das crianças se aproximava
da compreensão dos adultos a respeito das crenças e desejos: “Se o raciocínio crença-desejo
no cotidiano é construído de modo similar aos traços e à organização delineados aqui, então
quando e de que maneira as crianças pequenas se concentram nisso?” (p.245).
Sobre a expressão ‘raciocínio crença-desejo’, os autores esclarecem que se trata
apenas de uma grosseira abreviação: grosseira uma vez que crenças e desejos são construídos
amplamente e abreviação porque ilumina apenas duas de uma variedade de fatores
interrelacionados. Wellman e Bartsch (1988) iniciam seu artigo abordando uma explicação
dos processos de compreensão de estados mentais pelos adultos e propõem um sistema
organizado que esboça alguns aspectos críticos do que passam a chamar de ‘raciocínio
crença-desejo’ cotidiano, representando ambos (crença e desejo) como núcleos e as conexões
entre eles. É a esse sistema que a pergunta dos autores se refere.
Figura 1 - Esquema representativo do raciocínio crença-desejo (Wellman e Bartsch, 1988:241).
- crença, expectativa
- conhecimento
- dúvida, suspeita
- imaginação, suposição
- ver, ouvir, cheirar
- tocar, sentir
Percepção Crença
Emoções Básicas/
Psicologia Desejo
- amar, gostar, apreciar - querer, desejar
- odiar, desgostar, temer - sonhar, esperar
- ansiar, desejar avidamente - deduzir, inferir
- sentir dor, provocar
Ação Reação
- colidir, arrebatar - felicidade, contentamento, satisfação
- viajar - raiva, tristeza, desapontamento
- pesquisar - surpresa, perplexidade
- atender a - culpa, desânimo
28
A pergunta apresentada no artigo leva os autores a discutir a explicação dada para o
baixo desempenho das crianças nas tarefas de crença falsa em trabalhos anteriores, referindo-
se principalmente à tarefa de Maxi no artigo de Perner, Leekhan e Wimmer (1987). Segundo
essa explicação, as crianças pequenas não se engajam no raciocínio crença-desejo: a
predição errada das crianças pequenas sobre o comportamento de Maxi seria explicada pela
inabilidade de compreender a mente, no aspecto das crenças. O que, para Wellman e Bartsch
(1988), era passível de ser questionado.
Eles colocaram em evidência outra possível alternativa para explicar a performance
das crianças nesse caso: a particularmente difícil forma do raciocínio crença-desejo. Para os
autores, as crianças poderiam ser capazes de se concentrar, se engajar, no raciocínio crença-
desejo, mas ainda falhariam na especialmente difícil tarefa de raciocínio sobre crenças falsas.
Para colocar à prova sua explicação alternativa, investigaram as habilidades das
crianças em atribuir estados mentais ao outro propondo uma boa quantidade de variações no
que é requerido ao participante. Com essa finalidade, criaram uma sucessão de pequenas,
porém significativas, diferenças nas histórias das tarefas.
Com isso, os autores pretendiam retomar a questão inicial: se a compreensão das
crianças pequenas sobre a ação prestigia uma substrutura crença-desejo, então adultos e
crianças compartilham pelo menos uma parte fundamental de uma visão comum. Se não,
essas visões são decididamente diferentes (Wellman & Bartsch, 1988). Os autores enfatizam
a importância dessa questão lembrando que tais similaridades ou diferenças têm implicações
profundas para as teorias do desenvolvimento conceitual, aquisição de linguagem,
desenvolvimento social, e para decidirmos sobre nossas formas de interação com as crianças.
À medida que os autores realizavam a coleta dos dados, iam analisando os resultados
e propondo novos estudos. Assim, os autores trabalharam com diferentes grupos de
participantes em 3 estudos distintos mas complementares: no estudo 1 investigaram 60
crianças de 4 anos; no estudo 2, 32 crianças entre 3 e 4 anos (16 de 3 anos e 16 de 4 anos); e,
do estudo 3, participaram 40 crianças entre 3 e 4 anos (16 de 3 anos e 24 de 4 anos). Os
diferentes grupos respondiam, em encontro individual com o experimentador, às questões
provenientes de diferentes histórias, segundo a faixa etária e desempenho anterior.
Para essa pesquisa, foram criadas histórias que procuravam enfocar alguns dos
diferentes aspectos apresentados em seu esquema representativo (Tabela 1). As histórias
variavam, mesmo referindo-se à mesma tarefa, para que pudessem ser reaplicadas nas
mesmas crianças. A Tabela 1 apresenta um exemplo de história para cada uma das 8 tarefas
utilizadas nesse trabalho.
29
Tabela 1Exemplos de histórias utilizadas nas diferentes tarefas para avaliação da capacidade
de atribuição de crença ao outro (Weelman & Bartsch, 1988).
Tarefas Exemplos
1. Crença padrão
Desejo: desejo do personagem exposto explicitamente
Crença: crença do personagem exposta explicitamente
Alvo: localização real do objeto desconhecida
Sam quer encontrar seu cachorrinho. Ele pode
estar escondido na garagem ou embaixo da sacada.
Sam pensa que seu cachorro está embaixo da
sacada. Onde Sam procurará por seu cachorrinho
(garagem ou sacada)?
2. Crença negativa
Desejo: desejo do personagem exposto explicitamente
Crença: crença do personagem, de que o objeto não e
stá num certo local, mencionada explicitamente
Alvo: localização real do objeto desconhecida
Sam quer encontrar seu cachorrinho. Ele pode estar
escondido na garagem ou embaixo da sacada. Sam
pensa que seu cachorro não está na garagem. Onde
Sam procurará por seu cachorrinho?
3. Crença própria negada
Desejo: desejo do personagem exposto explicitamente
Crença: a crença do sujeito é solicitada primeiro,
depois é atribuída uma crença oposta ao personagem.
Alvo: localização real do objeto desconhecida
Sam quer encontrar seu cachorrinho. Ele pode estar
escondido na garagem ou embaixo da sacada. Onde
Sam procurará seu cachorrinho? Resposta exemplo:
“Embaixo da sacada”.
É uma boa opinião, mas Sam pensa que seu
cachorrinho está na garagem. Onde Sam procurará
seu cachorrinho?
4. Crença alterada
Desejo: desejo do personagem exposto explicitamente
Crença: o personagem tem uma crença inicial, mas
depois muda para a crença oposta.
Alvo: localização real do objeto desconhecida
Sam quer encontrar seu cachorrinho. Ele pode
estar escondido na garagem ou embaixo da sacada.
Sam pensa que seu cachorro está embaixo da
sacada. Onde Sam procurará por seu cachorrinho?
Mas, antes de Sam poder procurar seu
cachorrinho, a mãe de Sam veio para fora da
casa. Ela disse que viu o cachorrinho na
garagem. Então agora, Sam pensa que seu
cãozinho está na garagem. Onde Sam procurará
ser cãozinho?
5. Crença falsa explícita
Desejo: desejo do personagem exposto explicitamente
Crença: é dito que o personagem acredita que o objeto
está em outro (errado) lugar
Alvo: localização real do objeto é dita explicitamente
Jane quer encontrar seu gatinho. O gatinho de Jane
está realmente na sala de jogos. Jane pensa que seu
gatinho está na cozinha. Onde Jane vai procurar seu
gatinho? Onde o gatinho realmente está?
6. Crença inferida
Desejo: desejo do personagem exposto explicitamente
Crença: não há crença do personagem mencionada
explicitamente, mas é dito que o personagem viu
previamente o objeto num lugar e não em outro
Alvo: localização real do objeto desconhecida
Esta é Jane. Esta manhã Jane viu seus marcadores
mágicos na escrivaninha, não na estante. Agora,
Jane quer seus marcadores mágicos. Onde ela vai
procurar?
7. Crença inferida controlada
Desejo: desejo do personagem exposto explicitamente
Crença: não há crença do personagem exposta
explicitamente, mas é dito que o personagem viu
previamente o objeto num lugar e não noutro.
Alvo: o sujeito vê que o objeto está nos dois lugares.
Veja, há marcadores mágicos na escrivaninha e há
marcadores mágicos na estante. Esta manhã Jane
viu os marcadores mágicos na estante, não na
escrivaninha. Agora, Jane quer os marcadores
mágicos.Onde ela vai procurar os marcadores
mágicos? Os marcadores mágicos estão no (outro
lugar) também?
8. Crenças discrepantes
Desejo: desejo do personagem exposto explicitamente
Crença: é dito que o personagem acredita que o objeto
está num lugar e não noutro.
Alvo: o sujeito vê que o objeto está nos dois lugares.
Veja, há bananas na fruteira e bananas na
geladeira. Jane quer uma banana. Jane pensa que
há bananas somente na fruteira; ela não pensa que
há bananas na geladeira. Onde Jane vai procurar
bananas? Há bananas no (outro lugar) também?
30
Em relação à questão que motivou o estudo, Wellman e Bartsch (1988) afirmam que
se pode considerar que adultos e crianças compartilham sim de uma subestrutura comum,
encontrando que todas as crianças de 3 anos compreendem a crença como um estado mental
interno separado do desejo, mas ligado ao desejo em um esquema mais amplo de raciocínio
crença-desejo. Confirma-se, assim, a hipótese desenvolvimentista.
Considerações gerais sobre os estudos com tarefas de crença e crença falsa
A partir desse conjunto de estudos, é possível concluir que as tarefas envolvendo a
‘crença falsa’ têm contribuído muito para a investigação sobre o desenvolvimento da
concepção a respeito da mente, nas crianças. Os testes são simples, os resultados são
confiáveis e têm sido replicados em muitos estudos em diferentes lugares, possibilitando
comparações e discussões entre diferentes pesquisadores. As replicações têm utilizado uma
grande variedade de materiais, envolvendo crenças falsas, não apenas sobre os lugares de
objetos e dos conteúdos de uma caixa, mas sobre a identidade de objetos reais e de objetos
reproduzidos, sobre propriedades perceptivas como as das cores e propriedades abstratas
como as dos números (Astington & Gopnik, 1991). Assim, foram criados diferentes
protocolos para tentar avaliar as crianças em relação a essas distinções. As variações
consideradas envolvem também o deslocamento no espaço e a ambigüidade de objetos.
Como pode ser visto em algumas tarefas acima, os pesquisadores também têm procurado
diversificar a quem a crença falsa é atribuída, isto é, ‘o outro’ cuja ação a criança deverá
predizer. As variações envolvem pessoas reais (criança ou adulto), bonecas, fantoches e, até
mesmo, personagens representados em histórias ou vídeos.
Mais do que afirmar que a compreensão da crença falsa pela criança, por volta dos 4
anos, é um dos achados mais importantes na área, Jenkins e Astington (1996) frisam a
importância da correlação encontrada entre a performance das crianças nessas tarefas e a
performance nas tarefas que envolvem outras habilidades relacionadas a uma teoria da mente
das crianças - como a compreensão da distinção entre aparência e realidade, o
reconhecimento da certeza implicada pelo uso do termo saber (no lugar de pensar ou achar),
predição do comportamento do outro em função de sua crença.
Não apenas a predição do comportamento tem sido objeto de avaliação: há estudos
onde se avalia se o participante responde a questões envolvendo a ignorância em relação a
um estado de coisas, a explicação da ação, a intenção e, ainda, as emoções do outro. No lugar
31
de perguntar ‘Onde Sally vai procurar?’, pergunta-se ‘Sally sabe onde está?’, ‘Por que Sally
procurará nesse lugar?’, ‘Por que Anne mudou a bolinha de lugar?’, ou ainda, ‘Como Sally
vai se sentir ao procurar a bolinha e não encontrá-la?’. Astington e Gopnik (1991)
complementam apontando que as tarefas têm usado uma variedade de diferentes formas de
linguagem para a apresentação das questões, além de usarem variadas e diferentes questões,
perguntando onde ‘o outro’ irá procurar, como ‘o outro’ irá sentir e o que ‘o outro’ desejará.
Há ainda outra importante questão nos estudos da área que precisa ser apontada: a
própria discussão entre os pesquisadores sobre o que se entende por possuir uma teoria da
mente. Alguns autores (Astington & Gopnik, 1988; Moses & Flavell, 1990; Wimmer &
Perner, 1983) consideram que quando a criança apresenta bom desempenho em tarefas de
crença falsa ela tem uma teoria da mente. Outros apontam que diferentes indicadores, como a
atribuição de desejos e intenções ao outro, poderiam ser considerados e teríamos evidências
dessa capacidade por volta dos 3 anos. Alguns dos indicadores apontados na literatura,
muitas vezes medidos por tarefas já foram citados.
Em 2004, Henry Wellman e David Liu proporcionaram uma visão mais ampla sobre
o andamento dos estudos em teoria da mente que foram baseados na aplicação de tarefa. Eles
realizaram um levantamento bibliográfico (estudo 1) a respeito do conjunto de tarefas já
aplicadas nas pesquisas em teoria da mente. Buscaram os estudos que apresentavam as
palavras-chave desejo, crença, conhecimento, ignorância, emoção e suas combinações em
pares (desejo e crença; crença e ignorância;...) na base de dados PsycINFO, de 1987 a 2002,
e nos resumos das conferências da Society for Research in Child Development e da
Cognitive Development Society. Os autores compararam os resultados das pesquisas e
encontraram uma seqüência no surgimento de diferentes habilidades em relação à
compreensão de estados mentais. Em função dos resultados desse levantamento, realizaram
novo estudo (estudo 2) com vistas a organizar uma escala a partir do pressuposto empírico
que qualquer escala pode ser formada de uma coleção de itens heterogêneos na medida em
que as crianças passam primeiro por alguns e sucessivamente vão passando pelos demais.
Porém, Wellman e Liu ressaltam que, teoricamente, uma escala precisa ser validada e útil
para a área que reflete a base da progressão ou trajetória conceitual.
Criaram, então, uma escala com as tarefas para avaliação da teoria da mente,
testando-a em 75 crianças entre 2 anos e 8 meses a 6 anos e 6 meses. Segundo os autores, a
escala proposta no estudo 2 pode ser muito útil por estabelecer uma progressão do
empreendimento conceitual que marca a compreensão sociocognitiva no desenvolvimento
32
normal das crianças e por proporcionar um método mais rigoroso e informativo para a
mensuração desse desenvolvimento.
As tarefas que constam dessa escala envolvem a avaliação das seguintes habilidades:
Diferentes desejos - a criança julga a ação do outro quando duas pessoas (a
própria criança e a outra pessoa) têm diferentes desejos sobre os mesmos objetos;
Diferentes crenças - a criança julga a ação do outro quando duas pessoas (a
própria criança e a outra pessoa) têm diferentes crenças sobre os mesmos objetos, quando a
criança não sabe qual crença é verdadeira ou falsa;
Acesso ao conhecimento - a criança vê o que há em uma caixa e julga (sim ou
não) o conhecimento de outra pessoa que não teve acesso ao conteúdo da caixa;
Crença falsa em relação ao conteúdo - a criança julga a crença falsa de outra
pessoa, sobre o que há em um recipiente bem característico, quando a criança sabe o que há
no recipiente;
Crença falsa explícita - a criança julga como alguém vai procurar algo, sendo
que a pessoa tem uma crença equivocada;
Emoção sobre a crença - a criança julga como uma pessoa se sentirá, diante de
uma crença equivocada;
Emoção real-aparente - a criança julga que uma pessoa pode sentir-se de uma
forma, mas aparentar uma emoção diferente.
Os resultados mostraram uma compreensão dos desejos que precede a compreensão
de crença: as crianças percebem que duas pessoas podem ter diferentes desejos pelo mesmo
objeto antes de perceber que duas pessoas podem ter diferentes crenças sobre o mesmo
objeto. Também apontaram uma compreensão de que as pessoas podem ter crenças diversas
antes de compreender que uma pessoa pode ter crenças falsas, isto é, as crianças podem
julgar que elas e outra pessoa podem ter diferentes crenças sobre uma mesma situação antes
de serem capazes de julgar que outra pessoa pode ter uma crença falsa sobre uma situação.
Finalmente, os resultados mostraram que, entre essas crianças, a diferenciação entre emoção
real e aparente é uma compreensão tardiamente desenvolvida em relação às anteriores
(Wellman & Liu, 2004).
Ao observar atentamente a escala proposta por Wellman e Liu, é possível concluir
que não é plausível considerar a existência de uma clara linha divisória entre a compreensão
dos desejos, emoções, crenças. Uma vez que as tarefas constituintes da escala envolvem
simultaneamente mais do que um desses aspectos, não é admissível olhar para esse
33
desenvolvimento como se sua progressão pudesse ser considerada puramente como uma
progressão linear.
Para os autores, a maior contribuição dessa pesquisa é mais descritiva que explicativa,
confirmando que a compreensão de uma teoria da mente representa um extenso e progressivo
conjunto de aquisições conceituais e que nenhum tipo de tarefa, isoladamente, pode capturar
de forma adequada essa progressão desenvolvimental. Os autores afirmam ainda que
nenhuma explicação teórica será adequada se não considerar essas aquisições variadas e
seqüenciais no curso do desenvolvimento e apontam que os resultados a que chegaram
apóiam a implicação de que “uma escala para a teoria da mente é necessária para capturar
mais adequadamente os desenvolvimentos individuais das crianças em relação à teoria da
mente” (p.537).
O trabalho de Wellman e Liu representa uma importante contribuição para as
pesquisas na área e, por propor uma medida mais complexa e variada de diferentes
habilidades no desenvolvimento de uma teoria da mente pelas crianças, permite realizar uma
avaliação mais abrangente desse processo.
Salienta-se que a escala proposta não passou ainda por um processo de validação. Em
comunicação oral realizada na PUCSP, em maio de 2007, Michel Deleau informou que as
tarefas estão em processo de adaptação para o francês. Após a conclusão desse processo, num
esforço conjunto, diferentes centros de pesquisa estarão aplicando-as e cruzando os
resultados para que seja possível uma validação estatística da escala.
Mesmo com o processo de validação não concluído, o conjunto de tarefas está
organizado hierarquicamente, segundo o desempenho das crianças apontado nos resultados
de pesquisas anteriores, obtidos pela revisão de literatura realizada no estudo 1.
1.3.2.2 Distinção entre aparência e realidade
Outro aspecto importante na investigação sobre a concepção de mente das crianças é
a capacidade que elas apresentam em relacionar aparência e realidade: de um lado, a
capacidade de compreender a ambigüidade dos objetos e, de outro, a capacidade de distorcer
deliberadamente a realidade. Este tema tem sido revisitado pelos pesquisadores envolvidos
nos estudos da teoria da mente uma vez que se relaciona diretamente à habilidade de fingir e
distorcer deliberadamente a realidade, o que pressupõe uma capacidade de meta-
representação (Leslie, 1987).
34
Para Flavell (1986), tal desenvolvimento merece ser estudado por ser parte do
desenvolvimento maior de nosso conhecimento consciente sobre nossas próprias mentes e
sobre a mente do outro e, desta forma, da meta-cognição.
A distinção entre aparência e realidade assume muitas formas, aparece em muitas
situações e pode ter sérias conseqüências em nossas vidas. A relação entre aparência e
realidade surge de forma importante em nosso cotidiano, nas atividades perceptuais,
conceituais, emocionais e sociais. Além disso, ainda segundo Flavell (1986), a aquisição de,
pelo menos, parte do conhecimento explícito sobre essa distinção seria, provavelmente,
conseqüência do desenvolvimento universal da espécie humana e teria um papel importante
em nossa vida social e intelectual. Seria difícil imaginar uma sociedade na qual pessoas
normais não adquirissem aquele conhecimento.
Em um de seus estudos (Flavell, 1986) apresenta a tarefa em que o experimentador
mostra à criança um carrinho vermelho de brinquedo coberto por um filtro verde, que o faz
parecer preto. Deixa a criança pegar o carrinho em suas mãos (sem o filtro) e observá-lo bem,
constatando que é vermelho. A seguir, pega de volta o carrinho, cobre-o novamente com o
filtro verde e pergunta: ‘De que cor é este carro? Ele é vermelho ou preto?’ Como resultado,
obtém-se que crianças de 3 anos dizem ‘preto’ e crianças de 6 anos, ‘vermelho’. Velas que
parecem maçãs, esponjas que parecem pedras, imãs que parecem brigadeiros, entre outras
combinações, têm sido objetos explorados nas investigações.
A questão central agora não é mais perguntar o que é o objeto, mas perguntar à
criança pequena o que um outro amigo, que ainda vai chegar e não viu de perto e nem
manuseou o objeto, irá responder quando perguntarmos o que é o objeto.
As crianças de 6 anos claramente possuem algum conhecimento sobre essa distinção e
percebem de forma vivaz do que trata a tarefa. Já, as de 3 anos, que apresentam um grau de
conhecimento muito menor sobre essa distinção, não percebem. Questões de controle foram
utilizadas para que se pudesse ter certeza de que variáveis como memória e atenção não
estavam interferindo no resultado.
Há diversas provas que foram utilizadas em outros estudos. Todas têm um amplo
leque de variações, com a finalidade de confirmar ou refutar os resultados de pesquisas
anteriores, ampliando assim o corpo de resultados na área. Por exemplo, numa delas, uma
pequena lata de leite, que emite o som de uma vaca ao ser agitada, é apresentada à criança.
Pergunta-se então: ‘O som parece com o barulho de uma lata ou com o mugido de uma
vaca?’ e ‘Na realidade esse objeto é uma vaca ou uma lata?
35
Os resultados das pesquisas mostraram que as crianças em idade pré-escolar não
apresentaram um bom desempenho nessas tarefas. As crianças, até mesmo de 6 e 7 anos,
demonstram dificuldade de refletir e falar sobre idéias como: ‘parece com...’, ‘realmente é...
e, em especial, ‘parece diferente do que realmente é...’ ou ‘parece mas não é...’.
Constata-se, portanto, que se crianças de 3 anos parecem não entender como alguém
(um outro) pode acreditar em algo diferentemente do que elas conhecem, também não
entendem como algo pode parecer diferente do que realmente é. Mas, por outro lado, podem
distorcer a realidade.
A criança pode desconsiderar deliberadamente ou distorcer inconscientemente a
realidade através do jogo simbólico e de sua relação com objetos inanimados. É possível para
uma criança pequena ‘pensar numa banana como se fosse um telefone, num pedaço de
plástico como se ele tivesse vida, ou num prato vazio como ele contivesse sopa (Leslie, 1987:
412). Assim, a habilidade de fingir pode ser observada nas crianças desde pequenas. Ela
depende da capacidade de representar a ausência de objetos e situações e, para Leslie (1987),
emerge durante o segundo ano de vida. Essa habilidade não seria a culminância do
desenvolvimento intelectual mas, em vez disso, surge precocemente na infância de forma
lúdica. Acrescenta que, quando fingimos, nós distorcemos a realidade de forma deliberada.
Leslie destaca três características da brincadeira de faz-de-conta, observadas nas
brincadeiras das crianças. Em primeiro lugar, a criança faz com que um objeto represente
outro objeto diferente. A segunda característica destacada aponta que, quando é necessário, a
criança não só faz com que um objeto represente outro, como também cria um objeto
imaginário sem qualquer apoio material. Por último, Leslie destaca que a criança atribui
propriedades fictícias aos objetos.
Se a criança em seus jogos de faz-de-conta é capaz de utilizar esses artifícios já aos
dois anos, coloca-se como questão principal se a dificuldade encontrada nas tarefas refere-se
ao conhecimento da criança sobre as relações entre a aparência e realidade ou à linguagem
utilizada, isto é, ao conhecimento dos termos empregados.
Dias (1992a; 1992b) aponta, reportando-se ao referencial piagetiano, que o que
fornece a base para a distinção entre a aparência e realidade é a capacidade da criança de
pensar imaginativamente, recorrendo a representações do fingimento ou do ‘faz-de-conta’,
sem levar em consideração a situação real. O que é mais importante notar sobre essas
diferentes habilidades é que elas não são simples habilidades adquiridas por volta dos 2 anos
- no caso do fingimento – ou dos 3 ou 4 anos – no caso da distinção entre aparência e
realidade. Mas, sim, que as crianças parecem ir adquirindo-as aos poucos, de forma quase
36
simultânea e paralela. O mesmo se apresenta quando se observa a habilidade de avaliação de
crença aos quatro anos. Existem correlações significativas entre os resultados de crianças nas
tarefas de crença falsa, mudança deliberada de crença e compreensão da relação entre
aparência e realidade (Astington & Gopnik, 1991).
Harris (1996) apresenta um trabalho onde retoma as três características de Leslie,
buscando uma relação com a compreensão de estados mentais. Segundo Harris, aos dezoito
meses as crianças começam a tratar as bonecas como representações de seres humanos, mas
nessa fase, esses seres não recebem qualquer poder de agir ou sentir de forma independente –
são as crianças que os alimentam, lavam e os colocam para dormir. Dos dois aos dois anos e
meio, as relações entre crianças e bonecas mudam: as crianças começam a atribuir às bonecas
a capacidade de ação e experiência – as bonecas passam a falar e agir independentemente, e
depois de certo tempo, lhes é atribuído desejos, sensações e emoções. Dos três anos e meio
aos quatro anos, as crianças começam a atribuir às bonecas pensamentos e capacidade de
elaborar planos mais explícitos. As crianças fazem com que as bonecas falem sobre um plano
de esconder algo, por exemplo.
Para Harris, essas fases ilustram que a capacidade de faz-de-conta logo ultrapassa o
domínio dos objetos físicos. As crianças não limitam seu faz-de-conta à substituição de um
objeto por outro ou à criação de objetos e propriedades simulados. Começam a criar seres
animados que, inicialmente, não possuem mente própria e, aos poucos, começam a acolher os
estados mentais de faz-de-conta e a projetá-los nesses seres. O autor defende a idéia de que a
capacidade de fazer de conta permite à criança que escape à sua realidade de um modo
funcional e que seja receptiva às realidades que outras pessoas acolhem. Assim, fornece
“uma chave que destranca a mente de outras pessoas e permite que a criança entre, por um
certo tempo, em seus planos, esperanças e medos”. (Harris, 1996: 50).
1.4 O uso simultâneo dos dois recursos: uma combinação possível
Alguns trabalhos (Jenkins & Astington, 2000; Slomkowski & Dunn, 1996)
propuseram uma análise colocando em relação o desempenho das crianças em tarefas – na
maioria das vezes, tarefas de crença falsa – com a freqüência do uso de expressões que,
segundo os autores, demonstram a compreensão de estados ou ações mentais.
No Brasil, Carraro (2003) observou sete crianças de 6 anos com o objetivo de
examinar o status metarrepresentativo da brincadeira de faz-de-conta (apontada pela autora
37
como uma das atividades que indicam a presença de uma teoria da mente) e a sua relação
com o nível representativo apresentado nas tarefas de crença falsa e de aparência-realidade e
no emprego de termos mentais, em sessões de 20 minutos. Nessas sessões, de 20 minutos
cada, as crianças interagiam com colegas e brinquedos. Simultaneamente, as mesmas
crianças foram testadas em tarefas de crença falsa e aparência-realidade.
Todas as sete crianças tiveram bom desempenho nas tarefas e cinco crianças
empregaram, em suas conversações, termos mentais considerados metarrepresentativos.
Quanto à brincadeira de faz-de-conta, houve predomínio de episódios categorizados como de
brinquedo não-metarrepresentativo, apesar de seis crianças apresentarem episódios de faz-de-
conta metarrepresentativos. Carraro (2003) conclui que, como não foi possível encontrar uma
relação linear entre esses indicadores, os resultados confirmam a hipótese de alguns autores
de que a brincadeira de faz-de-conta metarrepresentativa ocorre mais tardiamente no
desenvolvimento, estando estreitamente relacionada à compreensão da sintaxe do termo
mental ‘fazer de conta’.
Com esse tipo de delineamento metodológico, esse foi o único estudo encontrado no
banco de teses da CAPES. Também não foram encontrados outros estudos brasileiros nessa
vertente na base de dados dos periódicos indexados (Scielo e Lilacs), acessada somente até o
ano de 2003.
Os estudos de Jenkins e Astington (2000) e de Slomkowski e Dunn (1996) serão
comentados no próximo item por apresentarem outra característica que os diferencia: são
estudos longitudinais.
1.5 Estudos longitudinais
Preocupados em compreender não apenas a época de surgimento da capacidade de
atribuir uma crença falsa ao outro, mas também, em investigar como se dá esse
desenvolvimento nas crianças pequenas, alguns autores vêm realizando estudos
longitudinais. Abaixo são apresentados alguns desses estudos, cujo delineamento
metodológico serviu de inspiração e fonte importante para este trabalho.
O primeiro e mais antigo dos estudos que encontrados foi a pesquisa de Shatz,
Wellman e Silber (1983) já descrita neste trabalho quando discutia-se a relação entre
linguagem e teoria da mente, à p.15. Como exposto, os autores acompanharam um grupo de
157 crianças durante 20 meses, duas vezes por semana durante 20 a 30 minutos. Outro grupo,
38
de 30 crianças, foi acompanhado durante 6 meses, perfazendo um total de 4 observações em
intervalos de 2 meses. Essas observações também duravam de 20 a 30 minutos. Em ambos os
grupos, as crianças encontravam-se inicialmente na faixa dos 2 anos de idade.
Apurou-se a freqüência de uso de termos mentais e em que idade se deram as
ocorrências iniciais e finais. Além disso, os autores criaram categorias para a análise dos
termos utilizados pelas crianças. O estudo permitiu concluir que os verbos mentais começam
a encontrar seu espaço na fala das crianças durante o terceiro ano de vida, porém não são
inicialmente usados para referir estados ou processos mentais internos, pois é muito provável
que as crianças os utilizem sem que os compreendam.
Em 1991, Dunn, Brown, Slomkowski, Tesla e Youngblade, publicaram um estudo
cujo primeiro objetivo era descrever diferenças individuais na compreensão das crianças
sobre sentimentos e sobre como as ações das pessoas são pautadas nas suas crenças num
estágio em que, de acordo com os trabalhos correntes sobre a teoria da mente das crianças,
algumas mas não todas as crianças são hábeis para refletir sobre estados mentais e explicar o
comportamento em termos de crenças. Outros objetivos desse estudo referiam-se a outras
variáveis que poderiam influenciar essas diferenças individuais na compreensão do outro.
Cinqüenta segundos filhos foram visitados em sua própria casa em dois momentos:
aos 33 e aos 40 meses. No primeiro momento, duas observações de 15 minutos cada foram
feitas com intervalo de uma semana. As crianças mantinham sua rotina normal e as
conversações familiares eram gravadas para posterior transcrição.
Na organização dos dados para a análise, detalhes do contexto foram incluídos: cada
vez que chegava ou saía alguém, ações entre os irmãos que levavam a uma disputa, detalhes
dos jogos de cooperação e faz-de-conta, o comportamento não verbal como provocativo de
desentendimentos e disputas físicas. Logo após cada observação, o observador fazia o relato
com o máximo de detalhes possível, incluindo a fala de toda a família e os acontecimentos
não verbais.
No segundo momento, aos 40 meses, as crianças foram avaliadas em dois encontros:
no primeiro foram aplicadas tarefas de crença falsa (Bartsch & Wellman, 1989) e, no último,
tarefas de efeito de tomada de perspectiva (Denham, 1986).
A fim de determinar um corte para a análise, foram utilizados dados como o número
de palavras usadas nas 10 mais longas falas enunciadas. Conversas onde o falante utiliza um
termo que expressa sentimento (sad ou happy), usa uma frase com essa conotação ou uma
interjeição aparece representando também um estado de sentimento foram consideradas. O
termo like foi considerado apenas quando se referia a um estado de desgosto ou
39
contentamento, não quando indicava desejo ou volição como em “Would you like to have
this toy?”. Considerou-se também, termos que projetavam sentimentos como atributo das
pessoas ou objetos (scary ou poor).
Também foram consideradas falas onde aparecem relações de causalidade: quando
apareceram explicitamente termos causais (why ou because) ou quando se observou uma
relação causal entre dois eventos ou estados (Don’t jump, you’ll break that!).
Os resultados mostraram que as diferenças individuais na compreensão dos fatores
determinantes da compreensão dos sentimentos do outro foram grandes: enquanto alguns
foram hábeis em explicar ações em termos de crenças falsas, a maioria não foi. As crianças
que cresceram em famílias nas quais as mães se envolviam no relativamente freqüente
controle do comportamento com o irmão mais velho, foram mais hábeis em dar explicações
nas tarefas de crença falsa. Por exemplo, mães que intervinham nos desentendimentos entre
os irmãos explicando como a crença do outro (freqüentemente enganos) era responsável por
suas ações (“He thought you had finished yours” ou “She didn’t know I had promised it to
you” ou “He thought it was his turn”), contribuíam para o desenvolvimento da capacidade
dos filhos para explicar ações em termos de crenças falsas (Dunn, Brown, Slomkowski, Tesla
& Youngblade, 1991).
Slomkowski e Dunn (1996) investigaram uma possível relação de predição entre as
habilidades para compreensão dos pensamentos e sentimentos dos outros, medidas
experimentalmente por meio de aplicação de tarefas, e o modo pelo qual as mesmas crianças
se comunicam verbalmente no âmbito de suas amizades. Assim, as autoras buscaram
relacionar habilidades em teoria da mente com comportamentos pró-sociais.
Participaram desse estudo 38 segundos filhos. Aos 40 meses de idade as crianças
resolveram tarefas individualmente e, aos 47 meses, foram observadas em situações de
comunicação com seus pares (amigos de mesma idade indicados pelas mães). As tarefas
eram: uma tarefa de crença falsa do tipo conteúdo inesperado (foi utilizada a versão da caixa
de Band-Aid, de Bartsch & Wellman, 1989); e uma tarefa visando avaliar como as crianças
classificariam as emoções de personagens (Deham, 1986), em 16 vinhetas com situações
similares a algumas vividas pelas próprias crianças, relatadas anteriormente por suas mães
para a confecção do instrumento.
Nas observações feitas 7 meses depois, as crianças passavam por sessões de 45
minutos de brincadeira com um amigo. Brinquedos e fantasias eram colocados à disposição
das crianças em uma área delimitada com um gravador ligado. Caso as crianças saíssem do
espaço delimitado, eram orientadas a voltar e brincar somente na área reservada. As falas
40
gravadas foram transcritas e categorizadas em: a) retornos conectados - episódios nos quais
as conversações mantinham relações lógicas; b) retornos em jogos – quando se observou
retornos conectados em situações de jogos; c) retornos em faz-de-conta – quando os retornos
conectados ocorreram em situações de jogos de faz-de-conta. As autoras referem o trabalho
de Gottman (1983) como fonte da escolha dessas três categorias e apontam que elas refletem
uma hierarquia na interação entre pares, considerando-se o retorno conectado como requisito
básico para a interação e os retornos em jogos e jogos de faz-de-conta como sofisticação dos
modos de interação.
Como resultado, Slomkowski e Dunn (1996) encontraram que o desempenho das
crianças nas tarefas, aos 40 meses, foi preditivo do modo como elas coordenavam suas
conversações e brincavam com seus amigos 7 meses depois. As autoras não sugerem que as
habilidades avaliadas nos protocolos experimentais mantêm uma relação causal com as
habilidades de comunicação demonstradas nas interações com os amigos e, sim, que ambas
as habilidades parecem requerer habilidades sociocognitivas similares. Concluem afirmando
que a importância desses resultados é que eles sugerem que o paradigma experimental, como
as tarefas de crença falsa, pode contribuir para a compreensão das habilidades necessárias
para coordenar interações com os amigos.
O trabalho de Jenkins e Astington (2000) acompanhou um grupo de 20 crianças entre
3 e 4 anos por 7 meses. Para a definição dos participantes, as autoras utilizaram um teste para
avaliar a habilidade geral de linguagem das crianças.
Foram utilizados 3 tipos de tarefas de crença falsa, envolvendo lugar inesperado
(Wiimmer & Perner, 1983), conteúdo inesperado (Hogrefe, Wimmer & Perner, 1986) e
aparência-realidade (Flavell, Flavell & Green, 1983), além da observação em vídeo-gravação
das crianças brincando em pares, com fantasias, durante 10 minutos. As crianças foram vistas
em 3 diferentes momentos, com intervalo de 3 meses e meio.
As gravações em vídeo foram transcritas com descrições sobre com o que as crianças
brincavam e de quem elas estavam falando, quando era necessário para determinar se
estavam envolvidas em jogos simbólicos. Todos os comentários do experimentador foram
excluídos. As unidades de fala foram classificadas em: interpretação de papel, discussão de
atividade imaginária; substituição de um objeto por outro e uso de réplicas como objetos
reais.
Todas as falas foram analisadas em busca de dois elementos: proposições conjuntas e
atribuição de papéis. Considerou-se como proposição conjunta quando havia referência ao
outro e a si próprio simultaneamente (“Faz de conta que você está me molhando de novo”) e
41
referência a si próprio e ao outro também realizada pelo uso de pronome na primeira pessoa
do plural como “we, us, our” para especificar a si próprio e o outro (“Lá vamos nós,
embaixo do nosso guarda-chuva para o caso de alguém nos molhar”).
Atribuição de papéis foi definida como a atribuição pela criança de papéis
(personagens) a si própria e/ou a outra criança. Esta atribuição tinha que ser feita verbal e
explicitamente para assim ser considerada (“Vamos ser bombeiros agora”), ou dirigida a seu
par (“Olá professora!”). Não foi considerada como atribuição de papéis se a criança estava
brincando de ser alguém (como evidenciado por suas roupas, adereços, ações ou mudanças
de voz), mas não disse explicitamente quem ela estava fingindo ser.
A análise comparou os resultados nas tarefas, nas proposições conjuntas e na
atribuição de papéis. As autoras buscavam as relações entre esses três conjuntos de dados em
função do tempo, isto é, como cada conjunto de dados da primeira coleta estaria relacionado
com os dados obtidos na segunda (3 meses e meio depois) e terceira coletas (7 meses depois).
Também perguntaram sobre as relações entre os dados da segunda e a da terceira coleta.
Os resultados forneceram uma maior sustentação para a hipótese de que o
desenvolvimento da teoria da mente tem um efeito significativo no comportamento social,
em contraposição à hipótese alternativa, de que o comportamento social tem um efeito
significativo sobre o desenvolvimento da teoria da mente. Porém, as autoras ressaltam que
não é possível, a partir de um estudo de tipo naturalístico, ter certeza sobre a direção do
efeito nessas relações, uma vez que a freqüência e o tempo de observação das crianças
sempre será um fator restritivo – o fato de algumas habilidades não terem sido demonstradas
nas sessões de coleta previstas não significa que as crianças já não as tenham desenvolvido,
talvez elas só não as tenham demonstrado naqueles momentos.
Assim, Jenkins e Astington (2000) colocam em questão as relações entre teoria da
mente, linguagem e jogo simbólico. Para elas, alguns aspectos do jogo simbólico, como atuar
assumindo diferentes personagens, podem preceder e apoiar a compreensão da crença falsa,
enquanto outros aspectos do jogo simbólico, como fazer um papel explicitamente claro para
seu par na brincadeira, podem ser decorrência e resultado da compreensão da crença falsa.
O que há em comum nesses estudos é a composição e coordenação de diferentes
perspectivas metodológicas: a observação das crianças em situações espontâneas e a
aplicação de tarefas.
42
2. Problema e Objetivos
O objetivo da presente pesquisa é investigar como se manifesta e evolui a capacidade
de compreensão de estados mentais nos primeiros anos de vida. Antes da explicitação dos
objetivos específicos desta pesquisa, serão feitas considerações preliminares sobre a literatura
na área considerada relevantes para este projeto. Será apresentada uma breve síntese das
discussões sobre as relações entre teoria da mente e linguagem e sobre as questões de método
nas pesquisas. Essas são questões sobre as quais se fundamentam os objetivos deste estudo.
Ao longo do capítulo anterior, foram apresentados trabalhos que investigam e
evidenciam as relações entre desenvolvimento da teoria da mente e linguagem. Astington e
Baird (2005) sintetizam a situação atual dos estudos apontando que, quanto ao papel da
linguagem, ainda há muitas controvérsias na literatura. Há, desde autores para os quais a
linguagem não tem papel especial no desenvolvimento da teoria da mente, propondo que a
teoria da mente é inata e não evidente antes de certo nível de desenvolvimento lingüístico e
cognitivo (Fodor, 1992); até autores que atribuem um papel mais fundamental e causal à
linguagem no desenvolvimento da teoria da mente, particularmente dos 18 meses aos 5 ou 6
anos, quando ambos, linguagem e teoria da mente, seriam rapidamente desenvolvidas e
intrinsecamente vinculadas (Dunn, Brown, Slomkowski, Tesla & Youngblade, 1991).
Nessa síntese, Astington e Baird (2005) apontam que entre as duas posições extremas,
estão os que defendem que o papel da linguagem está somente num nível superficial, uma
vez que muitas tarefas da teoria da mente são tarefas verbais, de forma que o sucesso no
desempenho das tarefas requer certo nível de habilidade lingüística (Chandler, Fritz & Hala,
1989); os que argumentam que as habilidades da teoria da mente repousam no domínio geral
das operações cognitivas que requerem linguagem (Frye, Zelazo & Palfai, 1995); e outros
pesquisadores que vêem o papel da linguagem como um caminho natural de prover as
crianças com a informação que elas requerem para construírem uma teoria da mente (Gopnik
& Wellman, 1994; Perner, 2000).
Nas pesquisas em teoria da mente, em particular aquelas que buscam relações entre
teoria da mente e linguagem, as questões metodológicas são de grande importância.
Encontra-se na literatura uma discussão sobre o uso da linguagem como recurso na pesquisa
em teoria de mente: seja pela aplicação de tarefas que, afinal, são verbais; seja pelo
43
intrincado trabalho de observação que também se apóia em manifestações verbais. Assim, de
uma forma ou de outra, a linguagem tem lugar de destaque nos estudos em teoria da mente.
Astington (1999) lembra que é o conhecimento das pessoas comuns que investigamos
e, portanto, as questões de método são importantes uma vez que essa investigação se volta ao
conhecimento espontâneo das crianças: o que interessa é o que a criança compreende, o olhar
deve repousar no senso comum das crianças. Afinal, não se pode esperar que as crianças
sejam capazes de descrever sua teoria da mente e explicá-la: é necessário inferí-la.
Mas quais seriam os melhores caminhos para chegar aos resultados, para obter
conclusões? Como conduzir as pesquisas sobre a compreensão que as crianças têm da mente?
O que permitiria concluir se as crianças compreendem, ou não, isto ou aquilo sobre a mente?
Diferentes autores (Astington, 1999; Bruner, 1997; Dunn, 1988) respondem
apontando que é necessário recorrer aos dois métodos fundamentais da psicologia do
desenvolvimento: a observação e a experiência. Observar crianças e escutá-las enquanto
vivem, falam e brincam no seio de sua família é uma possibilidade. Também é possível
propor experiências e verificar se elas foram ou não compreendidas por meio do que as
crianças dizem e fazem nas respostas às tarefas que lhes foram propostas. Porém, mais que
observar ou experimentar, é importante decidir o que observar ou avaliar.
Dunn (1988) aponta que pode parecer paradoxal o fato de ser possível observar
facilmente que os bebês se entendem bem e parecem conscientes do comportamento e
reações emocionais dos adultos com quem convivem, ao passo que as crianças um pouco
maiores, em idade pré-escolar, não têm sucesso em certos testes experimentais referentes à
sua compreensão do ponto de vista do outro. O que é preciso melhorar nas investigações?
Este não é um problema fácil de resolver.
Slomkowski e Dunn (1996) desenvolveram um trabalho explorando essa questão e
encontraram que habilidades exploradas por protocolos experimentais podem ser
relacionadas aos vínculos na comunicação entre a criança e um interlocutor amigo,
observados em situações espontâneas. Concluem que tanto as tarefas experimentais como as
observações naturalísticas requerem e exploram habilidades sociocognitivas similares. Esses
resultados também são importantes por sugerirem que o paradigma experimental, com as
tarefas de crença falsa que representam uma ampla expansão na área da pesquisa sobre
cognição social, pode contribuir para o entendimento das habilidades necessárias na
coordenação das interações com os amigos.
Sem o uso de tarefas, Harris (1996) investigou a apropriação dos estados mentais
pelas crianças por meio das expressões verbais que elas emitem. Os resultados mostraram
44
que por volta dos dois anos as crianças começam a produzir palavras referentes a estados
mentais: quase todas referem estados de percepção (‘eu vi’, ‘eu escutei’) e de volição (‘eu
quero’). Um número menor de crianças, mas ainda a maioria, faz referências a estados de
emoção (‘triste’, ‘feliz’, ‘bravo’, ‘contente’, ‘assustado’, ‘com medo’) e, cerca de um terço
das crianças, referem estados cognitivos (‘esqueci’, ‘sei’, ‘lembrei’, ‘acho’
6
).
Um aspecto importante a ser observado nesse desenvolvimento, é que as referências
aos próprios estados mentais são mais freqüentes que as referências aos estados mentais dos
outros - sejam eles perceptivos, volitivos, emotivos ou cognitivos. A defasagem entre essas
duas referências corrobora com a argumentação de serem as crianças conscientes de seus
próprios estados mentais inicialmente e, só então, interpretar o comportamento dos outros
projetando sobre eles os seus próprios estados mentais (Harris, 1996).
Assim, as expressões verbais emitidas pelas crianças podem proporcionar
demonstrações de sua apropriação dos estados mentais e, mais ainda, quando a criança passa
a falar explicitamente dos estados mentais, justificando as ações alheias em função desse
conhecimento, obtém-se demonstrações convincentes da consciência dos estados mentais
pelas crianças.
Por outro lado, a literatura apresenta muitos resultados oriundos de pesquisas
realizadas com aplicação de tarefas, que contribuem com dados de outra espécie, permitindo
a observação do desempenho das crianças em situações específicas, mesmo sendo
considerados pouco informativos quanto à natureza dessa habilidade. As tarefas (que
envolvem as ações de um personagem em função de sua crença, crença falsa, desejo ou
emoção) têm contribuído muito nas investigações sobre o desenvolvimento da compreensão
da mente pelas crianças: elas são simples e têm sido replicadas por muitos estudos e em
diferentes lugares, possibilitando comparações e discussões entre os pesquisadores
(Domingues, Valério, Panciera & Maluf, 2007).
A vantagem de se utilizar esse tipo de metodologia é que as tarefas em teoria da
mente fornecem dados precisos, uma vez que a situação experimental é controlada. Alguns
autores (Astington & Gopnik, 1988; Moses & Flavell, 1990; Wimmer & Perner, 1983)
consideram que quando a criança apresenta bom desempenho em tarefas de crença falsa ela
tem uma teoria da mente.
6
Referimos o verbo achar quando é usado pela criança no sentido de pensar e não de encontrar
(sentido atribuído pelo contexto).
45
Neste trabalho, a proposta é explorar ambos os recursos metodológicos com o mesmo
grupo de crianças, longitudinalmente, ao longo de 18 meses. O propósito central é estudar a
constituição da teoria da mente das crianças, a partir dos dois anos completos. Pretende-se
observar as manifestações mais precoces da capacidade de atribuição de estados mentais ao
outro. Os estados mentais referidos aqui são os que retratam emoções, desejos e crenças.
Será objeto de análise o conjunto de manifestações da compreensão de estados
mentais, tanto através de relatos verbais em situações lúdicas, como por meio do desempenho
na realização de tarefas. O quadro teórico que dá sustentação a esta pesquisa tem, por um
lado, estudos naturalísticos e, por outro, estudos experimentais. Neste trabalho será possível
acompanhar, longitudinalmente, as mesmas crianças em observações naturalísticas e com
medidas de crença falsa: o que permitirá descrever, analisar e interpretar as suas
manifestações de uma teoria da mente.
Assim, pergunta-se:
Como se manifesta e evolui a capacidade de compreensão de estados mentais nos
primeiros anos de vida?
Tem-se como objetivo central nesta pesquisa avançar na compreensão do
desenvolvimento da teoria da mente buscando compreender as possíveis associações entre o
uso de termos mentais e o desempenho em tarefas de atribuição de estados mentais. Para
isso, o recurso é o acompanhamento longitudinal do grupo dos participantes por meio dos
dois procedimentos.
Tem-se como objetivos específicos verificar longitudinalmente, num período de 18
meses subdividido em quatro imersões:
1. Como se apresenta nas crianças, em situações lúdicas, o uso de expressões
verbais que contêm termos mentais;
2. Como se apresenta nas crianças, a habilidade de compreensão da mente do
outro (teoria da mente) em tarefas de atribuição de estados mentais;
3. Que mudanças qualitativas se evidenciam nas manifestações dessa
compreensão nas diferentes imersões;
4. As possíveis associações entre o uso de termos mentais em situações lúdicas e
o desempenho em tarefas de crença falsa.
46
3. Método
3.1 Local e Participantes
Esta pesquisa foi realizada numa escola de educação infantil da rede particular de
ensino, em uma cidade do litoral paulista. A escola atende a uma clientela de nível
socioeconômico médio e médio-alto. Foram incluídas todas as crianças matriculadas na
escola que estavam na faixa etária prevista no estudo, isto é, de 1 ano e 11 meses aos 3 anos e
11 meses de idade.
A pesquisa teve início com 67 crianças. Houve uma perda amostral de 9 crianças e,
assim, a última coleta incluiu 58 crianças, que são os participantes deste estudo. Quanto à
idade, as crianças estavam distribuídas, no início da coleta, na faixa etária de 1 ano e 11
meses a 3 anos e 7 meses, sendo 29 meninos e 29 meninas.
Com o objetivo de conhecer a capacidade de expressão verbal dos participantes no
início da pesquisa, foi aplicado um instrumento de avaliação da expressão verbal uma
semana antes da primeira coleta.
Para tanto, realizou-se um encontro individual entre criança e experimentador, que leu
uma história para a criança e a convidou a responder 12 questões com o apoio visual das
gravuras do livro. Foi utilizada a história João e Maria (Silva & Scheidemantel, s/d), na
versão de um livro já conhecido pelo grupo de crianças, por constar na biblioteca da classe -
informação fornecida pelas professoras.
As doze questões foram escolhidas de modo que quatro delas se referissem ao
reconhecimento do personagem, outras quatro à identificação de cores e, as quatro últimas, à
identificação de ações dos personagens. As questões utilizadas estão exemplificadas abaixo:
1) Quem é esse menino? (“João”)
2) De que cor é esse pirulito? (“Azul”)
3) O que eles estão fazendo? (“Pegando maçãs” ou “Pegando frutinhas”)
Além de permitir um conhecimento preliminar do grupo de participantes, esse
procedimento possibilitou uma boa aproximação do experimentador com as crianças, o que
se tornou um elemento facilitador da interação.
47
3.2 Delineamento da pesquisa
Esta é uma pesquisa de tipo longitudinal. O grupo de crianças foi acompanhado ao
longo de 18 meses e os dados foram coletados em intervalos de 6 meses. Houve, portanto,
quatro coletas de dados, conforme apresentado na Tabela 2.
Tabela 2Distribuição das quatro coletas ao longo dos 18 meses do estudo.
Em cada coleta foram utilizados dois procedimentos:
a) observação das crianças em situações lúdicas semi-estruturadas em grupos de
quatro indivíduos; e
b) aplicação individual de tarefas de desejo, crença e crença falsa.
3.3 Instrumentos e Procedimentos
A seguir, serão descritos os dois diferentes procedimentos de coleta separadamente.
3.3.1 Observação das crianças em situações lúdicas pequenos em grupos
A observação em situações lúdicas se deu a partir do convite às crianças a participar
de um jogo de faz-de-conta, proposto por meio da encenação de histórias infantis, sendo uma
história diferente a cada coleta. Assim, as situações lúdicas propostas eram semi-estruturadas
por permitir que a crianças brincasse livremente, mas sempre a partir de uma mesma
proposta já definida, que era feita às crianças sempre em pequenos grupos de quatro
indivíduos.
2005 2006 2007
Coleta 1
Outubro
Coleta inicial
Coleta 2
Abril
Após 6 meses
Coleta 3
Outubro
Após 12 meses
Coleta 4
Abril
Após 18 meses
48
As crianças foram convidadas, já em grupos de quatro, a participar de uma
“brincadeira”. Uma vez aceito o convite, foram levadas a uma sala previamente preparada,
com uma câmera digital já posicionada para a filmagem, em um espaço delimitado por um
tapete (sala disponibilizada pela escola no período da manhã) ou por biombos (sala
disponibilizada no período da tarde), onde se dariam as interações entre as crianças.
Ao chegar à sala, foi dito às crianças:
- “Vamos sentar para ouvir uma historinha e ver o livro enquanto escutamos o CD.
Depois, vamos conversar sobre essa historinha e brincar com os personagens que estão ali.”
(nesse momento apontava-se para os bonecos que estavam a uma distância razoável das
crianças).
A seguir, através da audição de CD e da observação das figuras, foi apresentada a
história cuja duração variava entre 5 e 7 min (dependendo da história). Uma vez ouvida, as
crianças foram convidadas a contá-la e a conversar sobre o enredo e as ações dos
personagens, em tempo livre. Em seguida, foram convidadas a vivenciar a história, podendo
representar os personagens por meio de bonecos ou brincar livremente no espaço pré-
determinado.
O convite a brincar foi feito com a seguinte orientação:
- “Agora vocês podem brincar com os bonecos da forma que quiserem, mas sem sair
aquele espaço.” (apontando-se para o espaço entre os biombos, quando era o caso); ou
- “Agora vocês podem brincar com os bonecos da forma que quiserem, mas sem sair
do tapete.” (apontando-se para o tapete, quando era o caso).
Foi disponibilizado um tempo entre 6 e 12 min para a brincadeira, incluindo-se como
parte desse tempo, a própria preparação e organização da atividade, que também ficou sob
responsabilidade das crianças: atribuição de papéis aos “atores”, escolha de fantoches e
objetos de cena, uso do espaço etc.
Os títulos foram escolhidos por meio de dois critérios: por envolverem quatro
personagens, o que possibilitaria trabalhar com grupos de quatro indivíduos, e por serem bem
conhecidos pelas crianças, fazendo parte de seu repertório. A Tabela 3 apresenta os títulos
escolhidos para cada coleta e os personagens envolvidos.
49
Tabela 3Histórias escolhidas, por coleta, com explicitação dos personagens.
No Anexo 1 encontram-se as versões integrais das quatro histórias que foram extraídas
da coleção “Clássicos Inesquecíveis”. Trata-se de versões das histórias clássicas de
diferentes autores, adaptadas por Silva e Scheidemantel (s/d), publicadas em livro e CD.
Todos os encontros foram vídeo-gravados desde o momento inicial da preparação e
todas as falas foram transcritas para posterior análise.
3.3.2 Aplicação individual de tarefas de crença e crença falsa.
A capacidade de atribuição de estados mentais de desejo, crença e crença falsa foi
avaliada por meio da aplicação individual de tarefas. Em cada coleta, as tarefas foram
aplicadas em uma única sessão. A duração aproximada das sessões variou de 8 a 15 min, nas
diferentes coletas ao longo dos 18 meses. As crianças eram convidadas a participar ouvindo a
descrição de situações contadas com apoio de brinquedos, numa sala cedida pela escola e
preparada para isso.
O experimentador contou “histórias” para as crianças com o auxílio de brinquedos e
as crianças foram convidadas a dizer o que o personagem faria, se o personagem sabia ou não
sobre algo, ou como o personagem se sentiria.
Ao chegar à sala, foi dito às crianças:
-“Vou mostrar meus brinquedos para você e contar umas historinhas com eles.
Depois, você me ajuda a terminar as historinhas dizendo o que vai acontecer”.
No Anexo 2 encontram-se as seis tarefas de avaliação da compreensão de estados
mentais utilizadas na pesquisa. Trata-se das seis primeiras tarefas da escala de Wellman e Liu
(2004). Abaixo, constam os nomes das tarefas aplicadas segundo a seqüência proposta na
escala, com uma breve descrição do que é avaliado em cada uma.
Coletas Histórias Escolhidas Personagens (n = 4)
Os Três Porquinhos 3 porquinhos e 1 lobo
Cachinhos dourados 1 menina e 3 ursos
Chapeuzinho Vermelho 1 menina, 1 mãe, 1 lobo e 1 avó
Rapunzel 1 menina, 1 pai, 1 bruxa, 1 príncipe
50
1ª tarefa - Diferentes desejos: a criança deve predizer a ação do outro quando duas
pessoas (a própria criança e a outra pessoa) têm desejos diferentes sobre os mesmos objetos;
2ª tarefa - Diferentes crenças: a criança julga a ação do outro quando duas pessoas (a
própria criança e a outra pessoa) têm crenças diferentes sobre os mesmos objetos e quando a
criança não sabe qual crença é verdadeira ou falsa;
3ª tarefa - Acesso ao conhecimento: a criança vê o que há dentro de um recipiente
qualquer e julga (sim ou não) o conhecimento da outra pessoa que não teve acesso ao
conteúdo da caixa;
4ª tarefa - Conteúdo inesperado:
a criança julga a crença falsa de outra pessoa sobre o
que há dentro de um recipiente bem característico, quando a criança conhece o conteúdo
inesperado do recipiente (variação da clássica tarefa de conteúdo inesperado);
5ª tarefa - Crença falsa explícita:
a criança julga onde outra pessoa (um personagem)
vai procurar um objeto, sendo que esse personagem tem uma crença equivocada sobre a
localização do objeto (variação da clássica tarefa de mudança de lugar);
6ª tarefa - Emoção sobre a crença: a criança julga como uma pessoa se sentirá diante
de uma crença equivocada.
Na primeira coleta (outubro de 2005), foram utilizadas as três tarefas mais simples
apresentadas nessa escala. Nas demais coletas (abril de 2006; outubro de 2006; abril de
2007), foi mantida a aplicação das mesmas tarefas, com variação de objetos, bonecos, nomes
dos personagens e contextos, e incluídas gradativamente, isto é, uma nova tarefa a cada
coleta, as demais tarefas da escala (Tabela 4).
Tabela 4 - Distribuição das tarefas aplicadas por coleta
Foi elaborado um protocolo diferente para cada coleta (Anexo 3), onde foi registrado
o desempenho dos participantes e as justificativas às respostas. Ao longo dos dezoito meses
de duração deste estudo, foi aplicado um total de 18 tarefas.
Tarefas
Coleta 1 Coleta 2 Coleta 3 Coleta 4
Diferentes desejos
X X X X
Diferentes crenças
X X X X
Acesso ao conhecimento
X X X X
Conteúdo inesperado
X X X
Crença falsa explícita
X X
Emoção sobre a crença
X
Total de tarefas por coleta
3 4 5 6
51
3.3.3 Cuidados metodológicos e éticos
Para controle do efeito de ordem, os dois procedimentos de coleta foram alternados.
Para 50% dos participantes, aplicou-se inicialmente as tarefas e, só depois, as crianças foram
convidadas a participar das situações lúdicas. Inversamente, a outra metade dos participantes
iniciou tomando parte nas situações lúdicas e, só então, passaram à resolução das tarefas. Este
controle foi feito nas quatro coletas.
Para cada coleta, ao longo dos dezoito meses de duração da pesquisa, foram utilizados
entre oito e doze dias do início do mês previsto.
Este projeto, com os procedimentos e instrumentos acima descritos, foi submetido e
aprovado pelo Comitê de Ética da PUCSP (Anexo 4).
Cuidou-se para que a participação das crianças sempre fosse voluntária e prazerosa.
As crianças eram convidadas a participar das atividades que, de fato, foram efetivamente
lúdicas. Dentre as crianças convidadas, apenas duas crianças não participaram (uma não
conhecia a língua por ser estrangeira e ter acabado de se mudar para o Brasil; outra por ter se
recusado a tomar parte das brincadeiras, alegando sentir medo de “histórias de bruxas”).
3.4 – Procedimentos de Análise
Os procedimentos de análise adotados neste estudo foram de dois tipos, em função
dos métodos de coleta de dados utilizados. Serão, portanto, analisados separadamente os
dados obtidos pela observação das crianças nas situações lúdicas e os resultados provenientes
da pontuação individual das crianças nas tarefas.
3.4.1 – Dados provenientes da observação das crianças em situações lúdicas
3.4.1.1 – Construção dos critérios de análise
Os dados vídeo-gravados, provenientes da observação das crianças em situações
lúdicas semi-estruturadas, foram obtidos pela transcrição integral das manifestações orais dos
participantes durante os minutos em que brincaram em grupos de quatro.
Para a posterior análise dos dados das quatro coletas, adotou-se o mesmo
procedimento: a cada sessão (grupo de quatro crianças em interação) foi feita uma primeira
52
H
H
á
á
a
a
t
t
r
r
i
i
b
b
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u
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A si próprio
Ao outro
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1
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)
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(
2
2
)
)
C
C
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r
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e
n
n
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ç
a
a
(
(
3
3
)
)
transcrição, na qual foram anotadas todas as manifestações orais das crianças, na seqüência
em que foram emitidas. A seguir, a vídeo-gravação de cada sessão foi revista pelo menos
quatro vezes focando-se, a cada vez, a observação de apenas uma das crianças, para garantir
a fidelidade da transcrição. Todas as transcrições foram feitas pela própria pesquisadora.
Após o término das transcrições, as falas foram organizadas de duas maneiras: por
sessão, para que fosse possível observar as diferentes formas de interações que ocorreram
entre as crianças do mesmo grupo, e por criança, de forma a possibilitar uma análise intra-
individual.
Os dados de cada criança foram submetidos ao software SPAD-T
7
, a fim de que fosse
possível criar categorizações para a análise dos resultados. A partir das listagens das palavras
expressas pelas crianças, organizadas pelo software por ordem de freqüência e alfabética,
foram selecionados os termos mentais. Para cada termo mental selecionado foram localizadas
as frases nas quais estava inserido e as crianças que o utilizaram.
As frases foram classificadas segundo os seguintes critérios:
1. há atribuição ao outro de estados mentais de emoção;
2. há atribuição ao outro de estados mentais de desejo;
3. há atribuição ao outro de estados mentais de crença.
A Figura 2 apresenta, de forma esquemática, como se propôs a classificação das
frases inicialmente.
Figura 2Esquema explicativo dos critérios para escolha e
classificação das manifestações orais das crianças.
7
Système Portable pour l’Analyse des Donnés
53
Foram consideradas as expressões que se encaixavam em um dos três critérios.
Porém, ao observar as palavras listadas pelo software, foram encontradas muitas atribuições
de caráter ao outro (bom, bonzinho, mau, briguento, esperto etc.), o que levou a ponderar
sobre a possibilidade de também incluí-las na análise.
Examinando essa questão com minúcia observou-se que, por um lado, “caráter” não é
um estado mental e, portanto, não se encaixa em nenhuma das categorias, isto é, não é uma
‘atribuição de estados mentais ao outro de emoção’, ou ‘de desejo’, tampouco ‘de crença’.
Logo, atribuição de caráter não caberia no quadro apresentado na Figura 2
Por outro lado, pode-se conceber que apontar uma particularidade do caráter de
outrem indica que esse outro tem uma mente, que suas emoções e intenções podem ser
justificadas a partir dessa particularidade. Conseqüentemente, compreender o caráter alheio
significa compreender os traços psicológicos, o modo de ser, sentir e agir do outro indivíduo
(Harris, 1996). Assim, neste trabalho, levou-se em conta a atribuição de caráter ao outro
como mais uma categoria de análise.
Ressalta-se que não foram incluídas quaisquer atribuições de características ao outro.
Expressões como “ele é bom”, “ele é esperto” ou “ela é egoísta” têm um sentido diferente
de expressões como “ele é feio” ou “ele é gordo”, por serem as últimas ligadas estritamente
a estados de percepção (é possível ‘ver’ tais características).
A expressão “Lobo Mau”, utilizada com muita freqüência pelas crianças, foi
considerada como nome próprio e não como manifestação de tipo algum. Não foi, portanto,
computada como expressão de atribuição de caráter. Foram, sim, consideradas expressões
como “Lobo Mau bonzinho” ou “Lobo Mau malvado”, que também apareceram nesta
análise.
Dessa maneira, um novo quadro (Figura 3) esquemático foi utilizado para a
classificação das manifestações das crianças:
54
H
H
á
á
a
a
t
t
r
r
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b
b
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(
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1
)
)
De estados mentais
E
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(
2
2
)
)
D
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j
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(
3
3
)
)
C
C
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e
n
n
ç
ç
a
a
(
(
4
4
)
)
Ao outro
A si próprio
Figura 3Esquema explicativo dos critérios definitivos para escolha
e classificação das manifestações orais das crianças.
As frases manifestadas pelas crianças foram, então, classificadas segundo os
seguintes critérios:
1. há atribuição de caráter ao outro;
2. há atribuição ao outro de estados mentais de emoção;
3. há atribuição ao outro de estados mentais de desejo;
4. há atribuição ao outro de estados mentais de crença.
Cuidados na categorização das manifestações das crianças
Alguns cuidados foram adotados ao categorizar as falas espontâneas das crianças:
1. Em diferentes ocasiões, foi possível observar que as crianças usavam termos
referentes a estados mentais sem ter a intenção de referir-se realmente a um estado
mental. Em algumas circunstâncias, “ele quer” era a expressão de um pedido, de
uma solicitação feita pelo outro, e não uma atribuição de desejo ao outro. A
expressão “ele sabe” algumas vezes foi usada para dar ênfase para uma asserção
feita pelo colega. Assim, todas as expressões foram vistas considerando-se o
contexto no qual elas foram emitidas, para que se evitassem equívocos na
categorização. Esses cuidados tomaram por base pesquisas anteriores, como os
trabalhos de Harris (1996), Shatz, Wellman e Silber (1993), Sperb e Conti (1998).
55
2. A expressão “eles viveram felizes para sempre” não foi contabilizada por se tratar
de uma expressão comumente usada nos finais das histórias infantis. Não se
considerou, portanto, essa expressão como manifestação da atribuição do estado
mental de emoção e, sim, como forma de expressar o fim da história.
3. Foram consideradas como manifestações de atribuições ao outro as expressões que
envolveram o uso da primeira pessoa do plural (Jenkins & Astington, 2000). Em
frases como “nós queremos brincar”, “nós não sabemos”, ou “a gente não sabe”
julgou-se que há atribuição a si próprio e, também, ao outro.
4. De forma similar, expressões do tipo “eu também quero ficar no laranja” foram
contabilizadas por pressupor que o também implica na atribuição prévia ao outro
do mesmo estado mental de quem enuncia a expressão (Jenkins e Astington, 2000).
5. Ressalta-se que houve o cuidado de excluir os casos em que os estados mentais
foram oralmente expostos por quem foi atribuído.
Uma vez classificadas, as expressões de cada tipo foram contabilizadas por coleta e
por criança, para a análise.
3.4.1.2 Tratamento dos dados
Como apresentado no delineamento, esta pesquisa constituiu-se de quatro coletas de
dados que foram feitas ao longo de 18 meses, em intervalos de seis meses. A cada coleta,
foram formados grupos de quatro crianças para participar de uma mesma sessão lúdica.
O número de sessões lúdicas variou nas quatro coletas, como apresenta a Tabela 5.
Tabela 5 Número de sessões e total de participantes por coleta
Assim, na primeira coleta foram feitas 17 sessões (que correspondem a 17 grupos de
quatro crianças), perfazendo um total de 67 crianças. Na segunda coleta foram feitas 17
sessões, mas num total de 62 crianças. Na terceira coleta 16 sessões foram realizadas
Coleta 1ª
nº de sessões ( = nº de grupos) 17 17 16 16
Total de participantes
67 62 61 58
56
envolvendo um total de 61 crianças e, na última coleta, se realizaram 16 sessões, perfazendo
um total de 58 crianças, que foram os participantes desta pesquisa.
Para completar os grupos de quatro crianças foi adotado o seguinte procedimento. Na
primeira coleta, uma criança foi convidada a participar duas vezes para completar o último
grupo. A partir da segunda sessão, com a perda de alguns participantes ao longo do estudo,
crianças que entraram na escola no início de 2006 foram convidadas a participar a fim de
completar os grupos. Essas crianças não passaram a integrar o estudo, uma vez que não
participaram da primeira coleta.
Cada conjunto de dados obtidos nas diferentes coletas recebeu o mesmo tratamento,
que está descrito a seguir.
Inicialmente, a cada coleta, foram transcritas todas as sessões, conforme exposto nos
procedimentos de análise, às p.51 e 52. Obteve-se, portanto, quatro conjuntos de transcrições,
separadas por sessão de quatro crianças, que permitem observar as interações dentro de um
mesmo grupo. O anexo 5 apresenta um exemplo de sessão transcrita de cada coleta (num
total de quatro sessões, portanto, quatro exemplos).
As transcrições foram, a seguir, tratadas de forma que as crianças pudessem ser vistas
individualmente. Isto é, as mesmas transcrições foram reorganizadas por participante,
obtendo-se outros quatro conjuntos de transcrições onde as manifestações de cada criança
pudessem ser observadas separadamente. O anexo 6 apresenta os mesmos exemplos que os
apresentados anteriormente, agora organizados por participante.
Esse segundo conjunto de transcrições, organizado por criança, recebeu o tratamento
do software SPAD-T, que gerou, para cada coleta, duas listagens de palavras: uma
organizada por freqüência e outra, por ordem alfabética. Foram desconsideradas, nessa
análise, as listas organizadas por freqüência e optou-se por utilizar as listas onde as palavras
aparecem em ordem alfabética. Essa opção justifica-se por aproximar palavras diferentes em
torno de seu radical comum, como nas variações dos verbos: pensa, pensava, pense, pensou,
pensativo ou quer, querem, queria, quisessem. Para exemplificação, o anexo 7 apresenta uma
das listas completas em ordem alfabética: a lista gerada na primeira coleta.
Passou-se, a seguir, à construção de quatro listas específicas com palavras retiradas
das listas gerais anteriores. Como critério para escolha das palavras, selecionou-se palavras
que fossem ‘termos mentais’: palavras que expressam características ou fatos mentais,
referindo-se a desejos, emoções, intenções, crenças. Foram, portanto, selecionados: adjetivos
como esquecido, esperto, feliz, triste; substantivos como imaginação, mentira, medo; verbos
como achar, saber, adorar, querer. Além desse critério, foram também selecionadas
57
palavras, que mesmo não sendo um termo mental, pudessem remeter a alguma manifestação
de compreensão de estados mentais, como ajudou, chorar, desculpe, doendo, porque.
Essas quatro listas específicas foram construídas manualmente, a partir da lista gerada
pelo SPAD-T, e estão apresentadas abaixo: foram chamadas de ‘Palavras para o arquivo
Corda’ (o termo corda refere-se à nomenclatura utilizada pelo software para designar as
frases nas quais estão inseridas as palavras escolhidas).
Palavras para o arquivo Corda - Primeira Coleta (53 palavras)
Acho
Azar
Bom
Bonzinho
Bravo
Briguento
Cansada
Cansado
Chorar
Chorou
Combinado
Condição
Consegue
Consegui
Conseguiu
Contente
Desculpa
Desculpe
Doendo
Esconder
Escondeu
Escondida
Escondido
Esqueci
Felizes
Feio
Finge
Gosta
Gostara
Gostaram
Gostei
Gosto
Imitando
Inventado
Lembra
Lembrávamos
Mal
Malvado
Mau
Medo
Mentira
Mentirinha
Parece
Paz
Quer
Queria
Quero
Sabe
Saudade
Sei
Ser
Sou
Verdade
Palavras para o arquivo Corda - Segunda Coleta (45 palavras)
Acho
Achou
Ajudou
Atenção
Bom
Bravo
Cansado
Chato
Chorando
Chorou
Descansando
Doendo
Doeu
Engraçada
Ensaiar
Ensina
Ensinou
Espantou
Esperando
Esqueci
Estranha
Felizes
Furiosos
Gosta
Gostei
Gostou
Medo
Parece
Pensa
Porque
Preciso
Provou
Quer
Querem
Querer
Queria
Quero
Quiser
Sabe
Saber
Saberem
Sabia
58
Sabiam Sei Torci
Palavras para o arquivo Corda - Terceira Coleta (81 palavras)
Achava
Acho
Amor
Boa
Bom
Bonzinho
Brava
Bravo
Calma
Cansado
Chora
Chorar
Combinamos
Conhece
Conhecia
Conheço
Contente
Corajoso
Descobriu
Disfarçado
Enganar
Enganou
Entendeu
Esconde
Esconder
Esqueceu
Esqueci
Esquisito
Estranhos
Feliz
Felizes
Finge
Fingindo
Fingir
Fingiu
Gostam
Gostar
Gostou
Imita
Imitou
Lembro
Mal
Malvado
Mau
Medo
Mentir
Mentira
Mentirinha
Parece
Pensa
Pensando
Pensar
Pensava
Pensei
Pensou
Percebeu
Promete
Prometeu
Prometo
Quer
Querem
Querendo
Querer
Queria
Querida
Quero
Quis
Sabe
Sabendo
Saber
Sabia
Sabido
Sei
Sentiu
Ser
Sumiu
Susto
Triste
Verdade
Vergonha
Vontade
Palavras para o arquivo Corda - Quarta Coleta (71 palavras)
Aceitou
Acharam
Achava
Acho
Adorava
Atreve
Bem
Boazinha
Bobona
Bom
Cansado
Chata
Chorou
Conhece
Conhecer
Conheço
Delícia
Desejo
Doida
Egoísta
Encantado
Entendeu
Esconde
Escondi
Esperta
Esqueceu
Esqueci
Existe
Feliz
Felizes
Finge
Gosta
Gosto
Impressão
Legal
Lembra
Lembro
Lembrou
59
Mal
Malvada
Malvadeza
Mau
Medão
Medo
Mentira
Parece
Pensava
Pensou
Percebeu
Quer
Querem
Queria
Queriam
Quero
Quis
Quiser
Resolveu
Sabe
Sabem
Saber
Sabia
Segredos
Sei
Sentiu
Ser
Sinto
Triste
Verdadeira
Vergonha
Vontade
As quatro listas específicas de palavras foram tratadas de modo a localizar cada uma
delas na locução verbal onde estava inserida.
Assim, foram geradas quatro listas gerais de locuções verbais contendo algum tipo de
termo mental ou outra das palavras escolhidas. O anexo 8 permite observar o exemplo de um
fragmento da listagem geral de locuções geradas pelo software.
A partir desse material selecionou-se, manualmente, quatro listas específicas de
palavras no seu contexto, que forneceram locuções com os termos inicialmente escolhidos na
lista anterior. Foram excluídas as locuções que, embora contivessem um dos termos
escolhidos, foram consideradas como locuções que não expressavam compreensão de estados
mentais, ou seja, o termo visto no contexto da locução não expressa compreensão de estados
mentais.
Esta parte da análise foi feita com procedimento de julgamento por dois juízes
independentes.
Para que fosse possível realizar uma análise intra-individual foi feita, também
manualmente, a reorganização de todas as locuções agrupando-as por criança, a cada coleta.
Assim, foram construídas quatro tabelas que estão apresentadas no Anexo 9 e apresentam,
por criança, as locuções verbais emitidas nas situações lúdicas que expressam, de alguma
forma, compreensão de estados mentais.
Para nomear os tipos de locuções das tabelas apresentadas no Anexo 9, foram
utilizados códigos:
Expressão de desejo – D
Expressão de emoção – E
Expressão de crença – C
Expressão de caráter – Car
60
Os conjuntos de locuções apresentados nessas quatro tabelas é que forneceram as
bases para a análise dos resultados que serão apresentados posteriormente. As locuções
verbais obtidas neste último passo forram consideradas as unidades de análise para a
interpretação dessa parte da pesquisa.
3.4.2 – Dados obtidos pela pontuação das crianças nas tarefas.
O desempenho das crianças na aplicação das tarefas de desejo, crença e crença falsa
foi pontuado com os valores zero (0) e um (1): zero (0) nos casos de erro e um (1) para os
acertos. As crianças foram convidadas a justificar todas as respostas, mas as justificativas não
foram consideradas para a atribuição dos pontos. Os resultados foram organizados por coleta
e agrupados em uma única tabela que exprimiu as pontuações a cada tarefa.
Os dados foram submetidos a uma Análise Fatorial que permitiu a criação de grupos
de crianças (clusters) pela proximidade de desempenho ao longo do tempo. Os clusters
apontaram similaridades e diferenças entre os grupos e objetivaram verificar como o
comportamento dos participantes se organizou em função das quatro coletas.
Foram calculadas as médias dos acertos de cada criança por coleta, lembrando-se que,
conforme pode ser observado na Tabela 4, à p. 50, o número de tarefas variou nas diferentes
coletas. Os clusters foram obtidos pelas médias dos grupos.
Passou-se, então, à análise do comportamento desses grupos, a fim de compreender as
características de cada um, isto é, para que fosse possível encontrar os perfis de
comportamento de cada cluster e evidenciar diferenças no desenvolvimento das habilidades
estudadas em diferentes crianças.
Além disso, uma somatória simples de todos os pontos obtidos individualmente,
considerando-se as quatro coletas, também foi examinada. A pontuação máxima possível
para cada participante é de 18 pontos, uma vez que foram aplicadas 3 tarefas na primeira
coleta; 4 tarefas na segunda coleta; na terceira coleta foram 5 tarefas; e, na última coleta, 6
tarefas foram aplicadas, perfazendo um total de 18 tarefas em todo o estudo.
61
4. Resultados
A apresentação dos resultados foi dividida em três partes. Serão inicialmente
apresentados os resultados provenientes das locuções verbais emitidas pelas crianças,
considerando uma visão de conjunto e separadas segundo as categorias de análise
(atribuições de desejo, emoção, caráter e crença). A seguir, serão apresentados os resultados
obtidos a partir do desempenho nas tarefas submetido à análise fatorial. Finalmente, os
resultados da análise intra-individual de alguns participantes serão expostos, o que
possibilitará um exame dos dois conjuntos de dados simultaneamente.
4.1 Resultados obtidos pela observação das crianças em situações lúdicas grupos
A primeira etapa para a análise dos dados provenientes das locuções verbais, foi a
organização de uma tabela comparativa dos resultados nas quatro coletas, considerando
como unidade de análise as locuções emitidas de cada categoria, isto é, se a locução
manifestava desejo, emoção, crença ou caráter, com a freqüência das crianças que as
emitiram.
A Tabela 6 sintetiza esses dados e utiliza o mesmo conjunto de códigos
apresentados na p. 59 e no Anexo 9: D para desejo, E para emoção, C para crença e Car
para caráter.
Tabela 6Comparativo das locuções verbais expressas nas quatro coletas,
por participante.
Nº de Coleta 1 Coleta 2 Coleta 3 Coleta 4
Ordem idade Idade idade idade
1
4
43m 49m 55m D 61m
2
5
42m E,D 48m D 54m E,C,Car 60m D,C
3
6
42m 48m 54m D,E,C 60m D,C
4
7
42m 48m D,E 54m E,C 60m D,E,C
5
8
42m D 48m 54m D,C 60m D,E,C
6
9
42m E 48m D 54m D,E,C, Car 60m C,Car
7
10
42m 48m 54m 60m E
8
11
41m D 47m D 53m E 59m D,E,C
9
12
41m 47m 53m D,C 59m D
10
13
41m 47m 53m D,C 59m D,C
11
14
41m D, C, Car 47m 53m D,E,C 59m D,C
12
15
41m D,E 47m 53m D 59m D,E
13
16
41m D,E 47m 53m D,Car 59m D
14
17
41m 47m D 53m D,E,C 59m D,E,Car
62
15
18
41m D,C 47m 53m E,C 59m D,C
16
19
41m 47m 53m E 59m C,Car
17
20
40m D 46m 52m D,E,C 58m
18
21
40m 46m 52m 58m
19
22
39m 45m D 51m 57m D,C
20
23
38m 44m 50m 56m D,C
21
24
38m 44m 50m E,D,C 56m E,C
22
25
38m 44m 50m 56m D,E
23
26
38m 44m C 50m E,C 56m D,E
24
27
38m 44m C 50m D,C 56m E,Car
25
28
38m D 44m 50m 56m D
26
32
35m Car 41m 47m E,C 53m D,C
27
33
34m D 40m 46m 52m
28
34
34m 40m 46m D 52m D,C
29
35
34m D 40m 46m E,C 52m
30
37
33m 39m Car 45m D 51m D,C
31
38
33m Car 39m D 45m D,E 51m D,Car
32
39
33m D 39m 45m E 51m D,C
33
40
32m 38m 44m E,C 50m
34
41
31m 37m 43m D, C 49m E,C
35
42
31m 37m 43m D,C 49m D,C
36
43
31m 37m D 43m 49m
37
44
31m D, Car 37m 43m 49m
38
45
30m D, Car 36m 42m D 48m D
39
46
30m 36m 42m E 48m
40
47
30m 36m 42m D,E 48m D,C
41
48
29m D 35m E 41m D,E,C 47m C,Car
42
50
29m 35m D,C 41m D 47m D,E
43
51
29m D 35m 41m D,C 47m C
44
52
29m 35m 41m E 47m C
45
53
29m 35m 41m D,E,C, Car 47m D,C
46
54
29m 35m 41m D 47m
47
55
29m E 35m 41m D 47m D
48
56
28m 34m D 40m D,C 46m D,C
49
57
27m 33m 39m E,C,Car 45m
50
58
27m 33m D,E 39m E,D,C 45m D,I,C,Car
51
59
26m 32m 38m D,C 44m D
52
60
26m 32m 38m 44m
53
61
25m 31m 37m 43m D,E
54
63
25m 31m C 37m Car 43m Car
55
64
24m 30m 36m E,Car 42m
56
65
24m 30m 36m D,E 42m
57
66
23m 29m 35m D,C 41m D,I,C,Car
58
67
23m 29m 35m E,D 41m D
A Tabela 6 mostra os participantes que manifestaram compreensão de estados
mentais ao longo do estudo. É possível observar que, na primeira coleta, há um total de 20
crianças que expressam algum tipo de compreensão de estados mentais. Esse número de
crianças passa para 16 na segunda coleta. Na terceira coleta, observa-se um aumento do
63
número de participantes que manifestam essa compreensão, num total de 47 crianças. Na
última coleta, esse total passa a ser 44 participantes. Esse resultado sugere que ao longo do
estudo ocorreu nas crianças um desenvolvimento na capacidade de uso de termos mentais.
Duas crianças (nº. 21 e nº. 60) não emitiram locuções que demonstrassem essa
compreensão ao longo das quatro coletas. Embora seja importante ressaltar que se a criança
não apresentou essas locuções em nenhuma das sessões lúdicas, não se pode afirmar que não
houve o desenvolvimento da capacidade de compreensão de estados mentais no período da
pesquisa, esse resultado inesperado permite que se levante essa hipótese e sugere que o
resultados apresentados pelas crianças nº 21 e nº 60 sejam melhor investigados.
Dessa forma, do universo dos 58 participantes, 56 demonstraram ter desenvolvido a
capacidade de compreender estados mentais. Portanto, ao longo do estudo, somente duas
crianças não forneceram indícios dessa compreensão. As demais, em algum momento e de
alguma forma, forneceram esses indícios.
Mais adiante, quando for apresentado o confronto entre os resultados obtidos pelas
situações lúdicas e tarefas, este estudo voltará às duas crianças que não manifestaram essa
compreensão (nº 21 e nº 60).
Tratou-se, a seguir, das 56 crianças que forneceram indícios da compreensão de
estados mentais. As diferentes categorias foram estudadas a partir da compreensão manifesta.
Estudou-se a variação do número de crianças que manifestaram essa compreensão
com ao longo do estudo. Para tanto, as locuções verbais foram agrupadas por categoria, como
mostra a Tabela 7.
Tabela 7Número de crianças que expressaram os diferentes tipos de compreensão de
estados mentais (de desejo, emoção, caráter e crença) ao longo do estudo.
A Tabela 7 apresenta o número de crianças que manifestaram compreensão de estados
mentais nas diferentes categorias ao longo do estudo. Em todas as coletas, é mais freqüente o
número de crianças que emitem locuções expressando desejo.
Coletas
Estados mentais
Coleta 1 Coleta 2 Coleta 3 Coleta 4
Desejo 16 11 32 36
Emoção 5 3 27 13
Caráter 5 1 7 9
Crença 2 4 27 27
64
Na primeira coleta (média de idade de 34m) observa-se maior freqüência de crianças
que emitiram locuções de desejo, sendo 16 crianças; seguidas pelas crianças que expressaram
emoção e caráter, em número de 5 crianças cada uma. Apenas duas crianças manifestaram
compreensão de crença na primeira coleta.
Retomando-se a Tabela 6, observa-se que, à exceção da coleta seguinte, o participante
que expressou uma locução de crença continua utilizando-a até o fim do estudo. Por esse
motivo, este participante (nº. 14) também foi escolhido para uma análise intra-individual, que
será apresentada mais adiante.
Seis meses depois (média de idade de 40 m), na segunda coleta, as crianças que
manifestam desejo continuam as mais freqüentes. As locuções aparecem em 11 crianças,
seguidas das que manifestaram crença (4 crianças). As expressões de emoção só aparecem
em 3 crianças e apenas 1 criança manifestou caráter.
Na terceira coleta (média de idade de 46 m), as crianças que manifestaram locuções
de desejo continuam em maior número, sendo 32 crianças. Seguem-se as que manifestaram
emoção em mesmo número das que manifestaram crença, com locuções que aparecem em 27
crianças em cada categoria. As crianças que emitiram locuções de caráter (7 crianças)
aparecem em número bem menor em relação às anteriores.
No final do estudo, (média de idade de 52 m), as crianças têm entre 3a5m e 5a2m,
observa-se maior freqüência de crianças que manifestam desejo, como nas coletas anteriores,
aparecendo em 34 crianças. Em 27 crianças, aparecem as locuções de crença seguidas pelas
de emoção, em 13 crianças, e pelas manifestações de caráter, em 9 participantes.
Outros resultados foram observados. Além de observar quantas e de que tipo eram as
locuções que expressaram essa compreensão, procurou-se analisar como essas manifestações
se apresentavam. Com esse objetivo, a análise das manifestações verbais das crianças em
interação nas situações lúdicas focou três aspectos: verificação da variedade de palavras que
as crianças utilizaram para expressar estados mentais; primeira ocorrência, freqüência e
contexto do uso das palavras; mudanças qualitativas dessas manifestações com o tempo.
Com foco nesses três aspectos, serão apresentados os resultados distribuídos em quatro
blocos, conforme as categorias previstas nos procedimentos de análise, às p. 53 e 54: desejo,
emoção, caráter e crença.
65
4.1.1 Manifestações da atribuição de desejo ao outro
O verbo querer foi o termo mais utilizado pelas crianças para a manifestação de
desejo. Em diferentes ocasiões, ao utilizá-lo, as crianças se referiram a um desejo (como em
“o lobo quer engolir os três porquinhos”) ou a uma intenção, isto é, uma decisão deliberada
ou planejada (como em “a gente quer sentar naquela cadeira”). Decidiu-se, portanto, por
não separar as duas classificações.
Neste estudo, as manifestações de desejo foram predominantes em relação às demais
(emoção, caráter, crença) nas falas das crianças. Entre 1a11m e 2a4m não houve qualquer
manifestação de desejo. As crianças só manifestaram desejo através do o uso do verbo quer a
partir dos 2a5m, nas situações que envolveram troca dos bonecos, como forma de convite
(“Quer trocar?”) ou em circunstâncias nas quais as crianças estão manifestando um desejo
já declarado pelo outro, isto é, como forma de constatação.
Na primeira coleta, o verbo querer aparece, em geral, nas negociações entre as
crianças sobre troca dos bonecos na brincadeira. Em freqüência menor o termo é usado para
expressar o desejo do personagem ou do colega na atividade.
A manifestação mais precoce surgiu com a locução emitida pela criança nº 48 (aos
2a5m), que estava inserida num grupo cuja idade variou entre 2a7m e 2a2m. O verbo querer
apareceu na disputa do boneco e seu uso parece apresentar mais uma asserção e uma
proposta de troca do que, propriamente, uma atribuição de desejo ao colega.
46 (2a6m) – Ele é o lobo mau.
48 (2a5m) – Toma, toma!
43 (2a7m) – Esse é meu!
48 (2a5m) – Ela não quer
. Você não quer?
60 (2a2m) – Não.
Outras locuções também pareceram expressar mais um convite do que a compreensão
do desejo do colega. Os exemplos abaixo se referem a essas manifestações e foram emitidas
por crianças de diferentes idades.
Emitida pelo nº 39, aos 2a9m, a pergunta “Quer
trocar?” sugere expressão de uma
proposta.
66
39 (2a9m) – O lobo vai comer! Vai comer! Comeu!
40 (2a8m) – Eu! Eu! Eu!
39 (2a9m) – Põe o dedo. Quer trocar? (propõe ao colega que não assumiu o papel)
40 (2a8m) – Eu! Eu! Quero o lobo!
Em outras situações, o verbo foi utilizado como um convite:
14 (3a5m) – Você quer vir aqui na casa de tijolos?
38 (2a9m) – O porquinho! O porquinho! O porquinho, o porquinho... o lobo... o lobo!
14 (3a5m) – E agora nós estamos no fim da história.
Assim, nesses casos, as manifestações não foram consideradas como atribuição de
desejo ao outro.
A mais precoce locução classificada como atribuição de desejo ao outro foi emitida
pela criança nº 44 e ocorreu aos 2a7m. No fragmento, a criança atribuiu desejo ao
personagem ao afirmar que o lobo “quer papar”. Sua asserção provocou no colega a reação
de abrir a boca do boneco que representa o lobo.
45 (2a6m) - Vamos bater nele, vamos? Olha...
44 (2a7m) – Quer papar! Quer papar!
45 (2a6m) – Ele abre a boca! (fala enquanto abre a boca do lobo)
Pouco tempo depois, na mesma sessão, a criança nº 45 é que passou a utilizar o verbo
querer. Esse uso, porém, não foi considerado como atribuição de desejo, mas como
solicitação de troca e confirmação de um desejo já manifestado pelo outro.
45 (2a6m) – Não quer trocar?
44 (2a7m) – Não quero.
45 (2a6m) – Ele não quer trocar... (dirigindo-se ao observador, que nada responde)
44 (2a7m) – Não quer! Quero o lobo mau!
A criança nº 20, aos 3a4m, usou o verbo querer como constatação do desejo do outro.
17 (3a5m) – Socorro! Ainda bem que não peguei você!
37 (2a9m) - E eu vou pegar você.
67
17 (3a5m) – Vai pegar você!
37 (2a9m) - Iah!
20 (3a4m) – Vamos trocar, Larissa? Ela não quer trocar...
17 (3a5m) – Tó!
Todos os exemplos acima são fragmentos de conversações da primeira coleta (em
outubro de 2005). O uso do verbo querer apareceu, nessa coleta, em locuções breves
concentradas num mesmo bloco de conversa, o que sugere que quando uma das crianças a
utiliza, as outras crianças passam também a utilizá-las no contexto da conversa, o que
ocorreu mesmo entre as crianças mais velhas (entre 3a7m e 3a5m).
No exemplo, quando uma das crianças (nº 5, com 3a6m) solicitou ao observador, no
meio da brincadeira, que a história fosse contada novamente, as demais passaram a opinar ou
a fazer asserções sobre a opinião dos colegas.
5 (3a6m) – Depois você conta aquela história dos porquinhos de novo?
9 (3a6m) – Eu quero.
5 (3a6m) – Eu não gostei. Eu não gostei, ai, ai, ai...
28 (3a2m) – Eu não quero...
5 (3a6m) – E ninguém quer.
28 (3a2m) – É, ninguém quer.
5 (3a6m) – Os meninos não gostaram...
9 (3a6m) – As meninas gostaram, né?
A criança nº 5, com 3a6m, foi quem introduziu na conversa a primeira atribuição de
desejo ao outro ao afirmar “E ninguém quer
.” A criança nº 28 (com 3a2m) confirmou a
asserção do amigo, o que pareceu mais um ato de imitação.
Pouco depois, na mesma sessão, as crianças simularam o momento da história em que
o lobo cai da chaminé dentro do caldeirão de água fervente e começaram a falar sobre a
temperatura da cabeça do lobo que, na realidade, estava fria. Mas na situação da brincadeira
estava quente. Aqui, o verbo foi usado como convite.
5 (3a6m) – Põe a mão na minha (a criança se refere à cabeça do boneco).
28 (3a2m) – Ai, tá muito fria!
34 (2a10m) – Ai, tá muito fria...
68
5 (3a6m) – Não tá muito frio, tá muito quente... Quer ver?... Põe a mão aqui... Tá muito
quente!
28 (3a2m) – Tá muito frio!
5 (3a6m) – Tá muito quente!
9 (3a6m) – Cadê o quente?
5 (3a6m) – Tá aqui, ó! Ó aqui no quente...
Neste caso, a criança (nº 5, com 3a6 m) que iniciou a conversa é a mesma que iniciou
a do exemplo anterior. É a única que utilizou a palavra querer, introduzindo uma pergunta
aos colegas, convidando-os a verificar sua afirmação sobre a temperatura do lobo. As outras
crianças entraram no jogo proposto pelo amigo, mas só utilizaram expressões ligadas à
percepção, concentrando-se na sensação quente/frio. Neste grupo, esses foram os únicos dois
fragmentos da conversação onde apareceram as manifestações em estudo.
Abaixo, seguem outros exemplos dessa manifestação, que permitiram confirmar essa
característica: em sua maioria são locuções breves nas quais as crianças expressam seu
próprio desejo.
A criança que iniciou a conversa (nº 11) tem 3a5m. Ela atribuiu às outras o mesmo
desejo que o seu. Uma delas (nº 8, um mês mais velha que a primeira) respondeu imitando a
amiga, mas as demais se engajaram manifestando seus próprios desejos (nº 22, com 3a3m, e
23, com 3a2m). Ao ouvir todas as colegas, a criança que imitou (nº8) manifestou outro
desejo e, a que iniciou a conversa, se manteve atribuindo seu próprio desejo às demais.
11 (3a5m) – Era uma vez um lobo que assoprava, assoprava, assoprava...
8 (3a6m) – Assoprava, assoprava...
11 (3a5m) – A gente quer
sentar!
8 (3a6m) (3a6m)– A gente quer
sentar!
23 (3a2m) – Eu quero ficar de pé!
22 (3a3m) – Eu quero sentar!
8 (3a6m) – Eu quero ficar em pé!
11(3a5m) – A gente quer
sentar naquela cadeira!
8 (3a6m) – Era uma vez... o lobo... E o chapeuzinho foi...
16 (3a5m) – A gente quer
trocar...
18 (3a5m) – Troca, troca!
69
6 (3a6m) – Eu também quero esse!
16 (3a5m) – Eu quero esse!
(...)
15 (3a5m) – Agora eu quero o lobo mau. Vamos trocar, tó!
18 (3a5m) – Por quê?
15 (3a5m) - Porque eu quero.
16 (3a5m) – Mas não pode.
18 (3a5m) – Tia, pode trocar? É que o Luiz Felipe não quer trocar. (dirigindo-se ao
observador)
As simulações de fragmentos da história levaram as crianças a atribuir desejos aos
personagens. Algumas crianças atribuíram emoções aos seus bonecos no contexto da história.
No exemplo, a criança nº 35, aos 2a10m, atribuiu desejo ao lobo.
Nº 35 (2a10m) – É que ele tá abrindo a boca! É porque ele quer comer o porquinho! Quer
comer agora! Ele quer comer agora... Ele não quer falar. Ele quer comer o porquinho! É
porque ele quer...
Todas as crianças envolvidas na conversa que segue tinham 3a5m. É possível
observar que o uso do verbo querer, pelas três crianças, apresentou atribuição de desejo ao
outro, no caso, ao personagem da história (lobo).
15 (3a5m) – O que que você quer, três porquinhos? Ele quer comer folha. (referindo-se ao
próprio boneco que é o lobo)
16 (3a5m) – O que que você quer
comer?
15 (3a5m) – Tó folhinha, tó folhinha, tó folhinha... Ele quer
comer folhinha. (dando folhas
ao lobo)
16 (3a5m) – Lobo, vamos comer, que que você quer lobo?
18 (3a5m) – Eu quero comer você.
16 (3a5m) – Então come. Ele tá me comendo.
18 (3a5m) – Eu vou te engolir. O lobo quer engolir os três porquinhos. Luiz, tenta de novo,
tenta de novo!
15 (3a5m) – O que que você quer?
16 (3a5m) – Que que você quer comer?
70
18 (3a5m) – Eu quero comer você.
Observou-se que, com o tempo, aumentou a utilização do verbo querer como forma
de atribuir desejo ao personagem. Apresenta-se a seguir, fragmentos ligados às outras três
histórias. Ressaltam-se as crianças nº 63 que, aos 3a, atribuiu desejo a vovó e nº 67, que aos
2a11m, atribuiu desejo ao lobo.
Na história Cachinhos Dourados (segunda coleta):
5 (4a) – Alguém quebrou a minha cadeira... O ursinho quer
ir embora!
56 (2a10m) – Ninguém quer
falar!
5 (4a) - Tenho o pequenininho. Ninguém vai falar?
Na história Chapeuzinho Vermelho (terceira coleta):
67 (2a11m) – O lobo quer matar a gente.
47 (3a6m) – O lobo queria comer a vovó, ele tava com muita fome.
65 (3a) – A vovó queria comida.
67 (2a11m) – O lobo quer pegar eu e a vovó.
34 (3a10m) – Ele quer te bater. Ela não quer entrar na barriga do lobo.
12 (4a5m) – Vai Gabi! Fala com o lobo e corre.
34 (3a10m) – Ela não quer.
4 (4a7m) - Ela não quer.
12 (4a5m) – Vovó, onde você está? Sou, eu sua neta. Vovó... Sou eu, a sua netinha
Chapeuzinho. Você abre a porta, por favor... Eu trouxe uns doces pra você, olha! Oi, sou eu,
a sua neta querendo dar uns docinhos...
12 (4a5m) – Era uma vez uma menininha que tava andando na floresta...
4 (4a7m) – Oi!
34 (3a10m) – Sou eu, eu tô com fome. O lobo quer
comer a vovó.
4 (4a7m) – E a chapeuzinho?
34 (3a10m) – É, o lobo quer
comer a Chapeuzinho.
12 (4a5m) – Mas a Chapeuzinho ele não come!
71
9 (4a6m) – Tá bom, tá bom! O caçador já chegou... Caçador, o lobo mau tá atrás de mim
querendo me comer!
(...)
5 (4a6m) – Puxe a alavanca e se abrirá a porta.
9 (4a6m) – Ela não quer abrir a porta.
Na história Rapunzel (quarta coleta):
22 (4a9m) – Não, isso não. Ela quer só matar o príncipe...
19 (4a10m) – Eu só quero matar!
47 (4a) – Não sei o que eu vou falar agora...
56 (3a10m) – Você quer arrumar umas maçãs para o neném.
42 (4a1m) – Ele foi no jardim da bruxa, foi lá roubar. E ela não queria que roubasse. Aí o
príncipe foi embora.
66 (3a5m) – Eu queria contar a história da Rapunzel. Era uma vez a Rapunzel, ela queria
casar com o príncipe, mas o príncipe tava no castelo e aí ele percebeu que a Rapunzel tava
dormindo e aí ela deitou e dormiu.(...) Eu queria casar com o príncipe, bruxa. Quem é você?
A primeira manifestação de desejo sem o uso do verbo querer de seu na terceira
coleta. A manifestação mais precoce foi aos 3a5m, pela criança nº 48 (a mesma criança que
fez o uso mais precoce do verbo querer, na primeira coleta), que participava de uma sessão
cuja faixa etária das crianças variava entre 3a2m e 3a5m e usa o substantivo vontade.
56 (3a4m) – Vai ficar com ele pra sempre.
48 (3a5m) – Ela quer ficar com a vovó. Ela tá triste. A Ana Beatriz tá triste porque ela tem
um gosto esquisito. É, ela tem um gosto esquisito... É porque ela tá com vontade de chorar.
58 (3a3m) – É que eu quero a vovozinha.
48 (3a5m) – Então tem que ter duas vovozinhas... e sem lobo.
58 (3a3m) – A Rebeca não quer
trocar comigo. Ela não quer brincar comigo. Por que você
não quer
brincar comigo?
56 (3a4m) – Porque eu quero ficar com a vovó e a Li quer ficar com a Chapeuzinho.
72
Em três locuções apareceram o uso do substantivo vontade para atribuição de desejo
ao outro em duas crianças: as crianças nº 6 (aos 4a6m) e nº 14 (aos 4a11m). Apesar da
criança nº 13 também tê-lo usado, ao observar o contexto, classificou-se esse uso como uma
repetição da fala do amigo.
6 (4a6m) - O lobo queria comer os doces da Chapeuzinho Vermelho. Mas ele ficou com
tanta vontade que até matou a vó da Chapeuzinho Vermelho. E depois, o lobo...
32 (4a5m)– Por que está roubando as minhas maçãs?
14 (4a11m) – Porque a minha esposa está com vontade.
13 (4a11m) – ...a minha esposa está com vontade. (essa locução não foi considerada)
(...)
14 (4a11m) – Agora ela ficou em pé. Ela ficou com vontade de comer maçãs. Aí o rapaz foi
lá catar as maçãs aí a bruxa viu. Vai!
13 (4a11m) – Ele já pegou.
A única ocorrência da utilização do substantivo desejo para atribuir desejos ao
personagem se deu na quarta coleta. Embora duas crianças tenham utilizado esse substantivo
em suas falas, neste trabalho considerou-se apenas a primeira ocorrência (pela criança nº 5,
aos 5a), uma vez que a segunda ocorrência (da criança nº 16) se deu pela imitação da fala do
colega.
8 (5a) - Pega aqui ó! Pega aqui, faz de conta!
6 (5a) – Faz de conta que as maçãs tão ali. Aí é a bruxa. Vai, vai lá!
8 (5a) – Me devolve as maçãs! Me devolve as maçãs!
6 (5a) – Aí você falou: minha mulher está com desejo de comer maçãs...
16 (4a11m) – A minha mulher tá com desejo de comer maçãs.
8 (5a) – Eu vou pegar seu neném se você não devolver essa maçã.
6 (5a) – Aí você falou: pega essas maçãs e depois dá o neném pra mim, a bruxa falou.
8 (5a) – Se você não der o neném eu vou pegar todas as maçãs e nunca mais você... Nunca
mais vou dar elas pra você!
Assim, considerando-se todo o estudo, foi possível observar que nas manifestações de
desejo houve predominância do uso do verbo querer (quer, quis, quiser, queria, querem e
73
queriam). Com freqüência bem menor, utilizaram os substantivos vontade e desejo (o último
com uma única ocorrência).
Em apenas duas circunstâncias o verbo resolver foi utilizado para expressar a decisão
do personagem movida por seu desejo. Essa manifestação apareceu no grupo das crianças
mais novas, somente na quarta coleta: aos 3a5m (criança nº 66) e aos 3a9m (criança nº 58).
53 (3a11m) – Ele escutou a voz da Rapunzel e aí a bruxa tirou a voz da Rapunzel. E depois
ele caiu e viu as rosas e cortou as plantas.
58 (3a9m) – (...) Aí apareceu uma bruxa bem grandona e viu. E aí ele resolveu
roubar as
frutas e aí depois foi assim. Mas eu quero de novo ler essa história.
53 (3a11m) – Então pega lá o livro e leia.
58 (3a9m) – Mas eu quero assistir mais porque eu não ouvi.
66 (3a5m) – Ela dormiu e aí a bruxa... Ela resolveu
, ela jogou as tranças e a bruxa falou e
ela ficou em cima da torre mais alta e aí ela foi conversar lá na janela da torre mais alta. E
aí a bruxa diz joga suas tranças e ela jogou as suas tranças.
Investigou-se a hipótese de que o uso do substantivo desejo e do verbo resolver
poderia ter ocorrido em função de serem utilizados na versão da história contada às crianças.
Ao observar o texto integral da versão apresentada (Anexo 1), descartou-se essa hipótese em
relação ao termo resolveu, uma vez que o verbo resolver não é utilizado nessa versão. Ele só
aparece nas versões das histórias contadas na coleta 1 (Os Três Porquinhos) e na coleta 2
(Cachinhos Dourados), sem aparecer nas falas das crianças nessas coletas.
Em relação ao substantivo desejo, ao contrário, observou-se que foi utilizado por uma
vez na versão apresentada às crianças. A palavra desejo foi utilizada pelo ‘pai da Rapunzel’
de forma bastante similar ao uso feito pela criança. Isto sugere que houve influência do texto
da história na fala da criança.
Neste trabalho perguntou-se que mudanças qualitativas se evidenciaram nas
manifestações dessa compreensão. Em busca de mais respostas para essa questão, as
manifestações de desejo foram observadas com vistas a verificar se elas se tornaram mais
elaboradas com o tempo, e como se deu esse processo.
Encontrou-se que as crianças passaram, ao longo do estudo, a fornecer evidências da
compreensão das relações entre desejos e suas causas ou conseqüências. A criança nº 47 é a
criança que justificou o desejo do personagem mais precocemente, aos 3a6m.
74
47 (3a6m) – O lobo queria comer a vovó, ele tava com fome.
A criança nº 15 (aos 4a5m) usou um desejo para justificar outro desejo quando
afirmou que o lobo “quer pegar (...) porque ele quer comer(...)”. O exemplo mostra a
locução no contexto onde foi enunciada.
16 (4a5m) – Esse é o caçador. Quem que é essa amarelinha? É a vovó?
15 (4a5m) – O Gabriel tá com o lobo. Aí ele quer pegar a Chapeuzinho que tá com o Kalil
porque ele quer comer, vai levar pra floresta.
16 (4a5m) – Aí o caçador vai e pum!
A criança nº 17, também com 4a5m, justificou o desejo do lobo em função de uma
ação posterior: (...) queria entrar pra pegar (...) pra levar embora (...).
17 (4a5m) - O caçador falou que vai matar o lobo pra Chapeuzinho e corre. Aí o lobo pega a
Chapeuzinho Vermelho corre lá e ele foi e entrou lá na casa da mãe dela e o caçador entrou
na casa da vó dela. Aí o lobo queria entrar pra pegar a Chapeuzinho pra levar embora pra
casa da vó dela.
Aos 4a6m, duas outras crianças também demonstraram conhecer as causas dos
desejos. As crianças nº 5 e nº 8 justificaram o desejo do lobo:
38 (3a9m) - Aí ela foi cantando essa música: “Pela estrada afora...”. Aí, ela encontrou o
lobo. Aí ele foi pelo outro caminho e chegou antes da Chapeuzinho Vermelho.
24 (4a2m) – A Chapeuzinho ficou feliz porque ela queria
ir na casa da vovó.
5 (4a6m) – Ele quer
enganar a Chapeuzinho por que ele é ruim, ele come gente!
10 (4a6m) – O lobo, ele veio comer a vovozinha.
13 (4a5m) – O lobo, ele quer
comer a vovozinha.
8 (4a6m) – Porque ele tá com fome e porque ele quer
comer gente. Oh! Eu vou comer
você! (...)
75
Desejos também foram utilizados pelas crianças para justificar ações, com evidência
mais precoce aos 2a11m, pela criança nº 66. Outras evidências apareceram em crianças com
idades variadas. A seguir alguns exemplos estão apresentados considerando-se essa variação
etária.
59 (3a2m) – O lobo queria comer ela.
66 (2a11m) – Ele quer comer a Chapeuzinho Vermelho. Essa aqui ó...
59 (3a2m) – Eu também tenho. Aí eu abro a minha mão pra mexer o fantoche.
66 (2a11m) – O lobo queria
comer a Chapeuzinho Vermelho, mas ele foi antes na casa da
vovó. Ele pulou na cama da vovó. O lobo comeu a vó do Chapeuzinho Vermelho por que
ele quis
.
67 (2a11m) – Vovó, olha o lobo! Ai, vovó, o lobo quer me pegar! Caçador, caçador...
(...)
53 (3a5m) – O lobo quer matar todos nós. Vamos correr do lobo.
45 (3a6m) – E ele quer esse. Eu vou emprestar só um pouco pra ele, não pode pegar o
lobo.
31 (ex) – Aí, se alguém apertar muito a orelha dele, ele come!
16 (4a5m) – É porque o lobo é bravo. Aí o caçador vai lá e mata ele porque ele queria
comer a Chapeuzinho Vermelho.
9 (5a) – Ela deixou ele pegar as maçãs e ela pegou o neném dele. Logo que o neném
nascesse...
12 (4a11m) – Neném nascesse... É que os pobres queriam ter muito filho. E acabou. Fim.
28 (4a8m) – Ela queria o filho deles e eles queriam maçã.
12 (4 11m) – E acabou a história, fim.
20 (4a10m) – É essa.
23 (4a8m) – Aí ela quis as maçãs e ele foi pegar, o pai da Rapunzel.
33 (4a4m) – Não, é o príncipe.
76
A próxima conversa forneceu evidências de que a criança nº 7, aos 5a, consegue
justificar a causa do desejo do personagem “ela tava grávida” e a ação de outro personagem
decorrente desse desejo “e o pai foi lá buscar”.
26 (4a8m) – Ela tava grávida.
25 (4a8m) – Ele não quer pegar
26 (4a8m) – Eu quero pegar
26 (4a8m) – Vai Bruna!
7 (5a) – Ela tava grávida e queria
maçãs e o pai foi lá buscar e a bruxa brigou por que ela
falou: pode pegar quantas quiser que eu vou fazer...
26 (4a8m) – É que vai nascer o bebê e é pra eu dar pra ela.
Síntese dos resultados sobre as manifestações de atribuição de desejo
Em síntese, os dados mostraram que nas manifestações de desejo, o verbo querer foi
o mais utilizado pelas crianças. Porém, em muitas circunstâncias e em diferentes idades ele
não foi usado para atribuir desejo ao outro, mas como forma de: constatar ou confirmar uma
asserção; solicitar algo; convidar ou propor uma ação; protestar ou direcionar a interação;
perguntar ou averiguar.
A primeira ocorrência do uso do verbo querer se deu aos 2a5m (criança nº48), por
meio de uma locução que expressou uma constatação. Foi seguida, aos 2a9m (criança nº 39),
por uma locução que expressou uma proposta.
Locuções que utilizam o verbo querer para expressar atribuição de desejo ao outro
apareceram a partir dos 2a7m (criança nº 44) e foram classificadas em dois grupos: atribuição
ao personagem, com maior freqüência, e atribuição ao colega na atividade.
Outros termos foram utilizados na atribuição de desejos, porém com ocorrência mais
tardia e menor freqüência em relação ao verbo querer. Foram os substantivos vontade (aos
3a5m pelo participante nº 48, aos 4a6m pelo nº 6 e aos 4a11m pelo nº 14) e desejo (com uma
única ocorrência aos 5a pelo nº 6). Há a ressalva de que possa ter havido influência do texto
da história contada às crianças no uso da palavra desejo.
O verbo resolver também foi incluído nessa classificação por manifestar a intenção do
personagem ligada ao desejo. Ele apareceu em duas locuções, aos 3a5m (criança nº 66) e aos
3a9m (criança nº 58).
77
Além das mudanças em relação às palavras empregadas, outras mudanças qualitativas
nas manifestações das crianças foram observadas. As locuções foram se tornando mais
elaboradas ao longo do estudo e algumas passaram a apresentar, além da atribuição de
desejo, as causas e ações decorrentes dos desejos atribuídos. Há locuções que apresentaram
desejos como forma de justificar uma ação, a manifestação mais precoce se deu aos 2a11m,
pela criança nº 66. Outras locuções apresentaram as causas dos desejos do outro, com
ocorrência mais precoce aos 3a6m, pela criança nº 47. Aos 5a, a criança nº 7 emitiu uma
locução mais elaborada, na qual apresenta a causa de um desejo e a ação decorrente.
4.1.2 Manifestações da atribuição de emoções ao outro
Em todo o estudo, as crianças recorreram às seguintes palavras para expressar as
emoções dos colegas e, principalmente, dos personagens: os substantivos medo, susto, raiva
e vergonha; os verbos adorar e gostar (nas variações adorava, gosto, gostava, gostou); os
adjetivos feliz, triste, contente e furioso.
A manifestação mais precoce apareceu na primeira coleta emitida pela criança nº 55,
aos 2a5m, num contexto onde um colega (nº 16, um ano mais velho) introduz o assunto
falando sobre seu próprio gosto. A criança nº 55 fala da preferência de sua amiga (a idade do
grupo teve essa variação em função da rotina escolar).
16 (3a5m) – Eu também quero ficar no laranja. (referindo-se à cor do tapete, ele diz que quer
ficar sobre o tapete como outra criança).
15 (3a5m) – Eu também.
16 (3a5m) – Eu também gosto
de beterraba e laranja.
41 (2a7m) - Eu gosto do au-au...
55 (2a5m) – Do lobo... A Valentina gosta
do lobo.
Essa foi a única ocorrência dessa manifestação nessa idade. Encontrou-se uma lacuna
de 4 meses entre as manifestações, que voltaram a aparecer a partir dos 2a9m, apoiadas no
substantivo medo. O verbo gostar voltou a ser utilizado pela criança nº 48, aos 2a11m, e foi
observado num total de oito ocorrências: por quatro crianças (nº 5, 9, 16 e 55) na primeira
coleta, por duas crianças (nº 7 e nº 48) na segunda coleta, e por apenas uma criança nas
coletas três (nº 48) e quatro (nº 18).
78
No fragmento apresentado a seguir, as crianças discutem os acessórios dos bonecos e
a criança nº 48, aos 2a11m, atribui emoção às personagens (à mamãe e à Cachinhos
Dourados).
48 (2a11m) – Eu vou ver a mamãe porque ela gosta de brilho. O meu não gosta. O dela
não gosta, mas a Cachinho Dourado gosta. O seu não tem lacinho e esse também perdeu
porque ele é papai e papai não usa lacinho.
As crianças entre 3 e 4 anos, utilizaram o verbo fazendo uma atribuição aos colegas
na atividade.
56 (3a4m) – Eu gosto da vovó, eu não gosto do lobo.
58 (3a3m) – Olha ela não quer trocar, ela ficou com a vovozinha.
48 (3a5m) – Devia ter duas vovozinhas. Porque as duas gostam da vovozinha.
23 (3a2m) – Eu gostei do pai porque eles são ursos.
7 (4a) – A Bubu que gostou da menina, né Bubu?
10 (4a) – Não!
5 (3a6m) – Os meninos não gostaram...
9 (3a6m) – As meninas gostaram, né?
A evidência mais tardia do uso do verbo gostar na atribuição de emoção ao outro,
aparece aos 4a11m, pela criança nº 18 que atribui emoção ao personagem (bruxa).
38 (4a3m) – A bruxa que tá comigo pegou a Rapunzel e levou ela lá pro topo...
18 (4a11m) – Aí caiu!
38 (4a3m) – Aí caiu e depois a bruxa jogou o pai. Não, jogou o príncipe lá embaixo e ela
falou há,há,há,há porque ela era muito malvada.
18 (4a11m) – E não gosta
do príncipe. E aí ele ficou cego e depois a bruxa desapareceu e
depois ele ouviu tudo. Ouviu e depois ele foi seguindo o som e sabia que era a Rapunzel e aí
depois voltou a enxergar e depois se casaram e viveram felizes para sempre.
79
O outro verbo encontrado neste estudo foi o verbo adorar, que teve duas ocorrências
na quarta coleta. A ocorrência mais precoce se deu aos 3a9m, pela criança nº 58, e a outra
ocorrência pela criança nº 11, aos 4a11m.
58 (3a9m) – Era uma vez uma menina bem boazinha que adorava ter uma filha. Aí depois
apareceu uma filha que a bruxa quase que pegou ela. Filha, não deixa a bruxa pegar você!
11 (4a11m) – Posso contar outra história? Era uma vez a Chapeuzinho Vermelho que
adorava passear. Aí o lobo mau olhou pra ela e salvou ela. Só.
O substantivo medo foi o termo mais freqüente na manifestação de emoções. Apesar
de a mais precoce ocorrência ter referido outro termo (o verbo gostar), também entre as
crianças menores medo foi o termo mais freqüente - atribuído pelas crianças aos personagens
ou utilizado em locuções onde as crianças incorporam o papel de um personagem. As
manifestações começam a aparecer aos 2a9m, emitidas pelas crianças nº 38 e nº 58. Seguem
as locuções no contexto em que ocorreram:
Primeira coleta: Os três porquinhos
32 (2a11m) – Agora é que eu vou te pegar e não adianta correr, ó! O lobo tá aqui! É o lobo!
38 (2a9m) – Ah! Que medo! Ai que medo! (incorporando o papel do porquinho)
32 (2a11m) – Não! Ele não morde! Ele é bonzinho!
38 (2a9m) – Ai que medo! Ai que medo!
32 (2a11m) – Ele não morde, ele é bonzinho!
38 (2a9m) – Ai meu Deus que medo
! Ai meu Deus que medo!
Segunda coleta: Cachinhos Dourados
63 (2a7m) – Era uma vez um tubarão que mordia um urso, o tubarão comeu o urso.
58 (2a9m) – Era uma vez uma menina que chamava Iaiá. A Iaiá ia pela floresta e achou a
mamãe dela. Mamãe, mamãe, cadê o meu papai?
63 (2a7m) – Encontrou um tubarão e mordeu.
58 (2a9m) – Aí a Iaiá fugiu e aí ficou com medo
e aí ele bateu. Aí ele quer bater. Por que
ele está batendo?
80
Com vistas a apresentar algumas evidências - por meio do uso do substantivo medo -
da atribuição de emoção aos personagens, pequenos fragmentos de algumas interações entre
as crianças, em diferentes idades e coletas, foram exibidos a seguir.
Dos 2a11m aos 3a10m
Em Chapeuzinho Vermelho
67 (2a11m) – A vovó tem medo.
53 (3a5m) – Ele tá com medo dele e se esconde na almofada.
65 (3a) – A Chapeuzinho tava com medo
.
47 (3a6m) – Ela tá com medo
porque não tem mãe. A Chapeuzinho não tem mãe aqui e a vó
dela tá doente.
Em Rapunzel
57 (3a9m) – Cadê o papai?
41 (4a1m) – É esse. Ele ficou com medo.
50 (3a11m) – Ele ficou com um medão.
Dos 3a11m aos 5a
Em Chapeuzinho Vermelho
32 (3a11m) – A vó participou tirando a tranca pra ele entrar e ele... Aí ele come ela porque
ela pensou que o lobo era a Chapeuzinho.
17 (4a5m) – Porque o lobo queria entrar na casa da vovozinha... Aí a vovó fica com medo
que era a Chapeuzinho Vermelho.
20 (4a4m) – Ele imitou a voz do Chapeuzinho Vermelho.
5 (4a6m) – Eu não tenho medo.
9 (4a6m) – Mas o lobo tem medo sim.
5 (4a6m) – Mas ele não tem medo de verdade.
Em Rapunzel
26 (4a8m) – Aí a bruxa cortou as tranças dela.
7 (5a) – Vai, que mais?
26 (4a8m) – O pai tinha medo da bruxa e a Rapunzel tinha medo da bruxa.
27 (4a8m) – Ele ficou com medo e aí caiu.
81
Em relação a outras mudanças qualitativas, foram encontradas várias evidências, em
diferentes idades, nas quais as crianças apresentaram as causas do medo que atribuiu ao
personagem ou utilizou esse medo como justificativa para uma ação posterior.
As manifestações mais precoces, entre 2a9m e 3a3m, apenas constatam o medo do
personagem. A partir dos 3a5m, além das locuções que constatam o medo, as crianças a
expressar locuções com a explicação dos motivos que levaram o personagem a sentir medo e
ações decorrentes do medo do personagem.
53 (3a5m) – Ele tá com medo
dele e se esconde na almofada.
47 (3a6m) – Ela tá com medo
porque não tem mãe. A Chapeuzinho não tem mãe aqui e a vó
dela tá doente.
40 (3a8m) – O caçador não tem medo do lobo porque ele é corajoso. Porque ele corta a
barriga do lobo.
7 (4a6m) – Socorro! Caçador!
24 (4a2m) – Eu já me matei o lobo.
35 (3a9m) – A Chapeuzinho tava com medo porque achava que o lobo ia comer ela.
25 (4a8m) – O pai sentiu medo.
26 (4a8m) – Ele ficou com medo porque a bruxa, ela queria a filha.
Salienta-se a locução emitida pela criança nº 20, aos 4a4m, que ao mesmo tempo
apresenta o motivo que leva o personagem a sentir medo (“é porque ele quer comer ela”) e
como age em decorrência do medo (“por isso é que ela sai correndo”).
20 (4a4m) – A Chapeuzinho tem medo.
32 (3a11m) – Ela tem medo do lobo.
20 (4a4m) – É porque ele quer comer ela. Ela sabe que o lobo quer comer ela por isso é
que ela sai correndo, é medo.
Todas as atribuições de medo encontradas nesse estudo foram feitas a um personagem
da história. Em nenhum caso as crianças fizeram atribuição de medo ao colega na atividade.
82
Quanto aos demais substantivos (susto, raiva e vergonha), verificou-se que não
apareceram no corpo do texto da versão de cada da história contada às crianças (Anexo 1).
Portanto, descartou-se a hipótese da influência da história sobre o uso desses substantivos.
Os resultados da análise sobre o uso desses substantivos revelou que eles foram pouco
freqüentes: em todo o estudo susto e raiva só apareceram uma vez, e vergonha apareceu na
fala de quatro crianças.
Esses termos passaram a ser utilizados a partir da terceira coleta. Vergonha teve sua
primeira manifestação com a criança nº 5, aos 4a6m, e voltou a ser enunciada pelas crianças
nº 24, aos 4a8m, nº 17, aos 4a11m, e nº 10, aos 5a.
No exemplo que segue, vergonha apareceu logo no início da sessão. Em virtude do
silêncio de uma das crianças, que deveria começar a fazer seu personagem falar porém fica
mudo, a criança nº 5 diz aos demais:
5 (4a6m) – Tá com vergonha...
Em outra sessão, a criança nº 24, aos 4a8m, também supõe que seu colega está
envergonhado, atribuindo-lhe, portanto, essa emoção e pergunta sobre sua suposição.
14 (4a11m) – Agora ela ficou em pé, ela ficou com vontade de comer maçãs. Aí o rapaz foi
lá catar as maçãs. Aí a bruxa viu. Vai!
13 (4a11m) – Ele já pegou.
14 (4a11m) – Fala!
24 (4a8m) – Você tá com vergonha?
14 (4a11m) – Eu tô falando. Olá mamãe...
13 (4a11m) – Aí eles ficaram... Aí foram felizes para sempre
32 (4a5m) – Agora?!... Depois, Kenzo!
13 (4a11m) – Ah, faz a história aí que eu não sei. Aí o papai... Aí ela já cresceu...
Na conversa abaixo, a criança mais velha, com 5a, é a primeira que utiliza o termo
vergonha. Esse uso surge pelo mesmo motivo do que foi observado no primeiro exemplo:
diante do silêncio da colega na atividade. Ao perguntar à amiga se ela “tem vergonha”, a
criança não espera resposta e já completa a frase concluindo que “ela tem vergonha.”. Um
pouco mais tarde, na mesma conversa, outra criança (nº 17, aos 4a11m) usa o termo e inclui,
na mesma locução, a única ocorrência do substantivo raiva.
83
17 (4a11m) – Mamãe, você quer comer uma maçã do jardim?
10 (5a) – Sim.
17 (4a11m) – Então, pega uma maçã pra comer.
10 (5a) – Fala Ana!
17 (4a11m) – Não tem língua pra falar?
10 (5a) – Você tem vergonha? Ela tem vergonha.
11 (4a11m) - O gato comeu sua língua?
17 (4a11m) – Eu peguei uma maçã do jardim.
(...)
17 (4a11m) – (...) Elas não vão falar?
11 (4a11m) - Eu vou.
17 (4a11m) – Então fala, Karol.
10 (5a) – Eu tenho vergonha.
17 (4a11m) - Dá uma raiva ficar com vergonha. Para de ficar com vergonha!
11 (4a11m) – Posso contar outra história? Era uma vez a chapeuzinho vermelho que
adorava passear aí o lobo mau olhou pra ela e salvou ela. Só.
O último substantivo utilizado foi susto, que apareceu em duas locuções emitidas pela
mesma criança (nº 6), aos 4a6m, em contextos muito parecidos.
6 (4a6m) – O lobo queria comer os doces da Chapeuzinho Vermelho. Mas ele ficou com
tanta vontade que até matou a vó da Chapeuzinho Vermelho e depois o lobo e a
Chapeuzinho Vermelho caiu no mato. Ela levou um susto
. Ele pegou a cestinha de doces e
ela morreu.
11 (4a5m) – A Chapeuzinho não estava contente porque o lobo comeu ela.
6 (4a6m) – Ela sentiu medo porque alguém derrubou ela e deixou ela no chão caída. E era o
lobo mal. E deu um susto
e morreu. Ela pensou que era a vovó dela mas não era, era o lobo
mal.
Os adjetivos feliz, contente e triste apareceram na fala das crianças a partir dos 2a11m
e, como no caso do substantivo medo, foram muito freqüentes e com ocorrências em faixas
etárias bem variadas. Todas as ocorrências se evidenciaram a partir da terceira coleta. O uso
mais precoce, aos 2a11 pela criança nº 66, pode ser observado a seguir:
84
67 (2a11m) – A Chapeuzinho Vermelho tá triste por que o lobo matou.
45 (3a6m) – O caçador matou o lobo.
Desde a primeira manifestação encontrada, as crianças justificaram as atribuições que
faziam, explicando os motivos pelos quais os personagens estavam felizes, contentes ou
tristes. Com exceção de uma manifestação, na qual a criança nº 48 atribuiu essas emoções ao
colega na atividade, todas as atribuições foram aos personagens.
Abaixo, organizou-se uma lista com algumas ocorrências para que seja possível
observar algumas ocorrências dessas locuções em relação à idade das crianças. Foram
encontradas locuções que expressavam atribuição de emoção ao outro aos 2a11, 3a, 3a5m,
3a6m, 3a7m, 3a9m, 4a2m, 4a5m, 4a6m, 4a11 e aos 5a (manifestação mais tardia).
64 (3a) – Eu acho que a vovó tava triste porque o lobo era malvado e o lobo mal comeu ela
53 (3a5m) – Ele ficou feliz, o caçador. Eu acho que a vovó ficou feliz porque o caçador
matou o lobo.
57 (3a3m) – A Val tá com a vovó e não tá falando comigo.
52 (3a5m) – A vó tava feliz porque ela traz doces pra vovó.
48 (3a5m) – Ela quer ficar com a vovó. Ela tá triste. A Ana Beatriz tá triste porque ela tem
um gosto esquisito. É, ela tem um gosto esquisito. É porque ela tá com vontade de chorar.
58 (3a3m) – É que eu quero a vovozinha.
46 (3a6m) – A vovó ficou triste porque o lobo comeu a vovó.
61 (3a7m) – Ela não tava, eu acho que ela tava
feliz.
7 (4a6m) – A Chapeuzinho tava feliz.
38 (3a9m) – É porque ela queria ir na casa da vovó e ficou feliz aí a vovó ...
26 (4a2m) – E a vovó não tava feliz porque ela tava doentinha. E a Chapeuzinho não
também porque ela tava sabendo que a vovó tava doente.
14 (4a5m) – A Chapeuzinho Vermelho tá triste porque o lobo engoliu ela e o caçador ouviu
e foi ver o que tava acontecendo.
85
18 (4a5m) – E a vó tava feliz porque a Chapeuzinho ia visitar ela.
11 (4a5m) – A Chapeuzinho não estava contente porque o lobo comeu ela.
6 (4a6m) – Ela tá levando os doces da mãe pra vó dela. O pai ficou triste porque chegou em
casa e não viu e vó e nem a filha e nem a sobrinha porque o lobo comeu.
7 (4a6m) – A mãe dela deu uns doces pra ela pra levar pra vó dela porque ela tava doente.
Ela tava triste porque a vó dela tava doente.
9 (4a6m) – Ela tava feliz porque ela ia visitar a vovó. A vovó tava feliz porque a
Chapeuzinho ia levar doce pra ela.
11 (4a11m) – A bruxa jogou o príncipe lá da janela e o cabelo da Bela Adormecida... da
Rapunzel também. Ela cortou o cabelo da Rapunzel, aí a Rapunzel ficou triste e depois ela
ficou feliz porque encontrou o príncipe dela. Aí depois a Rapunzel pegou uma maçã pra ela,
da bruxa, e a bruxa falou que não podia pegar. Só isso.
15 (4a11) – Aí a mãe tava triste porque ela levou a filha dela. E acabou a história.
7 (5a) – Ela ficou triste. Ela ficou triste depois ela encontrou o príncipe encantado, a
Rapunzel.
Desde a manifestação mais precoce, as crianças justificaram a atribuição de emoção
(referentes ao uso dos adjetivo triste, feliz e contente) que fazem aos outros. Assim, nada se
pode afirmar sobre mudanças da compreensão das emoções de tristeza e felicidade do outro
em relação à idade.
Quanto ao adjetivo furioso, ele foi utilizado por apenas uma criança (nº 7, aos 4a) na
segunda coleta. Esse termo apareceu uma única vez no texto da versão da história Os Três
Porquinhos, contada às crianças na primeira coleta (Anexo 1). Furioso apareceu na locução
da criança somente seis meses depois, na segunda coleta, o que permitiu concluir que não
houve influência do texto da história no uso desse adjetivo.
86
7 (4a) – Chegaram na casa e ficaram muito furiosos quando viu uma menina deitada na
cama do filho.
Síntese dos resultados sobre as manifestações de atribuição de emoção
Em síntese, os dados mostraram que nas manifestações de emoção, o substantivo
medo foi o mais utilizado pelas crianças. Porém, a primeira ocorrência se deu com o uso do
verbo gostar, aos 2a5m (criança nº 55).
Outras locuções que utilizam o verbo gostar para expressar atribuição de emoção ao
outro voltaram a aparecer quatro meses mais tarde, a partir dos 2a11m (criança nº 48), e
foram relacionadas aos colegas na atividade e aos personagens das histórias. A locução mais
tardia ocorreu com a criança nº 18, aos 4a11m.
Mais um verbo foi utilizado na atribuição de emoção ao outro, porém com freqüência
bem inferior (duas ocorrências) e mais tardiamente em relação ao verbo gostar. Trata-se do
verbo adorar, expresso aos 3a9m, pela criança nº 58, e aos 4a11m, pela criança nº 11.
O substantivo medo teve seu uso mais precoce aos 2a9m, nas crianças nº 38 e nº 58, e
continuou a ser emitido pelas crianças ao longo do estudo.
Outros substantivos foram utilizados na atribuição de emoção ao outro, porém com
ocorrência mais tardia e menor freqüência em relação ao substantivo medo. Foram os
substantivos vergonha (aos 4a6m pelo participante nº 5, aos 4a8m pelo nº 24, aos 4a11m pelo
nº 17 e aos 5a pelo nº 10); raiva (com uma única ocorrência aos 4a11m pelo nº 17) e susto
(também em ocorrência única aos 4a6m pela criança nº6).
Os adjetivos feliz, triste, contente começaram a aparecer na terceira coleta. Seu uso
mais precoce se deu aos 2a11m, pela criança nº 66, e mais tardio aos 5a, pela criança nº 7.
Esses adjetivos apareceram em muitas locuções. Em contrapartida, o adjetivo furioso
apareceu uma única vez em todo o estudo, na segunda coleta, na criança nº 7 aos 4a. Todas as
atribuições, com apenas uma exceção (nº 48, aos 3a5m), foram dirigidas aos personagens.
Não houve influência do texto da versão das histórias contadas às crianças (Anexo 1)
na emissão de nenhum dos termos utilizados para manifestar atribuição de emoção ao outro.
Quanto às mudanças qualitativas das locuções expressas pelas crianças ao longo do
tempo, foram encontradas mudanças nas locuções que envolveram o termo medo: a partir dos
3a5m, as crianças forneceram evidências de avanços nessa compreensão. As locuções se
tornaram mais elaboradas ao longo do estudo e algumas passaram a apresentar, além da
atribuição ao outro, as causas e ações decorrentes da emoção atribuída. Aos 4a4m, a criança
87
nº 20 emitiu a locução mais elaborada na qual apresenta tanto o motivo que levou o
personagem a sentir medo e a ação em decorrência do medo. Ressalta-se que todas as
locuções que se apoiaram no substantivo medo foram de atribuições aos personagens das
histórias, nunca aos colegas na atividade.
Quanto aos adjetivos, não foram encontradas mudanças qualitativas nas locuções que
os utilizaram, uma vez que as manifestações mais precoces já envolveram as causas e
conseqüências das emoções atribuídas.
Não foram encontradas mudanças qualitativas nas locuções que utilizaram os verbos.
Essas locuções se concentraram em constatações sobre os sentimentos dos colegas ou dos
personagens.
4.1.3 Manifestações da atribuição de caráter ao outro
Desde a primeira coleta de dados realizada neste estudo, foi possível observar que em
algumas circunstâncias as crianças se manifestavam sobre certos atributos ligados ao caráter
dos personagens. Harris (1996) aponta que compreender o caráter alheio significa
compreender os traços psicológicos, o modo de ser, sentir, pensar e agir do outro, o que
implica na atribuição de estados mentais. Considerou-se, portanto, que as crianças estavam
atribuindo estados mentais ao personagem quando afirmavam que ele era malvado, corajoso
ou esperto, por exemplo.
Em todo o estudo, as crianças recorreram principalmente aos adjetivos que atribuíam
maldade (malvado(a), mau/má, ruim) e bondade (bom, bonzinho/boazinha) aos personagens.
Essas ocorrências se deram em três das quatro coletas (excluindo-se a segunda coleta) e
envolveram várias de crianças, com diferentes idades.
Um segundo grupo de adjetivos foi usado pelas crianças: bravo, chato, chata,
corajoso, egoísta e esperta. A característica comum neste segundo grupo, é que cada uma
das palavras foi expressa por uma única criança e emitida na coleta três ou quatro, com
exceção do adjetivo chato que apareceu na segunda coleta.
As manifestações mais precoces apareceram na primeira coleta, emitidas pela criança
nº 44, aos 2a7m, e pelo colega nº 45, de 2a6m. Ambos utilizaram o adjetivo bonzinho.
44 (2a7m) – Não bate, não bate! O lobo é bonzinho.
45 (2a6m) – O lobo é bonzinho, o lobo mau é bonzinho ...
88
36 (ex) – O porquinho é bonzinho!
44 (2a7m) – Vai pegar! Vai pegar! Vai pegar!
Logo depois, encontrou-se a locução emitida pelo nº 38, aos 2a9m, num contexto
onde a criança repete o termo malvado, que um colega mais velho, nº 14 de 3a5m, já havia
atribuído ao lobo.
38 (2a9m) – Me deixa entrar!
14 (3a5m) – Malvado!
32 (2a11m) – Eu vou comer você!
38 (2a9m) – Malvado
! Lobo mau malvado!
32 (2a11m) – Comi!
14 (3a5m) – Comeu nada! Estou aqui inteirinho...
Na seqüência da brincadeira, outra criança do grupo (nº 32, com 2a11m) passa a fazer
a “defesa” do lobo:
32 (2a11m) – Agora é que eu vou te pegar e não adianta correr, ó! O lobo tá aqui! É o lobo!
38 (2a9m) – Ah! Que medo! Ai que medo!
32 (2a11m) – Não! Ele não morde! Ele é bonzinho!
38 (2a9m) – Ai que medo! Ai que medo!
32 (2a11m) – Ele não morde, ele é bonzinho!
38 (2a9m) – Ai meu Deus que medo! Ai meu Deus que medo!
Aos 3a e 3a1m, outras locuções com o adjetivo malvado apareceram:
67 (2a11m) – Vovó, olha o lobo! Ai, vovó, o lobo quer me pegar! Caçador, caçador...
63 (3a1m) – Porque o lobo é malvado.
53 (3a5m) – É porque ele é de garrafa. O lobo é malvado porque ele come as pessoas
(...)
53 (3a5m) – O lobo quer matar todos nós. Vamos correr do lobo.
64 (3a) – Ele é malvado!
89
Os exemplos apresentados acima são, em geral, parecidos com as outras ocorrências
observadas em todo o estudo. As crianças fazem constatações sobre o caráter do personagem
e, em diferentes idades, justificam ou apresentam decorrências da atribuição que fazem.
Abaixo, encontram-se exemplos de conversas nas quais as crianças, com idades
variadas, usam as atribuições de caráter para justificar ações ou emoções.
64 (3a) – Eu acho que a vovó tava triste porque o lobo era malvado e o lobo mau comeu ela.
40 (3a8m) – O caçador não tem medo do lobo porque ele é corajoso. Porque ele corta a
barriga do lobo.
18 (4a11m) – Aí caiu!
38 (4a3m) – Aí caiu e depois a bruxa jogou o pai. Não, jogou o príncipe lá embaixo! E ela
falou “Há! Há! Há! Há!” porque ela era muito malvada.
19 (4a11) – A bruxa é a mais esperta da história.
A maioria das atribuições de caráter foi dirigida aos personagens. Apenas duas foram
destinadas aos colegas na atividade, e refletem desacordos entre as crianças.
38 (3a3m) – Ai, você segura pra mim? Prá eu por o colar... Ai, opa! Não consigo!
37 (3a3m) – Ai, você é muito chato!
11 (4a11m) – Larissa, dá ela! Ela tava comigo, tá!
17 (4a11m) – Posso ver?
11 (4a11m) – Você já viu!
17 (4a11m) – Ela é egoísta. Sabia que ela é egoísta? Sabia que a Karol é egoísta?
11 (4a11m) – Não sou nada!
17 (4a11m) – É sim, ela não empresta.
11 (4a11m) – Não sou!
17 (4a11m) – Ela é egoísta
porque ela não empresta brinquedo.
11 (4a11m) – Não sou porque outro dia eu te dei um salgadinho inteirinho...
17 (4a11m) – É assim que se fala: “Vai pegando...”
90
Síntese dos resultados sobre as manifestações de atribuição de caráter
As manifestações das crianças que atribuíram caráter ao outro ficaram bem
distribuídas em relação à variação das idades, desde a mais precoce, aos 2a6m (nº45), até a
mais tardia, aos 5a (nº9).
Não houve mudanças qualitativas no grau de elaboração das locuções. As crianças
menores mostraram-se capazes de justificar ações em função do caráter atribuído.
Apareceram lado a lado, ao longo do tempo, tanto as locuções que apresentaram constatações
de caráter como as que eram mais elaboradas.
Só duas atribuições foram destinadas aos colegas. Todas as outras foram dirigidas aos
personagens.
4.1.4 Manifestações da atribuição de crenças ao outro
Neste estudo, as manifestações da compreensão de estados de crença pelas crianças
foram numerosas. Se apoiaram principalmente no uso de verbos mentais: achar, saber,
enganar, mentir, pensar, fingir, entender, conhecer, descobrir, lembrar.
Além dos verbos, as crianças utilizaram os substantivos mentira, segredos e verdade,
e o adjetivo disfarçado.
O verbo achou foi usado mais precocemente pela criança nº 63, aos 2a7m, na locução
apresentada a seguir.
63 (2a7m) – Ela... o boneco virou espada! Ela achou que a boneca era espada.
58 (2a9m) – Essa boneca é Iaiá, o nome dela é Iaiá.
O contexto da locução, observado no vídeo, esclareceu que a criança estava se
referindo à colega na atividade, que brincava com a boneca como se ela fosse uma espada.
Assim, é possível supor que a criança justificou a ação da colega atribuindo-lhe uma
crença: a amiga teria feito uso inapropriado da boneca, pois “achou” que era uma espada e,
portanto, tinha uma crença sobre o objeto, mesmo que diferente da realidade.
Por outro lado, há outra interpretação possível. A criança estaria usando essa locução
como se fosse: “Ela fez-de-conta que a boneca era uma espada” ou “Ela brincou com a
91
boneca como se fosse uma espada”, isto é, a criança teria atribuído à colega a capacidade de
simular.
Dessa forma, foi possível afirmar que esta pesquisa encontrou uma manifestação de
atribuição de crença ao outro por uma criança aos 2a7m.
Aos 2a11m, outras evidências dessa compreensão surgiram. Duas crianças, nº 50 e nº
66, emitiram locuções nas quais usavam os verbos saber. Para que fosse possível afirmar que
as crianças estavam atribuindo, de fato, uma crença ao outro, retomou-se as conversas das
crianças para avaliar o contexto.
O primeiro fragmento selecionado foi o que envolveu a criança nº 50
5 (5a) – Os ursos foram embora...
50 (2a11m) – Eu vou falar uma coisa!... Esqueci! ...(silêncio)... Ninguém vai saber!
Ninguém vai falar, eu vou falar uma coisa bem diferente, vocês nem vão saberem! ... Um
bichinho tá aqui atrás!
5 (5a) – Foi você que pintou isso?
A observação, através do vídeo, do contexto no qual se deu a conversa mostrou que a
criança estava tentando monopolizar a atenção dos colegas. Ao afirmar “Eu vou falar uma
coisa!” ela interrompe a fala do colega e chama a atenção de todos para si. Ressalta-se que
nenhum dos colegas manifestou, anteriormente, o uso do verbo saber ou de qualquer outro
termo mental. A criança afirma que vai “falar uma coisa bem diferente” e que “ninguém vai
saber” e encerra com uma proposição fictícia. Os amigos mudam de assunto e emendam a
conversa desviando completamente o foco, sem lhe dar atenção. Assim, não foi possível
afirmar que, neste caso, houve atribuição de crença ao outro.
Passou-se, a seguir, à análise do fragmento no qual apareceu a fala da criança nº 66.
Na conversa é possível observar que, além da criança nº 66, alvo da observação, outra
criança (nº 59, com 3a2m) utilizou um verbo mental.
59 (3a2m) – O lobo queria comer ela.
66 (2a11m) – Ele quer comer a Chapeuzinho Vermelho. Essa aqui ó... “Pela estrada
afora...” (cantarolando). Segura aqui Maria Tereza!
59 (3a2m) – A Chapeuzinho sabia do lobo.
66 (2a11m) – O lobo quer comer a Chapeuzinho Vermelho. Ela sabia do lobo.
59 (3a2m) – Por que você pôs ela no chão?
92
66 (2a11m) – Por que eu não quero a vovó.
59 (3a2m) – Você quer o meu?
66 (2a11m) – Não.
Quanto à manifestação da criança nº 66, a observação da conversa permitiu supor que
a locução “ela sabia do lobo” foi uma confirmação da asserção feita pelo colega. Assim, não
foi possível afirmar que se trata uma atribuição de estados de crença.
A criança que primeiro referiu o verbo saber é o nº 59, aos 3a2m. Nesta conversa,
revista no vídeo, a criança parece realmente atribuir uma crença ao personagem quando
afirma que “a Chapeuzinho sabia do lobo”.
Este fragmento permitiu, portanto, concluir que a criança nº 59, aos 3a2m, apresentou
a evidência mais precoce de atribuição de crença ao outro.
A próxima manifestação que evidenciou atribuição de crença apareceu aos 3a3m,
quando uma das crianças (nº 58) faz uma atribuição à sua própria mãe:
58 (3a3m) – A Lisciele não vai na minha casa porque a minha mãe não convidou ela porque
ela tá brava comigo. Mas porque tá fazendo visita na minha casa e a minha mãe tá ocupada,
porque ela sabe que a visita não consegue andar.
Essa manifestação pareceu um tanto desconectada da conversa do grupo. De fato, os
outros participantes não responderam a ela o que tornou essa fala desarticulada em relação ao
conjunto. De qualquer forma, a manifestação permitiu admitir que a criança nº 58, aos 3a3m,
atribuiu crença à própria mãe.
Apenas duas vezes, em todo o estudo, apareceram evidências de atribuição de crença
não dirigidas a alguém do próprio grupo em interação ou personagem da história. Em ambos
os casos, as crianças atribuíram crença às próprias mães. A criança nº 27, aos 3a8m, foi a
responsável pela outra atribuição.
27 (3a8m) – Pai, vamos embora daqui porque aqui tem um urso.
22 (3a9m) – Ah vamos, então vamos.
27 (3a8m) – Sabia que o pai e a mãe beijam na boca? A minha mãe e o meu pai beijam na
boca, porque a minha mãe pensa que o meu pai é o namorado da minha mãe.
22 (3a9m) – A minha mãe e o meu pai beijam na boca também... Ela não tem boneco...
93
Como a manifestação do exemplo anterior, aqui também pareceu haver uma
desconexão entre o comentário introduzido pela criança e a conversa encadeada pelo grupo,
que continua com uma discussão sobre a troca dos bonecos.
As demais atribuições encontradas nesse estudo foram dirigidas a um dos
participantes da sessão a um dos personagens.
Dos três aos quatro anos, outras crianças deram sinais da habilidade de atribuir uma
crença (verdadeira ou falsa) ao outro, personagem ou colega na atividade. As manifestações
apresentaram-se distribuídas ao longo do terceiro ano de vida, com predominância das
ocorrências a partir dos 3a7m, e envolveram o uso de diferentes palavras, com primazia do
verbo saber.
Foram encontradas circunstâncias nas quais as crianças envolviam os colegas nas
atribuições que fazia a si mesmo, o que dificultou a interpretação dos resultados. Em alguns
casos não foi possível afirmar se a criança atribuiu uma crença ao outro ou confundiu suas
próprias crenças com as do amigo. Isto é, algumas locuções não permitiram concluir se a
criança estendeu sua própria crença ao grupo ou se, de fato, atribuiu ao outro uma crença
que, coincidentemente, era igual a sua.
Abaixo se encontram alguns exemplos dessas locuções, listadas a partir da mais
precoce. Para que seja possível observá-las no contexto, a história da vez foi informada ao
lado de cada fragmento.
32 (2a11m) – Cadê a música? (referindo-se a música que o lobo canta na história)
14 (3a5m) – A gente não sabe como começar!
32 (2a11m) – Abre a porta e me deixe entrar! (Os três porquinhos)
14 (3a5m) – Não!
53 (3a11m) – Porque você não conta a história? Pega a história e conta? Você tem que
contar.
39 (4a3m) – A gente não sabe.
53 (3a11m) – Só você sabe. (Rapunzel)
58 (3a9m) – A gente não sabe
contar.
51 (3a11m) – Vamos ouvir o cd, heim?
58 (3a9m) – É, pode ser o cd.
53 (3a11m) – Então a gente precisa contar.
94
5 (5a) – Então deixa eu falar!
41 (4a1m) – A gente não sabe a história!
5 (5a)– Eu sei! (Rapunzel)
41 (4a1m) – O Lucas sabe.
42 (4a1m) – Eu acho que a Gabriela sabe a história.
11 (4a11m) – Não era historinha que eu ia contar pra ela, era outra coisa!
17 (4a11m) - A Ana Clara quer...
11 (4a11m) – Era outra coisa. Não vou contar!
17 (4a11m) – A Ana Clara quer ir embora. (Rapunzel)
11 (4a11m) – Ninguém vai saber!
17 (4a11m) – A Karol, a Bruna, a Ana Clara e eu quer ir embora pra ir no pátio. Quem quer
ir no parque?
11 (4a11m) – Eu!
8 (5a) - Quem é o pai?
16 (4a11m) – Eu.
8 (5a) – Fala com a mãe. A gente não sabe nada.
6 (5a) – A gente esqueceu. (Rapunzel)
8 (5a) – É diferente olha: eles ficaram felizes pelo bebê.
16 (4a11m) – Bebê?
6 (5a) – Não, a maçã!
16 (4a11m) – Ela queria um bebê.
Os resultados não permitiram estabelecer uma relação de precedência entre dois tipos
de manifestação: a atribuição de uma crença ao outro ou a atribuição de suas próprias crenças
com a(s) do(s) colega(s), atribuindo ao outro ou ao grupo suas próprias crenças. Algumas
locuções não permitiram concluir se a criança estendeu sua própria crença ao grupo ou se, de
fato, atribuiu ao outro uma crença que, coincidentemente, era igual a sua.
Outro aspecto que esta análise procurou verificar foi a predominância em relação a
quem as atribuições de crença se dirigiram. Os resultados mostraram que as crianças
atribuíram mais crenças aos personagens do que aos colegas na atividade.
As atribuições de crença aos colegas sempre se referiram ao conhecimento que as
crianças tinham sobre a história e apoiaram-se, principalmente, nos verbos saber e conhecer.
95
Na conversa abaixo, a criança nº 35, com 3a10m, reafirmou sua asserção sobre o
conhecimento que o amigo teria da história em contraposição ao que o próprio amigo afirma,
o que permitiu concluir que foi capaz de atribuir uma crença, diferente da sua própria, ao
amigo.
38 (3a9m) – Quando eu for matar o lobo ele morre no chão.
35 (3a10m) – Eu esqueci a história.
7 (4a6m) – A Júlia esqueceu a história também e o Pedro esqueceu a história também. O
Tiago não esqueceu a história, ele sabe a história.
38 (3a9m) – Não sei não!
35 (3a10m) – Mas o Tiago não conhece outra história.
38 (3a9m) – Eu conheço.
35 (3a10m) – Não conhece.
24 (4a2m) - Eu também não conheço.
Cabe observar que a criança nº 7, aos 4a6m, deu mostras dessa habilidade.
No próximo exemplo, a criança nº41, com 4a1m, deu mostras da habilidade de
atribuir crença ao outro e contrariou a asserção de seu amigo (nº 5) quase um ano mais velho.
A criança nº 42, com 4a, também apresentou sinais dessa compreensão.
41 (4a1m) - Aí a bruxa colocou a Rapunzel num prédio.
5 (5a) – Acabou a história.
41 (4a1m) – Ele não conhece a história.
5 (5a) – Eu falei pra ele. Acabou a história. Você não conhece? Você não conhece?
41 (4a1m) – Não.
5 (5a) – Só ela e ele. Ela e ele não sabem contar a história. Só ele sabe. O Lucas sabe a
história.
41 (4a1m) – O Lucas não sabe. Isso é mentira porque o Lucas não sabe.
42 (4a) – Eu quero meu.
41 (4a1m) – Ele fala e aí o que ele fale é mentira. Quando o Lucas fala que ele sabe, ele fala
pra Cássia e ele não sabe essa aula.
5 (5a) – Ele sabe sim! Ô Lucas, você não sabe contar a história?
42 (4a) – Eu sei sim.
34 – Acabou a história.
96
42 (4a) – É mentira o que você falou Guilherme Imai.
34 (4a4m) – Acabou a história.
42 (4a) – Você falou mentira!
Abaixo, crianças pouco mais velhas, nº 27 (4a2m) e nº 18 (4a5m) também deram
demonstrações dessa compreensão.
27 (4a2m) – Ela sabe começar.
46 (3a6m) – É que eu sou a vovó.
18 (4a5m) – Ela sabe a história.
27 (4a2m) – Não faz assim.
Como exposto acima, as atribuições de crença aos personagens foram mais
numerosas, e começaram a aparecer na eminência do quarto ano de vida.
18 (3a11m) – Ela é que quebrou a minha cadeira.
16 (3a11m) – Não, fui eu.
24 (3a8m) – Não fui eu.
26 (3a8m) – Não, eles não sabiam que quebraram a cama.
26 (3a8m) – Que quebrou a cama eles não sabiam.
16 (3a11m) – Fui eu que quebrei.
26 (3a8m) – Não, vocês não sabiam. Todo mundo falou alguma coisa, heim?
32 (3a11m) – A vó participou tirando a tranca pra ele entrar e ele, aí ele come ela. Porque
ela pensou
que o lobo era a Chapeuzinho.
Aos 3a8m, outra criança (nº 40) forneceu claras evidências de sua capacidade em
atribuir crença ao outro. No exemplo que segue, atribuiu uma crença falsa ao personagem
(Chapeuzinho).
19 (4a5m) – O lobo come a Chapeuzinho.
40 (3a8m) – Ele enganou
a Chapeuzinho. O lobo, ele comeu a vovozinha. Ele comeu a
vovozinha e aí a Chapeuzinho Vermelho não sabia
que era o lobo. A Chapeuzinho pensou
que era a vovó de verdade.
97
14 (4a5m) – O lobo mal chegou antes na casa da vovó porque a mãe dela pediu pra ela ir
por um caminho da estrada, mas ela foi pelo caminho da floresta. Aí ela encontrou o lobo
mal. O lobo mal, ele fingiu ser bonzinho e ele foi correndo na casa da vó se maquiou e ele se
deitou na cama bem rapidinho pra poder enganar a Chapeuzinho Vermelho porque quando
a Chapeuzinho Vermelho bateu na porta e ele falou fingindo ser bonzinho e ela pensou que
era a vovó porque ela pensou que o lobo tivesse ainda na floresta.
19 (4a5m) – Não!
40 (3a8m) – Era o lobo disfarçado de vovozinha. A mamãe não sabia que tinha lobo na
floresta. E porque ela não sabia ... É porque ela não foi com a Chapeuzinho ver o lobo.
14 (4a5m) – E aí a mãe da Chapeuzinho pediu pra ela ir pro caminho da cidade e ela não
foi, ela foi pro caminho da floresta.
19 (4a5m) – Porque tinha lobo.
Outros dois fragmentos das conversas das crianças foram selecionados abaixo, por
envolver crianças que ainda não completaram quatro anos. No primeiro, a criança nº 58, com
3a9m, mostrou que foi capaz de atribuir ao príncipe uma crença. O segundo fragmento traz
outras duas crianças, nº 56 aos 3a10m e nº 52 aos 3a12m, que também deram mostras dessa
habilidade.
39 (4a3m) – Ela não quer trocar.
58 (3a9m) – É que eu não terminei de contar. A Rapunzel fala: não quero a minha mãe,
quero o meu pai! Paiê, pai!
51 (3a11m) – Oi filha!
58 (3a9m) – Eu quero a minha mãe, mas eu não quero que ela me bate. O príncipe sabia
que
a Rapunzel tava na torre porque ele escutou a voz da Rapunzel e ai ele sabia.
53 (3a11m) – Ele escutou a voz da Rapunzel e aí a bruxa tirou a voz da Rapunzel e depois
ele caiu e viu as rosas e cortou as plantas
58 (3a9m) – (...) Aí apareceu uma bruxa bem grandona e viu e aí ele resolveu
roubar as
frutas e ai depois foi assim. Mas eu quero de novo ler essa história.
53 (3a11m) – Então, pega lá o livro e leia.
98
56 (3a10m) – Eu não sei contar a história, vai ter que tentar...
52 (3a11m) – Eu sei. Era uma vez uma Rapunzel e bruxa colocou ela na torre e o príncipe
tentou subir e falou: Rapunzel, joga as tranças! E aí ele subiu lá e ela jogou as tranças, a
Rapunzel.
56 (3a10m) – Mas era a bruxa e ele não sabia.
52 (3a11m) – É, ele não sabia ... E ele não sabia porque ele não viu que a bruxa tava lá na
torre.
Esta análise se propôs a avaliar as possíveis influências dos textos das histórias
contadas às crianças (Anexo 1) sobre os termos que elas utilizaram. Os resultados mostraram
que dentre as palavras que apareceram na fala das crianças, somente os verbos achar, saber,
pensar e descobrir foram citadas nas histórias. Foi encontrada uma ocorrência do verbo
achou na primeira e outra na segunda coleta; uma ocorrência do verbo saber em cada umas
das três primeiras coletas; uma vez o verbo pensar na terceira coleta; e uma vez o verbo
descobrir na quarta coleta. Quanto aos outros termos (os verbos enganar, mentir, fingir,
entender, lembrar; os substantivos segredos e verdade; e o adjetivo disfarçado), verificou-se
que não apareceram no corpo do texto da versão de cada da história contada às crianças.
Portanto, descartou-se a hipótese da influência da história sobre o uso desses termos uma vez
que eles apareceram um número reduzido de vezes ou não apareceram.
Crenças verdadeiras, crenças falsas e ausência do conhecimento
Os dados coletados sugeriram investigar se haveria diferença nas atribuições feitas
pelas crianças em relação ao tipo de crença atribuída: falsa ou verdadeira. Além disso,
apurou-se que algumas locuções manifestaram a compreensão dos estados mentais de crença
pela ausência do conhecimento da situação. Os resultados mostraram que a maior freqüência
das manifestações referiu atribuições de crenças falsas ao outro e que as crianças atribuíram
crenças verdadeiras mais precocemente.
Abaixo, encontram-se alguns exemplos separados segundo essa classificação.
Crenças falsas
6 (4a6m) – Era uma vez uma Chapeuzinho Vermelho que a mãe dela comprou uns doces pra
vovó, que ela tava doente. Ela levou e veio o lobo e contou pra ela uma boa história. Aí, ele
99
entrou na casa da vovozinha engoliu a vovó. Ele fez a maquiagem da vovó e depois pôs a
roupa pra Chapeuzinho Vermelho, pra ela pensar que o lobo mal era a vó do Chapeuzinho
Vermelho, mas não era, era o lobo mal.
6 (4a6m) – Ela sentiu medo porque alguém derrubou ela e deixou ela no chão caída, e era o
lobo mal! E deu um susto e morreu. Ela pensou que era a vovó dela mas não era, era o lobo
mal.
2 (ex) – O lobo mal enganou ela. Ele fingiu que era a vovozinha e enganou ela.
14 (4a5m) - Ela não sabia, a Chapeuzinho foi pelo caminho da floresta sem contar para
mãe dela porque ela pensou que na floresta não tinha lobo. Quando ela encontrou o lobo
ela foi pelo caminho da floresta e o lobo foi pela cidade e aí o lobo mau bateu na porta pra
comer a vovó.
13 (4a11m) – Aí ela riu, aí ele caiu porque ele pensou...o que a bruxa fez com ele?
32 (4a5m) – Jogou ele do castelo
14 (4a11m) – Não, ele pensou que era a Rapunzel jogando as tranças, aí era a bruxa que
jogou da mão dela, aí ele deu um pulo e caiu.
32 (4a5m) – E ficou cego.
Crenças verdadeiras
7 (4a6m) – Socorro caçador!
24 (4a2m) – Eu já me matei o lobo!
35 (3a10m) – A Chapeuzinho tava com medo porque achava
que o lobo ia comer ela.
7 (4a6m) – A Chapeuzinho tava feliz.
38 (3a9m) – É porque ela queria ir na casa da vovó e ficou feliz aí a vovó ...
18 (4a11m)– E não gosta do príncipe. E aí ele ficou cego e depois a bruxa desapareceu. E
depois ele ouviu tudo e depois ele foi seguindo o som e sabia
que era a Rapunzel. E aí
depois voltou a enxergar e depois se casaram e viveram felizes para sempre.
59 (3a2m) – A Chapeuzinho sabia do lobo.
66 (2a11m) – O lobo quer comer a Chapeuzinho Vermelho. Ela sabia do lobo.
100
22 (4a3m) – Na minha história ela falou que não é pra ir pela floresta
18 (4a5m) – A mamãe sabia e aí ela falou tome cuidado.
26 (4a2m) - A vovó sabia que a Chapeuzinho Vermelho ia visitar.
37 (3a9m) – A vó é ela.
26 (4a2m) – Não. Ela não sabia. Mas aí, de repente, entendeu.
32 (3a8m) – Ela tem medo do lobo.
20 (4a4m) – É porque ele quer comer ela. Ela sabe
que o lobo quer comer ela por isso é que
ela sai correndo, é medo.
Ausência do conhecimento
40 (3a8m) – Mas ela tava fora. Ela percebeu, mas ela não sabia
que era o lobo.
14 (4a5m) – Que era o lobo
40 (3a8m) – Ela pensou que era a vovozinha
47 (4a) – Você sabe João Pedro?
45 (4a) – Eu não. Eu não sei. Se ele quer pegar da bruxa as maçãs daí...
47 (4a) – Então eu não sei quem sabe. Eu não sei quem sabe.
45 (4a) – Nem eu.
23 (4a8m) – Assim ó, assim. Ele tá com as maçãs aqui. Aí ela levou a filha.
33 (4a4m) – Levou nada.
23 (4a8m) – Levou sim! Depois eu posso ficar com o príncipe?
33 (4a4m) – Depois eu posso ficar com o pai?
23 (4a8m) – Ele não sabia...
33 (4a4m) – O quê?
23 (4a8m) – Ele não sabia que a bruxa queria a filha.
Outras mudanças qualitativas nas manifestações das crianças foram observadas. À
medida que as crianças foram se tornando mais velhas, as locuções foram se tornando mais
elaboradas e passaram a apresentar, além da atribuição de crença, as causas e ações
decorrentes das crenças atribuídos.
101
Há locuções que apresentaram justificativas para as crenças, falsas ou verdadeiras.
Outras apresentaram explicações para as ações dos personagens a partir das crianças. Nos
exemplos anteriores, apresentados com vistas a responder outras questões, é possível
verificar como as manifestações de crença apareceram em diferentes idades. A fim de evitar
repetições, seguem algumas das manifestações mais tardias que mostram a qualidade da
argumentação sobre as crenças que as crianças conseguiram atingir.
6 (4a6m) – Ele comeu a Chapeuzinho Vermelho e a vovó dela. E aí o caçador ficou com
medo porque ele sabia que o lobo mal engoliu as duas. Ele sabia por que ele ouviu um
barulho lá da casa dele então ele foi salvar. Ele tava no banheiro comendo bolacha.
11 (4a5m) – O lobo parou a Chapeuzinho e a Chapeuzino tava rindo do lobo.
6 (4a6m) – A Chapeuzinho morreu por que ela não tinha sabido que o lobo engoliu a vovó.
Aí ela pulou de dentro da barriga que abriu o caçador. Aí, viveram sempre juntos.
13 (4a5m) – Vai, começa pela vó. Aí comeu a Chapeuzinho. Aí o lobo comeu os dois.
8 (4a6m) – A Chapeuzinho não sabia que o lobo tava indo pra casa da vovó. E ele foi mais
rápido que a Chapeuzinho. A Chapeuzinho não sabia que era o lobo. Ele foi mais rápido
pra casa da vovó então ela não sabia. Aí, o lobo se vestiu de vovó, aí depois a vovó foi
engolida pelo lobo. Aí a Chapeuzinho falou: quem esta aí? É a sua neta. Aí depois ela falou
assim, ela entra e fala: que olhos tão grandes. É pra te ver melhor! E pra que esse nariz tão
grande? É pra te cheirar melhor. E essa boca tão grande? É pra te engolir!
8 (4a6m) – Ah, mas eu vou ficar com o príncipe...
8 (4a6m) – Ele não sabia
que a bruxa tá lá. Aí depois que ele subiu a bruxa subiu. Aí
depois ele ouviu a Rapunzel cantando a sua canção.
6 (4a6m) – Óh, deixa ele subir aqui!
Ocorrências singulares
Neste estudo, algumas ocorrências mereceram especial atenção, por não se incluírem
em nenhuma das perspectivas discutidas até agora. Assim, considerações sobre essas
ocorrências singulares serão apresentadas abaixo.
Em algumas locuções as atribuições da compreensão dos estados mentais não
envolveram atribuições ao outro. Na conversa apresentada abaixo, os verbos enganar, mentir
102
e fingir foram usados para dar explicações sobre estados mentais. A criança nº 56, aos 3a4m,
tentou explicar ao colega o que é enganar. Foi seguida pela colega, nº 48, com 3a5m.
56 (3a4m) – Eu acho que o lobo queria comer ela. Daí ele queria matar o caçador. Daí ele
queria enganar ela e a Chapeuzinho desobedeceu.
48 (3a5m) – Enganar e comer.
56 (3a4m) – Enganar também é mentir.
48 (3a5m) – Mentir é fingir uma coisa.
Em outra conversa, mais uma vez foi possível observar o uso do verbo enganar como
sinal da compreensão dos estados mentais do outro. A criança nº 5, com 4a6m, atribui ao
lobo uma intenção (“enganar a Chapeuzinho”), no que é acompanhada pelo colega da
atividade (nº 57, aos 3a3m) que ainda explica porque o lobo “vai enganar”.
5 (4a6m) – Ele vai enganar a Chapeuzinho, ele vai enganar.
57 (3a3m) – Ele vai enganar a Chapeuzinho por que ele era mau.
5 (4a6m) – Ele quer enganar a Chapeuzinho por que ele é ruim ele come gente.
O verbo lembrar foi utilizado uma única vez como referência ao estado mental de um
personagem. A criança nº 8, aos 5a, afirmou que a mãe de Rapunzel “lembrou do neném
quando ela acordou”, conforme segue:
6 (5a) – Cadê meu neném, heim?
8 (5a) – Ela lembrou
do neném quando ela acordou.
6 (5a) – Ela acordou e falou: cadê meu neném?
8 (5a) – Aí depois o marido falou: a bruxa pegou! Fui pegar umas maçãs...
Assim, neste estudo, só se verificou o uso do verbo lembrar na atribuição de estados
mentais ao outro aos 5 anos.
Outra palavra utilizada uma única vez em todo o estudo, foi o substantivo segredo. A
ocorrência se deu aos 3a5m, pela criança nº66. A locução onde apareceu a palavra não
permitiu afirmar que a criança refere o termo segredo como algo que deve ser sigiloso ou que
envolve conhecimento restrito a poucos. Assim, observando o contexto onde a palavra
103
apareceu não foi possível concluir que houve manifestação da compreensão de estados
mentais.
66 (3a5m) – Eu sou a Rapunzel. Ela é a Rapunzel e ele é o príncipe e essa é a bruxa, né? Eu
vou contar os segredos pra vocês. Era uma vez uma história que vivia pela floresta. Ela
fugiu pela janela. Entendeu? Pra vocês é um boneco. A mamãe e o papai e a bruxa.
A última ocorrência apresenta uma locução na qual a criança nº 42, aos 3a7m,
manifesta atribuição ao outro de uma crença sobre um lugar inesperado, tal como avaliado
nas clássicas tarefas de Max (Wimmer & Perner, 1983) e das bonecas Sally e Anne (Baron-
Cohen, Leslie & Frith, 1985).
41 (3a7m) – E matou o lobo e cortou a barriga...
50 (3a5m) – Ele bate em mim.
42 (3a7m) – Ele pensa que tá aqui, mas tá aqui olha!
50 (3a5m) – Ele vai bater...
42 (3a7m) – Ele tá aqui olha!
50 (3a5m) – Eu não lembro essa parte... Eu não lembro mesmo dessa parte.
41 (3a7m) – Eu lembro.
Síntese dos resultados sobre as manifestações de atribuição de crença
Em síntese, os dados mostraram que nas manifestações de crença, o verbo saber foi o
mais utilizado pelas crianças, além de ter aparecido mais precocemente. Foram utilizados um
total de dez verbos mentais, três substantivos e um adjetivo, com apenas uma ocorrência.
Pensar, conhecer, mentir e enganar também foram verbos muito freqüentes neste estudo.
A manifestação mais precoce se deu aos 3a2m, pela criança nº 59, que fez uma
atribuição a um personagem da história por meio do verbo saber. Aos 3a3m, a criança nº 58
fez a atribuição a sua própria mãe, também por meio do verbo saber.
Os resultados apresentaram várias evidências da habilidade das crianças para atribuir
uma crença ao outro dos três aos quatro anos, com predominância das que ocorreram a partir
dos 3a7m.
104
Quanto a quem se dirigiu as atribuições de crença, os resultados apontaram um
número mais expressivo de atribuições aos personagens. As outras atribuições se dirigidas
aos colegas na atividade. Apenas duas atribuições voltaram-se às mães das próprias crianças
responsáveis pelas atribuições.
Os resultados não permitiram concluir pela influência do texto das histórias contadas
às crianças (Anexo 1) na emissão dos termos utilizados para manifestar atribuição de crença
ao outro.
Este estudo procurou investigar se haveriam diferenças nas atribuições feitas pelas
crianças em relação ao tipo de crença atribuída (falsa ou verdadeira), ou que outras
manifestações poderiam ser encontradas. Os resultados mostraram que a maior freqüência
das manifestações referiu atribuições de crenças falsas ao outro, porém as crianças atribuíram
crenças verdadeiras mais precocemente. Foram também encontradas manifestações que
manifestaram atribuição ao outro pelo desconhecimento de fatos.
Quanto às mudanças qualitativas das locuções expressas pelas crianças ao longo do
tempo, foram encontradas mudanças nas locuções que envolveram os verbos mentais: a partir
dos 3a5m, as crianças forneceram evidências de avanços nessa compreensão. As locuções
foram se tornando mais elaboradas com a idade e algumas passaram a apresentar a atribuição
de crença no contexto em que ocorreram, com causas e ações decorrentes.
4.2 Resultados obtidos pela aplicação individual de tarefas crença e crença falsa.
A análise dos dados provenientes da aplicação individual de tarefas teve início
com a organização de uma tabela dos resultados nas quatro coletas (Anexo 10). Foram
utilizados os valores 0 (zero), para indicar erro ou ausência de resposta, e 1 (um), para
indicar acerto.
Esses resultados foram submetidos à análise fatorial, com a finalidade de organizar o
desempenho das crianças e separá-las em grupos de comportamentos comuns, com o objetivo
de encontrar diferentes perfis de desenvolvimento e estudá-los. O critério de construção dos
clusters foi a média geral nas tarefas por coleta.
A análise fatorial e a classificação hierárquica apresentaram duas possibilidades de
formação de clusters: uma delas gerou três clusters e a outra gerou sete clusters.
105
29,94 29,00 5,846 23 41
32,56 32,00 5,294 23 41
38,59 40,50 4,239 29 43
34,03 33,50 6,258 23 43
CLUS3
1
2
3
Total
Média Mediana
Desvio Padrão
Miínimo Máximo
4.2.1 Distribuição dos participantes em três clusters
Como resultado da análise fatorial, a classificação hierárquica separou os
participantes em três clusters segundo seu desempenho. A Figura 4 permite observar a
distribuição dos participantes nos clusters.
Figura 4Nuvem de pontos com a distribuição dos participantes nos três clusters.
Ao observar a Figura 4 perguntou-se, inicialmente, em que medida as diferenças que
geraram a formação dos clusters poderiam ser relacionadas à idade, uma vez que a faixa
etária dos participantes da pesquisa tem uma amplitude de 24 meses.
A Tabela 8 apresenta as médias, medianas e o desvio padrão das idades dos
participantes dos clusters no início do estudo.
Tabela 8Medidas descritivas das idades dos participantes por cluster,
na distribuição em três clusters
106
A Figura 5, abaixo, apresenta o intervalo de confiança para a média, isto é, a
probabilidade de que este intervalo contém a média das idades dos participantes em cada
cluster. Entre as crianças do cluster 1, houve uma variação de 18 meses, sendo a idade média
de 30m; entre as crianças do cluster 2 houve a mesma variação de 18 meses, com uma
pequena elevação da idade média para 32m; no cluster 3, a variação da idade das crianças foi
de 14 meses, com idade média de 38,5m. A análise fatorial mostrou uma relação entre a
formação dos clusters e a idade dos participantes no início da pesquisa: a média de acertos
nas tarefas avançou de acordo com o aumento da idade.
Passou-se, então, à análise do comportamento de cada cluster. O cálculo da média do
número de acertos por coleta mostrou as diferenças entre no desempenho das crianças nos
três clusters, como apresentado na Figura 6.
Figura 5Média das idades por cluster, Figura 6Média do número de acertos
em três clusters por coleta, em três clusters
A Figura 6 mostra que as dezoito crianças que compõem o cluster 1 começaram com
baixas médias de desempenho e apresentaram progresso ao longo dos 18 meses do estudo. A
Figura 5 mostra a média das idades no cluster 1, o que nos permitiu formular a hipótese que,
neste caso, a idade influenciou no desempenho das crianças.
Os dezoito participantes que compõem o cluster 2 iniciaram com médias baixas e
apresentaram um avanço em seu desempenho. Porém, a faixa etária no cluster fornece
indícios que permitem hipotetizar que outras variáveis, além da idade, poderiam ter
influenciado o avanço do desempenho na última coleta. A Figura 5 mostra que se trata de
221818 221818 221818 221818N =
p
Cluster 3Cluster 2Cluster 1
Intervalo de Confiança - 95%
1,0
,8
,6
,4
,2
0,0
-,2
Coleta 1
Coleta 2
Coleta 3
Coleta 4
221818N =
Cluster 3Cluster 2Cluster 1
95% CI Idade (em meses)
42
40
38
36
34
32
30
28
26
107
crianças pouco mais velhas que as do cluster 1 que atingiram, na última coleta, o mesmo
patamar de desempenho que o apresentado por crianças mais velhas de outro cluster.
O cluster 3 foi formado por vinte e duas crianças, com média de idade de 38,5m
(Figura 5). O desempenho, na primeira coleta, apresentou-se em torno da média e os avanços
foram regulares. Foram as crianças que, em média, tinham mais idade, o que permite
hipotetizar que houve influência da idade, desde a primeira coleta, no bom desempenho deste
grupo de crianças.
Assim, a análise fatorial permitiu a observação de três “perfis de desenvolvimento”
das crianças, que se evidenciaram ao longo do tempo:
um grupo de dezoito crianças, com média de idade de 30 meses, que começaram com
baixas médias de desempenho e apresentaram avanços ao longo dos 18 meses do
estudo;
outro grupo de dezoito crianças, com média de idade de 32 meses, que iniciaram com
médias baixas e apresentaram avanços em seu desempenho, com indícios de que a
melhora do desempenho na última coleta tenha sofrido outras influências além da
idade;
o último grupo formado por vinte e duas crianças, com idade média de 38,5 meses,
que iniciaram com desempenho em torno da média e apresentaram avanços regulares.
De qualquer maneira, em todos os grupos, foi possível observar que há melhora no
desempenho com o passar do tempo. Assim, os resultados evidenciam uma mudança
desenvolvimental nos três grupos de crianças.
108
32,57 29,00 8,715 23 43
28,33 29,00 2,915 24 31
32,91 31,00 4,784 27 41
31,83 31,00 6,969 23 41
38,00 39,50 4,648 29 41
35,33 34,00 5,431 25 42
39,20 41,50 4,290 29 42
34,03 33,50 6,258 23 43
CLUS7
1
2
3
4
5
6
7
Total
Média Mediana Desvio Padrão Mínimo Máximo
4.2.2 – Distribuição das crianças em sete grupos
Como resultado da análise fatorial, a classificação hierárquica apresentou mais uma
forma de dividir os participantes em três clusters, segundo seu desempenho. A Figura 7
apresenta a distribuição dos participantes nos sete clusters:
Figura 7 Nuvem de pontos com a distribuição dos participantes nos sete clusters
Como no item anterior, perguntou-se inicialmente sobre a influência da idade na
formação dos clusters. A Tabela 9 informa sobre as médias, medianas e o desvio padrão das
idades dos participantes dos sete clusters, no início do estudo.
Tabela 9Medidas descritivas das idades dos participantes por cluster, na
distribuição em sete clusters
109
109661197109661197109661197109661197N =
7,006,005,004,003,002,001,00
95% CI
1,2
1,0
,8
,6
,4
,2
0,0
-,2
Coleta 1
Coleta 2
Coleta 3
Coleta 4
109661197N =
7,006,005,004,003,002,001,00
95% CI Idade (em meses)
50
40
30
20
A Figura 8, abaixo, apresenta o intervalo de confiança para a média, isto é, a
probabilidade de que este intervalo contém a média das idades dos participantes em cada
cluster. As crianças do cluster 1, apresentaram uma variação etária de 20 meses, sendo a
idade média 32,5m; no cluster 2, a variação na idade das crianças foi de 7 meses, com idade
média de 28m; no cluster 3, as crianças apresentaram uma variação de 14 meses, e a idade
média foi 33m; as crianças do cluster 4, apresentaram variação de 18m e a idade média foi
32m; no cluster 5, observou-se uma variação de 12 meses na idade das crianças, sendo a
média 38m; as crianças do cluster 6 apresentaram uma variação etária de 17 meses e idade
média de 39m; e, no cluster 7, foi encontrada uma variação de 13 meses na idade das
crianças, sendo a média 39m. A análise fatorial não permitiu concluir que há relação direta
entre a formação dos clusters e a idade dos participantes no início da pesquisa: crianças de
diferentes idades formaram um mesmo cluster.
Passou-se, a seguir, à análise do desempenho das crianças de cada cluster, para que
fosse possível encontrar os perfis de comportamento. Para isso, foram consultadas a Figura 8,
que apresenta a média das idades dos participantes por cluster, e a Figura 9, que apresenta a
média do número de acertos dos participantes por coleta e por cluster.
Figura 8Média das idades por cluster, Figura 9Média do número de acertos
em sete clusters por coleta, em sete clusters
A Figura 9 mostra que as sete crianças do cluster 1 obtiveram nota zero no início do
estudo, seguido de um salto em suas médias na segunda coleta, que se manteve na terceira e
sofreu uma pequena queda na última coleta. Ao observar a Figura 8, é possível notar que a
110
faixa etária dessas crianças apresentou uma grande amplitude, o que permite hipotetizar que
outras variáveis além da idade influenciaram no desempenho das crianças.
As crianças dos clusters 2 e 7 mostraram comportamentos próximos, tendo em vista a
regularidade que demonstram no avanço de seu desempenho em relação aos demais clusters.
A diferença entre elas é que no primeiro (cluster 2) as nove crianças iniciaram com médias
baixas e avançaram gradativamente, sem chegar a atingir médias muito altas; e, as dez
crianças do cluster 7, iniciaram com desempenho próximo à média e avançaram
gradativamente, chegando à médias altas na última coleta. A Figura 8 permitiu supor que
essa diferença nas médias de desempenho das crianças de cada cluster foi devida a diferença
de idade, uma vez que as do cluster 2 apresentaram média de idade de 28 meses e, o cluster
7, foi formado por crianças cuja média de idade correspondeu a 39 meses.
Assim, levando-se em conta a faixa etária das crianças dos clusters 2 e 7, foi possível
afirmar que os dois grupos de crianças apresentaram o mesmo perfil de desenvolvimento, e
que esse perfil é compatível com uma mudança desenvolvimental.
Há também alguma semelhança entre os comportamentos apresentados pelas crianças
dos clusters 3 e 6: elas apresentaram um aumento em seu desempenho ao longo do tempo,
com uma pequena queda da segunda para a terceira coleta, mas com uma recuperação na
quarta coleta. Se forem observadas as médias de idade da Figura 8, pode-se hipotetizar que,
mesmo apresentando um mesmo perfil, as médias de desempenho das crianças do cluster 3
são mais baixas em relação às do cluster 6 em função das diferenças nas médias de idade.
As onze crianças do cluster 3 apresentaram o maior salto de desempenho em todo o
grupo de participantes, comparando-se os resultados da primeira e da última coleta. Ressalta-
se que se trata de crianças, em média, mais novas do que as dos clusters 6 e 7, e que atingem
o mesmo desempenho no final do estudo.
No cluster 4, as seis crianças apresentaram um salto de desempenho da segunda para
a terceira coleta (Figura 9). Neste cluster, os participantes também chegaram a médias altas
na última coleta - como nos clusters 3, 6 e 7 - e apresentaram um desempenho compatível
com a hipótese de uma mudança desenvolvimental. Mesmo assim, observando as mudanças
das médias das crianças do cluster 4 ao longo do estudo, não se pode dizer que seu perfil de
desenvolvimento é similar aos dos demais, em virtude do salto no desempenho observado
entre as coletas 2 e 3. A Figura 8 aponta que a variação da idade teve uma amplitude maior
que a encontrada entre as crianças do cluster 3, o que poderia ter influenciado nas médias.
No último cluster a ser analisado (cluster 5), as seis crianças se apresentaram já na
primeira coleta com médias altas, uma queda na segunda coleta, uma nova alta das médias na
111
terceira coleta e, na última coleta, com maior dispersão das médias de desempenho.
Apresentaram, portanto, uma variação das médias ao longo do estudo.
Esta análise encontrou pelo menos 5 diferentes perfis de desenvolvimento, o que
forneceu evidências para sustentar a hipótese da influência de outras variáveis, além da
idade, no desenvolvimento da capacidade de atribuir estados mentais ao outro. Os resultados
da distribuição dos participantes em sete clusters evidenciaram uma mudança
desenvolvimental.
4.3 Estudos de caso: análise intra-individual de algumas crianças
Nas duas análises realizadas – tanto a que se apoiou nas locuções verbais das crianças
como a que utilizou o desempenho nas tarefas – os resultados de alguns participantes
suscitaram um exame particular. Essas crianças foram escolhidas para um estudo intra-
individual.
Neste item, serão analisadas as mudanças apresentadas no comportamento desses
participantes ao longo do tempo, a partir dos tipos de resultados: locuções verbais e
pontuação nas tarefas.
As crianças foram escolhidas por atenderem a pelo menos um os seguintes critérios:
1. ausência de manifestações verbais com algum tipo de atribuição de estados mentais ao
outro, ao longo da duração do estudo;
2. pontuações mais baixas nas tarefas, considerando-se a somatória de todas as tarefas
aplicadas;
3. atribuições de crença ao outro nas manifestações verbais desde a primeira coleta;
4. manifestação mais precoce da atribuição ao outro de emoção, desejo ou crença;
5. pontuações mais altas nas tarefas, considerando-se a somatória de todas as tarefas
aplicadas no estudo.
112
4.3.1 Ausência de manifestações verbais com algum tipo de atribuição de estados
mentais ao outro, ao longo da duração do estudo
Analisar as crianças que não apresentaram qualquer atribuição de estados mentais na
fala é importante porque, o fato dessas atribuições não terem aparecido, não significa que as
crianças não tenham essa habilidade.
Assim, verificar o desempenho dessas crianças nas tarefas pode contribuir para
responder à questão do desenvolvimento dessa compreensão nessas crianças.
Dos 58 participantes da pesquisa, somente as crianças nº 21 e nº 60, não deram
demonstrações, em suas manifestações verbais, de que atribuíram estados mentais ao outro.
Criança nº 21
A criança nº 21, com 3a4m no início do estudo, não apresentou manifestações verbais
que fornecessem indícios da habilidade de atribuição ao outro de estados mentais.
Considerando-se a divisão em sete clusters, a análise fatorial incluiu essa criança no
cluster 3, das crianças que apresentaram baixas médias de desempenho nas três primeiras
coletas e um salto em seu desempenho na última coleta, aos 4a10m. O Anexo 10 permitiu
observar esse avanço em seu desempenho aos 4a10m, quando deu respostas corretas para
todas as tarefas da quarta coleta.
Essas evidências permitem hipotetizar que a criança nº 21 não deu indícios da
habilidade de atribuir estados mentais ao outro em suas manifestações verbais, pois
apresentou sinais de um desenvolvimento tardio em relação a outras crianças. O desempenho
nas tarefas da última coleta mostrou que, aos 4a10m, a criança nº 21 foi capaz de atribuir
estados mentais ao outro.
Neste caso, os dois conjuntos de resultados apontaram para a mesma direção e se
complementaram: o desempenho nas tarefas ajudou a compreender e explicar a ausência das
manifestações verbais.
113
Criança nº 60
A criança nº 60 iniciou o estudo aos 2a2m. Não apresentou manifestações verbais que
fornecessem indícios da habilidade de atribuição ao outro de estados mentais até o final do
estudo, aos 3a8m.
Considerando-se a divisão em sete clusters, a análise fatorial incluiu essa criança no
cluster 2, das crianças com baixas médias de desempenho em todo o estudo. No Anexo 10 foi
possível observar o desempenho da criança inclusive no final do estudo, quando deu
respostas corretas para apenas duas das seis tarefas da quarta coleta, aos 3a8m.
Essas evidências permitem hipotetizar que a criança nº 60 não deu indícios da
compreensão de estados mentais, pois apresentou sinais de um desenvolvimento tardio em
relação a outras crianças deste estudo com idades próximas (as crianças nº 58 a nº 63
apresentaram melhor desempenho nas tarefas e manifestações verbais dessa compreensão).
Neste caso, os dois conjuntos de resultados (manifestações verbais e desempenho em
tarefas) apontaram para a mesma direção e, novamente, o desempenho nas tarefas ajudou a
compreender e explicar a ausência das manifestações verbais.
4.3.2 Pontuações mais baixas nas tarefas
O desempenho das crianças nas tarefas foi expresso por uma somatória simples, que
permitiu encontrar as crianças que obtiveram as notas mais baixas. No Anexo 10 é possível
notar que, de um escore máximo de 18 acertos, as pontuações mais baixas foram das crianças
nº 64, que obteve 3 acertos, e da criança nº 44, com 4 acertos.
A fim de explicar o baixo desempenho dessas crianças, recorreu-se às manifestações
verbais que elas apresentaram ao longo do tempo.
Criança nº 64
A criança nº 64 tinha 2 anos no início do estudo. Na análise fatorial que formou sete
clusters, ela foi incluída no cluster 2, das crianças com médias baixas nas quatro coletas.
A Tabela 6 mostra que a criança emitiu locuções verbais com manifestações da
compreensão de estados mentais apenas na terceira coleta, aos 3 anos. Foram duas locuções
114
expressas pela criança que referiram estados de emoção e caráter. O Anexo 9 permitiu
recuperar e reapresentar como se configuraram as manifestações emitidas pela criança:
64 (3a) - Ele é malvado!
64 (3a) - Eu acho que a vovó tava triste porque o lobo era malvado e o lobo mau
comeu ela.
Assim, a criança nº 64 não forneceu indícios dessa compreensão no segundo ano de
vida, o que permite hipotetizar que ela estava no início do processo de elaboração dessa
compreensão quando, com 3 anos completos, forneceu os primeiros sinais com atribuições de
emoção e caráter aos personagens da história.
Ressalta-se que na quarta coleta (aos 3a6m) a criança não deu outros indícios dessa
compreensão nas manifestações verbais e acertou apenas a primeira tarefa (que avalia se a
criança diferencia seu próprio desejo do desejo dos outros).
Neste caso, os dois conjuntos de resultados (manifestações verbais e desempenho em
tarefas) apontaram para a mesma direção e juntos, permitiram explicar melhor o desempenho
da criança nº 64.
Criança nº 44
A criança nº 44 tinha 2a7m no início do estudo. Na análise fatorial que formou sete
clusters, ela foi incluída no cluster 2, das crianças com médias baixas nas quatro coletas. O
Anexo 10 permitiu confirmar a baixa média de desempenho da criança nas tarefas até o final
do estudo, aos 4 anos, quando deu respostas corretas apenas para as duas primeiras dentre as
seis tarefas da quarta coleta.
A Tabela 6 mostrou que a criança emitiu locuções verbais com manifestações da
compreensão de estados mentais apenas na primeira coleta, aos 2a7m. Foram duas locuções
que referiram estados de desejo e caráter. O Anexo 9 permitiu recuperar e reapresentar como
se configuraram as manifestações emitidas pela criança:
44 (2a7m) – Quer
papar! Quer papar!
44 (2a7m) – O lobo é bonzinho
... Olha! Olha!
115
Cabe ressaltar que esta foi a mais precoce atribuição de desejo encontrada nesse
estudo. Contudo, salienta-se que essa criança não apresentou outros sinais da compreensão de
estados mentais até o final do estudo, aos 4a1m.
Os resultados das tarefas forneceram evidências na mesma direção, o que permite
hipotetizar que a criança nº 44 não deu indícios da compreensão de estados mentais, por ter
apresentado um desenvolvimento tardio em relação a outras crianças deste estudo.
Assim, não foram encontradas relações entre a manifestação precoce da criança e
outros indícios posteriores dessa compreensão. Não foi possível concluir, portanto, que a
criança apresentou um desenvolvimento precoce tendo em conta toda a extensão dessa
compreensão.
4.3.3 Manifestações verbais de atribuições de crença ao outro desde a primeira
coleta
As locuções que fornecem indícios de atribuição de crença ao outro, são
manifestações privilegiadas nos estudos a respeito da teoria da mente das crianças. Essa já
seria uma razão suficiente para justificar uma verificação mais acurada das crianças que,
desde a primeira coleta, apresentaram indícios dessa compreensão. Contudo, outras duas
razões foram consideradas neste trabalho: a) somente duas crianças apresentaram indícios da
compreensão de estados de crença na primeira coleta; e b) a idade dessas crianças (3a5m) é
menor que o normalmente apontado pela literatura como período em que se manifesta essa
habilidade (a partir dos 4a).
Criança nº 14
A criança nº 14 iniciou o estudo com 3a5m e deu indícios da compreensão de estados
de mentais de crença em suas manifestações verbais na primeira coleta. Foram observadas as
manifestações nas coletas que se seguiram (Tabela 6) e os resultados mostraram que a
criança continuou fornecendo indícios dessa compreensão, pois apresentou manifestações nas
coletas 3 e 4. Além disso, a Tabela 6 mostrou que esses indícios envolveram a compreensão
de outros estados mentais (apareceram atribuições de desejo nas coletas 2, 3 e 4; de emoção
nas coletas 3 e 4; e de caráter na coleta 4).
116
Considerando-se a divisão em sete clusters, a análise fatorial incluiu essa criança no
cluster 7, das crianças que apresentaram médias altas de desempenho nas tarefas em todo o
estudo. O Anexo 10 permitiu confirmar o alto índice de acerto da criança nas tarefas nas três
últimas coletas, aos 3a11m, 4a5m e aos 4a11m.
Essas evidências forneceram uma base para sustentar a hipótese de que a criança nº
14 compreendia estados mentais de crença aos 3a5m.
Neste caso, os dois conjuntos de resultados (manifestações verbais e desempenho em
tarefas), apontam para a mesma direção e se complementaram na explicação do desempenho
da criança.
Criança nº 18
A criança nº 18 iniciou o estudo com 3a5m e suas manifestações verbais deram
indícios da compreensão de estados de mentais de crença na primeira coleta. Foram
observados os resultados das coletas seguintes, que mostraram que a criança continuou
fornecendo indícios dessa compreensão, pois apresentou manifestações nas coletas 3 e 4.
Considerando-se a divisão em sete clusters, a análise fatorial incluiu essa criança no
cluster 6, das crianças que apresentaram baixas médias na primeira coleta e um salto na
média de desempenho da primeira para a segunda coleta, que continuou a crescer até o fim
do estudo. O Anexo 10 permitiu confirmar o alto índice de acerto da criança nas tarefas das
duas últimas coletas, aos 4a5m e aos 4a11m.
O Anexo 9 permitiu recuperar e reapresentar como se configurou a manifestação de
crença emitida pela criança na primeira coleta:
18 (3a5m) – Eles não falam nada de verdade
, que aconteceu na historia.
Na locução, o fato da criança dizer que seus colegas na atividade “não falam nada de
verdade”, mostra que ela atribui aos colegas a capacidade de mentir. Por outro lado, é
possível indagar se a locução não poderia ser considerada apenas uma constatação da mentira
dita pelos colegas na atividade. De qualquer forma, a criança deu sinais de compreender que
há diferença entre seus próprios estados mentais e os dos outros.
Além disso, as manifestações verbais da criança nº 18 forneceram indícios da
compreensão de outros estados mentais (apareceram locuções de desejo nas coletas 1 e 4, e
de emoção na coleta 3).
117
Essas evidências fornecem uma base para sustentar a hipótese de que a criança nº 18
estava em processo de elaboração dessa compreensão aos 3a5m e que, aos 4a5m, a
compreensão da criança estava estabelecida.
Neste caso, os dois conjuntos de resultados (manifestações verbais e desempenho em
tarefas) novamente apontam para a mesma direção.
4.3.4 Manifestação mais precoce da atribuição ao outro de emoção, desejo ou crença
As manifestações mais precoces da compreensão dos estados mentais foram
apresentadas no item 4.1 separadamente: manifestações das atribuições de desejo, emoção,
caráter e crença. A seguir, as crianças que manifestaram essas locuções serão estudadas para
que seja possível verificar como elas se desenvolveram em relação à compreensão de estados
mentais ao longo do estudo. Nessa verificação será também observado o desempenho nas
tarefas, a fim de contribuir na explicação do comportamento das crianças ao longo do tempo.
Serão estudadas as seguintes crianças (apresentadas por ordem cronológica):
- criança nº 55, que manifestou emoção aos 2a5m;
- criança nº 45, que manifestou caráter aos 2a6m;
- criança nº 44, que manifestou desejo aos 2a7m;
- criança nº 59, que manifestou crença aos 3a2m,
Criança nº 55
A criança nº 55 tinha 2a5m no início do estudo e, logo na primeira coleta, apresentou
a manifestação mais precoce de emoção. A Tabela 6 mostrou que seis meses depois, aos
2a11m, essa criança não apresentou qualquer manifestação, voltando a apresentá-las somente
aos 3a5m e aos 3a11m (foram manifestações de desejo).
Quanto ao desempenho nas tarefas, a criança nº 55 acertou 6 tarefas em todo o estudo
(Anexo 10) e, considerando-se a distribuição em sete clusters, foi incluída no cluster 3, das
crianças que iniciaram com médias baixas e apresentaram um salto em seu desempenho na
última coleta.
Esses resultados sugerem que, apesar de ter apresentado uma manifestação precoce da
compreensão dos estados de emoção, essa criança não se apresentou do mesmo modo em
118
relação aos demais estados mentais, uma vez que só apresentou locuções envolvendo desejo
e não emitiu locuções envolvendo crença até o final dos estudos, aos 3a11m.
Assim, nesse caso, não parece ter havido relação entre a manifestação precoce da
criança e outros indícios da compreensão de estados de mentais posteriores. Não foi possível
concluir, portanto, que a criança apresentou um desenvolvimento precoce se levar-se em
conta toda a extensão dessa compreensão.
Criança nº 45
A criança nº 45 tinha 2a6m no início do estudo, quando manifestou a mais precoce
atribuição de caráter ao outro. Além dessa manifestação, também foi encontrada na primeira
coleta uma locução expressou atribuição de desejo. A Tabela 6 mostrou que aos 3a (segunda
coleta) essa criança não apresentou qualquer manifestação, mas voltou a expressar
atribuições de desejo aos 3a6m e aos 4a.
Quanto ao desempenho nas tarefas, a criança nº 45 acertou 8 tarefas em todo o estudo
(Anexo 10) e, considerando-se a distribuição em sete clusters, foi incluída no cluster 3, das
crianças que iniciaram com médias baixas e apresentaram um salto em seu desempenho na
última coleta.
Esses resultados permitem concluir que, apesar de ter apresentado uma manifestação
precoce de atribuição de caráter ao outro, essa criança não apresentou indícios da
compreensão de outros estados mentais além de desejo até o final do estudo, aos 4a.
Assim, nesse caso, os resultados não apontaram para uma relação entre a
manifestação precoce da criança e indícios posteriores da compreensão de outros estados
mentais. Não foi possível concluir, portanto, que a criança apresentou um desenvolvimento
precoce se levar-se em conta toda a extensão dessa compreensão.
Criança nº 44
A criança nº 44 teve sua análise intra-individual realizada no item 4.3.2, que discutiu
as crianças com as pontuações nas tarefas mais baixas.
119
Criança nº 59
A criança nº 59 tinha 2a2m no início do estudo e até a segunda coleta, aos 2a8m, não
apresentou qualquer manifestação de compreensão de estados mentais na fala (Tabela 6).
Aos 3a2m, além da locução que atribuiu crença ao outro, emitiu uma locução que atribuiu
desejo. Na última coleta, aos 3a8m, voltou a atribuir apenas desejo ao outro.
Quanto ao desempenho nas tarefas, a criança nº 59 acertou 9 tarefas em todo o estudo
(Anexo 10) e, considerando-se a distribuição em sete clusters, foi incluída no cluster 1 - das
crianças que obtiveram nota zero no início do estudo, seguido de um salto em suas médias na
segunda coleta, que se mantiveram na terceira e sofreram uma pequena queda na última
coleta.
Esses resultados sugerem que, a criança nº 59 apresentou um desempenho, com altos
e baixos ao longo do tempo. Não foi possível concluir, portanto, que a criança apresentou um
desenvolvimento precoce considerando-se toda a extensão dessa compreensão.
4.3.5 Pontuações mais altas nas tarefas
Neste estudo, somando-se todas as tarefas aplicadas nas quatro coletas, foi possível
obter uma pontuação máxima de 18 pontos. As pontuações mais altas foram obtidas pelas
crianças que fizeram 16 pontos (criança nº 6 e criança nº 9) ou 14 pontos (crianças nº 5, nº 7,
nº 11 e nº 48). Nenhuma criança obteve 18, 17 ou 15 pontos (Anexo 10).
As crianças nº 5, 6, 7 e 9 iniciaram o estudo com 3a6m meses e terminaram com 5a.
A criança nº 11, com diferença de apenas um mês de idade em relação às anteriores, iniciou o
estudo com 3a5m e terminou com 4a11. Esses dados mostraram que a idade pode ter
exercido influência no bom desempenho dessas crianças.
Em relação à criança nº 48 não foi possível concluir que o bom desempenho foi
influenciado pela idade, uma vez que a criança começou o estudo com 2a5m e, na quarta
coleta, estava com 3a11m, sendo pelo menos um ano mais nova que as outras cinco com
pontuações próximas. Por isso, a criança nº 48, com 14 pontos, será objeto da análise intra-
individual nesse item.
120
Criança nº 48
A criança nº 48 acertou todas as tarefas nas coletas três e quatro (Anexo 10). A
análise fatorial que criou sete clusters incluiu a criança no cluster 7, das crianças que
iniciaram o estudo com desempenho em torno da média e apresentaram uma melhoria regular
em seu desempenho obtendo médias altas na última coleta.
Por outro lado, as manifestações verbais dessa criança apontam que:
- aos 2a5m, apresentou o uso mais precoce do verbo quer (Ela não quer. Você não quer?);
- aos 2a11m, apresentou a segunda atribuição mais precoce de emoção ao outro, com uso do
verbo gostar (Eu vou ver a mamãe porque ela gosta de brilho. O meu não gosta. O dela não
gosta, mas a Cachinho Dourado gosta.);
- aos 3a5m, apresentou a atribuição mais precoce de desejo ao outro sem o uso do verbo quer
(A Ana Beatriz tá triste porque ela tem um gosto esquisito... É porque ela tá com vontade de
chorar.);
- aos 3a5m, apresentou sua primeira manifestação de compreensão de crença na terceira
coleta, ao explicar para o amigo o que é mentir (Mentir é fingir uma coisa).
- aos 3a11m, apresentou manifestações de caráter e crença (Ela é malvada; ...porque ela
falava mentira).
- apresentou locuções com atribuições de estados mentais ao outro nas quatro coletas.
Neste caso, os dois conjuntos de resultados (manifestações verbais e desempenho em
tarefas) apontaram para a mesma direção e mostraram que os sinais dessa compreensão nas
tarefas foram tardios em relação aos sinais encontrados nas manifestações verbais.
Esse conjunto de resultados forneceu uma base para sustentar a hipótese
desenvolvimental e permitiu supor que a criança nº 48 apresentou essa compreensão mais
precocemente em relação às demais crianças com quem foi comparada.
Síntese
Na análise intra-individual das dez crianças escolhidas, os resultados mostraram
comportamentos que podem ser agrupados sob algumas classificações. Esses resultados serão
apresentados a seguir, na busca de discutir aspectos que possam permitir generalizações.
As atribuições mais precoces foram encontradas em diferentes crianças. As
atribuições de desejo, emoção e caráter ocorreram em idades muito próximas (aos 2a7m, aos
121
2a5m e aos 2a6m) e a atribuição de crença surgiu mais tardiamente em relação às anteriores,
aos 3a2m.
Esses resultados permitiram concluir que a compreensão dos estados de crença foi
mais tardia em relação às demais e, portanto, concordam com a literatura. Porém, não
concordam com os autores que defendem uma hierarquia nesse desenvolvimento em relação
à compreensão dos estados de desejo e emoção, que, neste trabalho, apareceram praticamente
no mesmo período.
Além disso, foi possível concluir que a precocidade na atribuição de um tipo de
estado mental não significa um desenvolvimento melhor ou mais precoce de todos os outros.
Comparando os dois conjuntos de dados dessas dez crianças (desempenho em tarefas
e manifestações verbais) foi possível observar que em nenhum caso foram encontradas
contradições entre eles: desempenho em tarefas e manifestações verbais se complementaram
e se apoiaram mutuamente nas explicações sobre o desenvolvimento da compreensão de
estados mentais pelas crianças.
122
Conclusões e Considerações Finais
A revisão da literatura realizada para esta pesquisa apresentou estudos a respeito da
existência de uma relação entre a habilidade de atribuição de estados mentais e
desenvolvimento da linguagem vista sob aspectos distintos. Diferentes autores realizaram
pesquisas que evidenciaram que no segundo ano de vida começam a aparecer, na fala das
crianças, palavras que se referem a ações mentais. Essas palavras aparecem nas conversações
cotidianas das quais as crianças participam e, principalmente, nas conversas que ocorrem em
contextos de brincadeiras de faz-de-conta.
Outros estudos, também apresentados nesta revisão, dão indícios de que as crianças
apresentam bom desempenho em tarefas que avaliam a compreensão de estados mentais no
início do quarto ano de vida.
Tomando essas duas perspectivas, a literatura vem apontando, por um lado, a
necessidade de mais trabalhos que verifiquem como as crianças mudam suas manifestações
verbais relativas a estados mentais com o avanço da idade; e, por outro, a importância de
olhar melhor como as crianças respondem a tarefas que avaliem sua compreensão sobre
estados mentais em diferentes momentos de seu desenvolvimento.
No cenário internacional, é possível encontrar estudos que apresentam fortes indícios
de que as crianças muito novas são capazes de falar sobre desejos, emoções e crenças
(Harris, 1996). Trabalhos como os de Barstch e Wellman (1995) e Shatz, Wellman e Silber
(1983) investigam o período de aquisição de termos mentais pelas crianças.
No Brasil, foram encontradas três pesquisas que investigaram as manifestações
verbais das crianças (Alves, 2003; Scheuer, 1996; Sperb & Conti, 1998). Contudo, não foram
encontrados estudos brasileiros que buscassem investigar possíveis relações entre o uso de
termos mentais na fala e o desempenho das mesmas crianças em tarefas, ou que
pesquisassem a freqüência ou período de surgimento de termos mentais na fala da criança.
Assim, vê-se a necessidade de novos trabalhos que estudem outras questões
específicas sobre a aquisição de alguns desses termos mentais. Souza (2006) aponta, como
exemplo, a importância de investigar particularmente quando os verbos saber e pensar
aparecem no vocabulário das crianças brasileiras, uma vez que há duas traduções possíveis
para o verbo know (saber ou conhecer) e think (pensar ou achar). Segundo a autora, esses
dados poderiam contribuir para um melhor entendimento sobre como o desenvolvimento de
uma compreensão de estados mentais, e possivelmente, de uma teoria da mente em crianças
123
brasileiras é afetado por essa característica da língua portuguesa: haver dois termos distintos
para marcar os diferentes usos do think e do know. As crianças apresentariam mudanças em
seu desenvolvimento em relação às crianças falantes do inglês, em função dessa diferença?
Aponta-se, portanto, a necessidade de olhar para esses e outros termos comuns no
português do Brasil, como os verbos querer e gostar, relativos a estados de desejo e de
emoção. Somente um olhar mais acurado para o uso desses verbos nas manifestações orais
das crianças em situações espontâneas pode permitir traçar uma comparação entre crianças
brasileiras e crianças falantes de outras línguas (como o inglês).
8
Outro aspecto que merece destaque é a escassez de estudos de tipo longitudinal, que
acompanhem o mesmo grupo de crianças num certo tempo, em relação ao desenvolvimento
dessas habilidades. No Brasil, nenhum estudo com esse enfoque foi encontrado.
Diante desse quadro, esta pesquisa teve por objetivo verificar, em crianças brasileiras
de 2 a 4 anos, como aparece o uso de termos mentais em conversas espontâneas com outras
crianças, além de avaliar a habilidade de atribuição de estados mentais ao outro, por meio da
aplicação de tarefas. Todas as crianças deste estudo foram acompanhadas ao longo de 18
meses e vistas sob esses dois aspectos.
Estudar sobre como e quando as crianças pequenas desenvolvem uma compreensão
da mente do outro tem o propósito de compreender como elas regulam suas interações com
as pessoas de seu convívio para coordenar o seu comportamento e atribuir sentido ao
comportamento social e à comunicação verbal dos outros.
Esta questão se reveste de importância, tanto teórica quanto prática, e pode oferecer
relevante contribuição para a educação, pois esse conhecimento poderá contribuir para a
discussão e o avanço do saber sobre o papel da linguagem no desenvolvimento de uma teoria
da mente em crianças. De igual modo, dar origem e sustentação a práticas que possam ser
realizadas em contextos educacionais, familiares ou escolares, facilitadoras do processo de
socialização e aprendizagem escolar.
Este trabalho perguntou como se manifesta e evolui a capacidade de compreensão de
estados mentais nos primeiros anos de vida.
8
Bruner (2001) lembra que na linguagem cotidiana pouco se fala sobre termos mentais, como pensar,
acreditar e lembrar. O que se verifica é que esses termos passam o tempo todo despercebidos, sendo utilizados
somente em algumas situações. “Usar estas palavras requer que a criança entenda não apenas as palavras, mas
sua contextualização na sociedade ao seu redor (p.108)”. Então, como se daria a aquisição desses termos pelas
crianças brasileiras?
124
Os resultados encontrados no presente estudo apontam que nas manifestações de desejo, o
verbo querer foi o mais utilizado pelas crianças. Porém, em muitas circunstâncias e em
diferentes idades ele não foi usado para atribuir desejo ao outro, mas como forma de
constatar ou confirmar uma asserção; solicitar algo; convidar ou propor uma ação; protestar
ou direcionar a interação; perguntar ou averiguar. A primeira ocorrência do uso do verbo
querer se deu aos 2a5m por meio de uma locução que expressou uma constatação (Ela não
quer. Você não quer?). Foi seguida, aos 2a9m por uma locução que expressou uma proposta
(Quer trocar?).
Esses achados estão de acordo com o argumento de Harris (1996) de que, por volta
dos dois anos, as crianças começam a produzir palavras referentes a estados mentais: para o
autor, quase todas as crianças nessa idade referem estados de volição (eu quero). Neste
estudo, outros termos foram utilizados na atribuição de desejos, porém com ocorrência mais
tardia e menor freqüência em relação ao verbo querer, que expressou atribuição de desejo ao
outro a partir dos 2a10m.
Harris ainda aponta que um número menor de crianças, mas ainda a maioria, referem
estados de emoção (triste, feliz, bravo, contente, assustado, com medo) dos dois aos três
anos. Os resultados deste trabalho novamente concordam com Harris (1996), pois apontaram
que nas manifestações de emoção, o substantivo medo foi o mais utilizado pelas crianças e os
adjetivos feliz, triste, contente começaram a aparecer no final do segundo ano de vida.
Em relação à aquisição das palavras que se referem a termos mentais de crença, os
resultados mostraram que o verbo saber foi o mais utilizado pelas crianças, além de ter sido o
que apareceu mais precocemente, aos 2a11m, na fala de duas crianças sem expressar
atribuição ao outro (Ninguém vai saber! ... vocês nem vão saberem! e Ela sabia do lobo); aos
3a2m encontrou-se a evidência mais precoce do uso do verbo saber como atribuição de
crença ao outro (A Chapeuzinho sabia
do lobo). Pensar, conhecer, mentir e enganar também
foram verbos muito freqüentes neste estudo, a primeira ocorrência do verbo pensar se deu
aos 3a7m (Ele pensa
que tá aqui, mas tá aqui, ó...). Foram utilizados um total de dez verbos
mentais, três substantivos e um adjetivo, com apenas uma ocorrência.
Esta pesquisa se junta, portanto, aos trabalhos da área com achados que vão na
mesma direção dos encontrados com Bartsch e Wellman (1995) e Harris (1996). Contribuem,
dessa forma, na busca de respostas à questão apresentada por Souza (2006) sobre quando
palavras como saber e pensar surgiriam no vocabulário das crianças brasileiras. Em relação a
essa questão, foram encontrados indícios de diferenças quanto à freqüência e época de
aquisição entre os verbos saber e conhecer, e entre achar e pensar.
125
Por um lado, esses resultados também estão de acordo com Shatz, Wellman e Silber
(1983), que encontraram que verbos mentais como saber e pensar obtém espaço na fala das
crianças durante o terceiro ano de vida. Nesse estudo, os autores também encontraram uma
variedade de termos mentais usados pelas crianças como os que foram utilizados nesse
estudo (esquecer, lembrar, achar).
Por outro lado, este estudo não concorda com Bartsch e Wellman (1995), Harris
(1996) e Shatz, Wellman e Silber (1983), quando apontam que as crianças, durante o terceiro
ano de vida, provavelmente os utilizam sem que os compreendam. Os resultados desta
pesquisa fornecem evidências de que as crianças compreendem as atribuições que fazem
usando os verbos saber, pensar, conhecer: os resultados apresentaram várias evidências da
habilidade das crianças para atribuir uma crença ao outro dos três aos quatro anos, com
predominância das que ocorreram a partir dos 3a7m.
Harris (1996) apontou que, cerca de um terço das crianças entre dois e três anos,
referem estados cognitivos como esqueci, sei, lembrei, acho (no sentido de penso). Não
encontramos esse resultado. O número de crianças que utilizaram esses termos, mesmo
referindo-se a si mesmas, foi muito pequeno antes dos três anos.
Esse último resultado remete a um aspecto importante a ser observado nesse
desenvolvimento: as referências aos próprios estados mentais são mais freqüentes que as
referências aos estados mentais dos outros - sejam eles volitivos, emotivos ou cognitivos.
A defasagem entre essas duas referências corrobora a argumentação de serem as
crianças conscientes de seus próprios estados mentais inicialmente e, só então, interpretar o
comportamento dos outros projetando sobre eles os seus próprios estados mentais (Harris,
1996). Assim, segundo o autor, as expressões verbais emitidas pelas crianças podem
proporcionar demonstrações de sua apropriação dos estados mentais e, mais ainda, quando a
criança passa a falar explicitamente dos estados mentais, justificando as ações alheias em
função desse conhecimento, obtém-se demonstrações convincentes da consciência dos
estados mentais pelas crianças. Nesse sentido, Alves (2003) apresentou resultados que
apontam que crianças entre 2a6m e 3a6m referem-se aos próprios estados mentais quando
utilizam termos mentais.
Jenkins e Astington (2000) encontraram, na fala de crianças de 3 a 4 anos, locuções
que chamaram de proposições conjuntas: expressões que apresentavam referências
simultâneas ao outro e a si próprio (em pronomes separados) numa mesma fala, ou
referências a si próprio e ao outro realizadas pelo uso de pronome na primeira pessoa do
plural como “we, us, our”.
126
Este trabalho concorda com Harris (1996), Alves (2003) e Jenkins e Astington
(2000), pois encontrou evidências nas quais as crianças envolviam os colegas nas atribuições
que faziam a si mesmos (A gente quer sentar naquela cadeira!). Inicialmente as crianças
referiam-se aos próprios estados mentais, depois incluíam os colegas estendendo seu próprio
estado mental ao outro. Em alguns casos não foi possível afirmar se a criança atribuiu uma
crença ao outro ou confundiu suas próprias crenças com as do amigo nessa extensão. Isto é,
algumas locuções não permitiram concluir se a criança estendeu sua própria crença ao grupo
ou se, de fato, atribuiu ao outro uma crença que, coincidentemente, era igual a sua (A gente
não sabe
a história!).
Neste estudo foram, portanto, encontradas evidências de que no segundo ano de vida
as crianças já são capazes de atribuir estados de desejo e emoção ao outro e que, entre três e
quatro anos, as crianças têm condições de atribuir crença ao outro (personagem da história ou
colega na atividade).
Ressalta-se que este trabalho procurou criar condições propícias para que as crianças
emitissem manifestações que pudessem remeter a estados mentais. Harris (2005) discute que
há duas condições facilitadoras para a compreensão das crianças sobre a mente: a
participação em conversações cotidianas e no jogo simbólico. Para o autor, as crianças usam
a linguagem para conseguir bons efeitos enquanto brincam de faz-de-conta. Elas podem fazer
sugestões ou dirigir a brincadeira falando sobre os estados mentais dos personagens quando
não assumem um ‘papel’ no jogo. Podem ainda participar ativamente da brincadeira ao
incorporar um dos papéis e dar voz ao personagem, o que as levará a explicitar os estados
mentais do personagem que representam (Harris, 2005).
Assim, quanto a questão de saber a quem as crianças atribuíram as crenças, os
resultados apontaram um número mais expressivo de atribuições aos personagens: as outras
atribuições foram dirigidas aos colegas na atividade, em sua maioria evidenciando a tentativa
de dirigir a brincadeira, como apontado por Harris. No caso da crença, apenas duas
atribuições voltaram-se às mães das próprias crianças responsáveis pelas atribuições, em
contextos alheios ao jogo de faz-de-conta que transcorria. Assim, concordamos com o autor
(Harris, 1996; 2005) quando aponta que a capacidade de fazer de conta permite à criança que
escape à realidade de um modo funcional e que seja receptiva às realidades que outras
pessoas acolhem. Assim, as atividades envolvendo o faz-de-conta forneceram “uma chave
que destranca a mente de outras pessoas e permite que a criança entre, por um certo tempo,
em seus planos, esperanças e medos.” (Harris, 1996: 50)
127
Esses resultados apontam para a mesma direção dos apresentados por outros trabalhos
realizados no Brasil (Dias, 1992a, 1992b; Sperb & Conti, 1998) e no cenário internacional
(Dunn, 1988; Jenkins e Astington, 2000; Slomkowski e Dunn, 1996), quando afirmam que
brincaderia de faz-de-conta e teoria da mente relacionam-se de modo complexo e
interdependente.
Quanto às mudanças qualitativas nas locuções que expressaram compreensão de
estados mentais, os resultados desse estudo mostraram mudanças nas manifestações de
desejo, emoção e crença. A partir das manifestações mais precoces, observou-se uma
mudança gradativa nas locuções que passaram a apresentar relações causais envolvendo os
estados mentais. A época em que começaram a aparecer as evidências das mudanças no grau
de elaboração das locuções não é a mesma para os diferentes estados mentais a que se
referem: os sinais de mudanças começam a aparecer aos 2a11m nas locuções que referem
desejo, aos 3a5m no caso das emoções e aos 3a5m nas que referem crença.
Estes achados estão de acordo com Bartsch e Wellman (1995) que apontaram que as
crianças adquirem palavras referentes a desejos (querer, desejar) antes de palavras que se
referem a crenças (saber, pensar). Segundo esses autores, as crianças começam a conversar
sobre pensamentos e crenças entre os 3 e 4 anos e, em seguida, são capazes de estabelecer
relações entre esses pensamentos e crenças. Assim, as crianças ampliariam sua compreensão
da mente e do comportamento humano o que contribuiria para a construção de uma teoria da
mente. Harris (1996) corrobora essa posição quando afirma que “pode-se creditar às
crianças uma compreensão como que teórica da mente. Elas explicam e prevêem o
comportamento e a emoção das pessoas por meio da consideração das relações existentes
entre conceitos tais como crenças e desejos. Não se limitam a detectar associações empíricas
entre situações e reações. Mas, para evocar tais conceitos, a criança não precisa postular
entidades não observáveis. As crianças pequenas possuem crenças e desejos, e são capazes
de declará-los. Sua compreensão da psicologia baseia-se em sua própria experiência, e não
numa dedução feita a partir de um conjunto de postulados teóricos.” (p.75)
Vários estudos investigaram essas diferenças por meio da aplicação de tarefas. Em
sua meta-análise Wellman e Liu (2004) concluíram que primeiro as crianças percebem que as
pessoas podem ter diferentes crenças sobre um objeto ou fato e, só depois, passam a perceber
que alguém pode ter uma crença falsa sobre dada situação.
Este estudo também procurou investigar se haveria diferença nas atribuições feitas
pelas crianças em relação ao tipo de crença atribuída (falsa ou verdadeira), ou que outras
manifestações poderiam ser encontradas. Os resultados mostraram que a maior freqüência
128
das manifestações referiu atribuições de crenças falsas ao outro, porém as crianças atribuíram
crenças verdadeiras mais precocemente. Foram também encontradas manifestações de
atribuição ao outro pelo desconhecimento de fatos.
No que se refere ao desempenho das crianças nas tarefas, o objetivo deste estudo foi
investigar se haveria diferentes ‘perfis de desenvolvimento’ no conjunto de crianças
estudadas que se revelariam ao longo do estudo. Foi possível conhecer e analisar diferenças
em relação ao momento de surgimento das habilidades em crianças distintas e observar como
se deu seu desenvolvimento a partir do desempenho nas tarefas nas quatro coletas, nos
intervalos de seis meses.
Além disso, seria também possível levantar questões a respeito das possíveis
convergências ou contradições entre os dois conjuntos de resultados (manifestações verbais e
desempenho em tarefas).
A análise fatorial foi feita a partir da normalização dos dados e apresentou duas
formas de distribuição das crianças em clusters. Ambas apontaram para a influência da idade
no desempenho das crianças, o que dá suporte a hipótese desenvolvimental.
Mas, a divisão em sete clusters, permitiu observar dentre os agrupamentos das
crianças, os que forneceram indícios de que alguns participantes se desenvolveram mais
precocemente em relação a esta compreensão do que outros. Algumas crianças, com idade
menor, apresentaram desempenho melhor (isto é, pontuação mais alta nas tarefas) quando
comparadas a crianças mais velhas. Esse resultado permitiu confirmar a hipótese de que
outras variáveis, além da idade, teriam exercido influência no desempenho dessas crianças.
Esses achados estão de acordo com o argumento de diferentes autores (Dias, 1993;
Dias, Soares & Sá, 1994; Jenkins & Astington, 1996; Slomkowski & Dunn, 1996) de que
diferentes variáveis influenciam no desenvolvimento da capacidade de atribuição de estados
mentais das crianças. Neste estudo, também foram encontradas crianças cujo desempenho
apresentou ‘saltos’ em diferentes idades, o que corrobora essa posição.
Pelo menos cinco perfis diferentes foram encontrados, lembrando-se que se trata de
crianças que vivem em circunstâncias familiares muito próximas e que têm as mesmas
condições de escolarização.
Sete crianças compuseram um cluster que se caracterizou por terem, todas elas,
obtido nota zero no início do estudo, seguido de um salto em suas médias na segunda coleta,
e manutenção dessas médias até o fim do estudo. Nesse grupo foram encontradas evidências
que permitem concluir que não houve influência da idade no desempenho dos participantes.
129
Dezenove crianças que constituem outros dois clusters apresentam comportamentos
parecidos em relação à regularidade que demonstraram no avanço de seu desempenho. A
diferença entre eles foram seus pontos de partida e de chegada, e os dados permitiram supor
que houve influência da idade do desempenho de cada grupo. Portanto, as nove crianças do
primeiro desses grupos apresentaram o mesmo perfil de desenvolvimento das dez que
formaram o outro cluster.
As crianças de outros dois clusters também se mostraram como semelhantes em seus
comportamentos. As onze crianças de um cluster apresentaram, ao longo do estudo, um
aumento em seu desempenho com uma pequena queda da segunda para a terceira coleta, mas
com uma recuperação na quarta coleta. Outras nove crianças que formaram outro cluster,
também apresentaram a mesma variação em seu desempenho com o tempo. Nesse caso, as
diferenças encontradas entre as crianças desses dois clusters, nas médias de cada coleta,
puderam ser atribuídas às diferenças de idade. Dessa forma, foi possível concluir que esses
dois clusters apresentam o mesmo perfil de desenvolvimento.
Um grupo de seis crianças se diferenciou por ter apresentado o maior salto de
desempenho em todo o conjunto de participantes, comparando-se os resultados do início com
os do fim do estudo. As crianças deste cluster apresentaram um salto de desempenho da
segunda para a terceira coleta. Os resultados apontaram que a variação da idade pode ter
influenciado nas médias.
Outras seis crianças formaram um último cluster. Elas apresentaram, já na primeira
coleta, médias altas. Porém, com uma queda na segunda coleta, uma nova alta das médias na
terceira coleta e, na última coleta, com maior dispersão das médias de desempenho.
Apresenta, portanto, uma variação em seu desempenho ao longo do estudo, sem indícios que
pudessem atribuir esses resultados à variabilidade da idade. Assim, as crianças deste cluster
constituíram outro perfil de desenvolvimento.
Uma questão que pareceu merecer uma investigação mais cuidadosa é que, dentre as
doze crianças que formaram esses dois últimos clusters, dez são filhas únicas. Além disso,
essas duas crianças que não são filhos únicos compõem um casal de gêmeos que foram
incluídos em clusters diferentes pela análise fatorial. Jenkins e Astington (1996) estudaram a
influência da estrutura familiar no desenvolvimento da teoria da mente e encontraram que há
relação entre o desempenho das crianças nas tarefas de crença falsa e o número de irmãos.
Para os autores, esse resultado sugere que a teoria da mente das crianças é mais que uma
habilidade lingüística e outras variáveis devem ser investigadas. Assim, aponta-se a
130
importância da realização de mais estudos no Brasil sobre a influência de diferentes fatores
na constituição da teoria da mente.
Em relação ao período em que as crianças apresentaram respostas corretas às tarefas,
os dados apontaram que, nessas crianças, a compreensão dos desejos precedeu a
compreensão de estados de crença. Esses resultados estão de acordo com os de outros autores
(Astington & Gopnik, 1991; Wellman & Bartsch, 1988; Wellman & Liu, 2004) que afirmam
que a compreensão de estados de crença é mais tardia em relação a desejos e emoções.
Em especial, as crianças de um dos clusters merecem ser observadas, pois
apresentaram o maior salto de desempenho em todo o grupo de participantes, comparando-se
os resultados da primeira e da última coleta. Este cluster constituiu-se de crianças, em média,
mais novas do que as de outros e que atingem o mesmo desempenho no final do estudo. Cabe
perguntar o que teria impulsionado esse desenvolvimento nesse grupo de crianças.
Neste estudo, portanto, foram encontrados diferentes perfis de desenvolvimento, o que
oferece suporte às correntes que defendem que não se deve olhar para o desenvolvimento da
compreensão dos estados mentais como se sua progressão pudesse ser considerada
puramente como uma progressão linear. Bartsch e Wellman (1988) e Wellman e Liu (2004)
apontaram que a maior contribuição de suas pesquisas, que envolviam uma variação de
tarefas destinadas a avaliar diferentes habilidades para a compreensão de estados mentais, é
mais descritiva que explicativa, confirmando que a compreensão de uma teoria da mente
representa um extenso e progressivo conjunto de aquisições conceituais e que nenhum tipo
de tarefa, isoladamente, pode capturar de forma adequada essa progressão desenvolvimental.
Os autores afirmam ainda que nenhuma explicação teórica para o desenvolvimento dessa
compreensão será adequada se não considerar as aquisições variadas e seqüenciais no curso
do desenvolvimento.
Durante todo o estudo, aceitou-se a hipótese de que o desenvolvimento da teoria da
mente em crianças pequenas poderia ser evidenciado por meio de expressões verbais e de
resultados em tarefas de crença falsa. Este estudo buscou olhar para as expressões verbais e
as tarefas de crença e falsa crença a fim de considerá-los conjuntamente ao longo do tempo.
Foram feitas análises intra-individuais de algumas crianças, com o intuito de observar se os
dados provenientes dos dois procedimentos estariam ou não na mesma direção. As análises
permitiram sustentar a hipótese da existência de associações entre esses dois constructos.
Na análise intra-individual das dez crianças escolhidas, os critérios de escolha das
crianças para essa análise foram determinados por cortes de desempenhos extremos: foram
131
escolhidas as crianças com as mais altas e mais baixas pontuações nas tarefas; crianças que
apresentaram as atribuições de estados mentais mais precoces; crianças que não apresentaram
atribuições de estados mentais; crianças que apresentaram indícios de compreensão de crença
na primeira coleta.
Os resultados mostraram comportamentos que podem ser agrupados sob algumas
classificações e foram organizados de modo a discutir aspectos que permitam generalizações
a partir dessas análises individuais.
As atribuições mais precoces foram encontradas em diferentes crianças. As
atribuições de desejo, emoção e caráter ocorreram em idades muito próximas (aos 2a7m, aos
2a5m e aos 2a6m) e a atribuição de crença surgiu mais tardiamente em relação às anteriores,
aos 3a2m. Esses resultados permitiram concluir que a compreensão dos estados de crença foi
mais tardia em relação às demais e, portanto, concordam com a literatura. Porém, não
concordam com os autores que defendem uma hierarquia nesse desenvolvimento em relação
à compreensão dos estados de desejo e emoção, que, neste trabalho, apareceram praticamente
no mesmo período. Além disso, é possível concluir que a precocidade na atribuição de um
tipo de estado mental (emoção, desejo ou crença) não significa um desenvolvimento melhor
ou mais precoce de todos os outros.
Comparando os dois conjuntos de dados das dez crianças analisadas individualmente
(desempenho em tarefas e manifestações verbais), foi possível observar que em nenhum caso
foram encontradas contradições entre eles: desempenho em tarefas e manifestações verbais
se complementaram e se apoiaram mutuamente nas explicações sobre o desenvolvimento da
compreensão de estados mentais pelas crianças.
Antes de encerrarmos este trabalho, algumas considerações de caráter metodológico
devem ser feitas.
A primeira delas diz respeito à possível influência das histórias contadas às crianças,
sobre a qualidade e quantidade de manifestações verbais. Nos procedimentos de coleta foram
apontados os critérios para a escolha das histórias: deveriam ter quatro personagens e fazer
parte do repertório infantil. Tanto que as próprias professoras das crianças que participaram
do estudo colaboraram opinando na escolha das histórias. Assim, mesmo garantindo-se que
todas as histórias eram conhecidas igualmente pelas crianças, não foram consideradas as
diferenças na ênfase emocional de cada enredo. Foi possível observar que Cachinhos
132
Dourados talvez não tenha sido uma escolha tão boa como as demais histórias, uma vez que
não havia a mesma intensidade nas emoções dos personagens.
Além desse aspecto, há que se considerar a influência das palavras usadas no texto da
história contada às crianças, conforme apontado na análise. Anotamos indícios de que isso
tenha ocorrido com a palavra desejo ao menos em um dos participantes do estudo, como
repetição exata da fala do personagem. Porém, em relação à emissão de outras locuções de
desejo ou à emissão de locuções de crença ou emoção, os resultados não permitiram concluir
pela influência do texto das histórias contadas às crianças na atribuição de crença ou emoção
ao outro. De qualquer modo, esse é um importante cuidado que deve ser observado em
futuros trabalhos.
Como conclusão sublinha-se aqui a importância para a educação do favorecimento da
habilidade de atribuição de estados mentais nas crianças (Deleau, Maluf & Panciera, no
prelo). O estudo sobre como e quando as crianças desenvolvem uma compreensão da mente
das outras pessoas permite compreender como elas regulam suas interações com seus
semelhantes, especialmente pelo uso da fala, para coordenar seu comportamento e fornecer
sentido ao comportamento social e à comunicação verbal com os outros, designando seus
desejos e intenções.
Portanto, conhecer a forma como as crianças compreendem e adquirem noções sobre
estados mentais ganha importância para a educação, pois esse conhecimento poderá
contribuir para que o educador possa se dedicar a elaboração de estratégias facilitadoras do
processo de socialização e aprendizagem escolar.
Estudos naturalísticos e longitudinais representam um grande desafio para
pesquisadores num país como o Brasil, dadas suas exigências não somente em termos da
complexidade de seu procedimento, como também economia de tempo. Foi tentativa deste
trabalho, oferecer uma pequena contribuição nessa direção, nos limites das condições
encontradas para sua consecução. Considera-se importante que outros estudos que
acompanhem as crianças ao longo do tempo de aquisição da compreensão de estados mentais
sejam realizados, para que seja possível contar com um número maior de evidências que
permitam ampliar o quadro atual de conhecimentos na área.
Finalizando, considera-se que o presente estudo oferece suporte às correntes teóricas
que sustentam que o contexto conversacional no qual a criança está inserida tem importância
crucial para seu desenvolvimento cognitivo, no que se refere ao desenvolvimento da
133
representação de estados mentais em geral e, em especial, da representação de crenças. Há
ambientes familiares e escolares mais apropriados para esse tipo específico de estimulação da
criança, ricos em conversas que engajam a criança em uma troca de pontos de vista e
explicam o comportamento das pessoas em função de termos mentais. Há também atividades
escolares que podem ser planejadas a fim de propiciar esse desenvolvimento: ampliar as
possibilidades da vivência pelas crianças de brincadeiras de faz-de-conta, por exemplo, já
seria uma grande contribuição que as escolas de educação infantil poderiam oferecer. É nesse
contexto que as instituições de educação infantil revestem-se de um importante valor social
para a aprendizagem e o desempenho das crianças nos seus primeiros anos de vida.
134
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140
Anexo 1
Histórias contadas para as crianças no início das sessões lúdicas nas quatro coletas:
texto integral das versões utilizadas.
1. Primeira coleta: Os três porquinhos
Era uma vez três porquinhos que viviam felizes com a sua mãe. Certo dia os três
resolveram sair da casa de sua mãe para construir cada qual sua própria casa.
O mais novo achou que seria mais fácil e prático construir sua casinha com palha.
Assim que terminou de fazer sua casinha de palha, apareceu o lobo gritando:
- Abra a porta e me deixe entrar!
O porquinho ficou com muito medo e não abriu. O lobo ficou furioso e resolveu
derrubar a casinha de palha. Então, assoprou, assoprou e a palha voou. A casa desmoronou.
O porquinho mais que depressa fugiu para a cada do seu irmão.
O segundo porquinho resolveu construir a sua casinha de madeira. Quando ficou
pronta, o lobo apareceu gritando:
- Abra a porta e me deixe entrar!
O segundo porquinho também não abriu. O lobo furioso assoprou, assoprou, e a
casinha de madeira também desabou.
O porquinho apavorado fugiu em disparada para a casa do irmão mais velho.
O porquinho mais velho, por sua vez, resolveu construir sua casa com tijolos. Ele
sabia que o lobo andava pela floresta. Assim que o porquinho mais velho terminou sua casa,
os seus irmãos vieram correndo se abrigar nela.
Em seguida apareceu o lobo gritando:
- Abra a porta e me deixe entrar!
O porquinho mais velho não abriu. O lobo, mais que depressa, assoprou, assoprou,
mas, para seu espanto, a casa não caiu. O lobo então resolveu subir no telhado e entrar pela
chaminé.
O porquinho percebendo a esperteza do lobo, resolveu esquentar um caldeirão de
água. Quando o lobo desceu pela chaminé, caiu dentro de um grande caldeirão de água
fervendo.
141
O lobo quase morreu, mas conseguiu sair. Deste dia em diante o lobo tinha medo até
de água fria. Nunca mais o lobo perturbou os porquinhos e eles viveram felizes na casinha de
tijolos.
2. Segunda coleta: Cachinhos Dourados
Era uma vez uma linda menina chamada Cachinhos Dourados. Ela era muito curiosa,
costumava mexer em tudo que via pela frente. Um certo dia, a menina passeava pelo bosque,
quando avistou uma bela casinha.
- Nossa, que casinha linda! – disse a menina, que já foi entrando porta adentro.
Assim que entrou, percebeu que algo lhe chamou a atenção. Alguns objetos eram
muito grandes, enquanto outros eram médios ou ainda pequeninos, como ela.
Como tinha a mania de olhar e mexer em tudo, a menina foi à sala, onde encontrou
novas surpresas:
- Por que há uma cadeira grande, uma média e uma pequena? – indagou a curiosa.
Primeiro, Cachinhos Dourados sentou na cadeira grande, mas não alcançou o pé no
chão. Depois, sentou na cadeira média, mas não conseguiu balançá-la. Ainda descontente,
sentou na cadeira pequenininha:
- Desta eu gostei! – exclamou a menina, que de tanto mexer na cadeirinha, quebrou
a coitadinha.
Chegando na cozinha, Cachinhos Dourados encontrou três pratos cheios de mingau de
mel.
- Oba, comida! Este passeio está me deixando com uma fome...
A menina provou o mingau do prato maior, mas desistiu de comê-lo porque estava
muito quente. Então experimentou o mingau do prato médio, que ela achou muito frio. Por
fim, provou do prato pequenininho, que estava do jeitinho que ela queria. Então, ela comeu
todo aquele delicioso mingau.
Depois de encher a barriguinha, a pequena curiosa decidiu:
- Vou procurar o quarto para descansar um pouquinho. – então ela subiu as escadas e
foi ao quarto.
- Que legal! Tem uma cama grande, uma pequena e uma nem grande, nem
pequena!
142
Primeiro, tentou dormir na cama maior, mas nessa, ela nem conseguiu subir. Então,
ela tentou subir na cama média, mas não gostou muito.
- Vou dormir na cama pequenina. – resolveu a menina.
Quando o Papai Urso, a Mamãe Urso e o seu filhinho chegaram em casa, uma
desagradável surpresa os esperava:
- Quem fez esta bagunça? – reclamou a Mamãe Urso, que gostava de tudo bem
arrumadinho.
- Alguém entrou aqui e mexeu em tudo. – afirmou o Papai.
- E quebraram minha cadeira! – choramingou o pequeno ursinho.
Chegando à cozinha, a família percebeu que alguém havia comido o mingau:
- No meu prato deram algumas colheradas. – disse o Papai.
- Comeram a metade do meu mingau. – afirmou a Mamãe.
- E do meu... Não deixaram nadinha. – lamentou o filhote.
Quando subiram as escadas e foram ao quarto, mais surpresas:
- A minha cama está desarrumada! – reclamou o Papai Urso.
- Assim como a minha, alguém deitou nela. – emendou a Mamãe.
- Silêncio! Na minha cama há uma garotinha, que ainda está dormindo. – observou
o ursinho.
Cachinhos Dourados despertou com aquele falatório e, assustada, saiu em disparada.
Ela nem ao menos se desculpou pelas travessuras ou agradeceu pela comida. Mas de uma
coisa sabemos, a pequena menina aprendeu a lição e deixou de ser tão curiosa.
3. Terceira coleta: Chapeuzinho Vermelho
Era uma vez uma linda menina chamada Chapeuzinho Vermelho. Seu nome era esse
porque sua mãe havia feito para ela um capuz vermelho.
Um certo dia sua mãe preparou alguns doces e pediu a Chapeuzinho Vermelho para
levá-los à avó, que morava do outro lado do bosque. A avó de Chapeuzinho Vermelho estava
um pouco doente. Sua mãe avisou-lhe:
- Não pare e nem converse com estranhos no caminho. É muito perigoso!
143
Quando, muito feliz, atravessava o bosque, a menina encontrou o lobo. O lobo teve
vontade de comê-la, mas não teve coragem porque havia caçadores por perto. O lobo
perguntou a Chapeuzinho Vermelho:
- Para onde vai a linda menina?
A menina com toda inocência respondeu:
- Vou visitar minha avó que está doente e levar estes deliciosos docinhos para ela.
Chapeuzinho não sabia que era perigoso conversar com o lobo, e disse-lhe:
- A casa de minha avó é a primeira depois do bosque.
O lobo fazendo-se de bonzinho falou:
- Se quiser acompanho você à casa de sua avó!
Chapeuzinho agradeceu e não aceitou.
O lobo pegou outro caminho e foi mais que depressa para a casa da avó de
Chapeuzinho Vermelho. Chegando bateu à porta: toc,toc,toc...
- Quem está aí? – perguntou a avó.
- É sua neta Chapeuzinho Vermelho – disse o lobo imitando a voz da menina.
A bondosa avó, que estava adoentada na cama, gritou:
- Puxe a tranca que a porta se abrirá.
O lobo então entrou, avançou sobre a pobre mulher e a devorou. Em seguida se vestiu
com as roupas da avó de Chapeuzinho Vermelho, trancou a porta e se deitou na cama. Ficou
esperando Chapeuzinho Vermelho chegar.
Um pouco depois Chapeuzinho Vermelho chega batendo à porta: toc,toc,toc...
- Quem está aí? – perguntou o lobo com a voz meio grossa.
A menina ouvindo a voz grossa ficou assustada, mas pensou que a avó estivesse
resfriada. Respondeu:
- É a sua neta, Chapeuzinho Vermelho. Vim trazer alguns doces que minha mãe
mandou.
- Puxe a tranca que a porta se abrirá! – gritou o lobo.
A porta se abriu e Chapeuzinho Vermelho entrou. Chapeuzinho Vermelho estranhou e
perguntou:
- Que olhos grandes são esses, vovó?
- É pra te ver melhor.
- Que nariz grande é esse?
- É pra te cheirar melhor.
- Que boca grande é essa?
144
- É pra te comer!
Dizendo estas palavras, o lobo saltou para cima de Chapeuzinho Vermelho, mas ela
conseguiu escapar.
Um caçador escutou os gritos e foi até lá. O lobo ainda tentou fugir, mas o caçador o
matou. O caçador também abriu a barriga do lobo e tirou a vovó de dentro. Depois disto
todos viveram felizes para sempre.
4. Quarta coleta: Rapunzel
Era uma vez um casal que queria muito ter um filho. Por isso os dois ficaram muito
alegres quando souberam que teriam um filho.
Nos fundos da casa do casal, rodeado por um muro alto, havia um lindo jardim com
as mais belas flores e frutas também. Este jardim pertencia a uma feiticeira, por isso ninguém
tinha coragem de entrar ali.
Um dia, a mulher sentiu vontade de comer as mais belas maçãs do jardim da vizinha.
O marido muito amoroso foi colher as maçãs para a esposa. Na hora em que ele começa a
colher as maçãs, aparece a feiticeira e, furiosa, pergunta:
- Como te atreves a entrar em meu jardim e roubar minhas maçãs?
O marido respondeu:
- Tive de vir aqui porque a minha esposa viu da janela as maçãs e sentiu um desejo
muito grande de comê-las.
- Sendo assim, podes pegar quantas maçãs quiseres, porém, em troca, me darás o teu
filho que está para nascer.
O homem ficou tão assustado que aceitou quando sua esposa deu à luz a pequena
menina, a feiticeira veio e a levou. Chamou-a de Rapunzel.
Rapunzel tornou-se a moça mais do mundo com suas longas tranças. Ao completar
doze anos, a feiticeira a prendeu numa torre não tinha escadas nem portas, somente uma
pequena janela no alto.
Cada vez que a feiticeira queria subir ao alto da torre, ela gritava: “Rapunzel, joga
tuas tranças”.
145
Sozinha na torre, Rapunzel cantava lindas músicas. Um certo dia, um príncipe que
caçava na floresta ouviu o canto de Rapunzel. Imitando a voz da feiticeira, ele pediu que
Rapunzel jogasse as tranças.
Ela jogou e assim ele subiu. Vendo a formosura da moça, o príncipe lhe propôs
casamento. Ambos planejaram até a fuga.
Na véspera do dia da fuga, a feiticeira descobriu o plano dos dois. Furiosa, ela cortou
as tranças de Rapunzel e a levou embora. Então esperou pelo príncipe para poder vingar-se.
Quando o príncipe chegou à torre, a feiticeira jogou as tranças e ele subiu. Quando
viu a feiticeira, o príncipe ficou desesperado e pulou da torre. Acabou caindo em cima do
espinheiro e ficou cego.
O príncipe inconformado passou a viver no bosque, comendo frutas e raízes. Um dia,
porém, chegou ao deserto onde Rapunzel vivia. Ouviu o seu belo canto e a reconheceu. Sua
emoção foi tão grande que ele voltou a enxergar.
Finalmente, feliz por ter encontrado o seu amor, o príncipe levou Rapunzel a seu
reino, onde se casaram e viveram felizes para sempre.
146
Anexo 2
Tarefas de atribuição de estados mentais aplicadas neste estudo
As tarefas foram traduzidas do artigo de Wellman e Liu (2004) para o Português-
brasileiro e aplicadas utilizando-se materiais.
Tarefa 1: Diferentes desejos
- Origem: Segundo Wellman e Liu (2004), esta primeira tarefa de sua escala é
derivada das tarefas utilizadas por Wellman e Wooley (1990) e Repacholi e Gopnik (1997).
- Materiais: boneco, milho e pão de plástico.
- Descrição da tarefa
Apresenta-se a criança um boneco que representa um adulto e brinquedos que imitam
pãezinhos e doces, com os dizeres:
“Este é o Seu Adriano. Ele vai fazer um lanche e está escolhendo o que comer. Mas
ele só tem em casa dois tipos diferentes de lanche: pãezinhos ou milho. Que lanche você
acha melhor? Você prefere pãozinho ou millho?” (Questão sobre o desejo da criança).
Se a criança escolhe o milho, diz-se:
“Esta é uma boa escolha, mas seu Adriano prefere o pão. Ele não gosta de milho. O
que ele mais gosta é de pão.” (Caso a criança opte pelo pão, inverte-se a opção do boneco)
Então, pergunta-se à criança:
“Bom... Está na hora do lanche e seu Adriano tem que escolher o que vai comer. Mas
ele só pode escolher um deles. Qual lanche seu Adriano vai escolher? O pão ou o milho?”
A resposta dada pela criança deve apontar para o lanche que difere de seu próprio
lanche preferido para ser considerada correta.
147
Tarefa 2: Diferentes crenças
- Origem: Esta segunda tarefa da escala de Wellman e Liu (2004) foi adaptada do
trabalho de Wellman e Bartsch (1989) e Wellman e outros (1996).
- Materiais: uma casinha de brinquedo com uma cama, uma estante com TV e uma
mesa com duas cadeiras; uma boneca.
- Descrição da tarefa
Apresenta-se à criança uma boneca e a casinha com a seguinte história:
“Esta é Lindinha e ela mora nesta casa. Lindinha tem um gatinho que adora se
esconder. O gato de Lindinha sempre se esconde ou embaixo da cama ou atrás da estante.”
Então, pergunta-se:
“Onde você acha que o gatinho se escondeu: na cama ou na estante?” (Questão
sobre a crença da criança.)
Se a criança escolhe a cama, diz-se:
“Esta é uma boa escolha, mas Lindinha acha que o gatinho se escondeu na estante.”
(Caso a criança opte pela estante, inverte-se a opção da boneca)
Então, pergunta-se à criança:
“Bom... Agora Lindinha vai procurar seu gatinho. Onde Lindinha vai procurar o
gatinho: na cama ou na estante?”
A resposta dada pela criança deve apontar para o lugar que diferente do local
apontado inicialmente para ser considerada correta.
Tarefa 3: Acesso ao conhecimento
- Origem: Terceira tarefa da escala, Wellman e Liu (2004) referem Pratt e Bryant
(1990) e Pillow (1989) como os primeiros a utilizá-la e apontam que foi modificada para que
seu conteúdo se tornasse mais paralelo ao conteúdo das tarefas de falsa crença.
- Materiais: uma caixa com gaveta, um pequeno cachorrinho de brinquedo e uma
boneca.
148
- Descrição da tarefa
Apresenta-se à criança a caixa com a gaveta fechada contendo um cachorrinho e
pergunta-se:
“Aqui temos uma gaveta. O que você acha que há dentro da gaveta?” (Questão sobre
o conhecimento da criança).
Espera-se que a criança dê qualquer resposta ou diga que não sabe o que há na gaveta.
A seguir, abre-se a gaveta apresentado seu conteúdo:
“Vamos ver... Há um cachorrinho dentro da gaveta!”
A seguir, fecha-se a gaveta e pergunta-se:
“Bem... O que há na gaveta?” (Espera-se que a criança responda que há um
cachorrinho)
Apresenta-se, então, uma boneca com os dizeres:
“Polly nunca olhou dentro da gaveta. Ela estava dormindo e agora vem vindo. Polly
não viu dentro da gaveta. Então, Polly sabe o que há na gaveta?”
A resposta considerada correta é “não”.
Finalmente, pergunta-se:
“Polly olhou dentro da gaveta?” (Questão de memória)
Tarefa 4: Conteúdo inesperado
- Origem: Inicialmente usada por Perner, Leekam e Wimmer (1987), a quarta tarefa
da escala de Wellman e Liu (2004), foi frequentemente modificada e utilizada desde sua
primeira publicação.
- Materiais: caixa de toddynho contendo um pequeno ursinho de plástico e um
boneco.
- Descrição da tarefa
Apresenta-se para a criança a caixa de toddynho. A seguir, diz-se:
“Esta é uma caixa de toddynho. O que você acha que tem dentro da caixa?”
A criança pode dar qualquer resposta, inclusive que não sabe. Porém, espera-se que a
criança responda que o que há na caixa é toddynho.
149
A seguir, abre-se a caixa permitindo-se à criança observar que na caixa não há
toddynho e sim um pequeno ursinho de plástico. E confirma-se em voz alta:
“Vamos ver... O que temos dentro da caixa é um ursinho e não toddynho!”
Apresenta-se, então, o problema à criança:
“Meu amigo Pedro vem vindo. Ele não viu o que há dentro dessa caixa de toddynho.
O que você acha que Pedro dirá que há na caixa? Toddynho ou ursinho?”
A resposta considerada correta é “Toddynho”.
Tarefa 5: Falsa crença explícita
- Origem: A quinta tarefa da escala foi obtida da utilizada por Wellman e Bartsch
(1988) e Siegal e Beattie (1991).
- Materiais: um boneco representando um menino, uma mochila e um armário de
brinquedos.
- Descrição da tarefa
Apresenta-se à criança o boneco, a mochila e o armário dizendo:
“Este é o Toninho. O Toninho vai jogar futebol e quer encontrar suas chuteiras. As
chuteiras podem estar na mochila ou no armário. Na verdade, as chuteiras estão na mochila,
mas o Toninho acha que as chuteiras estão no armário.”
Então, pergunta-se à criança:
“Onde o Toninho vai procurar as chuteiras? Na mochila ou no armário?” (questão
de falsa crença).
E, a seguir:
“Onde as chuteiras do Toninho estão na verdade? Na mochila ou no armário?”
(questão de realidade).
Para estar correta a criança deve responder “armário” à questão de falsa crença e
“mochila” à questão de realidade.
150
Tarefa 6: Emoção sobre a crença
- Origem: Esta tarefa foi obtida através do trabalho de Harris e outros (1989) e
assumiu a sexta posição na escala de Wellman e Liu (2004).
- Materiais: uma bonequinha representando uma menina, um tubo de confeitos MM -
bastante conhecidos pelas crianças e claramente identificável por elas – contendo pequenas
contas.
- Descrição da tarefa
O experimentador diz à criança:
“Este é um tubo de MM e esta é Denise. O que você acha que há dentro desse tubo?”
(espera-se que a criança responda “MM”)
Então, o experimentador faz a boneca falar:
“Que bom... eu adoro MM. MM é o chocolate é que eu mais gosto de comer.Agora
vou lá fora brincar!!”
Em seguida, o experimentador coloca a boneca fora do campo de visão da criança,
abre o tubo de MM e mostra à criança seu conteúdo:
“Vamos ver... o que tem no tubo são contas e não MM! Não tem mais nada além de
contas!”
Então, fecha o tubo e pergunta:
“Qual é mesmo o chocolate preferido da Denise?” (espera-se que a criança responda
MM).
O experimentador traz a boneca de volta dizendo:
“Denise nunca olhou dentro desse tubo. Agora Denise vem vindo... Denise está de
volta e quer comer chocolate. Vamos dar este tubo pra Denise. Como a Denise se sente
quando ganha este tubo? Feliz ou triste?” (questão emoção-crença)
O experimentador abre o tubo, faz com que a boneca olhe dentro dela e diz:
“Como Denise se sentiu depois de olhar dentro do tubo? Feliz ou triste?” (questão
emoção-controle).
Considera-se correta a resposta “feliz” na questão emoção-crença e “triste” na
questão emoção controle.
151
Anexo 3
Protocolos de aplicação das tarefas nas quatro coletas.
PROTOCOLO DE COLETA DE DADOS / 1ª COLETA
Nome: _______________________________________________
Data:____ / _____ / _____ Período: _____
Tarefa 1
Este é o Seu Adriano. Ele vai fazer um lanche e está escolhendo o que comer. Mas ele só tem
em casa dois tipos diferentes de lanche: pãozinho ou milho. Que lanche você acha melhor?
Você prefere pãozinho ou milho? _____________. Esta é uma boa escolha, mas seu Adriano
prefere ___________ . Ele não gosta de __________. O que ele mais gosta é de __________.
Bom... Está na hora do lanche e seu Adriano tem que escolher o que vai comer. Mas ele só pode
escolher um deles. Qual lanche seu Adriano vai escolher? Pão ou milho? Por quê?
Fita:
Tarefa 2
Esta é Lindinha e ela mora nesta casa. Lindinha tem um gatinho que adora se esconder. O gato de
Lindinha sempre se esconde embaixo da cama ou atrás da estante. Onde você acha que o gatinho se
escondeu: na cama ou na estante?
____________. Esta é uma boa escolha, mas Lindinha acha
que o gatinho se escondeu na
___________. Bom... Agora Lindinha vai procurar seu gatinho.
Onde Lindinha vai procurar o gatinho: na cama ou na estante?
____________. Por quê?
Fita:
Tarefa 3
Aqui temos uma gaveta. O que você acha que há dentro da gaveta? _____________. Vamos
ver... Há um cachorrinho dentro da gaveta! Bem... O que há na gaveta?
___________. Polly
nunca olhou dentro dessa gaveta. Ela estava dormindo e agora vem vindo. Polly não viu dentro da
gaveta. Então, Polly sabe o que há na gaveta?
___________. Por quê?
Polly olhou dentro da gaveta? _________
Fita:
1 – erro
2 – certo
nº de ordem:
152
PROTOCOLO DE COLETA DE DADOS / 2ª COLETA
Nome: _______________________________________________
Data:____ / _____ / _____ Período: _____
Tarefa 1
Esta é Ana Maria. Ela vai almoçar e está decidindo o que comer. Ana Maria tem, na cozinha,
cenoura e batata frita. O que você prefere? Cenoura ou batata frita? _________________. Esta é
uma boa escolha, mas Ana Maria prefere _____________. Ela não gosta de ___________. O que
ela mais gosta é de ___________. Agora, Ana Maria vai almoçar e tem que escolher o que vai
comer. O que Ana Maria vai escolher? Cenoura ou batata frita? ____________. Por quê?
Fita:
Tarefa 2
Este é o André. André tem um cachorro chamado Tob que adora se esconder! Tob gosta de se
esconder no quarto ou na sala. Onde você acha que o Tob se escondeu? No quarto ou na sala?
____________. Essa é uma boa escolha, mas André acha que ele se escondeu no(a) ___________.
Agora, André vai procurar o Tob. Onde André vai procurar Tob: no quarto ou na sala?
____________. Por quê?
Fita:
Tarefa 3
Esta é uma caixinha. O que você acha que há dentro desta caixa? _________.
Vamos ver... Há um anel dentro da caixinha! Bem... O que há mesmo na caixa? _________. Esta é
Tânia. Ela estava dormindo e agora vem vindo... Ela nunca olhou dentro desta caixa. Tânia não viu
dentro da caixa. Tânia sabe o que há na caixa? ___________. Por quê?
Tânia olhou dentro da caixa? _________
Fita:
Tarefa 4
Esta é uma caixa de Mc Lanche Feliz. O que você acha que tem dentro da caixa?
__________________________. Vamos ver... O que há na caixa é um livrinho e não Mc Lanche
Feliz! Meu amiguinho João está vindo aí... Ele não estava aqui e não viu o que há dentro dessa
caixa de Mc Lanche Feliz. Ele não olhou dentro dessa caixa. O que você acha que João vai dizer
que há na caixa? Mac Lanche ou livrinho? ____________________. Por quê?
Fita:
1 – erro
2 – certo
nº de ordem:
153
PROTOCOLO DE COLETA DE DADOS / 3ª COLETA
Nome: _______________________________________________
Data:____ / _____ / _____ Período: _____
1 – erro 2 – certo
Tarefa 1
Este é o Cauê. Ele vai jantar e vai escolher o que comer. Cauê tem, na cozinha, ovo e bife. O
que você prefere? Ovo ou bife? _________________. Esta é uma boa escolha, mas Cauê
prefere _____________. Ele não gosta de ___________. O que ele mais gosta é de
___________. Agora, Cauê vai jantar e tem que escolher o que vai comer. O que ele vai
escolher? Ovo ou bife? ____________. Por quê?
Fita:
Tarefa 2
Esta é a Karina. A Karina tem um ursinho! O ursinho se escondeu no quarto ou no banheiro.
Onde você acha que o ursinho se escondeu? No quarto ou no banheiro? ____________. Essa
é uma boa escolha, mas Karina acha que o ursinho se escondeu no ___________. Agora,
Karina vai procurar seu ursinho. Onde ela vai procurar o urso: no quarto ou no banheiro?
____________. Por quê?
Fita:
Tarefa 3
Este é um saquinho. O que você acha que há dentro deste saquinho? _________. Vamos ver...
Há um gatinho dentro do saquinho! Bom... O que há mesmo no saquinho? _________. Esta é
Ana. Ela estava dormindo e agora vem vindo... Ela nunca olhou dentro deste saquinho. Ana
não viu dentro do saquinho. Ana sabe o que há no saquinho? ___________. Por quê?
Ana olhou dentro do saquinho? _____.
Fita:
Tarefa 4
Esta é uma caixa de toddynho. O que você acha que há na caixa? _____________________.
Vamos ver... O que há na caixa é uma bola de algodão e não toddynho! Meu amigo Bruno
está vindo aí... Ele não estava aqui e não viu o que há dentro dessa caixa de toddynho. Ele não
olhou dentro dessa caixa. O que você acha que Bruno vai dizer que há na caixa? Toddynho ou
algodão? ____________________. Por quê?
Fita:
Tarefa 5
Esta é a Laís. Laís vai passear e quer encontrar seu batom. O batom pode estar na bolsa
o
armário. Na verdade, o batom está na bolsa, mas a Laís pensa que o batom está no armário. O
n
Laís vai procurar o batom primeiro? Na bolsa ou no armário? _______. Onde o batom da Laí
s
na verdade? Na bolsa ou no armário? _________.
Fita:
nº de ordem:
154
PROTOCOLO DE COLETA DE DADOS / 4ª COLETA
Nome: _______________________________________________
Data: ____ / _____ / _____ Período: _____
1– erro / 2 – acerto
Tarefa 1
Esta é a Luísa. Ela vai para o lanche e vai escolher o que comer. Mas Luísa só tem na lancheira
dois tipos diferentes de lanche: salsichas e hambúrguer. Que lanche você acha melhor? Você
prefere salsichas ou hambúrguer? _____________. Esta é uma boa escolha, mas Luísa prefere
___________ . Ela não gosta de __________. O que ela mais gosta é de __________. Bom... Está
na hora do lanche e Luísa tem que escolher o que vai lanchar. Mas ela só pode escolher um deles.
Qual lanche Luísa vai escolher? Salsichas ou hambúrguer? _________________. Por quê?
Fita:
Tarefa 2
Este é Jorge e ele mora nesta casa. Jorge tem uma tartaruga que adora se esconder. A tartaruga de
Jorge sempre se esconde na sacola ou na caixinha. Onde você acha que a tartaruga se escondeu: na
sacola ou na caixa? ____________. Esta é uma boa escolha, mas Jorge acha que a tartaruga se
escondeu na ___________. Bom... Agora Jorge vai procurar sua tartaruga. Onde Jorge vai procurar
a tartaruga: na caixa ou na sacola? ____________. Por quê?
Fita:
Tarefa 3
Aqui temos um pequeno baú. O que você acha que há dentro do baú? _____________.
Vamos ver... Há uma bala dentro do baú! Bem... O que há no baú? ___________. Este é
Jonas. Jonas nunca olhou dentro desse baú. Ele estava dormindo e agora vem vindo. Jonas não viu
dentro do baú. Então, Jonas sabe o que há no baú?
___________. Por quê?
Jonas olhou dentro do baú? _________
Fita:
nº de ordem:
155
1 – erro / 2 – acerto
Tarefa 4
Este é um pacote de bolacha. O que você acha que há no pacote? ______________. Vamos ver...
O que há no pacote são canudinhos e não bolachas! Minha amiga Bárbara está vindo aí... Ela não
estava aqui e não viu o que há dentro desse pacote de bolacha. Ela não olhou dentro desse pacote.
O que você acha que Bárbara vai dizer que há na caixa? Bolacha ou canudinhos?
____________________. Por quê?
Fita:
Tarefa 5
Este é o Lucas. Lucas vai jogar futebol e quer encontrar sua bola. A bola pode estar na caixa de
brinquedos ou no armário. Na verdade, a bola está na caixa, mas o Lucas pensa que a bola está no
armário. Onde o Lucas vai procurar a bola primeiro? Na caixa ou no armário? _______. Por quê?
Onde a bola do Lucas está na verdade? Na caixa ou no armário? ____________.
Fita:
Tarefa 6
Esse é o Carlinhos. E aqui está uma caixa de chocolate. O que você acha que tem dentro dessa
caixa? ____________. O Carlinhos está falando assim: ‘Que legal, porque eu adoro chocolate.
Chocolate é o que eu mais gosto de comer.’ Mas, agora o Carlinhos vai brincar bem longe daqui.
Agora que o Carlinhos não está mais aqui, vamos ver o que tem dentro dessa caixa? Vamos ver...
tem uma pedra dentro... e não tem nenhum chocolate! Só tem pedra! A caixa de bombom é
fechada: Muito bem... O que é que o Carlinhos mais gosta de comer mesmo?
O Carlinhos não olhou o que tem dentro dessa caixa. Ele nunca viu aqui dentro. Agora, aqui vem o
Carlinhos. Ele voltou e está na hora do lanche dele. Vamos dar esta caixa para o Carlinhos. Então...
como o Carlinhos se sentiu quando ele ganhou essa caixa de bombom? Feliz ou triste?
_______________. Por quê?
Como o Carlinhos se sentiu depois de olhar dentro da caixa? Feliz ou triste? _____________. Por
quê?
Só se a criança respondeu corretamente as anteriores: E por que ele ficou feliz antes, quando ele
ganhou a caixa? __________. Por quê?
Fita:
156
Anexo 4
Parecer do Comitê de Ética da PUC-SP.
157
Anexo 5
Transcrições das sessões lúdicas vídeo-gravadas:
uma sessão transcrita como exemplo para cada coleta.
Primeira coleta ‘Os Três Porquinhos’
Participantes (nº. de ordem): 39, 40, 56, 59.
56 – Eu... Quem é? Quem é?
39 – O lobo.
56 – O lobo mau...
39 – Não vai pegar...
40 – Eu sou os três porquinhos... Eu sou o porquinho... Esse é o porquinho.
56 – Assopra!
39 – Esse é o porquinho, esse daqui...
56 – Chama lobo...
40 – Ah! Ah! Ah!
59 – Abre a porta, eu quero entrar...
39 – Esse é o porquinho.
56 – Tenho o lobo...
39 – Tenho o porquinho...
40 – Esse é o porquinho...
56 – Esse é o lobo... E agora... Ra, ra, ra...
40 – Roinc, roinc, roinc...
56 – Esse é o lobo.
40 – Esse é o porquinho. Eu sou o porquinho...
39 – Vou ficar de pé. Fica de pé. Esse é o porquinho.
56 – Ai! Ai!
39 – Ai!
59 – Ai!
40 – Eu tô sentado. Roinc, roinc, roinc...
56 – Esse é o meu!
158
39 – É o porquinho.
40 – É o porquinho.
39 – Tô passeando...
56 – Ele trocou, ele trocou o lobo...
59 – O lobo...
39 – Esse é o porquinho.
40 – Vamos trocar... Quero esse...
56 – Esse é o porquinho, esse é o porquinho!
40 – Eu quero o lobo.
56 – Abre a porta...
59 - Que eu quero entrar...
56 – Não, eu não vou abrir! Eu não vou abrir!
59 – Abre a porta! Quero entrar!
56 – Não vou abrir! Não vou abrir!
39 – Não vou abrir!
40 – Não vou abrir!
59 – Vai sim! Abre a porta! Me deixa entrar!
40 - É essa parte?
59 – Esse é o lobo!
40 – Roinc, roinc...
56 – Ó... O nariz dele...
40 – O nariz dele!
39 – Esse é o porquinho!
40 – Esse é o cabelo! Esse é o chapéu!
56 – Ô, esse é o porquinho...
39 – Subindo...
40 – Porquinho...
39 – Descendo...
56 – Subindo... Descendo...
39 – Eu sou o porquinho!
56 – Abre a porta se não eu vou bater no lobo!
40 – Não vou abrir a porta! Ai! Ai!
59 – Eu quero entrar! Ahá! Ahá! Ahá!
40 – Ei! Ei! Ei!
159
39 – Vou sentar...
40 – O porquinho!
39 – É o porquinho...
59 – O lobo... O nariz...
39 – Vai pegar o porquinho!
40 – Ele tem dente... O porquinho tem língua...
39 – Ah! Comeu...
40 – Ah! Comeu...
56 – Ah! Comeu...
39 – Ah! Comeu...
40 – Ah! Comeu...
56 – Ah! Comeu...
40 – Nhac!
39 – Nhac!
40 – Ai! Ai!... O lobo... Não sei...
56 – Eu acho que o lobo comeu a gente!
40 – Eu acho que o lobo comeu a gente!
39 – O lobo comeu a gente!
40 – O lobo comeu a gente!
39 – O lobo comeu a gente!
56 – O lobo comeu a gente!
39 – O lobo comeu a gente!
39 – É o lobo! É o lobo! É o lobo...
40 – É o porquinho!
39 – Agora ele comeu! Olha o lobo Rebeca!
56 – O lobo comeu a gente!
39 – O lobo! O lobo! O lobo vai comer! Vai comer! Comeu!
40 – Eu! Eu! Eu!
39 – Põe o dedo... Quer trocar?
40 – Eu! Eu! Quero o lobo!
56 – Eu quero...
39 – Você é o porquinho! Porquinho! Vou pegar o lobo!
40 – Eu sou o porquinho!
39 – Ai, to com medo!
160
40 – Ai! Ai! Ai!
56 - Abre a porta que eu vou entrar!
40 – Eu sou o lobo! Quanto vento!
39 – Fala porquinho!
56 – Abre a porta que eu quero entrar!
39 – Fala porquinho!
40 – Roinc! Roinc!Roinc!
59 – Abre a porta, quero entrar!
56 – Abre a porta que eu quero entrar!
56 – Abre a porta!
40 – Não vou abrir!
39 – Eu não vou abrir! Eu não vou abrir Rebeca!
40 – Eu não vou abrir Rebeca!
39 – Eu não vou abrir!
56 – Eu não vou abrir, Vivi!
39 – Rebeca, eu não vou abrir!
40 – Eu não vou abrir, roinc, roinc! Olha, o peão faz assim...
59 – Faz assim...
40 – Não vou deixar Rebeca! Não vou deixar você entrar!
56 – Eu vou deixar você, Vivi!
40 – Não vou deixar você, Rebeca!
56 – Não vou deixar André e Vivi!
40 – Não!
39 – Não!
59 – Não!
56 – Oi1 Oi! Oi! Eu sou o lobo!
39 – Eu sou o porquinho!
56 – A gente tá brincando, brincando... O lobo comeu a gente.
39 – O lobo comeu a gente.
56 – O lobo comeu a gente. Eu! Tá aqui!
39 – Eu sou o porquinho!
161
Segunda coleta ‘Cachinhos Dourados’
Participantes (nº. de ordem): 16, 18, 24, 26.
18 – Eu sou o papai? Alguém tomou a minha sopa.
26 – É que eles estão batendo. Alguém comeu metade do meu mingau.
18 – Alguém comeu um pouco do meu mingau.
16 – Não fui eu.
26 – E alguém deitou nessa cama.
16 – Fui eu
26 – Na sua cama. Alguém comeu meu mingau, comeu metade do meu mingau... Vamos
trocar?
24 – Vamos.
16 – Vamos trocar?
18 – Ô tia, olha, ele bateu no meu!
16 – Vem Felipe.
18 – Alguém tomou a sopa.
16 – Fui eu, pra ficar mais forte pra te bater.
18 – Ele falou que vai me bater.
16 – Eu vou te bater e vou comer todo o seu mingau.
18 – Não foi você!
26 – Foi eu que comi, tá!
16 – Fui eu!
18 – Não, foi ela.
16 – Oi, eu sou um urso bem bravo. Qual é o seu nome?
18 – O meu nome é ursinho.
16 – Ursinho Poof?
18 – Não. Ursinho sozinho.
16 – Oi, qual é o nome da mamãe do ursinho? Eu sou um amigo.
26 – Qual é seu nome?
18 – Ursinho.
26 – E o seu?
16 – O meu é Dedé.
26 – E o seu?
16 – Bundalila.
162
26 – Não!
24 – Bundalila?
26 – E eu chamo Bundalila também.
16 – Bundalina! Tá bom!
18 – E até ele vai pra tua casa.
16 – Vamos lá pra casa, né?
18 – Ih, alguém quebrou a minha cadeira.
16 – Fui eu!
18 – Ela é que quebrou a minha cadeira.
16 – Não, fui eu!
24 – Não, fui eu!
26 – Não, eles não sabiam que quebraram a cama... Que quebrou a cama eles não sabiam.
16 – Fui eu que quebrei!
26 – Não, vocês não sabiam! Todo mundo falou alguma coisa, heim?
16 – Deixa servir então... Tchauzinho, vou embora...
26 – Você fala psiu...
16 – Oi, eu sou um amigo. Como é seu nome? O meu é Ritinha. E o seu? O meu é Ritinha.
24 – O meu é Vitória.
18 – O meu é Dedé.
16 – Oi Dedé, vamos brincar?
26 – Olá Vitória!
16 – Olha lá um ursinho. Qual é seu nome? O meu é Dedézinho.
18 – O meu é Dedé. Vamos é brincar com a zebra.
26 – Vamos lá brincar com a zebra.
16 – Ali a zebra, de azul, ali. Vamos fazer a pipoca.
26 – Café! Uma delícia...
16 – Café! Uma delícia...
18 – Ô papai, vamos voltar pra casa?
16 – Vamos.
18 – Quem tomou a minha sopa, por favor?
16 – Fui eu.
18 – Não, foi a Cachinhos Dourados.
16 – Não foi a Cachinhos Dourados não! Fui eu! Ah, sou um pai bravo! Eu sou mais alto!
Ah! a Cachinhos de Ouro é mais alta.
163
26 – Não pode alcançar assim...
24 – Vamos trocar?
16 – Troca, troca.
26 – Eu tô brincando, eu tô brincando!
18 – Ô papai, papai... Alguém entrou em casa.
26 – Vamos brincar?
24 – Vamos!
16 – Vamos!
18 – Alguém comeu a minha sopa toda.
16 – Fui eu.
18 - Mas não foi!
16 – Eu sou mais alto!
26 – Eu sou mais alta...
16 – Não, eu!
24 – Olha como é o meu...
16 – Eu sou o mais alto!!
26 – Não pode bater...
Terceira coleta ‘Chapeuzinho Vermelho’
Participantes (nº. de ordem): 41, 42, 50, 55.
42 - Como a gente vai brincar, vai seu lobo!
41 – A vovozinha tem que deitar... Depois o lobo comeu a vovozinha.
50 – E ela só vai voltar depois que o caçador matou o lobo.
41 – A Chapeuzinho vai entrar na história.
42 – Abre a barriga dele. Sai por que comeu...
50 – É que eu comi você, então você tava dentro da minha barriga, tá?
41 – Fala vai Murilo, fala! O Murilo não quer falar...
50 – Ele quer dormir.
41 – Murilo fala!
55 – Mas o lobo já ta falando.
50 – Guilherme, depois a Chapeuzinho chama você, tá bom?
164
41 - A Chapeuzinho, o lobo... O lobo queria comer a Chapeuzinho. Depois, Chapeuzinho
Vermelho foi lá onde o lobo dormia, depois ele enganou a Chapeuzinho Vermelho.
55 – E aí?
41 – E matou o lobo e cortou a barriga.
50 – Ele bate em mim!
42 – Ele pensa que tá aqui, mas tá aqui olha...
50 – Ele vai bater!
42 – Ele tá aqui olha!
50 – Eu não lembro essa parte... Eu não lembro mesmo dessa parte...
41 – Eu lembro.
50 – Vamos trocar então.
41 – Vamos! Chapeuzinho, onde você está indo?
42 – O Chapeuzinho falou com o lobo.
41 – Que linda menina...
55 – Guilherme, vamos trocar?
41 – Vamos. Vai, fala lobo!
55 – O que você tá levando?
41 – Eu tô levando a cesta pra vovozinha.
55 – E por que a menina tá andando pela floresta?
41 – Vou levar esses doces para a vovozinha. A noite eu tenho o teatro da Chapeuzinho, do
lobo, da vovozinha e do caçador que é lá em cima. Oi caçador!
42 – Eu quero brincar de massinha.
55 – Você quer massinha?
41 – Mas não tem massinha.
55 – A minha vó faz tudo que eu quero para brincar com o prato mágico.
42 – Comeu.
50 – Depois ele vai querer comer você, tá bom!
42 – É, e depois o caçador deu um tiro e cortou a barriga do lobo e depois ele salvou a vovó e
a Chapeuzinho Vermelho. Ele não matou a vovó. O lobo comeu por que ele tava com fome.
41 – Foi o Murilo que me deu.
42 – Você não quer trocar Yudi? Você quer trocar, eu fico com o caçador e você fica com a
vovó.
50 – Não quero, não quero.
42 – Olha, ele não quer trocar.
165
50 – Eu não quero trocar, eu tô cansado de trocar.
41 – Ele não quer trocar comigo. Ele tá de vermelho e ela tá de vermelho. Olha, ele tem um
casaco vermelho e ela tem uma capa vermelha. Lobo, lobo, lobo... Vem aqui! O lobo não
quer vir aqui. Não, não, o lobo!
50 – Olha o lobo aí!
42 – Mas agora é o Chapeuzinho que vai aí.
55 – Já tá chegando. Agora deixa ele te bater, ele quer te comer.
41 – Ela entrou na barriga. Depois ele foi pra cama da avó.
50 – E eu salvei, tá bom?
41 – Caçador, vem caçador!
55 – Não, ele quer esperar a Chapeuzinho. Primeiro vem a Chapeuzinho.
41 – Chapeuzinho vem! Você tem que bater e aí vai fingir que ela bateu na porta.
55 – Pa! Pa! Pa!
41 – Quem é que tá aí?
55 – O lobo.
41 – Ai... Que olhos bem grandes!
55 – Prá te comer!
41 - Daí o lobo...
55 – Vem caçador...
41 – Aí o caçador vai e tira a vovozinha de dentro da barriga.
50 – Dá, eu sei!
41 – Não, eu vou tirar a vovozinha de dentro da barriga, taí a vovozinha tirada de dentro da
barriga e pronto.
55 – Não, olha aqui é que é a barriga!
41 – Mentira, a barriga é de mentira por que, olha, não dá, não dá! Quer ver? Murilo, deixa
eu mostrar... Olha, não dá, viu? Não dá!
166
Quarta coleta ‘Rapunzel’
Participantes (nº. de ordem): 13, 14, 24, 32.
13 – Olha o príncipe, olha o de verde aqui, olha!
14 – Vamos começar?
13 – Sabe quem é ele? É o príncipe.
14 – Aí o príncipe... Você segura assim olha. Aí ela pensou que era a bruxa...
13 – Ele caiu, olha. Aí o que que aconteceu?
32 – Não sei.
24 – Os olhos dele ficou cego.
13 – Aí ele chorou e eles se casaram e foram felizes para sempre.
24 – Mas agora, Kenzo?
32 – Depois.
13 – Aí ele caiu e ficou cego
14 – Agora ela ficou em pé, ela ficou com vontade de comer maçãs. Aí o rapaz foi lá catar as
maçãs aí a bruxa viu. Vai!
13 – Ele já pegou.
14 – Fala!
24 – Você tá com vergonha?
14 – Eu tô falando. Olá mamãe!
13 – Aí eles ficaram...aí foram felizes para sempre.
32 – Agora! Depois, kenzo!
13 – Ah, faz a história aí que eu não sei. Aí o papai... Aí ela já cresceu.
32 – Ela já tá assim.
14 – Você não é a Rapunzel, você é a mamãe.
13 – Aí ela riu, aí ele caiu porque ele pensou... O que a bruxa fez com ele?
32 – Jogou ele do castelo.
14 – Não, ele pensou que era a Rapunzel jogando as tranças, aí era a bruxa que jogou da mão
dela, aí ele deu um pulo e caiu.
32 – E ficou cego.
14 – É, aí ele ficou cego. Aí depois, quando ele vai...
24 – Ah, Kenzo!
32 – Agora? Aí... Vamos começar de novo porque o Kenzo sempre não sabe...
13 – Agora espera um pouquinho.
167
32 – Que foi?
13 – Pega isso? Eu quero que você pegue porque eu não sei como é que... Eu esqueci!
14 – Era uma vez... Nós é que vamos falar... Era uma vez...
13 – Era uma vez...
14 – Uma linda princesa Rapunzel...
13 – Uma linda princesa Rapunzel.
32 – Ai! Agora ela não nasceu, tá a mãe...
13 – Finge que ela não nasceu. E o príncipe tava procurando ela, aí ele pegou as maçãs...
14 - E a bruxa apareceu. Esconde ela. Aí a bruxa apareceu. Você está colhendo as minhas
lindas maçãs? Vai, fala!
32 – Você está colhendo as minhas lindas maçãs?
14 – Fala sim!
13 – Sim.
32 – Por quê?
14 – Porque a minha esposa está com muita vontade... Vai, fala!
13 – Porque a minha esposa está...
14 - Com muita vontade...
13 – Muita vontade.
32 – Pode levar, mas se você...
14 – Quantas você quiser.
32 – Quantas você quiser.
24 – Em troca...
32 – Por troca me dá a sua filha. Aí ele aceitou.
14 – Aí ela foi e pegou. Ela ainda era bebê.
32 – Eu escondi ela, eu escondi ela.
13 – Aí ele comeu a maçã
32 – Era ela que tava com fome! Aí a filha dela comeu.
13 – A filha.
32 – A filha? A Rapunzel, né? Ela quer a bruxa.
13 – Mas... Aí ela tinha que pegar assim. Aí o príncipe tava procurando ela, o príncipe que
ele era pequeno.
32 – Aí ela pegou.
13 – Aí ele apareceu. Aí ela ficou grande.
14 – Ele conversou com a bruxa feia. Oi mãe, olha minha trança já tá grande!
168
13 – Aí tinha um pai. Ele tava atrás do príncipe. Aí, quando ela viu o príncipe...
32 – É de garrafa isso...
13 – Aí viveram felizes para sempre.
24 – Ah Kenzo!
32 – Agora?
13 – Tá bom!
24 – Olha que graça!
13 – Ele é o pai! Ele é que é o príncipe!
32 – Ai, ela é a bruxa.
13 – Ele é que é o príncipe.
24 – Ela é a mamãe.
13 – Ele é que é o príncipe! Aí depois, ele pegou muitas maçãs.
24 – Vai, aparece!
13 – Olha, ela tava aqui.
32 – Mas agora ela tá aqui.
13 – A porta dela era aqui, ó. Ela tava aqui aí, quando ela ouviu ele pegar ela apareceu na
rua. Quem está roubando...
24 – Minhas maçãs?
13 – As minhas maçãs?
32 – Por que está roubando as minhas maçãs?
14 – Porque a minha esposa está com vontade.
13 – A minha esposa está com vontade.
32 – Pode levar quantas quiser mas...
24 – Por troca...
32 – Por troca...
13 – Esqueceu?
24 – Me dá o bebê.
32 – Por troca me dá o seu bebê.
13 – Tá bom.
32 – Ela ainda não nasceu.
13 – Mas ele já cresceu... O príncipe. Ele já tava crescendo, ele tava com cinco anos.
24 – Cinco?
13 – Aí ela também tava. Eles cresceram rápido.
14 – O cabelo já era desse tamanho.
169
13 – Aí, quando ela viu ele, o que aconteceu?
14 – Príncipe!
13 – Aí, sabe o que ela fez? Ela bateu na Rapunzel, mas aí o príncipe... Eu não sei como é
que é a história! Eu não sei como é a história...
14 – Faz do jeito que quer!
13 – Faz de um outro jeito, né? De um outro jeito...
24 – Era uma vez...
13 – Eu queria que você pegasse a história e pegasse porque eu não sei.
14 – Pegasse pra gente ver como ela é feita.
13 – Você fala e aí... Eu acho que ela sabe. Ela sabe e ela sabe.
24 – Eu não sei.
14 – Eu sei.
32 – Eu também. Eu sei, mas a gente nem começou a história...
13 – Eu conheço bem, mas eu esqueci.
24 – Ela conhece.
32 – Eu conheço também.
13 – Eles se casaram também. Só eles se casaram.
170
Anexo 6
Transcrições das sessões lúdicas vídeo-gravadas, organizadas por criança para tratamento
pelo software SPAD-T (exemplo de sessão transcrita de cada coleta).
Primeira coleta ‘Os Três Porquinhos’
Participantes (nº. de ordem): 39, 40, 56, 59.
----39
O lobo. Não vai pegar... Esse é o porquinho, esse daqui... Esse é o porquinho. Tenho o
porquinho... Vou ficar de pé. Fica de pé. Esse é o porquinho. Ai! É o porquinho. Tô
passeando... Esse é o porquinho. Não vou abrir! Esse é o porquinho! Subindo... Descendo...
Eu sou o porquinho! Vou sentar... É o porquinho... Vai pegar o porquinho! Ah! Comeu... Ah!
Comeu... Nhac! O lobo comeu a gente! O lobo comeu a gente! O lobo comeu a gente! É o
lobo! É o lobo! É o lobo... Agora ele comeu! Olha o lobo Rebeca! O lobo! O lobo! O lobo
vai comer! Vai comer! Comeu! Põe o dedo... Quer trocar? Você é o porquinho! Porquinho!
Vou pegar o lobo! Ai, to com medo! Fala porquinho! Fala porquinho! Eu não vou abrir! Eu
não vou abrir Rebeca! Eu não vou abrir! Rebeca, eu não vou abrir! Não! O lobo comeu a
gente. Eu sou o porquinho! Eu sou o porquinho!
----40
Eu sou os três porquinhos... Eu sou o porquinho... Esse é o porquinho. Ah! Ah! Ah! Esse é o
porquinho... Roinc, roinc, roinc... Esse é o porquinho. Eu sou o porquinho... Eu tô sentado.
Roinc, roinc, roinc... É o porquinho. Vamos trocar... Quero esse... Eu quero o lobo. Não vou
abrir! É essa parte? Roinc, roinc... O nariz dele! Esse é o cabelo! Esse é o chapéu!
Porquinho... Não vou abrir a porta! Ai! Ai! Ei! Ei! Ei! O porquinho! Ele tem dente... O
porquinho tem língua... Ah! Comeu... Ah! Comeu... Nhac! Ai! Ai!... O lobo... Não sei... Eu
acho que o lobo comeu a gente! O lobo comeu a gente! É o porquinho! Eu! Eu! Eu! Eu! Eu!
Quero o lobo! Eu sou o porquinho! Ai! Ai! Ai! Eu sou o lobo! Quanto vento! Roinc!
Roinc!Roinc! Não vou abrir! Eu não vou abrir Rebeca! Eu não vou abrir, roinc, roinc! Olha,
o peão faz assim... Não vou deixar Rebeca! Não vou deixar você entrar! Não vou deixar
você, Rebeca! Não!
171
----56
Eu... Quem é? Quem é? O lobo mau... Assopra! Chama lobo... Tenho o lobo... Esse é o
lobo... E agora... Ra, ra, ra... Esse é o lobo. Ai! Ai! Esse é o meu! Ele trocou, ele trocou o
lobo... Esse é o porquinho, esse é o porquinho! Abre a porta... Não, eu não vou abrir! Eu não
vou abrir! Não vou abrir! Não vou abrir! Ó... O nariz dele... Ô, esse é o porquinho... Abre a
porta se não eu vou bater no lobo! Ah! Comeu... Ah! Comeu... Eu acho que o lobo comeu a
gente! O lobo comeu a gente! O lobo comeu a gente! Eu quero... Abre a porta que eu vou
entrar! Abre a porta que eu quero entrar! Abre a porta que eu quero entrar! Abre a porta! Eu
não vou abrir, Vivi! Eu vou deixar você, Vivi! Não vou deixar André e Vivi! Oi1 Oi! Oi! Eu
sou o lobo! A gente tá brincando, brincando... O lobo comeu a gente. O lobo comeu a gente.
Eu! Tá aqui!
----59
Abre a porta, eu quero entrar... Ai! O lobo... Que eu quero entrar... Abre a porta! Quero
entrar! Vai sim! Abre a porta! Me deixa entrar! Esse é o lobo! Subindo... Descendo... Eu
quero entrar! Ahá! Ahá! Ahá! O lobo... O nariz... Abre a porta, quero entrar! Faz assim...
Não!
Segunda coleta ‘Cachinhos Dourados’
Participantes (nº. de ordem): 16, 18, 24, 26.
----16
Não fui eu. Fui eu. Vamos trocar? Vem Felipe. Fui eu, pra ficar mais forte pra te bater. Eu
vou te bater e vou comer todo o seu mingau. Fui eu! Oi, eu sou um urso bem bravo. Qual é o
seu nome? Ursinho Poof? Oi, qual é o nome da mamãe do ursinho? Eu sou um amigo. O meu
é Dedé. Bundalila. Bundalina! Tá bom! Vamos lá pra casa, né? Fui eu! Não, fui eu! Fui eu
que quebrei! Deixa servir então... Tchauzinho, vou embora... Oi, eu sou um amigo. Como é
seu nome? O meu é Ritinha. E o seu? O meu é Ritinha. Oi Dedé, vamos brincar? Olha lá um
ursinho. Qual é seu nome? O meu é Dedézinho. Ali a zebra, de azul, ali. Vamos fazer a
pipoca. Café! Uma delícia... Vamos. Fui eu. Não foi a Cachinhos Dourados não! Fui eu! Ah,
sou um pai bravo! Eu sou mais alto! Ah! a Cachinhos de Ouro é mais alta. Troca, troca.
Vamos! Fui eu. Eu sou mais alto! Não, eu! Eu sou o mais alto!!
172
----18
Eu sou o papai? Alguém tomou a minha sopa. Alguém comeu um pouco do meu mingau. Ô
tia, olha, ele bateu no meu! Alguém tomou a sopa. Ele falou que vai me bater. Não foi você!
Não, foi ela. O meu nome é ursinho. Não. Ursinho sozinho. Ursinho. E até ele vai pra tua
casa. Ih, alguém quebrou a minha cadeira. Ela é que quebrou a minha cadeira. O meu é Dedé.
O meu é Dedé. Vamos é brincar com a zebra. Ô papai, vamos voltar pra casa? Quem tomou a
minha sopa, por favor? Não, foi a Cachinhos Dourados. Ô papai, papai... Alguém entrou em
casa. Alguém comeu a minha sopa toda. Mas não foi!
----24
Vamos. Bundalila? Não, fui eu! O meu é Vitória.Vamos trocar? Vamos! Olha como é o
meu...
----26
É que eles estão batendo. Alguém comeu metade do meu mingau. Na sua cama. Alguém
comeu meu mingau, comeu metade do meu mingau... Vamos trocar? E alguém deitou nessa
cama. Foi eu que comi, tá! Qual é seu nome? E o seu? E o seu? Não! E eu chamo Bundalila
também. Não, eles não sabiam que quebraram a cama... Que quebrou a cama eles não
sabiam. Não, vocês não sabiam! Todo mundo falou alguma coisa, heim? Você fala psiu... Olá
Vitória! Vamos lá brincar com a zebra. Café! Uma delícia... Não pode alcançar assim... Eu tô
brincando, eu tô brincando! Vamos brincar? Eu sou mais alta... Não pode bater...
Terceira coleta ‘Chapeuzinho Vermelho’
Participantes (nº. de ordem): 41, 42, 50, 55.
----41
A vovozinha tem que deitar... Depois o lobo comeu a vovozinha. A Chapeuzinho vai entrar
na história. Fala vai Murilo, fala! O Murilo não quer falar... Murilo fala! A Chapeuzinho, o
lobo... O lobo queria comer a Chapeuzinho. Depois, Chapeuzinho Vermelho foi lá onde o
lobo dormia, depois ele enganou a Chapeuzinho Vermelho. E matou o lobo e cortou a
barriga. Eu lembro. Vamos! Chapeuzinho, onde você está indo? Que linda menina... Vamos.
Vai, fala lobo! Eu tô levando a cesta pra vovozinha. Vou levar esses doces para a vovozinha.
A noite eu tenho o teatro da Chapeuzinho, do lobo, da vovozinha e do caçador que é lá em
173
cima. Oi caçador! Mas não tem massinha. Foi o Murilo que me deu. Ele não quer trocar
comigo. Ele tá de vermelho e ela tá de vermelho. Olha, ele tem um casaco vermelho e ela
tem uma capa vermelha. Lobo, lobo, lobo... Vem aqui! O lobo não quer vir aqui. Não, não, o
lobo! Ela entrou na barriga. Depois ele foi pra cama da avó. Caçador, vem caçador!
Chapeuzinho vem! Você tem que bater e aí vai fingir que ela bateu na porta. Quem é que tá
aí? Ai... Que olhos bem grandes! Daí o lobo... Aí o caçador vai e tira a vovozinha de dentro
da barriga. Não, eu vou tirar a vovozinha de dentro da barriga, taí a vovozinha tirada de
dentro da barriga e pronto. Mentira, a barriga é de mentira por que, olha, não dá, não dá!
Quer ver? Murilo, deixa eu mostrar... Olha, não dá, viu? Não dá!
----42
Como a gente vai brincar, vai seu lobo! Abre a barriga dele. Sai por que comeu... Ele pensa
que tá aqui, mas tá aqui olha... Ele tá aqui olha! O Chapeuzinho falou com o lobo. Eu quero
brincar de massinha. Comeu. É, e depois o caçador deu um tiro e cortou a barriga do lobo e
depois ele salvou a vovó e a Chapeuzinho Vermelho. Ele não matou a vovó. O lobo comeu
por que ele tava com fome. Você não quer trocar Yudi? Você quer trocar, eu fico com o
caçador e você fica com a vovó. Olha, ele não quer trocar. Mas agora é o Chapeuzinho que
vai aí.
----50
E ela só vai voltar depois que o caçador matou o lobo. É que eu comi você, então você tava
dentro da minha barriga, tá? Ele quer dormir. Guilherme, depois a Chapeuzinho chama você,
tá bom? Ele bate em mim! Ele vai bater! Eu não lembro essa parte... Eu não lembro mesmo
dessa parte... Vamos trocar então. Depois ele vai querer comer você, tá bom! Não quero, não
quero. Eu não quero trocar, eu tô cansado de trocar. Olha o lobo aí! E eu salvei, tá bom? Dá,
eu sei!
----55
Mas o lobo já ta falando. E aí? Guilherme, vamos trocar? O que você tá levando? E por que a
menina tá andando pela floresta? Você quer massinha? A minha vó faz tudo que eu quero
para brincar com o prato mágico. Já tá chegando. Agora deixa ele te bater, ele quer te comer.
Não, ele quer esperar a Chapeuzinho. Primeiro vem a Chapeuzinho. Pa! Pa! Pa! O lobo. Prá
te comer! Vem caçador... Não, olha aqui é que é a barriga!
174
Quarta coleta ‘Rapunzel’
Participantes (nº. de ordem): 13, 14, 24, 32.
----13
Olha o príncipe, olha o de verde aqui, olha! Sabe quem é ele? É o príncipe. Ele caiu, olha. Aí
o que que aconteceu? Aí ele chorou e eles se casaram e foram felizes para sempre. Aí ele
caiu e ficou cego. Ele já pegou. Aí eles ficaram... Aí foram felizes para sempre. Ah, faz a
história aí que eu não sei. Aí o papai... Aí ela já cresceu. Aí ela riu, aí ele caiu porque ele
pensou... O que a bruxa fez com ele? Agora espera um pouquinho. Pega isso? Eu quero que
você pegue porque eu não sei como é que... Eu esqueci! Era uma vez... Uma linda princesa
Rapunzel. Finge que ela não nasceu. E o príncipe tava procurando ela, aí ele pegou as
maçãs... Sim. Porque a minha esposa está... Muita vontade. Aí ele comeu a maçã. A filha.
Mas... Aí ela tinha que pegar assim. Aí o príncipe tava procurando ela, o príncipe que ele era
pequeno. Aí ele apareceu. Aí ela ficou grande. Aí tinha um pai. Ele tava atrás do príncipe. Aí,
quando ela viu o príncipe... Aí viveram felizes para sempre. Tá bom! Ele é o pai! Ele é que é
o príncipe! Ele é que é o príncipe. Ele é que é o príncipe! Aí depois, ele pegou muitas maçãs.
Olha, ela tava aqui. A porta dela era aqui, ó. Ela tava aqui aí, quando ela ouviu ele pegar ela
apareceu na rua. Quem está roubando... As minhas maçãs? A minha esposa está com
vontade. Esqueceu? Tá bom. Mas ele já cresceu... O príncipe. Ele já tava crescendo, ele tava
com cinco anos. Aí ela também tava. Eles cresceram rápido. Aí, quando ela viu ele, o que
aconteceu?Aí, sabe o que ela fez? Ela bateu na Rapunzel, mas aí o príncipe... Eu não sei
como é que é a história! Eu não sei como é a história... Faz de um outro jeito, né? De um
outro jeito... Eu queria que você pegasse a história e pegasse porque eu não sei. Você fala e
aí... Eu acho que ela sabe. Ela sabe e ela sabe. Eu conheço bem, mas eu esqueci. Eles se
casaram também. Só eles se casaram.
---14
Vamos começar? Aí o príncipe... Você segura assim olha. Aí ela pensou que era a bruxa...
Agora ela ficou em pé, ela ficou com vontade de comer maçãs. Aí o rapaz foi lá catar as
maçãs aí a bruxa viu. Vai! Fala! Eu tô falando. Olá mamãe! Você não é a Rapunzel, você é a
mamãe. Não, ele pensou que era a Rapunzel jogando as tranças, aí era a bruxa que jogou da
mão dela, aí ele deu um pulo e caiu. É, aí ele ficou cego. Aí depois, quando ele vai... Era uma
vez... Nós é que vamos falar... Era uma vez... Uma linda princesa Rapunzel... E a bruxa
apareceu. Esconde ela. Aí a bruxa apareceu. Você está colhendo as minhas lindas maçãs?
175
Vai, fala! Fala sim! Porque a minha esposa está com muita vontade... Vai, fala! Com muita
vontade... Quantas você quiser. Aí ela foi e pegou. Ela ainda era bebê. Ele conversou com a
bruxa feia. Oi mãe, olha minha trança já tá grande! Porque a minha esposa está com vontade.
O cabelo já era desse tamanho. Príncipe! Faz do jeito que quer! Pegasse pra gente ver como
ela é feita. Eu sei.
----24
Os olhos dele ficou cego. Mas agora, Kenzo? Você tá com vergonha? Ah, Kenzo! Em troca...
Ah, Kenzo! Olha que graça! Ela é a mamãe. Vai, aparece! Minhas maçãs? Por troca... Me dá
o bebê. Cinco? Era uma vez... Eu não sei. Ela conhece.
----32
Não sei. Depois. Agora! Depois, Kenzo! Ela já tá assim. Jogou ele do castelo. E ficou cego.
Agora? Aí... Vamos começar de novo porque o Kenzo sempre não sabe...Que foi? Ai! Agora
ela não nasceu, tá a mãe...Você está colhendo as minhas lindas maçãs? Por quê? Pode levar,
mas se você... Quantas você quiser. Por troca me dá a sua filha. Aí ele aceitou. Eu escondi
ela, eu escondi ela. Era ela que tava com fome! Aí a filha dela comeu. A filha? A Rapunzel,
né? Ela quer a bruxa. Aí ela pegou. É de garrafa isso... Agora? Ai, ela é a bruxa. Mas agora
ela tá aqui. Por que está roubando as minhas maçãs? Pode levar quantas quiser mas... Por
troca... Por troca me dá o seu bebê. Ela ainda não nasceu. Eu também. Eu sei, mas a gente
nem começou a história... Eu conheço também.
176
Anexo 7
Lista geral de palavras geradas pelo software SPAD-T a partir das transcrições das sessões
lúdicas vídeo-gravadas, organizadas por criança para tratamento.
(exemplo de lista da primeira coleta)
|------|------------------------|----------|----------|
| NUM. | MOTS EMPLOYES | FREQUENCES | LONGUEURS |
|-------|------------------------------|------------|------------|
| 1 | 2 | 1 | 1 |
| 2 | 3 | 4 | 1 |
| 3 | A | 154 | 1 |
| 4 | ABERTA | 1 | 6 |
| 5 | ABRE | 37 | 4 |
| 6 | ABRINDO | 1 | 7 |
| 7 | ABRIR | 19 | 5 |
| 8 | ABRIU | 3 | 5 |
| 9 | ABRO | 1 | 4 |
| 10 | ACABOU | 12 | 6 |
| 11 | ACHO | 4 | 4 |
| 12 | ACONTECEU | 1 | 9 |
| 13 | ACORDADA | 1 | 8 |
| 14 | ACORDAR | 2 | 7 |
| 15 | ACORDOU | 7 | 7 |
| 16 | ADIANTA | 2 | 7 |
| 17 | AGOR | 2 | 4 |
| 18 | AGORA | 22 | 5 |
| 19 | AGUA | 1 | 4 |
| 20 | AH | 32 | 2 |
| 21 | AHA | 3 | 3 |
| 22 | AI | 83 | 2 |
| 23 | AIH | 13 | 3 |
| 24 | AINDA | 1 | 5 |
| 25 | AJUDE | 1 | 5 |
| 26 | ALEXANDRE | 3 | 9 |
| 27 | ALGUEM | 1 | 6 |
| 28 | ALGUMA | 1 | 6 |
| 29 | ALI | 4 | 3 |
| 30 | AMIGO | 5 | 5 |
| 31 | AMIGOS | 1 | 6 |
| 32 | AMIGUINHOS | 2 | 10 |
| 33 | ANDRE | 1 | 5 |
| 34 | AONDE | 2 | 5 |
| 35 | AQ | 1 | 2 |
| 36 | AQUELA | 1 | 6 |
| 37 | AQUI | 39 | 4 |
| 38 | AQUII | 1 | 5 |
| 39 | AQUIL | 1 | 5 |
| 40 | AQUILO | 5 | 6 |
| 41 | AR | 1 | 2 |
| 42 | AS | 6 | 2 |
| 43 | ASSIM | 7 | 5 |
| 44 | ASSOPRA | 5 | 7 |
| 45 | ASSOPRAR | 17 | 8 |
| 46 | ASSOPRAVA | 5 | 9 |
177
| 47 | ASSOPROU | 1 | 8 |
| 48 | ATACA | 1 | 5 |
| 49 | ATACAR | 1 | 6 |
|-------|------------------------------|------------|------------|
| 50 | ATRAS | 1 | 5 |
| 51 | AU | 3 | 2 |
| 52 | AU-AU | 1 | 5 |
| 53 | AUH | 4 | 3 |
| 54 | AUUU | 1 | 4 |
| 55 | AZAR | 2 | 4 |
| 56 | BAHEIRO | 1 | 7 |
| 57 | BANHEIRO | 2 | 8 |
| 58 | BANHO | 2 | 5 |
| 59 | BARULHO | 1 | 7 |
| 60 | BATE | 6 | 4 |
| 61 | BATENDO | 8 | 7 |
| 62 | BATER | 10 | 5 |
| 63 | BATEU | 2 | 5 |
| 64 | BATI | 1 | 4 |
| 65 | BEM | 1 | 3 |
| 66 | BETERRABA | 1 | 9 |
| 67 | BOCA | 9 | 4 |
| 68 | BOLO | 2 | 4 |
| 69 | BOM | 6 | 3 |
| 70 | BONZINHO | 13 | 8 |
| 71 | BOSQUE | 2 | 6 |
| 72 | BRAVO | 2 | 5 |
| 73 | BRIGADEIRO | 3 | 10 |
| 74 | BRIGAR | 1 | 6 |
| 75 | BRIGUENTO | 1 | 9 |
| 76 | BRINCADEIRA | 2 | 11 |
| 77 | BRINCANDO | 2 | 9 |
| 78 | BRINCAR | 8 | 7 |
| 79 | BRINCARO | 1 | 8 |
| 80 | BRINQUEDO | 6 | 9 |
| 81 | BRINQUEDOS | 1 | 10 |
| 82 | BRUXA | 3 | 5 |
| 83 | BUM-BUM | 1 | 7 |
| 84 | CABELO | 6 | 6 |
| 85 | CABELOS | 1 | 7 |
| 86 | CABE€A | 1 | 6 |
| 87 | CACADORES | 1 | 9 |
| 88 | CADE | 7 | 4 |
| 89 | CADEIRA | 1 | 7 |
| 90 | CAH | 3 | 3 |
| 91 | CAIR | 1 | 4 |
| 92 | CAIU | 6 | 4 |
| 93 | CAIXA | 1 | 5 |
| 94 | CALDO | 1 | 5 |
| 95 | CAMINHA | 1 | 7 |
| 96 | CAMINHANDO | 1 | 10 |
| 97 | CANSADA | 1 | 7 |
| 98 | CANSADANAO | 1 | 10 |
| 99 | CARA | 2 | 4 |
| 100 | CASA | 43 | 4 |
| 101 | CASINHA | 9 | 7 |
| 102 | CASINHA | 1 | 9 |
|-------|------------------------------|------------|------------|
| 103 | CASINHAA | 1 | 9 |
| 104 | CASINHAEU | 1 | 9 |
| 105 | CASINHAS | 2 | 8 |
178
| 106 | CH | 1 | 2 |
| 107 | CHAMA | 1 | 5 |
| 108 | CHAMINEH | 1 | 8 |
| 109 | CHAO | 1 | 4 |
| 110 | CHAPEU | 6 | 6 |
| 111 | CHAPEUZINHO | 4 | 11 |
| 112 | CHAVA | 1 | 5 |
| 113 | CHEGA | 1 | 5 |
| 114 | CHEGOU | 1 | 6 |
| 115 | CHEGUEI | 1 | 7 |
| 116 | CHEIA | 1 | 5 |
| 117 | CHOCOLATE | 1 | 9 |
| 118 | CHORAR | 1 | 6 |
| 119 | CHOROU | 1 | 6 |
| 120 | CHOVENDO | 3 | 8 |
| 121 | CHUTAR | 1 | 6 |
| 122 | CHUVA | 2 | 5 |
| 123 | COISA | 2 | 5 |
| 124 | COLOCA | 1 | 6 |
| 125 | COM | 15 | 3 |
| 126 | COMBINADO | 1 | 9 |
| 127 | COME | 7 | 4 |
| 128 | COMECAR | 7 | 7 |
| 129 | COMENDO | 4 | 7 |
| 130 | COMER | 32 | 5 |
| 131 | COMEU | 29 | 5 |
| 132 | COMI | 4 | 4 |
| 133 | COMIA | 7 | 5 |
| 134 | COMIGO | 3 | 6 |
| 135 | COMO | 5 | 4 |
| 136 | COMPRAS | 2 | 7 |
| 137 | CONDICAO | 1 | 8 |
| 138 | CONSEGUE | 1 | 8 |
| 139 | CONSEGUI | 1 | 8 |
| 140 | CONSEGUIU | 1 | 9 |
| 141 | CONSTRUIR | 2 | 9 |
| 142 | CONSTRUIU | 1 | 9 |
| 143 | CONTA | 3 | 5 |
| 144 | CONTAR | 1 | 6 |
| 145 | CONTENTE | 1 | 8 |
| 146 | CONTINUAR | 1 | 9 |
| 147 | COR | 1 | 3 |
| 148 | CORRE | 7 | 5 |
| 149 | CORRER | 4 | 6 |
| 150 | CORREU | 2 | 6 |
| 151 | CORTINA | 2 | 7 |
| 152 | CRIANCINHAS | 2 | 11 |
| 153 | D | 2 | 1 |
| 154 | DA | 4 | 2 |
| 155 | DAH | 4 | 3 |
|-------|------------------------------|------------|------------|
| 156 | DAIH | 1 | 4 |
| 157 | DANCAR | 2 | 6 |
| 158 | DAQUI | 2 | 5 |
| 159 | DE | 55 | 2 |
| 160 | DEDO | 1 | 4 |
| 161 | DEI | 1 | 3 |
| 162 | DEITOU | 1 | 6 |
| 163 | DEIXA | 16 | 5 |
| 164 | DEIXAR | 5 | 6 |
| 165 | DEIXE-ME | 1 | 8 |
179
| 166 | DEIXO | 3 | 5 |
| 167 | DELA | 1 | 4 |
| 168 | DELE | 8 | 4 |
| 169 | DELES | 2 | 5 |
| 170 | DENTE | 2 | 5 |
| 171 | DEPOIS | 10 | 6 |
| 172 | DERRUBAR | 2 | 8 |
| 173 | DERRUBOU | 1 | 8 |
| 174 | DESCENDO | 2 | 8 |
| 175 | DESCULPA | 1 | 8 |
| 176 | DESCULPE | 2 | 8 |
| 177 | DESMONTOU | 1 | 9 |
| 178 | DESSE | 3 | 5 |
| 179 | DEUS | 2 | 4 |
| 180 | DIA | 2 | 3 |
| 181 | DINOSSAURO | 1 | 10 |
| 182 | DO | 28 | 2 |
| 183 | DOENDO | 1 | 6 |
| 184 | DOIS | 3 | 4 |
| 185 | DORMINDO | 8 | 8 |
| 186 | DORMIR | 5 | 6 |
| 187 | DOS | 4 | 3 |
| 188 | DRAGAO | 3 | 6 |
| 189 | DVD | 1 | 3 |
| 190 | E | 66 | 1 |
| 191 | EH | 175 | 2 |
| 192 | EI | 8 | 2 |
| 193 | ELA | 5 | 3 |
| 194 | ELE | 102 | 3 |
| 195 | ELES | 6 | 4 |
| 196 | EM | 5 | 2 |
| 197 | EMBORA | 4 | 6 |
| 198 | EMPRESTA | 2 | 8 |
| 199 | EMPURROU | 1 | 8 |
| 200 | ENCONTRAR | 1 | 9 |
| 201 | ENGOLIR | 2 | 7 |
| 202 | ENGOLIU | 3 | 7 |
| 203 | ENTAO | 9 | 5 |
| 204 | ENTRA | 1 | 4 |
| 205 | ENTRAR | 25 | 6 |
| 206 | ENTRAREM | 2 | 8 |
| 207 | ENTROU | 2 | 6 |
| 208 | ERA | 6 | 3 |
|-------|------------------------------|------------|------------|
| 209 | ES | 1 | 2 |
| 210 | ESCONDER | 5 | 8 |
| 211 | ESCONDEU | 1 | 8 |
| 212 | ESCONDIDA | 1 | 9 |
| 213 | ESCONDIDO | 1 | 9 |
| 214 | ESTAH | 11 | 7 |
| 215 | ESPELHO | 2 | 7 |
| 216 | ESPIRREI | 1 | 8 |
| 217 | ESQUECI | 1 | 7 |
| 218 | ESQUENTADO | 1 | 10 |
| 219 | ESQUENTAR | 1 | 9 |
| 220 | ESSA | 4 | 4 |
| 221 | ESSE | 81 | 4 |
| 222 | ESSES | 1 | 5 |
| 223 | EST | 1 | 3 |
| 224 | ESTA | 1 | 4 |
| 225 | ESTAH | 65 | 5 |
180
| 226 | ESTAMOS | 4 | 7 |
| 227 | ESTAVA | 1 | 6 |
| 228 | ESTOU | 6 | 5 |
| 229 | ESTOH | 1 | 5 |
| 230 | EU | 193 | 2 |
| 231 | F | 1 | 1 |
| 232 | FA | 1 | 2 |
| 233 | FALA | 8 | 4 |
| 234 | FALAM | 1 | 5 |
| 235 | FALAR | 2 | 5 |
| 236 | FALER | 1 | 5 |
| 237 | FALOU | 5 | 5 |
| 238 | FAZ | 5 | 3 |
| 239 | FAZENDO | 4 | 7 |
| 240 | FAZER | 21 | 5 |
| 241 | FECHA | 3 | 5 |
| 242 | FECHAR | 1 | 6 |
| 243 | FECHEI | 3 | 6 |
| 244 | FEIO | 1 | 4 |
| 245 | FELIPE | 5 | 6 |
| 246 | FELIZES | 1 | 7 |
| 247 | FEZ | 2 | 3 |
| 248 | FICA | 2 | 4 |
| 249 | FICAR | 8 | 5 |
| 250 | FILHINHO | 1 | 8 |
| 251 | FIM | 1 | 3 |
| 252 | FINGE | 1 | 5 |
| 253 | FLORESTA | 2 | 8 |
| 254 | FOGE | 3 | 4 |
| 255 | FOGO | 1 | 4 |
| 256 | FOGUEIRA | 2 | 8 |
| 257 | FOI | 9 | 3 |
| 258 | FOLHA | 1 | 5 |
| 259 | FOLHINHA | 4 | 8 |
| 260 | FOME | 1 | 4 |
| 261 | FORA | 1 | 4 |
|-------|------------------------------|------------|------------|
| 262 | FRIA | 2 | 4 |
| 263 | FRIO | 9 | 4 |
| 264 | FUGIA | 2 | 5 |
| 265 | FUGINDO | 1 | 9 |
| 266 | FUGIR | 2 | 5 |
| 267 | FUGIU | 2 | 5 |
| 268 | GABI | 1 | 4 |
| 269 | GANHEI | 1 | 6 |
| 270 | GANHEIEI | 2 | 8 |
| 271 | GELADO | 2 | 6 |
| 272 | GENTE | 34 | 5 |
| 273 | GIOVANA | 1 | 7 |
| 274 | GOSTA | 1 | 5 |
| 275 | GOSTARA | 1 | 7 |
| 276 | GOSTARAM | 1 | 8 |
| 277 | GOSTEI | 2 | 6 |
| 278 | GOSTO | 13 | 5 |
| 279 | GRANDAO | 2 | 7 |
| 280 | GRANDE | 1 | 6 |
| 281 | GUARDA-CHUVA | 1 | 12 |
| 282 | GUILHERME | 1 | 9 |
| 283 | HA | 1 | 2 |
| 284 | HAU | 2 | 3 |
| 285 | HECTOR | 1 | 6 |
181
| 286 | HEI | 1 | 3 |
| 287 | HEIM | 2 | 4 |
| 288 | HISTOHRIA | 2 | 9 |
| 289 | HISTORIA | 17 | 8 |
| 290 | HISTORIANOSSA | 1 | 13 |
| 291 | HISTORINHA | 1 | 10 |
| 292 | I | 1 | 1 |
| 293 | IA | 1 | 2 |
| 294 | IAH | 1 | 3 |
| 295 | IEH | 1 | 3 |
| 296 | IGUAL | 2 | 5 |
| 297 | IH | 1 | 2 |
| 298 | IHA | 1 | 3 |
| 299 | IMITANDO | 1 | 8 |
| 300 | INDO | 1 | 4 |
| 301 | INTEIRINHO | 1 | 10 |
| 302 | INVENTADO | 2 | 9 |
| 303 | IR | 8 | 2 |
| 304 | IRMAO | 2 | 5 |
| 305 | IRMAOZINHO | 2 | 10 |
| 306 | ISSO | 9 | 4 |
| 307 | JA | 2 | 2 |
| 308 | JAH | 5 | 3 |
| 309 | JOGO | 2 | 4 |
| 310 | KAROL | 2 | 5 |
| 311 | L | 3 | 1 |
| 312 | LA | 2 | 2 |
| 313 | LADO | 6 | 4 |
| 314 | LAH | 12 | 3 |
|-------|------------------------------|------------|------------|
| 315 | LAQUI | 1 | 5 |
| 316 | LARANJA | 5 | 7 |
| 317 | LARGA | 1 | 5 |
| 318 | LARISSA | 2 | 7 |
| 319 | LEAOZINHO | 1 | 9 |
| 320 | LEMBRAA | 1 | 7 |
| 321 | LEMBRAVAMOS | 1 | 11 |
| 322 | LEVANTANDO | 1 | 10 |
| 323 | LEVANTEI | 1 | 8 |
| 324 | LIMP | 1 | 4 |
| 325 | LIMPA | 1 | 5 |
| 326 | LIMPINHO | 1 | 8 |
| 327 | LINGUA | 3 | 6 |
| 328 | LO | 4 | 2 |
| 329 | LOB | 1 | 3 |
| 330 | LOBO | 208 | 4 |
| 331 | LUANA | 2 | 5 |
| 332 | LUCAS | 3 | 5 |
| 333 | LUIZ | 4 | 4 |
| 334 | MA | 3 | 2 |
| 335 | MACHUCOU | 1 | 8 |
| 336 | MAE | 3 | 3 |
| 337 | MAIS | 5 | 4 |
| 338 | MAL | 5 | 3 |
| 339 | MALAS | 1 | 5 |
| 340 | MALVADO | 4 | 7 |
| 341 | MAMAE | 4 | 5 |
| 342 | MAND | 1 | 4 |
| 343 | MAO | 11 | 3 |
| 344 | MARINA | 1 | 6 |
| 345 | MAS | 6 | 3 |
182
| 346 | MATA | 2 | 4 |
| 347 | MATAR | 1 | 5 |
| 348 | MAU | 65 | 3 |
| 349 | MAUESSES | 1 | 8 |
| 350 | ME | 28 | 2 |
| 351 | MEDO | 14 | 4 |
| 352 | MELECA | 7 | 6 |
| 353 | MENINAS | 1 | 7 |
| 354 | MENINO | 4 | 6 |
| 355 | MENINOS | 1 | 7 |
| 356 | MENTIRA | 2 | 7 |
| 357 | MENTIRINHA | 15 | 10 |
| 358 | MESMO | 1 | 5 |
| 359 | MEU | 22 | 3 |
| 360 | MEUS | 4 | 4 |
| 361 | MEXENDO | 1 | 7 |
| 362 | MEXER | 2 | 5 |
| 363 | MIM | 3 | 3 |
| 364 | MINGAU | 5 | 6 |
| 365 | MINHA | 31 | 5 |
| 366 | MONTE | 3 | 5 |
| 367 | MORDE | 5 | 5 |
|-------|------------------------------|------------|------------|
| 368 | MORDER | 1 | 6 |
| 369 | MORDEU | 4 | 6 |
| 370 | MORDIA | 1 | 6 |
| 371 | MORREU | 2 | 6 |
| 372 | MORREUA | 1 | 7 |
| 373 | MOUSSI | 1 | 6 |
| 374 | MUITO | 17 | 5 |
| 375 | MUSICA | 1 | 6 |
| 376 | N | 2 | 1 |
| 377 | NA | 19 | 2 |
| 378 | NADA | 7 | 4 |
| 379 | NAO | 183 | 3 |
| 380 | NAQUELA | 1 | 7 |
| 381 | NARIZ | 3 | 5 |
| 382 | NEH | 5 | 3 |
| 383 | NELE | 2 | 4 |
| 384 | NELES | 1 | 5 |
| 385 | NEM | 6 | 3 |
| 386 | NESSE | 1 | 5 |
| 387 | NHAC | 2 | 4 |
| 388 | NHEC | 2 | 4 |
| 389 | NHO | 1 | 3 |
| 390 | NHOC | 3 | 4 |
| 391 | NINGUEM | 2 | 7 |
| 392 | NO | 21 | 2 |
| 393 | NOITE | 1 | 5 |
| 394 | NOS | 1 | 3 |
| 395 | NOSSA | 4 | 5 |
| 396 | NOSSAS | 2 | 6 |
| 397 | NOSSO | 1 | 5 |
| 398 | NOVA | 1 | 4 |
| 399 | NOVO | 5 | 4 |
| 400 | NUM | 3 | 3 |
| 401 | N·O | 1 | 3 |
| 402 | O | 288 | 1 |
| 403 | OBRIG | 1 | 5 |
| 404 | OBRIGADO | 1 | 8 |
| 405 | OH | 11 | 2 |
183
| 406 | OHH | 1 | 3 |
| 407 | OI | 20 | 2 |
| 408 | OI1 | 1 | 3 |
| 409 | OINC | 3 | 4 |
| 410 | OLHA | 39 | 4 |
| 411 | OLHAR | 2 | 5 |
| 412 | ONDE | 1 | 4 |
| 413 | OPA | 4 | 3 |
| 414 | ORELHA | 2 | 6 |
| 415 | OS | 17 | 2 |
| 416 | OUTRA | 3 | 5 |
| 417 | OUTRO | 4 | 5 |
| 418 | P | 1 | 1 |
| 419 | PA | 1 | 2 |
| 420 | PAPAI | 10 | 5 |
|-------|------------------------------|------------|------------|
| 421 | PAPAR | 1 | 5 |
| 422 | PARA | 12 | 4 |
| 423 | PARECE | 1 | 6 |
| 424 | PARTE | 1 | 5 |
| 425 | PASSARINHO | 2 | 10 |
| 426 | PASSEANDO | 1 | 9 |
| 427 | PASSEAR | 5 | 7 |
| 428 | PAZ | 2 | 3 |
| 429 | PE | 1 | 2 |
| 430 | PEAO | 1 | 4 |
| 431 | PEGA | 6 | 4 |
| 432 | PEGAR | 28 | 5 |
| 433 | PEGO | 2 | 4 |
| 434 | PEGOU | 4 | 5 |
| 435 | PEGUEI | 7 | 6 |
| 436 | PEH | 5 | 3 |
| 437 | PELA | 1 | 4 |
| 438 | PELANDO | 2 | 7 |
| 439 | PER | 1 | 3 |
| 440 | PERSIANA | 1 | 8 |
| 441 | PERSONAGEM | 1 | 10 |
| 442 | PESADO | 11 | 6 |
| 443 | PESCOCINHO | 1 | 10 |
| 444 | PO | 2 | 2 |
| 445 | PODE | 17 | 4 |
| 446 | PODE-ME | 1 | 7 |
| 447 | PODEM | 2 | 5 |
| 448 | POE | 6 | 3 |
| 449 | POR | 6 | 3 |
| 450 | PORCO | 4 | 5 |
| 451 | PORQ | 1 | 4 |
| 452 | PORQUE | 7 | 6 |
| 453 | PORQUI | 1 | 6 |
| 454 | PORQUINH | 1 | 8 |
| 455 | PORQUINHO | 134 | 9 |
| 456 | PORQUINHOS | 31 | 10 |
| 457 | PORTA | 43 | 5 |
| 458 | POSSO | 1 | 5 |
| 459 | POUCO | 1 | 7 |
| 460 | POQUINHO | 1 | 9 |
| 461 | POUQUINHO | 1 | 11 |
| 462 | PRA | 35 | 3 |
| 463 | PRESA | 1 | 5 |
| 464 | PRETO | 1 | 5 |
| 465 | PRIMEIRO | 5 | 8 |
184
| 466 | PRO | 3 | 3 |
| 467 | PULANDO | 1 | 7 |
| 468 | QUANDO | 1 | 6 |
| 469 | QUANTO | 1 | 6 |
| 470 | QUE | 82 | 3 |
| 471 | QUEBROU | 3 | 7 |
| 472 | QUEI | 1 | 4 |
| 473 | QUEIMOU | 10 | 7 |
|-------|------------------------------|------------|------------|
| 474 | QUEM | 2 | 4 |
| 475 | QUENTE | 8 | 6 |
| 476 | QUER | 43 | 4 |
| 477 | QUERIA | 1 | 6 |
| 478 | QUERO | 57 | 5 |
| 479 | R | 1 | 1 |
| 480 | RA | 3 | 2 |
| 481 | RABO | 1 | 4 |
| 482 | RAPIDO | 1 | 6 |
| 483 | REBEC | 1 | 5 |
| 484 | REBECA | 5 | 6 |
| 485 | ROINC | 12 | 5 |
| 486 | S | 1 | 1 |
| 487 | SABE | 3 | 4 |
| 488 | SABONETE | 1 | 8 |
| 489 | SAI | 4 | 3 |
| 490 | SAIH | 1 | 4 |
| 491 | SALA | 4 | 4 |
| 492 | SAO | 3 | 3 |
| 493 | SAUDADE | 1 | 7 |
| 494 | SE | 8 | 2 |
| 495 | SEGURAR | 1 | 7 |
| 496 | SEI | 3 | 3 |
| 497 | SELVA | 1 | 5 |
| 498 | SEMPRE | 1 | 6 |
| 499 | SENTADO | 1 | 7 |
| 500 | SENTAR | 5 | 6 |
| 501 | SER | 1 | 3 |
| 502 | SERENA | 2 | 6 |
| 503 | SEU | 4 | 3 |
| 504 | SI | 1 | 2 |
| 505 | SIM | 5 | 3 |
| 506 | SO | 3 | 2 |
| 507 | SOCORRO | 11 | 7 |
| 508 | SOH | 3 | 3 |
| 509 | SOPRAR | 5 | 6 |
| 510 | SOU | 58 | 3 |
| 511 | SR | 13 | 2 |
| 512 | SUA | 14 | 3 |
| 513 | SUBINDO | 2 | 7 |
| 514 | SUBIR | 2 | 5 |
| 515 | SUJO | 1 | 4 |
| 516 | T | 1 | 1 |
| 517 | TA | 4 | 2 |
| 518 | TAMBEM | 16 | 6 |
| 519 | TAO | 6 | 3 |
| 520 | TAPETE | 4 | 6 |
| 521 | TAVA | 1 | 4 |
| 522 | TCHAU | 3 | 5 |
| 523 | TE | 8 | 2 |
| 524 | TEATRINHO | 1 | 9 |
| 525 | TEM | 36 | 3 |
185
| 526 | TENHO | 3 | 5 |
|-------|------------------------------|------------|------------|
| 527 | TENTA | 2 | 5 |
| 528 | TER | 2 | 3 |
| 529 | TIA | 2 | 3 |
| 530 | TIAGO | 1 | 5 |
| 531 | TIJOLO | 2 | 6 |
| 532 | TIJOLOS | 17 | 7 |
| 533 | TIR | 1 | 3 |
| 534 | TO | 13 | 2 |
| 535 | TODO | 3 | 4 |
| 536 | TOH | 5 | 3 |
| 537 | TOMA | 3 | 4 |
| 538 | TOMAR | 2 | 5 |
| 539 | TREPAR | 1 | 6 |
| 540 | TRES | 13 | 4 |
| 541 | TROCA | 6 | 5 |
| 542 | TROCAR | 27 | 6 |
| 543 | TROCO | 1 | 5 |
| 544 | TROCOU | 3 | 6 |
| 545 | TUDO | 1 | 4 |
| 546 | U | 1 | 1 |
| 547 | UAU | 1 | 3 |
| 548 | UFA | 1 | 3 |
| 549 | UI | 6 | 2 |
| 550 | ULTIMO | 1 | 6 |
| 551 | UM | 24 | 2 |
| 552 | UMA | 22 | 3 |
| 553 | V | 1 | 1 |
| 554 | VAI | 56 | 3 |
| 555 | VALENT | 1 | 6 |
| 556 | VALENTINA | 1 | 9 |
| 557 | VAM | 1 | 3 |
| 558 | VAMO | 2 | 4 |
| 559 | VAMOS | 45 | 5 |
| 560 | VEIO | 3 | 4 |
| 561 | VEM | 14 | 3 |
| 562 | VENDO | 1 | 5 |
| 563 | VENTO | 1 | 5 |
| 564 | VER | 3 | 3 |
| 565 | VERDADE | 4 | 7 |
| 566 | VERMELHA | 2 | 8 |
| 567 | VERMELHO | 2 | 8 |
| 568 | VEZ | 10 | 3 |
| 569 | VINDO | 1 | 5 |
| 570 | VIR | 1 | 3 |
| 571 | VIVI | 3 | 4 |
| 572 | VIVIAM | 1 | 6 |
| 573 | VIVO | 1 | 4 |
| 574 | VO | 2 | 2 |
| 575 | VOA | 2 | 3 |
| 576 | VOAR | 1 | 4 |
| 577 | VOCE | 51 | 4 |
| 578 | VOU | 76 | 3 |
| 579 | YUDI | 1 | 4 |
|-------|------------------------------|------------|------------|
186
Anexo 8
Exemplo de um fragmento da listagem geral de locuções verbais contendo algum termo
mental ou outra da palavra escolhida (arquivo corda).
----------------------------------------------------
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Logiciel D‚pos‚: France logiciel APP-88 08 006 01
----------------------------------------------------
CONCORDANCE DES FORMES EQUIVALENTES A: QUIS
--------------------------------------
FREQUENCE DE REPETITION 1 REPONSE
AIH ELA QUIS AS MACANS E ELE FOI PEGAR - 23
CONCORDANCE DES FORMES EQUIVALENTES A: QUISER
--------------------------------------
FREQUENCE DE REPETITION 8 REPONSE
SE VOCE QUISER PEGAR PODE PEGAR - 5
PODE PEGAR QUANTAS QUISER QUE EU VOU FAZER - 7
QUANTAS VOCE QUISER - 14
PODE PEGAR QUANTAS QUE VOCE QUISER - 16
PODE TROCAR QUEM QUISER - 25
VOCE PODE TROCAR SE VOCE QUISER - 25
QUANTAS VOCE QUISER - 32
PODE LEVAR QUANTAS QUISER MAS - 32
CONCORDANCE DES FORMES EQUIVALENTES A: RESOLVEU
--------------------------------------
FREQUENCE DE REPETITION 2 REPONSE
AI APARECEU UMA BRUXA BEM GRANDONA E VIU E AI ELE RESOLVEU ROUBAR AS FRUTAS E AI DEPOIS FOI ASSIM - 58
ELA RESOLVEU - 66
CONCORDANCE DES FORMES EQUIVALENTES A: SABE
--------------------------------------
FREQUENCE DE REPETITION 29 REPONSE
SO ELE SABE - 5
O LUCA SABE A HISTORIA - 5
ELE SABE SIM - 5
O LUCAS VOCE NAO SABE CONTAR A HISTORIA - 5
VOCE NAO SABE QUE NAO DEVE FAZER ASSIM COM O BONECO - 5
A GENTE NAO SABE - 7
ELA EH QUE SABE E QUE RESPONDE - 7
A GENTE NAO SABE NADA - 8
SABE QUEM EH ELE - 13
SABE O QUE ELA FEZ - 13
EU ACHO QUE ELA SABE - 13
ELA SABE E ELA SABE - 13
ELA SABE E ELA SABE - 13
ELA NAO SABE COMO COMECA - 22
ELA NAO SABE QUE COMECA AGORA - 22
VAMOS COMECAR DE NOVO PORQUE O KENZO SEMPRE NAO SABE - 32
A GENTE NAO SABE - 39
A GENTE NAO SABE A HISTORIA - 41
O LUCAS SABE - 41
O LUCAS NAO SABE - 41
ISSO EH MENTIRA PORQUE O LUCAS NAO SABE - 41
QUANDO O LUCAS FALA QUE ELE SABE - 41
ELE FALA PRA CASSIA E ELE NAO SABE ESSA AULA - 41
EU ACHO QUE A GABRIELA SABE A HISTORIA - 42
VOCE SABE JOAO PEDRO - 47
ENTÇO EU NAO SEI QUEM SABE - 47
EU NAO SEI QUEM SABE - 47
SOH VOCE SABE - 53
A GENTE NAO SABE CONTAR - 58
CONCORDANCE DES FORMES EQUIVALENTES A: SABEM
--------------------------------------
FREQUENCE DE REPETITION 1 REPONSE
ELA E ELE NAO SABEM CONTAR A HISTORIA - 5
CONCORDANCE DES FORMES EQUIVALENTES A: SABER
--------------------------------------
FREQUENCE DE REPETITION 1 REPONSE
NINGUEM VAI SABER - 11
187
CONCORDANCE DES FORMES EQUIVALENTES A: SABIA
--------------------------------------
FREQUENCE DE REPETITION 14 REPONSE
ELE NAO SABIA QUE A BRUXA TA LAH AIH DEPOIS QUE ELE SUBIU A BRUXA - 8
SABIA QUE ELA EH EGOISTA - 17
SABIA QUE A KAROL EH EGOISTA - 17
ELE OUVIU TUDO OUVIU E DEPOIS ELE FOI SEGUINDO O SOM E SABIA QUE ERA A RAPUNZEL E AIH DEPOIS VOLTOU A ENXERGAR E - 18
SABIA QUE ISSO NAO EH DE BATER PAPO - 19
ELE NAO SABIA - 23
ELE NAO SABIA QUE A BRUXA QUERIA A FILHA - 23
SABIA QUE VOCE TAH QUASE NO FINAL - 42
SABIA QUE EH ESSA - 51
ELE NAO SABIA - 52
E ELE NAO SABIA PORQUE ELE NAO VIU QUE A BRUXA TAVA LAH NA TORRE - 52
MAS ERA A BRUXA E ELE NAO SABIA - 56
O PRINCIPE SABIA QUE A RAPUNZEL TAVA NA TORRE PORQUE ELE ESCUTOU A VOZ DA - 58
NA TORRE PORQUE ELE ESCUTOU A VOZ DA RAPUNZEL E AI ELE SABIA - 58
CONCORDANCE DES FORMES EQUIVALENTES A: SEGREDOS
--------------------------------------
FREQUENCE DE REPETITION 1 REPONSE
EU VOU CONTAR OS SEGREDOS PRA VOCES - 66
188
Anexo 9 - Tabelas das locuções verbais emitidas nas situações lúdicas.
Tabela 1 - Locuções verbais emitidas pelas crianças nas situações lúdicas semi-
estruturadas, na primeira coleta, classificadas por criança por tipo.
nº de
ordem
Locuções verbais das crianças nas situações lúdicas - 1ª coleta tipo de locução
Os meninos não gostaram, não é meninos? E
E ninguém quer.
5
Quer ver?
D
8 A gente quer sentar. D
9 As meninas gostaram. E
A gente quer sentar.
11
A gente quer sentar naquela cadeira.
D
Você quer vir aqui na casa de tijolos. D
A gente não sabe como começar. C
14
Malvado! Car
E o lobo mau vai ficar contente. E
Ele quer comer folha.
O que você quer, três porquinhos?
O que você quer?
15
Ele quer comer folhinha.
D
Eu também gosto de beterraba e laranja. E
A gente quer trocar.
Que que você quer, lobo?
Que que você quer comer?
16
Eu também quero ficar no laranja.
D
É que o Luiz Felipe não quer trocar.
O lobo quer engolir os três porquinhos.
D
18
Eles não falam nada de verdade. C
20 Ela não quer trocar. D
28 Ninguém quer. D
Ele é bonzinho.
32
Ele não morre e é bonzinho.
Car
33 Você quer a minha casa? D
É porque ele quer comer o porquinho.
Quer comer agora.
Ele quer comer agora.
Ele não quer falar.
Ele quer comer o porquinho.
35
É porque ele quer.
D
36 O porquinho é bonzinho. Car
Lobo mau malvado! Car
38
Ai, que medo! E
39 Quer trocar? D
Quer papar! D
44
O lobo é bonzinho. Car
Não quer trocar.
Ele não quer trocar.
D
O lobo é bonzinho.
45
O lobo mau é bonzinho.
Car
Ela não quer.
48
Você não quer.
D
55 A Valentina gosta do lobo. E
189
Tabela 2 - Locuções verbais emitidas pelas crianças nas situações lúdicas semi-
estruturadas, na segunda coleta, classificadas por criança e por tipo.
Nº de
ordem
Locuções verbais das crianças nas situações lúdicas – 2ª
coleta
tipo de locução
5 O ursinho quer ir embora. D
A gente não quer fazer aqui a gente quer fazer lá em
outro lugar.
O que vocês querem continuar... Eu vou brincar.
D
Chegaram na casa e ficaram muito furiosos...
7
A Bubu gostou da menina, né Bubu?
E
Quer esse? Depois você me dá!
A gente não quer brincar.
9
Se quiser, dá beijo aqui.
D
11 A Letícia não quer começar com esse. D
17 Quer ir embora? D
22 Quer sentar do meu lado? D
Eles não sabiam que quebraram a cama.
Que quebrou a cama eles não sabiam .
26
Vocês não sabiam.
C
Sabia que o pai e a mãe beijam na boca?
Porque a minha mãe pensa que o meu pai é o namorado
da minha mãe.
27
Depois Guilherme, você tem que dar esse pra mim
porque ele quer esse.
C
37 Você é muito chato! Car
38 Eles não querem brincar comigo. D
43 Ela não quer me dar. D
Eu vou ver a mamãe porque ela gosta de brilho.
O meu não gosta.
48
O dela não gosta, mas a do Cachinho Dourado gosta.
E
Ele não quer. D
Ninguém vai saber.
50
Vocês nem vão saberem.
C
56 Ninguém quer falar D
Aí ele quer bater. D
58
Aí a Iaiá fugiu e aí ficou com medo e aí ele bateu. E
63 Ela achou que a boneca era espada. C
190
Tabela 3 - Locuções verbais emitidas pelas crianças nas situações lúdicas semi-
estruturadas, na terceira coleta, classificadas por criança e por tipo.
nº de
ordem
Locuções verbais das crianças nas situações lúdicas – 3ª coleta
tipo de
locução
4 Ela não quer. D
Tá com vergonha!
Mas ele não tem medo de verdade.
E
Ele vai enganar a Chapeuzinho, ele vai enganar! C
5
Ela vai enganar a Chapeuzinho porque ele é ruim, ele come gente. Car
O lobo queria comer os doces da Chapeuzinho Vermelho.
Mas ele ficou com tanta vontade que até matou a vó da Chapeuzinho.
D
E deu um susto e morreu.
Ela sentiu medo porque alguém derrubou ela.
Ela levou um susto.
O caçador ficou com medo porque ...
O pai ficou triste porque chegou em casa e não viu a vó e nem a filha.
E
...ele sabia que o lobo mal engoliu as duas.
Ele tinha uma namorada, esqueceu dela e nunca mais voltou. Verdade!
A Chapeuzinho morreu por que ela não tinha sabido que o lobo engoliu
a vovó.
Ela pensou que era a vovó dela mas não era, era o lobo mau.
Pôs a roupa pra Chapeuzinho Vermelho, pra ela pensar que o lobo mau
era a vó do Chapeuzinho Vermelho, mas não era, era o lobo mau.
Ele saiu porque sabia que a Chapeuzinho ia encontrar a vovó, aí ele
encontrou uma caixa.
6
Ele sabia porque ele ouviu um barulho lá da casa dele.
C
Ela tava triste porque a vó dela tava doente.
A Chapeuzinho tava feliz.
E
Ele sabe a história.
O Tiago não esqueceu a história.
7
A Júlia esqueceu a história também e o Pedro esqueceu a história
também.
C
Porque ele quer comer gente
Oi, quer ir lá na casa da minha avó?
D
Ele foi mais rápido pra casa da vovó, então ela não sabia.
A Chapeuzinho não sabia que o lobo tava indo pra casa da vovó.
A Chapeuzinho não sabia que era o lobo.
Ela não sabia porque ela não viu o lobo.
8
A mamãe não sabia que o lobo tava lá pela floresta.
C
Ela não quer abrir a porta.
Caçador, o lobo mau tá atrás de mim querendo me comer.
D
A vovó tava feliz porque a Chapeuzinho ia levar doce prá ela.
Ela tava feliz porque ia visitar a vovó.
Mas o lobo tem medo sim.
E
Ele é bom porque ele caçava o lobo mau.
O lobo ia comer ela porque ele é mau.
Car
A mãe achava que o lobo ia comer ela.
9
A mãe pensava que o lobo ia comer ela.
C
11 A Chapeuzinho não estava contente porque o lobo comeu ela. E
191
Oi, sou eu a sua neta querendo dar uns docinhos. D
12
Não, eu é que sou a vovó de mentira. C
O lobo ele quer comer a vovozinha. D
É que ela não conhecia o lobo.
A vovó não conhecia o lobo.
A vovó pensou que era a Chapeuzinho Vermelho e não era.
13
Ele veio sozinho porque ele sabe onde é.
C
A Chapeuzinho Vermelho está triste porque o lobo engoliu ela.
O Chapeuzinho teve medo.
E
Bateu na porta e ele falou fingindo ser bonzinho e ela pensou que era a
vovó...
Ela pensou que o lobo tivesse ainda na floresta.
Ela foi pelo caminho da floresta sem contar para mãe dela porque ela
pensou que na floresta não tinha lobo.
Ela não sabia...
Ele entrou disfarçado da vovozinha e ele comeu o Chapéu e a vovó.
O caçador foi ver porque ele não sabia o que tava acontecendo.
Ele não sabia mas quando ele viu pela janela aí ele entrou e viu o lobo...
E ele se deitou na cama bem rapidinho pra poder enganar a
Chapeuzinho
C
14
Quer ir embora? Quer ir embora? D
Ele quer pegar a Chapeuzinho que está com o Kalil.
Porque ele quer comer.
15
Agora ele não quer ir.
D
Aí o caçador vai lá e mata ele porque ele queria comer a Chapeuzinho. D
16
É, porque o lobo mau é bravo. Car
O lobo que queria entrar pra pegar a Chapeuzinho.
A vovó queria que o lobo entrasse na casa dela.
Porque o lobo queria entrar na casa da vovozinha.
D
Aí a vovó fica com medo que era a Chapeuzinho Vermelho. E
A Chapeuzinho pensou que ela fosse entrar.
17
Aí depois ela pensou que era o lobo aí o caçador ajudou a pegar o lobo...
C
A Chapeuzinho não sabia que tinha um lobo na floresta.
Eu acho que ele não está falando a verdade eu acho que ele está
querendo nos enganar
A mamãe sabia e aí ela falou tome cuidado.
Ela sabe a história.
É que o outro caminho facinho ela não conhece.
C
18
E a vó tava feliz porque a Chapeuzinho ia visitar ela. E
19 A vovozinha também teve medo. Porque ela tem medo do lobo. E
É porque ele quer comer ela. D
A Chapeuzinho tem medo. E
20
Ela sabe que o lobo quer comer ela, por isso é que ela sai correndo.
C
A Chapeuzinho ficou feliz porque... E
...ela queria ir na casa da vovó. D
Mas a vovó não ia saber que a Chapeuzinho ia lá.
24
Eu também não conheço.
C
26 A vovó não tava feliz porque ela tava doentinha. E
192
Aí depois ele descobriu e ele foi lá e viu.
Ela tava sabendo que a vovó tava doente.
A vovó sabia que a Chapeuzinho Vermelho ia visitar ela.
Não, ela não sabia. Mas aí, de repente, entendeu!
C
Ele quer comer o Chapeuzinho Vermelho. D
E ele enganou ela.
27
Ela sabe começar.
C
Ela tem medo do lobo. E
32
Porque ela pensou que o lobo era a Chapeuzinho. C
Ele quer te bater.
Ela não quer entrar na barriga do lobo.
Ela não quer.
Ela quer o meu.
Sou eu, eu estou com fome. Lobo quer comer a vovó.
É, o lobo quer comer a Chapeuzinho.
34
Você quer trocar comigo, Bia?
D
A Chapeuzinho tava com medo... E
...porque achava que o lobo ia comer ela.
35
Mas o Tiago não conhece outra história.
C
37 Ele não quer falar. D
Você quer ir comer alguma coisa na floresta?
É porque ela queria ir na casa da vovó...
D
38
...e ficou feliz. E
39 Do lobo eu tenho medo. E
O caçador não tem medo do lobo porque ele é corajoso. E
Era o lobo disfarçado de vovozinha.
A Chapeuzinho Vermelho não sabia que era o lobo.
A mamãe não sabia que tinha lobo na floresta.
É porque ela não sabia...
Ela percebeu mas ela não sabia que era o lobo...
...a Chapeuzinho pensou que era a vovó de verdade.
Ela pensou que era a vovozinha.
40
Ele enganou a Chapeuzinho.
C
O Murilo não quer falar.
Ele não quer trocar comigo.
O lobo não quer vir aqui.
O lobo queria comer a Chapeuzinho.
D
41
... depois ele enganou a Chapeuzinho Vermelho. C
Você não quer trocar Yudi? Você quer trocar? Eu fico com o caçador e
você fica com a vovó.
Olha ele não quer trocar!
D
42
Ele pensa que tá aqui, mas tá aqui, olha... C
45 E ele quer esse... D
46 A vovó ficou triste porque o lobo comeu a vovó. E
O lobo vai ver ele pelado e vai querer comer ele.
O lobo queria comer a vovó, ele tava com muita fome.
Eu não queria trocar por esse.
D
47
Ela tá com medo porque não tem mãe... E
193
É porque ela está com vontade de chorar.
Ela quer ficar com a vovó.
Elas querem a mesma vovozinha.
E a Vitória, ela queria o lobo...
D
Ela está triste...
A Ana Beatriz está triste.
Porque as duas gostam da vovozinha!
E
Mentir é fingir uma coisa!
48
... enganar e comer.
C
Ele quer dormir.
50
Depois ele vai querer comer você.
D
A Chapeuzinho não quer falar.
A Chapeuzinho quer voar.
D
51
Você tem que ficar pensando na árvore. C
52 A vó tava feliz porque ela traz doces pra vovó. E
O lobo quer matar todos nós. D
...ficou feliz porque o caçador matou o lobo.
Ele ficou feliz!
Ele ta com medo dele e se esconde na almofada.
E
Eu acho que a vovó... C
53
O lobo é malvado porque ele come as pessoas. Car
54 Elas não querem. D
Você quer massinha?
Ele quer te comer.
55
Não. Ele quer esperar a Chapeuzinho, primeiro vem a Chapeuzinho.
D
A Li quer ficar com a Chapeuzinho.
Olá linda menina... Você quer ir na minha casa?
...queria comer a vovó e a Chapeuzinho.
...queria comer ela e daí ele queria matar o caçador.
Ele queria matar o caçador daí ele queria enganar ela e a Chapeuzinho
desobedeceu.
D
Eu acho que ele...
Eu acho que o lobo...
56
Enganar também é mentir.
C
A mãe tinha medo dele... E
O caçador é bom.
Porque ele era mau.
O caçador ia matar porque o lobo era mau.
Car 57
Ele vai enganar a Chapeuzinho porque ele era mau. C/Car
Ela não convidou porque ela ta brava comigo. E
Olha, ela não quer trocar.
A Rebeca não quer trocar comigo.
Ela não quer brincar comigo.
Por que você não quer brincar comigo?
D
Porque ela sabe que a visita não consegue andar.
58
É mentira!
C
Você quer o meu. 59
O lobo queria comer ela.
D
194
A Chapeuzinho sabia do lobo. C
63 Porque o lobo é malvado! Car
Eu acho que a vovó tava triste... E
...porque o lobo era malvado.
64
Ele é malvado!
Car
A vovó queria comida. D
65
A Chapeuzinho tava com medo. E
Ele quer comer a Chapeuzinho Vermelho.
O lobo quer comer a Chapeuzinho Vermelho.
O lobo queria comer a Chapeuzinho Vermelho, mas ele foi antes...
O lobo comeu a vó do Chapeuzinho Vermelho por que ele quis.
D
66
Ela sabia do lobo. C
A Chapeuzinho Vermelho tá triste por que o lobo matou.
A vovó tem medo.
E
Ai vovó, o lobo quer me pegar!
O lobo quer pegar eu e a vovó.
67
O lobo quer matar a gente.
D
Tabela 4 - Locuções verbais emitidas pelas crianças nas situações lúdicas semi-
estruturadas, na quarta coleta, classificadas por criança e por tipo.
nº de
ordem
Locuções verbais das crianças nas situações lúdicas – 4ª coleta
tipo de
locução
Você quer tentar pegar?
Se você quiser pegar, pode pegar.
D
Você não conhece.
Você conhece.
Só ele sabe.
O Lucas sabe a história.
Ele sabe sim.
O Lucas, você não sabe contar a história?
Você não sabe que não deve fazer assim com o boneco?
Esqueceu?
5
Ela e ele não sabem contar a história.
C
Minha mulher está com desejo de comer maçãs. D
6
A gente esqueceu. C
Ela tava grávida e queria maçãs.
Pode pegar quantas quiser.
D
Ela ficou triste.
Ela ficou triste, depois ela encontrou o príncipe encantado.
E
A gente não sabe.
7
Ela é que sabe e que responde.
C
Você quer?
Você quer ir pra classe?
D
Eles ficaram felizes pelo bebê. E
Ela lembrou do neném quando ela acordou.
A gente não sabe nada.
8
Ele não sabia que a bruxa tá lá.
C
9 A bruxa é má. Car
195
Acho que ele achava que ela ia matar ele. C
Você tem vergonha.
10
Ela tem vergonha.
E
Era uma vez a Chapeuzinho Vermelho que adorava passear.
Rapunzel ficou triste e depois ela ficou feliz porque encontrou o
príncipe dela.
E
A Ana Clara e a Bruna não querem contar.
Você quer?
Quer trocar Bruna?
D
11
Ninguém vai saber. C
12
É que os pobres queriam ter muito um filho.
D
A minha esposa está com vontade. D
Aí, ele caiu porque ele pensou...
Eu acho que ela sabe.
Ela sabe e ela sabe.
Sabe que é ele?
Sabe o que ela fez?
13
Esqueceu?
C
Faz do jeito que quer.
Quantas você quiser.
Ela ficou com vontade de comer maçãs.
Porque a minha esposa está com muita vontade.
D
Aí ela pensou que era a bruxa.
14
Ele pensou que era a Rapunzel jogando as tranças.
C
Aí o príncipe era rico e não queria que ela tivesse aquelas tranças. D
15
A mãe tava triste porque ela levou a filha dela.
E
A minha mulher tá com desejo de comer maçãs.
Ela queria um bebê.
16
Pode pegar quantas você quiser.
D
Ela é egoísta.
Ela é egoísta porque ela não empresta brinquedo.
A bruxa malvada veio falar pra ele.
Car
Vocês querem ir pra classe?
Quem quer ir no parque?
Quer que eu sou a bruxa?
Você quer comer uma maçã do jardim?
...com a Rapunzel pra se casar pra ver se o pai e a mãe quer ser
mais legal pra ir ficar com eles.
Você quer ser a bruxa malvada e não quer falar nada.
A Ana Clara quer ir embora.
Era uma vez um lindo príncipe que queria ir na casa da Rapunzel
Ela foi passear e a bruxa queria pegar ela.
D
17
Dá raiva ficar com vergonha. E
E não gosta do príncipe e aí ele ficou cego e depois a bruxa...
Era uma vez a mãe que queria ter um neném.
Ah, ele queria dar pra Rapunzel.
Aí ele queria dar pra mãe.
D
18
Ela lembra. C
196
Ele ouviu tudo e depois ele foi seguindo o som e sabia que era a
Rapunzel
Bruxa que é a mais esperta da história. Car
19
Sabe que isso não é de bater papo? C
Ela quer só matar o príncipe. D
Ela não sabe como começa.
22
Ela não sabe que começa agora.
C
A mãe que queria comer e ela morreu.
Aí ela quis as maçãs e ele foi pegar.
D
Ele não sabia.
23
Ele não sabia que a bruxa queria a filha.
C
Você tá com vergonha? E
24
Ela conhece C
Ele não quer pegar.
Pode trocar quem quiser.
Você pode trocar se quiser.
D
25
O pai sentiu medo. E
Ele ficou com medo.
O pai tinha medo da bruxa e a Rapunzel tinha medo da bruxa.
E
26
Ela queria a filha. D
Ele ficou com medo e aí caiu. E
27
Você é muito má, heim bruxa! Car
28
Ela queria o filho deles e eles queriam maçã.
D
Ela quer a bruxa.
Quantas você quiser.
Pode levar quantas quiser mas...
D
32
Vamos começar de novo porque o Kenzo sempre não sabe. C
Quer trocar? D
E aí ela pensava que era a bruxa que tava lá embaixo, mas era o
príncipe.
34
A Rapunzel jogou e veio a bruxa e aí ela pensou...
C
Ela queria comer maçã.
A mãe queria pegar a...
D
37
Ela casou com o rei, lembra? C
A mãe queria ter uma filhinha.
D
38
Porque ela era muito malvada. Car
Ela não quer trocar.
A gente quer ver a Rapunzel.
D
39
A gente não sabe. C
Ele ficou com medo.
E
Ele não conhece a história.
O príncipe pensou que era a Rapunzel mas não era.
A gente não sabe a história.
O Lucas sabe.
O Lucas não sabe.
Isso é mentira porque o Lucas não sabe.
Ele fala pra Cássia e ele não sabe essa aula.
41
O que ele fala é mentira
C
197
E ela não queria que roubasse.
Quer trocar?
Quem quer pegar esse boneco?
D
Ela pensava que era a bruxa.
Eu acho que a Gabriela sabe a história.
Sabia que você tá quase no final?
É mentira o que você falou, Guilherme
42
Você falou mentira!
C
45
Se ele quer pegar da bruxa as maçãs...
D
A gente quer pegar outro brinquedo.
D
Você sabe João Pedro.
47
Então eu não sei quem sabe.
C
Ela é malvada.
Car
48
Porque ela falava mentira. C
Ele ficou com um medão.
E
50
Ele é que queria falar. D
51
Sabia que é essa?
C
Ele não sabia.
52
E ele não sabia porque ele não viu que a bruxa tava lá na torre.
C
Ou quer ser o pai...
Quer o pai.
Quer o príncipe.
D
53
Só você sabe. C
Ele quer pegar as maçãs.
55
É porque ele queria pegar as maçãs.
D
Você quer arrumar umas maçãs para o neném.
Vocês dois sempre querem trocar.
D
56
Mas era a bruxa e ele não sabia. C
Era uma vez uma menina bem boazinha...
Car
...que adorava ter uma filha. D
Ele resolveu roubar as frutas e aí depois foi assim. I
O príncipe sabia que a Rapunzel tava na torre porque ele escutou a
voz da Rapunzel e aí ele sabia.
58
A gente não sabe contar.
C
59
A mamãe não quer voltar.
D
Ela pede o que o pai quer. D
61
Eu acho que ela tava feliz E
Bruxa malvada!
63
Bruxa chata!
Car
Ela queria casar com o príncipe.
Ela jogava as tranças pela janela, mas não queria que jogasse o
cabelo.
D
Ela resolveu. I
É a bruxa malvada. Car
Entendeu?
66
Eu vou contar os segredos pra vocês.
C
67 Quem quer ser essa? D
198
Anexo 10
Desempenho dos participantes nas tarefas, por tarefa e coleta.
Nº de Coleta 1 Coleta 2 Coleta 3 Coleta 4 Total¹
ordem T1 T2 T3 T1 T2 T3 T4 T1 T2 T3 T4 T5 T1 T2 T3 T4 T5 T6 max=18
1
4
0 00 1 0 1111110101 1 0 1
11
2
5
1 00 1 1 0011111111 1 1 1
14
3
6
1 10 1 0 1111111111 1 1 1
16
4
7
1 10 1 1 1011101111 0 1 1
14
5
8
1 10 1 1 1010111101 0 1 1
13
6
9
1 11 1 1 1011110111 1 1 1
16
7
10
0 01 0 0 1110110001 1 1 1
10
8
11
0 00 1 0 1010101101 0 0 0
7
9
12
1 01 1 0 0010111101 1 1 1
12
10
13
0 00 0 0 1111101001 0 0 1
8
11
14
0 01 1 1 1011111101 1 1 1
14
12
15
1 10 1 1 0011100110 0 0 0
9
13
16
0 00 0 1 0011110111 0 1 1
10
14
17
1 00 0 0 0011011110 0 0 0
7
15
18
0 01 1 0 1011100111 1 1 1
12
16
19
0 00 1 0 0000100101 1 1 1
7
17
20
1 00 1 0 1111100111 1 1 1
13
18
21
0 00 0 1 1011000111 1 1 1
10
19
22
1 10 1 1 1011100111 0 1 1
13
20
23
1 00 0 0 1011100111 1 1 1
11
21
24
1 10 1 0 0011101111 0 1 1
12
22
25
1 10 1 0 0011100111 0 0 0
9
23
26
1 10 1 1 1000111101 1 0 1
12
24
27
1 00 1 1 1010101101 1 0 1
11
25
28
0 00 1 0 0010001110 0 1 1
7
26
32
1 10 1 1 0011001111 1 1 1
13
27
33
0 00 1 1 0010100111 1 1 0
9
28
34
1 00 1 0 0011101111 1 1 1
12
29
35
0 00 1 1 1000101111 1 1 1
11
30
37
0 00 1 1 0000000101 1 1 0
6
31
38
1 00 1 1 0010001111 0 1 1
10
32
39
1 00 1 0 1010100111 0 0 1
9
33
40
0 10 1 1 1011100101 1 1 1
12
34
41
0 00 0 1 0010000111 0 0 0
5
199
35
42
0 10 0 0 0000000111 1 1 0
6
36
43
0 10 1 0 0010000101 0 0 0
5
37
44
0 00 0 0 0110000110 0 0 0
4
38
45
0 00 1 0 1011000110 1 1 0
8
39
46
0 00 1 0 0010001110 0 0 0
5
40
47
0 00 1 0 0000101111 1 0 1
8
41
48
1 00 1 1 0011111111 1 1 1
14
42
50
1 00 1 1 0010000101 0 0 1
7
43
51
0 00 1 0 0010100111 1 1 1
9
44
52
0 00 1 1 0011001100 0 0 1
7
45
53
0 10 0 1 0010000110 0 0 1
6
46
54
1 10 1 1 0011101001 1 1 1
12
47
55
0 00 1 0 0010000101 0 1 1
6
48
56
1 00 0 0 0010110111 1 1 0
9
49
57
0 00 0 0 0011100111 1 1 0
8
50
58
0 00 1 1 0011000111 1 1 1
10
51
59
0 00 1 1 1011100101 0 0 1
9
52
60
1 00 1 0 0010100001 0 1 0
6
53
61
1 00 1 1 0011000111 1 0 0
9
54
63
0 00 1 0 1110100101 0 0 1
8
55
64
0 00 1 0 0010000100 0 0 0
3
56
65
1 00 1 0 0010000100 0 0 1
5
57
66
0 00 0 0 0011000101 1 1 0
6
58
67
0 00 1 0 1010001100 0 0 0
5
¹ - O Total a que esta coluna se refere representa o número total de acertos nas tarefas ao
longo de todo o estudo, por participante.
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