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UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA – UNEB
DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS HUMANAS – CAMPUS V
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA REGIONAL E LOCAL
O TREM DAS GROTAS: A FERROVIA LESTE BRASILEIRO E SEU
IMPACTO SOCIAL EM JACOBINA (1920-1945)
FABIANA MACHADO DA SILVA
Santo Antônio de Jesus, Ba.
Julho, 2009.
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FABIANA MACHADO DA SILVA
O TREM DAS GROTAS: A FERROVIA LESTE BRASILEIRO E SEU
IMPACTO SOCIAL EM JACOBINA (1920-1945)
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
graduação em História Regional e Local da
Universidade do Estado da Bahia, Campus
V, para obtenção do título de Mestre em
História Regional e Local.
Orientadora: Profª. Drª. Suzana Maria de
Souza Santos Severs
Santo Antônio de Jesus, Ba.
Julho, 2009.
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FICHA CATALOGRÁFICA
(Elaborada pela bibliotecária Marisa Santiago)
SILVA, Fabiana Machado da.
O Trem das Grotas: a ferrovia Leste Brasileiro e seu impacto
social em Jacobina (1920-1945)/Fabiana Machado da Silva - 2009.
156 f.
Dissertação (Mestrado) – Universidade do Estado da Bahia –
UNEB. Mestrado em História Regional e Local, 2009.
Orientador (a): Prof
a
. Dr
a
. Suzana Maria Santos Severs.
1. Ferrovias – Aspectos Econômicos – Bahia 2. Ferrovias –
Impacto Social – Bahia. 3. Desenvolvimento Regional – Jacobina –
Bahia. I. Severs, Suzana Maria Santos, orient. II. Título.
CDD: 385.3098142
O TREM DAS GROTAS: A FERROVIA LESTE BRASILEIRO E SEU
IMPACTO SOCIAL EM JACOBINA (1920-1945)
FABIANA MACHADO DA SILVA
Orientadora: Profª. Drª. Suzana Maria de Souza Santos Severs
BANCA EXAMINADORA:
__________________________________________________
Profª. Drª. Suzana Maria de Souza Santos Severs (Orientadora)
Universidade do Estado da Bahia (UNEB)
__________________________________________________
Profª. Drª. Carmélia Aparecida Silva Miranda (Titular)
Universidade do Estado da Bahia (UNEB)
__________________________________________________
Prof. Dr. Walter Fraga Filho (Titular)
Universidade Federal do Recôncavo (UFRB)
__________________________________________________
Profª. Drª. Ana Maria Carvalho dos Santos Oliveira (Suplente)
Universidade do Estado da Bahia (UNEB)
__________________________________________________
Prof. Dr. Rinaldo Nascimento Leite (Suplente)
Universidade Estadual de feira de Santana (UEFS)
Aprovada em: Julho de 2009.
Dedico este trabalho às memórias de:
Antonio, meu pai, in memoriam, pelo amor incondicional, apoio e
dedicação.
Fernando Rodrigues Machado, meu pai-avô, in memoriam, que
inspirou a realização deste trabalho.
A meu sobrinho, Arthur, alegria da minha vida.
Àqueles que são seduzidos pela história das ferrovias e queiram
“viajar pelos trilhos da Leste”, no Trem das Grotas.
AGRADECIMENTOS
A realização do Mestrado foi à concretização de um sonho de uma menina do interior
(Alagoinhas), que não tem medo de arriscar e sonhar. Pensava em estudar e ser professora,
que se encantou pela História, por Jacobina e pela ferrovia. que não se vive de sonhos,
temos que lutar para concretizá-los, enfrentar os obstáculos e as dificuldades, aprender com
elas. Lógico que isso jamais conseguiria sozinha, sem a participação e apoio de amigos e
familiares.
Por isso agradeço:
A Deus primeiramente pelo dom da vida e pela força e coragem, pois sem Ele não
seria possível realizar este trabalho.
À direção e funcionários da Universidade do Estado da Bahia (UNEB) Campus V -
Santo Antônio de Jesus-Ba, por favorecer a realização desse sonho. Pelo apoio e carinho com
que fui tratada, pelo pessoal da Direção, da Biblioteca, do Colegiado de História, do Setor de
Informática, da Xerox, da Cantina, Limpeza e Vigilância.
À coordenação e funcionários do Programa de Pós-Graduação em História Regional e
Local (UNEB), por possibilitar as condições técnicas e institucionais para realização desta
dissertação de Mestrado. Em especial às secretárias e secretário sempre de prontidão a nos
atender, que passaram pela secretaria do colegiado: Andréa, César, Aneise, Ane e Consuelo.
Ao Programa de Demanda Social (DS) da Coordenação de Aperfeiçoamento de
Pessoal de Nível Superior (CAPES), pelo apoio financeiro, com a concessão de bolsa de
estudos, sem a qual seria impossível a realização desta pesquisa.
À professora Suzana Maria de Souza Santos Severs, minha orientadora, pelo carinho e
atenção quase de mãe para comigo. Pela paciência, competência e compreensão com que
orientou a condução deste trabalho.
Ao senhor Marivaldo Teixeira dos Santos, diretor do Jornal Primeira Página, por ter
me concedido pesquisar nos arquivos do Jornal O Lidador, o que foi muito importante para o
andamento da pesquisa.
Ao senhor Amado, diretor do Centro Municipal e Cultural Edmundo Isidório dos
Santos, por ter possibilitado pesquisar os livros e coleções da Seção Memória do Município,
onde realmente aprendi a arte de historiar.
Aos ex-ferroviários entrevistados, que ajudaram a compreender alguns aspectos do
funcionamento da empresa ferroviária federal Leste Brasileiro na cidade de Jacobina. Sem
eles meu trabalho “não teria vida”, nem significado.
Aos funcionários da Biblioteca Pública Municipal Afonso Costa, que auxiliaram,
sempre que possível, e acompanharam de perto o trabalho de catalogação do material que se
encontra na Seção Memória do Município. À Júlia, Marcelo, Ana Cristina, meus sinceros
agradecimentos.
Aos funcionários da biblioteca da Fundação Clemente Mariani, que gentilmente
mostraram os relatórios da Leste, que se encontram no acervo desta biblioteca. Também
agradeço aos funcionários do Arquivo Público Municipal de Alagoinhas (APMA), da
Biblioteca Pública do Estado da Bahia (BPEB) e do Arquivo Público do Estado da Bahia
(APEB), do Instituto Histórico e Geográfico da Bahia (IHGB), pelo profissionalismo e
atenção com que fui atendida.
À professora Iraci Gama, por ter aberto as portas e confiado a mim o material que
durante anos juntou e organizou, disponibilizando-o para pesquisa na sede da fundação que
recebeu seu nome.
Aos meus ex-orientadores na graduação e pós-graduação. Ao professor Luiz Henrique
dos Santos Blume, pelo significativo papel na iniciação nas atividades de pesquisa. Ao
professor Francisco Antonio Zorzo, por ter me ensinado “a andar pelas linhas do trem”
durante o período da Especialização. Pela ajuda e pelas palavras de força e ânimo.
A todos os professores do Programa de Mestrado em História Regional e Local, que
contribuíram com a minha formação acadêmica, pelo incentivo nos estudos, pelo carinho e
atenção. Aos professores Charles D’almeida Santana e Felipe Santos Magalhães pelo
aprendizado e sugestões de leituras durante as disciplinas cursadas. A professora Ely Souza
Estrela, pela ajuda e apoio durante a caminhada do Mestrado e ao professor Daniel Francisco
dos Santos que sempre me incentivou e demonstrou acreditar no meu trabalho. Aos
professores Carmélia Aparecida Silva Miranda e Walter Fraga Filho por aceitarem participar
da banca e pelas sugestões dadas para aprimoramento deste trabalho durante o exame de
qualificação. Ao professor Raimundo Nonato Pereira Moreira pela forma competente e
atenciosa com que conduziu a regência das aulas durante o tirocínio docente no Mestrado.
Aos amigos e colegas da primeira turma do curso de Mestrado da UNEB, Alex
Andrade Costa, Carlos Nássaro Araújo da Paixão, Cleide Cardim dos Santos, Edilma Oliveira
Souza Quadros, José Alberto Nascimento de Jesus, Liliane Maria Fernandes Cordeiro Gomes,
Marcos Profeta Ribeiro, Marcus Vinicius da Silva Saldanha, Moisés de Oliveira Sampaio,
Osvaldo Silva Felix Júnior, Philipe Murillo Santana de Carvalho, Raul Coelho Barreto Neto,
Rosana Costa Gomes, Rosineide Costa Brito dos Santos, pelos momentos divertidos que
passamos juntos, por acreditarem em mim.
À minha segunda família da Residência Universitária Sururu (R.U), Aline, Alison,
Brian, Décio, Elisângela, Elton, Giselli, Hamilton, Isabela, Lucas, Luis, Marcelino, Marciele,
Renilton, Tânia, pelos momentos agradáveis que passamos juntos. Muitas histórias para
contar.
À amiga Marília e toda sua família por gentilmente me receberem em sua casa,
durante os primeiros dias de aulas do Mestrado. Com certeza a ajuda de vocês foi essencial. E
também a amiga Keite Maria pela leitura e sugestões valiosas para esse trabalho. Também não
poderia deixar de citar o professor Jorge Damasceno que sempre me deu ânimo quando
pensava em desistir, tirando minhas dúvidas quando solicitado.
A Neuide, minha mãe, por em todos os momentos estar comigo e mais uma vez
acreditando e apoiando a realização de um sonho. Sem a senhora não sei o que seria de mim.
Às minhas irmãs Karla e Alessandra, que sempre vibram a cada conquista minha, pelo
carinho, incentivo, apoio afetivo e financeiro durante o primeiro ano de Mestrado.
Aos tios, primos, amigos e cunhados que sempre torceram por mim. Em especial à tia
Mercedes que me deu abrigo em Salvador para realizar as pesquisas.
A todas as pessoas que de uma forma ou de outra contribuíram para a realização deste
trabalho e de um sonho, seja tirando minhas dúvidas, seja ouvindo minhas angústias durante a
sua concretização.
Uma empresa de ferrovia é um ser vivo. E devia ser classificado como crime
matar uma ferrovia. Uma ferrovia não é apenas os trilhos, os dormentes, os
pontilhões e as estações. Nem são apenas os trens e os vagões. Uma ferrovia
é um conjunto de cidades que vivem à sua margem e são estradas que vêm a
elas, e é a gente que vive ali e é economia, a saúde, a esperança e até o
amor, o destino, a felicidade e a morte.
Antonio Leal de Santa Inês
RESUMO
Entre os aspectos da modernidade em Jacobina entre 1920 e 1945, a ferrovia foi um elemento
significativo pela representatividade e influência modificadora. A Leste teve um lugar
principal na disputa sobre o que poderia ser considerado moderno em Jacobina, uma vez que
trouxe mudanças não só na paisagem urbana como na vida social e cultural de seus habitantes.
Abordam-se as transformações sociais, culturais e urbanas, os aspectos do cotidiano, da
construção das relações sociais, ressaltando em que medida as elites locais vivenciaram a
modernidade e o progresso, proporcionados pela influência e simbologia da ferrovia, como
isso influenciou a reestruturação e a transformação da infra-estrutura urbana e suas
representações sócio-culturais. Discutem-se os impactos da Leste em Jacobina, as relações
entre as transformações sociais e seu ambiente ferroviário, com a articulação sócio-regional e
redes de sociabilidade. Partimos de uma metodologia de análise histórico-discursiva-
interpretativa de documentos e dados históricos, depois utilizamos a análise da história oral
como fonte. Também tentamos seguir algumas pistas a partir das fotografias. Utilizamos
vários tipos de fontes manuscritas, impressas, jornalísticas e orais como: Livros de Atas
Municipais; de Atos do Prefeito, de 1933 a 1938; de Leis e Resoluções do Conselho
Municipal, de 1908 a 1915; de Registro de Ofícios, de 1950 a 1951; de Mensagens dos
Governadores à Assembléia Legislativa; O Código de Posturas de 1933; Diário Oficial do
Estado da Bahia 1823-1923; relatórios da Leste; jornais e depoimentos de antigos moradores e
ex-ferroviários.
Palavras-chave: Ferrovia. Desenvolvimento Regional. Impacto Social. Jacobina-Ba.
ABSTRACT
Among the aspects of the modernity in Jacobina among 1920 and 1945, the railway was a
significant element for the representativeness and modifier influence. The East had a main
room in the dispute on what it was it could be considered modern in Jacobina, once she
brought changes not only in the urban landscape as in the its inhabitants' social and cultural
life. The social, cultural and urban transformations are approached, the aspects of the daily, of
the construction of the social relationships, standing out in that measured the elites local
experienced the modernity and the progress, provided by the influence and symbolism of the
railway, as that influenced the restructuring and the transformation of the urban infrastructure
and its partner-cultural representations. The impacts of the East are discussed in Jacobina, the
relationships between the social transformations and its rail atmosphere, with the partner-
regional articulation and sociability nets. We left of a methodology of historical-discursive-
interpretative analysis of documents and historical date, later we used the analysis of the oral
history as source. We also tried to follow some clues starting from the pictures. We used
several types of sources manuscript, printed, journalistic and you pray as: Municipal minute
books, of Acts of the Mayor of 1933 and 1938, of Laws and Resolutions of the Municipal
Council from 1908 and 1915, of Registration of Occupations from 1950 and 1951, of
Messages of the Governors to the Legislative Assembly, The Code of Postures of the year of
1933, official newspaper of the State of Bahia 1823-1923, reports of the East, newspapers and
old inhabitants' depositions and former-rail.
KEYWORDS: Railway. Regional Development. Social impact. Jacobina-Ba.
LISTA DE SIGLAS
APEB - Arquivo Público do Estado da Bahia.
APMA - Arquivo Público Municipal de Alagoinhas.
APMJ - Arquivo Público Municipal de Jacobina.
BCE - Biblioteca Central do Estado da Bahia.
BPEB - Biblioteca Pública do Estado da Bahia
CBTU - Companhia Brasileira de Trens Urbanos.
DNEF - Departamento de Estradas de Ferro.
FAFEN - Fábrica de Fertilizantes Nitrogenados S. A.
FCA - Ferrovia Centro Atlântica S. A.
FCM - Fundação Clemente Mariani.
FIGAM - Fundação Iraci Gama.
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.
IGHB - Instituto Geográfico e Histórico da Bahia.
IPAC (Ba) - Instituto do patrimônio artístico e cultural da Bahia.
IHGB - Instituto Histórico e Geográfico da Bahia.
NECC - Núcleo de Estudos de Cultura e Cidade.
NEO - Núcleo de Estudos Orais.
RFFSA - Rede Ferroviária Federal Sociedade Anônima S. A.
RVFFLB - Rede de Viação Férrea Federal Leste Brasileiro.
SEI - Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia.
SINDEFERRO - Sindicato dos Trabalhadores Ferroviários, similares e afins.
VFFLB - Viação Férrea Federal Leste Brasileiro.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Vista Panorâmica de Jacobina, 1930.
41
Figura 2 -
Mapa da Localização de Jacobina em Relação ao Estado e sua Capital.
42
Figura 3 - Mapa da Região de Jacobina.
43
Figura 4 -
Visão Panorâmica de Jacobina, 1950.
44
Figura 5 - Desastre de Trem, Década de 1940.
76
Figura 6 -
Estação da Leste, 1960.
80
Figura 7 - Mapa do Traçado da Viação Férrea Federal Leste Brasileiro, em 1969
88
Figura 8 - Trem das Grotas
, 1960.
95
Figura 9 - Fachada da Estação da Leste de Jacobina,
1970.
100
Figura 10 -
Antiga e a Nova Estação Ferroviária de Jacobina
, 1960.
102
Figura 11 -
Mulheres Lavando Roupa no Rio Itapicurú-Mirim
.
103
Figura 12 -
Praça da Matriz, 1920
.
109
Figura 13 -
Praça da Matriz.
110
Figura 14 -
Estação da Leste
em Jacobina.
116
Figura 15 -
Viajantes de Trem, Década de 1960.
117
Figura 16 -
Carro de Boi
, Década de 1970.
119
Figura 17 -
Coreto Municipal de Jacobina na Praça da Matriz
.
121
Figura 18 -
Pontilhão da Es
trada de Ferro, Década de 1970.
126
Figura 19 -
Construção do Prédio do Campus IV - UNEB, Década de 1980.
126
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - População do Estado da Bahia em 1932
.
57
Tabela 2 - Receitas de Algumas Estações Selecionadas em 1944 (em réis).
73
Tabela 3 - Principais Mercadorias Transportadas pela Ferrovia em 1935
.
74
Tabela 4 - Receita da Estação de Jacobina de 1941 a 1948 (em réis)
.
90
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO 15
INTRODUÇÃO 18
CAPÍTULO I - DA VILA AGRÍCOLA À CIDADE COMERCIAL 39
1.1
A ORIGEM DO NOME JACOBINA
39
1.2
DADOS FISIOGRÁFICOS DE JACOBINA 41
1.3
DA ALDEIA À VILA, OUVIDORIA DE JACOBINA 51
1.4
A CIDADE ANTES DO TREM 55
CAPÍTULO II - A LESTE E O PIEMONTE 59
2.1
HISTÓRICO DA LESTE BRASILEIRO
59
2.2
O FUNCIONAMENTO E DECADÊNCIA DA LESTE BRASILEIRO 72
2.3
O TRABALHO NO TREM 80
2.4
A FERROVIA EM JACOBINA 86
CAPÍTULO III – A FERROVIA E AS MUDANÇAS EM JACOBINA 94
3.1
PIUÍÍ ... CHEGOU O TREM DAS GROTAS! O CONTEXTO DE SUA
IMPLANTAÇÃO
94
3.2
UMA CIDADE PASSANDO POR MUDANÇAS DEPOIS DA CHEGADA DA
LESTE BRASILEIRO
99
3.3
AS MUDANÇAS URBANAS EM JACOBINA 101
3.4
AS MUDANÇAS SOCIAIS E CULTURAIS NA SOCIEDADE JACOBINENSE 115
CONSIDERAÇÕES FINAIS 127
FONTES 131
REFERÊNCIAS 135
GLOSSÁRIO 147
ANEXOS 148
ANEXO I - Cronologia dos principais decretos e contratos da formação das
empresas ferroviárias que constituíram a Leste Brasileiro.
149
ANEXO II – Tabela - Extensão das Linhas e Ramais da Leste Brasileiro em
1944.
151
ANEXO III - Tabela - Movimento Financeiro da VFFLB de 1911 a 1940 (em
Réis).
152
ANEXO IV - Mapa Estradas de Ferro da Bahia. 153
ANEXO V - Mapa Estrada de Ferro da Bahia ao Rio São Francisco. 154
ANEXO VI - Mapa da Viação Férrea Federal Leste Brasileiro em 1965. 155
ANEXO VII - Mapa da RFFSA/Superintendência Regional - Salvador-1984. 156
15
APRESENTAÇÃO
Este trabalho é o resultado de questionamentos que surgiram a partir de pesquisas
sobre a cidade de Jacobina, realizadas desde a Graduação no curso de Licenciatura Plena em
História, Campus IV/Jacobina-Ba, da Universidade do Estado da Bahia (UNEB). As idéias e
o objeto de estudo suscitados foram aprimorados no decorrer do curso de Especialização em
História da Bahia, na Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), culminando em
projeto de pesquisa para Mestrado, cujos resultados apresentamos nesta Dissertação,
desenvolvida na linha de pesquisa Campo e Cidade do Programa de Pós-graduação em
História Regional e Local, UNEB/Campus V - Santo Antônio de Jesus-Ba.
O processo de elaboração e delimitação da temática a ser pesquisada deu-se a partir de
um movimento único e articulador entre o sujeito e o objeto, envolvendo também a postura
histórica e a maneira como o historiador percebe e se insere no contexto social, na
constituição e construção da investigação histórica, sendo simultaneamente, sujeito e objeto
de estudo, “[...] ao mesmo tempo em que a postura e a experiência do pesquisador vão estar
presentes no seu trabalho, enquanto sujeito do conhecimento, esta mesma bagagem é histórica
tornando-o um objeto, isto é, o historiador é também fruto do seu tempo
1
. Na maioria das
vezes, a escolha do tema tem a ver com as próprias inquietações e experiências pessoais do
pesquisador (a), como afirma Marc Bloch:
[...] Em boa verdade conscientemente ou não, é sempre às nossas
experiências que, em última análise, vamos buscar, dando-lhes onde forem
necessários, os matizes de novas tintas, os elementos que nos servem para a
reconstituição do passado: as próprias palavras de que nos servimos para
caracterizar os estados de alma desaparecidos, as formas sociais estioladas,
que sentido teria para nós se não tivéssemos visto primeiro viver os
homens?[...]
2
Vários foram os motivos que levaram a escolha e definição do tema e da problemática
pesquisada. Inicialmente, a motivação que nos levou ao estudo da ferrovia e do seu impacto
social em Jacobina esteve diretamente ligada à curiosidade que despertaram as histórias de
Fernando Rodrigues Machado, um ex-ferroviário da Leste em Alagoinhas, sobre a chegada da
linha férrea que modificou, em certa medida, a dinâmica social e os costumes da população
alagoinhense. Houve um tempo em que a vida na cidade passou a ser regida e organizada de
acordo com o horário do trem. Essa experiência pessoal foi de certa maneira um dos fatores
1
Yara Maria Khoury [et. al.]. A Pesquisa em História. 2. ed. São Paulo: Ática, 1999. p. 30.
2
Marc Bloch. Introdução à História. 6. ed. Mira-Sintra: Europa-América, 1941. p. 43. (Coleção Saber).
16
que levaram ao estudo da história de Jacobina, onde a Leste teve uma grande contribuição e
influência.
Ouvimos e crescemos em meio às histórias de trem e estação, as memórias tornaram-
se repletas de sentimentos e significados, trazendo a marca da própria experiência de vida,
problematizando e pondo-se em questionamento as nossas próprias memórias. Embora não
tenhamos tido a oportunidade e o privilegio de andar de trem, sempre gostamos e nos
interessamos pelas histórias de trem, encantando-nos pelo brilho que as ferrovias
proporcionaram à vida das pessoas que viram e andaram em um trem em movimento.
Durante o curso de História, a participação nos vários encontros do Núcleo de Estudos
de Cultura e Cidade (NECC) despertou o interesse em desenvolver um estudo dentro da linha
de pesquisa integrante, “Cultura e Cidade”, a qual discutia as relações entre a cultura e o fazer
urbano, buscando compreender a cidade a partir dos problemas sociais que fazem parte do
viver citadino.
O contato direto com as fontes históricas primárias despertou-nos o interesse em
pesquisar a implantação de um equipamento urbano em específico, a empresa Ferroviária
Federal Leste Brasileiro, que contribuiu para as transformações sociais ocorridas na cidade de
Jacobina a partir do decênio de 1920. Este foi o início de nosso interesse pela história de
Jacobina e sua relação com a Leste Brasileiro, fruto do trabalho como bolsista de Iniciação
Científica (UNEB-PICIN) entre 2001
e 2002 do projeto coordenado pelo professor Luiz
Henrique dos Santos Blume “Imagens da cidade: a emergência da modernidade em Jacobina
(1920-1950)”. A monografia final do curso de Graduação intitulada As Influências da Viação
Férrea Leste Brasileiro na Cidade de Jacobina (1920-1950), acabou resultando em uma
análise dos discursos e visões sobre a cidade de Jacobina, pouco aparecendo a ferrovia.
Para o Trabalho de Conclusão de Curso, utilizamos como fonte escrita os documentos
disponíveis na seção Memória do Município do Arquivo Público Municipal de Jacobina
(APMJ) e o jornal O Lidador, importante fonte histórica sobre a história de Jacobina e
documentação que trata em específico da Leste, o qual somente tivemos acesso com o
consentimento do diretor do Jornal Primeira Página, Marivaldo Teixeira dos Santos,
contribuindo assim para o andamento da pesquisa. A ferrovia apareceu com mais interesse
que a cidade, foi um elemento significativo pela representatividade e influência modificadora.
No curso de Especialização, seguimos essa mesma linha de pesquisa. Aprofundamos
os estudos sobre esta temática a partir do acesso a documentação escrita e aos dados sobre a
organização e movimentação financeira obtidos nos relatórios produzidos pela empresa no
período estudado. No trabalho final, para obtenção do tulo de especialista, O Episódio
17
Ferroviário e o Desenvolvimento da cidade de Jacobina/Ba (1920-1945), apresentamos
questões referentes à história da Leste Brasileiro e sua relação com o desenvolvimento
urbano-comercial de Jacobina, baseando-nos na análise de dados econômicos e financeiros
divulgados nos relatórios da empresa.
Tínhamos em mente estudar os reflexos da onda modernizante de começos do século
XX em Jacobina. Para tanto, levamos em consideração a implantação de certos equipamentos
urbanos que vão fazer parte do cotidiano da população jacobinense e tornam-se elementos-
símbolos modernizadores da cidade. A ferrovia apareceu como um instrumento transformador
da vida econômica local e dos hábitos cotidianos considerados atrasados, próprios da região
sertaneja. Falar de Jacobina é também falar da Leste, marco importante na constituição do
espaço urbano, havendo uma relação entre ambas, uma é indissociável da outra.
Para realização desta pesquisa de Mestrado, buscamos ampliar a análise de tais
questões, sob uma perspectiva dialógica e integradora das funções sociais da cidade e
ferrovia, tendo a Leste, um lugar principal na disputa sobre o que poderia ser considerado
moderno na cidade, uma vez que trouxe mudanças não na paisagem urbana como na vida
social e cultural de seus habitantes. Analisamos o papel regional que essa empresa teve
agenciando conflitos, dispondo de poderes e movimentando bens e pessoas, seu significado
para o desenvolvimento político-social e econômico de Jacobina.
Nesta Dissertação seguimos uma perspectiva de História Social, com recorte no
âmbito regional e local, sobre uma área do sertão baiano, Jacobina. Nela abordamos as
transformações sociais, culturais e urbanas, os aspectos do cotidiano, da construção das
relações sociais, ressaltando em que medida as elites locais inventaram a modernidade e o
progresso, proporcionados pela influência e simbologia da ferrovia, como isso influenciou na
reestruturação e transformação da infra-estrutura urbana e suas representações sócio-culturais.
O título da Dissertação, “O Trem das Grotas: a ferrovia Leste Brasileiro e seu impacto
social em Jacobina (1920-1945)”, faz menção ao nome dado pela população jacobinense ao
trem que passava na região, fazendo a trajetória do ramal da estrada de ferro que ia do
município de Senhor do Bonfim à Piritiba, localizados em território baiano, com uma das
paradas em Jacobina. Era movido por locomotivas a óleo diesel e eletricidade, rápidas e
potentes que cortavam as serras e passavam pela paisagem natural e peculiar do Piemonte da
Chapada Diamantina. A cidade de Jacobina é rodeada de montanhas, existindo várias áreas de
grotas, por isso o nome Trem das Grotas.
18
INTRODUÇÃO
Dentro da recente historiografia baiana tem-se avolumado o número de trabalhos que
se debruçam sobre as cidades e a cultura urbana, em especial sobre os municípios baianos
3
.
Jacobina foi por muito tempo relegada a uma posição periférica por estudos que enfatizavam
Salvador e o Recôncavo. A ausência, até recentemente, de trabalhos específicos sobre o
interior baiano, e mesmo de outros Estados brasileiros, contribuiu durante muito tempo para
nutrir uma visão do sertão baiano enquanto lugar de “atraso” e de pessoas “incultas”,
contrapondo a cidade tida como moderna e civilizada.
Desmistificando esta idéia, Arruda mostra que a cidade era considerada progressista e
representante de novos valores modernos e democráticos, onde se usava a razão para
convencer, sendo o lugar de vivência e atuação de cidadãos livres e conscientes. Enquanto
que o sertão era considerado arcaico, o lugar da ação do clientelismo político, dos coronéis,
do populismo, da violência e onde não havia liberdade política e de expressão
4
.
A empresa ferroviária federal Leste Brasileiro foi um marco da nova visão de
modernidade que começava a se configurar na cidade. A partir daí, se constituem os objetivos
gerais do nosso trabalho, quais sejam: analisar o processo de implantação e funcionamento da
Leste em Jacobina entre 1920 e 1945 e estudar a relação do dispositivo ferroviário com o
dispositivo territorial da cidade
5
, enquanto um mecanismo desestruturador e reestrututador do
espaço urbano, compreendendo de que maneira, juntamente com outros melhoramentos, a
Leste influenciou na transformação das funções urbanas
6
, dos hábitos, costumes e modos de
vida da população.
A baliza cronológica que escolhemos para nossa pesquisa toma como parâmetro o
movimento mais geral do capitalismo durante o breve século XX
7
no período entre guerras, de
aceleração e concentração capitalista, com o surgimento e transformações industriais,
3
Sobre a cidade de Jacobina, vejam as obras que consultamos para a confecção desta Dissertação, relacionadas
nas Referências, no final deste trabalho.
4
Gilmar Arruda. Cidades e Sertões: entre a história e a memória. Bauru, SP: Edusc, 2000. p. 13.
5
Consideramos a ferrovia enquanto um dispositivo de poder, engendrado e em constante relação com o meio
social, conforme analisa Francisco Antonio Zorzo. Ferrovia e Rede Urbana na Bahia: doze cidades conectadas
pela ferrovia no sul do recôncavo e sudoeste baiano (1870-1930). Feira de Santana: UEFS, 2001. p. 2.
6
As funções urbanas referem-se à forma de organização social e infra-estrutura da cidade, ligadas diretamente ao
modo de vida e à cultura urbana. Marcel Roncayollo. “Cidade”. In: Enciclopédia Einaudi: Região. v. 8. Lisboa,
Portugal: Imprensa Nacional/Casa da Moeda, 1986. p. 422, estuda as transformções nas funções urbanas
associadas a cultura urbana.
7
Conceito utilizado por Eric Hobsbawm. Era dos Extremos: o breve século XX: 1914-1991. São Paulo: Cia. das
Letras, 2004, para se referir ao período que vai de 1914 até o fim da era soviética.
19
ampliando-se e dando prosseguimento a malha ferroviária, inclusive na Bahia. Um período de
ensaios de modernização técnico-social, na indústria e transporte no Brasil e na Bahia, ora de
forma quase homogênea, como uma totalidade orgânica, a exemplo de São Paulo, ora de
maneira fragmentária e contraditória como se pode ver na Bahia.
Neste “breve culo XX”, segundo os relatórios da Leste, a ferrovia esteve no auge de
seu funcionamento, em amplo processo de desenvolvimento e dinamismo na cidade de
Jacobina. Foram várias as transformações ocorridas na constituição do espaço urbano, com o
empreendimento de novos elementos modernos como a construção de praças, calçamentos,
implantação de energia elétrica e transporte ferroviário, dentre outros.
Foi em 1920 que encontramos as principais transformações no espaço urbano em
virtude da chegada da ferrovia. A operacionalização do serviço de transporte ferroviário
possibilitou uma maior intensificação e desenvolvimento das atividades comerciais devido à
articulação e contato com outras regiões baianas. Neste sentido, a chegada do trem é o ponto
de partida para se entender as transformações das funções urbanas ocorridas nesta cidade e a
absorção de uma nova idéia calcada no modernismo europeu do século XX, pois a ferrovia
tornou-se “o fio condutor de todo o processo de produção social do espaço da cidade”
8
.
A década de 1930 trouxe maior incentivo e investimento no transporte ferroviário pelo
Governo Federal. Porém a partir de meados da década seguinte, viveu-se o nascimento e o
agravamento da crise financeira na companhia, culminando com o processo de declínio e
sucateamento do transporte ferroviário, que perdeu sua importância, cedendo espaço ao
rodoviário. O contexto de recessão econômica a partir da Segunda Guerra Mundial dificultou
e piorou a situação da referida empresa e da população jacobinense em geral. Também
contribuiu para o declínio do setor ferroviário baiano a implantação das rodovias federais e
estaduais de norte a sul do país, que diminuíram o poder de conexão das ferrovias brasileiras e
substituíram aos poucos o transporte ferroviário no país, não sendo estes os únicos fatores que
contribuíram para esse processo e sim a junção de um conjunto de situações favoráveis.
Delineamos a problemática deste estudo em torno da importância e contribuição da
Leste para o desenvolvimento comercial do município entre os anos referidos. Questionamos
até que ponto, como e em quais aspectos a ferrovia foi um fator de mudança social e sinal de
progresso e modernidade para Jacobina, procurando com isso mostrar a significação da Leste
Brasileiro para os cidadãos jacobinenses, sejam eles, aqueles considerados cidadãos comuns
ou parte do grupo mais influente na sociedade (os coronéis, políticos, comerciantes, médicos e
8
Franciane Gama Lacerda. Em Busca dos Campos Perdidos: uma história de trem e cidade. São Paulo: PUC-SP,
1997. p. 17. Dissertação [Mestrado em História Social].
20
intelectuais) e como eles se portaram diante da implantação do transporte ferroviário.
Abordamos também a memória em torno do trem, ao buscar recompor a visão que antigos
moradores e ex-ferroviários demonstram ter sobre a ferrovia e a cidade.
Discutimos os impactos da chegada da ferrovia em Jacobina, considerando a história
urbana, a memória sobre a ferrovia guardada por um jornal local da época, O Lidador, e pelos
trabalhadores da empresa ferroviária; como também as relações entre as transformações
sociais ocorridas na sociedade de Jacobina e seu ambiente ferroviário, com a articulação
sócio-regional e redes de sociabilidade, a conectividade e assentamentos de núcleos urbanos
na região.
Pretendemos estabelecer uma relação entre cidade, memória e ferrovia. Analisar como
a cidade vai se modificando e a partir da compreensão de como as memórias são tecidas,
entender o processo de modernização em Jacobina e os significados implícitos à Leste
Brasileiro. Para isso partiu-se de uma valorização e analise das experiências e vivências de
pessoas mais antigas de Jacobina e de ex-ferroviários da Leste Brasileiro, procurando articular
e colocar em evidência os modos de trabalhar e viver urbano, no processo de construção de
suas práticas cotidianas. Também, entendemos o espaço de diversidade na cidade, onde se
evidenciam experiências cotidianas e significados sociais diferenciados, gestados a partir de
encontros e desencontros de variadas relações sócio-culturais.
Buscamos analisar e compreender a cidade de Jacobina sob uma perspectiva plural,
enquanto um lugar de diversidade cultural, da diferença, de conflitos e disputas no processo
de construção e afirmação das memórias sociais e exercício de poder pelos espaços e
territórios urbanos. Isso fica claro nas afirmações de Déa Ribeiro Fenelon:
Com isto, reafirmamos a idéia de que a cidade nunca deve surgir apenas
como um conceito urbanístico ou político, mas sempre encarada como o
lugar da pluralidade e da diferença, e por isto representa e constitui muito
mais que o simples espaço de manipulação do poder
9
.
Levando-se em conta esse conceito de cidade, cabe uma discussão sobre a relação
entre o campo e a cidade, refutados enquanto uma relação dicotômica e realidades históricas
distintas. Deve-se analisar o campo e a cidade nas suas historicidades e particularidades, como
mecanismos que se engendram e interagem, marcando um ao outro com suas nuances e
peculiaridades, numa relação dialética e dinâmica, tornando-se assim dimensões que fazem
parte de um mesmo contexto histórico. Analisando a problemática da relação entre campo e
cidade, Raymond Willians, ressalta que:
9
Déa Ribeiro Fenelon (Org.). “Introdução”. In: Cidades. São Paulo: Olho d’água, 1999. p. 7.
21
O campo e a cidade são realidades históricas em transformação tanto em si
próprias quanto em suas inter-relações. Temos uma experiência social
concreta não apenas do campo e da cidade, em suas formas singulares, como
também de muitos tipos de organizações sociais e físicas intermediárias e
novas
10
.
Faz-se também necessário destacar que não compreendemos a cidade enquanto um
conceito abstrato e a-histórico, correspondendo às discussões em torno da estética urbana e da
constituição do seu traçado, mas sim, compreende a cidade constituída por uma terceira
noção, a de cultura urbana, como apresenta Marcel Roncayolo:
Um conjunto de comportamentos e atitudes. A originalidade do modelo
urbano dependeria da densidade e das dimensões demográfica [Wirth, 1938]
e da heterogeneidade social, ligada à divisão e multiplicação das tarefas,
portanto ao exercício das funções urbanas. Na descrição de cultura urbana
estariam interligados, ambiente, modo de vida e comportamentos
11
. [grifos
do autor]
Podemos notar que na sua análise sobre cidade que Roncayolo utiliza duas categorias
consideradas fundamentais para sua compreensão: as funções urbanas e a cultura. Segundo
essa perspectiva, a cidade deve ser entendida como construção e desconstrução das suas
funções, o que demonstra o caráter dinâmico da composição interna deste organismo, que está
sempre “[...] em mutação, pois, a cada instante, algo mais que a vista alcança, mais do que
o ouvido possa perceber, uma composição nova em um cenário novo que espera para ser
analisado”
12
.
A partir do estudo da memória de antigos moradores jacobinenses e de uma categoria
de trabalhadores, os ex-ferroviários, destacando “seus fazeres e viveres, as dimensões de sua
vida material, suas práticas e modos de trabalhar, suas tradições, crenças e valores, suas
instituições e formas de organização política”
13
, temos o propósito de estudar a cidade dos
moradores e dos trabalhadores ferroviários, para compreendermos como se processavam as
relações sociais, a constituição dos modos de vida dentro do espaço urbano e a assimilação do
seu viver citadino.
Os elementos da memória, obtidas e incorporadas nesse trabalho mediante a história
oral, através da construção e interpretação de narrativas e discursos variados, permitiram-nos
10
Raymond Willians. O Campo e a Cidade na História e na Literatura. São Paulo: Cia. das Letras, 1989. p. 25.
11
Marcel Roncayollo. “Cidade”. In: Enciclopédia Einaudi: Região. v. 8. Lisboa, Portugal: Imprensa
Nacional/Casa da Moeda, 1986. p. 422.
12
Rogério Lima; Ronaldo Costa Fernandes (Orgs.). O Imaginário da Cidade. Brasília: Universidade de Brasília;
São Paulo: Imprensa Oficial do Estado, 2000. p. 9.
13
Heloísa de Farias Cruz. “Cultura, trabalhadores e viver urbano”. Projeto História: Revista do Programa de
Estudos Pós-Graduados em História e do Departamento de História/PUC-SP. n. 18 (Espaço e Cultura). São
Paulo: Edusc, 1999. p. 302.
22
compreender a representação da história da cidade e da Leste, no momento da reconstrução e
rememoração do passado. Produzimos uma história de Jacobina e da empresa ferroviária
baseada nos discursos presentes nos documentos escritos, aliada aos discursos das fontes
orais, mediante uma operação recriadora e transformadora. Trabalhar com as tramas da
memória foi e continua sendo um difícil e encantador aprendizado, um desafio que envolve a
nós mesmos e aos outros, o que é fascinante e exige mais cuidados.
Realizamos esta pesquisa em três etapas: a primeira constituiu-se no levantamento e
seleção de fontes históricas, a segunda, do entrecruzamento e problematização das fontes,
através de um cruzamento de dados e informações e a terceira da análise dos discursos,
observando as relações de poder e os interesses no processo de construção dos mesmos, no
intuito de percebermos as contradições entre as várias visões construídas sobre a idéia de
progresso e modernidade nas fontes consultadas.
algumas contradições entre os discursos e visões construídas sobre a cidade de
Jacobina e a ferrovia no período estudado. O jornal O Lidador, enquanto um instrumento
usado pelas elites locais para disseminarem seus ideais de progresso, assumia uma posição de
críticas à Leste Brasileiro, buscando criar mediante o enfoque de aspectos negativos uma
idéia depreciadora da ferrovia. Com outro olhar e ponto de vista, os ex-ferroviários e parte da
população buscam defender e reafirmar uma visão positiva, posicionando-se a favor da
ferrovia, ressaltando sua importância para o desenvolvimento comercial de Jacobina. Essa
diferença de opiniões mostra a existência de discursos, formas de se ver e analisar os aspectos
da modernidade antagônicos e conflitantes, segundo os interesses dos grupos aos quais estão
ligados.
O discurso do jornal O Lidador versava a favor de um grupo social em específico, os
comerciantes, que eram os mais prejudicados com os problemas do funcionamento do
transporte ferroviário na região de Jacobina e os que mais faziam críticas, exigiam
providências e melhorias. Esta posição do jornal O Lidador pode ter a ver com a influência do
comércio local dentro da sociedade jacobinense e pela ligação dos diretores deste periódico
com os interesses desse grupo social. O discurso dos ex-ferroviários corresponde ao papel de
trabalhadores que buscavam defender a empresa que representava sua fonte de subsistência e
resistir ao abandono da idéia propulsora que se tinha da ferrovia, procurando melhorar a
imagem da atuação da empresa ferroviária em Jacobina.
É necessário analisar a autoria das críticas feitas à empresa ferroviária, quais os seus
objetivos e interesses. Será que existiram aspectos negativos e coisas ruins a falar do
funcionamento da linha férrea? Provavelmente não, que, de uma forma ou de outra, a
23
empresa ferroviária favoreceu, com seus serviços, o deslocamento e transporte de pessoas e de
mercadorias da cidade de Jacobina.
Fazendo o mesmo com os relatos dos ex-ferroviários, deve-se perguntar o porquê de
uma atitude de defesa e exaltação da ferrovia. Será que não sofreram e não tinham algum tipo
de queixa no que diz respeito às relações trabalhistas engendradas no ambiente ferroviário?
Até que ponto o funcionamento da companhia ia bem realmente e atendeu satisfatoriamente a
população de Jacobina?
Na tentativa de constituirmos uma relação direta entre teoria e prática, fazendo-se o
diálogo entre as fontes e as evidências
14
, para compor o contexto e a tessitura do corpo social
estudado, escolhemos uma variedade de fontes históricas pertinente à temática estudada, para
termos uma visão o mais precisa possível do tema devido ao caráter fragmentário das
mesmas, sendo elas manuscritas, orais ou iconográficas.
Neste estudo, buscamos associar e dialogar com vários recursos teóricos e
metodológicos, possibilitando-nos uma interpretação mais objetiva e coerente possível das
fontes utilizadas. Partimos primeiramente de uma metodologia de análise histórico-discursiva-
interpretativa de documentos e dados históricos, depois utilizamos a análise da história oral
como fonte, ouvindo os depoimentos de ex-ferroviários e antigos moradores, que vivenciaram
a época estudada, além, de também tentarmos seguir algumas pistas a partir das fotografias.
O intuito de utilizarmos a fonte oral não foi contrapor versões ou privilegiar discursos
e sim, de mostrar outras formas de se olhar e falar da cidade, que não ficassem restritas a
dados estatísticos e sem vida, que em certa medida são importantes, mas insuficientes,
trazendo uma versão parcial dos fatos. Embora as fontes escritas deixassem entrever alguns
aspectos da cidade, por outro lado restringiam e limitavam o olhar, silenciando e deixando de
mostrar outras questões pertinentes e instigadoras. Não queremos dizer com isso que o
trabalho com as memórias não tenha seus limites e fosse a fonte que resolveria todos os
problemas, pelo contrário, ela abrir-nos-ia novas possibilidades de compreensão da cidade e
da Leste, mostrando outras visões de mundo
15
.
14
Yara Maria Khoury [et. al.]. A Pesquisa em História. 2. ed. São Paulo: Ática, 1999. p. 38.
15
Segundo Alessandro Portelli, “a essencialidade do individuo é salientada pelo fato da história oral dizer
respeito a versões do passado, ou seja, à memória. Ainda que seja sempre moldada de diversas formas pelo meio
social, em última análise, o ato e a arte de lembrar jamais deixam de ser profundamente pessoais.” “Tentando
Aprender um Pouquinho: algumas reflexões sobre ética e história oral”. Projeto História: Revista do Programa
de Estudos Pós-Graduados em História e do Departamento de História/PUC-SP. n. 15 (Ética e História Oral).
São Paulo: Educ. 1997. p. 16.
24
Compreendemos o depoimento dos sujeitos-testemunhas
16
como uma fonte que
possibilita apresentarmos os significados das experiências e memórias dos sujeitos sociais e
não como um complemento na falta de documentação escrita. A partir da análise das
entrevistas, buscamos compreender as formas de viver, os significados e representações que
as pessoas entrevistadas construíram sobre a ferrovia e a cidade. Tratava-se de ouvirmos
aqueles que ainda não haviam falado, deixar expressarem suas maneiras pensar e agir.
O que importa é compreendermos o processo de rememoração do passado, que se
deixa entender pelo o olhar que os entrevistados lançam sobre o tempo que passou
relacionando-o com o tempo que experienciam hoje, ou seja, são as composições
17
e
recomposições do passado nas suas várias significações que interessam para que o estudo da
cidade e da ferrovia não se torne uma mera leitura e compilação de documentos
antigos/escritos e sim a expressão do modo de vida dos sujeitos que vivenciaram e
constituíram a trama histórica.
Para um aprofundamento a respeito do trabalho de interpretação das fontes orais,
foram relevantes os estudos de alguns historiadores sobre história oral. Eles tratam da
responsabilidade e dilemas enfrentados por historiadores que trabalham com história oral, por
lidarem com um “documento vivo”, com subjetividades diferentes, sendo que “a memória
oral se assenta na memória e não em outros textos e suas fontes são as pessoas e não
documentos”
18
trazendo assim, novas questões problematizadoras para a escrita da história.
Como afirma Franciane Lacerda:
O respeito e a coerência na análise de fontes sejam de que natureza for, é
algo intrínseco ao trabalho do historiador. Para aqueles que trabalham com
sentimentos que vão aflorando no momento da narração, acredito que estes
devem ser redobrados, pois fazemos da história de vida dos entrevistados, as
fontes com a qual se produz o conhecimento histórico
19
.
16
Conceito utilizado por Alessandro Portelli ao se referir as pessoas que vivenciaram e testemunharam de
primeira mão determinado fato e assumem o valor de sujeitos- testemunhas na análise histórica.
17
O termo composição da memória é utilizado por Alistair Tompson. “Recompondo a Memória: questões sobre
a relação entre a história oral e as memórias”. Projeto História: Revista do Programa de Estudos s-Graduados
em História e do Departamento de História/PUC-SP. n. 15 (Ética e História Oral). São Paulo: Educ, 1997. p. 56.
Ele enfatiza que “compomos nossas reminiscências para dar sentido à nossa vida passada e presente.
Composição é um termo adequadamente ambíguo para descrever o processo de ‘construçãode reminiscências.
De certa forma, nós as compomos utilizando as linguagens e os significados de nossa cultura”.
18
Raphael Samuel. “Teatros de memória”. Projeto História: Revista do Programa de Estudos Pós-Graduados em
História e do Departamento de História/PUC-SP. n. 14 (Cultura e Representação). São Paulo: Educ, 1997. p. 41-
83, Apud Maria Antonieta Antonacci. “Apresentação”. Projeto História: Revista do Programa de Estudos Pós-
Graduados em História e do Departamento de História/PUC-SP. n. 17 (Trabalhos da Memória). São Paulo: Educ,
1998. p. 9.
19
Franciane Gama Lacerda. Em Busca dos Campos Perdidos: uma história de trem e cidade. São Paulo: PUC-
SP, 1997. p. 22. Dissertação [Mestrado em História Social].
25
A fonte oral tem o mesmo valor para construção do conhecimento histórico que os
documentos escritos, buscamos analisá-la e criticá-la como qualquer outro tipo de fonte
histórica, observando as intencionalidades no processo de construção das mesmas. José Carlos
S. Bom Meihy considera que “para serem garantidas como método, as fontes orais precisam
ser ressaltadas como nervo da pesquisa e sobre elas os resultados são efetivados”
20
.
O estudo da história oral é criterioso na análise e compreensão das narrativas, levando
em conta os embates e disputas em torno da construção das memórias individuais e sociais, e
a relação dialética entre memória e história, considerando-se os limites entre o individual e o
coletivo
21
. A história oral é um processo individual, que ocorre em um meio social, o coletivo
não impede a autonomia do processo de construção, é o indivíduo que pensa e faz da
oralidade sua ciência e arte. O que nos interessa é o que cada um consegue lembrar, a visão e
interpretação que cada pessoa empreende da sua experiência do passado e do presente.
No processo de construção do documento oral é necessário estabelecermos uma
relação de confiança e respeito entre o entrevistador e o entrevistado, havendo um
posicionamento ético entre eles, para que a entrevista possa fluir, “se torne uma troca de
experiências e não um mero questionário de perguntas e respostas onde o pesquisador
pergunta e o entrevistado responde”
22
, com resultados satisfatórios para ambos, estando-se
atento à análise dos silêncios, das emoções, da gestualidade, da vocalidade e da performance
dos depoentes (lembrando as discussões de Paul Zumthor
23
- sobre o estudo do corpo e
práticas corporais relacionados à memória), que dão significado à construção da oralidade.
Devemos estar atentos àquilo que os olhos capturam: os gestos, as feições, sorrisos e
lágrimas de quem narra a sua história, a análise dos pequenos detalhes para se compreender o
porquê de determinadas pausas, silêncios e repetições. É preciso respeitar o tempo de quem
fala, os silêncios, as muitas pausas e repetições, para depois buscarmos lê-los e entendê-los
24
,
direcionando a entrevista para questões pertinentes, respeitando quando os entrevistados
querem falar ou não, não os impedindo de pensar e exporem suas opiniões sobre determinado
assunto, com muitas perguntas sem parar para ouvi-los. Tais indícios devem ser anotados pelo
pesquisador e depois analisados juntamente com a voz reproduzida pelo gravador para se
compreender o sentido do que foi exposto no momento da entrevista.
20
José Carlos Sebe Bom Meihy. Manual de História Oral. 3. ed. São Paulo: Loyola, 2000. p. 31.
21
Alistair Thomson. “Recompondo a Memória: questões sobre a relação entre a história oral e as memórias”.
Projeto História: Revista do Programa de Estudos Pós-Graduados em História e do Departamento de
História/PUC-SP. n. 15 (Ética e História Oral). São Paulo: Educ, 1997. p. 51-84.
22
Franciane Gama Lacerda. Em Busca dos Campos Perdidos: uma história de trem e cidade. São Paulo: PUC-
SP, 1997. p. 19. Dissertação [Mestrado em História Social].
23
Paul Zumtor. Performance, Recepção e Leitura. São Paulo: Educ, 2000.
24
Franciane Gama Lacerda. Op.cit.. p. 19.
26
Outra questão esclarecida por Portelli
25
é que os indivíduos no processo de produção
de narrativas constroem e atribuem significado à sua própria existência e identidade social,
não havendo uma experiência pura, visto que a memória é constantemente reelaborada e
recomposta de acordo com o que é significativo para o indivíduo. A memória é seletiva, sendo
a identidade que molda as reminiscências dos indivíduos, compostas para dar sentido às suas
vidas passadas e presentes
26
.
O processo de construção da história oral ocorre no “momento da narrativa”, o que
presentifica e torna verdadeira a história evocada, e “[...] implica o resultado da articulação
lógica dos fatos encadeados no ‘tempo antigo’ e no ‘tempo dos acontecimentos”
27
, sendo a
narrativa o local de colagem e expressão de fragmentos, de estilhagem do passado que possui
múltiplas configurações sendo constantemente reescrito, retecido
28
.
O estudo de Janaína Amado
29
fala sobre a ética em história oral, esclarecendo algumas
questões sobre o relacionamento com o grupo social sobre o qual debruça a pesquisa. Ressalta
que o reconhecimento da validade do trabalho do historiador não está ligado às questões
políticas e ideológicas ou ao grau de interferência sobre o destino do grupo que pesquisa e
sim, as suas qualidades acadêmicas, pela capacidade de desvendar relações humanas e
compromisso profissional.
Portelli
30
fala em ética das responsabilidades, ou seja, devemos entende que estamos
lidando com pessoas, portanto devemos buscar respeitar seu tempo, circunstâncias e limites,
estando atento às diferenças e subjetividades, desenvolvendo a arte ouvir, escutar, estando
sempre prontos a ouvir mais do que falar e perguntar, agindo sempre com sensibilidade e bom
senso, buscando respeitar e resguardar as fontes, não havendo uma técnica ou modelo, para se
25
Alessandro Portelli. “Forma e Significado na História Oral: a pesquisa como um experimento de igualdade”.
Projeto História: Revista do Programa de Estudos Pós-Graduados em História e do Departamento de
História/PUC-SP. n. 14 (Cultura e Representação). São Paulo: Educ, 1997. p. 7-14.
26
Segundo Alistair Thomson. “Recompondo a Memória: questões sobre a relação entre a história oral e as
memórias”. Projeto História: Revista do Programa de Estudos Pós-Graduados em História e do Departamento de
História/PUC-SP. n. 15 (Ética e História Oral). São Paulo: Educ, 1997. p. 57, “nossas reminiscências também
variam dependendo das alterações sofridas por nossa identidade pessoal, o que me leva a um segundo sentido,
mas psicológico, da composição: a necessidade de compor um passado com o qual possamos conviver”.
27
José Carlos Sebe Bom Meihy. Manual de História Oral. 3. ed. (Revista e Ampliada), São Paulo: Loyola,
2000. p. 37.
28
Júlio Pimentel Pinto. “Os muitos tempos da memória”. Projeto História: Revista do Programa de Estudos Pós-
Graduados em História e do Departamento de História/PUC-SP. n. 17 (Trabalhos da Memória). São Paulo: Educ,
1998. p. 203-211.
29
Janaína Amado. “A Culpa Nossa de Cada Dia: ética e história oral”. Projeto História: Revista do Programa de
Estudos s-Graduados em História e do Departamento de História/PUC-SP. n. 15 (Ética e História Oral). São
Paulo: Educ, 1997. p. 145-155.
30
Alessandro Portelli. “Tentando Aprender um Pouquinho: algumas reflexões sobre ética e história oral”.
Projeto História: Revista do Programa de Estudos Pós-Graduados em História e do Departamento de
História/PUC-SP. n. 15 (Ética e História Oral). São Paulo: Educ, 1997. p. 13-49.
27
fazer uma boa entrevista, a não ser o compromisso ético e responsável consigo mesmo e com
os seus entrevistados, valorizando a cada indivíduo.
Durante o trabalho de campo, o historiador deve buscar ter uma postura ética,
seguindo as boas maneiras no contato com os entrevistados, sendo que, boas maneiras
significam além das normas de condutas sociais, assumir o lugar do outro, criando uma
igualdade sem ignorar as diferenças, colocando-se disposto a ouvi-los, instituindo um
ambiente e abertura suficiente para que possam se expressar.
Também Portelli ressalta a questão da ética na hora da interpretação dos documentos
orais, recomendando que devemos ser fiéis à origem dos discursos, estabelecendo um diálogo
entre as várias formas de construções das memórias e versões discursivas, sendo objetivos
sem negarmos a subjetividade.
Existe ainda outra forma do historiador ser ético, na restituição à comunidade, ou seja,
através da divulgação do seu trabalho, possibilitando que a voz dos indivíduos seja ouvida por
outras pessoas, levada para fora da comunidade, pondo fim a sensação de isolamento e
impotência
31
, contribuindo para que seu discurso tenha receptividade na sociedade. Mas isso
não é um imperativo, devendo-se levar em conta a sensibilidade.
O conjunto de relatos que apresentamos se baseia em experiências e memórias de
antigos moradores de Jacobina, que tinham participação ativa no seio da sociedade. Hoje
moram ou não em Jacobina, com faixa etária entre sessenta e noventa anos, se destacaram e se
destacam como memorialistas, compositores, poetas, poetisas, escritores e escritoras,
vivenciando o período de funcionamento da linha férrea de 1930 a 1950, relembrando e
recontando os tempos de uma Jacobina antiga, que segundo eles eram bons. São memórias
que afloram diante de muitos sentimentos, trazendo a lembrança e saudades de uma Jacobina
antiga, revivendo sonhos antigos quando se almejava e lutava-se com o trabalho individual,
por uma vida melhor.
Em seus testemunhos, essas pessoas recordavam o tempo em que se era produtivo e de
alguma maneira, com a força física ou produção cultural-intelectual, contribuíram para o
desenvolvimento da sociedade Jacobinense. Mas também, juntamente a essas recordações,
afloravam as lembranças de um tempo de alegrias, de diversão, de ir às festas, de fazer
serenatas e passeios à Estação. O que primeiro vinha à memória eram as brincadeiras de
31
Alessandro Portelli. “Tentando Aprender um Pouquinho: algumas reflexões sobre ética e história oral”. Projeto
História: Revista do Programa de Estudos Pós-Graduados em História e do Departamento de História/PUC-SP.
n. 15 (Ética e História Oral). São Paulo: Educ, 1997. p. 31.
28
crianças, vindo logo a lembrança de terem visto algum menino ou elas próprias se aventuram
a subir e se pendurando no trem em movimento.
Também entrevistamos ex-ferroviários, que residem em Jacobina e trabalharam na
ferrovia, mais precisamente, durante as décadas de 1940 e 1950. Relembram e até se
emocionam ao rememorarem a história e o tempo em que existia a Leste Brasileiro em
Jacobina, explicando o trabalho e funcionamento do ambiente ferroviário. Utilizamos nomes
fictícios ao nos referirmos à fala dos entrevistados a fim de resguardamos suas identidades.
Na transcrição das entrevistas foi usada a sigla F. M. S. para as iniciais do nome e
sobrenome da pesquisadora que fez a entrevista, Fabiana Machado da Silva. A. F. R. refere-se
às primeiras letras do nome de um dos ex-ferroviários entrevistados, alcunhado de Antonio
Francisco Rego e Valdir Serra Sena para outro entrevistado. Optamos por “limpar” o texto das
falas dos entrevistados, omitindo repetições e expressões utilizadas no discurso oral,
transcrevendo-as segundo a norma culta do português para facilitar a leitura e compreensão,
sem alterarmos seu conteúdo e significado original.
Os ex-ferroviários entrevistados foram trabalhadores da ferrovia, que participaram do
processo de implantação e funcionamento, exercendo várias funções na empresa ferroviária,
como a de trabalhadores e dos cargos de chefia a exemplo do Feitor* e Mestre de Linha*.
Hoje aposentados, com mais de sessenta anos de idade, residentes em Jacobina, eles passam
informações de suas próprias experiências individuais e as adquiridas através das lembranças
e conversas com colegas mais antigos. Também é necessário percebermos que eles
representam a ferrovia a partir de um olhar de hoje, reconstruindo a memória do passado a
partir de uma interação com o presente. A representação do passado no ato de narrar é
constituída aos poucos pela plenitude de suas significações, numa mistura dos muitos tempos
da memória, que compõem a tecitura das muitas histórias
32
.
As informações obtidas através das entrevistas com os ex-ferroviários passam uma
visão geral dos problemas e qualidades da empresa ferroviária, dizendo mais a respeito da
questão salarial, das condições de trabalho, do papel social dos operários e menos do estado e
condições funcionais da ferrovia, como se não quisessem trazer à tona tais questões, talvez
porque não as achassem relevantes ou porque quisessem ocultá-las por depreciarem a imagem
da empresa.
32
Júlio Pimentel Pinto. “Os muitos tempos da memória”. Projeto História: Revista do Programa de Estudos Pós-
Graduados em História e do Departamento de História/PUC-SP. n. 17 (Trabalhos da Memória). São Paulo: Educ,
1998. p. 203-211.
29
Nas visitas aos arquivos históricos das cidades de Jacobina, Salvador e Alagoinhas,
encontramos documentação pertinente à temática estudada. Fizemos o levantamento e a
descrição sumária de parte dos livros que se encontram no acervo da Biblioteca Municipal
Afonso Costa
33
(Jacobina/Ba), na seção Memória do Município, os quais estavam relegados
em estantes de aço, sem tratamento e organização alguma. Despendemos algum tempo
reconhecendo este material e percebemos tratar-se de documentos referentes à história
político-administrativa de Jacobina durante o período colonial.
Listamos a seguir as seguintes coleções, que dentre outras obras, compõem o acervo
desta biblioteca e que se tornaram importantes referências por abordarem aspectos do
cotidiano econômico e social de Jacobina, impactados pela linha férrea, nosso objeto principal
de estudo:
Anais do Arquivo Público do Estado da Bahia;
Anais do Arquivo Público da Bahia e do Museu do Estado da Bahia;
Coisas da Bahia (coleção de livros que trata da História da Bahia, da história da cidade
de Jacobina e de outros municípios baianos);
Documentos Históricos da Biblioteca Nacional (coleção de livros que trata da História
da Bahia, da história da cidade de Jacobina e de outros municípios baianos);
Memórias Históricas e Políticas da Bahia (coleção de livros que trata da História da
Bahia, da história da cidade de Jacobina e de outros municípios baianos).
Neste material, encontramos registros sobre o desbravamento e povoamento da região
do sertão baiano e da cidade em estudo, havendo referências à divisão das sesmarias, que
correspondiam às terras de Jacobina, que antes eram propriedade dos Guedes de Brito e dos
Garcia d’Avila. Nele relata-se a atuação destes desbravadores do sertão baiano até a elevação
de Jacobina à categoria de cidade, como também a atividade mineradora na região, com
informações inclusive sobre a quantidade de ouro exportado.
33
Afonso Costa nasceu no arraial de Palmeiras, então município de Jacobina, em 2 de agosto de 1885. Filho de
Manoel Gonçalves da Costa e de Dionísia de Almeida Costa, foi um autodidata que deixou a família e foi morar
em Salvador, passando a trabalhar no Instituto Histórico e Geográfico e a ter contato com estudos e
documentações oficiais sobre Jacobina, reunindo um valioso material e produzindo vários artigos sobre a cidade,
com um olhar positivista, característico da produção dos institutos históricos do país, sendo considerado como
um dos maiores pesquisadores da História da Bahia e de Jacobina. A Biblioteca pública da cidade, para onde foi
doada parte de sua biblioteca particular, cujos livros ficam na Sessão de Obras Raras e serviram de fontes para
pesquisa, possui o nome dele em sua homenagem.
30
Estes documentos contêm dados referentes ao comércio e à economia, como os
produtos mais comercializados e transportados pela linha férrea. Também trazem dados
populacionais para o período delimitado, especificando-se a quantidade de mulheres, homens
e crianças. Além da Legislação e Histórico da Estrada de Ferro da Bahia, faz-se referência ao
ramal que ia do município de Senhor do Bonfim à estação que ficava no povoado do França
34
,
no município de Piritiba, próximo a Jacobina e sub-ramal de Campo Formoso, trecho da
Estrada de Ferro São Francisco que passava por Jacobina, objeto deste estudo.
Continuando nossa busca por pistas sobre a cidade de Jacobina, analisamos parte da
documentação existente no Arquivo Público Municipal de Jacobina (APMJ) que, por estar em
fase de organização, foram disponibilizados poucos documentos de interesse para esta
pesquisa, selecionando-se, neste acervo, o Livro de Leis e Resoluções do Conselho
Municipal, de 1908 a 1915; o Livro de Registro de Ofícios, de 1950 a 1951; o Livro de Atos
do Prefeito de 1933 a 1938, Livros de Atas Municipais; o Código de Posturas Municipais, de
1933; Decretos e papéis diversos, documentos que refletiram os ideais, os desejos de mudança
e uma preocupação por parte dos poderes públicos em constituir a imagem de uma cidade que
estava se modernizando e tinha urgência na implantação de certos equipamentos urbanos.
Mediante a análise do Código de Posturas Municipais do ano de 1933, outra fonte de
pesquisa instigante e interessante, pelo aspecto revelador dos detalhes da constituição do
espaço social da cidade, foi possível percebermos as estratégias de controle elaboradas pelos
poderes públicos e a utilização desse documento como um mecanismo e instrumento
regulador e disciplinador dos modos de viver e das práticas cotidianas da população citadina.
Também analisamos alguns documentos que se encontram no Arquivo Público do
Estado da Bahia (APEB), tais como os Livros de Mensagens dos Governadores à Assembléia
Legislativa, correspondências e atos dos governadores, além de documentos da Secretária da
Agricultura e Comércio, anuários estatísticos e processos referentes à Leste Brasileiro, dentre
outros.
Para compreendermos a constituição e a estrutura de funcionamento da empresa
ferroviária estudada, analisamos os relatórios da Leste Brasileiro, referentes aos exercícios
dos anos de 1935 a 1948, que se encontram no setor de obras raras da Biblioteca Central do
Estado da Bahia (BCE), havendo exemplares dos relatórios dos anos de 1943, 1944 e 1948,
34
O povoado do França, no município de Piritiba, foi uma localidade próspera nos áureos tempos da Estrada de
ferro. Era uma das paradas do ramal Bonfim/Piritiba e também ficava ali instalada a única oficina de trens desse
trecho, onde eram feitos os reparos em locomotivas e vagões. Hoje esta estação e o galpão da oficina da Leste se
encontram em estado de total abandono e esquecimento pelo poder público. Estação do França está em ruínas.
Jornal Primeira Página, Ano X - 483, Geral - sessão memória/Outrora um marco de desenvolvimento, as
estações de trem estão abandonadas. Jacobina-Bahia, sábado, 30 mar. 2002. p. 2.
31
que também se encontram no acervo da biblioteca da Fundação Clemente Mariani (FCM). A
leitura e análise desses relatórios possibilitaram percebermos de forma mais ampla o
andamento e funcionamento da Leste durante esses anos.
Também analisamos os discursos e as visões construídas pela imprensa da época sobre
a modernização da cidade de Jacobina e a ferrovia
35
, que visavam atender aos mecanismos de
domínio e manipulação do poder, das técnicas e territórios urbanos, a partir de pesquisa no
periódico O Lidador
36
que circulou em Jacobina por uma década. Anterior ao processo de
digitalização, algumas reportagens referentes aos anos de 1934, 1935 e 1936 foram transcritas
e analisadas durante a pesquisa.
Enquanto circulou este jornal, os articulistas publicaram notas sobre política nacional
ou internacional, sendo um órgão veiculador de notícias e formador de opiniões
37
. Seus
autores escreviam como se estivessem apresentando Jacobina para o mundo e pudessem ser
lidos em outras partes do país, “sendo tamanha a força das indagações, conselhos e
reivindicações lançadas”
38
por eles. Nele publicavam-se artigos, poesias, propagandas
comerciais, notícias de sobre fatos do cotidiano da cidade e acontecimentos políticos
regionais, nacionais e internacionais. Como ressalta Sady,
a maioria das publicidades estava relacionada a medicamentos, ou pelo
menos o que se chamava de medicamentos. Havia um cronista espírita, coisa
muito rara na época, em uma cidade onde a maioria das pessoas era católica
e o diretor do jornal não era espírita. Muitas notícias sobre o cangaço, a seca,
obras públicas, instituições públicas e privadas, política, polícia e
sociedade
39
.
35
“Os jornais, como veículos de formação e de opinião pública, colaboram para construção de imagens sobre a
cidade e o seu cotidiano. Através da utilização de uma linguagem específica, com adjetivos e artifícios de
retórica, constroem uma forma de ver o outro e o mundo, ainda que este seja apenas uma cidade”. Ana Maria
Carvalho dos Santos Oliveira. Feira de Santana em Tempos de Modernidade: olhares, imagens e práticas do
cotidiano (1950-1960). Recife, 2008. p. 32. Tese [Doutorado em História].
36
Hebdomadário semanal de no máximo três páginas, o qual versava sobre os mais variados assuntos da política,
sociedade, saúde e religião. Politicamente de direita, era um misto de informativo cultural, tribuna popular e
jornalismo, deixando registros sobre a forma como os jacobinenses na época pensavam, agiam e interagiam com
o mundo. Foi fundado em 7 de setembro de 1933, sob a direção do senhor Nemesio Lima. Surgido após um
conflito entre seu futuro proprietário e o Coronel da cidade de Mundo Novo, o intendente Raul Victória. Tendo
sua sede na Praça da Matriz em Jacobina, e filiais em Juazeiro e França, circulando até 1943. Sendo seu principal
incentivador enquanto era impresso na cidade, o coronel Francisco Rocha Pires. Hoje se encontra digitalizado e
disponível para pesquisa no Núcleo de Estudos Orais (NEO), do Campus - IV/ Jacobina-Ba.
37
Pesquisando o jornal O Lidador, Cledson Sady concluiu que na década de trinta os periódicos eram, no
interior, os maiores veículos de comunicação. No caso específico dos avanços científicos, chegava ao senso
comum através de uma adequação dos escritores de tais periódicos, que normalmente buscavam a informação
através de jornais da capital. A imaginação era uma arma poderosa, assim como a falta de contestação de tais
fatos, por parte dos leitores. As esquinas eram o lugar onde tais avanços, anunciados no Jornal, eram julgados,
aceitos ou não”. Gledson Marlos Pinheiro Sady. O Lidador: ciência, janelas e esquinas da Jacobina dos anos
trinta”. A Letra em Revista. Jacobina-Ba: Academia Jacobinense de Letras, set. 2001. p. 33.
38
Gledson Marlos Pinheiro Sady. Op. cit.. p. 29.
39
Ibidem.
32
Ao que parecem, as pessoas que escreviam o jornal estavam muito bem informadas
das questões e “avanços” científicos, que estavam ocorrendo fora de Jacobina, (sendo
analisados temas como Segunda Guerra Mundial e integralismo, dentre outros) e também
podemos perceber sua ligação com os movimentos sociais e políticos, que apoiavam sua
continuidade, quando publicados temas polêmicos, a exemplo das matérias sobre espiritismo,
do articulista Paulo Bento
40
. Eles usavam da criatividade para atrair a atenção e curiosidade
dos seus leitores, principalmente, nos títulos chamativos de suas matérias.
A análise deste tipo de fonte permitiu-nos perceber como a cidade se mostrou nas
reportagens, tornando visíveis os problemas, conflitos e tensões sociais presentes no período
estudado, sendo possível perceber também como os poderes públicos buscavam criar um novo
ideal de cidade, que estaria no caminho do progresso, existindo uma preocupação por parte
dos mesmos com o embelezamento, a higienização e com a constituição do espaço urbano
pela população citadina.
Segundo pesquisa do professor Adriano Menezes sobre a imprensa em Jacobina, a
forma como era construído e o discurso ufanista utilizado no Jornal O Lidador levava a
construção de uma idéia personificada da cidade de Jacobina e a enxergar esse meio de
comunicação como seu “advogado e grande impulsionador”
41
, e ainda, segundo esse mesmo
autor, citando uma nota desse jornal, “aquele que a levaria [Jacobina] marchar galhardamente
pela estrada ampla do progresso”
42
, considerado como mais um signo do progresso e da
modernidade na cidade, “e que por isso deveria ser por ela recebido de braços abertos”
43
,
restando à população jacobinense ouvir suas opiniões e conselhos.
Percebemos que o jornal O Lidador se tornou instrumento disseminador dos novos
ideais de progresso e civilidade, adotando sempre um discurso que versava a favor de um
grupo social específico, os comerciantes. Esse jornal tomava sempre uma posição de crítica à
administração da empresa ferroviária Leste Brasileiro, passando sempre a idéia de uma viação
férrea desmantelada, desorganizada e caindo aos pedaços. Estas críticas encontram-se no
decorrer das matérias analisadas desse jornal sobre a Leste. Em específico, nos chamou a
atenção duas delas por terem em seus títulos esses adjetivos depreciadores com relação aos
40
“Que levou o ‘O Lidador’ a ser alvo de proibição por parte do ‘Bispo de Bomfim’, de ser lido pelos católicos,
sendo por fim, instrumento de homenagens e monções de apoio por parte jornalistas do Rio de Janeiro e
Salvador”. Gledson Marlos Pinheiro Sady. O Lidador: ciência, janelas e esquinas da Jacobina dos anos trinta”.
A Letra em Revista. Jacobina-Ba: Academia Jacobinense de Letras, set. 2001. p. 29.
41
Adriano Antonio Lima Menezes. “A imprensa sertaneja: uma busca de identidade cultural no Piemonte da
Chapada Diamantina”. In: Anuário de Pesquisa da UNEB, Salvador-Ba – Edição I. p. 5.
42
O Lidador, n. 1, 7 set. 1933. p.1 apud Adriano Antonio Lima Menezes. Op.cit.. p. 5.
43
Adriano Antonio Lima Menezes. Op.cit.. p. 5.
33
serviços e estado de funcionamento da empresa ferroviária. “A E’ste continua largando os
pedaços”
44
e “Companhia desorganizada”
45
.
Também consultamos alguns jornais que são anteriores ou posteriores ao nosso recorte
temporal e tiveram uma vida de circulação efêmera na cidade: A primavera, de 1917, O Ideal,
de 1927 (que deixou de existir antes de completar um ano), O Jornal, de 1960, que se
encontram no acervo documental do NEO e A Vanguarda, que circulou de 1955 a 1960, cujos
exemplares se encontram em mãos de particulares. Esses periódicos serviram para mostrar o
contexto da cidade anterior e também um pouco depois da chegada da ferrovia. As
reportagens desses jornais, apesar de não fazerem parte do recorte temporal da pesquisa,
trazem uma visão de Jacobina e da ferrovia dentro de uma mesma perspectiva modernizadora
e progressista.
Cabe apenas deter-nos na análise das reportagens do jornal O Lidador, pois circulou
mais tempo do que os outros jornais citados e foi um veículo disseminador dos ideais de uma
parcela da população reclamante da urgência de melhoramentos dos serviços públicos,
correspondentes aos anseios de uma cidade que estava se modernizando e nos rumos do
progresso.
Na Biblioteca Pública do Estado da Bahia (BPEB), no setor de periódicos,
pesquisamos no Jornal A Tarde do ano de 1919 a 1930. Este período foi coberto com algumas
lacunas, porque alguns exemplares não estão mais disponíveis para pesquisa, devido ao estado
de conservação precário dos mesmos. Este periódico consultado mostra a representatividade
que o município de Jacobina teve no Estado da Bahia no período, as principais questões que o
atingiram e também alguns dados sobre funcionamento da Leste na capital e no interior do
Estado.
Pesquisamos em jornais na intenção de encontrar notas e matérias referentes à cidade e
à ferrovia, de indícios e pistas sobre as mesmas, perguntando-nos e questionando: de que
maneira a população jacobinense vivia e se comportava nas décadas em estudo? Como
recebeu e encarou a chegada da ferrovia? Como esse fato era visto e transmitido pela
imprensa local da época? A escolha dos jornais a serem pesquisados não seguiu um critério,
mas a disponibilidade e facilidade de acesso, a busca de referências na impressa sobre
Jacobina e a Leste Brasileiro. Sobre as notas da imprensa transcritas neste trabalho, quando
necessário fizemos a alteração para o português atual, para facilitar a compreensão.
44
O Lidador, 14 set. 1934.
45
Idem, 19 out. 1934.
34
As fotografias, que utilizamos neste trabalho, foram cedidas pelo Núcleo de Estudos
de Cultura e Cidade (NECC) da UNEB/Campus IV - Jacobina-Ba e compõem parte do acervo
Memória Fotográfica de Jacobina, em processo de organização dentro deste núcleo, sendo
inseridas no texto de forma ilustrativa e descritiva, mas não deixando de reconhecer o seu
valor como fonte histórica, de leitura do texto citadino, analisado e decodificado a partir do
olhar e forma de percepção da realidade, enquanto uma produção do trabalho e ação humana.
uma relação direta entre a representação da visualidade fotográfica e o registro,
testemunho da implantação dos elementos da modernidade, contribuindo para a construção de
um discurso e ideal de cidade que estava nos rumos do progresso.
As fotografias dos principais espectadores fotográficos urbanos foram
também responsáveis pela constituição de um padrão visual da cidade,
notadamente moderno e higienizado, simbolizado através de imagens dos
locais que serviram de referências para Jacobina, sendo difundidas e
veiculadas em diferentes formatos e suportes, tanto internamente quanto fora
dela
46
.
Segundo Valter Gomes “desde o início do século XX, a fotografia cumpriu diversas
funções sociais a partir dos usos do seu artefato
47
. Ela apresentou-se como evocadora de
memórias, dos lugares da memória
48
, na constituição do espaço citadino e sua paisagem
urbana. Um dos locais de referência presente nas memórias dos entrevistados, que não pode
mais ser visto e que foi muito fotografado é a estação da Leste de Jacobina. O uso da
fotografia permitiu visualizar os espaços e ambientes anteriores e ligar o registro da cidade do
passado à visualização da cidade do presente. Mas a foto por si não permite conhecer o
contexto de sua produção e evocações, suas intencionalidades e significações.
Operando nos meandros da memória coletiva e individual em Jacobina, a
fotografia assume papel de legítimo patrimônio histórico e cultural da
cidade. Além de um valioso recurso da memória, a fotografia cumpriu
também diversas outras funções naquela sociedade como importante como
“objeto de coleção” e também “objeto de história”
49
.
Os fotógrafos da época em estudo geralmente registraram igrejas, praças, coretos,
prédios públicos, determinadas personalidades e fatos importantes como a inauguração de
novos equipamentos urbanos. Fotografou-se também o prédio da estação ferroviária em
46
Valter Gomes Santos de Oliveira. “Fotografia nas Fronteiras da Memória: Acervos, histórias e patrimônio em
Jacobina”. In: Anais Eletrônicos do IV Encontro de História - ANPUH-BA/UESB, 2008. p. 1.
47
Idem. Ibidem. p. 9.
48
Pierre Nora. “Entre Memória e História: a problemática dos lugares”. Projeto História: Revista do Programa
de Estudos Pós-Graduados em História e do Departamento de História/PUC-SP. n. 10 (História e Cultura). São
Paulo: Educ, 1993. p. 7-28.
49
Valter Gomes Santos de Oliveira. Op. cit.. p. 9.
35
Jacobina, as pessoas a espera do trem, o trem chegando à cidade, o pontilhão do trilho da
Leste e desastres ferroviários. Estes documentos fotográficos foram uma produção de
discursos que contribuíram para formar e conformar uma representação da implantação e
funcionamento da ferrovia, condizentes com os ideais pensados e propagados pelas elites
locais.
Tais fotografias demonstraram a importância e expectativas com a implantação e
funcionamento do transporte ferroviário, o que trouxe de modificações sociais para a
população. Por outro lado, esses documentos foram uma forma de testemunho e denúncia do
estado precário, de abandono e mau funcionamento em que, segundo a visão das elites locais,
encontrava-se a Leste Brasileiro em Jacobina, registrando a necessidade de melhorar e
investir-se no serviço de transporte ferroviário, no intuito de atender aos anseios das elites
jacobinenses.
Nos arquivos públicos localizados em Salvador, pesquisamos também no Instituto
Histórico e Geográfico da Bahia (IHGB), no setor da biblioteca Ruy Barbosa, examinando
alguns números das revistas publicadas pelo próprio instituto e livros referentes à ferrovia,
além do jornal Estado da Bahia de 1933.
No Arquivo Público Municipal de Alagoinhas (APMA), analisamos o Livro de
Registro de Cartas, Cartões e Memorandos de 1946- 1952 e o Livro de Registro de Ofícios da
Prefeitura de 1948- 1950. Esses documentos eram endereçados às chefias e inspetorias da
Viação Férrea Federal Leste Brasileiro (VFFLB) e das Oficinas de São Francisco, tratando
de diferentes assuntos relacionados ao seu funcionamento e participação na vida da cidade.
Embora esses documentos não façam parte do recorte espaço-temporal da pesquisa, eles
foram consultados para buscar mais informações sobre a ferrovia e Estação de São Francisco.
Em Alagoinhas, visitamos o acervo da Fundação Iraci Gama (FIGAM), importante
centro de referência para o estudo sobre a ferrovia São Francisco - onde se encontram vários
documentos e jornais que relatam o período de funcionamento da empresa ferroviária Leste
Brasileiro nos municípios baianos, como por exemplo, o livro publicado pela Rede
Ferroviária Federal, em comemoração ao 1º centenário da Viação Férrea Federal Leste
Brasileiro 1860-1960, além do Diário Oficial do Estado da Bahia 1823-1923, Edição
Especial do Centenário da Independência de 1923 e do Guia Geral das Estradas de Ferro e
Empresas de Transportes com elas Articuladas. G-1, Nomenclatura, posição, altitude, data de
inauguração, regime de funcionamento de estações, portos e agências, de 1960.
36
Restam ainda alguns esclarecimentos sobre o texto da Dissertação. O termo “elite” foi
utilizado no plural
50
, por representar uma diversidade que não pode ser tomada de forma
simples e unitária. O termo engloba as pessoas dos setores dominantes político-social e
economicamente, que possuíam prestígio e poder dentro da sociedade jacobinense, além
daqueles que compunham a parcela intelectual da população, detentora de um patrimônio
artístico-cultural e comercial, formada por um grupo de intelectuais membros da Academia
Jacobinense de Letras, poetas, compositores e memorialistas.
Os termos “crise”, “declínio” e “decadência” não são usados no sentido de
transitoriedade ou mesmo ruptura do processo histórico. Referem-se às fases e momentos na
história da empresa, e também à forma como era sentido e analisado pelos sujeitos e setores
sociais, o contexto e andamento do transporte ferroviário em Jacobina. “Trata-se, portanto, de
acompanhar as leituras históricas, sociais, políticas, econômicas e culturais que os homens de
uma época fazem de si mesmos na elaboração de suas identidades”
51
.
Algumas palavras utilizadas no texto são pouco conhecidas e de uso específico do
jargão ferroviário, por isso para esclarecer e facilitar o entendimento do leitor, elas contêm um
asterisco, indicando que fazem parte do Glossário.
Para melhor compreensão da temática apresentada, dividimos este trabalho em três
capítulos. No primeiro “Da vila agrícola à cidade comercial”, descrevemos como se
apresentava a cidade de Jacobina no início da sua história, quando era uma vila agrícola, antes
da chegada da ferrovia, depois passando a ser uma cidade comercial. Trata-se de perceber a
cidade desde o começo da sua história até o início do século XX , quando não tinha ferrovia,
de feição pouco moderna, a antiga vila colonial.
O segundo capítulo, A Leste e o Piemonte”, aborda a história da Viação Férrea
Federal Leste Brasileiro (VFFLB), o seu processo de formação e funcionamento, as etapas, o
contexto de crise econômica, de ficits financeiros e quedas na receita, a inserção dessa
empresa na cidade, como era realizado o trabalho no trem, o início da presença da ferrovia e o
seu dinamismo em Jacobina, trazendo aspectos mais modernos.
Este capítulo lança um olhar sobre a cidade e a sua relação com o transporte
ferroviário. Busca compreender, encontrar e construir os significados a partir do
entrelaçamento dessas duas histórias, que modificou uma a outra e reestruturou a paisagem
urbana e seus significados. Trata-se de tentar entender e viajar por caminhos e tempos
50
Sobre o uso do termo elite, ver Rinaldo Cesar Nascimento Leite. A Rainha Destronada: discursos das elites
sobre as grandezas e os infortúnios da Bahia nas primeiras décadas republicanas. São Paulo: PUC-SP, 2005. p.
14. Tese [Doutorado em História Social].
51
Idem. Ibidem. p. 17.
37
diversos, que compõem o espaço da cidade juntamente com seu trem. “De certa forma, a
história da cidade se confunde com a história do trem”
52
, a estação da Leste foi um dos mais
importantes referenciais da cidade, quando Jacobina era cortada pelos trens. Para muitos
moradores, falar da cidade era falar da Estação, mantendo-se viva a memória da Estação e seu
movimento.
No terceiro e último capítulo, “A ferrovia e as transformações em Jacobina”,
discorremos sobre o contexto da chegada do trem em Jacobina e sua influência, mostrando a
situação social da cidade no início da década de 1920. Também apresentamos um panorama
geral de algumas das transformações ocorridas em Jacobina associadas ao processo de
modernização e ampliação tecnológica principalmente no setor de transporte, em específico, o
ferroviário, que esteve diretamente relacionado à expansão da rede urbana e ao
desenvolvimento regional, mostrando como o espaço citadino se constitui e se modifica na
vivência cotidiana de seus moradores, tendo como um de seus agentes transformadores a
chegada da ferrovia.
Neste capítulo, mostramos a perspectiva de progresso em Jacobina depois da inovação
nos transportes. Destacamos as mudanças urbano-econômicas e sócio-culturais relacionadas à
chegada da Leste, além da implantação de novos hábitos, costumes e maneiras de agir na
sociedade jacobinense, após a chegada da ferrovia, buscando perceber como a cidade vai
adquirindo e estruturando feições mais modernas e urbanizadas, sendo um dos fatores
primordiais desse processo a vinda do trem.
Esboçamos ainda a conclusão a que chegamos com essa pesquisa a respeito da
importância e influência da Leste Brasileiro em Jacobina, dos significados e das
representações sociais da Leste para o povo jacobinense, enquanto elemento da modernidade
que contribuiu para tornar mais expressivo o ideal modernizador da cidade, associando-se a
implantação do equipamento ferroviário ao crescimento e desenvolvimento urbano-social de
Jacobina.
Com este estudo, pretendemos ressaltar a importância e organização de uma memória
deste município baiano, sobre o qual se têm poucas obras publicadas. Juntamente, buscamos
fornecer subsídios que ajudem na reconstituição da história das ferrovias da Bahia, e dentre
elas a de Jacobina, sobre a qual se tem pouca referência escrita. Objetivamos auxiliar ao
entendimento de aspectos que envolvem o ambiente ferroviário, a constituição, as disputas de
territórios e poder em Jacobina, bem como, trazer à tona as experiências de ex-ferroviários da
52
Franciane Gama Lacerda. Em Busca dos Campos Perdidos: uma história de trem e cidade. São Paulo: PUC-
SP, 1997. p. 32. Dissertação [Mestrado em História Social].
38
Leste Brasileiro e o significado da sua implantação para a população jacobinense, reavivando
a memória da ferrovia e dos trabalhadores dessa empresa.
39
CAPÍTULO 1 - DA VILA AGRÍCOLA À CIDADE COMERCIAL
1.1 A ORIGEM DO NOME JACOBINA.
São várias as versões sobre o significado e a origem do nome Jacobina. Segundo o
historiador Theodoro Sampaio, o termo Jacobina quer dizer “campo aberto”
53
e derivaria da
língua tupi, na qual significa, [...] espaço limpo, trecho calvo ou naturalmente despido de
vegetação
54
, o que justifica muito bem “[...] os desacertos e as façanhas de opulência que se
lhe emprestam”
55
. Na visão de Afonso Costa, essa significação indígena é lógica, “[...], pois o
aborígine via por aquelas terras todas, dimensões muito longas, espaços despidos da
vegetação umbrosa [...] e tudo aquilo para o íncola figurava, muito acertadamente,
Jacobina”
56
.
Além dessa versão de Theodoro Sampaio, o nome de Jacobina tem uma origem
lendária que é passada de geração a geração
57
, sendo contada até hoje, a qual remete para o
fato de que o nome da cidade teria sido originado da junção dos nomes de um casal de índios,
Jacó e Bina
58
, que habitavam aquela região e serviam como intermediários na relação
amistosa entre os forasteiros (portugueses e paulistas) e os índios daquela terra
59
. Segundo a
lenda, conta-se que este casal de índios, “[...] se encontrava como dominadores dos paiaiás,
os quais acolhiam os brancos aventureiros sem tanta animosidade, agasalhando-os nas suas
53
Banco do Nordeste do Brasil S. A.. Jacobina. Fortaleza-CE: Grafinort indústria gráfica, 1985. p. 6.
54
Afonso Costa. “Minha Terra: Jacobina de antanho e de agora”. Anais do Congresso Brasileiro de
Geografia. v. 2. Salvador: IGHB, 1918. p. 253.
55
Idem. Ibidem. p. 252.
56
Idem. Ibidem. p. 253.
57
Em seu artigo, “Segredos do acaso”, Maria da Conceição Rocha Marcelino relata que descobriu essa história
em um dos livros de seu pai, Quincas Marcelino, que tinha como título “Fatos históricos e pitorescos de
Caruaru”, de autoria de Rosalino da Costa e do amigo de seu pai, Zacarias Campelo, os quais relatavam: “Em
relação, porém, à nomenclatura toponímica, a coisa muda de figura. Cada lugar deve mesmo ostentar um nome
que faça lembrar algo que justifique”. Continuando, eles ressaltam a transmissão pela tradição oral da versão
lendária sobre a origem do nome Jacobina, afirmando terem conhecido um antigo comprador de couros, o velho
Pedu, que relatava essa história idílica de Jacó e Bina, que segundo eles “[...] nunca mais serão esquecidos
enquanto figurar no mapa baiano a velha cidade de Jacobina”.
58
Segundo a lenda, Jacobina “[...] tem seu nome de batismo na terminologia toponímica, em virtude da
interessante coincidência de haver morado ali, um casal, chamado respectivamente Jacó e Bina, que unidos pelo
coração através da benção nupcial, justapuseram-se, gramaticalmente, para dar o nome à terra de onde vinham
tirando, pelo suor do rosto, o pão de cada dia”. Maria da Conceição Rocha Marcelino. “Segredos do acaso”. A
Letra em Revista. Jacobina-Ba: Academia Jacobinense de Letras, set. 2001. p. 52.
59
“Os desbravadores tinham acesso à choupana desse casal de índios, usando o Rio Itapicuri Mirim que, como
todos os rios históricos, serviam de caminho às expedições desbravadoras”. Banco do Nordeste do Brasil S. A..
Jacobina. Fortaleza-CE: Grafinort indústria gráfica, 1985. p. 6.
40
tabas, acarinhando-os, por fim”
60
. Depois de anos Jacó e Bina morreram adoentados, e para se
fazer menção a essas figuras lendárias, que ali viveram, uniu-se “[...] para a nova rmula
onomástica os elementos que se baseavam nos apelidos do venturoso par”
61
, passando a grafia
do vocábulo por várias mudanças, “[...] Jacobinna, Jacoabinna, Jacoabina e Jacuabina,
como se verifica de Antonil, Rocha Pita, Gabriel Soares e correspondências oficiais
coletâneas deles, e, dos termos do século [...]”
62
, até chegar, a forma do falar brasileiro e
baiano, que une, encurta e dá outro formato às palavras, à escrita atual mais simples, Jacobina.
Mas tudo isso não passa de uma lenda em torno da origem do nome da cidade de
Jacobina, veiculada através da tradição oral, figurando como estatuto de verdade entre a
população local, sendo que, se pode considerar como mais aceita a opinião de Theodoro
Sampaio, segundo suas investigações e leituras, das obras de José Andrei Antonil,
O nome da cidade de Jacobina é de origem muito duvidosa. Houve
tempo em que procurei investigar isso e consegui verificar que em
documentos antigos, e na obra de André João Antonil (Cultura e
Opulência do Brasil, do princípio do século XVIII), se dá esse nome
com a grafia Jacuabina ou Jacoabina, sem nenhuma explicação
quanto a sua procedência
63
.
Tais questões não dizem respeito diretamente à temática desta pesquisa, mas mostram
quão encantadora é a constituição dos elementos que compõem a história de Jacobina.
Também reforçam a idéia do povoamento dos sertões de Jacobina, forjada da miscigenação
entre brancos e índios. Assim, “a revalorização do antepassado indígena funcionou como um
amálgama para cimentar a coesão de um grupo bastante disperso e com cismas internos
avolumados e graves [coronéis e administração do Estado]”
64
. A problematização do processo
de colonização de Jacobina e a participação dos íncolas ligados as atividades da pecuária,
levou a questionamentos sobre a presença e invisibilidade da população afrodescendente em
Jacobina, no século XIX, discutidos na Tese de Doutorado do professor Raphael
RodriguesVieira Filho
65
.
60
Afonso Costa. “Minha Terra: Jacobina de antanho e de agora”. Anais do Congresso Brasileiro de
Geografia. v. 2. Salvador: IGHB, 1918. p. 253.
61
Ibidem.
62
Idem. Ibidem. p. 252.
63
Idem. Ibidem. p. 253-254.
64
Raphael Rodrigues Vieira Filho. Os Negros em Jacobina (Bahia) no Século XIX. São Paulo: PUC-SP, 2006. p.
41. Tese [Doutorado em História Social].
65
Idem. Ibidem. p. 1-240.
41
1.2 DADOS FISIOGRÁFICOS DE JACOBINA.
Figura 1 - Vista Panorâmica de Jacobina. Autor: Juventino Rodrigues, 1930.
Fonte: Núcleo de Estudos de Cultura e Cidade da Universidade do Estado da
Bahia, Campus IV.
A fotografia acima é uma das mais antigas vistas panorâmicas da cidade, encontradas
e registradas. Mesmo a imagem não estando tão nítida, nos possibilita ver a fisiografia da
década de 1930. Jacobina está localizada na zona fisiográfica do Nordeste baiano, na
mesorregião central do norte baiano, mais precisamente na região econômica do Piemonte da
Chapada Diamantina
66
entre serras, desfiladeiros e microrregião das Serras de Jacobina, da
qual é sede administrativa, fazendo parte da região semi-árida do Estado da Bahia e incluída
no chamado polígono das secas.
66
Região localizada na área central do Estado, que integra a área do semi-árido do nordeste brasileiro. Conforme
censo do IBGE de 1980, composta de 16 municípios, entre os quais o de Jacobina se destaca. Região de contorno
irregular e relevo acidentado, montanhosa e de difícil acesso, cujo povoamento derivou de três fatores de
relevância distintas, complementares e diferenciadas: as missões, a pecuária extensiva e a mineração.
42
Figura 2 - Mapa do Estado da Bahia. Fonte: “Jacobina”.
In: Wikipédia, a enciclopédia livre. Disponível em:
<http://pt.wikipedia.org/wiki/Jacobina>. Acesso em: 8 de
março de 2008.
O mapa acima traz a localização do Município em relação ao Estado e sua capital.
Jacobina possui uma área total de 2.328,9 km
2
, com uma população de 96.131 habitantes e
densidade demográfica de 41,28 hab/ km
2
.
Distante da capital do Estado 281 quilômetros,
com 11º10’52” de Latitude Sul e 40º30’31” de Longitude W.Gr. Limitava-se com os
municípios de Morro do Chapéu e Miguel Calmon pelo lado Sul; Campo Formoso a Oeste;
Riachão de Jacuípe, Santa Luz e Queimadas a Leste; municípios de Saúde, Mirangaba e
Anselmo Fonseca ao Norte
67
. Hoje devido ao processo de desmembramento do seu
território
68
, limita-se ao Norte: Mirangaba, Saúde e Caém; ao Sul: Várzea Nova e Miguel
Calmon; ao Leste: Serrolândia, Quixabeira e Capim Grosso; ao Oeste: Ourolândia como
está representado na figura abaixo do mapa da divisão político-administrativa da região, sede
de Jacobina.
67
Banco do Nordeste do Brasil S. A.. Jacobina. Fortaleza-CE: Grafinort indústria gráfica, 1985. p. 12.
68
“O primeiro desmembramento de Jacobina ocorreu em 1746, quando se emancipou a Freguesia de Urubu de
cima, com sede na atual Paratinga”. Secretária da Indústria e Comércio da Bahia, IPAC - Ba. “A descoberta de
ouro”. Inventário de Proteção do Acervo Cultural; monumentos e sítios da Serra Geral e Chapada Diamantina.
v. 4. Salvador, 1980. p. 16.
43
Figura 3 - Mapa da Região de Jacobina. Fonte: SEI (2004)
Apresenta um relevo acidentado na parte central, chegando a ser montanhoso,
existindo noutros trechos, planaltos, planícies e extensas áreas de caatingas, sendo os picos
dominantes as serras da Bananeira e Tombador. De clima em geral quente, com períodos de
chuvas regulares nas áreas das grotas, subsolo rico em minérios (ouro, diamantes, ametista,
salitre e silício) e uma rica fauna e flora
69
.
O município de Jacobina situa-se entre as bacias hidrográficas do Rio do Ouro e do
Rio Itapicuru-Mirim, que nasce na Serra do Tombador e corre de Oeste para Leste, passando
no meio da cidade. O ouro que ficava nas serras descia e se depositava nos leitos dos rios da
cidade, permitindo a faiscagem do ouro de aluvião. Segundo Doracy Lemos
70
, Jacobina, “[...]
por essa razão é apelidada carinhosamente de ‘Panela de Ouro [...]’”. Conhecida como
“cidade do ouro” porque é a região mais antiga onde se encontrou ouro na Bahia.
Jacobina também, pela constituição geográfica, situada num vale rodeada de várias
cadeias de serras, é conhecida como Cidade Presépio
71
. “[...] Vista de cima é uma cidade que
encanta os olhos, pois remete a uma imagem presepial
72
: uma cadeia de verdes montanhas, e
as águas dos rios entrecortam um amontoado de casinhas e sobrados policromáticos”
73
. “[...]
À noite, iluminada, é um espetáculo de luz, cor e brilho que extasiam os olhos do
69
Enciclopédia dos Municípios Brasileiros, nº. XX. Rio de Janeiro: IBGE, 1958. p. 351-352.
70
Doracy Araújo Lemos. “Jacobina”. A Letra em Revista. Jacobina-Ba: Academia Jacobinense de Letras, set.
2001. p. 37.
71
Ana Lúcia Gomes da Silva. “Leitura da Cidade: tessitura polifônica - representações simbólicas, políticas e
ideológicas à luz da semiótica”. A Letra em Revista. Jacobina-Ba: Academia Jacobinense de Letras, set. 2001. p.
25.
72
A idéia de cidade-presépio remete à caracterização do lugar onde se recolhe o gado, curral, a representação da
cena do nascimento de cristo, segundo o Evangelho.
73
Vanicléia Silva Santos. A “Civilidade” Chegando à Jacobina. p. 2 [Texto em processo de publicação].
44
observador”
74
. O espaço urbano e o panorama da cidade são compostos de “labirínticas ruas,
espaços reais e simbólicos, por onde transitam pessoas”
75
, como se pode ver na figura abaixo
da visão panorâmica da cidade, em 1950.
Figura 4 - Visão Panorâmica de Jacobina. Autor: Osmar Micucci, 1950. Fonte: Núcleo de Estudos de Cultura e Cidade da
Universidade do Estado da Bahia, Campus IV.
A área do município de Jacobina era de 5.245 km
2
, correspondendo a 0,91% do total
do Estado, compreendendo seis distritos: Jacobina (sede), Caatinga do Moura, Itaitu, Itapeipu,
São José do Jacuípe e Várzea Nova
76
. Com o fracionamento do seu território, que seguiu as
indicações e aos interesses dos chefes políticos locais, iniciado a partir do século XIX, outros
municípios foram surgindo: Monte Alegre/Mairi (1857), Morro do Chapéu (1864), Riachão
do Jacuípe (1878). “Por fracionamento destes, no final do século, eram doze os munípios
surgidos do primeiro termo da vila de Jacobina”
77
. No século XX este número se multiplicou
por três
78
. “Hoje está reduzido a 2.042 km
2
, constituído de quatro distritos incluindo a sede, e
de vários povoados”
79
.
Apesar de Jacobina ser caracterizada como uma cidade que faz parte da região da
Chapada da Diamantina e do Semi-árido Baiano, sendo incluída entre as cidades que
compõem e circunscrevem o polígono e geografia das secas, possui características
fisiográficas bastante peculiares que a diferenciam das outras cidades da zona na qual está
localizada.
74
Doracy Araújo Lemos. “Jacobina”. A Letra em Revista. Jacobina-Ba: Academia Jacobinense de Letras, set.
2001. p. 37.
75
Vanicléia Silva Santos. A “Civilidade” Chegando à Jacobina. p. 2 [Texto em processo de publicação].
76
Banco do Nordeste do Brasil S. A.. Jacobina. Fortaleza-CE: Grafinort indústria gráfica, 1985. p. 12.
77
Secretária da Indústria e Comércio da Bahia, IPAC - Ba. “A descoberta de ouro”. Inventário de Proteção do
Acervo Cultural; monumentos e sítios da Serra Geral e Chapada Diamantina. v. 4. Salvador, 1980. p. 16.
78
Ibidem.
79
Doracy Araújo Lemos. Op .cit.. p. 37.
45
Os principais fatores que levam a esta diferenciação e singularidade são a altitude, a
variação da temperatura e a precipitação. Considerando-se o parâmetro relacional de que a
cada 100 m de altitude, a temperatura aumenta e que está situada a 463 m de altitude
80
,
Jacobina, possui uma temperatura média de 23ºC, abaixo da dos municípios de clima semi-
árido, o que torna seu clima mais frio e peculiar.
Outro fator que distingue Jacobina é a sua caracterização e variação climática. Sendo
uma região que faz parte da área correspondente ao clima semi-árido do estado da Bahia,
possui uma variação de temperatura muito instável, de uma máxima de 29.2ºC e mínima de
18.9ºC
81
. Tal fato faz com que ela seja uma cidade com características climáticas
diferenciadas, de dias quentes e noites frias.
Por todos esses aspectos, optou-se por se considerar Jacobina como uma cidade
incluída na zona sertaneja do Estado da Bahia, tendo o conceito de sertão
82
, enquanto uma
construção e produção cultural, que analisa as cidades do interior baiano, mais afastadas da
capital, numa relação dicotômica e de oposição ao litoral.
Para se entender o contexto histórico e as transformações pelas quais passou o
município de Jacobina antes da chegada do trem é preciso entender e se reportar aos
elementos de povoamento e constituição da sua história, desde a formação da vila até o seu
desenvolvimento urbano.
A história do município se inicia no final do século XVII. Segundo consta, o
desbravamento da região onde se localiza Jacobina e a distribuição do seu território
principiaram em 1658, em propriedade dos D’ Ávila, proprietários da casa da Torre
83
.
Considerando que, “as terras desabitadas ou não, deveriam cumprir seu ideal: servir a
majestade real e seus súditos escolhidos”
84
, organizou-se um sistema de doação de terras e
concessão de sesmarias, pela cora portuguesa, sendo uma das principais atividades de
ocupação do território, a criação de gado.
A origem do seu povoamento, assim como de outras cidades do interior baiano se dá a
partir de três fatores que contribuíram para o desenvolvimento e ampliação do seu território:
80
SEI, 2004.
81
SEI, 2004.
82
Sobre o conceito de sertão ver: Janaína Amado. “Região, sertão, nação”. Revista Estudos Históricos. v. 8. n.
15. Rio de Janeiro, 1995. p. 145-151; Gilmar Arruda. Cidades e Sertões: entre a história e a memória. Bauru, SP:
Edusc, 2000; Erivaldo Fagundes Neves. “Sertão como recorte espacial e como imaginário cultural”. Politéia:
história e sociedade. Vitória da Conquista, g. 3, n. 1, 2003. p. 153-162.
83
Secretária da Indústria e Comércio da Bahia, IPAC - Ba. “Piemonte da Chapada Diamantina”. Inventário de
Proteção do Acervo Cultural; monumentos e sítios da Serra Geral e Chapada Diamantina. v. 4. Salvador, 1980.
p. 373.
84
Raphael Rodrigues Vieira Filho. Os Negros em Jacobina (Bahia) no Século XIX. São Paulo: PUC-SP, 2006. p.
44. Tese [Doutorado em História Social].
46
as missões jesuíticas, a pecuária e a mineração. Todos esses fatores contribuíram em
temporalidades e formas diferenciadas para a formação do seu cleo inicial, embora alguns
historiadores atribuam mais significado a mineração
85
.
A relação entre os fatores e a dinâmica do povoamento de Jacobina, tornando aquela
região rica em produção agrícola e mineral, bem como, em populações diversas é resumida da
seguinte maneira na Tese do professor Raphael Rodrigues:
Os exploradores [no século XVI e início do XVII], em suas viagens de levar
e trazer gado e procurar riquezas minerais, e também os religiosos sempre
passavam pelas terras de Jacó e Bina, tornando-se um local de encontro e
repouso dos vaqueiros e viajantes, em geral vindos do litoral para o sertão e
vice-versa. [...] Rapidamente os religiosos resolveram implantar as Missões e
os vaqueiros, seus currais na região. Um pouco depois os exploradores
fizeram as primeiras excursões e implantaram as minas
86
.
Desde o final desta centúria, Jacobina era um local de paradas dos tropeiros e
boiadeiros, aventureiros e bandeirantes que tinham destino ao Recôncavo e ao sertão. Logo
depois dos primeiros posseiros e vaqueiros chegarem à região, suas terras passaram a ser
usadas para engorda e descanso de gado, sendo uma forma de cumprir a cláusula de
povoamento por concessão de sesmarias do sertão baiano
87
.
A expansão do povoamento para o interior da capitania da Bahia em direção à área do
atual município de Jacobina com a atividade da pecuária tornou o povoado ponto de parada de
boiadas que seguiam o rio São Francisco em direção ao litoral, ou seja, “[...] plantaram-se os
currais e distribuíram-lhe as criações, os vaquejadores entrando o regaço inviolado da soberba
mataria [...]”
88
.
Segundo as afirmações de Afonso Costa,
Em torno da lagoa do Gago ficavam currais e vaqueiros, guardadores, com
encarrego de zelar a fazenda, enquanto pelos embrechados de serras da
Bananeira, do Ouro Fino, da Pílula eram as tabas dos Paiaiás, dominando a
embocadura do Rio do Ouro [...]
89
.
85
Segundo Josildeth da Silva Gomes. “Povoamento da Chapada Diamantina”. Revista do Instituto Geográfico e
Histórico da Bahia, n. 77. Salvador, 1952. p. 224. “A mineração foi, por excelência, o elemento fixador das
populações. Muito mais que a pecuária, foi o ouro que primeiro propiciou o surto de vilas e cidades do nosso
‘hinterland’”. “O fator que nos começos do século XVIII determinou o início de ocupação desta zona até então
deserta”. Idem. Ibidem. p. 227.
86
Raphael Rodrigues Vieira Filho. Os Negros em Jacobina (Bahia) no Século XIX. São Paulo: PUC-SP, 2006. p.
39-40. Tese [Doutorado em História Social].
87
Idem. Ibidem. p. 52.
88
Afonso Costa. “Minha Terra: Jacobina de antanho e de agora”. Anais do Congresso Brasileiro de
Geografia. v. 2. Salvador, Bahia: IGHB, 1918. p. 236.
89
Idem. Ibidem. p. 271.
47
A pecuária, a princípio ligada à produção açucareira, tornou-se uma das atividades
econômicas que impulsionou a economia baiana durante os setecentos
90
. Expandiu-se a
criação de gado para o interior dos sertões
91
, formando-se os currais que rumaram e seguiram
a margens do rio São Francisco, com os Ávilas e Guedes de Brito (séc. XVII). [...] Os
Guedes de Brito subiram o São Francisco, levando os seus rebanhos até o interior mineiro. Os
D’Ávila expandiram seus currais para o norte, cruzando o São Francisco e penetrando no
Piauí”
92
.
O início da exploração das terras de Jacobina deu-se com aventureiros em busca de
ouro. Os primeiros povoadores da região foram Belchior Dias Moreira, Antônio de Brito
Correia e mais tarde, os Guedes de Brito. Estes últimos vieram acompanhados de muitos
colonos e escravos, iniciando-se, também, por essa época, as atividades complementares de
criação de gado e de culturas agrícolas essenciais
93
. Dessa forma, “tudo ia a voga dos Guedes
e dos Britos, jamais lhes falhando o concurso de trabalhadores escravos para montagem de
suas ricas fortunas”
94
.
Estes desbravadores foram pioneiros na busca de minérios. A partir de 1693,
vivenciou-se uma verdadeira “corrida do ouro” nas serras de Jacobina, atraindo pessoas de
todas as condições socioeconômicas ao enriquecimento com a exploração desse metal
precioso. “O brilho do ouro, suas glórias e a representação de fortuna construíram no passado
a imagem da cidade de Jacobina associada ao sonho da ‘terra prometida’, lugar de trabalho e
riqueza para todos”
95
.
Como afirma Santos,
[...] a mineração gerou um processo de migração para a região e para
convergiam missionários franciscanos e jesuítas, empregados da coroa,
90
“A medida que se conquistava ao íncola suas terras, garantia-se a ocupação das mesmas com os currais de
gado, ocupação esta que embora rala e cheia de lacunas, não deixou de representar papel do mais salientes, sinão
o mais importante, na posse efetiva da maior parte do nosso território”. Josildeth da Silva Gomes. “Povoamento
da Chapada Diamantina”. Revista do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia, v. 77. Salvador, 1952. p. 217-
220.
91
“Chegou-se, em 1655, às cabeceiras do Itapicuru e do Jacuipe e repartiram-se as terras, três anos mais tarde,
em Jacobina e no São Francisco, que foram ocupadas por grandes currais de gado”. Secretária da Indústria e
Comércio da Bahia, IPAC - Ba. “Desbravamento do sertão”. Inventário de Proteção do Acervo Cultural;
monumentos e sítios da Serra Geral e Chapada Diamantina. v. 4. Salvador, 1980. p. 14.
92
Secretária da Indústria e Comércio da Bahia, IPAC - Ba. “Desbravamento do sertão”. Inventário de proteção
do Acervo Cultural; monumentos e sítios da Serra Geral e Chapada Diamantina. v. 4. Salvador, 1980. p. 14.
93
Banco do Nordeste do Brasil S. A.. Jacobina. Fortaleza-CE: Grafinort indústria gráfica, 1985. p. 4.
94
Afonso Costa. “Minha Terra: Jacobina de antanho e de agora”. Anais do Congresso Brasileiro de
Geografia. v. 2. Salvador, Bahia: IGHB, 1918.p. 271.
95
Sara Oliveira Farias. “Ouro, Desenvolvimento e Morte: a mineração na cidade de Jacobina”. In: Nancy Rita
Sento de Assis; Felipe Santos Magalhães (Org.). Anais do I de Seminário Cultura, Memória e Sociedade,
Santo Antonio de Jesus, 1 a 3 ago. 2006. Salvador: UNEB-EDUNEB. p. 40.
48
bandeirantes, escravos, índios escravizados, povoadores portugueses e
brasileiros, pobres garimpeiros, criadores de gado e camponeses
96
.
No século seguinte, a expedição de Robério Dias Moreira descobriu quatro palhetas de
ouro em terras jacobinenses (1701)
97
, cabendo, mais tarde, a Belchior Dias Moreira, “o
Muribeca”, encontrar mais metais preciosos na região, conforme descrição de Afonso Costa.
[...] Na ramificação de serras chamada de Jacobina, majestosas e de belos
panoramas pela sua elevação e cobertura verde de plantas rasteiras e até de
matas nas seladas enhumeiro, Belchior teria, de verificar a existência das
grandes minas de ouro e de metais preciosos soterrados, muito deles
encontrados por ensejo do descobrimento da localidade, brilhando à luz do
clarão do sol batendo-lhe a face nua. Se a expedição de Belchior Dias, como
trace o mencionado roteiro, partira de Pedra Furada (Jacobina) em direitura
do rio Salitre, vem em apoio de verdade a passagem da leva pelos rios Aipim
e Bananeira, do município de Campo Formoso, ‘onde minas de prata que
se supõem serem as do histórico Robério Dias
98
.
Coube ao bandeirante e desbravador das terras dos sertões, Belchior Dias Moreira,
abrir os caminhos para outros aventureiros dar continuidade ao devassamento e conhecimento
das terras do interior baiano
99
. Esteve à procura de enriquecer, e mediante a construção de
uma grande fortuna, conseguiu destaque social em uma sociedade de valores aristocráticos,
hierarquizada e desigual. Costa, ao se referir à chegada de Belchior Dias Moreira, fez uma
apologia à atuação e importância deste bandeirante para o desenvolvimento da então vila de
Jacobina.
A ambição de afortunamentos idealizados, de poderosas grandezas, para
triunfar por entre os coleios da vida social, conduziu o pioneiro de meus
sertões, o precursor das tomadas de minha terra, por sobre as escabrosidades
dos desertos da civilização, para a estrada reivindicadora que hoje lhe
rasgamos com os salmos de nosso rejuvenescimento
100
.
Depois de “Muribeca”, outros desbravadores chegaram à região no auge da mineração,
contribuindo para um crescimento desorganizado da cidade, acirrando a situação social e o
96
Vanicléia Silva Santos. Sons, Danças e Ritmos: a Micareta de Jacobina - Bahia (1920 a 1950). São Paulo:
PUC-SP, 2001. p. 33. Dissertação [Mestrado em História Social].
97
A coroa portuguesa já tinha conhecimento da existência de ouro nas terras de Jacobina desde esta época.
Secretária da Indústria e Comércio da Bahia, IPAC - Ba. “A descoberta de ouro”. Op. cit.. p. 15.
98
Afonso Costa. As Minas de Prata de Robério Dias à Luz da Crítica Hodierma: memória lida no I.G.H. da
Bahia. Anais do 4
º
Congresso Brasileiro de Geografia. Bahia: Livraria Econômica, 1915. p. 53.
99
“Belchior Dias Moreira, que prosseguiu as pesquisas de Gabriel Soares de Souza, explorou uma larga faixa do
sertão, que se estende da Serra de Itabaiana às cabeceiras do Paramirim sem penetrar na região montanhosa, mais
tarde conhecida como Chapada Diamantina”. Secretária da Indústria e Comércio da Bahia, IPAC - Ba.
“Desbravamento do sertão”. Inventário de Proteção do Acervo Cultural; monumentos e sítios da Serra Geral e
Chapada Diamantina. v. 4. Salvador, 1980. p. 14.
100
Afonso Costa. “Minha Terra: Jacobina de antanho e de agora”. Anais do 5º Congresso Brasileiro de
Geografia. v. 2. Salvador, Bahia: IGHB, 1918. p. 235.
49
cenário de desordem no Arraial, pois esta atividade atraía pessoas de várias localidades que
começaram a se agrupar de forma desordenada. “[...] À proporção que novas levas de braços
chegavam para o garimpo, o arruado à margem do rio Itapicuru Mirim ia crescendo
rapidamente, reunindo população bastante densa e heterogênea”
101
. A partir de 1701,
aumentaram-se os roubos, assaltos e assassinatos. Segundo Afonso Costa:
[...] afluem lhes primeiro as classes dos que não podem enfrentar de face a
sociedade, filiados do banditismo e capangas dos motins da gente ignara e
assassina, que as lavras minerais chegando fazem por exercer, exercem
muitas vezes, o domínio da roubalheira, do saque, do assassinato, da
violência inomináveis
102
.
O quadro de desordem social começou a melhorar quando o coronel Pedro Barbosa
Leal assumiu o governo do então povoado Missão de Sahy (Sede da Vila de Santo Antonio de
Jacobina) e gerenciou tanto as terras quanto a população. As medidas tomadas para esta
melhoria como determinado pelo governo da Bahia de D. Rodrigo da costa (1702-1705)
foram, a proibição e o controle da mineração clandestina, combatendo qualquer tipo de
desordem na região das minas
103
, além da criação e fundação de novas vilas para melhor
controle dos conflitos, como a vila de Jacobina, na missão franciscana de Sahy.
Por uma divergência entre Pedro Barbosa Leal e o rico e influente Garcia d’ Ávila
Pereira, o lugar escolhido para sede da recém criada Vila foi, sem muita preferência e
importância, a chamada Missão de Nossa Senhora do Sahy
104
, localizada nas terras de Garcia
d’ Ávila
105
, que não se conformou e protestou perante a coroa contra tal decisão que lhe
prejudicaria, com vários pedidos para que não se instalasse a Vila de Jacobina em suas terras,
segundo afirma Afonso Costa:
Garcia d’ Ávila, porém, não era nada pelos atos. Estomagara-se com o feito
de Barbosa Leal, contra o qual de cedo lançara protestação e, realizada a
vingança do coronel com a instalação em terras de Garcia d’ Ávila, este,
anchudo de poderes, prestigioso, impondo-se perante a coroa com os seus
multimilhões de cruzados, reclamou da metrópole a causa de semelhante
ação que lhe era prejudicial, documentando-se com mil pretextos
101
Banco do Nordeste do Brasil S. A.. Jacobina. Fortaleza-CE: Grafinort indústria gráfica, 1985. p. 04.
102
Afonso Costa. “Minha Terra: Jacobina de antanho e de agora”. Anais do 5º Congresso Brasileiro de
Geografia. v. 2. Salvador, Bahia: IGHB, 1918. p. 271.
103
“Embora proibida, prosseguia clandestinamente a mineração em Jacobina, em meio a muitas desordens”.
Secretária da Indústria e Comércio da Bahia, IPAC - Ba. “A descoberta de ouro”. Inventário de Proteção do
Acervo Cultural; monumentos e sítios da Serra Geral e Chapada Diamantina. v .4. Salvador, 1980. p. 15.
104
Aldeia indígena fundada por franciscanos em 1697, atualmente pertencente ao município de Senhor do
Bonfim.
105
Afonso Costa. Op. cit.. p. 239.
50
aparentemente justificados, contando que a vila de Jacobina em as terras de
sua propriedade não ficasse
106
.
Atendendo ao pedido de tão nobre súdito, Garcia d’ Ávila, o rei solicitou informações
a respeito do caso ao governador e vice-rei D. Vasco Fernandes César de Menezes, que
mediante portaria de 15 de fevereiro de 1724, mandou deslocar a sede da vila, por estar
situada distante das minas, buscando atender aos interesses locais e políticos, para o trecho da
serra onde agora temos a cidade, concretizando-se sua transferência
107
, em 05 de junho de
1724, para a Missão do Bom Jesus da Glória, outra aldeia de índios, também fundada por
franciscanos, em 1706, para catequese dos “Paiaiás”, construindo-se ali a igreja e o convento
do Bom Jesus da Glória, cuja cópia da carta de transferência confirma:
Quando foi o coronel Pedro Barbosa Leal a essas minas erigir vila por minha
ordem lhe encarreguei elegesse o sítio mais capaz e próprio de se utilizarem
esses moradores: depois de ereta a dita vila algumas queixas me chegaram a
respeito da distância, por cuja causa se dificultavam os recursos, mas como o
meu fim não seja outro mais que evitar a esses moradores o incômodo, v.m.
os ouça e mande pôr o pelourinho e fazer a câmara em parte onde os livre da
opressão da distância...
108
.
Como podemos ver pelo documento acima, a transferência foi realizada para atender
as solicitações políticas, servindo para controle dos garimpeiros e das minas e também ao
mesmo tempo contentar a população local que o estava disposta a se deslocar mais de vinte
e duas léguas de distância da sede do juizado até a região das minas
109
. “Mas os limites da vila
implantada não ficaram estabelecidos de forma clara em nenhum de seus documentos de
criação”
110
. Segundo Raphael Rodrigues Vieira Filho, “existem documentos denunciando uma
briga jurídica entre os donatários da região e os habitantes quanto a questão da instalação da
sede da Vila, do Juizado e pagamento de impostos. Mas isso não lança nenhuma luz ou traz
conhecimentos sobre os limites da Vila”
111
.
A extensão do termo da Vila de Jacobina correspondia a 300 léguas (1. 980,000 Km),
“em terras de propriedade da Casa da Ponte, dos Guedes de Brito, abrangendo desde Rio de
Contas, Monte Alto (atual Palmas de Monte Alto-Ba), Cachoeira, e indo até os limites com o
106
Afonso Costa. “Minha Terra: Jacobina de antanho e de agora”. Anais do 5º Congresso Brasileiro de
Geografia. v. 2. Salvador, Bahia: IGHB, 1918. p. 241.
107
Secretária da Indústria e Comércio da Bahia, IPAC - Ba. “A descoberta de ouro”. Inventário de Proteção do
Acervo Cultural; monumentos e sítios da Serra Geral e Chapada Diamantina. v. 4. Salvador, 1980. p. 15. Idem.
Ibidem. “Piemonte da Diamantina”. p. 373.
108
Idem, Ibidem. Afonso Costa. p. 245.
109
Conforme carta citada por Afonso Costa. Op. cit.. p. 239-241.
110
Raphael Rodrigues Vieira Filho. Os Negros em Jacobina (Bahia) no Século XIX. São Paulo: PUC-SP, 2006.
p. 54. Tese [Doutorado em História Social].
111
Idem, Ibidem. p. 55.
51
Estado de Sergipe incluindo a cachoeira de Paulo Afonso”
112
. Considerando-se a extensão das
principais vilas mineradoras, Jacobina e Rio de Contas, estendiam-se muito mais além da
Chapada Diamantina e Serra geral
113
. “Em direção norte- sul este território ia da altura do
atual município de Mirangaba até a fronteira Bahia-Minas; na direção transversal desde o Rio
São Francisco até 100 km da costa”
114
.
1.3 DA ALDEIA À VILA, OUVIDORIA DE JABOBINA.
As terras da Freguesia de Santo Antonio de Jacobina datam de 1682 e sua sede foi
erigida onde hoje é a cidade de Campo Formoso, dando-se início a expansão do território “das
Jacobinas"
115
, ou como era chamada antes, Jacobina Velha ou Freguesia Velha de Santo
Antonio de Jacobina, havendo imprecisões quanto à profusão de nomes parecidos
116
, sendo
suas terras desmembradas, dando origem à parte do terreno, que corresponderia à nova
Freguesia de Santo Antonio da Vila de Jacobina (criada somente em 1758)
117
, onde se
desenvolveu a sede da vila de Jacobina. Então esclarecemos e tiramos qualquer dúvida de que
a vila de Campo Formoso não é e nunca foi à atual “Agrícola Cidade de Jacobina” como ficou
denominada após passar à categoria de cidade
118
.
A freguesia fundada no povoado Missão do Sahy foi elevada à categoria de Vila
mediante carta régia de D. João V, datada em 5 de agosto de 1720
119
. Os requisitos básicos
que dão status de vila a um povoado e a liberação da mineração foram contemplados,
definitivamente, em 24 de junho de 1722
120
, quando fez jus ao título de Vila de Santo Antonio
de Jacobina e integrou as freguesias de Santo Antonio de Pambu e Santo Antonio de Urubu,
como nos mostra o documento assinado pelo coronel Pedro Barbosa Leal, que assumiu a
governança da Vila de Santo Antonio de Jacobina:
112
Enciclopédia dos Municípios Brasileiros, nº. XX. Rio de Janeiro: IBGE, 1958. p. 350.
113
Secretária da Indústria e Comércio da Bahia, IPAC - Ba. “A descoberta de ouro”. Inventário de Proteção do
Acervo Cultural; monumentos e sítios da Serra Geral e Chapada Diamantina. v. 4. Salvador, 1980. p. 15.
114
Ibidem.
115
Nos documentos antigos também encontramos referências a essa região que serviu de parada de boiadas,
como “As Jacobinas” ou as “Serras das Jacobinas”.
116
Raphael Rodrigues Vieira Filho. Os Negros em Jacobina (Bahia) no Século XIX. São Paulo: PUC-SP, 2006.
p. 54. Tese [Doutorado em História Social].
117
Idem. Ibidem. p. 53.
118
Afonso Costa. “Minha Terra: Jacobina de antanho e de agora”. Anais do 5º Congresso Brasileiro de
Geografia. v. 2. Salvador, Bahia: IGHB, 1918. p. 248.
119
Secretária da Indústria e Comércio da Bahia, IPAC - Ba. “A descoberta de ouro”. Op. cit.. p. 15.
120
Ibidem. Idem. Ibidem. “Piemonte da Diamantina”. p. 373.
52
Aos vinte e quatro dias de junho de 1722 anos, neste sitio do Sahy. Missão
de N. S das Neves, e freguesia de s. Antonio de Jacobina, nas casas de
missão onde de presente está pousado o coronel Pedro Barbosa Leal, fidalgo
da casa s.m., cavaleiro professo da Ordem de Cristo, a cujo cargo está a
incumbência das minas de Jacobina e a criação e ereção da vila de s. Antonio
de Jacobina por delegação e comissão que tem do Exmo.sr. Vasco Fernandes
César de Menezes, vice-rei e capitão general de mar e terra do estado do
Brasil
121
.
Depois da criação da Vila de Santo Antonio de Jacobina, a coroa portuguesa liberou e
passou a coordenar e fiscalizar a extração de ouro na região, “pois todo ouro e prata retirados
das minas do Brasil colônia deveriam passar por casas de fundição, instaladas aqui [Jacobina]
pela coroa portuguesa. Era a forma encontrada pela metrópole de resguardar os metais
preciosos, controlar as barras circuladas e de cobrar impostos sobre as peças [...]
122
. Outra
medida adotada foi a criação de meios de ligação (estradas) entre as regiões mineradoras,
facilitando assim o controle da circulação de ouro. “Um caminho ligando os dois centros de
mineração [Jacobina e Rio de Contas] é aberto por Pedro Barbosa Leal, em 1725, informando
existirem em funcionamento 700 bateias em Jacobina e 830 em Rio de Contas”
123
.
Por provisão do Conselho Ultramarino de 13 de maio de 1726, ordenada pelo
Governador da Metrópole ao Governador da Província da Bahia, para melhor controle da
arrecadação do dízimo sobre a quantidade de ouro extraída na região, foram criadas duas
casas de fundição na Província da Bahia, uma em Jacobina e outra em Rio de Contas
124
. A
descentralização dessas fundições de ouro somente funcionou até 1752, “quando nova
provisão [ultramarina] criou a casa de fundição de Arassuaí, Minas Gerais, mandando que alí
fosse fundido o ouro de Jacobina e Rio de Contas”
125
, passando em 1755 toda a fundição a ser
centralizada em Salvador
126
.
A casa de fundição em Jacobina foi instalada em 05 de janeiro de 1727
127
e funcionou
de 1728 a 1823; nos dois primeiros anos de funcionamento arrecadou 3.841 libras de ouro
128
-
valor este relativo, permitindo que Jacobina estivesse incluída entre as regiões de arrecadação
mineradora mais importantes do império colonial português. Segundo Fonseca, “isso
121
Afonso Costa. “Minha Terra: Jacobina de antanho e de agora”. Anais do 5º Congresso Brasileiro de
Geografia. v. 2. Salvador, Bahia: IGHB, 1918. p. 239.
122
Agnaldo Marcelino Gomes. “Casa de fundição de Jacobina”. A Letra em Revista. Jacobina-Ba: Academia
Jacobinense de Letras, Set. 2001. p. 6.
123
Secretária da Indústria e Comércio da Bahia, IPAC - Ba. “A descoberta de ouro”. Inventário de Proteção do
Acervo cultural; monumentos e sítios da Serra Geral e Chapada Diamantina. v. 4. Salvador, 1980. p. 15.
124
Agnaldo Marcelino Gomes. Op. cit.. p. 6.
125
Secretária da Indústria e Comércio da Bahia, IPAC - Ba. “A descoberta de ouro”. Op. cit.. p. 15.
126
Ibidem; Agnaldo Marcelino Gomes. Op. cit.. p. 6.
127
Onde hoje é o edifício dos Correios e Telégrafos.
128
Agnaldo Marcelino Gomes. Op. cit.. p. 6.
53
representou um relevante canal de articulação regional que se abriu no sertão da Bahia, tendo
Jacobina como uma das ou mais importante porta de entrada”
129
.
A atração migratória para a região das minas fez Jacobina crescer e avançar no seu
processo de povoamento, aumentando sua influência regional e estabelecendo uma relação de
poder e dominação sobre as cidades circunvizinhas. Como ilustra bem as palavras de Costa,
“Jacobina agrandava-se distribuindo o mando de sua autoridade pelas imensas terras que lhe
deram a governar”
130
. Segundo esse mesmo autor, “o ouro primeiro deu-lhe vida. [...]
secundariamente desenvolveu-a sendo a mais antiga vila dos sertões da Bahia, e de todas a de
mais importância a seu tempo”
131
.
A partir de então, Jacobina tornou-se um centro da zona sertaneja, firmando-se como
um dos pontos de confluência e principal porta de entrada para a Chapada Diamantina.
Tornou-se “matriz de povoamento de outras cidades do interior baiano com a descoberta de
ouro em suas terras”
132
.
Por resolução do Conselho Ultramarino de 10 de dezembro de 1734, foi instalada em
Jacobina a sede da Ouvidoria, estando “sob sua jurisdição além da vila de Jacobina, a de
Nossa Senhora do Livramento das Minas de Rio de Contas, as Minas Novas e partes de Serro
Frio”
133
, com todas as vantagens de uma comarca. De acordo com análise de Afonso Costa:
O Conselho Ultramarino, tomando na conta devida a justíssima explanação
que s.m. inspirara, criou a ouvidoria de Jacobina ou comarca de Baía da
parte do sul, pela resolução de 10 de dezembro de 1734, a qual, presentes ao
rei, foi ordenada a sua execução depois de octênio, pela Carta Régia de 3 de
julho de 1742, que instituiu a comarca
134
.
A instalação da Ouvidoria contribuiu ainda mais para o crescimento de seu comércio,
que passou a concorrer à liderança regional com as cidades de Salvador e Cachoeira,
principais centros comerciais e políticos da época
135
, observando-se que “tudo fora da
jurisdição da comarca da Bahia e de Sergipe, era comarca de Jacobina”
136
, e a partir daí, seu
129
Antônio Ângelo Martins Fonseca. Poder, Crise Regional e Novas Estratégias de Desenvolvimento: o caso de
Jacobina-Ba. Salvador: UFBA, 1995. p. 107. Dissertação [Mestrado em Arquitetura e Urbanismo].
130
Afonso Costa. “Minha Terra: Jacobina de antanho e de agora”. Anais do 5º Congresso Brasileiro de
Geografia. v. 2. Salvador, Bahia: IGHB, 1918. p. 236.
131
Idem. Ibidem. p. 272.
132
Vanicléia Silva Santos. Sons, Danças e Ritmos: a Micareta de Jacobina - Bahia (1920 a 1950). São Paulo:
PUC-SP, 2001. p. 33. Dissertação [Mestrado em História Social].
133
Raphael Rodrigues Vieira Filho. Os Negros em Jacobina (Bahia) no Século XIX. São Paulo: PUC-SP, 2006.
p. 55. Tese [Doutorado em História Social].
134
Afonso Costa. Op.cit.. p. 255.
135
Afonso Costa apud Vanicléia Silva Santos. Op.cit.. p. 34.
136
Raphael Rodrigues Vieira Filho. Op. cit.. p. 55.
54
território foi desmembrado, tornando-se, no século XVIII, um dos maiores municípios da
província.
Apesar desse relativo progresso e desenvolvimento com a atividade agrícola e aurífera,
entre fins dos setecentos e início dos oitocentos, a economia baiana passou por um processo
de reestruturação e mudanças, sobretudo depois da vinda da Família Real em 1808. A
Abertura dos Portos beneficiou a economia baiana, estimulando as trocas comerciais e o
investimento na produção agrícola, a indústria têxtil e as atividades de exploração de
diamantes em outras cidades como Mucugê, Lençóis e Andaraí (Chapada Diamantina), que
começaram a ganhar destaque regional, mudando-se assim o curso da história do sertão
baiano, atraindo o fluxo de aventureiros e mineiros para outras regiões mineradoras que
estavam surgindo.
As antigas áreas de exploração aurífera, como Jacobina e Rio de Contas, foram
atingidas por um momento de crise na década de 1800, devido ao êxodo dos mineradores para
as novas áreas de exploração aurífera, na busca por melhores condições de sobrevivência.
Essa situação piorou com a descoberta, em 1848, de jazidas de diamantes na Chapada
Diamantina, atraindo vários mineiros ávidos por novas aventuras.
No decorrer da segunda metade do século XIX, o declínio das atividades mineradoras
em Jacobina forçou a busca de alternativas que proporcionassem a manutenção de seu
desenvolvimento econômico. Passou-se a investir no fortalecimento da agricultura com a
acentuação da policultura e a introdução da cultura de mamona, algodão, feijão e outros
produtos, como também na ampliação e diversificação das suas atividades comerciais
137
.
Segundo Afonso Costa, “o comércio de Jacobina apareceu no final do século XVII, cresceu
com a afluência de garimpeiros à procura de ouro”
138
e, em seguida, com o comércio e
importação de gado de vários locais do Nordeste, transitando na região muitos homens e
riquezas. Jacobina transforma-se no “empório expedidor de fazenda, miudezas e ferragens
para os sertões de Bahia, Goiás e Piauí”
139
, gozando de prestígio e honra por suas transações
comerciais,estando entre os principais municípios baianos no início da década de 1920.
O enfraquecimento comercial da região foi decorrente do declínio da mineração que
expulsou enorme contingente populacional consumidor que, como vimos, transferiu-se para a
Chapada Diamantina. Esta situação foi responsável pela demora na elevação da Vila à
137
Antônio Ângelo Martins Fonseca. Poder, Crise Regional e Novas Estratégias de Desenvolvimento: o caso de
Jacobina-Ba. Salvador: UFBA, 1995. p. 120. Dissertação [Mestrado em Arquitetura e Urbanismo].
138
Afonso Costa apud Vanicléia Silva Santos. Sons, Danças e Ritmos: a Micareta de Jacobina - Bahia (1920 a
1950). São Paulo: PUC-SP, 2001. p. 34. Dissertação [Mestrado em História Social].
139
Afonso Costa. “Minha Terra: Jacobina de antanho e de agora”. Anais do 5º Congresso Brasileiro de
Geografia. v. 2.Salvador, Bahia: IGHB, 1918. p. 295.
55
categoria de cidade - o que ocorreu em 1880
140
ao receber o título de Agrícola Cidade de
Santo Antonio de Jacobina, mesmo possuindo uma forte vocação para a exploração mineral,
como exposto acima. Em 11 de janeiro de 1893 durante o governo provincial de Joaquim
Manoel Rodrigues Lima
141
, é que se efetivou a condição de cidade com a instituição do poder
executivo local, sendo o primeiro prefeito de Jacobina, Antonio Manoel de Mesquita, que
tomou posse neste mesmo ano
142
.
1.4 A CIDADE ANTES DO TREM.
Em razão da atividade mineradora e produção agrícola diversificada, Jacobina possuía
representatividade e importância econômica entre os municípios que compõe a região
Piemonte da Chapada Diamantina e sempre foi uma das principais portas de entrada para o
sertão, sobretudo após o ciclo da mineração
143
.
Apesar do engrandecimento em riquezas naturais e econômicas, a população de
Jacobina concentrou-se na zona rural de forma desordenada e conflituosa. Com aparência
física de um povoado, suas casas eram de palha e cresciam de forma irregular. A população
era etnicamente diversificada tanto na zona rural quanto perímetro urbano: “São rostos de
negros, índios, mestiços, brancos, europeus, que foram constituindo essa trama urbana ao
longo dos séculos”
144
.
Por sua vez, na área urbana, sede da cidade, verificaram-se poucos investimentos e
melhoramentos em serviços e equipamentos coletivos. Não havia fornecimento de água
encanada nem sistema de eletrificação nem meios de comunicação ou transportes, além dos
lombos de burros e muares sobre os quais se faziam a condução dos produtos da região.
A iluminação da cidade era feita por fifós* de querosene, antigos candeeiros ou
lamparinas, lampiões a gás, e algumas pessoas usavam velas para iluminar o interior das
140
Lei provincial nº. 2.049, de 28 jul. 1880.
141
Banco do Nordeste do Brasil S. A.. Jacobina. Fortaleza-CE: Grafinort indústria gráfica, 1985. p. 5.
142
Ibidem.
143
O jornal O Lidador, semanário que circulava na cidade, na década de 1930, faz constantes referências às
descobertas e desordens nas minas e à quantidade de jazidas de ouro extraídas das terras de Jacobina. Segundo
consta, muito ouro aluvião foi garimpado nos leitos dos rios que passam na cidade de Jacobina, depois ficou
escasso, entrando em declínio a mineração. O trabalho de exploração de ouro na época era feito pela Companhia
das Minas de Jacobina, fundada em 1880, e após um processo de decadência, iniciado em 1896, reaberta neste
período.
144
Vanicléia Silva Santos. A “Civilidade” Chegando à Jacobina. p. 2. [Texto em processo de publicação].
56
casas. A população, enquanto não possuía água encanada, principalmente aqueles que não
possuíam cisternas, utilizavam as águas dos rios para beber e uso doméstico, como tomar
banho e lavar roupas, prática que passou mais tarde a ser vista como uma cena de
anticivilidade e recriminada pela elite, como constatamos no texto da professora Doracy
Lemos ao relembrar a existência de tal cena urbana.
Em época não muito distante, quando não havia água encanada, era comum
verem-se as lavadeiras debruçadas sobre as pedras esfregando roupas,
enquanto outras peças eram estendidas nos coradouros de pedra, ou secando-
as nas balaustradas que margeiam os rios, emprestando àquele ambiente uma
paisagem bucólica
145
.
A educação formal também pouco cresceu em investimento. A maioria da população
era pouco instruída por quase não existir instituições de ensino na cidade. Apenas havia o
Instituto Senhor do Bonfim de Jacobina
146
(foi construído um prédio para abrigar a Escola
Normal de Jacobina, que sequer entrou em funcionamento). Este Instituto oferecia formação
até o curso Normal, o qual foi extinto para dar lugar ao curso Ginasial. A educação formal era
limitada. O Instituto Senhor do Bonfim de Jacobina não era suficiente para atender a todas as
crianças e jovens. Aqueles que quisessem continuar a estudar e ingressar na carreira de
Magistério ou em curso universitário tinha que se deslocar para a capital.
Em relação ao comércio, podemos dizer que era constituído por um pequeno centro
atacadista ainda pouco desenvolvido, com algumas lojas comerciais cujos donos exerciam
influência no interior da sociedade jacobinense. A população empregava-se na lavoura e
criação de gado, destacando-se a produção de ouro.
Mesmo com algumas imprecisões, devido a falta de estimativas populacionais
precisas, tivemos acesso a alguns dados da quantidade da população de Jacobina entre 1923 e
1933. Com relação à década de 1920, levantamos que o total da população da Bahia era de
3.334.465 habitantes, do qual 48. 804 em 1923 correspondiam a Jacobina
147
. Tal população da
Bahia, de 1928 a1932, era calculada em 4. 045.701 habitantes, sendo a parte do sertão e da
chapada estimada em 1.303.455, estando Jacobina em segundo lugar entre os principais
145
Doracy Araújo Lemos. “Jacobina”. A Letra em Revista. Jacobina-Ba: Academia Jacobinense de Letras, set.
2001. p. 37.
146
Alcira Pereira Carvalho Silva. “Lembranças do Centro Educacional Deocleciano Barbosa de Castro”.
Academia Jacobinense de Letras (Org.). Letras Douradas: Antologia. Jacobina, Bahia: Tipô Carimbos, 1998. p.
197.
147
Municípios do Interior-Jacobina”. Diário Oficial do Estado da Bahia. 1823-1923. Edição Especial do
Centenário da Independência. Bahia: Salvador, 1923. p. 562; F. Borges de Barros. “Os municípios da Bahia
(1823-1923)”. Ibidem. p. 520.
57
municípios, pelo número de habitantes, com o mesmo percentual indicado para o ano de
1923
148
.
Nesta época, o Estado da Bahia era uma das regiões brasileiras que mais crescia em
termos de população. Seja próximo ao litoral ou nas áreas dos sertões, a densidade
demográfica era alta, existindo 7 a 8 habitantes por quilômetro quadrado, sendo que sua
distribuição variava, segundo a intensidade da produção econômica, estando Jacobina entre as
zonas de maior atividade agro-mineradora. Tenta-se justificar o crescimento da população
mais pelo aumento da taxa de natalidade no Estado do que pelo efeito de ondas imigratórias,
pouco perceptíveis na época
149
. Tal justificativa não pode ser aceita como única, devendo-se
levar em conta outros fatores que interferem no crescimento da população, não esclarecendo e
nem ajudando a desvendar o contingente populacional em Jacobina.
Segundo cálculos encontrados no Livro de Mensagens dos Governadores de 1933,
expostos na tabela abaixo, o total da população da Bahia era de 4.432.812 habitantes,
sendo 351.648 da capital do Estado e o restante, dos municípios do interior, estando
Jacobina em oitavo lugar entre os municípios com maior número de população, ficando a
abaixo das cidades de Salvador, Feira de Santana e Vitória da Conquista, acima de Jequié,
Morro do Chapéu e Campo Formoso.
Tabela 1 - População do Estado da Bahia em 1932.
CIDADE POPULAÇÃO
1 Capital 351.648
2 Santo Amaro 113.764
3 Feira de Santana 103.946
4 Ilhéus 84.393
5 Macaúbas 84.093
6 Candeúba 80.767
7 Conquista 75.071
8 Jacobina 74.636
9 Jequié 65.943
10 Cipó 61.385
11 Itabuna 56.231
12 Esplanada 55.700
13 Monte Santo 55.446
14 Morro do chapéu 53.128
15 Caetité 52.340
16 Irará 50.292
17 Campo Formoso 50.131
População total do Estado 4.432.812
Fonte: Juracy Magalhães. Livro de Mensagens do Governador. Salvador:
Imprensa Oficial do Estado da Bahia, 1933.
148
Álbum Artístico, Comercial e Industrial do Estado da Bahia, organizado e editado por Manoel Rodriguez
Folgueira, dedicado ao governo do Exm°. Sr. Vital Henriques Baptista Soares. Edição Folgueira:
PerArduaSurgo; Brasil, 1930. p. 264 e 272.
149
Idem. Ibidem. p. 272.
58
A análise dos dados da tabela acima, mostra que são até certo ponto questionáveis. Os
mesmos demonstram um aumento significativo da população da Bahia de quase 100.000.00
mil habitantes em um período de dez anos. Em Jacobina por sua vez, houve um aumento de
mais de 25. 000.00 habitantes. Consideramos um crescimento populacional grande, em um
espaço de tempo relativamente curto, mas infelizmente não encontramos outros documentos
que confrontassem esses dados. De qualquer maneira, ressaltam que Jacobina estava entre as
cidades do interior, em franco desenvolvimento urbano, acarretado pelo aumento da
população. Este relativo crescimento trouxe sérios problemas para cidade em relação à
moradia, saúde e educação, devido a uma ocupação desordenada do espaço urbano
150
.
Se o desenvolvimento social, comercial e urbano de Jacobina, desde a sua origem até
as primeiras décadas do século XX, esteve atrelado às atividades agrária, mineradora e
comercial, será a chegada da ferrovia, aliada a outros fatores igualmente transformadores, que
impulsionarão e implantarão uma nova organização funcional da cidade, trazendo uma nova
dinâmica social.
150
Afonso Costa. “Duzentos Anos Depois: a então Vila de Jacobina”. Revista do Instituto Geográfico e
Histórico da Bahia. v. 48. Salvador, 1923. p. 277-282.
59
CAPÍTULO II A LESTE E O PIEMONTE.
2.1 HISTÓRICO DA LESTE BRASILEIRO.
A criação de novos meios de transportes no Brasil em meados do século XIX se
tornou algo necessário e indispensável para atender às exigências do mercado e à circulação
dos produtos industrializados vindos da Europa. As ferrovias foram criadas no Brasil na
tentativa de proporcionar agilidade e eficiência na circulação de bens e mercadorias,
favorecendo o desenvolvimento econômico para o país, sobretudo para as regiões onde
estavam sendo implantadas. Tendo por objetivo também ocupar e integrar as áreas dos
sertões, a ferrovia foi assim revestida de uma força simbólica, como se ela sozinha pudesse
levar o progresso ao restante do país. Segundo entrevista de Patrícia Moreira para o Jornal A
tarde, com o historiador Antonio Guerreiro, “na Bahia, a Maria fumaça cortava os sertões,
conduzindo passageiros e cargas, desenvolvendo o semi- árido, integrando o vasto território
do Estado e introduzindo a dinâmica da modernidade nos rincões mais afastados”
151
.
Não houve uma preocupação e planejamento para a construção de estradas de ferro no
Brasil, não se elaborando um plano nacional
152
para a rede ferroviária do Estado da Bahia, não
se organizando seu traçado de acordo com as necessidades das áreas mais férteis e de maior
produção, dirigindo-se, de forma invariável e sem planejamento, do litoral para o sertão. Isso
contribuiu para os resultados negativos e fracasso das mesmas, uma vez que faltaram-lhe a
completude dos ramais de ligação e falharam no objetivo a que se destinavam, resultando em
prejuízos, desgastes e déficits financeiros. Sua única preocupação era ligar o litoral ao sertão,
não importando a deficiência no intercâmbio entre os principais centros produtores
153
.
Como escreveu em suas “notas sobre o transporte ferroviário”, o engenheiro civil
Carlos Alberto de Azevedo Dantas Mendes:
A ausência, durante muito tempo, de um planejamento integrado das
diversas modalidades de transportes, aliada a fatores históricos e
151
Patrícia Moreira. “Maria Fumaça cortava os sertões levando a modernidade”. Bahia – Documento 5 -
Transportes e energia. Caderno 8. Jornal A Tarde, Salvador: quarta-feira, 15 mai. 2002. p. 2.
152
“Quem se der ao trabalho de observar o mapa da rede ferroviária do Estado, notará, á primeira vista, a falta do
plano nacional referido, que lhes garantisse o desenvolvimento, com os próprios elementos de trafego”. Mário
Tarquínio. “Vias de Comunicação e Meios de Transporte”. Revista do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia.
n. 60. Salvador. 1934. p. 325.
153
Idem, Ibidem, p. 325-326.
60
conjunturais, diretamente condicionados pelo subdesenvolvimento e pela
dependência econômica, impediram que essas distorções fossem corrigidas,
faltaram competência e vontade política
154
.
As discussões das diretrizes para a implantação de estradas de ferro no Brasil
iniciaram-se com a lei nº. 101, de 1835, conhecida como a Lei Feijó
155
, garantindo vantagens
e privilégios para a construção de estradas de ferro a fim de ligar o Rio de Janeiro às capitais
de Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Bahia. Entre outros benefícios, estabeleceu-se o
seguinte: “privilégio de quarenta anos, isenção de impostos de importação para todas as
máquinas durante os cinco primeiros anos, cessão gratuita de terrenos necessários à estrada
(se pertencessem ao governo), direito de desapropriação caso pertencessem a particulares e
prazo de oitenta anos para a concessão, caso não fosse cumprido seria revertido ao patrimônio
nacional”
156
.
Esta primeira lei ferroviária não obteve efeitos práticos, e tal projeto trouxe
expectativas e especulações sobre a viabilidade da ferrovia para a economia do país, havendo,
ainda mesmo na Europa, receio e resistência a esse novo meio de transporte. No Brasil,
analisava-se o nível de confronto entre os interesses dos defensores do trem e dos senhores de
engenho, além da viabilidade da manutenção do escravismo na ferrovia.
Se a necessidade de construção de estradas, ampliando a quilometragem e a
qualidade das mesmas, parecia ser tema consensual no século XIX o mesmo
não se pode dizer sobre as perspectivas “rodoviaristas ou ferroviárias”.
Muito se debateu sobre a viabilidade das ferrovias, se seus interesses eram
complementares ou antagônicos aos da grande lavoura e a sua relação com a
escravidão
157
.
A partir da década de 1850, setores da sociedade brasileira começaram a ver de forma
mais favorável a execução de um projeto, na época muito arrojado e de custos financeiros
significativos e com ele tentou-se novamente a construção de estradas de ferro no Brasil. Na
época, a lei nº. 641, de 1852, marcou efetivamente o início da história da ferrovia no Brasil
158
.
Esta lei foi mais objetiva que as anteriores. Seus argumentos eram mais fundamentados e
convincentes, pois concedia mais privilégios e incentivos financeiros para quem quisesse
154
Carlos Alberto de Azevedo Dantas Mendes. Notas Sobre o Transporte Ferroviário. Salvador: [s.ed.], 19 mar.
2004.
155
Sancionada pelo regente do Império Diogo Antonio Feijó, em 31 out. 1835.
156
Trens e Cia: ferrovias no Brasil - breve história. Disponível em: <http://br.geocities.com/hptrensecia/fevbras.html>.
Acesso em: 21 jan. 2002.
157
A Estrada de Ferro. Disponível em: <File: // E:/historia/Estrada 1. Htm>. Acesso em 23 jan 2003.
158
Trens e Cia: ferrovias no Brasil - breve história. Disponível em: <http://br.geocities.com/hptrensecia/fevbras.html>.
Acesso em: 21 jan. 2002. Joaquim Wanderley de Araújo Pinho. “A Viação na Bahia”. Diário Oficial do Estado da Bahia.
1823-1923. Edição Especial do Centenário da Independência. Bahia: Salvador, 1923. p. 132.
61
investir na construção de estradas de ferro. Além disso, proibia a utilização de mão-de-obra
escrava e dispensava os trabalhadores ferroviários do serviço militar
159
.
Com essas reformas na lei, o governo brasileiro esperava atrair capitais nacionais e
estrangeiros, sobretudo ingleses, a fim de levar avante o transporte ferroviário no país,
tornando o investimento em ferrovias um negócio atraente para as empresas
concessionárias”
160
. Segundo Souza,
mesmo aquelas ferrovias que, inicialmente, se mostraram economicamente
deficitárias, com o passar dos anos, passaram a ser consideradas como vitais
para a economia e o projeto político integracionista do Estado, que se dispôs
a assumir os riscos cambiais e a financiar, por meio da garantia dos juros,
grande parte desse empreendimento
161
.
A construção da viação férrea no Brasil se concretizou dezenove anos depois, com a
inauguração, em 30 de abril de 1854, do primeiro trecho da ferrovia Rio de Janeiro-Petrópolis,
depois conhecida como Estrada de Ferro de Mauá
162
. Em 1852 foi feita a concessão a Irineu
Evangelista de Souza, Barão de Mauá
163
, para construção da estrada de ferro, com 14, 5 km,
entre o Porto da Estrela na baía de Guanabara (Rio de Janeiro) e a localidade Fragoso
(Petrópolis), cujos trilhos somente chegaram à serra da Estrela dois anos depois
164
. Esta
estrada é a primeira do Brasil e da América Latina
165
. Tinha como objetivo ligar os principais
159
Trens e Cia: ferrovias no Brasil - breve história. Disponível em: <http://br.geocities.com/hptrensecia/fevbras.html>.
Acesso em: 21 jan. 2002. Joaquim Wanderley de Araújo Pinho. “A Viação na Bahia”. Diário Oficial do Estado da Bahia.
1823-1923. Edição Especial do Centenário da Independência. Bahia: Salvador, 1923. p. 132.
160
Robério Santos Souza. Experiências de Trabalhadores nos Caminhos de Ferro da Bahia: trabalho,
solidariedade e conflitos (1892-1909). Campinas, SP. 2007. p. 22. Dissertação [Mestrado]-Universidade Estadual
de Campinas, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas.
161
Ibidem.
162
Iraci Gama Santa Luzia. Rede Ferroviária em Alagoinhas - Passando pelo Histórico da Ferrovia na Bahia,
no Brasil e no Mundo, p. 1. [Texto em processo de publicação]. Esta troca de nome foi uma questão de ordem
política, que tinha como objetivo apagar a importância de D. Pedro II para o início da história dos transportes
ferroviários no Brasil. Isso depois irá mudar e esta principal estação ferroviária passou a se chamar Estação D.
Pedro II.
163
Coube ao Visconde de Mauá o privilégio de ser o pioneiro do transporte ferroviário Nacional. “O título de
barão de Mauá, foi lhe dado por D. Pedro II, após a inauguração dos primeiros quilômetros da via férrea no
Brasil. 30 de abr. 1854”. Revista do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia, fundado em 1894, reconhecido de
utilidade pública pela lei n° 110 de 13 ago. 1895, n° 67, 1941. p. 252.
164
“Por esta Estrada fazia-se o transporte de cargas e passageiros, por meio de conexão com a barca a vapor
‘Guarani’ que vinha da Prainha, Praça Mauá, ao ponto inicial da ferrovia, a estação de Guia de Pacobaíba”.
Rede Ferroviária Federal S. A. Superintendência de Patrimônio. Gerência de Preservação do Patrimônio
Histórico Ferroviário. Manual de Preservação de Edificações Ferroviárias Antigas/Rede Ferroviária Federal S.
A. Rio de Janeiro: RFFSA, 1991. p. 22.
165
“Inaugurando os primeiros quilômetros de caminhos de trilhos, que o povo crismou com o nome de ‘Estrada
de Ferro de Mauá’, mostrou Irineu Evangelista de Souza que a fumaça da locomotiva não matava a passarinhada
dos arredores, como receiava em França e se propalava no Brasil; que o barulho do camboio não causava estouro
das boiadas, nem afugentava os galináceos das margens da via férrea; que o deslocamento de ar á passagem de
dois trens não produzia asfixia nos seus viajantes, nem ocorreriam os outros males apontados pelos que
combatiam a sua construção”. Revista do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia, fundado em 1894,
reconhecido de utilidade pública pela lei n° 110 de 13 ago. 1895, n° 67, 1941. p. 253.
62
círculos produtores de café, que eram Santos, São Paulo e Jundiaí, buscando-se através desta
ligação estender o domínio dos produtores de café e contribuir para o desenvolvimento do
país. Devido às limitações que enfrentou para seu término, esta ferrovia foi absorvida e
incorporada pela The Leopoldina Railway em 1883, sendo depois extinta.
As ferrovias brasileiras, de um modo geral, foram construídas por iniciativas e
investimentos de capitais estrangeiros ou de concessões do governo feitas à particulares. A
maioria concedia reserva de mercado às companhias capitalistas sem qualquer garantia do
empreendimento dar certo, oferecendo-se também garantia de juros e exclusividade de
tributos ao empreendimento ferroviário
166
. Isso ocorreu devido à falta de capital do império
brasileiro para investir na construção de estradas de ferro.
No ano de 1855, foram feitas várias concessões à construção e exploração de estradas
de ferro no Brasil. Neste ano, sob a forma de sociedade anônima, foi criada a Estrada de Ferro
D. Pedro II (depois E. F. Central do Brasil)
167
no Rio de Janeiro, com o objetivo de ligar esta
cidade a São Paulo, e em seguida, até Minas Gerais, tendo sido seu trecho inicial, com uma
extensão de 48,2 km, do Rio de Janeiro à localidade fluminense de Queimados, inaugurado
em 29 de março de 1858
168
. A criação desta ferrovia buscou articular e impulsionar o
desenvolvimento econômico das regiões Sul e Sudeste do país.
Das empresas ferroviárias implantadas no Brasil, uma das mais importantes foi a
Viação Férrea Federal Leste Brasileiro (VFFLB), propriedade do Governo Federal, em
funcionamento desde 1860 e federalizada em 1935
169
. Teve como diretor, durante alguns
anos, o engenheiro Lauro Farani Pedreira de Freitas
170
. Serviu e interligou com suas linhas e
ramais vários Estados como Bahia, Sergipe, Pernambuco, Piauí e Minas Gerais. Esta empresa
166
Francisco Antônio Zorzo. “Retornando à História da Rede Viária Baiana: o estudo dos efeitos do
desenvolvimento ferroviário na expansão da rede rodoviária da Bahia (1850-1950)”. Sitientibus. Feira de
Santana. n. 22. jan./jun. 2000. p. 101.
167
Pela lei nº. 1.599, de 9 mai. 1855.
168
Rede Ferroviária Federal S. A. Superintendência de Patrimônio. Gerência de Preservação do Patrimônio
Histórico Ferroviário. Manual de Preservação de Edificações Ferroviárias Antigas/Rede Ferroviária Federal S.
A. Rio de Janeiro: RFFSA, 1991. p. 22.
169
José Trajano. História da Viação Férrea Federal Leste Brasileiro. [s.n.t.]. p. 1.
170
Este engenheiro civil “ocupou vários cargos de relevo, entre os quais o de superintendente da antiga
Compagnie de Chemins de Fer Federaux de l’Este Brésillienne. [...] Foi presidente da caixa de aposentadoria e
Pensões dos Ferroviários da Bahia e Sergipe, cargo que exerceu de 1931 a 1943”. Cartilha Histórica da Bahia:
A Bahia e seus Governadores. 4. ed. (revista e aumentada). Editora Continente; PerArduaSurgo:
Brasil/Bahia,1986. p. 311.Também teve participação na história da política baiana na década de 1940, como
Deputado Federal pelo PSD, chegando a candidatar-se ao governo do Estado em 1950, falecendo em acidente
aéreo em plena campanha política. “Como Diretor da Leste Brasileiro construiu novas estações, substituiu
linhas, ampliou as condições de rodagem e iniciou a eletrificação do sistema, colocando a ferrovia baiana entre
as mais modernas”. “Comemoração marca os 100 anos de Lauro de Freitas”. A tarde. Salvador, 29 abr. 2001.
63
ferroviária passou por várias fases durante o período de sua formação e funcionamento,
mudando várias vezes de nome e de administração
171
.
A Leste brasileiro foi criada a partir de concessões a particulares com capital inglês e
depois franco-belga, através de processos de transferências e arrendamento, cada trecho de
estrada de ferro era explorado por uma pequena empresa que atuava em linhas e ramais
diferentes, ligando o Nordeste ao Sudeste brasileiro, ou seja, era formada por um
conglomerado de pequenas empresas, “inicialmente por cinco ferrovias que foram construídas
em épocas diferentes e que, depois foram unificadas, constituindo o seu sistema atual”
172
, que
serviu à metade do Estado da Bahia e quase todo o Estado de Sergipe
173
.
A Viação Férrea Federal Leste Brasileiro passou por várias fases administrativas
durante o processo de formação e consolidação da malha ferroviária. No período entre 1910 e
1950, ocorreram as etapas de construção, fusão, incorporação e liquidação de várias das
empresas privadas e públicas que a compunham. A extensão de sua ferrovia foi constituída da
reunião de antigas e pequenas estradas e ramais
174
como a Estrada de Ferro da Bahia ao São
Francisco, a antiga Estrada de Ferro Centro-Oeste da Bahia, a Estrada de Ferro Petrolina a
Terezina, a Estrada Central da Bahia e a Estrada de Ferro Santo Amaro e também a Estrada de
Ferro Bahia e Minas
175
.
A mais antiga empresa ferroviária a integrar a Leste foi a Estrada de Ferro da Bahia ao
São Francisco, também conhecida como Estrada de Ferro Calçada-Juazeiro. Esta ferrovia foi
a primeira da Bahia e a quarta do Brasil, criada
176
a partir de uma concessão particular
autorizando Joaquim Francisco Alves Branco Muniz Barreto
177
construir uma ferrovia na
província da Bahia que, partindo de Salvador, chegasse a Alagoinhas e à margem direita do
rio São Francisco, mais precisamente à cidade de Juazeiro
178
. Para dar continuidade aos
trabalhos de construção da Estrada de Ferro da Bahia ao São Francisco, foram transferidos
179
os direitos de concessão a The Bahia and San Francisco Railway Company, que era de capital
171
Conforme podemos observar pelo histórico da empresa, até ser chamada de Leste Brasileiro.
172
Rede Ferroviária Federal S. A. Centenário da Viação Férrea Federal Leste Brasileiro 1860-1960.
Bahia/Salvador: Tipografia da Leste. p. 3.
173
Idem. Ibidem. p. 6.
174
José Trajano. História da Viação Férrea Federal Leste Brasileiro. [s.n.t.]. p. 1.
175
Desligada em 1936 por força do decreto nº. 570, de 31 dez. 1936.
176
Em virtude das leis . 641 de 26 jun. 1852 e nº. 725, de 3 out. 1853, pelo decreto de nº. 1. 299, no ano de
1853.
177
Em um prazo de noventa anos, com a garantia de juros a 5% ao ano. Passando o prazo a estrada poderia ser
resgatada pelo governo, mediante prévia indenização.
178
Mário Tarquínio. “Vias de Comunicação e Meios de Transporte”. Revista do Instituto Geográfico e Histórico
da Bahia. n. 60. Salvador. 1934. p. 369-370; Rede Ferroviária Federal S. A.. Op. cit.. p. 3; José Emílio de Castro
H. Buzelin; João Bosco Setti. Ferrovia Centro – Atlântica: uma ferrovia e suas raízes. Memória do trem: Brasil,
2001. p. 72.
179
Pelo decreto nº. 1. 615, em 9 mai. 1855.
64
inglês, com sede em Londres
180
. Somente depois dessa mudança para concessionários
ingleses, em 1856 é que tem início a abertura dos trilhos até o rio Joanes
181
.
Sua construção foi realizada em três etapas: primeiramente, o trecho que foi de
Salvador a Alagoinhas, atingindo 123 quilômetros de extensão, dividindo-se em dois ramais:
um atingiu a cidade de Juazeiro no sentido do arraial de Pernambuco, a outra passou pela
cidade de Esplanada, atravessando todo o Estado de Sergipe, perfazendo o total de 428 km
182
.
O primeiro trecho
183
da E. F. Bahia ao São Francisco, ligando o bairro da calçada a
Paripe, até a periferia de Aratu em Salvador-Ba, com extensão de 14 km
184
, chegou a
Alagoinhas em 13 de fevereiro de 1863
185
, na extensão de 123,3 km
186
, no terreno do Coronel
Pedro Rodrigues Bastos, que estabeleceu casa comercial próximo ao local da estação
187
.
Prosseguindo o trabalho de construção da estrada, procedeu-e o seu prolongamento da
rede ferroviária de Alagoinhas a Juazeiro
188
. Os estudos definitivos foram aprovados em
1876, firmado o contrato em nove de março, mas somente em 25 de outubro deste mesmo
ano, iniciaram-se os trabalhos de construção
189
. Estes prosseguiram sob orientação direta do
Governo Imperial até 1887, sendo retomados de forma lenta mediante contratos com
empresas estrangeiras, em 1889, somente completando-se o prolongamento com a abertura ao
tráfego da estação de Juazeiro, em 24 de fevereiro de 1896
190
. “A partir daí muda-se o nome
da Estrada de Ferro da Bahia ao São Francisco, ficando com o de Estrada de Ferro do São
Francisco”
191
.
Também se prolongaram os caminhos de ferro de Alagoinhas até Timbó. Este ramal
foi construído pela Bahia and São Francisco Railway Company com autorização do
180
“Em Londres organizou-se a ‘Bahia and São Francisco Railway Company’ para levar a efeito a construção da
Estrada de Ferro da Bahia ao São Francisco”. José Trajano. História da Viação Férrea Federal Leste Brasileiro.
[s.n.t.]. p. 2.
181
Em 10 set.1860.
182
José Trajano. Op. cit.. p. 1.
183
Entre Jequitaia e Aratu, inaugurado 28 jun. 1860.
184
Rede Ferroviária Federal S. A. Superintendência de Patrimônio. Gerência de Preservação do Patrimônio
Histórico Ferroviário. Manual de Preservação de Edificações Ferroviárias Antigas/Rede Ferroviária Federal S.
A. Rio de Janeiro: RFFSA, 1991. p. 22.
185
Com relação a outros municípios chegou a Serrinha em 1870, em Senhor do Bonfim em 1887, Juazeiro em
1895 (a partir daí seguiu com o nome de Estrada de Ferro de São Francisco), Campo Formoso em 1917, Jacobina
em 1920, Miguel Calmon em 1923 e Iaçú em 1937.
186
Rede Ferroviária Federal S. A. Centenário da Viação Férrea Federal Leste Brasileiro 1860-1960.
Bahia/Salvador: Tipografia da Leste. p. 3.
187
“Neste ponto, a história da via férrea se imbrica com a da cidade, porque Alagoinhas era a vila de Santo
Antônio de Alagoinhas, localizada a três quilômetros da Estação de Ferro, onde hoje está o bairro de Alagoinhas
Velha”. Iraci Gama Santa Luzia. Rede Ferroviária em Alagoinhas - Passando pelo Histórico da Ferrovia na
Bahia, no Brasil e no Mundo. p. 1. [Texto em processo de publicação].
188
Autorizado pela lei nº. 1. 953, de 17 jul. 1871.
189
José Trajano. Op. cit.. p. 3-4.
190
Iraci Gama Santa Luzia. Op.cit.. p. 2.
191
Ibidem.
65
Ministério da agricultura, para realização dos estudos do terreno, em 31 de dezembro de 1881.
Devido a algumas complicações, como a seca que ocorreu no norte da Bahia e Sul de Sergipe,
esta estação somente foi inaugurada em 30 de março de 1887. Com 82 km, este trecho foi
mais tarde prolongado até Aracaju e Propriá, em 1909
192
.
Outra linha férrea que integrou a Leste foi a Estrada de Ferro Central da Bahia
193
, cujo
traçado tinha dois trechos, um partia de Cachoeira a Feira de Santana, o chamado ramal de
Feira
194
, e outro saía de São Felix com destino à Chapada Diamantina, a chamada linha
principal
195
.
No início do século XX, ainda se observou e colocou-se em prática uma expansão da
malha ferroviária brasileira, com o resgate e a construção de várias ferrovias, sendo o Estado
obrigado a assumir o controle e prejuízos de várias empresas em dificuldades financeiras. A
partir da era Vargas e do pós-guerra, o ritmo de expansão diminui e ampliou-se o controle das
empresas estatais.
De 1889 a 1902, após encampar as estradas de ferro da Central da Bahia e da Bahia ao
São Francisco, o Governo Federal procedeu ao processo de repasse e arrendamento de
contrato por empresa privada
196
. A Estrada de Ferro da Bahia ao São Francisco foi resgatada
dos ingleses pelo Governo Federal, mediante a lei 652, de 23 de novembro 1899, iniciando-se
uma estratégia de sucessivos arrendamentos a engenheiros a partir de 1900. A Estrada Central
da Bahia também foi arrendada em 1902, sendo concedidos os direitos de arrendatários aos
mesmos particulares que detinham o controle acionário da Estrada de Ferro da Bahia ao São
Francisco.
Em janeiro de 1909, foram feitas as transferências e arrendamentos dessas estradas
para a Companhia Viação Geral da Bahia. Esta companhia veio a constituir mais tarde o
núcleo formador da Leste Brasileiro. Em 23 de outubro de 1910, foi constituída a Rede de
Viação Férrea Federal da Bahia, com o intuito de coordenar e unificar os serviços de
ferrovias existentes
197
. Neste ano ligou-se e incorporou-se a Estrada de Ferro Bahia – Minas à
rede ferroviária baiana, que, antes de 1910, era composta pela Estrada de Ferro Central da
192
José Emílio de Castro H. Buzelin; João Bosco Setti. Ferrovia Centro Atlântica: uma ferrovia e suas raízes.
Memória do trem: Brasil, 2001. p. 72.
193
Esta estrada foi construída a partir de 06 out. 1867, através de uma concessão a Paraguassú Steam Tram-
Road Campany.
194
Inaugurado em 7 abr. 1875.
195
A linha principal, de São Félix até Bandeira de Mello, foi concluída em 1877.
196
Ver Francisco Antonio Zorzo. “O Movimento de Tráfego da Estrada de Ferro Central da Bahia e seu Impacto
Comercial: das iniciativas privadas inaugurais à encampação estatal”. Revista Sitientibus. nº. 26. Feira de
Santana, 2002.
197
De acordo com o decreto de nº. 8.321.
66
Bahia, pela linha que ia para o São Francisco, pela Estrada de Ferro de Santo Amaro, pela
Estrada de Ilhéus e pela linha sul do Estado, as quais funcionavam com administrações
diferentes e interesses desencontrados sob os pontos de vista político-administrativo-
industrial
198
.
Um ano depois, a malha ferroviária passou novamente por um processo de
transferência e arrendamento do contrato para a empresa privada, Compagnie des Chemins
Fer Féderaux de I’Est Brésilien, que era formada por capitais franceses e belgas, passando a
denominar-se E’ste Brasileiro
199
. A partir daí a Leste, sob a administração francesa, foi
ampliando seu patrimônio, executando o prolongamento das linhas e ramais que faziam parte
da rede ferroviária federal brasileira, adquirindo estradas de ferro estaduais, Centro-Oeste e
Nazaré, e a incorporação, através de um acordo entre os governos dos estados de Minas
Gerais e Bahia, da Nova Companhia de Estrada de Ferro Bahia - Minas, responsável pela
linha férrea que ia de Caravela a Teófilo Otoni
200
. Esta empresa esteve sob o domínio da Leste
por duas décadas, sendo desmembrada em 1936, para ser administrada pelo Departamento de
Estradas de Ferro (DNEF)
201
.
A antiga Inspetoria Federal de Estradas, sob administração da L’Est Brésilien, tinha
planos e projetos para realizar o estabelecimento definitivo da rede baiana, numa extensão
total de linhas e ramais de 3.500 km, ligando-se a Estrada de Ferro Central do Brasil, nos
limites do Estado de Minas Gerais à rede da Great Western, em Alagoas. Mas, devido às
crises políticas e econômicas e os desgastes da Primeira Guerra Mundial, mudou-se o ritmo
das atividades da empresa, levando a uma restrição dos recursos financeiros para a empreitada
de negócios, resultando em crise e precário funcionamento
202
.
Devido às dificuldades administrativas e aos prejuízos decorrentes da deficiência dos
serviços, que sempre eram alvo de reclamações, o Governo Federal passou a intervir na
administração dos negócios da Leste no ano de 1931. Somente quatro anos depois, pelo
decreto de 11 de março de 1935, o governo de Getúlio Vargas encampou e se responsabilizou
pelos bens e serviços a cargo da antiga Companhia L’Est Brésilien, sob o comando da antiga
Inspetoria Federal de Estradas, depois Departamento Nacional de Estradas de Ferro
198
Estas estradas eram administradas por grupos com visões e formas diferentes de administração, que
discordavam quanto à necessidade de construção e ligação das linhas e ramais da Leste, existindo também
conflitos entre os interesses dos administradores e seus empregados.
199
Através do decreto de nº. 9.029.
200
Em 30 dez. 1911.
201
O desmembramento da Estrada de Ferro Bahia e Minas foi proposto, em dez. de 1935, pela diretoria, segundo
Lauro de Freitas no relatório da Viação Férrea Federal Leste Brasileiro, do exercício de 1936. p. 5.
202
José Trajano. História da Viação Férrea Federal Leste Brasileiro. [s.n.t.]. p. 18.
67
(DNEF)
203
. Assim se constituiu a Rede de Viação Férrea Federal Leste Brasileiro
(RVFFLB), com um total de 2.545 km de extensão, um dos principais sistemas ferroviários do
país
204
.
Através dos relatórios da empresa, percebemos que na década de 1930, a política dos
transportes ferroviários do país foi mais incisiva do que no período da administração anterior,
sendo motivo de elogios: Delsuc Moscos de Oliveira
205
, engenheiro e diretor de ferrovia
baiana, elogiou em pronunciamento nacional ao presidente Getúlio Vargas e a Landulpho
Alves
206
.
A Viação Férrea Federal Leste Brasileiro procurou levar adiante uma série de
projetos de recuperação e empedramento das vias permanentes das estradas de ferro,
construção de novas estações, caixas d’água para o abastecimento das locomotivas a vapor,
recuperação e ampliação das oficinas onde consertavam-se as locomotivas, dos depósitos e
das estações que estavam em péssimas condições físicas, construção de casas para os agentes
de estação e pessoal de conservação das linhas permanentes.
Os trabalhos de eletrificação da linha tronco, de Salvador a Alagoinhas e de Mapele a
Candeias, iniciaram-se na década de 1940. O objetivo era aproveitar as reservas petrolíferas
do Recôncavo baiano e as jazidas de gás natural da região de Aratu. Estas obras foram levadas
adiante em 1948, pelo governo de Eurico Gaspar Dutra e encerradas em 1954, chegando a 230
km de linhas eletrificadas, adquirindo-se também, em novembro de 1938, da English Eletric
as primeiras locomotivas Diesel-Elétricas e Diesel-Mecânicas a rodar no Brasil, montadas nas
oficinas da Calçada (Salvador) e colocadas em circulação a partir de 1939.
Depois de encampar os serviços das estradas de ferro, o Governo Federal colocou-se
como o “salvador da pátria” e “restaurador” do bom andamento e funcionamento da
administração da ferrovia, iniciando, segundo discurso oficial, uma fase de prosperidade e de
equilíbrio nas contas da empresa, bem como renovação de seus serviços, com a sistematização
do tráfego e a finalização de construções inacabadas
207
. Nos relatórios da empresa referentes
203
Órgão criado pelo governo em 1942 para controlar, supervisionar e fiscalizar as concessões e funcionamento
da rede. Sendo responsável pela elaboração dos projetos e planos ferroviários, apresentados ao conselho
Nacional de Transportes. Funcionou até 1974, quando extinto e substituído pela Engefer que funcionou até 1983.
204
José Emílio de Castro H. Buzelin; João Bosco Setti. Ferrovia Centro Atlântica: uma ferrovia e suas raízes.
Memória do trem: Brasil, 2001. p. 73.
205
Discursos proferidos por D. M. de Oliveira publicados sobre os títulos: “Inauguração do Prolongamento da
Estrada de Ferro de Nazaré - São Roque” (jan. 1941) e “A Política dos Transportes do Estado Novo” (nov.
1940). Discursos. Bahia: Empresa Gráfica LTDA, 1941. O elogio da atuação do governo durante o Estado Novo
também perpassa o relato de Osvaldo Gordilho sobre o Plano Geral de Viação Nacional de 1934. Ver Osvaldo
Gordilho. Os Transportes no Brasil. Rio de Janeiro: Ministério da Viação e Obras Públicas, 1956.
206
Este último passou por doação a Estrada de Santo Amaro para a Viação Férrea Federal Leste Brasileiro.
207
José Trajano. História da Viação Férrea Federal Leste Brasileiro. [s.n.t.]. p. 19.
68
ao período em que o governo esteve à frente dos negócios do transporte ferroviário no país, é
notável a ressalva que faz a sua boa administração, como aparece nesta citação: “o estado de
ruína clamorosa sob que foram recebidos os serviços explorados até 1935, pela ex-companhia
arrendatária. Na Leste Brasileiro muito e muito que se realizar, para poder-se preencher
sua finalidade”
208
.
O processo de resgate das ferrovias brasileiras pelo Governo Federal redundou em um
momento de crise política e ação judicial, pois a antiga empresa arrendatária queria recuperar
a todo custo os seus direitos e voltar à administração da malha ferroviária da Leste Brasileiro.
Segundo os relatórios da empresa de 1935 a 1949 e o jornal O Lidador (década de 1930), a
antiga companhia francesa não tinha feito uma boa administração, sendo alvo de críticas por
conta do sucateamento e mau funcionamento dos equipamentos e das linhas que compunham
a Leste, levando a uma situação de tensão e insatisfação social por parte dos ferroviários e da
população de um modo geral contra a situação de abandono e descaso.
No relatório do exercício de 1935, consta que após a ocupação das estradas de ferro da
Leste Brasileiro pelo Governo federal
209
, a empresa arrendatária anterior reagiu “a todo
transe”, segundo palavras d’O Lidador, contra o Governo Federal para reaver a administração
da empresa, “considerando ilegal e abusivo o ato”
210
, ocasionando um momento de
insatisfações, conflitos e greve entre os trabalhadores ferroviários que não concordavam com
tal situação e eram contra a administração francesa.
Os ferroviários por sua vez, “sob coesão magnífica e admirável, possuídos do mais
sadio e puro espírito nacionalista”
211
, repeliram, a todo custo, as ousadas investidas “dos
gananciosos arrendatários”
212
. Depois, por ocasião de um mandado de segurança, concedido
pela Justiça Federal na Bahia, para que a antiga administração francesa voltasse a ocupar a
administração da E’ste Brasileiro, declararam-se “em greve pacífica, em sinal de veemente
protesto a volta da administração francesa”
213
. Este momento de greve dos ferroviários em
apoio ao Governo Federal contra a administração francesa também ganhou visibilidade nas
páginas do jornal O Lidador:
À última hora fomos seguramente informados de que os ferroviários entrarão
em greve hoje, caso não tenha sido até ontem a noite satisfeitos as suas
208
Viação Férrea Federal Leste Brasileiro, Lauro F. P. de Freitas. Relatório do Exercício de 1935. Salvador: Cia.
Editora Gráfica da Bahia, 1936. p. 6.
209
Por força do decreto nº. 24. 321 de 1º jun. 1934.
210
Viação Férrea Federal Leste Brasileiro. Op. cit.. p. 3.
211
Ibidem.
212
Ibidem.
213
Idem. Ibidem. p. 3-4.
69
pretensões que são a imediata ocupação da E’ste pelo Governo Federal, de
vez que reputam a continuação da administração francesa, um escárnio a
nossa civilização
214
.
Os ferroviários, em meio às agitações que os cercavam, resistiram “às tentativas de
suborno, às promessas fantásticas de aumentos de salários, às ameaças de vinganças, de
demissões e até mesmo de morte”
215
. A nova administração apesar do seu “absoluto espírito
de tolerância” tomou uma “medida profilática”, segundo expressões do jornal, para reprimir
os abusos e irregularidades no andamento dos serviços, promovidas a soldo por agitadores a
favor da companhia francesa e restaurar a ordem e a disciplina no ambiente ferroviário,
“removeu e demitiu cerca de uma dezena de maus elementos”
216
. Esta expressão, “maus
elementos”, era usada para se referir aos trabalhadores da empresa, que faziam greves em
protesto contra a administração francesa da Leste.
Outro passo importante na consolidação da malha ferroviária da Leste se deu em 1939,
quando, graças à complementação da Estrada de Ferro de Santo Amaro, que foi conectada à
Estrada de Ferro de São Francisco e à Estrada de Ferro Central da Bahia, conseguiu-se
realizar a integração Norte-Sul das suas várias linhas, o que era uma antiga demanda
ferroviarista baiana.
Conforme se verifica na tabela do anexo II, em 1944, a Leste Brasileiro era integrada
pela Estrada de Ferro de São Francisco e ramais (inclusive a Estrada de Ferro de Sergipe e
Estrada de Petrolina a Terezina, esta incorporada em 1941), a Estrada de Ferro de Santo
Amaro e Estrada de Ferro Central da Bahia e ramais, totalizando 2.209 km de linhas e 126,2
km de desvios auxiliares. A Estrada de Ferro da Bahia ao São Francisco tinha 124,9 km, o seu
ramal da Barra de Mundo Novo, 208,4 km e o Sub-ramal, que ia de Itinga (Antonio
Gonçalves) a Campo Formoso, 9,8 km.
Desde 1952, no seu segundo governo, Getúlio Vargas tentou reorganizar as ferrovias,
para centralizar os serviços ferroviários, encaminhando ao congresso um projeto para criação
de uma Rede Ferroviária Federal (RFFSA)
217
. Após anos de debates no congresso, este
projeto somente foi sancionado pelo presidente Juscelino Kubstschek em 16 de março de
1957. E finalmente foi fundada mediante o Decreto-Lei 3.155, em 30 de setembro de 1957, a
214
Edição de 10 mar. 1935.
215
Viação Férrea Federal Leste Brasileiro, Lauro F. P. de Freitas. Relatório do Exercício de 1935. Salvador: Cia.
Editora Gráfica da Bahia, 1936. p. 4.
216
Ibidem. p. 3-4.
217
Iraci Gama Santa Luzia. Rede Ferroviária em Alagoinhas - Passando pelo Histórico da Ferrovia na Bahia,
no Brasil e no Mundo. p. 5. [Texto em processo de publicação].
70
Rede Ferroviária Federal Sociedade Anônima S. A. - RFFSA
218
, centralizando-se a
administração das ferrovias do Brasil.
A Rede Federal englobou a Viação Férrea Federal Leste Brasileiro, passando a
funcionar organizada em quatro sistemas regionais: Nordeste, Centro, Centro-Sul e Sul,
subdivididos em doze superintendências regionais (SR’s): SR.1-Recife, SR.2-Belo Horizonte,
SR.3-Juiz de Fora, SR.4-São Paulo e Centro-Oeste, SR.5-Curitiba, SR.6-Porto Alegre, SR.7-
Salvador e Sudeste, SR.8-Campos, SR.9-Tubarão, SR.10-Bauru e Sul,SR.11-Fortaleza e
SR.12-São Luís
219
.
Inicialmente foram aglutinadas dezoito ferrovias brasileiras, que se estendiam desde
Maranhão até o Rio Grande do Sul e desde o Rio de Janeiro até Mato Grosso, operando com
cerca de 24.000 km, incluindo-se a Estrada de Ferro da Bahia ao São Francisco, pertencente à
Leste Brasileiro. Depois foram encampadas mais quatro, totalizando 22 empresas
220
. A
VFFLB passou a compor em 1969 a Divisão Operacional da Leste. Depois com a criação
das superintendências regionais, em 1976, foi incorporada à SR. 1, depois se tornando uma
Superintendência Regional independente, a SR.7, com sede em Salvador
221
.
Sua criação teve como objetivo principal expandir racionalmente a malha ferroviária
brasileira, buscando-se padronizar o material rodante, além da construção de redes de tráfego
mútuo, substituição do material desgastado e antigo, e mudança do pessoal menos
especializado nos serviços ferroviários
222
. Segundo diz a Revista Ferroviária, a Rede
cumpriu sua tarefa, reduzindo a malha e o quadro de pessoal, e aumentando a produção”
223
.
A RFFSA funcionou cerca de quatro décadas e, nos anos seguintes, muitos dos ramais
da antiga Leste foram removidos ou desativados, deixando de atuar no transporte de
passageiros no interior do Estado da Bahia, existindo atualmente somente os trens de
passageiros do Subúrbio Ferroviário de Salvador, pertencentes à Companhia Brasileira de
Trens Urbanos (CBTU), que ligam a Estação da Calçada a Paripe. No restante das linhas
218
“A Rede funcionou como uma sociedade de ações, a qual ficariam incorporadas todas as estradas de ferro de
propriedade da União e administradas por ela, além daquelas que viessem a ser transferidas para o controle no
governo futuro”. Revista Ferroviária. 1992. p. 8.
219
Mayara Mychella Sena Araújo. A Ferrovia e a Configuração Urbana da Cidade de Alagoinhas-Bahia.
Salvador: [s.ed.], 2005. p. 39.
220
“A RFFSA surgiu da união de 22 ferrovias em todo o Brasil, a maioria de capital privado, reunindo linhas
despadronizadas, deficitárias e com excessivo quadro de pessoal (cerca de 160.000 ferroviários). Em muitos
casos não havia interligação física entre as ferrovias desapropriadas”. Jorge Luiz Dantas Menezes [et. al.]. A
Decadência Sócio-Econômica do Município de Alagoinhas-Ba: O caso da ferrovia. Alagoinhas: Faculdade
Santíssimo Sacramento, 2004. p. 23-24.
221
José Emílio de Castro H. Buzelin; João Bosco Setti. Ferrovia Centro Atlântica: uma ferrovia e suas raízes.
Memória do trem: Brasil, 2001. p. 73.
222
Enciclopédia Barsa. Engenho de açúcar: fotogravura. v. 7. São Paulo: Encyclopaedia Britannica do Brasil
Publicações, 1983. p. 335.
223
Revista Ferroviária. Abr. 1997. p. 31.
71
ativas, funcionam os trens que fazem o transporte de cargas de uma região a outra do
país
224
.
Com o advento das empresas privadas de transporte ferroviário de carga,
lentamente os trens de passageiros desapareceram. No seu lugar, hoje
circulam apenas os trens-cargueiros, que cortam cidades e estações
fantasmas, deixando a nostalgia de um tempo em que as pessoas vestiam a
melhor roupa domingueira para passear na estação
225
.
O último período da história da administração das linhas férreas que compunham a
Leste refere-se à privatização da Rede Ferroviária Federal, em 1994, quando a malha Centro-
Leste, constituída pelas Superintendências Regionais de Belo Horizonte (SR. 2), Salvador
(SR. 7) e de Campos (SR. 8)
226
foi adquirida pela Ferrovia Centro-Atlântica S. A. (FCA). Esta
empresa busca recuperar o transporte ferroviário no país a partir de projetos de restauração
das antigas estações de trem e construção de museus para conservação e preservação do
patrimônio da Leste.
Na Bahia, desde 28 de agosto de 1996
227
, quando assumiu os serviços de transporte
ferroviário na região, a FCA não conseguiu mudar o quadro do transporte ferroviário,
continuando a deficiência no atendimento dos poucos trens que fazem linha no Subúrbio
Ferroviário de Salvador. Observando-se ainda “poucas locomotivas para atender a demanda
de passageiros, vagões sujos e sem segurança e paradas obrigatórias por defeitos técnicos”
228
.
Segundo o diretor, do Sindicato dos Trabalhadores Ferroviários, similares e afins nos
Estados da Bahia e Sergipe (Sindiferro), José Raimundo Jesus que exercia função em 2002:
“[...] a FCA, que para amealhar a RFFSA garantiu que cuidaria da malha SR. 7, não cumpriu
o prometido. A malha está um caos. Nenhuma melhoria foi feita”
229
. No interior da Bahia
constatamos a triste realidade que, “o que resta dos tempos áureos da viação Férrea Federal
224
“Da malha restante e absorvida pela fase da Superintendência Regional Salvador, temos as seguintes linhas,
assim denominadas: a linha Sul, entre Mapele e Monte Azul, MG, destacando-se o transporte de mineraise
derivados; a linha Norte com o transporte de derivados químicos produzidos pela Fábrica de Fertilizantes
Nitrogenados S. A. FAFEN, antiga Nitrofértil S. A., cimento, álcool, trigo e sal; a Linha Centro, entre as
cidades de Alagoinhas e Juazeiro, com uma extensão para Petrolina, PE, na margem do São Francisco, com
transporte de minerais e processados minerais”. José Emílio de Castro H. Buzelin; João Bosco Setti. Ferrovia
Centro – Atlântica: uma ferrovia e suas raízes. Memória do trem: Brasil, 2001. p. 76.
225
“Maria Fumaça: Estrada de ferro nasceu em meados do século XIX como símbolo da integração nacional’.
Correio da Bahia. Repórter, 24 jul. 2001.
226
Iraci Gama Santa Luzia. Rede Ferroviária em Alagoinhas - Passando pelo Histórico da Ferrovia na Bahia,
no Brasil e no Mundo. p. 6. [Texto em processo de publicação].
227
“Sendo o grupo que adquiriu a empresa na ocasião uma sociedade múltipla com mais de 08 cios”. Folhão.
FCA premiou Ferroviários. Diversos. Alagoinhas-Ba. p. 5.
228
Cintia Kelly. “Sistema ferroviário viaja na contramão do desenvolvimento”. Bahia Documento. Fora dos
trilhos. Apesar de eficiente e mais econômico, o estado das ferrovias é de falência. Salvador: quarta-feira, 15
mai. 2002. p. 3.
229
Ibidem.
72
Leste são cemitérios de vagões abandonados e ex-funcionários aposentados que vivem das
próprias lembranças”
230
.
2.2 FUNCIONAMENTO E DECADÊNCIA DA LESTE BRASILEIRO.
Quando a Viação Ferroviária Federal Leste Brasileiro chegou Jacobina, a cidade
passava por um processo de declínio e sucateamento, recebendo críticas sobre mau
funcionamento e estado de conservação, por parte de uma parcela da população, conforme a
análise de excertos d’O Lidador, para o qual a ferrovia não estava atendendo satisfatoriamente
aos anseios de uma sociedade que procurava estar nos rumos do progresso e do
desenvolvimento.
A empresa Leste brasileiro funcionou com déficits a maior parte do período entre
1911 a 1940, com exceção de um intervalo de alguns anos nas cadas de 1920 e 1930, os
anos de 1926 e 1929 e os anos de 1930, 1934 a 1938, em que os saldos foram significativos.
A empresa tinha despesas maiores que a receita arrecadada, de forma que sua renda não era
suficiente para cobrir os gastos com materiais e despesas com funcionários, tornando seu
funcionamento economicamente desfavorável. Os dados financeiros da empresa servem para
demonstrar sua situação econômica e funcional durante os anos vinte, época de crise e
sucateamento. O movimento financeiro da Leste entre 1911 e 1948 está apresentado na tabela
em anexo III.
Entre 1911 e 1935, a receita foi de 251.679 contos de réis, tendo uma despesa de
263.319 contos, acumulando um déficit de 17.136 contos de prejuízos, sendo que a receita
cobria em média apenas 95% das despesas. A partir de 1930, após a entrada do engenheiro
Lauro de Freitas, a empresa melhorou administrativamente, obtendo saldos da sua receita. A
partir da década de 1940, a empresa voltou a atuar com suas contas no vermelho,
aumentando-se muito os déficits, após o ano de 1944, quando a receita passou a ser o
equivalente à metade das despesas. Em 1946, quando as despesas eram três vezes maiores que
as receitas de transporte, a Leste entrou em ampliada decadência financeira, acumulando
déficits irreparáveis.
Segundo consta, “até 1943, o sistema ferroviário brasileiro apresentava resultados
230
“Fumaça: Estrada de ferro nasceu em meados do século XIX como símbolo da integração nacional”. Correio
da Bahia. Repórter, 24 jul. 2001.
73
financeiros equilibrados, mas em 1946 com a despesa total de cerca e Cr$ 2,9 bilhões,
registrou- se uma receita de cerca de Cr$ 1,95 bilhão”
231
, resultados estes insatisfatórios e
deficitários do transporte. Os dados financeiros da tabela em anexo representam que a
situação orçamentária da Leste brasileiro, na maior parte do tempo em que funcionou em
Jacobina, foi de dificuldades financeiras, o que dificultava o bom funcionamento da empresa e
acarretava mais prejuízos e críticas na imprensa local ao mau atendimento dos serviços
prestados à população jacobinense.
A empresa ferroviária tinha a sede na capital do Estado da Bahia e estações por todas
as linhas. Dentre as diversas estações ferroviárias, havia as de centros urbanos/sedes
municipais e as estações de distritos/povoados. Para se ter uma idéia da arrecadação de
algumas das principais estações da Leste, pode-se observar a tabela abaixo. Nota-se pela
receita da estação da Calçada em Salvador, que esta estação central, era de longe, a mais
importante da empresa, em matéria de arrecadação.
Tabela 2 - Receitas de Algumas Estações Selecionadas em 1944 (em Réis).
ESTAÇÕES VIAJANTES
BAGAGENSENCOMENDAS
ANIMAIS MERCADORIAS
ARMAZENAGEM
TELEGRAMAS
OUTROS
RECEITA TOTAL
Salvador 2.774.200,60
16.531,60 1.11.546,60 73.484,30 4.843.068,00 34.979,50 20.335,95 27.319,70 9.790.847,05
Alagoinhas 386.835,60
1.345,60 96.025,50 34.490,30 832,60 343,20 2.330,20 943,00 587.237,80
Feira de Santana
125.789,70
---------
22.752,90 13.964,20 192.497,70 244,50 201,05 2.421,50 386.961,65
Juazeiro 537.013,50
7.344,30 108.948,30 12.575,40 1.602.913,50 2.290,70 5.808,95 4.421,40 2.489.461,05
Bonfim 423.300,40
2.677,70 39.252,60 25.810,10 263.336,00 474,90 32.584,45 1.910,30 864.483,85
Jacobina 198.478,50
2.205,40 29.421,00 17.480,60 526.527,70 300,40 2.522,90 1.786,70 851.119,10
M Calmon 71.045,70
295,10 13.623,90 2.007,80 559.740,30 245,40 1.429,15 425,00 710.639,10
B. M .Novo 172.008,60
-------- 18.309,10 145.936,90 68.655,30 478,00 1.204,50 1912,50 447.573,00
Aracaju 1.013.127,50
3.434,60 205.805,80 11.577,20 2.979.984,70 2.509,70 17.024,60 19.948,90 4.654.204,40
Cachoeira 132.070,20
55,30 18.211,20 2.031,40 226.985,00 74,10 164,30 729,20 413.488,60
São Félix 346.687,00
117,20 180.578,80 4.686,80 1.497.702,90 3.562,40 16.660,00 14.373,00 2.250.595,90
Própria 485.553,20
1.094,20 67.368,90 2.879,20 597.996,60 2.459,60 304,90 3.862,80 1264.677,00
Nota: Estações com receita acima de $ 300.000,00
Fonte: Relatório da Viação Férrea Federal Leste Brasileiro do exercício do ano de 1944, que se encontra no acervo da biblioteca da
Fundação Clemente Mariani.
Pela tabela acima, percebemos que a maior concentração de renda da Leste estava na
estação de Salvador. Os principais pontos de confluência da rede da empresa eram as estações
de Salvador, Juazeiro, Aracaju e Bonfim, que por serem pontos extremos e conexões
importantes, arrecadavam mais. A estação de Jacobina estava no ranking das dez maiores
estações, em termos de arrecadação, estando acima de Miguel Calmon, Alagoinhas e Feira de
Santana, tendo uma receita menor que a de Propriá e de Senhor do Bonfim.
231
Enciclopédia Barsa. Engenho de açúcar: fotogravura. v. 7. São Paulo: Encyclopaedia Britannica do Brasil
Publicações, 1983. p. 335.
74
Tabela 3 – Principais Mercadorias Transportadas pela Ferrovia em 1935.
Fonte: Relatório da Viação Férrea Federal Leste
Brasileiro do exercício do ano de 1935, que se encontra
no acervo da biblioteca da Fundação Clemente Mariani.
A tabela 3 indica os principais produtos transportados pela Leste. Como se observa, os
principais itens são produtos primários, de agricultura ou de extração, voltados para o
mercado externo, mas a maioria deles era para o próprio mercado interno de consumo.
Considerando-se que o principal produto de exportação da Bahia, na época, era o cacau, nota-
se que, grosso modo, a pauta de mercadorias da Leste tinha um perfil mais modesto dentro do
quadro produtivo baiano e era voltado para a realidade regional do semi-árido. O total de
mercadorias transportadas, medido por quilometragem, em 1934, foi de 46.563.213 toneladas
por quilômetros - T. K., em 1942, 75.641.170 T. K., em 1943 de 97.161.728b T. K. e em 1944
de 97.750.164 toneladas no total.
Registraram-se nos relatórios da Leste consideráveis aumentos nas cifras
correspondestes à circulação regional de passageiros. Em 1934, foram transportados
1.072.424 passageiros; em 1935, transportou-se 1.408.526; em 1936, 1.352.592 passageiros.
Em 1942, transportou-se o total de 2.513.644 passageiros; em 1943, 2.895.964 e em 1944,
3.488.566. Isso quer dizer que, a cada ano, aumenta-se o número de pessoas as quais a
empresa atenderia, exigindo-se mais equipamentos, infra-estrutura e investimentos por parte
da mesma, cuja situação financeira deixava a desejar em seus serviços.
Para se ter uma idéia do contingente dos trabalhadores da Leste em 1935, segundo o
Relatório do Exercício daquele ano, alcançou-se um total de 4.650 operários. Um diretor-
superintendente, 10 engenheiros, 296 funcionários dos escritórios (contabilidade, médicos,
chefes de seção, tesoureiros, oficiais, escriturários, escreventes), 56 agentes, 53 chefes de
trem, 141 guarda-freios, 208 telegrafistas, 91 maquinistas, 638 oficiais, 115 foguistas, 1216
trabalhadores braçais, além de muitos outros funcionários que exerciam atividades diversas,
os quais, conforme foi dito acima, totalizavam 4.650 operários. Estes números demonstram
que era um razoável contingente de funcionários e operários da Leste, havendo uma
hierarquia entre eles, sendo a maioria, trabalhadores braçais.
MERCADORIA
CARGA (TONELADAS)
Lenha
21.582
Açúcar
17.836
Sal
17.746
Milho
12.681
Fumo
11.793
Madeira
10.681
Feijão
9.501
Algodão
8.408
Couro
3.519
75
Sobre o funcionamento e operação da Leste Brasileiro, no que se refere às linhas e
ramais para o interior, pouco se sabe, sendo que os documentos oficiais da Leste não existem
nos escritórios das estações antigas. Alguns foram enviados para a sede da empresa em
Salvador, outros queimados e também se encontram nas mãos de particulares, dificultando a
reconstrução da história desta empresa.
O período de operação da Leste, que vai de 1935 a 1949, foi o mais documentado,
graças a uma série de relatórios impressos que foram publicados anualmente. O engenheiro e
diretor da empresa no período, Lauro de Freitas, conseguiu realizar um trabalho minucioso de
fornecimento de estatísticas ao Ministério de Agricultura, Indústria, Comércio, Viação e
Obras Públicas. Por força da própria época em que o país vivia, a diretoria geral foi
rearticulada para modernizar a organização da empresa, em todos os seus setores, procurando
impor uma imagem positiva e eficiente de seu funcionamento e operação. Nesse sentido, a
empresa cresceu e implementou diversos setores, inclusive fazendo funcionar, a partir de
1940, a Tipografia da Leste.
Todas essas questões abordam a situação de declínio e decadência financeira que
enfrentava a Leste Brasileiro. A Leste estava enfrentando momentos de baixas nas receitas da
empresa e passou a entrar em fase de decadência. As condições financeiras da empresa e o
estado mecânico do material rodante e da linha permanente eram lastimáveis. Conforme
observou Osvaldo Gordilho,
232
“desde a década de 1930, as estradas de ferro têm sofrido de
desgaste considerável” devido às dificuldades financeiras do país e dos custos de aquisição de
equipamentos, estabelecendo-se um círculo vicioso. Segundo ele, a depreciação das empresas
de transporte ferroviário: “não ajuda, não atende e não beneficia a riqueza nacional”
233
.
A prolongada crise da empresa constava em diversos relatórios da Leste, sobretudo na
época posterior à Segunda Guerra Mundial. Nesse período, vinha apresentando despesas com
crescimento maior que as receitas, sendo apontado como motivo principal para isso, o baixo
valor dos fretes de transporte. Entretanto, foram várias as causas deste declínio empresarial,
algumas internas à própria empresa e outras de caráter externo como a concorrência do
transporte rodoviário.
A via permanente da ferrovia da Bahia estava defasada em relação às novas condições
necessárias para conduzir os seus veículos com segurança e velocidade que competissem com
232
Este engenheiro técnico afirmou, na década de 1950, que o sistema ferroviário estava em “situação vexatória”
(1956, p. 155). A maioria das locomotivas das empresas ferroviárias do país, cujo total chegava a 3.671
unidades, estava em estado de obsolescência, sendo que 497 das máquinas tinham mais de 60 anos de vida útil e
que apenas 81 delas tinham menos de 10 anos de uso.
233
Osvaldo Gordilho. Os Transportes no Brasil. Rio de Janeiro: Ministério da Viação de Obras Públicas, 1956.
76
o sistema de transporte rodoviário que se implantava. O desenvolvimento do traçado
ferroviário ocorreu segundo antigas diretrizes técnicas, sem muitos estudos e diagnósticos das
áreas a serem atingidas, em condições operacionais desiguais, reflexo da história da estrada.
Conforme consta o relatório do exercício de 1935, era necessária a aquisição de veículos
novos para dar conta da demanda e exigências dos transportes, faltando recursos para isso:
A reação econômica que se processa em todo o Estado, está, dia a dia, a
exigir o aparelhamento desta Viação Férrea, mas os recursos que dispusemos
até o momento são de todo insuficientes, não só para a conservação ordinária
do material, senão também, e principalmente, para a aquisição de unidades
novas, indispensáveis ás exigências sempre crescentes dos transportes
234
.
Os problemas operacionais nos veículos eram muitos, e o envelhecimento do material
causava acidentes. Nos trilhos mais antigos, fraturas eram reparadas quase diariamente. Havia
ainda o agravamento adicional da insegurança nos trens, com uma elevada incidência de
perdas e roubos de cargas.
A exemplo encontramos, a foto abaixo, registrando um momento de desastre de trem
na década de 1940, provocado pelo estado em que se encontrava, mesmo que tenha passado
por um processo de restauração, percebendo-se que o fotógrafo registrou o instante em que
dois trens se chocaram, chamando a atenção de vários curiosos.
Figura 5 - Desastre de Trem. Autor: Juventino Rodrigues,
1940. Fonte: Núcleo de Estudos de Cultura e Cidade da
Universidade do Estado da Bahia, Campus IV.
Por que registrar um desastre de trem? Que sentidos podem ser atribuídos a esta
imagem? Pode ser que o profissional tenha resolvido fotografar uma cena que apesar de fazer
parte da vida ferroviária em Jacobina, talvez ainda não tivesse sido presenciada e registrada
234
Viação Férrea Federal Leste Brasileiro, Lauro F. P. de Freitas. Relatório do Exercício de 1935. Salvador: Cia.
Editora Gráfica da Bahia, 1936. p. 10.
77
pela câmara do fotógrafo. A fotografia ganhou sentido de documento/testemunho dos
constantes desastres de trens da Leste, denunciando a situação precária, em que, segundo as
queixas do jornal O Lidador, encontravam-se os vagões e trilhos desta empresa ferroviária na
região.
A viabilidade da ferrovia dependia de reaparelhamento das vias e das máquinas, além
de uma melhoria técnica dos serviços para atrair mais passageiros. Outros fatores de declínio
do empreendimento podem ser considerados por problemas técnicos do material fixo e do
equipamento rodante, além dos custos e dos problemas de execução das tarefas cotidianas no
transporte
235
.
“À vista dessa deficiência de tração, não nos tem sido possível transportar rapidamente
a produção da zona, fato que traz certo desânimo aos produtores e oferece maiores
oportunidades à concorrência rodoviária, com acentuados prejuízos para nossa receita e para a
própria economia da região”
236
. O problema da concorrência com o transporte rodoviário já era
presente na década de 1940. Os comerciantes do interior da Bahia deixaram os trens e
investiram seus capitais em seus próprios veículos rodoviários. O antigo poder de conexão e
atração da ferrovia, dentro de sua área de influência, diminui neste ano.
Os municípios à margem da Leste passaram a se conectar rodoviariamente com outros
centros do Nordeste e do Sudeste do Brasil. A quebra da hegemonia do trem como transporte
e veículo de comunicação levou-nos a observar o efeito da ampliação do sistema rodoviário
nas suas características vantajosas, em comparação com o ferroviário, como refere Agnaldo
Marcelino Gomes:
Devido às condições precárias em que se encontrava, a via férrea perdeu a
sua viabilidade de transporte de cargas e passageiros, perdeu a sua
movimentação... devido à chegada das estradas de rodagem e os pesados
caminhões de transporte de cargas. Maria fumaça ficou cansada e foi
sufocada pela evolução dos tempos, vieram as máquinas diesel, que não
tinham nenhuma graça e a beleza de Maria Fumaça, mas era o avanço do
potente modernismo
237
.[Destaque em Itálico feito pelo autor]
Cada parte da linha, ou zona, segundo denominação técnica, sofreu diferentes veis
de influência em decorrência da ascensão do transporte rodoviário, de acordo com ingerência
ou não da Leste em cada zona. Algumas, por influência direta da Leste, tinham oportunidades
235
Ver quadro de declínio, estudado no caso da Estrada de Ferro de Nazaré, por Francisco Antônio Zorzo.
Ferrovia e Rede Urbana na Bahia: doze cidades conectadas pela ferrovia no sul do recôncavo e sudoeste baiano
(1870-1930). Feira de Santana: UEFS, 2001. p. 231-246.
236
Viação Férrea Federal Leste Brasileiro, Lauro F. P. de Freitas. Relatório do Exercício de 1948. Salvador:
Tipografia da Leste, 1949. p. 4.
237
Agnaldo Marcelino Gomes. “Maria Fumaça... quanta saudade!!!”. A Letra em Revista. Jacobina-Ba:
Academia Jacobinense de Letras, set. 2001. p. 6.
78
de desenvolvimento, mas nem sempre as zonas potencialmente mais promissoras estavam
diretamente conectadas à Leste. Tardiamente, a Leste incorporou a zona de Minas Gerais com
o Sudeste e Sul do país. Isso se deu somente na década de 1950, justamente na época em que
as grandes rodovias, como a BR-116 e a BR-101, foram construídas. As rodovias nacionais e
estaduais passaram a escoar a produção, mais diretamente e em melhores condições, para
outras cidades importantes para a economia nacional, ampliando assim seus papeis na
hierarquia urbano-regional.
A incompletude e inoperância da retícula de interligação das estradas de ferro baianas
e a falta de ligação com outras vias foram fatores de limitação da operação da Leste. Ela,
apesar de insistentes propostas e estudos, não se conectou com a Great Western e a Estrada de
Ferro de Nazaré (município do Recôncavo baiano).
Não foram poucos os pedidos de técnicos e usuários da Leste para o prolongamento
dos trilhos que passavam pela Bahia conectando-a, às demais ferrovias dos estados
economicamente representativos. Na prática, essas ligações solicitadas foram feitas por meio
de rodovias, pois as autoridades do governo diziam que a operacionalidade rodoviária era
mais barata e imediata e foram substituindo aos poucos as estradas de ferro. Segundo Gomes,
O sistema ferroviário mais importante, hoje, é o rodoviário, mas em épocas
passadas o transporte mais utilizado era o ferroviário, que fazia o transporte
de passageiros e cargas para a capital do Estado e outras cidades, o
escoamento dos produtos de toda a grande região era feito através da
Estrada de Ferro Leste Brasileiro, que muito contribuiu para o
desenvolvimento da região. Por mais de meio século a ferrovia beneficiou
nossa cidade e outras
238
. [Destaque em itálico feito pelo autor]
Houve várias queixas na imprensa da época com relação ao estado precário e a
conservação das locomotivas da Leste, que atendiam a região de Jacobina. Segundo nota do
jornal iam largando os pedaços por onde passavam.
[...] O que é fato, é que os trens da E’ste continuam largando os pedaços por
onde vão passando. Locomotivas velhas, furadas sem força até mesmo para
arrastarem carros vazios, continuam a espinhosa função de fazer o horário
Piritiba-Bonfim, multiplicando-se, conseqüentemente, os descarrilamentos,
os atrasos, os prejuízos, enfim
239
.
O jornalista, nas entrelinhas, ao denunciar a situação precária das locomotivas, busca
alertar para a situação geral de abandono, em que segundo ele, se encontrava a Leste. O
próprio título da reportagem “A E’ste (sic) continua largando os pedaços” ratifica que a real
238
Agnaldo Marcelino Gomes. “Maria Fumaça... quanta saudade!!!”. A Letra em Revista. Jacobina-Ba: Academia
Jacobinense de Letras, set. 2001. p. 5.
239
O Lidador, 14 set. 1934.
79
intenção do autor foi mostrar a idéia de uma viação férrea desmantelada, que não prestava
mais, servindo apenas para dar prejuízos. Então voltamos a perguntar: a quem o estado das
locomotivas mais incomodava? Para quem tal situação traria prejuízos? Percebemos que a
situação e o estado das locomotivas prejudicavam primeiramente os representantes do
comércio local, trazendo-lhes prejuízos com o atraso e falta de transporte das mercadorias,
depois o restante da população que ficava dependendo de um precário maquinismo ferroviário
para se deslocar e comunicar.
Os problemas da Leste com seus equipamentos, as debilidades das máquinas e das vias
que atrapalhavam o transporte de mercadorias, no entanto, não impediam o desejo das pessoas
de viajar de trem. O operariado da Leste também era muito zeloso de seus compromissos e
trabalhava para manter o serviço ferroviário funcionando. Paradoxalmente, a importância
social da ferrovia continuava viva ainda na década de 1960, quando vários ramais foram
sendo definitivamente suprimidos.
O jornal O Lidador criticava ainda os desastres que constantemente aconteciam com
os trens da Leste. Ao apontar um acidente que ocorreu com um trem que vinha transportando
lenha de Djalma Dutra (atual Miguel Calmon) para Jacobina, o jornalista aproveita para
apontar as causas de mais um desastre ferroviário, que segundo ele “foi o mal estado dos
carros sem lubrificação e da linha férrea mal cuidada”
240
, demonstrando também espanto
pelos franceses, arrendatários da ferrovia, alegarem a falta de rendimentos para melhorarem a
estrada e as máquinas em tráfego
241
.
Osmar Micuccí foi um dos fotógrafos que na década de 1960, mais fotografou o
prédio da estação da Leste em Jacobina, registrando a situação, a repercussão junto ao público
e o atendimento dos serviços desta empresa ferroviária à população de Jacobina.
Reproduzimos aqui uma das suas fotografias, registrando o armazenamento de mercadorias
transportadas pelo Trem das Grotas.
240
O Lidador, 7 abr. 1935.
241
Ibidem.
80
Figura 6 - Estação da Leste. Autor: Osmar Micuccí,
1960. Fonte: Núcleo de Estudos de Cultura e
Cidade da Universidade do Estado da Bahia,
Campus IV.
Ainda que nos pareça transmitir uma impressão de paradeiro, abandono e desleixo
com a administração e funcionamento do transporte ferroviário em Jacobina, mostra-nos o
intenso movimento cargueiro na cidade, trazendo rendimentos para o comércio local.
2.3 O TRABALHO NO TREM.
Nas entrevistas feitas com ex-ferroviários é presente o sentimento de saudade dos
tempos em que trabalhavam na ferrovia. Esse sentimento fica explícito na entrevista com o
ex-ferroviário Valdir Serra Sena, que até se emocionou e chorou ao recordar a sua época de
ferroviário, sempre fazendo uma distinção entre o período em que era trabalhador da estrada
de ferro e a sua situação atual, enquanto ferroviário aposentado, esquecido e abandonado.
O Sr. Valdir S. Sena ressalta que no passado sentia orgulho da sua condição de
ferroviário. Hoje, devido à circunstância adversa em que se encontra, tem vergonha de dizer
ter trabalhado numa das primeiras empresas de transporte ferroviário do país e que foi
suprimida, não sendo lembrado e respeitado como cidadão que contribuiu para o
funcionamento de um importante meio de transporte, que trouxe desenvolvimento para país e
para Jacobina.
De acordo com o entrevistado, no tempo em que trabalhou na ferrovia, no período do
Governo de Getúlio Vargas, ser ferroviário possibilitava representação e status social dentro
da sociedade jacobinense, havendo preocupação por parte do Governo Federal com os
81
trabalhadores, que para ele, eram bem tratados e bem remunerados, recebiam um salário que
dava para sobreviver.
Naquele tempo ferroviário era tão bem visto no país, tão bem amado, tão
bem abraçado por todos, que se precisassem resolver alguma coisa fora e
tivesse qualquer problema, discussão, coisa e ele corressem quando
chegassem à cima da estrada de ferro as polícias não pegava a não ser com a
ordem do chefe superior, caiu ali já era polícia
242
.
Percebe-se que a visão que Valdir S. Sena passa da ferrovia tem a ver com a situação
antes vivida, enquanto trabalhador da estrada de ferro, e a vivenciada hoje na condição de ex-
ferroviário aposentado. na construção da sua narrativa uma mistura de elementos e
condições passadas e presentes. Outros ex-ferroviários em condições diferenciadas podem ter
construído uma memória e identidade diferentes.
Também segundo Antônio F. Rego, outro ex-ferroviário entrevistado, a Leste servia
bem à população e este recebia um salário razoável que era suficiente para manter sua família,
fazendo questão de enfocar sua condição de assalariado e quanto estimava receber por mês.
Na sua fala, pode-se perceber que ao definir imprecisamente o valor real do seu salário
“sessenta e tanto, coisa e etc...”, demonstra que não era pouco, mas o necessário para
possibilitar tranqüilidade, estabilidade para sua manutenção e despesas familiares.
F. M. S. – Como eram as condições de trabalho?
A. F. R. – As condições?
A. F. R. – De salário?
F. M. S. – Sim
A. F. R. – Eu era sala...
F. M. S. – Dava para sobreviver com o trabalho, com o dinheiro?
A. F. R. Quando eu entrei logo eu era salariado [...] (pausa) a três reis por
dia, recebia 60 e tanto, coisa e etc...
243
Essa é a opinião de um ex-ferroviário aposentado, que ressalta as boas condições de
atendimento e funcionamento dos transportes ferroviários à população de Jacobina, que
incluía também a representação do seu trabalho e serviços enquanto empregado da empresa
ferroviária, podendo haver outros que tinham uma visão e postura diferentes, reclamando das
condições de trabalho e assistência aos trabalhadores da Viação Férrea Federal Leste
Brasileiro.
Este entrevistado, ao se referir ao pagamento dos empregados da estrada de ferro,
aproveita para focalizar a organização e regularidade com que eram feitos os pagamentos dos
242
Trecho da entrevista realizada com Valdir Serra Sena, 29 set. 2002, Jacobina-Ba.
243
Trecho da entrevista realizada com Antônio Francisco Rego, set. 2002, Jacobina-Ba.
82
funcionários da Leste, que, segundo ele, o deixava de pagar a nenhum de seus
trabalhadores.
[...] A inspetoria lá acertava mandava pra chefia para ser regularizado o
pagamento. Vinha um trem exclusivo para fazer o pagamento, rodando de
Salvador ao fim da linha, se era linha sul até Monte Azul, se era esta que era
Centro-Oeste ia até Iaçú, o entroncamento
244
.
Ao falar sobre o funcionamento da Leste e do tratamento que a empresa tinha para
com seus funcionários, Sr. Antônio F. Rego também se reporta à licença médica concedida
não deixando de lembrar a forma de pagamento do salário dos ferroviários, que, segundo ele,
depois de um assalto do trem que levava o dinheiro para pagar-lhes, passou a ser feito pelo
banco.
A pessoa tava doente tinha que recorrer ao médico, e coisa e enquanto não
ficasse bom não ia trabalhar, e o salário... Ia um trem exclusivamente
pagando né? Pagando o povo de fora a fora, agora depois teve um assalto e
então resolveram mandar pelo banco, nós pegamos a receber pelo
banco
245
.
É provável que outros empregados da ferrovia tenham outro olhar sobre a forma de
tratamento, o valor e regularidade dos salários pagos, podendo haver críticas às excessivas
cargas horárias de trabalho e às poucas horas de descanso, reivindicando melhores salários.
Os ex-ferroviários entrevistados demonstram orgulho por terem trabalhado na
Empresa Ferroviária Federal Leste Brasileiro, associando-a ao getulismo e trabalhismo. Têm
um sentimento de identidade e reconhecimento com o ambiente de trabalho e a função que
exerciam na ferrovia. Antonio Francisco Rego demonstrou sempre muito orgulho em ter
trabalhado na Leste Brasileiro, e do que fazia, dando uma entonação maior sempre que se
referia ao Presidente que o nomeou ao cargo: “[...] Fui nomeado a trabalhador por Getúlio
Vargas. Porque naquele tempo quem nomeava era ele, o presidente, Getúlio Vargas
(entonação) [...]
246
”.
Por que Sr. Antonio demonstrou tal orgulho? Por que destacou com tanta veemência o
nome de quem o nomeou? Inferimos que para ele era motivo de muito se orgulhar da sua
entrada no mundo do trabalho ferroviário, pois quem o tinha nomeado não foi qualquer pessoa
e sim o presidente da república, que representava e simbolizava a nação brasileira,
demonstrando a ligação da memória a um sentimento de nacionalismo e amor à pátria.
244
Trecho da entrevista realizada com Antônio Francisco Rego, set. 2002, Jacobina-Ba.
245
Ibidem.
246
Ibidem.
83
O Sr. Antônio F. Rego trabalhou na ferrovia, quando ela já tinha sido encampada pelo
Governo Federal. Ele primeiro foi trabalhador, depois feitor e por fim a mestre de linha,
sempre fazendo questão de diferenciar o que fazia e como realizava seu trabalho em cada
função que ocupou na ferrovia, não deixando destacar o nome de quem o tinha nomeado para
exercer os devidos cargos e funções: “É sim a ferrovia era companhia [...]? Mas [...] eu
quando trabalhei não foi como companhia, quando eu fui nomeado foi pelo presidente. Fui
nomeado por Getúlio Vargas
247
”.
Durante a entrevista Antônio F. Rego sai em defesa da disciplina e da ordem na
execução do trabalho ferroviário. Quando lhe foi perguntado sobre o que fazia e qual a função
que exerceu na ferrovia, se posicionou sem questionar a situação dos trabalhadores frente à
rotina exploradora:
F. M. S. E o senhor fazia o quê? A. F. R. Bom aí é o seguinte, nós
trabalhávamos de capinação de asseio da linha, trabalhador, trabalhei [...]
sob a guarda de um feitor, faz tantos anos agora que eu num posso tirar de
trabalhador e depois disso fui nomeado... aliás, o que é que eu fazia, né?
Capinava linha, mudava dormente, segurança dos trilhos, mudava trilho
quando tava torto, é pegava linha sob macaco, macaco de mão rodando,
suspendendo a linha pra nivelar [...]. [...] Depois da linha nivelada socava os
paus, se a terra não dava pra cubrir ia se cavar a terra nos cortes pra trazer a
tróleo* pra lastrar*, depois disso ficava a linha pronta
248
.
Segundo nosso ex-ferroviário entrevistado, os funcionários utilizavam os serviços de
trem e viajavam pela linha férrea para cumprimento das suas tarefas e para averiguar o
funcionamento e andamento dos serviços de transporte ferroviário, trabalho que o mestre de
linha, uma vez por mês, fazia a pé.
F. M. S. – Sim, quem era da população que andava de trem?
A. F. R. – Os funcionários
F. M. S. – Só os funcionários?
A. F. R. Bom, os funcionários, cada trem tinha sua lotação, se era carga,
era os guarda-freio, um breque com o [...] bagageiro, o breque, é o bagageiro
é que andava [...] ou chefe de trem, agora o trem... passageiro tinha o breque
que é onde carregava o chefe de trem, o bagageiro e os guarda-freio, etc,
guarda-freio
249
.
Nesta sua entrevista, o ex-ferroviário também explicou que existiam vagões chamados
de Trem de Lastro. Este Trem era usado para carregar o material para lastrar a linha férrea, ou
247
Trecho da entrevista realizada com Antônio Francisco Rego, set. 2002, Jacobina-Ba.
248
Ibidem.
249
Ibidem.
84
seja, deixar as pedras, as britas, perto do local de onde estivessem trabalhando, conduzindo
um breque com um feitor responsável pelo serviço, pegando as turmas para o trabalho.
O trem de lastro conduzia cinco prancha [sic] ou seis prancha [sic] e um
breque com [...] o chefe, com o feitor, nesse tempo era feitor, feitor de trem
de lastro, aí, se era pra carregar terra, aquelas prancha ia [...] pra o do
serviço, pra onde tinham cavado a terra e as turmas, pegava as turmas,
uma, duas, três[...]
250
[grifo do autor]
na fala de Sr. Antônio, empolgação e orgulho por seu trabalho, ao falar da sua
rotina diária, enquanto trabalhador da ferrovia. Ao mesmo tempo também se percebe como as
questões da disciplina e da ordem estão presentes no trabalho ferroviário. Não era tirar
dormente e limpar linha, era tirar dormente e limpar linha com dedicação e presteza, a
qualquer hora, em favor do bom funcionamento da empresa ferroviária, que precisava de
funcionários prestativos, responsáveis e zelosos pela sua existência. Essa era a ideologia que a
administração da Leste pregava aos ferroviários, que às vezes seguiam ou não e que em
determinados momentos, analisando-se as circunstâncias, procuravam cumprir as ordens e a
disciplina de trabalho impostas.
Na sua entrevista, Antônio F. Rego deixa claro como era feito o cumprimento do
horário de trabalho, sendo, segundo ele, destinada somente uma hora para almoço, o que
representa a necessidade dessa empresa seguir as exigências de uma ótica capitalista de
mercado, onde não se pode perder tempo, deve-se primar pelo trabalho e pelos lucros: “O
horário de trabalho, nós pegava as sete e arriava as dez, tinha uma hora pra descanso, meio dia
tornava a pegar e arriava as dezesseis
251
”.
A questão da disciplina e ordem no trabalho também é percebida nesta entrevista
quando fala sobre o conserto de um pontilhão totalmente destruído por um acidente de trem,
destacando a desenvoltura e agilidade com que, mesmo sem querer, realizou esse trabalho,
calculado para ser realizado em três dias, entregando o serviço antes do tempo previsto.
O mestre de linha [...] levou pra estação na frente e me entregou o serviço eu
sem querer ele ali disse aos feitores que quem recusasse a ordem do serviço
palavreada por mim, eram suspensos 15 dias. E eu peguei esse serviço e,
agora diga que hora eu chamei o trem pra passar? (tom de questionamento)
Zero hora chamei o trem pra passar, calculado pra três dias, zero hora eu
mandei o trem passar
252
.
250
Trecho da entrevista realizada com Antônio Francisco Rego, set. 2002, Jacobina-Ba.
251
Ibidem.
252
Ibidem.
85
Para dar conta do serviço, Antônio Francisco Rego relata como coordenou os
trabalhos de restauração do pontilhão e manteve o ritmo intenso dos trabalhadores da ferrovia
daquele trecho da linha. A eficiência do serviço foi tal, que nem mesmo seus superiores
acreditaram no resultado, devido ao estado em que havia ficado o pontilhão após o desastre.
Parece que o inspetor num levou muita confiança, eu tava tirando ferramenta
para aqui, ele disse seu Antonio vamos ver o local onde o trem tombou ai
quando chegou lá ele me entregou o serviço, eu falei não doutor eu vim tirar
ferramenta, vou pra casa, não é você que vai tomar conta do serviço [...] e eu
tomei conta do serviço [...] e aqui uma turma come, e vem e a outra vai
trabalhar, ninguém para (entonação), e administrei o negocio num é, um vai
botando, uma vai pra botar esses trilhos tortos pra fora, uma vai fazendo [...]
a, acertando a terra, outra vai botando os dormentes outra vai [...] [...]
bitolando, não outra trazendo o trilho, os trilhos e assentando, outra vai
grampeando e furando e [...] distribui e dois feitores tomam conta desse
pontilhão e quero, num quero demora pra terminar...
253
.
O entrevistado também contou que depois que terminou o serviço, recebeu uma
promoção de cargo para inspetor e aumento de salário por ter realizado o trabalho com tanta
dedicação, mas não aceitou, por medo de perder sua aposentadoria. Hoje, analisando melhor a
situação, se arrepende, por ter perdido, naquela época, o cargo e o dinheiro.
O inspetor veio aqui, me deu onze diárias [...] e o cargo [...] de subinspetor,
eu num quis, ele me mandou dormir e consultar meu travesseiro que ia hoje,
mas não vou deixar pra amanhã, pra consultar com seus travesseiros. Eu
tinha requerido a aposentadoria e num queria que cortasse, eu digo que vou
pra e nego pode cortar minha aposentadoria, chega ao outro dia, num
quero não doutor, seu [...] e entrou lá pra cabine e não saiu mais. Agora fui,
depois enfim ... analisar que quem viu poder perder cargo e dinheiro né?
Como é que pode? Perder cargo e dinheiro, eu acho que ... 200 ou 500
tirando bem né? (risos)
254
.
Ao ter quer decidir entre ter sua aposentadoria ou ser promovido e continuar
trabalhando na ferrovia, Antônio não pensou duas vezes, optou por ter o direito de gozar sua
aposentadoria. Esse comportamento pode ter várias explicações. Uma delas seria a falta de
conhecimento sobre as questões trabalhistas, pois aceitar continuar trabalhando no novo cargo
não implicaria na perda de sua aposentadoria. Isso se deu talvez por não procurar um maior
esclarecimento e se informar no sindicato ou devido à falta de acompanhamento e atuação do
sindicato junto aos ferroviários. Também se pode inferir que senhor Antônio talvez estivesse
cansado e quisesse se ver livre do trabalho na ferrovia, preferindo o descanso de uma boa
aposentaria a continuar trabalhando, mesmo ganhado mais.
253
Trecho da entrevista realizada com Antônio Francisco Rego, set. 2002, Jacobina-Ba.
254
Ibidem.
86
Ressaltamos também da entrevista com Antônio sua preocupação em tornar conhecido
o nome da ferrovia e em manter viva a sua história, fazendo questão de enfocar e perguntar
algumas vezes se a entrevistadora sabia o nome da ferrovia, para qual tinha a satisfação de ter
trabalhado, sentindo-se na obrigação e responsabilidade de falar e não deixar que o tema fosse
relegado ao esquecimento e insignificância, sendo que, muitas pessoas nem lembram mais dos
fatos em questão. Talvez até seus netos desconheçam o nome da primeira empresa ferroviária
da Bahia na qual seu avô trabalhou. Podemos perceber isso, nesse trecho da sua entrevista:
A. F. R. - Já tem o nome da ferrovia?
F. M. S. - Não, pode falar, fale sobre a ferrovia.
A. F. R. - A ferroviária...
F. M. S. - O senhor está ansioso para falar sobre a ferrovia.
A. F. R. - Era o nome dessas estradas, a linha sul, o nome é ferrovia O Leste
Brasileiro, não é Ferroviária Leste Brasileiro, o nome da estrada de ferro
255
.
Na maioria das vezes, os ex-ferroviários buscam reafirmar o caráter prático da
ferrovia. Ressaltam sua contribuição para o desenvolvimento econômico da cidade de
Jacobina e região, possibilitando sua expansão comercial. Isso fica explícito na fala do senhor
Valdir Serra Sena quando lhe perguntamos sobre a influência da ferrovia para a região. Disse
que a ferrovia era importante por que: “Tudo, tudo era o transporte, era o transporte [...] de
tudo, daqui saia o ouro, saia tudo...
256
”.
A fala do Sr. Valdir Serra Sena deixa transparecer um pouco de exagero e entusiasmo
ao enfocar o quanto a ferrovia era importante para a cidade. Quando diz que a ferrovia era
tudo, para ele não representava pouca coisa, era o principal transporte da região, que levava e
trazia riqueza para a cidade de Jacobina.
2.4 A FERROVIA EM JACOBINA.
A ferrovia chegou à cidade de Jacobina com um pouco de atraso em relação a outras
cidades do sertão baiano, que tinham menor representatividade no âmbito regional a exemplo
de Senhor do Bonfim e Juazeiro. Jacobina somente será beneficiada com o meio de transporte
ferroviário quarenta anos após sua emancipação política e elevação à categoria de Agrícola
Cidade de Santo Antônio Jacobina o que, de certa maneira, causou expectativas e a deixou em
255
Trecho da entrevista realizada com Antônio Francisco Rego, set. 2002, Jacobina-Ba.
256
Trecho da entrevista realizada com Valdir Serra Sena, 29 set. 2002, Jacobina-Ba.
87
desvantagem em termos de crescimento comercial, devido à demora de sua inserção na malha
ferroviária do Estado em relação a essas outras cidades, que haviam sido prioritariamente
atendidas com o transporte ferroviário.
As ferrovias sempre serviram como instrumento de poder das elites desejosas por “[...]
redesenhar o perfil do país e de seus habitantes, afastando a imagem de ‘atrasado’ e ‘exótico’
que julgavam herança do período imperial [...]”
257
. “Nestes termos, colocava-se como uma
necessidade ‘civilizar’os sertões, impondo aos seus moradores novas concepções de tempo,
propriedade e trabalho”
258
. É com o objetivo de trazer desenvolvimento e de integração
econômica da região sertaneja à capital baiana, que o transporte ferroviário foi implantado,
em 1920, na cidade de Jacobina.
Sua instalação tinha o intuito de ligar Jacobina à capital baiana e colocá-la em contato
com a modernidade que atingiu a maioria das grandes cidades brasileiras, a exemplo do Rio
de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais. Esta influência chegou a algumas cidades do interior
baiano, trazendo consigo transformações no âmbito social e cultural e também o anseio de
uma maior visibilidade e desenvolvimento para a cidade e região, o que poderia vir a
acontecer com a passagem da linha férrea. Porém, foi em contexto conturbado e redefinidor
das suas funções urbanas que a ferrovia chegou à Jacobina.
A linha férrea que passava pela sede de Piemonte da Diamantina, denominada Estrada
de Ferro de São Francisco, ligava Salvador a Juazeiro
259
. O ramal que entrava em Jacobina
originava-se no município baiano de Senhor do Bonfim, passando pelo sub-ramal de Campo
Formoso, até chegar ao destino final em Iaçu (nesta época conhecida como Paraguaçu). Em
Paraguaçu, a Estrada de Ferro do São Francisco desembocava pelo lado sul na Estrada de
Ferro Central da Bahia, interligando assim o Estado da Bahia ao de Minas Gerais. Ainda que
diga respeito às linhas férreas no ano de 1969, estes trechos de estrada citados são os mesmos
contemplados no mapa abaixo.
257
Gilmar Arruda. Cidades e Sertões: entre a história e a memória. Bauru, SP: Edusc, 2000. p. 103.
258
Idem. Ibidem. p. 99.
259
Antiga Bahia and São Francisco Railway, construída a partir de um contrato entre o Governo Federal e a
Viação Geral da Bahia, em 15 abr. 1911, aprovado pelo decreto nº. 8.648, de 31 mar. do mesmo ano, como
revisão do contrato de 31 out. 1910, aprovado pelo decreto de nº. 8.321, de 23 do mesmo mês e ano.
88
Figura 7 - Mapa do Traçado da Viação Férrea Federal Leste Brasileiro, em 1969.
Fonte: José Emílio de Castro H.; João Bosco Setti. Ferrovia Centro Atlântica:
uma ferrovia e suas raízes. Memória do trem: Brasil, 2001. p. 74.
A primeira parte da linha que passaria em Jacobina começou sua construção em 27 de
maio de 1912
260
no município de Senhor do Bonfim (doravante chamada de Bonfim) com
uma extensão de 118 km. O primeiro trecho desta linha ligava Bonfim à cidade Pindobaçú
(que fica pouco antes de se chegar a Jacobina, vindo de Bonfim) foi inaugurado em março de
1917; mais tarde este trecho ampliou-se atingindo a cidade de Jacobina, graças à edificação do
sub-ramal que, partindo da estação de Itinga (atual município de Antônio Gonçalves), ao subir
o curso do Riacho Água Branca, chegou a Campo Formoso
261
. O primeiro trem de ferro
260
Aprovada pelo decreto nº. 9.597.
261
Construção aprovada pelo decreto nº. 9. 597, de 14 de agosto de 1912 e inaugurado em mai. 1917. José
Trajano. História da Viação Férrea Federal Leste Brasileiro. [s.n.t.]. p. 8.
89
chegou a Jacobina em 21 de março de 1919, no entanto sua operacionalização somente foi
ocorrer um ano e meio depois (27 de junho de 1920
262
), atravessando a linha Centro Sul da
Divisão da Leste
263
.
O segundo trecho desse ramal, ligando Jacobina ao povoado de França, foi inaugurado
em 12 de outubro de 1923, com estações no município de Djalma Dutra (hoje, Miguel
Calmon) e no povoado de França
264
. O trecho, conectando a cidade Barra de Mundo Novo à
Itaíba, foi construído com a finalidade de entroncar com o ramal de Iaçu, completando-se a
ligação entre a linha de São Francisco e a Central da Bahia.
Segundo Aloísio Sales de Queiroz, o início do século XX foi um período de grandes
avanços na construção ferroviária na região do Piemonte da Chapada Diamantina, sendo
também uma época de muitas dificuldades, tanto pelas condições tecnológicas pouco
desenvolvidas, quanto pelos fatores geográficos que não eram compatíveis com a realização
de tal empreendimento
265
.
Inicialmente, a implantação do transporte ferroviário não foi visto com bons olhos,
mas, depois, a chegada da ferrovia foi exaltada e ao que se demonstra veio a satisfazer a
população, sendo vista como algo bom e próspero para a cidade, como registrou o jornal, O
Lidador, quinze anos depois: “Incontestavelmente a estrada de ferro tem sido poderosa
propulsora do progresso comercial nesta zona, apesar da exorbitância de suas tarifas, que
oneram em mais de 20% certos artigos, da Calçada [estação na cidade de Salvador] a esta
cidade”
266
.
Ao ressaltar a importância comercial da ferrovia, este jornal aproveitou para denunciar
a questão do preço das tarifas ferroviárias, consideradas abusivas e injustas. Pode-se inferir
que o preço abusivo e exorbitante, com certeza, repercutiria onerosamente para os
comerciantes que teriam que pagar mais caro pela compra e transporte de suas mercadorias e,
mormente, para o restante da população que pagaria mais caro pelos bilhetes da passagem de
trem.
262
De acordo com o Guia Geral das Estradas de Ferro e Empresas de Transportes com elas Articuladas. G-1,
Nomenclatura, posição, altitude, data de inauguração, regime de funcionamento de estações, portos e agências.
[s.l.]: [s.ed.], 1960, a ferrovia atingiu Jacobina em 27 jun. 1920, a uma altitude de 468 metros, distante do ponto
inicial da linha 558.948 metros.
263
Segundo Aloísio Sales Queiroz. “O Trem das Grotas”. A Letra em Revista. Jacobina-Ba: Academia
Jacobinense de Letras, Set. 2001. p. 17 e em José Trajano. História da Viação Férrea Federal Leste Brasileiro.
[s.n.t.]. p. 8, a linha férrea chegou à estação de Jacobina em 7 set. 1920.
264
Aprovado pelos decretos nº
s
9.637 e 9.754, respectivamente de 26 jul. e 4 set. 1912.
265
Aloísio Sales Queiroz. Op.cit.. p. 17.
266
Edição de 7 set. 1935.
90
Pelo trem de cargas, eram transportados vários tipos de produtos comerciais, desde
cereais até metais mais valiosos, como o ouro explorado na região. Segundo o ex-ferroviário
Antônio Francisco Rego, tudo era transportado pela ferrovia, o trem de carga levava qualquer
tipo de produto.
O trem de carga era para tudo, carregava pedra, carregava pau, carregava
ferro, carregava o boi, tinha trem que era [...] lotado de boi, cinco, seis, carro
de boiada, trem de carga carregava material em grosso, esse chamava trem
de carga. Trem cargueiro né? Tudo [...], transportava qualquer coisa
267
.
Antônio Francisco Rego buscou ressaltar a importância que teve a ferrovia como um
dos meios de transporte mais modernos (neste período havia os caminhões, como falamos
acima, a respeito da substituição da ferrovia pela rodovia) e utilizados em Jacobina. Nesta
época, os vagões carregavam qualquer material, desde aqueles de maior valor venal, como
ouro, ou de menor valor, como pedra e madeira, facilitando a compra e venda de produtos,
contribuindo para a ampliação e desenvolvimento da função comercial de Jacobina.
Ao ser indagado sobre os produtos mais comercializados pela ferrovia na cidade, Sr.
Antonio destacou a mamona, produto este cuja produção estava em alta. Até hoje, é bastante
produzido na zona rural de Jacobina, principalmente, na região do Junco, onde se pode
constatar a criação de cooperativas para beneficiamento deste vegetal.
F. M. S. – Quais eram os produtos mais transportados pela linha férrea daqui
de Jacobina? A. F. R. Aqui de Jacobina [...], mamona [...].Quando tinha
essa fábrica de sisal, sisal, não pegava trem direto para aqui. Aqui e para
aqui é... a não ser o sisal e ... se tivesse mamona para abastecer [...] Quer
dizer aí já é para o trem de carga [...]. É pra o trem de carga
268
.
A tabela abaixo se refere aos valores gastos com os materiais transportados pela
estação de Jacobina do período de 1941 a 1948. Percebe-se que a produção de Jacobina não é
muito grande, quando comparada com a de outras cidades de igual porte. O período em que a
referida estação esteve com melhor e maior total de receita foi durante os anos de 1941 e
1944, sendo o pior ano de sua arrecadação o de 1947.
Tabela 4 - Receita da Estação de Jacobina de 1941 a 1948 (em réis).
Ano Viajantes Bagagen
s
Encomenda
s
Animais Mercadoria
s
Armazenage
m
Telegrama
s
Outros Receita
total
194
1
--------- --------- ----------- ---------- ------------ ------------ ----------- --------- 660.137,8
5
194
2
222.439,9
0
---------- 22.381,40 5.479,70 450.892,40 292,70 2.096,70 1.273,3
0
704.945,8
0
194 198.255,2 1.520,00 28.293,70 35.061,2 362.466,70 66,40 1.965,70 1.019,7 663.379,4
267
Trecho da entrevista realizada com Antônio Francisco Rego, set. 2002, Jacobina-Ba.
268
Ibidem.
91
3 0 0 0 0
194
4
198.478,5
0
2.205,40 29.421,00 17.480,6
0
526.527,70 300,40 2.522,90 1.786,7
0
851.119,1
0
194
5
219.198,1
0
660,00 49.544,90 9.588,30 295.840,50 8.545,10 2.483,00 1.525,3
0
654.460,6
0
194
6
208.833,7
0
675,60 36.134,30 7.892,10 320.653,30 325,50 2.579,10 1.284,2
0
649.506,3
0
194
7
173.816,9
0
1.566,90 26.682,70 5.889,10 216.833,50 475,80 3.001,05 775,40 470.029,1
5
194
8
181.509,7
0
609,40 25.375,60 7.058,70 389.267,80 190,70 3.047,65 547,20 662.909,8
5
Fonte: Relatórios da Leste Brasileiro dos exercícios dos anos de 1943 a 1948.
Notamos que a Estação de Jacobina, dentre os anos de 1941 a 1948, gastou mais com
o transporte de mercadorias do que com qualquer outro item da receita total. Em segundo
lugar, o item com o que mais se gastava era o das encomendas, notando-se também que o
valor gasto com bagagens era relativamente pequeno em comparação ao número de
passageiros. A sua receita anual manteve uma ordem dos seiscentos a setecentos mil réis,
exceto no ano de 1947, cujo valor foi de 470 mil réis, significando ficits nas contas da
empresa.
A Leste adotava idéias comerciais competitivas, atendendo a ordens getulistas e
trabalhistas, obedecendo às decisões de fora do país, sendo que, a maioria do que era
comercializado através da ferrovia era programado a partir das possibilidades dos mercados
regional e nacional, visando ao lucro e ao atendimento dos interesses e bem-estar de algumas
pessoas, ou seja, a população rica de Jacobina.
Devemos pensar o contexto da chegada da ferrovia em Jacobina, analisando a que
interesses e a quem, a qual grupo social, a implantação da Leste Brasileiro atendia e
interessava. É preciso perguntar o que representou o transporte ferroviário no final do século
XIX e início do seguinte no Brasil e qual a importância da ferrovia nos aspectos sociais e
econômicos para a cidade em estudo.
A chegada da ferrovia gerou entusiasmos e expectativas por uma parte da população
jacobinense, que esperava com a vinda do trem, mudanças na dinâmica dos transportes e um
desenvolvimento comercial e urbano. Como podemos ver no trecho abaixo, a sensação de
quem viu uma Maria Fumaça cortar os sertões baianos era uma mistura de espanto,
admiração e expectativa”
269
.
De repente, eles perceberam por trás das janelinhas da tal máquina esquisita,
mais parecida com uma cobra gigante, uns lencinhos brancos se agitando ao
vento. Um sinal de aquele troço sobre os trilhos vai mudar suas vidas,
269
“Maria Fumaça: Estrada de ferro nasceu em meados do século XIX como símbolo da integração nacional”.
Correio da Bahia. Repórter, 24 jul. 2001.
92
tirando-os do isolamento com o qual já se acostumaram, [...]. Era o trem que
chegava e junto com ele a promessa do desenvolvimento
270
.
Entretanto essa expectativa não foi correspondida, visto que, a situação financeira
deficitária contribuiu para que a empresa investisse cada vez menos na manutenção e
reposição de equipamento ferroviário, gerando uma insatisfação nas pessoas que utilizavam
seus serviços. Essa situação suscitou críticas sobre sua forma de administração e
funcionamento, que não correspondiam mais aos objetivos que nela foram depositados. Em
outra matéria, o jornal O Lidador expõe certa decepção com o estado de coisas que essa
condição da ferrovia traz e por si não podia mudar.
Os passageiros estavam todos contrariados e sobressaltados com a falta de
luz, de higiene e de segurança daquele trem que vinha largando os pedaços
pelo caminho. Enquanto a companhia nos trata como a um burgo podre, as
estações do ramal, de Piritiba a Bonfim, lhe dão renda nunca inferior a 300
contos mensais. a estação de Jacobina rende 30 contos, mensalmente e,
por sinal, é iluminada a fifó, porque a E’ste que continua absorvendo o nosso
ouro e servindo pessimamente o brasileiro
271
.
A distribuição dos serviços ferroviários em Jacobina não era diferente da de outras
cidades. Existiam os trens que faziam o transporte de passageiros e os que eram destinados ao
transporte de mercadorias, chamados de trem cargueiro. O trem de passageiros era dividido
em três classes diferenciadas pelo valor da passagem. A primeira classe era onde ficava o
restaurante, destinada às pessoas mais influentes de Jacobina, enquanto que, na segunda,
viajavam pessoas de médias posses e na terceira as pessoas de baixa renda, por ser a passagem
mais barata, o que demonstra a estratificação social existente dentro da sociedade, como nos
dias atuais. Também existiam os trens mistos que levavam passageiros da primeira e da
segunda classe. Podemos perceber que mesmo com essa diferenciação no atendimento dos
serviços de trem, eram procurados e utilizados por todos os tipos de pessoas.
Podemos perceber no início do século XX, a ferrovia como uma nova máquina e
transporte de massa, que “[...] servia aos negros escravos, pobres quitandeiros, mulheres,
crianças e aos membros da elite em quase igualdade”
272
. Entretanto, os abastados
comerciantes e os falidos, porém orgulhosos antigos proprietários de terra não viram com
bons olhos a utilização do trem por pessoas de posições sociais diferentes. “Mesmo separadas
270
.“Maria Fumaça: Estrada de ferro nasceu em meados do século XIX como mbolo da integração nacional”.
Correio da Bahia. Repórter, 24 jul. 2001.
271
O Lidador, 8 dez. 1934.
272
“Maria Fumaça: Estrada de ferro nasceu em meados do século XIX...”Op. cit.
93
em vagões específicos para classes sociais, as famílias nobres não gostavam da idéia de
dividir o mesmo meio de locomoção com pessoas consideras inferiores”
273
.
273
“Maria Fumaça: Estrada de ferro nasceu em meados do século XIX como símbolo da integração nacional”.
Correio da Bahia. Repórter, 24 jul. 2001.
94
CAPÍTULO III A FERROVIA E AS MUDANÇAS EM JACOBINA.
3.1PIUÍÍ ... CHEGOU O TREM DAS GROTAS! O CONTEXTO DE SUA IMPLANTAÇÃO
O transporte ferroviário chegou à Jacobina em um contexto idealizador da
modernidade que se vivia no mundo: mudanças conjunturais nos aspectos urbanos e
socioculturais, ampliação dos meios técnico-científicos e das indústrias de produção em série,
construção e implantação das ferrovias no país
274.
Para Nicolau Sevcenko, “nenhuma
impressão marcou mais fortemente as gerações que viveram entre o final do século XIX e o
início do século XX, do que a mudança vertiginosa dos cenários e comportamentos, sobretudo
no âmbito das grandes cidades”
275
. Seria esse o contexto da vida moderna, com novos ritmos
de trabalho e fragmentação da experiência urbana, relacionada ao uso da tecnologia.
A partir de meados do século XIX, iniciou-se um processo de transformação urbana de
cidades européias com aspiração de modernização, urbanização e embelezamento,
representando uma reestruturação e mudanças dos valores e do cotidiano da sociedade
européia, pois da maneira como estava organizada e estruturada não convergia aos novos
paradigmas de ordem e de progresso impostos pelo capitalismo industrial. Mediante a
implementação de reformas nas cidades, aliadas à novos valores sociais e costumes, a Europa
se impôs como um modelo de civilidade e sociabilidade a ser seguido pelo mundo ocidental.
A estética e o embelezamento urbano, juntamente com a moralização da população eram
considerados como índices de civilidade tomando como parâmetro a cidade européia
276
.
O Brasil acompanhou estas mudanças nas dimensões social, política, econômica e
urbana, inserindo-se na nova ordem mundial, tentando adequar as idéias vindas da Europa à
sua realidade à qual ainda se estruturava sob as bases do sistema escravista, empreendendo
um processo de urbanização segundo os moldes europeus. Era o ingresso do Brasil no campo
da modernidade, alinhando-se com os padrões e o ritmo da economia européia
277
.
274
“O século XIX foi um período de avanços científicos, prodigiosos, durante o qual campos completamente
novos surgiram [...] O desenvolvimento tecnológico também foi espetacular [...]. Transporte, eletrificação,
indústrias químicas, controle de doenças [...] estavam alterando a sociedade de modo profundo e irreversível.
Ivan Tolstói apud Nicolau Sevcenko. “A Capital Irradiante: técnica, ritmos e ritos do rio”. História da vida
privada no Brasil. v. 3. São Paulo: Companhia das Letras, 1998. p. 515.
275
Nicolau Sevcenko. Op. cit.. p. 515.
276
Lúcia Silva. “A Cidade do Rio de Janeiro nos Anos 20: urbanização e vida urbana”. Déa Ribeiro Fenelon
(Org.). Cidades. São Paulo: Olho d’água, 1999. p. 63.
277
Gilmar Arruda. Cidades e Sertões: entre a história e a memória. Bauru, SP: Edusc, 2000. p. 102.
95
O Trem das Grotas chegou à cidade de Jacobina na primeira metade do século XX,
um período não de renovação, mudanças, superação do atraso e construção de um ideal de
nação
278
, como também um tempo marcado por conflitos e ambigüidades, que dificultavam a
constituição e a realização de um projeto de formação da nacionalidade brasileira e do seu
ideal modernizador
279
. Essa idéia nada mais era do que uma representação ideológica que
servia aos interesses dos que mandavam e mandam em nosso país, a criação do “mito
fundador” do Brasil
280
.
Uma época em que se observou a origem do processo de modernidade do Brasil,
decisiva no que se refere aos impactos das mudanças nos planos material, social e político-
cultural, de confluência, auge e crise na produção econômica agro-exportadora e também de
consolidação de uma sociedade burguesa que estava preocupada com questões referentes aos
aspectos internos da sociedade brasileira, primando-se pelo desenvolvimento da economia
urbano-industrial, voltada para o crescimento do mercado interno do país.
Figura 8 - Trem das Grotas. Autor: Amado Nunes, 1960.
Fonte: Núcleo de Estudos de Cultura e Cidade da
Universidade do Estado da Bahia, Campus IV.
Ainda que seja uma fotografia dos anos 60, a imagem acima pode simbolizar o Trem
das Grotas chegando à cidade. É um registro do desenvolvimento tecnológico na construção e
implantação do transporte ferroviário na região, da emoção que causava o apito da máquina e
o rasgo dos trilhos de ferro em Jacobina. O fotógrafo conseguiu flagrar e registrar um costume
antigo com origem pelos idos de 1920, quando a ferrovia foi implementada em Jacobina,
segundo alguns contemporâneos relatam em suas memórias, e outros nas rápidas conversas
278
Segundo Marilena Chauí. Brasil: mito fundador e sociedade autoritária. São Paulo: Fundação Perseu Abramo,
2001. p. 14, a invenção histórica da nação, entendida como Estado-nação, definida pela independência ou
soberania, é muito recente. Sua data pode ser colocada por volta de 1830.
279
Em alguns momentos o antigo foi rechaçado e em outros ele serviu de refúgio para a crítica ao processo de
modernização da cidade e de seus hábitos, havendo por parte de alguns o medo do novo, “de perder as raízes”.
280
Marilena Chauí. Op.cit.. p. 9.
96
que tivemos: o pongar no trem, enquanto ele ainda estava em movimento. Hábito este
censurado pelos serviços de transporte ferroviário, por ocasionar acidentes.
O fotógrafo captou também um pouco da paisagem geográfica e peculiar do sertão
baiano, constituída pelas serras de Jacobina, que tornava a viagem de trem um atrativo para os
amantes da natureza, oferecendo um passeio agradável, direcionando seu olhar para o trem
que está chegando ao seu destino.
Na passagem do século XIX para o século XX, a sociedade brasileira foi marcada por
profundas transformações dentro do processo histórico, como a mudança política na forma de
governo, mudanças nas relações sociais com a adoção do regime republicano, além de uma
nova rearticulação comercial no cenário econômico. Com o advento da República, novas
relações sociais e comerciais foram sendo estabelecidas, incorporando-se costumes, diferentes
modos de vida, enfim, novas formas de sociabilidade.
Surgiram novos atores sociais (classe operária, camadas médias urbanas e militares)
que passaram a interferir e a delinear um novo cenário político e social, surgindo novas idéias
liberais e modernizadoras, expressas no plano da política e nas mudanças de pensamento,
sensibilidade e gosto, que interferiram implícita e explicitamente nos aspectos do cotidiano da
vida material da sociedade brasileira.
A cidade do Rio de Janeiro se tornou o principal foco de disseminação das “idéias
modernizantes” vindas da Europa, devido à sua situação privilegiada na intermediação dos
recursos da economia cafeeira, e sua condição de centro político e comercial do país na
época
281
. Buscava-se dar ao Rio de Janeiro um caráter de cidade cosmopolita e moderna que
deveria ser seguido pelas outras cidades brasileiras. “O Rio passa a ditar não as novas
modas e comportamentos, mas acima de tudo os sistemas de valores, o modo de vida, a
sensibilidade, o estado de espírito e as disposições pulsionais que articulam a modernidade
como uma experiência existencial e intima”
282
.
No cenário baiano, passou-se também por um momento de transformações nas
primeiras décadas do vigésimo século. Ao assumir o Governo do Estado, J. J. Seabra iniciou
uma política de reformas urbanas e modernidade da cidade de Salvador, edificando novos
prédios, construindo e alargando ruas e calçadas, embelezando a cidade com jardins e praças
sofisticadas. Foi o período de um verdadeiro “bota-abaixo” na capital do Estado, de
281
Nicolau Sevcenko. “A Capital Irradiante: técnica, ritmos e ritos do rio”. História da vida privada no Brasil. v.
3. São Paulo: Companhia das Letras, 1998. p. 522.
282
Ibidem.
97
reconstrução e remodelação da cidade. Era a época do “seabrismo”
283
que procurava acabar
com a feição colonial de Salvador, inspirada no exemplo do Rio de Janeiro, sinônimo de
progresso que deveria ser adotado por outras cidades do interior baiano
284
.
As mudanças ocorridas na capital, neste período, foram sentidas, mesmo que de
formas e em graus de abrangência diferenciados, em alguns municípios da Bahia, a exemplo
de Lençóis, Caetité, Senhor do Bonfim e, claro, Jacobina. Esses municípios tinham
representatividade política em âmbito regional e local que ajudaram a mudar a feição e a
dinâmica social, trazendo ares de modernidade e influenciando no status de cidade. Para
Vanicléia Santos “poderíamos pensar também que Jacobina estivesse recebendo influências
da cidade de Salvador nesse período, com os surtos modernizantes das administrações de J. J.
Seabra (1912-16) e Goés Calmon (1924-28)”
285
.
Jacobina, assim como outras cidades do interior baiano, era uma cidade pequena e
pacata que passava por algumas transformações nas dimensões política, econômica, social e
urbana, como disputas e conflitos no cenário político, crescimento comercial, e também
mudanças no espaço urbano com a chegada de certos equipamentos como eletricidade, água
encanada, canalização dos rios, embelezamento e construção de praças e jardins e, com
destaque, a construção da ferrovia
286
, elementos que interferirão na construção de novos
hábitos e costumes considerados mais citadinos.
Neste momento, em meio ao que seria considerado moderno e rural, Jacobina pode ser
representada como um verdadeiro e rico mosaico de contradições. Tinha uma base econômica
e social agrária e, ao mesmo tempo, fervilhava o desenvolvimento de serviços urbanos que
dificilmente atingiam o meio rural. Sua orientação política estava voltada tanto para a
população urbana quanto para a rural, porém, contraditoriamente, era desigual e elitista. O
meio rural permaneceu com a figura forte de comando do coronel, detentor de terras e de
almas.
Em meio à presença de valores tradicionais, uma parcela da população mostrava-se
avessa às mudanças, embora a implantação do transporte ferroviário tivesse trazido
expectativas ao mesmo tempo favoráveis e assustadoras, considerado uma inovação técnica
moderna e não deixando de perceber as melhorias que imporia e a necessidade de adequação a
283
Refere-se ao período de governo de J. J. Seabra na Bahia.
284
Wlamira R. de Albuquerque. Algazarras nas Ruas: comemorações da Independência da Bahia (1889-1923)
Campinas: UNICAMP, 1999, descreve o processo de desafricanização das ruas de Salvador e a inversão das
festividades do 2 de julho, na Bahia no início do século XX.
285
Vanicléia Silva Santos. Sons, Danças e Ritmos: a Micareta de Jacobina - Bahia (1920 a 1950). São Paulo:
PUC-SP, 2001. p. 48. Dissertação [Mestrado em História Social].
286
Vanicléia Silva Santos. Op.cit.. p. 17, destaca a chegada da ferrovia como ponto de partida para percebermos
as transformações iniciadas em Jacobina na década de 1920.
98
novos valores e costumes sociais, bem como aos avanços técnico-científicos decorrentes da
“era” de modernidade.
No decênio dos anos vinte, Jacobina passou por um processo de crescimento e
desenvolvimento urbano. O que implicou na reestruturação de suas funções e modificações do
cotidiano e dos costumes da população citadina, sendo perceptível à preocupação dos poderes
públicos com a implantação de novos equipamentos urbanos, com o funcionamento e
qualidade dos serviços que atendiam à população, que estivessem a altura dos oferecidos em
uma cidade cosmopolita.
Tais mudanças tinham o intuito de, em primeiro lugar, resolver os problemas práticos
da população, mas também ao mesmo tempo construir a imagem de uma cidade que estava se
modernizando, segundo os ideais de progresso daquela época. A população de Jacobina
buscou ajustar-se aos entretempos de um progresso e adequar os seus costumes e práticas aos
novos ideais de civilidade e moralidade propostos pelos diversos grupos de influência social,
como os intelectuais, políticos e ricos comerciantes, constantes no Código de Posturas de
1933.
Neste período, deu-se início ao desenvolvimento comercial de Jacobina. Segundo
Antonio Ângelo Fonseca, uma nova função urbana começou a se delinear e configurar na
cidade. A função comercial passou a predominar sobre a mineradora, e Jacobina, a partir de
1920, “[...] deixou de ser singular no sertão baiano, devido à exploração do ouro, para se
transformar numa cidade como as outras, caracterizadas pelo desenvolvimento da agricultura,
da pecuária e do comércio”
287
.
A cidade de Jacobina, apesar dos anseios de progresso e riqueza para a região, por
parte das elites locais, passava por dificuldades econômicas, devido à crise na agricultura e
mineração e pela falta de meios de transporte mais ágeis que os lombos de burros e muares.
Continuava sendo uma cidade rural, onde a base da economia era a produção agrícola,
produzindo na década de 1920, café, mandioca, milho e outros cereais
288
. Em agosto de 1935,
os produtos de maior comercialização na região eram a mamona e o algodão
289
.
Jacobina apesar da pretensão por mudanças e o desejo de se colocar em prática os
ideais modernizadores, ainda permanecia funcionando sob antigas relações aristocráticas e
coronelistas, visto que os coronéis, donos de terras, continuavam a exercer seu domínio e
287
Antônio Ângelo Martins Fonseca. Poder, Crise Regional e Novas Estratégias de Desenvolvimento: o caso de
Jacobina-Ba. Salvador: UFBA, 1995. p. 120. Dissertação [Mestrado em Arquitetura e Urbanismo].
288
Municípios do Interior-Jacobina”. Diário Oficial do Estado da Bahia. 1823-1923. Edição Especial do
Centenário da Independência. Bahia: Salvador, 1923. p. 562.
289
O Lidador, 7 set. 1935.
99
poder sobre a população, através de sistema de clientelismo e apadrinhamento que marcaram
as relações sociais e contribuíram para manter a situação de dominação política durante os
anos vinte. Esses atores políticos tinham também influência e poder de articulação regional,
sendo que “a fronteira regional era definida através do poder dos coronéis. O limite de uma
das fronteiras representava o início do poder de outro coronel”
290
. Assim, a cidade dependia
do poder e da vontade política dos coronéis para conseguir suas melhorias.
A sociedade jacobinense, em meio à idéia da construção de um futuro urbano e
moderno, mantinha-se presa a uma memória do passado, com seus olhos voltados para os
tempos de fama econômica e prestígio político, permanecendo as velhas relações sociais e
influências políticas: “a aristocracia branca, formada pelos proprietários de terras, de gados,
das mais ricas casas comerciais, e detentoras da política local, continuavam se espelhando
num passado senhorial em que submetiam negros e pobres aos seus mandos e
autoritarismos”
291
.
3.2 UMA CIDADE PASSANDO POR MUDANÇAS DEPOIS DA CHEGADA DA LESTE
BRASILEIRO.
A implantação e funcionamento da empresa ferroviária federal Leste Brasileiro
provocou um processo de modificação e reestruturação do espaço urbano que levou a
desconstrução de territorialidades e constituição de novos territórios na cidade. Com a
chegada do trem e o aumento da população, Jacobina começou a se expandir no sentido oeste,
ou seja, para o lado direito do rio Itapicurú-Mirim, sendo necessária a construção de uma
ponte sobre o rio que passa no meio da cidade, viabilizando assim o trânsito de pessoas para a
estação ferroviária.
Como podemos ver na foto da fachada da Estação da Leste de Jacobina, mesmo na
década de 1970, ainda mostra a imponência do prédio, e presença de pessoas na Estação
demonstra as mudanças no cotidiano e hábitos dos seus habitantes após a chegada da ferrovia.
290
Antônio Ângelo Martins Fonseca. Poder, Crise Regional e Novas Estratégias de Desenvolvimento: o caso de
Jacobina-Ba. Salvador: UFBA, 1995. p. 82. Dissertação [Mestrado em Arquitetura e Urbanismo].
291
Vanicléia Silva Santos. Sons, Danças e Ritmos: a Micareta de Jacobina - Bahia (1920 a 1950). São Paulo:
PUC-SP, 2001. p. 36. [Dissertação Mestrado em História Social].
100
Figura 9 - Fachada da Estação da Leste de Jacobina.
Autor: Normando Lima, 1970. Fonte: Núcleo de
Estudos de Cultura e Cidade da Universidade do
Estado da Bahia, Campus IV.
A várzea tornou-se o principal ponto de encontro e circulação de pessoas. Um lugar
onde se ficava inteirado das novidades que chegavam de Salvador, onde se paquerava e se
divertia, e também eram externados os sentimentos de saudades das pessoas que o trem levava
ou trazia.
A várzea, as margens dos rios do ouro e Itapicurú Mirim, que se unem
como que possuídos de fraternalíssimos sentimentos, é bem um adorável e
lindo local, para onde, pela manhã e pela tarde, convergem as morenas que
vão levar um adeus a alguém que o comboio ferroviário leva ou traz
292
.
A várzea era um lugar animado onde a paisagem servia como fonte de inspiração e
tornava o local agradável e ideal para se conversar com os amigos. Como ressaltou o colunista
“a várzea é um ponto de palestra bem mais animado que a ponte da Praça da Matriz, porque
ali tudo se passa à luz do dia, o panorama inspira e àrvores frondosas que fazem
sombra”
293
.
Aos poucos as imediações da Estação Ferroviária começaram a ser habitadas,
principalmente por pessoas que trabalhavam na ferrovia. Surgiu o Bairro da Estação, que
devido ao difícil acesso, por falta de construção de pontes de ligação entre o lado direito e
esquerdo da cidade, ficava isolado do Centro, levando ao seu desenvolvimento na área de
comércio atacadista. Pode-se dizer que a ferrovia ocasionou uma nova constituição e
reorganização do espaço urbano, possibilitando sua ampliação para outras áreas urbanas.
A chegada da ferrovia também contribuiu para o desenvolvimento comercial da cidade
de Jacobina, articulando-a economicamente a outras regiões baianas, dando um novo ímpeto
às atividades agrícolas e pecuárias, mudando assim, sua posição no cenário regional e local.
292
O Lidador, 7 set. 1935.
293
Ibidem.
101
Como afirmou o estudioso da história de Jacobina, Newton Eloy Gentil: “nada obstante o seu
abandono e a situação de ruína de suas instalações, muito se devem à estrada de ferro pelo que
representou, enquanto ativa, para o transporte e a economia da região”
294
.
Quando a ferrovia foi desativada na cidade de Jacobina, em 1976, isso trouxe várias
conseqüências de âmbito social, econômico e cultural, como a diminuição da produção
comercial e das trocas culturais. A população teve que ser reeducada para viver sem a
máquina ferroviária, sendo guiada por um conjunto de imagens do passado que regulavam
suas ações e modos de agir.
No que tange à dinamização econômica, social e cultural que as ferrovias trouxeram
para as cidades do interior, pouco se tem conhecimento sobre a importância e contribuições
do transporte ferroviário para o desenvolvimento do Brasil e do Estado da Bahia, havendo
poucas pesquisas publicadas.
3.3 AS MUDANÇAS URBANAS EM JACOBINA
A chegada dos trilhos em Jacobina foi muito esperada pela maioria da população que
habitava as imediações da cidade. Este fato trouxe várias mudanças na forma de organização e
funcionamento estrutural do espaço urbano, transformando os modos de vida e aspecto físico
de Jacobina após ser alcançada pela ferrovia. Mas o cenário de Jacobina antes da ferrovia não
mudou tanto, e as mudanças não decorreram somente deste fator específico. Ocorreu na
mesma época a construção de novas praças, pavimentação das ruas, o fornecimento de
eletricidade pública, canalização de água para as residências em projeto de saneamento
básico, ainda que tenha deixando de fora a população da zona rural. Contribuíram, assim,
lentamente e, cada um do seu modo, para o processo de urbanização e modernização de
Jacobina. As alterações não ocorreram de uma hora para outra e não atingiram a todos, sendo
sentidas, atendidas e aceitas de formas diferenciadas pela sociedade.
Normando Lima, autor da imagem abaixo, se destacou por suas fotografias da estação
da Leste em Jacobina, na década de 1960. Esta fotografia mostra a antiga e a nova Estação
ferroviária da cidade, construídas uma do lado da outra; a estação velha que ficava do lado
direito dos trilhos e outra, à esquerda da linha férrea, construída de forma mais estruturada,
294
Banco do Nordeste do Brasil S. A.. Jacobina. Fortaleza-CE: Grafinort indústria gráfica, 1985. p. 8.
102
para funcionamento da sede administrativa do transporte ferroviário na região, sendo a
estação mais velha destinada ao depósito e almoxarifado da empresa
295
.
Figura 10 - Antiga e a Nova Estação Ferroviária de
Jacobina. Normando Lima, 1960. Fonte: Núcleo de
Estudos de Cultura e Cidade da Universidade do
Estado da Bahia, Campus IV.
Nesta imagem da década de 1960, portanto quase trinta anos após o foco deste
trabalho, tirada com certa distância, o que primeiro direciona o olhar é a parte dos trilhos da
Leste que aparece, tendo ao fundo os prédios das estações de Jacobina e as serras que
compõem a paisagem da cidade. Esta fotografia ganha um sentido, enquanto testemunho da
presença ativa da linha férrea, trazendo uma nova dinâmica e mudanças para a população
jacobinense, como se ela, por si só, acarretasse o progresso e desenvolvimento da região.
Apesar de, na época, Jacobina possuir serviço de água encanada, ainda se
presenciava na cada de 1930 a cena de mulheres lavando roupas no rio Itapicurú-Mirim.
Esse costume pela sua regularidade passou a ser proibido pelo Código de Posturas Municipais
de 1933, no Art° 48: “É proibido lançar nas praças ruas, becos, rios e fontes, animais, lavar
roupas e animais tomar banho, despejo de latinhas, de fabrica de alambiques, de qualquer lixo
ou substância nociva a saúde sob pena de 50$000”
296
.
Esta prática recriminada pela postura municipal era considerada como algo que
“enfeiava” a urbe e atrapalhava o trânsito das pessoas na ponte construída sobre esse rio. Um
detalhe é que esta ponte dava acesso à estação da Leste. As críticas às lavadeiras ganharam
visibilidade na imprensa e foram registradas pelas fotografias da época. Mesmo assim, ainda
encontramos em época mais recente, porém sem datação exata, este mesmo costume, sinal de
295
Aloísio Sales Queiroz. “O Trem das Grotas”. A Letra em Revista. Jacobina-Ba: Academia Jacobinense de
Letras, set. 2001. p. 18.
296
Código de Posturas Municipais. Atos do Prefeito (1933-1938). nº. 65. 30 dez. 1933.
103
que nem a modernidade, nem a ferrovia apagaram definitivamente os hábitos enraizados na
população jacobinense.
Figura 11 - Mulheres Lavando Roupa no Rio Itapicurú-Mirim. Fonte: Núcleo de
Estudos de Cultura e Cidade da Universidade do Estado da Bahia, Campus IV.
Sem autoria e datação.
Através da câmara do fotógrafo registrou-se uma situação há muito tempo combatida e
que não era aceita por uma parcela da população local. Por não condizer com o ideal de
estética e costumes citadinos disseminados e almejados para uma cidade tida como moderna,
sendo servida por um sistema de água encanada.
A implantação da energia elétrica e a substituição dos antigos meios de iluminação
artificial na cidade se deram de maneira progressiva. A eletricidade representava um desejo de
reconfiguração do espaço urbano
297
. Os postes de madeiras com os fios condutores de energia,
tortos e colocados de forma irregular, somente atingiam as praças e as ruas do centro da
cidade e as áreas mais afastadas do centro continuavam a se servirem de candeeiros,
lamparinas e velas. Entretanto, até os mais ricos e a elite comercial não se desfizeram desses
antigos mecanismos de iluminação devido à irregularidade e má distribuição de energia
elétrica pela empresa responsável.
Segundo dados de pesquisa realizada pelo Banco do Nordeste, a iluminação pública da
cidade, na década de 1920, era feita por motores de caldeira abastecidos com lenha
298
. Essa
297
Vanicléia Silva. Sons, Danças e Ritmos: a Micareta de Jacobina - Bahia (1920 a 1950). São Paulo: PUC-SP,
2001.p. 42. Dissertação [Mestrado em História Social].
298
Banco do Nordeste do Brasil S. A.. Jacobina. Fortaleza-CE: Grafinort indústria gráfica, 1985. p. 7.
104
situação mudou quando o Conselho Municipal autorizou o Intendente Cel. César de Moraes a
estabelecer luz elétrica e água encanada na cidade
299
.
Uma parte da sociedade, vendo a chegada da luz elétrica como um dos
impulsionadores da civilidade e modernidade, agradeceu e homenageou o Intendente pelos
seus feitos e préstimos: “Quer como intendente Municipal, durante 8 anos, quer como
influência política do partido, que dominou até 1930, quer afinal como excelente amigo
particular, não se pode negar aplausos pelo que realizou em Jacobina”
300
. Como afirma
Santos, “podemos ver a partir da documentação descrita acima que as práticas políticas estão
diretamente associadas às práticas particulares”
301
. Ou seja, os interesses políticos interferiam
no andamento dos serviços públicos da municipalidade jacobinense. A realização de
melhorias urbanas era utilizada como uma forma de tirar proveito pessoal e político.
Depois que a referida lei (Lei nº. 11, de 7 de agosto de 1924) autorizando o
estabelecimento de luz elétrica e água encanada foi publicada e registrada, publicaram-se os
editais convocando os interessados em assumir a instalação de tais serviços. Um empresário
requereu os direitos de contrato para distribuir luz elétrica e água encanada, constituindo uma
sociedade anônima com a denominação de Companhia Força e Luz de Jacobina,
“contratando o fornecimento de luz pública com a municipalidade conforme ata de 7 de abril
de 1928”
302
.
A Companhia enfrentou dificuldades devido à insuficiência de capital. A ajuda
financeira veio do Governo do Estado por intermédio do coronel local, também um dos
diretores da Companhia, o Cel.. Galdino. Juntamente com outros recursos, a companhia pôde
ser inaugurada em 15 de agosto de 1928. “[...] E consta que, no dia da inauguração da luz
pública, aconteceu em Jacobina uma das maiores festas da época”
303
, ressaltando-se, como um
marco histórico para a cidade.
A chegada da luz elétrica foi associada à figura do Coronel Galdino, constando-se que
“[...] na construção de Jacobina como uma cidade ‘civilizada’, a idéia de ‘modernidadeestá
intimamente ligada à idéia de moralidade [...]
304
. Conforme as idéias propagadas pelas elites,
não tinha sido qualquer pessoa responsável por trazer a luz para a cidade, mas sim a “figura
patriótica e respeitável” do Sr. Galdino César de Moraes, como descreve o jornal O Lidador.
299
.O Lidador, 7 nov. 1933.
300
Ibidem.
301
Vanicléia Silva Santos. Sons, Danças e Ritmos: a Micareta de Jacobina - Bahia (1920 a 1950). São Paulo:
PUC-SP, 2001. p. 41. Dissertação [Mestrado em História Social].
302
O Lidador, op.cit..
303
Banco do Nordeste do Brasil S. A. Jacobina. Fortaleza-CE: Grafinort indústria gráfica, 1985. p. 7.
304
Vanicléia Silva Santos. Op. cit.. p. 41.
105
De tudo que Jacobina possui de bom e útil, ocupa inegavelmente o primeiro
plano a Cia. Força e Luz de Jacobina, melhoramento que devemos á figura
respeitável e patriótica do Cel. Galdino Cezar de Moraes, jacobinense dos
mais dignos e esforçados
305
.
De acordo com o que foi descrito nas reportagens do jornal O Lidador, o serviço de
iluminação pública na década de 1920 era precário e deixava a desejar, apenas atendendo ao
centro da cidade, deixando as áreas periféricas no escuro. Esse mesmo jornal serviu como
espaço de críticas à falta de energia elétrica em algumas ruas e bairros afastados do centro da
cidade e ainda atestou irregularidades no serviço de fornecimento de energia elétrica. Como
se pode ver na reportagem do jornal O Lidador.
A cidade está vai por mais de quarenta dias completamente às escuras, com
o desarranjo da usina da Cia. Força e Luz, cuja peça danificada foi levada
para o competente concerto na Bahia e até hoje nem notícia, mal grado os
esforços do Cel. Galdino Moraes, diretor da aludida companhia
306
.
Notamos nestas palavras a ênfase dada ao descaso pelo serviço de fornecimento de
energia elétrica a partir da denúncia do blackout de quarenta dias, ao mesmo tempo em que
aproveita a situação para ressaltar a figura de uma pessoa em particular, o diretor da
Companhia Força e Luz e coronel, Sr. Galdino, como se os méritos por ter restabelecido o
fornecimento de energia na cidade fossem todos dele.
O jornal O Lidador também destacou a prática de vandalismo contra os postes de
iluminação pública sendo, várias vezes, as lâmpadas que iluminavam o centro e as praças da
cidade, depredadas por vândalos. Segundo esse jornal, os autores eram os inimigos da ordem,
contribuindo para piorar a situação do serviço de fornecimento de energia elétrica e “sepultar
Jacobina nas trevas”, expressão cunhada pelo jornal.
Dia a dia, as lâmpadas da iluminação das ruas vão diminuindo e a cidade vai
ficando sepultada nas trevas. Os inimigos da ordem, e amigos do alheio vão
subtraindo as lâmpadas (que sendo de 220 volts não servem para a
iluminação de 110 Volts) vendendo-as aos fabricantes de fifós a
Kerosene![...]
307
.
As modificações na dinâmica social, no comportamento e costumes da população de
Jacobina, em conformidade com os novos ideais de civilidade e progresso, também podem ser
percebidas através da análise das formas de se tratar as questões referentes aos serviços
urbanos e da preocupação com o funcionamento dos mesmos. As reclamações feitas contra a
305
O Lidador, 7 nov. 1933.
306
Ibidem, 7 abr. 1935.
307
Ibidem, 7 fev. 1935.
106
ferrovia refletiam as mudanças no cotidiano, nos hábitos e costumes, enfrentados pela
população jacobinense.
Uma parcela da população, que reclamava a urgência de melhoramentos no serviço de
iluminação pública, também protestou contra o mau atendimento no fornecimento de energia
elétrica, no interior do transporte ferroviário. Foram várias as reclamações encontradas no
jornal O Lidador, com relação às constantes faltas de energia elétrica na Estação Ferroviária
de Jacobina, que segundo as reportagens analisadas, na maioria das vezes, continuava a ser
iluminada por fifós.
meses que nos batemos pela instalação da luz elétrica na estação de
Jacobina, que continua mal servida, sepultada nas trevas, e nada de
merecermos a atenção da superintendência, quando a companhia para
iluminar a referida estação, dispensa muito mais em “fifós” e azeite
308
.
A questão da falta de energia elétrica, um fator que veio piorar e depreciar a
imagem da administração da ferrovia e a situação da empresa que estava, segundo se enfocou
na reclamação acima, em estado de decadência e precariedade, quase “sepultada nas trevas”,
foi tida como culpa e responsabilidade da Superintendência da Viação Férrea, que não se
preocupava em resolver o problema, preferindo gastar mais dinheiro para continuar
iluminando a estação com lampiões movidos a querosenes. Tinha a ver com os novos ideais
das elites locais, segundo os quais não cabia ter em Jacobina uma estação ferroviária
iluminada à base de antigas lamparinas, o que lembrava mais os tempos coloniais do que uma
cidade moderna.
Sobre a questão do funcionamento dos serviços de iluminação da cidade, podemos
questionar; a qual parcela da população atingia o precário atendimento de tais serviços? No
que isso implicava? Será que se estava colocando em primeiro lugar o bem-estar e conforto da
maioria da população com o melhoramento desses serviços? Certamente a irregularidade no
fornecimento de energia elétrica atingia diretamente aos comerciantes, os maiores
prejudicados no que se refere ao comércio e perda de mercadorias, também, mais uma vez, o
restante da população era atingido, ficando “às escuras”.
Após ser alcançada pela linha férrea, Jacobina passou a ter um povoamento mais
intenso e regular, tornando-se extensivo, espalhando-se e atingindo as áreas mais afastadas do
centro da cidade. A cidade cresceu em todas as direções, subindo os morros e entre as serras.
“As moradas tomaram a direção dos vales e ‘cayons’[sic]: Bananeira, Grotinha, Pingadeira,
Leader, seguindo rumo às nascentes do Rio do Ouro. No vale do ‘Sol Poente’ a cidade se
308
O Lidador, 23 nov. 1934.
107
estendeu, encontrou espaço e deu lugar à construção de bairros populares”
309
, concentrando-se
principalmente na área próxima à Estação que tinha o nome do município servido por ela,
começando a chegar cada vez mais gente para a cidade, dando outro delineamento ao
processo de povoamento, expansão e desenvolvimento local.
Novos moradores instalaram-se nas imediações da Estação da estrada de ferro por ter
acesso mais fácil à gare. Eram gente importante e gente simples, principalmente trabalhadores
que ficavam nas proximidades como os carregadores dos grandes armazéns das empresas
exportadoras de matéria-prima da região e importadoras de produtos manufaturados. Os
empregados da empresa ferroviária com suas famílias, por comodidade ou praticidade,
passaram também a habitar nessas proximidades, que com o passar do tempo, cresceu e se
tornou o Bairro da Estação, denominação que resiste até os dias atuais.
A implantação da ferrovia trouxe consigo a modificação e modernização do acesso à
informação e a facilidade dos meios de comunicação. Havia um posto d’ Os Correios e
Telégrafos em cada Estação, e Jacobina também tinha o seu, cuja função principal era a
comunicação entre as Estações da Leste e utilizado também pela população em geral para
enviar e receber mensagens curtas e urgentes. Essa mudança na área das comunicações,
proposta pela ferrovia não foi, à princípio, tão eficiente e o sistema de telégrafos da Leste
Brasileiro foi alvo de críticas. A imprensa reclamou do mau funcionamento, das
irregularidades e das várias interrupções dos serviços de transmissão das mensagens,
atrasando o envio de recados urgentes. O prejuízo era da população e, muitas vezes, da
própria empresa ferroviária que dependia, por vezes, de informes passados entre as estações
para seu pleno desempenho
310
.
A educação formal em Jacobina também lucrou com a implantação do transporte
ferroviário. Neste período, em que a Leste esteve ativa no município, a sociedade ganhou
mais um estabelecimento de ensino secundário. Com a encampação do antigo Instituto Senhor
do Bonfim da Bahia
311
foi criado o Ginásio Estadual Deoclaciano Barbosa de Castro para os
jovens que quisessem continuar os estudos secundários
312
.
A reforma educacional da instrução pública, pela qual passava o país, chegou a
Jacobina logo após a realização dos exames admissionais para ingresso no novo Ginásio
309
Doracy Araújo Lemos. “Jacobina”. A Letra em Revista. Jacobina-Ba: Academia Jacobinense de Letras, set.
2001. p. 37.
310
As críticas a esse tipo de serviço disponibilizado pela Leste mostram mais uma vez a situação de desordem e
ruína da empresa.
311
Pelo decreto de 20 fev. 1952, publicado em diário oficial do dia 23.
312
Alcira Pereira Carvalho Silva. “Lembranças do Centro Educacional Deocleciano Barbosa de Castro”.
Academia Jacobinense de Letras (Org.). Letras Douradas: Antologia. Jacobina, Bahia: Tipô Carimbos, 1998. p.
199.
108
Estadual. A extinção do antigo regimento do Curso Normal deu lugar a um novo modelo de
curso comportando o curso Ginasial, com duração de quatro anos, seguido de um ano de curso
intermediário e depois, mais três para aqueles que quisessem cursar o Pedagógico a fim de
concluírem os estudos de formação de professores primários. Esta mudança legou a Jacobina
a possibilidade de ampliação do curso de Magistério para o ensino primário, sendo o mesmo
abrigado pelo Ginásio Estadual Deoclaciano que, por esta razão, passou a chamar-se Colégio
Estadual Deoclaciano Barbosa de Castro - C. E. D. B. C, sigla e denominação que persiste até
hoje
313
.
O trem trouxe também expectativas para muitos jovens desejosos de estudar e fazer o
ensino superior na capital. Somente os filhos de famílias da classe média urbana, que faziam
parte das elites jacobinenses, puderam ter seu sonho realizado, pois eram os únicos que
poderiam pagar para viver em Salvador. Com o transporte ferroviário ficou mais fácil o
contato da população de Jacobina com as novidades e a produção do conhecimento na capital
do Estado, possibilitando o deslocamento e a ida desses jovens para continuarem e
aperfeiçoarem seus estudos, visando, a maior parte deles, retornar para aplicar e exercer suas
profissões em benefício de sua terra natal
314
.
A influência do transporte ferroviário na região intensificou a diversificação das
atividades comerciais. Jacobina tornou-se um centro econômico produtor e comercial de
mamona, algodão e outras matérias primas quase que específicas da região jacobinense,
interferindo na produção econômica do Estado, inclusive pela continuidade da exploração
aurífera (que remonta ao período colonial). Jacobina teve uma movimentação intensa de
pessoas, comerciantes, mineradores, aumentando sazonalmente a população local, provendo
um crescimento financeiro e maior circulação de renda, tornando-se detentora de um
“comércio centralizador, para onde se dirigiam os habitantes dos municípios circunvizinhos,
principalmente os da região oeste; ditos, o povo do sertão”
315
.
Aliadas as atividades agrícolas, houve algumas transformações na função urbana da
cidade que, impulsionada pela ferrovia, passa a assumir uma função comercial, exigindo-se
intervenções sociais e urbanas. Iniciou-se um período de reformas com a abertura e
pavimentação de ruas, construção de praças e jardins, canalização dos rios que passavam na
313
Alcira Pereira Carvalho Silva. “Lembranças do Centro Educacional Deocleciano Barbosa de Castro”.
Academia Jacobinense de Letras (Org.). Letras Douradas: Antologia. Jacobina, Bahia: Tipô Carimbos, 1998. p.
200.
314
Aloísio Sales Queiroz. “O Trem das Grotas”. A Letra em Revista. Jacobina-Ba: Academia Jacobinense de
Letras, set. 2001. p. 19.
315
. Ibidem.
109
cidade, com a edificação de pontes sobre os mesmos, fornecimento do serviço de água
encanada, de energia elétrica e transporte ferroviário, conforme aludimos anteriormente.
Figura 12 - Praça da Matriz, 1920. Fonte: Núcleo de Estudos de
Cultura e Cidade da Universidade do Estado da Bahia, Campus IV.
Sem autoria.
A fotografia acima mostra o portal de entrada da Praça da Matriz, na década de 1920,
de ordinário montado e usado em datas comemorativas ou dias de festa, como a visita do
Governador da Bahia. Ao que se pode ver, a praça já está pavimentada, mas ainda sem um
jardim que a enfeitasse, conforme pleito de cidadãos expresso nos jornais locais, e também
sem o coreto que fica em frente à Igreja da Matriz.
Essa praça era, e continua sendo, uma das mais freqüentadas. Ela representava o
“cartão postal” da modernização da cidade aos seus visitantes. Localizada em uma área
central, ponto apropriado para lazer, encontros e passeios de fim de tarde e dias de feriados.
Na fotografia abaixo, outro ângulo da Praça da Matriz arborizada com uma ponte e,
em destaque, o coreto Municipal, onde se apresentavam as filarmônicas da cidade.
110
Figura 13 - Praça da Matriz. Fonte: Núcleo de Estudos de Cultura e Cidade da
Universidade do Estado da Bahia, Campus IV. Sem autoria e sem data.
Na época da chegada da ferrovia, a cidade viveu uma perspectiva e ideal
modernizadores, alimentou-se uma expectativa promissora de desenvolvimento e progresso,
depositada principalmente na vinda de um tão esperado meio de transporte mais moderno, que
traria benefícios de âmbito comercial e representação social para a região. Aos poucos,
Jacobina crescia e ganhava impulso, principalmente, a partir da agilidade na condução e
comercialização de mercadorias com o transporte ferroviário.
Uma parcela da população de Jacobina se incomodava com a lentidão na melhoria dos
benefícios coletivos e equipamentos urbanos. De acordo com a visão das elites dominantes,
uma cidade, que procurava seguir os rumos do progresso, não podia ter seus serviços públicos
atendendo mal a sua população e neste sentido, o serviço de iluminação da cidade também foi
alvo de olhares críticos, conforme relatamos anteriormente.
A higienização e o asseio da cidade foram preocupações das elites locais que ansiavam
em corresponder aos ideais e padrões de progresso e desenvolvimento na perspectiva do ideal
europeu de cidade em processo de modernização. Podemos ver nas reportagens do jornal
pesquisado, a busca e preocupação em mostrar uma imagem de Jacobina como cidade limpa,
asseada e higienizada:
A prefeitura está executando um asseio geral na cidade. O Senhor prefeito
Municipal [Sr. Reinaldo Jacobina], num gesto que merece aplausos, está
executando um asseio em regra em toda a cidade. Do capim que servia de
manto ao calçamento, estão livres a praça da matriz e metade da Rua Dr.
Pedro Lago
316
. [grifo do autor]
316
O Lidador, 17 mai. 1935.
111
Com relação à reportagem acima, percebemos um exagero do colunista ao ressaltar
que a prefeitura estava executando um asseio em regra em toda a cidade, pois não
ultrapassava as principais ruas do centro e restringia-se à retirada de capim do calçamento,
não priorizando o lixo eventualmente jogado nas ruas. A expressão que destacamos foi usada
como uma maneira de ressaltar, com mais ímpeto, o empenho da prefeitura em mudar os ares
de Jacobina e mostrar e importância de se ter uma cidade asseada e limpa, que dissesse bem
das elites e das pessoas que ali viviam. O colunista quis enfatizar a figura do prefeito,
Reinaldo Jacobina, como digna de aplausos por tal feito, no entanto, vemos tal ação como
uma obrigação de qualquer administração pública. Por que precisa ser aplaudido por uma
coisa que não era nenhuma caridade ou benevolência?
A manutenção da higiene foi uma das questões principais dentro das idéias e discursos
de modernidade que circulavam na cidade de Jacobina nas décadas estudadas. Eram várias as
notas na imprenssa local, que chamavam a atenção da população para a necessidade de mais
higiene e asseio por parte da mesma. Neste sentido, não passou despercebido e foi mais um
motivo de reclamação a situação da falta de higiene em que, segundo reportagem do jornal, se
encontravam as locomotivas que faziam o transporte na região. “Pela estação desta cidade
passou na manhã de sexta, uma locomotiva puxando um imundérrimo carro de segunda
classe, que mais parecia carro de conduzir animais”
317
.
Outra questão que dizia respeito à falta de higienização e limpeza das locomotivas
mostra o estado de conservação e manutenção das locomotivas e, juntamente com o mau
funcionamento da empresa ferroviária, são motivos de queixas contra a ferrovia e também
reflexos das modificações ocorridas no seio da sociedade de Jacobina. Uma sociedade que
quer se modernizar, guiar-se pelos padrões de civilidade e urbanidade internacionais, requer
com ênfase, mediante a imprensa local, melhores condições físicas do transporte ferroviário e
um atendimento aos usuários de forma mais respeitosa e cidadã.
Através do excerto citado acima, o jornal O Lidador quer mostrar uma empresa que
não tinha a devida preocupação com o conforto, o bem-estar e a segurança de seus
passageiros, não se preocupando em proporcionar nem um bom atendimento nem condições
básicas de higiene, tratando-os como se fossem animais, como mostra a citação anterior, sem
considerar e atender os seus direitos enquanto cidadãos.
Também apareceram com freqüência nos jornais consultados reclamações contra os
constantes atrasos nos horários dos trens. Segundo relatam estas reportagens, os atrasos
317
O Lidador, 21 jun. 1936.
112
dificultavam a vida dos passageiros e dos comerciantes locais, atrasando o transporte das
mercadorias.
[...] Nunca mais o trem chegou no horário, quando vem de Bonfim, e muitas
vezes, como hoje aconteceu, verificando um atraso de 1 hora e mais de
Piritiba a Jacobina, isso devido ao misérrimo estado de composições, desde
a locomotiva velha, remendada, impotente, aos carros desmantelados, sem
freios, sem higiene, sem conforto [...]
318
.[grifo do autor]
O colunista procurou, ao máximo, criar uma imagem de abandono e “misérrimo
estado de composições” em que, de acordo com ele, se encontravam as locomotivas da Leste
na cidade de Jacobina, só existindo locomotivas velhas, remendadas, impotentes; carros
desmantelados, sem freios, sem higiene e conforto para as pessoas que neles eram
transportadas.
Os atrasos nos horários dos trens eram atribuídos a vários motivos como, por exemplo,
o estado de conservação das locomotivas, os descarrilamentos ocasionados pelos desarranjos
das linhas e a falta de iluminação dos trens à noite, como ressaltou O Lidador,
Os descarrilamentos por desarranjos na linha, os bronzes dos vagões que
vivem em chamas, por falta de lubrificação, a falta de luz à noite enfim uma
série de desarranjos são citados pelos encarregados da E’ste como causa da
falta de pontualidade nos horários
319
.
E também a falta de vagões específicos para o transporte de passageiros, pois nem
todos os comboios transportavam apenas passageiros e, muitas vezes, carregavam junto as
mercadorias e demais cargas, ocasionando impontualidade e incômodos para as pessoas que
utilizavam o serviço, como explícito na reportagem do jornal,
Depois que o Governo tomou conta da Estrada de ferro, não mais horário
na chegada dos trens! Isso tudo por que, segundo estamos informados, o
superintendente decidiu que os trens de passageiros que trafegam de Bonfim
a Piritiba façam, também, o transporte de cargas, quer subindo, quer
descendo
320
.
A visão dos ferroviários hoje é outra. Eles tentam justificar o atraso nos horários dos
trens como algo normal em qualquer empresa de transporte ferroviário, acontecendo mais
devido à incapacidade e impontualidade dos maquinistas do que pelo estado do material
rodante da estrada de ferro, numa atitude de defesa da empresa em que trabalharam. Isso é
318
O Lidador, 8 fev. 1935.
319
Ibidem, 19 out.1934.
320
Op. cit., 2 jul.1935.
113
percebível na entrevista com Antônio F. Rego, quando perguntado se havia muitos atrasos nos
horários dos trens, respondeu:
Poder pode, de acordo com o maquinista, ou de atrasar, podia atrasar e podia
adiantar, podia chegar no horário. Era muito... quando...o a máquina era boa
e o maquinista, era muito difícil atrasar, por que o maquinista (tosse) tinha
uns ranceiros, tinha outros...a senhora sabe todo setor tem os bons mais torto
e os menos né? Uns trabalha de uma maneira e outros de trabalha de outra
321
.
As constantes críticas do Lidador, na década de 1930, à administração da Leste
eram vistas como resultado da falta de interesse e compromisso por parte dos seus
administradores, que estariam mais preocupados com os seus interesses políticos do que com
os prejuízos da própria empresa e do comércio local. Segundo esse jornal, eles agiam como se
tivessem chefiando uma roça qualquer, sem nenhum tipo de compromisso, de qualquer jeito,
criticando da seguinte maneira:
[...] É que, naturalmente envolvido com as cousas da megera política, S.S.
não dispõe de tempo para cuidar mais de perto dos problemas que consultam
os interesses do comércio e da ferrovia inclusive. Para politicar, sim; a
tempo de sobra, demitindo e removendo funcionários ao sabor das paixões
de qualquer chefão da roça
322
.
O jornal principal da cidade ressaltava a postura descuidada da empresa, estando seus
donos mais preocupados em defender os interesses do comércio local do que com os
interesses e problemas sociais, que diziam respeito à população de Jacobina de um modo
geral. Eles se colocavam em defesa das opiniões de um grupo social em particular, deixando
de lado aspectos mais amplos relacionados à sociedade.
Cabe aqui perguntarmos o porquê e a quem interessava a construção da visão de uma
ferrovia negligente. Qual o motivo de não servir bem às pessoas que utilizavam os seus
serviços e lhe garantiam os lucros necessários para a sua manutenção e funcionamento? Será
que a empresa estava realmente atendendo mal à população, e os serviços de transporte
ferroviário, não iam tão mal como dizia a imprensa da época? Perguntamos então: a crítica
tem fundamento? Na opinião dos ex- ferroviários, não.
Desta forma, constatamos que o poder público jacobinense buscou dar outra feição
estética à cidade, apagando qualquer memória colonial, pois ela significaria o oposto à
civilidade e modernidade, ou seja, “atraso” social e urbano. Podemos constatar nas
reportagens do jornal que mais pesquisamos, O Lidador, a preocupação com a construção de
321
Trecho da entrevista realizada com Antônio Francisco Rego, set. 2002, Jacobina-Ba.
322
O Lidador, 23 nov. 1934.
114
praças e jardins no centro da cidade, no intuito de se criar uma imagem estética mais “bonita”,
para causar uma boa impressão aos visitantes que chegavam e cuidar do bem estar da elite,
sempre tão preocupada em manter estes valores de modernidade e progresso. Esse jornal
registrou uma denúncia quanto ao abandono em que se encontravam os trabalhos da
construção de um jardim na igreja da Conceição, cobrando providências à comissão
responsável pela realização da obra.
Visitamos, esta semana, os trabalhos, em tão boa hora iniciados por uma
comissão de senhoritas, da construção de um jardim no adro da Igreja N. S
da Conceição desta cidade. E ficamos perplexos ao observarmos o estado de
abandono em que as obras iniciadas se encontram, quando julgávamos
concluídos, sobretudo por ter nascido à iniciativa de pessoas capazes de
idealizar e realizar
323.
Por que tanto incomodava as elites da cidade, expressando-se por meio do jornal, a
morosidade e a não conclusão do jardim? Não podemos esquecer que a maioria dos fiéis desta
igreja era de membros das elites da cidade. Políticos, comerciantes, intelectuais, ricos
agricultores que a mantinham com seus dízimos e ofertas sentiam-se no direito de cobrar
providências com relação à situação exposta acima. Também ao olhar dessas pessoas, este
templo católico era um dos cartões de visita da cidade e, portanto, deveria ser um local bem
apresentável com jardins e praças, que não fizessem vergonha a qualquer outra urbe.
Entendemos por “fazer vergonha”, o sentir-se inferior às demais localidades mais bem
aprazíveis em suas estruturas urbanas e de saneamento.
A preocupação com o embelezamento, higienização e asseio da cidade não estava
necessariamente ligada aos interesses daqueles que não participavam da elite ou com o seu
bem-estar, mas associada à preocupação dos poderes locais e da elite com a imagem que os
visitantes levariam da cidade, colocando-se a questão do asseio urbano como uma necessidade
inadiável. Podemos notar nas reportagens analisadas, a preocupação em propagar a imagem
de uma cidade bonita, limpa, higienizada e de pessoas dignas, sem se preocupar com a
situação do restante da população. Como fica visível no excerto d’O Lidador, “o asseio da
cidade é [sic] não quem negue necessidade inadiável. Agrada aos habitantes, higieniza a
cidade e impressiona bem as pessoas que nos visitam”
324
.
Para isso, segundo o exposto na impressa local nos anos de 1930, era preciso limpar os
oitões e muros das casas, pois pela sujeira em que se encontravam passavam uma imagem
323
O Lidador, 19 mar. 1935.
324
Ibidem, 8 fev. 1935.
115
negativa dos habitantes de Jacobina. Era preciso “mudar e alvejar a roupa da cidade de
Jacobina”, para assim dar “mais realce” e causar uma melhor imagem aos olhos do público.
Em quase todas as cidades do interior existe a praxe, em fase as leis
municipais, dos proprietários assearem as frentes e paredes laterais das casas
de residências, muros, etc., para dar mais realce a cidade. [...] A cidade esta
precisando dos serviços de pedreiros e caiadores para alvejarem os oitões,
limparem os muros, etc., que estão á vista do público, dizendo mal dos
nossos costumes
325
.
Na análise acima podemos inferir as intenções e os significados das palavras do
articulista que, nas entrelinhas, critica a mudança superficial destes costumes citadinos. A
questão vai além da estética da cidade para calcar-se na necessidade de uma reformulação do
costume de não limparem e cuidarem de suas casas, deixando-as desleixadas e sujas.
Ressaltando-se mais do que necessariamente uma caição das casas a necessidade do
abandono, de maneira concreta, pela a população de Jacobina, desse e de outros costumes que
ficavam mal a quem os observava.
3.4 AS MUDANÇAS SOCIAIS E CULTURAIS NA SOCIEDADE JACOBINENSE.
A imagem abaixo, de autoria e data desconhecidas, mostra a Estação da Leste cheia de
gente. Nela é visível a agitação e movimentação nos arredores da Estação de Jacobina, muitas
pessoas indo para e para cá, podendo ser um dia especial, de festa na cidade, alguma
personalidade importante que estava chegando para visitá-la ou era um dia como outro
qualquer, sendo comum aquela quantidade de gente na estação.
325
O Lidador, 24 fev. 1935.
116
Figura 14 - Estação da Leste em Jacobina. Fonte: Núcleo de Estudos de Cultura e Cidade da
Universidade do Estado da Bahia, Campus IV. Sem autoria e sem data.
No momento em que foi tirada a fotografia acima havia apenas homens na Estação
ferroviária (conforme minuciosa análise da fotografia em zoom). A novidade da ferrovia
trouxe um novo espaço de sociabilidade, introduzindo o costume de passear nas tardes de
domingo, na Estação, ocasião para vestirem seus melhores trajes e expressarem
comportamentos sociais adequados aos padrões de civilidade copiados dos grandes centros
urbanos europeus. Trajavam seus melhores paletós, em tons claros, prevalecendo o branco
(ainda que a foto seja P&B sabemos ser esta a preferência masculina de elegância deste
período) sempre dando charme aos modos e gestos com lenços presos no bolso do casaco,
chapéus típicos dos anos 30 e gravatas, segundo a moda usada na capital do Estado. As
mulheres, ausentes neste espaço exceção daquela que destacamos com uma seta em cor
vermelha) dá-nos a entender ser o local um espaço de sociabilidade masculina. Uma situação
nova a ser experimentada e que deveria ser registrada pelo fotógrafo ali presente.
As elites atentas à moda e aos novos modos de viver da capital, tidos como civilizados
e modernos, ditavam as novas formas de vestir, de calçar, de se divertir e de se comportar que
iam sendo incorporados pela população de Jacobina. Imbuídas de discursos de civilidade e
moralidade, buscavam moldar os costumes e hábitos antigos marcados por contrastes e
contradições sociais que delimitavam os territórios da cidade, com a chegada do trem.
A fotografia abaixo, intitulada pelo autor de Viajantes de Trem, em uma época
posterior, na década de 1960, mostra o fascínio que possivelmente o trem ainda provocava.
117
Pensamos que o vagão está aparentemente estacionado e por esta razão servindo de local para
as pessoas se aconchegarem em uma conversação e olharem a paisagem. Não podemos,
contudo, afirmar categoricamente que eram passageiros no aguardo do embarque, como
sugere o título da imagem dado pelo seu próprio autor, pois, simplesmente, não há bagagens a
nossa vista.
Figura 15 - Viajantes de Trem. Autor: Osmar
Micuccí, 1960. Fonte: Núcleo de Estudos de
Cultura e Cidade da Universidade do Estado da
Bahia, Campus IV.
Entretanto, em conversas com ex-ferroviários, ouvimos muito o comentário que, antes
de embarcarem, as pessoas paravam para serem fotografas à frente do vagão em que iriam
viajar, como esta foto, tipicamente então, nos revela. Por informações que nos chegaram a
partir do Núcleo que nos concedeu o direito de publicação desta fotografia, a senhora
retratada em primeiro plano da foto é a Profª. Alcira Pereira Carvalho Silva, poetisa e
escritora, membro da Academia Jacobinense de Letras.
Chapéus, luvas, gravatas, paletós e novos artigos de luxo passaram a fazer parte do
vestuário da população de Jacobina. Moças e rapazes em cada estação encantavam os
viajantes, não menos encantadores. Usavam guarda-pó para manterem a vestimenta impecável
até o final do trajeto, evitando sujar suas vestes com a fuligem que a Maria Fumaça ia
soltando pelo caminho”
326
, como é ressaltado pela professora acima retratada:
Era um luxo viajar de trem para Salvador. Usavam-se chapéus, luvas e
guarda pó. [...] Usava-se para essas viagens um guarda-pó, para conservar
impecável a vestimenta até o final do trajeto. Os cavalheiros usavam roupas
326
Patrícia Moreira. “Maria Fumaça cortava os sertões levando a modernidade”. Bahia documento5 -
Transportes e energia. Caderno 8. Jornal A Tarde. Salvador: quarta-feira, 15 mai. 2002. p. 2.
118
completas, gravatas e paletó; as moças e senhoras usavam chapéus. Isto nos
idos de 1937
327
.
Ao relembrar como era a viagem de trem, Alcira Pereira Carvalho explica como era
viajar de classe especial: “Este trem a vapor possuía uma classe especial - a do restaurante,
muitíssimo bem equipado, cujo cardápio era de fazer inveja a aqueles que apreciavam uma
boa refeição. O carro-dormitório era um luxo só; cabines isoladas por cortinas, vigia que
ficava alerta toda à noite
328
”.
Esse primor nos modos de vestir era mais percebido por ocasião da promoção das
grandes festas, como os famosos bailes de gala, quando se fazia presente a maioria da moças e
rapazes, geralmente aqueles que representavam as elites da cidade. Era a oportunidade de
ostentar todo o seu charme e riqueza. As damas aproveitavam para usarem seus trajes
importados da França e seus belos penteados, recobertos de ouro pelos pais a fim de dourar-
lhes os cabelos, tornando-os reluzentes. Os rapazes por sua vez também usavam distintas e
bonitas roupas de gala, de acordo com o momento
329
.
Também por realização das grandes festas e bailes, o tipo de bebida servida na época
eram os licores de jenipapo e girame, considerados famosos e finíssimos pela população local,
geralmente trazidos de outras regiões. Da mesma forma, o gelo usado para acompanhar as
bebidas “era novidade e vinha de Salvador embalado em pó-de-serra”
330
pelos ferros das
estradas.
São visíveis os anseios das elites locais e a construção por parte das mesmas de um
novo ideal e imagem de cidade que não lembrasse os tempos coloniais e que por isso
precisava se dissociar do rural e negar sua formação tradicional que não condizia com o
modelo de cidade por eles almejada e planejada.
Neste sentido, houve uma preocupação por parte dos poderes públicos com a
construção de obras e funcionamento de alguns serviços públicos como o fornecimento de
energia elétrica e o atendimento do transporte ferroviário. E também com o disciplinamento e
controle de práticas tidas como atrasadas, que contribuíam para a construção de um conceito
anticivilizado da cidade de Jacobina e dos seus habitantes.
327
Alcira Pereira Carvalho Silva. “Trem da Grota”. A Letra. Ano IX, nº. 27. Jacobina-Ba, abr/mai. 2002. p. 1.
328
Ibidem.
329
Banco do Nordeste do Brasil S. A.. Jacobina. Fortaleza-CE: Grafinort indústria gráfica, 1985. p. 7.
330
Ibidem.
119
Figura 16 - Carro de Boi. Autor: Lindenício Ribeiro, 1970.
Fonte: cleo de Estudos de Cultura e Cidade da
Universidade do Estado da Bahia, Campus IV.
A figura acima focaliza um carro de boi com algumas pessoas em cima, que servia
como meio de transporte e locomoção em seu trabalho no campo e para irem à cidade. Esta
imagem é a representação de uma cena comum à vida cotidiana na zona rural de Jacobina, na
década de 1920, que como se perdurou até 1970, que era subir em um carro de boi, com os
melhores trajes para ir à cidade, um costume considerado pelas elites como antigo e atrasado,
“colonial” que não condizia com o modelo de cidade almejada e planejada por elas.
Representava a presença e permanência de práticas sociais rurais e “coloniais” em uma cidade
que estava passando por um processo de urbanização, demonstrando o movimento e a
dinâmica que existe no campo e sua relação e ligação com a cidade.
O trânsito de carroças e a presença de animais soltos na cidade eram regulados pelos
poderes públicos, mediante o Código de Posturas Municipais
331
, que legisla sobre as funções
urbanas da cidade, sendo utilizado pelas classes dominantes como um mecanismo de controle
dos usos e apropriações do espaço urbano, ditando o que a população podia ou não fazer.
Dessa forma estabeleciam-se os conflitos entre as leis e os costumes que fogem a regra.
As leis municipais, mediante o Código de Posturas de 1933, instituíram que não era
“permitido aos carroceiros montarem no centro das carroças. O animal terá freio ligado ao
cabeção e o referido condutor pegado à rede, sob pena de 10$000 de multa”
332
. Sendo que,
“igual pena será aplicada aos carreteiros que entrarem na cidade sem que os guios [sic]
venham à frente dos bois, puxado numa corda ligado a cabeça dos bois, e bem assim aqueles
que passarem com carros pelas pontes em geral”
333
determinando que “será terminantemente
331
Código de Posturas Municipais. Atos do Prefeito (1933-1938). nº. 65. 30 dez. 1933.
332
Ibidem. Artº 120.
333
Op.cit.. Artº 121.
120
proibido automóveis, caminhões, carros de boi, carroças sem matricula. Pena de 10$000 de
multa”
334
.
Segundo o mesmo Código de Posturas Municipais, também ficou proibida a criação de
animais soltos no perímetro urbano. “Fica proibido criar animais suínos, caprinos e langras,
soltas dentro da sede do município, vilas arraiais e povoados, sob pena de serem mortos e
multado o infrator”
335
.
O descumprimento dessa postura e imposição municipais pela população de Jacobina
encontrou no jornal O Lidador um espaço de denúncia por parte de uma parcela da população
que se incomodava com a continuação dessa prática costumeira, considerando-a como uma
prática atrasada dentro de uma cidade que buscava progredir. Várias eram as queixas e
denúncias feitas contra a existência de animais, (porcos, vacas) soltos no perímetro urbano, o
que segundo elas, trazia alguns transtornos para os transeuntes e contribuía para a falta de
higiene na cidade.
Os que estão reduzindo a cidade a um campo sujo de criar porcos, não
poderão ficar aborrecidos com quem almejando e pugnando pelo progresso
dela, se insurgem contra a porcaria. Até nas roças, é permitida tal criação
quando os seus proprietários fazem tapumes apropriados
336
.
Percebemos de acordo com as denúncias que se encontram n’O Lidador, como a todo
custo, as elites buscavam moldar e impor outros costumes à população jacobinense, levando-
nos a considerar as pessoas que continuavam criando animais soltos pelas ruas como inimigas
da cidade, pois não contribuíam para o seu desenvolvimento, mas para que continuasse no
verdadeiro atraso. É necessário perguntar o porquê de se incomodar com tal hábito. Em que e
a quem prejudicava tal fato? O que estava por traz e o que se queria com a imposição de uma
postura municipal como essa? A continuidade de tal prática social prejudicava a imagem
civilizada que elites propagavam da cidade, principalmente no que refere ao centro urbano e
aos representantes do comércio local, cujos clientes se incomodavam com a sujeira que esses
animais deixavam perto das lojas.
Percebemos em Jacobina um espaço de discordâncias e de contradiscursos. Uma parte
da população queria impor novos modos de viver e lutava por melhoramentos urbanos,
enquanto uma grande parte continuava a manter os velhos costumes de uma cidade antiga e a
não se importar e valorizar os esforços de quem, segundo as elites, se importava com o
progresso jacobinense.
334
Código de Posturas Municipais. Atos do Prefeito (1933-1938). nº. 65. 30 dez. 1933. Artº 122.
335
Ibidem. Artº 57.
336
O Lidador, 16 fev. 1936.
121
Um dos símbolos urbanos que deu certo sentido às transformações urbanas na cidade
foi a construção do coreto que ficava na Praça Castro Alves em frente à igreja da Matriz. Na
época em que foi tirada a foto abaixo, uma cidade que buscava estar nos rumos do progresso e
do desenvolvimento, segundo os ideais de civilidade e modernidade das elites locais, deveria
ter uma praça urbanizada, com belos jardins e uma igreja no meio, tendo em destaque um
coreto em frente.
Figura 17 - Coreto Municipal de Jacobina na Praça da Matriz.
Fonte: Núcleo de Estudos de Cultura e Cidade da Universidade
do Estado da Bahia, Campus IV. Sem autoria e sem data.
Esta fotografia deixa perceber que Jacobina buscava não estar fora desta perspectiva
de ideal de cidade. Retrata um coreto limpo e iluminado para o deleite e diversão das elites
daquela época. Durante as décadas de 1920 a 1950, o coreto da Praça da Matriz funcionava
como ponto de encontro e lazer familiar, espaço de apresentação das orquestras filarmônicas e
onde aconteciam as serenatas, local privilegiado para se apreciar a paisagem e namoro entre
os jovens. Ao contrário da estação ferroviária, a princípio um espaço demarcado para a
sociabilidade masculina, o coreto traz para as ruas as moças de família, bem vestidas, calçadas
e penteadas nos rigores da moda da época e, como a foto registra, sempre acompanhadas por
um varão, talvez um irmão, um primo de uma das moças que aparece no retrato a protegê-las.
Estas moças parecem fazer parte das elites jacobinenses que aproveitaram o domingo para sair
e exibirem-se no coreto.
O coreto municipal era também um lugar favorável para a aglomeração e realização de
jogo do bicho, costume ilegal considerado como imoral, a ser reprimido pelos poderes
públicos. Aos olhos das elites não ficaria bem semelhante espetáculo em plena praça pública,
122
perante os visitantes
337
. A repetição da realização deste tipo de jogo, por uma parte da
população de Jacobina era criticada e as “coisas do jogo” ganham visibilidade nas ginas do
jornal O Lidador, mas sempre persistia o jogo. “Coisas do jogo! Mais um rolo registrou-se
ontem, á noite no Ispora do Sr. Miguel Francellino. Tombos, gritos, zoada pancadaria e corre-
corre. Sempre o jogo!”
338
.
Por que reprimir tal costume? Por que incomodava tanto as elites o jogo em praça
pública? Será que não se estava mais preocupado com outras questões como a troca e difusão
de novas idéias, entre tanta gente junta? Vemos que manter a ordem era o principal problema,
ao se enfocar o barulho e gritaria que acontecia quando ocorria jogatina. Com certeza a
ininterrupção do jogo em praça pública, em frente ao coreto municipal, prejudicava a moral e
os bons costumes almejados para uma cidade civilizada e moderna, cujos habitantes não se
envolvem com as questões do jogo.
Com a chegada da ferrovia, as idéias de civilidade e moralidade se tornam ainda mais
contundentes e urgentes e deveriam ser colocadas em prática. Regulavam-se até os palavrões
que eram proferidos em voz alta pelos funcionários da Leste durante a viagem de trem.
Segundo o jornal O Lidador, o uso de palavrões “indignava aos ouvintes e recomendavam
mal a Companhia”
339
.
A instalação da linha rrea provocou uma nova configuração espaço-temporal, com o
a ampliação e reajustamento dos fluxos, do espaço urbano e dos equipamentos coletivos,
inaugurando novas maneiras de organizar o tempo e impondo-lhe um novo ritmo, com a
agitação da chegada e saída dos trens. O tempo passou a ser regido de acordo com o apito dos
trens.
A alegria e o alvoroço pela chegada do trem, aumentando-se a adrenalina dos que
vinham nele quando o maquinista acionava a buzina, avisando que estava chegando, são
destacados no trecho do texto de Aloísio Sales Queiroz, para a revista A Letra, da Academia
Jacobinense de Letras:
Lá vem o trem! O alvoroço se formava antes mesmo de surgir na curva, já se
ouvia o “vuc-vuc” à distância. E para aumentar a descarga de adrenalina nas
veias daqueles que estariam envolvidos com o trem. O maquinista acionava
a buzina, [...] Piuíí...
340
337
O Lidador, 18 jan. 1935.
338
Ibidem, 23 fev. 1936.
339
Edição de 7 abr. 1935.
340
Aloísio Sales Queiroz. “O Trem das Grotas”. A Letra em Revista. Jacobina-Ba: Academia Jacobinense de
Letras, set. 2001. p. 17.
123
A agitação pelo apito do trem quando apontava na serrinha é descrito em verso na letra
da música “Minha infância em Jacobina ó menina”, do cantor e compositor Aristeu Queiroz,
que divulgou Jacobina e suas belezas, no auge da sua carreira, na Rádio Nacional do Rio de
Janeiro.
Na Serrinha
341
a vez é minha
O trem apita, o povo se agita,
Esperando alguém
Que vai chegar o trem
342
Os segmentos acima mostram que o cotidiano de uma pacata cidade do interior foi de
certa maneira modificado pela buzina do trem, inaugurando novas maneiras de se lidar com o
tempo e impondo-lhe um novo ritmo. Era o trem apontar nas serras de Jacobina, por detrás
da Bananeira e Serrinha
343
, marcando os horários cotidianos da população, que o povo se
agitava e se alvoroçava. “Era rasgão tecnológico das máquinas capazes de moverem os
corpos, de cortar as distâncias com muita rapidez, que encantava o homem em Jacobina”
344
.
Nota-se um sentimento de saudosismo daquele tempo em que existia o trem para
trazer animação para a cidade. Ao se referirem ao alvoroço e à agitação do povo jacobinense,
quando o trem apitava, os autores estão também fazendo referência às mudanças e agitação,
que o mesmo trazia para a cidade e sua população, nos aspectos econômicos e sociais.
Além da propaganda negativa da cidade e da ferrovia veiculada pela imprensa local da
época, construiu-se uma memória fáustica, saudosista e prosaica em torno do período
considerado áureo em que funcionava a Leste Brasileiro em Jacobina, tanto nos relatos de
memorialistas, como nas narrativas de antigos moradores e dos ex-ferroviários, que defendem
a empresa na qual trabalharam.
O sentimento de algumas poucas pessoas que escreveram sobre a Jacobina da época
do Trem das Grotas, ao recordar o tempo em que a ferrovia passava na cidade, revela um
saudosismo dos tempos tidos como áureos, de progresso e desenvolvimento para a cidade e
para a região. Foram textos que tentaram reconstruir ou simplesmente contar o período em
que a ferrovia foi encampada pelo governo de Getúlio Vargas (1935), passando a funcionar
com o nome de Leste Brasileiro; o período descrito como o mais áureo da empresa, momento
especial lembrado com tristeza e saudosismo pelas pessoas que vivenciarem e viram de perto
341
Refere-se a um dos primeiros bairros da cidade de Jacobina.
342
Banco do Nordeste do Brasil S. A.. Jacobina. Fortaleza-CE: Grafinort indústria gráfica, 1985. p. 11.
343
Nomes dos bairros mais antigos de Jacobina, localizados na entrada da cidade entre as principais serras que
compõem o relevo jacobinense.
344
Vanicléia Silva Santos. Sons, Danças e Ritmos: a Micareta de Jacobina - Bahia (1920 a 1950). São Paulo:
PUC-SP, 2001. p. 17. Dissertação [Mestrado em História Social].
124
a ocasião de seu domínio e esplendor. Segundo Agnaldo Marcelino Gomes, “quem não sente
saudades da Maria Fumaça, com seu barulho característico e o apito estridente ecoando por
entre as serras, trazendo saudades de alguém que partiu ou aquela ansiedade da espera de
alguém que vinha retornando no trem, para o velho ninho de saudades”
345
.
Gomes faz menção a como era gostoso o tempo em que ia aos domingos à estação
esperar o trem que ia chegar; tempo este que segundo ele, vai distante e não volta mais.
Explana quanta saudade deixou a espera do trem aos domingos na estação, com um trem
descendo e outro subindo de Jacobina.
[...] A espera na estação, o encontro com a namorada, um aperto de mão, o
piscar de olhos, tempo gostoso que vai distante e que o volta mais, aos
domingos ir à estação para despedir-se de alguém e às vezes para
acompanhá-la até a próxima estação, sempre aos domingos, porque havia um
trem descendo para Caém e outro subindo para Miguel Calmon, que eram as
próximas estações de Jacobina... [...]. Um longo apito e a saudade cortando o
coração, hoje só restam à saudade
346
.
No seu texto, Agnaldo Marcelino expõe com riqueza de detalhes como era esperar o
trem e o ambiente na estação e seus arredores. Um lugar cheio de vida, alegria e com ar de
festa, envolvido por sentimentos e emoções. Lembrando a existência do bar da Leste, que
ficava no prédio anexo ao da estação, onde tomava cerveja, enquanto esperava o trem chegar,
escreve:
Bar da Leste que funcionava em anexo ao prédio, onde se tomava umas e
outras, uma loura bem gelada enquanto se esperava a chegada do trem, às
vezes havia música ao vivo, quando a namorada de algum seresteiro ia viajar
ou estava chegando férias, era sempre uma festa
347
.
O autor descreve quanta saudade a Maria Fumaça deixou: “recuando no tempo e
revolvendo a mente, são muitas as saudades de um tempo que a gente era feliz e não sabia”. E
faz uma pergunta pertinente e interessante: “que fazer com os sentimentos quando eles
retornam como uma linda canção de amor? Maria Fumaça, você ficou na lembrança. Hoje
resta a saudade
348
”.
Esse sentimento de saudade, do tempo em que existia a Estação Ferroviária em
Jacobina, também é percebido no trecho do texto escrito pela professora Alcira Pereira
345
Agnaldo Marcelino Gomes. “Maria Fumaça... quanta saudade!!!” . A Letra em Revista. Jacobina-Ba:
Academia Jacobinense de Letras, set. 2001. p. 5.
346
Ibidem.
347
Idem. Ibidem. p. 6.
348
Agnaldo Marcelino Gomes. “Maria Fumaça... quanta saudade!!!”. A Letra em Revista. Jacobina-Ba:
Academia Jacobinense de Letras, set. 2001. p. 6.
125
Carvalho Silva para o jornal A Letra, no qual destaca o seu inconformismo com a desativação
da linha de ferro na cidade e a falta de esperança na possibilidade de sua reativação.
Quanta saudade daquele tempo em que também fazia parte de nossa vida ir
ver o Trem da Grota voltar, ir buscar parentes e amigos, trazer novidades
para a terra, encantar corações. Infelizmente o vimos ser desativado, não
havendo mais esperança de um retorno da linha de ferro por onde tanto
andou o inesquecível Trem da Grota
349
.
Também Aloísio Sales Queiroz, no final de seu artigo O Trem das Grotas, demonstra
um sentimento de saudade do tempo em que O Trem das Grotas cortava as serras de
Jacobina, trazendo desenvolvimento e progresso político-social para a cidade e região”,
restando, segundo ele, a saudade de um passado que não volta mais, cheio de aventuras e
fantasias, proporcionadas pelo ir e vir dos trens.
Com o trem, surgiu o desenvolvimento político-social e um progresso
evidente para a região. Hoje nos restaram as saudades de um tempo de
aventuras e de fantasias, onde nos sonhos, embarcávamos no Trem das
Grotas
350
.
Aloísio Sales também reaviva a memória que traz as lembranças das poucas vezes em
que foi esperar o trem, como era movimentada a estação, lembrando-se principalmente do
barulho e alegrias das crianças, que viviam em torno da estação.
[...] Era uma alegria muito grande que eles passavam para as crianças ali
presentes; mesmo antes de o Trem surgir na curva, de corações disparados,
até mesmo, os daqueles menores que alimentavam a esperança de um dia
poder dar um ‘pongadinha no Trem’. Os meninos faziam uma festa!
Infiltravam-se entre as pessoas para vender guloseimas àqueles passageiros
que permaneciam sentados, a observar a movimentação em torno do Trem
[...]
351
.
As figuras colocadas abaixo, também são dotadas de significados que devem ser
interpretados pelos sujeitos que as vêem. A primeira é uma fotografia do pontilhão da estrada
de ferro, tirada na década de 1970, por Normando Lima. A segunda, de autoria desconhecida,
é a foto da construção do prédio de um dos Campus da Universidade do Estado da Bahia -
UNEB, em 1980, no local onde antes funcionava o prédio da estação da Leste em Jacobina.
349
Alcira Pereira Carvalho Silva. “Trem da grota”. A Letra. Ano IX, nº. 27. Jacobina-Ba, abr/mai. 2002. p. 1.
350
Aloísio Sales Queiroz. “O Trem das Grotas”. A Letra em Revista. Jacobina-Ba: Academia Jacobinense de
Letras, set. 2001. p. 19.
351
Idem. Ibidem. p. 17.
126
Figura 18 - Pontilhão da Estrada de Ferro. Autor: Normando
Lima, 1970. Fonte: Núcleo de Estudos de Cultura e Cidade
da Universidade do Estado Bahia, Campus IV.
Figura 19 - Construção do Prédio do Campus IV- UNEB.
Autoria desconhecida, 1980. Fonte: Núcleo de Estudos de
Cultura e Cidade da Universidade do Estado Bahia, Campus
IV.
A fotografia do pontilhão da estrada de ferro representa o único vestígio de que em
Jacobina existiu ferrovia. Traz a lembrança de algo que ali houve ativamente, mas agora
ficando a lembrança dos tempos em que passavam os trilhos da Leste entre as serras
jacobinenses.
Pela segunda fotografia, notamos que, no local onde funcionava a Estação da Leste, foi
construído o prédio do Departamento de Ciências Humanas - Campus/IV, da UNEB. No lugar
de um equipamento urbano, símbolo da modernidade, que não mais atendia aos anseios de
uma cidade, que procurava se desenvolver economicamente foi construído um novo elemento,
signo da modernidade e símbolo do conhecimento.
Com a desativação da linha férrea que passava em Jacobina, em 1976, os trilhos foram
arrancados e a estação demolida, não se deixando qualquer vestígio material sobre a
existência da ferrovia. Para tristeza da população jacobinense “por volta de 1975/76 não se
ouvia mais o grito rouco e o apito saudoso cortando os ares, Maria Fumaça emudeceu
352
”,
deixando saudade.
352
Agnaldo Marcelino Gomes. “Maria Fumaça... quanta saudade!!!” . A Letra em Revista. Jacobina-Ba:
Academia Jacobinense de Letras, set. 2001. p. 6.
127
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este trabalho longe de propor uma análise pronta e definitiva dos impactos causados
pela presença da ferrovia na cidade de Jacobina, no início do século XX, procurou trazer
algumas reflexões sobre as mudanças ocorridas na cidade, com a chegada da Estrada de Ferro
Federal Leste Brasileiro. Durante os anos de 1920-1945, passou-se de uma expectativa
promissora de modernização e progresso para Jacobina com a implantação de um meio de
transporte mais moderno e eficiente, para uma situação menos satisfatória, da falta de
investimentos e melhorias ferroviárias, criando-se frustrações em uma parte da população, que
tinha na ferrovia, a concretização dos seus desejos de modernização.
Algumas questões impulsionaram esse trabalho: será que a ferrovia teve algum
significado para a cidade e a população de Jacobina? Ela foi importante para a região? Em
quais aspectos? Algumas foram respondidas no decorrer do trabalho, mas outras ficaram sem
respostas.
Neste sentido, podemos dizer que a implantação da linha férrea, considerando ora suas
influências positivas, ora seus aspectos negativos, foi dotada de vários significados e
representações sociais, dentro de uma visão modernizadora e progressista, adequando-se,
segundo os interesses dos setores e atores sociais envolvidos, especialmente para as elites
locais, a parte mais desejosa e responsável pela sua instalação, bem como para a população
em geral.
Percebemos que a história da cidade foi tecida a partir da expressão das contradições e
ambigüidades da modernidade. Até certo momento, a ferrovia torna-se símbolo do progresso.
No início da década de 1920 até 1940, ressaltou-se a importância da linha férrea, a cidade era
vista existindo com seu dinamismo social por causa da ferrovia, atribuindo-se o
desenvolvimento econômico à presença da Leste. Em outro tempo, depois de 1940, a ferrovia
ao entrar em um processo de declínio e decadência, enfrentando dificuldades financeiras, não
contribuindo mais satisfatoriamente para o desenvolvimento das atividades comerciais,
passou a representar um entrave ao progresso pretendido para a cidade de Jacobina.
Principalmente com o trem e posteriormente sem ele, o espaço urbano se dinamiza e se
transforma pela ação dos homens que o constitui, a cidade vai se estruturando e se tornando
mais urbanizada, objeto e resultado das práticas sociais variadas.
Ao longo do trabalho nos detivemos na descrição da história de Jacobina e do histórico
da ferrovia. Este esforço teve o intuito de compreender o desenvolvimento e entrecruzamento
128
dessas duas histórias, que se entremeiam na construção do processo histórico, tomando a
ferrovia como um dos principais referenciais modernizadores e um dos elementos promotores
de modificações da trama urbana. Mostramos alguns aspectos da cidade antes e depois do
trem, para destacar a compleição e extensão modificadora da ferrovia.
Mesmo passando por um momento de sucateamento e mau funcionamento, a presença
da ferrovia passou a fazer parte e a moldar a identidade da cidade de 1920 a 1945, sendo um
referencial, uma marca na sua história, não se destruindo por completo a memória do apito do
trem “rasgando as serras de Jacobina”, acordando de madrugada, dando vida e movimento a
cidade. Sempre aflorando o sentimento do tempo do trem, com seus caminhos de ferro, nas
memórias de quem viveu esse momento, não importando se analisam a cidade de hoje mais
bonita e melhor para se viver ou se a de antes, a Jacobina antiga, dos trilhos por onde passava
a Maria Fumaça.
A Leste Brasileiro durante o período do seu funcionamento sofreu influências e
incentivos de capitais ingleses, franceses e belgas. Percebemos que o período em que a
empresa esteve sob administração francesa, de 1911 a 1934, não foi produtivo
financeiramente e tais arrendatários não foram bem vistos e aceitos por uma parte da
população, incluindo os ferroviários, que reclamavam contra os abusos e exploração dos
empregados da Leste, enquanto subordinados aos franceses.
Segundo os relatórios da Leste, os piores anos, foram os relacionados “a época dos
franceses”. Ao contrário, o período que vai de 1934 a 1938 (sob o Governo de Vargas) foi de
otimismo com relação aos recursos financeiros e melhoramentos no transporte ferroviário. A
partir de 1939, percebe-se um déficit financeiro nas contas da empresa e o início da crise e
declínio do transporte ferroviário que se agravou a partir do ano de 1946.
Por todas as questões organizacionais e funcionais, a Leste Brasileiro teve e tem até
hoje um significado social e representativo no imaginário da população jacobinense. Sendo
considerada na época, como sinônimo de progresso e desenvolvimento para a cidade e região.
Também se destaca sua importância e influência na mudança de sua funcionalidade,
impulsionando juntamente com outros fatores o desenvolvimento comercial de Jacobina.
Esta empresa ferroviária foi muito importante para o Nordeste e para a Bahia, por
agenciar diversas funções no território, movimentando pessoas e bens, fornecendo serviço
telegráfico, empregando técnicos e trabalhadores braçais. A Leste serviu como um meio de
interligação regional, atingindo plenamente a vida social e nos aspectos referentes à
coletividade do sertão baiano.
Mediante as mudanças que implantou territorial e socialmente, a Leste contribuiu
129
significativamente para o desenvolvimento e ampliação de fronteiras territoriais, sociais e
culturais, do país, da região Nordeste e do Estado da Bahia, onde se localiza em específico a
cidade de Jacobina, trazendo novos meios de comunicação, de transporte e de trocas
comerciais e culturais que constituíram a população sertaneja.
O trem foi o principal meio de transporte moderno na região, que para a cidade de
Jacobina, trouxe várias mudanças urbanas, sociais, culturais e econômicas, notadamente no
comércio, através de uma maior agilidade nos transportes de mercadorias e da articulação
com outras áreas comerciais.
A ferrovia não deve ser vista por si só, como um símbolo propulsor do progresso e
desenvolvimento, mas como um elemento de expressão da modernidade, que juntamente com
outras transformações e equipamentos urbanos contribuiram para tornar expressivo o processo
e ideal modernizador em Jacobina.
Percebemos no desenrolar das conversas com os ex-ferroviários destacados no texto,
cujas memórias são saudosistas do tempo da Leste, o significado e importância da ferrovia
para essas pessoas. Para eles, enquanto empregados da Leste, trouxe mudanças e novas
perspectivas para as suas vidas, representando seu trabalho e forma de sustento, aliada a uma
expectativa de vida para melhor, como fica expresso na entrevista com Valdir.
Nas entrevistas, os dois ex-ferroviários, cujas narrativas privilegiamos, tentam passar a
idéia de que tudo funcionava perfeitamente e que a empresa ferroviária cuidava bem dos seus
funcionários, oferecendo boas condições de trabalho. Na realidade, isso não acontecia, sendo
uma carga de trabalho excessiva e muita exigência e disciplina cobrada dos ferroviários no
desenvolvimento das suas atividades, sem oferecer as condições suficientes para um bom
desempenho do transporte ferroviário.
Consideramos, em certa medida, que a posição de defesa, presente nas falas dos dois
ex-ferroviários entrevistados, tem a ver com a auto-referência desses sujeitos, enquanto
integrantes da categoria de operários ferroviários, que reagia e resistia à política de
sucateamento do transporte ferroviário no Brasil e na Bahia, e também pela ligação desses
trabalhadores da estrada de ferro com o seu ambiente de trabalho e com a formação de sua
identidade pessoal.
Mesmo não tendo contato com ex-ferroviários que nos passassem visões diferentes,
devemos levar em conta, que também podem existir aqueles trabalhadores das estradas de
ferro, que devido a outras experiências, dessem outro significado ao trabalho ferroviário, não
se identificando com a ferrovia, mantendo uma idéia negativa da empresa, não havendo uma
ligação com a auto-referência ferroviária, atribuindo outra representação social a Leste.
130
Podemos destacar também a ligação da imprensa local com seu discurso ufanista e
progressista, veiculando novos pontos de vistas sociais e políticos, com a construção de um
novo ideal de cidade, com ares modernos e novas formas de condutas, sendo as colunas e
notas do principal jornal da cidade, O Lidador, destinadas a criticar qualquer posicionamento
em contrário com as regras e condicionamento urbanos, condizentes com os grandes centros e
interesses das oligarquias rurais.
Neste trabalho, pretendíamos explorar mais o uso da fonte oral, reconhecendo o seu
valor e contribuição no esclarecimento das teias das histórias e memórias das pessoas que
vivenciaram e sentem saudades da “Maria Fumaça” e também dos trabalhadores da empresa
ou empregados da Estrada de ferro, como eram chamados os ex-ferroviários da Leste.
Entretanto, no decorrer da pesquisa, tivemos dificuldades em trabalhar com esse tipo de fonte,
ficando essa lacuna, que pretendemos suprir em um posterior projeto de pesquisa.
O uso das fotografias também se limitou a uma tentativa inicial de encontrar algumas
pistas sobre alguns aspectos da cidade de Jacobina e da ferrovia. Devemos esclarecer que o
uso desse tipo de fonte é enriquecedor para a pesquisa, mas também faltou-nos o
conhecimento necessário da técnica de fotografia e da história de alguns fotógrafos de
Jacobina. Ressaltamos que recentemente temos o estudo do professor Valter Gomes, sobre
a influência e importância da memória fotográfica em Jacobina. Seriam outros caminhos de
pesquisa, detendo-se na análise especifica de fotografias, o que não foi o caso do nosso estudo
neste momento.
Esse é o longo percurso da viagem pelos trilhos da Leste Brasileiro, no Trem das
Grotas, atravessando grotas, montanhas e serras e chegando a Jacobina pelos idos de 1920.
Esta viagem pode levar aonde a imaginação e criatividade queiram chegar, não tem fim nem
começo, o fim pode ser começo e o começo pode ser o fim, depende do olhar e aonde se quer
chegar, no começo ou no fim, que ligam várias histórias, que ainda estão sendo construídas,
escritas e reescritas.
Fica deste trabalho a paixão pelo tema pesquisado, a saudade, o significado e
importância da Leste Brasileiro de uma maneira geral para a vida da cidade e seus habitantes.
As falhas e lacunas, apontadas anteriormente, deixamos para que outros jovens historiadores
(as) possam supri-las. Na medida do possível, levantamos alguns questionamentos e
sugerimos os caminhos para outros pesquisadores, que se sintam seduzidos pela história da
ferrovia, de Jacobina e queiram seguir os rumos dos trilhos da Leste, possibilitando novas
descobertas a respeito do funcionamento do transporte ferroviário, que tanto influenciou a
sociedade e a economia brasileira, nordestina, baiana e especificamente jacobinense.
131
FONTES
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BIBLIOTECA PÚBLICA MUNICIPAL AFONSO COSTA, JACOBINA-BA, SEÇÃO
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Anais do Arquivo da Marinha, nrs.: I, II, III, IV, V, VI, VII, VIII, IX, X. (Estão no mesmo
volume);
Anais do Arquivo Público da Bahia e do Museu do Estado da Bahia, vls.: 2, 3, 4, 5, 7, 8, 9;
Anais do Arquivo Público da Bahia, vls.: 24, 25, 26, 27(2v), 29, 30, 31;
Coisas da Bahia, vls: IV, VII, VIII, IX, XI, XIV, XV, XIX, XX, XXI, XXIII, XXIV, XXVI,
XXVIII, XXIX, XXX, XXXI, XXXIV, XXXV, XXXVI, XLI, XLII, XLIII, LII, LIII, LVI,
S/N, S/N, S/N;
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Encicoplédia dos Municípios Brasileiros, vls: III, IV, VII, IX, XI, XIV, XV, XVI, XVII,
XVIII, XIX, XXII, XXIII, XXIV, XXV, XXVI, XXVII, XXVIII, XXIX, XXX, XXXI,
XXXII, XXXIII, XXXIV, XXXV, XXXVI;
Memórias Históricas e Políticas da Bahia, vls: III, IV, V, VI;
ARQUIVO PÚBLICO MUNICIPAL DE JACOBINA (APMJ):
Código de Posturas Municipais. Atos do Prefeito (1933-1938). n. 65. 30 dez. 1933.
Decretos e papéis diversos;
Livros de Atas Municipais;
O Livro de Atos do Prefeito de 1933 e 1938;
O Livro de Leis e Resoluções do Conselho Municipal de 1908 a 1915;
O Livro de Registro de Ofícios de 1950 a 1951.
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O Livro de Registro de Cartas, Cartões e Memorandos de 1946- 1952;
O Livro de Registro de Ofícios da Prefeitura de 1948- 1950.
FUNDAÇÃO IRACI GAMA (FIGAM), ALAGOINHAS-BA.
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Independência. Bahia: Salvador, 1923;
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132
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Correspondências e atos dos governadores, dentre outros;
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BIBLIOTECA DA FUNDAÇÃO CLEMENTE MARIANI, SALVADOR-BA:
VIAÇÃO FÉRREA FEDERAL LESTE BRASILEIRO, FREITAS, Lauro F. P. de. Relatório
do Exercício de 1935. Salvador: Cia. Editora Gráfica da Bahia, 1936;
VIAÇÃO FÉRREA FEDERAL LESTE BRASILEIRO, FREITAS, Lauro F. P. de. Relatório
do Exercício de 1943. Salvador: Tipografia da Leste, 1944;
VIAÇÃO FÉRREA FEDERAL LESTE BRASILEIRO, FREITAS, Lauro F. P. de. Relatório
do Exercício de 1944. Salvador: Tipografia da Leste, 1945;
VIAÇÃO FÉRREA FEDERAL LESTE BRASILEIRO, FREITAS, Lauro F. P. de. Relatório
do Exercício de 1948. Salvador: Tipografia da Leste, 1949.
BIBLIOTECA PÚBLICA DO ESTADO DA BAHIA (BPEB), SALVADOR-BA:
VIAÇÃO FÉRREA FEDERAL LESTE BRASILEIRO, FREITAS, Lauro F. P. de. Relatório
do Exercício de 1935. Salvador: Cia. Editora Gráfica da Bahia, 1936;
VIAÇÃO FÉRREA FEDERAL LESTE BRASILEIRO, FREITAS, Lauro F. P. de. Relatório
do Exercício de 1936. Salvador: Cia Editora Gráfica da Bahia, 1937;
VIAÇÃO FÉRREA FEDERAL LESTE BRASILEIRO, FREITAS, Lauro F. P. de. Relatório
do Exercício de 1937. Salvador: Cia Editora Gráfica da Bahia, 1938;
VIAÇÃO FÉRREA FEDERAL LESTE BRASILEIRO, FREITAS, Lauro F. P. de. Relatório
do Exercício de 1940. Salvador: Tipografia da Leste. 1941;
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do Exercício de 1941. Salvador: Tipografia da Leste, 1942;
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do Exercício de 1942. Salvador: Tipografia da Leste, 1943;
VIAÇÃO FÉRREA FEDERAL LESTE BRASILEIRO, FREITAS, Lauro F. P. de. Relatório
do Exercício de 1943. Salvador: Tipografia da Leste, 1944;
VIAÇÃO FÉRREA FEDERAL LESTE BRASILEIRO, FREITAS, Lauro F. P. de. Relatório
do Exercício de 1944. Salvador: Tipografia da Leste, 1945;
VIAÇÃO FÉRREA FEDERAL LESTE BRASILEIRO, FREITAS, Lauro F. P. de. Relatório
do Exercício de 1948. Salvador: Tipografia da Leste, 1949.
133
ENCONTRADOS EM OUTROS ARQUIVOS:
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Caderno 2-cultura. p. 3, 13 de novembro de 1994, 25 de agosto de 1997. p. 18;
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O Estado da Bahia, Ano I, nrs. 3 a 58, 1933;
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Vanguarda, que circulou de 1955 a 1960;
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Correio da Bahia. Repórter, 24 de junho de 2001;
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ORAIS:
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GLOSSÁRIO
BREQUE: era o nome dado, geralmente, ao último carro, ou vagão, do comboio de trens que
possuía freio mecânico para parar as máquinas e comumente transportava os chefes das
turmas de empregados da linha férrea.
DORMENTE: ferros que unem os trilhos.
FEITOR: era o empregado da ferrovia que dirigia, tomava conta e comandava a supervisão de
uma turma de operários em determinados trechos das linhas.
FIFÓS: Antigos lampiões de querosene, usado no Norte do Brasil, na época uma das formas
de iluminação artificial da cidade. Onomatopéia do ruído assoprado que faz a chama do
lampião.
GROTA: refere-se à abertura produzida pelas enchentes em ribanceira ou na margem de um
rio, formando uma depressão entre as montanhas. Uma região de vales e serras com clima e
solo propícios para a prática da agricultura.
LASTRAR: “lastrar linha”, na linguagem ferroviária, referia-se ao trabalho de colocar uma
camada protetora de pedras, britas sobre os dormentes das linhas.
MESTRE DE LINHA: era o chefe superior que fiscalizava e supervisionava o funcionamento
dos trabalhos e estado das linhas. Geralmente o mestre de linha percorria os trechos da
ferrovia sobre um troller, vendo se os dormentes estavam bons, analisando as condições dos
trilhos e verificando se precisava fazer algum reparo nas linhas.
TRÓLEO: Troller”, um pedaço de lastro de vagão sobre rodas, com uma cadeira no meio,
aonde o mestre de linha ia sentado, empurrado por alguns homens que trabalhavam na
ferrovia. É semelhante à Baratinha, carrinho com o qual se faz a fiscalização das linhas que se
têm hoje. A única diferença é que ela é motorizada e o troller era movido à força humana.
148
Anexos
149
ANEXO I - Cronologia dos principais decretos e contratos da formação das empresas
ferroviárias que constituíram a Leste Brasileiro.
Decreto legislativo n. 725, de 3 de outubro de 1853 autoriza a construção da Estrada de
Ferro de Ferro da Bahia ao São Francisco.
Decreto legislativo n. 1.242, de 16 de junho de 1865 – autoriza a uma companhia a
construir a estrada de ferro da cidade de Cachoeira à Chapada Diamantina e do ramal para
Feira de Santana.
Aviso n. 62, de 19 de novembro de 1872 a partir da massa falida da Estrada de Ferro do
Paraguassú, organiza a nova empresa da Estrada de Ferro Central da Bahia.
Decreto n. 9.082, de 14 de dezembro de 1883 aprova o projeto e orçamento do ramal do
Timbó da E. F. da Bahia ao São Francisco (abertura ao tráfego em 1887).
Aviso n. 42, de 30 de janeiro de 1892 prorroga o prazo da construção do prolongamento
de Vila Nova (Bonfim) a Juazeiro.
Lei n. 652, de 23 de novembro de 1899 autoriza o resgate das estradas de ferro da Bahia
(Da Central da Bahia e da Bahia ao São Francisco). A partir daí até 1904 as estradas entram
no processo de repasse, de recebimento e arrendamento. No decreto n. 3.565, a Estrada de
Ferro da Bahia ao São Francisco é arrendada ao engenheiro Teive e Argollo. No Aviso n. 25,
de 7 de abril de 1904, é concluída a liquidação e resgate, em Londres, da E. F. Central da
Bahia.
Decreto n. 1.126, de 15 de dezembro de 1903 autoriza a construção da Estrada de Ferro
de Timbó a Propriá.
Decreto n. 7.509, de 19 de agosto de 1909 o contrato transfere para a Companhia Viação
Geral da Bahia, o arrendamento das estradas de ferro federais da Bahia.
Decreto n. 8.648, de 31 de março de 1911 – revisa o contrato anterior.
Decreto n. 8.939, de 30 de agosto de 1911 autoriza a Compagnie dês Chemins de Fer
Federaux l´Est Brésilien a atuar no Brasil e no decreto 9.029, de 11 de outubro de 1991, esta
companhia recebe por transferência, o contrato da Companhia de Viação Geral da Bahia.
Decreto n. 9.278, de 30 de dezembro de 1911 a l’Est recebe por acordo com o governo
do Estado de Minas Gerias e do governo do Estado da Bahia, a Nova Companhia de E. F. da
Bahia a Minas, da linha de Caravelas a Teófilo Otoni.
Decreto n. 9.718, de 12 de agosto de 1912 – aprova os estudos do ramal de Campo
Formoso.
Decreto n. 9.754, de 4 de setembro de 1912 aprova os estudos de ligação a partir de
Jacobina, da E. F. São Francisco à E. F. Central da Bahia.
Decreto n. 10.097 de 26 de fevereiro de 1913 – incorpora a Estrada de Ferro Santo Amaro
à Rede de Viação Férrea Federal da Bahia, arrendada à l’Est. Cuja encampação, ocorre no
150
decreto n. 3.337, de 5 de setembro de 1917.
Decreto n. 24.321 de 1 de junho de 1934 – o Governo Federal recupera a administração da
empresa francesa l’Est.
Decreto n. 3.115 de 16 de março de 1957 o Governo Federal cria a Rede Ferroviária
Federal Sociedade Anônima - RFFSA, que englobou a Leste Brasileiro.
151
ANEXO II
Tabela - Extensão das Linhas e Ramais da Leste Brasileiro em 1944.
ESTRADA ESTAÇÕES EXTREMAS
EXTENSÃO LINHA PRINCIPAL
(SEM OS DESVIOS) (KM)
Estrada de Ferro da Bahia ao São
Francisco
Calçada (SSA)-Alagoinhas 124,9
Estrada de Ferro de São Francisco Alagoinhas-Juazeiro 453,1
Ramal da Barra de Mundo Novo Bonfim-Barra de Mundo Novo 208,4
Sub-ramal de Campo Formoso Itinga-Campo-Formoso 9,8
Estrada de Petrolina a Terezina Petrolina-Paulista 203,8
Alagoinhas a Própria Alagoinhas-Propriá 428,1
Estrada de Ferro de Sergipe Ponta do Triângulo-Aracaju 1,9
Ramal de Capela Murta-Capela 11,3
Estrada de Ferro Central da Bahia Mapele-Umburanas 580,7
E. F. Santo Amaro
Ramal de Bom Jardim
Barunhem-Bom Jardim 29,6
Ramais da Estrada de Ferro de Santo
Amaro
Várias estações 49,0
Ramal de Feira de Santana Conceição de Feira-Feira de Santana
31,5
Ramal de Santa Terezinha Triângulo-Santa Terezinha 1,6
Ramal de Itiúba Paraguaçu-Itiúba 41,6
Ramal de Itaeté Queimadinhas-Itaeté 33,7
TOTAL – 2.209,0
Fonte: Relatório da Viação Férrea Federal Leste Brasileiro do exercício do ano de 1944, que se encontra no acervo da biblioteca da
Fundação Clemente Mariani.
152
ANEXO III
Tabela - Movimento Financeiro da VFFLB de 1911 a 1940 (em Réis).
ANO RECEITA DESPESA DÉFICIT SALDO
2º. Semestre – 1911
1.680:413$829
1.889:568$821 - 209:154$992
1912
3.400:968$107
3.792:769$500 - 391:801$393
1913
3.750:707$422
4.421:720$707 - 671:013$285
1914
3.627:052$734
4.378:822$181 - 751:769$447
1915
3.689:848$065
3.751:320$567 - 61:472$502
1916
4.557:162$849
4.570:962$298 - 13:799$449
1917
5.272:171$707
5.739:258$102 - 467:086$395
1918
5.741:323$317
7.216:848$609 - 1.475:525$292
1919
6.897:573$541
8.963:173$650 - 2.065:600$109
1920
9.614:484$969
10.901:582$504 - 1.297:097$536
1921
8.122:340$707
10.005:117$755 - 1.882:777$048
1922
9.174:978$309
9.897:393$062 - 722:414$753
1923
9.854:724$801
10.596:459$683 - 741:734$882
1924
11.621:932$789
11.970:815$989 - 348:883$200
1925
14.407:886$189
14.757:911$727 - 350:025$538
1926
14.616:847$736
13.818:173$402 798:674$334
1927
14.900:818$456
17.618:357$512 - 2.717:539$056
1928
17.625:119$619
18.075:553$491 - 450:433$872
1929
18.050:696$264
16.583:444$982 1.467:251$282
1930
17.521:852$528
15.942:992$257 1.578:860$271
1931
13.910:900$493
15.326:146$186 - 1.415:245$693
1932
12.253:999$050
13.313:783$117 - 1.059:784$067
1933
12.350:649$310
12.403:746$482 - 53:097$172
1934
13.280:787$145
13.128:022$052 152:765$093
1935
15.754:685$483
14.25:083:565 1.499:611$918
1936
18.204:144$751
15.330:543$129 2.873:601$622
1937
19.956:883$900
18.828:719$737 1.128:164$167
1938
18.935:837$000
18.854:633$446 81:203$554
1939
18.134:901$979
19.513:518$979 - 1.378:617$779
1940
21.146:385$500
21.285:993$644 - 139:608$144
1941
20.417.582,10
25.235.834,50 - 4.818.252,40
1942
25.567.687,00
32.441.088,40 - 6.873.401,40
1943
35.531.835,40
35.591.888,90 - 254.667,90
1944
$37.923.387,50
58.724.405,80 - 20.801.018,30
1945
$35.011.645.60
65.844.808,40 - 30.833.162,80
1946
$34.480.506,50
108.086.006,70 - 73.605.500,20
1947
$31.223.848,10
116.964.745,20 - 85.740.897,10
1948
$36.040.009,90
130.985.048,30 - 94.945.038,40
Fonte: Relatórios da Viação Férrea Federal Leste Brasileiro dos exercícios dos anos de 1943 a 1948, que se encontram no
acervo da biblioteca da Fundação Clemente Mariani.
153
ANEXO IV - Mapa Estradas de Ferro da Bahia.
Fonte: Atlas Geoeconômico da Bahia. Salvador, Bahia: [s.ed.], 1959.
154
ANEXO V - Mapa Estrada de Ferro da Bahia ao Rio São Francisco.
Fonte: MESQUITA, Elpídio. Viação Férrea da Bahia. Rio de Janeiro: Tipografia do jornal do comércio, 1910.
155
ANEXO VI - Mapa da Viação Férrea Federal Leste Brasileiro em 1965.
156
ANEXO VII - Mapa da RFFSA/Superintendência Regional - Salvador-1984.
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