![](bg1f.jpg)
FELIPE RODRIGUES GOMES FERREIRA
30
As reivindicações territoriais antárticas, sem exceção, não são
reconhecidas pela comunidade internacional, a não ser entre os países
territorialistas. Reino Unido, Austrália, Nova Zelândia, França e Noruega
reconhecem mutuamente suas reivindicações. Chile e Argentina reconhecem
mutuamente seus direitos na região, apesar de não terem chegado a um acordo
sobre limites, e rejeitam as demais reivindicações.
Todas as reivindicações acima partem da premissa que a Antártica é res
nullius, ou seja, o continente não pertence a ninguém e seria passível de
apropriação, parcial ou total, bastando que um Estado estabelecesse lá soberania.
Em contraposição, há quem defenda para a Antártica a aplicação do princípio res
communis, ou seja, o continente seria espaço comum a todos, não suscetível a
soberania, a exemplo do que ocorre com o alto-mar. A defesa do res communis
baseia-se principalmente na dificuldade de uma ocupação permanente. Por isso,
alguns juristas, como Fauchille, defendiam, já há muito, a tese da criação de um
regime internacional para administrar as regiões polares.
36
Mesmo com toda a atual tecnologia, é fato que uma ocupação efetiva e
permanente da Antártica, que fundamentaria uma irrefutável reivindicação, é
extremamente difícil. Mesmo a “população” antártica de aproximadamente
3.000 cientistas não poderia ser considerada permanente – por maior que seja
sua estada no continente, esta é intermitente e dura apenas o quanto durarem
seus projetos científicos.
37
A ocupação é considerada hoje pela maioria dos juristas como único
título válido de soberania, admitindo excepcionalmente outros critérios, como
a descoberta, somente como títulos incoativos.
38
Apesar de difícil, o
36
FAUCHILLE, Paul. Traité de Droit International Public, 1925. apud. COSTA, João Frank da.
Antártida: o problema político.Revista Brasileira de Política Internacional, v.1, nº 3, pp.
41-58, 1958a.
37
Um hipotético estabelecimento permanente na Antártica hoje não poderia servir de base para
qualquer reivindicação territorial, nos termos do Artigo IV do Tratado, conforme será visto
adiante. Pela mesma razão, a política de incentivo ao nascimento de crianças em estações
antárticas, promovida pelos regimes militares de Argentina e Chile, tampouco poderia servir
para reforçar as reivindicações desses países. Sobre a política antártica chilena, ver
GUIMARÃES, Gilda Maria. O Chile e a Antártida – subsídios para uma visão brasileira. VI
Curso de Altos Estudos, 2
o
período. Brasília: IRBr, 1983. Para uma visão argentina, ver
MOLINARI, Ángel Ernesto (coord.). La Argentina en la Antártida: 100 años de presencia
permanente e ininterrumpida. Buenos Aires : CARI, 2005.
38
Títulos incoativos (inchoate titles) são títulos jurídicos imperfeitos, válidos temporariamente
até a efetiva ocupação e exercício de soberania sobre um território – o problema é a definição de
quanto tempo é “temporariamente”. JOYNER, 1998, pp. 14-20. Se soberania estatal pode ser
definida como “exclusividade, autonomia e plenitude de competências”sobre determinado
território e sua população ou como presunção dessa competência, parece claro que o conceito