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mãe; coloca-se em seu lugar, identifica-se com ela, e toma a si próprio como um
modelo a que devem assemelhar-se os novos objetos de seu amor. Desse modo ele
transformou-se num homossexual. O que de fato aconteceu foi um retorno ao auto-
erotismo, pois os meninos que ele agora ama à medida que cresce, são, apenas,
figuras substitutivas e lembranças de si próprio durante sua infância — meninos
que ele ama da maneira que sua mãe o amava quando era ele uma criança.
Encontram seus objetos de amor segundo o modelo do narcisismo, pois Narciso,
segundo a lenda grega, era um jovem que preferia sua própria imagem a qualquer
outra, e foi assim transformado na bela flor do mesmo nome (FREUD, 1910,
p.106).
Neste texto o conceito é usado no mesmo sentido que o da nota de rodapé dos Três
ensaios; porém, é mais bem detalhado. Trata-se de uma forma de identificação com a mãe que
leva a um tipo específico de escolha dos objetos sexuais: a escolha narcísica. Leonardo amava
seus aprendizes enquanto representantes de si mesmo como menino. Ao mesmo tempo estava
identificado com sua mãe por ter tido de renunciar ao seu amor por ela e, assim, relacionava-
se com seus aprendizes como gostaria que sua mãe tivesse se relacionado com ele (STEINER,
1997, p.61). Portanto, de início, o narcisismo surge como um tipo de relação de objeto fruto
de uma identificação. Os principais conceitos que compõem o conjunto dos elementos
narcísicos surgem embrionariamente neste texto: a escolha narcísica e a identificação
narcísica.
O texto seguinte, na história da evolução do conceito, traz contribuições que vão além
daquelas desenvolvidas anteriormente. Mais uma vez, o narcisismo aparece associado aos
desejos homossexuais; no entanto, Freud tenta explicar a relação destes desejos com a
paranóia. No Caso Shereber, de 1911, encontramos o seguinte:
Pesquisas recentes dirigiram nossa atenção para um estádio do desenvolvimento da
libido, entre o auto-erotismo e o amor objetal. Este estádio recebeu o nome de
narcisismo. O que acontece é o seguinte: chega uma ocasião, no desenvolvimento
do indivíduo, em que ele reúne seus instintos sexuais (que até aqui haviam estado
empenhados em atividades auto-eróticas), a fim de conseguir um objeto amoroso; e
começa por tomar a si próprio, seu próprio corpo, como objeto amoroso, sendo
apenas subseqüentemente que passa daí para a escolha de alguma outra pessoa que
não ele mesmo, como objeto. Essa fase eqüidistante entre o auto-erotismo e o amor
objetal pode, talvez, ser indispensável normalmente; mas parece que muitas pessoas
se demoram por tempo inusitadamente longo nesse estado e que muitas de suas
características são por elas transportadas para os estádios posteriores de seu
desenvolvimento. De importância principal no eu (self) do sujeito assim escolhido
como objeto amoroso já podem ser os órgãos genitais. A linha de desenvolvimento,
então, conduz à escolha de um objeto externo com órgãos genitais semelhantes —
isto é, a uma escolha objetal homossexual — e daí ao heterossexualismo. As
pessoas que se tornam homossexuais manifestas mais tarde, nunca se emanciparam,
pode-se presumir, da condição obrigatória de que o objeto de sua escolha deve
possuir órgãos genitais como os seus; e, com relação a isto, as teorias sexuais
infantis que atribuem o mesmo tipo de órgãos genitais a ambos os sexos exercem
muita influência (FREUD, 1911, p. XX).