82
O que eu colo?
Obras que talvez quisesse ter feito, que admiro e que, por vezes, venero. Que
consegui através de uma “cópia” sei lá como, que “xeroco”. Roupas que queria ter
usado. Que pesquiso sua história e me fascinam. Botões que trato como jóias. Adesivos
que colam em si mesmos, revoadas de borboletas. Flores - de tecido, de plástico, de
biscuit. Penas, vasos, pérolas, passamanarias. Fitas – de cetim, de veludo, de organdi, de
organza, de natal, xadrezes, lisas, estampadas e gregas. Bijuterias, escapulários,
rosários, medalhas, anéis. Santinhos – de papel, gesso, resina, bronze, ferro.
Calendários, bandejas rendadas, bandejas de papelão. Tecidos - de algodão, seda,
microfibra, brocados, veludos, tapeçarias. Rendas de nylon, de guipure, valencianas,
francesas e italianas. Baralhos de tarô, revistas, livros e filmes – do cinema, da TV, das
propagandas. Teatros, óperas e balés.
Colo memórias, lembranças, questionamentos, metáforas, vivências, traumas,
emoções, orações, cantos, amizades, passagens, teorias, práticas, oferendas, esperanças,
pedidos, olhares – meus, teus, da Virgem; tempos, espaços, culturas, invocações,
cenários, realidades, virtualidades, reproduções, autenticidades, industrializações,
manufaturas, artesanatos, preciosidades, dúvidas, certezas, dualismos, espíritos, fé,
superstições, crendices...
Posso me enquadrar, por vezes, nas premissas de Chiarelli e na prática do "uso
de imagens de segunda geração", a qual chama “citacionismo”
20
. Sobre o qual o artista
transita, sem prender-se à linearidade da história.
Pelo contrário, percebe-se nela a necessidade de manter um olhar
retrospectivo, produzindo obras cujo valor não está na novidade absoluta das
formas – que caracterizou principalmente as vanguardas históricas –, mas sim
na elaboração de outros sistemas visuais significativos, criados a partir da
conjugação de imagens e processos lingüísticos preexistentes (e muitas vezes
conflitantes), todos eles recolhidos naquele universo de imagens, já referido.
(CHIARELLI, 2002, p. 100)
Mas, como disse Nicolaiewsky, “Este trabalho se propõe a ser uma reflexão
sobre o processo criativo em artes plásticas, a partir do testemunho do criador”
(NICOLAIEWSKY, 1997, p.2), devo confessar que, no momento de criação, não me
importo citar Leonardo Da Vinci ou citar o “camelô” de quem comprei adesivos. No ato
de criação me preocupo em colar elementos que juntos formem a Virgem Maria. Em
20
Como algo que está implicada com os avanços tecnológicos do último século, Uma tecnologia que
inicialmente foi usada para registrar o presente, construir uma memória material e preservar o passado,
passou a ser usada como matéria prima para composição de novas obras.