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UM UNI
VERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS - UNIMONTES
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTU SENSU EM
CIÊNCIAS DA SAÚDE
MESTRADO PROFISSIONAL EM CUIDADO PRIMARIO EM
SAÚDE
Carolina dos Reis Alves
O Agente Comunitário de Saúde: percepções e
interpretações quanto a seu perfil e seu papel na
Estratégia Saúde da Família da cidade de Montes
Claros – MG
Montes Claros/ MG
2009
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2
UM UNI
VERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS - UNIMONTES
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTU SENSU EM
CIÊNCIAS DA SAÚDE
MESTRADO PROFISSIONAL EM CUIDADO PRIMARIO EM
SAÚDE
Carolina dos Reis Alves
O Agente Comunitário de Saúde: percepções e
interpretações quanto a seu perfil e seu papel na
Estratégia Saúde da Família da cidade de Montes
Claros – MG
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Ciências da Saúde (PPGCS) da
UNIMONTES como parte das exigências para a
obtenção do título de Mestre em Ciências da
Saúde: Cuidado Primário em Saúde.
Orientador: Profª. Drª. Virgínia Torres Schall
Montes Claros/MG
2009
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3
UM UNI
VERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS - UNIMONTES
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTU SENSU EM
CIÊNCIAS DA SAÚDE
MESTRADO PROFISSIONAL EM CUIDADO PRIMARIO EM
SAÚDE
ALUNA: Carolina dos Reis Alves
TÍTULO DO PROJETO: O Agente Comunitário de Saúde: percepções e interpretações
quanto a seu perfil e seu papel na Estratégia Saúde da Família da cidade de Montes
Claros – MG
BANCA (TITULARES) ASSINATURAS
PROFª. DRª. Virginia Torres Schall ORIENTADOR _______________________
PROFª. DR.ª Celina Maria Modena– Fiocruz/René Rachou _______________________
PROF. DR. João Felício Rodrigues Neto– UNIMONTES _______________________
BANCA (SUPLENTES) ASSINATURAS
PROF. DR. Antônio Prates Caldeira - UNIMONTES ___________________________
PROF. DR. Maísa Tavares de Souza Leite – UNIMONTES ______________________
[ ] APROVADA [ ] REPROVADA
4
“A esperança
não é para
amanhã.
A esperança é
este instante.
Precisa-se dar
outro nome a
certo tipo de
esperança
porque esta
palavra
significa
sobretudo
espera.
E a esperança é
já”.
(Clarice Lispector,
1977)
5
DEDICATÓRIA
Dedico este estudo à Vida, representada pela mensagem de A. J. Cronin,
que revela a trajetória trilhada na execução deste estudo:
“A vida não é um corredor reto e tranqüilo que
s percorremos livres e sem empecilhos,
mas um labirinto de passagens,
pelas quais nós devemos procurar nosso
caminho, perdidos e confusos, de vez em quando
presos em um beco sem saída.
Porém, se tivermos fé,
uma porta sempre será aberta para nós,
o talvez aquela sobre a qual
nós mesmos nunca pensamos,
mas aquela que definitivamente
se revelará boa para nós.”
Dedico este estudo aos “Anjos” da Estratégia Saúde da Família, os Agentes
Comunitários de Saúde, que emprestaram suas “Asas”, permitindo-me voar
que voar depende das asas de cada um de nós em um processo coletivo
de aprendizagem retratado por Richard Bach:
“Aprender é descobrir aquilo que você já sabe.
Fazer é demonstrar que você o sabe.
Ensinar é lembrar aos outros que eles sabem tanto quanto você.
Nós todos somos aprendizes, fazedores, professores."
6
AGRADECIMENTOS
"Agradecer é admitir que houve um minuto em que se precisou de alguém.
Agradecer é reconhecer que o homem jamais poderá lograr para si o dom de ser auto-
suficiente”. (Autor desconhecido)
Ao meu esposo, Claudio, que compartilhou comigo os momentos de alegria e me apoiou
nos dias de incerteza, de angústias, de ansiedades e, acima de tudo, pelo apoio
incondicional a todas as minhas escolhas e que está sempre ao meu lado e presente na
minha vida, a você, que é a minha “Vida”, agradeço por todos os momentos vividos e
compartilhados.
Aos meus pais, Noelia e José (Gessé), pelo apoio incessante e estímulo em toda a minha
trajetória de vida, que, apesar de não terem o “estudo”, lutaram com garra para que suas
filhas pudessem alcançar tudo que desejassem, é para vocês esta conquista e a minha
eterna gratidão.
Às minhas irmãs, Ana Paula e Marta, que, mesmo distantes geograficamente, estavam
sempre perto no aspecto do sentimento e da motivação, apoiando as minhas decisões.
Em especial, a Aninha, minha eterna companheira.
A minha afilhada e sobrinha, Camily, que, por sua curiosidade e aprendizado de criança,
leva-me a querer contribuir para a construção de um mundo melhor.
À minha orientadora, professora D Virginia Torres Schall, que aceitou a tarefa de
oferecer suporte para este trabalho, pelas sugestões e disponibilidade em auxiliar-me no
7
esclarecimento de dúvidas, e, especialmente, pela paciência. Como não tenho palavras
para descrever a minha gratidão, utilizarei as palavras de Cora Coralina: "Professor, sois
o sal da terra e a luz do mundo. Sem vós tudo seria baço, e a terra escura. Professor, faz
de tua cadeira a cátedra de um mestre. Se souberes elevar teu magistério, ele te elevará
à magnificência (...) Feliz aquele que transfere o que sabe e aprende o que ensina.
Melhor professor nem sempre é o de mais saber e, sim, aquele que, modesto, tem a
faculdade de manter o respeito e a disciplina da classe.
Aos Agentes Comunitários de Saúde, sujeitos da pesquisa, pela valiosa colaboração e
pela confiança ao revelar as suas alegrias, suas angústias, o seu processo de trabalho; o
meu muito obrigado a vocês construtores da saúde e engenheiros de um novo fazer;
obrigada por repartir seus conhecimentos com dedicação e amizade, no cumprimento do
seu dever.
A minha equipe de Saúde da Família Vila Anália, pelo apoio diário, por suportar o mau-
humor e pelo constante esforço de estar junto como uma verdadeira família e permitirem
esta conquista profissional e pessoal.
Às famílias dos bairros Vila Anália, Novo Delfino e Jardim Olímpio, pela compreensão nos
momentos de ausência em decorrência do estudo e de aprendizagem; muito obrigada.
À Secretaria Municipal de Saúde, em especial o ex-secretario de saúde, João Batista
Silvério, pessoa visionária que permitiu a consumação desse sonho por meio da liberação
para o inicio da trajetória do mestrado.
8
Com muito carinho, agradeço a todos da minha família, em especial ao meu avó,
Joaquim, esteio da família Reis, que, na sua simplicidade, mostrou-me o verdadeiro
sentido da vida em família. Á minha avó, Lourdes, que, mesmo fisicamente ausente,
contribuiu e ainda contribui com seus exemplos em vida, que possibilitaram ser a “Ló”,
pessoa de garra e que nunca desiste.
À minha cunhada, Cíntia, pelo apoio, incentivo e contribuições significativas para o
desenvolvimento deste estudo.
Ao professor João Felício, pelo incentivo em momentos de incertezas e contribuição
durante o desenvolvimento acadêmico.
Agradeço, enfim, aos que estiveram ao meu lado, seja no estímulo, seja na motivação,
possibilitando a construção e aprofundamento deste trabalho.
9
LISTA DE TABELAS
TABELA 1- População atendida pelo Programa de Agente Comunitário
de Saúde (PACS), Brasil, 1999.
63
TABELA 2 - Distribuição dos agentes das equipes de saúde da família
do pólo urbano por gênero e tempo de experiência da cidade de Montes
Claros/MG, outubro 2007.
145
TABELA 3 - Distribuição dos agentes das equipes de saúde da família
do pólo urbano por escolaridade e tempo de experiência da cidade de
Montes Claros/MG, outubro 2007.
147
TABELA 4- Distribuição dos agentes por faixa etária da cidade de
Montes Claros/MG, 2008.
169
TABELA 5- Distribuição dos agentes por tempo de profissão da cidade
de Montes Claros/MG, 2008.
170
TABELA 6- Frequência da realização do processo de educação
permanente nas equipes de saúde da família da cidade de Montes
Claros/MG, 2008.
323
10
LISTA DE FÍGURAS
FIGURA 1 – Foto panorâmica da cidade de Montes Claros- MG.
137
FIGURA 2 – Macrorregião de Montes Claros- MG
138
FIGURA 3 – Região do Norte de Minas Gerais.
139
FIGURA 4 - Vista panorâmica da cidade de Montes Claros – MG.
140
FIGURA 5 - Rede Instalada dos Serviços de Saúde de Montes Claros -
MG.
144
FIGURA 6 - Rede Instalada dos Serviços de Saúde que participaram da
pesquisa
156
11
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1 Caracterização dos agentes comunitários de saúde da
região leste da cidade de Montes Claros/MG, 2008.
162
QUADRO 2 Caracterização dos agentes comunitários de saúde da
região noroeste da cidade de Montes Claros/MG, 2008.
163
QUADRO 3 Caracterização dos agentes comunitários de saúde da
região norte da cidade de Montes Claros/MG, 2008.
164
QUADRO 4 Caracterização dos agentes comunitários de saúde da
região central da cidade de Montes Claros/MG, 2008.
164
QUADRO 5 Caracterização dos agentes comunitários de saúde da
região sudoeste da cidade de Montes Claros/MG, 2008.
165
QUADRO 6 Caracterização dos agentes comunitários de saúde da
região sul da cidade de Montes Claros/MG, 2008.
166
QUADRO 7 Caracterização dos agentes comunitários de saúde da
região oeste da cidade de Montes Claros/MG, 2008.
166
QUADRO 8 - Comparação da visão do processo de trabalho antes e
depois de ser Agente Comunitário de Saúde, 2008
257
QUADRO 9 - Distribuição dos resumos publicados em anais de eventos
científicos, 2008
379
12
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ACS
Agente Comunitário de Saúde
ADENE
Agência Desenvolvimento do Nordeste
AIS
Ações Integradas de Saúde
APS
Atenção Primária à Saúde
CEB
Câmara de Educação Básica
CEP
Comitê de Ética em Pesquisa
CNBB
Conferência Nacional dos Bispos do Brasil
CNE
Conselho Nacional de Educação
CONASP
Conselho Consultivo de Administração da Saúde Previdenciária
CMS
Conselho Municipal de Saúde
DAB
Departamento de Atenção Básica
DSC
Discurso do Sujeito Coletivo
DF
Distrito Federal
ECH
Expressões-Chaves
ESF
Estratégia Saúde da Família
FMS
Fundo Municipal de Saúde
GM
Gabinete do Ministro
GPSM
Gestão Plena do Sistema Municipal
HUCF
Hospital Universitário Clemente Faria
IBGE
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IC
Ideias Centrais
LOS
Lei Orgânica da Saúde
MG
Minas Gerais
13
MOC
Montes Claros
MS
Ministério da Saúde
NASF
Núcleo de Apoio ao Saúde da Família
NOAS
Norma Operacional de Assistência à Saúde
NOB
Norma Operacional Básica
OMS
Organização Mundial de Saúde
PACS
Programa de Agente Comunitário de Saúde
PIASS
Programa de Interiorização das Ações de Saúde
PROFAE
Projeto de Profissionalização dos trabalhadores da área de
enfermagem
PSF
Programa Saúde da Família
SESP
Serviço Especializado em Saúde Pública
SIAB
Sistema de Informação da Atenção Básica
SIPACS
Sistema de Informação do Programa de Agente Comunitário de
Saúde
SME
Secretaria Municipal de Educação
SMS
Secretaria Municipal de Saúde
SUDS
Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde
SUS
Sistema Único de Saúde
UNICEF
Fundo das Nações Unidas para a Infância
UNIMONTES
Universidade Estadual de Montes Claros
USP
Universidade de São Paulo
14
RESUMO
Na implantação do Sistema Único de Saúde (SUS), a Estratégia Saúde da Família (ESF)
estabeleceu-se como alternativa para mudança do modelo assistencial, imprimindo uma
nova concepção do processo de saúde-doença. Em sua equipe multiprofissional, surge o
Agente Comunitário de Saúde (ACS), com o papel de realizar a interlocução equipe-
comunidade, unindo dois saberes o popular e o científico - na perspectiva da
organização assistencial de forma interdisciplinar, fundamentada no trabalho em equipe.
Este estudo buscou investigar e descrever o perfil e o papel dos ACS das equipes de
saúde da família da cidade de Montes Claros - MG, a partir de categorias sugeridas em
documento do Minisrio da Saúde (2004), caracterizadas pelas dimensões do saber-ser,
saber-conhecer, saber-fazer e saber-conviver. Através de entrevistas semiestruturadas
com 15 ACS, buscou-se investigar seu processo de trabalho, seu processo de formação e
suas relações interpessoais, segundo a perspectiva dos próprios agentes. A análise dos
dados foi orientada pelo Discurso do Sujeito Coletivo que revelou as seguintes ideias
centrais: (1) Saber Ser: significado do ser, motivação, qualidades/valores, atributos
negativos, aspectos facilitadores / dificultadores, expectativas; (2) Saber Conhecer:
processo de educação permanente em saúde, (des)conhecimento dos princípios do SUS;
(3) Saber Fazer: atribuições, atividades comunitárias, planejamento, receptividade,
situações de risco, avaliação, ética, satisfação; (4) Saber Conviver: trabalho em equipe,
trabalho comunitário, interação equipe-comunidade, estabilidade na profissão. Conclui-se,
assim, que o agente compreende e desenvolve o seu papel de educador e interlocutor
utilizando tecnologias relacionais que favorecem o estabelecimento de vínculo.
Entretanto, a valorização e a demanda por práticas biomédicas desvirtuam as dimenes
de sua práxis, limitando seu papel como marcador de consulta e representante somente
do serviço de saúde e não da comunidade. Essa incompreensão do seu papel de agente
transformador da saúde requer maior investimento para construção social do cuidado
contextualizado e reorganização do modelo assistencial, destacando-se a relevância da
educação permanente.
DESCRITORES: Agente Comunitário de Saúde; Estratégia Saúde da Família; Identidade;
Processo de Trabalho; Educação Permanente.
15
ABSTRACT
The Community Healthcare Agent: their perceptions and interpretations about its profile
and its role in the Family Healthcare Strategy of the city of Montes Claros, MG, Brazil.
In Brazil´s National Health System (SUS), the Family Healthcare Strategy (ESF) was
established as an alternative to the traditional care model, bringing a new conception of
the health and disease. In its multi-professional healthcare teams, the Community Health
Agent (ACS) was added with the role of realizing the interlocution between community and
healthcare team, uniting two points of view - the popular and scientific knowledge. This
study investigates and describes the profile of the ACSs and their role in the family
healthcare teams in the city of Montes Claros-MG, using four categories, suggested in a
document of the Brazilian Ministry of Health (2004) and characterized as: know-being,
know-knowing, know-doing and know-living. Using semi-structured interviews with 15
ACS, their working process, training process and interpersonal relationships, from their
point of view, was investigated. Data analysis was guided by the Collective Subject´s
Discourse (DSC) which revealed the following central ideas: (1) Know-being: being
meaning, motivation, qualities/values, negative attributes, facilitators and difficult issues,
expectations; (2) Know-knowing: the process of permanent education in health, (lack of)
knowledge of the principles of the SUS; (3) Know-doing: tasks, community activities,
planning, reception, situations of risk, assessment, ethics, satisfaction; (4) Know-living:
team work, community work, team interaction, community, stability in the profession. It is
concluded that the agents understand and develop their role as educator and community
partner through relational technologies that favor the establishment of links. However, the
valorization and the demand for biomedical practices, diverts and limits the dimensions of
their practice, reducing their role to a marker of consultations and representative of the
health service only and not of the community. This misunderstanding of its role requires
more investment to build a contextualized social care and reorganization of the care
model, highlighting the importance of permanent education.
KEY WORDS: Community Healthcare Agent, Family Healthcare Strategy, Working
Process; Identity; Permanent Education.
16
SUMÁRIO
Apresentação...........................................................................................
21
Capitulo I
Introdução................................................................................................
27
Objetivos...................................................................................................
33
Objetivo Geral..........................................................................................
33
Objetivos Específicos..............................................................................
33
Capítulo II
Referencial Teórico Histórico ................................................................
35
1- Construção histórica do Sistema Único de Saúde- SUS 35
2- Atenção Primária à Saúde (APS) e a Estratégia Sde da Família 40
3- Estratégia Saúde da Família 43
4- Experiências Internacionais 47
4.1 Médicos dos Pés-Descalços da China 47
4.2 Feldshers da Rússia 49
4.3 Agentes de Saúde da Comunidade em países da África de
língua francesa
49
4.4 Os Agentes de Saúde Comunitários do Sudão 50
4.5 Os Auxiliares Médicos da Tanzânia 50
4.6- Promotores Rurais do Haiti 51
4.7 Promotores Voluntários de Saúde do Peru 52
4.8 Agentes Comunitários de Saúde da Bolívia 52
4.9 Auxiliares de Saúde Comunitária da Jamaica 52
4.10. Agentes Locais de Saúde das Filipinas 53
5- Agente Comunitário de Saúde 53
5.1. Trajetória histórica – do PACS à profissão Agente
Comunitário
53
5.2. Aspectos legais da profissão agente comunitário de saúde 66
17
5.3. Qualificação profissional – histórico e competências 69
5.3.1. PROFAE (Projeto de Profissionalização dos
Trabalhadores da Área de Enfermagem)
69
5.3.2. Curso Técnico de Agente Comunitário-
Competência e Saberes
71
5.3.3- Processo educativo – Curso Introdutório 84
5.3.4- Educação Permanente 86
6- Atribuições do Agente Comunitário de Saúde 91
6.1- Cuidar: a essência do ser 94
6.2- O Saber-Fazer do Agente Comunitário 98
6.3- Conhecimento da Área / Avaliando a Saúde 99
6.3.1- Visita Domiciliar - Instrumento de Aproximão e
Conhecimento
99
6.3.2- Cadastramento das Famílias 106
6.4- Ferramentas do Fazer do Agente - Instrumentos de Coleta
de dados
107
6.5- Diagnóstico de saúde e da comunidade 109
6.5.1- Territorialização – Mapeamento da Comunidade 111
6.6- Planejamento Local 113
6.7- Programão das Atividades 116
6.8- Ações Educativas 116
7- Trabalho em Equipe - Fazer Compartilhado/ Ações Coletivas 121
8- Aspectos Éticos 126
Capítulo III
Materiais e Métodos.................................................................................
132
1- Fundamentação teórico-metodológica 132
2- Cenário do Estudo 136
2.1- Caracterização do Cenário 136
2.1.1 - Aspecto histórico 136
2.1.2 – Localizão 138
2.1.3 - Contexto histórico da sde em Montes Claros 140
18
2.1.4- Sistema Municipal de Saúde 142
3- Sujeitos do Estudo 145
3.1- Dados preliminares dos sujeitos 147
3.2- Critérios de inclusão 148
3.3- Critérios de exclusão 148
3.4- Coleta de Dados 149
3.5.- Instrumentos 151
4- Aspectos Éticos 153
5- Coleta de Dados 154
6- Análise dos Dados 157
6.1- Análise do Discurso do Sujeito Coletivo (DSC) 157
Capítulo IV
Resultados e Discussão..........................................................................
162
1- Caracterização dos Agentes Comunitários de Saúde 162
2- Análise dos Discursos do Sujeito Coletivo Agente Comunitário de
Saúde
173
2.1 - Saber Ser 189
2.2 - Saber Fazer 269
2.3 - Saber Conhecer 322
2.4 - Saber Conviver 332
Capítulo V
Produtos Alcançados I............................................................................
359
Artigo 1 - A expressão da ética pelo agente comunirio de saúde em
seu exercício profissional: um estudo no município de Montes
Claros/MG
359
Artigo 2 A percepção dos agentes comunitários de saúde da cidade
de Montes Claros/MG acerca da formação do agente enquanto auxiliar
de enfermagem
374
19
Produtos Alcançados II...........................................................................
388
Capitulo VI
Considerações Finais..............................................................................
390
Referências Bibliográficas......................................................................
398
Apêndice...................................................................................................
424
Apêndice A – Roteiro de Entrevista Semi-Estruturada
425
Apêndice B – Consentimento Livre e Esclarecido
428
Anexo .......................................................................................................
431
Anexo A – Parecer Consubstanciado
432
20
APRESENTAÇÃO
A trajetória profissional serve de instrumento para a construção do saber, do fazer
e do conviver. Partindo dessas premissas, o presente estudo é fruto das inúmeras
inquietações vivenciadas pela autora.
A primeira experiência ocorreu no município de Montes Claros no ano de 2000,
enquanto residente de enfermagem da Residência Multiprofissional em Saúde da Família,
cuja primeira atividade foi realizar o processo de territorialização para conhecimento da
área e aproximação com a comunidade; posteriormente foi realizada a seleção e o curso
introdurio dos Agentes Comunitários de Saúde - ACS e auxiliares de enfermagem.
Encerrada essa etapa, iniciou-se o funcionamento da equipe multiprofissional em
saúde da família. Assim, no fazer e conviver cotidiano, ocorreu o estreitamento dos laços
de cumplicidade, além da troca de experiências e de compartilhar as alegrias, tristezas,
frustrações. Nesse cenário, surgiram também vários questionamentos sobre esse novo
personagem da saúde o Agente Comunitário de Saúde no aspecto das atividades,
limites, relacionamentos com a equipe e a comunidade.
Em 2001, assumi a função de Preceptora da residência e coordenadora do Pólo
Grande Eldorado, passando a conviver diretamente com 18 Agentes. As vivências
tornaram-se mais intensas, resultando em inúmeras inquietações sobre esse personagem
peculiar que assumiu, a partir de 1994, por meio das políticas de saúde do Ministério da
Saúde, o papel de divulgador e defensor do Sistema Único de Saúde - SUS e do, então
denominado, Programa Saúde da Família – PSF, e representa também sujeito das
mudanças do modelo assistencial vigente, realizando a ponte entre o saber cientifico e o
saber popular.
21
Diante de tantas responsabilidades e atribuições desse ator comunitário, comecei a
questionar quem é esse profissional, qual é o seu saber e o seu fazer, o quê sente, como
é o seu viver e o seu conviver, como lida com tantas atribuições e cobranças, como
realiza a intermediação equipe-comunidade da qual ele faz parte.
No ano de 2003, o ambiente de convivência passou a ser o Pólo da equipe
Tiradentes e Tancredo Neves, onde continuei no papel de preceptora e coordenadora.
Nesse local, percebi que os sentimentos, indagações e vivências do ACS eram os
mesmos do pólo do grande Eldorado; então passei a refletir como bairros e comunidades
tão distintos possuem indagações e vivências tão próximas e semelhantes.
Para endossar essa reflexão, tive a oportunidade, em 2003, de lecionar no
PROFAE - Projeto de Profissionalização dos Trabalhadores da Área de Enfermagem, em
que os discentes eram os Agentes Comunitários de saúde das rias equipes de saúde
da cidade. Tal atividade possibilitou perceber, por meio das discussões em sala de aula e
dos diálogos nos corredores, que as experiências, os sentimentos eram comuns a todos
dessa categoria, reconhecida legalmente como profissão a partir de 2002 com a Lei
Federal 10.507, somente depois de transcorridos 11 anos de existência, desde o icio
do PACS, enquanto trabalhadores da saúde.
No ano de 2004, tive que novamente reiniciar a peregrinação, a equipe escolhida
foi a da Vila Anália, dessa vez com uma diferença, pois agora seria a enfermeira da
equipe, convivendo diretamente com seis ACS em que a partilha de experiências é mais
estreita e mais próxima; e permaneço nessa unidade até a presente data, resultando em
cinco anos na equipe Vila Anália e nove anos de experiência profissional.
A trajetória profissional e pessoal e o convívio com equipes diferentes e suas
experiências, através do contato diário com os mesmos, proporcionou a percepção de
uma multiplicidade de histórias de vida, relatos e desabafos. O contato com a equipe e a
22
própria comunidade permite vivenciar alegrias, vitórias, tristezas e dificuldades
enfrentadas, bem como o não reconhecimento como profissional da saúde. Tais
percepções e experiências forneceram os subsídios para escolher essa temática
instigante como foco de estudo e associado ao grande desejo de contribuir para a
compreensão e construção social dessa categoria profissional que não se limita a ser um
mero coadjuvante do cuidar, e sim um personagem principal na busca do Eldorado,
representado pela consolidação do conceito positivo de saúde.
Na dissertação, busco refletir, construir, retratar e especialmente divulgar quem é a
pessoa, o indivíduo por trás dessa figura emblemática da saúde, que assume tantas
atribuições e responsabilidades; identificar as percepções sobre o seu papel, motivações,
expectativas, desafios, relações estabelecidas com a equipe e principalmente com a
comunidade que representa e onde mora; os aspectos que facilitam e dificultam a
realização de suas atividades; para que, no futuro, possamos compreender o Ser, o
Saber, o Fazer e o Viver dos Agentes Comunitários de Saúde da Cidade de Montes
Claros, contribuindo para a construção do SUS que queremos.
O maior desejo frente a essas indagações é poder dar maior visibilidade a esses
personagens do processo de saúde que ainda não estão fortalecidos enquanto recém
categoria profissional e que na luta diária buscam “um lugar ao sol.
A pesquisa, portanto, discorre sobre a ação do Agente Comunitário no âmbito da
saúde da família, referindo-se, mais especificamente, como os Agentes Comunitários de
Saúde (ACS) percebem a si mesmos enquanto profissionais de saúde e o seu trabalho. O
texto foi dividido em seis capítulos brevemente apresentados a seguir:
No Capítulo I, há uma abordagem histórica onde busco introduzir a temática dos
Agentes Comunitários de Saúde, com a apresentação de alguns pressupostos que
23
orientam este estudo e a compreensão dos problemas aos quais pretendo buscar
respostas:
Quem é o Agente Comunitário de Saúde das Equipes de Saúde da Família da cidade
de Montes Claros - MG?
O que apontam como aspectos facilitadores e dificultadores do seu processo de
trabalho?
Como relatam o seu processo de formação / capacitação?
O que descrevem sobre as suas relações interpessoais nas equipes e com a
comunidade?
Na sequência, apresento a definição dos objetivos propostos descritos na página
33.
O Capítulo II apresenta o referencial teórico que sustentação à proposta de se
estabelecer uma compreensão do processo de trabalho do Agente, atravessando a
história do setor saúde com reflexão sobre a atenção primária.
Logo a seguir, o Capítulo III traz o caminho metodológico, a aproximão do
cenário do estudo, a opção pela pesquisa qualitativa, suas implicações e limites, o
aspecto ético e as técnicas escolhidas para a produção das informões.
O Capítulo IV apresenta os resultados e discussões, por meio da metodologia de
análise do discurso do sujeito coletivo (Lefèvre & Lefèvre, 2005), que emergiram da
análise dos dados, refletindo e interpretando os mesmos à luz da literatura da área. A
partir da descrição do perfil dos Agentes entrevistados, os resultados foram apresentados
através das categorias propostas pelo documento do Ministério da Saúde “Referencial
curricular para curso técnico de Agente Comunitário de Saúde: área profissional”
(BRASIL, 2004), destacando-se o saber ser, saber conhecer, saber fazer e saber
conviver. Decidiu-se apresentar todas as categorias encontradas e suas respectivas
24
ideias centrais. Para o saber ser, encontraram-se 16 categorias, para o saber conhecer, 4
categorias, o saber fazer totalizou 14 categorias e o saber conviver, 8 categorias. Tais
dados são discutidos em relação a estudos semelhantes encontrados na literatura,
permitindo um diálogo profícuo sobre a investigação realizada em Montes Claros - MG.
No Capítulo V, são apresentados os produtos alcançados sobre o estudo,
retratados por meio de artigos científicos.
No Capítulo VI, são apresentadas as considerações finais sobre o estudo e as
perspectivas.
25
CATULO I
___________________________________
A Imortalidade de
que se reveste a
natureza humana
f
az o homem
sempre presente.
Presente pela
amizade que
conquistou;
26
INTRODUÇÃO
O Sistema Único de Saúde (SUS) é a política blica de maior inclusão social e
fruto de vários acontecimentos históricos dentro de um contexto político-social que
conduziu para a maior conquista da sociedade representada pela saúde como direito de
todos e dever do estado. E a Estratégia Saúde da Família (ESF) se apresenta como uma
alternativa para mudança do modelo assistencial, imprimindo uma nova concepção do
processo de saúde-doença, integrada ao ideário do SUS. Tem como objetivo principal a
reorganização da atenção básica com ênfase nas ações de promoção, prevenção,
atenção e reabilitação da saúde. Foi criada em 1994 com o desafio de mudar o paradigma
da doença para a saúde, em que o foco de trabalho passa a ser a saúde, compreendida
de forma mais ampla, vinculada à qualidade de vida (BRASIL, 2007; BRASIL, 2007a).
As equipes multiprofissionais em saúde da família o formadas por, no mínimo,
médico, enfermeira, auxiliar de enfermagem e Agentes Comunitários de saúde, tendo
como ponto de apoio a unidade de saúde da família, que deve ser o primeiro contato do
usuário com o serviço de saúde. São responsáveis pelo acompanhamento de um número
definido de famílias, localizadas em uma área geográfica delimitada e têm como desafio
atuar nas ações de promoção da saúde, prevenção, atenção, reabilitação e manutenção
da saúde, visando a uma maior resolubilidade (BRASIL, 2006).
A ESF deve ser estruturada na gica de atuação participativa, visando a
transformar os indivíduos em sujeitos do próprio processo de melhoria de sua saúde, de
sua família e, por conseguinte, de sua comunidade (MATTEI, TAGLIART, MORETTO,
2005). Surge, então, um grande desafio para todos os profissionais que atuam no
Programa Saúde da Família, que é a realização da integralidade das ações, num terririo
definido, no espaço familiar, privilegiando a atenção primária (SANTOS et al., 2000).
27
Dessa forma, a família passa a ser sujeito do processo, definindo o domicílio
como contexto social e histórico onde se constroem as relações intra e extrafamiliares,
onde se dá a luta pela sobrevivência, pela produção e reprodução e pela melhoria das
condições de vida (BRASIL, 1996).
A Estratégia Saúde da Família reconhece o contexto familiar como o espaço
privilegiado para as ações de saúde e define a atenção primária como o nível do sistema
de saúde que constitui a porta de entrada para todas as necessidades e problemas,
fornecendo atenção sobre a pessoa e sua família e representando o eixo orientador
determinante do trabalho dos demais níveis hierárquicos desse sistema (STARFIELD,
2002).
Isso posto, surge a pessoa do Agente Comunitário de Saúde (ACS) como elo de
interlocução entre as famílias e o serviço de saúde, uma vez que o mesmo faz parte da
comunidade em que trabalha, representando a pedra angular deste processo de
mudanças. O ACS passa a ser o grande responsável pela operacionalização das
atividades desenvolvidas pela equipe, representando a peça essencial na organizão da
assisncia, pois, pertencendo à própria comunidade a que atende, vivencia os problemas
onde mora, conhece as famílias, estabelece um vínculo com as mesmas; representando
um elo entre a equipe e o usuário na construção do cuidado.
Nesse sentido, ele exerce a importante tarefa de consolidar a mudança na
concepção do processo saúde-doença, saindo do pólo de oferta de serviços voltada para
a doença para investir em ações que articulam a saúde como qualidade de vida, tomando
como foco a família no seu espaço sico e social, permitindo intervenções para além das
práticas curativas.
O Agente Comunitário de Saúde representa a síntese de vários segmentos, ele é o
sujeito de mudanças assistenciais, o sujeito da comunidade, o sujeito do sistema de
28
saúde; ele é, acima de tudo, um cidadão que emerge da comunidade e se integra à
equipe de saúde, contribuindo para a construção e a consolidação do novo modelo de
atenção à saúde. É, portanto, um elo cultural, pois faz a ponte entre dois universos
distintos: o do saber científico e o do saber popular, promovendo a interlocução entre os
mesmos, fortalecendo a educação em saúde com vista à melhoria das condições de vida
(BRASIL, 2000).
Ainda que os Agentes Comunitários de Saúde existam desde 1991, a
regulamentação da profissão só ocorreu em 2002, por meio da Lei 10.507, de 10/07/2002,
que caracteriza a profissão pela execução de atividades preventivas e promocionais de
caráter individual e coletivo, realizados através de ações domiciliares ou comunitárias,
desenvolvidas em conformidade com as diretrizes do SUS e supervisionadas pelo gestor
local (BRASIL, 2002).
Essa regulamentação ocorreu após disputa de interesses sobre mercado de
trabalho e legalização do exercício profissional, uma vez que essa categoria incipiente
conta com ummero estimado de 208 mil profissionais em atuação, presente em 5,2 mil
municípios, com cobertura populacional de 58,4%, correspondendo a cerca de 103,5
milhões de pessoas assistidas pelos Agentes, de acordo com o levantamento realizado
em 2005 pelo Departamento de Atenção Básica (DAB) do Ministério da Saúde (BRASIL,
2006a).
Considerando o crescimento da Estratégia Saúde da Família e, por consequência,
a ampliação do mercado de trabalho para o novo profissional de saúde - o Agente
Comunitário de Saúde, faz-se necessário refletir sobre a identidade desse sujeito e seu
processo de trabalho.
O Agente Comunitário de Saúde que exerce suas atividades no município de
Montes Claros, apesar de estar em número significativo, tem sido esquecido pelos
29
pesquisadores da saúde coletiva, quando comparamos a imensidão de experiências e
informação que o extraídas da estratégia saúde da família. Essa tendência também é
visualizada no contexto nacional, pois, pela busca de publicações nos bancos de dados
da saúde, constata-se que o número de artigos referentes a esse profissional é mínimo se
comparado a outros temas da saúde da família, como avaliação do serviço, planejamento,
impacto das ações e diagstico situacional de saúde.
Faz-se necessário e urgente, portanto, conhecer esse sujeito que assume diversas
atividades fundamentais para a consolidação da mudança de paradigma e reorganização
da atenção básica. Por ser uma peça chave, torna-se indispensável a sua caracterização
e a do seu universo de trabalho.
Diante desse papel, é importante investigar a caracterização do Agente
Comunitário de Saúde e do seu processo de trabalho nas Equipes de Saúde da Família
da cidade de Montes Claros - MG, onde o problema posto para investigação parte de sua
própria percepção sobre a profissão e seu papel guiado pelas seguintes questões
norteadoras:
Quem é o Agente Comunitário de Saúde das Equipes de Saúde da Família da cidade
de Montes Claros - MG?
O que apontam como aspectos facilitadores e dificultadores do seu processo de
trabalho?
Como relatam o seu processo de formação / capacitação?
O que descrevem sobre suas relações interpessoais nas equipes e com a
comunidade?
A motivação para a escolha do objeto de estudo baseou-se na necessidade de
conhecer quem é a pessoa, o indiduo por trás desse profissional da saúde que assume
30
tantas atribuições e responsabilidades; identificar as percepções sobre o seu papel,
motivações, expectativas, desafios, relações estabelecidas com a equipe e principalmente
com a comunidade que representa e onde mora; os aspectos que facilitam e dificultam a
realização de suas atividades e repercussões em sua própria vida e na sua saúde.
A escolha do objeto de estudo está entrelaçada à minha formação e experiência
profissional em enfermagem, pois, através do contato diário com os Agentes, percebi uma
multiplicidade de histórias de vida, relatos e desabafos sobre o contato com a equipe e a
própria comunidade, as alegrias, as vitórias, as tristezas e as dificuldades enfrentadas, a
sobrecarga e o não reconhecimento como profissional da saúde. Tais constatações
forneceram os subsídios para escolher esse tema instigante como foco de estudo e o
grande desejo de contribuir para a compreensão e construção social dessa categoria
profissional, que não se limita a ser um mero coadjuvante do cuidar, e sim um
personagem principal na busca da consolidação do conceito positivo de saúde.
Assim, o estudo busca: (1) refletir, construir, retratar e, especialmente, divulgar
quem é a pessoa, o indivíduo por trás desse profissional emblemático da saúde, que
assume tantas atribuições e responsabilidades; (2) identificar as percepções sobre o seu
papel, motivações, expectativas, desafios, relações estabelecidas com a equipe e
principalmente com a comunidade que representa e onde mora; (3) os aspectos que
facilitam e dificultam a realizão de suas atividades, para que no futuro possamos
compreender o Ser, o Saber, o Fazer e o Conviver dos Agentes Comunitários de Saúde
da Cidade de Montes Claros (BRASIL, 2004). Esse estudo poderá contribuir para a
construção do SUS que queremos, poderá fortalecer esses personagens por vezes
marginalizados do processo de saúde, que ainda não se consolidaram enquanto recém
categoria profissional e que, na luta diária, buscam “um lugar ao sol”. Tal estudo pode
somar-se a outros que m sido orientados na mesma direção, como apontam Giffin e
31
Shiraiwa (1989), ao discutir o Agente Comunitário de Saúde na comunidade de
Manguinhos, Rio de Janeiro; e Esnola e Costa (2006), que avaliaram o grau de
satisfação e descontentamento de Agentes de Mossoró; DalPoz (2002), Lunardelo (2004),
Silva e Dalmaso (2002), Fortes e Spinetti (2006), Marques e Padilha (2004), Levi, Matos e
Tomita (2004), Ferraz e Aerts (2005).
A realização deste estudo visa a contribuir com conhecimentos e informações
significativas para a elaboração de metodologias que instrumentalizem os profissionais de
vel superior da equipe mínima, com maior participação dos enfermeiros no aspecto
relacionado à coordenação da equipe e supervisão do processo de trabalho do Agente.
Além disso, objetiva subsidiar as políticas blicas de saúde e as estratégias de geração
de impacto positivo na saúde.
32
OBJETIVOS
Objetivo Geral
Investigar e descrever o perfil e o papel do Agente Comunitário de Saúde das Equipes
de Saúde da Família da cidade de Montes Claros MG, partindo de sua percepção e
das dimensões do saber ser, do saber conhecer, do saber fazer e do saber conviver -
categorias sugeridas pelo documento do Ministério da Saúde “Referencial curricular
para curso técnico de Agente Comunitário de Saúde: área profissional.” (BRASIL,
2004).
Objetivos Específicos
Identificar os aspectos facilitadores e dificultadores do processo de trabalho do Agente
Comunitário de Saúde.
Investigar a percepção do Agente sobre o seu fazer cotidiano.
Investigar o processo de formão / capacitação do Agente Comunitário de Saúde.
Investigar as relações interpessoais do Agente nas equipes e com a comunidade.
33
CATULO II
___________________________________
“Para ver mundo
num grão de areia
E um céu numa
flor silvestre,
Segure o infinito
34
REFERENCIAL TEÓRICO HISTÓRICO
1- CONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE - SUS
O Sistema Único de Saúde (SUS) representa a maior conquista do povo brasileiro
quando se trata de cidadania representada pela saúde como direito de todos e dever do
estado, pois, a partir da efetivação desse sistema de saúde, ocorreu a inclusão social
consolidada pela universalidade; a sua construção foi fruto de rios acontecimentos
históricos dentro de um contexto político-social.
Do século XX aa metade dos anos de 1960, predominou o modelo assistencial
sanitarista campanhista, que corresponde à saúde pública tradicional com ões
centradas em campanhas e programas especiais/verticais, como o controle da
tuberculose e da hanseníase, catarata, saúde da criança, com caráter geralmente
temporário do tipo bombeiro objetivando apagar incêndio. Ou seja, combater as
epidemias; evoluindo posteriormente para o modelo médico-assistencial-privatista, que
predominou até a década de 1980, tamm chamado de modelo hegemônico-
hospitalocêntrico voltado para o atendimento curativo centrado no hospital, na doença, no
atendimento clínico individual, em equipamentos, exames e medicamentos (PAIN, 1999;
BRASIL, 2007).
Os dois modelos não contemplavam a totalidade da situação de saúde,
concentrando sua atenção no controle de certos agravos ou em determinados grupos em
risco de adoecer ou morrer, e nas pessoas que procuravam o serviço por demanda
espontânea em que o indivíduo na dependência do seu grau de conhecimentos e/ou
sofrimento procura as instituições de saúde (PAIN, 1999; BRASIL, 2007).
35
O modelo médico-privatista contribuiu muito na conduta do trabalhador que,
envolvido pelo estilo médico-centrado, transformou o usuário em paciente, objeto
depositário de problemas de saúde, tratado de forma impessoal e descompromissada;
assim a relação profissional-usuário foi coisificada por meio do empobrecimento da visão
dos problemas, que passou a ser considerada em partes e não na sua universalidade
(MERHY, 1997).
Como consequência dessa postura profissional, os usuários coisificados passaram
a associar boa assistência ao uso de tecnologias duras, com exames cada vez mais
complexos e medicamentos, ao mesmo tempo desvalorizando as tecnologias leves
centradas nos atos humanos, como a escuta, o acolhimento e as relações interpessoais;
em que a insatisfação está associada ao não atendimento de suas solicitações referentes
a essas tecnologias duras, pois a qualidade da assistência prestada passou a estar
relacionada ao acesso a consultas médicas, exames, consultas especializadas e
medicamentos (MENEGHEL et al., 2007).
No período que compreendeu as cadas de 1970 e 1980, o modelo de saúde
priorizou a assistência curativo-individual-hospitalocêntrica, passando a não atender as
necessidades da população de forma coletiva associada ao aumento dos gastos e
diminuição da arrecadação e incapacidade de atender ao grande número de indigentes
excluídos do sistema de saúde. No mundo, começou a ocorrer um movimento em prol da
saúde enquanto direito fundamental do homem e a Atenção Primária à Saúde como meio
para atingir esse objetivo. Esse momento histórico foi eternizado pela Conferência
Internacional sobre a Atenção Primária à Saúde realizada em 1978 na cidade de Alma-
Ata, localizada no Cazaquiso (BRASIL, 2007; BRASIL, 2007a).
Enquanto isso, no Brasil, ocorreu dois movimentos o político e o sanitário que
estavam interligados buscando a garantia da cidadania com ênfase na sde com
36
enfoque não mais individual e sim coletivo, contemplando o processo saúde-doença no
aspecto positivo, promocional e preventivo na construção da medicina comunitária,
constituindo a base político-ideológica da reforma sanitária (BRASIL, 2007; BRASIL,
2007a).
O movimento da reforma sanitária teve a participação de intelectuais, políticos e
profissionais da saúde que buscavam a operacionalização de diretrizes transformadoras
do sistema de saúde. Nesse sentido, houve vários projetos, como o Projeto Montes
Claros (MOC), o PIASS (Programa de Interiorização das Ações de Saúde), e algumas
ões governamentais, como as AIS (Ações Integradas de Saúde) e o SUDS (Sistema
Unificado e Descentralizado de Saúde) que contribuíram para a consolidação e criação de
um Sistema Único de Saúde (BRASIL, 2007; BRASIL, 2007a).
O PIASS objetivava a interiorização das ações de saúde e saneamento, que
privilegiassem a região Nordeste e as regiões desprivilegiadas de assistência,
contribuindo para o deslocamento dos profissionais de nível superior para o interior,
unindo uma abordagem médico-social ao pensamento sanitarista desenvolvimentista com
priorização da atenção primária (BRASIL, 2007; BRASIL, 2007a).
Posteriormente, as AIS surgiram como programa dentro do CONASP (Conselho
Consultivo de Administração da Saúde Previdenciária), trazendo avanços significativos no
fortalecimento da rede básica e articulação dos serviços públicos com a contratação de
recursos humanos com prenúncio do princípio da integralidade (BRASIL, 2007; BRASIL,
2007a).
O marco da democratização da sde foi a VIII Conferência Nacional de Saúde em
1986, que contou com a participação dos vários segmentos da sociedade e definiu no
relatório final três grandes referenciais que serviram de base para o arcabouço jurídico
por meio da Constituição Federal; que são (1) saúde como direito de todos e dever do
37
estado, (2) saúde contemplada como resultante de fatores determinantes e
condicionantes, tais como alimentação, educação, habitação, renda e (3) a instituição de
um Sistema Único de Saúde fundamentado pelos princípios de universalidade,
integralidade, descentralização e participação popular (BRASIL, 2007; BRASIL, 2007a).
Em 1987, foi criado o SUDS, que serviu como ponte para o Sistema Único de
Saúde (SUS), ao ser contemporâneo das discussões na Assembléia Nacional
Constituinte. Com a aprovação da Constituição Federal de 1988, houve a criação do SUS,
reconhecendo saúde como direito e integrando as ações e serviços de saúde de todo
terririo nacional, tais serviços deveriam ser organizados em rede regionalizada e em
hierarquia, fundamentada nas diretrizes e princípios de descentralização com comando
único, integralidade, priorizando a prevenção sem prejuízo da assisncia, equidade e da
participação popular (BRASIL, 2007; BRASIL, 2007; BRASIL, 2001).
A organização do SUS encontra-se fundamentada em princípios doutrinários ou
filosóficos e em princípios organizativos, que estão a seguir apresentados: (BRASIL,
2007; BRASIL, 2007a; BRASIL, 2001).
Universalidade - garantia de saúde enquanto direito do cidadão e dever do Estado que
pro as condições indispensáveis ao seu pleno exercício.
Integralidade - conjunto articulado e contínuo de ações e serviços de saúde tanto no
âmbito preventivo quanto curativo, individual ou coletivo em todos os níveis de
complexidade que a pessoa precisa, sendo compreendida como um ser em toda a sua
totalidade.
Equidade - tratar de forma desigual os desiguais, ou seja, pessoas com necessidades
diferentes precisam de atenção diferente, contemplando uma discriminação positiva.
Regionalização e hierarquização - a assistência à saúde prestada por meio de níveis
crescentes de complexidade de forma articulada com fluxo de refencia e
38
contrarreferência circunscrita à determinada área geográfica, devendo o serviço ser
prestado o mais próximo possível da residência do usuário.
Descentralização e comando único - redistribuir o poder e a responsabilidade nas
esferas de governo, pois quanto mais perto da população as deliberações forem
tomadas, maior a chance de dar certo; sempre levando em consideração a autonomia
de cada esfera do governo e a soberana de suas decisões.
Participação Popular - garantir a democratização das discussões e decisões em saúde
por meio das instâncias colegiadas - conselhos e conferências de saúde que têm
como função formular estratégias, controlar e avaliar a execução da política de saúde.
O Sistema Único de Saúde passa a ser compreendido como a noção de sistema
que diz respeito ao conjunto de várias instituições dos três níveis de governo e tamm
do setor privado em caráter complementar; o termo Único significa que todas as
instituições prestadoras devem ter a mesma doutrina e a mesma forma de organização
em todo o país onde a saúde é concebida como qualidade de vida e direito à vida.
(BRASIL, 2001)
Mesmo com a criação do SUS pela Constituição Federal, era necessário
regulamenta-lo, formando o arcabouço jurídico por meio da Lei Orgânica da Saúde (LOS)
8.080/90, que dispõe sobre as condições dos níveis de prevenção (promoção, proteção e
recuperação da saúde) e da organizão e funcionamento dos serviços de saúde; e a Lei
8142/90, que regulamenta duas questões fundamentais: a participação popular e as
transferências intergovernamentais de recursos. Tamm foram instituídas as Normas
Operacionais Básicas (NOB), que definiram as competências das esferas de governo e o
papel de gestor juntamente com a habilitação dos municípios e estados no total de quatro
NOB/91, NOB/92, NOB/93 e NOB/96. Posteriormente, houve a publicação da Norma
39
Operacional da Assistência à Saúde (NOAS) que estabeleceu a regionalização como
estratégia de hierarquização dos serviços em busca de maior equidade combatendo as
iniquidades regionais (BRASIL, 2007; BRASIL, 2007a; BRASIL, 2001).
2- ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE (APS) E A ESTRATÉGIA SAÚDE DA FAMÍLIA
A Atenção Primária à Saúde (APS) teve visibilidade no cenário da saúde
internacional através da Conferência Internacional sobre Cuidados Primários de Saúde
realizada em Alma Ata no período de 06 a 12 de setembro de 1978. A Conferência foi
organizada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e pelo Fundo das Nações Unidas
para a Infância (UNICEF), quando se propôs que os governos deveriam urgentemente
promover ões no campo da saúde e do desenvolvimento com ênfase nos cuidados
primários (BRASIL, 2007; MENDES, 2002).
O documento do Ministério da Saúde (BRASIL, 2007b) afirma que essa
conferência, também conhecida como Alma-Ata, enfatiza três aspectos:
I) A saúde compreendida como completo bem-estar físico, mental e social, e não
meramente a ausência de doença, devendo ser constituída um direito fundamental. Além
disso, os altos veis de saúde devem ser uma meta social mundial a ser perseguida,
requerendo as ações intersetoriais para alcançá-la.
II) A grande desigualdade do estado de saúde dos povos, em especial entre os pses
desenvolvidos e em desenvolvimento, assim como dentro dos países, é inaceitável
política, social e economicamente, devendo constituir-se um objeto da preocupação
comum de todos os países.
III) O desenvolvimento econômico e social é imprescindível para a realização da meta de
Saúde para Todos no Ano 2000 e para a redução do fosso existente entre o estado de
40
saúde dos países em desenvolvimento e dos desenvolvidos. As ações de promoção e
proteção da saúde dos povos é o caminho encontrado para o contínuo desenvolvimento
econômico e social, contribuindo para a melhoria da qualidade de vida e para a paz
mundial.
A conferência definiu a educação em saúde, o saneamento do meio ambiente e o
processamento dos alimentos e água, assistência materno-infantil com ênfase no
planejamento familiar e imunização, prevenção e controle de doenças endêmicas, projeto
terapêutico adequado às doenças, com fornecimento de medicamentos, promoção da
alimentação saudável e valorização da medicina tradicional como os elementos
fundamentais para a efetivação da atenção primária (STARFIELD, 2002).
Essa declaração norteou as ões em vários países, que passaram a priorizar a
Atenção Primária à Saúde que foi definida pela OMS em 1978 (Starfield; 2002, p. 30)
como a seguir descrito:
A ateão essencial à saúde baseada em tecnologia e métodos práticos,
cientificamente comprovados e socialmente aceitáveis tornados
universalmente acessíveis a indivíduos e famílias na comunidade por
meios aceitáveis para eles e a um custo que tanto a comunidade como o
país possa arcar em cada estágio de seu desenvolvimento, um espírito de
autoconfiaa e autodeterminação. É parte integral do sistema de saúde
do país, do qual é função central, sendo o enfoque principal do
desenvolvimento social e econômico global da comunidade. É o primeiro
nível de contato dos indivíduos, das famílias e comunidade com o sistema
nacional de saúde, levando a atenção à saúde o mais próximo possível do
local onde as pessoas vivem e trabalham, constituindo o primeiro
elemento de um processo de atenção continuada à saúde.
Starfield (2002) compreende a APS como sendo o nível do sistema de saúde que
representa a porta de entrada para todas as novas necessidades e novos problemas com
atenção à pessoa e não à doença no decorrer do tempo organizando, coordenando e
racionalizando o uso adequado dos recursos tanto básicos quando especializados
41
necessários para o enfrentamento de todas as condições apresentadas pela pessoa,
família e comunidade.
A APS, segundo Starfield (2002), deve ser orientada pelos seguintes atributos:
Primeiro contato - deve constituir a porta de entrada para os serviços de saúde,
favorecendo a acessibilidade e o uso oportuno do serviço a cada novo problema ou
necessidade com vista a alcançar os melhores resultados possíveis em saúde.
Longitudinalidade - significa a existência de uma fonte regular de atenção com uma
relação pessoal de longa duração entre profissionais de saúde e usuários em suas
Unidades de Saúde, independente do problema de saúde ou até mesmo da existência
de algum problema. Esse atributo proporciona o aumento do vínculo com equipe de
sde e o adequado manejo cnico aos problemas de saúde.
Integralidade - exige o reconhecimento das necessidades de saúde da população e os
recursos para abordá-las, seja direta, na unidade de saúde, ou indiretamente, por meio
do acompanhamento do usuário em outros pontos de atenção.
Coordenação - refere-se à continuidade da assistência por meio da disponibilidade de
informação a respeito dos problemas de sde e dos serviços prestados nos diversos
pontos de atenção, em que a APS exerce o papel de organizador das necessidade de
sde da população; sem a coordenação, a longitudinalidade perde a sua
contribuição.
Mendes (2002) afirma que o princípio da coordenação, conhecido como
continuidade, viabiliza a função organizativa da APS. Porém, existem entraves para a
efetivação desse principio, já que o encaminhamento das equipes para o nível secundário
não garante o atendimento.
42
Além disso, no Brasil, foram acrescentados dois atributos, que é a centralização na
família com o olhar da equipe sobre os problemas de saúde dos membros da família por
meio de uma abordagem familiar e intervenções personalizadas ao longo do tempo; e
tamm a orientação comunitária por meio da definição e caracterização da comunidade,
tendo o Agente Comunitário como estimulador dessa orientação, possibilitando o aumento
do vínculo e o envolvimento da comunidade nas decisões de saúde, exercendo, assim, o
controle social (MINAS GERAIS, 2007; BRASIL, 2007b).
A atenção primária foi conceituada como atenção básica à saúde e tem a
Estratégia Saúde da Família como o seu mecanismo de reorganização e regulação.
3- ESTRATÉGIA SAÚDE DA FAMÍLIA (ESF)
A crise da saúde brasileira tem estimulado a busca de alternativas para promover
a mudança do atual modelo assistencial, hospitalocêntrico, centrado na doença, no
paradigma flexneriano
1
, na prática sanitária da atenção médica, altamente individualista e
especializada, que demonstra ser incapaz de atender as necessidades de saúde da
população (MENDES, 1999).
Esse modelo assistencial tem gerado um impacto sobre os problemas de saúde
que o têm sido proporcionais ao investimento feito, os resultados se distribuem
desigualmente entre as classes sociais, e a população atendida expressa um alto grau de
insatisfação com a qualidade da assistência recebida (RAGGIO; GIACOMINI, 1996).
As mudanças nos rumos das políticas de saúde requerem a adoção de novos
modelos assistenciais que invertam o foco da atenção, priorizando a promoção da saúde
e a prevenção de doenças (PAIM, 1999).
1
Flexneriano paradigma consolidado pelas recomendações do Relatório Flexner, publicado em 1910, e expressa-se
por meio de um conjunto de elementos que coexistem, complementam e se potenciam: o mecanismo, o biologismo, o
individualismo, a especialização, a tecnificação e o curativismo.
43
Esse novo modelo assistencial deve possuir duas metas principais, descritas por
Starfield (2002, p.19) como:
A primeira é otimizar a saúde da população por meio do emprego do
estado mais avançado do conhecimento sobre a causa das enfermidades,
manejo das doenças e maximização da saúde. A segunda meta, e
igualmente importante, é minimizar as disparidades entre subgrupos
populacionais, de modo que determinados grupos não estejam em
desvantagem sistemática em relação ao seu acesso aos serviços de
saúde e ao alcance de um ótimo nível de saúde.
O Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS), criado em 1991, foi uma
estratégia abraçada pelo Ministério da Saúde, que serviu de alicerce para a consolidação
dos princípios organizativos do Sistema Único de Saúde (SUS) descentralização com
comando único, atendimento integral com prioridade para as atividades preventivas sem
prejuízo dos serviços assistenciais e participação popular. O PACS serviu de sustentação
para a implantação da Estratégia Saúde da Família (BRASIL, 2001a).
Implantado a partir de 1994, a Estratégia Saúde da Família, conforme escreve
Sousa (2000, p.25), propõe adotar:
[...] uma nova dinâmica para a estruturação dos serviços de saúde, bem
como para sua relação com a comunidade e entre os diversos veis de
complexidade assistencial. Assume o compromisso de prestar assistência
universal, integral, equânime, contínua e, acima de tudo, resolutiva à
população, na unidade de saúde e no domicílio, sempre de acordo com as
suas reais necessidades, identificando os fatores de risco aos quais ela
está exposta e neles intervindo de forma apropriada.
A ESF levará o serviço de saúde vigente a escolher um outro paradigma para a
organização do sistema local de saúde, que contemple os princípios e diretrizes do SUS,
como determina a Constituição Federal de 1988 e a Lei Orgânica da Saúde de 1990
(BRASIL, 2001a).
44
Dessa forma, a ESF se apresenta como a principal abordagem de organização da
atenção básica à saúde, fortalecendo as ações de promoção da saúde, prevenção de
doenças, atenção e reabilitação da saúde de forma contínua e integral (BRASIL, 2001a).
A Saúde da Família é entendida como estratégia de reorganização da prática
assistencial com uma ideia renovadora, com caráter substitutivo ao modelo tradicional
centrado na cura de doenças. É estruturada com base no fortalecimento da atenção à
saúde com ênfase na integralidade da assistência centrada na família, entendida e
percebida a partir de seu ambiente físico e social, o que possibilita à equipe de saúde
uma compreensão ampliada do processo saúde-doea e da necessidade de intervenção
que vai além das práticas curativas, tendo como foco principal a prevenção das doenças
(ALVES, 2005).
A organização do sistema de saúde baseado na atenção básica ou atenção
primária influencia diretamente no perfil de morbi-mortalidade da população, resultando na
redução do número de recém-nascidos com baixo peso, diminuição da mortalidade infantil
e da menor perda de anos de vida para qualquer causa, elevando, assim, a expectativa
de vida com qualidade para todos, em especial para o idoso. Demonstra, dessa forma, o
grande impacto positivo na população quando o enfoque das ações passa a ser para as
pessoas e suas famílias (BRASIL, 2008).
Nesse sentido, a família passa a ser sujeito do processo, com a definição do
domicílio como contexto social e histórico onde se constroem as relações intra e
extrafamiliares, onde se a luta pela sobrevivência, pela produção e reprodão e pela
melhoria das condições de vida (BRASIL, 1996).
Os seres humanos organizam-se de forma social através da construção de uma
rede de laços ou de relações interpessoais que originam as famílias, os grupos e a
comunidade. A construção desses laços fundamenta-se no fato de que os seres humanos
45
necessitam uns dos outros desde o momento do nascimento, por meio da realização de
cuidados representados por um suporte social que gira em torno de dois aspectos: (1)
estabelecimento de vínculos interpessoais, grupais ou comunitários que fornecem
proteção e apoio; (2) consequência desses vínculos na integridade sica e psicológica do
ser. Esse suporte social promove padrões duradouros de vínculos, permitindo a
manutenção da integridade física e psicológica, reduzindo o stress e promovendo bem-
estar (CAMPOS, 2005).
Esse suporte social caracteriza-se por relações interpessoais acolhedoras e
geradores de sentimentos e reconhecimento, sendo oferecida pela família, comunidade
ou serviço de saúde, através de relacionamentos compostos por elementos fundamentais
que estão no âmbito emocional, valorativo, comunicacional, informativo e instrumental que
ajudam o enfrentamento de situações estressantes e a redução dos efeitos nocivos de
doenças (CAMPOS, 2005).
As famílias, diante de problemas de sde, articulam mecanismos de
enfrentamento baseados nas suas crenças e valores culturalmente instalados; trocam
experiências, acumulam saberes, habilidades, hábitos e costumes; e quando procuram
assisncia na unidade de saúde, esta apresenta, na maioria das vezes, o único
equipamento social disponível e acessível, seja pela proximidade ou pelo vínculo
(BASTOS; TRAD, 1998; PEDROSA; PEREIRA, 2007).
Apesar de utilizarem os serviços oferecidos pela equipe, os usuários têm
dificuldade de compreender o funcionamento e as diretrizes da unidade de saúde. Apesar
de a maioria acolher bem os profissionais, existe resistência de uma minoria que reage
contrariamente ao processo de inversão do modelo assistencial (TRAD et al., 2002).
A inserção da família como Agente ativo nos serviços de saúde, em especial na
atenção primaria, torna necessário reconhecer que saber sendo transmitido ao longo
46
das gerações. Assim, a construção de práticas de saúde no contexto doméstico pode
resultar na aceitabilidade e na credibilidade social dos serviços de saúde (BASTOS;
TRAD, 1998).
A estratégia saúde da família reconhece o contexto familiar como o espaço
privilegiado para as ações de saúde e define a atenção primária como o nível do sistema
de saúde que constitui a porta de entrada para todas as necessidades e problemas,
fornecendo atenção sobre a pessoa e sua família e representando o eixo orientador
determinante do trabalho dos demais níveis hierárquicos desse sistema (STARFIELD,
2002).
Isto posto, surge a figura do Agente Comunitário de Saúde como elo de
interlocução entre as famílias e o serviço de saúde, uma vez que o mesmo faz parte da
comunidade em que trabalha; a utilizão de recursos humanos da própria comunidade
não é exclusiva do sistema de saúde brasileiro, uma vez que existem experiências
internacionais em que membros da população mediam a comunicação entre a própria
comunidade e os serviços de saúde na implementação de ações de saúde.
4- EXPERIÊNCIAS INTERNACIONAIS
Os diversos sistemas de serviços de saúde do mundo utilizam conhecimentos e
experiências de praticas relacionadas a cuidados primários de saúde por meio de
diversos programas (SANTOS, 2006).
4.1- Médicos dos Pés-Descalços da China
Os cidadãos chineses não tinham acesso aos cuidados de saúde sejam eles
prestados pela medicina moderna ou pela medicina tradicional; dessa forma em muitas
47
localidades, a assistência à sde era executada por um morador com habilidades para a
acupuntura e para o manejo e manipulação de ervas; esse conhecimento era repassado
por tradição e a forma de aprendizado era de maneira prática e durante muitos anos esse
era o único cuidado de saúde que os chineses tinham acesso (SANTOS, 2006).
Com a revolução chinesa e a definição da agricultura como pilar da economia
ocorreu a priorização da reorganizão dos serviços de saúde publica do campo que foi
posto em prática por meio da formão de equipes itinerantes constituídas por médicos
recém-formados, médicos experientes e diferentes especialistas para assistência
preventiva e curativa aliado a capacitação de um corpo auxiliar médico selecionados entre
os moradores de uma região aliado a formação de sanitaristas voluntários que eram
lavradores treinados em primeiros socorros para agir perante pequenos acidentes.
(SANTOS, 2006).
O auxiliar médico realizava assistência terapêutica e preventiva, sem abandonar o
trabalho produtivo na lavoura possuindo assim a intimidade com os moradores por meio
do estabelecimento de um vinculo de confiança, pois, continuam sendo um lavrador igual
aos demais membros da coletividade por essas características ficaram conhecidos como
médicos dos s-descalços com os pés e raízes enraizados na realidade local
(SANTOS, 2006).
Esse sistema de médicos-descalços representa uma referência de saúde através
da utilização de auxiliares escolhidos na comunidade em que moram e trabalham que,
após treinamentos são habilitados para dispensa de tratamentos e medicamentos,
realização de intervenções e promoção da saúde individual, coletiva e ambiental
(SANTOS, 2006).
48
4.2- Feldshers da Rússia
Na Rússia, os auxiliares são denominados por feldshers e desempenham papeis
distintos de acordo com a localidade, nos centros urbanos realizam função similar a uma
enfermeira-chefe qualificada em área rural, os serviços de saúde o entregues aos
cuidados de feldshers e parteiras que graças a dedicação e trabalho adquiriram confiança
da população desempenhando papel complementar a ão médica; atualmente às
feldshers se especializaram como auxiliares de saúde pública, de laboratório e nos
serviços de emergência (SANTOS, 2006).
4.3- Agentes de Saúde da Comunidade em países da África de língua francesa
A política de saúde dos países africanos de língua francesa pode ser dividida em
dois períodos antes e depois da Conferencia de Alma-Ata em 1978 que tinha como meta
Saúde para Todos no Ano 2000; o sistema de saúde anterior a conferencia estava
centrado no modelo hospitalocêntrico e curativista com priorização da área urbana
mostrando-se ineficaz, ineficiente e impróprio para atingir a meta de desenvolvimento
sanitário pactuada em Alma-Ata (SANTOS, 2006).
Diante disso, ocorreram modificações no sistema de saúde que passou a ser
centrado na atenção primária, na educação sanitária, na responsabilidade e no
compromisso comunitário; a implementação desse modelo foi operacionalizada pelos
agentes da comunidade recrutados em povoados e aldeias representando a primeira linha
do sistema de saúde, que depararam frequentemente com precárias condições sócio-
econômicas (SANTOS, 2006).
49
4.4- Os Agentes de Saúde Comunitários do Sudão
Em 1974, o Sudão reconheceu ser possível prestar serviços médicos rurais com
participação da comunidade, para a implementação desses serviços agentes de saúde da
comunidade formam o pilar com a execução de suas atividades de duas formas, como
nômades ou com funções mais sedentárias fazendo parte de uma rede de unidades
primarias. A rede de unidades é formando por cinco ou seis unidades de saúde primária
vinculadas a um dispensário - um assistente médico; cada unidade serve a uma
população de aproximadamente 4000 pessoas (SANTOS, 2006).
Os agentes de saúde desempenham o eixo central da atenção primária pois tem a
possibilidade de espalhar nas mais remotas regiões, que fazem parte dessas
comunidades e tamm desenvolvem atividades de educadores sanitários e também
ões que consistem na administração de medicamentos para tratamento de doenças
simples, encaminhamento de casos complexos para a rede associado à utilização de
conhecimentos empíricos acerca do uso medicinal de plantas (SANTOS, 2006).
4.5- Auxiliares Médicos da Tanzânia
A Tanzânia apresenta como a principal causa de morbi-mortalidade às doenças
infecto-parasitárias aliadas as desigualdades sociais, ao baixo nível sócio-econômico da
população e as iniqüidades de acesso a saúde; para reverter essa situação o caminho foi
investir nos cuidados primários de saúde e utilização de pessoal de categoria auxiliar, que
o selecionados pelos moradores e devem completar sete anos de escola primária e
o treinados em um hospital por período compreendido entre três a seis meses
(SANTOS, 2006).
O treinamento capacita os auxiliares médicos a tratarem de doenças comuns,
fornecerem atendimento de urgência para problemas sérios e colaborar na prevenção de
50
doenças comuns; organizam a educação em saúde e visitas domiciliares (SANTOS,
2006).
4.6- Promotores Rurais do Haiti
Em 1978, surgiu a caracterização da figura do promotor rural de saúde que devia
agregar pré-requisitos para atuação como residir na zona rural; ser capacitado para
prestar serviços básicos de saúde e servir de vínculo entre a comunidade e o sistema
médico formal e também deviam ter um perfil que incluía: ser do sexo feminino, ter idade
de 15 a 45 anos, capacidade para leitura e escrita, participação ativa nos problemas da
comunidade e residência no local (SANTOS, 2006).
A indicação das candidatas que atendessem o perfil era realizada pelo conselho
comunitário por meio de seleção feita pelo subcoordenador local do programa de saúde
pública, membro daquela mesma comunidade e promotor de saúde. Após a seleção, os
candidatos passavam por capacitação, na primeira etapa com noções de anatomia,
fisiologia, exame físico, infra-estrutura social, saneamento ambiental, nutrição, saúde
materno-infantil, planejamento familiar, diabetes, tuberculose, primeiros socorros e
diagnóstico coletivo, por meio de inquéritos adequados a realidade local; na segunda
etapa, reforçavam-se as ações de prevenção, de relacionamento no trabalho e as
habilidades para resolução de problemas, envolvendo atividades sanitárias e comunitárias
(SANTOS, 2006).
Após a capacitação, o agente de sde realizava a atualização dos registros
demográficos, educação em saúde, medidas dos sinais vitais administração de
medicamentos, vitaminas e vacinas, tratamento de transtornos além do dialogo constante
com o saber popular compreendidos na dinâmica cultural do local (SANTOS, 2006).
51
4.7- Promotores Voluntários de Saúde do Peru
Os promotores voluntários tinham que atender alguns critérios como ser maior de
18 anos, leitura, escrita e motivação para o trabalho; devendo desenvolver atividades de
estimulação da população a adotar soluções coletivas para os problemas de sde,
incentivo as atividades preventivas, prestar os primeiros auxílios, tratar as enfermidades
comuns e encaminhar, se necessário, os usuários aos centros de saúde auxiliando os
serviços de saúde na melhoria da qualidade de vida (SANTOS, 2006).
4.8- Agentes Comunitários de Saúde da Bolívia
Na Bolívia, em 1983 a ão de agentes treinados trouxe melhorias na situação
sanitária com diminuição da mortalidade infantil e aumento da esperança de vida; esses
agentes eram eleitos na sua própria comunidade, de forma voluntária o recebendo
nenhuma remuneração sendo supervisionados por médicos favoráveis ao programa
realizando assim a mediação entre a medicina tradicional e a moderna alem de
compartilhar crenças e valores com os vizinhos (SANTOS, 2006).
4.9- Auxiliares de Saúde Comunitária da Jamaica
O serviço de saúde jamaicano incorporou os auxiliares de saúde comunitária nas
equipes de atenção primária trabalhando junto com as enfermeiras, vinculando
comunidade e serviços de saúde com o objetivo de interviessem no saneamento,
nutrição, planejamento da família, saúde infantil e imunizão, com ênfase nas medidas
preventivas alem de acompanhar diabéticos e hipertensos (SANTOS, 2006).
A incorporação dos auxiliares de saúde comunitária a sistema de sde formal
ocasionou modificações como a diminuição da disponibilidade dos mesmos como fonte de
referencia para a comunidade passando a se identificar com a categoria de enfermagem;
52
o que tem levantado a questionamentos em relação ao lugar de trabalho e de
recrutamento serem dependentes do seu local de residência que começaram a perder
gradativamente a referencia comunitária (SANTOS, 2006).
4.10- Agentes Locais de Saúde das Filipinas
O acesso aos serviços de saúde foram ampliados pelos cuidados primários de
saúde por meio de programas de saúde comunitária introduzidos pela Igreja Católica em
1975 apenas nas localidades que expressavam o interesse em lidar com a saúde como
necessidade sica; constatado a motivão o facilitador reúne-se com a comunidade
para fazer o diagnostico comunitário e identificação das causas e a seguir escolher um
trabalhador voluntário que recebe capacitação para a assistência à saúde e organização
comunitária (SANTOS, 2006).
5- AGENTE COMUNITÁRIO DE SAÚDE
5.1- TRAJETÓRIA HISTÓRICA - DO PACS À PROFISSÃO AGENTE COMUNITÁRIO
Com a mudança dos modelos de atenção à saúde, da atenção médica para a
vigilância da saúde, representado pela criação do Programa de Agentes Comunitários de
Saúde (PACS) e da Saúde da Família, surge, no âmbito nacional, um novo trabalhador
o Agente Comunitário de Saúde (ACS).
Várias experiências institucionais e comunitárias contribuíram na concepção
teórico-prática dos Agentes Comunitários, a exemplo das práticas de atenção primária no
período de 1974-1978 realizadas pelos auxiliares de saúde integrantes do Programa
Integrado de Saúde Comunitária de Planaltina-DF, da Universidade de Brasília em
53
parceira com o governo do Distrito Federal - Fundação Hospitalar e Fundação de Serviço
Social, a Fundação Kellog e a Fundação Interamericana. Esses auxiliares de saúde
realizavam visitas a toda a populão urbana e rural. No período de 1979-1986, o trabalho
do auxiliar de saúde foi ampliado para a região do Ceará em Jucás e FEBEM. Outra
experiência foi dos visitadores sanitários da Fundação SESP (Serviço Especializado em
Saúde Pública) nos anos de 1970-1980, através de atividades domiciliares para
população com alto risco de adoecer e morrer das doenças infecto-parasitárias e
desnutrição, o que possibilitou repensar a assistência extramuro, tendo em vista que os
serviços de saúde eram centrados no eixo hospitalar (BRASIL, 1994; MELAMEDI et al,
1998; LAVOR; LAVOR; LAVOR, 2004).
Outra inspiração foi o programa de Líderes Comunitários da Pastoral da Criança
vinculada à CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), que prestam assistência
especialmente nas áreas de baixa renda em caráter voluntário, visando à melhoria da
realidade dessas famílias (BRASIL, 1994; OLIVEIRA, NACHIF e MATHEUS, 2003).
Os Agentes Comunitários de saúde iniciaram as suas atividades em comunidades
rurais e peri-urbanas a partir da década de 1970 com o intuito de oferecer cuidados
básicos de saúde às populações de difícil acesso (BRASIL, 1994).
Os documentos do Minisrio da Saúde (BRASIL,1991; BRASIL,1994) retratam
vários projetos com os Agentes Comunitários de saúde que foram implantados nos
estados, especialmente na região Nordeste com destaque para o Programa de Agentes
Comunitários de Saúde do Estado do Ceará. Esse teve início em 1988, com excelentes
resultados de integração profissional-equipe, levando à redução da morbidade infantil e
materna e podendo ser considerado o precursor das ideias geradoras do PACS
(Programa de Agentes Comunitários de Saúde) que foi institucionalizado em 1991 pelo
Ministério da Saúde/Fundação Nacional de Saúde, visando a contribuir na implantação e
54
implementação do SUS em todos os seus prinpios, em especial a universalidade, a
regionalizão, hierarquização e participação popular.
O embrião dos Agentes Comunitários no âmbito nacional teve início no Ceará, no
ano de 1987, de forma emergencial, com 6.000 Agentes que prestavam assistência às
vítimas da seca, priorizando as ações de saúde da mulher e da criança em decorrência da
persistência de altas taxas de morbidade e mortalidade materno-infantil que estavam
condicionadas a três causas: 1- Não Acessibilidade aos serviços de saúde; 2-
Desinformação da população acerca do funcionamento dos serviços de saúde e de ações
eficazes de promoção e prevenção de saúde; 3- Limitações do processo de educação em
saúde. Além dessas três causas, havia a necessidade de execução de política de frentes
de trabalho, uma vez que o trabalho, nessas localidades, era o escasso quanto a água
(LAVOR; LAVOR; LAVOR, 2004; TOMAZ, 2002; NOGUEIRA; SILVA; RAMOS, 2000).
Diante dessa situação, foram selecionados para a função mulheres carentes
responsáveis pelo sustento da casa, criando oportunidade de emprego, entretanto
deveriam ter habilidade de se comunicar e relacionar com seus vizinhos que constituiriam
a população adscrita. Muitas das mulheres que foram contratadas tinham experiência com
o trabalho comunitário, pois atuavam como Agentes de saúde da Pastoral da Criança,
ajudando de forma solidária e estritamente voluntária. (LAVOR; LAVOR; LAVOR, 2004;
TOMAZ, 2002; NOGUEIRA; SILVA; RAMOS, 2000). Diante disso, o depoimento do ex-
secretário de Saúde do Cea, Dr. Carlyle Lavor, ilustra de forma clara essa situação:
(...) surgiu uma seca no Ceará e houve a necessidade de empregar as
pessoas que estavam sem emprego e passando fome. Então, sugerimos
a ideia de empregar mulheres. Sempre nas emergências se empregam os
homens, mas há muitas mulheres que não têm marido, que são as donas
da casa. Então sugerimos empregar seis mil mulheres, que era o cálculo
que a gente tinha feito de Agentes de saúde necessários para o estado.
Foram selecionadas seis mil mulheres dentre aquelas mais pobres do
estado, que eram escolhidas por um comitê formado por trabalhadores,
igreja, representantes do estado e município. A gente definiu coisas muito
55
simples e que eram muito importantes para a saúde, como conseguir
vacinar todos os meninos, achar todas as gestantes e levar para o
médico, ensinar a usar o soro oral. Assim, dentro de quatro meses,
treinamos seis mil mulheres sem nenhuma qualificação profissional. E o
mais importante é que fossem pessoas que a comunidade reconhecesse,
mulheres que merecessem o respeito da comunidade. Assim foi o início
do trabalho. Cessou o programa de emergência de atendimento à seca
que tinha 200 mil trabalhadores. Mas essas mulheres da saúde foram as
únicas que continuaram a trabalhar porque o sucesso foi grande demais.
(NOGUEIRA; SILVA; RAMOS; 2000, p.4).
A contratação de mulheres para o papel de Agente Comunitário de Saúde causou
um significativo impacto sobre a geração de oportunidades de renda e emprego,
especialmente com o ingresso no mercado de trabalho de jovens, em especial mulheres
que nunca trabalharam de maneira formal e que são originários de classe social em que a
renda per capita igual ou maior que um salário mínimo representa a exceção ao invés da
regra associado a uma condição que os distingue dos vizinhos; a aquisição dessa renda
ocasiona um impacto positivo na família com a melhoria das condições de vida dos seus
membros (NOGUEIRA; SILVA; RAMOS, 2000).
Em 1988, o programa emergencial foi desativado e, logo depois, iniciou-se,
definitivamente, o Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS), que aproveitou
a mesma equipe coordenadora e de execução, ou seja, todos os Agentes permaneceram
em suas funções, de forma que o estreito laço comunitário estabelecido com as famílias
terminou por influenciar os serviços de saúde, projetando o Ceará como o campeão
nacional em cobertura vacinal e menor índice de mortalidade infantil, fazendo com que os
sinos deixassem de ser tocados, ou seja, não mais anunciando a viagem de um anjo para
o céu (LAVOR; LAVOR; LAVOR, 2004; TOMAZ, 2002; NOGUEIRA; SILVA; RAMOS,
2000).
O ACS não deve ser apenas um elo entre o serviço e a população, e sim deve
exercer uma relação com a comunidade por meio da identificação e da ajuda solidária,
buscando aumentar a resolutividade ou evitar que alguns problemas de saúde ocorram
56
por meio de ações de saúde com ênfase na prevenção, contribuindo para a diminuição da
morbi-mortalidade por meio do autocuidado individual e familiar. Outra contribuição foi a
compreensão de como o processo saúde-doença ocorre na coletividade, como, por
exemplo, compreender as relações entre a falta de aleitamento materno, a desnutrição, o
analfabetismo, a pobreza e a morte das crianças, quando temas como esses passaram a
estar na agenda dos políticos (BRASIL, 1991; LAVOR; LAVOR; LAVOR, 2004;
NOGUEIRA; SILVA; RAMOS, 2000).
O sucesso dos Agentes do Ceará foi reconhecido pelo Ministério da Saúde, que
criou, em 1991, o PACS para os Estados do Nordeste, recebendo a ajuda dos técnicos
cearenses na formão das equipes coordenadoras do programa em todas as secretarias
estaduais da região (LAVOR; LAVOR; LAVOR, 2004).
O PACS estava centrado na região Nordeste, entretanto, a partir do início de 1992,
ocorreu um surto de cólera no país, resultando na exteno em caráter emergencial para
a Região Norte, onde assumiu um papel crucial no controle e prevenção da epidemia por
meio de ações relacionadas à reidratação oral, controle da diarreia e maior cobertura
vacinal das crianças com o intuito de reduzir a mortalidade infantil (BRASIL,1994).
O documento do Ministério da Sde (BRASIL, 2002) relata que o PACS enfrentou,
no início de sua trajetória, vários obsculos ideológicos, como a utilização do mesmo
enquanto programa eleitoreiro, desqualificação das ações de saúde. Entretanto, o apoio e
a defesa do PACS realizado pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF)
mudou essa concepção, contribuindo para a efetivação do programa associado a
experiências exitosas com aumento do aleitamento exclusivo, melhoria dos indicadores
nutricionais das crianças, aumento da cobertura vacinal dentre outros.
A implantação do PACS foi iniciada pela região Nordeste devido à existência de
altos índices de doenças, de carências e de pobreza, sendo previsto, na segunda fase, a
57
expansão para a região Norte e entorno do Distrito Federal e, numa terceira etapa, ainda
em 1992, deveria entrar na periferia das grandes capitais e áreas carentes do país com
altos índices de morbi-mortalidade e baixos índices de condições de sobrevivência das
crianças de até seis anos. Entretanto, essa estratégia de expansão não ocorreu, ficando o
PACS restrito apenas às regiões Nordeste, Norte e Centro-Oeste (BRASIL, 1991;
SOUSA, 2001).
Somente em 1993, o plano original de expansão do PACS foi retomado,
priorizando as regiões de risco biológico, levando em consideração a magnitude e
gravidade das informações de morbi-mortalidade e contando com a implementação em 13
Estados da região Norte e Nordeste, que totalizou mais de 29 mil ACSs, distribuídos em
761 municípios no contexto da municipalização e descentralização das ações de saúde.
Ressalta-se, aqui, que o próprio município opta pela implantação, o que justifica seu lento
processo no território nacional (BRASIL, 1994; SOLLA; MEDINA; DANTAS, 1996).
Os documentos do Ministério da Saúde (BRASIL, 1994; BRASIL; 1997; BRASIL,
2002) comentam que a operacionalizão do PACS pelos municípios realiza-se por meio
do atendimento de alguns pré-requisitos que ajudam a consolidar os princípios do SUS e
fortalecer a vigilância à saúde com responsabilização territorial. Nesse sentido, os critérios
dizem respeito a aspectos já contidos na Lei Orgânica da Saúde - 8.80/90 e Lei 8.142/90 -
como a existência do Conselho Municipal de Saúde que aprove a adesão ao programa,
constituição da Coordenação Municipal do PACS, Fundo Municipal de Saúde, indicação
de uma Unidade Básica de Saúde à qual o Agente estará vinculado, ter um profissional
Enfermeiro de referência dos ACS, processo seletivo com critérios e habilitação na
condição de gestão prevista na NOB 01/96. Somente após a demonstração de que
preencheu os requisitos, o município solicita formalmente o interesse em aderir ao PACS.
58
O cumprimento dos requisitos para a implantação do PACS contribuiu para
impulsionar a (re)organização do sistema de saúde e, acima de tudo, dos modelos locais
de saúde que passaram a ser repensados com a participação popular por meio do ACS
(DALPOZ, 2002).
Os documentos do Minisrio da Saúde compreendidos no período de 1991 a 2002
(BRASIL, 1991; 1994; 1994a; 1997; 2002) descrevem os passos e requisitos da época
para a operacionalização do PACS:
1- Sensibilização
A primeira estratégia está fundamentada na mobilização dos vários setores sociais,
especialmente com a comunidade, que devem respaldar e fortalecer o trabalho dos
Agentes de saúde. Para essa finalidade, faz-se necessário dispor de todos os recursos de
comunicação disponíveis.
2- Adesão
O município solicita à secretaria de estado da saúde a implantação do PACS
através do termo de adesão, desde que todos os critérios pré-estabelecidos estejam
cumpridos mediante documentação comprobatória, com a observação especial da
disponibilidade de tempo do enfermeiro que desempenhará o papel de instrutor/supervisor
com carga horária mínima de 20 horas.
3- Recrutamento e Seleção
A primeira etapa é constituída pelo mapeamento com definição da área geográfica,
determinação do número de famílias obtidas em dados secundários, como empresas de
água, luz e o respectivo mero de ACS necessários, levando em consideração que um
59
Agente pode acompanhar 200 a 250 famílias no pólo urbano e 100 a 150 no pólo rural,
posteriormente à aprovação do mapeamento e à divulgação nos diversos meios de
comunicação de massa dos critérios para a inscrição, áreas de abrangência e locais de
prova.
4- Inscrição
Caracteriza-se pela primeira etapa eliminatória, uma vez que os candidatos devem
atender a critérios como:
Ter mais de 18 anos;
Saber ler e escrever – ter pelo menos o 1º Grau completo preferencialmente;
Ser morador da comunidade mais de dois anos, que ele deve conhecer o local
onde vai trabalhar;
Ter disponibilidade de 8 horas;
Continuar residindo na área de atuação para garantir a identidade cultural, valorizando
as potencialidades locais, promovendo a inclusão comunitária.
Esse momento deve ser gratuito e realizado por pessoas idôneas, com observação
rigorosa dos critérios pré-estabelecidos.
5- Seleção
O processo seletivo deve atender a normas estabelecidas pela Coordenação
Nacional e compreende três etapas: prova escrita, entrevista individual e em grupo.
A entrevista compreende uma etapa fundamental, pois permite a identificação de
uma característica essencial para o papel de Agente: o espírito de solidariedade com a
capacidade de ajudar o próximo na busca da qualidade de vida (BRASIL, 2002).
60
6- Resultado
Os resultados devem ser publicados através dos meios de comunicação e listas
afixadas no local da seleção; e, posteriormente, deve ser feita a convocação.
7- Capacitação
A capacitação dos Agentes aprovados é realizada através de treinamento inicial
correspondente às ações que irá desempenhar junto à comunidade; dessa forma inicia-se
o processo de profissionalização.
O primeiro documento intitulado Programa Nacional dos Agentes Comunitários de
Saúde (BRASIL; 1991, p.8) menciona como atribuições:
Realizar Ações Básicas de Saúde (...) através de visitas domiciliares,
reuniões de grupos ou outras modalidades. Desenvolver atividades de
educação em saúde individual e coletiva. Estimular a organização da
comunidade. (...) registrar as atividades desenvolvidas no seu trabalho e
encaminhá-las à coordenação municipal do programa.
Em um primeiro momento, recebem orientação para visitas domiciliares, cadastro
das famílias, acompanhamento e orientação de grupos especiais - crianças, gestantes -
identificação e prevenção de situações de risco.
Após treinamento, os Agentes deverão iniciar o processo de profissionalização em
auxiliares de enfermagem sob a responsabilidade dos órgãos formadores das secretarias
estaduais de saúde.
No que se refere à educação continuada, deve ser garantida por meio dos
instrutores/supervisores que orientam as ações de acordo com as necessidades.
61
8- Supervisão, Acompanhamento e Avaliação
Essa etapa deve ser feita de forma sistemática e permanente, utilizando os
instrumentosdados do sistema de informação, relatórios, reuniões, depoimentos, visitas
e observação do trabalho dos Agentes.
Os dados levantados pelos Agentes acerca da situação de saúde das famílias
formam um Sistema de Informão do PACS (SIPACS) que representa um passo inicial
para o planejamento local e veiculo de avaliação por meio de indicadores que
compreendem três grupos Cobertura, Processo e Morbi-mortalidade da comunidade
acompanhada (BRASIL, 1996).
9- Desligamento
Algumas situações foram nomeadas para denominar critérios para o desligamento
do Agente, dentre elas o residir na área de abrangência, rejeição pela comunidade, não
compatibilidade de horário, apresentar distúrbio de conduta que prejudique as suas
atividades e a credibilidade do programa; realizar atividades político-partidárias durante a
jornada de trabalho e não cumprir suas atribuições.
Esses pré-requisitos contribuíram para a inserção do Agente Comunitário no
sistema local de saúde, para o fortalecimento do processo de municipalização e do
controle social e tamm para uma significativa interiorização do profissional do
enfermeiro, uma vez que essa categoria é responsável pela supervisão (BRASIL, 2002).
O PACS consolidou-se como programa, tendo como pilar a redução de graves
problemas, como o difícil acesso da população aos serviços de saúde, a baixa cobertura
das ações básicas, falta de orientação sobre cuidados básicos, falta de aproximão dos
serviços de saúde com a comunidade. Diante disso, a missão dos Agentes é melhorar a
capacidade da população de cuidar da sua saúde por meio de informações e proporcionar
62
a ligação entre a comunidade e os serviços de saúde, contribuindo para a redução da
morbi-mortalidade dos grupos mais vulneráveis ao risco de adoecer e morrer (BRASIL,
1991; BRASIL, 1994; BRASIL, 1994a).
A partir de 1994, com o desenho da estratégia do Programa de Saúde da Família
(PSF), é que os Agentes começaram a chegar aos grandes centros, às regiões
metropolitanas e às capitais do Sul e do Sudeste; especialmente em áreas
marginalizadas, devendo ser compreendido como estratégia de garantir os princípios do
SUS com ênfase para a equidade com vista a prover toda a população com a atenção
primária, que garantirá, assim, a continuidade da assistência, já que a reorganização da
APS pressiona os outros níveis de atenção para reestruturarem com qualidade (SOUSA,
2001; TOMAZ, 2002).
Reafirmando Marques; Padilha (2004) comenta que o PACS e o PSF foram
concebidos com o intuito de enfrentar dois incômodos das unidades de saúde
representados pela falta de vínculo com os usuários e suas famílias e a incapacidade
para resolver as doenças crônicas. Esses programas passaram a orientar a atuação
profissional baseada na atenção integral e integrada com as famílias, comunidades e
ões intersetoriais, além de estimular a participação popular, convocando o usuário para
ser o co-responsável pela saúde.
Em 1998, o PACS atingia todas as regiões do país, segundo documento do
Ministério da Saúde (2001), conforme se observa na Tabela 1.
TABELA 1- População atendida pelo Programa de Agentes Comunitários de Saúde
(PACS), Brasil, 1999.
Região População Coberta %
Norte 69,9
63
Nordeste 60,2
Centro-Oeste 43,7
Sul 17,0
Sudeste 2,9
Fonte: Brasil/Ministério da Saúde, 2001
A partir de 1994, os Agentes Comunitários de saúde podem ser encontrados em
duas situações: ligados a uma unidade básica de saúde, constituindo o PACS; e ligados a
uma unidade básica de saúde da família como membro da equipe multiprofissional.
(BRASIL, 2006a).
Com a implantação do PSF, o papel do ACS foi ampliado com a mudança do foco
materno-infantil para o contexto familiar e comunitário, exigindo novas competências dos
Agentes associadas a um grau de escolaridade mais elevado (TOMAZ, 2002).
Como membro de uma equipe multiprofissional, o Agente Comunitário exerce a
função de elo entre as necessidades de sde das pessoas e a equipe, realizando um
contato permanente com as famílias, proporcionando a efetivação do trabalho de
vigilância à saúde (BRASIL, 2000a).
A publicação do Ministério da Saúde (BRASIL, 2002) revelava que, após oito anos
de operacionalizão, quase 70% da totalidade dos Agentes eram do sexo feminino, 60%
tinham ensino médio completo ou incompleto, 18% ensino fundamental completo, 22%
fundamental incompleto e 86% recebiam até um salário mínimo.
Em 2004, após 13 anos de implantação do PACS, uma realidade descrita pelo
documento do Ministério da Sde (BRASIL, 2004) traz uma situação preocupante que
demonstra que o Agente, apesar de ser relevante, é o elo mais fraco da corrente, pois
suas atividades o exercidas sem regulamentação, com vínculos precários, que variam
64
de vínculos legais até acordos verbais, com contratos temporários, gerando insatisfação,
instabilidade e vivendo em constantes ameaças de desligamentos, ocasionando a
dificuldade em implementar as suas verdadeiras atribuições.
Diante dessa afirmão, o Agente realiza uma tradução consciente, em relação
ao saber técnico, e também inconsciente, quando se trata da vivência comunitária. Assim,
por meio desse fazer, desempenha o papel de tradutor, um elo cultural que faz a ponte
entre dois universos distintos: o do saber científico e o do saber popular, realizando a
interlocução entre os mesmos, fortalecendo a educação em saúde com vistas à melhoria
das condições de vida (BRASIL, 2000a; SILVA et al, 2008).
A essência do trabalho do Agente assemelha-se às atividades realizadas pelo líder
comunitário da Pastoral da Criança, com uma vantagem para o Agente, já que o mesmo
exerce suas atividades durante oito horas diárias de forma remunerada, o que resulta na
redução cada vez maior do número de líderes da pastoral que passaram a fazer parte do
quadro de funcionários do PACS, ascendendo no mercado de trabalho e desfrutando de
direitos e benefícios ligados à relação assalariada (NOGUEIRA; SILVA; RAMOS, 2000).
Tomaz (2002) comenta que deve evitar colocar sob o ombro do Agente o peso da
responsabilidade de ser a mola propulsora da efetivação do SUS, que a consolidação
do SUS fundamenta-se em um conjunto de fatores técnicos, políticos, sociais e o
envolvimento de todos os segmentos, incluindo o ACS, levando em consideração que o
processo de transformação social é lento e requer esforços conjuntos.
Nessa perspectiva, um emprego estável com carteira assinada revela-se como
raridade que deve ser mantida pelo profissional a todo custo, originando uma instabilidade
constante manifestada no âmbito pquico por meio de sofrimento, ansiedade, angústia e
depressão; no âmbito orgânico, com maior predisposição ao adoecimento, diminuindo a
65
qualidade de vida e desagregando os laços de solidariedade e socialização, o que
dificulta a efetivação do seu papel de elo (LUZ, 2008).
Destaca-se, nesse contexto, a precariedade do trabalho aliada à intensificação do
trabalho caracterizado pelo aumento das tarefas e das horas trabalhadas, realizão de
atividades durante o tempo livre com a disponibilidade constante e a cobrança excessiva
de qualificação. Dessa forma, o aumento dos requisitos e competências resulta no
estranhamento do processo de trabalho, que deixa de ser prazeroso, passando a
significar martírio e aumentando o risco de adoecer (ARRUDA; MARTELETO; SOUZA,
2000).
O trabalho do Agente deixa de ser sinônimo de liberdade e transforma-se em
estranhamento, perda de si e tortura, ocasionando desgaste e sofrimento sico e mental;
entretanto a vida dos seres humanos não está reduzida apenas ao trabalho e não pode
ser compreendida na sua ausência. Assim, onde quer que estejam as causas do
sofrimento dos Agentes, estarão sempre presentes em suas vidas e no seu trabalho
(CODO; SAMPAIO; HITOMI, 1993).
Em paralelo à trajetória de implantação do PACS, da regulamentação de suas
exigências, da falta de estabilidade com a precariedade do vínculo, os Agentes
começavam a reivindicar sua efetivação profissional como forma de reverter o sofrimento
causado pela incerteza do trabalho, que será mais bem detalhado a seguir.
5.2- ASPECTOS LEGAIS DA PROFISSÃO AGENTE COMUNITÁRIO DE SAÚDE
Todas as profissões são regulamentadas por leis e decretos, com os Agentes
Comunitários não seria diferente, porém, quando surgiram no cenário nacional, eram
reconhecidos como categoria e o como Profissão. Entretanto, a luta permanente pelo
66
reconhecimento legal culminou com a edição de um aparato legal Decreto Federal nº.
3.189/99, que fixa as diretrizes para o exercício de suas atividades e, em seguida, a
elaboração de um projeto de lei que culminou na publicação da Lei Federal nº. 10.507, de
10 de julho de 2002, que cria a profissão de Agente Comunitário de Saúde e,
posteriormente, a Emenda Constitucional nº. 51, de 14 de fevereiro de 2006 e a Lei
11.350, de 05 de outubro de 2006.
O decreto nº. 3.189, de 04/10/1999 estabelece as diretrizes para a função dos
Agentes, que compreende atividades preventivas e promocionais, através de ações
educativas individuais e coletivas, estimula a participação comunitária nas políticas
públicas em busca da qualidade de vida, promovendo o fortalecimento dos laços com o
serviço de saúde e outros setores, realiza visitas domiciliares para o monitoramento de
situações de risco e utiliza instrumentos para diagnóstico comunitário.
Em 2002, foi regulamentada a Lei 10.507, que transforma finalmente a categoria
Agente Comunitário em profissão exercida exclusiva no âmbito do SUS, sob a supervisão
do gestor local, demonstrando a grande importância desse profissional para a efetivação
do SUS. Também estabelece requisitos para essa nova profissão como: residir na
comunidade em que atua, concluir o curso de qualificação básica de formação de Agente
e possuir o ensino fundamental.
Apesar dos grandes avanços obtidos, ainda existia um grande desafio a ser
vencido, a precariedade da seleção e dos vínculos dos Agentes Comunitários, que eram
contratados através de contratos temporários ou informais, terceirizados ou acordos
verbais. Essa falta de segurança resultava na ausência de direitos trabalhistas e
previdenciários como décimo terceiro, licença médica, licença maternidade, resultando em
alta rotatividade, insatisfação e desmotivação, afetando, diretamente, a qualidade do
cuidado prestado à população, associado à utilizão desses profissionais em práticas
67
clientelistas e eleitoreiras; somente em 2006 foi estabelecido o primeiro passo em busca
da desprecarização desses nculos e garantia dos direitos por meio da Emenda
Constitucional nº. 51 (14/02/2006), a qual regulamentou que os gestores municipais
poderão admitir os Agentes por meio de processo seletivo público (prova escrita ou prova
escrita/títulos) e os contratados anteriormente seriam dispensados de se submeter a um
novo processo, desde que tivessem sido submetidos a processo seletivo público
anteriormente (BRASIL, 2006c; BAHIA, 2007; BAHIA, 2007a).
Os Agentes Comunitários passam a integrar o quadro administrativo as a
aprovação de lei especifica que cria os cargos ou empregos públicos de Agentes
Comunitários, vedando a contratação temporária ou a terceirização (BAHIA, 2007a).
A Lei 11.350 de 05/10/2006 regulamenta os vínculos, as atribuições, atividades e
requisitos e acrescenta as situações para rescindir unilateralmente o contrato na
ocorrência de falta grave, acumulação ilegal de cargos, necessidade de redução de
quadro de pessoal, insuficncia de desempenho, declaração falsa de residência.
Por meio do arcabouço jurídico, pode-se perceber que, durante a trajetória de
categoria para profissão, ocorreram alguns acréscimos no que se refere aos requisitos
exigidos para o exercício profissional. Os documentos ministeriais presentes em Brasil
(1994) e Brasil (1997) afirmam, como exigência, que o candidato deveria morar na
comunidade pelo menos dois anos, ter idade mínima de dezoito anos, saber ler e
escrever (1º grau) e ter disponibilidade de tempo integral para executar o trabalho. Já o
decreto 3.189 (Brasil, 1999) menciona a importância do espírito de liderança e
solidariedade que deveriam ser inerentes ao individuo; e pela lei 10.507 (BRASIL, 2002)
com a regulamentação da profissão, acrescenta-se a necessidade da conclusão do
ensino fundamental e da aprovação no curso de qualificação básica para formação do
Agente Comunitário de Saúde.
68
A exigência de morar na comunidade pelo menos dois anos fundamenta-se na
capacidade desse profissional de compreender de dentro os aspectos comunitários,
proporcionando a construção de vínculos interpessoais e o estabelecimento de formas de
comunicação (SILVA et al., 2008).
A profissão de Agente Comunitário necessita de um corpo de conhecimentos que
tem o intuito de subsidiar as atividades cotidianas, garantindo a manutenção da
excelência de qualidade. Em virtude de o processo educativo necessitar de atualização
constante adequado à realidade local, faz-se necessária a garantia da qualificação
profissional associada ao processo de educação permanente em saúde.
5.3- QUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL HISTÓRICO E COMPETÊNCIAS
5.3.1- PROFAE (PROJETO DE PROFISSIONALIZAÇÃO DOS TRABALHADORES DA
ÁREA DE ENFERMAGEM)
O PROFAE (Projeto de Profissionalização dos Trabalhadores da Área de
Enfermagem) foi instituído em 1999 em resposta à desqualificação e à irregularidade de
alguns profissionais da saúde que realizavamões próprias da enfermagem sem a
habilitação técnica para a mesma, desrespeitando a Lei do Exercício Profissional de
Enfermagem (Lei Federal nº. 7.498/86) e colocando em risco a qualidade da assistência
prestada à população (CÊA; REIS E CONTERNO, 2007).
O Ministério da Saúde, em parceria com o Ministério da Educação e Ministério do
Trabalho, implementaram o PROFAE, que tinha como missão a profissionalização na
área de enfermagem com a posterior melhoria da qualidade dos serviços de saúde, com
o intuito de atingir cerca de 225 mil auxiliares e 90 mil cnicos de enfermagem,
69
constituindo-se uma política blica para a qualificação da força de trabalho da área de
enfermagem no Brasil, que, posteriormente, foi estendido aos Agentes Comunirios de
saúde (CÊA; REIS E CONTERNO; 2007; BRASIL, 2008a).
Esses profissionais foram capacitados contemplando algumas competências
centradas no trabalho em saúde, que se expressa na capacidade de cuidar do outro,
colocando-se à disposição do ser humano no âmbito do conhecimento e da ão
necessárias à prevenção e à solução dos problemas de saúde (BRASIL, 2008a).
Outro aspecto de capacitação é a perspectiva de atender algumas competências,
compreendida como a capacidade de ação frente ao fazer e não mais concebida como
estoque de conhecimento, passando a ser centrada no trabalho em saúde, que se
expressa na capacidade de cuidar do outro de forma profunda, conhecendo suas
necessidades e o modo de vida, colocando-se a disposição do ser humano no âmbito do
conhecimento e da ação necessários à prevenção e à solução dos problemas de saúde
(BRASIL, 2004; MARQUES; PADILHA, 2004; BRASIL, 2008a).
O PROFAE foi organizado em dois componentes, o componente I contempla a
qualificação de auxiliares e atendentes de enfermagem, complementação da formação de
auxiliares e técnicos de enfermagem e complementação do ensino fundamental de
atendentes de enfermagem. Já o componente II destina-se à garantia dos insumos,
infraestrutura e recursos necessários para a efetivação do componente I, como a
formação dos professores, certificação de competências e modernização de instituições
(CÊA; REIS E CONTERNO, 2007).
A nova abordagem de competência gerou um novo sistema de capacitação e
avaliação formativa contextualizada ao novo saber-fazer em saúde, que culminou em um
novo sistema de Certificação de Competências/PROFAE (CÊA; REIS E CONTERNO;
2007; BRASIL, 2008a).
70
Os profissionais da saúde precisam ser capazes de atuar de forma interdisciplinar e
intersetorial em busca da melhoria dos indicadores de saúde que somente será alcançado
por meio da qualificação profissional, com a elevação da escolaridade e autonomia
intelectual, que contempla o saber-conhecer, capacidade de planejar, trabalhar em
equipe, implicações éticas (MARQUES; PADILHA, 2004; BRASIL, 2008a).
5.3.2- CURSO TÉCNICO DE AGENTE COMUNITÁRIO- COMPETÊNCIA E SABERES
A formação profissional deve ser valorizada e reconhecida como um dos pilares
para a garantia da excelência da qualidade da assistência em saúde. Diante disso, houve
a necessidade de elevar a escolaridade dos Agentes, com o aumento da autonomia
intelectual associada à caracterização do perfil de desempenho desejado. O caminho
para atingir essas metas dá-se por meio da educação profissional, que consiste em
integrar a educação ao trabalho e ao saber tecnológico, levando ao constante
desenvolvimento de habilidades essenciais ao processo produtivo e social (BRASIL,
2004; BRASIL, 1996b; BRASIL, 1999a).
O decreto nº. 5.154 de 23/07/04 (BRASIL, 2004c) e a Resolução nº. 1 de
03/02/2005 (BRASIL, 2005) atualizam a nomenclatura dos cursos de educação
profissional em:
Formação inicial e continuada de trabalhadores, substituindo o termo educação
profissional de nível básico;
Educação profissional cnica de nível médio, ao invés de educação profissional de
nível técnico;
Educação profissional tecnológica, de graduação e pós-graduação, em substituição a
educação profissional de nível tecnogico.
71
Nos documentos do Ministério da Educação (BRASIL, 2004b; BRASIL, 2005), a
educação profissional técnica de nível médio e o ensino médio apresentam-se de três
formas: 1- Integrada, na mesma instituição de ensino com matrícula única; 2-
Concomitante, na mesma instituição de ensino ou em estabelecimentos diferentes; 3-
Subsequente, disponível apenas para quem tenha concluído o ensino médio. A
conclusão do ensino médio é condição fundamental para a obtenção do diploma de
técnico de nível médio.
Com a profissionalização dos Agentes Comunitários e as especificidades deste
trabalhador associadas às novas perspectivas da educação profissional no Brasil com
suas diretrizes curriculares, fez-se necessário valorizar a formação desses profissionais
no intuito de se adequar aos princípios do SUS por meio de aprendizagens significativas,
reflexão critica e criativa com vinculação educação-trabalho para a promoção da melhoria
dos indicadores de sde com vistas à resolução da rede de atenção e humanização da
assisncia. Isso posto, o Ministério da Saúde delineou o Perfil de Competências
Profissionais do Agente Comunitário de Saúde fundamentado em um processo
sistematizado de debates com especialistas e trabalhadores que visa a subsidiar as
escolas técnicas na formão e instrumentalização desse trabalhador sui generis
(BRASIL, 2004).
O documento do Ministério da Saúde (BRASIL, 2004a) define a profissão Agente
Comunitário com base na Lei nº. 10.507 como sendo exercida exclusivamente no âmbito
do SUS, sob a coordenação do gestor municipal; realizando atividade de promoção da
saúde e prevenção de doenças através de ações educativas de saúde realizadas a nível
domiciliar ou junto à comunidade em conformidade com os princípios e diretrizes do SUS
e estende-se também facilitar o acesso da comunidade assistida às ações e serviços de
informação, sde, promão social e cidadania.
72
Esse novo trabalhador da saúde irá se capacitar e atuará como técnico Agente
Comunitário de nível médio, devendo compor a equipe multiprofissional, em que suas
atividades irão transcender o campo da saúde, requerendo a atenção a aspectos das
condições de vida da comunidade assistida; para isso é preciso é preciso reforçar o seu
importante papel social de interlocutor do serviço com a população (BRASIL, 2004).
O documento do Ministério da Saúde (BRASIL, 2004) define que o Agente
Comunitário de Saúde terá acesso ao curso técnico de nível médio de três formas:
a) etapa formativa I formação inicial: para todos os Agentes Comunitários de Saúde,
independentemente da escolaridade;
b) etapa formativa II: concluintes da etapa formativa I, com certificado de conclusão ou
atestado de realização concomitante do ensino fundamental;
c) etapa formativa III: concluintes das etapas formativas I e II, com certificado de
conclusão ou atestado de realização concomitante do ensino médio.
Os Agentes Comunitários lidam com vários problemas na comunidade, Morin
(2003) comenta que os problemas podem ser classificados como essenciais, globais e,
principalmente, particulares, que devem ser pensados de modo contextualizado e, para
serem enfrentados, necessitam de saberes cada vez mais polidisciplinares,
multidimensionais, globais, exigindo dos profissionais um enfoque em profundidade e uma
visão mais ampla.
Diante de tanta responsabilidade, torna-se indispensável o desenvolvimento de
competências como atitudes/valores, habilidades e conhecimentos que incorporam três
dimensões do saber: saber-ser, saber-conhecer e saber-fazer, os quais têm a promão
da saúde e a prevenção de doenças como eixos estruturantes (BRASIL, 2004).
Para contemplar essas dimensões do saber e as competências, o Ministério da
Saúde (BRASIL, 2004) estabeleceu três etapas e suas respectivas atribuições que estão
73
contempladas no projeto político pedagógico do currículo proposto para o curso de
técnico de Agente Comunitário de Saúde:
Etapa I- Formação inicial: contextualização, aproximão e dimensionamento do
problema. O perfil social do técnico Agente Comunitário de Saúde e seu papel no âmbito
da equipe multiprofissional da rede básica do SUS, contemplando conceitos sobre a
política nacional de saúde, a estratégia da saúde da família, o processo saúde-doença,
processo de trabalho, planejamento com enfoque estratégico, trabalho em equipe e
comunitário, ações que integrem a equipe e a população, processo avaliativo do trabalho,
e desenvolvimento da cidadania no âmbito social e da saúde – totalizando 400 horas.
Etapa II- Competências no âmbito da promão da saúde e prevenção de doenças,
dirigidas a indivíduos, grupos específicos e doenças prevalentes com a compreensão do
processo saúde-doença no enfoque positivo de saúde, desenvolvimento de ões de
promoção da saúde e educação em saúde de maneira contextualizada, e de ações em
cenários diversos (domicílios, escolas, creches, unidade de saúde) com o monitoramento
de grupos específicos e as doenças prevalentes, articulação intersetorial, mobilização
comunitária com o intuito de melhorar a qualidade de vida – carga horária 600 horas.
Etapa III- Competências no âmbito da promoção, prevenção e monitoramento das
situações de risco ambiental e sanitário através de ões de promoção da saúde com
enfoque de risco, vigilância em saúde, mapeamento, envolvimento comunitário nas ações
de redução/prevenção de riscos ambientais e sanitários – carga horária 200 horas.
O diploma de Técnico Agente Comunitário de Saúde será concedido apenas aos
discentes que concluírem o ensino médio, todas as etapas formativas, com o
desenvolvimento das competências requeridas, tendo potencializada a sua capacidade de
74
estreitar o laço equipe-comunidade atuando como estimulador da autonomia dos clientes
(BRASIL, 2004).
Cada competência retrata uma dimensão da realidade de trabalho do Agente
Comunitário, norteando sua atuação com a definão de possibilidades e limites de sua
práxis dimensionada pelo saber-fazer e saber-conhecer baseados em ações crítico-
reflexivas, compromisso e sensibilidade frente às questões sociais (BRASIL, 2004a).
Afinal, qual o significado de competência? Competência, palavra atualmente tão
valorizada pelos profissionais tanto da educão quanto da saúde e do gerenciamento
dos serviços de saúde.
Perrenoud (2001) afirma que competência é o conjunto dos recursos que utilizamos
para agir, representando a aplicação dos saberes como saber-ser, saber-fazer, saber-
mobilizar, dentre outros; essa capacidade de mobilizar esses recursos torna-se
extremamente necessária no enfrentamento de situações complexas que vivenciamos
diariamente e objetivam a solução dos problemas.
Fleury; Fleury ( 2004, p.30 ) define competência como sendo um saber agir
responsável e reconhecido, que implica mobilizar, integrar, transferir conhecimentos,
recursos, habilidades, que agreguem valor econômico à organizão e valor social ao
individuo.
Diante de tantas definições proposta por vários autores, o documento de perfil
profissional elaborado por documento do Ministério da Saúde (BRASIL; 2004a, p.9),
fundamentado em Zarifian (1999), conceitua Competência Profissional como sendo:
capacidade de enfrentar situações e acontecimentos próprios de um
campo profissional, com iniciativa e responsabilidade, segundo uma
inteligência prática sobre o que está ocorrendo e com capacidade para
coordenar-se com outros atores na mobilização de suas capacidades (...)
deixa de ser a disponibilidade de um estoque de saberes’, para se
transformar em ‘capacidade de ação diante de acontecimentos.
75
A Resolução CNE/CEB nº. 04/99 (BRASIL, 1999a) que institui as diretrizes
curriculares para a educação profissional de nível técnico define competência profissional
como sendo os recursos para mobilizar, articular, transformar ões em valores,
conhecimentos e aptidões para desempenhar de maneira eficiente e eficaz as tarefas
cotidianas necessárias de acordo com a natureza do trabalho, divididos em: 1-
Competências sicas desenvolvidas no ensino fundamental e médio, 2- Competências
profissionais gerais comuns aos técnicos de cada área; 3- Competências profissionais
específicas de cada área de habilitação e qualificação.
Para o Agente Comunitário eso propostas as seguintes competências
profissionais (BRASIL, 2004):
Integração da equipe de saúde com a comunidade - promover ões que integrem as
equipes de saúde com a população local, levando em consideração o
acompanhamento de indivíduos e grupos sociais ou coletividades.
Promoção da saúde - as ações de promoção da saúde devem ser desenvolvidas em
equipe, objetivando à melhoria da qualidade de vida da comunidade, participação
popular nas políticas públicas de saúde e o exercício do controle social.
Prevenção e monitoramento de risco ambiental e sanitário - dirigidas às situações de
risco ambiental e sanitário para a população, conforme planejamento participativo da
equipe de saúde.
Prevenção e monitoramento a grupos específicos e morbidades prevalentes -
definidas no planejamento da equipe de saúde e nos protocolos de sde coletiva.
O sujeito desse estudo precisa ser competente e mobilizar todos os saberes
indispensáveis para a prática cotidiana, visando a atingir os objetivos propostos na
dimensão do aprendizado individual e coletivo com vistas a garantir uma assistência de
76
qualidade à população. A atuação desse profissional está distribuída em três âmbitos, em
que a promão da saúde e a prevenção de doença representam a base estruturante e
integradora dos âmbitos: 1- mobilização social, integração comunidade-equipe e
planejamento das ações; 2- promão da saúde e prevenção de doenças direcionada à
pessoa, grupos específicos e doenças prevalentes; 3- promão, prevenção e
monitoramento das situações de risco ambiental e sanitário (BRASIL, 2004).
A concepção de competência proposta pelo documento do Ministério da Saúde
(BRASIL, 2004a) propõe uma série de sentidos essenciais à prática dos ACS, como
iniciativa, responsabilidade, autonomia, inteligência prática (articula e mobiliza o ser, o
saber-conhecer, fazer e o conviver), coordenar-se com outros atores e apreender
situações e acontecimentos próprios de um campo profissional.
Assim, compete ao Agente mobilizar todos os recursos disponíveis para realizar o
seu fazer de modo eficiente, eficaz e efetivo, através das dimensões do saber: saber-ser
(atitudes, produção de si), saber-conhecer (conhecimento e aprendizagem), saber-fazer
(habilidades) e saber-conviver (coordenar-se com os outros); sendo que a primeira
perpassa todas as outras dimensões e se expressa na análise critico-reflexiva e mudança
ativa em si mesmo e na sua prática, dimensionando a sua atuação, respeitando o
indivíduo em sua integralidade (BRASIL, 2004a).
SABER SER
A dimensão saber-ser representa o domínio afetivo que objetiva a realização
completa do homem e o desenvolvimento de sua personalidade, incluindo toda a sua
riqueza e complexidade existencial que começa com o conhecimento de si mesmo para
que, enfim, se relacione com o outro por meio do estabelecimento de relações
interpessoais (DELORS, 2003).
77
Heidegger (1981) analisa o fenômeno da vivência cotidiana, caracterizando o
homem, o ser, o ser aí, o dasein situado no mundo; esse ser tem uma história e um
significado, uma dimensão que transcende a humanidade, e o mesmo está continuamente
procurando algo am de si mesmo, projetando-se para fora de si sem jamais sair das
fronteiras do mundo.
O saber-ser se expressa através de atitudes, valores, qualidades pessoais (inatas
ou adquiridas na busca de realização pessoal) e especialmente pela produção de si para
agir com maior autonomia, discernimento e responsabilidade por meio de uma
capacidade critica, ética, reflexiva, visando à mudança ativa em si mesmo, em suas
vivencias e nas suas práticas (BRASIL, 2004; DELORS, 2003).
Saupe et al. (2005) afirma que saber-ser diz respeito ao saber ouvir e falar com
tolerância e respeito ao outro com suas diferenças e limitações, com vistas a interagir com
indivíduo e seu grupo através da empatia com troca de experiências.
Assim, o ser é um ser discursivo, isso não quer dizer que seja capaz de falar, mas
que tem a faculdade de articular o que compreende; essa compreensão é estudada pela
ontologia, que estuda o ser enquanto ser (HEIDEGGER, 1999; STEIN, 1988).
O dasein é ser-aí e o é o mundo: o mundo concreto, literal, real e cotidiano e
esse ser-aí não diz respeito somente às coisas e ao mundo, mas tamm ao ser-no-
mundo que ele próprio é (HEIDEGGER, 1999; STEIN, 1988).
Então, o homem esno mundo, com o mundo e pelo mundo, tornando-se capaz
de relacionar-se, de projetar-se nos outros, transcendendo, constituindo-se um ser de
relação (FREIRE, 1983).
Esse ser revela-se tanto em sua complexidade biológica quanto cultural. Diante
desse fato, o ser deve ser compreendido como sujeito de sua própria história na busca
incessante do conhecimento, estabelecendo o dlogo contínuo com as incertezas, que
78
possui três princípios: o cerebral, de que o conhecimento nunca reflete o real, pois ele é
apenas uma tradução; o sico, em que o conhecimento essujeito a interpretação; e o
epistemológico, em que não há verdade absoluta. A partir desses princípios, os homens
dialogam com a incerteza em que conhecer e pensar o se limita a chegar a uma
verdade absoluta (MORIN, 2003).
Porém, os homens pouco sabem de si e se inquietam por saber mais e, ao
reconhecer o seu pouco saber de si, questionam-se e se fazem problemas a eles
mesmos, pois, ao responderem suas respostas, surgem novas perguntas (FREIRE,
1987). Nesse processo de síntese e antítese, ocorre o anseio por libertar-se, o que
culmina no sofrimento, expresso por Freire (1987, p.35):
Sofrem uma dualidade que se instala na interioridade’ do seu ser.
Descobrem que, não sendo livres, não chegam a ser autenticamente.
Querem ser, mas temem ser. São eles e ao mesmo tempo são o outro
introjetado neles, como consciência opressora. Sua luta se trava entre
serem eles mesmos e serem duplos. Entre expulsarem ou não o opressor
de ‘dentro’ de si. Entre se desalienarem ou se manterem alienados. Entre
seguirem prescrições ou terem opções. Entre serem espectadores ou
atores. Entre atuarem ou terem a ilusão de que atuam na atuação dos
opressores. Entre dizerem a palavra ou não terem voz, castrados no seu
poder de criar e recriar, no seu poder de transformar o mundo.
O medo da liberdade ou o medo de assumi-la dificulta a visão do real e faz
perceber o que o existe, temem a liberdade e se refugiam na segurança oferecida; raro
o as pessoas que manifestam o medo da liberdade. A tendência da maioria é disfarçar
por meio de um jogo manhoso, ainda que inconsciente, em que tentam demonstrar um
sentimento de defesa da liberdade. Omitindo o verdadeiro sentimento de temor, a busca
da liberdade para recuperar a humanidade se faz por meio da tarefa de libertar-se a si e
aos opressores (FREIRE, 1987).
E por que os homens não se libertam? Freire (1987, p. 50) comenta que:
79
De tanto ouvirem de si mesmos que são incapazes, que não sabem nada,
que não podem saber, que o enfermos, indolentes, que não produzem
em virtude de tudo isto, terminam, por se convencer de sua ‘incapacidade’.
Falam de si como os que não sabem e do ‘doutor’ como o que sabe e a
quem devem escutar. Os critérios de saber que lhe são impostos são os
convencionais.
Os homens transformam-se em coisas e, coisificados e oprimidos, não conseguem
ultrapassar esse estado, pois ninguém liberta ninguém, os homens libertam-se em
comunhão e para isso precisam perder o medo de buscar a liberdade e quebrar esse ciclo
vicioso por meio do autoconhecimento (FREIRE, 1987).
Portanto, é indispensável que ocorra a tomada de consciência para dar início aos
questionamentos do ser na busca de sua compreensão interna, pois somente através da
compreensão individual seremos capazes de compreender o outro e o mundo; e
compreendendo poderemos nós libertar da opressão que assola o ser-aí.
Os documentos do Ministério da Saúde (BRASIL, 2004a; BRASIL, 2003) que
norteiam as competências que os Agentes devem possuir afirmam que o saber-ser
incorpora:
Interação com o indivíduo e coletividade;
Respeito ao senso comum com seus valores, culturas e o pensar saúde;
Postura ativa com busca de alternativas frente a situações adversas;
Frente a dificuldades e problemas em recorrer à equipe na busca de soluções;
Trabalhar em equipe na busca de práticas eficazes;
Senso ctico e responsabilidade social.
80
SABER CONHECER
A dimensão saber-conhecer compreende o domínio cognitivo representado pelo
conhecimento e capacidade de aprender, beneficiando-se das oportunidades oferecidas
ao longo da vida através da formação educacional ou da experiência (SAUPE et al, 2005).
O conhecer/aprender visa à aquisição e ao domínio de um repertório de saberes e
dos instrumentos de compreensão do mundo, em especial o profissional, através do
desenvolvimento da capacidade para comunicar-se e do aprender para conhecer,
exercitando a atenção, a memória e o conhecimento; favorecendo o despertar do sentido
crítico e reflexivo tão necessário para o fazer cotidiano (DELORS, 2003).
O repertório de conhecimento proposto pelo documento do Ministério da Saúde
(BRASIL, 2004) para a formação do Agente Comunitário de Saúde abrange três eixos
temáticos - papel do Agente no âmbito da equipe; promoção da sde e prevenção de
doenças; e promoção, prevenção e monitoramento das situações de risco ambiental e
sanitário; esses eixos têm o intuito de subsidiar o saber-fazer.
SABER FAZER
O saber-fazer faz parte do domínio psicomotor representado pela
habilidade/destreza, conhecimento tático que são necessários para as atividades
profissionais, contribuindo para o poder agir sobre o meio para a identificação de
problemas e de soluções de trabalho em equipe (BRASIL, 2004; DELORS, 2003; SAUPE,
2005).
Encontra-se associado ao saber-conhecer e ao saber-conviver por meio do
trabalho coletivo e do estabelecimento das relações interpessoais, em que se torna
importante ao trabalhador saber comunicar-se e resolver conflitos, ter iniciativa, intuição,
81
ter estabilidade emocional para o enfrentamento de problemas complexos, tornando-se
apto a enfrentar diversas situações e aprender a trabalhar em equipe (DELORS, 2003).
A comunicação dentro do saber-fazer representa o aspecto fundamental do
processo de trabalho do Agente que se apresenta sobre duas formas de agir:
(...) No agir comunicativo, encontramos o Agente Comunitário
estabelecendo relações no cotidiano da comunidade. Esse tipo de ação
possui normas que guiam os comportamentos dos sujeitos, membros de
um grupo social, que partilham valores comuns. No agir estratégico, o
Agente Comunitário pretende, usando conhecimentos técnicos
biomédicos, estimular a ação dos outros de acordo com interesses bem
definidos, seja desenvolvendo ações de promoção de saúde ou
prevenção às situações de risco sanitário. O agir estratégico tem por meta
atingir um fim, atender às determinações das políticas públicas de saúde.
Terá êxito ou fracassará se encontrar ou não os meios adequados para
conseguir realizar essa finalidade (SILVA et al.; 2008, p. 82-83).
O saber-fazer aponta a valorização das experiências vividas e a eleição de um
elenco de saberes necessários para a realização de atividades que se materializam
durante o momento assistencial em que novos valores são aflorados, como autonomia,
valorizão, engajamento, motivão, inovação e, principalmente, cooperação e
comunicação (BARROS; PINHEIRO, 2007).
No processo de saber-fazer do Agente Comunitário, a credibilidade e a confiança
o condições essenciais para as relações estabelecidas com a comunidade e a postura
ética representa o meio para inspirar essa credibilidade e confiança que os usuários
devem depositar neles, permitindo exercer o seu papel que, em grande parte, é
executado dentro do domicílio.
Partindo dessa assertiva, Fernandes et al. (2007) menciona que os ACS
necessitam de algumas características pessoais e qualidades individuais que favoreçam a
criação de vínculos e, para isso, devem ter suas ações permeadas por valores e
82
instrumentos, como a escuta qualificada, a comunicação, empatia, o cuidado, a
subjetividade, o desejo, a emoção, o toque, o tempo, a solidariedade, a compaixão, a
confiança, a ética, a espiritualidade e o transcender.
SABER CONVIVER
O saber-conviver, junto com o saber-ser, esincluído no domínio afetivo e diz
respeito a coordenar-se com os outros em todas as atividades humanas, aprendendo a
viver juntos, compreensão mútua, relacionando-se e, especialmente, respeitando as
experiências, valores, as limitações, o saber ouvir e falar (BRASIL, 2004; SAUPE, 2005;
DELORS, 2003).
Porém, essa tarefa de saber-conviver é árdua e representa um dos maiores
desafios, pois é da natureza humana supervalorizar as qualidades do seu grupo e ter
preconceito em relação ao outro; a única saída é a percepção da interdependência e o
fato de não vivermos sozinhos, isolados (DELORS, 2003).
O saber-conviver dos Agentes é estabelecido com a comunidade tendo como base
o conjunto de expectativas dos usrios, pois conforme Merhy (1997, p.120):
usuários que não m nenhum interesse de estabelecer uma relação
mais permanente com os trabalhadores de saúde, tanto que sempre que
se julgam doentes recorrem a serviços do tipo urgência e emergência e se
sentem bem com isto. outros que, se não puderem ir
frequentemente a um ser serviço e ter vínculos mais constantes com os
trabalhadores, não se satisfazem de jeito nenhum.
Então, essa relação profissional encontra-se pautada nas expectativas prévias que
irão gerar a satisfação com a assistência ou não, com conotação maior no caso dos
Agentes, pois essa relação é a base do papel do mesmo.
Os níveis de satisfação dos usuários estão associados à combinação de elementos
como um ideal de serviço, noção de serviço merecido, experiência passada e um nível
83
subjetivo da qualidade de serviço alcançado; assim, qualidade da assistência es
relacionada à satisfação desses elementos (TRAD et al., 2002).
Na saúde, todas as dimensões do saber, em especial o saber-fazer e o saber-
conviver, tomam uma proporção maior, pois a essência desse aspecto reside no processo
do cuidar; e no cotidiano do ACS o cuidar representa a alma dessa categoria.
5.3.3- PROCESSO EDUCATIVO - CURSO INTRODUTÓRIO
O trabalho e a educão são prinpios que acompanham o ser humano no
decorrer de sua existência. O conceito de educação significa a aquisição de
conhecimentos integrados e ampliados sobre a realidade, potencializando o raciocínio
humano e deve ocorrer de forma contínua e prolongada com dependência direta com a
motivação para aprender, resultando em processo de aprendizagem significativa para o
sujeito cujo ponto de partida deve ser aquilo que ele conhece e a meta do que se
pretende aprender, de forma que os profissionais tornem-se responsáveis pela sua
formação (BEZERRA, 2003). Assim, o processo educativo é permanente e os homens
o seres inacabados e sujeitos de sua própria educação
O cão e a árvore também são inacabados, mas o homem se sabe
inacabado e por isso se educa. Não haveria educação se o homem fosse
um ser acabado. O homem pergunta-se: quem sou? De onde venho?
Onde posso estar? O homem pode refletir sobre si mesmo e colocar-se
num determinado momento, numa certa realidade: é um ser na busca
constante de ser mais e, como pode fazer esta auto-reflexão, pode
descobrir-se como um ser inacabado, que está em constante busca. Eis
aqui a raiz da educação (FREIRE; 1987, p. 27).
Dessa forma, a estratégia saúde da família deve estar pautada na formão e
qualificação dos profissionais por meio da educação/aprendizagem significativa em que
os mesmos sintam-se valorizados e reconhecidos pelo seu trabalho de ajudar a
84
comunidade na definição das necessidades e direitos de saúde, contribuindo para o
empoderamento e capital social. Nesse sentindo, o primeiro passo para alcançar esse
objetivo é o curso introdutório (BRASIL, 2008).
A capacitação da equipe de saúde tem como marco inicial o Treinamento
Introdutório, depois chamado de Curso Introdutório, que antecede o início do trabalho dos
profissionais ou de forma concomitante em até três meses após a implantação da equipe,
objetivando a aproximão com os princípios operacionais da ESF, tais como a noção de
territorialidade/adscrição da clientela, diagnóstico e planejamento, processo de trabalho,
noção da família como foco das ações, princípios do SUS, funcionamento do sistema de
saúde local (BRASIL, 2001c; BRASIL, 2006b).
O treinamento introdutório deve ser realizado preferencialmente no município ou
região de atuação do profissional, proporcionando uma aproximação com a realidade
local nos aspectos demográficos, sociais, econômicos, ambientais e sanitários,
favorecendo uma compreensão maior dos indicadores de saúde pactuados na atenção
básica (BRASIL, 2001c).
Com a reformulação das diretrizes da ESF, o Curso Introdutório passou a ser de
responsabilidade da Secretaria de Estado da Saúde (SES) em parceria com a Secretaria
Municipal de Saúde (SMS) em municípios com a população inferior a 100 mil habitantes e
no caso de municípios com mais de 100 mil habitantes a situação inverte-se, a Secretaria
Municipal de Saúde é a responsável, podendo realizar parceria com a Secretaria de
Estado da Saúde (BRASIL, 2006b).
Após o treinamento introdutório, as equipes são inseridas em um processo de
educação permanente, para possibilitar o desenvolvimento constante de suas
competências e é de responsabilidade conjunta das SMS e das SES proporcionar essa
qualificação (BRASIL, 2001c; BRASIL, 2006b).
85
A educação deve ser vista como prática de transformação de objeto-sujeito para
sujeito-produto que é fruto do trabalho humano de sujeitos-Agentes num processo de
aprender a aprender de forma permanente (PAIM; ALMEIDA FILHO, 2000).
5.3.4- EDUCAÇÃO PERMANENTE
A população adscrita da equipe de saúde é dinâmica e, para atender as
necessidades de saúde, faz-se preciso um processo de capacitação e informão
contínuo e eficaz para gerar resolutividade de ões; e, para aumentar essa resolução, o
caminho encontrado é o processo de aperfeiçoamento profissional que tem a Educação
Permanente em Saúde como importante mecanismo de articular as necessidades dos
serviços de saúde, as possibilidades de desenvolvimento da educão dos profissionais,
a capacidade resolutiva e a gestão social sobre as políticas públicas de saúde por meio
da educação popular (BRASIL, 1997; BRASIL, 2004d; BRASIL, 2007c).
Para contemplar essa articulação, o Ministério da Saúde definiu uma política de
formação e desenvolvimento para o SUS por meio da aprovação de uma Política Nacional
de Educação Permanente em Saúde, que conceitua Educação Permanente como a
aprendizagem no trabalho em que ocorre a inter-relação entre o aprender e o ensinar,
incorporado ao cotidiano do trabalho e das instituições levando em consideração os
problemas reais cujo enfrentamento faz-se com a utilização dos conhecimentos e
experiências prévias dos profissionais; e que, por meio da problematização do processo
de trabalho, seja estruturada a formação e o desenvolvimento dos trabalhadores pautados
na realidade local das necessidades de saúde da população adscrita, ou seja, o
profissional deve ser resolutivo na sua localidade, transformando as práticas profissionais
86
e a organização do trabalho em aprendizagem significativa (BRASIL, 2004d; BRASIL,
2007c).
A Educação Permanente tem como fundamento a aprendizagem significativa que
diz respeito à aprendizagem motivada pelo desejo ativo dos membros da equipe pela
apropriação de novos saberes e práticas, que, por meio da vivência e/ou reflexão das
práticas do cotidiano, realizam o encontro entre o mundo de formação e o mundo do
trabalho, incorporando o diálogo aprender-fazer à rotina do dia-a-dia e coletivamente
problematizam e dialogam, produzindo, de forma contínua, as soluções para os
problemas, visando a enfrentar o grande desafio de produzir transformações nas
instituições de saúde com o intuito de aproximá-las a conceitos de atenção integral,
humanizada e com equidade (BRASIL, 2004e; BRASIL,2005a; CECCIM,2005).
Essa aprendizagem significativa leva os membros da equipe de saúde a
assumirem a construção de coletivos no trabalho e o processo de co-gestão, onde todos
o facilitadores das práticas de educação permanente e estimulados a compreender o
cenário e suas relações de trabalho a partir de questionamentos sobre o que, como, com
quem, para que e para quem, resultando na análise reflexiva sobre os cenários de saúde,
os atores e o processo de trabalho, agindo de forma autônoma, criativa e de poder
compartilhado em busca da (re) construção das relações dentro da equipe, entre equipes
e entre instituições (BRASIL, 2005a).
A aprendizagem significativa e coletiva dentro da gestão democrática rompe com o
modelo hegemônico centrado na figura do médico, uma vez que possibilita a produção de
novos acordos e pactos coletivos em busca do trabalho em equipe fundamentado na
interdisciplinaridade (BRASIL, 2005b).
O poder compartilhado possibilita a construção do processo de co-gestão com a
ampliação da aprendizagem significativa, em que as demandas para a capacitação não
87
o definidas apenas por necessidades individuais de atualização de conhecimentos, mas
coletivamente definidos por múltiplos elementos que tenham sentido para os sujeitos
(conhecimento, valores, relações de poder) baseados na problematização do processo de
trabalho de forma descentralizada, ascendente e transdisciplinar. Dessa forma, favorece o
compromisso, o desenvolvimento da capacidade de aprendizagem, a responsabilizão
com a população, o enfrentamento criativo das situações de saúde, a democratização e o
espírito de equipe com a socialização da informão e a intensa comunicação que são
questões fundamentais para a organização do trabalho em equipe pensado não de forma
isolada e sim como processo articulado em rede de pessoas (BRASIL, 2004e; BRASIL,
2005a).
Esse processo articulado resulta na noção de gestão colegiada, em que todos são
autores e atores da produção coletiva por meio das Rodas para a Gestão da Educação
Permanente em Saúde que representam espaços de diálogo e negociação entre os
membros da equipe de saúde e as instituições formadoras, colocando-os como
participantes de uma operação conjunta em que todos são protagonistas da
implementação da melhor e mais adequada ação (BRASIL, 2004d; BRASIL, 2004e).
Ceccim (2005) afirma que a educação permanente em saúde pode ser mais bem
compreendida pelos componentes do Quadrilátero da Formação, que ajudam a
compreender a Política Nacional de Educação Permanente em Saúde; a qual inclui os
seguintes componentes:
a) análise da educação dos profissionais de saúde: mudar a concepção hegemônica
tradicional embasada no paradigma flexneriano para uma concepção construtivista
baseada na problematização e contextualização, incentivando a produção de
conhecimentos;
88
b) alise das práticas de atenção à saúde: construir um novo fazer em saúde, tendo
em vista os desafios da integralidade, da humanização e da inclusão da participação
popular no planejamento das ações, inclusive terapêutica;
c) análise da gestão setorial: garantir a conformação de redes de atenção às
necessidades em saúde, considerando a avaliação de satisfação dos usrios;
d) análise da organização social: favorecer a participação popular nas ações da saúde
por meio da presença dos movimentos sociais na constrão coletiva do atendimento às
necessidades sociais por saúde.
O Quadrilátero da Formão marca o encontro da saúde com a educação através
da Educação permanente que propicia a ligação ornica entre ensino, trabalho e
cidadania; não ficando restrita apenas a uma prática de ensino-aprendizagem, mas a uma
política de educação na saúde, concebendo um ponto de intersecção entre educação e
saúde (CECCIM e FERLA, 2008).
Dessa forma, a Educação Permanente em Saúde passa a ser compreendida como
um espaço coletivo para a aprendizagem coletiva dentro de cada equipe, favorecendo
uma interface entre formação, produção de subjetividade e trabalho, visando ao
enfrentamento e solução dos problemas cotidianos, que são extremamente dinâmicos e
construídos histórica e socialmente. Esse espaço de gestão de coletivo pode ser
traduzido como uma oportunidade para produzir uma escuta pedagógica em sde,
buscando o diálogo e interação entre os atores profissionais, gestão e população ,
potencializando e ampliando a capacidade de enfrentamento e resolução dos problemas
no constante movimento de interação em que esse atores se sintam convocados à
criação, à abertura e ao coletivo (BRASIL, 2005b; CECCIM e FERLA, 2008).
89
A Política Nacional de Educação Permanente em Saúde contempla os princípios e
diretrizes do SUS articulados à Atenção Integral à Saúde e a Cadeia do Cuidado
Progressivo à Saúde na rede do SUS, considerando a construção de uma rede de
cuidados organizados de forma horizontal, contemplando a poliárquica, rompendo com a
hierarquização vertical dos recursos, das tecnologias e alocação dos profissionais,
visando a contemplar a integralidade e a resolutividade dos processos de atenção à
saúde, garantindo a efetivação do controle social e da produção e disseminação de
conhecimento. Essa cadeia do cuidado progressivo deve ser compreendida como a ideia
de rede com a articulação de todos os serviços de saúde de forma contextualizada e
reconhecendo as histórias de vida como meio para assegurar o adequado acolhimento e
responsabilização pelos problemas de saúde das pessoas e das populações com vistas à
humanização dos serviços de saúde (BRASIL, 2004d; BRASIL, 2007c; BRASIL, 2004e).
A qualificação dos profissionais de saúde é objeto do Ministério da Saúde para a
efetivação da política nacional de saúde que será alcançado por meio da constituição de
Pólos de Educação Permanente em Saúde para o SUS (esferas interinstitucionais e
locorregionais/rodas de gestão) com a elaboração de propostas e projetos que
contemplem mudança na educação técnica, na graduação, nas especializações, nas
residências ou outras estratégias de s-graduação, como mestrado; desenvolvimento
dos trabalhadores e dos gestores de saúde; envolvimento com o movimento estudantil da
saúde; produção de conhecimento para a mudança das práticas de sde e de formação,
bem como a educação popular para a gestão social das políticas blicas de saúde
(BRASIL, 2004d; BRASIL, 2007c).
Dentro da estratégia de qualificação, a formação dos trabalhadores de nível técnico
é um componente decisivo para fortalecer e aumentar a qualidade do setor da saúde, que
pode ser justificado tendo em vista o papel dos trabalhadores de nível técnico no
90
desenvolvimento das ações e serviços de saúde por meio do contato mais intenso e com
laços de comunicação mais estreitos com as demandas da população associado ao fato
de serem referência para a comunidade assistida (BRASIL, 2007c; BRASIL, 2004e).
6- ATRIBUIÇÕES DO AGENTE COMUNITÁRIO DE SAÚDE
No tocante ao papel desempenhado pelo Agente, a primeira abordagem se faz
presente no Manual do Agente Comunitário elaborado em 1991 e revisto em 1994 no livro
intitulado: “O trabalho do Agente Comunitário de Saúde”, que foi divulgado em documento
oficial (Brasil; 1994b, p.26-27) onde suas ações e papeis estão assim descritos:
Servindo de elo entre a comunidade e os Serviços de Saúde, ele auxilia as
pessoas e os serviços na:
Promoção e proteção de saúde;
Identificação de situações de risco individual e coletiva;
Educação para a conquista da saúde;
Acompanhamento e encaminhamento de doentes às unidade de saúde;
Notificão aos serviços de saúde das doenças que necessitam de
vigilância.
[...] exemplos de atividades que ele vai realizar:
Cadastrar famílias;
Estimular a participação comunitária;
Analisar, com os demais membros da equipe de saúde, as necessidades da
comunidade;
Registrar nascimentos e óbitos ocorridos;
Atuar, junto com os serviços, nas ações de controle das doenças
endêmicas.
A Portaria nº. 1886 GM/MS, de 18 de dezembro de 1997, estabelece as primeiras
atribuições básicas que estão relacionadas ao conhecimento da área (cadastramento,
diagnóstico comunitário, mapeamento, definição do perfil sócio-econômico);
acompanhamento e monitoramento (diarreias, infecções respiratórias agudas,
hanseníase, tuberculose e outros), prevenção de doenças e promão da saúde com
91
priorização de grupos populacionais (crianças, gestantes, puérperas, hipertensos,
diabéticos, tuberculose e outros); ações educativas e estimulação da participação
comunitária (BRASIL, 1997b).
A Lei 11.350 sintetiza as atividades do Agente, considerando sua área de
atuação: realizar visitas domiciliares para monitorar situações de risco, promover ações
educativas individual e coletiva, realizar o diagnóstico da comunidade por meio da
utilização de instrumentos, planejar as ações através do registro sistemático, estimular a
participação comunitária nas políticas públicas com o fortalecimento do elo (BRASIL,
2006d).
Para realizar essas atribuições, os Agentes Comunitários de saúde utilizam
instrumentos como a entrevista, a visita domiciliar, o cadastramento das famílias, reuniões
comunitárias e mapeamento que auxiliam no conhecimento das necessidades das
pessoas que vivem na microárea sob a sua responsabilidade (BRASIL, 1994b).
Para garantir a qualidade do cuidado prestado às famílias cadastradas por equipe
e seus respectivos moradores, o documento regulamentador de Brasil (2006e) afirma que
esse número deve ser de no máximo 4.000 habitantes, sendo em dia recomendada
3.000, e no que se refere aos Agentes Comunitários devem ser em número suficiente
para cobrir 100%, com um máximo de 750 pessoas por ACS e de 12 Agentes por equipe
de saúde da família.
Na Portaria nº. 648, que aprova a Política Nacional da Atenção Básica e revoga
todas as portarias anteriores, define-se como atribuições específicas do Agente
Comunitário de Saúde, enquanto integrante da equipe de saúde: desenvolver ações que
integrem a equipe e a comunidade; trabalhar com as famílias cadastradas na micrrea e
manter o cadastro atualizado; estar em contato permanente com as famílias sob sua
responsabilidade através do acompanhamento das visitas domiciliares; desenvolver
92
ões educativas individuais e coletivas; atividades de promoção da saúde, prevenção
das doenças, vigilância à saúde, mantendo a equipe informada principalmente a respeito
daquelas com situação de risco (BRASIL, 2006e).
O Agente é a extensão do olhar da equipe além dos muros da unidade,
identificando as condições de vida das famílias e necessidade de um cuidado de outros
profissionais. Porém, devido ao papel de ponte comunidade-equipe, ocorre uma distorção
das atribuições do Agente, levando à sobrecarga, que todas as atividades que devem
ser desenvolvidas nas famílias e na comunidade são atribuídas unicamente ao Agente,
levando a sofrimento (SILVA; DALMASO, 2002; TOMAZ, 2002).
Cabe ressaltar o papel comunitário do Agente, que representa um referencial
para a comunidade não apenas nas questões da unidade de saúde, mas como
estimulador da organização comunitária, objetivando à conquista do verdadeiro exercício
de cidadania (SILVA et al., 2008).
Diante dessas considerações, conclui-se que o Agente possui uma situação
peculiar, uma vez que reside obrigatoriamente na área de atuação, o que faz com que
compartilhe o cotidiano da comunidade com maior intensidade do que os outros membros
da equipe. Associado a este fato, o ACS visita frequentemente os domicílios dos usuários,
fazendo-se necessária a construção de metodologias que garantam a privacidade
daqueles com quem o Agente se relaciona no tocante às informões pessoais sobre a
saúde individual e familiar e também a necessidade de competências e saberes que o
instrumentarão na implementação das ações em saúde (FORTES; SPINETTI, 2004).
93
6.1- CUIDAR: A ESSÊNCIA DO SER
Cuidar representa uma atitude que deve ser realizada e, especialmente, estimulada para
que ocorra em todo contato com o outro e seja presente em todos os atos, abrangendo
não exclusivamente momentos de atenção, zelo e de desvelo, e sim uma
responsabilização, preocupação e envolvimento com o outro, com uma demonstração de
empatia. Isso abrange o modo de ser, ser-com-o-outro e principalmente ser-no-mundo
fundamentando, dessa forma, todas as relações que estabelecemos com todas as coisas
(BOFF, 2004).
O cuidado pode ser compreendido como atenção, dedicação, carinho e cautela.
Sendo assim, o ato de cuidar significa a ação do cuidado por meio de servir, perceber o
outro como é, oferecer ao outro a assistência de forma individualizada (BRASIL, 2008b).
Para ilustrar a importância do cuidar, BOFF (2004, p. 34) comenta que:
(...) Quer dizer, o cuidado se encontra na raiz primeira do ser humano,
antes que ele faça qualquer coisa. E, se fizer, ela sempre vem
acompanhada de cuidado e imbuída de cuidado. Significa reconhecer o
cuidado como um modo-de-ser essencial, sempre presente e irredutível à
outra realidade anterior. É uma dimensão frontal, originária, ontológica,
impossível de ser totalmente desvirtuada.
Assim, a essência do ser humano pode ser representada pelo cuidado, somos
criaturas iminentemente cuidadoras, pois colocamos cuidado em tudo o que projetamos e
fazemos, sendo uma característica peculiar do homem e, por essa razão, necessitamos
tamm de sermos cuidados, já que quem cuida também precisa ser cuidado (BOFF,
2004).
O processo central do ser humano é representado pelo cuidar compreendido no
aspecto coletivo, cultural e social, uma vez que transmuta o outro, transcendendo-o, indo
94
além de nós mesmos, pois mesmo quando o homem vivencia o adoecer ele está
intercomunicado com os outros e com o mundo (BRASIL, 2005b).
O ser cuidador deve possuir qualidades como conhecimento, paciência,
honestidade, confiança, humildade, esperança e, acima de tudo, coragem, aliados ao fato
de que cuidado é um ideal ético e transformativo, que, para cuidar, é preciso
compreender a realidade do outro, envolver-se, sentir com o outro, entrar na estrutura
referencial do outro, pois quando compreendemos a realidade do outro é que
poderemos conhecer as suas necessidades e aju-lo a crescer (WALDOW, 2007).
Nesse aspecto, o ACS encontra-se em situação privilegiada, que comunga a realidade
do outro, identificando-se com o ser a ser cuidado.
O cuidar da saúde implica, além de competências, habilidades, mas, acima de
tudo, é necessário estar preparado e disponível para o diálogo. Dessa forma, o cuidado
transcende a mera assistência física e contempla as questões emocionais, o contexto
social e a história de vida (BRASIL, 2008; BRASIL, 2005b).
Esse homem, em sua condição básica de ser-no-mundo, desenvolve-se,
estabelece relações com-o-outro, com-o-mundo, agindo e reagindo em suas
possibilidades existenciais. Assim, o ser-no-mundo relaciona-se com o ser-com-os-outros.
Então, não há um ser sem mundo, da mesma maneira que não há ser sem o outro ser; e
isso se expressa pelo cuidar das coisas e o ser-com-os-outros pelo cuidar dos outros,
constituindo a relação fundamental entre os homens (HEIDEGGER, 1999; HEIDEGGER,
1981; STEIN, 1988).
Esse cuidar do outro é realizado por um ser humano, no sentido da palavra
humano, pois cuidar é próprio do ser, já que a função do cuidador ultrapassa as
atividades drias e tem como intuito maior zelar pelo bem-estar no acompanhamento e
95
no auxílio da pessoa a ser cuidada, escutando-a, sendo solidária, atuando como elo entre
a pessoa, família e equipe de saúde (BRASIL, 2008b).
Corroborando, Boff (2004, p. 96) afirma que Este modo de ser-no-mundo, na forma
de cuidado, permite ao ser humano viver a experiência fundamental do valor, daquilo que
tem importância e definitivamente conta.
O cuidar dos outros pode ter, então, duas direções: a de assumir o cuidado do
outro subtraindo seus cuidados de uma forma inautêntica de coexistir; e a de ajudar o
outro a conquistar o seu autocuidado de uma forma autêntica de coexistir, desvelando o
ser em si mesmo; os homens são capazes de cuidar de si por meio da identificação e
satisfação de suas necessidades, pois todo homem possui na natureza dele o cuidado
(HEIDEGGER, 1999; WALDOW, 2007).
Autenticidade do ser refere-se a manter o ser que ele é, do ser próprio, do ser-no-
mundo, impondo-se como tal. Na existência inautêntica, o homem se entende a partir do
que ele não é, busca realizar aquilo que ainda não realizou e, muitas vezes, é desviado
do caminho existencial, deixando de se tornar ele mesmo e se tornando o que os outros
desejam (HEIDEGGER, 1999).
Esse vivenciar do homem marca a sua existência, ao projetar-se em sua condição
básica de ser-no-mundo, desenvolve-se, estabelece relações com-os-outros, agindo e
reagindo na autenticidade ou na inautenticidade do seu ser (HEIDEGGER, 1999).
O homem é um ser aberto ao ser, um ser que compreende o ser, um ser-com-os-
outros que revela aos outros, revelando-se a si mesmo. Esse modo de proceder com os
outros refere-se à forma como me relaciono, atuo, sinto, vivo com os meus semelhantes e
esse relacionar-se significa cuidar, que representa a estrutura fundamental do ser-aí
enquanto ser-no-mundo e define o ser enquanto ser (HEIDEGGER, 1999; STEIN, 1988).
96
O cuidar representa a estrutura fundamental do ser, que se torna livre através do
cuidado autêntico, um ser sem cuidado é um ser não livre, pois, através do cuidado,
manifestamos a nossa relação de ser-uns-com-os-outros, permitindo o ser-no-mundo que
é a essência do ser que se completa na relação com o outro (WALDOW, 2007).
Para Heidegger (1981), o mundo não significa o universo físico, mas as condições
geográficas, hisricas, sociais e econômicas em que o indivíduo está imerso; que, na
vida cotidiana, o ser o se refere ao mundo desinteressado, neutro, mas está junto ao
mundo, tomado pelo seu mundo, não se reduzindo a um simples estar presente, uma vez
que o mesmo necessita se projetar. Dessa forma, o homem é o projeto e as coisas do
mundo o projeções humanas, portanto está no mundo, envolvendo-se, transformando o
mundo e, ao fazê-lo, forma e se transforma a si mesmo; trata-se de uma projeção no
mundo, do mundo e com o mundo, de modo que o eu e o mundo são inseparáveis.
Então, para compreender uma coisa, faz-se necesrio ter vivido, experimentado,
pois ser no mundo diz respeito às maneiras que o existir humano espossibilitado a
viver, a poder viver e aos vários modos como se relaciona e atua com os outros, o ser-
com-os-outros (HEIDEGGER, 1999; HEIDEGGER,1981; STEIN, 1988).
A experiência do vivido se mostra em si mesmo e revela-se através do discurso e
do silêncio. Por meio da dimensão cotidiana dos sujeitos, percebemos os fenômenos
ônticos como tudo é percebido, entendido - e os aspectos ontológicos que dão sentido
ao ser, o modo de ser da presença; ontologia refere-se ao estudo do ser enquanto ser e a
história do ser rege toda a condição e situão humana (HEIDEGGER, 1999; STEIN,
1988).
97
6.2- O SABER-FAZER DO AGENTE COMUNITÁRIO
O saber-fazer refere-se a habilidades e técnicas do Agente. Nesse sentido, o
Ministério da Saúde (BRASIL, 2000) comenta que é preciso ficar atento a quatro verbos
importantes no trabalho do Agente que refletem a maioria das ões contidas nos
instrumentos utilizados:
Identificar- a primeira ação é identificar os problemas de saúde das famílias, incluindo os
fatores socioeconômicos, culturais e ambientais que estão afetando a saúde da
comunidade. Para essa atividade, é preciso ouvir e reconhecer fatores de risco e sinais de
alerta de determinadas doenças.
Encaminhar- uma vez identificadas as condições que necessitam de intervenção, é
preciso encaminhar, que significa conduzir, enviar para a unidade de saúde, realizando
uma ligação comunidade/equipe para atingir esse objetivo com eficiência.
Orientar- constitui a ação realizada diariamente, sendo a pedra angular do cuidar
prestado à comunidade e estimular a vivência da cidadania.
Acompanhar- significa assistir e cuidar das pessoas e famílias que estão em situação
de risco, como gestantes, crianças, adolescentes, hipertensos, diabéticos; representando
uma ão muito gratificante por meio dos resultados alcançados visualizados pela
melhoria da qualidade de vida e das condições de saúde.
Além dos quatro verbos que constituem o alicerce do trabalho, existem outros
verbos fundamentais no trabalho, que podem ser agrupados em:
Comunicação - ouvir, conversar, observar.
Cuidado - cuidar, notificar, ajudar, atender, estimular o autocuidado, co-
responsabilidade pela saúde.
Mobilização comunitária - estimular, convencer, mobilizar, convocar, convidar, reunir.
98
ão/Reflexão - agir, defender, reagir, refletir.
Na implementação do saber-fazer nas atividades cotidianas do Agente, que resulta
no conhecimento da área e avaliação da saúde, são utilizadas ferramentas que
representam instrumentos que norteiam o trabalho diário, facilitando o conhecimento das
pessoas e famílias adscritas, como a visita domiciliar, cadastramento das famílias,
mapeamento, atividades educativas que proporcionam o diagnóstico comunitário
(BRASIL, 2000).
É importante ressaltar que, durante o processo de execução das ações, o Agente
enfrenta resistências tanto dos profissionais quanto da comunidade, limitando a vivência
do seu papel de mobilizador. Com relação ao âmbito dos profissionais, existe a
hierarquização do saber associada às relações de poder dentro da equipe e, quanto à
comunidade, existe o conflito do saber popular e o saber cientifico/biomédico; levando o
Agente a ser um estrangeiro nos dois mundos, passando a não pertencer a nenhum deles
(SILVA et al, 2008).
Cabe destacar que, nesse fazer cotidiano, os ACS acabam por suportar uma carga
excessiva de atividades, responsabilidades aliada ao fato de ser o depositário de
expectativas do gestor e da população assistida. Tais expectativas, quando não são
atendidas, passam a ser fonte de insatisfação e desmotivação tanto para o profissional
quanto para o gestor e, especialmente, para a população (NOGUEIRA, 2002).
6.3- CONHECIMENTO DA ÁREA / AVALIANDO A SAUDE
6.3.1- VISITA DOMICILIAR - INSTRUMENTO DE APROXIMAÇÃO E CONHECIMENTO
99
A Visita Domiciliar é um instrumento de aproximação com a população adscrita e
facilitador da identificação das necessidades, objetivando a busca da excelência do
cuidado em saúde; é uma atribuição comum a todos os profissionais da equipe, com
maior valor para o Agente Comunitário, que tem como uma das atribuições específicas o
acompanhamento mensal de todas as famílias e indivíduos cadastrados na sua microárea
por meio de visita domiciliar. Quando necessárias, as visitas podem ser repetidas de
acordo com a existência de situações determinantes e/ou quando a equipe considerar
necessário (BRASIL, 2006b; BRASIL,1997).
Isso posto, a visita domiciliar possibilita ao profissional conhecer a realidade de
vida e saúde do usuário e das famílias sob sua responsabilidade, com vistas a identificar
as condições sociais, epidemiológicas, condições de saúde, relações intrafamiliares,
subsidiando o planejamento da assistência, pois permite conhecer os recursos familiares
disponíveis no fazer saúde individual e coletivamente (TAKAHASHI e OLIVEIRA, 2001).
A família passa a ser a unidade central da prática dos Agentes e o domicílio é
compreendido como o local privilegiado de reconhecimento e desenvolvimento de ações à
saúde da família, que permite perceber as relações sociais e a dinâmica familiar, bem
como os aspectos religiosos e culturais que favorecem ou dificultam o processo de
adoecer e morrer (MANDÚ et al., 2008).
Dentre as atividades realizadas pelo Agente Comunirio de Saúde, a mais
importante é a Visita Domiciliar, pois favorece a integração Agente-comunidade,
garantindo a manutenção da sde, ão essencial da equipe de saúde. Dessa maneira,
as visitas podem ser programadas ou voltadas ao atendimento de demandas
espontâneas conforme a identificação de situações de risco ou critérios epidemiológicos
(BRASIL, 1997a; BRASIL, 1998).
100
No desenvolvimento da visita, o Agente utiliza tecnologias (conjunto de saberes e
competências aplicadas a determinada atividade) chamadas de leves que se referem às
relações interpessoais, permitindo e potencializando a organização do trabalho centrado
na produção de compromisso por meio da interação, escuta e do olhar que se referem a
um jeito ou atitude própria do profissional e tamm utiliza a tecnologia leve-dura, em que
a parte dura é representada pela técnica e parte leve significa o modo próprio que cada
trabalhador utiliza ao aplicar acnica (BRASIL, 2005c).
O acompanhamento das famílias através da visita domiciliar tem por objetivos
(BRASIL, 2000; BRASIL, 1997a; BRASIL,1998):
Acompanhar e monitorar a situação de saúde das famílias.
Conhecer os principais problemas de saúde das pessoas.
Conhecer as condições socioeconômicas, os hábitos, as crenças, os costumes, os
valores.
Estimular o cuidado em saúde.
Identificar as famílias que precisam de um acompanhamento mais próximo e mais
freqüente.
Estimular as ações promocionais e preventivas e orientar a utilização correta de
medicamentos.
O documento do Ministério da Saúde (BRASIL, 2000) sugere algumas situações,
em que se faz necessária a repetição da visita pelo Agente:
Recém-nascido com baixo peso ao nascer (menos de dois quilos e meio).
Criança desnutrida.
Recém-nascido que não está sendo amamentado.
Criança com doenças graves.
101
Criança com vacinação atrasada.
Gestantes com problemas de saúde.
Outras pessoas com problemas de saúde.
Comunicantes de doenças transmissíveis.
Famílias isoladas por barreiras geográficas, culturais.
Visita puerperal na primeira semana de vida da criança.
A visita é uma forma de entrada consentida na intimidade do outro e da sua família
e, para essa finalidade, a presença do profissional e o registro dos dados devem ser
autorizados e, para melhorar o aproveitamento e aumentar a efetividade das ações e a
realização da visita domiciliar, deve seguir alguns passos - planejamento, execução,
registro de dados e avaliação (AMARO, 2003).
O documento do Ministério da Saúde (BRASIL, 2000) direciona essa atividade com
algumas sugestões de metodologia:
Ao chegar ao domicílio, solicitar permissão para entrar e se pode ser recebido naquele
momento - licença! Posso entrar?; perguntar o nome da pessoa que atendeu ou
chamá-la pelo nome caso já conheça, demonstrando uma forma de interesse.
Informar aos moradores o motivo da visita – cadastramento ou acompanhamento – e a
importância.
No caso de cadastramento, é importante uma apresentação inicial: diga seu nome,
qual o seu trabalho, a importância que ele tem, o motivo da sua visita.
Escolha um bom horário e defina o tempo de duração da visita, tendo sensibilidade
para identificar se as pessoas querem ou não conversar mais um pouquinho.
Valorize os costumes, as crenças, o modo de ser, os problemas e sentimentos dos
membros da família, conquistando a confiança e respeito.
102
Todas as informações que lhe são repassadas são confidenciais e devem ser
mantidas em sigilo, por questões éticas.
Explique o motivo das perguntas, a importância e para que elas vão servir.
A entrevista é uma oportunidade para ensinar, aprender e levar as pessoas a
pensarem em novas maneiras de cuidar de sua saúde.
Verifique se conseguiu as informações necessárias, vendo o que deu certo na visita,
para poder corrigir as falhas. Isso é importante para planejar as próximas visitas.
Durante a realização das visitas, aspectos como atenção dedicada aos membros
da família, a conversa, o direito de ser ouvido, respeito e o comprometimento profissional
com ações humanizadas são valorizados, gerando bem-estar (MANDÚ et al., 2008).
Alguns aspectos durante a realizão das visitas devem ser considerados, como:
(1) a duração da visita, que representa o tempo cronológico e também o tempo
emocional, considerando as tecnologias produtoras de relações de interação, intercessão,
respeito e confiança com as famílias traduzidas pelo acolhimento; (2) formação de vínculo
e autonomia com responsabilidade; e (3) evitar que o tempo cronológico interfira no tempo
emocional (SAKATA, 2007).
Corroborando com as prescrições do Ministério da Saúde, Takahashi e Oliveira
(2001) descrevem que a técnica de visita domiciliar é formada por etapas:
Planejamento
Inicia-se com processo de seleção segundo critérios definidos visita de
acompanhamento das famílias ou retorno; a seguir estabelecer o trajeto e o tempo gasto
nele, determinar a duração da visita de acordo com o objetivo da visita;
Execução
103
Durante a realização da visita, o Agente deve identificar-se, falar sobre o objetivo da
visita, ser cortês, evitando condutas extremistas formalidade e intimidade; a seguir
estabelecer o diálogo com os membros, observar a dinâmica familiar, realizar orientação e
encaminhamento.
Registro de dados
Explicar o motivo e a importância da anotação, destacando a questão ética com a
garantia do sigilo; realizar anotação.
Avaliação do processo
O processo avaliativo é fundamental para o planejamento da assistência à família
visitada.
Para a implementação desse instrumento, o Agente deve ter a capacidade de
autodisciplina para a observação, a habilidade para a entrevista e ética para a escuta da
história da família (AMARO, 2003).
Marasquin et al. (2004) comentam que a visita domiciliar apresenta algumas
vantagens e desvantagens. Dentre as vantagens, pode-se mencionar a presença do
profissional na resincia, proporcionando um processo de educação em saúde ao grupo
familiar; o conhecimento da realidade domiciliar; melhor relacionamento família-
profissional devido ao fato de ser sigiloso e menos formal; o favorecimento da liberdade
para expor os mais variados problemas. As desvantagens apontadas são as dificuldades
de acesso; a limitação dos encontros devido ao horário de trabalho e os afazeres
domésticos que podem impossibilitar ou dificultar a sua realização; a falta de um tempo
maior para o atendimento, seja pela locomão ou pela execução da visita.
Outro aspecto que merece ser destaque são as repercussões do contato
permanente e intenso que o Agente estabelece com as famílias, as pessoas e suas
demandas de apoio e de suporte aliado ao contato direto com o sofrimento, emoções,
104
sentimento e conflitos, pois cuidar implica envolver-se e identificar-se com o outro, o que
resulta em vulnerabilidade dos Agentes às doenças; além da vivência cotidiana de fatores
estressantes, frustrações e sentimento de impotência diante da realidade que gera
doenças, em especial as manifestadas psicologicamente (CAMPOS, 2005).
Nessa vertente, Reis et al. (2007) afirmam que a visita domiciliar favorece o
estabelecimento de vínculo/responsabilização com os usuários em busca da autonomia
na produção de cuidados. Entretanto, esse vínculo e o contato intenso com a realidade
das famílias e o sofrimento vivenciado pelas mesmas pode levar esses trabalhadores a se
afastarem dos usuários na tentativa de se defender das dores, sofrimentos e anstias,
uma vez que as famílias depositam as suas esperanças e anseios na equipe, que, na
maioria das vezes, encontra-se em situação de impotência diante de demanda social,
transitando entre dois extremos: o de que pode curar tudo e o de que não pode fazer mais
nada.
A criação de vínculo que o Agente favorece é fruto de uma construção social e
permite que a experiência do cuidado seja uma prática do cotidiano com a co-
responsabilização do sujeito, promovendo uma atenção baseada no acolhimento, pois o
Agente traduz para a equipe, por meio da visita domiciliar, a realidade da comunidade e
seus modos de vida, extrapolando a mera questão da doença. Também realiza o caminho
inverso, traduz para a comunidade o funcionamento e os serviços prestados pela equipe,
desempenhando, dessa forma, o relevante papel de intérprete de símbolos culturais,
como a interpretação cnico-científico-biomédica (SILVA et al., 2008).
105
6.3.2- CADASTRAMENTO DAS FAMÍLIAS
O cadastramento das famílias, realizado durante as visitas domiciliares, fornece
dados sobre os membros familiares e suas morbidades referidas, condições de moradia,
saneamento, utilização dos meios de comunicação, transporte, serviço de sde e
relações comunitárias, proporcionando o levantamento das condições de saúde da
comunidade, que é chamado de diagnóstico comunitário/local. Isso tem como ganho
secundário a oportunidade de conhecer cada recanto e cada morador, iniciando, assim, a
formação do vínculo do Agente com essas famílias adscritas. Esses dados levantados
junto às famílias fornecem informações importantes para organizar e planejar as ações de
saúde (BRASIL,1997a; BRASIL,1998).
Durante o cadastramento, é preenchida a Ficha A, que permite a coleta de dados
sobre faixa etária, sexo, número de indivíduos em cada residência, condição de saúde de
cada morador. O cadastro da família e/ou indivíduo é realizado quando a família/pessoa
chega à comunidade, e perde seu cadastro quando muda desse local, constituindo um
movimento chamado migração. Essas informações permitem à equipe conhecer o perfil
demográfico por faixa etária e sexo, perfil sócio-econômico, condições de vida, morbidade
da população, número de nascimentos, mortes e internações, subsidiando o planejamento
das ações de saúde (BRASIL, 2000; BRASIL, 2003a).
A atualização dos dados dessa ficha como nascimento, mortes, gestação,
condições de moradia e condições sanitárias, mudanças de ocupão, etc., devem ser
realizadas sempre que tiver a ocorrência das mesmas (BRASIL, 2003a).
O Agente Comunitário cadastra todas as famílias por meio do preenchimento da
Ficha A, a seguir essas informações são consolidadas compondo o Sistema de
Informão de Atenção Básica - SIAB e o Sistema de Informão do Programa de
106
Agentes Comunitários de Saúde SIPACS, juntamente com a utilização de outras fichas
Ficha B - Acompanhamento domiciliar dos grupos prioritários para monitoramento; Ficha
C - Cartão da Criança; Ficha D - registro das atividades, procedimentos e notificação
(BRASIL, 2003a; BRASIL, 2000).
6.4- FERRAMENTAS DO FAZER DO AGENTE - INSTRUMENTOS DE COLETA DE
DADOS
As informões colhidas pelos Agentes Comunitários através de fichas de
cadastramento e acompanhamento geram relatórios de consolidação dos dados que
possibilitam o controle e avaliação das ões e serviços por meio de um abrangente
Sistema de Informão da Atenção Básica SIAB - idealizado para agregar e para
processar essas informações sobre a população visitada de forma confiável para
programar e reprogramar ações locais, adequando-as à realidade local com vista à
melhoria da qualidade dos serviços prestados (BRASIL, 2003a; BRASIL, 2002a).
Esse sistema de informação é formado por fichas de acompanhamento
preenchidas pelos Agentes Comunitários de saúde durante as visitas domiciliares e
tamm registro de atividades e notificações preenchidas por todos os profissionais da
equipe, todos os dias, o que gera as fichas de consolidação dos dados e relatórios de
acompanhamento e avaliação (BRASIL, 2003a; BRASIL, 2000). As fichas de instrumentos
de coleta de dados preenchidas pelo Agente são:
Cadastramento das famílias - Ficha A.
Acompanhamento domiciliar dos grupos - Ficha B.
o acompanhamento de gestantes - Ficha B-GES;
o acompanhamento de hipertensos - Ficha B-HA;
107
o acompanhamento de diabéticos - Ficha B-DIA;
o acompanhamento de pacientes com tuberculose - Ficha B-TB;
o acompanhamento de pacientes com hanseníase - Ficha B-HAN;
Acompanhamento de crianças - Ficha C (Cartão da Criança).
Registro de atividades, procedimentos e notificações - Ficha D.
FICHA B- FICHAS PARA ACOMPANHAMENTO DOMICILIAR
As fichas do grupo B (B-GES, B-HA, B-DIA, B-TB e B-HAN) o utilizadas para o
acompanhamento domiciliar dos grupos prioritários para monitoramento que necessitam
de atenção especial, pois são passíveis de ações preventivas e assistenciais, evitando,
dessa forma, complicações. O Agente deve mensalmente acompanhar e atualizar os
dados destas fichas, que devem ser revistas periodicamente pela equipe; e sempre que o
Agente cadastrar um caso novo deve discutir com os demais membros da equipe o
acompanhamento do mesmo (BRASIL, 2003a; BRASIL, 2000).
FICHA C- FICHA PARA ACOMPANHAMENTO DA CRIANÇA
A Ficha C é representada pela cópia do Cartão da Criança que se encontra na
posse da família, sendo o instrumento utilizado para o acompanhamento da criança
menor de cinco anos, servindo de base para o planejamento das ões em saúde da
criança (BRASIL, 2000; BRASIL, 2003a).
108
FICHA D- FICHA PARA REGISTRO DE ATIVIDADES, PROCEDIMENTOS E
NOTIFICAÇÕES
A ficha D é utilizada por todos os profissionais da equipe de saúde para o registro
diário das atividades e procedimentos realizados, além da notificação de algumas
doenças ou condições que são objetos de acompanhamento sistemático (BRASIL, 2000;
BRASIL, 2003a).
6.5- DIAGNÒSTICO DE SAÚDE E DA COMUNIDADE
O diagnóstico de saúde com a análise situacional da comunidade constitui-se a
primeira etapa do planejamento e deve envolver toda a comunidade em parceria com a
equipe de saúde dentro de uma abordagem intersetorial, considerando que a saúde deve
ser concebida como qualidade de vida com vários fatores condicionantes e
determinantes, tais como saneamento, educação, moradia, emprego, abastecimento de
água, lazer, dentre outros (BRASIL, 2000). A abordagem intersetorial corresponde à
ruptura das barreiras de comunicação que dificultam o diálogo entre os setores e deve
buscar uma unidade de fazer comum e de agir compartilhado que está associado à
vinculação, reciprocidade e complementaridade na ação (MENDES, 1999).
O diagstico deve ser realizado em parceria com a comunidade, buscando um
planejamento participativo num processo coletivo de identificação, seleção, priorização e
análise dos problemas, recursos e necessidades. O Agente Comunitário de Saúde é um
informante-chave desse processo, pois, além de ser da própria comunidade, conhecedor
da realidade local, ele tamm realiza o cadastramento das famílias, mapeamento da
área e estabelece o diálogo com a comunidade assistida, iniciando o planejamento das
109
ões concebidas de maneira conjunta equipe-comunidade, favorecendo o envolvimento
mútuo (BRASIL, 2000).
Trata-se do processo de conhecimento da comunidade adscrita da equipe de
saúde, compreendendo algumas ações, como o processo de territorialização, com o
conhecimento do território-solo e do território-processo; o cadastramento das famílias com
o preenchimento da Ficha A pelo Agente; o levantamento de problemas da comunidade; a
classificação das famílias por grau de risco sanitário; e o perfil epidemiológico da
população (MINAS GERAIS, 2007).
Esse diagnóstico de saúde e da comunidade proporciona vários dados
indispensáveis para o conhecimento da área de abrangência, como o demográfico,
socioeconômico, características da comunidade, situação de saúde e sistema de saúde,
que subsidiarão as ações de saúde com a identificação de áreas de risco e situações de
risco (BRASIL, 2000).
As áreas de risco são locais que possuem situações de risco, indicadores de saúde
desfavoráveis e/ou barreiras geográficas ou culturais que dificultam ou impedem o acesso
e a acessibilidade aos serviços de saúde. Esse enfoque de risco leva ao estabelecimento
do princípio da equidade, com o tratamento desigual aos desiguais, atenção maior para
quem tem o risco maior de adoecer e morrer ou que estão sujeitos a situações de maior
risco, favorecendo o destino maior de recursos para onde mais problemas. Risco,
nesse contexto, deve ser entendido como a probabilidade de alguém ou grupo
populacional sofrer um dano em sua saúde (BRASIL, 2000a; MENDES, 1992).
O diagnóstico deve ser realizado em parceria com a comunidade, identificando a
real situação e os problemas a serem enfrentados de forma coletiva, pois esse momento
representa a essência do planejamento ascendente, que tem início a vel local -
equipe/comunidade - até o nível central - secretaria de saúde (BRASIL, 2000).
110
O documento de trabalho do Agente Comunitário (BRASIL, 2000) menciona as
etapas que devem ser realizadas durante o diagnóstico comunitário:
1. Definição dos objetivos – o que se procura conhecer;
2. Estabelecimento das informações ou dados a serem conhecidos, a exemplo das
características da comunidade, organização administrativa, perfil sociodemográfico,
recursos sociais, sistema sanitário;
3. Identificação das fontes de dados – fonte primária e/ou secundária, informantes chaves,
escolha dos métodos e das técnicas e, se necessário, elaboração de instrumentos de
coleta de dados;
4. Coleta de dados;
5. Análise e interpretação dos dados coletados, identificação dos problemas,
necessidades, recursos necessários para o enfrentamento, e áreas e/ou grupos de risco;
6. Estabelecimento das prioridades com critérios definidos com a comunidade;
7. Documentação dos problemas prioritários com análise de causa e consequência,
facilitando o enfrentamento.
Essas atividades requerem conhecimento, decisão, integração entre os membros e
a comunidade com atualizão permanente.
6.5.1- TERRITORIALIZAÇÃO - MAPEAMENTO DA COMUNIDADE
A Estratégia Saúde da Família fundamenta suas atividades na territorialidade por
meio do conhecimento e da apropriação do território-solo, que pode ser representada
através de um mapa da área de abrangência com o desenho dos lugares, como as ruas,
casas, pontos comerciais, igrejas, barreiras geográficas, escolas, lixões, serviços de
saúde e, especialmente, as microáreas de risco (BRASIL, 2000).
111
O território-solo é compreendido como espaço sico definido por critérios
geográficos e políticos, com uma visão estática que não acompanha as mudanças
contínuas do território, superfície fixa (MENDES, 1992; MENDES, 1993; MINAS GERAIS,
2007).
O mapeamento da área do Agente Comunitário proporciona o conhecimento da
área física, as características socioeconômicas e sanitárias, recursos sociais, barreiras
geográficas de acesso à unidade de saúde, identificação das áreas que precisam de mais
atenção, subsidiando o planejamento das ões do próprio Agente e de toda a equipe
(BRASIL, 2000).
O Manual dos Agentes Comunitários de Saúde (BRASIL, 2000) menciona alguns
cuidados na confecção dos mapas, como manter a noção de distância, reproduzindo no
mapa, de forma reduzida, o que existe na comunidade, devendo ocupar no desenho o
espaço daquilo que representa e também a não de direção, com a localização
adequada dos pontos cardeais.
O Agente Comunitário deve levar em consideração também o conceito de território-
processo que representa mais que uma superfície geográfica, é um território pulsante de
vidas, conflitos e interesses que estão em constante construção e reconstrução,
acompanhando a dinâmica social, representando um território econômico, político, cultural
e sanitário onde ocorre o cruzamento dos usuários com os sujeitos das práticas de saúde
(MENDES, 1992; MENDES, 1993; MINAS GERAIS, 2007; PEDROSA; PEREIRA, 2007).
O processo de territorialização resulta na apropriação do território e caracterização
da comunidade e de suas necessidades, criando uma relação de responsabilidade em
que os atores sociais se transformam em autores do processo numa lógica voltada à
saúde, possibilitando a definição da área de abrangência, a divisão da região em áreas
menores, conhecimento da realidade, subsidiando o planejamento ascendente e
112
participativo e em que emergem as preocupões da população que se transformam em
proposições (MENDES, 1992; MENDES, 1999; MINAS GERAIS, 2007; PEDROSA;
PEREIRA, 2007).
Essa apropriação do território resulta no processo de gestão participativa, com o
compartilhamento do poder e da responsabilidade pelo enfrentamento das necessidades
de saúde e dos seus determinantes e condicionantes, desencadeando a mobilização
social e a consolidação de espaços de interlocução em busca da ressignificação do direito
à saúde, favorecendo o planejamento participativo (PEDROSA; PEREIRA, 2007).
6.6- PLANEJAMENTO LOCAL
A realidade social é dinâmica e está, permanentemente, em mudança e é
conformada por diferentes atores sociais que, de acordo a sua inserção e posição social,
enxergam e percebem a realidade de diferentes formas, bem como possuem distintos
projetos de vida (MATUS, 1997).
Todos nós somos responsáveis por mover ou arrastar a realidade para onde
queremos, mas, ao mesmo tempo, somos inconscientemente arrastados na direção que
não desejamos, tornando condutores conduzidos. Dessa forma, a única maneira de tentar
submeter o curso dos acontecimentos à vontade humana e tratarmos de ser condutores
de nosso próprio futuro é por meio do Planejamento (MATUS, 1997).
O planejamento é uma ferramenta das lutas permanentes que o homem trava
desde o início da humanidade para conquistar graus crescentes de liberdade, pois, a
partir do momento em que transformamos variantes em opções, passamos a decidir e
conduzir o nosso futuro, já que quando o homem não conhecia o fogo, não tinha liberdade
de escolher entre o frio e o calor, quando o descobre pode optar. Negar o planejamento é
113
negar a possibilidade de escolher o futuro, é aceitá-lo seja ele qual for, abdicando da
principal liberdade humana que é tentar decidir para onde queremos chegar e como lutar
por nossos objetivos, uma vez que o futuro, para acontecer, não depende de ninguém, ele
se constrói dia a dia incessantemente (MATUS, 1997).
Planejar é tentar submeter à nossa vontade o curso encadeado dos
acontecimentos cotidianos e esse processo depende do conhecimento da situação atual
para ser definido a que se pretende chegar. Dessa forma, o diagnóstico local constitui-se
a etapa precursora realizada continuamente e de maneira dinâmica em parceria com a
comunidade, pois as atividades da equipe devem refletir as reais necessidades de saúde
(BRASIL, 2000a; BRASIL, 1997; OLIVEIRA, 1999; MATUS, 1997).
O planejamento deve ser permanente e participativo, tendo como pressuposto
fundamental o fato de que quem realiza o planejamento deve estar imerso na realidade
sobre a qual se planeja, ou seja, deve estar contextualizado e relacionado com os outros
atores. As pessoas implementam melhor as ações quando conhecem as razões e esse
fato ocorre quando participam de sua elaboração (BRASIL, 1997; OLIVEIRA, 1999).
O processo de planejar requer um modo de pensar que envolve indagações; e
indagações envolvem questionamentos sobre o que fazer, como, quando, quanto, para
quem, por que, por quem e onde, sendo que a sua maior riqueza está no processo e não
no fim. Assim, deve ser concebido de forma integral e direcionado aos problemas
identificados no processo de territorialização e passíveis de resolução da equipe com o
intuito de melhorar as condições de saúde e qualidade de vida (BRASIL, 1997; MATUS,
1997; OLIVEIRA, 1999).
Nesse sentido, é preciso que esse enfoque de planejamento contribua para a
construção cotidiana do futuro, transformando-se num instrumento capaz de ajudar a
mudar uma situão. Um planejamento que não se reduza à produção de planos e
114
programas enquanto apenas documentos, mas um planejamento estragico, que se
constitua num processo que oriente e possa desencadear a mudança, envolvendo o
pessoal do serviço e a população, para que se tenha uma chance de influir na realidade
(MATUS, 1997).
Vale salientar que o planejamento é assumido como processo contínuo que
necessita de fluxos constantes de informações, análise, cálculo técnico e político para
apoiar nas decisões, no processo de intervenção. Além disso, deve ter um caráter duplo,
isto é, abranger desde a preparação dos planos até o acompanhamento e avaliação das
ões, necessitando de uma revisão contínua de objetivos, prioridades e ações (MATUS,
1997).
O planejamento tem como projeto de interveão os problemas de saúde de uma
dada população, considerando a posição dos distintos sujeitos na delimitação, definição e
exploração dos problemas, cujo resultado será decorrente do processo de negociação
e/ou confronto entre os distintos modos de entender o processo saúde-doença em sua
dinâmica social e histórica (MATUS, 1997; BRASIL, 2000a).
Mendes (1999) e Matus (1997) conceituam problema como a discrepância entre a
realidade constatada e uma realidade objetiva, representando uma divergência entre o
pode ser do deve ser, levando a um incômodo. Em consequência, o problema de saúde é
entendido como a representação dos atores de necessidades de saúde derivadas das
condições de vida percebidas no confronto da realidade com a meta proposta.
Por outro lado, o planejamento estratégico elege instrumentos flexíveis, criativos,
que possam dar conta do dinamismo e das frequentes transformações da realidade
implicando num processo descentralizado de planejamento, na medida em que o
planejamento não se constitui num ato separado da ação, devendo envolver todos os
atores em situação, inclusive a população alvo (BRASIL, 1997).
115
6.7- PROGRAMAÇÃO DAS ATIVIDADES
As informações obtidas durante o processo de territorializão, diagnóstico e
planejamento subsidiam a programação das atividades, direcionando o plano de trabalho
da equipe, possibilitando a otimização dos recursos e de tempo, servindo de guia para o
processo contínuo de avaliação da equipe, considerando sempre a dinamicidade da
comunidade cuja programão deve acompanhar esse dinamismo (BRASIL, 2000a).
O documento do Ministério da Saúde intitulado Cadernos de Atenção Básica
(BRASIL, 2000a) aborda que a programação deve conter:
os problemas priorizados, já tendo sido identificados no momento do diagnóstico local;
os objetivos a serem atingidos, de acordo com as necessidades da população e as
possibilidades da equipe;
as atividades a serem realizadas e o detalhamento de sua realização;
as metas a serem atingidas, que representam os objetivos quantificados;
os recursos necessários para a realização das atividades;
o tempo que será despendido com tais atividades, de acordo com um cronograma de
trabalho e os resultados esperados.
6.8- AÇÕES EDUCATIVAS
A ão educativa é a mola mestra do trabalho do Agente, pois proporciona um
momento de troca de informões e o compartilhamento de saberes profissional-
comunidade, proporcionando um processo de aprender e ensinar e favorecendo a criação
de vínculos entre assistência à saúde e o pensar e o fazer da comunidade (BRASIL,
2000a; VASCONCELOS, 2007).
116
Esse compartilhamento de saberes deve pautar-se no saber-ignorância em que
não saber nem ignorância absoluta, e sim um processo de relatividade, Freire (1983,
p.29) afirma que
Por isso, não podemos nos colocar na posição do ser superior que ensina
um grupo de ignorantes, mas sim na posição humilde daquele que
comunica um saber relativo a outros que possuem outro saber relativo. (É
preciso saber reconhecer quando os educandos sabem mais e fazer com
que eles também saibam com humildade).
Nessa vertente, as práticas educativas vivenciadas pela equipe dizem respeito à
própria essência da palavra vivenciada que deriva de vivenciar, que ocorre no coletivo,
pois não vivência apenas no âmbito individual, dessa maneira as práticas educativas
o realizadas em grupo, devendo ser concebidas, gestadas e desenvolvidas em
parceria.
Esse processo de trocas interpessoais, com o intuito de promover saúde, ocorre
tanto nas atividades formais como em reuniões educativas e visitas domiciliares quando
no contato cotidiano e nos eventos sociais, já que o diálogo é o instrumento utilizado para
estreitar os laços de comunicação profissional-comunidade, proporcionando a criação de
vínculo e a explicitação e a compreensão do saber, seja popular ou científico,
fundamentando, assim, a Educação em Saúde, que objetiva superar o fosso entre esses
saberes (VASCONCELOS, 2001; VASCONCELOS, 1999).
A Educação em Saúde representa o campo de interlocução do saber científico dos
serviços de saúde e o saber popular do pensar e fazer cotidiano da população,
constituindo-se num processo pedagógico em que os homens, de forma participativa,
fomentam formas coletivas de aprendizagem, em que os mesmos tornam-se atores,
saindo da passividade, contribuindo para uma ação educativa contextualizada em que a
117
comunidade passa a ser o sujeito de sua própria história (VASCONCELOS, 1999;
VASCONCELOS, 2001).
A educão não deve ser compreendida como mero elemento da Atenção Primária
à Saúde, e sim como sólida base para que as pessoas e comunidade assumam o controle
sobre sua saúde e suas vidas (VASCONCELOS, 1999).
A valorização do saber e dos valores da comunidade permite um processo ativo de
problematização, em uma discussão aberta sobre os problemas cotidianos em busca de
soluções; deixando de ser meramente uma atividade a mais no serviço de saúde,
passando a ser uma ão orientadora das práticas executadas em consonância com a
vida dos membros população, em que os mesmos deixem de ser atores subalternos e
explorados para serem sujeitos ativos (VASCONCELOS, 2007).
A lebre frase de Freire (1987, p 68) Ninguém educa ninguém, ninguém educa a
si mesmo, os homens se educam entre si, mediatizados pelo mundo representa a
essência da educação em saúde, que não se faz de A para B ou de A sobre B, mas de A
com B, sempre relacionada ao contexto e fundamentada na educação problematizadora
que se faz num esforço permanente através do qual os homens vão percebendo,
criticamente, como estão sendo no mundo, com que e em que se acham (FREIRE, 1987).
Pode-se perceber que o processo educativo não se resume meramente à
transferência de conhecimento, mas a um processo criativo de possibilidades para a
produção e criação de saberes, uma vez que a educação em saúde se faz de forma
simbiótica, pois quem ensina acaba aprendendo ao ensinar e quem aprende ensina ao
aprender. As pessoas aprendem em comunhão na vida cotidiana, os homens se
encontram enquanto homens no fazer, no falar, no trabalho, na ação-reflexão (FREIRE,
1987; FREIRE, 1996).
118
O processo de educação em saúde também contribui para a formação de
profissionais comprometidos com as questões sociais por meio do engajamento ativo com
a comunidade com vistas à construção da autonomia dos indivíduos, das famílias e dos
grupos sociais. Para alcançar esse objetivo, são utilizadas ferramentas como a reflexão
crítica, o diálogo e a construção compartilhada do conhecimento entre a cultura popular e
científica (PEDROSA, 2007).
A educação em saúde representa um conjunto de saberes e práticas formais ou
informais que ocorrem no fazer-saúde, funcionando como um instrumento cujo objetivo é
a educação, e o objeto de ação é o problema de saúde. Aqui, os indivíduos da
comunidade são os principais responsáveis por seu enfrentamento e resolução, mas, para
isso, é imprescindível que ocorra a tomada de consciência que deve se iniciar por meio do
diálogo em um ato constante de reflexão-ação com autonomia, resultando na mudança do
estado de doença para o estado de saúde (VASCONCELOS, 2001).
A tomada de consciência inicia-se com o fato de reconhecermos que somos seres
históricos e, portanto, inacabados, e que vivemos em uma realidade dialética que também
é igualmente inacabada; a consciência dessa inconclusão nos leva a um permanente
movimento de busca em direção ao estar no mundo, estar com o mundo e com os outros
(FREIRE, 1987; FREIRE,1996).
O processo educativo representa um ato de amor, pois podemos educar quando
somos capazes de amar os seres inacabados, pois quem não ama não compreende o
outro, não o respeita e não busca a comunicação (FREIRE, 1983).
Freire (1996, p.58) afirma que:
É na inconclusão do ser, que se sabe como tal, que se funda a educação
como processo permanente. Mulheres e homens se tornaram educáveis
na medida em que se reconheceram inacabados.Não foi a educação que
fez mulheres e homens educáveis, mas a consciência de sua inconclusão
é que gerou sua educabilidade.É também na inconclusão de que nos
119
tornamos conscientes e que nos inserta no movimento permanente de
procura que se alicerça a esperança.
Esse movimento permanente de procura vem de encontro com a capacidade de
aprender que significa (re) construir, mudança, muito mais do que repetir a lição dada;
essa superação do processo de aprender não se faz no ato de repetição, mas no de
produzir e de transformar o pensar em ação e comunicação; esse pensar não se faz pelo
outro nem para os outros, nem sem os outros e sim com o povo como sujeito de seu
pensar (FREIRE, 1987; FREIRE, 1996; FREIRE, 1983).
O processo de aprender não ocorre de forma bancária em que o educando é um
depositário de saber e sim de forma problematizadora através de uma constante captação
e compreensão do mundo, uma vez que a realidade é dinâmica; essa captação do mundo
é facilitada pelo agente comunirio de sde que realiza a interligação saber popular
saber científico intermediado através das ações educativas (FREIRE, 1987).
O Agente realiza suas ões educativas de forma individual e/ou coletiva em vários
espaços, seja no domicílio ou na unidade de saúde. Na forma coletiva, a educação em
saúde é chamada de reunião educativa realizada pelo Agente Comunitário com duração
mínima de 30 minutos e participação de 10 pessoas no mínimo e tendo como meta
disseminar informações de saúde, contribuir para a organização comunitária e ajudar a
comunidade a estabelecer estragias de superação dos problemas comunitários,
reconhecendo o saber/poder popular como peça chave para a transformão social
(BRASIL, 2003; CARVALHO, 2007).
O compartilhamento do conhecimento científico com o senso comum permite,
através de diversos olhares, a aprendizagem por meio da interatividade e cooperação,
objetivando a construção da autonomia dos sujeitos envolvidos nas relações de
construção do saber (CARVALHO, 2007).
120
7- TRABALHO EM EQUIPE - FAZER COMPARTILHADO / AÇÕES COLETIVAS
O trabalho em equipe teve início na década de 1970 com a presença de vários
profissionais de diferentes formações nas unidades de saúde. Com a criação do
Programa Saúde da Família, a equipe multiprofissional deixou de ser um aspecto
administrativo e passou a ser o alicerce da efetivação da estratégia de reorganização da
atenção básica. A saúde passou a ser compreendida como produção social, necessitando
de vários olhares para ver o indivíduo em toda a sua totalidade, que representa a
integralidade vista como um conjunto de valores morais e éticos (GOMES et al., 2007).
Faz-se necessário, nesse contexto, definir o termo equipe, que, segundo Honorato e
Pinheiro (2007, p.87),
No cotidiano de determinado território, a ‘equipeé um conjunto de atores
engajados em determinada ão, socialmente constitutiva e constituinte
de outras ações. A equipe só existe em função do trabalho, da atividade
que realiza. Assim, ela se constitui como o corpo de profissionais
envolvidos na realização da tarefa.
Essa equipe deve pautar suas ações no princípio da integralidade, que contempla o
conceito de cuidado visto como ação integral e integrada em uma área de comunhão de
vários saberes e fazeres de atores diferentes em busca da produção de ações em saúde
com a superação da visão cartesiana, fragmentada, da justaposição dos diferentes
profissionais e fragmentação do cuidado presente no cotidiano dos serviços de saúde
(BONALDI et al., 2007).
O cuidado ao ser humano deve ser revelado em toda a complexidade, pois o
homem tem dupla entrada: a entrada biofísica (totalmente biológica) e a entrada
psicossociocultural. Essas duas entradas remetem uma à outra, uma vez que estão
interligadas, devendo ser compreendidas como um todo, além de necessitar da
compreensão de que o conhecimento das partes liga-se ao conhecimento do todo e que o
121
conhecimento do todo liga-se ao conhecimento das partes, pois os fenômenos referentes
ao ser humano são multidimensionais e apresentam-se de forma solidária e conflituosa,
necessitando de uma abordagem complexa e completa (MORIN, 2003).
Para garantir o princípio da integralidade, é primordial o estabelecimento do
respeito profissional entre os membros, incorporando a contribuição de todos com o
estabelecimento de rotinas e evitando dois grandes eqvocos: o de que os profissionais
devem ser subalternos ao médico e o de confundir o trabalho do Agente Comunitário com
o auxiliar de enfermagem (BRASIL, 2000a).
Na construção da integralidade, o Agente encontra-se na posição de elemento
integrador de partes serviço e comunidade como canal de comunicação, articulando
escuta e fala, resultando na construção de um território comum baseado na flexibilização
dos saberes e das práticas de saúde que buscam a transformação de relações e atitudes
dos sujeitos envolvidos, consolidando o sistema de saúde local (SILVA et al., 2008).
A compreensão e a intervenção no processo saúde-doença necessitam de um
trabalho em equipe, uma vez que a realidade é complexa e apenas uma ação
interdisciplinar é capaz de enfrentar os problemas contextualizados. Essa ação supõe a
possibilidade de um profissional se encontrar na prática do outro e ambos transformando-
se para a intervenção dessa realidade complexa, cuja soma compõe a equipe
interdisciplinar ( ARAUJO; ROCHA, 2007).
A superação do paradigma cartesiano deve basear-se na noção do agir em
concerto por meio da orquestração do trabalho em equipe com respeito às
individualidades e responsabilidades de cada profissão, reforçando o sentimento de
pertencimento à equipe, rompendo as fronteiras do saber especializado e/ou campo de
atuação, não restringindo nem se encerrando em nenhum trabalhador especifico e sim no
122
reconhecimento do saber do outro para a realização do trabalho que fundamenta o
alicerce de um trabalho em equipe (BONALDI et al., 2007).
Esse agir em concerto leva a uma responsabilidade coletiva e um saber/fazer
comum resultando em que:
Desta forma, cada trabalhador é responsável por todas as ações da
equipe. A orquestração do trabalho em saúde, ao harmonizar as
diferentes práticas, ao produzir o sentimento de pertencimento à equipe e
de comprometimento com o outro, ressalta essa dimensão política, a da
responsabilidade por todas as ações. (...) Assim, a responsabilidade
coletiva afirma um compartilhar, um saber/fazer comum, no qual erros e
acertos são processos acionados nos coletivos (BONALDI et al.; 2007, p.
63).
O documento do Ministério da Saúde (BRASIL, 2005c) comenta sobre o modo-
equipe de trabalhar definido como a forma com que os profissionais se re-arranjam para
assistir uma pessoa/família/grupo de forma holística, transformando-se em um tecido de
relações entre diferentes saberes, poderes, classes sociais, possibilitando um permanente
movimento de construção/desconstrução/reconstrução por meio de momentos de maior
interação de trabalho e vida, (des) articulação, (de) ânimo, criação e invenção, (não)
saber, confiança, estranhamento, cooperão, visando à finalidade comum: o cuidado.
A responsabilidade coletiva resulta em gestão coletiva com cooperação e
confiança, possibilitando a construção de um laço de união, em que a ausência da
confiança e a rotatividade dos profissionais resultam em fragmentação do fazer,
interferindo na qualidade da assistência, que trabalhar em equipe requer o
gerenciamento de um saber comum que está orientado por valores éticos que alicerçam
as escolhas coletivas (BONALDI et al., 2007).
O trabalho em equipe resulta na escuta do outro, com o estabelecimento de um
canal de comunicação ativo, fundamentado na inter-relação pessoal de forma intensa que
pode ocasionar conflitos que vão estar presentes no dia-a-dia, uma vez que a equipe é
123
formada por indiduos que possuem especificidades como gênero, inserção social, visão
de mundo, experncias anteriores, motivação, interesses individuais que exercem
influências direta ou indiretamente no processo de trabalho. Esse conflito deve favorecer
a reflexão sobre o processo de trabalho chamado problematizão que permite a troca e
o movimento de ideias, compreensão e decisão (ARAUJO; ROCHA, 2007; BRASIL,
2005c). Os membros da equipe devem estar em sintonia entre si, uma vez que
desempenham uma função primordial para a população, que é a tarefa de cuidar e
escutar o outro, exercendo assim o papel de
(...) servir de depositário das angústias e incertezas, sem tomar para si a
vida e a decisão que é do outro (aquele que está sendo cuidado) (...) A
equipe pode ‘emprestar’ seu corpo, constituindo-se como lócus onde os
usuários podem colocar suas dúvidas, angústias e dores. Quando faz
isso, a equipe pode também ser capaz de absorver essas aflições e de
devolvê-las de outro modo: processadas, tal como as mães que recebem
dos filhos solicitações e desconfortos, processam e devolvem ao bebê
algo diferente, acalento, tolerância, compreensão, respeito ao momento
do filho (BRASIL; 2005c, p.99).
Essa escuta do outro aproxima os membros da equipe, tornando-as responsáveis
umas pelas outras, pois a escuta es relacionada à compreensão de expectativas e
sentidos, das expressões e gestos, captar as mensagens do interlocutor, indo além da
mera audição que diz respeito à compreensão apenas de vozes e sons audíveis. Essa
escuta favorece o trabalho em equipe, facilitando o fazer cotidiano com as famílias,
levando ao estreitamento dos vínculos (REIS et al., 2007).
O fazer em saúde resulta na relação entre os profissionais na busca contínua de
novos conhecimentos, levando a interdisciplinaridade - inter-relação e interação entre as
disciplinas, ou seja, relação com o outro na busca do novo - que constitui um fator de
transformão e liberdade dos profissionais na busca do diálogo, rompendo as barreiras
entre os campos de conhecimento e as pessoas (MARTINI; MEIRELLES, 2006).
124
A diversidade de contextos exige também a diversidade de respostas com a
pluralidade de modelos cuja resposta encontra-se no retorno da visão integral, da visão
holística que representa a essência da interdisciplinaridade, a qual compreende que
(...) ser interdisciplinar é saber que o universo é um todo, que dele
fazemos parte como fazem parte do oceano as suas ondas. Num
momento a própria substância oceânica se encrespa, se agita, toma forma
e se dilui sem jamais ter-se do seu todo separado ou ter deixado de ser o
que sempre foi (FERREIRA; 1999, p.20).
Portanto, podemos compreender interdisciplinaridade como ato de troca, de
reciprocidade entre os saberes com a exposição de uma visão de mundo, já que a
realidade é complexa, necessitando de vários pontos de vista, uma vez que sempre
teremos compreendido uma parte do todo, pois ninguém é portador da verdade absoluta,
apenas de forma relativa, necessitando da troca de olhares entre os profissionais através
do diálogo (FERREIRA, 1999).
A interdisciplinaridade realiza o encontro dos seres num certo fazer por meio da
direcionalidade para compreensão do objeto por meio da comunicão e relacionamento,
que deve funcionar como sinfonia em que todos os elementos são fundamentais, sem
hierarquia de importância e sim com a integração dos elementos, ultrapassando a
fragmentação do homem e a mutilação do ser e do conhecimento (ASSUMPÇÃO, 1999;
FERREIRA, 1999a).
A comunicação dentro da equipe de saúde deve acontecer por meio de uma rede
dialógica, proporcionando aumento da capacidade de criação e transformação com mais
autonomia, sempre em um processo de composição não apenas como reunião de
indivíduos, mas como uma política de coletivo, com uma dimensão mais ampla do fazer
saúde (BARROS; BARROS, 2007).
125
A Estratégia Saúde da Família é o caminho para a quebra da divisão do processo
de trabalho em busca da responsabilização pela comunidade e humanizão das práticas
de saúde na superação da equipe como agrupamento de profissionais. Porém, para
alcançar esse objetivo, a condição imprescindível é a equipe como integração de
trabalhos e articulação em uma nova dimensão, que é a interdisciplinaridade na busca da
transdisciplinaridade com o intuito de proporcionar uma relação recíproca de comunicação
e interação. Esse novo fazer admite a diversidade de ação, buscando a inter-relação de
fazeres profissionais com a passagem de um trabalho apenas individual para uma ão
coletiva (ARAUJO; ROCHA, 2007; HONORATO e PINHEIRO, 2007).
A transdisciplinaridade ultrapassa a interdisciplinaridade, que esta promove a
construção de um objeto comum com a contribuição de diferentes disciplinas, formando
uma área de interseção, e na transdisciplinaridade ocorre a produção de interferências
entre as disciplinas, buscando uma unidade do saber com inter-relação e um efeito de
intercessores entre os saberes e os sujeitos no contínuo movimento dialético de
construção e reconstrução (HONORATO e PINHEIRO, 2007; ASSUMPÇÃO, 1999).
8- ASPECTOS ETICOS
O trabalho do Agente Comunitário enquanto conjunto de ações de natureza diversa
que se articula e se integra entre si, pautando-se nos aspectos éticos; constituídos a base
de uma visão crítica da realidade e o norte das ações dos seres humanos.
Diante da importância da ética, faz-se necessário dar significância à palavra ética,
que durante a história da humanidade foi (re) formulada por diversos autores.
A palavra ética originou-se do vocábulo grego ETHOS, que, inicialmente,
significava assentamento, vida comum, toca do animal ou casa humana, posteriormente
126
foi acrescido de outros significados como hábito, temperamento, caráter, modo de pensar;
passando a ser associado ao significado de Caráter com valores e atitudes, construindo
pessoal e socialmente o ambiente humano que deve ser cuidado (GERMANO, 1993;
BOFF, 2004).
Rios (2001) afirma que o domínio do Ethos é o da moralidade, do estabelecimento
de deveres, sendo que o Ethos representa a casa do homem, e o espaço do Ethos é o
espaço humano, que é construído e re-construído diariamente de maneira incessante,
cujo domínio é o da moralidade, do estabelecimento de deveres e de significação das
ões.
Esse espaço humano - Ethos - encontra no cuidado a identificação da essência do
ser humano que ordena as relações com os outros e com o mundo por meio de valores,
princípios e inspirações (BOFF, 2001; BOFF, 2004).
Dessa maneira, o Ethos passa a compreender a morada do ser, modo de ser, os
valores, os costumes e expressar-se nos comportamentos que caracterizam uma cultura,
um grupo profissional que se pauta em valores, em que cada sociedade possui ou se
compõe por um conjunto de ethos que confere caráter à mesma, definindo os papeis
sociais (GELAIN, 1998; RIOS, 2001).
O Ethos, enquanto palavra, deu origem ao adjetivo ético, que passou a designar
um grupo de virtudes humanas e a Ética é a ciência que estuda essas virtudes, levando à
reflexão acerca do comportamento prático, procurando ver de forma aprofundada os
valores, problematizando e dando significância e consistência. Entretanto, a tarefa da
ética é traçar um caminho para orientar a conduta dos homens, mas não lhe cabe
determinar o comportamento de cada homem, haja vista que o mesmo é um ser ativo,
produtor ou criador (GERMANO,1993; RIOS, 2001). Diante disso, Gelain (1998, p. 20)
comenta que
127
O pensamento contemporâneo, sobretudo a reflexão filosófica da
existência, tem dado muita importância ao sentido de ‘ethos’ como
‘morada do ser’ e à Ética, o sentido de busca da ‘morada do ser’, busca
da situação originária’, do ‘berço ontológico do ser’ (conjunto das
potencialidades a partir das quais o ser deve crescer e se realizar). Esta
visão de Ética resume todo um esforço de situá-la como uma
preocupação pela realização das pessoas a partir de suas potencialidades
originárias.
As atividades dos trabalhadores da equipe de saúde o são apenas direcionadas
pelos saberes, métodos e técnicas provenientes de suas respectivas profissões, mas
tamm por uma imensidão de valores que fundamentam as práticas na direção do
conceito de ética. A integralidade representa esse referencial ético de trabalho na
construção e transformação da saúde coletiva a partir de um fazer em rede, produzindo o
cuidar em saúde, em que o fazer de um inscreve seus atos no fazer do outro, formando
uma área de interface (GOMES et al., 2007; LOUZADA, RONALDI E BARROS, 2007).
A ética acaba traçando um caminho que pode orientar a conduta dos homens nas
diversas situações; e, na esfera profissional, surge a Bioética com os aspectos relativos à
concepção, à qualidade de vida e à morte com ênfase ao uso adequado de tecnologias e
da enfrentamento dos dilemas morais, baseando-se suas reflexões em princípios éticos
comuns (GELAIN, 1998; FORTES e MARTINS, 2000), como:
Autonomia - tem amplo significado, incluindo os direitos, a privacidade e as opções
individuais com capacidade de escolha livre de restrições externas. A tomada de
decisão deve ser livre e esclarecida, sempre fundamentada em informações
necessárias para aceitar ou recusar alguma atividade;
Beneficiência - dever de fazer o bem e a promão de atos de benevolência, como
bondade, gentileza; e também a obrigação de não fazer o mal;
Confidencialidade - relaciona-se ao conceito de privacidade, garantia do sigilo ou
segredo das informações que, por sua natureza, deve ser conservado oculto;
128
Duplo efeito - justifica moralmente algumas ações que podem produzir efeitos tanto
benéficos quanto maléficos;
Fidelidade - cumprimento das promessas com o dever de ser fiel aos próprios
compromissos;
Justiça - casos semelhantes com tratamento igual;
o maleficiência - não inflingir o mal, assim como impedi-lo e remove-lo;
Direito à informão - a informação é a mola mestra do processo decisório;
Paternalismo - limitação intencional da autonomia de outros indivíduos justificada pelo
apelo à beneficiência ou bem-estar ou suas necessidades de uma outra pessoa;
Respeito às pessoas - estende-se além de aceitar a noção ou atitude de que as
pessoas têm a opção autônoma de tratarem as outras de modo a possibilitar-lhes
fazer escolhas;
Santidade da vida - a vida compreendida como maior bem;
Veracidade - a obrigação de dizer a verdade e não mentir ou enganar as outras
pessoas.
Fortes e Martins (2000) comentam que o Agente Comunirio, durante o exercício
de suas atividades, deve compartilhar com a equipe algumas informações sobre a
população acompanhada, necessitando discernir quais dados pode compartilhar e
observando com atenção princípios como privacidade e confidencialidade. A privacidade
diz respeito à intimidade, vida privada em que os moradores decidem quais informões
podem ser compartilhadas ou não e observando sempre o direito da confidencialidade,
garantindo a manutenção do segredo de todas as informações colhidas no exercício da
profissão.
129
O cuidar, as interações humanas e os princípios éticos não devem ser
negligenciados durante o exercício da profissão; e a ética é apresentada como formadora
da consciência individual e coletiva para a obtenção de uma assistência de qualidade.
Para alcançar essa excelência de qualidade, faz-se necessário o estabelecimento
de uma relação do ser-com-os-outros e ser-no-mundo pautado em postura ética que deve
ser almejada e alcançada. Para atingir essa meta, Malinowski (1976), em DaMatta (1987,
p.6), comenta que:
Não podemos chegar à sabedoria final socrática de conhecer-nos a s
mesmos se nunca deixarmos os estreitos limites dos costumes, crenças e
preconceitos em que todo homem nasceu. Nada nos pode ensinar melhor
lição nesse assunto de máxima importância do que crenças e valores de
outro homem do seu próprio ponto de vista. E mais: nunca a humanidade
civilizada precisou dessa tolerância mais do que agora, quando o
preconceito, a vontade e o desejo de vingança dividem as nações
europeias, quando todos os ideais estimados e reconhecidos como as
mais altas conquistas da civilização, da ciência e da religião são lançadas
ao vento.
Pode-se perceber que as relações estabelecidas por meio do diálogo e da empatia
constituem o caminho que deve ser trilhado por todos os homens, em especial pelo
Agente Comunitário de Saúde, que alicerça seu processo de trabalho na comunicação, no
cuidado, na mobilização comunitária e na ação/reflexão permeado pela ética e pela
bioética (FORTES; SPINETTI, 2004).
130
CAPITULO III
______________________________________________________
“Que se pode
fazer de mais
exato, de mais
rigoroso, quando
se estuda o
home
m, do que
131
MATERIAIS E MÉTODOS
1- Fundamentação teórico-metodológica
A opção metodológica para análise e compreensão do objeto foi a pesquisa
qualitativa, por possibilitar, conforme afirma Triviños (2006), a interpretação minuciosa dos
resultados em sua totalidade, buscando a percepção de algum fenômeno no contexto e
objetivando captar não apenas a aparência como tamm a essência que se apresenta.
A pesquisa qualitativa implica considerar o sujeito de estudo: gente em
determinada condição e grupo social, com suas crenças, valores e significados. Esse
significado deve ser estudado não apenas no âmbito individual, mas também no âmbito
coletivo. Assim, essa significação ganha sentido para os que vivenciam e cabe aos
pesquisadores qualitativos a tentativa de estudar e dar sentido ou interpretar os
fenômenos no aspecto das significações que os indivíduos trazem ao vivenciar (MINAYO,
2006; TURATO, 2005).
Nesse estudo, o interesse volta-se para a significação da vivência do processo de
trabalho dos Agentes Comunitários de saúde das Equipes de Saúde da Família da cidade
de Montes Claros (MG). Turato (2005, p. 510) comenta que
Primeiramente, o interesse do pesquisador volta-se para a busca do
significado das coisas, porque este tem um papel organizador nos seres
humanos. O que as “coisas” (fenômenos, manifestações, ocorrências,
fatos, eventos, vivências, ideias, sentimentos, assuntos) representam dá
molde à vida das pessoas. Num outro vel, os significados que as “coisas”
ganham passam também a ser partilhados culturalmente e assim
organizam o grupo social em torno destas representações e simbolismos.
132
Para melhor abrangência do tema e compreensão da significação foi utilizada uma
pesquisa de natureza descritiva, com o objetivo de descrever um fenômeno ou situação
mediante estudo do contexto social, descrevendo as características do fenômeno
estudado (DUARTE; FURTADO, 2002; MARCONI; LAKATOS, 1999).
O estudo descritivo narra com precisão os fatos e os fenômenos de uma realidade,
tentando captar não a aparência como também a essência. Tem como foco principal o
desejo de conhecer melhor o objeto que se pretende pesquisar, exigindo, para tanto, uma
série de informações que descrevem uma determinada realidade (TRIVIÑOS, 2006).
Nesse trabalho, o objeto de estudo é o papel e o perfil do Agente Comunitário de Saúde
das Equipes de Saúde da Família da cidade de Montes Claros MG, considerando as
dimensões do saber-ser, do saber-conhecer, do saber-fazer e do saber-conviver,
categorias sugeridas pelo documento do Ministério da Saúde Referencial curricular para
curso cnico de Agente Comunitário de Saúde: área profissional.” (BRASIL, 2004).
Segundo Polit e Hungler (1995), para se desenvolver um estudo descritivo, o
pesquisador observa e explora aspectos de uma situação; as pesquisas descritivas
objetivam, fundamentalmente, o retrato interpretativo das caractesticas dos indivíduos,
situações ou grupos e a frequência com que ocorrem determinados fenômenos.
Corroborando tal perspectiva, Triviños (2006) comenta que a descrição da realidade es
imbuída dos significados, que são produtos da visão subjetiva e que tem por base a
percepção e interpretação do fenômeno.
A pesquisa qualitativa requer critérios para garantir o rigor na sua realização,
contribuindo para o crédito da cientificidade e, para alcançá-lo, são sugeridos alguns
critérios, como credibilidade, adequação, verificabilidade e confirmabilidade, que devem
estar contemplados para validá-la e conferir credibilidade (PRAÇA; MERIGHI, 2003).
133
Turato (2005) narra que os métodos qualitativos m como atributo a força no rigor
da validade, uma vez que a observação e a escuta dos sujeitos favorece o conhecimento
da essência do objeto em estudo.
Praça Merighi (2003) e Alves-Mazzotti & Gewandsznajder (2002) comentam que
credibilidade diz respeito à capacidade de uma interpretação/descrição, ou seja, retratar a
experiência das pessoas de tal forma que os sujeitos envolvidos possam reconhecer-se
nessas descrições.
O critério de adequação refere-se à capacidade de transferir os achados de um
estudo para outro contexto, ou seja, poder ser generalizado. Por conseguinte, a
representatividade dos sujeitos, testes e situações podem ser avaliados, representando a
validade externa por meio de um grau de generalização dos resultados. Associado a esse
critério, existe a verificabilidade em que outro pesquisador pode seguir os
passos/procedimentos empregados e encontrar os mesmos achados comparáveis, mas
nunca contraditórios (PRAÇA; MERIGHI, 2003).
A confirmabilidade é também um critério de rigor na pesquisa, proposto como
alternativa ao conceito de objetividade em que deve manter a neutralidade no processo,
evitando emitir opiniões e garantindo que os resultados sejam confirmáveis (PRAÇA;
MERIGHI, 2003; ALVES-MAZZOTTI & GEWANDSZNAJDER; 2002).
Minayo (2006) afirma que a garantia da adequação entre realidade e o pensamento
sobre a mesma somente é possível com a cientificidade das pesquisas, que devem ser
conduzidas por meio de critérios que visem a melhorar a validade e a verificação em
pesquisa qualitativa.
DaMatta (1987) afirma que Antropologia Social e as pesquisas qualitativas em
qualquer área adotam como ponto de partida no trabalho de campo a posição e o ponto
de vista do outro e os estudam através de todos os meios dispoveis, considerando que,
134
no processo de entendimento de uma forma de vida social diferente, nada deve ser
excluído. Assim, faz-se necessário adentrar na realidade dos sujeitos, colocando-se
diante dela.
Diante dessa situação supracitada, como garantir a neutralidade científica e o rigor
na execução do estudo? DaMatta (1987) afirma que isso é possível por meio da
realização de uma dupla tarefa: (1) transformar o estranho no familiar e/ou (2) transformar
o familiar no estranho; por meio de um movimento constante de estranhamento e
familiarizão com vistas ao entendimento do contexto e mediação de conflitos.
Dessa forma, este estudo enquadra-se nessa situação, haja vista que os Agentes
Comunitários são familiares ao pesquisador e, com o intuito de garantir o rigor científico,
foi realizado um processo de estranhamento, que consiste em questionar o que é familiar,
a fim de contextualizá-lo, pois o que é familiar não é necessariamente conhecido
(DAMATTA, 1987).
DaMatta (1987, p.162) reafirma e descreve esse processo de familiaridade e
estranhamento essencial no trabalho de campo em pesquisa qualitativa,
(...) Quando falo em familiaridade, estou me referindo a essa noção de
modo dinâmico, como algo que deve ser transformado e assim
transcendido para que a perspectiva do trabalho de campo, a postura
antropológica possa aparecer. Não estou dizendo que o familiar possa ser
estudado porque o conhecemos bem. Digo apenas que o familiar, para ser
percebido antropologicamente, ele tem que ser de algum modo
transformado no exótico. (...) Quando falo em familiaridade, utilizo a noção
como um modo de conduzir a reflexão para vida. No sentido preciso de
fazer o leitor se perguntar: mas, Deus meu, tudo que é me é familiar é meu
conhecido? Tudo que me é familiar é intimo? Tudo que me é familiar está
realmente próximo de mim? Fazendo a si mesmo tais perguntas,
encontrará na sua realidade social respostas diversas, mas, fazendo isso,
estará praticando de alguma forma a dúvida antropológica, base do
trabalho de campo.
As colocações de DaMatta (1987) orientaram o estudo por meio de uma
perspectiva autêntica e pessoal utilizada para o enfrentamento de cada problema,
135
desenvolvendo um diálogo com as teorias correntes a partir da experiência concreta com
o grupo estudado – os agentes comunitários de saúde.
2- Cenário do Estudo
O local selecionado para a realização da pesquisa foram as Equipes de Saúde da
Família da cidade de Montes Claros, localizada no Norte de Minas Gerais, que representa
umlo de desenvolvimento regional.
A estratégia saúde da família compõe a rede municipal de saúde do município de
Montes Claros que iniciou suas atividades no ano de 1998, nos bairros Village do Lago e
Vila Sion, situados, respectivamente, na periferia norte e sul. Em 2007, no icio da
pesquisa, existiam 48 unidades implantadas, sendo 43 na zona urbana e 05 na zona
rural. Encontrava-se em processo de expansão da estragia com a cobertura de 46,5%,
totalizando uma população de 162.718 pessoas, compreendidas em 42.784 famílias
(SIAB, outubro-2007).
2.1- Caracterização do Cenário
2.1.1- Aspecto histórico
Montes Claros teve sua origem no período das Entradas e Bandeiras na expedição
chamada Espinosa-Navarro”, proveniente de Porto Seguro em 1553, desbravada pelos
bandeirantes, em especial Antônio Gonçalves Figueira. Esse em 12/04/1707, obteve uma
sesmaria, nas cabeceiras do Rio Verde onde construiu a sede de sua fazenda, no Vale do
rio Vieira, afastando-se das margens insalubres do Rio Verde Grande. A topografia da
região com montes calcáreos, com ausência de nuvens baixas ou cerrações, permitia ao
observador avistar ao longe os Montes de pouca vegetação sempre Claros. Por essa
peculiaridade, a fazenda ficou conhecida na região como Fazenda Montes Claros. Tal
136
característica pode ser visualizada na Figura 1, fotografada na Serra da Sapucaia
(PREFEITURA MUNICIPAL DE MONTES CLAROS, 2003; IBGE,2008)
FIGURA 1- FOTO PANORÂMICA DA CIDADE DE MONTES CLAROS- MG.
Fonte: http://www.skyscrapercity.com/showthread.php?t=374328
Com a apropriação das terras, surgiram os primeiros núcleos de povoamento,
formando, então, o povoado de Formigas, em que foi construída uma capela sob a
invocação de Nossa Senhora e São José. Em 13/10/1831, foi elevada à categoria de Vila
das Formigas e apenas em 16/10/1832 foi chamada Vila Montes Claros de Formiga. Em
03 de julho de 1857, conquistou sua emancipação político-administrativa e, finalmente, foi
denominado de município de Montes Claros (PREFEITURA MUNICIPAL DE MONTES
CLAROS, 2003).
137
2.1.2- Localização
O município de Montes Claros, lo da área mineira da Agência de
Desenvolvimento do Nordeste - ADENE (antiga SUDENE), localizado ao Norte do Estado
de Minas Gerais, na bacia do Alto Médio São Francisco, possui uma área de 3582 Km
2
,
limitando-se com os municípios de São João da Ponte e Mirabela (Norte); Juramento,
Glaucilândia, Bocaiúva e Claros dos Poções (Sul); Francisco Sá e Capitão Enéas (Leste);
e Coração de Jesus (Oeste); como pode ser visualizado na Figura 2 (PREFEITURA
MUNICIPAL DE MONTES CLAROS, 2003). O município liga-se ao Nordeste através do
acesso à rodovia BR 116 (Rio Bahia); pela BR 365 para Brasília DF; BR 135, que
fornece o acesso a Belo Horizonte e Rio de Janeiro. Montes Claros representa o segundo
entroncamento rodoviário do país (PREFEITURA MUNICIPAL DE MONTES CLAROS,
2003).
FIGURA 2 - MICRORREGIÃO DE MONTES CLAROS
Fonte: www.webcarta.net/carta/mapa.php?id=6547&Ig=pt
138
FIGURA 3- REGIÃO DO NORTE DE MINAS GERAIS
Fonte: GRS MONTES CLAROS
Possui uma população de 352.384 habitantes estimada para 2007, segundo o Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística IBGE (IBGE, 2008). A figura 4 representa essa
cidade, que é o centro de atração do Norte de Minas e, em uma analogia, pode ser
considerada a Capital do Norte de Minas.
139
FIGURA 4- VISTA PANORÂMICA DE MONTES CLAROS - MG
Fonte: http://www.skyscrapercity.com/showthread.php?t=374328
2.1.3 - Contexto histórico da saúde em Montes Claros
A mudança das práticas do modelo assistencial de saúde de um pólo negativo,
centrado na doença, para um pólo positivo, centrado na saúde, necessita de estratégias
de transição, que, no caso do município de Montes Claros, teve início por meio do
Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS) no ano de 1996 em seis áreas -
Vila Sion, Village do Lago, Independência, Vila Anália, Chiquinho Guimarães e Bela
Paisagem – escolhidas por representarem áreas remotas, sem infraestrutura de saúde, ou
140
seja, com desamparo de práticas assistenciais, constituindo-se, assim, áreas prioririas.
As equipes de PACS eram constituídas por um enfermeiro-supervisor e seis Agentes
Comunitários de Saúde, selecionados por meio de seleção pública realizada em parceria
com a Pastoral da Criança (PREFEITURA MUNICIPAL DE MONTES CLAROS, 2003).
Em 1998, ocorreu uma ruptura do processo de transição ocasionada pela mudança
administrativa, em que as seis equipes de PACS deram lugar a apenas duas equipes de
PSF, nos bairros Vila Sion e Village do Lago, enquanto os outros bairros remanescentes
da estratégia PACS retomaram suas ações assistenciais em 1999, quando ocorreu a
expansão das Equipes de Saúde da Família para os bairros Vila Anália, Novo Delfino,
Delfino, Jardim Palmeiras, Santo Antonio I e II, José Carlos de Lima, Vila Telma. Somente
em 2000, expandiu para o Eldorado, Nova Morada, Santa Eugênia, Cidade Industrial, Vila
Atlântida e Santa Rafaela (PREFEITURA MUNICIPAL DE MONTES CLAROS, 2003).
Em 1999, ocorreu realização da Residência em Saúde da Família para Enfermeiros
(seis residentes) em convênio com a Universidade Estadual de Montes Claros -
UNIMONTES. No ano 2000, houve a transferência da Residência Médica, iniciada em
Itacarambi (1999), para Montes Claros e o início da Residência multiprofissional médico e
enfermeiro em três equipes na região do Grande Eldorado. Dando continuidade à parceria
Secretaria Municipal de Saúde / UNIMONTES, houve ampliação em 2001 para mais três
residentes médicos e seis residentes enfermeiros (PREFEITURA MUNICIPAL DE
MONTES CLAROS, 2003).
A partir de 2000, o município liberou suas equipes do PSF para campo de estágio
dos cursos de graduação em enfermagem, medicina e odontologia, propiciando a
integração teoria - prática do discente e aproximando-o da realidade social e dos serviços
de saúde visando à construção do novo modelo de atenção (PREFEITURA MUNICIPAL
DE MONTES CLAROS, 2003).
141
Em 2001, o município ganhou a concorrência para sediar a residência
multiprofissional em Saúde da Família para Médico e Enfermeiro, oferecido pelo Hospital
Universitário Clemente Faria (HUCF) UNIMONTES, em connio com o Ministério da
Saúde para o biênio 2002 e 2003, com a implantação de nove equipes de residência e,
em 2004, tiveram início 16 novas equipes (PREFEITURA MUNICIPAL DE MONTES
CLAROS, 2003).
Desde então, o município vem implantando de forma gradativa suas equipes de PSF,
com priorização do perfil profissional, especialmente através da residência
multiprofissional em saúde da família.
Em 2007, em parceria com a UNIMONTES, iniciou-se o mestrado profissional em
cuidado primário em saúde, o qual representa uma oportunidade de compreender o
cuidado primário implantado na região do Norte de Minas e contribuir para a divulgação
da Estratégia Saúde da Família Montesclarense no contexto nacional.
2.1.4- Sistema Municipal de Saúde
Com a implantação do processo de descentralização administrativa, através da
estratégia de municipalização das ações e serviços de saúde, Montes Claros busca
implementar os princípios doutrinários e organizativos preconizados pelo Sistema Único
de Saúde – SUS e, desde 01/01/1999, encontra-se habilitado em Gestão Plena de
Sistema Municipal GPSM. Para tanto, foram instituídos o Conselho Municipal de Sde
- CMS, criado pela Lei Orgânica Municipal: os Conselhos Gestores, criados para
dinamizar e aproximar os usuários das unidades básicas de Saúde; o Fundo Municipal de
Saúde FMS foi instituído em 26 de Junho de 1992 através da Lei nº. 2.052; a Ouvidoria,
142
em 2005, localizada na Secretaria Municipal de Saúde; e a Ouvidoria Descentralizada, em
2006, nos hospitais conveniados.
A rede de serviços próprios e contratados disponíveis para a população estão
descritos a seguir e ilustrada na figura 5 - Rede Instalada dos Serviços de Saúde de
Montes Claros – MG, conforme a Prefeitura Municipal de Montes Claros (2008):
11 Postos de Saúde - Pólo Rural - Aparecida do Mundo Novo, Ermidinha, Miralta,
Campos Elízios, Santa Rosa de Lima, São Jo da Vereda, São Pedro das Garças e
Vila Nova de Minas, Camela, Abóboras e Jardim Primavera.
Equipes de PSF - Vilage do Lago, Vila Sion, Santo Antônio II, Vila Telma,
Independência I, Independência II, Santo Antônio I, Delfino Magalhães, Jardim
Palmeiras I, Jardim Palmeiras II, Novo Delfino, Vila Anália, Santa Rafaela, José Carlos
de Lima, Santa Eugênia, Eldorado I, Eldorado II, Nova Morada, Cidade Industrial,
Santos Reis, Tancredo Neves, Tiradentes, Vila Atlântida, Cidade Cristo Rei, Clarice
Ataíde, Independência III, Bela Paisagem, Vila Atlântida, Bela Vista, Vila São
Francisco de Assis, Alto da Boa Vista, Morrinhos I, Morrinhos II, Morrinhos III, Vila
Mauriceia, Vila Oliveira, Lourdes I, Lourdes II, Cintra I, Cintra II, Santa Lúcia I, Santa
Lúcia II, Monte Carmelo I, Monte Carmelo II, Nova Esperança, Santa Rosa de Lima,
Aparecida do Mundo Novo, Jardim Primavera e São Geraldo II.
Equipes de PACS - Planalto, Mandaquaril, Samambaia, Miralta e Jardim Primavera.
10 Centros de Saúde - Antônio Pimenta, Cintra, Esplanada, Major Prates, Maracanã,
Planalto, Renascença, São Judas, Vera Cruz e Vila Oliveira.
05 NASF (Núcleo de Apoio à Saúde da Família) - Delfino Magalhães, Santos Reis,
Vila Sion, Lourdes e Eldorado.
143
06 Policlínicas - Dr. Carlos José do Espírito Santo, Dr. Hélio Sales, Dr. Ariosto Corrêa
Machado, Dr. Alpheu de Quadros, Centro de Especialidade Tancredo Neves, antigo
Dr. Hermes de Paula, e Centro de Atenção à Saúde do Idoso – Eny Farias .
07 Hospitais - (Aroldo Tourinho, Prontocor, Prontomente, Santa Casa, Fundação
Dilson Godin de Quadros / São Lucas, Hospital Universitário Clemente Faria e
UNIMED – que não possui nenhum serviço contratado pelo SUS.
FÍGURA 5- REDE INSTALADA DOS SERVIÇOS DE SAUDE DE MONTES CLAROS -
MG
Fonte: Prefeitura de Montes Claros/2008.
PSF VILA OLIVEIRA
PSF VILA MAURICÉIA
144
A escolha da cidade de Montes Claros se justifica por ser o lócus de atividades dos
Agentes Comunitários de saúde e, portanto, cenário ideal para o desenvolvimento desse
estudo.
3- Sujeitos do Estudo
Os sujeitos selecionados para compor este estudo foram os Agentes Comunitários
de Saúde das Equipes de Saúde da Família que compõem as 43 equipes que cobrem a
atenção primária da cidade de Montes Claros no pólo urbano, totalizando o universo de
274 informantes no período de 2007, época do início do estudo. Entretanto, apenas 32
equipes, compostas, em média, por seis a sete Agentes, m mais de dois anos de
existência, em um total de 196 ACS, constituindo-se, assim, os sujeitos deste estudo,
representados por sexo e tempo de experiência, conforme a Tabela 2.
TABELA 2- Distribuão dos Agentes das Equipes de Saúde da Família do lo
urbano por gênero e tempo de experiência da cidade de Montes Claros/MG, outubro
2007.
GÊNERO / TEMPO Menos de 2 anos 2 anos ou mais
Feminino 62 158
Masculino 12 38
TOTAL 78 196
Fonte: SIAB; outubro, 2007
145
Triviños (2006) e Turano (2005) afirmam que, na pesquisa qualitativa, podem ser
usados recursos aleatórios e/ou intencionais para compor uma amostra, procurando uma
espécie de representatividade dos sujeitos que participam do estudo.
A amostra representativa traça um caminho intermediário entre a contagem de uma
população e a conveniente seleção, garantindo a eficncia na pesquisa ao fornecer uma
base gica para estudo de apenas partes de uma população sem perder informações
(BAUER; GASKELL, 2004).
A representatividade do grupo é uma queso essencial em alguns estudos e, para
isso, é importante manter a intencionalidade ao invés da escolha aleatória para responder
aos objetivos propostos (TRIVIÑOS, 2006).
Dessa maneira, a amostra ideal em pesquisa qualitativa é aquela que pode refletir
a totalidade nas suas dimensões, em que o critério não é puramente numérico e prevê um
processo de inclusão progressiva à medida que ocorrerem as descobertas do campo
(MINAYO, 2006).
Foi utilizada, neste estudo, a amostragem representativa, sem a definição prévia
do número de pesquisados, uma vez que objetiva-se a atingir o ponto de saturação que
refletirá as tendências prevalentes do grupo pesquisado (MINAYO, 2006).
Minayo (2006: p197) comenta a respeito dessa representatividade e do número de
informantes:
O dimensionamento da quantidade de entrevista, grupos focais e outras
técnicas devem seguir o critério de saturação. Por critério de saturação se
entende o conhecimento formado pelo pesquisador, no campo, de que
conseguiu compreender a lógica interna do grupo ou da coletividade em
estudo. No entanto, provisoriamente o investigador pode e deve prever um
montante de entrevistas e de outras cnicas de abordagem a serem
depois balizadas em campo, à medida que consiga o entendimento das
homogeneidades, da diversidade e da intensidade das informações
necessárias para seu trabalho.
146
Ancorado nos pressupostos de Minayo (2006), foram previstos inicialmente 32
entrevistas, ou seja, uma entrevista por equipe de saúde da família, cada indivíduo sendo
selecionado pelo número da respectiva microárea, uma vez que cada Agente é
representado por meros que coincidem em todas as equipes cadastradas. E os
informantes foram selecionados através de sorteio aleatório do respectivo número da
microárea, que foi a de número 3 e também selecionado uma amostra de reserva, que
foram as microáreas próximas aos números 2 e 4.
Bauer; Gaskell (2004) afirmam que saturação é o critério de finalização em que
investigam diferentes percepções e representações a que a inclusão de novas
informações não acrescente mais nada de novo.
3.1- Dados preliminares dos sujeitos
Os sujeitos do estudo também foram retratados por escolaridade, tendo em vista
que a mesma representa um requisito mínimo ( grau completo) para se candidatar ao
cargo. Com a criação da profissão Agente Comunitário, ocorreu a necessidade de uma
formação técnica em Agente Comunitário que comou a exigir uma mudança na
escolaridade mínima de para grau. Assim, os Agentes tiveram que se adequar
gradativamente a esse critério. A seguir, a Tabela 3 retrata a situação escolar dos
Agentes Comunitários em Montes Claros.
TABELA 3 - Distribuição dos Agentes das Equipes de Saúde da Família do pólo
urbano por escolaridade e tempo de experiência da cidade de Montes Claros/MG,
outubro 2007.
Escolaridade/Tempo
Menos de 2 anos 2 anos ou mais
1º Grau 02 08
2º Grau Incompleto 0 04
147
2º Grau 74 178
3º Grau Incompleto 02 05
3º Grau Completo 00 01
TOTAL 78 196
Fonte: SIAB; outubro, 2007
3.2- Critérios de inclusão
Ser Agente Comunitário de Saúde das Equipes de Saúde da Família da cidade de
Montes Claros – MG, situadas no pólo urbano.
Ter mais de dois anos de experiência na função de Agente Comunitário de Saúde,
apresentando, dessa forma, uma maior relação de trabalho e vivências com a
equipe e a comunidade. Esse critério baseia-se na recomendação dos documentos
ministeriais presentes em documentos do Ministério da Saúde (Brasil, 1994; Brasil,
1997; Brasil, 2006) com a exigência, para a pessoa se candidatar à função de
ACS, de morar na comunidade há pelo menos dois anos para ter conhecimento da
área e da comunidade.
Aceitar participar da pesquisa.
3.3- Critérios de exclusão
Ser Agente Comunitário de Saúde das Equipes de Saúde da Família de Montes
Claros, situadas no pólo rural, pois o deslocamento do pesquisador fica dificultado
pela distância e tamm pela característica da área rural onde os Agentes estão
148
em microáreas distantes do ponto de apoio, prejudicando o encontro com os
entrevistados.
Ter menos de dois anos de experiência na função de Agente Comunitário de
Saúde.
Não aceitar participar da pesquisa.
Não ser encontrado após três tentativas de contato.
3.4- Coleta de Dados
A pesquisa qualitativa fundamenta-se na participação do sujeito como um dos
pilares do fazer científico. Nesse sentido, percebe-se uma multiplicidade de recursos,
como entrevista semiestruturada, entrevista aberta, observação livre, questionário aberto,
dentre outros, que podem ser usados na realização do estudo, permitindo o que se
denomina como técnica da triangulação na coleta de dados (TRIVIÑOS, 2006).
A abordagem qualitativa relaciona-se ao significado que sujeitos atribuem a suas
experiências do mundo social e como compreendem esse mundo, fazendo-se necessário
empregar diversos métodos, ou seja, uma abordagem por métodos múltiplos que permita
observar as pessoas, falar com elas e ler o que elas escreveram ou o que escreveram
sobre elas (POPE & MAYS, 2005).
A cnica da triangulação na coleta de dados objetiva a maior amplitude na
descrição, explicação e compreensão do sujeito em estudo, partindo do princípio de que é
improvável compreender a existência isolada do contexto, sem suas raízes históricas,
suas representações culturais e sem vinculação com a realidade social (TRIVIÑOS,
2006).
149
Para atender esses propósitos, faz-se necessário uma técnica que contemple toda
essa amplitude e, nessa vertente, Triviños (2006) comenta que a técnica da triangulação
permite uma compreensão ampliada por meio de três ângulos de enfoque:
Processos e produtos centrados no sujeito: subdivide-se nos elaborados pelo
pesquisador e naqueles construídos pelo próprio sujeito; o primeiro faz alusão às
percepções do sujeito (formas verbais) obtidas por meio de entrevistas e questionários
e tamm aborda os comportamentos e ações através da observação livre ou dirigida;
o segundo são os construídos pelo próprio sujeito como diários, autobiografias,
confissões, cartas, livros, obras de arte.
Elementos produzidos pelo meio: representado pelos documentos (internos e
externos); instrumentos legais ( leis, decretos, pareceres, regulamentos); instrumentos
oficiais (diretrizes, propostas, ata de reuniões, memorandos) e tamm estatísticos e
fotografias.
Processos e produtos originados pela estrutura sócio-econômica e cultural do macro-
organismo social do sujeito: relaciona-se ao modo de produção, propriedade dos
meios de produção e as classes sociais.
Minayo (2006) menciona o grande valor da triangulação, uma vez que esse método
possibilita ir além de cada método isoladamente, pois fornece elementos para responder
às questões que se pretende conhecer de forma mais aprofundada.
A triangulação permite garantir a validação e o rigor na pesquisa qualitativa, tendo
em vista que esse rigor contribui para o crédito de cientificidade.
150
3.5- Instrumentos
A técnica da triangulação tem por finalidade a visualização mais abrangente do
objeto de pesquisa por meio da multiplicidade de abordagens. Dessa forma, este estudo
utilizou como instrumentos de coleta de dados a pesquisa bibliográfica, a pesquisa de
campo e a entrevista semiestruturada, pois é de significativa importância verificar a
informação e melhorar sua precisão, evitando vieses ao retratar a percepção do
entrevistado.
O método qualitativo tem como propriedade ocorrer no ambiente natural do sujeito,
assim permitindo a observação sem o controle de variáveis, que necessitam estar livres
para proporcionar o conhecimento da significação por meio da pesquisa de campo, que,
neste caso, ocorreu no lócus de trabalho dos Agentes Comunitários de Saúde (TURATO,
2005).
Nesta pesquisa, foi utilizada a entrevista semiestruturada, com itens condizentes
com os objetivos da investigão, pois esse instrumento representa uma técnica em que o
investigador se apresenta frente ao investigado, formulando perguntas com o objetivo de
obtenção de dados dos mais diversos aspectos da vida social e comportamento humano.
Assim, a entrevista apresenta maior flexibilidade, podendo assumir as mais diversas
formas e proporcionando a possibilidade de captar expressões faciais, tonalidade de voz
e ênfase nas respostas (GIL, 1994).
A entrevista semiestruturada permite a presença do entrevistador, ao mesmo
tempo que proporciona liberdade e espontaneidade ao informante para esboçar a sua
compreensão diretamente sobre o assunto (TRIVIÑOS, 2006). Dessa forma, representa a
técnica para gerar e estabelecer diálogos com os sujeitos sobre determinados assuntos
com o intuito de compreender os significados atribuídos aos mesmos (MAY, 2004).
151
Essa técnica utiliza tanto perguntas pré-definidas em um roteiro (Apêndice A)
quanto permite ao entrevistador certa liberdade para sondar além das respostas,
estabelecendo, assim, um diálogo que contribui para uma maior compreensão dos
significados atribuídos ao tema (MAY, 2004).
As questões do roteiro (Apêndice A) foram elaboradas a partir do documento do
Ministério da Saúde (2004): Referencial curricular para curso técnico de Agente
Comunitário de Saúde: área profissional” (Série A. Normas e Manuais técnicos), Brasília,
DF. ISBN 85-334-0809-9. Nesse documento, também se baseiam as categorias saber-
ser, saber-conhecer, saber fazer, saber-conviver. Dessa forma, o roteiro foi validado no
estudo piloto, que tinha por proposição a avalião das questões e destaque de possíveis
falhas na redação, complexidade das questões, imprecisão na redação, questões
desnecessárias ou pouco informativas, portanto, que podem ser descartadas ou
substituídas.
O estudo piloto foi realizado em Dezembro de 2007, com dois Agentes de Saúde
pertencentes a equipes que não foram incluídas na pesquisa em decorrência de ter
menos de dois anos de existência e contou com a participação da orientadora do estudo,
proporcionando uma análise mais pormenorizada das perguntas. Após a realização do
estudo piloto e discussões estabelecidas entre a pesquisadora e a orientadora, constatou-
se a necessidade de acréscimos no roteiro semiestruturado, como questões relativas à
ética, relevância do estudo, aspectos motivadores e desmotivadores do processo de
trabalho, aliado a mudanças relativas à forma de fazer algumas perguntas, facilitando a
compreensão e evitando perguntas indutoras.
Para garantir a fidelidade das informões sem que houvesse prejuízo, foi
solicitado aos sujeitos da pesquisa que a entrevista fosse gravada para, posteriormente,
ser transcrita em sua íntegra. Triviños (2006) corrobora com essa ideia, pois assegura
152
que a gravação permite que o entrevistador tenha contato com todo o material fornecido
pelos informantes, o que não ocorreria seguindo outro meio. A entrevista gravada foi
transcrita imediatamente e analisada pelo pesquisador antes de realizar uma nova
entrevista.
A possibilidade de registro por meio de vídeo foi postulada, entretanto,
considerando a possibilidade de inibição dos participantes para expor/revelar seus pontos
de vista, optou-se por retirar essa técnica de gravação.
4- Aspectos éticos
O projeto de pesquisa foi encaminhado para apreciação do Comi de Ética em
Pesquisa (CEP) da Universidade Estadual de Montes Claros (UNIMONTES), sendo
aprovado com o Parecer Consubstanciado nº. 880 (Anexo A), em 23 de Novembro de
2007.
Precedendo a essa fase, foi realizado contato por escrito com a coordenação das
Equipes de Saúde da Família do referido município, solicitando a autorizão prévia para
realização da pesquisa; e não sendo revelado à coordenação nenhum dado isoladamente
e tampouco a decisão individual do informante de participar ou não da pesquisa.
Para atender aos aspectos éticos, foram respeitadas todas as diretrizes previstas
na Resolução 196/1996, do Conselho Nacional de Saúde, que preconiza as diretrizes e
normas de pesquisas envolvendo seres humanos (BRASIL, 2000b).
Antes da realizão da entrevista, esclareceu-se o objetivo principal da pesquisa,
relevância e importância da colaboração, a garantia do anonimato, bem como a
desistência sem prejuízo para eles, em qualquer momento da realizão do trabalho; e
posteriormente foi solicitada a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
153
(Apêndice B), em duas vias, sendo uma retida com o pesquisador e a outra com o
participante.
Todos os entrevistados foram mantidos sob anonimato e os resultados foram
apresentados com a utilização de nomes de anjos. A escolha desse pseudônimo es
associada à grande contribuição dos agentes comunitários na diminuição da mortalidade
infantil, resultando no menor numero de criaas indo para o céu, também chamados de
anjos na cultura popular, em especial no Nordeste em que todo óbito infantil era
anunciado a comunidade local através dos sinos das igrejas que soavam anunciando a
ascensão de um pequenino para o lado do criador.
5- Coleta de dados
As entrevistas foram realizadas em horários e locais previamente selecionados
pelos enunciadores, dentro do próprio ambiente de trabalho ou em ambiente privado,
atendendo aos critérios de privacidade, comodidade e neutralidade, proporcionando a
espontaneidade por parte de cada um dos sujeitos do estudo, estabelecendo-se, assim,
um encontro de forma amigável e cordial.
Nesse ambiente, o pesquisador fez a leitura do Termo de Consentimento Livre e
esclarecido (Apêndice B), que, depois de explicado e aceito, foi assinado pelos
entrevistados, assegurando o caráter de confidencialidade e sigilo das informações.
Baseado no critério de saturação, houve a repetição de informações sem novas
contribuições, ocasionando a realização de 17 entrevistas das 32 previstas nas Equipes
de Saúde da Família. O contato com os informantes ocorreu durante o ano de 2008. Com
o intuito de garantir uma representação do universo, optou-se por entrevistar os sujeitos
agrupados em equipes por regiões geográficas e tempo de implantação da estratégia,
154
visando verificar se os aspectos do processo de trabalho dessa categoria são diferentes
em decorrência da comunidade/território solo e processo, uma vez que os bairros em que
as equipes estão implantadas o, na sua maioria, periféricos, porém com condições
sócio-econômicas distintas, variando de locais populosos a lugares com baixa densidade
populacional com padrão social adequado. No quesito tempo de implantação das equipes,
optou-se por entrevistar equipes que se encontravam em três fases: Recém-implantadas
(ponto zero dois a quatro anos ); Equipes com tempo Médio ( cinco a oito anos) e
Equipes Antigas (nove a dez anos). Dessa forma, as equipes representariam o
amadurecimento e implementação da estratégia saúde da família na cidade de Montes
Claros, favorecendo o processo de Triangulão na coleta de dados e garantindo maior
confiabilidade e representatividade das informações.
Para facilitar o entendimento, a figura 6 ilustra a rede instalada dos serviços de
saúde com destaque das equipes pesquisadas, representada por Círculo de cor azul.
Assim, na Região Norte foram contempladas as equipes Village do Lago e Clarice
Athayde; Região Central, a equipe Cidade Cristo Rei, a equipe Vila Tiradentes, a equipe
Tancredo Neves; Região Noroeste, as equipes Eldorado, Nova Morada e Santa Eugênia;
Região Oeste, as equipes Vila Atlântida, Bela Vista e Bela Paisagem; Região Sudoeste,
as equipes Vila Oliveira e Vila Mauriceia; Região Leste, as equipes Vila Anália e Novo
Delfino; Região Sul, as equipes Vila Telma e José Carlos de Lima.
No decorrer da coleta de dados, ocorreram alguns imprevistos em algumas
equipes: na microárea 3, que foi previamente sorteada, alguns Agentes não foram
encontrados, pois estavam afastados de suas atividades laborais por diferentes motivos,
como rias regulamentares, licença médica, licença maternidade. Nessas situações, foi
entrevistado o Agente da microárea 2 ou 4, conforme previsto no projeto inicial.
155
Das 17 entrevistas realizadas, duas estavam com o áudio comprometido e
correspondiam a Região Central, não permitindo sua transcrição completa. Por esse
motivo, foram excluídas, sem prejuízo do critério de saturação, não precisando, portanto,
de reposição das mesmas.
Figura 6- Rede instalada dos serviços de saúde que participaram da pesquisa
Fonte: Prefeitura de Montes Claros/2008.
PSF VILA OLIVEIRA
PSF VILA MAURICÉIA
Áreas pesquisadas
156
6- Análise dos Dados
Na pesquisa qualitativa, no que diz respeito à análise dos dados obtidos, ocorrem
três obstáculos que precisam ser superados ilusão da transparência, supervalorização
dos métodos e das técnicas em detrimento da essencialidade dos significados e
dificuldade da junção e síntese das teorias e do trabalho de campo (MINAYO, 2006).
No intuito de evitar ou superar esses obstáculos, foi utilizada a análise de discurso
do sujeito coletivo. As entrevistas foram analisadas à luz da análise de discurso do sujeito
coletivo, tendo em vista que as ideias centrais presentes nos discursos individuais deram
origem ao discurso coletivo como se o discurso de todos fosse o discurso de um. Para
subsidiar o processo de reconstituição discursiva, utilizou-se o Software Qualiquantisoft
desenvolvido pela Sales e Paschoal Informática (2008).
6.1- ANÁLISE DO DISCURSO DO SUJEITO COLETIVO (DSC)
As pesquisas qualitativas proporcionam ao pesquisador vários depoimentos
individuais sobre um determinado tema; e o maior desafio encontrado é processar esses
depoimentos e obter como resultado final as representações sociais ou opiniões coletivas,
não tratando apenas da soma dos depoimentos e sim de garantir a representatividade
coletiva e a discursividade que devem estar presentes tanto no âmbito individual quanto
no coletivo (LEFÈVRE & LEFÈVRE, 2006).
Levre & Lefèvre (2005) consideram a discursividade como caractestica iminente
no pensamento coletivo, algo que é fato empírico, ao mesmo tempo que deve ser
preservada em todos os momentos da pesquisa.
157
A técnica do Discurso do Sujeito Coletivo (DSC) representa a possibilidade de
preservar essa discursividade, pois respeita a opinião, a ideia e o pensamento que é a
matéria-prima, proporcionando, assim, uma categorização discursiva e o meramente
matemática; as respostas individuais não são simplesmente somadas, as mesmas
contribuem na produção de um discurso coletivo – opinião coletiva –, como a contribuição
e a presença de diferentes cores na confecção de uma pintura (LEFÈVRE & LEFÈVRE,
2005; LEFÈVRE & LEFÈVRE, 2005a).
Levre & Lefèvre (2006a) afirmam que a agregação de diferentes discursos
individuais implica a quantificação narrativa discursiva que ocorre no âmbito narrativo,
garantindo a construção de um denominado eu ampliado que representa o indivíduo
coletivo reconstituído.
Percebe-se, assim, um conjunto de vários depoimentos como um acorde na música
em que a coexisncia do uno e do singular, do singular e do plural; compondo uma
sinfonia de um discurso que representa uma coletividade (LEFÈVRE & LEFÈVRE,
2006a; LEFÈVRE & LEFÈVRE, 2006b). Para garantir essa representatividade e os
preceitos legais Lefèvre & Lefèvre (2006a, p.3) comentam que:
Então, todos os sujeitos individuais com os quais o sujeito coletivo é
composto precisam estar representados neste sujeito coletivo, o que
equivale dizer que o sujeito coletivo não pode estar, de nenhum modo,
‘traindo’ nenhum dos sujeitos individuais dos quais é composto: não pode
ser posto na ‘boca do coletivo’ nada do que não esteja na boca dos
indivíduos’ que compõem este coletivo.
A técnica do DSC é um recurso metodológico que permite a organização e a
tabulação de dados qualitativos obtidos por entrevistas individuais que expressam o
pensamento, o comportamento discursivo com vistas ao resgate das opiniões coletivas
que culminam em um conjunto de discursos coletivos (LEFÈVRE & LEFÈVRE, 2005;
LEFÈVRE & LEFÈVRE, 2005a).
Levre & Lefèvre (2005, p. 16) afirmam que
158
O sujeito coletivo se expressa, então, através de um discurso emitido no
que se poderia chamar de primeira pessoa (coletiva) (...) Trata-se de um eu
sintático que, ao mesmo tempo em que sinaliza a presença de um sujeito
individual do discurso, expressa uma referencia coletiva na medida em que
esse eu fala pela ou em nome de uma coletividade. Esse discurso coletivo
expressa um sujeito coletivo, que viabiliza um pensamento social.
O DSC expressa a fala da coletividade sobre um determinado tema por meio das
falas individuais que buscam resgatar o discurso como signo que compõe o imaginário
social. Para alcançar esse objetivo, serão utilizadas as figuras metodológicas como
expressões-chaves (ECH), ideias centrais (IC) e discurso do sujeito coletivo (DSC)
(LEFÈVRE & LEFÈVRE, 2005).
As expressões-chaves (ECH) são trechos, pedaços selecionados de cada
depoimento por meio de destaques (sublinhar, colorir) e descrevem a essência do
depoimento selecionado da própria fala/discurso; as expressões semelhantes formarão
depoimentos coletivos (LEFÈVRE & LEFÈVRE, 2005; LEFÈVRE & LEFÈVRE, 2005a).
As ideias centrais revelam e descrevem o sentido presente em cada depoimento
analisado, cada conjunto de expressões-chave e tamm o conjunto de respostas dos
sujeitos envolvidos que têm sentido parecido ou complementar e m a função de
identificadora e especificadora. Portanto, essa figura é uma descrição do sentido do
discurso que pode ter várias ideias centrais e vários discursos podem ter ideias
semelhantes ou complementares (LEFÈVRE & LEFÈVRE, 2005; LEFÈVRE & LEFÈVRE,
2005a).
O Discurso do Sujeito Coletivo (DSC) representa o conjunto de expressões-chave
que possui a mesma ideia central e/ou ancoragem redigida, na 1ª pessoa do singular sob
a forma de um discurso-síntese, com conteúdos discursivos de sentido semelhante, em
que o discurso é visto como signo de conhecimentos que representa a fala do social ou o
pensamento coletivo (LEFÈVRE & LEFÈVRE, 2005; LEFÈVRE & LEFÈVRE, 2005a).
159
Para a elaboração do DSC, parte-se da análise inicial do discurso com a seleção
das ideias centrais presentes em cada um dos discursos individuais, isto é, todas as
ideias devem ser aproveitadas. Se elas estiverem semelhantes ou repetidas, escolhe-se
apenas um exemplar na busca da reconstituição discursiva da representação social de
forma coerente, em que cada uma das partes se reconheça nesse todo e o todo
constituído por essas partes (LEFÈVRE & LEFÈVRE, 2005; LEFÈVRE & LEFÈVRE,
2005a).
OS DSC apresentam uma dupla representatividade qualitativa e quantitativa.
Qualitativa, porque a opinião coletiva é apresentada em forma de discurso que recupera
os conteúdos contidos no elemento chave. É também quantitativa, porque esse discurso
tem uma expressão numérica (indica quantos depoimentos foram necessários para
compor cada DSC) que gera uma confiabilidade estatística (LEFEVRE; LEFEVRE,
2006a).
Nessa metodologia, foi utilizado o Software Qualiquantisoft desenvolvido pela Sales
e Paschoal Informática em parceria com a Universidade de São Paulo (USP) que foi
utilizado com o intuito de viabilizar a análise, tornando-a mais ptica e ágil.
160
CAPITULO IV
____________________________________________________________
O homem não é
igual a nenhum
outro homem
bicho ou coisa,
Ninguém é i
gual
a ninguém.
161
RESULTADOS E DISCUSSÕES
1- CARACTERIZAÇÃO DOS AGENTES COMUNITÁRIOS DE SAUDE
Caracterizar os sujeitos do estudo é um dos aspectos mais importantes para
revelar quem é o Agente Comunitário de Saúde da cidade de Montes Claros - MG. Com o
intuito de facilitar a visualização, optou-se por representar as informações dos quinze
atores por meio de sete quadros divididos por Regiões que ilustram as peculiaridades nos
diferentes bairros. Esses quadros contêm as variáveis - Gênero, Idade, Estado Civil, Nº.
de Filhos, Escolaridade, Trabalho Anterior, Tempo de residência na comunidade,
atividade comunitária, Tempo de profissão, Curso cnico de enfermagem e Curso técnico
de Agente Comunitário de Saúde que permitem uma aproximão com a realidade
desse profissional.
QUADRO 1 - CARACTERIZAÇÃO DOS AGENTES COMUNITÁRIOS DE SAUDE DA REGIÃO LESTE DA
CIDADE DE MONTES CLAROS.
CARACTERISTICAS DO
AGENTE
AGENTE 1
Gabriel
AGENTE 2
Miguel
GENERO Feminino Feminino
IDADE 38 32
ESTADO CIVIL Solteira Casada
Nº. DE FILHOS 1 1
ESCOLARIDADE 2º Grau Completo
2º Grau Completo
TRABALHO ANTERIOR Auxiliar de Escritório Doméstica
TEMPO DE RESIDENCIA NA
COMUNIDADE (ANOS)
10 5
ATIVIDADE COMUNITARIA Não Não
162
TEMPO DE PROFISSÃO
(ANOS)
8 3 a 4
CURSO DE TECNICO DE
ENFERMAGEM
Sim Sim
CURSO TECNICO DE
AGENTE
Não Não
Fonte: Pesquisa de campo, 2008.
QUADRO 2 - CARACTERIZAÇÃO DOS AGENTES COMUNITÁRIOS DE SAUDE DA REGIÃO NOROESTE
DA CIDADE DE MONTES CLAROS.
CARACTERISTICAS DO
AGENTE
AGENTE 3
Caliel
AGENTE 4
Daniel
AGENTE 5
Rafael
GENERO Feminino Feminino Feminino
IDADE 27 31 26
ESTADO CIVIL Solteira Casada Solteira
Nº. DE FILHOS 1 1 Não
ESCOLARIDADE 3º Grau incompleto 2º Grau Completo Grau Completo
TRABALHO ANTERIOR Desempregada Balconista Balconista
TEMPO DE RESIDENCIA NA
COMUNIDADE (ANOS)
25 18 5
ATIVIDADE COMUNITARIA Pastoral da Criança Pastoral da Criança Não
TEMPO DE PROFISSÃO
(ANOS)
3 2 a 3 anos 3 a 4 anos
CURSO DE TECNICO DE
ENFERMAGEM
Sim Não Sim
CURSO TECNICO DE
AGENTE
Não Sim o
Fonte: Pesquisa de campo, 2008.
163
QUADRO 3 - CARACTERIZAÇÃO DOS AGENTES COMUNITÁRIOS DE SAUDE DA REGIÃO NORTE DA
CIDADE DE MONTES CLAROS.
CARACTERISTICAS DO AGENTE AGENTE 6
Mikael
AGENTE 7
Benael
GENERO Feminino Feminino
IDADE 26 29
ESTADO CIVIL Casada Casada
Nº. DE FILHOS 1 1
ESCOLARIDADE 2º Grau Completo 2º Grau Completo
TRABALHO ANTERIOR Autônoma – Manicura Comércio
TEMPO DE RESIDENCIA NA
COMUNIDADE (ANOS)
18 17
ATIVIDADE COMUNITARIA Não Associação de
Moradores e
Grupos Religiosos
TEMPO DE PROFISSÃO (ANOS) 3 2 a 3 anos
CURSO DE TECNICO DE
ENFERMAGEM
Sim Não
CURSO TECNICO DE AGENTE Não Não
Fonte: Pesquisa de campo, 2008.
QUADRO 4 - CARACTERIZAÇÃO DOS AGENTES COMUNITÁRIOS DE SAUDE DA REGIÃO CENTRAL
DA CIDADE DE MONTES CLAROS.
CARACTERISTICAS DO AGENTE AGENTE 8
Raziel
GENERO Feminino
IDADE 35
ESTADO CIVIL Casada
Nº. DE FILHOS 1
ESCOLARIDADE Grau Completo
164
TRABALHO ANTERIOR Doméstica
TEMPO DE RESIDENCIA NA
COMUNIDADE (ANOS)
25
ATIVIDADE COMUNITARIA Não
TEMPO DE PROFISSÃO (ANOS) 4
CURSO DE TECNICO DE
ENFERMAGEM
Sim
CURSO TECNICO DE AGENTE Não
Fonte: Pesquisa de campo, 2008.
QUADRO 5 – CARACTERIZAÇÃO DOS AGENTES COMUNITÁRIOS DE SAUDE DA REGIÃO SUDOESTE
DA CIDADE DE MONTES CLAROS.
CARACTERISTICAS DO AGENTE AGENTE 9
Omael
AGENTE 10
Ariel
GENERO Masculino Masculino
IDADE 40 31
ESTADO CIVIL Casado Solteiro
Nº. DE FILHOS 2 Não
ESCOLARIDADE 2º Grau Incompleto 2º Grau Completo
TRABALHO ANTERIOR Cobrador
Servente de pedreiro
Desempregado
TEMPO DE RESIDENCIA NA
COMUNIDADE (ANOS)
30 23
ATIVIDADE COMUNITARIA Associação de
Moradores
Grupos Religiosos
Grupos Religiosos
TEMPO DE PROFISSÃO (ANOS) 2 2
CURSO DE TECNICO DE
ENFERMAGEM
Não o
CURSO TECNICO DE AGENTE Não o
165
Fonte: Pesquisa de campo, 2008.
QUADRO 6 CARACTERIZAÇÃO DOS AGENTES COMUNITÁRIOS DE SAUDE DA REGIÃO SUL DA
CIDADE DE MONTES CLAROS.
CARACTERISTICAS DO
AGENTE
AGENTE 11
Sitael
AGENTE 12
Aniel
GENERO Feminino Feminino
IDADE 37 39
ESTADO CIVIL Casada Casada
Nº. DE FILHOS 2 2
ESCOLARIDADE Grau Completo 2º Grau Completo
TRABALHO ANTERIOR Doméstica
Sorveteria
Do lar
TEMPO DE RESIDENCIA NA
COMUNIDADE (ANOS)
32 16
ATIVIDADE COMUNITARIA Pastoral da Criança
Associação de Moradores
Grupos Religiosos
TEMPO DE PROFISSÃO (ANOS) 9 8
CURSO DE TECNICO DE
ENFERMAGEM
Sim Sim
CURSO TECNICO DE AGENTE Não Não
Fonte: Pesquisa de campo, 2008.
QUADRO 7CARACTERIZAÇÃO DOS AGENTES COMUNITÁRIOS DE SAUDE DA REGIÃO OESTE DA
CIDADE DE MONTES CLAROS.
CARACTERISTICAS DO AGENTE AGENTE 13
Jeliel
AGENTE 14
Manael
AGENTE 15
Anauel
GENERO Feminino Feminino Feminino
IDADE 33 39 28
ESTADO CIVIL Casada Casada Casada
166
Nº. DE FILHOS 2 3 2
ESCOLARIDADE 2º Grau Completo 2º Grau Completo 2º Grau Completo
TRABALHO ANTERIOR Do lar Auxiliar de escritório Doméstica
TEMPO DE RESIDENCIA NA
COMUNIDADE (ANOS)
20 30 17
ATIVIDADE COMUNITARIA Grupos Religiosos Pastoral da Criança
Associação de
Moradores
Pastoral da
Criança
TEMPO DE PROFISSÃO (ANOS) 8 8 8
CURSO DE TECNICO DE
ENFERMAGEM
Sim Não Sim
CURSO TECNICO DE AGENTE Sim Sim o
Fonte: Pesquisa de campo, 2008.
De acordo com as variáveis sociodemográficas, a maioria dos Agentes
pesquisados pertence ao sexo feminino, perfazendo 87% dos entrevistados, o que vem
ao encontro com os dados publicados pelo Ministério da Saúde em 2002 de que 70% dos
Agentes são mulheres (BRASIL, 2002). Essa característica assemelha-se à origem dos
Agentes no estado do Ceará que priorizou a contratação de mulheres, justificado pelo fato
de que elas são responsáveis pelo cuidado de suas famílias e possuem qualidades
indispensáveis para essa função, que é de Saber Cuidar, Saber Comunicar e Saber
Conviver com os seus vizinhos e as demais famílias da comunidade (LAVOR; LAVOR;
LAVOR, 2004).
Essas qualidades facilitam a execução do papel de laço e identificação, que as
mulheres são cuidadoras universais, característica atribuída pela sociedade ao gênero
feminino; cabe à mulher exercer suas atividades na esfera privada, ou seja, dentro do
domicílio e suas atribuições estão relacionadas, principalmente, à maternidade, com a
167
tarefa de cuidar da família e ser guardiã do afeto e da moral. Quando necessitam realizar
papeis na esfera blica, assumindo ou compartilhando o sustento da família,
desempenham sempre papeis ligados ao de mãe, constituindo uma extensão da esfera
privada. Dessa forma, as mulheres das comunidades monstesclarenses reconheceram-se
no papel de Agente Comunitário como uma extensão do cuidado aliado a uma
oportunidade de ingressarem no mercado de trabalho, sem se afastarem de suas famílias
(FARIA; NOBRE, 1997).
Essa situação não é privativa da cidade de Montes Claros, vários estudos sobre o
trabalhador Agente Comunitário encontraram essa mesma realidade, como em Silva e
Dalmaso (2002); Lunardelo (2004); Ferraz; Aerts (2005).
No aspecto relacionado à escolaridade, 73% (11) têm o 2º Grau completo e apenas
6,7% (1) têm o 1º Grau Completo, atendendo ao requisito para ser Agente, que é o de ter
no mínimo o 1º grau completo. Tamm contempla a perspectiva da formação profissional
como Técnico de Agente Comunitário de Saúde e apresenta uma realidade superior aos
dados nacionais publicados em 2002, que correspondiam a 60% com ensino médio
completo e incompleto (BRASIL, 2002; BRASIL, 2004).
Em relação ao estado civil, a maioria (73% /11) encontra-se casada, como também
86,7% (13) têm filhos, assumindo, dessa forma, a responsabilidade pelo sustento total ou
parcial da família. Assim, agregam uma responsabilidade maior com a profissão aliada a
um temor, medo relacionado ao desemprego, levando ao sofrimento e à submissão ao
empregador com condições e vínculos precários. Existe tamm a vivência da
experiência em saúde da criança, saúde da mulher e da maternidade, já que a maioria é
do gênero feminino, facilitando o trabalho com as famílias assistidas.
168
A distribuição por faixa eria demonstra que os Agentes encontram-se acima de
27 anos com uma pequena concentração em maiores de 35, como retratado na tabela 4,
contemplando um dos pré-requisitos de ter idade acima de 18 anos.
TABELA 4- Distribuição dos Agentes por faixa etária da cidade de Montes
Claros/MG, 2008.
Faixa etária N
27 ¬ 30 05
30 ¬ 33 03
33 ¬ 35 01
≥ 35 06
Total 15
Fonte: Pesquisa de campo, 2008.
O Ministério da Saúde estabelece como pré-requisito para ser Agente Comunitário
que se more na comunidade há no mínimo dois anos, exigência justificada pelo fato de o
Agente ter que conhecer a localidade e ser reconhecido pela população. Os Agentes que
participaram do estudo tinham no mínimo cinco anos de residência (apenas dois) e a sua
maioria (13) residia mais de 10 anos na comunidade assistida, com isso todos
possuíam o conhecimento da mesma. Essa condição favorece a orientação comunitária e
a centralizão familiar com o estreitamento do laço, levando à implementação do atributo
da coordenação da equipe aliado à longitudinalidade (STARFIELD, 2002; MINAS
GERAIS, 2007; BRASIL, 2007c).
Cabe destacar, ainda, que o fato de residir na comunidade proporciona ao Agente
de Saúde a experiência de vivenciar, experimentar e compreender o mundo; este ser no
169
mundo que o ACS compartilha com a comunidade facilita o entendimento da forma de
existir humano e a forma de relacionar com os outros, favorecendo, assim, a
compreensão dos indivíduos assistidos e suas famílias, uma vez que o homem é projeto
do mundo e o mundo são projeções humanas, o ser no mundo é repleto de significados,
pois envolver-se com os outros seres desencadeia a transformação do mundo, o que leva
à transformão de si mesmo, modificando a sua relação com os outros, e isso significa
cuidar, palavra que define o ser enquanto ser (STEIN, 1988; HEIDEGGER, 1981;
HEIDEGGER, 1999). Diante disso, o Agente encontra-se em situação privilegiada de
compreensão do ser-aí, o ser no mundo e o ser-com-os-outros, subsidiando ações de
cuidar.
A estratégia saúde da família na cidade de Montes Claros teve sua implantação no
ano de 1998, com duas equipes, sendo que grande parte das equipes foram implantadas
em 1999 e 2000. Assim, durante o período de coleta de dados, procurou-se conversar
com os Agentes pertencentes às equipes com tempo de existência diferentes, tentando
conhecer a vivência ao longo dos anos e buscando retratar se poderia haver mudanças
significativas nos discursos de acordo com o tempo de profissão.
Diante disso, as entrevistas foram realizadas em equipes com diferentes tempos de
implantação e tamm com Agentes em diferentes tempos de exercício profissional, pois
a equipe pode ter sofrido mudanças de profissionais ao longo dos anos. O tempo de
profissão está apresentado na Tabela 5.
TABELA 5- Distribuição dos Agentes por tempo de profissão da cidade de Montes
Claros/MG, 2008.
Tempo de Profissão (anos) N
2 03
170
3 04
4 01
8 05
9 02
Total 15
Fonte: Pesquisa de campo, 2008.
De acordo com os dados apresentados, nota-se que os Agentes possuem os
atributos da atenção primária, em especial o da Longitudinalidade, que significa ser
refencia e fonte de atenção para a comunidade ao longo do tempo, proporcionando o
aumento do vínculo e o conhecimento dos problemas e facilitando o processo de
comunicação e elo com intervenções personalizadas. (STARFIELD, 2002; MINAS
GERAIS, 2007; BRASIL, 2007c)
Outra informação relevante é que a maioria dos Agentes iniciou suas atividades
junto com as equipes. Poucos deles foram usuários anteriormente, ou seja, não tinham
nenhum conhecimento sobre a profissão, mas tinham alguma experiência com o trabalho
comunitário, representado pela variável atividade comunitária. Observou-se que 73% (11)
tinham participação em atividades vinculadas à Pastoral da Criança, Grupos Religiosos e
Associação de Moradores. Assim, mesmo não conhecendo a profissão que iriam iniciar,
foram estimulados pela experiência adquirida com as atividades comunitárias, em
especial a Pastoral da Criança, encontrando uma forma confortável de continuar
trabalhando com a comunidade e contribuindo com a melhoria das condições de vida da
mesma, iniciando pela sua própria família, pois o seu fazer cotidiano passou a ser
remunerado.
171
Apenas 27% não tinham anteriormente a função de Agente e continuam não
exercendo nenhuma atividade comuniria. O discurso do entrevistado Ariel (31 anos), por
meio das suas expressões-chave, justifica a não realização das atividades comunitárias
anteriores em decorrência da dificuldade de conciliação com o trabalho atual de Agente
Comunitário.
Oh, eu trabalhei quatro anos, é,... não foi exclusivamente na
comunidade, eu trabalhei quatro anos mexendo com religião, em
grupos religiosos, então é a gente trabalhava muito aqui na área, é,
evangelizando o pessoal, conversando, ajudando as pessoas.
[Você ainda mantém essas atividades comunirias] Oh, essas
atividades hoje eu não tou mantendo mais, né, hoje a atividade que
eu tou mantendo hoje com a comunidade é somente o meu
trabalho, porque não tá dando pra conciliar.
Outro aspecto importante é o número significativo de Agentes, no total de 10
(67%), que possuem o curso técnico de enfermagem, sendo que 60% dos mesmos
ingressaram no curso por meio do PROFAE, o qual foi disponibilizado pelo Ministério da
Saúde em parceria com a Secretaria Municipal de Saúde. Com relação ao Curso Técnico
de Agente, que se tornou uma exigência da profissão após a criação da categoria
profissional, apenas seis (40%) o estão cursando.
Os Agentes pesquisados participaram do processo seletivo, que consistiu em prova
escrita para 14 (93%) dos sujeitos e apenas um foi por meio de entrega de currículo; os
Agentes mencionaram que, após a aprovação na prova escrita, foram submetidos a
outras etapas, como prova prática (treinamento introdurio) mencionada por 10 (71,4%) e
172
tamm entrevista, referida por 09 (64,3%). Esse dado demonstra que a maioria
participou de processo seletivo sem favorecimento e de forma idônea, garantindo a
transparência do processo e condizente com o preconizado pelos documentos do
Ministério da Saúde (BRASIL, 1991; 1994, 1994a, 1997, 2002).
Apresentaremos a seguir, em forma de Discurso do Sujeito Coletivo (DSC) e das
respectivas Ideias Centrais (IC) e Expressões-Chave (ECH), a essência do trabalho do
Agente em Montes Claros por meio dos saberes.
2- ALISE DOS DISCURSOS DO SUJEITO COLETIVO AGENTE
COMUNITARIO DE SAUDE
Nesta seção são apresentados os dados referentes ao discurso dos 15 agentes
comunitários de saúde entrevistados conforme estratégia metodológica adotada no
estudo expressa através de Idéias Centrais (IC) e Discurso do Sujeito Coletivo (DSC).
Essa etapa foi dividida em 4 saberes - Saber Ser, Saber Conhecer/Aprender, Saber
Fazer e Saber Conviver. Para facilitar a compreensão, será apresentada a seguir uma
síntese que permite uma visão geral das categorias e ideias-chave. Ao longo da
apresentação das ideias-chave, alguns aspectos serão discutidos a luz da literatura,
permitindo refletir sobre os dados obtidos, considerando a realidade do Agente em
Montes Claros - MG, em outras localidades e em âmbito nacional.
PERCEPÇÃO DOS AGENTES DE SAUDE SOBRE O SEU PERFIL E SEU PAPEL COM
BASE NOS SABERES (SABER SER, SABER CONHECER, SABER FAZER E SABER
CONVIVER)
173
SABER SER
1- MOTIVAÇÃO PARA SER AGENTE COMUNITÁRIO DE SAÚDE
Ideia Central (IC) 1 - Oportunidade de emprego
Ideia Central (IC) 2 - Oportunidade de emprego na área da saúde
Ideia Central (IC) 3 - Ajudar o próximo e a comunidade
Ideia Central (IC) 4 - Vocação
Ideia Central (IC) 5 - Influência Familiar
2- SIGNIFICADO DO SER AGENTE COMUNITÁRIO DE SAÚDE
Ideias Centrais: Ser Agente é:
1- Ter atitudes: ética, respeito, responsabilidade, paciência, saber cuidar e compartilhar.
2- Realizar ações voltadas ao próximo, à família e à comunidade: Ajudar, Cuidar, Acolher,
Contribuir, Repartir, Acompanhar, Orientar, Encaminhar, Explicar, Resolver.
3- Possuir atributos pessoais: Saber Ouvir/Escutar, Saber Lidar, Saber Comunicar, Ser
Tranquilo, Saber Doar, Identificar com o trabalho, sendo Povo com o Povo por meio do
Amor Profissional.
4- Possuir atributos profissionais: Saber Ser Elo, Identificar com a comunidade, Ser
representante da Comunidade, Conhecer as Famílias e a Comunidade, Ser Porta de
Entrada para o sistema de saúde.
5- Causar repercussões positivas (Ser Acolhido, Valorizado, Vivenciar experiências
gratificantes que resultam no estreitamento das relações interpessoais, levando a sentir-
se como membro da família) e negativas ( Incompreensão, Desvalorização, Decepção )
na Comunidade e nas Famílias.
174
3- QUALIDADES E VALORES DO AGENTE COMUNITARIO DE SAUDE
Ideias Centrais - O Agente Comunitário de Saúde deve possuir:
1- Atitudes/valores ética, compromisso, responsabilidade, paciência, confiança,
credibilidade, honestidade, compreensivo, atencioso, prestativo, fiel com a comunidade,
saber ouvir e relacionar, não fazer distinção/discriminar e tratar de forma igual.
2- Qualidades como ser compreensivo, solidário e amigo, saber acolher, ajudar e
conversar, sendo capaz de transpor um saber fácil de entender, norteando as Ações
voltadas ao próximo, à família e à comunidade.
3- Atributos pessoais: Ser humano, Ter amor à profissão, Ser simpático, Ser humilde, Ter
empatia, Motivão, Perseverança com força de vontade, Saber Interagir/Lidar,
Comunicar, Ouvir/Escutar.
4- Atributos profissionais: Ser profissional, Saber lidar com os problemas pessoais e
profissionais, Saber comunicar, Saber relacionar, Ser influenciador, Conhecer as Famílias
e a Comunidade.
4- ATRIBUTOS NEGATIVOS QUE O AGENTE COMUNITARIO DEVE EVITAR.
Ideias Centrais - O Agente Comunitário de Saúde não deve:
1- Demonstrar atitudes negativas: Ser fofoqueiro, Não ser ético, Irresponsável,
Descompromissado, Impaciente.
2- Ser muito bravo, grosseiro, ranzinza, arrogante, soberba e não saber ouvir.
3- Ser despreparado e não transmitir segurança e falta de vontade para ajudar.
5- ASPECTOS FACILITADORES PARA O DESENVOLVIMENTO DO PAPEL DO
AGENTE
Ideias Centrais - O desenvolvimento do papel de Agente é facilitado:
175
IC1- Pela presença de atributos pessoais amor à profissão, ajudar os outros,
capacidade de relacionar ou interagir com as pessoas, relação de confiança.
IC2- Pela presença de atributos profissionais - conhecer e estabelecer compromisso com
a comunidade, motivação proveniente da equipe.
IC3- Pela presença de atitudes da comunidade - aceitação das famílias e estabelecimento
de relação de compromisso e confiança.
IC4- Pela acessibilidade geográfica - localização e proximidade de sua residência, que
facilita o desenvolvimento do papel do Agente.
IC5- Pela organização dos serviços de sde por meio do trabalho em
equipe/interdisciplinar e a presença do Agente administrativo.
6- ASPECTOS DIFICULTADORES PARA O DESENVOLVIMENTO DO PAPEL DO
AGENTE
Ideias centrais - O desenvolvimento do papel de Agente é dificultado pela:
IC1- Valorização das atividades curativas, levando a não aceitação dos Agentes com
incompreensão e maltrato, associado à marcação de consulta, atividades
administrativas/burocráticas e atividades que o estão dentro da função de Agente que
causam sobrecarga e desmotivação.
IC2- Não valorização das atividades educativas.
IC3- Falta de acessibilidade geográfica e funcional como barreira geográfica, dificuldade
de acesso e a realização de visita para as pessoas que trabalham, o que dificulta o
desenvolvimento do papel do Agente.
IC4- Presença de aspectos inerentes à comunidade - aspectos socioeconômicos/
geográficos, questões sociais, como área de risco com baixo poder aquisitivo e falta de
infraestrutura, tráfico de drogas.
176
IC5- Falta de material para sensibilização da comunidade.
IC6- Presença de atitudes da equipe - Falta de respaldo para o trabalho do Agente por
parte da equipe.
7- ASPECTOS A SEREM MODIFICADOS NO PROCESSO DE TRABALHO DO AGENTE
COMUNITÁRIO DE SAUDE
IC1- Os Agentes modificariam a obrigatoriedade da visita domiciliar mensal, que
atualmente é realizada de maneira indiscriminada, não levando em consideração as
necessidades das famílias.
IC2- Retirar do processo de trabalho a atividade de marcar consulta, evitando a
compreensão reduzida do papel do Agente associada a não compreensão do novo
modelo assistencial e insatisfação com os Agentes.
IC3- Evitar a culpabilidade do Agente pela organizão, funcionamento e resolutividade
do sistema de saúde.
IC4- Retirar do processo de trabalho a necessidade de assinatura do morador após a
realização da visita domiciliar, evitando a compreensão reduzida do Agente como mero
caça assinatura.
IC5- Vivência de trabalho em equipe de forma interdisciplinar, garantindo a efetivação das
ões e a criação de vínculo de confiança, evitando a organização hierárquica.
IC6- Os Agentes diminuiriam o número de famílias cadastradas, visando ao melhor
acompanhamento e assistência.
IC7- Efetivação, com direitos trabalhistas e melhoria salarial, garantindo segurança para
realizar o processo de trabalho.
IC8- Não é necessária nenhuma modificação.
177
8- PERCEPÇÃO DA COMUNIDADE SOBRE O TRABALHO DO AGENTE NA
PERSPECTIVA DO AGENTE
IC1- A comunidade reconhece o profissional Agente através da compreensão/valorização
do papel de elo, sendo considerado referência no aspecto da saúde, o que resulta na
aceitação do trabalho.
IC2- Alguns moradores não valorizam o trabalho do Agente.
IC3- Culpa do Agente.
IC4- A comunidade valoriza as atividades curativas em detrimento das ações preventivas
e percebem o Agente apenas como Marcador de consulta, resultando na não
compreensão do novo modelo assistencial e insatisfação com os Agentes.
9- EXPECTATIVAS DA PROFISSÃO DO AGENTE
Ideias Centrais - O Agente Comunitário espera para o futuro:
IC1- Efetivação, a fim de garantir segurança e tranquilidade para realizar as atividades
cotidianas.
IC2- Valorização profissional em proporção com a responsabilidade, e o processo de
trabalho com reconhecimento tanto no âmbito financeiro quanto social, rompendo com a
visão do Agente como classe menos favorecida.
IC3- Efetivação como elo entre a comunidade e a unidade de saúde.
IC4- Educação permanente, garantindo qualificação profissional.
IC5- Apoio para implementar as atividades educativas.
IC6- Organização da classe profissional, levando à representatividade.
10- SER AGENTE COMUNITARIO DE SAUDE E SER AUXILIAR DE ENFERMAGEM:
DOIS PONTOS DE VISTA
178
IC1- Ser auxiliar de enfermagem proporciona ao Agente a maior valorizão perante a
comunidade que anseia pelas atividades curativas.
IC2- Ser auxiliar de enfermagem traz mais benefícios no aspecto individual do que no
coletivo.
11- ASPECTOS MOTIVADORES DO PROCESSO DE TRABALHO DO AGENTE
Ideias Centrais - O Agente Comunitário é motivado:
IC1- Pela resolução das necessidades de saúde, levando à sensação de dever cumprido
e reconhecimento.
IC2- Pela satisfação do usuário por meio das ações empreendidas durante o processo de
trabalho.
IC3- Pelo desejo de ajudar o próximo.
12- ASPECTOS DESMOTIVADORES DO PROCESSO DE TRABALHO DO AGENTE
Ideias Centrais - O Agente Comunitário é desmotivado:
IC1- Pela falta de resolução, que ocasiona a falta de credibilidade acerca do
desenvolvimento do papel desse profissional.
IC2- Pela responsabilização do Agente pela organização e funcionamento do sistema de
saúde, o que ocasiona insatisfação do usrio e incompreensão.
IC3- Pela compreensão reduzida do papel do Agente como andarilho da sde e caça
assinatura.
IC4- Pela realização de atividades administrativas desvirtuadas que sobrecarregam o
serviço e causa stress.
IC5- Pela ausência de trabalho de equipe associada à falta de compromisso com a
comunidade.
179
13- MUDANÇAS DA CONCEPÇÃO DO PROCESSO DE TRABALHO DO AGENTE
COMUNITARIO DE SAÚDE
14- A PERCEPÇÃO DA FAMÍLIA DOS AGENTES SOBRE O PROCESSO DE
TRABALHO DESSE PROFISSIONAL N A PERSPECTIVA DO SUJEITO/AGENTE
IC1- A família considera o papel de Agente como relevante, indispensável e essencial
para a comunidade por meio de ações de cuidado e também promove o desenvolvimento
pessoal.
IC2- A família valoriza o trabalho de Agente, que representa fonte de orgulho e confiança.
IC3- A família considera o processo de trabalho complexo, associado ao fato da
comunidade não separar o profissional-Agente do morador-Agente, com procura fora do
horário de serviço e do ambiente de trabalho e com cobranças indevidas.
IC4- A família considera o processo de trabalho complexo associado à convivência direta
com a realidade local e com a violência.
15- A PROFISSÃO DE AGENTE: UM TRABALHO A SER RECOMENDADO PARA
FAMILIARES E AMIGOS
Ideias Centrais Um trabalho a ser recomendado para familiares e amigos que
possuírem:
IC1- Atitudes e valores, como paciência e calma.
IC2- Atributos pessoais, como amor profissional.
IC3- Qualidades e atributos profissionais, como ser calmo, saber conversar, comunicar,
explicar, ser capaz de transpor informações, saber ouvir e saber lidar com situações
diversas.
180
16- AÇÕES NECESSÁRIAS PARA A VALORIZAÇÃO DO AGENTE DE SAÚDE NA
PERCEPÇÃO DO AGENTE
IC1- Valorização dos Agentes por parte da equipe e do gestor municipal de saúde como
peça fundamental no processo de inversão do modelo assistencial por meio do trabalho
em equipe, interdisciplinar e de visibilidade.
IC2- Divulgação do papel do Agente e da equipe de saúde da família, proporcionando
maior visibilidade e desmistificando a ideia de mero marcador de consulta.
IC3- União da categoria Agente de forma organizada para reivindicar e garantir os direitos
trabalhistas.
SABER CONHECER
1- PROCESSO DE EDUCAÇÃO PERMANENTE EM SAÚDE
IC1- Compromisso com a comunidade, estimulado pelo conhecimento da realidade local e
associado ao importante papel de educador sanitário e social das famílias.
IC2- Implementação do processo de Educação em saúde efetivada na visita domiciliar por
meio da escolha de temas a serem discutidos com as famílias.
2- ASPECTOS QUE CONTRIBUEM PARA A DESCONTINUIDADE DO PROCESSO DE
EDUCAÇÃO PERMANENTE EM SAUDE
IC1- Sobrecarga de atividades desenvolvidas pela equipe de saúde em decorrência de
formação incompleta das equipes, período de férias e acúmulo de atividades.
IC2- Sobrecarga de atividades em decorrência da implantação do plano diretor da
atenção primaria à sde.
181
IC3- Sobrecarga de atividades em decorrência da realização de reuniões na Secretaria
Municipal de Saúde.
IC4- Repetição dos temas durante o processo de educação permanente que ocasiona a
desmotivação.
3- ESCOLHA DOS TEMAS PARA O PROCESSO DE EDUCAÇÃO PERMANENTE EM
SAÚDE
Ideias Centrais O processo de escolha dos temas a serem abordados na educação
permanente baseia-se na:
IC1- Prática cotidiana dos Agentes de saúde por meio do levantamento das dificuldades
vivenciadas, dúvidas da comunidade, necessidades locais e situações epidemiológicas.
IC2- Plano Diretor da Atenção Primária à Saúde.
IC3- Escolha dos coordenadores (enfermeiro e médico) durante a implantação da equipe,
passando depois para a escolha dos temas, embasados na comunidade.
4- (DES) CONHECIMENTO DOS AGENTES DE SAÚDE SOBRE OS PRINCÍPIOS DO
SUS.
SABER FAZER
1- ATRIBUIÇÕES DO AGENTE COMUNITARIO DE SAUDE
IC1- Visita Domiciliar.
IC2- Reuniões – Atividades educativas coletivas.
IC3- Orientações e aconselhamento Comunitário.
IC4- Atividades internas – administrativas, recepção, farmácia.
182
IC5- Acompanhamento das famílias e de grupos específicos.
IC6- Marcação de Consulta, entrega de encaminhamentos e exames.
IC7- Promotor da Saúde e atividades comunitárias.
IC8- Acolher, ouvir a comunidade.
IC9- Elo.
IC10- Atividades de técnico de enfermagem - curativo, medida de pressão arterial - PA.
IC11- Trabalho em equipe.
2- PLANEJAMENTO DAS ATIVIDADES
IC1- O planejamento não é implementado adequadamente devido à realização de outras
atividades administrativas internas e externas, como entrega de exames e
encaminhamentos, associado à ausência de Agentes, o que causa sobrecarga de
atividades administrativas.
IC2- O planejamento o é implementado adequadamente devido a demandas da
comunidade e a necessidade de ser ouvida.
3- REALIZAÇÃO DAS VISITAS DOMICILIARES
1º Passo: DSC- Chegada ao domicílio, quando o Agente é conhecido pela família.
2º Passo: DSC- Certificar se o horário e o momento são apropriados para a visita.
3º Passo: DSC- Estabelecimento do diálogo e início da visita domiciliar.
4º Passo: DSC- Identificação e acompanhamento dos Grupos Específicos.
5º Passo: DSC- Acompanhamento e aconselhamento familiar e individual.
4- PERCEPÇÃO DO AGENTE ACERCA DA RECEPTIVIDADE DAS FAMÍLIAS
IC1- Boa receptividade
183
IC2- As famílias percebem o Agente Comunitário como o representante do serviço de
saúde e responsabiliza-o pela ineficiência e não resolução do sistema de sde,
resultando na resistência ao processo de visita domiciliar.
5-ACOMPANHAMENTO DOS GRUPOS ESPECÍFICOS
IC1- Acompanhamento dos hipertensos.
IC2- Acompanhamento dos diabéticos.
IC3- Acompanhamento das gestantes.
IC4- Acompanhamento das crianças.
IC5- Acompanhamento de condições que devem ser acompanhadas.
IC6- Acompanhamento dos hansenianos.
IC7- Acompanhamento dos tuberculosos.
IC8- Acompanhamento por meio dos grupos operativos.
6- REUNIÕES - EDUCAÇÃO EM SAUDE
DSC- “Eu ainda não fiz nenhuma reunião sozinho, a gente não faz sozinho, a gente
acompanha o médico ou o enfermeiro”.
DSC “Eu conduzo as reuniões de gestantes toda segunda, a gente faz reunião na
pesagem, só na pesagem e as outras eu participo junto com o enfermeiro”.
7- REGISTRO DAS ATIVIDADES
IMPORTÂNCIA DA INFORMAÇÃO
IC1- Acompanhamento das famílias e indivíduos, visando à promoção da saúde e
prevenção de doenças.
IC2- Planejamento e avaliação das ações desenvolvidas pela equipe.
184
IC3- Alimentação dos sistemas de informação em saúde.
IC4- Garantia do serviço realizado durante a visita.
8- ANOTAÇÕES
IC1- Anotações nas fichas do sistema de informação da atenção básica.
IC2- Anotações diversas registradas no caderno.
8.1- MOMENTO DA ANOTAÇÃO
DURANTE A VISITA.
FINAL DA VISITA.
DEPOIS DA VISITA.
9- ATIVIDADES COMUNITÁRIAS
10- ATIVIDADES DE AVALIÃO DAS AÇÕES DE SAUDE
IC1- Avaliação do processo de trabalho.
IC2- Avaliação da situação de saúde.
IC3- Avaliação para o acompanhamento das famílias e dos grupos específicos.
IC4- Avaliação relacionada à prestação de contas no SIAB.
IC5- Avaliação relacionada ao desempenho pessoal.
11- ETICA NO DESENVOLVIMENTO DE SUAS ATIVIDADES
IC1- Demandas por dúvidas relacionadas à saúde e a doença são encaminhadas e
discutidas com os membros da equipe, especialmente para quem tem as respostas e as
soluções.
185
IC2- Demandas pessoais não são compartilhadas com a equipe e nem com outras
famílias.
12- SITUAÇÕES DE RISCO
IC1- Risco socioeconômico.
IC2- Risco ambiental.
IC3- Situação de risco relacionado à saúde.
IC4- Acompanhamento de Grupos Específicos de Saúde.
13- PROMOÇÃO A SAÚDE
14- SATISFAÇÃO COM A PROFISSÃO DE AGENTE COMUNITARIO DE SAUDE
SABER CONVIVER
1- A PERCEPÇÃO DO AGENTE SOBRE O TRABALHO EM EQUIPE
Ideias Centrais - O trabalho em equipe:
IC1- Pauta-se construção de objetivos comuns.
IC2- Complementa o fazer individual, resultando em resolução e co-participação no
processo de cuidar.
IC3- Favorece um sentimento de pertencer a uma família profissional fundamentada na
ajuda mútua, na empatia e no respeito.
IC4- Favorece a valorização do profissional por meio da contribuição e complementação
das ações.
186
IC5- É compreendido como ão de uma catraca”, com a interligação das partes na
formação de um processo de cuidar completo.
2- A PERCEPÇÃO DO AGENTE SOBRE O TRABALHO COM A COMUNIDADE
IC1- O trabalho com a comunidade é percebido como tarefa difícil quando relacionada a
interesses diferentes entre dois personagens equipe e comunidade.
IC2- O trabalho com a comunidade é percebido como tarefa fácil se relacionada ao
conhecimento e ao compromisso com a comunidade.
3- PERCEPÇÃO DOS AGENTES SOBRE A INTERAÇÃO DA EQUIPE COM A
COMUNIDADE
IC1- A interação equipe-comunidade ocorre de forma positiva por meio do respeito mútuo
com aceitabilidade, receptividade e respeito recíproco.
IC2- A interação equipe-comunidade ocorre através do Agente Comunitário, que funciona
como elo.
IC3- Orientação da comunidade por meio de atividades educativas e diálogo.
4- ASPECTOS DO PROCESSO DE TRABALHO DO AGENTE QUE A EQUIPE DEVERIA
COMPREENDER/CONTRIBUIR NA PERCEPÇÃO DO AGENTE
IC1- A equipe não precisa de nenhuma informão adicional.
IC2- Os aspectos negativos do processo de trabalho que geram sobrecarga: atividades
internas e administrativas, em especial agendamento de consultas e exames.
IC3- Acompanhar as atividades dos Agentes Comunitários de forma mais próxima.
IC4- Conhecer os aspectos positivos do processo de trabalho do Agente.
187
5- ASPECTOS DO PROCESSO DE TRABALHO DO AGENTE QUE A COMUNIDADE
DEVERIA CONHECER/COMPREENDER NA PERCEPÇÃO DO AGENTE
IC1- Desmistificar o papel de marcador de consulta e valorizar o verdadeiro papel do
Agente Comunirio: Promotor da Saúde.
IC2- Divulgação da função do Agente Comunitário de Saúde.
IC3- Conhecimento das dificuldades enfrentadas pelos Agentes de saúde.
IC4- Divulgação do Objetivo da Estratégia Saúde da Família.
6- REFERÊNCIA PROFISSIONAL NO ENFRENTAMENTO DE SITUAÇÕES DE
RISCO/ÁREA DE RISCO
7- PERCEPÇÃO DOS AGENTES SOBRE A ESTABILIDADE NA PROFISSÃO E SUAS
IMPLICAÇÕES NEGATIVAS E POSITIVAS
IC1- A falta de estabilidade ocasiona receio e preocupação que atrapalham o
desenvolvimento e o desempenho nas atividades, especialmente, relacionadas ao
aspecto mental e sobrecarga.
IC2- A falta de estabilidade prejudica o planejamento das metas pessoais para o futuro e
o estabelecimento de compromisso financeiro.
IC3- A estabilidade na profissão proporciona o estabelecimento de diálogo efetivo sobre a
dinâmica do trabalho da equipe de saúde e esclarecimento do papel do Agente.
IC4- A falta de estabilidade não interfere na realização adequada do serviço para os
profissionais comprometidos.
8- ROTATIVIDADE DE PROFISSIONAIS NA EQUIPE DE SAUDE DA FAMILIA:
PERCEPÇÃO DOS AGENTES
188
IC1– Busca de novos horizontes profissionais motiva a rotatividade.
IC2- O processo de trabalho causa sofrimento profissional e stress, motivando a
rotatividade.
IC3- Visão equivocada do processo de trabalho motiva a rotatividade.
2.1 - RESULTADOS E DISCUSSÃO DO SABER SER
“O amor cura as pessoas...
Tanto aquelas que dão
Quanto aquelas que recebem
(Karl Menninger)
O Saber Ser expressa-se por meio de valores, atitudes e qualidades,
demonstrando o domínio afetivo que contempla o conhecimento de si mesmo que
subsidia o relacionamento com o outro por meio das relações interpessoais (DELORS,
2003; BRASIL, 2004).
O Ser Agente retratado nesse estudo contempla o ser, o ser-aí e o ser-com-os-
outros por meio de Ideias-Centrais e seus respectivos DSCs.
1- MOTIVAÇÃO PARA SER AGENTE COMUNITÁRIO DE SAÚDE
A motivação para ser Agente Comunitário vem ao encontro de várias perspectivas,
não restritas apenas ao campo financeiro, mas indo muito além, como a busca para o
encontro do seu Ser no mundo e Ser com os outros, objetivando a sua valorização
pessoal e profissional. Nesse sentido, a leitura das entrevistas possibilitou a construção
de cinco ideias centrais expressas no quadro abaixo.
189
Ideia Central (IC) 1- Oportunidade de emprego.
A motivação mais mencionada pelos Agentes foi a oportunidade de ingressar no
mercado de trabalho, expressa pelo DSC.
DSC- “Eu quis ser Agente porque na época foi mais questão de
necessidade mesmo, primeiro porque foi uma oportunidade porque
eu tava desempregada, na verdade foi assim, eu tava
desempregada 4 anos, eu procurava servo não achava, na
época eu tava com trinta e poucos anos, só que nas firmas não tava
mais querendo pegar, como eu posso falar, a classificação minha
não tava tão boa, tinha gente que já tinha mais curso, eu só tinha o
grau, eu tava tendo dificuldade pra trabalhar, eu comecei aa
entrar em depressão na época, então eu falei ‘eu não vou me
desesperar’, minha família tava mim ajudando, pelo menos comida
não faltava. Aí um dia, já faltando um dia pra fazer a inscrição,
a menina da pastoral foi na minha casa e mim falou ‘Oh, R. ta
tendo um curso aí, né, de Agente Comunitário’; eu nem sabia nessa
época o quê que era Agente Comunitário, , ‘Você não quer fazer
a inscrição, você o vai pagar nada, é de graça mesmo’; eu
cheguei e fui na secretaria tirei o xerox dos documentos foi lá e fiz a
inscrição; e surgiu a oportunidade, fiz a prova que a gente fez na
época foi pra ser admitida, depois fiz o treinamento, aí a gente vai
gostando, apaixonando pelo trabalho, e depois eu me identifiquei
190
com esse serviço apesar de ser muito complicado, difícil, mas, difícil
porque são situações que a gente enfrenta, essa questão de
inversão de modelo é muito difícil até hoje, depois de 08 anos a
gente que assim o pessoal aprendeu um pouco, mas ainda é
muito pouco, também é muito caminho pra andar”.
O processo seletivo para Agente Comunitário de Saúde representou uma forma de
reingressar no mercado de trabalho e de promover a geração de renda para garantia do
sustento da família, que os candidatos, em sua maioria, encontravam-se
desempregados na época da seleção. Essa motivação também foi retratada em outros
estudos, com destaque para Bachilli et al. (2008, p.53); em um estudo com sete Agentes
Comunitários, chamam atenção para o desemprego e a busca pela valorização em uma
nova categoria profissional. Assim comentam:
A opção pelo trabalho de Agente Comunitário caracteriza-se, assim,
não somente pela alternativa ao desemprego um ato da vontade,
mas principalmente pela atitude de presença na vida produtiva, que
se lança em busca de uma nova valorização, uma nova categoria
profissional.
O desejo de estar na vida produtiva e, especialmente, fazer parte de uma categoria
profissional, que para muitos era desconhecida, criou perspectivas para esses sujeitos
que se encontravam à margem da esfera produtiva e da esfera pública, precisando
sustentar suas famílias e, acima de tudo, sustentar seus sonhos de uma vida melhor no
âmbito familiar e social.
A questão da valorização pode ser percebida em algumas das ideias centrais que
se seguem.
191
Ideia Central (IC) 2- Oportunidade de emprego na área da saúde.
DSC- “Eu fiz o auxiliar e o técnico de enfermagem, surgiu a
oportunidade, eu tava na área da saúde, e aproveitei a
oportunidade eu que não tava trabalhando; aí, como é pra gente, e
aí ser na área de saúde, é claro, vou tentar, aí que tentei”.
O processo seletivo também representou uma oportunidade de ingressar na área
de saúde, que passaram a desenvolver suas atividades de enfermagem dentro do
sistema de saúde, funcionando como um “trampolim para a implementação do curso
iniciado anteriormente, e ser Agente revelou-se como uma forma de executar o fazer em
saúde e enfermagem.
Ideia Central (IC) 3- Ajudar o próximo e a comunidade.
DSC- Bom, é que eu percebi que a minha comunidade realmente
ela é bem carente então precisa de pessoas pra orientando, né,
é, aí, eu percebi que eu podia integrando aqui dentro, e
ajudando a comunidade, pelo fato de saber que eu ajudando o
meu próximo, né, área da saúde é uma área que eu gosto, e, e,
de ajudando, é, saber que eu gosto muito; primeiro porque eu
sempre gostei de trabalhar com a comunidade, e eu trabalhei na
associação de bairro, e trabalhei como voluntário, né, legionário,
legião de Maria, eu tinha um início de trabalho com a
comunidade, então, é era uma forma de ter mais experiência de
trabalhar no bairro, trabalhar com quem já conheço, continuidade
192
àquilo que já conheço, eu gosto de ser Agente, tem muitas coisas
parecidas com o trabalho comunitário”.
A opção pelo trabalho de Agente foi motivada pelo desejo de ajudar o pximo e a
comunidade, aliado ao beneficio da remuneração das atividades comunitárias
anteriormente realizadas de forma voluntária, continuando a prestar o cuidar à
comunidade e às famílias assistidas.
Esse desejo de ajudar revela a essência do fazer do Agente, que é a arte de cuidar
enquanto atenção, carinho, dedicação, zelo, desvelo, envolver-se com o outro,
abrangendo um modo de ser que engloba a forma de ser-no-mundo, percebendo o outro
como realmente é, respeitando-o e garantindo a autenticidade do ser que se revela como
um ser-no-mundo que se impõe como único. A partir dessa compreensão, o Agente pode
estabelecer relações interpessoais construtoras de confiança e credibilidade fundamentais
para a assistência (BOFF, 2004; BRASIL, 2008).
Ideia Central (IC) 4- Vocação.
ECH Gabriel Justamente por se tratar da comunidade, que eu
gosto muito de trabalhar com ela, não é tanto o salário, entendeu?
Mas é por vocação mesmo, porque eu gosto”.
Delors (2003) afirma que a dimensão do ser representa o domínio afetivo, o que é
retratado no discurso de Gabriel, que valoriza esse domínio, compreendendo-o como
vocação, iniciada com o conhecimento de si mesmo (gostar de trabalhar com a
comunidade) para, depois, se relacionar com os outros por meio das relações
interpessoais com a comunidade e, enfim, ajudar a quem necessita.
193
Essa vocação revela-se no cuidar, que representa a raiz primeira do ser humano, já
que somos criaturas cuidadoras, pois projetamos o cuidar em toda a nossa vida. Dessa
maneira, cuidar do outro passa a representar um desejo íntimo que não pode ser
explicado e é nomeado por alguns de Vocação (BOFF, 2004).
Ideia Central (IC) 5- Influência Familiar.
ECH Omael “Oh, na realidade a minha mãe é enfermeira particular,
né, então dentro de casa eu sempre tive, é, é, eu sempre tive um
contato com a pessoa, é, é... uma influência muito grande pra
trabalhar na área da saúde, mas eu nunca tive, assim, vontade, de ter
a vocação, depois que eu comecei a trabalhar que eu, é, é... foi
despertando em mim assim aquela, é... o desejo de, de trabalhar na
área da saúde que até então eu não tinha essa vontade. Igual hoje eu
trabalho, eu sei como é que é, assim quando você ajuda a pessoa e
a pessoa bem, entendeu, vê que aquilo ali partiu de você, que
aquilo ali vai fazendo a diferença, vai fazendo que cada dia mais você
tenha vontade de trabalhar na área”.
Heidegger (1981) analisa que a vivência cotidiana caracteriza o homem e o seu ser
situado no mundo. Dessa forma, Omael destaca, através da sua história de vida e em
contato com a experiência de cuidar, que foi motivado a procurar algo além de si mesmo
e o descobriu no papel de Agente Comunitário, projetando-se para fora de si por meio da
ajuda ao próximo e da gratificação por promover a saúde; esse projetar-se transformou o
fazer em algo prazeroso, uma fonte de inspiração para enfrentar as adversidades.
194
2- SIGNIFICADO DO SER AGENTE COMUNITÁRIO DE SAÚDE
O saber-ser se expressa através de atitudes, valores e qualidades pessoais, sejam
elas inatas ou adquiridas resultam na produção de si para o agir no processo de trabalho.
Diante disso, os anjos de Montes Claros dimensionaram o significado do ser Agente
Comunitário de Saúde por meio de Cinco Ideias Centrais e seus respectivos DSCs.
Ideia Central 1- Ser Agente é ter Atitudes: ética, respeito, responsabilidade,
pacncia, saber cuidar e compartilhar.
DSC- “Eu acho que ser Agente é tipo assim, você tem que ter
pacncia, é um cargo de muita responsabilidade, né, com muita
responsabilidade, de uma certa forma você é responsável pelo um
certo número de família e assim é um trabalho que exige muito
sigilo de suas condutas o que você faz dentro da área, dentro
você ouviu saiu dali acabou, é você saber respeitar as pessoas, o
idoso, é saber o que a pessoa está necessitando ali, você fazer o
melhor por ela, assim a gente pega muito, muito intimidade com a
pessoa, é assim que eu me sinto como ACS”.
O Ser Agente deve ter atitudes para ser-aí, estando no mundo, com o mundo e
pelo mundo; essas atitudes facilitam a interação com as pessoas e a coletividade por
meio de ações que promovam a troca de experiências e diálogo, acima de tudo, com
responsabilidade, ética e respeito (HEIDEGGER, 1999; STEIN, 1988; FREIRE, 1983).
Os Agentes nomeiam atitudes como expressão do Ser Agente, já que, para
compreender o seu ser, é necessário compreender o outro e, para compreendê-lo, é
195
preciso estabelecer relação com-o-outro e com-o-mundo, agindo, reagindo e interagindo;
o homem somente existe como ser-no-mundo através do relacionamento com os outros
seres, já que não há um ser sem o mundo e o mundo sem o ser (HEIDEGGER, 1999;
STEIN, 1988; FREIRE, 1983).
Os anjos do estudo, dentro de sua sabedoria, revelaram que o cuidar é o princípio,
o meio e o fim das relações interpessoais que tornam-se efetivas por meio de atitudes
construtivas.
Ideia Central 2- Ser Agente é realizar Ações voltadas ao próximo, à família e à
comunidade: Ajudar, Cuidar, Acolher, Contribuir, Repartir, Acompanhar, Orientar,
Encaminhar, Explicar, Resolver.
DSC- “Ser Agente Comunitário de Saúde é ajudar o pximo, né,
além de fazer minhas atividades, né, sociais eu desempenhando
um, um papel que é ajudar, você ajuda uma família que tava
doente, com problema, a família fica grata por você ter ajudado,
eles agradecem eu agradeço mais ainda por poder ser tão útil para
a comunidade. O Agente tem como maior objetivo é ajudar quem
precisa, porque a área da saúde é difícil, né, com o meu trabalho
poder ajudar aquelas pessoas que eu vejo que precisa mesmo
encaminhar na maneira do possível a gente consegue; ser Agente é
muito bom por poder contribuir com a família, ajudar o próximo, só
de entrando assim na casa da pessoa e, e poder orientar, é, é...
ajudando, orientando no dia a dia, você orienta de acordo com o
que você vê na casa, porque tem uma coisa que eu vejo numa
casa, na outra eu já vejo diferente, eu faço a casa de acordo com
196
que eu vejo lá, eu oriento. Na outra casa, eu não posso falar a
mesma coisa, porque é diferente; a gente tem que se doar muito
porque tem sempre alguém procurando, às vezes uma palavra sua,
um sim ou o que você dê resolve a vida deles, às vezes eles te
param na rua, às vezes dia de domingo vai em casa à noite
perguntar , eu sentindo isso, será que eu posso fazer isso, eu
devo ir no hospital, só que por eu gostar do serviço que eu faço, eu
gosto de trabalhar como Agente de Saúde, por isso que tem às
vezes os excessos. Agente faz além um pouquinho porque eu gosto
do que faço, se eu não gostasse, eu não faria, você tem que
disponível em outros momentos, é claro que a gente não pode
dispor da nossa vida, da nossa família”.
O Saber-Ser perpassa todas as outras dimensões - fazer, conhecer e conviver - e,
nesse DSC descrito, ocorre essa fusão, com destaque para as ações que têm na sua
essência o processo de cuidar, que representa a alma dessa categoria (BRASIL, 2004a).
Os Anjos do estudo revelam que esse processo de cuidar por meio de ações
relacionais e comunicativas, faz do homem um ser aberto ao outro e ao mundo que
através da compreensão e interação com o outro pode revelar e compreender a si
mesmo, os Agentes montesclarenses definem-se enquanto ser a partir do ser-com-os-
outros e ser-no-mundo, pois Ser Humano só acontece na presença do outro
(HEIDEGGER, 1999; STEIN, 1988).
197
Ideia Central 3- Ser Agente é possuir Atributos Pessoais: Saber Ouvir/Escutar,
Saber Lidar, Saber Comunicar, Ser Tranquilo, Saber Doar, Identificar com o
trabalho, sendo Povo com o Povo por meio do Amor Profissional.
DSC- Ser Agente de Saúde é repartir um pouco da gente com eles,
é ser povo com o povo, né, porque pra ser Agente, a gente tem que
ter muito amor, você aprende a amar as pessoas, né, de forma bem
profissional, às vezes sofre junto com ela, né. Igual mesmo, aqui
tem gente que tem dia que nem alma, outras vezes o janta,
pois começa a pensar naquilo; se não tiver amor não consegue, eu
vou falar a verdade, é como ser mãe da comunidade, porque de
tudo um pouco vo tem de resolver, né, tudo, tudo, você tem que
resolver, assim, é um elo mesmo, é você que, que sabe o que ta
acontecendo dentro, é vo que passa pro médico: ‘Doutor, mais
eu acho que não pra passar essa dieta pra essa pessoa porque
não tem como ela fazer essa dieta, não tem nem o que comer’;
deve ser uma pessoa que tem calma mesmo, saber lidar com as
pessoas, vo de repente uma resposta pra uma pessoa, em
questão da saúde, você tem que tá conversando, tá explicando
porque se a pessoa não tiver perfil, não gostar daquilo que faz, ela
não consegue”.
Os Agentes mencionam que, para ser Agente, é preciso possuir atributos pessoais
que representam características e qualidades que podem ser inatas ou adquiridas,
fundamentadas no Ser Discursivo que sabe ouvir, falar, compreender, lidar, respeitar,
198
articular e interagir, favorecendo a criação de vínculos com as pessoas e as suas famílias
(SAUPE et al., 2005; HEIDEGGER, 1999; STEIN, 1988; FERNANDES et al., 2007).
Esse agir comunicativo que permeia o Ser Agente representa o aspecto
fundamental do processo de trabalho, demonstrando que ser e fazer estão interligados.
Ideia Central 4- Ser Agente é possuir Atributos Profissionais: Saber Ser elo,
identificar-se com a comunidade, Ser representante da comunidade, conhecer as
famílias e a comunidade, Ser porta de Entrada para o sistema de saúde.
DSC- Ser Agente é você ter um elo com a comunidade,
representante da comunidade, nós somos um elo mesmo, eu sou
aquela ligação entre a família, as famílias e a saúde, qualquer
informação é o elo, é o vínculo da comunidade com a unidade de
saúde, é a porta de entrada, é um elo, a gente pega de e trás pra
, e daqui pra lá, então, é muito interessante, é tá inserido na
comunidade sabendo as demandas, , o que a comunidade precisa
pra ta resolvendo, pra ta acompanhando a família, ta conhecendo a
comunidade que vive. Eu conheço todo mundo da área, da microárea
minha e das outras também, pelo fato de morar no bairro já tem
bastante tempo eu conheço praticamente todo mundo e tudo que
eles precisam, eu conheço os problemas sociais, né, os problemas de
saúde, eu acho que é isso, é amor profissional, é um elo que me uniu
a comunidade mais do que antes, porque hoje em dia você tem que
amar mesmo, não adianta vocêquerer receber pagamento no final
do mês”.
199
Ser Agente é possuir atributos profissionais, ou seja, ser competente com a
capacidade de enfrentar situações e acontecimentos com responsabilidade por meio da
inteligência prática, descrita pelos sujeitos do estudo como interagir, desempenhando o
papel de laço, de ligação como legítimo representante da comunidade, que conhece e
se identifica com os seus moradores (BRASIL, 2004; FLEURY; FLEURY,2004).
Esse conhecer e identificar-se com os moradores eleva o Agente de Saúde a ser o
cuidador como modo-de-ser essencial e sempre presente, ultrapassando as atividades
diárias no horário de trabalho, que auxilia a pessoa, escuta-a de maneira solidária e
atua como elo, permitindo-se e permitindo ao outro experimentar a beleza de ser Humano
por meio de relações acolhedoras (BOFF, 2004; BRASIL, 2008).
Ideia Central 5- Ser Agente é causar Repercussões Positivas ( Ser Acolhido,
Valorizado, Vivenciar experiências gratificantes que resultam no estreitamento das
relações interpessoais, levando a sentir-se como membro da família) e Negativas (
Incompreensão, Desvalorização, Decepção ) na Comunidade e nas Famílias.
DSC- “Pra mim, ser Agente de Saúde é, é... igual eu ti falei é
gratificante por um lado, eu me sinto muito mais útil só de saber que
eu entrando na família, na casa da pessoa. Assim a gente pega
muito, muito intimidade, tem casos que a gente passa como uma
pessoa da família, é você, é como se você fizesse parte daquela
família, cada uma da família que a gente vai é uma casa, você
fica sabendo de tudo, sabe que acontece naquela família tem gente
que gosta muito da gente, e ser Agente de Saúde pra mim, foi muito
gratificante. Por outro lado, é, é... a gente decepciona, porque a
gente tem que lidar com todo tipo de pessoa, né, então a gente vai,
200
sai de casa sete horas da manhã, vem aqui na unidade, acolhe
as pessoas depois a gente vai pra área pra fazer a visita, pra
acompanhar o pessoal, e tem muitas pessoas que ainda não dão
valor, tem gente que acha que ser Agente de Saúde é ficá batendo
perna, é, é..., não faz nada, que fica de conversinha, na realidade a
gente é cobrado, todo fim de mês a gente tem uma meta pra poder,
é, é... prestar conta pro pessoal aqui”.
No processo de trabalho, os Agentes revelam a complexidade do Ser Agente
relacionada ao processo de síntese e antítese, sofrendo uma dualidade que inicia no fazer
(interação positivas e negativas) e se instala na interioridade do seu ser ( motivação e
desmotivação), estabelecendo o diálogo contínuo com as incertezas em que o existe a
verdade absoluta (FREIRE, 1987; MORIN, 2003).
Esses atributos profissionais revelam que o cuidado transcende a assistência
apenas sica, contemplando questões emocionais e relacionais, já que a experiência de
adoecer gera a intercomunicação do homem que precisa ser cuidado e de seu cuidador
em um contexto social e de história de vida. A relação estabelecida Agente-Cliente resulta
em produtos positivos e motivadores; por outro lado, se as expectativas não forem
contempladas de maneira satisfatória, gera sofrimento, angústia e stress.
Os Agentes de Saúde compreendem o Ser Agente de Saúde com base em uma
única palavra: Cuidado, que é, ao mesmo tempo, a essência do ser e o fazer (atitude).
3- QUALIDADES E VALORES DO AGENTE COMUNITARIO DE SAUDE
201
O aspecto relacionado a qualidades e valores foi dividido em quatro ICs,
subdivididas em categorias - Atitudes/valores, Qualidades, Atributos Pessoais e Atributos
Profissionais.
Ideia Central 1- O Agente Comunitário de Saúde deve possuir atitudes/valores
ética, compromisso, responsabilidade, paciência, confiança, credibilidade,
honestidade, compreensão, atenção, presteza, fidelidade com a população, além de
saber ouvir, relacionar-se com as pessoas e não fazer distinção/discriminação, ou
seja, tratar a todos de forma igual.
DSC- “Eu acho que você tem que ter ética, ser fiel com a
comunidade, ter honestidade, ser assim responsável, é, ser
responsável, entender daquilo que você fazendo tamm,
entender, eu acho que é isso eu acho que ele tem que ter palavra,
ele tem que ser uma pessoa assim. Por exemplo, se ele falar pro
paciente eu vou fazer isso pra você, eu vou na tua casa tal dia, ele
tem que ter aquela responsabilidade, de compromisso, ali porque
se não às vezes o que a gente adquiriu anos pra poder conseguir,
com essa falta de compromisso você deixa muito a desejar, perde
a credibilidade do paciente, mesmo que você for dar uma
resposta negativa, mas eu acho que você tem que dizer; ah, eu
acho que tem que ser atencioso, ter empatia, tem que ser
prestativo, tem que dá, assim atenção pro paciente, né, saber ouvir
o paciente, escutar, sabe assim dar aquele conselho, ser
comunicativo, ser uma pessoa compreensiva, que tem que parar
202
mesmo pra escutar as pessoas; tem que ter paciência porque
mexer com gente é difícil”.
Esse elenco de atitudes/valores mencionados pelos Agentes deve estar
fundamentado no Ethos/ Ética, que compreende a morada do ser, o modo de ser
expresso no grupo de virtudes humanas e comportamentos que orientam a conduta
profissional no cuidado prestado às pessoas e à coletividade, ordenando as relações
estabelecidas e as formas de comunicação (GELAIN, 1998; RIOS, 2001).
Os Agentes compreendem a ética de forma transcendente, como sendo a ética do
cuidado que inclui atitudes de solidariedade, compaixão, sentimento de cooperação e,
especialmente, por meio da humanização das relações (WALDOW, 2007).
Vale destacar a necessidade de garantir os princípios éticos da fidelidade e da
veracidade, com o cumprimento das promessas e obrigação de falar a verdade e não
enganar as outras pessoas aliados à justiça, como tratamento igual a casos semelhantes
(GELAIN, 1998; FORTES e MARTINS, 2000).
Ideia Central 2- O Agente Comunitário de Saúde deve possuir qualidades como ser
compreensivo, solidário e amigo, saber acolher, ajudar e conversar, sendo capaz de
transpor um saber fácil de entender, norteando as Ações voltadas ao próximo, à
família e à comunidade.
DSC- O Agente deve saber conversar, assim, saber o momento de
conversar, de poder passar o que ele realmente foi fazer ali, passar
confiança pra pessoa, eu vou transmitindo confiança pra ele, pra
ele falando dos problemas, porque tem muitos que realmente
tem dificuldade de falar, , e as vezes tem problemas que nós, é,
203
é... só conseguimos ajudar é dando confiança pra ele; tem que ser
amigo e procurar compreender as pessoas da comunidade, tem que
saber acolher, eu acho que acima de tudo querer ajudar o próximo,
se você não tem boa vontade pra ajudar, se você não tem paciência
de ouvir não tem como ser Agente”.
O elenco de qualidades mencionado pelos Agentes entrevistados tem o intuito de
guiar o agir comunicativo e o agir estratégico necessários para o processo de trabalho,
tendo em vista que o Ser Agente pauta suas ações no diálogo e no discurso que se
materializam em valores como compreensão, cooperação, solidariedade, engajamento e,
acima de tudo, confiança (SILVA et al., 2008; BARROS; PINHEIRO, 2007).
O Agente deve possuir qualidades que contemplem as demandas de cuidado
reveladas pelo sujeito, que estão pautadas no eixo relacional e comunicativo, uma vez
que o indivíduo assistido quer ser ouvido, compreendido, acolhido. Nessa conjuntura, o
ato terapêutico imprescinvel é o Ouvir, que é compreendido e revelado nos discursos
dos Agentes pesquisados que valorizam e reconhecem esse ouvir como a ferramenta
utilizada para fortalecimento do vínculo de suporte social (CAMPOS, 2005).
Ideia Central 3- O Agente Comunitário de Saúde deve possuir Atributos Pessoais:
Ser humano, ter amor à profissão, ser simpático, ser humilde, ter empatia,
motivação, perseverança, saber interagir, Comunicar e ouvir.
DSC- Ele tem que ser um ser humano, né, ele tem que sair da
caixinha de vidro, que eu sempre falo pras meninas aqui: ‘Nós
temos que sair dessa caixinha de vidro’, achar que, que a gente é
outra pessoa totalmente diferente do mundo daquelas pessoas, nós
204
temos que saber que a gente pode passar por situações iguais,
parecidas, eu acho que, primeiramente, um Agente, pra ser Agente,
ele tem que ter humildade, não tem que ter soberba, porque tem
uns que a gente vê que o tem perfil pra PSF, porque chega na
comunidade, eu vi né casos que tem gente que chega e não tem
aquela humildade, de chegar, sentar, conversar, né, com Dona
Maria, que ali é mais carente, você chega e ver que o ambiente da
casa, é a casa daquela pessoa bem fraquinha, bem humilde e tem
gente que, que até pula a casa, passa pra frente, vai naqueles mais
ou menos pra poder assim não ter contato, com medo de pegar
alguma doença, alguma coisa. Eu acho que o Agente de Saúde
primeiramente tem que ter humildade é ser, ser humano mesmo,
acolher, né, aquela pessoa, ele tem que saber das, das
necessidades da comunidade, tem que ser simpático, comunicativo,
saber ouvir as pessoas o que elas estão precisando, tem que ter a
humildade de ouvir o próximo, porque é muito difícil Agente ouvir
porque a pessoa às vezes precisando de alguém que escuta ela,
entendeu, as vezes ele não tá precisando nem tanto daquela
orientação que eu vou dá aquele dia, a gente quer muito falar e não
escutar, saber interagir com a comunidade inteira: escola, é,
sempre integrado; tem que ter perfil pra trabalhar, eu acho que ele
tem que ter muita é, é... perseverança, força de vontade, entendeu?
Tem que ser uma pessoa mesmo que por mais difícil que seja ela
luta mesmo, ela corre atrás, é mais ou menos por aí, tem que ter
205
amor a sua profissão, gostar do que faz, porque se você não gostar
do que você faz você não fica não”.
Todas as narrativas dos Agentes que deram origem ao DSC transmitem a
percepção de que o estabelecimento do vínculo e das relões interpessoais somente
acontece se o profissional possuir atributos como saber acolher, saber comunicar-se,
estar motivado, ter estabilidade e maturidade emocional para lidar com os problemas
complexos aprendendo a lidar com as pessoas e a comunidade e, acima de tudo, SER
HUMANO, valorizando o outro e a sua profissão com a garantia da ética por meio do
respeito às pessoas (DELORS, 2003; GELAIN, 1998; FORTES e MARTINS, 2000).
Waldow (2007) e Campos (2005) destacam que o cuidado constitui a condição
fundamental no desenvolvimento do ser e que, por meio do cuidado, expressamos o
Amor, pois cuidamos daquilo que amamos, que o amor potencializa a capacidade de
cuidar e o cuidar é a materializão do amor.
Os Agentes entrevistados corroboram com essa assertiva e destacam que o
profissional Agente Comunitário deve ser humano, ou seja, ter amor às pessoas, à
comunidade e à profissão, revelado por meio do amor enquanto preocupação com o outro
e movido pelo desejo de cuidar.
Ideia Central 4- O Agente Comunitário de Saúde deve possuir Atributos
Profissionais: Ser profissional, saber lidar com os problemas pessoais e
profissionais, saber comunicar, saber relacionar, ser influenciador, conhecer as
famílias e a comunidade.
DSC- “A qualidade, ter a habilidade de dialogar, de, de interagir com
a comunidade, não adianta um Agente Comunitário chegar numa
206
residência de cara fechada, não conversar com ninguém, então tem
que ter essa empatia com cada membro da família, ter um bom
entrosamento com a comunidade; vai ter que ter em lugar
comunicação, ? Tem que saber interagir e fazer com que aquela
pessoa tome a atitude que você deseja com o intuito de melhorar a
vida dele; ter a capacidade de persuasão, de influenciar a
comunidade, então uma das características tem que ser
influenciador no bom sentido. Ele tem, como se diz, ser muito, ser
aberto a comunidade, né, e assim a sua forma de expressar você
tem que mostrar que cê interessado no problema daquela
pessoa, você tem que mostrar que ta, como se diz, (pausa)
solidário, você preste a ajudar a qualquer momento, por isso que
você tem que demonstrar, como se diz, (pausa) aberto a qualquer
problema que ele vier te falar, e se você tiver os seus problemas
você deve deixar eles em casa, e, tá tentando resolver os dos
outros também; porque muitas vezes você chega aqui pra um
atendimento se ele é bem atendido ele volta pra casa satisfeito,. Ah,
se ele chega aqui, ele tá com algum problema, se ele chegou aqui e
for maltratado ele volta pra trás, a situação apiora, muitas vezes
eu acho que a pessoa tem que querer e, e saber ouvir eu acho que
a comunidade precisa mais às vezes nem sempre de atendimento,
muitas vezes o pessoal, o pessoal brinca como se fosse um
psicólogo a pessoa fala coisa que você não esperava ela falar ali
com a gente, a pessoa confia na gente, conta muita coisa, você vai
fazer uma visita de meia hora e fica ali 1 hora, 2 horas. Muitas
207
vezes vocêo resolve o problema da pessoa, só de você escutar a
pessoa já fica satisfeita.
Os atributos profissionais que os Agentes devem possuir vão ao encontro com a
série de sentidos essenciais à prática desses profissionais contemplado no documento do
Ministério da Saúde (BRASIL, 2004a) quando menciona que devem ter inteligência
prática, apreender situações e acontecimentos, articular, ter iniciativa, responsabilidade e
ênfase na habilidade de comunicação.
A habilidade de comunicação destacada pelos Agentes como qualidades
necessárias para o fazer pauta-se na relação íntima que a comunicação deve estabelecer
com o cuidado. A comunicação, para ser efetiva, deve ser baseada em instrumentos que
favoreçam a captação de mensagens verbais e não verbais sobre os significados do
processo saúde-doença (CAMPOS, 2005).
A comunicação efetiva torna viável o dialogo que se baseia na empatia, na
reciprocidade, na capacidade de perceber o outro e as necessidades pessoais, familiares
e de saúde, permitindo o estabelecimento de um relacionamento suportivo.
Percebemos que as qualidades necessárias para ser Agente fundamentam-se no
exercício e na experimentação do ser, não há como separar o ser do fazer, assim como o
ser das qualidades para se tornar um profissional eficaz e efetivo.
4- DEFEITOS QUE O AGENTE COMUNITARIO DE SAUDE NÃO DEVE TER
Os defeitos foram divididos nas mesmas categorias descritas no aspecto de
qualidade/valores que o Agente deve ter, com exceção da categoria qualidade, que não
foi construída pelos sujeitos do estudo.
208
Ideia Central 1- O Agente Comunitário de Saúde não deve possui Atitudes
Negativas: Ser fofoqueiro, antiético, irresponsável, descompromissado, impaciente.
DSC- “Defeito, conversar demais, conversar coisas que não deve
né, por exemplo, uma pessoa me conta uma coisa aqui, uma
família, aí eu vou e passo pra frente, passo pra outra, porque
através disso ele pode trazendo complicações, é, pra unidade,
pra todo pessoal e pra família também, , porque você revelar às
vezes um segredo que era pra ficar escondido, que era pra ninguém
ficá sabendo e, de repente, tá todo mundo sabendo então causa um
problema. Ser fofoqueiro isso é um defeito que não pode ter, né,
tipo assim: o que passar ali com a família ele não deve
comentando com ninguém, é, sigilo, deve ser sigiloso e outra coisa:
ele deve ter ética profissional, ele tem que ter ética, , no que ele
fazendo, tem que ter ética profissional; o Agente não deve ter é
falta de responsabilidade, tem que ter compromisso com o que ele
faz, ele não pode, é, é, por exemplo a pessoa te falando alguma
coisa e você simplesmente o um retorno, né, não, como se
diz, não importância a que a pessoa tá falando, é um defeito que
ele não pode ter, porque se a pessoa não tiver compromisso, por
exemplo, com a comunidade, né, porque muitas das vezes aqui, é,
é, nós, não falo somente eu, mas também os colegas de trabalho, a
gente sai do serviço cinco horas da tarde, tem vezes que sete, oito
horas da noite, a gente na rua pra poder avisar uma pessoa
sobre uma consulta, pra entregar encaminhamento, isso mostra
209
compromisso com a comunidade. Se a pessoa não tiver esse
compromisso, então fica um pouco difícil trabalhar nessa área,
porque realmente trabalha quem tem vontade, mesmo, quem
precisa, quem tem vontade de ajudar as pessoas, porque não é
brincadeira, não; e também não deve ser impaciente, tem que ter
muita paciência, muita paciência, porque tem que ter paciência
mesmo, porque assim: você chega um ti chama, hoje não, hoje
tranquilo porque hoje é sexta, mais na segunda-feira você chega
aqui, um chama, um fala uma coisa, outro fala outra, um chama de
um lado, outro chama do outro, alguns já chega com aquela falta de
educação pra conversar, votem que ter paciência pra conversar,
eu acho que a gente tem que ter paciência, principalmente nos
primeiros dias da semana, são os mais apertados”.
Os Agentes de Saúde destacam a importância de garantir o princípio ético da
privacidade e a necessidade de manter o sigilo e a confidencialidade, que o fazer do
Agente fundamenta-se na escuta do outro, na interação humana e especialmente na
confiança. Dessa forma, essas atitudes moralmente reprováveis devem ser
desencorajadas e repreendidas (FORTES; SPINETTI, 2004).
O Agente deve inspirar credibilidade e confiança para que os usuários
compartilhem suas experiências e sentimentos fundamentais para o exercício profissional.
Ideia Central 2- O Agente Comunitário de Saúde não deve possui os atributos
pessoais: Ser muito bravo, grosseiro, arrogante, soberba e não saber ouvir.
210
DSC- O Agente de Saúde não deve ser muito bravo e que não
tivesse ignorância, porque às vezes quando a pessoa é muito
bravo, você acaba afastando aquela pessoa de perto de vo, e ela
às vezes nem volta mais, às vezes tá cheia de coisa pra ti falar, e se
você é aquela pessoa grossa, muito grossa, ranzinza, tudo pra você
tá ruim: ‘Ah! Fulano, mais hoje não; Ah! Fulano, isso, isso’; a cultura
do não, não deve existir; tem que saber ouvir mais do que falar; tem
que saber conversar, tratar com educação, tem horas que a pessoa
chega alterada, nervoso, se você trata com educação, você
desarma a pessoa totalmente, você chega, conversa, explica e tudo
a pessoa acalma, sai tranquila e agradece e tudo”.
Nota-se que os atributos pessoais negativos mencionados dizem respeito a
atitudes/ações que são compreendidas na esfera da comunicação, instrumento essencial
do processo de trabalho do Agente. Portanto, essas atitudes que dificultam o diálogo e as
relações interpessoais são defeitos que o Agente eficaz e eficiente não deve possuir
(SILVA e DALMASO, 2002).
Ideia Central 3- O Agente Comunitário de Saúde não deve possuir os
atributos/ações profissionais de Ser despreparado e não deve transmitir
insegurança e falta de vontade para ajudar.
ECH Raziel- “O Agente de Saúde não pode ser despreparado e tem
que ser firme, porque às vezes você tem que dar uma palavra e não
tem aquela firmeza pra poder dar, não tem aquela segurança pra
poder falar, porque nem sempre você sabe que vai ter apoio”.
211
Raziel corrobora com a publicação do Ministério da Saúde (BRASIL, 2004) em que
se destaca a importância do Agente de Saúde ser competente e mobilizar todos os
saberes indispensáveis para a prática cotidiana por meio do aprendizado individual e
coletivo, visando a uma assistência de qualidade, que, para manter-se preparado, deve
ocorrer de forma sistemática o processo de educação permanente.
5- ASPECTOS FACILITADORES PARA O DESENVOLVIMENTO DO PAPEL DO
AGENTE
IC1- O desenvolvimento do papel de Agente é facilitado pela presença de atributos
pessoais amor à profissão, ajuda aos outros, capacidade de relacionar ou
interagir com as pessoas, relação de confiança.
DSC- “A facilidade que eu acho é porque eu gosto do meu serviço,
então se precisar de, de ir à noite eu vou, entendeu, se precisar ir a
qualquer horário, mas eu vou na minha área, outra facilidade é que
minha área é meu espaço que eu conheço eu não vejo risco nela de
poder saindo fora desse horário, outras pessoas daqui que não
teria essa facilidade; oh, talvez assim pra mim é a minha facilidade
de relacionar com as pessoas , eu tenho muita facilidade de
relacionar com as pessoas”.
Os aspectos facilitadores nomeados pelos Agentes confundem-se com o Ser
Agente e as qualidades mencionadas anteriormente em relão aos atributos pessoais de
motivação intrínseca/amor à profissão, desejo de ajudar, de cuidar dos outros e ter a
capacidade de interagir e conviver.
212
IC2- O desenvolvimento do papel de Agente é facilitado pela presença de atributos
profissionais Conhecer e estabelecer compromisso com a comunidade,
motivação proveniente da equipe.
DSC- O que facilita, né, é conhecer a comunidade, porque essa
área que eu moro justamente que eu tenho mais facilidade com
todo mundo, de tratar todo mundo, todo mudo me trata bem, que eu
acho que alguns Agentes teriam dificuldades de trabalhar nessa
área, porque os próprios Agentes relatam isso. É, eu acho que é o
nosso enfermeiro, o dentista muito bons pra gente, isso motiva
muito a gente a trabalhar aqui, em tudo eles ajudam a gente de
mais da conta, em tudo, tudo que vo precisa, tem muitas coisas
que na área a gente não consegue, né, acaba que a gente traz
aqui pra equipe, que a gente precisa de ajuda, então eu acho que
facilitou o meu trabalho”.
O fato de residir na área de abrangência facilita a construção de uma relação de
confiança com as famílias e seus moradores que, por sua vez, compartilham as suas
angústias, alegrias, problemas, proporcionando o estabelecimento de formas de
comunicação por meio da identidade cultural; associado ao cuidar mais efetivo e eficaz
resultante do trabalho em equipe, que proporciona o enfrentamento dos problemas
demandados pelas famílias por meio da relação de saberes e poderes numa permanente
interação de trabalho e vida, ânimo, motivação, confiança e cooperação, visando a um
objetivo comum o cuidado as pessoas e a coletividade (LEVY, MATOS, TOMITA, 2004;
BRASIL, 2002; BRASIL, 2005c).
213
IC3- O desenvolvimento do papel de Agente é facilitado pela presea de atitudes
da comunidade - aceitação das famílias e estabelecimento de relação de
compromisso e confiança.
DSC- “A aceitação das famílias, ah, tem algumas famílias, não são
todos que recebem a gente muito bem, e, tem, tem muitas famílias
que trata a gente muito bem, que confia na gente, né, sabe, e que,
acredita no trabalho nosso”.
O relacionamento com as famílias é, ao mesmo tempo, o instrumento de trabalho e
o objetivo dos Agentes, uma vez que é por meio da relação estabelecida que o Agente
identifica as condições de vida, gerando satisfação com o trabalho, gratificação por ajudar
as famílias e ser reconhecido (SILVA e DALMASO, 2002).
O homem possui duas necessidades básicas que foram apontadas pelos Agentes:
o desejo de ser ouvido, compreendido e acolhido; e a necessidade de ser valorizado
pelas ações desenvolvidas e aceito pelo outro e pela sociedade (WALDOW, 2005).
IC4– A acessibilidade geográfica localização e proximidade de sua residência
facilita o desenvolvimento do papel do Agente.
ECH Gabriel- “É bom, o local mesmo é perto, não tem atravessar
rio, , de barco, é, o transporte, pode ir a ou de bicicleta né,
além de, a única facilidade que eu acho que encontra é só isso”.
214
A acessibilidade geográfica facilita o processo de trabalho, já que os Agentes
residem em suas áreas de abrangência, não encontrando barreiras físicas/geográficas
para o acesso a seu lócus de trabalho.
IC5- A organização dos serviços de saúde por meio do trabalho em
equipe/interdisciplinar e a presença do Agente administrativo.
DSC- Eu acho que, dependo assim da, da equipe dá pra vo fazer
um bom trabalho e se tivesse gente pra essa parte administrativa, e
outra coisa que ajudaria muito seria ter um Agente administrativo”.
A organizão do processo de trabalho com ação interdisciplinar, em que as
atividades são realizadas na lógica do agir em concerto, respeitando as individualidades e
responsabilidades de cada profissão sem perder a visão do indivíduo como um todo em
sua integralidade (BONALDI et al., 2007)
Outro aspecto mencionado foi a presença de um profissional que fique
encarregado das atividades administrativas, diminuindo a sobrecarga que recai sobre os
Agentes, que, além de desenvolveram as atribuições preconizadas pelo Ministério da
Saúde, ainda exercem funções burocráticas e entrega de encaminhamento e exames
agendados, que o estão contemplados na Política Nacional de Atenção Básica
(BRASIL, 2006e).
6- ASPECTOS DIFICULTADORES PARA O DESENVOLVIMENTO DO PAPEL DO
AGENTE
215
IC1- O desenvolvimento do papel de Agente é dificultado pela valorização das
atividades curativas, levando à não aceitação dos Agentes, com incompreensão e
maltrato associado à marcação de consulta, atividades administrativo-burocráticas
e atividades que não estão dentro da função de Agente que causam sobrecarga e
desmotivação.
DSC- As maiores dificuldades que eu encontro pra realizar o meu
trabalho é as cobranças indevidas, exemplo um paciente vem, tem
um exame pra marcando aqui na unidade, não consegue
marcando, talvez a demora do exame de alto custo, e a unidade
agora sem dico, a pessoa vem querendo consulta. Você
explica, isso te atrapalha muito, vo faz explicação mas ele quer o
médico, muitos realmente tão precisando de um exame, de alguma
coisa, que você não pode fazer, aí ti atrapalha; ti atrapalha um
paciente que maltrata a gente, ou chega aqui fazendo barraco e
tal, já chega chamando de irresponsável, dificulta, quando você
não faz o que elas querem, porque na verdade é consulta, se você
conseguiu a consulta pra eles tá ótimo, se você não conseguiu,
não presta. A maior demanda é de consulta, e não depende só de
você; ele fica com raiva, ele fica chateado com o PSF, quando
eu chego na casa dele, ele ta com raiva e quer descontar em cima
de mim, vai virar pra mim e falar: ‘que o presta, não sei o que,
não sei o que’; quando chega aqui na unidade ele não fala nada, ele
cala a boca, vem aqui e sai mansinho, eu acho que é cobranças
indevidas, eles cobram e a gente explicar pra eles que não cabe a
gente marcando a consulta, marcando o exame, né, só que o
216
meu papel lá é fazendo a visita, pra trazer, pra levar e pra trazer
pra unidade o que for preciso. que muitas vezes eles não
entendem, isso, acham que temos que fazer isso; o paciente nos
culpa quando o exame não é marcado, e não é nossa
responsabilidade; às vezes, é porque a gente vive, o, pra uma
pessoa ela não acredita, né, às vezes tem pessoa, é, que realmente
quer caçar um probleminha, entendeu, que quer criar atrito; também
tem a parte muito burocrática, tem muito papel pra gente
preenchendo e às vezes atrapalha, né? Às vezes chega coisa da
secretaria que não é pra gente tá resolvendo, por exemplo um
cadastramento que chegou outro dia, o levantamento de cisternas,
credenciamento, assim atrapalha o nosso serviço, e no final do mês
você tem que entregar o seu SIAB completo, esse é um fator que
dificulta o meu trabalho; nossa área tá com oito Agentes, é, tá
grande, e a equipe toda sobrecarregada, a demanda nossa é
grande, então é imposto, é imposto pro pessoal, pras enfermeira,
pra a gente fazendo determinada coisa. Aí, o que acontece, a
gente tenta fazer, quando o pessoal chega na área não tem aquele
respaldo, não tem aquela segurança, porque acontece que a
demanda nossa é grande, a quantidade que procura é grande e a
quantidade que tem a oferecer é pequena, ainda tem umas pessoas
que não acredita no nosso trabalho, não recebe a gente muito
bem, entendeu?”.
217
As atribuições relacionadas com a marcação de exames e agendamento de
consultas descaracterizam o papel do Agente preconizado pelos documentos do
Ministério da Saúde e associado a uma valorizão do modelo médico-privatista, em que
os usuários levam em consideração boa assistência ao uso de tecnologias duras, com
exames cada vez mais complexos e desvalorizam as tecnologias leves centradas nos
atos humanos - escuta, acolhimento e relações interpessoais, o que gera insatisfação
quando ocorre o não atendimento dessas solicitações centradas na doença e dificulta o
processo de trabalho dos Agentes de Saúde (MENEGHEL et al., 2007).
IC2- Não valorização das atividades educativas.
DSC- “A maior dificuldade da comunidade é ainda entender e
aceitar o que é uma equipe de saúde da família, ou, ou eu não sei
se é porque eles não querem entender, eles não querem aceitar
ainda, o que é o trabalho do saúde da família. Então, a gente tem
essa dificuldade ainda, por que ainda é a inversão do modelo, e a
gente sabe que vai levar muito tempo ainda; as pessoas não
valorizam as reuniões, o próprio usuário não vem, já aconteceu de a
gente marcar aqui, vem uma, duas pessoas, as pessoas que
precisa de participar não participa. Então assim uma dificuldade
muito grande de comunicação com a comunidade, é difícil porque o
usuário reclama muito, mas na hora que chega pra valer ele não
vem”.
Essa IC2 complementa a IC anterior, destacando a desvalorização das ões de
promoção e prevenção de doenças realizadas por intermédio das atividades educativas,
218
em que os usuários foram tratados pelo modelo assistencial hegemônico como paciente,
coisificado e tratado de forma impessoal e descompromissada, e apenas com a
implantação da ESF foram apresentados ao novo modelo, centrado na vigilância à saúde
e co-ator do processo saúde-doença. Entretanto, os moradores estavam acostumados e
sentindo-se confortáveis na posição passiva e, no momento em que foram convocados a
ser ator do processo por meio das atividades educativas, não compreenderam e não
aderiram às mudanças propostas, ocasionando uma dificuldade ao processo de
efetivação da inversão do modelo (MERHY, 1997; MENEGHEL et al., 2007).
O medo da liberdade ou o medo de assumi-la dificulta a compreensão do real e a
sua aceitação com a omissão do sentimento de temor. Assim, acabam por aceitar a sua
condição passiva, não conseguindo enxergar a liberdade de ser ator da saúde. Nesse
caso, essa libertação só é possível pela educação, pois ninguém liberta ninguém, os
homens se libertam em comunhão, em partilha (FREIRE, 1987).
IC3- A falta de acessibilidade geográfica e funcional como barreira geográfica, a
dificuldade de acesso e a realização de visita para as pessoas que trabalham
dificultam o desenvolvimento do papel do Agente.
DSC- A dificuldade encontrada é o acesso à área, área é muito
difícil, eu saio daqui 9 horas, eu chego 9 e meia, quando 11 e
meia eu tenho que parar. As visitas de manhã o rende quase
nada, na tarde rende mais o trabalho, porque eu não preciso vim
aqui, de mesmo (casa) eu vou pra área, minha área é longe.
Outra dificuldade que eu tenho é aquelas famílias que trabalham,
assim fica a casa fechada o dia inteiro, encontra à noite, fica
mais difícil, mas no geral aquelas que encontra no dia a dia é bom
219
a aceitação, se eu precisar de fazer minhas visitas à noite, porque
essas visitas que eu faço à noite são pessoas que querem ser
visitados, porque às vezes se não for uma pessoa que não queria
ser visitado às vezes eu não ia poder visitar, são pessoas que
querem ser visitadas e que precisam ser visitadas e durante o dia
eu não encontro”.
A ESF fundamenta-se na atenção à família, compreendida como sujeito do
processo, e ao domicílio, concebido como o local mais apropriado para a construção das
relações intra e extrafamiliares. Nesse sentido, a visita domiciliar é o instrumento do
processo de trabalho da equipe, em especial para o Agente que, para desenvolver
adequadamente essa atividade, encontra dificuldades relacionadas à acessibilidade
geográfica, representada pelas barreirassicas, aliado à acessibilidade funcional, ou seja,
o horário de trabalho não compatível com a disponibilidade de algumas famílias (BRASIL,
1996).
Outra variação de acessibilidade geográfica que dificulta a função de Agente de
Saúde está ligada a aspectos socioeconômicos, como descrito abaixo na IC e na ECH de
Omael.
IC4- O desenvolvimento do papel de Agente é dificultado pela presença de aspectos
inerentes à comunidade aspectos socioeconômicos, geográficos, questões
sociais como área de risco, baixo poder aquisitivo, falta de infraestrutura e tráfico
de drogas.
ECH Omael- “Oh, oh, no meu dia a dia eu tenho, por ser uma área
de invasão, de baixo da rede, o pessoal fala que é favela, tem muita
220
dificuldade, que é com a questão da droga, porque é uma área que
40% dela envolvida na, na droga, o tráfico. Então, nessas casas
eu tenho que entrar como eu entro na casa de qualquer outra
pessoa, e tenho uma dificuldade muito grande em realizar o meu
trabalho nessas casas, porque eu sei que a polícia pode dando
uma batida, muitas vezes pode mim encontrar lá, muitas vezes com
a bolsa do lado, né, do mesmo jeito que eu posso ser um Agente de
Saúde, pode achar que eu consumindo. Já aconteceu deles mim
abordar e eu ter de explicar, a família ter que explicar que eu
fazendo um trabalho, todas as vezes que eles mim pararam eu tava
com um cartão de vacina na mão, fazendo anotação, que a mãe
confirmou. Mas se fosse na família e tivesse com droga e tivesse
colocado na minha bolsa, até provar, aeu explicar, eu tava muito
enrolado; a sorte que eu tava com cartão de vacina na mão, a
dificuldade maior é essa. E além da situação de pobreza que essa
área oferece né, as pessoas são muito dependentes da
comunidade, de ajuda e, e falta água, falta luz, rede de esgoto,
agora tem uma estrutura bastante precária, você tem que
saltando poça de esgoto, é porco, é galinha, é cachorro, é gato,
vaca, cavalo; tudo complicado você oferecer saúde né, orientações
é o mínimo que posso oferecer; vo vê crianças brincando dentro
de poça de esgoto, né, brincando com porco, galinha, cachorro,
tudo misturado. Você orienta mas eles têm muito tempo que estão
acostumados com galinha no quintal, tem um menino que já brinca
com porco, jáacostumado”.
221
IC5- O desenvolvimento do papel de Agente é dificultado pela falta de material para
sensibilização da comunidade.
DSC- “A falta de material, o problema é a falta de muito material pra
gente, pra poder divulgar, falta panfleto, falta muito”.
Os Agentes destacam que a ausência de materiais educativos desfavorece a
inversão do modelo assistencial, já que a educação em saúde representa o campo de
interlocução do saber científico e o saber popular, constituindo-se um processo
pedagógico para que os homens assumam o controle sobre a saúde e suas vidas
(VASCONCELOS, 1999; VASCONCELOS, 2001).
IC6- O desenvolvimento do papel de Agente é dificultado pela presença de atitudes
da equipe – Falta de respaldo da equipe para o trabalho do Agente.
ECH Ariel- “Tamm você faz a visita e pede a pessoa pra vim aqui
na unidade de saúde, chega aqui talvez não é o Agente de Saúde,
é outra pessoa na recepção e não trata a pessoa bem, entendeu, a
pessoa sai chateada. Depois quando eu vou fazer a visita, ela pega
e fala pra gente, que não foi bem atendida, fica chato pra gente que
vai na casa, que tem que bater na porta todo dia, e conversar com a
pessoa, como você vai justificar uma coisa que eu não fiz”.
A ausência de ões interdisciplinares e o trabalho em equipe impossibilitam a
vivência da ESF, que tem como pilar a ão em harmonia, com um agir em concerto
pautado na confiança.
222
O estudo de Lunardelo (2004) também destaca que o trabalho em equipe é um
instrumento enriquecedor quando atendidas as expectativas dos membros. Entretanto, a
presença de desarmonia só gera sofrimento, frustração e conflitos.
7- ASPECTOS A SEREM MODIFICADOS NO PROCESSO DE TRABALHO DO
AGENTE COMUNITÁRIO DE SAUDE
Diante dos aspectos dificultadores do processo de trabalho, os Agentes de Saúde
revelam alguns pontos que poderiam ser modificados para facilitar a execução de sua
função profissional.
IC1- Modificar a obrigatoriedade da visita domiciliar mensal, que atualmente é
realizada de maneira indiscriminada, não levando em consideração as
necessidades das famílias.
DSC- Eu acho que, se eu pudesse mudar, eu deixaria de fazer, é
muito difícil a questão assim da gente ter aquela rotina como a
visita, é, é porque tem casa que a gente vai, você tem a obrigação
de cobrir 100% de famílias, têm famílias que necessita mais do a
gente do que outras, tem outras que você vai, você ali todo mês,
porque votem que cobrir aquela meta de visita todo mês, porque
têm famílias que não têm aquela necessidade que você vá ali todo
mês, tem outras que você vai uma vez por mês e precisa mais
vezes você ali. Eu acho que mudaria isso aí, eu acho que eu
mudaria isso, eu dava mais assistência àquelas famílias que precisa
mais de mim do que aquelas que precisaria menos, aquelas que
223
precisaria menos eu ia assim de dois em dois meses, e aquelas que
precisa mais eu ia mais durante o mês; tem às vezes aquela
pessoa que está disponível pra receber, às vezes a gente percebe
que alguns colega nem enfrenta mais essa dificuldade das pessoas
recebendo eles ali todo mês pra aquela visita, algumas famílias
não aceitam bem essa questão ainda o, enquanto já tem outras
que se pudesse a gente ficava na casa deles todo dia, porque
assim de ter aquela obrigação a gente sabe que faz parte do
programa de fazendo aquela visita rotineira todo mês; porque às
vezes tem família que demanda mais sua atenção e outras se você
deixar de ir lá um mês pra elas não vai fazer diferença”.
A visita domiciliar é o instrumento de aproximação, conhecimento e
acompanhamento e facilitador da identificação das necessidades e tem a obrigatoriedade
de ocorrer mensalmente para todas as famílias (BRASIL, 2006; BRASIL, 1997).
Os Agentes conhecem a realidade de vida (sociais, ambientais, relações intra e
extrafamiliares) e de saúde dos usuários e das suas famílias. Dessa forma, expressam
que a regra de acompanhamento mensal é injusta, já que algumas famílias necessitam de
atenção maior e retornos mais frequentes, enquanto outras não apresentam situações
que indiquem esse cuidado mais intenso/mensal, podendo ser bimensal. Essa sugestão
dos Agentes condiz com o princípio da equidade, utilizado na escolha dos municípios
prioritários para a implantação inicial do PSF em 1994, e também para a escolha das
comunidades a serem assistidas em que ocorre a priorização das áreas periféricas num
sentido centrípeto em direção ao centro da cidade, completando 100% de cobertura
(BRASIL, 2006; BRASIL, 1997; TAKAHASHI e OLIVEIRA, 2001).
224
Outra análise que podemos presumir é se a qualidade da assistência prestada
pode ser garantida com a exigência de 100% das famílias visitadas mensalmente, que
a cobrança numérica pode resultar negativamente quanto ao acolhimento e ao diálogo
particularizados à realidade da família visitada.
IC2- Retirar do processo de trabalho a atividade de marcar consulta, evitando a
compreensão reduzida do papel do Agente, a incompreensão do novo modelo
assistencial e a insatisfação com os Agentes.
DSC- “Eu mudaria essa questão da marcação de consultas, eu não
sei se isso no papel do Agente de Saúde na verdade, mas isso
pesa muito nas costas da gente, sobrecarrega; eles [comunidade] vê
o Agente como secrerio, né, tá pra marcar consulta, pra marcar
exame não como Agente de Saúde que ta pra fazer uma visita, pra
poder acompanhar. A metade da população vê com bons olhos,
outros pensam que o Agente, que a visita é uma bobeira; ontem
mesmo aconteceu isso: na reunião do conselho gestor, o paciente
falou que, o usuário falou que o PSF, pra que visita?, pra que
reunião? né, se não faz nada, se o marca consulta, não marca
exame, vê o Agente como marcador de consulta. Às vezes, sabe, eu
acho que até hoje eles não entenderam direito que o Agente trabalha
com a prevenção e a promoção da saúde, assim, uma coisa que mim
angustia muito é a marcação de consulta, porque o pessoal acha que
é só pra marcar consulta que o Agente serve, sabe, ou entregar
exame pra ele. Às vezes você vai uma orientação, e eles num,
num tanta importância pra orientação, sabe, porque agora mesmo
225
eu orientando sobre a dengue, , porque tem surto de dengue na
área, as vezes você vai falar pra pessoa ‘oh, você tem que tirar a
vasilha, virar as garrafas pra baixo, tirar a vasilha que acumula água,
as vezes ele não tanta importância, ele fala ‘oh, e a minha
consulta? Você não marcou, não?’; a importância mais é a consulta.
Eu acho que eles acham que vem a unidade de saúde é só pra
marcar consulta, né, e nem sempre é isso, têm as reuniões e eles
quase o participam, né, os que vão mesmo estão mais
interessados na consulta, mesmo né; e se você não faz o que elas
querem, porque na verdade é consulta, se você conseguiu a consulta
pra eles ótimo, se você o conseguiu, aí não presta, a maior
demanda é de consulta, e não depende só de você. Às vezes a
pessoa ajuda o tempo inteiro, no dia que você não consegue nada
pra ela, ela acaba que esquece aquilo, não é o meu papel [marcador
de consulta] mas só que porém como o Agente leva tudo porém as
coisas não funciona assim, né? eles acham que você tem que
favorecer, aí, o aquelas pessoas que pensam assim, , que não
reconhecem o Agente”.
A responsabilidade do Agente com o agendamento de consultas e entrega de
exames descaracteriza o papel do Agente, que passa a ser confundido como um mero
marcador de consulta e secretário da comunidade, realizando comunicados. Esse fato,
portanto, ocasiona a valorização do modelo hegemônico privatista centrado na doença e
em tecnologias duras e a desvalorização do papel de mobilização social e de promotor da
saúde.
226
Os agentes começam a questionar e a exigir o retorno ao seu verdadeiro papel que
foi desvirtuado durante a implementação da estratégia saúde da família nacional; essa
situação não é um privilegio de Montes Claros, pois vários estudos realizados por
pesquisadores como Ferraz e Aerts (2005), Lunardelo (2004); Silva e Dalmaso (2002)
demonstram essa mesma realidade, em que se faz imprescindível apenas um tipo de
encaminhamento: a identificação de situações de risco na comunidade para o trabalho
interdisciplinar da equipe.
IC3- Evitar a culpabilidade do Agente pela organização, funcionamento e
resolutividade do sistema de saúde.
DSC- “O que dá certo, muitas das vezes nós não somos
reconhecidos, , quando o Agente ter feito um bom trabalho, outra
hora fica no ar pra quem quiser pegar; mas 90% das coisas errada
é Agente de Saúde. O que não certo é culpa do Agente, quando
chega uma reclamação aqui no PSF de um Agente de Saúde,
primeiro eles o chamam o Agente pra saber, chega
condenando, nem sempre é verdade, deveria um pouco de
crédito, de atenção”.
O Agente de Saúde é a ponte cultural de dois mundos - o institucional e o
comunitário -, representando o porteiro desses ambientes e sendo o responsável direto
pelo acesso e comunicação. Quando há falhas no processo, o Agente de Saúde recebe o
primeiro impacto, tanto no âmbito positivo quanto negativo, entretanto o aspecto negativo
tem uma repercussão mais abrangente e sempre esrelacionada à supervalorização do
modelo centrado na doença e exames citado na ideia central anterior (IC2) que extrapola
227
a competência do Agente, ocorrendo a sua modificação, o que, automaticamente, leva à
mudança proposta na IC3.
IC4- Retirar do processo de trabalho a necessidade de assinatura do morador após
a realização da visita domiciliar, evitando a compreensão reduzida do Agente como
mero “caça assinatura”.
DSC- “O que eu mudaria? (silencio) Ah, eu mudaria o seguinte,
esse necio de chegar na casa e pedir assinatura da pessoa na
casa, pegar assinatura, o que eu deixaria de fazer é pedir o povo
pra assinar naquelas folhas, nossa, se eu tiver um modo de eu
gravar, fazer a visita, a assinatura pra mim, pra mim, não só pra
mim, pode perguntar pra qualquer Agente, é um inferno na nossa
vida, porque essa assinatura é que faz ele achar que a gente
passa lá pra pegar assinatura, pra receber pagamento. Eu acho que
a coisa pior que existe, porque o povo acha que pagando o meu
salário; eu acho que deveria ter uma confiança, da gente
visitando ele, entendeu, né, essa assinatura, assinatura tem hora
que atrapalha, tira confiança, sobre, tem gente que também
atrapalha, tira a confiança, sabe? chega assim tem gente que fala
que o Agente chega só pra pedir pra assinar, e tem muitas pessoas
que a gente chega, fica quase meia hora na casa do paciente, aí,
quando vovira as costa ele fala que você só foi pra assinar e
não, não é, entendeu, fica difícil pra gente também; aquilo ali
machuca demais o Agente, tem Agente aqui que chega chorando,
chora mesmo, tem gente que não quer assinar, igualmente quem
228
não quer assinar no meu caderno eu faço o seguinte ‘Olha, dona
Maria o direito é da senhora, a senhora não quer assinar, eu coloco
lá que ela não quis assinar, escrevo tudo direitinho e falo:’Agora, eu
vou levar pro meu enfermeiro, hoje mesmo eu vou conversar com
ele sobre isso aqui, né’. Mais infelizmente acontece de não pegar
assinatura”.
A confiança é o pilar que sustenta o processo de trabalho da ESF, tendo o Agente
como interlocutor e facilitador da criação de vínculos, porém qualquer situação que
coloque em dúvida a credibilidade desse profissional responsável pelo elo impossibilita e
atrapalha o estabelecimento de um canal de comunicação.
Os Agentes destacam que o fato de terem que comprovar suas visitas por meio da
assinatura dos moradores gera um desconforto e incompreensão do processo de visita
domiciliar, que passa a ser vista pelos usuários como uma ferramenta coadjuvante em
detrimento da supervalorizão da assinatura na folha de visita domiciliar implementada
pelo município de Montes Claros e não uma exigência preconizada pelo Ministério da
Saúde.
A obrigatoriedade da comprovação da visita por meio da assinatura leva à falta de
autonomia do Agente, ocasionando desgaste, sofrimento psíquico e desmotivação, que
podem ser evitados caso seja modificada a forma de comprovação das visitas
domiciliares.
IC5- Vivenciar o trabalho em equipe de forma interdisciplinar, a fim de garantir a
efetivação das ações e a criação de vínculo de confiança, evitando a organização
hierárquica.
229
ECH Omael- “Eu acho que a desconfiança com o Agente, o Agente
de Saúde devido ele em baixo, entendeu, na hierarquia, o que
acontece, qualquer problema que acontece, qualquer coisa que não
dá certo, então, o erro é do Agente de Saúde, ‘Ah, quem é o Agente
de Saúde, é fulano, ah, então foi fulano’, entendeu?”.
Omael ressalta o trabalho em equipe como essencial para a efetivação, entretanto
deve existir respeito e valorização de todos os membros da equipe com a superação de
dois grandes equívocos: o de que os profissionais devem ser subalternos ao médico e de
que o Agente Comunitário de Saúde é auxiliar de enfermagem (BRASIL, 2000).
IC6- Diminuir o número de atendimentos para cada Agente, visando ao melhor
acompanhamento e assistência.
ECH Miguel- “Ah, se eu pudesse eu diminuiria o número de família,
eu acho que dava pra trabalhar melhor. Eu acho que umas 130,
provavelmente, dava pra você acompanhar tranquilo, fazer tudo que
você tinha que fazer”.
O discurso de Miguel esem consonância com as publicações do Ministério da
Saúde que delegam para os Agentes a responsabilidade por um número definido de
famílias e pessoas que possibilite o acompanhamento eficiente, com a garantia da
qualidade do cuidar prestado, com destaque para as áreas de risco e as famílias de risco;
as microáreas com essas particularidades de risco devem ser menores que aquelas as
quais não possuem essas situações especiais (BRASIL, 2006e).
230
IC7- Efetivar os Agentes para garantir direitos trabalhistas, com melhoria salarial, e
mais segurança para realizar o processo de trabalho.
ECH Gabriel- “Queria uma segurança maior em termos de melhor
salário e estabilidade, é disso que eu gostaria né? gico que hoje
em dia o trabalho não é esvel, qualquer pessoa, ela não tem
estabilidade total, mas a gente né, é com isso poderia ter mais
direito em relação à categoria, como, por exemplo, fundo de
garantia a gente não recebe, né, outro direito dentro da categoria, a
gente não tem piso salarial, o é compatível com o que a gente
ganha, a gente sabe disso né? Depende de cada região, né, pra
isso, melhores condições de trabalho, como por exemplo, vale
transporte, às vezes tem reuniões que a gente tem que tirar do
nosso bolso, pra participar e muitas vezes você tem que pedir
dinheiro emprestado, até mesmo pra C. que é a chefe nossa, às
vezes toma emprestado, né, pra poder se deslocar, mas eu gosto
de participar das reuniões é, é, não recebo vale transporte, gostaria,
justamente, de deslocar e pra melhor atender a comunidade, porque
você aprendendo mais alguma coisa você vai melhorar a
comunidade”.
A efetivação, com a garantia dos direitos trabalhistas, é mencionada com outras
contribuições de ECHs na análise de IC referente a Expectativas da profissão, em que
teceremos mais comentários.
231
IC8- Achar que não é necessária nenhuma modificação.
ECH Mikael- Eu acho que o trabalho de Agente de Saúde, já, já, é
muito bom, né, agora em mente, eu não lembrando, não lembro
assim, ah! Eu acho que eu não mudaria, porque o Agente ele é
muito importante na, na comunidade”.
O anjo Mikael destaca que não realizaria mudanças no processo de trabalho.
Nesse sentido, outra perspectiva que pode ser considerada é que o trabalho do Agente
deve ser destacado como de relevância pública.
8- PERCEPÇÃO DA COMUNIDADE SOBRE O TRABALHO DO AGENTE, NA
PERSPECTIVA DO AGENTE
Os anjos do estudo têm percepções variadas acerca da concepção da comunidade
em relação ao seu processo de trabalho, revelando repercussões diferentes de acordo
com a relação estabelecida Agente/famílias.
IC1- A comunidade reconhece o profissional Agente e valoriza sua função de elo,
sendo considerado referência no aspecto da saúde, o que resulta na aceitação do
trabalho.
DSC- “Eu acho que a comunidade aqui, pelo menos na área que a
gente trabalha, eu acho que 85% mim trata muito bem, reconhece
bastante o meu trabalho, sempre o objetivo é o elogio, que às vezes
que o pessoal gosta, muitas vezes, de reclamar, mas elogiar se eles
estão gostando eles não fala nada, sempre tem aqueles que não
232
gostam, nem Deus agradou todo mundo. Eles valorizam muito, eles
acham importante, tanto é que quando chegam na unidade eles
vêm direto no Agente, tem hora que eles não passam nem na
recepção, porque é o elo, eles reconhecem, eu sou bem tratada, é
tanto que quando eu passo nas ruas, na missa qualquer lugar que
eu esteja, não só da minha área mais das demais áreas, as
pessoas perguntam Amanhã vai ter médico, amanha vai ter isso’
No final de semana, quando acontece alguma coisa, se eu acho
que deve ir pro hospital, se dá pra esperar até na segunda; eu sou
bem conhecida, reconhece até demais que eu fico com vergonha de
não saber o nome de todas as pessoas na rua; o povo fala: ‘Oi,
tudo bem?’ Quer dizer, já tem um elo forte com eles, uma ligação,
sei dos problemas, das dificuldades, então cria aquela amizade com
a comunidade, porque na época que de férias mesmo, o pessoal
fica todo atrás, cobrando pra voltar ‘Você sumiu, você sumiu,
porque você não apareceu aqui’; aí eu falo porque eu tava de férias,
aí quando chega de novo as férias ‘Mas já, já vai tirar de novo’, eles
sentem falta. Eu acho que eles percebem uma evolução, né, porque
antes o tinha o Agente Comunitário pra na casa orientando e
pra quê? Vai ajudando a prevenir, vai promovendo saúde, né,
uma coisa que a pessoa pode até não sentindo naquele
momento mas se vem a sentir ele sabe como e o que fazer.
Entretanto, falam muito assim de que o Agente é a peça mais
importante nesse processo de inversão de modelo, mas quando a
gente vai inverter os papeis, é na hora de falar que o Agente é
233
mais importante na teoria, mas na prática não é o mais importante,
às vezes o pessoal valoriza mais o profissional do vel superior.
[Mas o que você acha que mudaria isso?] A gente sabe que é um
processo e que é uma longa caminhada, talvez assim trabalhar
mais junto , depende trabalhar mais junto o Agente e o profissional
de nível superior, porque às vezes tem equipe que não trabalha isso
assim com igualdade, todo mundo bem integrado, a gente sabe que
tem isso, aí dificulta um pouco”.
O Agente Comunitário percebe que a maioria das famílias reconhece a importância
do trabalho como elo e valoriza a sua mediação por meio da escuta e da valorização das
relações interpessoais, acolhendo o Agente como membro da família e compartilhando as
alegrias, as angústias e os sofrimentos compreendidos no âmbito íntimo (LUNARDELO,
2004).
IC2- Alguns moradores não valorizam o trabalho do Agente.
DSC- “Tem gente que reconhece, que vê o esforço que a gente faz,
outros não, eu acho que aquele que não vê é aquelas pessoas que
não teve a experiência muito boa em PSF em outras comunidades,
assim, de uma certa forma, tem, tem as pessoas que começam a
conhecer, aí eles começam a valorizar, mas aquelas pessoas que
mudam pra cá, que não conhece ainda, elas ainda não valorizam o
trabalho do Agente. Também tem aqueles que você pode fazer de
234
tudo que eles não estão satisfeitos, não tá bom, vem aqui se precisa
esperar a consulta, eles vão embora, eu sei que a maioria aprova o
meu trabalho”.
Por outro lado, existem os moradores que não reconhecem e não valorizam a
contribuição do Agente no cuidar da saúde. Diante disso, Merhy (1997) afirma que
existem usuários que não têm interesse de estabelecer contato permanente com a equipe
e, como alternativa, procuram serviços que priorizam a livre demanda, como as unidades
terciárias. Também, ainda aqueles que, mesmo usando o serviço dos Agentes e da
ESF, são eternos insatisfeitos apesar da assistência prestada.
IC3- Culpa do Agente.
DSC- É difícil, porque você é a peça, , o primeiro impacto tudo
que o pessoal vai ver, se ele não gosta de alguma coisa aqui, é
culpa do Agente. Na verdade é tudo assim, se acontece alguma
coisa aqui, se o médico o vem, ‘Ah, você marcou errado, você
não sabe’, né, cai em cima da gente, o Agente é a peça do PSF,
aquele que pega o impacto; Se não dá certo, é, é, o exame pra ele,
ele acha que o Agente de Saúde que foi culpado do seu exame não
ter dado certo, o Agente de Saúde é o culpado, então ele se
torna o elo, se uma coisa não der certo, né, ele tem que ter uma,
tipo assim uma (...), ele te cobra e muitas vezes ele tem razão por
causa desse sistema, que às vezes é um pouco moroso, né, apesar
do SUS ser o melhor, pra mim é o sistema de saúde melhor, o SUS,
235
ele tem muita coisa ali que tem a desejar, né, ele tem muita coisa
boa que resolve e tem muita coisa a desejar”.
A compreensão da culpa do Agente fundamenta-se no atributo do primeiro contato
da APS, em que o Agente é o porta-voz do novo modelo de saberes e fazeres em saúde,
em que são depositadas todas as expectativas prévias que irão gerar satisfação ou não
com o cuidar, pois o canal de comunicação é mais estreito (MERHY, 1997).
IC4- A comunidade valoriza as atividades curativas em detrimento das ações
preventivas e percebem o Agente como Marcador de consulta, resultando na não
compreensão do novo modelo assistencial e a insatisfação com os Agentes.
DSC- “Eles [comunidade] vê o Agente como secretario, né, ta pra
marcar consulta, pra marcar exame não como Agente de Saúde que
ta pra fazer uma visita, pra poder acompanhar; a metade da
população com bons olhos, outros pensam que o Agente, que a
visita é uma bobeira, ontem mesmo aconteceu isso na reunião do
conselho gestor: o paciente falou que o usuário falou que o PSF,
pra que visita? Pra que reunião? né, se não faz nada, se não marca
consulta, não marca exame, vê o Agente como marcador de
consulta, às vezes, sabe, eu acho que até hoje eles não
entenderam direito que o Agente trabalha com a prevenção e a
promoção da saúde. Assim, uma coisa que mim angustia muito é a
marcação de consulta, porque o pessoal acha que é pra marcar
consulta que a gente serve, sabe? Ou entregar exame pra ele, às
vezes você vai uma orientação, e eles num, num tanta
236
importância pra orientação, sabe? Porque agora mesmo eu
orientando sobre a dengue, né, porque tem surto de dengue na
área, às vezes você vai falar pra pessoa ‘oh, você tem que tirar a
vasilha, virar as garrafas pra baixo, tirar a vasilha que acumula
água’, às vezes ele não dá tanta importância, ele fala ‘oh, e a
minha consulta? Você não marcou, não? A importância mais é a
consulta; eu acho que eles acham que vem na unidade de saúde é
pra marcar consulta, né, e nem sempre é isso, tem as reuniões e
eles quase não participam, né, os que vão mesmo estão mais
interessados na consulta, mesmo né; e se você o faz o que elas
querem, porque na verdade é consulta, se você conseguiu a
consulta pra eles ta ótimo, se você não conseguiu, não presta. A
maior demanda é de consulta, e não depende de você, as vezes
a pessoa ajuda o tempo inteiro, no dia que vocêo consegue nada
pra ela, ela acaba que esquece aquilo, não é o meu papel
[marcador de consulta] mas só que porém como o Agente leva tudo
porém as coisas não funciona assim, né; eles acham que você tem
que favorecer, aí, são aquelas pessoas que pensam assim, né, que
não reconhecem o Agente”.
Esse DSC retrata o grande debate da saúde brasileira, que é a transição do
paradigma flexneriano, centrado na atenção médica altamente individualizada e
especializada, para a inversão do foco de atenção, priorizando a promoção da saúde e
prevenção de doença, que tem o Agente como seu legítimo representante. A IC acima e o
seu discurso revelam um equívoco de que o ACS é valorizado apenas pelo êxito ao
237
agendar a atenção médica e desvalorizado quando não satisfaz as expectativas do
usuário (MENDES, 1999; PAIM, 1999).
9- EXPECTATIVAS DA PROFISSÃO DO AGENTE
Os Agentes mencionam suas expectativas para o futuro dessa profissão, e as mais
desejadas concentram-se no âmbito profissional e na valorização salarial,
proporcionalmente a suas atribuições e responsabilidades, concomitante com a garantia
do processo de educação permanente.
IC1- O Agente Comunitário espera para o futuro a efetivação, garantindo segurança
e tranquilidade para realizar as atividades cotidianas.
DSC- “A gente espera muito a questão da estabilidade, né, porque
nesse caso o Agente de Saúde não é uma profissão, não
enquadrado ainda como uma profissão, então a gente não é, é visto
como funcionário da prefeitura, mas é contratado, eu espero ser
reconhecido realmente como profissão, né, e que, de uma forma ou
de outra, a gente seja efetivada, e que melhores condições pra
trabalhar, sabe. Se tivesse estabilidade, não porque acomodaria no
serviço, mas realmente você fazer o seu trabalho, você pensar que
no ano que vem você pode estar na mesma, né, no mesmo serviço,
então a gente não tem essa visão, ‘ah, o ano que vem fazer um
cálculo pro ano que vem, vou fazer, trabalhar isso na minha
comunidade’, mas eu acho que essa estabilidade daria pra todos os
Agentes uma tranquilidade maior pra poder desenvolver o trabalho
238
da gente. Oh, o que eu espero é ter uma segurança maior no meu
serviço, eu tenho medo que entra um prefeito e querer mandar tudo
embora, porque ele é tudo pra mim no momento e eu não pretendo
mudar não, eu acho que eu vou continuar sendo Agente, até
quando eu puder ser”.
A Emenda Constitucional nº. 51, de 14/02/2006, e a Lei 11.350, de 05/10/2006,
refletem bem o anseio dos anjos montesclarenses, pois regulamenta os vínculos, os
requisitos e a desprecarização da seleção e dos vínculos, por meio da criação do cargo
público de Agente Comunitário no quadro efetivo de funcionários municipais (BRASIL,
2006c; BRASIL, 2006d; BAHIA,2007a).
Apesar de a lei supracitada ter sido regulamentada em 2006, até o ano de 2008,
durante a época das entrevistas, ainda não existia essa função pública no referido
município, e os ACS’s não tinham estabilidade no emprego, gerando risco de sofrimento
psíquico, com ameaças constantes de desemprego, além da pressão para o uso como
cabo eleitoral, ocasionando o desvirtuamento das atividades e o desvio de função.
Em setembro de 2008, após terem sido realizadas as entrevistas no município de
Montes Claros, os Agentes foram efetivados e essa expectativa mencionada nas
entrevistas tornou-se uma realidade.
IC2- O Agente Comunitário espera para o futuro a valorização profissional
proporcional à responsabilidade e ao processo de trabalho com reconhecimento no
âmbito financeiro-social, rompendo com a visão do Agente como classe menos
favorecida.
239
DSC- “Eu acho que deveria ser mais valorizado, que o Agente seja
valorizado, e visto como Agente, como profissional mesmo, né? De
todas as classes a menos favorecida é o Agente Comunitário de
Saúde; é mais reconhecimento do Agente, porque ás vezes o
Agente não é muito reconhecido não, eu quero ser reconhecido
tanto profissional quanto financeiramente, ah, eu gostaria que
pudesse (pausa) aumentar o salário, o nosso salário deveria ser um
pouquinho a mais porque o trabalho do Agente pensa que é fácil
mas é muito difícil, né? São muitas tarefas pro Agente com, a gente
tem muito trabalho, trabalha muito, o salário é bom, ajuda né, mas
olha pra você ver tudo que vem da secretaria, não só da secretaria
é o Agente que faz, se é pra pesar da bolsa família é o Agente que
faz, tudo que vem de é o Agente que tem que fazer, porque o
Agente já tá lá na área, o Agente já tá vendo a família, porque não o
Agente ganhar um pouquinho mais? Porque ele é um elo entre a
comunidade e a unidade, mais assim, ser Agente de saúde é muito
bom, primeiro tem que gostar do que faz; eu espero mais curso
profissionalizante, mais divulgação do papel do Agente, quem sabe
que a secretaria ou o prefeito desse o maior valor pra os Agentes,
eu acho que a população tamm, acho que dava bem mais valor”.
O Agente Comunitário é a alma da ESF. Dessa forma, a efetivação das ações
desenvolvidas pelos membros da equipe depende da ação do ACS; a grande
responsabilidade que repousa nos ombros dos Agentes leva-os a questionar os direitos
trabalhistas e a remuneração proporcional a essa responsabilidade, especialmente aliado
240
à asceno ao mercado de trabalho, com o reconhecimento da profissão como ocorreu
pela lei em 2002, 10.507 de 10/07/2002, deixando de ser apenas uma categoria sem
legislação específica ligada a uma unidadesica de saúde (BRASIL, 2002a).
Esse questionamento foi também realizado em outros estudos (Nogueira, Silva e
Ramos, 2000) que relataram a compreensível aspiração dos Agentes para desfrutar de
direitos e benefícios trabalhistas e previdenciários garantidos à maioria dos trabalhadores
brasileiros, bem como a livre associação para defesa de seus interesses.
Outro aspecto destacado é o reconhecimento social que deve ocorrer inicialmente,
dentro da esfera institucional e prolongada para a esfera coletiva e social, que o papel
social do Agente de Saúde junto às famílias promove legitimidade e eficácia a seu perfil
ocupacional, transformando-o num recurso humano fora do comum que deve ser
valorizado (NOGUEIRA, SILVA e RAMOS, 2000).
IC3- O Agente Comunitário espera para o futuro a efetivação como elo entre a
comunidade e a unidade de saúde.
DSC- “O pessoal [a equipe] fala que o Agente é o cara, mas o
Agente é que ta lá na área, as pessoas pensam que o trabalho do
Agente é fácil mas é muito difícil, né? o muitas tarefas pro
Agente, ele ouve mais as pessoas, tá mais dentro da casa das
pessoas, então assim precisa mais unir porque tem certas coisas
que a gente ainda precisa alcançar, porque ele é um elo entre a
comunidade e a unidade, mais assim, ser Agente de Saúde é muito
bom, primeiro tem que gostar do que a gente faz”.
241
O DSC revela o anseio dos Agentes de serem reconhecidos no papel de laço, fato
tamm presente no estudo de Nogueira, Silva e Ramos (2000) que caracteriza o Agente
diante de dois aspectos fundamentais: 1- identidade com a comunidade; e 2- tendência
para a ajuda solidária. Esse recurso humano exige um perfil social fora do comum, com
destaque para o saber comunicar-se com sua comunidade, uma vez que é mais
comunidade que profissional de saúde, que tem um laço forte com ela, sentindo-se
mais próximo da comunidade do que com o serviço de saúde, enquanto os outros
membros da equipe são mais serviço de saúde.
IC4- O Agente Comunitário espera para o futuro a educação permanente que
garanta qualificação profissional.
DSC- “Eu espero uma melhor qualificação, mais curso
profissionalizante, porque agora mesmo fazendo esse curso de
Agente Comunitário de Saúde, que a gente seja reconhecido como
Agente de Saúde, porque pra o Ministério da Saúde o Agente não
era ainda profissão, aí eu espero ser reconhecida como profissão,
eu sei que o curso tem haver com isso”.
O Curso Técnico de Agente Comunitário de Saúde é uma expectativa mencionada
que ainda não é uma realidade na cidade de Montes Claros. Os Agentes revelam a
preocupação com a formação profissional, que é reconhecida como um dos pilares da
excelência da qualidade do cuidar em saúde e tamm permite o reconhecimento como
profissão, que necessita de um corpo de conhecimentos e habilidades, delineando um
perfil de competências necessárias para o fazer cotidiano, normatizadas por meio da
242
educação profissional com o curso técnico de nível técnico ( BRASIL, 2004; BRASIL,
1996; BRASIL, 1999a).
IC5- O Agente Comunitário espera para o futuro o apoio para implementar as
atividades educativas.
DSC- A gente quer fazer uma reunião diferente, que a gente tenha
material pra fazer essa reunião, né? Que a gente tenha espaço pra
fazer essa reunião. A nossa sala de reunião mesmo já não tem mais
espaço, não mais fazendo reunião praticamente aqui mesmo
na unidade, a gente tá procurando o salão comunirio, que graças
a Deus, é um espaço que sempre que a gente procurou aberto
pra gente, a creche tamm a gente usa, as escolas, então a gente
fazendo assim, a queso de espaço, né, de material, esses dias
mesmo, eu queria fazer uma reunião com revista, pincel essas
coisas, não tinha, né? Então, dificulta”.
O processo educativo o deve ser concebido na concepção bancária limitada à
transferência de conhecimentos e sim a um processo criativo de possibilidades para a
produção e criação de saberes, destacado pelo DSC como o apoio material e físico com
ões intersetoriais e parcerias comunitárias, resultando na educação em saúde que se
faz de forma simbiótica, onde os integrantes aprendem em comunhão e se encontram no
fazer, no falar, na ação-reflexão, vivenciando a saúde como construção coletiva (FREIRE,
1987; FREIRE, 1996).
243
IC6- O Agente Comunitário espera para o futuro a organização da classe
profissional, levando à representatividade.
ECH Aniel Que se unam mais e que tenha uma
representatividade para que organize igual como começando a
organização do Conselho do Agente pra a gente poder ta dando as
mãos e lutar em prol dos Agentes por causa que o Agente às
vezes, o que a gente passa muitas vezes o enfermeiro e o médico
não passa, às vezes ele passa por situações diferentes, então o
Agente, como fala o pessoal, o Agente é o cara, mas o Agente é
que ta lá na área, ouve mais as pessoas, ta mais dentro da casa
das pessoas, então assim precisa mais unir porque tem certas
coisas que a gente ainda precisa alcançar”.
O discurso de Aniel revela duas angústias vivência de situações exclusivas do
fazer do Agente e a responsabilidade pela inversão do modelo assistencial – que tem sua
solução atrelada à união de classe enquanto coletivo, pois os homens quando sofrem
opressão não conseguem ultrapassar essa condição sozinhos, pois ninguém liberta
ninguém, os homens libertam-se em comunhão, vencendo o opressor que existe dentro
deles em busca da liberdade (FREIRE, 1987).
10- SER AGENTE COMUNITARIO DE SAUDE E SER AUXILIAR DE ENFERMAGEM:
DOIS PONTOS DE VISTA
O PROFAE tinha como missão a profissionalização na área de enfermagem dos
profissionais que realizavam ões de enfermagem sem a habilitação técnica associado
244
ao intuito de melhorar a qualidade dos serviços de sde com a prevenção e a solução
dos problemas dessa área. Com a efetiva implementação, foi estendida aos Agentes
Comunitários de Saúde, gerando dois aspectos mencionados pelos sujeitos do estudo.
IC1- Ser auxiliar de enfermagem proporciona ao Agente a maior resolutividade e
valorização perante a comunidade que anseia pelas atividades curativas.
DSC- Não falo muito de perfil, porque a pessoa não nasce com
perfil, ele adquire , no conhecimento. Então muitas vezes se um
técnico de enfermagem fosse um Agente talvez o serviço dele seria
mais completo, né, as dificuldades que nós temos bastante como
Agente que eu sinto que a maioria dos meus colegas tamm
reclama a mesma coisa é a questão do, do da pressão, o ponto
maior que a gente tem hoje no serviço é a medida de pressão, né?
Então o Agente não pode medir, eu acho se ele tivesse um, um
curso, uma capacitação que o Agente pudesse, resolveria 50% dos
problemas da comunidade, muitas vezes a comunidade chega aqui
faz aquele volume de gente aqui, só pra poder medir a pressão,
muitas vezes tem curativo, tem vacina, tem uma coisa pra tomar.
Então eu acho se o Agente pudesse essa vazão no, no serviço
eu acho que a visão do serviço seria muito melhor; você tem mais,
é, é capacidade de ajudando a comunidade, por exemplo na
minha área tem mais 30 hipertensos, né, os meus hipertensos eles
não são acompanhados todo mês pra medir a pressão, o pessoal
fica em casa esperando, o auxiliar o pode sair da unidade, o
245
Agente de Saúde vai e o pode medir; se o Agente de Saúde
pudesse medir o usuário não precisaria sair de casa”.
Os Agentes de Saúde procuram alternativas em relação à profissionalização e o
curso de auxiliar de enfermagem apresenta-se como meio oportuno de dar continuidade
aos estudos e à formação profissional, proporcionando valorizão e visibilidade, que
as ões biomédicas permitem a aproximão e a identificação dos Agentes como
representantes da instituição de saúde, afastando-os da identidade comunitária e
permitindo um diferencial com os moradores, que o seus vizinhos e conhecidos
(NOGUEIRA, SILVA e RAMOS, 2000; LUNARDELO, 2004).
Dessa forma, os Agentes tornam-se bridos que pertencem a duas categorias: a
de Agente Comunitário de Saúde e como uma categoria ocupacional pertencente, ainda
que não legitimamente, ao grupo de enfermagem (NOGUEIRA, SILVA e RAMOS, 2000).
IC2- Ser auxiliar de enfermagem traz mais benefícios no aspecto individual do que
no coletivo.
ECH Sitael- “A gente tem mudado muito, mas por oportunidades
melhores, né, o único que saiu porque não teve perfil foi o primeiro
Agente de Saúde daqui. Agora saiu vários outros, mas porque
conseguiu outro emprego, uma Agente saiu pra fazer o cnico, C.
saiu agora porque passou na seleção e indo pro São Geraldo II.
Então a maioria dos Agentes que saiu foi os Agentes que fizeram o
curso técnico, e então o curso técnico favoreceu, eles mais na
questão pessoal e então o curso técnico acabou sendo um prejuízo
246
para o Agente e bom pro indivíduo; e surgindo a oportunidade acho
que vão mesmo”.
Outro aspecto destacado foi o curso de auxiliar de enfermagem como estimulador
da rotatividade nas Equipes de Saúde da Família, motivado pela busca de melhoria
técnica e asceno profissional com a busca de novas oportunidades, sendo mais
importante para o Agente de maneira individual do que para a Estratégia Saúde da
Família (LUNARDELO, 2004).
11- ASPECTOS MOTIVADORES DO PROCESSO DE TRABALHO DO AGENTE
Os aspectos motivadores permitem ao trabalhador manter-se entusiasmado,
querendo oferecer o melhor de si, influenciando e inspirando a ação; proporcionando ao
processo de trabalho o sentido de geração de prazer e recompensa pelo fazer.
Os Agentes identificaram três aspectos que mantêm a chama da motivação acessa
dentro de si.
IC1- O Agente Comunitário é motivado pela resolução das necessidades de saúde,
levando a sensação de dever cumprido e reconhecimento.
DSC- Ah! Igual mesmo você ver assim, você começar uma coisa e
ver cumprida, de eu consegui resolver o problema de alguém,
alguém ti procura, e, você conseguiu realmente que, vo ajudou
aquela pessoa, influenciou de algum jeito, você ver, viu o resultado
de seu trabalho é ótimo como quando eu descobri uma hanseníase,
né? A gente fez uma apresentação, na área tinha uma mulher, uma
247
mulher que tinha uma mancha, uma mancha, assim na testa dela
tinha uma mancha, e comecei a observar, ela esfregava muito, e
observei que também no braço tinha uma mancha, e ela não sabia
o que, o que era, e assim eu fiz o teste da caneta com ela, e a gente
percebeu que ela tava assim sem sensibilidade, ai, eu trouxe ela pra
cá, teve o dia da hanseníase aqui, e foi comprovado hanseníase, aí,
ela tratou um ano, quando ela ficou curada ela veio aqui
sabe, e mim agradeceu e eu pensei ‘Oh, poxa vida mais eu não fui
o dico que cuidou dela, o fui eu que é, é, tava dando remédio,
eu só assim, descobri e trouxe ela pra cá, ela veio mim agradecer’,
então isso pra mim, foi realizão mesmo, eu mim senti feliz nessa
hora. E tamm quando eu fui na casa de uma senhora semana
passada que eu não vou nem lembrar aqui e ela é idosa e eu vi que
tinha uma vasilha lá de colocar água, de colocar das galinha e eu
acho que nem o pessoal da dengue conseguiu fazer ela livrar
daquilo, eu cheguei fiz a visita conversei com ela, eu vi aquela
vasilha lá e mexi assim na beira da vasilha e tinha umas larvas eu
acredito que foi da dengue, chamei ela, mostrei a ela, expliquei
pra ela, falei com ela: ‘a senhora tá sabendo dos casos que tá
acontecendo fora daqui, aqui também, mas fora é mais grave, tinha
jeito a senhora pelo menos lavar?’, eu conversei com ela assim,
passar escova na beira ai porque não pode deixar; ela ficou calada,
(ela disse:) ‘não, não eu vou tirar’, aí quando eu voltei no outro dia e
ela tinha tirado eu fiquei feliz eu vi que meu serviço teve efeito”.
248
A ESF tem como objetivo prestar uma assistência universal, integral, contínua e
especialmente resolutiva, que se apresenta como a diretriz da resolutividade com o
atendimento das reais necessidades da população com intervenção adequada. Dessa
maneira, o Agente Comunitário assume o importante papel de intermediar a atenção às
famílias, entendendo e percebendo o processo saúde-doença a partir do ambiente físico e
mental, realizando, assim, a interlocução família/equipe (SOUSA, 2000; ALVES, 2005).
Isso posto, os Agentes entrevistados destacam que o cumprimento da diretriz da
resolução proporciona a sensação de dever cumprido, motivando-os, que são
conhecedores da realidade local e têm a percepção das condições sociais e de vida.
A solução dessas mazelas sociais e de saúde apresenta-se com um significado
diferente em relação aos demais membros da equipe e que proporciona um sentido
diferente a sua vida pessoal como morador da comunidade e ao seu processo de trabalho
por meio do cuidado ao outro.
IC2- O Agente Comunitário é motivado pela satisfação do usuário por meio das
ações empreendidas durante o processo de trabalho.
DSC- “Além de eu ter bastante em Deus, muita em Deus
mesmo, o que me motiva mais é quando o usuário precisa do
serviço e é bem atendido, né? Quando a gente volta pra saber,
retornar pra uma consulta, você consegue encaminhar ele, o
médico atende ele bem, volta na casa pra saber se a pessoa
melhorou, a pessoa ti agradece, agradece a unidade, a gente fica
muito satisfeito porque vendo que o trabalho realmente
funcionando, né? Ou quando eu presto um servo pra pessoa, e a
pessoa fica satisfeita, isso pra mim é maravilhoso, vale a pena, um
249
curativo que eu faço, uma PA que eu faço, tem pessoas idosas,
você termina e falam ‘Deus ti abençoe minha fia, vai com Deus’, ah,
eu fico alegre demais, eu adoro eu penso que eles gosta do
trabalho, a importância do nosso serviço mesmo que na
comunidade tem pessoas que falam mal, mais a satisfação de
algumas pessoas, especialmente idosos e crianças, é que mim
motiva a trabalhar mais ainda. Com certeza, sempre o objetivo é o
elogio, que às vezes que o pessoal gosta muita vezes de reclamar,
mas elogiar se eles estão gostando eles não fala nada, aí”.
A percepção dos usuários acerca da assistência prestada com o atendimento das
suas expectativas prévias resulta em satisfação, que motiva os Agentes de Saúde, já que
a manifestação da satisfação dos moradores ganha uma amplitude maior, uma vez que a
relação interpessoal com as famílias é a razão de ser e a base do processo de trabalho
do profissional Agente Comunirio de Saúde (MERHY, 1997).
IC3- O Agente Comunitário é motivado pelo desejo de ajudar o próximo.
DSC- “Nossa, eu acho que vale a pena, quando eu vejo que tem
uma família precisando mesmo, eu vou, eu ajudo, eu levo ao
médico, faço uma visita, eu vejo que aquela família fica satisfeita,
porque tem muitos, igual idoso que não tem condições de vim aqui,
eu vou, faço a visita chega resolvo algum problema que eu vejo
que a família fica satisfeita, pra mim já fico satisfeita. Ou quando eu
lido com aquela família que desanimada, que, não tem coragem
de vim aqui, que eu sei, se eu não ir até lá, se eu não ajudar é, é
não vai resolver o problema, aí, eu sei que vale a pena. É bom,
250
porque eu sei que eu ajudando meu próximo como eu já disse e,
e, de uma forma ou de outra sempre tem gente que recebe muito
bem, e vale a pena ser Agente, porque eu ajudando, na minha
orientação, no meu trabalho, né, assim, eu, eu acordo e falo assim
‘Hoje eu vou naquela casa, vou ser bem recebida, porque eles vão
mim acolher beme eu também faço o meu acolhimento de forma
muito agradável, né, do melhor possível que eu posso fazer porque
o que eu gosto mais é dá assistências às pessoas”.
O cuidar representa a essência do ser humano estimulado pelo contato com o
outro, fundamentando todas as relações estabelecidas com os outros. Por meio do ato de
cuidar, os anjos desse estudo demonstram um perfil solidário, imbuído do sentimento de
valorizão humana através da contribuição para a melhoria da vida das pessoas, seja
por meio de uma forma de cuidar inautêntica ou autêntica de coexistir (BOFF, 2004;
LUNARDELO, 2004; HEIDEGGER, 1999).
Esse perfil solidário, caracterizado pelo desejo de ajudar ao pximo é um aspecto
motivador do processo de trabalho e, ao mesmo tempo, causador de desmotivações.
12- ASPECTOS DESMOTIVADORES DO PROCESSO DE TRABALHO DO AGENTE
Os aspectos desmotivadores revelam o processo de trabalho como causador de
sofrimento e angústia que gera a insatisfação no trabalho, retratado por meio das ICs.
251
IC1- O Agente Comunitário é desmotivado pela falta de resolução, que ocasiona a
falta de credibilidade acerca do desenvolvimento do papel desse profissional.
DSC- “Oh, mim desanima é quando eu tento ajudar uma pessoa e
não consigo, porque às vezes o está ao meu alcance; é você
tentar fazer uma coisa pra alguém assim, e vover que a pessoa
merece e você não conseguir ou quando assim, a pessoa vem aqui
direto a gente consegue as coisas, ou mesmo na casa a gente
orienta, fala a pessoa segue, quando chega aqui e a pessoa
procura alguma coisa que não no meu alcance de resolver a
pessoa, a pessoa coloca a gente pra baixo, xinga ‘Ah, vo não
consegue nada, a gente não consegue nada nesse posto’; isso aí ti
desanima totalmente, vontade de desistir, por causa daqueles
que toda vez acha que tem que conseguir e também as vezes falta
muitas coisas que a gente não pode dá pra comunidade, como
material, que não depende de mim.
Os Agentes revelam que a percepção da incapacidade de responder a todas as
necessidades e demandas apresentadas pelos usuários e famílias frustra-os, pois, no
fazer diário, deparam com a pressão da comunidade aliada ao fato de a comunidade
depositar no Agente a responsabilidade de ser o locutor dos problemas enfrentados, essa
situação também foi descrita por Lunardelo (2004).
A falta de resolução reflete também no estabelecimento do vínculo de confiança,
fundamental no processo de trabalho do Agente, que tem no diálogo e na troca de
252
informações, muitas vezes confidencial, o mecanismo para a efetivação e a
implementação da Estratégia Saúde da Família.
IC2- O Agente Comunitário é desmotivado por sua responsabilidade pela
organização e funcionamento do sistema de saúde, o que ocasiona insatisfação do
usuário e incompreensão.
DSC- “É quando chega gente barraqueira e fala ‘Você não resolveu
isso pra mim, você é incompetente’, e não sei o que, e fala assim,
mim chama de irresponsável, quando acontece, né, é muito difícil,
mas acontece, a gente nunca consegue agradar todo mundo, né ou
quando você faz de tudo pela pessoa, tudo pela pessoa, aí, ela vai e
fala assim ‘eu não recebo nada, eu não consigo nada, que o PSF não
presta, não serve pra nada’, mas normalmente depois ela vem e pede
desculpa mais isso magoa muito”.
O duplo papel atribuído ao Agente de ser: 1- do âmbito comunitário o porta voz das
necessidades da população assistida; 2- do âmbito institucional a fonte de informação
sobre o processo de organizão dos serviços de saúde; ocasiona angústias e gera
desmotivação. Esse aspecto mencionado pelos entrevistados tamm foi relatado por
outros autores em seus estudos, em especial Lunardelo (2004).
IC3- O Agente Comunitário é desmotivado pela compreensão reduzida do papel do
Agente como andarilho da saúde e caça assinatura.
DSC- O que mim desmotiva às vezes é porque às vezes a gente
o máximo da gente, né, e assim não que eu busque de todo
253
mundo só elogio, porque sempre tem altos e baixos, né? Às vezes a
população não compreende a gente, às vezes eles pensam que
Agente de Saúde é só andando pra cima e pra baixo, eles não
entendem que o Agente tem um trabalho a seguir, que tem muitas
atividades a fazer, e as vezes que desmotiva é a não compreensão
da população e também tem muitas pessoas que ainda não dão
valor, tem gente que acha que ser Agente de Saúde é ficá batendo
perna, é, é, não faz nada, que fica de conversinha, na realidade a
gente é cobrado, todo fim de mês a gente tem uma meta pra poder,
é, é prestar conta pro pessoal aqui. Não é questão que desanima,
é, é que chateia, porque se fosse o caso de desanimar, eu já tinha
desistido, você entendeu?.
O Agente de Saúde é o responsável por captar os dados acerca da população e do
seu perfil de morbidade e mortalidade, objetivando à alimentação dos bancos de dados
nacional, o que resulta em cobranças e pressão sobre as visitas realizadas e seu
respectivo acompanhamento familiar a nível domiciliar. Porém, a população não
compreende o processo de trabalho do Agente e as metas estabelecidas a nível nacional,
como acompanhar mensalmente 100% das famílias e dos grupos prioritários, gerando
grande pressão e cobranças da população que, ao desconhecer e/ ou não compreender o
verdadeiro papel social e de sde dos ACS, contribui para a geração de sofrimento e
angústia (BRASIL, 2006; BRASIL, 2000; BRASIL, 2003).
IC4- O Agente Comunitário é desmotivado pela realização de atividades
administrativas desvirtuadas que sobrecarregam o serviço e causam stress.
254
ECH Raziel- “Tem hora que a burocracia do serviço, a parte
burocrática, é muita coisa que o é papel do Agente, e o Agente
acaba tendo que fazer”.
A não compreeno do importante papel de mobilizador social aliada à falta de
profissionais, como o administrativo, resulta no desvio de função, em que ele reduz suas
atividades externas, que é sua razão de existir (visita domiciliar) para realizar atividades
internas ( recepção, burocracia), o que desvirtua o seu verdadeiro fazer (BRASIL, 2006).
IC5- O Agente Comunitário é desmotivado pela ausência de trabalho de equipe e
pela falta de compromisso com a comunidade.
DSC- “Quando eu não consigo resolver alguma coisa, aí,
sinceramente, ou então quando eu chego com problema aqui,
porque acontece, é assim, aí eu chamo o médico, eu chamo o
enfermeiro pra conversar, e aí entra no ouvido e sai no outro, né,
não assunto, não dá a credibilidade praquilo que eu tô falando,
mim vontade de desistir aquilo, realmente desanima a gente
fica parecendo que o seu trabalho indo por água a baixo. Ou
quando o usuário fala ‘Ah, fulano mim tratou mal, ele não mim
atendeu o médico marcou e não veio’; é justamente isso quando a,
a equipe não em acordo, não entra em acordo, porque a gente
tem sempre reunião, como se diz a reunião é pra lavar roupa suja,
né? Então nisso aí a gente coloca os problemas que a gente tem,
então a gente fica realmente indignado quando a gente discute uma
coisa, planeja pra fazer aquilo no mês e quando você acha que o
255
trem caminhando direitinho, né, fala ‘Ah, não vai poder ter essa
reunião, não vai poder ter aquilo’, então realmente você fala com a
comunidade uma coisa, você marca com a equipe pra ir na, medir a
glicemia, pressão do pessoal pra fazer uma, uma eu tenho 30
hipertensos, umas 120 famílias tem mais ou menos 400 pessoas.
Então a quantidade de hipertensos tá bem pequena né, a estimativa
deveria ser maior, então fomos fazer uma busca ativa, então a
comunidade ficou esperando e a gente marcou o dia, marcou com a
equipe, a equipe demorou a sair daqui e quando chegou ficou
menos de uma hora. tava voltando, quando a comunidade
começou a chegar, começou a participar parou no meio da
atividade, o pessoal falou vopede pra gente vim aqui, pede pra
não faltar, e, o médico e o enfermeiro chegou ficou menos de uma
hora e foi embora’, isso aí desanima perante a comunidade”.
A compreensão do ser humano em toda a sua complexidade leva em consideração
a sua dupla entrada entrada biofísica e entrada psicossociocultural em que uma
remete à outra de maneira interligadas, resultando na compreensão integral do ser
humano. Na ESF, essa compreensão ocorre por meio do trabalho em equipe,
fundamentado no respeito ao saber e ao fazer do outro e suas respectivas contribuições
em busca da interdisciplinaridade (MORIN, 2003; BRASIL, 2000a; BONALDI et al., 2007).
Os Agentes destacam que a não efetivação da verdadeira prática em equipe com a
ão interdisciplinar gera atrito, desconfiança, falta de credibilidade e culmina na
desmotivação e na insatisfação com o processo de trabalho.
256
13- MUDANÇAS DA CONCEPÇÃO DO PROCESSO DE TRABALHO DO AGENTE
COMUNITÁRIO
A maioria dos Agentes de Saúde iniciou suas atividades junto com a implantação
da ESF, apenas cinco Agentes eram anteriormente usuários, sendo assistido pelos
Agentes através da visita domiciliar, associado a outros contatos estabelecidos
previamente, seja pela visita, atividade de educação em saúde e promocionais.
Todos os Agentes que eram anteriormente usuários das Equipes de Saúde da
Família (5) afirmaram que a visão sobre o processo de trabalho mudou após iniciar suas
atividades.
QUADRO 8- COMPARAÇÃO DA VISÃO DO PROCESSO DE TRABALHO ANTES E
DEPOIS DE SER AGENTE COMUNITÁRIO DE SAÚDE, 2008
VISÃO ANTERIOR VISÃO POSTERIOR
IC1- Processo de trabalho considerado
fácil, com poucas regras e atividades a
serem executadas.
ECH Miguel - Eu achava que era mais
fácil, sinceramente, quando eu vi, eu
achava que era menos serviço, achava
que era mais fácil (...) Ah, eu acho que,
que, eu achava que sinceramente, que o
serviço era menos, que o serviço era
menos, mais assim tamm depois que eu
vi que tamm tinha regras, que eu não
IC1- Processo de trabalho complexo
relacionado à interação com as famílias
que apresentam aspectos positivos e
negativos.
ECH Miguel - (...) nunca imaginei que
assim, que o pessoal xingava você, que
maltratasse, que, as vezes batesse a porta
em sua cara, nunca passava em minha
cabeça isso.
ECH Mikael - (...) a nossa visão mudou
257
assim, que eu não conhecia isso, eu não
sabia que tinha, que tinha metas pra
cumprir, eu não sabia que tinha.
ECH Mikael - Antes, eu não conhecia
realmente o que era um trabalho em
relação à saúde, no nosso SUS, né,
depois que mim tornei Agente, a gente vê
muita mudança e vê que, que a gente
achava que era fácil, é difícil na verdade,
como usuário, né, as pessoas acham que
é muito fácil, , que você pode um
jeitinho, a nossa visão mudou muito,
muito, por isso que a gente pega
conhecimento em relação à saúde vê que
não é tão fácil como as pessoas pensam,
que as coisas são bem diferentes.
IC2- Percepção simplificada do papel
de Agentes resumido na visita
domiciliar, como mero instrumento de
olhar as famílias e buscar assinaturas,
sem compromisso.
ECH Daniel - Bem, bem mudou muita
coisa, ah, eu achava que a gente ia na
casa, só assim, olhava como que tava a
família e tal, e voltava assim pegava
assinatura e saía mas depois que eu fui
, fui analisar e fui vê que não é isso.
IC2- Processo de trabalho relacionado ao
conhecimento/interação com as famílias
com o intuito de promover a saúde no
aspecto positivo.
ECH Daniel - (...) fui analisar e fui vê que
não é isso, , é você chegar na casa do
paciente, é observar o que acontecendo,
é interagir com aquela, aquela família,
vo tá por dentro de tudo sobre ela,
percebi que é muito além do que uma visita,
faz uma visita.
258
ECH Benael - (...) mais quando eu entrei
aqui é que eu pude ver as dificuldades de
quem aqui dentro, né, passar coisas pra
as pessoas que ta fora, tipo assim, levar
a saúde não é fácil, até envolve muitas
coisas, envolve cultura, né, envolve é, é,
tem mesmo assim condições pra
oferecendo pra elas alguma coisa, então é
complicado.
Fonte: Pesquisa de Campo, 2008.
Os Agentes de Saúde revelaram a não compreensão da importância e da
complexidade inerente ao seu processo de trabalho quando eram usuários cadastrados e
visitados pelos atuais colegas de equipe.
O fato de o Agente de Saúde ser oriundo da comunidade assistida, convivendo no
mesmo espaço comunitário, mesma cultura aliado a não exigência prévia de nenhum
requisito escolar específico resulta na visão simplificada do papel, e assim passa a ser
visto como simples e fácil, uma tarefa que qualquer um pode exercer. Emerge, dessas
colocações, um grande eqvoco de aliar o acesso universal à profissão a todos que
atendam aos requisitos estabelecidos pelo Ministério da Saúde a uma visão reduzida do
processo de trabalho, em que se valoriza apenas o diploma e o título, atribuindo maior
valor agregado ao conhecimento teórico em detrimento do conhecimento comunitário,
que os outros profissionais têm com pré-requisito a formação profissional específica para
a sua função (BRASIL, 1991; BRASIL, 2000; BRASIL, 2006).
259
Além da falta de exigência de formão profissional específica como requisito para
a função, foi destacada a visão de trabalho fácil, centrada na visita domiciliar como mera
ida ao domicílio para obtenção da assinatura mediada por um conversa informal e
desinteressada; o processo de trabalho como Agente possibilitou a visão ampliada do
processo saúde-doença e do importante papel de acompanhar e monitorar situações de
risco e grupos de risco, exercendo a ação de vigilância à sde, que é o pilar da
Estratégia Saúde da Família (BRASIL, 2004; MENDES, 1999).
Esse fato remete à reflexão acerca da ação que deve ser realizada pela equipe de
saúde e secretaria de saúde para esclarecer esses equívocos que dificultam a inversão
do modelo assistencial centrada na ESF.
14- A PERCEPÇÃO DA FAMÍLIA DOS AGENTES SOBRE O PROCESSO DE
TRABALHO DO AGENTE NA PERSPECTIVA DO SUJEITO/AGENTE
A família é a razão de existir do ser humano, ainda mais na ESF, que insere a
família como Agente ativo nos serviços de saúde, reconhecendo o contexto familiar como
espaço privilegiado para as ações de saúde. Diante disso, nada mais justo que conhecer
a percepção das famílias dos Agentes de Saúde sobre o processo de trabalho do Agente
na óptica do próprio Agente (BASTOS; TRAD, 1998; STARFIELD, 2002).
IC1- A família considera o papel de Agente como relevante, indispensável e
essencial para a comunidade por meio de ações de cuidado e desenvolvimento
pessoal.
DSC- “Ah, eles [família] adoram o meu trabalho de Agente, porque
de certa forma eu mim sinto tão bem e antes eu sentia tanta
260
depressão, eu chorava bastante, porque ficava desesperada por
não tá arranjando serviço, então eles sentem tranquilo, porque eu
trabalhando com o que eu gosto, também, né, a família acha bom,
acha bonito e fala o seguinte: que, que, que é um trabalho muito
bom, , engrandecedor porque você vai estar ajudando a pessoa,
de achar que a genteajudando alguém e vê que a gente é útil
na comunidade, eles acham que a gente cresce bastante não é só o
lado financeiro, mas o lado, é, é humano, do que é ser Agente,
minha família falou: você deve continuar e procurar crescer dentro
do que você se habilitou, é isso que eu quero, pra, pro ACS, ele
crescer pra ajudar a comunidade e as pessoas”.
Os Agentes destacam que a família considera de relevância pública o seu fazer
diário, por meio do reconhecimento social através do cuidar do outro que contribui para o
crescimento humano-individual (LUNARDELO, 2004).
IC2- A família valoriza o trabalho de Agente, que representa fonte de orgulho e
confiança.
DSC- Minha família é o maior orgulho, minha mãe então, minha
mãe fala minha filha é Agente’ ela tem orgulho pelo resultado do
trabalho, é, é eu chego preocupada ‘Ah, meu Deus eu tenho de
ajudar’, é, é não falando o nome, eu tenho uma família que tenho de
ajudar, eu saiu muito fora de hora, sabe, pra ajudar, sabe ela
que, que eu tenho compromisso; então isso aí um conforto pra
gente, uma confiança, sobre, eu fico muito alegre; eles [família] mim
261
coloca no alto tudo que acontece, em relão , e, e, os sobrinhos
machucou ‘oh! Tia vem , vê isso.”Minha tia teve é, é, bebê, e
pra fazer a retirada de pontos “Oh, você devia fazer pra mim’;
tamm é, já aconteceu de minha mãe tá aqui no serviço, e o
pessoal falar mal dos Agentes, né, e ela tá defendendo”.
A valorização do processo de trabalho é aliada à importância atribuída às ações de
cunho humanitário e solidário que o fazer do Agente proporciona ao seu ente querido,
que o Agente, seja ele, esposa(o), filha (o), pai, mãe, irmã passa a ser conhecido pela
comunidade onde vive, adquirindo status social na dinâmica comunitária.
IC3- A família considera o processo de trabalho complexo quando associado ao
fato de a comunidade não separar o profissional-Agente do morador-Agente, com
procura fora do horário de serviço e do ambiente de trabalho e com cobranças
indevidas.
DSC- “No início, minha família achou que seria bom ou muito
pesado, né, tem muita cobrança, o Agente, ele é bem cobrado em
qualquer lugar, no armazém, na igreja, em qualquer lugar é, a
comunidade tem a cultura assim, de o separar as coisas, o
Agente mora na comunidade e todos os lugares que você vai as
pessoas da comunidade eso , e param, vo vai no barzinho,
você pode sair em Montes Claros inteiro que vo encontra alguém
da comunidade,’Ah, eu quero uma consulta’. Você tá na fila do
ônibus, em qualquer lugar que vo, realmente é difícil, , eles
gostam [ família] do que eu faço, só não gosta quando o pessoal
262
começa a incomodar lá em casa, porque de noite é uma chamação,
vai lá fala pra ti procurar na unidade, porque agora de noite
você fazendo janta, vono horário de almo, as vezes tem
que parar de almar pra ir atender, porque eu tenho uma
dificuldade pra dizer não, porque quando chega assim, porque é eu
não sei se eu naquela casa ali no dia a dia, aquela família mim
aceita bem, eu sei da realidade, aí muitas vezes que a pessoa mim
procura eu sei que precisando, ai eu acabo cedendo apesar
mesmo no horário, que é meu horário de almo”.
O Agente de Saúde estabelece com as famílias visitadas uma relação de
confiança, que muitas vezes leva a interpretações equivocadas e dificuldade do Agente
em impor limites à população, que aborda esse profissional na comunidade, em qualquer
lugar e situações (casa, na rua, na igreja, no horário de lazer), independente do horário de
trabalho, gerando desconforto e incômodo com os familiares que presenciam essa
abordagem (LUNARDELO, 2004).
IC4- A família considera o processo de trabalho complexo se associado à
convivência direta com a realidade local e a violência.
ECH Raziel- “Meu esposo gosta do meu trabalho, agora o que, o
que ele fica mais chateado, é aquele, é, é, a questão do, do, por
enquanto o tem jeito, e a questão de, de, de residência no local,
dentro da área de abrangência, isso tem aatrapalhado muito até
263
agora por causa da violência do local. A gente quer ter uma casa
própria, né, só que a gente não quer uma casa própria aqui, agora
com filho, criar um filho no ambiente de violência, isso atrapalha,
atrapalha muito”.
Alguns familiares temem pela segurança do seu ente querido na realizão de seu
trabalho, o que resulta em uma convivência familiar confusa e conflituosa.
15- A PROFISSÃO DE AGENTE: UM TRABALHO A SER RECOMENDADO PARA
FAMILIARES E AMIGOS
Todos os Agentes de Saúde recomendariam essa profissão a familiares e amigos,
porém somente para aqueles que tivessem o perfil adequado, uma vez que a profissão
exige alguns requisitos.
IC1- Recomendaria para as pessoas que possuíssem atitudes/valores como
pacncia e calma.
DSC- “Oh, eu arecomendaria para aquelas pessoas que tem é,
deixa eu ver... paciência, né; mas também explicaria pra ela como
que é ser um Agente, que você tem que ter paciência, você tem que
ser uma pessoa é,é assim tem que ter calma demais”.
IC2- Recomendaria para as pessoas que possuíssem atributos pessoais, como
amor profissional.
264
DSC- “Se fosse alguém que eu soubesse que gostasse, que tivesse
interesse de trabalhar na área de saúde, porque a gente sabe que a
pessoa tem que ter perfil, tem que gostar, amor no que elas fizer,
porque tem que ter muito amor pra ser Agente de Saúde, em
qualquer profissão, mas o Agente ele tem que ter muito, muito amor
naquilo que ele fazendo, porque não é fácil, não é; agora se não
gostar eu nem recomendo”.
IC3- Recomendaria para as pessoas que possuíssem qualidades e atributos
profissionais, como ser calmo, saber conversar/comunicar, explicar, ser capaz de
transpor informações, saber ouvir e saber lidar com o público.
DSC- “Recomendaria, mas primeiro tinha que ser, eu acredito muito
na questão de ter perfil, saber mexer com as pessoas, saber lidar
com as pessoas, você de repente dá uma resposta pra uma pessoa,
em questão da saúde, você tem que conversando, explicando,
porque muitas vezes você tem que saber ouvir mais do que falar,
ouvir mais do que falar, eu acho que o Agente de Saúde não é pra
qualquer um, a pessoa tem que ter perfil e um desses perfil é saber
ouvir mais do que falar”.
Os Agentes destacam a importância de possuir atitudes/valores, atributos pessoais,
qualidades e atributos profissionais necessários ao exercício da profissão, que está
fundamentada na relação interpessoal, no diálogo e nas habilidades de comunicação.
Destaca-se, aqui, o cuidado profissional, definido como a forma com que os indivíduos
o atendidos nos sistemas de saúde pelos profissionais e embasado no cuidado cultural,
265
na percepção da experiência de vivenciar os comportamentos de cuidar e de não cuidar
dentro do contexto familiar, de maneira a manter o seu bem-estar e qualidade de vida
(LEININGER,1991).
A expressão chave retirada do depoimento de Manael retrata uma situação
específica enfrentada por candidato que o possui o perfil adequado e
qualidades/atributos necessários.
“Eu recomendei para minha irmã que ela entrou e não gostou
da experiência e saiu, ela o deu conta, ela disse que não era o
que ela esperava. [O que ela esperava?] Ela pensava que era
diferente, que o era pra ir todo mês na casa, visitando, e que as
pessoas também o tava aceitando o programa e às vezes nem
recebia ela, né”.
16- AÇÕES NECESSÁRIAS PARA A VALORIZAÇÃO DO AGENTE DE SAÚDE NA
PERCEPÇÃO DO AGENTE
Os Agentes destacam as ões necessárias para o processo de valorização, que,
nos relatos abaixo mencionados, se confundem com ações de educação que resultam na
sensibilização por meio do reconhecimento de que as pessoas são seres históricos e,
portanto, inacabados. Nesse sentido, a conscncia dessa inclusão leva à busca
constante em direção a estar no mundo, com o mundo e com os outros (FREIRE, 1987;
FREIRE, 1996).
Esse estar no mundo, com o mundo e com os outros refere-se à comunidade, à
equipe e ao gestor municipal de saúde.
266
IC1- Valorizão dos Agentes por parte da equipe e do gestor municipal de saúde
como peça fundamental no processo de inversão do modelo assistencial por meio
do trabalho em equipe, interdisciplinaridade e de visibilidade.
DSC- “Falam muito assim de que o Agente é a peça mais
importante nesse processo de inversão de modelo, mas quando a
gente vai ver se inverte os papeis, é na hora de falar que o
Agente é mais importante na teoria, mas na prática não é o mais
importante, às vezes o pessoal valoriza mais o profissional do nível
superior; a gente sabe que é um processo e que é uma longa
caminhada, talvez assim trabalhar mais junto, depende trabalhar
mais junto o Agente e o profissional de nível superior porque às
vezes tem equipe que não trabalha isso assim com igualdade, todo
mundo bem integrado, a gente sabe que tem isso, dificulta um
pouco; e eu acho é, que tipo assim , se por exemplo, é, é se a
secretaria, ou o prefeito desse o maior valor pra os Agentes, eu
acho que a população também, acho que dava bem mais valor”.
IC2- Divulgação do papel do Agente e da Equipe de Saúde da Família,
proporcionando maior visibilidade e desmistificando a ideia de mero marcador de
consulta.
DSC- “Eu acho que, que tipo assim divulgando mais o papel do
Agente, quem sabe; divulgando o papel que a gente desenvolve,
é fazendo reuniões comunitárias, explicando como funciona o PSF,
né, qual o objetivo do PSF, pra que serve o PSF, porque tem pouco
267
tempo que o PSF tá inserido aqui na comunidade, e o centro de
saúde é muito próximo eles viram, eles viam o PSF como um novo
centro de saúde e o como PSF, como postinho e tamm eu
acho que eles devem mim respeitar mais e ver como Agente de
Saúde e eu sou uma profissional também. Então, assim, nós não
somos mero marcador de consulta, né?”.
A valorização do processo de trabalho do Agente encontra respaldo no processo
de produzir e de transformar o pensar em ação e comunicação, que se faz pelo
reconhecimento e pela divulgação do verdadeiro papel do Agente, que deve acontecer
não pelo outro nem para o outro, nem sem os outros e sim com o outro como sujeito de
seu pensar (FREIRE, 1987; FREIRE, 1996; FREIRE, 1983).
O outro é reconhecido como o usuário, a equipe e o gestor local, que devem ser
envolvidos nas relações de construção do saber, fazer e conviver (CARVALHO, 2007).
IC3- União da categoria Agente de forma organizada para reivindicar e garantir os
direitos trabalhistas.
ECH Ariel- “Eu acho que a categoria é reunir como a associação, né
nos começamos a reunir e não demos continuidade, ficou naquela
primeira reunião, depois fizemos uma, porém o vingou, foi alguns
membro só, então foi eleito essa associação, porém não tem nada
registrado, o foi registrado a associação. Eu acho assim que a
categoria se em toda categoria se ela é unida, se é bem organizada,
tem como reivindicar mais os direitos da gente”.
268
A busca da valorização perpassa pelo questionamento de si e reconhecimento do
seu pouco saber de si, passando a questionar-se e ao seu processo de trabalho. Nessa
tomada de consciência, reconhecem que sozinhos são incapazes e que não podem
libertar-se, ou libertar o outro sem a participação do outro, pois ninguém liberta ninguém,
os homens libertam-se em comunhão. Essa liberdade, portanto, é descrita como a busca
dos direitos trabalhistas (FREIRE, 1987).
2.2- RESULTADOS E DISCUSSÃO DO SABER FAZER
“Somos anjos de uma asa só, e para voarmos precisamos nos abraçar.”
Autor desconhecido
1- ATRIBUIÇÕES DO AGENTE COMUNITARIO DE SAUDE
As atribuições foram mencionadas pelos Agentes de formas variadas, algumas
atividades foram nomeadas de maneira unânime, como a Visita Domiciliar, que
representa a mola mestra para as demais atribuições, que serão apresentadas em ordem
decrescente, pelo número de vezes que foram referidas, com seus respectivos DSC.
IC1- Visita Domiciliar (15).
“A primeira é fazer a visita domiciliar, o papel principal do Agente é
a visita domiciliar, que tem que visitar cada família uma vez por
mês, ah, fazer as visitas porque tem que ter um mero de visitas,
então, a visita domiciliar é principalmente importante”.
269
IC2- Reuniões - Atividades educativas coletivas (9).
DSC- Eu faço as reuniões mensais, que são reuniões educativas,
é, é grupos, a gente faz o grupo durante a pesagem, fala sobre
algumas doenças, era responsável pelos adolescentes. Então a
gente fazia as reuniões aqui, o grupo de mães, grupo de
planejamento familiar, grupo de hipertenso, diabético a gente fica
com a enfermeira; a gente, quando está presente, a gente ajuda na
equipe, ajuda nas reuniões, junto pra mim é também orientar um
pouco”.
IC3- Orientações/Aconselhamento Comunitário (8).
“Orientação, eu oriento as famílias, a gente faz também, a gente
tem uma parte que a gente faz as reuniões com a comunidade e
orientações sobre rios assuntos, a gente os assuntos que é
pertinente no momento. Igual agora trabalhando mais a
prevenção da dengue, a gente faz parceria, outra vez nós fizemos
uma blitz educativa na praçazinha ali com os colegas, em parceria
com o pessoal das zoonose. Então a gente procura
desenvolvendo de acordo com a época”.
IC4- Atividades internas - administrativas, recepção, farmácia (7).
“O Agente trabalha tamm aqui na unidade, desenvolvendo os
trabalhos internos aqui na parte administrativa, nós temos um turno
de plantão na recepção, que é escalado, de manha um, e de tarde
270
outro, a gente fica uma vez por semana, a gente faz o rodízio. Além
da recepção, tem muitas outras coisas é, é a gente faz muitas
outras coisas, a gente abre o material, quem tem curso de auxiliar e
de técnico, sabe, o material, esteriliza, né, trabalha na farmácia,
atende na, na farmácia”.
IC5- Acompanhamento das famílias e de grupos específicos (7).
“Ah, a gente faz o acompanhamento da família, a gente faz o
acompanhamento das crianças de 0 até 7 anos, de gestantes, de
hipertensos, diabéticos; realizo orientações, eu conto medicamentos
dos hipertensos, pra poder ver se eles estão tomando direitinho, dos
diabéticos tamm, as gestantes eu olho se fez a consulta do mês,
geralmente é aqui, né, mas quando é o fato de ser de fora eu olho,
se tomou vacina, o peso, a questão do peso até assim a queso da
amamentação, a gente conversa vários assuntos, entendeu? No
caso de criança, todo mês eu tô olhando os cartões das crianças de
zero a dois anos com mais questão dessa faixa etária, mas os
outros eu tenho que olhar também por causa das vitaminas, toma
até 5 anos sulfato ferroso, orientações assim gerais vai depender de
cada família. Já teve caso de eu acompanhar no hospital tamm,
né, numa consulta, porque às vezes tem muitas famílias que não
têm quem ajuda ela, eu levei idoso pro hospital, já levei pra fazer
exames, já levei gestantes pra ganhar menino”.
271
IC6- Marcação de Consulta, entrega de encaminhamentos e exames, aviso de
consulta (5).
“Ah, a gente faz o acompanhamento da família, de tá vendo a
necessidade de, de, por exemplo, de consulta, de, de, de
acompanhamento depois de aconselhamento das residências né,
entregamos encaminhamentos, avisamos retorno de consulta, é
marcado o CD, Agente avisa o CD, se é marcado a prevenção a
gente avisa”.
IC7- Promotor da saúde e atividades comunitárias (4).
“Ações de prevenção de saúde, promão de saúde, essa etapa é
ação de saúde, a gente faz reunião de equipe, a gente convida a
comunidade pra participar da reunião, também olha o cartão de
vacina, olha os hipertensos, tudo dentro da visita, é, visita os
hipertensos, saber comoa medicação, porque muitas vezes você
falta aqui pegar o medicamento e colocar na boca do paciente,
porque muitas vezes por ser uma área de invasão, assim, o pessoal
é muito deficiente mesmo, a questão de a pessoa não sabe ler, não
saber escrever a pessoa deixa de se cuidar, de tomar a medicação,
tem dificuldade de tomar a medicação, vo orienta, eu faço a
vasilhinha coloco um solzinho de manhã, na hora do almo, à
tarde. Então o papel do Agente eu acho que é justamente isso, é a
maior dificuldade que a gente tem é essa, o usuário não sabe tomar
o medicamento, porque tem muitas medicações, ele olha o
comprimido ao invés de ver clorana ver o captopril, ‘eu tô tomando o
272
pequinininho, o branquim’, captopril e clorana é igual, você tem que
ter uma diferenciação pra isso, nesse sentido”.
IC8- Acolhimento, Ouvir a Comunidade (4).
“A gente faz o acolhimento, né, recebe a comunidade, escuta a queixa
da pessoa, repassa, pro médico e tenta dá uma, uma vazão nesse
primeiro momento, estar acolhendo a pessoa, né, independente se ela
vai conseguir resolver o problema naquele momento, ou não, né; a
gente faz as orientações, orienta, né”.
IC9- Elo (3).
“Todo dia a gente sai pra área, faz o nosso papel, que é passar
saber da comunidade, dos problemas da comunidade faz aquela
ligação, levar a saúde porque o Agente Comunitário até então ele
era visto como marcador de consulta, né, e isso não é objetivo
do Ministério da Saúde, ser como marcador de consulta. O Agente
Comunitário ele discute o assunto no domicílio, vê se tá tendo
algum problema, algum caso em alguma família naquele assunto,
se tiver tendo ele traz pra cá, pra unidade, e, fala com o chefe
nosso”.
IC10- Atividades de técnico de enfermagem - curativo, medida de PA (Pressão
Arterial) (3).
273
“Oh, o Agente Comunitário faz a visita domiciliar, e, e ele observa
em casa, né, ele não pode medir a PA, eu meço porque eu sou
auxiliar, então ele não pode medir PA, o pode fazendo o
curativo não, e eu sempre faço retirada de pontos no domicílio, eu
faço, né. Mais sempre que precisa eu fazendo curativo, mas
Agente Comunitário não pode, pra mim que sou auxiliar de
enfermagem, eu que acompanho todos os meus 50 hipertensos”.
IC11- Trabalho em equipe (2).
“Tá trabalhando em equipe, mesmo, né, fazer parte da comunidade,
mesmo”.
Todas as atividades realizadas pelos Agentes pesquisados são embasadas no
Cuidar, que representa a essência do seu fazer, devendo ser compreendido como
atenção, dedicação, cautela, percepção real do outro, prestando às famílias e às pessoas
uma assistência de forma individualizada (BRASIL, 2008b).
2- PLANEJAMENTO DAS ATIVIDADES
Todos os Agentes realizam o planejamento de suas atividades, em especial a visita
domiciliar, que está fundamentada no mapeamento da microárea e, na sequência, das
visitas definidas por ruas, facilitando o fazer cotidiano.
O planejamento deve ser baseado no princípio da contextualização, ou seja, quem
realiza esse processo deve estar imerso na realidade sobre a qual planeja; e, para os
Agentes Comunitários, essa contextualização é obtida por meio do instrumento de
274
territorialização e mapeamento da área de abranncia que proporciona o conhecimento
e a identificação das pessoas e as necessidades da população. (BRASIL, 1997;
OLIVEIRA, 1999; BRASIL, 2000).
Esse planejamento das visitas tem o intuito de completar a meta estabelecida pela
Estratégia Saúde da Família de 100% de famílias visitadas mensalmente. Essa meta é
comentada por Miguel e Gabriel como DSC:
“O que tem que ser feito mesmo, a quantidade de cada coisa, o que
você tem que fazer dentro da área, igual a visitas diárias, né, que
você tem uma meta a cumprir, eu tenho que passar lá na
residência, é uma vez por mês, é o normal, pelo número de famílias
é uma vez por mês”.
Os Agentes m a atribuição de acompanhar mensalmente todas as famílias e,
para isso, os ACS de Montes Claros realizam um planejamento mensal para cumprir essa
atribuição, embasada principalmente no mapeamento da área e a organização por meio
da sequência de ruas.
Entretanto, alguns Agentes apresentam algumas particularidades de acordo com a
realidade local:
Jeliel faz o planejamento de suas atividades baseado no planejamento dos demais
membros da equipe e suas respectivas atividades:
“Todo início de mês a gente tem um planejamento do que vai
acontecer o mês todinho, os grupos, reuniões, tudo. Na visita
domiciliar eu já vou avisando, desde o icio do mês eu falo: ‘Oh, tal
275
dia vai ter grupo, planejamento’, eu vou realizando as visitas, já vou
convidando e avisando no decorrer do mês; quando o grupo tá
próximo e, e eu não cheguei na casa ainda, dou uma esticadinha, e
falo ‘tem grupo disso, daquilo’ ”.
O plano de trabalho da equipe considera a dinamicidade da comunidade, cujo
trabalho em equipe pauta-se na sintonia dos seus membros que se rearranjam para
executar o cuidar e a escuta do outro. Dessa forma, o planejamento dos Agentes deve
estar em sintonia com os demais atores do fazer em saúde (BRASIL, 2005a).
Caliel faz o seu planejamento com base na escala das atividades administrativas na
recepção, em que cada Agente fica responsável por dois turnos semanais:
“Eu faço de acordo com a recepção daqui da unidade, depois que,
que o cronograma fica pronto, que eu vejo, sempre pela manhã eu
faço visita e a tarde, eu deixo, as tardes que eu preciso fazer reunião,
eu, as reuniões que eu preciso fazer eu deixo pra tarde”.
As atribuições do Agente proposto pelo documento do Brasil (2006c) não
contempla nenhuma atividade administrativa. Entretanto, o Agente Caliel menciona que
faz o seu planejamento baseado nessa atividade, o que nos leva a questionar se nessa
equipe não está ocorrendo um desvirtuamento do papel estabelecido para esse membro.
Rafael aguarda a educação permanente na equipe para depois fazer o planejamento
sobre o tema a ser orientado em todas as visitas, levando em consideração as
276
necessidades da família, realizando a escuta, que tamm é realizado por Anauel,
expresso pelo DSC:
“No final do mês, a gente escolhe o tema a ser falado, mas nem
todas as casas, a gente planeja as visitas do dia, qual a rua, qual as
casas que a gente vai, a gente faz um cronograma de visita, a gente
planeja as famílias a ser visitada no dia. Você faz o plano, o tema a
ser falado, só que quando você chega na casa, chega lá é
totalmente diferente, a pessoa te esperando, queria falar outro
assunto, a gente escuta e orientação sobre o assunto. Como a
gente não pode ficar muito tempo na casa, se der tempo a gente
fala sobre o tema, se não a gente orienta sobre o que a pessoa
precisando, realmente; também tem visita que pode demorar mais,
tem muitas queses psicogicas, tem caso de até as pessoas
querer se suicidar na minha frente, aí você tem que ter um tempo
maior, né? Apesar de não ser formada em psicologia, de conversar
com aquela pessoa pra evitar que aconteça o pior, que existe
muitos casos é, esse lado aí, como a gente se torna muito próximo,
então ela sente aquela confiança, viu? De soltar tudo que ela tem,
né, por dentro, sem ninguém pra conversar, então o Agente, ele
tamm, é, é praticamente um psicólogo o formado”.
Essa definição retratada no DSC produzido pelos Agentes se aplica ao conceito de
Educação Permanente proposto pela Política Nacional de Educação Permanente, que é
compreendida como a aprendizagem no trabalho, em que ocorre a inter-relação entre o
277
aprender e o ensinar relacionado ao cotidiano do trabalho e voltado para as famílias
assistidas. Nesse caso, os Agentes contextualizam a orientação, que é a pedra angular
do cuidado prestado (BRASIL, 2007c; BRASIL, 2000).
Vale ressaltar também a utilizão do Tempo Emocional, que leva em
consideração as relações de interação, intercessão, respeito e confiança traduzidos pela
formação de vínculos, não restringindo o tempo cronológico durante a realização das
visitas (SAKATA, 2007).
Todos os Agentes concordam com duas situações enfrentadas durante o processo de
planejamento, que são a importância do mesmo e as dificuldades de sua implementação.
2.1- IMPORTANCIA DO PLANEJAMENTO
O agrupamento das expressões-chave deu origem a DSC que ilustra a importância do
processo de planejar.
“Geralmente aqui, no início né a gente saía aleatoriamente aí, mas
hoje a gente prefere sair por rua, porque você tem uma noção essa
rua eu já fiz, é muito importante, né, pra comunidade não ficar
reclamando, né, ‘oh, não me visitou esse mês’, tem que saber
porque que não visitou, né, será que foi alguma coisa, né, pra ser
justo com o Agente de Saúde, né. Assim pela sobrecarga que ele
tem de atividade, com esse planejamento você tem a
necessidade de voltar só quando realmente é alguma necessidade”.
278
Esse comentário retrata a essência do planejamento, que é de facilitar o processo de
trabalho, que não deve ser constituído de um ato isolado da ação e sim contar com a
dinamicidade da comunidade, em que o planejamento e a programação devem estar em
sintonia com as transformações (BRASIL, 1997).
2.2- DIFICULDADES PARA A IMPLEMENTAÇÃO DO PLANEJAMENTO
No aspecto das dificuldades encontradas para a implementação do planejamento,
foram elaboradas duas ideias centrais, que retratam situações que atrapalham o plano de
ão estabelecido no processo de planejamento.
IC1- O planejamento não é implementado adequadamente devido à realização de
outras atividades administrativas internas e externas, como entrega de exames e
encaminhamentos associado à ausência de Agentes, que causa sobrecarga de
atividades administrativas.
DSC- “Eu já tenho o planejamento assim, eu coloco no mês, em que
rua em vou , rua tal, rua tal, mais nem sempre, na maioria das
vezes, não pra seguir esse planejamento, eu vou seguindo
aquele cronograma ali, às vezes foge um pouco, porque tem uma
atividade, às vezes o exame chega tem que ir entregar, também
tem os encaminhamentos que a gente entrega que atrapalha muito
279
a visita , volta, tem outras emergências, entendeu? Eu sei que eu
tenho que fazer, tipo assim, dez visitas, quinze visitas por dia pra dá
conta no mês, só que eu vejo que tem casos, que tem dias que
você não tem condições de fazer o número completo, pois as vezes
tem trabalhos internos, ou alguma outra coisa que você tem que
fazer, mas mesmo assim eu planejo as visitas. A gente faz o
cronograma, mais esse cronograma nunca funciona, porque às
vezes igual a minha equipe faltando dois Agentes, às vezes eu
faço o cronograma do dia, planejo tudo, só que eu tenho que ir pra
outra micrrea, e não na minha; a gente sempre entregando
exames, se tal dia eu tinha que em tal rua, naquele dia eu
tenho que ir pra o outro lado pra entregar exame, aí, eu não tenho
como fazer assim o planejamento”.
A priorização de atividades administrativas internas ou externas, como entrega de
encaminhamentos e exames, atrapalha a implementação do plano, tendo em vista que
essas atividades supracitadas não eso dentro das atribuições previstas na Política
Nacional de Saúde da Família (BRASIL, 2006), o que revela um desvirtuamento do papel
do Agente de Saúde que, associado à sobrecarga ocasionada pela ausência de Agentes
e a lentidão do processo de contratação, atrapalha ainda mais a programação das
atividades previstas de acordo com o processo de diagnóstico e planejamento, uma vez
que tem que cobrir as entregas nas áreas descobertas.
Para enfrentar essa situação e tentar efetivar o planejamento, os Agentes
executam algumas estratégias para amenizar as dificuldades encontradas com a
280
realização da função de entregador de encaminhamentos dicos e exames, como
retratado no DSC:
“Eu costumo fazer isso [entregar exames e encaminhamentos] na
parte da manhã, porque entregar exame que é rápido, mesmo, mais
agora a visita domiciliar mesmo, à tarde eu vou e dou sequência ou
se eu tiver algum exame pra entregar em alguma rua, aí eu
aproveito entrego o exame e continuo fazendo aquela rua”.
O planejamento acaba sendo realizado de maneira parcial, ou seja, quando não
tem entrega de encaminhamento, o plano é implementado integralmente, mas, em casos
contrários, ocorre um aproveitamento de oportunidade.
IC2- O planejamento não é implementado adequadamente devido a demandas da
comunidade e à necessidade de ser ouvida.
ECh Omael “(...) quando você sai da unidade pra fazer as visitas,
você tem até uma noção aonde vo vai ‘ah, eu vou em tão lugar,
assim, assim, tal’; mas você chega na área, o pessoal coma a
chamar, chama aqui chama ali, chama aqui e chama ali, então
acaba sem querer ti desvia ali, daquela programação que vo tinha
feito. Então você acaba não fazendo as visitas que você tinha
programado naquele dia, vo tem que fazer aquela visita outro dia,
você aproveita aquela casa que você já entrou ali, já escutou e faz a
visita sem ser programada”.
281
O Agente de Saúde representa o laço estabelecido da comunidade com a equipe,
facilitando o diálogo entre as partes envolvidas, sendo, muitas vezes, procurado pela
população para a solução dos problemas apresentados, já que a visita domiciliar é
preconizada mensalmente e os problemas não ocorrem nessa frequência. Assim, sempre
que houver a necessidade de orientar, acompanhar e encaminhar, os Agentes irão
conjugar esses verbos e torná-los verbos de ão e não apenas de sensibilização.
3- REALIZAÇÃO DAS VISITAS DOMICILIARES
A visita domiciliar é instrumento utilizado pelos Agentes para realizar a
aproximação e o conhecimento da realidade das famílias. Partindo dessa assertiva, todos
os sujeitos da pesquisa reconhecem a relevância dessa atividade e diferenciam a
estratégia utilizada quando realizam a visita com o intuito de cadastramento/primeira
aproximação da visita com o objetivo de acompanhamento mensal das famílias.
O diferencial da visita de cadastro para a visita de acompanhamento refere-se ao
estabelecimento do primeiro contato, que deve acontecer de forma cordial e o profissional
deve ter alguns cuidados para atingir esse objetivo, percorrendo uma metodologia
adequada, conforme descrito no DSC- Metodologia utilizada na primeira visita domiciliar:
“Eu bato na porta, porque quando assim, quando é primeira visita, a
gente tem que chegar, apresentar pra pessoa, falar que sou Agente
de Saúde, falar o quê quer, como é composta a equipe, essas
coisas, como é composta a equipe, como é que funciona, a gente
282
explica tudo, pergunto se eles aceitam fazer o cadastro do
programa, porque às vezes tem uma família que não quer, que não
precisa, porque tem plano de saúde , igual assim eles não fazem
muita questão da visita não, assim, mais também não fala que não
quer, sabe, eu vou eles mim recebe e tudo, às vezes puxa uma
conversa. Assim eu faço a minha visita de rotina”.
O DSC está em sintonia com a conduta preconizada no documento do Ministério
da Saúde (BRASIL, 2000) que direciona as ões no caso de cadastramento que
consistem na apresentação inicial - Agente e trabalho do saúde da família - e explicação
sobre a importância do processo de trabalho e o motivo da realização da visita, seguido
pela permissão para que sejam realizados o cadastramento e o acompanhamento
familiar.
Após a visita de cadastramento, segue mensalmente a visita de acompanhamento,
que deve acontecer seguindo cinco passos elaborados a partir de Expressões Chaves,
que deram origem a DSC:
1º Passo:
DSC- Chegada ao domicílio.
“A visita é feita dessa forma: eu chego, primeiramente, chego até a
residência, eu chego bato na porta, né, chega alguém ali pra
atender, se for criança peço pra chamar o responsável, quando ele
vem, sou recebido pelo pessoal, eu cumprimento ele, dou bom dia,
mim identifico, né, falo meu nome, coisa e tal, né. depois como
a conversar com a pessoa, peço pra entrar, eu peço pra sentar,
283
pergunto como eles estão, né, a respeito da família, quem tá em
casa, se tiver eu chamo pra gente fazer a visita”.
DSC- Chegada ao domicílio quando o Agente é conhecido pela família.
“Bato na porta, a pessoa sai, aí, a pessoa atende, como todo
mundo mim conhece, não é, vai mandando entrar. Graças a
Deus eu não tenho dificuldade em relação ao entrosamento, sabe?
A pessoa convida pra entrar, eu entro, a gente senta, e vai
conversando já chega: ‘Ah, que bom que você veio eu tava te
esperando pra perguntar alguma coisa, pra saber alguma coisa’
começa por aí”.
2º Passo:
DSC- Certificar se o horário e o momento é apropriado para a visita.
“Eu falo ‘Bom dia’, seja homem, seja mulher; ‘oh, você pode mim
receber, nesse momento?’, eu vim fazer a visita do mês, eu posso
entrar? se a pessoa puder é ótimo; tem outros que fala ‘Ah, eu
não posso te atender’, eu falo assim Não tem importância não,
eu volto outro dia, viu? Que dia você pode mim atender, que hora
você pode mim atender’, ela vai falar, às vezes acontece de eu
chegar voltar no mesmo dia, no mesmo horário, mas as vezes não
dá certo, aí eu volto no outro dia e torno a bater ‘Oh, você pode mim
atender hoje?’ Quando é conhecida [a família], eu chego
pergunto a ela se ela pode me receber aquela hora se não puder
não tem problema, pergunto a hora que ela pode me receber,
284
porque às vezes a pessoa tem costume de receber a gente
naquela hora, mas naquela dia não tá podendo. Assim, por ter
sempre a gente que trabalha nesse serviço eu conheço
exatamente a hora de ir na casa de cada um, mas mesmo assim eu
ainda pergunto se pode me receber, né, quando a pessoa às vezes
com alguma atividade no momento não pode, eu pergunto se
pode me receber e se puder eu entro e faço a visita”.
3º Passo:
DSC- Estabelecimento do diálogo e início da visita domiciliar.
“Eu entro na casa, eu peço pra sentar, tem casa que não tem quase
nada, às vezes não tem nem onde sentar, sempre arruma uma
tijolinho, uma bua, mim coloca pra sentar, então eu sinto assim,
muito amada, muito amada pelas pessoas. Isso pra mim é
importante, porque às vezes ela não fala nada, mais só, só de eu
estar ali, eu poder olhar, conhecer aquela família, saber quem é
aquela família, o que está acontecendo, então pra mim isso é muito
importante, eu mim sinto muito querida, nesse ponto aí; chama pra
entrar, então eu entro, sento, pergunto sobre todo mundo, como
que tá a família, como que o esposo, o filho. a gente começa
abordando os assuntos que você foi fazer lá, se tem mais coisa pra
falar; converso, procuro saber como o foi o dia dele, peço pra contar
o que aconteceu durante o mês, aí ele conta o que aconteceu,
passo saber se tá tendo alguma dificuldade”.
285
4º Passo:
DSC- Identificação e Acompanhamento dos Grupos Específicos.
“Eu sempre pergunto se tem algum hipertenso, algum diabético,
alguma criança menor de 2 anos, alguma gestante, qualquer tipo de
patologia, né? Identifico o, o, é, como que está a saúde ali daquela
família pra eu poder depois classificar. A partir daí, a gente vai fazer
o acompanhamento daquelas pessoas; quando tem criança
pergunto se teve alguma complicação, se teve diarreia, pergunto
como a alimentação; o hipertenso a mesma coisa como é que
a medicação, se ele tomou o comprimido daquele medicamento, se
ele tendo alguma dificuldade pra tomar, né, no caso do
hipertenso e também diabético; com cuidado, né, igual no caso do
hipertenso, olhar a pressão, verificando os remédios, né, olhando a
receita, ver os remédios direitinho, orientando quem tem que pegar
os remédios, ver a receita que, orientando que tem que retornar, faz
orientação alguma coisinha mesmo, mas uma casa que tem um
hipertenso, vou perguntar a ele como é que esa dieta dele, é,
principalmente, chego não fazendo a dieta direito, , mais
no sal, gordura. A gente fala pra melhorando, né, ver pressão,
recomendar ele fazer caminhada,né, orientar.; se é hipertenso, eu
vou levando o técnico na minha visita, ele afere a pressão, né,
depois que ele afere, eu anoto na fichinha”.
5º Passo:
286
DSC- Acompanhamento e aconselhamento familiar e individual.
“Ah, fazendo a visita, eu vou chegar, quando eu chego na casa,
vou olhar como tá a situação da casa; também abordo um tema que
a gente sempre aborda mensal pras reuniões e tamm pras
visitas, né, tem assunto que a gente aborda mais. Tamm, a
pessoa vem falando o problema comigo, né, aí se for caso de
orientação eu oriento ali mesmo, às vezes a parte de orientação,
porque o papel do Agente é orientar; eu oriento a pessoa, se a
pessoa tiver dúvida eu tento esclarecer na medida que eu tenho o
meu conhecimento. Se eu não puder resolver, eu recorro à equipe
pra poder dar uma resposta para a pessoa, né; agora se, tiver
alguma queixa, algum descontrole, algum problema a gente
encaminha pra equipe de saúde, é, é qualquer coisa que eu vejo
que errado vou falando com jeitinho; ah, vou fazendo o
acompanhamento dela, depois de aconselhamento das residências,
né; quando você chega na casa que não tem filho é mais tranquilo,
ou até tem filho que já está grande, não tem problema de sde,
você vai e faz a visita, faz o serviço pra pessoa, oferece o serviço.
Um usuário saudável que não tem nenhuma doença, que não
precisa ser acompanhado eu pergunto realmente o básico, se
precisando de alguma coisa assim, se teve alguma complicação,
se não teve, a gente tira o tempo maior é pra essas famílias que
precisa de mais atenção; pergunto se eles estão precisando de
alguma coisa, se tem alguma dúvida pra esclarecer, né, esclareço e
se não tiver mais nada eu finalizo minha visita”.
287
Os passos mencionados pelos Agentes de Saúde de Montes Claros estão em
sintonia com os preconizados pelo documento do Ministério da Saúde (BRASIL, 2000)
acrescido da subjetividade e da experiência contida no discurso coletivo.
Os Agentes mencionam tamm algumas dificuldades para a consumão das
visitas, como comentado por Anauel:
“Chego, por exemplo, pra fazer o cadastro, a gente se apresenta e
tudo e explica como é que é, até entrar na casa, tem pessoas que
aceitam muito bem, tem pessoas que na porta mesmo ti recebem, e
tem aquelas que só ficam na rua. Infelizmente você tem que fazer a
visita na rua, não querem entrar em casa”.
As dificuldades encontradas para a efetivação das visitas domiciliares são
enfrentadas por meio do uso de tecnologias leves que estão relacionadas às relações
interpessoais estabelecidas através da interação, escuta e do olhar ferramentas
primordiais para o trabalho do Agente que, quando usadas no processo de
comunicação, rompem as barreiras iniciais (BRASIL, 2005c). Assim, os Agentes que
conseguem romper com essa barreira sentem-se vitoriosos, como descrito por Benael:
“É pra mim, às vezes é uma vitória, pois tem gente que não quer
que a gente entre, , e, é assim, eu mim sinto muito confiável,
você entende, quando as pessoas mim chamam, mim chamam,
eles estão mim acolhendo. Então eu sinto assim, muito amada,
muito amada pelas pessoas, isso pra mim é importante, porque as
288
vezes ela não fala nada, mais só,de eu estar ali, eu poder olhar,
conhecer aquela família, saber quem é aquela família, o que está
acontecendo, então pra mim isso é muito importante, eu mim sinto
muito querida, nesse ponto aí”.
Outra situação que gera motivação é quando as metas e os objetivos são
alcançados, levando à sensação de dever cumprido.
“É, bom, eu acho que é importante e assim, principalmente quando
eu consigo fazer uma visita, que eu vejo uma meta sendo obtida, eu
fico feliz, entendeu? eu fico realizada (Sitael)”.
A motivão alcançada por meio do cuidar prestado às famílias permite ao Agente
de Saúde vivenciar o modo de ser-no-mundo e a relação de ser-com-os-outros,
ultrapassando as atividades diárias de mero visitador para ser realmente um elo, com
acompanhamento e o auxílio às famílias.
Com a construção desse elo, os Agentes colocam em prática o princípio da
equidade, tratando de forma distinta os diferentes que apresentam necessidades
diferentes.
“É diferenciado, de uma maneira ou de outra é diferenciado, porque
aquela família requer uma atenção maior, né, do meu trabalho,
porque eu tenho que ter um tempo maior praquela família, o tempo
que eu tenho naquela família que tem uma pessoa saudável,
trabalhando, o toma nenhum medicamento é o tempo que eu tiro
289
pra usar nessa família que tem uma criança, um gestante, um
hipertenso, um diabético, é um idoso (Ariel)”.
O acompanhamento das famílias por meio do assistir e cuidar marca a existência
dos Agentes, que passam a fazer parte das vidas das pessoas visitadas, gerando
satisfação e gratificação pela ajuda ao outro aliadas ao reconhecimento.
4- PERCEPÇÃO DO AGENTE ACERCA DA RECEPTIVIDADE DAS FAMÍLIAS
A maioria dos Agentes comenta que a receptividade das famílias é boa, resultando
em um reconhecimento comunitário, estabelecimento de uma relação de confiança e
credibilidade.Porém, ainda existem os usuários que não compreendem o papel do Agente
ou que não têm atendido as suas expectativas pessoais, levando à resistência no
processo de visita domiciliar e educação em saúde realizada pela equipe.
IC1- Boa receptividade.
DSC- “Na minha área, a maioria, a grande maioria das famílias me
trata muito bem, a maioria mim aceita bem, me recebem muito bem,
não tenho o que reclamar não, todos recebem com muita alegria,
reconhece bastante o meu trabalho, confia na gente, né, que
acredita no trabalho nosso, elas mim reconhecem na rua. Agora tem
alguns que as vezes fala assim agora ocupado, volta mais tarde,
mas é um número bem pequeno, ao passo que tem pessoas que
com a casa cheia d’agua que manda você entrar e sentar e para
tudo pra atender a gente. Então, e, ânimo pra gente, você vai na
290
casa, mas você vai na casa de um que o tá animado; de 10
sempre tem 1 que, que, o animado, mas nem Deus agradou
todo mundo”.
Os Agentes mencionam a boa receptividade das famílias acompanhadas, que é
uma situação primordial para o desenvolvimento do processo de trabalho, uma vez que a
visita é uma entrada consentida na intimidade da família e de seus membros; e o
estabelecimento desse vínculo de confiança/cumplicidade e de um adequado processo de
comunicação são essenciais para a efetivação do papel de interlocutor famílias/equipe.
IC2- As famílias percebem o Agente Comunitário como o representante do serviço
de sde e responsabiliza-o pela ineficiência e não resolução do sistema de saúde,
resultando na resistência ao processo de visita domiciliar.
DSC- “É muito difícil trabalhar com a comunidade, sabe, eles acham
que você é culpado pelo sistema, tipo, você ouve muitas coisas
também, eles descarregam na gente os problemas. Se não
certo, é, é, o exame pra ele, ele acha que o Agente de Saúde que
foi culpado do seu exame não ter dado certo, aí o Agente de Saúde
é o culpado. Então ele se torna o elo, se uma coisa não der certo
ele te cobra, né, porém não é o meu papel mas só que porém como
o Agente leva tudo, né: ‘então, J. se vo tivesse dado uma força
dentro eu teria conseguido se você deixasse o meu passar na frente
ele teria saído primeiro’, mas as coisaso funciona assim, né. Eles
acham que você tem que favorecer, aí, são essas pessoas que
291
pensam assim, né, que não reconhecem o Agente; que já não
acredita no nosso trabalho, não recebe o Agente muito bem,
entendeu, tamm existem várias pessoas que nascem com
aquela situação de ter cara fechada, são pessoas que estão de mal
até com elas mesmos, não sabe viver bem nem com elas mesmos,
devido ela não bem nem com elas. Então com as outras piora e
que querem caçar um probleminha, entendeu, que quer criar atrito,
tem às vezes a pessoa que você ajuda o tempo inteiro, no dia que
você o consegue nada pra ela, ela acaba que esquece aquilo. E
existe a parte muito burocrática, dá, muito papel pra gente
preenchendo e às vezes atrapalha, né”.
As famílias percebem o Agente como o marcador de consulta e o entregador de
exames e consultas especializadas, em que a sua aceitabilidade e a sua credibilidade
estão vinculadas ao funcionamento do sistema de saúde e, na maioria das vezes, são
considerados culpados quando ocorrem barreiras no acesso ao sistema de saúde, já que
realizam a ligação comunidade/equipe, representando a unidade de saúde, que é, na
maioria das vezes, o único recurso social e de saúde disponível seja pela proximidade ou
pelo vínculo, isso aliado aos atributos da APS, em especial o do primeiro contato
(BRASIL, 2000; BASTOS; TRAD, 1998; PEDROSA; PEREIRA, 2007; STARFIELD, 2002).
Essa resisncia limita a ação do Agente de Saúde, especialmente no seu papel de
mobilizador comunitário, em que deve ajudar na inserção das famílias como Agente ativo
nos serviços de saúde (BRASIL, 2000; BASTOS; TRAD, 1998).
A superação desse equívoco e incompreensão acerca do verdadeiro papel do
Agente encontra-se fundamentado na educação transformadora, já previsto por Benael:
292
“O processo de inversão do modelo é demorado e a saída encontra-
se na educação que se inicia na escola. Eu falei pros meninos
que nós temos que começar a trabalhar nas escolas o ano que vem,
agora, é, nós tamos achando interessante a gente comar a
apresentar o Programa Saúde da Família, a Estratégia Saúde da
Família, na escola, né, por que os pais, é, é a lei da natureza, vão
morrer e tudo, né, então tem que ir preparando a cabeça desses
jovens, né, o que é a Estratégia Saúde da Família, porque ela
existe, entendeu?”.
A educação proporciona uma busca constante da capacidade de aprender, (re)
construir e mudar em direção ao estar no mundo, estar com o mundo e com os outros e
por meio da educação em saúde é que tal transformão é possível cujo dialogo é
instrumento de reflexão-ação, transformando pacientes em sujeitos da saúde/atores
(FREIRE, 1983; FREIRE, 1987; FREIRE, 1996).
5- ACOMPANHAMENTO DOS GRUPOS ESPECÍFICOS
O documento do Ministério da Saúde (BRASIL, 2000) define acompanhamento
como o assistir e o cuidar das pessoas que eso em situação de risco de adoecer e
morrer, necessitando continuamente da identificação dos problemas de saúde das
famílias e reconhecimento dos fatores de risco e dos sinais de alerta.
Os Agentes realizam o acompanhamento das famílias e também enfatizam suas
ões nos grupos específicos - hipertensos, diabéticos, gestantes, crianças, doentes de
293
hanseníase e de tuberculose - que são preconizados pelos documentos publicados pelo
Ministério da Saúde.
Todos os entrevistados mencionaram os grupos específicos preconizados e
tamm fizeram alusão a algumas condições passíveis de acompanhamento, que são
realizados tanto de forma individual ou familiar, no âmbito domiciliar, quanto de forma
coletiva, por meio das reuniões - educação em saúde em que serão apresentados os
DSCs da forma dos grupos que precisam de acompanhamento.
IC1- Acompanhamento dos hipertensos.
DSC- “Realizo visitas, orientações, reunião com os hipertensos, a
gente olha a pressão, vê o cartão, verifica os remédios pra poder
ver se eles estão tomando direitinho, pra ver se tá tomando o
remédio certo, pra mi ir explicando, relatando como toma o
medicamento. Eu conto medicamentos dos hipertensos, né, olhando
a receita, orientando que tem pegar os remédios, ver a receita,
orientando que tem que retornar, pra evitar que eles, é, é, não
fiquem sem remédio”.
IC2- Acompanhamento dos diabéticos.
“Diabético, é, é, os diabéticos a gente vai acompanhando, tamm
aferindo a pressão deles, orientando tamm em relação à dieta,
caminhada e o que pode tá fazendo. Realizo visitas, orientações, eu
conto medicamentos pra poder ver se eles estão tomando
direitinho”.
294
IC3- Acompanhamento das gestantes.
“As gestantes eu olho se fez a consulta do mês, geralmente é aqui,
né, mas quando é o fato de ser de fora eu olho, olho o cartão, se
tomou vacina, o peso, a questão do peso até assim a questão da
amamentação, a gente conversa vários assuntos, entendeu?
Também gosto de aferindo a pressão pra ver se bem, gosto
tamm de tá perguntando também como tá se sentindo, se tá
sentindo alguma coisa diferente”.
IC4- Acompanhamento das crianças.
“No caso de criança, todo mês eu olhando os cartões das
crianças de zero a dois anos com mais questão dessa faixa etária,
mas os outros eu tenho que olhar também por causa das vacinas,
peso, das vitaminas toma a 5 anos sulfato ferroso, orientações
assim gerais vai depender de cada família”.
IC5- Acompanhamento de condições que devem ser acompanhadas.
“Tem saúde mental, os de distúrbio mental tamm, né, são
pessoas que precisam de carinho, não o trabalho, né, a gente
conversa com eles e são mais cil de mexer; têm os adolescentes
e idosos”.
295
IC6- Acompanhamento por meio dos grupos operativos.
ECH Daniel- Tem o grupo saúde e vida, que é feito aqui na
unidade, todos os grupos é feito aqui na unidade, então, a gente vai
e convida, tamm pra tá vindo aqui nas reuniões”.
Apenas dois acompanhamentos - Acompanhamento dos hansenianos e
Acompanhamento dos tuberculosos - foram somente mencionados, sem descrições
detalhadas. Tal fato se deve ao menor número de usuários portadores dessas patologias
se comparados com as que são mais prevalentes.
Os anjos de Montes Claros destacam de maneira caterica a importância do
acompanhamento desses grupos:
DSC- “Porque é, até então, tempos passados não tinha aquele
acompanhamento, a pessoa vinha sem saber o que era; uma coisa
que pode prevenir, que pode prolongar, que pode cuidar, não é,
então por falta de orientação você chegava ao AVC, né, e, além do
mais, você ia dar trabalho pra quem: pra família, né, a pessoa ficava
ali acamada, tomando o tempo do familiar e além do mais nos
hospitais, o é, nos hospitais fica toda aquela luta ali. A gente tem
o, o manual, né, tem que fazer o acompanhamento deles, tem que
dá atenção especial às pessoas, tem as diversas perguntas, né, pra
aquelas pessoas, aquela população”.
296
Esse DSC retrata a verdadeira essência da ESF, que é a inversão do modelo
assistencial, com a compreensão ampliada do processo saúde-doença e da necessidade
de intervenção com foco na prevenção através da vigilância à saúde com ênfase no
acompanhamento dos grupos de risco e das situações de risco (ALVES, 2005; BRASIL,
2006e).
6- REUNIÕES - EDUCAÇÃO EM SAÚDE
A educação em saúde por meio das reuniões constitui-se uma atribuição de todos
os membros da equipe, em especial o Agente Comunitário de Saúde. Nesse estudo, foi
constado que alguns Agentes não realizam essa atividade ou simplesmente acompanham
os profissionais de nível superior, como descrito no DSC:
“Eu ainda não fiz nenhuma reunião sozinho, a gente não faz
sozinho, a gente acompanha o médico ou o enfermeiro”.
Outra situação observada é que os Agentes que realizam as reuniões restringem-
se a apenas alguns grupos, não tendo liberdade para trabalhar com os específicos da
realidade de sua microárea, restringindo o processo de orientação.
“Eu conduzo as reuniões de gestantes toda segunda, a Agente faz
reunião na pesagem, só na pesagem e as outras, eu participo junto
com o enfermeiro”.
Entretanto, existem algumas exceções, como a experiência diferente observada
com a equipe de Aniel:
297
“A gente faz também, a gente tem uma parte que a gente faz as
reuniões com a comunidade e orientações sobre vários assuntos, a
gente vê os assuntos que é pertinente no momento igual agora
trabalhando mais a prevenção da dengue, então a gente procura
desenvolvendo de acordo com a época. As vezes tem na microárea,
mas a gente tem muita dificuldade em reunindo as famílias na
microárea, aí a gente aproveita o espaçozinho do acolhimento, pra
agendar consulta e faz a reunião. Todo dia um Agente faz esta
reunião”.
A orientação constitui a pedra angular do cuidar prestado às famílias, podendo ser
realizada no domicílio ou na unidade de saúde, de forma coletiva por meio da reunião
educativa que permite o compartilhamento do conhecimento, devendo ser realizada como
regra em todas as equipes e não como exceção, já que é uma das atribuições dos
Agentes de Saúde (BRASIL, 2000; BRASIL, 2003; CARVALHO, 2003).
7- REGISTRO DAS ATIVIDADES
O registro das informões é o primeiro passo para a alimentação dos Sistemas de
Informão em Saúde que subsidia as políticas blicas. Diante desse fato, o Agente
Comunitário é um ator importante do processo, que colhe os dados diretamente da
fonte - domicílio e comunidade -, sendo assim a compreensão dos sujeitos desse estudo
acerca do registro é fundamental.
298
Todos os Agentes são unânimes quando se trata da importância da anotação e
apenas divergem com relação ao tipo de anotação registrada e ao momento da anotação
durante a visita, no final ainda dentro do domicilio e outros depois da visita fora do
domicilio; que será apresentada a seguir.
7.1- IMPORTÂNCIA DA INFORMAÇÃO
A importância da informão foi relatada por todos os Agentes e encontra-se
relacionada à necessidade de acompanhamento das famílias; planejamento e avaliação
das ações e da situação de saúde da comunidade associado à alimentação dos sistemas
de informação, em especial a SIAB e garantia do serviço realizado durante a visita
domiciliar, o que está contemplado nas diretrizes da ESF contida nos documentos do
Ministério da Saúde (BRASIL, 2003; BRASIL, 2002; BRASIL, 2000).
IC1- Acompanhamento das famílias e indivíduos, visando à promoção da saúde e
prevenção de doenças.
DSC- “Porque através das minhas anotações é que eu vou saber,
né, em que estágio a pessoa está, se ela está se cuidando, se ela
não está, quais orientações que eu devo passar pra ela, tudo
através daquele livro, às vezes quando eu anoto uma criança que
eu vou visitar e a mãe não levando pra vacinar, não trazendo
no CD, eu anoto tudo no cartãozinho dela, eu deixo um espaço
pequenininho, ‘mãe não trouxe pra o CD’, mãe não leva pra
vacinar’, aí eu trago e converso com a enfermeira, no dia da minha
visita eu levo a enfermeira. Nesse caso que eu acho
299
superimportante, porque aí, por exemplo, no outro mês que eu volto
na casa, que eu medi a pressão da pessoa, aí pergunto ‘Oh, no mês
passado nós medimos, você lembra quanto é que tava?’, ‘Não
lembro’, eu vou e olho no meu caderno que tenho anotado do
mês anterior, tem hipertenso que tem no cartão, do hipertenso, aí, é
mais fácil, mas tem gente na casa que não é hipertenso, mas a
gente costuma tá medindo, aí eu vou e anoto”.
Percebe-se, por meio do DSC, que os Agentes compreendem a importância da
anotação e a realizam de forma adequada, registrando nas fichas de cadastramento e de
acompanhamento domiciliar, que originarão as fichas de consolidação dos dados e
relatórios essenciais para monitorar e avaliar a situação de saúde das famílias
cadastradas.
IC2- Planejamento e avaliação das ações desenvolvidas pela equipe.
DSC- “A importância de você anotar essas informações, porque, por
exemplo, é no final do mês a gente tem que tá prestando contas,
né, do nosso serviço da nossa visitas, dessas informões, quando
é no final do mês essas são cobradas da gente, pra tá, pra tá, como
vou, quer dizer (pausa) eu passo pra F. ou pra doutor M. [equipe]
porque eles sempre cobram, aí pra gente tá desenvolvendo um
trabalho melhor, né, a partir do momento que a gente passa a
anotar; então talvez quando vo não anota, vo passa
despercebido aquilo ali. Agora quando você anotando sempre no
final quando a gente vai passar os dados ali, então você passou o
300
máximo de, de coisas que você consegue pegar na área, você
passa no SIAB, fica assim uma coisa mais concreta”.
Outro aspecto mencionado é a utilizão da informão no processo de
planejamento e programão das atividades, que esses dados retroalimentam o
planejamento durante a sua implementação e possibilitam a avaliação do processo de
trabalho da equipe, aliado ao acompanhamento da situação de saúde das famílias
(BRASIL, 2000; BRASIL, 1997).
IC3- Alimentação dos sistemas de informação em saúde.
DSC- “Igual eu sempre comento aqui na reunião, desde que a gente
o tempo todo anotar e passar pra equipe aqui, e ela passar pra
frente, , ser comunicada do órgão competente pra frente, porque
se não eu chego aqui e falo: ‘Oh, M. teve tantas crianças com
diarreia, teve tantas complicações respiratórias’, se M. não
encaminha pro órgão competente lá, o meu trabalho vai ficar em
vão porque, porque alguém dependendo dessas informações
minhas pra agir, . Então, eu acho assim que é isso que é
trabalhar em equipe, se eu faço o serviço atrás, entrego a ela
aqui no SIAB, se esse SIAB não é repassado pra frente, eu acho
que o trabalho, que o trabalho ficou no meio da estrada”.
Uma das atribuições do Agente, destacado pelos documentos do Ministério da
Saúde é a Vigilância à Saúde, com a execução de ações de promoção da saúde e
prevenção de doenças direcionadas a pessoa, grupos e doenças prevalentes e
301
monitoramento de morbidades e situações de risco que subsidiam o fazer da equipe
(BRASIL, 2004; BRASIL, 2004a).
IC4- Garantia do serviço realizado durante a visita.
DSC- “Por que eu registro? Porque se você tem que perguntar
alguma coisa, se tiver alguma queixa pra poder anotando;
quando eles falarem alguma coisa de mim, falar que eu não fui na
casa, por que isso acontece, falar de mim”.
O registro também proporciona o respaldo em caso de questionamento acerca da
efetivação das visitas domiciliares, sendo, portanto, um instrumento de garantia para os
Agentes de Saúde.
7.2- ANOTAÇÕES
Os Agentes utilizam todas as fichas preconizadas pelo SIAB, que visam ao
acompanhamento das famílias com seu cadastramento e tamm dos grupos específicos
- hipertensos, diabéticos, gestantes e crianças. Com relão aos hansenianos e
tuberculosos, foram mencionados em menor frequência devido aos poucos casos e
por ser também uma condição temporária.
Além da mera anotação, as fichas norteiam o acompanhamento desses grupos
especiais e as principais ações que os Agentes devem realizar, em especial os que
possuem o curso de técnico de enfermagem, que podem medir a pressão e realizar a
glicemia, aumentando, assim, a resolutividade.
302
Associado às fichas, os Agentes tamm anotam, em seu Caderno, outras
demandas da população, como dúvidas, pedidos de consultas e exames.
IC1- Anotações nas fichas do sistema de informação da ateão sica.
DSC- “Eu levo sempre o cadastro, sempre pra atualizando,
sempre que acontecer alguma coisa, tem casa que na verdade você
não faz quase nada, porque nunca acontece nada, tem casa que eu
anoto tudo. Oh, eu trabalho com a ficha do hipertenso, trabalho com
a ficha do diabético, com a ficha da gestante, tem o cartão da
criança, a gente acompanha o cartão de criança, anota o peso eu
passo de casa em casa e passo o peso da criança pro cartão,
questiona a respeito da, da se teve alguma diarreia, se alguém teve
diarreia na casa é, é, complicações respiratórias; isso tudo a gente
anota pra passar pro SIAB, e têm as outras fichas, do tuberculoso,
da hanseníase, todas as fichas, eu vou levar tudo. O que eu acho
que é falha é a parte de saúde mental que não têm, que não tem
como a gente anotar, que é conversa mesmo”.
Os sujeitos entrevistados utilizam todas as fichas preconizadas - Ficha A, Ficha B,
Ficha C e a Ficha D - pelo SIAB com destaque para o acompanhamento e a orientação
das famílias (BRASIL, 2000; BRASIL, 2002; BRASIL, 2003).
IC2- Anotações diversas registradas no caderno.
303
DSC- Tem o nosso caderno de visita, a gente sempre coloca, a
gente procura anotar né, as orientações que a gente dá, se eles têm
vida eu anoto tudo, se eles tem algum exame pra marcar, eu
anoto o exame, qual que é, nem se tem algum exame aqui pra ser
entregue, eu vou olhar, anoto os encaminhamentos que eu entrego,
pressão arterial, quando eu faço glicemia. Às vezes é, tem é, é, tem
um acamado aí, ele quer um medicamento, aí eu anoto o nome do
medicamento, ou então eu recolho a receita dele, quem é acamado
não tem como vim, aí, eu venho e falo com a médica, , a médica
vai, as vezes ela vai e faz a visita nessa acamado, dependendo do
que é que foi, a gente anota. Por exemplo, a gente anota e o
restante que a pessoa fala, alguma queixa da pessoa. A gente às
vezes geralmente não registra muita coisa, geralmente a pessoa
queixa ‘ah, eu precisando de uma consulta’, eu pergunto ‘Por
que você precisando de uma consulta?’, ele fala: ‘Eu sentindo
uma dor no estômago; ah, eu sentindo uma dor na coluna,
demais’. Eu anoto tudo que eles mim falam, assim eu procuro
anotando, às vezes as meninas riem de mim porque eu usei as
mesmas palavras da pessoa no meu cadastro, sabe, mais eu gosto
de fazer isso pra mim lembrar como é aquela família, entendeu?”.
Aliado às fichas preconizadas pelo Ministério da Saúde, os Agentes de Montes
Claros também utilizam um Caderno, destinado ao registro das demandas e vidas das
famílias que subsidiam as ações da equipe, estreitando os vínculos família/equipe.
304
7.3- MOMENTO DA ANOTÃO
Os Agentes divergem no aspecto relacionado ao momento oportuno para a
realização das anotações, que pode ocorrer durante a conversa com a família ou no final
da visita ou até mesmo depois da visita; são expressas abaixo das respectivas DSC e
ECh.
DURANTE A VISITA
DSC- “Na medida que eu vou conversando, eu vou anotando, eu vou perguntando e vou
anotando e tal, vai olhando”.
FINAL DA VISITA
ECh Rafael-Sempre no final”.
DEPOIS DA VISITA
DSC- “As minhas anotações eu faço depois que eu saio da casa, eu começo a anotar”.
Na literatura, não existe referência com relação ao momento oportuno para realizar
as anotações, somente é destacada a questão da ética e da confidencialidade.
8- ATIVIDADES COMUNITÁRIAS
O atributo da orientação comunitária tem o Agente Comunitário como estimulador e
as atividades comunitárias como o meio para a implementação desse atributo,
305
possibilitando o envolvimento da comunidade e o aumento do vínculo (BRASIL, 2007b;
MINAS GERAIS, 2007).
As atividades comunitárias mencionadas pelos Agentes ocorrem, na sua maioria,
em parceria com a Pastoral da Criança, visando ao acompanhamento, especialmente,
das crianças e gestantes.
“Assim, tem a pastoral, né, que a gente tem uma parceria junto né,
que faz a pesagem, a da pastoral, né, junto com pastoral da criança,
a gente faz a pesagem junto com a pastoral”.
Historicamente, a Pastoral da Criança foi uma das inspirações para a criação do
PACS e posteriormente da ESF, dessa forma o laço com o seu precursor ainda
permanece, mesmo que de forma inconsciente.
Existem tamm outras parcerias comunitárias, como a Associação de Moradores
de bairro e as Igrejas, para realização de atividades recreativas.
“Assim, sempre que surge a gente faz, né, igual a gente fez junto
com a associação: festa pras mães, as vezes a gente faz com a igreja
junto com o pessoal”.
As equipes tamm realizam atividades preventivas com a comunidade por meio
de algumas ações, comentadas apenas por Manael:
“Movimentos com a dengue, tem a DST, o ano passado a gente fez
aqui na Escola Jair de Oliveira, a gente um sábado, assim até 3
306
horas, dinâmicas, deu vídeo, deu palestras sobre DST e AIDS, a
gente convidou os adolescentes, o pessoal da área pra poder ir lá.
Agora começou uma terapia de fazendo artesanato, mas é só
uma vez por semana”.
Ocorrem também atividades recreativas em datas comemorativas para aproximar a
equipe da comunidade, como mencionado por Aniel:
“A gente sempre procura todo ano, principalmente nas datas
comemorativas, a gente procura reunindo o útil ao agradável, né,
comemorar e tá levando alguma informação ou orientação”.
O anjo Gabriel comenta que a equipe sempre promove atividades comunitárias,
entretanto a população tem que ser convidada, caso contrário não há adesão.
“Com a comunidade? A gente aborda as pessoas, tentando marcar,
né, mesmo, , estando na reunião, qualquer coisa que vem da
secretaria desenvolve, chama o grupinho ali, já passa as
informões, porque as pessoas, você coloca o cartaz, elas não
lêem, então é preciso o Agente tá sempre parando, chamando”.
Percebe-se que o atributo da orientação comunitária está sendo realizado em
Montes Claros (MG), levando em consideração as particularidades de cada comunidade.
9- ATIVIDADES DE AVALIAÇÃO DAS AÇÕES DE SAUDE
307
O processo avaliativo é realizado por todos os Agentes, que o compreendem como
a busca de informação na visita domiciliar que leva a ação que norteia o processo,
objetivando sempre à melhoria da qualidade de vida e à satisfação popular, subsidiando o
diagnóstico de saúde e o diagnóstico comunitário.
A partir dos discursos, os Agentes elaboraram Ideias Centrais com relação ao
processo avaliativo que está relacionado a:
IC1- Avaliação do processo de trabalho.
DSC- “Oh, eu avalio meu servo, eno a gente procura avaliar
pensando o que a gente fez no mês, né, eu procuro assim, quantos
casos que eu consegui resolver, né, quantas diarreias que eu
consegui notificar, se eu não conseguir notificar nenhuma, Graças a
Deus, é melhor, se eu notifiquei muitas, então alguma coisa tá
acontecendo de errado, as minhas orientações que eu tô dando não
tão servindo. Então, eu procuro, é, saber de tudo, saber o que foi
que eu fiz, quantos hipertensos que eu tenho, né, quantos estão
tomando o remédio, se faleceu algum, porque foi, foi eu que esqueci
de orientar, foi eu que deixei de estar presente lá, eu tento fazer
dessa forma, eu sei que eu sou uma boa Agente de Saúde,
entendeu, porque assim igual que eu te falando, se eu vê que eu
preciso fazer aquilo pra resolver um problema da minha microárea
se eu precisar de ir a noite mesmo, eu vou”.
IC2- Avaliação da situação de saúde.
308
DSC- “A gente avalia assim no dia a dia, por exemplo, a avaliação
do número de crianças em aleitamento materno exclusivo, se
bom, se as crianças estão pesadas você vai e faz a visita, né, então
a pessoa faz uma queixa, você vai e pede pra vim na unidade, você
encaminha ela, ela vem na unidade, ela consulta, então, devido o
problema dela é acompanhada tem saúde da mulher, tem saúde do
idoso, tem várias coisas. Aí depois de uma semana, quinze dias, um
mês você vai vê, né, vo faz a visita , o trabalho que você fez você
o retorno do seu trabalho na frente, é o que a satisfação da
comunidade, falar pra você que bom, que melhorou, agradecer,
agradecer os médicos, agradecer a equipe também, por você
avalia”.
IC3- Avaliação para o acompanhamento das famílias e dos grupos específicos.
ECH Sitael- “As minhas crianças eu consigo trazer todos pra pesar,
entendeu, pra vacinar também, algumas, teve um caso no Siab atrás
que o vacinou porque o pediatra pediu pra o tá vacinando,
porque se eu fui e convidei pra ela vim no Cd e ela não veio , eu
volto de novo, eu volto três vezes se precisar , quantos vezes
precisar, porque o que foi que aconteceu que não foi. Então eu acabo
acho que vencendo elas pelo cansaço e elas vêm, os hipertensos que
não o acompanhado e os diabéticos geralmente é porque estão
viajando e então não tem jeito”.
IC4- Avaliação relacionada À prestação de contas no SIAB
309
DSC- Oh, isso aí, a gente faz uma avaliação conjunta quando a
gente fechando o SIAB, né, o que atingiu, o que ficou em baixa, a
gente faz conjunta, mas é claro que cada Agente que conhece bem a
área ele sabe, qual o percentual de sua área. Essa avaliação no
SIAB, M. tem uma anotação que é o que cobra da gente no SIAB,
então nessa avaliação que ela faz do que precisa ser planejado pro
mês seguinte, é a avaliação que a gente faz, porque se eu deixei dez
famílias sem visitar esse mês significa que eu vou ter que correr um
pouco mais, pra mim conta, eu tenho uma estratégia
diferente; eu conto aquelas famílias que ficaram sem a visita do
mês eu inicio por elas, mas geralmente isso na minha área quase
não acontece”.
IC5- Avaliação relacionada ao desempenho pessoal.
ECH Aniel- “Olha assim, a questão da, da avaliação, fazer uma
avaliação mesmo, assim, eu, eu não faço o, não é porque eu não
sei fazer, mas no momento, de acordo com a receptividade das
pessoas, ou, se ela senti ti fala alguma coisa, ou, ou critica com
relação ao serviço, com relação ao seu trabalho, então as vezes é
uma hora que você para pra pensar: ‘Opa será que, se eu fazendo
um bom serviço?’ “.
Todas IC ilustram caminhos diferentes que levam a um propósito único, que é a
melhoria do cuidar prestado.
310
Os Agentes comentam alguns aspectos que dificultam o processo de trabalho que
interfere na avaliação:
Ech Benael- “Igual A.[enfermeira] fala aqui com Agente, a gente
trabalhando mentira, porque você anda, anda, vo corre, corre,
você faz, faz e chega o final do mês ainda, parece que vonão fez
nada, porque não fluiu, eu falo: ‘Olha, A., olha pra vo ver, quantos
encaminhamentos nós entregamos esse mês, né, quantas
pessoas’.
A ECH ilustra que existe uma valorização maior da quantidade em detrimento da
qualidade e do tempo emocional, que o fundamentais para a criação do vínculo e
intermediação do diálogo com as famílias assistidas.
10- ETICA NO DESENVOLVIMENTO DE SUAS ATIVIDADES
Todos os Agentes afirmam que a ética é de significativa importância na realização
de sua função, haja vista que o seu processo de trabalho fundamenta-se em uma relação
de confiança, que ocorre entre indivíduos que representam o saber científico (equipe) e o
saber popular (famílias).
A ética deve orientar a conduta dos homens em diversas situações, em especial no
exercício da profissão, já que os Agentes realizam suas atividades no ETHOS, ou seja, na
casa do homem, em que o domicílio é um espaço íntimo, necessitando de sua
autorização para entrar em suas vidas por meio da visita domiciliar. Assim, faz-se preciso
a adoção de comportamentos que garantam os princípios éticos que subsidiam o
311
estabelecimento e o estreitamento de vínculo (GERMANO, 1993; BOFF, 2004). O anjo
Caliel destaca essa questão por meio da ECH:
“Vou falar pra ele, que ele pode tá confiando em mim, né, porque eu
sou profissional, e, e, e o que aconteceu, o que ele tá mim relatando
não vai sair, né, do nosso meio”.
Essa função de elo entre os saberes exige do Agente a confidencialidade, o sigilo
e, acima de tudo, a postura ética, como visualizado na expressão chave (ECh) de Aniel
que representa a importância da ética:
“É uma das coisas que a pessoa tem que ter, né, a questão da
postura, uma postura ética, porque a gente ouve, muita coisa, que
né, que você viu e ouviu lá naquela casa ficou lá, ou se for, né, se
você tiver que passar, dividir com alguém é com o profissional, né,
seu colega que vai ti ajudar, no caso é a enfermeira, mais assim pra
outros jamais, . A gente tem que ter essa postura e tem que saber
como lidar com a situação, com o problema, com as demais questões
de sde, a gente ouve coisa muito íntima da pessoa, coisa assim,
até segredos que você tem que levar pra você pro túmulo”.
No processo de saber-fazer do Agente, a credibilidade e a confiança são condições
essenciais no estabelecimento das relações interpessoais; e a postura ética é o caminho
encontrado para inspirar essa credibilidade e confiança que permitem o Agente entrar na
intimidade da família e realizar o seu papel de laço.
312
Fortes e Spinetti (2004) destacam a necessidade de construir metodologias que
garantam a privacidade no tocante às informações pessoais, aliado a competências e
saberes que os instrumentalizem na implementação dessas ações, que os Agentes
vivem o cotidiano da comunidade, por habitar a mesma localidade, fazendo essencial
discernir o pessoal do profissional, sua inserção comunitária de sua inserção institucional
e saber lidar com os segredos que são revelados.
Uma das metodologias encontradas pelos Agentes de Saúde para executar essa
postura ética com a garantia da privacidade é a seleção das informões, que devem ser
compartilhadas com os membros da equipe e destino adequado para as devidas
soluções, como destacado a seguir:
IC1- Demandas por dúvidas relacionadas à saúde e à doença são encaminhadas e
discutidas com os membros da equipe, especialmente para quem tem as respostas
e as soluções.
DSC- “Ah, é, é, é só a pessoa é, é igual, é, se tem alguma coisa que
você pode trazer pra unidade, que vo deve, que você tem que
trazer, você deve trazer, em relação à doea, quando você fica
sabendo de alguma coisa, assim depende da pessoa que você vai
poder passar. No caso, se for o médico, a enfermeira vo vai
passar pra eles, pra ver alguma resposta de algum é, é de alguma
coisa que o paciente te perguntou, que você às vezes não soube
responder, que você tem que perguntar, depois informar pra ele de
novo, né, em relação a pessoa que com uma dificuldade, que a
gente pode até ajudando em alguma dúvida, entendeu? você
vai falar aquilo que você pode falar, a coisa que você pode falar;
313
agora você trazer coisas pessoais, que as pessoas às vezes até
trata, morre com a gente, não é?”.
IC2- Demandas pessoais não são compartilhadas com a equipe e nem com outras
famílias.
DSC- “A gente ouve coisa muito íntima da pessoa, o quê a pessoa
me falar fica comigo só, tem coisas assim que nem com a
enfermeira eu conto, nem com o médico; coisa assim até segredos
que você tem que levar pra você, pro túmulo, morre com a gente,
não é. Quando eu chego em outra casa, eu chego o comento
nada, que eu vi numa casa, acontece muito das pessoas chegar pra
gente contar casos da família: ‘Aconteceu isso, conta caso da
vizinho’, passo na outra casa, faço de conta que não sei de nada”.
Durante o exercício de suas atividades profissionais, os Agentes compartilham
algumas informações e devem discernir quais os dados que podem ser informados, com a
garantia da privacidade/intimidade contida na vida privada juntamente com a
confidencialidade (FORTES e MARTINS, 2000).
Fortes e Spinetti (2004) destacam que os segredos revelados na intimidade das
residências podem resultar em risco para a vida dos Agentes e de suas famílias, tendo
em vista que esses trabalhadores continuam no local em que trabalham e vivem,
enquanto os demais profissionais, em especial os de nível superior, retornam a suas
residências que estão distantes do seu lócus de trabalho.
314
Assim, além da postura ética estabelecida durante a entrevista realizada no contato
com os moradores, outra forma de garantir a confidencialidade é por meio do registro,
com o destino adequado dos dados, como destacado pela ECH expresso por Miguel:
“Ah, dentro das fichas, né, notifica, no caso, a gente notifica e a
ficha fica guardada direitinho e tal”.
A confidencialidade diz respeito à garantia da manutenção do segredo de todas as
informações colhidas no exercício da profissão (FONTES e MARTINS, 2000).
11- SITUAÇÕES DE RISCO
Situação de risco pode ser compreendida como a probabilidade de uma pessoa ou
grupo sofrer um dano em sua sde por meio de condições que proporcionam uma
chance maior de adoecer e morrer aliado ou o ao fato de residir em áreas de risco
ambiental e/ou social (BRASIL, 2000; MENDES, 1992).
As situações de risco o identificadas por meio das visitas domiciliares, com a
percepção da realidade local e realização de busca ativa.
DSC- “É, é quando eu chego na casa pra visitar, eu vejo o local
onde a pessoa mora, a forma de vida daquela pessoa, como a
pessoa vive (...). Dependendo da doença, né, se for confirmada
alguma coisa, a gente faz a busca ativa na família, no vizinho, né,
pra ver se não tem mais casos”.
315
A identificação e o acompanhamento das situações de risco, com o enfoque de
vigilância à saúde, são atribuições do Agente e que devem ser percebidas no exercício de
suas funções.
Os Agentes consideram situações de risco de forma diversas que não são
divergentes e sim convergentes, pois se complementam, conforme apresentado a seguir:
IC1- Risco socioeconômico.
DSC- “Na minha área, o que eu chamaria de situação de risco é a
precariedade das pessoas, tem pessoas que não têm uma condição
financeira, né, e, as crianças não têm alimentação”.
IC2- Risco ambiental.
DSC- Porque a minha área praticamente o tem asfalto, as
crianças estão constantemente na unidade com problemas
respiratórios, alergias, por causa da terra, da poeira. O local que a
pessoa vive, mora próxima a uma barroca, um esgoto a céu aberto,
matagal, cobra, escorpo e o pessoal fez a casa assim na beira do
esgoto, no meio do mato”.
IC3- Situação de risco relacionado à saúde.
DSC- “Tem tantos, é, aquela, por exemplo, as mães de não têm
aquele cuidado com as crianças, e tem muita criança, e tamm
não tem cuidado com a higiene, a queso da higiene; aquela
criança de 10, 11 anos que eu vejo o dia todo na rua, eu tô visitando
eu sempre vendo ela, pra mim é um risco, porque se ela o dia
316
todo na rua, ela não tá na escola, porque se ela tá o dia todo na rua
a mãe com certeza não tá sabendo que ela na rua. Ela tá
trabalhado ou então a em casa, ou sabe se em casa assistindo
televisão e não a importando, isso acontece muito, não é, então isso
pra mim é um fator de risco. Aquele jovem que eu vejo envolvido,
que era uma pessoa de família e que eu começo ver e já
andando com outras pessoas, mal elemento essas coisas, tamm,
é risco, aquela moçinha que tá na adolescência, e que não tá
andando mais sozinha, que andando com outras pessoas que
tem filho, que mexe com droga, como também é de risco. Então
desde a criançinha que não vai pra escola, a pessoa que eu vejo
que já tá mudando o hábito dela, a rotina”.
IC4- Acompanhamento de Grupos Específicos de Saúde.
DSC- “Família de risco é, é o idoso, hipertenso, mães adolescentes,
criança de baixo peso, gestante, diabético é aquela família que tem
necessidade especial, que eu tenho que fazer um
acompanhamento, ter um cuidado especial, que eu tenho que fazer
um acompanhamento assim, tem famílias que eu vou a quatro
vezes no mês até mais, né. Igual, por exemplo, tem alguns
hipertensos que depende muito da gente, eles gostam muito de
conversar, às vezes nem o assunto dá, do que euquerendo falar,
às vezes eles precisam que eu esteja lá pra escutar o que eles
falam pra mim. Esse pessoal idoso tem muita depressiva, porque as
famílias deles não conversa com eles, os filhos às vezes spra
317
trabalhar chega só a noite, então eles fica em casa e eles são
muito carente, então eles gostam muito que a gente vai só pra
ouvir eles, pra falar as coisas deles, às vezes eles quer falar pra
gente as coisas deles, né, às vezes eles contam umas coisas que
não tem nada a ver, falam do passado deles, falam do presente, né.
Eu gosto muito de ir pra escutar eles, as vezes nem tanto pra falar,
mais pra ouvir”.
As situações de risco mencionadas pelos Agentes de Saúde pesquisados estão em
sintonia com as competências profissionais propostas pelo Minisrio da Saúde (BRASIL,
2004), que contemplam a promoção, prevenção e o monitoramento de pessoas, grupos
específicos e morbidades prevalentes e também a identificação de risco ambiental e
sanitário que esaliado ao diagnóstico de saúde e comunitário.
O enfrentamento das situações de risco é realizado pelos Agentes por meio do
Trabalho em Equipe e a busca de parcerias intersetoriais para as questões que
extrapolam o setor sde.
DSC- “Quando eu encontro situações que ultrapassam a minha
capacidade, eu passo pra equipe, você passa pra equipe, então eu
acho que é uma equipe, eu tenho que trazer pra cá, qualquer
vida que eu tenho, quando a equipe tá reunida é passada ali,
chama a enfermeira, chama o médico, e tal. depende do
problema que ele mim contando, se for problema de saúde, né, a
gente vai tá tentando encaminhar pra unidade, no primeiro momento
eu chamo os Agentes, né, é, aí a gente discute o que acha melhor
318
fazer, se for levar o enfermeiro, a gente leva o enfermeiro, se for o
médico a gente chama o médico, né, se for algum problema social,
vai encaminhar pros meios, no caso do CRAS, né, eu vô pedindo
ajuda pras pastorais”.
O Agente deve mobilizar todos os recursos disponíveis para realizar o seu papel de
interlocutor das necessidades da população.
12- PROMOÇÃO A SAUDE
As atividades de promoção à saúde são promovidas em equipe por meio de grupos
de educação em saúde, articulando sempre promoção com a prevenção de doenças cuja
escolha dos temas e dos aspectos trabalhados diferem de acordo com a realidade local.
DSC- “Realiza as reuniões. Ela é bem atuante mesmo, ela realiza
as reuniões, é a queso das reuniões, prevenção, tem um quadro
de reuniões que fora pra todos os grupos, até de idosos
agora, abrangendo todos os grupos, prevenção. Assim, a gente
não tem dificuldades com isso, sempre aberto, precisando, eu
acho que ninguém pode reclamar que não tem esse acesso; a
gente sempre procura fazendo alguns trabalhos, igual no ano
passado, s fizemos o, o dia da mulher, convidamos é, é as
mulheres pra participando de palestras, de informações sobre a
prevenção do câncer do colo uterino e das mamas, as mulheres
gostaram muito e pediram pra que a gente repetisse mais esses
319
eventos de tá trazendo informações; a gente teve muitas atividades,
na escola a gente fez peça, teatro, a gente saiu com os idosos
pro parque, atividade com os acadêmicos de fisioterapia, no início
tinha caminhada, depois o pessoal começou a desanimar, tinha a
caminhada, a gente fazia o rodízio dos Agentes participando, tá
precisando resgatar, porque é uma das áreas que mais precisa”.
Um dos Agentes destaca que, apesar de identificar os problemas da localidade
para serem enfrentados, nem sempre pode ser realizado, tendo em vista que algumas
temáticas podem gerar risco à vida dos membros da equipe, como descrito pela ECH de
Benael:
“Oh! Quando eu iniciei aqui no PSF, eu, preocupada com essa
questão da droga, nós começamos a fazer reuniões com criança de
12 anos a 14 anos, falar sobre tabagismo, essas coisas, então que
o necio aqui comou a ficar o perigoso, que, infelizmente,
prende a gente, que você não pode nem mais falar, que eu fiquei
com muito medo, que eu nem quero mais falar sobre isso. Tem
muita coisa, tem aquela questão do sexo, né, aquela mudança da
criança pra adolescente, a gente leva muita prevenção, né, trabalha
muito DST, né”.
13- SATISFAÇÃO COM A PROFISSÃO DE AGENTE COMUNITARIO DE SAUDE
A maioria dos Agentes encontra-se satisfeitos com a profissão escolhida,
revelando-a como meta de vida:
320
ECH Manael- “Oh, o que eu espero é ter uma segurança maior no
meu serviço, porque ele é tudo pra mim no momento e eu não
pretendo mudar não, eu acho que eu vou continuar sendo Agente,
até quando eu puder ser”.
Entretanto, alguns mencionam que buscam outras oportunidades, apesar de gostar
da profissão.
“Eu gosto, vou fazer o melhor possível até quando eu tiver, mais
não é uma coisa que eu quero pro resto da minha vida.[Por quê?]
Ah, pelo fato de ser assim um serviço que é muito direto, assim,
com a comunidade, não que eu não goste de trabalhar, de mexer
com gente, que eu gosto, que esse negoócio de bater na casa,
todo dia e tal, mas enquanto eu tiver eu vou o melhor de mim.
(Miguel)
A expressão-chave de Miguel revela que o processo de trabalho é estressante,
uma vez que lida diretamente com a comunidade, causando, em alguns momentos,
desgaste e sofrimento para o profissional.
Reis et al. (2007) destacou que o contato intenso com as famílias gera sofrimento,
levando os Agentes a se afastarem dos clientes na tentativa de amenizar a dor e a
impotência diante da demanda social, ocasionando, assim, a rotatividade dos membros
da equipe, como destacado por Miguel, levando a questionar a necessidade de apoio
psicológico para esse profissionais que estão na linha de frente da saúde.
321
2.3 - RESULTADOS E DISCUSSÃO DO SABER CONHECER
O correr da vida embrulha tudo.
A vida é assim, esquenta e esfria, aperta,
depois afrouxa, e depois inquieta.
O que ela quer da gente é coragem.
Guimarães Rosa
O saber conhecer compreende o domínio de conhecimentos e a capacidade de
aprender e apreender contínuos, fundamentados em uma análise reflexiva da realidade e
do contexto comunitário subsidiado pela formação educacional, experiência pessoal e
profissional, em que o espaço privilegiado para a efetivação é durante o processo de
educação permanente na equipe de saúde da família.
Esse processo de educação permanente proporciona o sentimento de
pertencimento a um grupo que objetiva ao trabalho coletivo, com contínua valorização e
contribuição de todos na busca do empoderamento pessoal e, principalmente,
profissional, com visibilidade perante a população assistida. Diante disso, faz-se
necessário conhecer como ocorre o processo de educação permanente nas equipes, uma
vez que o mesmo é primordial para a o desenvolvimento de conhecimentos e saberes,
competências e habilidades.
1- PROCESSO DE EDUCAÇÃO PERMANENTE EM SAÚDE
Os Agentes Comunitários de Saúde afirmam que a educação permanente em
saúde é muito importante para execução do seu processo de trabalho e para a
322
consolidação da Estratégia Saúde da Família, reconhecendo a sua grande contribuição.
Esse processo nas equipes acontecia de forma contínua, porém a ocorrência de vários
fatores dificultadores modificou a frequência do processo educativo, que passou a ser
realizado de maneira descontínua e sem planejamento, conforme descrito na Tabela 6 a
seguir:
TABELA 6- Frequência da realização do processo de educação permanente nas
Equipes de Saúde da Família da cidade de Montes Claros/MG, 2008.
FREQUENCIA N
Mensal 07
Quinzenal 01
Semanal 01
Não está ocorrendo 06
TOTAL 15
Fonte: Pesquisa de Campo, 2008.
Ceccim e Ferla (2008) e os documentos do Ministério da Saúde (BRASIL, 2005b;
BRASIL, 2004c) afirmam que a educação permanente proporciona um espaço de
aprendizagem coletiva, resultando na formação, produção de subjetividade e trabalho,
objetivando ao enfrentamento e solução de problemas. No caso das equipes
pesquisadas, esse processo educativo ocorre de forma irregular, ocasionando um
prejuízo na assistência prestada à comunidade; haja vista que o diálogo e a escuta
pedagógica não estão acontecendo, o que ocasiona uma dificuldade no estabelecimento
do trabalho em equipe.
323
Apesar da frequência inconstante do processo de educação na equipe, os sujeitos
do estudo corroboram com os autores citados e afirmam que a realização do processo de
educação permanente representa a mola propulsora e motivadora do processo de
trabalho em saúde, fornecendo um espaço coletivo de aprendizagem significativa,
associado ao fato de que a educação em saúde é a essência do papel do Agente e que a
irregularidade contribui para a não efetivação desse papel e da Estratégia Saúde da
Família.
Com relação a isso, foram encontradas duas ideias centrais com respectivo DSC e
uma expressão-chave relevante.
IC1- Compromisso com a comunidade, estimulado pelo conhecimento da realidade
local, em consonância com o importante papel de educador sanitário e social das
famílias.
DSC- “O que facilita o trabalho, eu penso que ver e sentir a
dificuldade e orientando em cima das dificuldades de cada um.
Talvez tem casos que necessitaria ser individualizado, porque
talvez a minha dificuldade não é a mesma do meu colega; é preciso
saber, pra poder tá passando informação pra comunidade,
ele pode tá tirando alguma dúvida de uma pessoa dentro da área
com a educação permanente, e geralmente são casos que nós
trazemos pra educação permanente, o casos que a gente vive,
são casos que a gente o tem resposta, a gente vem e pergunta
pro médico ou pro enfermeiro, eles elaboram a educação
permanente baseado nisso. Eles perguntam onde tem
324
dificuldade, o que a gente quer, quer falar sobre o quê, o que a
população tem pedido, tem cobrado, o que voacha que é melhor
tá passando pro pessoal; aí a gente opina, né”.
IC2- Implementação do processo de educação em saúde efetivada na visita
domiciliar por meio da escolha de temas a serem discutidos com as famílias.
ECH Daniel- “É, essas fases que a gente sabe que vai acontecer o
período, que, por exemplo, tem o mês que muito seco, as
crianças estão adoecendo, a gente vai e fala, mas no início do
ano, a gente estipula todos os temas, pro ano todinho, entendeu? A
gente fez isso uma vez, foi o ano passado, aí, é, é nós falamos
de um tema todas as visitas, eu achei muito interessante porque a
gente tá naquele período, a gente passa pra comunidade, praqueles
domicílios, pra pessoas”.
Nesse discurso coletivo, é evidenciado que os Agentes de Saúde realizam e se
preocupam com o desenvolvimento do seu verdadeiro papel de elo entre comunidade-
equipe, e encontram na educação permanente o instrumento de resposta para a
população acerca de questionamentos e dúvidas. Tal fato está de acordo com os
documentos do Ministério da Saúde (BRASIL, 2004e; BRASIL, 2005a) e Ceccim (2005),
ao compreenderem que a aprendizagem significativa deve ser motivada pelo cotidiano,
por meio do diálogo, do aprender-fazer no dia-a-dia do Agente, no encontro entre o
mundo de formão e o mundo do trabalho.
325
Apesar da importância atribuída pelos Agentes, vários aspectos contribuíram para
essa descontinuidade do processo educativo, caracterizando-se como fatores
dificultadores. Além disso, são descritos em forma de duas ideias centrais e respectivos
DSCs e EChs.
FATORES DIFICULTADORES PARA A EFETIVAÇÂO DA EDUCAÇÃO PERMANENTE
IC1- Sobrecarga de atividades desenvolvidas pela equipe de saúde em decorrência
de formação incompleta das equipes, período de férias e acúmulo de atividades.
DSC- “As reuniões eram semanais, sempre acontecia, mas por
causa de tantas atividades que esse Programa Saúde da Família
tem que desenvolver sempre tem aquele mês que mais apertado,
que dificulta, pelo fato dos cronogramas, reuniões pra sair. a
gente acabou empacando mais essas reuniões; agora, do fim do
ano pra cá, é, é devido o pessoal entrou de férias tá assim o
desencontro da equipe assim muito grande, como assim
tumultuado, faltando funcionário, a gente fazendo a educação
uma vez ao mês. Então a gente parou um pouco mais a
capacitação, mas eu creio que deve começar de novo, porque é
muito importante”.
326
IC2-Sobrecarga de atividades em decorrência da implantação do plano diretor da
atenção primaria à saúde.
ECH Manael- “É, assim, já teve muita capacitação, mais agora
ultimamente diminuiu, porque a gente mexendo com o plano diretor,
né, então as vezes não tendo tempo”.
IC3- Sobrecarga de atividades em decorncia da realização de reuniões na
secretaria municipal de saúde.
ECH Mikael- Sempre acontece, mais sempre tem aquele mês que
mais apertado, que dificulta, pelo fato dos cronogramas, reuniões
pra sair, aí, sempre que pode a gente faz, porque é muito
importante”.
Percebe-se, por meio dos DSC e das ECH apresentadas, que a educação
permanente é sempre sacrificada e desvalorizada perante o processo de trabalho da
equipe quando ocorre a sobrecarga de outras atividades em virtude da ausência de
funcionários e/ou atividades externas propostas pela Secretaria Municipal e Estadual de
Saúde. Essa situação representa um caminho oposto aos fundamentos da Atenção
Básica mencionada na Política Nacional de Atenção sica (BRASIL, 2006b), que
contempla a valorização dos profissionais por meio do estímulo e acompanhamento da
formação e capacitação profissional com o desenvolvimento constante de suas
competências e qualificação, e isso é de responsabilidade conjunta das SMS e das SES.
A sobrecarga de outras atividades com a falta de planejamento ascendente e
participativo tamm resulta na desmotivação e na falta de compromisso, pois ocorre
327
repetição de temas, sem a contextualização das necessidades da comunidade, como
mencionado na IC4.
IC4- Repetição dos temas durante o processo de educação permanente ocasiona
desmotivação.
ECH Daniel- “Ah, quando o acontece é ruim, sabe, sabe, porque
a gente às vezes a gente vai falar de um tema que a gente tinha
falado, e a gente repete aquele tema, entendeu? Porque não teve o
planejamento pra falar do que certo, entendeu? E a gente vai
e repete o anterior”.
Diante disso, percebemos que a escolha dos temas a serem trabalhados são
baseados na realidade local, que tem o Agente como seu principal intérprete. Nesse caso,
essa interlocução com a comunidade inspira e subsidia o processo de educação
permanente, consoante com o que é preconizado pelos documentos do Ministério da
Saúde.
ESCOLHA DOS TEMAS A SEREM ABORDADOS NA EDUCAÇÂO PERMANENTE
IC1- O processo de escolha dos temas a serem abordados na educação permanente
baseia-se na prática cotidiana dos Agentes de Saúde por meio do levantamento das
dificuldades vivenciadas, dúvidas da comunidade, necessidades locais e situações
epidemiológicas.
DSC- “É preciso saber, pra poder passando informação pra
comunidade, ele pode tirando alguma dúvida de uma pessoa
328
dentro da área com a educação permanente, e geralmente são
casos que s trazemos pra educação permanente, são casos que
a gente vive, são casos que a gente não tem resposta, a gente vem
e pergunta pro médico ou pro enfermeiro, eles elaboram a
educação permanente baseado nisso, a equipe toda dá opinião, nós
dá opinião, dá opinião nossa, porque tem o período igual ao período
chuvoso, né, tem a época de dengue. Então a gente fala sobre a
dengue, então cada época tem, tem época que dando muito, é, é
infecção respiraria, é, né, as crianças gripam demais, a gente vai
falar sobre a gripe, sobre o que é”.
Os Agentes destacam que o processo de trabalho deve estar enraizado na
comunidade sempre de maneira contextualizada e condizente com a realidade, levando
em consideração a época do ano e os problemas locais, assumindo, assim, a construção
de coletivos no trabalho e o processo de co-gestão, com poder compartilhado, em que
todos os membros da equipe são facilitadores. Assim, desempenham o papel de ator e
autor na busca da interdisciplinaridade (BRASIL, 2005a).
IC2- O processo de escolha dos temas a serem abordados na educação permanente
baseia-se no Plano Diretor da Atenção Primária à Saúde.
DSC- “Se eu não mim engano, vem do plano diretor, porque ela
[enfermeira] trabalha com a gente o plano diretor”.
329
O Plano Diretor da Atenção Primária à Saúde encontra respaldo nas
responsabilidades da Secretaria Estadual de Saúde. Dentre tantas outras, a de contribuir
na reorientação do modelo de atenção e qualificação da atenção básica, que os Agentes
conseguem perceber como fundamentais no processo de formação de toda a equipe
(BRASIL, 2006b).
IC3- O processo de escolha dos temas a serem abordados na educação permanente
baseia-se na escolha dos coordenadores (enfermeiro e dico) durante a
implantação da equipe, passando depois para a escolha dos Agentes, de acordo
com a comunidade.
ECH Ariel- “Oh, no início o tema era escolhido pelo, pelo pessoal da
equipe, por exemplo, os coordenadores, os coordenadores
escolhiam os temas e passava pra gente, hoje eles perguntam,
né, devido a gente já ter visto muita coisa nessa área, eles já
perguntam onde tem dificuldade, o que a gente quer, quer falar
sobre o quê, o que a população tem pedido, tem cobrado, o que
você acha que é melhor passando pro pessoal, aí a gente opina,
né”.
Essa ideia central está presente nas colocações de Paim; Almeida Filho (2000)
quando destacam que a educação deve ser uma prática de transformação de objeto-
sujeito para sujeito-produto, que é fruto do trabalho humano de Sujeitos-Agentes, num
processo de aprender a aprender de forma permanente, uma vez que, no início do
trabalho como Agente, não estavam familiarizados com a função. Assim, era necessário
330
serem direcionados pelos coordenadores e, durante o fazer cotidiano, foram, enfim,
transformados em protagonistas do saúde da família, por meio do poder compartilhado e
do trabalho em equipe.
Os Agentes de Saúde expressam a compreensão das diretrizes da educação
permanente e de todos os componentes e percebem a importância do processo de
qualificação contínuo.
2- (DES) CONHECIMENTO DOS AGENTES DE SAUDE SOBRE PRINCIPIOS DO SUS
A profissão Agente de Saúde só existe no âmbito do SUS e, dessa maneira, esse
profissional é privativo do sistema de saúde. Todo trabalhador deve conhecer a missão,
visão, diretrizes, valores da empresa na qual exercem suas atividades laborais. Partindo
dessa consideração, foi questionado aos sujeitos do estudo acerca do conhecimento do
SUS, o resultado ocasionou espanto e preocupação, tendo em vista que a maioria (11)
não mencionou nenhum dos prinpios e apenas quatro souberam nomear alguns dos
princípios, com destaque para os doutrinários e filosóficos. Entre eles, os prinpios e o
número de vezes que foram mencionados: universalidade (3), integralidade (3), equidade
(2), regionalização(2).
Diante dessa constatação, há de se indagar o processo de qualificação e as
temáticas que eso sendo abordadas, que todos os profissionais participaram do
Curso Introdutório, sob a responsabilidade do gestor municipal que tinha como objetivo a
aproximação com os princípios da Estratégia Saúde da Família bem como os princípios
do SUS e funcionamento do sistema de saúde local, como contemplado nos documentos
do Ministério da Saúde e também participam da educação permanente nas respectivas
equipes (BRASIL, 2001c; BRASIL, 2006b).
331
2.4- RESULTADOS E DISCUSSÃO DO SABER CONVIVER
Eu o preciso ser você, porque eu tenho você
ao meu lado.
Reconheço o valor do outro que é diferente de
mim.
O importante é o processo de busca e o
encontro do “eucom o “outro”.
O outro é parte e competência que me faltam.
A sabedoria está uma parte comigo e outra com
você.
Nós dois formamos um ser novo.
Somos capazes de fazer juntos algo que um
não faz.
(André Alckimim)
O saber-conviver compreende a capacidade de relacionar-se pautado no respeito
mútuo, valorização do ser-aí e no diálogo, representado pelo saber ouvir, saber escutar e
saber lidar.
Durante a execução das atividades laborais, o Agente Comunitário deve ter a
capacidade de saber-conviver com a equipe e, especialmente, com a comunidade,
constituindo-se um requisito indispensável para a assistência de qualidade, em que o
cuidar representa a essência do processo de trabalho dessa categoria. Diante disso,
apresentaremos a percepção dos Agentes acerca do trabalho em equipe e com a
comunidade.
332
1- A PERCEPÇÃO DO AGENTE SOBRE O TRABALHO EM EQUIPE
O trabalho em equipe representa tanto um aspecto inovador quanto indispensável
para a implementação do fazer dentro da Estratégia Saúde da Família. Diante dessa
colocação, os Agentes de Saúde percebem esse fazer coletivo como:
IC1- O trabalho em equipe pauta-se construção de objetivos comuns.
DSC- “Pra mim é bom, é bom, é, é porque na equipe tem que ter os
mesmos objetivos, trabalhar as mesmas coisas; eu nunca tive
dificuldade de trabalhar em equipe, sempre tive facilidade, acho
tranqüilo”.
Nesse discurso, os Agentes colocam em evidência que a equipe deve construir os
objetivos de forma coletiva associado ao plano para alcançá-la, o que encontra
correspondência com a definição de equipe apresentada por Honorato e Pinheiro (2007),
que contempla um conjunto de profissionais engajados em prol da realização de
determinada ação que foi estabelecida socialmente.
IC2- O trabalho em equipe complementa o fazer individual, resultando em resolução
e co-participação no processo de cuidar.
DSC- “A equipe tem que ter companheirismo, tem um caso que a
minha colega precisando de minha ajuda, pra ir fazer uma
visita, a gente vai e faz, ou se eu tenho um problema e não sei
como resolver sozinho, eu recorro às meninas [os outros
profissionais], não eu mais todo mundo né: ‘Gente mim uma
333
opinião, o que você acha que a gente pode fazer’, eu acho que é
companheirismo mesmo o trabalho em equipe”.
Os Agentes destacam que o companheirismo, com a troca de conhecimentos e
experiências, é a essência de um trabalho em equipe, de acordo com as opiniões de
autores como Araujo; Rocha (2007) e Bonaldi et al. (2007) que acreditam que o cuidado
deve contemplar a comunhão de saberes e fazeres em busca da produção de ações de
saúde, uma vez que a realidade da comunidade é complexa e o seu enfrentamento
necessita de vio e ão interdisciplinares, pois os problemas o contextualizados e
necessitam de encontro, de práticas em um profissional que precisa da ajuda do outro.
Esse encontro de saberes e fazeres resulta no sentimento de troca entre os
membros da equipe de saúde, levando ao sentimento de pertencimento, expressa na Ide
ia Central e no DSC abaixo.
IC3- O trabalho em equipe favorece um sentimento de pertencer a uma família
profissional fundamentada na ajuda mútua, na empatia e no respeito.
DSC- “Trabalho em equipe é querer pra mim o mesmo o que eu
quero pro meu colega, a equipe tem que ter os mesmos objetivos,
trabalhar as mesmas coisas, eu acho que é um ajudar o outro como
uma família, se um não pode fazer aquilo na hora: ‘Oh, colega faz
aqui que ocupado, uma ajudinha’, e o outro tá fazendo.
Também deve respeitar o outro, sabe, pessoas diferentes,
pensamentos diferentes, eu acho que a gente tem que
respeitando o espaço do outro; e nem sempre todo mundo pensa
assim gerando aquelas brigas, é uma família. Tem os dias que às
334
vezes de mal humor , mesmo que às vezes a gente o deve
refletir isso, as vezes escapole, né, então, assim, é muito bom
trabalhar em equipe”.
O trabalho realizado em equipe para os Agentes de Saúde perpassa pelo
compromisso com o outro, o respeito mútuo e empático, com o compartilhamento de
objetivos e metas por meio da comunicação efetiva e a escuta do outro, levando a uma
espécie de sintonia entre si, chamado por Bonaldi et al (2007) de agir em concerto por
meio da orquestração do trabalho com sentimento de pertencimento e responsabilidade
coletiva como uma família. Assim, reconhece-se o saber do outro como o pilar do cuidar,
em que os erros e os acertos são realizados e visualizados coletivamente.
Esse sentimento de família é uma extensão do cuidar prestado às famílias
adscritas, pois os colegas de trabalho devem ser tratados como um prolongamento de
sua família.
IC4- O trabalho em equipe favorece a valorização do profissional por meio da
contribuição e complementão das ações.
ECH Mikael- “A nossa equipe é muito boa, muito unida, assim, eu
mim sinto muito importante na equipe, né, que eu acho assim, que
uma Equipe de Saúde da Família, não é o Agente, o eu, é
uma equipe inteira que precisa trabalhar com muita união e eu mim
sinto, né, uma utilidade muito grande, né, de cada um membro da
equipe, a importância muito grande de se trabalhar em equipe”.
335
A contribuição de Mikael demonstra que a superação e a ruptura do paradigma
cartesiano ocorrem por meio do respeito e da valorização do profissional como membro
de um grupo, demonstrando que as equipes de saúde de Montes Claros estão
promovendo a mudança do modelo assistencial fundamentado na integralidade, no
trabalho em equipe e na quebra da divisão do processo de trabalho.
IC5- O trabalho em equipe é compreendido como ação de uma “catraca” com a
interligação das partes na formação de um processo de cuidar completo.
ECH Omael- “O meu trabalho é passar pro outro, seu eu não faço o
meu serviço, o outro o vai fazer na frente, eu tenho que dá conta
da minha produção, pro médico fazer a dele, pro enfermeiro, pra ele
poder fazer a dele bem. A gente depende da ajuda de todo mundo,
porque não adianta o médico tá ali pra atender se eu não indico o
paciente ou então o médico mim encaminha a pessoa pra fazer
acompanhamento e eu não dou conta de fazer o meu trabalho, eu
acho que aqui é desse jeito, trabalhar um ajudando o outro, né, é
como se fosse uma catraca, ela roda, se faltou um dente
daquele ali os outros não vão funcionar bem. Então, a
dificuldade que a gente tem é justamente essa, quando falta um
Agente de Saúde, a gente tem que cobrir a área do outro,
sobrecarrega muito, você deixa sua área pra poder atender a do
outro, muitas vezes o pessoal fala ‘Ah, o Agente não aparece em
casa’, a gente só vai entregar um encaminhamento, entregar um
336
exame, marcar uma consulta, entregar o pedido mas a visita fica a
desejar”.
Omael faz uma analogia do trabalho de equipe a uma Catraca, um sistema de
engrenagens em que a comunicação é o eixo central na inter-relação de fazeres
profissionais, com a passagem do trabalho apenas individual para uma ação coletiva,
proporcionando o aumento da capacidade de criação e transformação com mais
autonomia. Isso deve acontecer sempre em um processo de composição, não apenas
como reunião de indivíduos e sim como uma política de coletivo, com uma dimensão mais
ampla do fazer saúde (ARAUJO; ROCHA, 2007; HONORATO e PINHEIRO, 2007;
BARROS; BARROS, 2007).
2- A PERCEPÇÃO DO AGENTE SOBRE O TRABALHO COM A COMUNIDADE
A Agente de Saúde tem suas atividades voltadas e destinadas à comunidade,
famílias e indivíduos, por meio da definição e conhecimento da comunidade e sendo,
portanto, fundamental conhecer a visão desses sujeitos sobre o trabalhar em
comunidade, já que o Agente é o promotor do vínculo da equipe com a comunidade.
IC1- O trabalho com a comunidade é percebido como tarefa difícil se relacionado a
interesses diferentes entre dois personagens - equipe e comunidade.
DSC- “É muito difícil trabalhar com a comunidade, sabe, porque a
gente chama pras reuniões é pede pra tá vindo, né, que vai ser
bom, a gente fala que, é, tem muitas informões que eles não
sabem e que a gente não consegue transmitir todas, e nas reuniões
337
é que eles vão tá sabendo melhor. Porém, eles não participam das
reuniões, e é difícil mas é tranqüilo”.
A dualidade de interesses atrapalha o relacionamento com a comunidade, uma vez
que a equipe centra suas ões na promoção e na prevenção, enquanto que a
comunidade valoriza apenas as ões curativas e assistenciais, gerando um conjunto de
expectativas que, muitas vezes, não é atendida por ambas as partes envolvidas.
A relação profissional encontra-se pautada nas expectativas prévias que irão gerar
a satisfação com a assistência ou não, com conotação maior no caso dos Agentes, pois
essa relação é a base de seu papel.
IC2- O trabalho com a comunidade é percebido como tarefa fácil se relacionada ao
conhecimento e ao compromisso com a comunidade.
DSC- “Trabalhar com a comunidade é melhor, quando o Agente
conhece a comunidade é tranquilo, então não tem muita dificuldade,
entretanto se a pessoa não tem muito conhecimento da
comunidade, mas ela é uma pessoa que ativa, sempre
querendo resolver situação do pessoal da comunidade, eu acho que
não tem dificuldade, logo, logo ela consegue ganhar a simpatia do
pessoal”.
O conhecimento da comunidade é um pré-requisito para ser Agente e fazer parte
da equipe de saúde, que o candidato deve ter no mínimo dois anos de residência no
terririo (BRASIL, 2002); e os Agentes deixam bem claro que conhecer a comunidade
338
facilita o relacionamento com as famílias, além de proporcionar a capacidade de interação
e de comunicação e, acima de tudo, o desejo de ajudar o próximo, tendo em vista que
compreende de dentro os aspectos comunitários, proporcionando a construção de
vínculos.
Destaca-se, então, que, de acordo com esse fato, estão as colocações de Silva et
al (2008) de que a exigência de ser morador da comunidade fornece a esse profissional a
compreensão da comunidade vista de dentro dos seus aspectos comunirios e aliado à
construção de vínculos, com o estabelecimento de formas efetivas de comunicação.
Diante disso, o saber fazer tem como uma das atividades desenvolvidas pelo
Agente o diagnóstico de saúde e da comunidade, que é lembrado como aspecto que
facilita o trabalho com a comunidade.
3- PERCEPÇÃO DOS AGENTES SOBRE A INTERAÇÃO DA EQUIPE COM A
COMUNIDADE
O Agente de Saúde exerce a função de laço entre a equipe e a comunidade,
realizando um contato permanente com as famílias acompanhadas e promovendo a
efetivação do processo de trabalho na Estratégia Saúde da Família. Nessa vertente, é
importante conhecer a percepção dos Agentes acerca dessa interação.
IC1- A interação equipe-comunidade ocorre de forma positiva por meio do respeito
mútuo com aceitabilidade, receptividade e respeito recíprocos.
DSC- “Tem uma boa interação, o Agente é bem aceito e a
comunidade respeita, porque o respeito é recíproco, né; tem as
339
dificuldades como toda equipe, porque sempre tem aqueles que
sempre criam um problema, mais, a grande maioria é receptiva, a
grande maioria aceita bem”.
Por meio do discurso, é possível concluir que os Agentes percebem de forma
positiva a interação da equipe com a comunidade assistida, desde que seja pautada no
respeito mútuo e na postura ética. Esse aspecto também é contemplado por autores
como Barros; Pinheiro (2007), quando comentam que o saber-fazer deve valorizar as
experiências vividas e estar fundamentada em valores como engajamento, cooperação,
valorizão, e comunicação.
IC2- A interação equipe-comunidade ocorre através do Agente Comunitário, que
funciona como elo.
ECH Omael- A interação, ela acontece através do Agente
Comunitário de Saúde; eu sou responsável pela interação, a
comunidade, pra ela chegar à unidade de saúde, pra ela ter acesso
ao Programa Saúde da Família, ela tem que passar primeiro pelo
Agente de Saúde, quando o Agente de Saúde encaminha ela, certo,
aí, ela já começa a usar, a fazer uso do que o Agente tem proposto,
a gente funciona como um elo, né, entre a comunidade e a unidade
de saúde”.
O discurso do Omael ilustra o verdadeiro papel do Agente de Saúde de realizar a
interlocução com a comunidade, funcionando como porteiro do serviço de saúde,
340
conforme o atributo da atenção primária de primeiro contato, que representa a
oportunidade de acesso e uso oportuno dos serviços (Starfield, 2002).
IC3- Orientação da comunidade por meio de atividades educativas e diálogo.
DSC- A gente sempre faz nas reuniões, né, tendo a oportunidade
de falar o Agente fala, muitas vezes a gente indica pra equipe, pra
fazer reuniões com a comunidade”.
O Agente, como elo, promove a interação equipe-comunidade por meio de ações
educativas e de orientação familiar, tanto no âmbito domiciliar quanto coletivo, a educação
em saúde representa, segundo o autor Vasconcelos (2001; 1999), o espaço de
interlocução do saber científico com o saber popular, constituindo-se um processo
participativo de formação de sujeitos em prol da saúde, que o gradativamente
assumindo o controle de sua saúde.
4- ASPECTOS DO PROCESSO DE TRABALHO DO AGENTE QUE A EQUIPE
DEVERIA COMPREENDER NA PERCEPÇÃO DO AGENTE
O homem é um ser aberto ao ser; um ser que compreende o ser, um ser-com-os
outros, revelando-se aos outros. Para isso, faz-se necessário que a equipe compreenda o
processo de trabalho do Agente vista da percepção do mesmo, uma vez que, para
compreender uma coisa, é necessário vivenciar, experimentar. E isso se revela por meio
do discurso; esses discursos e suas ideias centrais representam a percepção do Agente
sobre o processo de trabalho que a equipe deveria compreender e contribuir
(HEIDEGGER,1999; HEIDEGGER, 1981;STEIN,1988).
341
IC1- A equipe não precisa de nenhuma informação adicional.
DSC- “A minha equipe sabe tudo, o fica nada pra gente, tudo que
a gente passa na área, tudo que a gente encontra, a gente passa
pra equipe da gente e, assim, aqui todo mundo sabe sobre o
processo de trabalho”.
Alguns Agentes comentam que a equipe esem sintonia, não necessitando de
informações adicionais, assim como dita o documento de Brasil (2005b), enfatizando que
os membros da equipe devem estar em sintonia entre si na escuta do outro, com
estabelecimento de um canal de comunicação estreito e interação recíproca, ocorrendo
um saber/fazer comum e não necessitando, portanto, de informações adicionais.
IC2 – Os aspectos negativos do processo de trabalho que geram sobrecarga:
atividades internas e administrativas, em especial agendamento de consultas e
exames.
DSC- “Ah, eu acho que deveria ver, que a gente não é marcador de
consulta, a tecla que eu bato muito é da questão da demanda de
consultas, porque eu acho que um assunto que bem assim sabe,
sobrecarregando o Agente de Saúde e atrapalha um pouco e tem
muitas atribuições que o Agente faz hoje que fica na recepção. No
dia que fica na recepção, ele trabalha muito, a pessoa que vem
procurar o Agente dele e ele não encontra, descarrega tudo no
Agente que tá na recepção. Eu acho assim, a recepção teria que
342
ser uma pessoa neutra, né, um Agente administrativo, porque ele
vai repassar as informões”.
Os Agentes mencionam que a equipe deveria saber que as atividades que
envolvem o agendamento de consultas e exames e as atividades internas e questões
administrativas atrapalham o desenvolvimento do verdadeiro papel do Agente, que é de
promotor da saúde por meio do trabalho com as famílias. Os documentos do Ministério da
Saúde que regulamentam as atribuições dos Agentes não contemplam essas atividades
referidas, o que nos leva a questionar: Por que os Agentes realizam o papel de Marcador
de Consulta? Os Agentes são unânimes ao declarar que ser promotor da doença
ocasiona sobrecarga e dificulta o relacionamento com as famílias, que vinculam
satisfação com a obtenção de consultas e exames e supervalorizam a doença ao invés da
saúde.
A saída para ultrapassar esse equívoco é por meio do trabalho em equipe, em que
cada profissional compartilha as experiências e as angústias vivenciadas pelo outro em
prol da efetivação da Estratégia Saúde da Família.
IC3- Acompanhar as atividades dos Agentes Comunitários de forma mais próxima.
DSC- “Eu acho que, entende, só que, eu acho que, que falta assim
um pouco de acompanhamento de perto, acompanhamento das
atividades dos Agentes Comunitários de forma mais próxima, indo
mais na visita com os Agentes. Eles devia participar mais com a
gente, então igual na marcação da consulta mesmo a gente fica só,
343
então se o enfermeiro tivesse ou o médico dava uma segurança
maior, né, pra poder decidir na marcação de consulta”.
O DSC destaca que a equipe deveria realmente ter suas ões voltadas para o
trabalho em equipe por meio do cuidar compartilhado, em que ocorre o acompanhamento
das atividades promovidas pelo Agente, em especial no agendamento de consulta, que é
modelo assistencial centrado na doença e também nas visitas domiciliares. Esse
acompanhamento mais próximo permitirá a inversão do modelo de saúde e a mudança de
paradigma da doença para a saúde, pois os Agentes destacam que a ação interdisciplinar
deve ser conhecida e realizada pelos membros da equipe de maneira efetiva, sempre
almejando à transdisciplinaridade.
Essa ão interdisciplinar permite o ato de troca, a reciprocidade de saberes entre
os membros na busca da compreensão da realidade complexa e necessita de vários
pontos de vista, que ninguém é dono da verdade absoluta, e sim possuidor de uma
verdade relativa. E só por meio da ajuda mútua e do diálogo é que ocorrerá o verdadeiro
trabalho em equipe (FERREIRA; 1999).
IC4- Conhecer os aspectos positivos do processo de trabalho do Agente.
ECH Aniel- “Oh, talvez fosse interessante que soubesse mais sobre
as dificuldades mesmo do outro, às vezes, saber também aquilo
que você faz de bom, , porque só criticar, às vezes é muito fácil,
mesmo é saber o que você fez de bom, prá talvez levando pra
outros”.
344
Barros; Barros (2007) destacam esse fato, mencionando que a comunicação dentro
da equipe deve ocorrer através de uma rede dialógica que permita a autonomia dos
participantes na lógica de uma política de coletivo com a saúde, compreendida de forma
ampliada, em que cada membro tem sua contribuição na formação de um todo, com
socialização das informações e das atividades e não apenas como a mera reunião de
indivíduos.
Por meio dessa rede dialógica, ocorrerá, conforme destacado pela ECH Aniel, o
conhecimento de todos os aspectos do trabalho, não apenas os pontos fracos mas
tamm os pontos fortes e as suas contribuições na realização do processo de trabalho.
Reis et al (2007) destaca que a escuta do outro sempre aproxima os membros da equipe
com o estreitamento dos vínculos; essa escuta deve ir além da mera audição e estar
centrada na compreensão do outro, na captação das expressões e gestos.
5- ASPECTOS DO PROCESSO DE TRABALHO DO AGENTE QUE A COMUNIDADE
DEVERIA CONHECER E COMPREENDER NA PERCEPÇÃO DO AGENTE
O homem é um ser no mundo e com o mundo, o Agente é um ser comunitário e
com a comunidade e é capaz de relacionar-se, projetar-se, de transcender. Esse ser de
relações que é o Agente de Saúde tem na comunidade a sua transcendência de estar
com os outros (FREIRE, 1983).
Diante disso, é fundamental saber a percepção do sujeito desse estudo (SER)
sobre os aspectos que a comunidade (SER-AÍ) deveria conhecer e compreender acerca
do fazer do Agente de Saúde.
345
Todas as ICs e os DSC apresentadas abaixo m uma raiz única e uma solução
comum. Diante desse fato, a percepção dos Agentes será apresentada e comentada de
forma coletiva no final de todos os discursos.
IC1- Desmistificar o papel de marcador de consulta e Valorizar o verdadeiro papel
do Agente Comunitário: Promotor da Saúde.
DSC- Eu acho que deveria ter uma divulgação maior, porque por a
gente marcar consulta, eles [a comunidade] vê muito o Agente
como marcador de consulta, por mais que a gente fala ‘oh o papel
do Agente não é de marcar consulta, a gente trabalha com a
prevenção de doença, promoção de sde, que ele tá pra
prevenir doença’, eu acho que deveria ter uma divulgação mais,
sabe, até mesmo da secretaria” [Secretaria Municipal de Saúde].
IC2- Divulgação da função do Agente Comunitário de Saúde.
ECH Rafael- “Eu acho que deveria saber mais, o que, o que é
Agente é, qual a função do Agente, né, porque às vezes eles quer
além, , além da visita, eles quer que marque, quer que leve na
hora certa, quer, quer, o quer ter mais trabalho, tem o Agente, o
Agente faz tudo, ele não quer nem mais deslocar, não vem aqui
nem pegar um exame, né”.
IC3- Conhecimento das dificuldades enfrentadas pelos Agentes de Saúde.
ECH Mikael- “Por exemplo, um encaminhamento da secretaria, eles
acham que o Agente de Saúde que marca, se tá demorando a culpa
346
é do Agente de Saúde ou a culpa é do PSF. Por mais que você
explica a forma de marcação, eles não entendem, eles querem
porque querem, cada um acha que a sua dificuldade é maior, mais
assim não entende a forma mesmo, eles acham que, que você tem
que dá um jeito, um jeitinho de passar na frente”.
IC4- Divulgação do Objetivo da Estratégia Saúde da Família.
DSC- Ah, eu acho que devia ser mais divulgado, tem que ser mais
exposto o papel do saúde da família, né, olha a comunidade, assim,
a maior dificuldade dela é ainda entender e aceitar o que é uma
equipe de saúde da família, ou, ou eu não sei se é porque eles não
querem entender, eles não querem aceitar ainda, o que é o trabalho
do saúde da família. Então, a gente tem essa dificuldade ainda,
porque ainda é a inversão do modelo, e a gente sabe que vai levar
muito tempo ainda, pedir pra comunidade tá mais interagindo com a
gente, porque eles é, é assim em relação à consulta, essas coisas,
eles sabem vim aqui, entendeu, mas quando tem uma atividade
igual, quando é parte de educação, eles ficam mais recuados”.
A valorizão das atividades curativas centrada na doença traduz o paradigma
flexneriano instituído no mundo desde 1910 e presente no imaginário da população. A
ruptura desse paradigma é o objeto da Estratégia Saúde da Família, que tem o Agente
como porta voz da superação do modelo, com a priorização da promoção da saúde e
prevenção de doença (MENDES, 1999; PAIM, 1999).
347
O Agente Comunitário facilita o laço estabelecido entre o sistema de saúde e a
comunidade, sendo, muitas vezes, responsabilizado pela ineficiência e ineficácia do
sistema no que diz respeito às atividades curativas - consultas e exames. Muitas vezes, o
seu reconhecimento e valorização centra-se no acesso a essas atividades, dificultando a
compreensão por parte dos usuários acerca do papel do Agente como promotor da sde
e não da doença.
A saída apontada pelos Agentes entrevistados é o processo de educação, com a
sensibilização da comunidade acerca da verdadeira atribuição do Agente PROMOTOR
DA SAÚDE, uma vez que a educação é permanente, em que todos estão se educando
em comunhão e afirmando-se como homens em integração com o mundo e mediados
pelo mundo (FREIRE, 1983; FREIRE; 1987).
6- REFERENCIA PROFISSIONAL NO ENFRENTAMENTO DE SITUAÇÕES DE
RISCO/AREA DE RISCO
Para compreender situações de risco, é necessário definir a palavra risco, que
significa a probabilidade de alguém ou grupo populacional sofrer um dano em sua saúde.
Também existe área de risco, que é o local com situações de risco, seja ambiental e/ou
sanitário, indicadores desfavoráveis, barreiras geográficas ou culturais que dificultam o
acesso e acessibilidade aos serviços de saúde aliado a grupos específicos que têm a
probabilidade maior de adoecer e morrer (BRASIL, 2000a; BRASIL, 2004; MENDES,
1992).
O Agente Comunitário tem como uma de suas competências a identificação dessas
situações e populações de risco por meio do diagnóstico de saúde e da comunidade e,
junto com a equipe e a comunidade proporem, através do planejamento, as solões e
meios para o enfrentamento dessas situações.
348
Para realizar o enfrentamento de situações de risco, os Agentes Comunitários
entrevistados recorrem à equipe. Entretanto, a maioria procura o profissional enfermeiro
(09), outros (05) procuram os profissionais de nível superior - médico e enfermeiro, e
apenas 01 procura primeiramente os colegas de nível médio - Agente e auxiliar de
enfermagem - para depois recorrer aos demais.
Pode-se perceber que todos procuram o enfermeiro como ponte direta das
dificuldades encontradas na comunidade e a solução para as mesmas. Isso se
fundamenta no fato de o enfermeiro ser mais receptivo, com acesso mais cil quando
associada à dificuldade de relacionar com o médico em virtude do horário em que se
encontra na unidade de saúde.
DSC- “Eu procuro é, é primeiro o enfermeiro, que é responsável
pela equipe, alias é mais fácil trazer pros enfermeiros, quando
chego encontro dificuldade, trago pra ele, ele é um elo, ele tenta
resolver da melhor maneira possível, aí se o enfermeiro não
consegue resolver, muitas vezes 80% dos casos a enfermeira
resolve. Quando ela não pode, ela passa pra frente, eu também vou
direto no médico, porém procuro mais os enfermeiros, porque o
médico assim a gente tem mais de difícil acesso com o médico,
devido o horário que o médico chega, geralmente muitas das vezes
a gente não na unidade. Tem vezes que a gente passa muito
tempo, porque se a gente fica pra resolver algum caso, a gente
demora, aí como a enfermeira chega um pouco mais cedo,
geralmente a gente espera a enfermeira chegar e passa o caso”.
349
Outra explicação para a procura maior pelo profissional enfermeiro repousa na
questão histórica, desde a sua gênese, quando ainda era PACS. Esse profissional foi
apontado pelo Ministério da Saúde como a referência para os Agentes a quem ele estaria
vinculado. Tal vínculo permanece na equipe de saúde do município de Montes Claros;
constatação também encontrada no estudo de Silva e Dalmaso (1991), destacando que o
enfermeiro foi reconhecido pela maior parte das equipes entrevistadas.
7- PERCEPÇÃO DOS AGENTES SOBRE A ESTABILIDADE NA PROFISSÃO E SUAS
IMPLICAÇÕES NEGATIVAS E POSITIVAS
O outro aspecto que deve ser destacado é a estabilidade, uma vez que os Agentes
foram reconhecidos como profissão apenas em 2002, com a regulamentação da Lei
10.507, ou seja, onze anos depois da criação nacional do PACS, e, somente em 2006, é
que foi estabelecido o primeiro passo em busca da desprecarização dos vínculos
trabalhistas.
Isso posto, é necessário conhecer a percepção dos sujeitos sobre a estabilidade na
profissão e a repercussão da falta dela.
IC1- A falta de estabilidade ocasiona receio e preocupação que atrapalham o
desenvolvimento e o desempenho nas atividades, especialmente relacionadas ao
aspecto mental e sobrecarga.
DSC- “Fica todo mundo inseguro e com receio, eu tenho medo que
entrando um prefeito e querer mandar tudo embora, e fica todo
mundo: ‘Oh, meu Deus será que eu vou continuar, será que eu não
350
vou’, né, corre muito boato, que às vezes é, é a gente não é
concursado, a gente é, é contratado sempre fica com o atrás,
mim preocupa, no caso porque você o sabe quanto tempo tem,
hoje você muito bem empregada e amanhã? Casada com filho e
tudo e porque eu não posso fazer compromisso; né, porque a gente
não tem segurança nenhuma; a qualquer momento a gente pode
na rua, é muito complicado, devia ser um pouco mais seguro, ou
concursado melhor ainda. A gente comenta com os Agentes de
outras equipes é, o medo porque, eu sou o sustento da família
muitas vezes aparece um serviço ou eu fico sabendo de um serviço,
aquilo eu fico não sei se você sai ou você não sai, entendeu, eu sei
que eu desempenho bem o meu trabalho, mas a gente fica com
medo de ficar desempregado, principalmente aqui em Montes
Claros, que é difícil o serviço, né, a gente pensa duas vezes, porque
aparece um serviço pra mim na empresa ali, né, de carteira
assinada, tudo direitinho, todos os direitos. Então isso balança a
gente, não é que a gente desanima por isso, e de certa forma se eu
perder o serviço, porque pra mim continuar trabalhando com a
minha comunidade vai ser um pouco difícil, porque assim eu vou ter
que procurar outro serviço pra mim fazer, pra ganhar meu dinheiro,
assim, porque além de ganhar meu dinheiro eu ajudando muita
gente na minha área. Quando chega na época da política que, que
assim ameaças, tem que ir na reunião, se não for é marcação
serrada, isso dificulta, é claro que dificulta, a gente fica estressada,
a gente fica com medo, a gente quando chega na época da política,
351
é um estresse, que seu trabalho não tem aquele rendimento.
Quando vo não numa outra época e no desenvolver das
atividades, você tá, tá, mentalmente é, é preocupado com alguma
coisa, então, as vezes o desempenho talvez não são do melhor.
Também acontece, inclusive agora mesmo tem uma área
descoberta, né, faltando um Agente, isso sobrecarrega pra os
demais profissionais, essa área que esdescoberta, eu, eu peguei
uma rua dela pra poder tá atualizando a ficha A, pra poder
entregando encaminhamento, pra avisar quando marcou uma
consulta, alguma coisa, então, assim é, é muito difícil”.
IC2- A falta de estabilidade prejudica o planejamento das metas pessoais para o
futuro e o estabelecimento de compromisso financeiro.
DSC- Mim preocupa, no caso porque vonão sabe quanto tempo
tem, hoje você muito bem empregada e amanhã? Casada com
filho e tudo, e porque eu não posso fazer compromisso, fico com
medo de fazer compromisso, ninguém quer fazer consórcio porque
todo mundo ficava com medo”.
A falta de estabilidade acarreta um sofrimento psíquico que gera instabilidade
emocional, diminuição da qualidade de vida e dificulta a efetivação do cuidar,
desagregando os laços com a comunidade; e o processo de trabalho deixa de ser algo
prazeroso, passando a significar martírio e sacrifício, pois produz desgaste físico e
mental, aumentando o risco de adoecer e morrer dos trabalhadores, caracterizados
352
principalmente pelas doenças ocupacionais e psicossomáticas, aliado à preocupação com
o bem-estar da família.
IC3- A estabilidade na profissão proporciona o estabelecimento de diálogo efetivo
sobre a dinâmica do trabalho da equipe de saúde e esclarecimento do papel do
Agente.
ECH Benael- “Muito, eu acho, se o Agente fosse uma pessoa
efetiva, , eu acho que teria mais chance de chamar a pessoa, de
falar: ‘Não é assim, não é no grito que vovai conseguir, a minha
função aqui é essa, eu sou efetiva aqui, é assim que funciona, se
você tem um pouco de paciência, nós vamos procurar te ajudar, da
melhor maneira possível’, aí, ele consegue tudo, né, então ele acha
que nós somos vagabundos, na rua a gente escuta: ‘Ah, vem
essa mulher, fica só andando pra cima e pra baixo, não faz nada’;
ele não sabe que você no dia, você entregou mais de dez
encaminhamentos, no dia você já orientou mais de seis famílias, ele
não sabe disso, , não sabe pra quantos avisa que não tem
médico, né, o Agente liga pro centro de saúde, liga pra outro, liga
no Maracanã, porque é uma lotação só, nós fazemos vaquinha aqui
dentro, paga a lotação de fulano que não tem dinheiro pra ir, eles
não sabem disso”.
O sujeito enfatiza que a efetivação irá proporcionar um diálogo mais franco com as
famílias, representando de fato o tradutor do saber com o compartilhar da realidade; Brasil
(2004) destaca que, desde o início da efetivação do PACS, o Agente vivencia constantes
353
ameaças de desligamentos. Apesar de ser considerado relevante, é tido como o elo mais
fraco da corrente; como bem ilustra o discurso de Benael, ao destacar que a efetivação
retira das costas dos Agentes o temor, o medo de conversar com o usuário,
especialmente quando tem que falar Não diante das demandas por consultas, uma vez
que a população reconhece mais os aspecto do modelo curativista e médico-centrada.
IC4- A falta de estabilidade não interfere na realização adequada do serviço para os
profissionais comprometidos.
DSC- “A pessoa que desenvolve o trabalho, faz o trabalho bem
feito, ele tem a segurança maior e não atrapalha não, não tem
medo, não”.
Alguns Agentes mencionam que a falta de estabilidade não causa motivo de
sofrimento e sim promove motivação, pois profissionais comprometidos o possuem
temor e medo.
8- ROTATIVIDADE DE PROFISSIONAIS NA EQUIPE DE SAUDE DA FAMILIA:
PERCEPÇÃO DOS AGENTES
Apesar do receio e da falta de estabilidade, os Agentes comentam que a ocorrência
de desligamento dos profissionais é difícil acontecer e quando ocorre é motivada por
questões pessoais, dentre elas a busca de novos horizontes e outras ligadas ao stress
proporcionado pelo processo de trabalho ou a visão equivocada do trabalho, resultando
em decepção.
354
IC1– Busca de novos horizontes profissionais motiva a rotatividade.
DSC- As, as, as pessoas saíram do PSF até hoje foi pra poder
encontrar um, um jeito melhor de viver, um trabalho melhor, esse,
esse rapaz que, que saiu foi trabalhar de técnico, foi ganhar mais e
trabalhar menos e a outra foi embora pra Belo Horizonte por
questões pessoais. Eles saíram, tem duas áreas descobertas”.
IC2- O processo de trabalho causa sofrimento profissional e stress, motivando a
rotatividade.
ECH Mikael “No caso dos Agentes que saíram, eles falaram que
estavam estressados, né, que estavam estressados, já não tavam
aguentando mais”.
IC3- Visão equivocada do processo de trabalho motiva a rotatividade.
ECH Manael- “Eu recomendei para minha irmã que ela entrou
e não gostou da experiência e saiu, ela o deu conta, ela disse
que não era o que ela esperava, ela pensava que era diferente, que
não era pra ir todo mês na casa, visitando, e que as pessoas
tamm não tava aceitando o programa e às vezes nem recebia
ela, né”.
A rotatividade tem como fator desencadeador os processos de frustrações, tanto no
aspecto pessoal quanto no psíquico e nas expectativas que não o contempladas pelo
processo de trabalho. A esse fato agrega-se outra questão, que é o desejo de crescer por
meio da busca de reconhecimento e valorização cnica e financeira, como tamm
355
visibilidade profissional em busca da almejada estabilidade e vínculos trabalhistas que
garanta os seus direitos, proporcionando qualidade de vida para sua família.
Essa questão também foi retratada em outros estudos, como Bachilll et al.(2008),
Lunardelo (2004) e Silva e Dalmaso (2002), revelando que essa questão não é privativa
de Montes Claros, portanto uma reflexão nacional.
Vale ressaltar que a busca de novos horizontes para alguns Agentes foi motivado
pelo curso de cnico de Enfermagem, que possibilitou melhores condições salariais e
estabilidade, o que é retratado no DSC:
DSC- “Então a maioria dos Agentes que saiu foi os Agentes que
fizeram o curso cnico e eno o curso técnico favoreceu eles mais
na questão pessoal, pra poder encontrar um, um jeito melhor de
viver, um trabalho melhor, esse, esse rapaz que, que saiu foi
trabalhar de técnico, foi ganhar mais e trabalhar menos; e então o
curso técnico acabou sendo um prejuízo para o Agente e bom pro
indivíduo. E surgindo a oportunidade acho que vão mesmo”.
Diante do discurso, devemos refletir sobre o impacto da qualificação do Agente em
outras áreas de atuação profissional, em especial da enfermagem. Surgem, então,
questionamentos como: Qual o ganho real para a equipe com essa qualificação em
auxiliar de enfermagem? Qual o ganho real para o profissional?
A saída de alguns Agentes ocasiona sobrecarga nos demais, pois os que
permaneceram na equipe tiveram que assumir as funções das áreas descobertas:
356
ECH Rafael- “Acontece, inclusive agora mesmo tem uma área
descoberta, né, faltando um Agente, isso sobrecarrega pra os
demais profissionais. Essa área que es descoberta, eu, eu peguei
uma rua dela pra poder tá atualizando a ficha A, pra poder tá
entregando encaminhamento, pra avisar quando marcou uma
consulta, alguma coisa, então, assim é, é muito difícil”.
O processo de trabalho deve ser fonte de prazer/alegria e não de sofrimento; o
profissional deve evitar na prática a vivência do conceito de trabalho que deriva de
Tripalium, instrumento de tortura, e do seu outro significado que se relaciona à desgaste
de energia.
Os Agentes lidam cotidianamente com angústias, conflitos, cobranças, obstáculos
e, acima de tudo, lidam com o sofrimento alheio, que resulta em sofrimento tamm para
o profissional, que sofrimento gera sofrimento que acaba se manifestando como
sintomas psicológicos que configuram sintomas de stress.Isso motiva o afastamento e o
desligamento imediato da fonte de sofrimento, que é o trabalho aliado à sobrecarga de
função ocasionada pela equipe incompleta.
Essa situação nos remete a uma reflexão de como manter a saúde mental de
profissionais que estão na linha de frente na construção da inversão do modelo
assistencial, e que possuem como objeto de trabalho o ser humano, que vive em uma
realidade injusta, permeada de conflitos, sofrimento e a sensação de impotência é
dominante.
Fica, dessa forma, uma pergunta a ser pensada: “Qual o caminho para evitar a
rotatividade motivada por frustrações? Eis a questão.
357
CAPITULO V
____________________________________________________________
Não conheço
nenhum fato mais
animador do que a
incontestável
capacidade do
homem de elevar
sua vida pelo
esforço consciente.”
Henry David
358
PRODUTOS ALCANÇADOS I
ARTIGO 1
A EXPRESSÃO DA ÉTICA PELO AGENTE COMUNITÁRIO DE SAÚDE EM SEU
EXERCÍCIO PROFISSIONAL: UM ESTUDO NO MUNICIPIO DE MONTES CLAROS/MG
THE EXPRESSION OF ETHICS FOR COMMUNITY HEALTHCARE AGENT IN YOUR
PROFESSIONAL EXERCISE: A STUDY IN CITY OF MONTES CLAROS / MG
RESUMO
Este estudo objetiva identificar a percepção dos Agentes Comunitários de Saúde (ACS)
da Estratégia Saúde da Família da cidade de Montes Claros (MG) sobre aspectos éticos
envolvidos em sua prática profissional e identificar as ações realizadas para garantir a
confidencialidade das informões reveladas no processo de trabalho. Caracteriza-se
como estudo qualitativo e descritivo, tendo como técnica de coleta de dados a entrevista
semiestruturada realizada com 15 ACS. A análise dos dados foi orientada pelo Discurso
do Sujeito Coletivo (DSC). O estudo revelou que todos os Agentes afirmam que a ética é
importantíssima na realização de sua função, haja vista que o seu processo de trabalho
fundamenta-se em uma relação de confiança, que ocorre entre indivíduos que
representam o saber científico (equipe) e o saber popular (famílias). No processo de
saber-fazer do Agente, utilizam três Ideias Centrais (IC’s) e seus DSC’s para garantir a
confidencialidade e a credibilidade que são: IC1- Demandas por vidas relacionadas à
saúde e à doença são encaminhadas e discutidas com os membros da equipe,
especialmente com quem tem as respostas e as soluções; IC2- Demandas pessoais não
359
o compartilhadas com a equipe e nem com outras famílias; IC3- Registro adequado
com o destino adequado dos dados. Portanto, credibilidade e confiança o condições
essenciais no estabelecimento das relações interpessoais e a postura ética é o caminho
encontrado para inspirar essa credibilidade e confiança que permitem ao Agente entrar na
intimidade da família e realizar o seu papel de elo equipe/comunidade.
DESCRITORES: Ética; Privacidade; Agente Comunitário de Saúde; Processo de
Trabalho; Estratégia Saúde da Família.
ABSTRACT
This study aims to identify the perceptions of the Health Community Agents (HCA) of the
Family Health Strategy of the city of Montes Claros (MG) on ethics issues involved in their
professional practice and to identify the actions made to ensure that the given information
in the work will be confidential. It is characterized as a descriptive and qualitative study
having as the data collection techniques the semi-structured interviews whose participants
were 15 HCAs. The data analysis was guided by the Collective Subject Discourse (CSD).
The study revealed that all agents say that ethics is important in carrying out their function,
considering that the process of their work is based on a relationship of trust that occurs
between individuals who represent the scientific knowledge (team) and the popular
knowledge (families). In the know-how process of the agent, it was used three central
ideas (CI's) and CSD's to ensure confidentiality and credibility that are: CI1-. Demands for
questions related to health and illness are sent and discussed with members of the team,
especially for those who have the answers and solutions, CI-2 Personal demands are not
shared with the team and neither with other families; IC3- Appropriate registration with the
suitable destination of the data. Therefore, credibility and trust are essential conditions to
the interpersonal relation, and the ethical attitude is the found way to inspire credibility and
360
confidence that allow the agent to get into the intimacy of the family and perform his role of
team / community link.
Key Words: Ethics, Privacy, Community Healthcare Agent , Process Work; Family
Healthcare Strategy.
INTRODUÇÃO
A Estratégia Saúde da Família reconhece o contexto familiar como o espaço
privilegiado para as ações de saúde e define a atenção primária como o nível do sistema
de saúde que constitui a porta de entrada para todas as necessidades e problemas,
fornecendo atenção sobre a pessoa e sua família e representando o eixo orientador
determinante do trabalho dos demais níveis hierárquicos desse sistema
1
.
A família passa a ser o sujeito do processo saúde-doença, com a definição do
domicílio em um contexto social e histórico onde se constroem as relações intra e
extrafamiliares. No seio familiar, ocorre a luta permanente pela sobrevivência, pela
produção e reprodução e pela melhoria das condições de vida
2
.
Para compreender a dinâmica familiar, o profissional Agente Comunirio de Saúde
(ACS) exerce a função de elo de interlocução entre as famílias e o serviço de saúde, uma
vez que o mesmo faz parte da comunidade em que trabalha, representando a pedra
angular desse processo de mudanças. O ACS passa a ser o grande responsável pela
operacionalizão das atividades desenvolvidas pela equipe, sendo essencial na
organização da assistência, pois, pertencendo à própria comunidade que atende, vivencia
os problemas onde mora, conhece as famílias, estabelece um vínculo com as mesmas,
representando um elo entre a equipe e o usuário na construção do cuidado
3,4
.
Para exercer o papel de interlocução comunidade-equipe, é exigida do Agente
Comunitário de Saúde a obrigatoriedade de morar na área de atuação. Esse requisito
361
fundamenta-se na capacidade desse profissional de compreender de dentro os aspectos
comunitários, proporcionando a construção de vínculos interpessoais e o estabelecimento
de formas de comunicação aliadas à vivência do cotidiano com maior intensidade do que
os outros profissionais da equipe. Esses, ao finalizarem as suas atividades laborais,
retornam às suas residências localizadas em outros bairros, enquanto que os Agentes de
Saúde retornam para o ambiente comum de vida profissional e pessoal, e os usuários
assistidos no horário de expediente passam a ser vizinhos
5,6
.
O Agente Comunitário, durante o exercio de suas atividades, ao adentrar no
domicílio, estabelece relações interpessoais com os moradores e obtém dos membros
informações pessoais sobre a saúde individual e familiar, devendo garantir a privacidade
e o destino adequado dos dados revelados. Tais atitudes estão embasadas em princípios
éticos que determinam o que pode ser compartilhado com a equipe. Portanto, precisam
discernir quais dados podem ser compartilhados ou não, observando sempre o direito da
confidencialidade, garantindo a manutenção do segredo de todas as informações colhidas
no exercício da profissão
6,7
.
O presente estudo objetiva identificar a percepção dos Agentes Comunitários de
Saúde (ACS) da Estratégia Saúde da Família da cidade de Montes Claros/MG sobre os
princípios éticos que regulam o seu exercício profissional, bem como visa identificar as
ões realizadas para garantir a confidencialidade e a privacidade das informações
reveladas no processo de trabalho.
MATERIAIS E MÉTODOS
A metodologia qualitativa foi escolhida para se pesquisar a partir do ponto de vista
do sujeito, buscando amenizar a carência de material nessa perspectiva.
362
Optou-se, então, por entrevistar os Agentes Comunitários de Saúde das Equipes
de Saúde da Família da cidade de Montes Claros/MG, situadas no pólo urbano que
estivessem com mais de dois anos de experiência na profissão, apresentando, dessa
forma, uma maior relação de trabalho e vivências com a equipe e a comunidade.
Foram previstas inicialmente 32 entrevistas, ou seja, uma entrevista por equipe de
saúde da família, cada indivíduo sendo selecionado pelo número da respectiva microárea,
uma vez que cada Agente é representado por meros que coincidem em todas as
equipes cadastradas. E os informantes foram selecionados através de sorteio aleatório do
respectivo número da microárea, que foi o número 3, e também selecionada uma amostra
de reserva que foram as microáreas próximas aos números 2 e 4
8,9
.
Baseado no critério de saturação, ocorreu a repetição de informões sem novas
contribuições, o que resultou na realização de 15 entrevistas que ocorreram durante o ano
de 2008. Com o intuito de garantir uma representação do universo, optou-se por
entrevistar os sujeitos agrupados em equipes por regiões geográficas e tempo de
implantação da Estratégia, visando a verificar se os aspectos do processo de trabalho
dessa categoria são diferentes em decorrência da comunidade/território, solo e processo,
uma vez que os bairros em que as equipes estão implantadas são, na sua maioria,
periféricos, porém com condições socioeconômicas distintas, variando de locais
populosos a lugares com baixa densidade populacional com padrão social adequado. No
quesito tempo de implantação das equipes, optou-se por entrevistar equipes que se
encontravam em três fases: I- Recém-implantadas (ponto zero dois a quatro anos ); II-
Equipes com tempo Médio ( cinco a oito anos) e III- Equipes Antigas (nove a dez anos).
Dessa forma, as equipes representariam o amadurecimento e implementação da
Estratégia Saúde da Família na cidade de Montes Claros, favorecendo o processo de
363
triangulação na coleta de dados, garantindo maior confiabilidade e representatividade das
informações.
Os Agentes foram convidados a participar da pesquisa após esclarecimentos sobre
a mesma e assinatura do termo de consentimento. No presente artigo, são analisados os
aspectos éticos, norteados pelas seguintes questões abertas incluídas no roteiro de
entrevista: (1) O que você entende por ética? (2) Como você garante a privacidade do
usuário?
Foi realizada a validação do roteiro por meio de um estudo piloto, que tinha por
proposição a avaliação das questões e destaque de possíveis falhas na redação,
complexidade das questões, imprecisão na redação, queses desnecessárias ou pouco
informativas, portanto, que foram descartadas ou substituídas. O estudo piloto foi
realizado em Dezembro de 2007, com dois Agentes de Saúde pertencentes a equipes
que não foram incluídas na pesquisa, em decorrência de terem menos de dois anos de
experiência, e contou com a participação da orientadora do estudo, proporcionando uma
análise mais pormenorizada das perguntas.
As entrevistas foram realizadas pela pesquisadora auxiliada por dois acadêmicos
de graduação de enfermagem; os discursos foram gravados e transcritos na íntegra e
analisados antes da realização de uma nova entrevista.
A interpretação do material ocorreu à luz da Análise de Discurso do Sujeito Coletivo
(DSC), segundo o delineamento proposto por Lefèvre & Lefèvre
10, 11, 12, 13, 14
. O DSC
analisa as ideias centrais presentes nos discursos individuais, das quais se origina o
discurso coletivo, como se “o discurso de todos fosse o discurso de um”. Para subsidiar o
processo de reconstituição discursiva, utilizou-se o Software Qualiquantisoft desenvolvido
pela Sales e Paschoal Informática (2008).
364
Para atender aos aspectos éticos, foram respeitadas todas as diretrizes previstas
na Resolução 196/1996, do Conselho Nacional de Saúde, que preconiza as diretrizes e
normas de pesquisas envolvendo seres humanos
15
. O projeto de pesquisa foi
encaminhado para apreciação do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade
Estadual de Montes Claros (UNIMONTES), sendo aprovado com o Parecer
Consubstanciado nº. 880, em 23 de novembro de 2007. À coordenação das Equipes de
Saúde da Família do referido município foi solicitada a autorização prévia para a
realização da pesquisa, não sendo revelado nenhum dado isoladamente e tampouco a
decisão individual do informante de participar ou não da pesquisa.
A cada um dos entrevistados, foi demandado o consentimento expresso para
participar do estudo por meio da assinatura do Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido. Todos os entrevistados foram mantidos sob anonimato e os resultados
apresentados com a utilização de nomes de Anjos, uma vez que os Agentes são
considerados os Anjos da comunidade. Os nomes dos Anjos não têm relação com o
gênero, já que anjo não tem sexo.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Perfil dos Agentes
Dos 15 Agentes entrevistados, a maioria pertence ao nero feminino, perfazendo
87% com a prevalência da faixa etária acima de 27 anos, com uma pequena
concentração em maiores de 35 anos. Contudo, a análise de seus relatos revela que
desempenham a função de arcanjos de forma profissional e também pessoal, que a
maioria se encontra casada, com filhos, tendo que ser Anjos da guarda de sua família
consanguínea e comunitária.
365
No aspecto relacionado à escolaridade, 73% (11) têm o Grau completo,
atendendo ao requisito mínimo de escolaridade para ser Agente. Outro requisito
contemplado foi o tempo de residência na comunidade, constatando-se que a maioria
morava em sua comunidade de trabalho mais de 10 anos. Além disso, os resultados
revelam que 73% deles estavam envolvidos em atividades comunitárias, proporcionando
uma maior aproximão e conhecimento das famílias, facilitando a constrão da
credibilidade e da confiança essenciais para o processo de trabalho dessa categoria.
Quanto à opção pela função de Agente, embora a maioria tenha relatado uma
condição de desemprego antes de iniciar sua atividade laboral, revelaram, seja por
depoimento ou por atividades comunitárias prévias, o desejo de ajudar o próximo e a
comunidade, sugerindo uma motivação vocacional.
Aspectos éticos relacionados ao exercício profissional
Todos os Agentes afirmam que a ética é importantíssima na realização de sua
função, uma vez que o seu processo de trabalho fundamenta-se em uma relação de
confiança, que ocorre entre indivíduos que representam o saber científico (equipe) e o
saber popular (famílias).
A ética deve orientar a conduta dos homens em diversas situações, em especial no
exercício da profissão, já que os Agentes realizam suas atividades no ETHOS, ou seja, na
casa do homem, em que o domicílio é um espaço íntimo. Assim, faz-se necessária sua
autorização para entrar em suas vidas por meio da visita domiciliar, o que requer a
adoção de comportamentos que garantam os princípios éticos que subsidiam o
estabelecimento e o estreitamento de vínculo
16, 17
. O Agente Caliel (feminino, 27anos)
destaca essa questão por meio da expressão chave (E-CH): Vou falar pra ele, que ele
366
pode confiando em mim, né, porque eu sou profissional, e, o que aconteceu, o que ele
tá me relatando não vai sair, né do nosso meio.
Essa função de elo entre os saberes exige do Agente a confidencialidade, o sigilo
e, acima de tudo, a postura ética, como visualizado na E-CH do Agente Aniel (feminino,
39 anos), que representa a importância da ética: É uma das coisas que a pessoa tem
que ter, né, a questão da postura, uma postura ética, porque a gente ouve, vê muita
coisa, que né, que você viu e ouviu naquela casa, ficou lá, ou se for, né, se você tiver
que passar, dividir com alguém, é com o profissional, né, seu colega que vai te ajudar, no
caso é a enfermeira, mais assim pra outros jamais, né. A gente tem que ter essa postura
e tem que saber como lidar com a situação, com o problema, com as demais questões de
saúde, a gente ouve coisa muito íntima da pessoa, coisa assim, até segredos que você
tem que levar pra você, pro túmulo”.
No processo de saber-fazer do Agente, a credibilidade e a confiaa são condições
essenciais no estabelecimento das relações interpessoais; e a postura ética é o caminho
encontrado para inspirar essa credibilidade e confiança que permitem ao Agente entrar na
intimidade da família e realizar o seu papel de laço.
Os Agentes de Saúde destacam a importância de garantir o princípio ético da
privacidade e a necessidade de manter o sigilo e a confidencialidade, já que o seu fazer
fundamenta-se na escuta do outro, na interação humana e especialmente na confiança.
Dessa forma, atitudes moralmente reprováveis, como fofoca, devem ser
desencorajadas e repreendidas. Essa afirmativa também foi encontrada no estudo
realizado por Fortes; Spinetti
6
em que os profissionais pesquisados destacaram a
importância da garantia da privacidade.
A equipe de saúde deve garantir a confidencialidade e a privacidade das
informações reveladas no exercício profissional. Essa garantia é mais requerida para o
367
Agente Comunirio que vivencia o cotidiano da comunidade, por habitar a mesma
localidade, tornando-se essencial discernir o pessoal do profissional. É preciso distinguir
entre a sua inserção comunitária e a sua inserção institucional e saber lidar com os
segredos que o revelados. Para garantir a ética, faz-se necessária a construção de
metodologias que garantam a privacidade do usuário no tocante às informões pessoais,
aliadas a competências e saberes que os profissionais devem possuir,
instrumentalizando-os na implementação da assistência prestada às famílias
6
.
Uma das metodologias encontradas pelos Agentes de Saúde pesquisados para
efetivar essa postura ética com a garantia da privacidade é a seleção das informações
que devem ser compartilhadas com os membros da equipe e o destino adequado para as
devidas soluções, como destacado por meio de três Ideias Centrais (IC) e seus
respectivos DSC e ECh:
IC1- Demandas por dúvidas relacionadas à saúde e a doença são encaminhadas e
discutidas com os membros da equipe, especialmente para quem tem as respostas
e as soluções.
DSC1- Ah, é, é, é a pessoa é, é igual, é, se tem alguma coisa que vopode trazer
pra unidade, que você deve, que você tem que trazer, você deve trazer, em relação à
doença, quando você fica sabendo de alguma coisa, assim depende da pessoa que você
vai poder passar, no caso se for o médico, a enfermeira, você vai passar pra eles, pra ver
alguma resposta de algum é, é de alguma coisa que o paciente te perguntou, que você
às vezes não soube responder, que você tem que perguntar, depois informar pra ele de
novo, , em relação a pessoa que tá com uma dificuldade, que a gente pode a
ajudando alguma dúvida, entendeu? você vai falar aquilo que você pode falar, a coisa
368
que você pode falar; agora você trazer coisas pessoais, que as pessoas às vezes até
trata, morre com a gente, não é”.
Durante o exercício de suas atividades profissionais, os Agentes compartilham
algumas informões e devem discernir quais os dados que podem ser informados aos
demais membros da equipe subsidiadas na garantia da privacidade/intimidade contida na
vida privada, aliada à confidencialidade. As informações reveladas devem estar limitadas
àquelas essenciais ao exercício profissional na prestação da assistência ao cidadão,
garantindo os princípios éticos da beneficiência, não maleficiência e principalmente
respeito e veracidade
6, 7, 16
.
IC2- Demandas pessoais não são compartilhadas com a equipe e nem com outras
famílias.
DSC2- “A gente ouve coisa muito íntima da pessoa, o quê a pessoa me falar fica comigo
, tem coisas assim que nem para a enfermeira eu conto, nem para o médico; coisa
assim, até segredos que você tem que levar pra você, pro túmulo, morre com a gente,
não é? Quando eu chego em outra casa, eu chego lá, não comento nada que eu vi numa
casa. Acontece muito das pessoas chegar pra gente e contar casos da família ‘Aconteceu
isso, conta caso da vizinho’, passo na outra casa, faço de conta que não sei de nada”.
Os segredos revelados na intimidade das residências podem resultar em risco para
a vida dos Agentes e de suas famílias, que algumas revelações podem conter atos
ilícitos ou moralmente reprováveis. O fato de esses trabalhadores continuarem no local
em que trabalham após o expediente os expõe ao risco de violência, enquanto que os
demais profissionais, em especial os de nível superior, retornam às suas residências, que
estão distantes do seu lócus de trabalho
6
.
369
IC3- Registro adequado com o destino adequado dos dados.
ECH Miguel (Feminino, 32 anos) “Ah, dentro das fichas, né, notifica, no caso a gente
notifica e a ficha fica guardada direitinho e tal.
Assim, além da postura ética estabelecida durante a entrevista realizada no contato
com os moradores, outra forma de garantir a confidencialidade é por meio do registro,
com o destino adequado dos dados, com a garantia da manutenção do segredo de todas
as informações colhidas no exercício da profissão, já que o Agente passar a ser o
guardião dos segredos que lhe foram revelados
7
.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Agente de Saúde favorece a uma construção social de saúde e permite que a
experiência do cuidado seja uma prática do cotidiano com a co-responsabilização do
sujeito, promovendo uma atenção baseada no acolhimento, pois esse profissional traduz
para a equipe, através da visita domiciliar, a realidade da comunidade e seus modos de
vida, extrapolando a mera questão da doença. Também realiza o caminho inverso, traduz
para a comunidade o funcionamento e os serviços prestados pela equipe,
desempenhando, dessa forma, o relevante papel de intérprete de símbolos culturais,
como a interpretação técnico-científico-biomédica
5
.
A credibilidade e a confiança representam os pilares que sustentam o processo de
trabalho da Estratégia Saúde da Família, tendo o Agente como interlocutor e facilitador da
criação de vínculos, porém qualquer situação que coloque em dúvida a credibilidade
desse profissional atrapalha e impossibilita o estabelecimento de um canal de
comunicação comunidade-equipe.
370
Isso posto, a credibilidade e a confiança podem ser conquistadas por meio da
postura ética, que representa o caminho que permite ao Agente entrar na intimidade da
família e realizar o seu papel de elo equipe/comunidade.
O cuidar, as interações humanas e os princípios éticos não devem ser
negligenciados durante o exercício da profissão; e a ética é apresentada como formadora
da consciência individual e coletiva para a obtenção de uma assistência de qualidade.
Pode-se perceber que as relações estabelecidas por meio do diálogo e da empatia
o caminhos que devem ser trilhados por todos os homens, em especial pelo Agente
Comunitário de Saúde, que alicerça seu processo de trabalho na comunicação, no
cuidado, na mobilização comunitária e na ação/reflexão permeado pela ética e a bioética.
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serviços, tecnologia. Brasília: UNESCO, Ministério da Saúde, 2002.
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como superação dos impasses no processamento de respostas a questões abertas. 2006.
Disponível em http://www.ipdsc.com.br. Acessado em: 08/03/2007.
372
11. LEFÈVRE, Fernando; LEFÈVRE, Ana Maria Cavalcanti. O discurso do sujeito coletivo
como expressão narrativa da quantidade. 2006a. Dispovel em http://www.ipdsc.com.br.
Acessado em: 08/03/2007.
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13. LEFÈVRE, Fernando; LEFÈVRE, Ana Maria Cavalcanti. O discurso do sujeito coletivo:
um novo enfoque em pesquisa qualitativa (desdobramento). 2. ed. Caxias do Sul: Educs,
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14. LEFÈVRE, Fernando; LEFÈVRE, Ana Maria Cavalcanti. Depoimentos e Discursos:
uma proposta de análise em pesquisa social. Brasília: Líber Livro Editora, 2005a. 97 p.
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373
ARTIGO 2
A PERCEPÇÃO DOS AGENTES COMUNITARIOS DE SAÚDE DA CIDADE DE
MONTES CLAROS/MG ACERCA DA FORMAÇÃO DO AGENTE ENQUANTO
AUXILIAR DE ENFERMAGEM
THE PERCEPTION OF THE HEALTH COMMUNITY AGENTS IN THE CITY OF
MONTES CLAROS / MG ON THE TRAINING OF THE AGENT AS A NURSING
ASSISTANT.
RESUMO
Este estudo objetiva identificar a percepção dos Agentes Comunitários de Saúde (ACS)
da Estratégia Saúde da Família da cidade de Montes Claros sobre a formão profissional
enquanto auxiliar de enfermagem. Caracteriza-se como estudo qualitativo e descritivo,
tendo como técnica de coleta de dados a entrevista semiestruturada cujos participantes
foram 15 ACS. A análise dos dados foi orientada pelo Discurso do Sujeito Coletivo (DSC).
O estudo revelou um número significativo de Agentes Comunitário de Saúde, no total de
10 (67%) que possuem o curso auxiliar de enfermagem, sendo que 60% dos mesmos
ingressaram no curso por meio do PROFAE e os demais (40%) afirmam que o fato de
possuírem anteriormente o curso profissional em enfermagem promoveu a motivação
para ser Agente Comunitário. No aspecto relacionado à profissionalização dos Agentes
Comunitários na área de enfermagem, os sujeitos do estudo destacaram duas ideias
centrais e seus DSC’s e ECH que são: IC1- Ser auxiliar de enfermagem proporciona ao
Agente a maior resolutividade e valorização perante a comunidade que anseia pelas
atividades curativas; IC2- Ser auxiliar de enfermagem traz mais benefícios no aspecto
individual do que no coletivo. Essas duas ideias centrais originam-se no fato de o
374
reconhecimento profissional do Agente de Saúde ter ocorrido tardiamente, resultando
numa indefinição de conhecimentos e competências necessárias para o exercício
profissional, levando os Agentes a identificarem-se com a categoria profissional de
enfermagem que possibilita valorização e visibilidade, que as ações biomédicas
permitem a aproximão e a identificação dos Agentes como representantes da instituição
de saúde, afastando-os da identidade comunitária e permitindo um diferencial com os
moradores, que são seus vizinhos e conhecidos.
DESCRITORES: Auxiliar de Enfermagem; Agente Comunitário de Saúde; Processo de
Trabalho; Saúde da Família.
ABSTRACT
This study aims to identify the perception of The Health Community Agents of the Family
Health Strategy in the city of Montes Claros about the professional training as a nursing
assistant. It is characterized as a descriptive and qualitative study having as the data
collection techniques, the semi-structured interviews, whose participants were 15 ACS.
The data analysis was guided by the Collective Subject Discourse (DSC). The study
revealed a significant number of health community agents, in total 10 (67%) that have the
nursing assistant course, where 60% of those, enrolled in the course through PROFAE,
and other (40%) report the fact that they had attended the professional nursing course
previously, was a great motivation to be a community agent. In the aspect related to the
professionalization of community agents in the area of nursing, people participating of the
study highlighted two central ideas and their DSC and ECH that are: IC1 - Being a nursing
assistant provides the agent a better resolution and appreciation in the community that is
anxious for healing activities. IC - 2 Being a nursing assistant brings more benefits in the
individual aspect than in the collective one. These two central ideas are originated in the
375
fact of the professional acceptance of the health agent has been occurred lately resulting
in a lack of knowledge and skills necessary for the professional exercise and leading the
agents to identify themselves with the profession category of nursing that allows recovery
and visibility , since the biomedical approach and the identification of the agents as
representatives of the health institution keep them away from the identity of the
community so allowing a differential action with the residents, who are their neighbors and
acquaintances.
KEY WORDS: Nursing Assistant; Health Community Agent; Work Process; Family
Health.
INTRODUÇÃO
A formação profissional deve ser valorizada e reconhecida como um dos pilares
para a garantia da excelência da qualidade da assistência em saúde. Diante disso, houve
a necessidade de elevar a escolaridade dos Agentes, com o aumento da autonomia
intelectual associada à caracterização do perfil de desempenho desejado. O caminho
para atingir essas metas dá-se por meio da educação profissional, que consiste em
integrar a educação ao trabalho e ao saber tecnológico, levando ao constante
desenvolvimento de habilidades essenciais ao processo produtivo e social
1, 2, 3
.
O PROFAE (Projeto de Profissionalização dos Trabalhadores da Área de
Enfermagem) foi instituído em 1999, em resposta à desqualificação e à irregularidade de
alguns profissionais da saúde que realizavamões próprias da enfermagem sem a
habilitação técnica para a mesma, desrespeitando a Lei do Exercício Profissional de
Enfermagem (Lei Federal 7.498/86) e colocando em risco a qualidade da assistência
prestada à população
4
.
376
O Ministério da Saúde, em parceria com o Ministério da Educação e Ministério do
Trabalho, implementaram o PROFAE, que tinha como missão a profissionalização na
área de enfermagem, com a posterior melhoria da qualidade dos serviços de saúde, com
o intuito de atingir cerca de 225 mil auxiliares e 90 mil cnicos de enfermagem,
constituindo-se uma política blica para a qualificação da força de trabalho da área de
enfermagem no Brasil, que, posteriormente, foi estendido aos Agentes Comunitários de
Saúde
4,5
.
Nesse contexto, esses profissionais foram capacitados na perspectiva de atender
algumas competências, compreendida como a capacidade de ão frente ao fazer e não
mais concebida como estoque de conhecimento, passando a ser centrada no trabalho em
saúde, que se expressa na capacidade de cuidar do outro de forma profunda,
conhecendo suas necessidades e o modo de vida, colocando-se a disposição do ser
humano no âmbito do conhecimento e da ação necessárias à prevenção e à solução dos
problemas de saúde
1, 5, 6
.
Entretanto, a formação profissional em auxiliar de enfermagem e o como Agente
Comunitário de Saúde especificamente gerou uma série de dúvidas e questionamento,
especialmente no tocante ao exercício das atividades laborais e o possível
desvirtuamento de atribuições, passando a centralizar as ões nas atividades
consideradas curativas, como retirada de pontos, verificação da pressão arterial e não
mais centrada na escuta, no diálogo com a comunidade, com o intuito de identificar as
necessidades locais, executando ações de promoção da saúde e a prevenção de
doenças.
Assim, o presente estudo objetiva identificar a percepção dos Agentes
Comunitários de Saúde (ACS) da Estratégia Saúde da Família da cidade de Montes
Claros/MG sobre a formão profissional enquanto auxiliar de enfermagem.
377
MATERIAIS E MÉTODOS
A metodologia qualitativa foi escolhida para se pesquisar a partir do ponto de vista
do sujeito, buscando amenizar a carência de material nessa perspectiva.
Optou-se, então, por pesquisar os Agentes Comunitários de Saúde das Equipes de
Saúde da Família da cidade de Montes Claros - MG, situadas no pólo urbano que
estivessem com mais de dois anos de experiência na profissão, apresentando, dessa
forma, uma maior relação de trabalho e vivências com a equipe e a comunidade.
Foram previstas inicialmente 32 entrevistas, ou seja, uma entrevista por equipe de
saúde da família, cada indivíduo foi selecionado pelo número da respectiva microárea,
uma vez que cada Agente é representado por números que coincidem em todas as
equipes cadastradas. E os informantes foram selecionados através de sorteio aleatório do
respectivo número da microárea, que foi o número 3 e também selecionado uma amostra
de reserva que foram as microáreas próximas, os números 2 e 4
7,8
.
Baseado no critério de saturação, ocorreu a repetição de informões sem novas
contribuições, ocasionando a realização de 17 entrevistas que ocorreram durante o ano
de 2008. Com o intuito de garantir uma representação do universo, optou-se por
entrevistar os sujeitos agrupados em equipes por regiões geográficas e tempo de
implantação da Estratégia, visando a verificar se os aspectos do processo de trabalho
dessa categoria são diferentes em decorrência da comunidade/território, solo e processo,
uma vez que os bairros em que as equipes estão implantadas são, na sua maioria,
periféricos, porém com condições socioeconômicas distintas, variando de locais
populosos a lugares com baixa densidade populacional com padrão social adequado. No
quesito tempo de implantação das equipes, optou-se por entrevistar equipes que se
encontravam em três fases: I- Recém-implantadas (ponto zero dois a quatro anos); II-
Equipes com tempo Médio ( cinco a oito anos) e III- Equipes Antigas (nove a dez anos).
378
Dessa forma, as equipes representariam o amadurecimento e implementação da
Estratégia Saúde da Família na cidade de Montes Claros, favorecendo o processo de
Triangulação na coleta de dados, garantindo maior confiabilidade e representatividade
das informões.
Foram submetidos à entrevista semi-estruturada, com a seguinte questão aberta:
(1) Qual a sua percepção acerca do Agente Comunitário de Saúde ter formação como
auxiliar de enfermagem?
Foi realizada a validação do roteiro por meio de um estudo piloto que tinha por
proposição a avaliação das questões e destaque de possíveis falhas na redação,
complexidade das questões, imprecisão na redação, queses desnecessárias ou pouco
informativas, portanto que podem ser descartadas ou substituídas. Esse estudo piloto foi
realizado em Dezembro de 2007 com dois Agentes de saúde pertencentes a equipes que
não foram incluídas na pesquisa em decorrência de ter menos de dois anos de existência
e contou com a participação da orientadora do estudo, proporcionando uma análise mais
pormenorizada das perguntas.
As entrevistas foram realizadas pela pesquisadora, auxiliada por dois acadêmicos
de graduação de enfermagem; os discursos foram gravados, transcritos na íntegra e
analisados pelo pesquisador antes de realizar uma nova entrevista.
A interpretação do material ocorreu à luz da Análise de Discurso do Sujeito Coletivo
(DSC), seguindo os ensinamentos de Lefèvre & Lefèvre
9, 10, 11, 12, 13
tendo em vista que as
ideias centrais presentes nos discursos individuais deram origem ao discurso coletivo
como se o discurso de todos fosse o discurso de um. Para subsidiar o processo de
reconstituição discursiva, utilizou-se o Software Qualiquantisoft desenvolvido pela Sales e
Paschoal Informática (2008).
379
Para atender aos aspectos éticos, foram respeitadas todas as diretrizes previstas
na Resolução 196/1996, do Conselho Nacional de Saúde, que preconiza as diretrizes e
normas de pesquisas, envolvendo seres humanos
14
. O projeto de pesquisa foi
encaminhado para apreciação do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade
Estadual de Montes Claros (UNIMONTES), sendo aprovado com o Parecer
Consubstanciado 880, em 23 de novembro de 2007. À coordenação das Equipes de
Saúde da Família do referido município foi solicitada a autorização prévia para a
realização da pesquisa, não sendo revelado nenhum dado isoladamente e tampouco a
decisão individual do informante de participar ou não da pesquisa.
A cada um dos entrevistados, foi demandado o consentimento expresso para
participar do estudo por meio da assinatura do Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido. Todos os entrevistados foram mantidos sob anonimato e os resultados
apresentados com a utilização de nomes de Anjos, uma vez que os Agentes são
considerados os Anjos da comunidade. Os nomes dos Anjos não têm relação com o
gênero, já que anjo não tem sexo.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Um aspecto a ser destacado é o número significativo de Agentes Comunitário de
Saúde, no total de 10 (67%) que possuem o curso auxiliar e cnico de enfermagem,
sendo que 60% dos mesmos ingressaram no curso por meio do PROFAE, e os demais
(40%) afirmam que o fato de possrem anteriormente o curso profissional em
enfermagem promoveu a motivação para ser Agente Comunitário, o que vem ao encontro
de várias perspectivas não restritas apenas ao campo financeiro, indo muito além da mera
busca por emprego, ou seja, busca a promoção do encontro do seu Ser no mundo e Ser
380
com os outros, objetivando a sua valorização pessoal e profissional; como expresso na
Ideia Central (IC) e seu respectivo DSC.
IC1 - Oportunidade de emprego na área da saúde.
DSC1- “Eu fiz o auxiliar e o técnico de enfermagem, surgiu a oportunidade, eu já tava
na área da saúde, e aproveitei a oportunidade eu que o tava trabalhando; aí, como é
pra gente, e aí ser na área de saúde, é claro, vou tentar, aí que tentei”.
O processo seletivo representou uma oportunidade de ingressar na área de saúde,
que passaram a desenvolver suas atividades de enfermagem dentro do sistema de
saúde, porém não na função espefica de auxiliar de enfermagem da equipe de saúde, e
sim como Agente Comunitário de Saúde que realiza atividades de enfermagem, como
medida de pressão arterial, curativo, retirada de pontos, administração de medicamentos
injetáveis, glicemia capilar.
No aspecto relacionado à profissionalizão dos Agentes Comunitários na área de
enfermagem, os sujeitos do estudo destacaram duas ideias centrais e suas respectivas
DSC’s e ECH.
IC1- Ser auxiliar de enfermagem proporciona ao Agente a maior resolutividade e
valorização perante a comunidade que anseia pelas atividades curativas.
DSC- “Não falo muito de perfil, porque a pessoa não nasce com perfil, ele adquire no
conhecimento, então muitas vezes se um técnico de enfermagem fosse um Agente talvez
o serviço dele seria mais completo, , as dificuldades que nós temos bastante como
Agente que eu sinto que a maioria dos meus colegas tamm reclama a mesma coisa é
a questão do, do da pressão, o ponto maior que a gente tem hoje no serviço é a medida
381
de pressão, né. Então o Agente não pode medir, eu acho se ele tivesse um, um curso
uma capacitação que o Agente pudesse, resolveria 50% dos problemas da comunidade,
muitas vezes a comunidade chega aqui faz aquele volume de gente aqui, pra poder
medir a pressão, muitas vezes tem curativo, tem vacina, tem uma coisa pra toma. Então
eu acho que se o Agente pudesse essa vazão no, no serviço eu acho que a visão do
serviço seria muito melhor; você tem mais, é, é capacidade de tá ajudando a comunidade.
Por exemplo na minha área tem mais 30 hipertensos, né, os meus hipertensos eles não
o acompanhados todo mês pra medir a pressão, o pessoal fica em casa esperando, o
auxiliar não pode sair da unidade, o Agente de Saúde vai e não pode medir; se o Agente
de Saúde pudesse medir, o usuário não precisaria sair de casa”.
Os Agentes de Saúde procuram alternativas em relação à profissionalização.
Nesse caso, o curso de auxiliar de enfermagem apresenta-se como oportunidade de
continuidade dos estudos aliado à formação profissional com resolutividade,
proporcionando valorizão e visibilidade, que as ações biomédicas permitem a
aproximação e a identificação dos Agentes como representantes da instituição de saúde,
afastando-os da identidade comunitária e permitindo um diferencial com os moradores,
que são seus vizinhos e conhecidos
15,16
.
Dessa forma, os Agentes tornam-se bridos que pertencem a duas categorias: a
de Agente Comunitário de Saúde e a de uma categoria ocupacional pertencente, ainda
que não legitimamente, ao grupo de enfermagem
15
.
IC2- Ser auxiliar de enfermagem traz benefícios mais no aspecto individual do que
no coletivo.
382
ECH Sitael (Feminino, 37 anos) A gente tem mudado muito, mas por oportunidades
melhores, né, o único que saiu porque não teve perfil foi o primeiro Agente de Saúde
daqui. Agora saiu vários outros, mas porque conseguiu outro emprego, uma Agente
saiu pra fazer o técnico, C. saiu agora porque passou na seleção, tá indo pro São Geraldo
II. Então, a maioria dos Agentes que saiu foi os Agentes que fizeram o curso técnico, e
então o curso técnico favoreceu eles mais na questão pessoal e então o curso cnico
acabou sendo um prejuízo para o Agente e bom pro indivíduo; e surgindo a oportunidade
acho que vão mesmo”.
Outro aspecto destacado foi o curso de auxiliar de enfermagem como estimulador
da rotatividade nas Equipes de Saúde da Família, os egressos das equipes são
motivados pela busca de melhoria técnica, melhores condições salariais, estabilidade e
ascensão profissional com a busca de novas oportunidades sendo mais importante para o
Agente de maneira individual do que para a estratégia saúde da família
16
.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os Agentes de Saúde pesquisados divergem com relação ao desempenho de
atividades relacionadas a assistência de enfermagem; alguns defendem a necessidade de
formação e de valorização profissional alcançada por meio da profissionalização na área
de enfermagem. Enquanto outros destacam que essa profissionalização contribui para o
êxodo da Estratégia Saúde da Família, uma vez que abre perspectivas futuras em outra
área de atuação.
383
Essa divergência origina-se no fato do Agente de Saúde, durante um período de 10
anos, não ter sido reconhecido enquanto profissão, originando uma indefinição de
conhecimentos e competências que norteiam a categoria profissional e a sua qualificação.
A profissionalização dos Agentes Comunitários no ano de 2002, por meio da Lei
10.507 e as especificidades deste trabalhador associada às novas perspectivas da
educação profissional e suas diretrizes curriculares no Brasil, motivou o Ministério da
Saúde a definir o Perfil de Competências Profissionais do Agente Comunitário de Saúde e
a exigir a realização do Curso Técnico devel médio, com o intuito de valorizar a
formação desses profissionais, adequando aos princípios do SUS por meio de
aprendizagens significativas, reflexão crítica e criativa com vínculo educação-trabalho
para a promão da melhoria dos indicadores de saúde, com vistas à resolutividade da
rede de atenção e humanização da assistência
1
.
Portanto, os profissionais da saúde precisam ser capazes de atuar de forma
interdisciplinar e intersetorial em busca da melhoria dos indicadores de saúde, que
somente serão alcançados por meio da qualificação profissional, com a elevação da
escolaridade e autonomia intelectual que contempla o saber-conhecer, capacidade de
planejar, trabalhar em equipe, implicações éticas
5,6
.
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técnico de Agente Comunitário de Saúde: área profissional saúde. Brasília: Ministério da
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núcleos de saúde da família em Ribeirão Preto - São Paulo. 2004. 154f. Dissertação de
Mestrado Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo,
Ribeirão Preto, 2004.
387
PRODUTOS ALCANÇADOS II
Além da produção dos artigos científicos, também ocorreram comunicações publicadas em
Anais de Eventos Científicos, conforme quadro:
QUADRO 9- DISTRIBUIÇÃO DOS RESUMOS PUBLICADOS EM ANAIS DE EVENTOS
CIENTÍFICOS.
RESUMO EVENTO
O AGENTE COMUNITÁRIO DE SDE:
INVESTIGANDO O SEU PERFIL E O SEU
PAPEL NA ESTRATÉGIA SAÚDE DA FAMÍLIA
DA CIDADE DE MONTES CLAROS – MG.
III Mostra Cientifica de Enfermagem
da Universidade Estadual de Montes
Claros - UNIMONTES, 2008.
A ÉTICA DO AGENTE COMUNITÁRIO DE
SAÚDE: UM ESTUDO NO MUNICIPIO DE
MONTES CLAROS/MG.
IV Mostra Cientifica de Enfermagem;
I Semana Unificada da Saúde da
Universidade Estadual de Montes
Claros - UNIMONTES, 2009.
PERCEPÇÃO DA COMUNIDADE SOBRE O
TRABALHO DO AGENTE NA PERSPECTIVA
DO AGENTE COMUNITÁRIO DE SAÚDE DO
MUNICIPIO DE MONTES CLAROS/MG.
IV Mostra Cientifica de Enfermagem;
I Semana Unificada da Saúde da
Universidade Estadual de Montes
Claros - UNIMONTES, 2009.
AGENTES COMUNITÁRIOS DE SAÚDE: A
PERCEPÇÃO DO PROPRIO PROCESSO DE
TRABALHO NA ESTRATÉGIA SAÚDE DA
FAMÍLIA DO MUNICIPIO DE MONTES
CLAROS/MG.
IV Mostra Cientifica de Enfermagem;
I Semana Unificada da Saúde da
Universidade Estadual de Montes
Claros - UNIMONTES, 2009.
388
CAPITULO VI
____________________________________________________________
DE TUDO FICARAM
TRÊS COISAS:
A certeza de que
estamos sempre
começando,
A certeza de que é
preciso
continuar,
E de que seremos
interrompidos
antes de
terminar.
389
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A questão central deste estudo foi motivada pela busca de saber “Quem é o Agente
Comunitário de Saúde da cidade de Montes Claros“, contribuindo para uma reflexão
acerca da identidade e do processo de trabalho desse profissional, a partir de sua própria
perspectiva. A investigação foi orientada pelo documento do Ministério da Saúde
“Referencial curricular para curso técnico de Agente Comunitário de Saúde: área
profissional.” (BRASIL, 2004), que propõe quatro dimensões norteadoras do perfil e a
qualificação profissional dos Agentes, caracterizadas como: Saber Ser, Saber Conhecer,
Saber Fazer e Saber Conviver.
Denominados, metaforicamente, no estudo, como Anjos, os dados contrariam o
argumento de que anjo não tem sexo e nem idade, pois os Agentes da Estratégia Saúde
da Família da cidade de Montes Claros são, em maioria, do gênero feminino,
prevalecendo a faixa etária acima de 27 anos com uma pequena concentração em
maiores de 35 anos. Contudo, a análise de seus relatos revela que desempenham a
função de arcanjos de forma profissional e também pessoal, já que a maioria SE encontra
casada, com filhos, tendo que ser anjos da guarda de sua família consanguínea e
comunitária.
No aspecto relacionado à escolaridade, 73% (11) têm o Grau completo,
atendendo ao requisito mínimo de escolaridade para ser Agente, exigido pela Lei Federal
10.507 de 2002. Outro requisito contemplado foi o tempo de residência na comunidade,
constatando-se que a maioria morava em sua comunidade de trabalho mais de 10
anos. Além disso, os resultados revelam que 73% deles estavam envolvidos em
atividades comunitárias, proporcionando uma maior aproximação e conhecimento das
390
famílias, facilitando a construção da credibilidade e da confiança essenciais para o
processo de trabalho dessa categoria.
Quanto à opção pela função de Agente, embora a maioria tenha relatado uma
condição de desemprego antes de iniciar sua atividade laboral, revelaram, seja por
depoimento ou por atividades comunitárias prévias, o desejo de ajudar o próximo e a
comunidade, sugerindo uma motivação vocacional.
As dimensões norteadoras do estudo (Saber Ser, Saber Conhecer, Saber Fazer e
Saber Conviver) mostraram-se potentes analisadores, permitindo identificar as
potencialidades do Agente, bem como seus limites, mas, sobretudo, o quão este
profissional é exigido em relação às qualidades pessoais e papeis que o tornam um ser
idealizado, distanciando o real do possível. Nesta análise final, tais dimensões servirão de
base para o diálogo com a literatura, embora se encontrem relacionadas e se entrelacem
naquilo que define a percepção do Agente sobre si mesmo.
Em relação ao saber ser, percebe-se um conflito entre o ideal desenhado nos
documentos oficiais e a realidade da vida de cada um. Os atributos pessoais requeridos
o numerosos, destacando-se a importância da capacidade de enfrentar situações, a
iniciativa, a responsabilidade, capacidade critica, ética reflexiva, visando à mudança ativa
em si mesmo e em suas vivências e nas suas práticas (BRASIL; 2004a, p.9). Como
comenta Tomaz (2002), percebe-se a “supereroização” e a “romantização” do ACS, o que
tem sido a nica dos textos oficiais. No presente estudo, os discursos analisados
evidenciam essa “supereroização” e visão “romântica” correspondente ao que lhes é
exigido cotidianamente. Os relatos demonstram que as atitudes relacionais o aquelas
que mais conferem valor ao Agente, a despeito das exigências do saber fazer, em que o
valor está colocado nas competências adquiridas como próprias da função de cuidado da
saúde que lhes é requerida.
391
No entanto, segundo os depoimentos dos próprios Agentes, observa-se a
descrição exarcebada do ser Agente que deve possuir atitudes como ser ético, ter
respeito, ter responsabilidade, ter paciência, aliadas a atributos pessoais, como a
capacidade de comunicação e relacionar, e a atributos profissionais, como ser elo e
conhecedor das famílias e da comunidade. Deles é requerida a realização das ações
voltadas ao próximo, à família e à comunidade que resultem em repercussões positivas
por meio do estreitamento das relações interpessoais, levando-os a sentirem-se como
membros das famílias atendidas, evitando as repercussões negativas, como a
incompreensão do processo de trabalho.
A ideia de ser Agente de Saúde confunde-se com as qualidades e valores que esse
profissional deve possuir para exercer o seu papel de laço equipe-comunidade e estão
centrados no eixo do relacionamento interpessoal, embasado na humanizão, na
perseverança e na ética. Essas qualidades são reforçadas a partir da identificação dos
atributos negativos que esse sujeito deveria evitar, como atitudes negativas prejudiciais
ao estabelecimento de confiança entre as duas pontas do laço, uma vez que confiança é
o pilar do processo de trabalho desse profissional. As atitudes negativas que devem ser
evitadas contemplam a falta de ética, a irresponsabilidade, a desumanizão, despreparo
no estabelecimento do diálogo e no processo de educação em saúde.
Percebemos, por meio da identificação do ser Agente e das qualidades que os
Agentes de sde pesquisados incorporaram, uma figura de profissional idealizado, que
deve ser um exímio comunicador, capaz de estabelecer as relações interpessoais de
maneira ética. Essas características devem emanar do próprio sujeito, que o mesmo é
revelado dentro da comunidade para desenvolver o papel de um Agente educador e
transformador, capaz de lidar com os problemas cotidianos. Isso nos faz questionar se
existe esse profissional ideal, uma vez que nas outras profissões, primeiro realiza-se a
392
formação anterior ao exercício profissional. No caso do Agente Comunitário de Saúde, o
caminho tem sido oposto: primeiro inicia-se a atividade laboral e depois se desenvolve a
qualificação profissional. O nível de exigência requerido é grande, pois no momento em
que inicia as suas atividades, já lhe são exigidas algumas atitudes, habilidades e atributos
para o desenvolvimento de suas atividades na comunidade.
Os aspectos facilitadores do processo de trabalho estão interligados ao ideal do ser
Agente, requerendo qualidades e valores positivos aliados à presença de atitudes da
comunidade, demandando como resultado uma relação efetiva e eficazmente construída.
Outro aspecto mencionado como facilitador de um trabalho bem sucedido relaciona-se a
uma diretriz própria da Estratégia Saúde da Família, que é trabalhar em uma área
geográfica adscrita, centrada no trabalho em equipe de forma interdisciplinar, aliado à
presença do Agente administrativo.
Os Agentes destacam que a compreensão da saúde como ausência de doenças
representada pela valorização das atividades curativas, em especial a marcação de
consulta, associada a aspectos socioeconômicos e geográficos inerentes à comunidade e
à ausência de trabalho interdisciplinar dificultam a implementação do processo de
trabalho centrado na promão e prevenção de doenças, com vistas à inversão do
modelo assistencial.
O aspecto referente à marcação de exames e agendamento de consultas
descaracteriza o papel do Agente preconizado pelos documentos do Ministério da Saúde
associado a uma valorização do modelo médico-privatista, em que os usrios levam em
consideração boa assistência ao uso de tecnologias duras com exames cada vez mais
complexos e desvalorizam as tecnologias leves centradas nos atos humanos - escuta,
acolhimento e relações interpessoais, gerando insatisfação quando ocorre o não
393
atendimento dessas solicitações centradas na doença, o que dificulta o processo de
trabalho dos Agentes de Saúde e resulta em sofrimento profissional.
Para efetivar o papel de promotor da saúde e Agente educador, os sujeitos
propõem algumas modificações que o, ao mesmo tempo, expectativas: (1) Visita
domiciliar que deixaria de ser obrigatória, de forma indiscriminada e passaria a ser
pautada no princípio da equidade - centrada na real necessidade das famílias - aliada a
não comprovação por meio da assinatura do morador, evitando a compreensão reduzida
do Agente como mero caça-assinatura, uma vez que a relação com as famílias deve ser
pautada em vínculo de confiança e credibilidade. Tamm se referem à necessidade de
diminuir o número de famílias adscritas; (2) Supressão da Função de Marcador de
Consulta e Exames, evitando a compreensão reduzida do papel do Agente como
secretário da comunidade, o que gera insatisfação e a responsabilizão pela
organização, funcionamento e resolutividade do sistema de saúde; (3) Não organização
da equipe de maneira hierárquica, e sim de forma interdisciplinar, garantindo o trabalho
em equipe com apoio para o desenvolvimento das atividades, em especial as educativas;
principalmente a educação permanente em saúde; (4) Substituir os vínculos precários
pela efetivação, garantindo os direitos trabalhistas, com melhoria salarial; (5) Valorização
profissional proporcional à responsabilidade e ao processo de trabalho, com
reconhecimento tanto no âmbito financeiro quanto no social, rompendo com a visão do
Agente como classe menos favorecida, aliado à organização enquanto categoria
profissional.
No final da realização das entrevistas, no mês de agosto, o desejo por estabilidade
foi finalmente alcançado através da efetivação dos Agentes Comunitários de Saúde com o
cumprimento da EC 51, passando a ser a única categoria dentro da ESF de Montes
Claros que é efetiva, enquanto os demais profissionais o contratados, sem segurança
394
nem garantia de estabilidade. Dessa forma, os ACS passam a ser, administrativamente, a
classe mais favorecida.
Outro aspecto a ser considerado es no fato de o Agente Comunitário de Saúde
viver em constante tensão e conflito dentro de seu processo de trabalho, ocasionado por
dois campos de força antagônicos. Tais opostos foram descritos por Ferreira et al. (2009),
que destaca, de um lado, o campo guiado pelo cuidado e criatividade do ACS, aspectos
fundamentais na elaboração de projetos terapêuticos, contextualizados no território
processo e domicílio e no contato com os usuários centrado nas tecnologias leves e
relacionais. Do outro lado, predomina a racionalidade instrumental, centrada no modelo
biomédico, normatizado e estruturado por um saber técnico, representado pelo modelo
programático e o cronograma que permeiam o seu processo de trabalho.
O saber-conhecer deve instrumentalizar os profissionais no seu fazer cotidiano e,
para atingir esse objetivo, deve ocorrer um processo de educação permanente, que seja
constante e dinâmico, permitindo atender as reais necessidades da comunidade
identificadas pelo Agente de Saúde no seu fazer diário. O processo educativo proporciona
à equipe, em especial ao Agente de Saúde, a apropriação de um domínio de
conhecimentos técnicos, mas também de habilidades de negociação, que a escolha
dos temas baseia-se principalmente na prática cotidiana dos Agentes de Saúde por meio
do levantamento das dificuldades vivenciadas, vidas da comunidade, necessidades
locais e situações epidemiológicas.
Um aspecto que deve ser destacado é o desconhecimento dos Agentes de Saúde
sobre os princípios do SUS, já que essa profissão só existe no seio desse sistema. Soma-
se a esse aspecto, a necessidade de conhecer a filosofia que deve nortear sua práxis
profissional; esse fato nos faz questionar: (1) Qual a filosofia que subsidia o processo de
395
trabalho do Agente? (2) Por que os Agentes não conhecem, tendo em vista que o sistema
de saúde na esfera municipal e estadual é responsável pela sua formação e qualificação?
Na dimensão saber-fazer, algumas atribuições referidas pelos ACS participantes da
pesquisa condizem com as atribuições fixadas na legislação, como visita domiciliar,
atividades educativas coletivas, orientações/aconselhamento comunitário,
acompanhamento das famílias e de grupos específicos, acolhimento/ouvir a comunidade,
promoção da saúde e atividades comunitárias, ser elo e trabalho em equipe; enquanto
outras não estão condizentes como atividades interno-administrativas, recepção,
farmácia, marcação de consulta, entrega de encaminhamentos e exames, avisar consulta
e atividades de técnico de enfermagem, como fazer curativos e medir a pressão arterial.
As atividades que não estão contempladas nas atribuições e na qualificação
profissional em técnico em Agente Comunitário ocasionam valorização das atividades
curativas e de caráter biomédico e desvirtuam o papel de Agente, ocasionando
sobrecarga, sofrimento e insatisfação popular.
O saber-conviver está expresso na relação com a equipe e com a comunidade e na
interação equipe-comunidade, que se pauta nas habilidades relacionais que se
entrelaçam ao saber ser, pois exige algumas atitudes e atributos pessoais e profissionais.
Diante dessas dimensões, percebemos que são demandadas aos Agentes muitas
exigências, queo desde o campo profissional até o pessoal, sendo necessário atender
a tantos requisitos e conflitos, inclusive os seus próprios, de sua vida e de sua saúde.
Essas exigências, somadas à difícil tarefa de reorganizar a atenção à saúde, não
podem estar somente a cargo do Agente de Saúde, pois geram angústia e sofrimento,
tornando o Agente incapaz de atender a tantos requisitos e conflitos, sobrecarregando a
sua saúde e de sua família.
396
As indagações e constatações resultantes deste estudo possibilitaram conhecer
alguns elementos relevantes para a reflexão sobre a identidade e o processo de trabalho
do Agente Comunitário de Saúde, promovendo a confrontação da práxis, que é geradora
de signos e significados que permitem o pensar individual e/ou coletivo, capaz de
transformar e fazer do mesmo um ser crítico e criativo promotor da (re)construção de sua
trajetória profissional de forma partilhada com seus pares e, assim, buscar novos
horizontes para as dimensões do saber - SER, CONHECER, FAZER e CONVIVER.
Contudo, aponta também a necessidade de estudos posteriores com o intuito de conhecer
mais “Quem são os Anjos da Estratégia Saúde da Família de Montes Claros”, pois:
“Se muito vale o já feito,
mas vale o que será
Mas vale o que será,
E o que foi feito é preciso conhecer
Para melhor prosseguir...”
(O que foi feito deverá - Milton Nascimento e Fernando Brandt)
397
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ANDICES
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APÊNDICE A
ROTEIRO DE ENTREVISTA SEMIESTRUTURADA
PERFIL SOCIAL DO ACS
Caracterização – Sexo, Idade, Estado civil, nº de Filhos, Escolaridade.
Tempo de resincia na comunidade.
Tempo de trabalho como Agente Comunitário.
Fale-me sobre o que você fazia antes de tornar-se Agente?
Você participa ou participava de algum tipo de atividade comunitária? Se sim, qual?
Você tem algum curso profissionalizante? Se sim, qual? Você era Agente na época
do curso?
Como foi o seu processo de seleção na função de Agente Comunitário?
SABER SER
Por que você se candidatou para ser Agente Comunitário de Saúde?
O que é para você ser Agente Comunirio de Saúde?
Quais as qualidades e valores que um Agente deve ter e os defeitos que não deve ter?
O que você mudaria no seu trabalho de ACS? Por quê?
Que dificuldades e facilidades você encontra para desenvolver o seu papel de Agente?
Você está satisfeita com o seu papel de Agente Comunitário? Por quê?
425
Na sua opinião, como a comunidade ver o trabalho do Agente e do PSF?
O que você espera de sua profissão?
A sua visão sobre o trabalho do Agente Comunitário mudou após você se tornar um?
Se sim, o que mudou? Por quê?
Como é ser ACS para sua família? Você recomendaria para algum amigo ou parente,
ser Agente? Por quê?
SABER CONHECER/APRENDER
Como é realizado o processo de educação continuada em sua equipe? Como os
temas são escolhidos?
Quais são os fatores que facilitam ou dificultam o processo de aprendizagem?
O Agente exerce suas atividades exclusivamente no âmbito do SUS. Você poderia
falar sobre os princípios do SUS?
SABER FAZER
Quais são as atribuições do Agente?
Quais são as atividades desempenhadas por você no seu papel de Agente e como
você planeja?
Como você realiza a visita domiciliar? Quais são as atividades desenvolvidas durante
a visita e a receptividade?
Como você realiza o acompanhamento dos grupos específicos?
Quais são as atividades de educação em saúde que você realiza?
Quando você registra as atividades desenvolvidas? Como e por quê?
426
Quais são as atividades comunirias que você realiza?
O que você faz nos casos existentes que necessitam de cuidados especiais?
O que você faz para ajudar a enfrentar os problemas de saúde?
Como são realizadas as atividades de avaliação das ações de saúde?
Comente sobre a ética no desenvolvimento de suas atividades.
Como você identifica situações de risco em saúde? Quais são as atividades realizadas
frente a essas situações?
Você poderia falar sobre as atividades desenvolvidas pela Equipe Saúde da Família?
Como você realiza a orientação da população quanto ao serviço de saúde?
SABER CONVIVER
Como é para você trabalhar em equipe, com a comunidade e realizar o
acompanhamento domiciliar?
Como ocorre a interação da equipe com a comunidade?
O que a equipe e a comunidade deveriam saber mais sobre o seu trabalho?
Quando você encontra dificuldades na realização de suas atividades a quem você
costuma recorrer? Por quê?
Fale sobre a estabilidade na função de ACS e da rotatividade de profissionais na
Equipe de Saúde da Família.
427
APÊNDICE B
CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
PARA PARTICIPAÇÃO EM PESQUISA
Título da pesquisa: O Agente Comunitário de Saúde: investigando o seu perfil e o seu
papel na Estratégia Saúde da Família da cidade de Montes Claros – MG.
Instituição promotora: Mestrado Profissionalizante Cuidado Primário de Saúde.
Patrocinador: Não se aplica.
Coordenador: Virginia Torres Schall.
Atenção:
Antes de aceitar participar desta pesquisa, é importante que você leia e compreenda a
seguinte explicação sobre os procedimentos propostos. Esta declaração descreve o
objetivo, metodologia/procedimentos, benefícios, riscos, desconfortos e precauções do
estudo. Tamm descreve os procedimentos alternativos que estão disponíveis a você e
o seu direito de sair do estudo a qualquer momento. Nenhuma garantia ou promessa
pode ser feita sobre os resultados do estudo.
1- Objetivo - Investigar e descrever o perfil e o papel do Agente Comunitário de Saúde
das Equipes de Saúde da Família da cidade de Montes Claros MG, considerando as
dimensões do saber-ser, do saber-conhecer, do saber-fazer e do saber-conviver
(categorias sugeridas por Brasil, 2004); Identificar os aspectos facilitadores e
dificultadores do processo de trabalho do Agente Comunitário de Saúde das Equipes de
428
Saúde da Família da cidade de Montes Claros - MG; Investigar o processo de
formação/capacitação dos Agentes Comunitários de Saúde e investigar as relações
interpessoais do Agente nas equipes e com a comunidade.
2- Metodologia/procedimentos - Trata-se de uma pesquisa qualitativa descritiva. A
coleta de dados será realizada através de entrevista semiestruturada e grupo focal.
3- Justificativa - O presente estudo torna-se relevante, uma vez que possibilitará
caracterizar o Agente Comunitário de Saúde e seu processo de trabalho, objetivando
contribuir com conhecimentos e informações significativas para a elaboração de
metodologias que instrumentalizem os profissionais nos processos de seleção,
capacitação e avaliação dessa categoria.
4- Benefícios - Esta pesquisa possibilitará a maior interação do Agente com a equipe e
comunidade por meio da caracterização dos Agentes e do seu processo de trabalho.
5- Desconfortos e riscos - Não se aplica.
6- Danos - É garantida a manutenção da integridade física, psíquica e social dos
participantes, ficando estes isentos de quaisquer riscos, danos ou agravos consequentes
deste estudo.
7- Metodologia/procedimentos alternativos disponíveis - Não se aplica.
429
8- Confidencialidade das informações - Será mantido o sigilo quanto à identificação dos
participantes. As informações/opiniões emitidas serão tratadas anonimamente no conjunto
dos entrevistados e serão utilizadas apenas para fins de pesquisa.
9- Compensação/indenização - A participação é voluntária; não haverá nenhuma
remuneração pela participação.
10- Outras informações pertinentes - Será garantida ao participante a liberdade de
recusar ou retirar o consentimento sem penalização em qualquer etapa da pesquisa.
11- Consentimento:
Li e entendi as informações precedentes. Tive oportunidade de fazer perguntas e todas
as minhas dúvidas foram respondidas a contento. Este formulário está sendo assinado
voluntariamente por mim, indicando meu consentimento para participar nesta pesquisa,
até que eu decida o contrário. Receberei uma cópia assinada deste consentimento.
__________________________ __________________________ _
_____
Nome do participante Assinatura do participante Data
__________________________ __________________
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Nome da testemunha Assinatura da testemunha Data
__________________________
__________________________ _______
Virginia Torres Schall Assinatura da coordenadora Data
430
ANEXOS
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