34
conde do Rio Vermelho e Manuel Inácio da Cunha e Meneses
75
. Era a freguesia cujos habi-
tantes mais se inclinaram às artes.
O largo de São Miguel, pertencente a essa freguesia, era local de vários batuques,
que amedrontavam as autoridades locais: “[...] é necessário todo o cuidado e principalmente
hoje com a idéia que corre de liberdade”
76
. No mesmo largo, e também no Guadalupe, foram
encontrados Cantos de negras ganhadeiras – esta pesquisa procurou seguir tal pista, mas infe-
lizmente não obtive sucesso, pois eles parecem ter existido de fato, mas não legalmente, já
que as posturas regulamentavam Cantos masculinos, inclusive com menção à vestimenta que
deveria ser usada – “Os trabalhadores são obrigados a usar camisa de mangas curtas”, con-
forme as normas de 1880 (grifos meus)
77
.
A Freguesia do Santíssimo Sacramento da Rua do Passo era a menor das congêneres.
Foi criada em 1718, pelo arcebispo Dom Sebastião da Vide, e estendia seus domínios à Fre-
guesia de Santana, do Pilar, de Santo Antonio, e da Conceição pelos limites já mencionados
acima, e da Sé pelo Beco do Ferrão. Sua extensão foi aumentada em 1882, mas, apesar do
tamanho, possuía numerosa população. Lá foram encontradas grandes famílias patriarcais,
com os chefes exercendo profissões liberais, ou negócios, pessoas de cor, donas de casa, pa-
dres, estudantes e pessoas de profissões inferiores. Nessa freguesia residiam muitos médicos
com poucas posses, com um ou nenhum escravo; os médicos, apesar de conceituados e respei-
tados, não provinham de famílias ricas, e a profissão não dava fortuna em bens materiais
78
.
75
Os dados relacionados a essa freguesia foram coletados por Reis no registro de escravo de 1849, dessa fregue-
sia; por Nascimento na lista de qualificação eleitoral de 1847/8; e por Costa numa lista nominativa do censo de
1855, correspondente ao terceiro quarteirão. Na lista de escravos foram registrados 925 escravos, dos quais 60%
eram de origem africana; dos 475 que especificaram sua origem, 78% era nagô. Foram encontrados também 87
libertos de origem nagô. Apesar da proibição, muitos escravos tinham ofício – eram sapateiros, alfaiates, pedrei-
ros, calafates, barbeiros, carpinteiros. Dos 87 libertos, nenhum era doméstico. 65% se ocupavam de transporte e
os demais negociavam e trabalhavam como artesãos. O quarteirão era bastante populoso, com 250 habitantes,
dos quais 161 livres e 89 escravos, sendo 26,8% brancos, 26,8% pretos, 18,5% pardos, 0,7% cabra e 27,5% cri-
oulos. Como na lista de 1849, 88,2% dos homens e 30% das mulheres declararam ter um ofício. Da população
restante, 50% das mulheres e 11,8% dos homens viviam do ganho, e 20% de mulheres no serviço doméstico.
Também não apareceu nenhum homem no serviço doméstico. Cf. REIS. A Greve negra de 1857 na Bahia. Op.
Cit., p.9; Carlos OTT. Formação e evolução étnica da cidade do Salvador. Salvador: Prefeitura Municipal de
Salvador, 1957, p.23 apud Ana Amélia NASCIMENTO. As dez freguesias, Op. Cit., p.84; Ana de Lourdes Ri-
beiro da COSTA. Ekabó!Op.Cit., p.138.
76
Cf. Ó óculo mágico. Salvador, 11/10/1866 apud Ana de Lourdes R. da COSTA. Op. Cit., p.134.
77
REIS. De olho no Canto... Op. Cit., p.241. Para a matrícula de mulheres em cantos, ver Wilson Roberto de
MATTOS. Negros contra a ordem: astúcias resistências e liberdades possíveis - Salvador 1850-1888. Salvador:
EDUFBA, 2008, p. 94. Em seu trabalho, Mattos diz não ter encontrado mulheres matriculadas, mas os cantos de
mulheres existiram. O autor cita Nina Rodrigues, que informa “que as mulheres são encontradas na Rua da Vala,
Canto de São Miguel, na Rua do Guadalupe, na Rua do Cabeça e Largo Dois de Julho, no cais de desembarque,
na Ladeira do Boqueirão em Santo Antonio. Diz ainda que elas, em geral, não se separaram tanto, como os ho-
mens, segundo a suas nacionalidades.
78
NASCIMENTO, Op. Cit., p.86.