106
um processo construtivo, não um mero trilho condutor de mensagens ou de idéias, nem tampouco um sinal indicador do mundo
externo” (5).
No mesmo texto, mais adiante Demo afirma:
“Um currículo escolar, um plano de governo, uma obra arquitetônica são construções que se servem da lógica científica necessariamente,
mas atingem o nível específico de um diálogo infindável com a natureza e a sociedade. Esta desmistificação da ciência é também corrente
em Autores que transmitem certa desilusão diante de seu progresso. “Considera-se a ciência é também corrente em autores que
transmitem certa desilusão diante de seu progresso. “Considera-se a ciência uma das maiores fontes de patologia e mortalidade do mundo
contemporâneo, sobretudo depois da grande guerra. Enfatiza-se sua constituição ética e social, seja para desmistificar sua pretensão à
neutralidade, seja para apontar o perigo que representa e a responsabilidade política de que deve estar investida. A ciência é apresentada
como uma importante forma de poder, sobretudo em sua relação com a alta tecnologia que hoje conhecemos. Reivindica-se, cada vez
mais, a superação de todas as dicotomias sobre as quais se funda o cientificismo, tais como conhecimento e política, ciência e sociedade,
teoria e prática, razão e poder, sujeito e objeto. A epistemologia já não é o espaço exclusivo da racionalidade e da linguagem, mas está
inteiramente imiscuída com as questões ético-políticas. A noção de ato epistemológico não corresponde mais necessária e
exclusivamente ao cogito cartesiano, pois a ciência é compreendida como produção técnica de objetos científicos construídos. Ela é, deste
ponto de vista, construção de um objeto depurado cientificamente por um sujeito que é social, estabelecido através da comunicação e do
controle. Afastado da mística cientificista, tal enfoque tenta mostrar que, ao tomar a descrição do fenômeno como o próprio fenômeno,
podemos determinar, ou melhor, alcançar pontos estáveis – ‘científicos’ – a partir da transformação de fatos em artefatos, que funcionam
na prática; rejeita-se, então, a oposição entre o fato objetivo e sua descrição científica. Contra a perpetuação irrefletida de tais binômios,
busca-se recuperar a criatividade num esforço inter, intra ou transdisciplinar, rejeitando os procedimento da repetição, cópia ou
representação, uma vez que estes, fragmentários, perderam a possibilidade de totalidade ativa do saber”. A “perspectiva construtivista”
assume abertamente a tese do objeto construído, mas, mais que isto, reconhece que a “legitimação dos conhecimentos científicos se
constrói social e historicamente”, ficando para trás a expectativa positivista de formalizações transcendentais. Por ser ciência um
conhecimento “contextual, contingencial, circunstancial, resultante da combinação de fatores sociais e econômicos”, precisa aprender a
conviver com outros saberes e aplicar o questionamento, antes de mais nada, a si mesma” (6).
A perspectiva construtivista acolhe e abriga, sem restrições, o projeto de arquitetura, como produção de conhecimento,
como ciência. Neste novo contexto, a arquitetura não só é ciência mas também paradigma de ciência pós-moderna.
Finalmente, a ciência historicamente limitada à analise, reconhece a validade e a necessidade da síntese. Aliás, a análise
sempre deveria perseguir a síntese e vice-e-versa, pois são movimentos do pensamento sempre interligados: na
análise, a razão prepondera, na síntese – face as limitações da teoria –, a intuição e o conhecimento sensível preenchem
os vazios e conduzem a mito-poiésis.
Análise e síntese são movimentos complementares do pensamento. São simétricos. Porque então a ciência clássica
privilegia apenas a análise?
Científico é o conhecimento que quer se organizar. Projeto é o conhecimento organizado. Projeto é re-interpretação da
realidade. Ciência é deconstrução, projeto é reconstrução.
Mas essas duas formas de pensar – as idéias e as imagens – não atuam separadamente. A capacidade inter-semiótica
caracteriza o designer; ele compreende intelectualmente as questões políticas, econômicas, culturais, sociais, técnicas e
humanas e as traduz numa imagem – a forma. Ele é capaz, também, na imagem ler os significados políticos, os
econômicos, os culturais e todos os demais significados presentes na genealogia das idéias. Rudolf Arnheim declara
que
"para harmonizar estas diversas estruturas, a mente humana dispõe de dois processos cognitivos: a percepção intuitiva e a análise
intelectual. As duas são igualmente valiosas e indispensáveis. Nenhuma é exclusiva para as atividades humanas específicas; ambas são
comuns a todas. A intuição é privilegiada para a percepção da estrutura global das configurações. A análise intelectual se presta aa
abstração do caráter das entidades e eventos a partir de contextos específicos, e os define “como tais”. A intuição e o intelecto não operam
separadamente, mas, em quase todos os casos, necessitam de cooperação mútua. Em educação, negligenciar uma delas em favor da
outra, ou mantê-las separadas, é algo que só tende a mutilar as mentes que estamos tentando educar" (7).