“O fantástico tem muitas faces”, afirma Souza (1990: 32), acrescentando que
Temístocles Linhares aponta Veiga como “o primeiro entre nós a extrair toda a beleza”
de um certo tipo de fantástico inglês (fantasmas, casas mal-assombradas: ghost-stories)
e do fantástico alemão (magias, elfos, feiticeiros). Lembrando que Murilo Rubião (O
Ex-mágico, 1947) inaugura o conto fantástico no Brasil, Linhares alinhava algumas
diferenças entre os dois: em Veiga, os elementos do fantástico “são fornecidos pelo real,
pelo folclore nacional, pelas crenças populares, já que suas personagens são constituídas
de gente simples e humilde do nosso hinterland” – diferentes dos elementos de M.
Rubião, mais feéricos e citadinos. Para ele, Veiga pretenderia demonstrar um certo
vínculo ou conexão entre o sentimento humano e os espíritos elementares, e que “a
terra, a água, o ar, os animais sobretudo são personalidades tão ativas como o eram para
os filósofos pré-socráticos”.
Assis Brasil, segundo Souza (1990: 33), acredita que Veiga “em sua criação joga
com dois elementos essenciais: o fantástico e uma linguagem de expressões bem
brasileiras. Assim temos um ‘maravilhoso’ nosso e não importado”.
Hélio Pólvora, no capítulo “As Vozes Críticas sobre a Ficção de José J. Veiga”
(Souza, 1990: 48), aparece incluindo Veiga entre os que se desviam da literatura
“marcada por uma preocupação exclusiva do real – o real que se limita ao aspecto
lógico, cioso de explicar o como e o porquê dos acontecimentos”, na medida em que
absorve “uma dicotomia que está presente na obra literária amadurecida”, onde o real se
subdivide nos aspectos lógico e poético, coexistentes e complementares.
A nota dissonante é Wilson Martins, citado por Souza (1990: 48), que aventurou,
em 1960, que sua arte se poderia definir como a do “realismo mágico”, querendo dizer:
“a do conto fantástico em que todos os elementos são os da vida cotidiana, em que há o
mistério sem haver (a não ser em raras exceções) o arbitrário”.
Também Gravina (2009: 44-58) propõe uma releitura de Veiga, que leve em
consideração as instâncias da mimesis, ou seja, da representação ou imitação da
realidade.
Agostinho Potenciano de Souza (1990: 35) vislumbra um determinismo comum a
Veiga e Kafka:
Para eles, o homem está perpetuamente condenado a uma vida malogrante, da qual não
pode sair: ele, de certo modo, está na prisão.
A população vive sob um sistema de vigilância: a Companhia em Sombras de Reis
Barbudos, o Umahla em Os Pecados da Tribo, o Simpatia em Aquele Mundo de
Vasabarros. Assim, para Souza, Veiga procuraria retratar o mundo como uma “cidade
punitiva”, tal como caracterizada por Michel Foucault. (1990: )
Segundo Souza (1990:31), a brasilidade da obra veigueana lhe dá diferenças da linha
do realismo mágico latino-americano,
Porém não rejeita a possibilidade de serem encontrados traços comuns a Veiga,
Cortázar, Borges, Arreola e Vargas Llosa. Todos eles têm raízes de criação de uma arte
nascida num espaço de resistência a formas de opressão, de invasões, como exemplo, a
Casa Tomada de Cortázar.
Portanto, sempre na interpretação de Souza (1990: ), “Se a voga de Borges e
Cortázar fez surgir o ‘boom’ latino-americano dos anos 60, nela não se inscrevem José
J. Veiga nem o inventor de O ex-Mágico (1947), Murilo Rubião, porque essa onda não
foi aproveitada pelos brasileiros”.