que pinturas. Mais que conteúdo, em Barthes, a preparação de um texto se dá pelo desejo de criação de
algo físico, matérico, talvez desejo de ver/fazer uma forma: “[...] as duas operações de escrita que me
proporcionam o prazer mais agudo são, primeiro, começar, segundo terminar” (BARTHES, 2004c, p.
259).
Partindo de um desejo de dissertação, este trabalho inicia imaginando sua forma, seu volume, sua
materialidade. Assim como se não importasse caso as páginas internas estivessem brancas. Ne bus
deparo-me com Ferreira Gullar (200 ue criou o livro-poema: “[...] um novo livro em que a forma das
páginas é parte do poema, de sua estrutura visual e semântica. [...] este poema não poderia estar senão
num livro com estas características ao contrário de qualquer outro poema que pode estar em qualquer
livro e mesmo na folha de um jornal -, aqui palavra e página constituem uma unidade indissolúvel, daí tê-
lo designado pelo nome de livro poema”. (p 37). Do livr poema Gullar criou o “poema-espacial”, como
extensão do livro-poema, já que o fato de seus poemas se tornarem “manuseáveis” fez com que eles se
transformassem em objetos tridimensionais. Do poema espacial ainda derivou o poema enterrado,
o e pectador participa com o corpo inteiro, entrando no poema (es e, uma sala).
Ne a busca pela forma do trabalho, também encontrei os livros de artista, funcionando como
anotações de processo, diários, e mesmo obra, muitas vezes relacionada diretamente à escrita (SILVEIRA,
2001).
Existiu aqui o desejo de criar uma dissertação-livro de artista ou uma dissertação poema, uma
dissertação-espacial. Ou um “Babilaque” de Waly Salomão (2008), em busca da fusão da escrita com a
plasticidade. Construir um trabalho que fizesse dessas folh algo inseparável das suas palavras e
imagens. Construir algo que fizesse dessas palavras e imagen algo inseparável dessas folhas. O desejo foi
de que nada que agora aqui está pudesse estar em outro lugar. Tudo como tentativa, ensaio, preparação.
Um desejo que espera imóvel alguma mobilidade: “[...] uma imobilidade aberta a uma mobilidade aberta
a uma imobilidade aberta” (GULLAR, 2007, p. 59). Vale perguntar, onde funciona? Como funciona? Só se
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saberá se for tocada, e se tocar.
Para Gullar (2007), Lygia Clark e Helio Oiticica, na busca pelo novo, vão reduzir a linguagem da
arte aos seus elementos primeiros: “as sensações” (p. 67), e, ainda mais, vão recuar para “experiências pré-
artesanais, anteriores a qualquer formulação, ou seja, limitaram-se a provocar no espectador-participante
simples sensações” (p. 71). Sem tais sensações, não existe a obra, e tal constatação levou e ainda leva a
muitas discussões acerca dos limites no campo da arte. Os limites que invadem a vida, e que confundem
os papéis e as definições. Ora, não pretendo discutir isso, Lygia Clark e Helio Oiticica, entre muitos
outros, fazem isso ainda (através de suas obras e seus leitores). O que me interessou foram essas simples
sensações que me fugiram. Fugiram do meu controle e do que este trabalho pôde alcançar. Ficou a
tentativa, disso que se quer simples, antes de mais nada, ou antes de tudo.
Foi, afinal, o elemento existencial um dos dados que estava faltando no concretismo, segundo
Gullar (2007). Ele fala de uma “evolução do “conteúdo”- que não será uma idéia definida (e nem será
mesmo talvez idéia), mas que é uma vontade de forma e, portanto, solicitação das experiências
existenciais, do homem-carne-osso-morte etc” (p. 112). Este trabalho teve essa vontade de forma, vontade
de conteúdo que não é idéia, vontade de homem-carne-osso-morte e vontade de provocar simples
sensações. A vontade nunca sendo demais.
Alguns atravessamentos no desejo de ver e criar uma forma compuseram este trabalho. Talvez
uma fantasia: como aquilo que coloca em marcha, em movimento, um desejo (BARTHES, 2005).
A abertura para tentativas práticas diversas é também tentativa de não se deixar reduzir às
formas (com todas suas regras) que já existem. Porque colher impressão de chuva e querer torná-la
impressão de escrita quis-se “resto irredutível” (BARTHES, 2005, p. 24). Esses restos foram compostos
por noções escritas, visuais e experienciais. Entre as identificações visuais, encontrei Brígida Baltar (2001)
e sua coleta da maresia, orvalho, entre outras. Performance fotografada, que também incluía a construção
de roupas e materiais como vidros específicos para a ação da coleta. Da coleta, nada se levava para a casa.
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