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Céus, apropria-se de diversas imagens e parábolas – fato esse que o levou a incorrer em
diversos mal-entendidos sendo até mesmo mais um motivo para sua condenação à morte
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Além da metáfora, outra figura de linguagem aproxima a poesia da religião: o
paradoxo. Wright aponta a poesia como o lugar dos paradoxos, onde a ambigüidade e o
choque provocado pelos opostos são “uma expressão da natureza contraditória da
experiência.”
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(1988: 152). Os grandes fatos do cristianismo também revelam-se
profundamente paradoxais, especialmente a crucificação do Filho de Deus, como afirma
São Paulo: “Com efeito, a linguagem da cruz é loucura para aqueles que se perdem, mas
para aqueles que se salvam, para nós, é poder de Deus.” (I Cor 1, 18).
Sendo a poesia o lugar literário por excelência do paradoxo, não seria ela o meio
mais apropriado para o embate da conversão? Como veremos nesta seção, o processo da
conversão apóia-se na premissa de que o homem é um ser ambivalente e que dentro dele
habitam vontades conflitantes. Quando ele decide converter-se, essa ambigüidade explode,
pois a força do hábito passa a oferecer toda a resistência para que o “homem velho” não
deixe de existir, cedendo lugar ao “homem novo”. Portanto, exprimindo na poesia essa luta
interior, o poeta consegue delinear com profundidade e beleza esse fenômeno.
Dando prosseguimento a esse raciocínio, começam a se esclarecer as razões pelas
quais Eliot escolhe a poesia para falar da conversão, especialmente à luz de alguns de seus
ensaios críticos. Um de seus mais influentes textos, “The Metaphysical Poets”, de 1921,
expõe a capacidade do poeta para condensar realidades dessemelhantes :
Quando a mente de um poeta está perfeitamente equipada para seu trabalho, ela
está constantemente amalgamando experiências díspares; a experiência do homem
comum é caótica, irregular, fragmentária. Ele se apaixona, ou lê Spinoza, e essas
duas experiências nada têm de semelhante entre elas, ou com o barulho de uma
máquina de escrever ou o cheiro da comida sendo preparada; na mente do poeta
essas experiências estão sempre formando novos conjuntos.
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Em seu julgamento no Sinédrio, Jesus é acusado de planejar a destruição do Templo por ter afirmado:
“Destruí este templo, em três dias eu o levantarei.” (Jo 2, 19). O próprio texto bíblico explica a metáfora:
“Ele, porém, falava do templo do seu corpo.” (Jo 2, 21).
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“an expression of the contradictory nature of experience.” (tradução livre).
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“When a poet’s mind is perfectly equipped for its work, it is constantly amalgamating disparate experience;
the ordinary man’s experience is chaotic, irregular, fragmentary. The latter falls in love, or reads Spinoza, and
these two experiences have nothing to do with each other, or with the noise of the typewriter or the smell of
cooking; in the mind of the poet these experiences are always forming new wholes.” (tradução livre).