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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
ESCOLA DE EDUCAÇÃO FÍSICA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DO MOVIMENTO HUMANO
ISMAEL ANTONIO BACELLAR SCHAFF
FORMAÇÃO PERMANENTE E SUAS RELAÇÕES COM A PRÁTICA DO
PROFESSOR DE EDUCAÇÃO FÍSICA NA SECRETARIA MUNICIPAL DE
ESPORTES, RECREAÇÃO E LAZER DE PORTO ALEGRE
PORTO ALEGRE
2010
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ISMAEL ANTONIO BACELLAR SCHAFF
FORMAÇÃO PERMANENTE E SUAS RELAÇÕES COM A PRÁTICA DO
PROFESSOR DE EDUCAÇÃO FÍSICA NA SECRETARIA MUNICIPAL DE
ESPORTES, RECREAÇÃO E LAZER DE PORTO ALEGRE
Dissertação de mestrado apresentada ao
Programa de Pós-Graduação em Ciências do
Movimento Humano da Escola de Educação
Física da Universidade Federal do Rio
Grande do Sul, para obtenção do título de
Mestre em Ciências do Movimento Humano.
ORIENTADOR: PROF. DR. VICENTE MOLINA NETO
PORTO ALEGRE
2010
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CATALOGAÇÃO NA FONTE
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S296s Schaff, Ismael Antonio Bacellar
Formação permanente e suas relações com a prática do professor
de educação física na Secretaria Municipal de Esportes, Recreação e
Lazer de Porto Alegre. / Ismael Antonio Bacellar Schaff. - Porto Alegre:
Escola de Educação Física da Universidade Federal do Rio Grande do
Sul, 2010.
276 f.
Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal do Rio Grande do
Sul. Escola de Educação Física. Programa de Pós-Graduação em
Ciências do Movimento Humano, Porto Alegre, BR-RS, 2010.
1. Formação permanente. 2. Educação não-escolar. 3. Professor de
educação física. 4. Políticas públicas. 5. Estudo etnográfico. I. Título.
II. Molina Neto, Vicente, orientador.
CDU: 796.012:612
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! DEDICATÓRIA
Aos filhos, pelo carinho que me deu forças e pela paciência
À esposa, pelos grandes e pequenos gestos de companheirismo
A um amigo, incansável ao longo de todo este trajeto de estudos
Aos meus colegas e colaboradores, que são a razão de ser deste estudo
Aos meus alunos, que tem sido meus grandes professores ao longo do caminho!
!
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AGRADECIMENTOS
Agradeço ao Prof. Dr. Vicente Molina Neto pela confiança
em mim depositada e na sua disposição e ousadia ao investir
em um estudo sobre um outro contexto de atuação dos
professores de educação física em Porto Alegre.
Agradeço aos colegas do Grupo de Estudos Qualitativos
Formação de Professores e Prática Pedagógica em Educação
Física e Ciências do Esporte da ESEF/UFRGS, pela acolhida e
pelos debates empreendidos.
Agradeço aos professores, funcionários e estagiários da
Secretaria Municipal de Esportes, Recreação e Lazer de Porto
Alegre, por todas as situações de aprendizagem que me
oportunizaram.
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Precisamos reconhecer modestamente, e de uma vez por
todas, que não existe mais um conceito absoluto de verdade.
Isto significa que a noção de verdade deve ser introduzida no
tempo humano. Não pode escapar à categoria da
temporalidade. É neste sentido que toda verdade humana é
feita de certas idéias veri-ficadas, feitas verdadeiras. Uma
verdade congelada torna-se anestesia intelectual.
Hilton Japiassu, 1983.
!
RESUMO
Este estudo tem por tema a formação permanente de professores de educação
física da Secretaria Municipal de Esportes, Recreação e Lazer de Porto Alegre, bem
como as relações desta formação com a prática deste coletivo docente. Esta
investigação focaliza os significados atribuídos por estes professores a sua formação
permanente na relação com o cotidiano de suas práticas pedagógicas, tendo em
vista as características institucionais onde se realiza: de espaço de atuação não-
escolar como praças, parques, centros de comunidade, ruas, associações
comunitárias; bem como a grande diversidade de campos de atuação deste
professorado que tem no lazer, no esporte e em ações ligadas à promoção da saúde
os instrumentos de sua intervenção, nos seus vieses educativos, competitivos e ou
lúdicos. A pergunta que sintetiza o problema de investigação e orienta as decisões
metodológicas é: Quais significados o professorado de educação física da
Secretaria Municipal de Esportes, Recreação e Lazer de Porto Alegre atribui ao
seu processo de formação permanente e que impactos este processo produz
no cotidiano de sua prática pedagógica?! Para responder a esta questão realizei
entrevistas semi-estruturadas, analisei documentos do período que vai de 1989 até
2009; com o mesmo intento, utilizei as observações e registros do diário de campo
sobre as situações de formação promovidas pela instituição e do cotidiano das
práticas dos professores de educação física desta secretaria, que permitissem a
construção de quadro de análise e interpretação sobre o material coletado. O
processo analítico apontou para algumas categorias significativas para a
compreensão de práticas docentes e do papel que a formação permanente ocupa na
sua sustentação e na superação dos desafios e contradições presentes nestas
práticas. Uma destas categorias situa-se no não-lugar do espaço público da
secretaria a possibilidade e a expectativa de uma ação educativa em espaços que
não parecem claramente associados aos significados da instituição escolar. Desta
decorre uma outra, situada no próprio sujeito do estudo: o “ser-não ser” do professor
desta instituição – as tensões e contradições na construção de uma identidade
docente – manifestas em trajetos de aproximação à cultura escolar ao mesmo tempo
que elenca as peculiaridades distintivas do seu fazer educativo. Articulada às
anteriores, a categoria de um personalismo e de uma fragilidade das políticas de
formação profissional da secretaria parecem apontar para um papel ao mesmo
tempo central desta para construção da identidade e de um referencial para as
práticas dos professores, mas contraditoriamente, na sua ausência, a distribuição
dispersa dos recursos humanos e o seu isolamento nos diversos espaços da cidade
permitem uma sobrevivência que supera a existência de uma proposta político-
pedagógica. Uma idéia central sugerida pelo estudo é que a proposta de formação
permanente, enquanto compromisso da instituição, tenha um caráter definidor de
uma identidade docente, articuladora de sujeitos e ações e que permita superar
fragilidades temporais e ideológicas das questões político-partidárias o estudo
aponta para a importância de uma estrutura de formação permanente, centrada nas
experiências dos professores: espaços e tempos de compartilhamento de êxitos, de
busca coletiva de superação de dificuldades e contradições.
PALAVRAS-CHAVES: Formação Permanente. Educação Não-Escolar.
Professores de Educação Física. Políticas Públicas. Estudo Etnográfico.
!
ABSTRACT
The subject of this study is the permanent formation of Physical Education teachers
of the “Secretaria Municipal de Esportes, Recreação e Lazer de Porto Alegre”
Sport and Leisure Department in the city hall of Porto Alegre. The study also deals
with the relations between this permanent formation and the practices of the group of
teachers. This investigation focuses on the meanings attributed by such group of
teachers to their permanent formation in relation to their everyday pedagogical
practices, having in mind institutional characteristics and the spaces where practices
take place: public squares, parks, community centers and streets. It also focuses on
the varied nature of the group’s work (leisure, sport, health) and its educative,
competitive or playful aspects. The question which summarizes the investigation and
guides methodological decisions is: Which meanings the teachers of the Sport
and Leisure Department of Porto Alegre attribute to their process of permanent
formation and which impacts such process produces in their everyday
pedagogical practices? To answer this question, semi-structured interviews were
held, documents from 1989 to 2009 were analyzed, observations and field diary
entries on the formation moments promoted by the department were used and
everyday practices were observed. All that allowed the construction of an analysis
and interpretation chart. The analytical process lead the study to point out some
meaningful categories to understand teachers’ practices, as well as, the role
permanent formation has in helping teachers overcome challenges and
contradictions found in their everyday practice. One of these categories depicts the
possibilities and expectations of an educative action in spaces which are not clearly
associated to a school institution. From the category mentioned above, another one
emerges, located within the subject of this study: the teacher’s lack of a clear self
identity; tension and contradiction permeate the construction of a clear and steady
identity, sometimes moving itself towards the school culture while in other moments it
unveils distinctive traits of the teachers’ practices. Linked to the previous categories,
there is one related to the subjective and fragile department policies related to
professional formation. This category seems to indicate a central role in the
construction of the teacher’s identity and a referential to the teacher’s practice, yet in
the absence of such policies, the scattered distribution of human resources and their
isolation in the many different spaces in the city of Porto Alegre allow them to outlive
the existence of a political and pedagogical project. A key point dealt within this study
is that the commitment of the institution towards permanent formation should help
define the teacher’s identity, help articulate subjects and actions and allow teachers
to overcome temporary difficulties caused by ideological and political matters. The
study points to the significance a permanent formation structure has and that it
should be based on teachers’ experience and provide them with the opportunity to
share cases of success and seek solutions to overcome difficulties and
contradictions.
KEYWORDS: Permanent Formation. Outdoor Education. Physical Education
Teachers. Public Policies. Ethnographic Research.
!
RESUMEN
!
Este estudio trata de la formación permanente del profesorado de educación física
de la Secretaria Municipal de Deportes, Recreación y Ocio de Porto Alegre (SME) y
sus relaciones con la práctica de ese colectivo docente. La investigación tiene por
foco los significados atribuidos por estos profesores de educación física a su
formación permanente en relación con su cotidiano de prácticas pedagógicas,
mirando a las características institucionales donde se realiza: de espacio de
actuación no escolar como plazas, parques, centros de comunidad, calles,
asociaciones comunitarias; así como la gran diversidad de campos de actuación de
estos profesores que tienen en el ocio, en el deporte y en las acciones relativas a la
promoción de la salud, sus instrumentos de intervención, desde la perspectivas
educativa, lúdica o competitiva. La cuestión que sintetiza el problema de
investigación y dirige las decisiones metodológicas es: Qué significados los
profesores de educación física de la Secretaria Municipal de Deportes,
Recreación e Ocio de Porto Alegre atribuyen a su proceso de formación
permanente y qué impactos produce en sus prácticas pedagógicas cotidianas?
Para responder a estas cuestiones, he realizado entrevistas semiestructuradas, he
hecho el análisis de documentos desde el período de 1989 hasta el 2009, he
realizado observaciones y el registro en el diario de campo sobre las situaciones de
formación promocionadas por la institución y del cotidiano de las prácticas
pedagógicas de los profesores de educación física de la SME, lo que me ha
permitido la construcción de un cuadro de análisis e interpretación sobre el material
colectado. El proceso analítico ha mostrado algunas categorías significativas para la
comprensión de la práctica docente y del papel que la formación permanente ocupa
en la sustentación y superación de los retos y contradicciones presentes en sus
prácticas. Una de estas categorías se ubica el no lugar del espacio público de la
SME, o sea, la posibilidad y la expectativa de una acción educativa en espacios que
no están claramente asociados a los significados de la institución escolar. Desde
esta está implicada una otra, situada en el propio sujeto de estudio: el binomio
ser/no ser del profesor de la SME las tensiones y contradicciones en la
construcción de su identidad docente – manifiestas en los trayectos de acercamiento
a la cultura escolar al mismo tiempo que apunta para las peculiaridades distintivas
de su hacer educativo. Articulada a las anteriores, la categoría del personalismo y de
la fragilidad de las políticas de formación profesional da SME parecen indicar una
paradoja: al mismo tiempo central para la construcción de la identidad e de un
referencial para las prácticas de los profesores, mas contradictoriamente, en su
ausencia, la distribución dispersa del profesorado y el aislamiento en los distintos
espacios de la ciudad permiten una sobrevivencia que supera la existencia de una
propuesta político-pedagógica. Una idea central sugerida por el estudio es que la
propuesta de formación permanente, mientras compromiso de la institución, tiene un
carácter definidor de su identidad docente, articuladora de los sujetos y de las
acciones, y que deberían superar fragilidades temporales y ideológicas de las
cuestiones político-partidarias. El estudio discute la importancia de una estructura de
formación permanente, centrada en las experiencias de los docentes: espacios y
tiempos de compartir los éxitos, de búsqueda colectiva de superación de las
dificultades y contradicciones.
PALABRAS-CLAVES: Formación Permanente. Educación no-escolar.
Profesores de Educación Física. Políticas Públicas. Estudio Etnográfico.
!
SUMÁRIO
CONSIDERAÇÕES INICIAIS ..............................................................................................16!
1.! APROXIMAÇÃO AO PROBLEMA DE PESQUISA.................................................21!
1.1.! A SME EM FOCO: A PERSPECTIVA DESTE ESTUDO EM FACE A PRODUÇÕES
PRECEDENTES SOBRE A INSTITUIÇÃO.................................................................................24!
2.! A EDUCAÇÃO PARA ALÉM DA ESCOLA: O UNIVERSO DA SME ..................26!
2.1.! REFLEXÕES SOBRE A PROFISSIONALIDADE NA DOCÊNCIA...............................32!
2.2.! O PAPEL DO PROFESSOR DA SME E DE SUA PRÁTICA DOCENTE....................36!
3.! FORMAÇÃO PERMANENTE DE PROFESSORES ................................................44!
3.1.! FORMAÇÃO INICIAL: POSSIBILIDADES E LIMITES....................................................45!
3.2.! FORMAÇÃO PERMANENTE: CONCEITOS E IMPLICAÇÕES ...................................47!
4.! DIMENSÕES POLÍTICAS E SUAS RELAÇÕES COM O MUNDO DO
TRABALHO E COM A FORMAÇÃO PERMANENTE....................................................55!
5.! PROBLEMA DE PESQUISA........................................................................................64!
5.1.! QUESTÕES DE PESQUISA ...............................................................................................66!
6.! OBJETIVOS DO ESTUDO............................................................................................67!
6.1.! OBJETIVOS ESPECÍFICOS ...............................................................................................67!
7.! DECISÕES METODOLÓGICAS..................................................................................68!
7.1.! CARACTERIZAÇÃO DA INVESTIGAÇÃO .......................................................................69!
7.2.! DELIMITAÇÃO DO ESTUDO..............................................................................................71!
7.3.! COLABORADORES DO ESTUDO ....................................................................................72!
7.4.! ESTRATÉGIAS DE COLETA DE DADOS........................................................................75!
7.4.1.! ANÁLISE DOCUMENTAL.............................................................................................75!
7.4.2.! OBSERVAÇÃO PARTICIPANTE.................................................................................77!
7.4.3.! ENTREVISTAS...............................................................................................................80!
7.5.! ANÁLISE E TRATAMENTO DAS INFORMAÇÕES ........................................................82!
7.5.1.! CONSTRUÇÃO DE CATEGORIAS DE ANÁLISE....................................................82!
7.5.2.! CONSTRUINDO A VALIDEZ INTERPRETATIVA....................................................83!
8.! UM EXERCÍCIO NARRATIVO: A TRAJETÓRIA DO PESQUISADOR E DA
INSTITUIÇÃO SME...............................................................................................................85!
9.! DISCUSSÃO DOS RESULTADOS...........................................................................103!
9.1.! O PAPEL DA TRAJETÓRIA PESSOAL E DOCENTE E AS SINGULARIDADES DO
MUNDO DA SME...........................................................................................................................104!
9.1.1.! EXPERIÊNCIAS INCORPORADAS: DOS HABITUS DE VIDA AOS HABITUS
DE PROFESSOR ......................................................................................................................105!
9.1.2.! APROXIMAÇÕES E CONTRADIÇÕES COM AS PRÁTICAS DA EDUCAÇÃO
FÍSICA ESCOLAR: CONSTRUINDO NOVOS ESQUEMAS DE AÇÃO NA
SINGULARIDADE DA SME.....................................................................................................108!
!
!
9.1.3.! DIVERSIDADE DE PRÁTICAS NA SME: POSSIBILIDADES DE BUSCA DA
INOVAÇÃO POSSIBILIDADES DE PRESERVAÇÃO DE UM HABITUS
PROFESSORAL INCORPORADO.........................................................................................120!
9.2.! POLÍTICA: POSSIBILIDADES E ENTRAVES................................................................129!
9.2.1.! RELAÇÕES E TENSÕES ENTRE A GESTÃO E OS PROFESSORES: OS
LIMITES TÊNUES ENTRE AS DISPUTAS DE PROJETOS POLÍTICOS E O
PERSONALISMO ......................................................................................................................130!
9.2.2.! O PAPEL DEFINIDOR DE UM MODELO DE GESTÃO E O PROJETO
POLÍTICO PEDAGÓGICO DE FORMAÇÃO PERMANENTE ...........................................137!
9.3.! OS MÚLTIPLOS ELEMENTOS DA FORMAÇÃO PERMANENTE.............................145!
9.3.1.! O PAPEL DA EXPERIÊNCIA NO PROCESSO DE FORMAÇÃO
PERMANENTE: CONHECER PARA PODER OPTAR, CONHECER PARA
CONSTRUIR NOVOS ESQUEMAS DE AÇÃO....................................................................147!
9.3.2.! OS LUGARES DO PROFESSOR DA SME NO SEU PROCESSO DE
FORMAÇÃO PERMANENTE ..................................................................................................156!
10.! CONSIDERAÇÕES TRANSITÓRIAS.....................................................................162!
REFERÊNCIAS....................................................................................................................166!
APÊNDICES.........................................................................................................................175!
APÊNDICE 01 – CARTA DE ANUÊNCIA DA INSTITUIÇÃO .....................................176!
APÊNDICE 02 – MODELO DE TERMO DE CONSENTIMENTO..............................177!
APÊNDICE 03 – CARTA DE APROVAÇÃO DO COMITÊ DE ÉTICA ......................180!
APÊNDICE 04 – TRANSCRIÇÕES DO DIÁRIO DE CAMPO.....................................181!
OBSERVAÇÃO DE REUNIÃO GERAL DE PROFESSORES DA SME 04 DE OUTUBRO
DE 2008...........................................................................................................................................181!
OBSERVAÇÃO DE SEMINÁRIO INTERNO DE PROFESSORES DA SME 25 DE MAIO
DE 2009...........................................................................................................................................186!
APÊNDICE 05 – ROTEIRO DE ENTREVISTA SEMI-ESTRUTURADA....................194!
APÊNDICE 06 – PROTOCOLO DE VALIDAÇÃO DE ENTREVISTAS ....................195!
APÊNDICE 07 – TRANSCRIÇÃO DE ENTREVISTAS ................................................196!
ENTREVISTA COM A COLABORADORA SUZANA...............................................................196!
ENTREVISTA COM O COLABORADOR GUILHERME .........................................................217!
ANEXOS ...............................................................................................................................229!
ANEXO 01 – LEI 7330: CRIA A SME EM 5 DE OUTUBRO DE 1993.......................230!
ANEXO 02 – DIRETRIZES PEDAGÓGICAS, ADMINISTRATIVAS - 2004..............233!
ANEXO 03 – DOCUMENTO INSTITUCIONAL SOBRE POLÍTICAS E
PRIORIDADES DA SME – 1995 ......................................................................................256!
ANEXO 04 – DOCUMENTO INSTITUCIONAL DA SERP/SMED COM
SISTEMATIZAÇÃO DE PROPOSTAS DE SEMINÁRIO DE PROFESSORES –
1989. ......................................................................................................................................263!
!
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ANEXO 05 – DOCUMENTO INSTITUCIONAL – PRESSUPOSTOS POLÍTICOS E
PEDAGÓGICOS DA SME – 2007....................................................................................267!
ANEXO 06 – DOCUMENTO INSTITUCIONAL – REFERENCIAIS E ORIENTAÇÕES
PEDAGÓGICAS SME – 2009. ..........................................................................................270!
ANEXO 07 – EDITAIS PARA O CONCURSO PÚBLICO PARA PROFESSORES
DO MUNICÍPIO DE PORTO ALEGRE - 2008................................................................273!
!
!
LISTA DE QUADROS
QUADRO 01
REPRESENTATIVIDADE TIPOLÓGICA ......................................
73
QUADRO 02
CARACTERIZAÇÃO DOS COLABORADORES E CRONO-
GRAMA DE ENTREVISTAS .........................................................
74
QUADRO 03
DOCUMENTOS OFICIAIS ANALISADOS ....................................
76
QUADRO 04
OBSERVAÇÕES REALIZADAS ...................................................
79
QUADRO 05
CATEGORIAS DE ANÁLISE ........................................................
83
QUADRO 06
UNIDADES RECREATIVAS DA SME EM 1987 ...........................
90
QUADRO 07
MAPA DE PORTO ALEGRE, SEGUNDO O ORÇAMENTO
PARTICIPATIVO E O AGRUPAMENTO ADMINISTRATIVO-
PEDAGÓGICO ADOTADO PELA SME ........................................
94
QUADRO 08
ESTRUTURA DE REUNIÕES DA SME E SUA CRONOLOGIA...
97
QUADRO 09
ESTRUTURA DA FORMAÇÃO DE PROFESSORES NA SME ...
139
QUADRO 10
DEMONSTRATIVO DE TEXTOS UTILIZADOS PARA SUBSI-
DIAR O TRABALHO DE FORMAÇÃO PERMANENTE ...............
142
!
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
APEF/RS
ASSOCIAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DE EDUCAÇÃO FÍSICA DO RIO
GRANDE DO SUL
ATEMPA
ASSOCIAÇÃO DOS TRABALHADORES EM EDUCAÇÃO DO MUNICÍPIO
DE PORTO ALEGRE
CAR
CENTRO ADMINISTRATIVO REGIONAL
CBCE
COLÉGIO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS DO ESPORTE
CC
CENTRO DE COMUNIDADE ou CENTRO COMUNITÁRIO
CECOBI
CENTRO DE COMUNIDADE BAIRRO IPIRANGA
CECOFLOR
CENTRO DE COMUNIDADE BAIRRO FLORESTA
CECOPAM
CENTRO DE COMUNIDADE PARQUE MADEPINHO
CECORES
CENTRO DE COMUNIDADE DA RESTINGA
CECOVE
CENTRO DE COMUNIDADE VILA ELISABETE
CEGEB
CENTRO DE COMUNIDADE GEORGE BLACK
CELAR
CENTRO DE ESTUDOS DE LAZER DA PUC
CEPRIMA
CENTRO DE COMUNIDADE VILA 1
o
DE MAIO
CEVI
CENTRO DE COMUNIDADE VILA INGÁ
CONBRACE
CONCRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS DO ESCPORTE
D.O.P.A.
DIÁRIO OFICIAL DE PORTO ALEGRE
DERP
DEPARTAMENTO DE ESPORTE E RECREAÇÃO PÚBLICA
EF
EDUCAÇÃO FÍSICA
EsEF
ESCOLA DE EDUCAÇÃO FÍSICA
ESEF
ESCOLA SUPERIOR DE EDUCAÇÃO FÍSICA
F3P-EFICE
GRUPO DE ESTUDOS QUALITATIVOS FORMAÇÃO DE PROFESSORES
E PRÁTICA PEDAGÓGICA EM EDUCAÇÃO FÍSICA E CIÊNCIAS DO
ESPORTE
FASC
FUNDAÇÃO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL E CIDADANIA
FESC
FUNDAÇÃO DE EDUCAÇÃO SOCIAL E COMUNITÁRIA
GESEF
GRUPO DE ESTUDOS SOCIO-CULTURAIS EM EDUCAÇÃO FÍSICA
IPA/IMEC
INSTITUTO PORTO ALEGRE - INSTITUTO METODISTA DE EDUCAÇÃO
E CULTURA
JIRGS
JOGOS INTERMUNICIPAIS DO RIO GRANDE DO SUL
LDB
LEI DE DIRETRIZES E BASES
ONG
ORGANIZAÇÃO NÃO GOVERNAMENTAL
OP
ORÇAMENTO PARTICIPATIVO
PÇ.
PRAÇA
PCdoB
PARTIDO COMUNISTA DO BRASIL
PDT
PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA
PMPA
PREFEITURA MUNICIPAL DE PORTO ALEGRE
POA
PORTO ALEGRE
!
PPGCMH
PROGRAMA DE PÓS GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DO MOVIMENTO
HUMANO
PPS
PARTIDO POPULAR SOCIALISTA
PQ.
PARQUE
PT
PARTIDO DOS TRABALHADORES
PTB
PARTIDO TRABALHISTA BRASILEIRO
PUCRS
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL
RA
RESPONSÁVEL POR ATIVIDADE
RM
RESPONSÁVEL POR MODALIDADE
SERP
SUPERVISÃO DE ESPORTE E RECREAÇÃO PÚBLICA
SESC
SERVIÇO SOCIAL DO COMÉRCIO
SIMPA
SINDICATO DOS MUNICIPÁRIOS DE PORTO ALEGRE
SMA
SECRETARIA MUNICIPAL DE ADMINISTRAÇÃO
SMC
SECRETARIA MUNICIPAL DE CULTURA
SME
SECRETARIA MUNICIPAL DE ESPORTES, RECREAÇÃO E LAZER DE
PORTO ALEGRE
SMED
SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO
TRE/RS
TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DO RIO GRANDE DO SUL
UFRGS
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
UR
UNIDADE RECREATIVA
UTP
UNIDADE TÉCNICO-PEDAGÓGICA
!
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CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Este trabalho constitui-se na dissertação de mestrado dentro da linha de
pesquisa sobre Formação de Professores e Prática Pedagógica do Programa de
Pós-Graduação em Ciências do Movimento Humano da Escola de Educação Física
da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, cujo tema refere-se à compreensão
do papel que a formação permanente estabelece com as diversas práticas do
professorado da Secretaria Municipal de Esportes, Recreação e Lazer doravante
nomeada pela sua sigla, SME levadas à efeito nos parques, praças e centros de
comunidade da cidade de Porto Alegre.
A busca de compreensão das relações entre formação profissional e prática
docente deste coletivo justifica-se pela diversidade de dimensões epistemológicas,
políticas e culturais que a instituição abriga: a) a de constituir-se por espaços não-
escolares, de acolhimento de culturas diversas que compartem e disputam visões de
mundo, de conceitos por vezes antagônicos de esporte e lazer e que operam numa
lógica peculiar de relação entre poder público e comunitário; b) de estar subordinada
a políticas sociais implementadas por governos municipais da cidade de Porto
Alegre, tornando-a suscetível as tensões entre os interesses e postulados político-
partidários, as demandas advindas da sociedade e aquelas oriundas do coletivo de
professores. Todos estes elementos constituem os objetos de investigação e de
busca de produção de conhecimento deste estudo.
Dada esta singularidade e complexidade que caracterizam espaço, tempo e
identidade profissional deste coletivo de professores de Educação Física da SME,
configuram-se questões como: que saberes são demandados para o exercício de
sua profissionalidade? Que elementos constituem a sua identidade? Como
identificam a instituição e as práticas profissionais deles demandadas? O que
sustenta o seu fazer cotidiano? Que significados a formação, seja a inicial ou outras
ações que conferem o caráter permanente a este processo, assume sobre suas
práticas? Em que contexto e que elementos atravessam o processo de sua formação
permanente?
Destas dúvidas, decorre a formulação do problema de pesquisa que norteou
o presente estudo: Que significados o professorado de educação física da Secretaria
!
:?!
Municipal de Esportes, Recreação e Lazer de Porto Alegre atribui ao seu processo
de formação permanente e que impactos esta produz no cotidiano da suas práticas?
Posto a refletir sobre a natureza do objeto de investigação e dos
pressupostos epistemológicos de produção de conhecimento, encontrei nos
referenciais da fenomenologia e da hermenêutica sustentação para este
empreendimento. O estudo das essências, de Husserl, que atribui valor à
percepção, à consciência e à intencionalidade, que nas palavras de Triviños (2008),
“não pensa que se possa compreender o homem e o mundo de outra forma senão a
partir de sua factilidade” (TRIVIÑOS, 2008, p. 43) aproximou-se da intenção deste
estudo: este professor factual, com seu fazer e seu lugar factual posto sob análise, a
pesquisa desafiada a apreender significados a partir do seu contexto factual. Para
além do seus desdobramentos metodológicos, esta concepção de ciência e de
produção de conhecimento sustenta uma investigação em que cultura,
interacionismo simbólico e interpretação de significados (BOGDAN; BIKLEN, 1994,
p. 53) são elementos definidores do paradigma norteador deste estudo. Tendo como
objetivo identificar, analisar e interpretar os significados atribuídos pelos sujeitos,
optei por um estudo de viés etnográfico, considerando as possibilidades que esta
etnometodologia tem para dar voz aos sujeitos participantes da investigação, de
compreender os signos conferidos por estes ao seu fazer, ao seu dizer, ao seu
espaço de intervenção: como refere Geertz (2008), estudos capazes de descrever
de forma consistente, densa, um determinado contexto no qual acontecimentos,
comportamentos, instituições e processos sociais tornem-se inteligíveis. Esta
articulação estabelecida por este autor entre cultura e os significados atribuídos
pelos sujeitos aos fatos da sua vida apontam para o “tom fenomenológico” do
discurso presente nos estudos etnográficos (BOGDAN; BIKLEN, 1994, p. 58).
Muitas situações abordadas sobre a história institucional e de
relações/experiências profissionais são possíveis na medida em que fui e sou um
dos trabalhadores desta instituição, tendo atuado em diferentes áreas de docência
assim como desempenhado funções de gestão, sendo esta trajetória um fator
relevante no conjunto de inquietações acadêmicas que motivam este estudo. É
importante antecipar, como mencionarei mais adiante, que este fato apresentou
aspectos positivos e negativos, tanto no que se refere a questões objetivas de
negociação para o ingresso, acesso e implementação do instrumental metodológico,
quanto no processo de analítico e interpretativo do objeto do estudo.
!
:@!
A presente dissertação traz os resultados de um empreendimento
investigativo que tem início oficialmente em agosto de 2007, quando do ingresso
efetivo como mestrando no Programa de Pós-Graduação em Ciências do Movimento
Humano da Escola de Educação Física da Universidade Federal do Rio Grande do
Sul, simultaneamente a minha participação como membro do Grupo de Estudos
Qualitativos Formação de Professores e Prática Pedagógica em Educação Física e
Ciências do Esporte, desta mesma universidade. Tem início a aproximação com
autores e idéias nas discussões suscitadas nas disciplinas, nos debates nos
diversos grupos e na própria experiência que trago ao longo dos meus 25 anos
como professor de educação física
1
. É neste contexto que se a construção
sempre inacabada do referencial teórico em que me apoiei para buscar dar
sustentação às discussões aqui apresentadas. Em 26 de setembro de 2008 o
projeto foi submetido a Banca de Qualificação, sendo aprovado e recebendo
diversas sugestões, as quais busquei arduamente contemplar no desenrolar do
estudo e que pretendi apresentar neste texto final. O projeto foi apresentado ao
Comitê de Ética em outubro de 2008, sendo aprovado sem restrições em 11 de
dezembro de 2008.
Dada a minha inserção na instituição SME, muitos dos documentos
institucionais faziam parte do meu acervo pessoal; outros foram prontamente
disponibilizados por colegas, em manifesta demonstração de interesse na realização
do estudo. Isto também pode ser observado na pronta aceitação dos colegas de
trabalho ao convite para tornarem-se colaboradores em entrevistas e observações;
ou seja, a negociação de acesso e o início da coleta de informações deu-se
rapidamente. O período compreendido entre o início dos convites à realização das
entrevistas vai da 2
a
quinzena de dezembro de 2008 até a quinzena de março de
2009. A observação das diversas situações de trabalho e formação vão da 2
a
quinzena de dezembro de 2008 ao final de maio de 2009; no entanto, é inegável que
os meus registros e apontamentos para a reflexão estiveram repletos das
experiências de quase duas décadas de atuação profissional na SME.
Posto em contato com os primeiros documentos e na construção cotidiana
do diário de campo, dei início imediatamente ao processo de análise e construção
de um quadro interpretativo que pudesse dar conta das questões da pesquisa, que
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
1
O termo pode passar a ser representado pela sua abreviatura: EF.
!
:A!
concluí em junho de 2009. Assim como me referi anteriormente ao processo de
incompletude na construção do quadro teórico, também assim refiro-me ao processo
interpretativo apesar dos limites temporais que a conclusão do curso impõe à
escrita, como um processo intrinsecamente inconcluso, passível de inúmeros
olhares e reescritas. Por fim chego à julho de 2009, em que concluí este relatório da
pesquisa, conforme apresentado no cronograma constante do projeto inicial. No que
se refere ao custeio desta investigação, arquei com a totalidade dos gastos
referentes a produção dos instrumentos de coleta e tratamento dos dados
(documentos impressos, gravação de entrevistas, reprodução de textos) bem como
as despesas para produção, revisão, serviço de tradução para a produção do
abstract e resumen, impressão, encadernação e distribuição do presente relatório.
Coube à Coordenação do Programa de Pós-Graduação em Ciências do Movimento
Humano a viabilização financeira para a constituição da Banca Avaliadora desta
dissertação de Mestrado.
Feitas estas considerações de caráter cronológico e orçamentário para
produção deste relatório, passo à apresentação do texto propriamente dito. Este
relatório esta formatado levando em consideração as normas técnicas referenciadas
por Furasté (2009). No que se refere à sua estruturação, está disposto da seguinte
forma: no primeiro bloco desta dissertação capítulos 1, 2, 3 e 4 apresento um
quadro teórico, no qual são feitos alguns diálogos com a literatura que referencia os
diversos blocos temáticos, tais como a profissionalização da docência, as
possibilidades educativas do esporte e lazer no espaço não-escolar, o papel da
formação profissional na educação de forma ampla, bem como as peculiaridades
desta formação no que se refere à educação física; por fim, os diálogos e tensões
entre política pública, prática pedagógica e formação profissional.
No segundo bloco (capítulos 5, 6 e 7), são apresentadas as questões que
configuram o problema de pesquisa, os objetivos que sustentam este
empreendimento acadêmico, bem como as considerações de caráter
epistemológico, as opções metodológicas que sustentam este empreendimento
acadêmico: as possibilidades, peculiaridades e dificuldades que o desenho
etnográfico suscitou ao longo do cotidiano de pesquisa, dadas as características e
aproximações entre o objeto de investigação e a trajetória pessoal e profissional do
investigador: facilidades e dificuldades que decorreram desta condição peculiar.
!
B;!
Divido o terceiro bloco em dois capítulos: no capítulo 8, apresento um texto
essencialmente narrativo, em que procuro apresentar a minha trajetória pessoal e
profissional na EF e a história da SME, sob a minha perspectiva: longe de pretender
expor a verdade da história institucional, pretendo exatamente mostrar uma das
tantas representações e interpretações desta história a que eu vivi. No capítulo 9,
apresento os resultados do processo etnográfico propriamente dito, empreendo uma
descrição densa do contexto investigado a partir dos registros da observação das
práticas docentes do professorado, das circunstâncias e das manifestações dos
atores nas situações de formação institucional, e principalmente, dos textos
produzidos nas entrevistas dos colaboradores. Na triangulação da pesquisa
documental, observação e entrevistas, procurei construir as diferentes categorias de
análise que emergiram no processo interpretativo à luz do referencial teórico. Ao
longo deste capítulo, apresento os significados e as recorrências que acabaram por
constituir as categorias centrais deste estudo: as relações contraditórias das práticas
da SME e as da EF escolar; os múltiplos significados atribuídos a diversidade de
culturas e práticas pelo professorado; as inferências da esfera política sobre a vida e
as práticas do professorado; a configuração da formação profissional destes
professores: os papéis da formação inicial, estratégias de formação permanente e,
por fim, os múltiplos contextos de possibilidades e limitações que a política de
formação profissional institucional assume para estes professores.
No quarto e último bloco (capítulo 10) apresento uma síntese na qual
procuro situar os significados e expectativas do professorado da SME frente a
materialidade de seu cotidiano: possibilidades e limites, tensões, contradições,
transgressões; as interrelações entre a prática pedagógica da Educação Física na
SME, as propostas político-pedagógicas e a formação permanente destes
professores. Ao trazer reflexões, críticas e proposições, pretendo contribuir com a
produção de conhecimento na área e convidar a comunidade acadêmica, assim
como outros atores identificados com os temas abordados, para o diálogo, a
discussão e o aprofundamento. Espero desta forma suscitar outras investigações
significativas para a compreensão desta área de atuação do professor de Educação
Física, dos desafios da formação inicial. Fundamentalmente, que comprometam-se
com a melhoria das condições de trabalho, formação e realização destes
professores.
!
B:!
1. APROXIMAÇÃO AO PROBLEMA DE PESQUISA
Professor da Secretaria Municipal de Esportes, Recreação e Lazer de Porto
Alegre nos últimos 19 anos, tive a possibilidade e o privilégio de exercer a docência
nas várias áreas de atuação oferecidas por esta instituição iniciação e
aperfeiçoamento esportivo com crianças e adolescentes, projetos e programas
ligados à promoção da saúde, ginástica para grupos de idade, reeducação
postural.
Pude também exercer funções de gestão, especialmente gestão de
pessoas, na medida em que ocupei as funções de assessor e gerente pedagógico
da SME, de 1998 à 2004 sendo um dos responsáveis pela constituição e
implementação da política pedagógica, lotação de professores e estagiários em
atividades sistemáticas, programas e projetos. Tive a responsabilidade de procurar
articular os aspetos setoriais da Administração Municipal, as demandas
estabelecidas pela população e os anseios e contribuições dos professores que
constituem o quadro profissional da instituição.
Nesta função, tive a oportunidade de dialogar e debater sobre idéias e
projetos com pares do coletivo de gestão e com os colegas que estavam nas
atividades-fins. Estes diálogos, longe das unanimidades, traziam a riqueza dos
diferentes referenciais e das diferentes trajetórias dos sujeitos; consolidavam
estimas e amizades assim como evidenciavam divergências e construíam
distanciamentos profissionais, às vezes pessoais. Mas, de grande relevância na
construção da minha trajetória, estas experiências de gestão exercitaram, exigiram o
olhar para um mesmo fenômeno por perspectivas diversas, muitas vezes
antagônicas e contraditórias as demandas e necessidades do professorado e da
comunidade, de fácil solução aparentemente, eram frequentemente viradas ao
avesso pelos limitadores orçamentários, burocráticos e ou políticos. Mas em outras
oportunidades não: a possibilidade de escuta dos diversos atores, a busca da
identificação de limitadores circunstanciais e as possibilidades de superação dos
mesmos davam gratificantes e renovadoras perspectivas para o exercício
profissional.
Com este breve historiar, busco situar o meu envolvimento com o universo
estudado, a estreita relação entre as motivações acadêmicas e as motivações do
mundo do trabalho. E deste olhar sobre meu mundo do trabalho e o que sustentou
!
BB!
minha trajetória, percebi que a formação inicial pouco contribuíra para a superação
dos desafios que a SME impôs ao longo deste caminho. Por outro lado, atribuí um
grande significado às trocas de experiências, às situações de aprendizagem
construídas com meus colegas.
A partir desta reflexão, busquei problematizar estes elementos: que
características os meus colegas atribuem ao trabalho na SME? Como a formação
inicial dialogou com suas necessidades de trabalho na instituição? Que significados
eles atribuíam às situações de formação permanente, fossem elas iniciativas
pessoais ou as promovidas pela própria SME? Davam conta dos desafios do
trabalho cotidiano?
Este passa a ser o problema balizador e o professorado da SME, os sujeitos
deste estudo; questões para o investigador, oriundas de sua prática cotidiana; e
colaboradores que compartilham, a seus modos, a partir de suas perspectivas, as
características e peculiaridades desta mesma instituição.
Sem a pretensão de ser ou ter percorrido a trajetória de um antropólogo,
logo me confrontei com temores de contaminação no processo de observação e
análise do cenário investigado ao longo do fazer etnográfico.
A busca do meu lugar como professor-investigador assumiu uma dimensão
profundamente desconfortável, somente atenuada no compartilhamento destas
dificuldades com meus colegas do grupo de estudos
2
grupo este com longa e
consolidada caminhada, tendo na etnografia educativa sua ferramenta de
investigação. Importantes também foram a leitura e releitura de alguns textos.
Destaco, de forma especial, a contribuição de Geertz (2005), quando este explicita o
universo de tensões inerentes a produção do texto etnográfico:
As peculiaridades cruciais da escrita etnográfica [...]
encontram-se tão plenamente à vista que passam despercebidas:
por exemplo, o fato de ela consistir em grande parte em
asseverações incorrigíveis. A natureza altamente situacional da
descrição etnográfica um dado etnógrafo, em tal época e tal lugar,
com tais informantes, tais compromissos e tais experiências,
representante de uma dada cultura e membro de uma certa classe
confere ao grosso do que é dito um caráter do tipo “é pegar ou
largar” (GEERTZ, 2005, p. 15-16).
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
2
F3P-EFICE: Grupo de Estudos Qualitativos Formação de Professores e Prática Pedagógica em
Educação Física e Ciências do Esporte.
!
B=!
Neste fragmento, que exalta o significado do “estar lá”, ou seja, a
capacidade de levar o leitor a “ver”, a acreditar que o conjunto de detalhes e
decorrentes análises e interpretações se deram porque o investigador “esteve lá”
residiu uma reflexão de grande relevância para mim, no âmago das minhas
inquietações de investigador-ator. Dada a minha implicação, anteriormente
apresentada, com o universo de minha investigação, com a história institucional,
com os colegas que viriam a tornar-se os colaboradores neste empreendimento,
com as ações da ponta e as ações da gestão, procurei apoiar-me fortemente nesta
idéia para empreender os esforços investigativos: ao longo dos últimos 19, quase 20
anos eu, efetivamente, “estive lá”.
As realizações e incertezas inerentes a prática docente nesta instituição
estão fortemente marcadas na minha experiência tanto profissional quanto pessoal
(algumas bem específicas associadas ao espaço não-escolar e ao caráter informal
das relações estabelecidas entre o público e as práticas corporais sejam elas de
caráter lúdico e ou esportivo
3
). Este quadro de possibilidades, tensões e disputas
constitui o contexto onde se a ação dos educadores da SME, assim como a
vivência das motivações, desafios e pressões advindas da gestão. E é exatamente
este contexto que me coloca inquieto e renovadamente instigado a procurar
entender a complexidade do exercício da prática docente nesta instituição, sob
diferentes óticas.
Consciente de que estudos de caráter etnográfico como o que pretendi
empreender consolidam-se epistemologicamente como busca de análise e
compreensão em um recorte contextual específico, espero poder contribuir
academicamente com outros educadores comprometidos com desafios similares,
mas sobremaneira, com os docentes da SME, meus colaboradores, que atuam
diuturnamente nas comunidades da cidade de Porto Alegre, para que eles mesmos
possam compreender melhor o quê fazem, que finalidades sua atuação atende; e,
neste sentido, que possam sentir-se estimulados a refletirem e sistematizarem suas
próprias experiências.
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
3
Estas duas dimensões das práticas corporais não são apresentadas aqui como antagônicas ou
contraditórias, mas como conteúdos culturais distintos, imbricados de significados simbólicos pelos
diferentes coletivos sociais. Esta discussão encontra-se mais aprofundada p. 36-37.
!
BC!
1.1. A SME EM FOCO: A PERSPECTIVA DESTE ESTUDO EM FACE A
PRODUÇÕES PRECEDENTES SOBRE A INSTITUIÇÃO
Neste tópico, procuro apontar para o caráter inédito até aqui de um estudo
que coloque o foco na formação permanente e num contexto complexo que sobre
ela recai e que dela emana: a conjuntura política, com seus enunciados partidários
que tomam consistência nas política públicas de lazer para a cidade; no
envolvimento do professorado na discussão e elaboração do seu fazer cotidiano,
das características deste fazer e dos desafios que se desdobram; a especificidade
na constituição deste quadro profissional: aproximações e distanciamentos,
possibilidades e dificuldades de uma prática docente não-escolar, as peculiaridades
de uma educação física sem os signos institucionais da escola e ao mesmo tempo,
liberto para acolher um aluno que está ali pelo seu único e exclusivo interesse pela
atividade. E sob este contexto, procurar entender, analisar e interpretar os
significados de práticas e estratégias de formação profissional pelas lentes do
professorado da SME: e nisto explicito uma opção observações do cotidiano e
documentos institucionais em mãos, atribuo um papel de fundamental relevância às
entrevistas, àquilo que os colaboradores trazem à tona com seus depoimentos.
Ouvi-los constituiu-se na mola propulsora para o aprofundamento de questões da
pesquisa inicialmente propostos e do desvelar de novas pautas, que busco
compreender de forma mais abrangente.
Outros estudos sobre a instituição SME, ou sobre seus antecedentes
históricos foram empreendidos: pelo viés historiográfico, Feix (2003) trata dos
primórdios da recreação pública em Porto Alegre, dos Jardins de Recreio, da
implantação de uma política pública de recreação e lazer para a cidade, dos órgãos
que vieram constituindo-se ao longo do tempo. O seu recorte temporal vai de 1926,
quando da criação do Jardim de Recreio 1, na Praça Alto da Bronze, até 1950,
quando da criação do Serviço de Recreação Pública, órgão este que de alguma
forma, constitui-se no cenário de iniciativas pioneiras no Brasil de educação, esporte
e lazer públicos, constituída por professores de EF que construíram práticas e
experiências que, de alguma forma, contribuíram para a constituição da instituição
SME que temos hoje.
!
BD!
A SME também foi objeto de investigação tendo por perspectiva as políticas
públicas de lazer para Porto Alegre. Tanto na tese de doutorado de Amaral (2002)
quanto na dissertação de Santos (2003), os aspectos referentes ao papel da SME
na democratização dos conteúdos do lazer, do acesso e participação da população
tanto nas atividades em si como na proposição e demanda junto aos canais
disponíveis no poder público, marcam a abordagem e a perspectiva da produção de
conhecimentos sobre e a partir da instituição.
Ainda pela perspectiva da análise das políticas públicas, Schaff (2003)
analisa as disparidades de distribuição dos espaços públicos de lazer sob a
responsabilidade da SME nas diferentes regiões da cidade, apresentando distorções
entre densidade populacional e disponibilidade de áreas, propondo reflexões sobre a
importância de empreender ações na busca de minimizar tais distorções.
A SME, juntamente com a FASC, é objeto da dissertação de Bello (2004),
que analisa a situação das ações, projetos e programas das duas instituições
voltados para o público idoso, relacionando as concepções, as atividades propostas
com a prevenção e o tratamento de doenças crônico-degenerativas nos idosos.
O GESEF Grupo de Estudos Socioculturais em Educação Física, sob a
coordenação do Professor Marco Paulo Stigger, também tem empreendido alguns
de seus estudos tendo como objeto espaços públicos ou eventos sob a
responsabilidade da SME, como o CECORES
4
, os Campeonatos Municipais de
Futebol de Várzea e de Futsal
5
, ou o papel da SME na organização dos JIRGS
6
no
período de 1999 à 2002.
Sem a pretensão de esgotar os trabalhos que tenham tematizado a
SME/POA, procuro demonstrar que uma abordagem focada na formação
permanente de seus professores e mais que isto: na qual a construção deste
quadro de análise se a partir dos significados que os sujeitos atribuem ao seu
processo de formação permanente, pode trazer reflexões singulares, suscitando
críticas, contribuições e novos empreendimentos acadêmicos.
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
4
Centro de Comunidade do Bairro Restinga, um dos espaços objeto da dissertação de mestrado de
Ana Cecília de Carvalho Reckziegel (2004).
5
Eventos organizados pela SME, do qual participavam as colaboradoras da dissertão de mestrado
de Raquel da Silveira (2008).
6
Jogos Intermunicipais do Rio Grande do Sul. As tensões entre as instituições organizadoras nos
âmbitos estaduais e municipais são objetos da dissertação de mestrado de Fernando Bruno Rieth
(2005).
!
B>!
2. A EDUCAÇÃO PARA ALÉM DA ESCOLA: O UNIVERSO DA SME
O sujeito deste estudo é o professor, um professor de educação física que
tem como meio para sua ação o esporte, o lazer e a promoção da saúde, num
espaço não-escolar. Portanto, torna-se necessário buscar referências sobre este
sujeito e sobre o contexto em que é empreendida a sua ação. Neste capítulo,
procuro apresentar algumas referências sobre as possibilidades educativas para
além da instituição escolar: sem qualquer intenção de questionar seu papel
preponderante no processo educativo de crianças, jovens e adultos, o que pretendo
sobremaneira é apontar para outros espaços, tempos e conteúdos para a prática
docente, em especial, àquelas que constituem o universo da SME e de seu
professorado.
Algumas características do nosso tempo colocaram educação e educadores
frente a desafios inéditos, para os quais buscamos elaborações teóricas e práticas
capazes de responder às agendas e crises da contemporaneidade. Aliás, a escola,
entendida como instituição que emerge da sociedade e que para ela se destina,
reflete as limitações, tensões e contradições desta mesma sociedade. Como bem
apresenta Perrenoud (2005), “a escola somos nós”, ao tecer considerações sobre a
forma como desemprego, desigualdade social, condições sub-humanas de vida
entrelaçam-se com violência e “incivilidade”:
Um sistema educacional não pode ser muito mais virtuoso que
a sociedade da qual extrai sua legitimidade e seus recursos. Se
nossa sociedade é individualista, se nela todos vivem fechando os
olhos às injustiças do mundo, limitando-se a tirar o corpo fora, é inútil
exigir da escola que professe valores de solidariedade que a
sociedade ignora ou escarnece no dia-a-dia em suas mídias, em sua
vida política, naquilo que se passa nos estádios, nas empresas, nos
bairros (PERRENOUD, 2005, p. 10).
Para além de um debate conceitual sobre modernidade ou pós-
modernidade, o que temos é a busca de respostas da educação para a humanidade:
e as decorrências sobre o professor, tanto nas representações sociais sobre ele
quanto dele em relação aos estatutos de sua profissionalidade (GIROUX, 1997;
APPLE, 1989; ARROYO, 2000; NÓVOA; 1999; IMBERNÓN, 2000; GIMENO
SACRISTÁN, 2002).
!
B?!
Busco em Imbernón (2009) algumas reflexões iniciais que possam dar conta
da complexidade e dos desafios para a educação nos tempos que vivemos:
O século XXI representa um acontecimento mítico para todos
os que nasceram na segunda metade do século anterior, e por isso
parece necessário que toda instituição educativa (desde a que se
encarrega das etapas iniciais aa Universidade, bem como toda a
instituição responsável pela formação inicial e permanente, como
instituições que tem a função de educar) e a profissão docente
(entendida como algo mais que a soma dos professores que se
dedicam a essa tarefa nessas instituições) devem mudar
radicalmente, tornando-se algo realmente diferente, apropriado às
enormes mudanças que sacudiram o último quartel do século XX.
Em suma, a profissão docente deve abandonar a concepção
predominante do século XIX de mera transmissão do conhecimento
acadêmico, de onde de fato provém, e que se tornou inteiramente
obsoleta para a educação dos futuros cidadãos em uma sociedade
democrática, plural, participativa, solidária, integradora (IMBERNÓN,
2009, p. 7).
Ainda com o mesmo autor, podemos aprofundar aspectos significativos para
aqueles que estejam envolvidos com a educação, seja na instituição escolar, seja
para além dela:
Para educar realmente na vida e para a vida, para essa vida
diferente, e para superar desigualdades sociais, a instituição
educativa deve superar definitivamente os enfoques tecnológicos,
funcionalistas e burocratizantes, aproximando-se, ao contrário, de
seu caráter mais relacional, mais dialógico, mais cultural-contextual e
comunitário, em cujo âmbito adquire importância a relação que se
estabelece entre todas as pessoas que trabalham dentro e fora da
instituição (IMBERNÓN, 2009, p. 8).
Nestes dois extratos de Imbernón, destaco a dimensão que a educação
assume para além da estrutura e do espaço da escola; pelo contrário, um grande
desafio é superar os entraves, o enrijecimento curricular e o desgaste simbólico que
a escola traz consigo. A atual crise do ensino e da escola como instituição vem
configurando-se ao longo das últimas décadas, remontando ao fim da Segunda
Grande Guerra, como apontam Tardif e Lessard (2008, p. 257). As profundas
desigualdades sociais, as modificações no mundo do trabalho, as novas fronteiras
culturais no mundo globalizado, a ampliação geométrica da capacidade de
comunicação digital são alguns dos fatores que contribuem para a alteração do
!
B@!
status da escola e das expectativas da sociedade e dos professores em relação ao
sistema educativo (ESTEVE, 1999).
Muitos são os desafios enfrentados pela escola nos dias hoje, no que se
refere a sua capacidade de dar conta da tarefa educativa, entendida aqui para além
de uma análise do ideário, dos discursos que a sustentem ou do contexto político
que a configura. Muitos são os autores que empreendem profundos e extensos
estudos sobre o papel da escola, suas limitações perante o mundo; da necessidade
de reflexão crítica sobre sua organização, suas práticas. Faço aqui intencionalmente
referência à obra de Paulo Freire (1967, 1970, 1979, 1991, 1992, 1993, 1997, 2000),
reconhecida mundialmente ao mesmo tempo pela crítica à escola e à pedagogia
como aparato de dominação e opressão assim como pela proposição de uma
pedagogia emancipatória e libertária. Refiro-me à Freire como ícone da produção de
uma teoria crítica que expõe os limites da instituição escola, do currículo escolar e
das práticas pedagógicas nela presentes: nele procuro contemplar as produções de
inúmeros autores, com vastas e ricas contribuições.
De todo este movimento sobre os limites da escola frente aos novos
desafios destes tempos que vivemos, configuram-se desdobramentos sobre o papel
da educação, na escola e para além dela especificamente no Brasil, no âmbito
político, o próprio texto da nova LDB
7
pretende “incorporar uma concepção ampliada
de educação”, como destaca Arroyo (2000, p. 68), apontando e tecendo reflexões
sobre o texto do Art. 1º da referida lei:
!
Essa concepção de educação como formação humana que se
em uma pluralidade de espaços sociais amplia a visão dos
processos educativos e consequentemente amplia o leque de
educadores. [...] Se enraizamos a ação educativa na condição
humana, na pluralidade de tempos e espaços em que nos formamos
ou nos tornamos humanos teremos de admitir que qualquer um [em
qualquer lugar] pode ser considerado educador (ARROYO, 2000, p.
68) [grifo nosso].
Permito-me transcrever o texto do artigo acima referido, pelos significados
possíveis de serem inferidos à SME, tanto no que se refere aos seus espaços
quanto às práticas de seus professores:
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
7
Lei de Diretrizes e Bases: refiro-me à Lei nº 9394/96.
!
BA!
A educação abrange os processos formativos que se
desenvolvem na vida familiar, na convivência humana, no trabalho,
nas instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e
organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais
(BRASIL, MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, 1996).
O teor deste texto, que do ponto de vista legal e político, define a concepção
da educação brasileira, torna-se norteadora das ações setoriais. Neste sentido,
outros tempos, espaços e práticas podem ser entendidos em suas possibilidades
educativas. É pensar nas possibilidades do aprender para além do tempo formal do
estar na escola, das disciplinas; é levar em consideração espaços como a praça, o
parque, o centro de comunidade, a própria rua espaços
8
estes de exercício da
prática docente da SME como lugares de educação. Significa trazer para a
construção de práticas pedagógicas conteúdos culturais, práticas sociais que
ultrapassam os elementos estruturantes dos currículos escolares; e, reportando-me
novamente às contribuições freirianas, trazer os atores associados a estes
conteúdos a construírem práticas significativas como sujeitos nos seus processos de
humanização: estes atores são a razão da intervenção dos professores.
Posto desta forma, outros espaços e práticas, como museus, teatros,
livrarias, salas de multimeios, salas de dança devem ser entendidos como espaços
educativos e por conseguinte, dotados de uma política de ativação, como propõe
Marcellino (2001, 2008) no que se refere ao campo do lazer. Aliás, nas reflexões
finais sobre uma “pedagogia da animação” (MARCELLINO, 1987, p. 149), evidencia-
se uma proposta que ultrapassa muros escolares, que pretende articular os diversos
atores envolvidos com as práticas culturais, buscando valorizá-las e colocá-las como
conteúdos de uma intervenção eminentemente educativa.
A partir deste conjunto de reflexões procuro situar a SME como lugar de
docência e seus professores como atores desta ação docente, aproximando-me das
considerações de Carrano (2003), que refere-se a estas noções ampliadas do
processo educativo, ultrapassando “fronteiras disciplinares que separam as usuais
noções de educação e cultura” e prossegue:
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
8
Das mais de 500 praças e parques de POA, algumas possuem equipamentos e atividades
sistemáticas promovidas por professores de EF da SME. Outros projetos de caráter recreativo e
itinerante tem seu espaço de atuação em ruas ou, em comunidades carentes, vielas e becos. Ao
longo do tempo, o número de praças e parques ativados teve significativa variação, em estreita
relação com a proposta política geral e ou setorial para a cidade. O tema é mais amplamente
abordado no bloco de discussão dos resultados deste estudo.
!
=;!
A recusa em compreender a educação apenas enquanto
âmbito formativo das aprendizagens institucionais nos desafia a
compreendê-la também como processo social de compartilhamento
de significados para alem dos espaços intencionalmente instituídos
para promover aprendizagens (CARRANO, 2003, p. 11).
Esta aproximação dá-se, fundamentalmente, por compartilhar a concepção
de educação como prática cultural, não circunscrita ao campo institucional da escola
expressa pelo autor: esta compreensão marca a abordagem que faço da SME como
instituição educativa e que sustenta sua pedagogia em práticas ligadas ao corpo, ao
esporte, ao lazer, às atividades de promoção à saúde e às relações humanas que se
configuram a partir delas. Sobretudo, refiro-me ao corpo numa visão ampla, que
pode ter nos fenômenos acima e na própria estrutura curricular da EF escolar, os
seus limitadores, as panóplias corretoras do tempo e da cultura que vivemos
(VIGARELLO, 1995); assim como, contraditoriamente, podemos ter nestes mesmos
fenômenos a possibilidade da reflexão crítica e da construção de novos significados,
que superem os apelos midiáticos das práticas esportivas pautadas pelos conteúdos
hegemônicos do alto rendimento, dos modismos estéticos ou de práticas de lazer
resumidas aos seus aspectos compensatórios ao mundo do trabalho e da
produtividade.
Para que estas últimas possibilidades possam materializar-se, seria
importante levar em consideração: uma política educativa que reconheça estes
“outros espaços” e estas “outras práticas” como parte de sua concepção de
educação e intervenção na sociedade e que, para tanto, precisa constituir uma
política de ativação e formação de profissionais (MARCELLINO, 1987, 1995, 2001,
2003, 2006, 2008).
Tendo argumentado sobre a ampliação do conceito de educação e por
conseguinte, do tempo e do espaço para que se constitua, torna-se importante
caracterizar este conceito, de forma a explicitar as peculiaridades dos diferentes
universos educativos. Novamente reporto-me a Carrano (2003), quando discorre
sobre a educação para além da instituição escolar, apresentando uma divisão da
educação em três setores, bastante utilizada tanto na literatura quanto nos debates
sobre as suas dimensões: formal, não-formal e informal. Ressalto a definição da
!
=:!
dimensão informal, por ser reiteradamente associada à docência na SME, enunciada
da seguinte forma:
[...] constituída pelo conjunto de processos e fatores que geram
efeitos educativos sem que tenham sido expressamente
configurados para esse fim. Diferentemente dos setores formais e
não-formais a educação informal não se caracterizaria por uma
intervenção pedagógica intencionada e consciente (CARRANO,
2003, p. 17).
Associo-me a opinião do autor quando se refere a inadequação desta
definição na medida em que não responde a algumas questões: a) a escola está
repleta de situações e atividades não intencionais e sem um controle preciso dos
processos e efeitos, sem que isto “arranhe” seu status formal; b) em contextos extra-
escolares, informais ou não-formais como em muitas das atividades sistemáticas
da SME existe um “alto nível de formalização” (CARRANO, 2003, p. 18), dentre
eles a estruturação de turmas, controle de assiduidade e pautas educativas
definidas para a intervenção docente. Desta forma, vemos que a rigidez do conceito
e das fronteiras que estabelece, parecem não dar conta das peculiaridades do
universo em pauta.
Dada esta limitação conceitual, procurei aproximações com a expressão não
escolar para dar conta das práticas educativas implementadas no espaço e no
tempo institucional da SME. Apesar de bastante ampla inicialmente, recorri a
definição de Zuchetti e Moura (2006) quando propõe a “simples denominação
‘educação não escolar’ para distinguir todas as práticas educativas que ocorrem no
campo social daquelas que ocorrem no interior da escola” (ZUCHETTI; MOURA,
2006, p. 231). Mesmo reconhecendo ambiguidades e limitações, a discussão que
estas autoras estabelecem sobre as peculiaridades de ações educativas extra-
escolares o ao encontro daquelas que se dão no cotidiano da SME. Destaco
elementos desta discussão, tendo na conjuntura brasileira o foco de análise; entre
eles, a herança assistencialista de programas, projetos e ações sócio-educativas
associadas a nomenclaturas do não escolar. Esta relação restritiva vinculada à
critérios distintivos por extrato sócio-econômico ou a medidas compensatórias por
delitos ou infrações não contempla dimensões possíveis do não escolar voltadas à
população em geral (ZUCHETTI; MOURA, 2006, p. 230-231).
!
=B!
Parece-me oportuno ressalvar que a busca de uma conceituação distintiva
para a educação não escolar não pretende subtrair o valor da escola: procuro, sim,
situar um lugar e um tempo pedagógico do e para o professorado da SME, bem ao
encontro da consideração apresentada por Zuchetti e Moura:
[...] a educação não é co-extensiva a escola, o âmbito da
educação não escolar dispõe de objetivos e finalidades diversos e,
portanto, demanda por reflexões que são complementares, porém de
natureza distintas […]de que a educação está para além dos muros
da escola e, nesta perspectiva, a concepção de que a educação
escolar traz consigo a sua complementaridade: a educação não
escolar (ZUCHETTI; MOURA, 2007, p. 4).
Existem ações sistemáticas extra-escolares, como aquelas empreendidas
cotidianamente nos espaços de atuação da SME, com conteúdos definidos,
metodologia específica, intencionalidade propositiva, ou seja, elementos formais,
tendo na universalidade social o seu público alvo: ou seja, ações não escolares, nem
por isto informais ou não-formais, levando em consideração as definições para estes
dois últimos termos de Trilla e Gahem (2008). Some-se a estas reflexões o fato de
que o conjunto de pessoas da SME que implementam estas ações são professores
e acadêmicos de EF: as características da atuação destes profissionais e as
relações com a sua profissionalidade são os objetos de discussão no bloco que
segue.
2.1. REFLEXÕES SOBRE A PROFISSIONALIDADE NA DOCÊNCIA
Uma reflexão sobre a constituição e as modificações da profissionalidade de
forma abrangente traz consigo uma análise histórica da sociedade industrial, das
modificações das relações de trabalho, das disputas e conquistas por políticas
sociais, de uma explosão demográfica sem precedentes, da modificação da
configuração urbana, de um vertiginoso crescimento tecnológico, da universalização
dos meios de comunicação de massa, da ditadura do mercado financeiro, a culminar
com este tempo que vivemos, daquilo que chamamos de globalização, outros de
mundialização, a derrubar fronteiras e construir outras, talvez menos visíveis mas de
mais difícil superação, contexto este descrito de forma admirável por Hobsbawm
(1995).
!
==!
Sennett (2003) apresenta uma ampla análise sobre as novas características
do trabalho orientado por uma nova economia, marcada pela globalização e
flexibilidade, que, apesar de tomada a partir do contexto norte americano, parece
fortemente presente nas mazelas espelhadas pelo globo. De acordo com o autor, as
novas demandas do mercado para o trabalhador deste novo tempo apontam para a
necessidade de um comportamento ágil e disponibilidade para modificações de
tarefa e de ocupações, descartando segurança e estabilidade até então vivenciadas
como condições para a realização. Projetos de curto prazo, flexibilidade,
transitoriedade, remodelações, inovações, superficialidade são apontadas como os
novos jargões do mercado. No entanto, as consequências não param por aí. O autor
acrescenta que estas mudanças, e aqui residem os efeitos mais brutais, acabam por
debilitar, por corroer valores adotados pelas pessoas no âmbito de seu trabalho e
fora dele, como a lealdade, a confiança, a fidelidade, o estabelecimento de objetivos
e compromissos recíprocos em longo prazo e a solidificação de laços emocionais
duradouros.
Hagemeyer alia-se a estas reflexões ao argumentar que na atualidade, os
problemas político-econômicos se aliam à vertiginosa evolução científica e
tecnológica, refletindo-se em “mudanças nas formas de ser e viver dos homens em
todos os níveis, desconcertando a quem tem a profissão de ensinar/formar crianças
e adolescentes” (HAGEMEYER, 2004, p. 68).
A educação, entendida dialeticamente, constrói significados e reproduz
significados em sua relação com o mundo e com a sociedade, estando portanto,
afeita a todos os fatores históricos, políticos, sociais e culturais acima elencados.
São conexões importantes, como refere Apple, em que “condições materiais e
ideológicas [...] fornecem as condições de existência de uma boa parte de nossa
formação social” (APPLE, 1989, p. 181). Numa análise sobre as disputas e
contradições que a conjuntura social estabelece sobre a educação, o mesmo autor
traz uma contribuição importante:
Se vemos a cultura e a política como locais de lutas, então o
trabalho contra-hegemônico dentro dessas esferas torna-se muito
importante. Se a forma e o conteúdo culturais e o estado (assim
como a economia) são inerentemente contraditórios, e se essas
contradições são experienciadas na própria escola [espaço
educativo], por professores e alunos, então a gama de ações
!
=C!
possíveis amplia-se consideravelmente (APPLE, 1989, p. 182) [grifo
do autor].
Hargreaves (1996), ao enfocar suas idéias sobre as modificações do
trabalho do professorado, destaca as transformações pelas quais a educação tem
passado, com ênfase para o aumento das demandas e das diversidades das tarefas
e responsabilidades que se depositam sobre este fazer. O autor aponta que a tese
da intensificação, em contraponto à corrente que exalta estas modificações como
expressões de uma profissionalização, promove um processo de deterioração e
desprofissionalização do trabalho docente, ou como ele define, “uma estratégia para
que os docentes colaborem de bom grado em sua própria exploração, deixando que
exijam deles cada vez maiores esforços” (HARGREAVES, 1996, p. 143). Destaco
vários aspectos que sugerem um processo de intensificação, dos quais enfatizo as
referências à inibição na participação do planejamento de suas ações e ao processo
de diversificação forçada de competências e de responsabilidades para cobrir a falta
de pessoal e por conseqüência, reduções na qualidade da prestação do serviço.
No que se refere ao lugar do professor a pensar sobre o seu fazer
profissional, seja pela reflexão, proposição ou planejamento, parece ficar
evidenciado o seu afastamento da posição de sujeito do processo. É o que sugere a
expressão de Antônio Nóvoa (1999) quando refere-se ao professor como o
“referente passivo” aos outros sujeitos da ação educativa, ou na figura retórica que
utiliza, o “lugar do morto” em alusão metafórica ao jogo de bridge as jogadas
dependem das cartas que ele detém no entanto, ele em nada pode interferir no
desfecho das jogadas. Esta percepção é de significativa importância ao procurarmos
entender o quadro de desvalorização não somente da instituição escolar, mas
também do significado da educação como processo de formação e emancipação
humana. No âmago disto parece subjazer a depreciação e o desinvestimento do
professor. Levemos em conta a seguinte reflexão:
Atualmente, o saber dos professores tende a ser desvalorizado
em favor do saber científico (da pedagogia ou das outras disciplinas).
Um dos paradoxos principais na história dos professores reside no
fato de os tempos-fortes da reflexão científica em educação
contribuírem para um maior prestígio social da profissão, mas
também, e simultaneamente, para uma certa desvalorização dos
seus saberes próprios. Na verdade, a afirmação do saber da
pedagogia (dos especialistas em ciências da educação) faz-se
!
=D!
frequentemente a partir de uma depreciação do saber da experiência
(dos professores). As práticas de racionalização do ensino contém os
elementos de uma deslegitimação dos professores como produtores
do saber (NÓVOA, 1999, p. 9-10).
Ao apontar para a importância do desafio da (re)tomada do protagonismo do
professor sobre a produção de conhecimento e proposição de suas práticas, torna-
se fundamental um entendimento da profissão professor, de tal forma a retirá-la do
“lugar do morto”. Neste sentido, autores como Henry Giroux preconizam a
importância de constituírem-se condições nas quais os professores possam atuar
enquanto “intelectuais transformadores que combinam a reflexão e a prática
acadêmica a serviço da educação dos estudantes para que sejam cidadãos
reflexivos e ativos” (GIROUX, 1997, p. 158). A relevância desta consideração acerca
do fazer docente dá-se sob diversos pontos de vista: o primeiro é que colocar a
tarefa educativa como tarefa intelectual se opõe de forma direta ao modelo das
pedagogias instrumentais e ou utilitaristas; em segundo, explicita condições
ideológicas e práticas para a sua atuação como intelectual e, por último, explicita o
papel que os professores desempenham na produção e legitimação de diversos
interesses políticos, econômicos e sociais através das pedagogias que eles mesmos
elegem e utilizam.
Destaco a importância do protagonismo deste professor-intelectual, que
reflexiona sobre conjunturas e práticas sobre as quais interfere e que interferem
sobre ele. Neste sentido, a tarefa da transformação social pede a superação de um
dualismo educador-educando: implica na idéia de uma práxis incessante, contínua,
na qual se transformam tanto objeto quanto o sujeito.
Algumas das idéias apresentadas configuram as demandas e expectativas
para este professor profissional, assim caracterizado por Marguerite Altet:
[...] um profissional da articulação do processo ensino-
aprendizagem em uma determinada situação, um profissional da
interação das significações partilhadas. [...] o professor é um
profissional da aprendizagem, da gestão de condições de
aprendizagem e da regulação interativa em sala de aula (ALTET,
2001, p. 26).
!
=>!
Este entendimento sobre a profissionalidade docente pressupõe
desdobramentos sobre as concepções e sobre o processo propriamente dito de
formação permanente, tema este que aprofundarei no capítulo 3.
2.2. O PAPEL DO PROFESSOR DA SME E DE SUA PRÁTICA DOCENTE
Pensar a prática do professorado da SME é colocar-se frente a não
linearidade conceitual, à pluralidade e a aspectos contraditórios neste universo de
exercício profissional da EF: ao mesmo tempo que conteúdos da recreação e do
esporte remetem a uma profunda similaridade com o universo escolar, distanciam-se
deste pelas características de adesão voluntária, de espaço e de tempos o
associados aos da instituição escolar.
Ao referir-me à prática destes professores de EF, busco sustentação na
discussão feita por Sanchotene (2007), que aborda o entendimento de prática
associada às noções de habitus
9
, experiências vividas e contexto. Diz a autora:
[...] não considero que o habitus (profissional ou professoral)
seja a prática; mas que o habitus é um dos aspectos fundamentais
na constituição das práticas pedagógicas dos professores.
Nesta perspectiva, a prática pedagógica dos professores de
educação física será entendida como resultante da interação entre
um habitus e um contexto (SANCHOTENE, 2007, p. 23).
Tendo esta referência para o entendimento de prática pedagógica, saliento a
importância que a especificidade do contexto da SME tem, em suas peculiaridades
distintivas e similares ao universo da EF escolar, no processo de incorporações
destes habitus na constituição de suas práticas.
Ao incorporar o conceito de habitus ao referencial teórico e sua utilização ao
longo do estudo, é importante explicitar que o termo notabilizado por Bourdieu
(1972), é empregado aqui a partir dos textos de Perrenoud (2001, 2002) ao referir-se
a incorporação da experiência sob contextos específicos e do sentido atribuído por
Lahire (2002, 2004) na inter-relação com as idéias de contexto e estabelecimento de
esquemas de ação. Refiro-me a este processo de “construção de esquemas de
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
9
Para que o termo não seja apresentado de forma descontextualizada neste estudo, compartilho com
Sanchotene (2007) o conceito de habitus a partir das reflexões dos seguintes autores: Perrenoud
(2001, 2002), Silva (2005) e Lahire (2002).
!
=?!
ação” a partir da incorporação de uma “estrutura social sob forma de estrutura
mental”, no sentido atribuído por este último autor:
A criança, o adolescente e, depois, o adulto não incorporam,
propriamente falando, “estruturas sociais”, mas hábitos corporais,
cognitivos, avaliadores, apreciativos, etc., isto é, esquemas de ação,
maneiras de fazer, de pensar, de sentir e de dizer adaptadas (e às
vezes limitadas) a contextos sociais específicos (LAHIRE, 2002, p.
173).
Procuro desta forma, dar ênfase ao aprender sobre e com a especificidade
do fazer na SME. A formação inicial deste coletivo em nada difere daqueles que
estão nas redes escolares de ensino ou em outros espaços de atuação profissional
da EF como clubes, academias, entre outros. Tanto que vários professores da SME
atuam nestes outros espaços; alguns na própria rede escolar, seja ela municipal,
estadual ou privada; outros atuam ou atuaram em academias, clubes esportivos
com diferentes níveis do treinamento esportivo, em creches trabalhando com EF
infantil. Espaços e identidades distintas, práticas profissionais ora muito similares,
ora absolutamente diversas. A especificidade do contexto, das linguagens, dos
significados atribuídos culturalmente pelos diversos sujeitos aos conteúdos,
mediados pelas experiências vividas e incorporadas pelos professores, são os
elementos constituintes de seus esquemas de ação, de suas práticas pedagógicas.
Como situar um campo de atuação para este professorado? Será a SME
uma secretaria de um perfil único de formação, ou, como sugere Marcellino (2003, p.
14), espaço para intervenção de equipes multiprofissionais, onde profissionais com
formações oriundas não da EF, mas também das artes cênicas, do turismo, da
dança, pudessem constituir seu coletivo profissional? Dentro do próprio contexto
atual dos cursos de formação da EF, o trabalho da SME identifica-se com aqueles
oriundos da Licenciatura ou do Bacharelado? No sentido desta discussão, Alexandre
Scherer (2005) traz uma série de reflexões sobre a EF, o estatuto contemporâneo de
sua profissionalidade e o mercado de trabalho que se configura para os egressos
destes dois vieses de formação acadêmica.
Não pretendo neste estudo trazer para a pauta estas discussões; entretanto,
algumas análises podem emergir na discussão sobre o contexto da formação inicial
ou ao deter-me sobre os dados empíricos; outrossim, prefiro construir sentidos a
partir das contribuições dos colaboradores, entender o sentido conferido pelos
!
=@!
sujeitos que hoje atuam na SME sobre as características de sua profissionalidade.
De fato e de direito, o que temos desde sua criação é uma secretaria cujos recursos
humanos são constituídos por professores licenciados em EF ingressos por
Concurso Público
10
.
No entanto, ao refletir sobre as características da intervenção destes
professores e nisto trago sobremaneira a minha trajetória vivida na instituição e a
interação cotidiana com meus pares
11
- evidencia-se uma forte identidade com os
aspectos educativos da prática docente, mesmo considerada a diversidade de
manifestações que esta prática abrange na SME. Tanto os documentos político-
pedagógicos (PMPA/SME, 1995, 2000, 2001, 2002, 2003, 2004) que orientaram e
orientam formalmente o trabalho na SME, quanto os processo de formação
promovido pela instituição, apontam para um perfil de intervenção educativa dos
professores, não nas atividades de caráter sistemático quanto nos eventos,
assistemáticos.
Tendo em vista esta identificação com os conceitos e práticas ligados à
educação, entendo como relevante que este professorado conforme-se como um
coletivo de intelectuais transformadores, com competências para uma intervenção
crítica sobre a realidade, tal como proposto por Giroux (1997). Da mesma forma, é
importante compreender como estes professores entendem, apropriam-se e
ressignificam em suas trajetórias os valores educativos apontados por Perrenoud
(2005, p. 91-132), em especial aqueles relacionados à solidariedade e à cidadania.
Ao reportar-me às reflexões de Perrenoud sobre a importância atribuída
para estes aspectos educativos, enfatizo a possibilidade de articular
propositivamente aos conteúdos do lazer e esporte estes valores humanos; ao
mesmo tempo, associo-me ao autor quando alerta para o caráter não-natural da
solidariedade [e cidadania]
12
são “sociologicamente improváveis” (PERRENOUD,
2005, p. 91): postos desta forma, coloca-os como objetos da ação educativa num
esforço de inscrevê-la como construção cultural, constituinte de pacto social,
estabelecido na forma de reciprocidade.
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
10
Apesar da atual divisão dos Cursos de EF, o Edital do Concurso Público publicado em 2008
contemplava somente os egressos dos cursos de Licenciatura.
11
Trajetória que busco explicitar detalhadamente no capítulo 8, daquilo que encontra-se fortemente
imbricado com a trajetória e as motivações do pesquisador.
12
Grifo meu.
!
=A!
A materialização destas possibilidades educativas e do papel da intervenção
do professorado da SME aparece com força no texto de Brandão (1993),
apresentado em seminário sobre políticas públicas de esporte e lazer, promovido
pela Secretaria Municipal de Educação de Porto Alegre, aproximadamente dois
meses antes da criação da SME:
Acredito que um trabalho realizado através do lazer tem que
impor ao público, ao Estado, ao poder, não os espaços
destinados ao esporte como também aqueles espaços de
experiência da convivência solidária para que as pessoas saiam de
casa, [...] e participem também da vida nesses lugares da
comunidade.
Locais de experiência comunitária da cidadania. Da negação enfática
do egoísmo, do individualismo. Lugares de retomada solidária do
“público” como “comunitário”. Locais que mesmo quando construídos
pelo poder do estado são nossos e são da nossa responsabilidade,
para preservar e para usufruir (BRANDÃO, 1993, p. 123).
13
É importante fazer alusão ao momento histórico em que este seminário
com o tema Políticas Públicas de Esporte, Lazer e Recreação é realizado e este
texto apresentado ao professorado. Toda uma movimentação político-partidária e de
grupos deste próprio coletivo vinha algum tempo articulando-se em torno de
discussões e disputas sobre a “ascensão” daquela Supervisão ligada à Secretaria
de Educação ao primeiro escalão da administração municipal, levada ao status de
Secretaria, o que consuma-se em outubro de 1993. Ressaltei a importância
emblemática deste evento e do texto como forma de fazer refletir sobre a estreita
relação entre de identidade profissional, exercício de participação democrática e
formação permanente: profissionalidade, professores e gestores postos em tensão,
em disputa de conceitos e práticas, construindo-se.
Ao aproximar as idéias de caráter amplo da educação às específicas do
campo do lazer, aos aspectos educativos do lazer, busco de Marcellino (1987) uma
reflexão que me parece precisa:
tem sentido se falar em aspectos educativos do lazer, se
este for considerado ... como um dos possíveis canais de atuação no
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
13
Transcrito da palestra do autor no Seminário sobre Políticas Públicas de Esporte, Lazer e
Recreação, promovido pela SERP-SMED/PMPA, em julho de 1993 e posteriormente publicado pela
promotora do evento.
!
C;!
plano cultural, tendo em vista contribuir para uma nova ordem moral
e intelectual, favorecedora de mudanças no plano social. Em outras
palavras: tem sentido se falar em aspectos educativos do lazer,
ao considerá-lo como um dos campos possíveis de contra-
hegemonia. A instrumentalização, mesmo educacional, do tempo
disponível das pessoas, onde se busca, ou se deveria buscar,
fundamentalmente o prazer, só tem sentido na medida em que possa
contribuir para que essas mesmas pessoas tenham mais prazer de
viver, sejam menos pressionadas por uma estrutura socioeconômica
sufocante, em que uma minoria tem excessos de recursos, de
espaço e de tempo, pela exploração da grande maioria, cujo tempo
quando não é desocupado, pela incapacidade do modelo econômico
imposto gerar trabalho, é livre entre aspas. Só tem sentido, na
medida que contribuir para eliminar essas aspas (MARCELLINO,
1987, p. 63-64).
Ao apontar para estas possibilidades e expectativas de uma prática
educativa pelo lazer, faz-se importante contextualizá-la no espaço da SME, qual
seja, a do não-escolar, aonde as pessoas vão por opção e não pela obrigação. Do
parque e da praça pública, do campo de futebol de várzea, do Centro Comunitário,
em espaços onde o educador, não tendo o aparato da escola, não abre mão da sua
intervenção educativa em contextos formais ou não-formais, numa dimensão ampla,
tal como a apresentada por Marcellino (1987), referindo-se às idéias de Gramsci:
Entendo a relação pedagógica de maneira ampla [...] que não
limita “às relações especificamente escolásticas”, mas a distingue
‘[...] em toda a sociedade no seu conjunto e em todo o indivíduo com
relação aos outros indivíduos, bem como entre camadas intelectuais
e não intelectuais, entre governantes e governados, entre elites e
seguidores, entre dirigentes e dirigidos, entre vanguardas e corpos
do exército. Toda relação de hegemonia é necessariamente uma
relação pedagógica’ (MARCELLINO,1987, p. 43).
Aqui reside um dos pontos centrais deste estudo, objeto investigado na
observação e na análise das entrevistas com o professorado da SME a busca de
compreensão de como os professores vêem a complexidade do educar para além
do aparato e das obrigações da escola tendo como conteúdos para a prática
pedagógica o esporte e o lazer; como eles constroem uma identidade profissional
num universo em que os elementos acima apontados não se apresentam como
unanimidades: são contraditórios, disputam significados. A praça do prazer pode ser
o espaço do não reconhecimento; a liberdade do não-currículo e da não
institucionalidade que a praça traz em contraponto à escola, pode trazer o
!
C:!
isolamento, a precariedade da identificação com a profissionalidade. Estes limites
tênues que estabeleceram tensões na minha construção profissional são os
elementos da minha inquietação acadêmica neste estudo.
Até agora o foco das reflexões situou-se em conceitos mais amplos de
educação, de seus tempos, lugares e práticas, e o papel que professores ocupam
neste contexto. No entanto, pretendo fazer uma aproximação mais específica do
universo da SME: dos conteúdos que constituem sua base de intervenção na
sociedade porto-alegrense, da característica de público que constituem os alunos
dos grupos ou turmas nas atividades sistemáticas, do perfil de formação profissional
que caracteriza o professorado que nela atua. Para tal, levo em consideração o
período-alvo deste estudo, ou seja, de 1993 – quando da alteração de seu status de
supervisão da SMED ao de Secretaria autônoma, alçada ao primeiro escalão da
administração municipal – até os dias atuais.
Um primeiro corte refere-se aos conteúdos centrais que sustentam as
práticas sistemáticas, programas e projetos: o esporte, a recreação e as atividades
de promoção à saúde. O lazer, presente na denominação da própria instituição e
objeto de algumas das considerações propostas anteriormente, situa-se como
conceito transversal ao contexto das políticas e das ações da SME. Talvez na
perspectiva de contemplar a força que o termo assume nas últimas décadas no
Brasil (MARCELLINO, 2008, p. 12), de direito social explicitado constitucionalmente,
e de dar outras perspectivas e possibilidades aos demais conteúdos esporte e
recreação.
A presença do termo lazer na denominação do órgão reafirma aquilo que
Marcellino destaca em algumas de suas produções (2001, 2008): da aparente
necessidade de associação do termo lazer a outras idéias (promoção social, bem-
estar) “que sirva para amenizá-lo, suavizá-lo ou mesmo ‘resolvê-lo” (2001, p. 6); ou a
outras políticas setoriais: Esporte, Turismo, Cultura (2008, p. 12), como se o lazer
não desse conta de um corpo próprio de propostas de ação.
No entanto, sua presença na denominação da SME parece também apontar
para políticas que pretendiam superar modelos e práticas hegemônicas, e que a
própria história dos serviços e setores que antecederam a sua criação de
educação social e recreação pública traziam como herança. No que se refere ao
esporte, vislumbra a possibilidade que este fosse entendido não somente pelos seus
aspectos hegemonicamente constituídos, da espetacularização, do alto rendimento,
!
CB!
mas também em outras significações que os sujeitos que o praticam pudessem
atribuir a ele: de suas possibilidades lúdicas, da negociação da regra, de uma outra
visão do outro, como “companheiros adversários” (STIGGER, 2005).
Da mesma forma, a associação do termo recreação entendida como
atividade ao lazer pode pretender superar um “sentido pejorativo”, beneficiando-se
do status alcançado pelo lazer (WERNECK, 2000, p. 83).
Entretanto, esporte e recreação já eram pauta das ações de DERP e SERP.
Estes conteúdos praticamente monopolizavam a intervenção deste professorado
junto à população, fosse nos grupos constituídos, fosse nos eventos promovidos.
Porém, além destes dois conteúdos culturais, esporte e recreação e suas
possíveis articulações com o lazer as atividades sistemáticas, programas e
projetos ligados à promoção da saúde assumem papel significativo na SME, em
duplo sentido: de demanda para um outro perfil de público; e, por outro lado, de
abertura de espaço para que os professores da instituição pudessem propor ações
que contemplassem práticas específicas, fruto de suas trajetórias profissionais.
No que se refere ao primeiro aspecto mas que encontra-se profundamente
entrelaçado com o segundo – há a identificação de públicos e práticas até então não
contemplados: a orientação de imenso contingente de caminhantes, corredores e
outras atividades aeróbias em parques e praças da cidade (que acaba por sustentar
a criação em 1992 do projeto Lazer e Saúde
14
). Com a eclosão das academias de
ginástica, do embrião daquilo que hoje temos como uma “cultura fitness”
(GOELLNER, no prelo), diferentes modalidades de aulas de ginástica são
demandadas e contempladas, a culminar com a criação de salas de musculação
(Ginásio Tesourinha, 1997 e Parque Ararigbóia, 2000). Também os idosos passam a
ser objeto da atenção das políticas e ações da SME, com a constituição de grupos
de ginástica, dança, culminando com a criação do projeto de Bem com a Vida,
sendo estas ações e projetos, objeto do estudo de Bello (2004).
Retomo, neste ponto a discussão sobre o segundo sentido associado à
ampliação do leque de atividades, não àquelas ligadas à promoção da saúde,
grupos de adultos e idosos, mas também de outras manifestações do esporte e de
vivências do lúdico: esta diversificação, além das tensões da sociedade sobre a
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
14
Este e outras ações, projetos e programas serão analisados mais profundamente no bloco de
discussão dos resultados deste estudo.
!
C=!
instituição, vai ao encontro dos interesses dos professores, pela possibilidade de
atuarem lançando mão de competências conhecidas. Esta busca em criar as
condições para a prática, de forma a encontrar referências na sua trajetória, pode
ser bem entendida nas reflexões feitas por Silva (2005) e por Sanchotene (2007) no
papel que habitus e experiência exercem na constituição dos esquemas de ação do
professorado: de que os saberes construídos por estes são resultantes das
experiências adquiridas ao longo de suas trajetórias profissionais, nos diversos
espaços onde fizeram operar as suas práticas pedagógicas. Dizem respeito às
“interações vividas pelos docentes” (SANCHOTENE, 2007, p. 26) referindo-se ao
conceito de “saberes experienciais” expresso desta forma por Tardif:
[...] os próprios professores, no exercício de suas funções e na
prática de sua profissão, desenvolvem saberes específicos,
baseados em seu trabalho cotidiano e no conhecimento de seu meio.
Esses saberes brotam da experiência e são por ela validados. Eles
incorporam-se à experiência individual e coletiva sob a forma de
habitus e de habilidades, de saber-fazer e de saber-ser (TARDIF,
2007, p. 38-39).
Esta busca em criar as condições para uma prática docente associada aos
saberes constituídos e incorporados de forma bem-sucedida pode ser também
entendida como estratégia de redução ou minimização de aspectos que tornem
precárias as suas condições de trabalho (TARDIF, 2007, p. 89-102). Esta reflexão
assume um significado ainda maior ao levarmos em consideração as peculiaridades
e aspectos distintivos do trabalho na SME, já anteriormente mencionados.
As reflexões empreendidas até agora sobre as peculiaridades da instituição
e das singularidades e regularidades que caracterizam as práticas destes
professores pretendem remeter para o foco central deste estudo, ou seja: o papel da
formação permanente na sustentação destas práticas, de tempos e estratégias de
reflexão sobre o trabalho docente e, naquilo que entendo como uma “utopia
possível”, criar as condições para uma prática docente crítico-reflexiva.
No próximo capítulo, apresento algumas considerações acerca da formação
permanente que permitam melhor compreender suas possibilidades e limitações.
!
CC!
3. FORMAÇÃO PERMANENTE DE PROFESSORES
Neste capítulo, procuro abordar aspectos relevantes na relação entre o
processo de formação permanente e a prática docente, na tentativa de articular
conceitos, modelos e lugares dos sujeitos neste processo.
Para este fim, estruturo o capítulo em dois blocos: no primeiro, abordo as
questões referentes à formação inicial, não por considerá-la externa a formação
permanente mas por questões temporais, de como e em que etapa da vida se
apresenta para os sujeitos.
No segundo bloco, busco enfocar a formação permanente nos seus
aspectos conceituais, nas relações com a profissionalidade docente e suas
implicações sobre o cotidiano dos professores.
Antes de dar inicio à discussão propriamente dita, explicito a perspectiva
adotada sobre a formação inicial como etapa de um todo maior, ou de uma
disposição mais ampla do sujeito em aprender, disposição esta entendida como
formação permanente, idéias apresentadas por autores como Japiassú (1983) e
Günther (2000, 2005), para os quais formação permanente supera os limites “das
atividades de reciclagem, visando apenas a uma atualização nos avanços
específicos de cada área” (GÜNTHER, 2005, p. 205). Se tomarmos o professor
comprometido com sua formação permanente como aquele que entende formação
como autoformação, poderemos entender Japiassú (1983) quando afirma:
[...] o primeiro dever do educador consiste em guardar um
interesse fundamental pela pesquisa e em despertar no educando o
espírito de busca, a sede da descoberta, da imaginação criadora e
da insatisfação fecunda no domínio do saber. O essencial é que o
educando permaneça sempre em estado de apetite (JAPIASSÚ,
1983, p. 46).
É do entendimento de um sentido recorrente na afirmação de Japiassú, de
um educador/educando que deve despertar no outro e manter o seu próprio
interesse no processo de aprender a aprender, que apresento a formação inicial
como recorte temporal de um todo maior, de forma a permitir discussões sobre
peculiaridades, indefinições e incompletudes características de períodos distintos da
formação humana.
!
!
CD!
3.1. FORMAÇÃO INICIAL: POSSIBILIDADES E LIMITES
Falar sobre formação inicial é falar da própria formação permanente,
entendida simplesmente como uma de suas etapas; e da universidade, como um
espaço de referência para esta etapa; mas não a única. Ao pensar sobre os desafios
da formação inicial sobre a prática dos docentes, que se buscar o que distancia
os saberes sistematizados do exercício profissional efetivo.
Convém destacar a importância de se conceber a formação de professores
como um processo contínuo. Desta forma, não se deve pretender que a formação
inicial ofereça produtos acabados, encarando-a antes como uma primeira fase de
um longo e diferenciado processo de desenvolvimento profissional.
Para isto, proponho uma reflexão crítica sobre os papeis da formação inicial:
daquilo que de melhor esta etapa pudesse contribuir para a do futuro profissional e
daquilo que tem sido visto, do abismo entre os elementos dados pela formação
acadêmica e as demandas do mundo do trabalho.
Sobre o que temos visto: ainda prevalece uma concepção e estrutura
fragmentária sobre os saberes que sustentam a docência, carente de uma
articulação clara entre disciplinas que, em suma, parecem simplesmente cumprirem
disposições legais e comporem uma listagem de disciplinas (GÜNTHER, 2000, p.
22).
Este quadro fragmentário dos saberes é atribuído a diversas marcas
históricas deixadas nas universidades. Uma destas heranças remonta ao período
militar, sobre o qual são identificadas modificações na matriz de formação e
pesquisa, muito mais associada à produção dos técnicos competentes, necessários
para dar respostas a um modelo empresarial, sob forte influência das tendências
ditadas a partir dos grandes centros de pesquisa e produção de conhecimento
científico nos países desenvolvidos.
Esta lógica periférica, de importação de modelos, manifestou-se o no
papel das agências de formação de caráter universitário, mas na educação como um
todo: experiências e modelos educacionais implantados nas escolas destes países
desenvolvidos, pensados para atenderem as suas peculiaridades humanas, sociais
e estruturais, desembarcavam nas nossas escolas sob o emblema da inovação.
Outra marca ainda relacionada à década de 60 e ao processo de
fragmentação no ensino universitário refere-se ao processo de departamentalização
!
C>!
nas universidades, repercutindo, e ao mesmo tempo reforçando, a
compartimentalização dos conhecimentos, das disciplinas, e contribuindo para uma
“desarticulação entre os docentes” (GÜNTHER, 2000, p. 23).
Além das implicações da fragmentação dos saberes, uma outra espécie de
fragmentação parece assumir um papel relevante: o distanciamento da realidade
social, um processo dissociativo entre os conteúdos elencados para a formação dos
professores e aquilo que constituía as condições materiais, objetivas e subjetivas da
docência.
Não por acaso, obviamente associado a toda uma conjuntura política e
social, a partir da década de 70 emergem com força pedagogias centradas na
reflexão e na ação dos professores. Toda a produção freiriana e o espaço que os
textos de correntes da pedagogia crítica passam a assumir, apontam para a
necessidade de rever o processo de formação dos professores, de aproximar, de
criar conexões mais consistentes entre os saberes, muitas vezes apresentados e
assimilados de forma estanque, acrítica com os mundos onde se constroem as
práticas.
Associada a este quadro fragmentário da universidade com os saberes e
com a sociedade, foi consolidando-se uma outra dissociação, entre pesquisa e
prática docente, tema este abordado profundamente por Demo (2001, p. 127-133). E
coloca a questão da seguinte forma:
!
Pesquisa significa diálogo crítico e criativo com a realidade,
culminando na elaboração própria e na capacidade de intervenção.
Em tese, pesquisa é a atitude do aprender a aprender, e como tal,
faz parte de todo processo educativo e emancipatório (DEMO, 2001,
p. 128).
Esta idéia, que coloca a pesquisa como elemento fundante da
profissionalidade docente, devolve para a reflexão que propus inicialmente: o que de
melhor a universidade poderia fazer com os futuros professores. A universidade
deveria assumir esta premissa formadora do professor que aprende a aprender, que
desmistifica a pesquisa como aparato sofisticado e distante da prática. Esta
perspectiva coloca o professor como sujeito, como produtor de sentido para o que
faz, pois reflete, sistematiza e ressignifica o que faz ou seja, pesquisa. Ainda,
tomando as idéias de Demo:
!
C?!
[...] pesquisa funda o ensino e evita que este seja simples
repasse copiado. Ensinar continua [sendo] função importante da
escola e da universidade, mas não se pode mais tomar como ação
auto-suficiente. Quem pesquisa, tem o que ensinar; deve, pois,
ensinar, porque ‘ensina’ a produzir, não a copiar (DEMO, 2001, p.
128).
Este seria um grande desafio da formação inicial, de reinventar-se, de
superar um modelo marcado pela perspectiva instrumental. Esta talvez pudesse se
constituir numa síntese do que busquei por em discussão: os desafios da educação
contemporânea não vêm em pedaços; o domínio da informação, de um saber
instrumental, isoladamente, não responde às situações complexas que se
apresentam nos espaços de docência. E a universidade não parece ter dado
demonstrações evidentes de superar estas mazelas. Diversidade de experiências de
formação na ação e de reflexão na ação (SCHÖN, 2000) e a produção de
significados pelo aluno, poderiam constituir-se em elementos estruturadores mais
presentes nos cursos de formação inicial.
!
3.2. FORMAÇÃO PERMANENTE: CONCEITOS E IMPLICAÇÕES
O tema formação permanente abriga uma diversidade de concepções
associadas aos objetivos e aos modelos de relação entre o sujeito e os conteúdos.
Inicialmente cabe definir o significado atribuído neste estudo à expressão formação
permanente. Refere-se a:
[...] um estudo de caráter permanente com vistas a propiciar
oportunidades de promoção social, não devendo ser confundida com
atividades de reciclagem, visando apenas uma atualização nos
avanços específicos de cada área. Formação permanente pode ser
ainda entendida como aperfeiçoamento, formação profissional
continuada, formação em serviço: termos que podem estar
agrupados, ainda que contenham pequenas diferenças (GÜNTHER,
2000, p. 31-32).
Esta diversidade de termos acarreta, de fato, dificuldades para definir o que
melhor se adequaria a este estudo. No entanto, opto pela expressão formação
permanente por entender que o termo abriga de forma mais adequada as
!
C@!
associações com as idéias de processo, de múltiplos atores que dela participam e
da superação de sua redução a uma dimensão instrumental. Subjaz nesta opção,
por este termo mais abrangente, também a sua intrínseca relação com questões de
ordem política, seja no que se refere aos aspectos de intencionalidade ideológica,
seja do lugar em que é posto o sujeito da formação.
A importância dada à formação permanente decorre do sentido a ela
atribuído de dar sustentação à atuação deste professor, submetido às tensões de
um contexto complexo em que sua intervenção se materializa. Na referência que
faço à complexidade na docência reporto-me a uma reflexão semelhante de
Perrenoud (2001), quando diz:
[...] falar de complexidade significa falar de si mesmo e dos
outros frente à realidade. Significa questionar nossa representação e
nosso controle do mundo, especialmente do mundo social. Significa
também verificar quais são nossas ferramentas de compreensão, de
antecipação e de ação (PERRENOUD, 2001, p. 30).
Esta identificação de ferramentas para compreensão do mundo, de
construção de competências capazes de superar os desafios do complexo,
constituem objetos da formação como processo. Dela fazem parte as experiências
da família, da escolaridade, dos múltiplos ambientes e relações que o indivíduo
estabelece e que conformam seus esquemas de ação, os seus habitus, conceitos
estes já apresentados nas discussões sobre a prática docente (LAHIRE, 2002, 2004;
PERRENOUD, 2001, 2002; SANCHOTENE, 2007). Somam-se a estes as
experiências da formação inicial, esta, tema do próximo bloco.
Ao tematizar a formação permanente, entendo o papel das contribuições
que todas estas experiências imprimem ao sujeito, bem como a incompletude e as
lacunas que elas mantém sem resposta, pela singularidade e o ineditismo que a
realidade apresenta.
Entretanto, as análises sobre formação permanente parecem estar
intimamente ligadas com a busca de compreensão sobre a profissionalização do
trabalho docente. A busca de identificação das competências que caracterizam a
docência como profissão tendem a estabelecer amarras com o modelo e as
estratégias de formação.
!
CA!
A idéia de profissionalidade não vem desprovida de discussões desde a
origem histórica do ofício ou sobre matriz teórica em que se situa sua atribuição de
significado. Da origem no magistério como sacerdócio/vocação com raízes no séc.
XVI e forte ligação com a Igreja, quando da abertura de escolas elementares para
classes populares até o contexto atual, no qual o trabalho docente se constitui
fortemente atrelado à lógica capitalista da produtividade, da racionalização, da
proletarização existe um longo e tortuoso trajeto de construção de um status e de
representação no espaço social (HYPÓLITO, 1997).
Ainda sobre a da profissionalização do trabalho docente, diferentes autores
analisam o tema por diferentes matrizes conceituais. As implicações do processo de
profissionalização associada à proletarização do trabalho do professorado assumem
um aspecto significativo nesta discussão. Sobre esta discussão o mesmo autor
apresenta conjuntos de características que sustentam a tese, e outras que contra-
argumentam ou dão outros significados à mesma tese. Sobre as que afirmam o
processo de proletarização (HYPÓLITO, 1997):
Trabalho docente como modalidade de trabalho tipicamente capitalista
Prolongada jornada de trabalho
Difíceis condições profissionais
Processo de alienação e desqualificação de seu trabalho
Baixos salários
Organização de movimentos de reivindicações, luta e greves; constituição de
entidades de classe: sindicatos, associações, conselhos
Racionalização e fragmentação do trabalho conduzindo a sua intensificação,
diminuindo a possibilidade de pensar, compartilhar, programar e planejar
Dependência de determinações externas, de tecnologias!
Os contra-argumentos ou ressignificações à tese apresentados por este
autor são:
As características acima colocadas retirariam o caráter missionário,
sacerdotal do professor
Existem muitos grupos de professores: universitários, rurais, primários,
particulares não constituem um coletivo homogêneo de culturas e práticas
!
D;!
Professores mantém boa parte do controle de seu trabalho, gozando de uma
certa autonomia
Os professores sofreram um proletarização ideológica (controle sobre os fins
do trabalho), exercendo algum controle sobre a proletarização técnica (modos
de execução do trabalho)
É preciso uma série de aspectos para definir um grupo em uma classe social
definida (identidade, representações, habitus, situação no espaço social)
Interesses nem sempre coincidem com o do operariado!
Estas características apresentadas e discutidas por Hypólito (1997) não
constituem-se, sob a minha perspectiva, como opostas ou excludentes entre si.
Dada a diversidade dos sujeitos, dos lugares e contextos plurais em que sua prática
ocorre, entendo que as tensões oriundas das relações capitalistas contemporâneas
assumem caráter hegemônico sobre o trabalho docente; por outro lado, o forte
componente reflexivo e a dose de autonomia que estejam associados a ele,
fornecem as condições para rupturas e constituição de cenários de resistência.
Ao aludir brevemente sobre questões que envolvem a profissionalização da
docência, pretendi fazê-lo para referir que a formação permanente tende a
reproduzir discursos e concepções acerca do que se espera da atuação profissional.
Os tempos e estratégias formais de formação permanente seja os da formação
inicial ou nas situações de formação em serviço – materializam uma intencionalidade
propositiva. A constituição de um modelo de sociedade, de relação trabalho e
produção, acabaram por imprimir marcas no sentido atribuído à profissionalidade, às
noções de competências e ao processo formativo capaz de fazê-las emergir
(PERRENOUD, 2001, 2002).
Recorro às reflexões de Tardif quando este destaca o papel de uma
epistemologia da prática profissional como um “conjunto de saberes utilizados
realmente pelos profissionais em seu espaço de trabalho cotidiano para
desempenhar todas as suas tarefas” (TARDIF, 2007, p. 255), buscando evidenciar o
distanciamento entre os saberes acadêmicos e as solicitações da profissionalidade
factual, podendo conduzir a situações de ruptura de simples rejeição à formação
teórica universitária ou de adaptação acrítica destes conhecimentos para adequá-los
às exigências cotidianas. Identificadas as rupturas e os desafios que se constituem
!
D:!
no cotidiano do trabalho docente, o processo de formação permanente assume um
papel significativo.
Pérez Gómez (1998, p. 399), apresenta-nos quatro perspectivas de
formação docente acadêmica, técnica, prática e de reconstrução social, a partir
das quais estabeleço esta análise inicial.
Ao aproximar o que define cada um destes enfoques e a dinamicidade da
docência, destaco duas destas: a primeira é a perspectiva prática, na qual o autor
enfatiza que “a atuação do professor/a se apóia em conhecimentos práticos
adquiridos através da experiência cotidiana, nas interações da vida de aula” (PERÉZ
GÓMEZ, 1998, p. 415). Sua intervenção autônoma supõe incorporar o significativo e
o relevante para compreender e experimentar em cada contexto singular.
A segunda perspectiva que enfatizo é a da reflexão da prática para a
reconstrução social – parte da concepção de docência como atividade crítica, repleta
de opções e desafios de caráter ético, que pretende promover desenvolvimento
autônomo e emancipador daqueles envolvidos no processo educativo. Enquanto
processo de formação profissional, pressupõe três aspectos fundamentais:
A aquisição de uma bagagem cultural de clara orientação política e social.
O desenvolvimento de capacidades de reflexão crítica sobre as práticas, que
possibilitem o desmascaramento dos seus aspectos hegemônicos ocultos.
O desenvolvimento de atitudes deste professor/intelectual transformador
comprometidas politicamente com investigação, iniciativa, solidariedade e
colaboração.
Acredito que o conhecimento deva ser entendido como um processo que se
constrói nas trocas significativas com o outro, bem como no confronto de antigas e
novas concepções teóricas, tendo em vista a elaboração de novas significações à
prática pedagógica.
Nesta perspectiva, reveste-se de fundamental importância a possibilidade de
empreender ações de ação-reflexão, de um aprender com o fazer profissional. Em
especial para a EF, pela multiplicidade de espaços e conteúdos relacionados ao seu
campo de intervenção profissional, este processo continuado, crítico-reflexivo
assume grande relevância, como aponta Molina Neto (1997):
!
DB!
[...] é certo que muito do que faz o professorado de Educação
Física na escola pública, aprendeu fora dos Institutos de Formação,
antes, durante e depois. A experiência que se constrói junto com a
prática do dia-a-dia é um elemento fundamental da cultura docente
do professorado de educação física (MOLINA NETO, 1997, p. 37).
Ao mesmo tempo que valoriza a reflexão sobre o fazer cotidiano do
professor de EF, o texto de Molina Neto permite pensar neste professor como autor,
como produtor de conhecimento. Mas instiga também a pôr em questão o quanto
este professor identifica-se desta forma, autoriza-se como pesquisador de sua
própria prática. Entre outros fatores, o status de sofisticação associado à pesquisa
(DEMO, 2001), a construção de uma representação do professor de EF como um
profissional prático, parecem ter afastado este educador de sua identificação como
um pesquisador na ação.
Uma das estratégias de formação para pensar este percurso do professor
prático para o professor comprometido em reflexionar sobre o seu fazer e a partir
disto construir significados, poderia apoiar-se nas biografias docentes, em exercícios
autobiográficos que permitam ao professor identificar suas próprias representações
da docência e atribuir valores ao seu fazer como conhecimento. A formação
abordada como auto-formação, como sugere Nieto (2006):
Começo por minha própria história porque creio que toda
docência é, afinal, autobiográfica e que é um processo de evolução.
Somente através da reflexão sobre esta evolução podemos
compreender nossos motivos, aspirações e inclusive, o êxito e o
fracasso dos professores (NIETO, 2006, p. 34).
Cada professor carrega a sua biografia para o seu espaço de trabalho, para
a concretude de suas práticas. As marcas de suas trajetórias manifestando-se no
cotidiano. Algumas a serem explicitadas, outras a serem silenciadas. O caldo de
cultura no qual a formação profissional procura intervir é a própria vida de cada
professor: desde sua experiência como aluno, sua passagem pela formação inicial,
seus trajetos no mundo do trabalho. Recorro novamente à Nieto (2006):
Os docentes não deixam seus valores na porta quando entram
em aula. Ao contrário, por mais que queiram escondê-los ou evitá-
los, seus valores e crenças cruzam a porta com eles. De fato, os
docentes levam toda sua autobiografia consigo: suas experiências,
identidades, valores, crenças, atitudes, obsessões, preferências,
!
D=!
desejos, sonhos e esperanças. É inútil que o neguem; o máximo que
podem fazer é reconhecer como tudo isto pode ou bem dificultar ou
bem melhorar seu trabalho com os alunos (NIETO, 2006, p. 51-52
15
).
Ao reforçar uma abordagem que valoriza a reflexão sobre a ação,
compartilho as preocupações de Nóvoa (1999), referidas, e às propostas por
Gimeno Sacristán (1999):
Os professores não produzem o conhecimento que são
chamados a reproduzir, nem determinam as estratégias práticas de
ação. Por isso, é muito importante analisar o significado da prática
educativa e compreender as suas consequências no plano da
formação de professores e do estatuto da profissão docente
(GIMENO SACRISTÁN, 1999, p. 68).
!
Cabe também diferenciar uma proposta centrada na produção de
conhecimentos e significados atribuídos pelos sujeitos da ação daquelas
frequentemente identificadas aos modelos tradicionais de formação centrada nos
conteúdos. A possibilidade de seu distanciamento dos contextos em que se dá o
trabalho do professor pode levar ao seu não comprometimento e ao descrédito e
desinvestimento no seu processo de formação permanente. Idéia esta bem
apresentada por Sonia Nieto (2006):
O simples proporcionar de cursos, seminários e outra
atividades de reciclagem profissional nos quais não têm voz nem
voto, por melhores que sejam as intenções com que os
proporcionam, está destinado ao fracasso (NIETO, 2006, p. 164).
Aqui reside um aspecto relevante que pretendi abordar sobre formação
permanente, no que se refere a sua intencionalidade, ao papel proposto para o
professor neste processo e as posições que este professor se propõe a assumir: de
apropriação passiva de conhecimentos instrumentais ou de professor-pesquisador, a
empreender um esforço crítico-reflexivo sobre suas práticas.
Ao final deste capítulo ficam elementos para a análise de como as
estratégias e procedimentos de formação permanente geraram efeitos diferenciados
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
15
A tradução deste e de outros fragmentos de obras escritas em outros idiomas foram feitas sob
minha responsabilidade.
!
DC!
no professorado da SME. Suas aprendizagens ao longo de suas trajetórias, suas
experiências na SME e fora dela, estabeleceram diálogos singulares com as
diretrizes político-pedagógicas, construindo manifestações também singulares na
sua prática docente.
!
DD!
4. DIMENSÕES POLÍTICAS E SUAS RELAÇÕES COM O MUNDO DO
TRABALHO E COM A FORMAÇÃO PERMANENTE
Para dar início a este bloco, é importante situar a abordagem dada ao termo
política, por abrigar sentidos distintos e, ao mesmo tempo, interligados. Recorro a
Muller e Surel (2004) que se utilizam da diferenciação de termos da língua inglesa
para atribuir seus diferentes sentidos:
Com efeito, este termo [política] cobre, ao mesmo tempo, a
esfera da política (polity), a atividades política (politics) e a ação
pública (policies). A primeira faz a distinção entre o mundo da política
e a sociedade civil, podendo a fronteira entre os dois, sempre fluída,
variar segundo os lugares e as épocas; a segunda designa a
atividade política em geral (a competição pela obtenção dos cargos
políticos, o debate partidário, as diversas formas de mobilização...); a
terceira acepção, enfim, designa o processo pelo qual são
elaborados e implementados programas de ação pública, isto é,
dispositivos político-administrativos coordenados em princípio em
torno de objetivos explícitos (MULLER; SUREL, 2004, p. 13) [grifo
meu].
Decorre desta distinção o entendimento que a ação política materializa
concepções sobre o mundo, as relações sociais, as formas de produção e acesso
aos bens de consumo, bem como o papel do Estado como propositor e ou mediador
destas relações. Antes de buscar um conceito, procuro compartilhar algumas noções
sobre o Estado, de tal modo que se possa melhor entender o contexto político,
jurídico e social que se desdobra a partir destas concepções fundantes sobre os
modelos do Estado hoje.
Norberto Bobbio refere-se ao Estado,
[...] entendido como ordenamento político de uma comunidade,
nasce da dissolução da comunidade primitiva fundada sobre os laços
de parentesco e da formação de comunidades mais amplas
derivadas da união de vários grupos familiares por razões de
sobrevivência interna (o sustento) e externas (a defesa) (BOBBIO,
1987. p. 73).
Vários autores como Muller e Surel (2004), Soares e Caccia-Bava (1998) e
Boneti (2006) tecem análises sobre o modelo e papel do Estado, sem no entanto,
estabelecerem formulações sobre o que é o Estado. Recorro novamente à Bobbio
!
D>!
(1987, p. 94), buscando uma definição fortemente marcada pela abordagem jurídica,
abrangente, e que supera de alguma forma, definições matizadas pelo viés
ideológico, mas que me parece adequada para a compreensão daquilo que pauta as
reflexões sobre as políticas, enquanto expressões fortemente imbricadas com o
modelo do Estado:
[…] o Estado tem sido definido através de três elementos
constitutivos: o povo, o território e a soberania [...] Para citar uma
definição corrente e autorizada, o Estado é “um ordenamento jurídico
destinado a exercer o poder soberano sobre um dado território, ao
qual estão necessariamente subordinados os sujeitos a ele
pertencentes”. [...] o poder soberano torna-se o poder de criar e
aplicar direito (ou seja, normas vinculatórias) num território e para um
povo, poder que recebe sua validade da norma fundamental e da
capacidade de se fazer valer recorrendo inclusive, em última
instancia, à força, e portanto do fato de ser não apenas legítimo mas
também eficaz (legitimidade e eficácia referenciam-se uma a outra);
o território torna-se o limite de validade espacial do direito do Estado
[...] o povo torna-se o limite da validade pessoal do direito Estado, no
sentido de que as próprias normas jurídicas valem apenas, salvo
casos excepcionais, para determinados sujeitos que, deste modo,
passam a constituir os cidadãos do Estado (BOBBIO, 1987, p. 94).
É importante destacar a complexidade do cenário econômico e social num
mundo globalizado e organizado a partir da lógica capitalista. Significa dizer que
tensões constituídas em outros países ou organizações de atuação transnacional
podem interferir nos projetos políticos pelo mundo afora. E isto, desdobrando sobre
as diversas classes sociais e a organização da sociedade civil.
Cabe então, buscar diferenciar as formas de estruturação e intervenção do
Estado, segundo seus pressupostos ideológicos. O Estado neoliberal é fortemente
marcado pela lógica da intervenção mínima sobre o mercado, deixando para este a
responsabilidade de regulação do processo de produção e acesso aos bens sejam
eles materiais, culturais ou serviços (SINGER, 2002).
Decorre disto, um modelo de gestão pública marcada pela privatização,
inclusive em áreas de espectro amplo como: produção e distribuição de energia,
rede de circulação viária, saúde, previdência social, entre outras. Sob o discurso de
que o Estado não consegue dar conta de forma tão competente quanto a iniciativa
privada, caberia ao cidadão ter as condições, advindas do mercado, de acesso a
estes bens: via de regra, quem tem, “compra”, quem não tem fica à margem do
processo.
!
D?!
Segundo este modelo, podemos ter que os bens culturais atividades e
programas de recreação e lazer, música, teatro, entre tantos outros – torna-se
responsabilidade de iniciativa privada, tratados como bens de consumo de uma
indústria cultural, como apontado por Marcellino (1987, 2001, 2003) ao longo de sua
obra.
Uma outra visão é a que tem sido proposta e implementada pelo campo da
esquerda, tanto nos países da Europa que elegeram como modelo político partidos
de orientação socialista, bem como no próprio Brasil, onde experiências de cunho
democrático-participativo se constituíram nas diversas esferas: municipais, estaduais
e federal.
O Estado acima referido assume outra perspectiva quanto ao seu papel nas
relações com a economia, a sociedade civil e sua intervenção no que se refere a
políticas essenciais: inverte a lógica do Estado mínimo, não desonerando-se de sua
responsabilidade de propor, implementar ações e estabelecer canais de participação
efetiva da sociedade na priorização destas políticas.
Algumas das experiências de gestão participativa são tratadas na obra de
Soares e Caccia-Bava (2002), trazendo para a cena os pressupostos de um modelo
de intervenção do Estado que coloca o foco das ações no reconhecimento das
desigualdades e injustiças sociais: o Brasil “não é um país pobre, mas sim um país
injusto” (COHN, 1998, p. 143).
Portanto, o desafio da superação da pobreza, seja ela de caráter
essencialmente econômico ou cultural, passa não só pelo aumento absoluto da
produção destes bens, mas em
associar a questão da superação da pobreza a medidas de caráter
redistributivo, de transferência direta de renda, de transferência
indireta, por meio de políticas sociais efetivamente redistributivas, e
não meramente compensatórias das desigualdades sociais (COHN,
1998, p. 144).
!
Os principais desdobramentos desta perspectiva é que o Estado deve
buscar garantir o acesso aos bens (alimentação, saúde, educação, trabalho, cultura
e lazer, previdência social) a todos os cidadãos, partindo, no entanto, do
reconhecimento das desigualdades sociais. Neste enfoque, cabe ao Estado, um
!
D@!
papel redistributivo, que tem nas políticas públicas a materialização de sua
intervenção.
Desta forma, podemos ver que o modelo de Estado parece ser determinante
na constituição das políticas públicas, privadas, na sustentação jurídica que se
estrutura para legitimar a forma de intervenção deste Estado na sociedade que o
constitui. Tanto maior será a busca de abrangência e de investimento de poder ao
Estado quanto mais a sua sustentação ideológica entenda o direito social como para
todos: saúde, trabalho, educação, alimentação, moradia, cultura, lazer, transporte,
segurança, são campos que podem ser devolvidos para a lógica do mercado no
Estado mínimo neoliberal, ou entendidos e assumidos pelo Estado como sua
responsabilidade na garantia dos direitos a todos os cidadãos.
Decorre destas reflexões um entendimento de que o ato político é um ato
intencional, que materialidade ao modelo ideológico, atuando para garantir a
lógica de suas concepções. É o que aponta Stigger (1998), ao falar de políticas
públicas:
[...] se está falando de um determinado tipo de intervenção.
Intervenção essa que, necessariamente, deverá trazer consigo e ter,
como ponto de partida, a posição político-ideológica que a norteia, a
qual deverá estar inserida na concretização de todas as ações que
vierem a ser adotadas (STIGGER, 1998, p. 84).
Considerando as reflexões anteriores sobre as possibilidades de
constituição do Estado, poderíamos, na busca de uma síntese, pensar que a política
pública é a forma de ação/intervenção de um modelo de Estado sobre um
determinado campo, entendida também a não-ação/não-intervenção como uma
tomada de posição. Ao buscarmos identificar a prioridade de investimentos públicos
sobre saúde pública, por exemplo, temos a concretização da visão do Estado sobre
sua responsabilidade em levar saúde enquanto direito do cidadão, e não como
produto privado, disponível aos que possam comprá-la. Num modelo inverso, o
Estado pode omitir-se de intervir na área, deixando para a esfera da iniciativa
privada a oferta e custeio de bens e serviços.
Não desvinculados dos aspectos levantados até aqui, os pressupostos para
tomada de decisão por parte do Estado e a concepção de gestão são de grande
importância. Num modelo centralizador, um corpo técnico/político estabelece
!
DA!
prioridades e estratégias de ação setorial, muitas vezes sem conexões efetivas com
os diversos segmentos sociais que demandam por intervenções. Talvez, como nos
aponta Boneti (2006), pela presença ainda marcante de uma tradição iluminista (p.
20) onde a busca de verdades de caráter científico, de cunho universalista, trazem
como implicações no campo da política, não a busca de uma homogeinização,
mas partem do princípio de que a sociedade é homogênea, colocando a ação da
política pública no sentido de igualar e não o de identificar e resolver as
desigualdades.
Aliás, é de central importância no entendimento e debate da política pública,
uma discussão sobre igualdade/desigualdade, democracia/acesso efetivo.
Entendidos nos seus sentidos mais amplos, e nas implicações conceituais que as
envolvem e dão concretude, a pressuposição de que a democracia apoiada no
aparato legal garantiria a igualdade, tem dado mostras inequívocas de sua
insuficiência. Assentar a ação política pública no pressuposto de que todos os
cidadãos são iguais perante a lei, iguais no que se refere aos preceitos
constitucionais, significa manter o cenário de hegemonias, de preservação dos
interesses das classes dominantes, não na esfera econômica mas também no
que se refere aos bens culturais.
O reconhecimento das desigualdades como pressuposto para a ação
política coloca sob a responsabilidade do Estado buscar um reordenamento amplo
do acesso aos bens e serviços essenciais para aqueles membros da sociedade que
encontram-se privados de condições dignas de cidadania. Privações estas que não
se resumem a dimensão econômica, como bem destaca Boneti (2006) sobre estudo
feito sobre o tema desigualdade:
A pessoa pobre entrevistada não utiliza como parâmetro de
pobreza o nível de rendimento familiar. Ela não percebe também o
analfabetismo e as condições materiais (habitação, a capacidade de
consumo, etc.) como sinônimo de pobreza. O pobre se sente pobre
quando não tem acesso ao trabalho, à escola, ao transporte coletivo,
aos serviços de saúde, etc. (BONETI, 2006; p. 36).
Longe de esgotar as discussões de espectro mais amplo sobre o papel do
Estado no estabelecimento de prioridades e de agendas que dêem conta de reverter
o contexto de profundas distorções sociais ao redor do planeta, cabe-nos identificar
possibilidades ou o que Muller e Surel (2004, p. 144) chamam de “janelas de
!
>;!
oportunidade”, onde os próprios mecanismos de crise expõem contextos de
vulnerabilidade, de disputa de poder, de contradição, abrindo caminhos possíveis
para sua superação.
O objetivo neste ponto do estudo é buscar situar, na perspectiva do Estado,
os significados da criação de um órgão de primeiro escalão da administração
municipal voltado ao campo do esporte e lazer, campo este ligado às políticas
sociais; cabe também buscar identificar quais os segmentos da sociedade
participaram no estabelecimento de tensões para esta criação.
No decorrer da primeira gestão da Frente Popular (1989-1993), uma
administração municipal auto-anunciada de viés socialista, o governo buscava dar
concretude as suas principais plataformas de ação: a gestão participativa, a ênfase
na organização comunitária, mas fundamentalmente, a inversão de prioridades da
política pública, tendo em vista a estrutura sócio-econômica da população. Estes
eixos programáticos marcaram e se mantiveram ao longo de todo o período do
governo municipal nominado ADMINISTRAÇÃO POPULAR (1989 – 2004).
As principais ações nesta direção centraram-se no saneamento básico e nas
obras infraestruturais em regiões periféricas da cidade, onde reconhecidamente
encontravam-se as comunidades mais desprovidas das condições básicas de
cidadania. Junto a isto, novas políticas de saúde comunitária e assistência social
também passaram a receber investimento.
Na primeira gestão, toda uma nova proposta pedagógica passa a ser
discutida na Secretaria Municipal de Educação (SMED) com o professorado
municipal, num movimento que veio posteriormente a introduzir e consolidar o
ensino por Ciclos de Formação. O esporte e o lazer, na sua dimensão escolar,
estavam contemplados nesta trajetória. A prática e a formação deste professorado
de educação física, neste novo contexto, aparecem amplamente estudadas por
Molina Neto (1997), Molina (2001), Günther (2000), Bossle (2003), Wittizorecki
(2001), entre outros.
No entanto, dentro desta mesma SMED, estava um departamento alçado à
instância de supervisão em 1987, que respondia por ações de esporte, recreação e
lazer para além dos muros escolares municipais. Este órgão, circunscrito à condição
de apêndice da estrutura da educação, guardava em si uma história de inovação,
vanguarda e pioneirismo que remonta a 1926, quando da criação do Jardim de
Recreio por Frederico Guilherme Gaelzer, até a criação de um Serviço de
!
>:!
Recreação Pública em 1950, história esta analisada por Feix (2003). Neste período,
a autora destaca não os aspectos de pioneirismo e inovação na utilização destes
equipamentos públicos mas também do avanço da proposta pedagógica de ativação
destes espaços, com professores atuando na organização de atividades esportivas e
recreativas para as crianças e jovens da cidade.
No entanto, na década de 70 um outro conteúdo cultural vem ocupar
espaços na agenda das políticas públicas: o lazer passa a ser objeto de estudos
específicos no Brasil (MASCARENHAS, 2003), tendo no sociólogo francês Joffre
Dumazedier um dos grandes teóricos que influenciou tanto os estudos no país como
as ações do Serviço Social do Comércio (SESC), bem como a matriz do trabalho da
Fundação de Educação Social e Comunitária (FESC), no convênio entre PMPA,
SMEC
16
e PUCRS
17
/Centro de Estudos do Lazer (CELAR), objeto de estudos de
Molina (1997).
O tema lazer assumiu um papel de maior relevância no cenário brasileiro
quando do seu reconhecimento constitucional (Constituição Federal de 1988
reforçado pelas Emendas de 2000 - art. 6o, e 217º, §3º)
18
. As demandas e
agendas de eventos esportivos e recreativos numa cidade com grande número de
parques e praças tencionaram o centro do governo municipal para implantação de
uma política mais específica de esporte e lazer para a cidade. Não pretendo
aprofundar neste ponto as concepções de lazer e esporte enquanto objeto da ação
política, deixando estas análises para o próximo bloco.
No entanto, parece significativa a reflexão sobre o papel contraditório que
esporte, recreação e lazer representavam dentro de um programa de governo
identificado com uma proposta de esquerda, de cunho democrático-participativo.
Estes conteúdos, que historicamente eram vinculados pelos autores ligados à
esquerda como meios para alienação do proletariado, como manifestações
hegemônicas do recente estágio de desenvolvimento capitalista, agora deveriam
compor de forma coerente o programa de governo de uma coalização política
identificada com um ideário socialista. O grande desafio naquele momento seria
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
16
Secretaria Municipal de Educação e Cultura.
17
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.
18
Com desdobramentos em praticamente todas as constituições estaduais e leis orgânicas (ME,
2007).
!
>B!
vencer as resistências políticas internas, tendo em vista discursos recorrentes da
esquerda de então, acerca dos temas e ações implementadas pela SERP/SMED.
Estas discussões e disputas conceituais e programáticas pautaram diversos
movimentos que acabaram por articular representantes do professorado e líderes do
PT, provocando tensões sobre executivo e legislativo de tal forma que em 1993 é
criada a Secretaria Municipal de Esportes, Recreação e Lazer
19
.
Criada e regulamentada a SME, e para além das disputas por dotação
orçamentária e constituição de uma equipe de trabalho para dar conta do
organograma constituído, seguiam em pauta e disputa as concepções de lazer e
esporte enquanto constructo teórico, decorrente de uma visão de homem, sociedade
e os papéis do Estado na proposição, implementação e mediação desta política
setorial. Adviria daí a definição da linha político-pedagógica que nortearia o trabalho
do professorado.
Retomo neste ponto às postulações da Administração Popular, para a qual
a lógica neoliberal vigente nas políticas públicas do município até então, deveria ser
contraposta. O lazer não deveria reduzir-se às suas dimensões funcionalistas
(MARCELLINO, 1987, p. 35). Deveria, outrossim, não se submeter à lógica
mercadológica, de um lazer enquanto produto de consumo, ou de viés utilitarista de
capacitação para o próprio trabalho, mas um lazer entendido enquanto a “cultura
compreendida no seu sentido mais amplo vivenciada (praticada ou fruída) no
‘tempo disponível’” (MARCELLINO, 1987, p. 31).
Compreendido pelo coletivo de gestão e de professores que este enunciado
dava conta da visão de lazer pensada para a cidade, não é por acaso que este
tornou-se o conceito norteador das ações pela SME. Visão de lazer alicerçada em
eixos norteadores como emancipação, autonomia e cidadania (SME/PMPA, 1995,
1997, 2000-2004).
Neste ponto procuro refletir sobre as interrelações possíveis entre as
diretrizes de ordem macro política e a concepção e implementação de ações de
formação permanente; e como consequência deste realinhamento da pauta político-
pedagógica, os desdobramentos na prática docente.
O grande desafio de um processo de formação para um coletivo de
professores como o da SME, dada a diversidade de práticas da cultura do
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
19
Lei 7330, de 5 outubro de 1993, assinada pelo então prefeito de Porto Alegre, Tarso Genro.
!
>=!
movimento humano e da diferenciação do espaço não-escolar e os vínculos
estabelecidos com a sociedade, abriga diversos dilemas e desafios. O que me
parece como questão de fundo é a discussão apresentada sobre o papel de sua
intervenção: educador ou animador, crítico-transformador ou reprodutor de lógicas
hegemônicas. Esta é uma questão desafiadora, pois exige do Estado nas suas
diversas instâncias, explicitar sua visão e seu modelo de intervenção.
Sobre outros aspectos essenciais da prática docente do professorado da
SME cabem reflexões similares: vista a presença marcante e o significado das
diversas manifestações que o esporte assume dentro da SME, a explicitação da
visão institucional sobre este tema deveria entrar “em contato” com as práticas dos
professores de tal forma a sustentar e superar as tensões que pudessem emergir
deste debate; longe de querer encerrar o esporte numa definição ou conceito, como
bem adverte Stigger (2005), o reconhecimento da diversidade pode ser exatamente
a garantia da não consolidação de um único modelo de intervenção e de
entendimento sobre o esporte na esfera da atuação da SME.
!
>C!
5. PROBLEMA DE PESQUISA
Este estudo tem por sujeito de investigação o professor de EF, atuante
numa instituição pública do município de Porto Alegre Secretaria Municipal de
Esportes Recreação e Lazer cujos espaços e tempos de atuação são externos à
escola, e por consequência, operam numa lógica peculiar, abrigando similaridades e
contradições em relação aos rituais, às estruturas burocráticas da instituição escolar;
e, numa reflexão mais ampla, abriga estas tensões na construção de identidades e
de significados atribuídos pela sociedade, pelo Estado e pelo próprio coletivo
profissional que nela atua.
Ao mesmo tempo, a concepção historicamente constituída da instituição
quanto aos três referentes de intervenção com o coletivo de professores de EF
esporte, recreação e lazer são os pautados pela ação educativa. Tanto nos textos
legais, que criam e regulamentam a SME (PMPA, 1993), ou nos que orientam
pedagogicamente a ação docente (SME-PMPA, 1995, 2001, 2002, 2003, 2004),
quanto na observação cotidiana deste trabalho, caracteriza-se o estabelecimento de
relações com a sociedade numa abordagem educativa. Some-se ao processo de
aproximação da realidade institucional o fato de que sou parte deste coletivo desde
1990, como detalharei em bloco posterior, sobre a trajetória do investigador.
Dito isto, busco situar o presente estudo no campo da investigação
educativa que mesmo não tendo como lócus de atuação a escola, o processo
central da ação deste coletivo de professores é o ato educativo. Proponho a reflexão
sobre esta relação de disputa e de identidade do fazer da SME, do “ser-não ser”
professor, na provocação feita por Gimeno Sacristán (1999):
À educação referem-se ações muito diversas, que influenciam
a prática didática. Nesta perspectiva, é necessário alargar o conceito
de prática, não a limitando ao domínio metodológico e ao espaço
escolar (GIMENO SACRISTÁN, 1999, p. 68).
Na reflexão sobre a profissionalidade na instituição, os seus encantos,
contradições e conflitos, identifiquei que a trajetória de formação permanente esta
tomada num sentido amplo de possibilidades: da pauta e serviços de apoio
institucional, do intercâmbio com colegas, de tempos e espaços de partilha foi
fundamental na minha /construção profissional. No entanto, as condições para esta
!
>D!
formação não se apresentaram de forma linear, sistemática ou articulada com as
necessidades oriundas da prática docente.
Sob a perspectiva do investigador-sujeito que reflexiona sobre sua
caminhada, esta formação permanente andou em estreita relação com a formação
profissional institucional: tempos e espaços que de alguma forma viabilizavam a
troca entre pares profissionais, a reflexão coletiva, a discussão de problemas e,
inclusive, a constituição de um campo de disputas para conceitos e práticas
antagônicas.
A interação com meus colegas ao longo destes quase 20 anos apontava
para incompletudes, para manifestações de entusiasmo em produções coletivas, de
desabafos por desencanto e desamparo frente aos desafios do cotidiano; para
temas e dinâmicas de reuniões instigantes e produtivas; de palestrantes e temas
descontextualizados e que não agregavam valor ao trabalho. Por fim, vivi e comparti
tempos em que a proposta institucional de formação permanente era tão rotineira
que consolidou grupos de trabalho em constante reflexão sobre o seu fazer, ao
mesmo tempo que tornou-se banalizada e desprovida de maiores impactos no fazer
docente. Mas, também vivi e comparti tempos de inexistência de tempos; de um
silêncio obscuro de propostas institucionais para esta formação, tempos em que não
nos encontramos, em que pouco sabíamos do outro.
Motivado a tentar compreender como formação profissional e prática
docente dialogam, atam ou desatam os nós do cotidiano, procurei empreender um
estudo que tome como sujeito central o professor da SME: a observação e a escuta
do que ele tem a dizer sobre si e nisto a opção pela etnografia educativa, por
permitir aquilo que Molina Neto (2004) aponta como possibilidade de interação entre
o sujeito e o objeto do estudo. O mesmo autor destaca também:
Promove o exercício do pensamento dialético entre a teoria e a
prática, entre o fato e a reflexão, entre a objetividade e a
subjetividade, que tanto o investigador como o investigado estão
impregnados do contexto mais amplo. Na interação desenvolvida
pela atividade investigadora, investigador-investigado ensinam, um
ao outro, por meio dos signos apreendidos da realidade que os
circunda e nas expectativas de como gostariam que ela fosse
(MOLINA NETO, 2004, p. 116).
!
>>!
Esta abordagem sintetiza de forma significativa as expectativas e os
desafios que nortearam este empreendimento: escolher mais que ferramentas
metodológicas, um conceito de investigação e de produção de conhecimento que
abrigasse a minha condição de forte envolvimento com a instituição e com o
conjunto de professores da SME.
A partir das reflexões, revisitando os múltiplos fatos e contextos que foram
configurando a história institucional, estabelecendo desafios, provocando
desacomodações, superações e reinvenções na prática docente, configurei o
problema de investigação na seguinte pergunta-chave:
Quais significados o professorado de educação física da Secretaria
Municipal de Esportes, Recreação e Lazer de Porto Alegre atribui ao seu
processo de formação permanente e que impactos este processo produz no
cotidiano de sua prática pedagógica?
Sem as pretensões de produzir generalizações ou certezas, pretendo
contribuir com o processo de compreensão dos possíveis papéis que a formação
profissional exerça sobre a identidade do professor de EF da SME, bem como na
sustentação de suas práticas.
5.1. QUESTÕES DE PESQUISA
Tendo como centro a pergunta-chave, desdobro-a em questões mais
específicas, de tal forma a desencadear os eixos norteadores para o olhar
investigativo e o processo de análise e interpretação:
1. Como o professorado da SME compreende seu trabalho na instituição?
2. Que significados os professores de Educação Física da SME atribuem as
suas trajetórias de formação permanente, tanto inicial quanto as promovidas
pela instituição?
3. Que relações os professores da SME estabelecem entre formação
permanente e as suas práticas?
4. Que fatores os professores da SME identificam como intervenientes na sua
formação permanente e nas suas práticas?
!
>?!
6. OBJETIVOS DO ESTUDO
Tendo em vista as questões anteriormente expostas e as indagações que
delas decorrem, este estudo tem como objetivo central:
!
Compreender, a partir da perspectiva dos professores de educação
física da SME, o significado por eles atribuído ao seu processo de formação
permanente e os efeitos desta sobre as suas práticas profissionais, tendo em
vista a diversidade de conteúdos culturais e as peculiaridades da atuação num
espaço não escolar.
!
6.1. OBJETIVOS ESPECÍFICOS
!
Ao desdobrar o objetivo geral deste estudo, visando detalhar aspectos mais
pontuais da relação professorado da SME, formação permanente e prática
profissional, propus os seguintes objetivos específicos:
!
Identificar como os professores da SME referem-se à formação inicial e
às ações de formação permanente em diálogo com as suas práticas
profissionais.
Compreender como a diversidade de práticas profissionais da SME é
entendida pelos professores que nela atuam.
Descrever e interpretar as situações da prática cotidiana deste
professorado sob a perspectiva de suas referências e relações com o
processo de formação permanente.
!
>@!
7. DECISÕES METODOLÓGICAS
Neste bloco, apresento o conjunto de opções metodológicas tomadas frente
às questões do problema de pesquisa, bem como os pressupostos epistemológicos
que sustentaram as decisões tomadas. Nisto, assumo as convicções de caráter
teórico e epistemológico, bem como pelo conjunto de instrumentos e pelo desenho
que configuraram este estudo. Tendo em vista a sua natureza, de buscar
compreender significados de um determinado universo humano, de trazer a tona
tensões e disputas ligadas a um fazer profissional, de caráter educativo, repleto dos
signos culturais que ali se materializam, optei por um estudo qualitativo, de
abordagem fenomenológica, ou de “compreensão interpretativa das interações
humanas” (BOGDAN; BIKLEN; 1994, p. 53).
Neste contexto entendo a produção do conhecimento enquanto uma
representação do objeto cognoscente, estando assim repleta de subjetividades e
significados histórico-culturais manifestos nas decisões, observações e construções
teóricas que emergiram do processo interpretativo.
Dada a minha proximidade com o contexto do estudo procurei estar atento
para a não contaminação das observações, buscando condições para o
estranhamento de uma realidade bastante próxima a mim. Em outras palavras,
busquei confrontar permanentemente, como propõe Aguirre Baztán (1995), a
perspectiva dos sujeitos (os conceitos êmicos) e a minha própria perspectiva como
investigador (os conceitos éticos), de modo a evitar quer um corporativismo com o
contexto estudado ou o etnocentrismo enquanto pesquisador. Procurei, de outra
forma, ter na proximidade uma aliada que pudesse facilitar o processo de
negociação com o campo e que este “fazer parte” pudesse potencializar uma
relação dialética no processo investigativo: ações e reflexões tanto no sujeito
investigado quanto naquele que o investiga. Reafirmo, no entanto, que não foi sem
esforço e por vezes sofrimento, a manutenção do distanciamento para que o
processo de escuta, análise e interpretação; longe de procurar produzir um texto
neutro, esforcei-me para que este não se tornasse espaço de corporativismos,
discursos ideológicos, que de alguma forma, pudessem distorcer ou subverter as
vozes dos sujeitos que sustentaram o processo investigativo.
!
>A!
7.1. CARACTERIZAÇÃO DA INVESTIGAÇÃO
Conforme mencionado anteriormente, este estudo apoiou-se no
instrumental da pesquisa etnográfica. Esta escolha pareceu ser coerente com o
propósito da investigação, justificando-a como metodologia que permite a
reconstrução das vozes dos sujeitos envolvidos no problema de pesquisa. Outro
fator considerado nesta escolha, dada a minha longa e estreita relação com o
universo sob investigação, a possibilidade de uma descrição profunda ou densa,
como denomina Geertz (2008). Para o autor, o idéia de tal descrição reside no
esforço intelectual que busca “estabelecer relações, selecionar informantes,
transcrever, textos, levantar genealogias, mapear campos, manter um diário” (p.15)
ou seja, mais que uma descrição minuciosa, seria uma descrição feita nos termos do
vocabulário dos membros da comunidade estudada e que busca contemplar os
significados desses sujeitos, não como um espião ou pesquisador asséptico, mas
como um compatriota que os situa culturalmente.
Na medida em que me aproximava como pesquisador do cenário complexo
em que se encontravam os sujeitos professores da SME e da instituição SME
responsável pela proposição, planejamento e implementação de políticas setoriais
de esporte e lazer, ambos eivados de significados e representações construídas
culturalmente, reafirmei a convicção do imenso desafio do empreendimento
etnográfico, da descrição densa, daquilo que Bogdan e Biklen (1994) remete ao
trabalho do etnógrafo que
ao examinar a cultura com base nesta perspectiva [...] depara-se
com uma série de interpretações de vida, de interpretações do senso
comum [...] de apreender significados que os membros da cultura
têm como dados adquiridos e, posteriomente, apresentar o novo
significado às pessoas exteriores à cultura (BOGDAN; BIKLEN,
1994, p. 59).
Oriunda da pesquisa antropológica, a etnografia está consolidada como
ferramenta metodológica nos estudos na área educacional, sendo crescentemente
utilizada como possibilidade metodológica nas pesquisas em educação (ANDRÉ,
1995). Molina Neto (1997) indica que a etnografia educativa pode ser entendida
como
!
?;!
[...] um desenho de investigação que se nutre de fontes teóricas
provenientes da investigação antropológica, sociológica e
psicológica. É um tipo de investigação que tem uma primeira fase
interpretativa, onde o investigador confronta seus conceitos éticos
com os conceitos êmicos dos participantes. Revela-se de grande
eficácia no estudo de universos culturais particulares, uma vez que
através de entrevistas, observações e análise de documentos,
orientados pelo princípio da reflexividade, expõe o processo
educativo tais como ocorrem dentro de marcos sócio-culturais mais
amplos (MOLINA NETO, 1997, p. 41-42).
Busquei no texto de Woods (1995), mais sustentação para a situação que
supunha pudesse ser desconfortável face a minha grande aproximação com o
contexto investigado, da minha perspectiva do investigador “por dentro”. Para este
autor, a etnografia
[...] se interessa pelo que as pessoas fazem, como se comportam,
como interagem. Se propõe descobrir suas crenças, valores,
perspectivas, motivações e o modo em que tudo isso se desenvolve
ou muda com o tempo, ou de uma situação a outra. Trata de fazer
tudo isso, desde dentro do grupo e desde dentro da perspectiva dos
membros do grupo. O que importa são seus significados e
interpretações (WOODS, 1995, p. 18).
Apesar deste apoio teórico, busquei a vigilância que este exercício
etnográfico exigiria de mim, do equilíbrio tênue entre familiaridade e naturalização,
do fundamental exercício de estranhamento sobre o cotidiano, de buscar revelar os
pré-conceitos presentes no meu próprio olhar enquanto investigador, de forma a
minimizar as “certezas e as condenações prévias”. Busquei dar sentido ao que alerta
Silva (1996):
Esta proximidade exige que o pesquisador constantemente
esteja se auto-examinando para não perder de vista o sentido inicial
da pesquisa e para que consiga conduzir os encontros com os
sujeitos pesquisados na direção das respostas procuradas (SILVA,
1996, p. 92).
Partindo das considerações de Goetz e LeCompte (1988) sobre a
possibilidade que a etnografia ao leitor de recriar as crenças compartidas, as
práticas, os artefatos, o conhecimento popular e os comportamentos de um grupo de
pessoas, procurei não limitar a pesquisa etnográfica à mera descrição de situações,
!
?:!
ambientes, pessoas, ou à reprodução de suas falas e de seus depoimentos mas
constituir um quadro interpretativo capaz de permitir o compartilhamento da cultura
deste coletivo de professores, segundo o seu conjunto de códigos, valores e
representações.
Neste sentido a escolha pela etnografia educativa possibilitou condições
para superar modelos de pesquisa unilateral, estabelecendo um processo
transparente e ético de investigação, em que a voz dos colaboradores assuma um
papel relevante nos seus processos de reflexão e formação pessoal e profissional e
de outros pares que venham a identificar-se com o contexto aqui levantado. Um
grande desafio e objetivo como pesquisador é que aqueles que contribuíram com
este estudo possam identificar-se e sentir-se parte da construção deste texto
acadêmico.
7.2. DELIMITAÇÃO DO ESTUDO
O presente estudo estabeleceu seu foco de análise no professorado da
Secretaria Municipal de Esportes, Recreação e Lazer de Porto Alegre, tendo como
corte temporal o período compreendido de 1993 até 2009. Este período abrange
desde as movimentações políticas, sociais e profissionais que culminam com a sua
criação em outubro de 1993, passando por três administrações nas quais a SME
esteve sob a direção do PT, dentro da composição da Frente Popular contexto
este objeto do estudo de Santos (2003) e duas sob a direção do PDT, dentro do
coletivo de governo municipal sob o comando do PPS (2005-2008) e que permanece
a frente da Secretaria no governo eleito para o período 2009-2012).
Não desconsidera também o contexto histórico que a antecede, pelas
heranças e culturas incorporadas desde os seus primórdios enquanto Serviço de
Recreação Pública, DERP e por último a SERP.
Sendo a formação profissional o tema que sustenta este estudo,
consideramos todas as atividades apontadas pelos colaboradores como
significativas em seu processo de formação permanente: aquelas ações promovidas
de forma direta ou indireta pela instituição assim como aquelas que se dão no
espaço e no tempo não formalizado.
!
!
?B!
7.3. COLABORADORES DO ESTUDO
Para dar conta da representatividade tipológica dos sujeitos que atuam na
SME, elegi os critérios expostos no quadro 01 (p. 73).
Um dos elementos considerados se refere à especificidade da forma de
ingresso:
Concurso Público, de caráter generalista em educação física escolar;
Concurso Público específico, focado nas propostas político-pedagógicas
da instituição.
Outro elemento que orientou a construção de critérios para a definição do
quadro de representatividade tipológica refere-se à característica das práticas
profissionais propriamente ditas, construídas historicamente no cotidiano do que foi
a SERP, a SME e dos colegas oriundos da FASC
20
, que comportam conteúdos
relacionados ao esporte, à recreação, à promoção da saúde e realização de eventos
em diferentes escalas de abrangência para a população. Os professores
colaboradores atuaram em ao menos duas das áreas acima referidas.
Outro fator determinante na escolha dos colaboradores refere-se ao tempo
de trabalho na SME. Levando em consideração a importância do processo
interpretativo da construção histórica da instituição e dos sujeitos que com ela
interagem dialeticamente, entendi que o fator tempo de trajetória destes professores
seria significativa na construção de um quadro interpretativo.
Dos professores 1 e 2 procurei aprofundar a experiência daqueles que
viveram toda a história recente, inclusive o que antecede a criação da SME. Dos
colaboradores 3 e 4, busquei contemplar aqueles professores que tiveram seu
ingresso ainda focado na rede escolar e que, pelas necessidades de constituição do
coletivo de professores da recém-criada secretaria, acabaram sendo nela lotados. Já
os colegas 5 e 6 trazem a contribuição de quem ingressou na SME com a
intencionalidade de quem atendeu a um Edital específico, referenciado em autores,
diretrizes políticas e pedagógicas específicas. Por último, os 2 colaboradores que
entre 2000 e 2002
21
vieram a se incorporar ao professorado da SME, oriundos da
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
20
Processo de incorporação previamente descrito na pg. 18.
21
Período em que a gestão dos equipamentos recreativos e esportivos de 7 Centros de Comunidade
passam da FASC para a SME. Neste período, os professores de EF tiveram a possibilidade por optar
pela permanência nos projetos da Fundação ou pela relotação na SME.
!
?=!
FASC, trazendo, como referido anteriormente, suas experiências de uma
educação física balizada pelos objetivos contidos nas políticas da Assistência Social
e da Educação Comunitária.
Outro fator que entendi significativo refere-se ao envolvimento com a gestão,
seja ela de um equipamento, projeto/programa, região ou outro de espectro mais
amplo assessoria ou gerenciamento. Ressalto a importância de contemplar este
fator para a compreensão do processo complexo de formação permanente, dados
os desafios que se apresentam na trajetória profissional de professores que se viram
desafiados a entender a política pública pela ótica do gestor e a desenvolverem
outras competências que não necessariamente compunham o seus repertórios
iniciais para ingresso no serviço público.
!
QUADRO 01: REPRESENTATIVIDADE TIPOLÓGICA
Tempo na
Instituição
Forma de Ingresso
TRAJETO
PMPA
ÁREA
ATUAÇÃO/
GESTÃO
Professor 1
Mais de 20 anos
Concurso para SMED
SMED/SME
Mínimo 2
Professor 2
Mais de 20 anos
Concurso para SMED
SMED/SME
Mínimo 2
Professor 3
De 10 à 20 anos
Concurso para SMED
ou SME
SMED/SME
Somente SME
Mínimo 2
Professor 4
De 10 à 20 anos
Concurso para SMED
ou SME
SMED/SME
Somente SME
Mínimo 2
Professor 5
Até 10 anos
Concurso para SME
SME
Mínimo 2
Professor 6
Até 10 anos
Concurso para SME
SME
Mínimo 2
Professor 7
Mais de 6 anos
Oriundo da FASC
FASC/SME
Mínimo 2
Professor 8
Mais de 6 anos
Oriundo da FASC
FASC/SME
Mínimo 2
Apesar de não apresentar no quadro acima, entendo que uma preocupação
surgida ao longo da construção deste estudo deve ser explicitada neste ponto do
relatório. Dada a minha referida inserção no campo de pesquisa como professor-
pesquisador, bem como a minha atuação como gestor num determinado tempo
institucional conduzido pelo Partido dos Trabalhadores, recebi diversos
questionamentos sobre a possibilidade de estabelecer um diálogo “entre iguais”, ou
!
?C!
seja, eleger dentro do coletivo de professores àqueles que atendessem os critérios
de representatividade tipológica e que compartilhassem de uma mesma visão
político-partidária. A partir da análise destas reflexões e do entendimento que eram
contribuições procedentes, acrescentei aos critérios apresentados a eleição
intencional de metade dos colaboradores que historicamente manifestassem
discursos divergentes aos dos integrantes do PT, divergências estas que
apareceram claramente ao longo de diversas entrevistas. Pretendi desta forma
viabilizar uma estratégia metodológica que acolhesse os diversos discursos político-
pedagógicos e as diferentes leituras de uma instituição pública, complexa e plural.
Todos os colaboradores foram convidados a uma leitura detalhada do Termo
de Consentimento Livre e Esclarecido (APÊNDICE 02, p. 177) antecedendo a sua
assinatura. Neste momento explicitei também a preservação de seus anonimatos,
apresentando-os ao longo do texto por meio de seus “nomes fantasias”, forma pela
qual passam a ser apresentados a partir deste ponto.
No quadro a seguir apresento como ficou a configuração dos colaboradores
e o cronograma das entrevistas:
!
QUADRO 02 CARACTERIZAÇÃO DOS COLABORADORES E CRONOGRAMA
DE ENTREVISTAS
NOME
FANTASIA
TEMPO
PMPA
(anos)
INGRESSO
PMPA
TRAJETO
PMPA
ÁREA
ATUAÇÃO/
GESTÃO
IDENTIFI-
CAÇÃO
PARTI-
DÁRIA
DATA ENTRE-
VISTA
DURA-
ÇÃO
Guilher-
me
22
Concurso
SMED
DERP/SERP
SME/SMED
ESPORTE
EVENTOS
GESTÃO
PT
12 março
2009, 10h
1h50
Jairo
20
Concurso
SMED
SERP/SME
ESPORTE
GESTÃO
NÃO PT
6 fevereiro
2009, 10h20
1h25
Suzana
19
Concurso
SMED
SERP/SME
ESPORTE
DANÇA
RECREAÇÃO
GESTÃO
PT
20 fevereiro
2009, 10h
2h10
Otavio
15
Concurso
SME
SME
ESPORTE
GESTÃO
NÃO PT
19 fevereiro
2009, 9h30
1h40
Alice
8
Concurso
SME
SME/SMED
RECREAÇÃO
DANÇA
GINÁSTICA
PT
11 março
2009, 14h20
1h20
Ronaldo
8
Concurso
SME
SME/SMED
ESPORTE
EVENTOS
NÃO PT
13 fevereiro
2009, 10h30
1h30
Elton
22
Contrato
FASC
FASC/SME
ESPORTE
GINÁSTICA
GESTÃO
NÃO PT
23 janeiro
2009
2h40
Lucas
15
Contrato
FASC
FASC/SME
ESPORTE
RECREAÇÃO
GESTÃO
NÃO PT
19 fevereiro
2009, 14h
1h50
!
?D!
Desta forma, pretendi dar conta da pluralidade de atores na SME, buscando
garantir representatividade dos diversos coletivos que a instituição abriga.
7.4. ESTRATÉGIAS DE COLETA DE DADOS
Os instrumentos e procedimentos a seguir apresentados foram utilizados no
trabalho de obtenção de informações, buscando construir as condições para
apreensão do contexto investigado, de forma a atender o delineamento da pesquisa
e gerar um quadro interpretativo coerente com o problema de investigação.
Foram empregados os seguintes instrumentos: a análise documental, a
observação participante e a entrevista semi-estruturada, os quais serão
apresentados em seu contexto de utilização.
7.4.1. ANÁLISE DOCUMENTAL
Os documentos analisados trouxeram a contribuição das referências legais,
normativas e trazem consigo as marcas de conteúdos visíveis e ocultos, que de
maneira direta ou indireta influem na prática docente e no processo de formação
permanente dos professores da SME.
Como aponta Lüdke e André (1986):
Os documentos constituem também uma fonte poderosa de onde
podem ser retiradas evidências que fundamentem afirmações e
declarações do pesquisador. Representam ainda uma fonte “natural”
de informação. Não são apenas uma fonte de informação
contextualizada, mas surgem num determinado contexto e fornecem
informações sobre esse mesmo contexto (LÜDKE; ANDRÉ, 1986, p.
39).
E é exatamente nestes aspectos que o acesso a relatórios que antecederam
a criação da SME (SERP/SMED, 1989), bem como uma das primeiras versões
(UTP
22
/SME, 1995) do que viria a tornar-se o caderno de Diretrizes Pedagógicas e
Administrativas, contendo vários pontos da macro política, de indicadores da linha
pedagógica, bem como outros elementos que evidenciam as marcas históricas,
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
22
Unidade Técnico-Pedagógica, que viria a tornar-se Gerência Pedagógica no organograma da SME.
!
?>!
culturais e políticas de seu contexto, foram importantes. Os documentos
investigados puderam trazer elementos valiosos não no seu conteúdo mas
permitiram releituras do processo de observação participante e de elementos
levantados pelos colaboradores nas suas entrevistas. Por pretender entender
contextos políticos, diretrizes institucionais para a prática docente e a estrutura e
pauta institucional para a formação de seus quadros, foram utilizados documentos
do tipo oficial e do tipo técnico, segundo a classificação apresentada por Lüdke e
André (1986, p. 40).
Ainda sobre o tratamento dado no processo de análise documental, recorri à
metodologia de análise de conteúdo, procurando identificar unidades de significado
por blocos temáticos, como apresentada pelos autores acima citados (LÜDKE;
ANDRÉ, 1986, p. 41).
Foram utilizados os documentos que compõe o quadro a seguir:
QUADRO 03 – DOCUMENTOS OFICIAIS ANALISADOS
Documento n.º 1
ANEXO 01
LEI MUNICIPAL DE CRIAÇÃO DA SECRETARIA MUNICIPAL
DE ESPORTES, RECREAÇÃO E LAZER DE PORTO
ALEGRE.
Documento n.º 2
ANEXO 02
DIRETRIZES PEDAGÓGICAS, ADMINISTRATIVAS E
PROGRAMAÇÃO 2004 – SME.
Documento n.º 3
ANEXO 03
POLÍTICAS E PRIORIDADES DA SME – 1995.
Documento n.º 4
ANEXO 04
SISTEMATIZAÇÃO DE PROPOSTAS DE SEMINÁRIO DE
PROFESSORES 1989 – SERP/SMED.
Documento n.º 5
ANEXO 05
REFERENCIAIS POLÍTICO E PEDAGÓGICO DA SME – 2007.
Documento n.º 6
ANEXO 06
REFERENCIAIS E ORIENTAÇÕES PEDAGÓGICAS SME –
EXTRATO DA AGENDA 2009.
Documento n.º 7
SISTEMATIZAÇÃO DAS DISCUSSÕES (24/09/2003) - Fórum
de RA`s
23
Documento n.º 8
DIRETRIZES PEDAGÓGICAS, ADMINISTRATIVAS E
PROGRAMAÇÃO 2003 – SME.
Documento n.º 9
PLANEJAMENTO PLURIANUAL 2002-2005 DIRETRIZ: 002
SME/PMPA.
Documento n.º 10
A SME E MOVIMENTO DE REGIONALIZAÇÃO.
Documento n.º 11
DIRETRIZES PEDAGÓGICAS, ADMINISTRATIVAS E
PROGRAMAÇÃO 2002 – SME.
Documento n.º 12
ANEXO 07
EDITAIS DO CONCURSO PÚBLICO PARA PROFESSORES
DA PMPA: 159/08, 163/08 E 165/08.
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
23
Responsáveis por Atividades Professores da SME com responsabilidades de coordenação de
Região, Projeto, Programa e Centros de Comunidade.
!
??!
O acervo de documentos construído para este estudo contou com alguns
oriundos de minha própria situação de membro do professorado e de partícipe na
gestão, bem como com aqueles fornecidos por colaboradores deste
empreendimento. Ao buscar informações oriundas de registros específicos ou
períodos específicos, pude perceber a descontinuidade e a precariedade do
processo documental institucional, crítica esta não direcionada a um período ou
gestão específica, mas para a ausência histórica de rotinas de constituição destes
registros.
7.4.2. OBSERVAÇÃO PARTICIPANTE
Como o problema de pesquisa situa-se na relação entre a formação
profissional permanente e a prática docente, na materialidade que esta formação
imprime no fazer cotidiano do professor em interação com alunos, pais, lideranças
comunitárias, manifestações diversas de cultura expressas nas atividades esportivas
e recreativas, é fundamental que exista uma aproximação à realidade e ao
comportamento destes diversos atores. Esta aproximação possibilitou uma
identificação mais apurada das ações e reações, das manifestações ditas e não-
ditas, das linguagens corporais, permitindo, desta forma, registros mais atentos,
precisos e ricos.
Foi na observação participante que me deparei com uma grande dificuldade
e o grande desafio a ser superado: minha grande proximidade dos sujeitos e dos
objetos da observação me provocou a sensação da incapacidade do estranhamento,
da incorporação de pré-disposições e emissões de juízos de valores sobre os
fenômenos observados. Sobre este instrumento residiram boa parte dos meus
dilemas sobre a opção metodológica. Somente na reaproximação com alguns
autores e na discussão com pares do grupo de pesquisa é que consegui, ao menos
parcialmente, superar tais obstáculos.
Sobre a reaproximação com leituras, três reflexões de Geertz (2005) foram
fundamentais, talvez por apresentarem idéias que me eram necessárias:
A ilusão de que a etnografia é uma questão de dispor fatos
estranhos e irregulares em categorias familiares e ordenadas [...] foi
demolida muito tempo. O que ela é, entretanto, não está muito
claro. Que talvez a etnografia seja uma espécie de escrita, um
!
?@!
colocar as coisas no papel, é algo que tem ocorrido, vez por outra,
aos que se empenham em produzi-la, consumi-la, ou ambas
(GEERTZ, 2005, p. 11).
Ainda do mesmo autor:
O que um etnógrafo propriamente dito deve fazer,
propriamente, é ir a lugares, voltar de lá com informações sobre
como as pessoas vivem e tornar essas informações disponíveis à
comunidade especializada, de uma forma prática, em vez de ficar
vadiando por bibliotecas, refletindo sobre questões literárias
(GEERTZ, 2005, p. 11-12).
Sem a pretensão de considerar-me o etnógrafo na acepção do antropólogo,
encontrei suporte para os meus dilemas de investigador imerso na realidade
investigada na seguinte afirmação:
A capacidade dos antropólogos de nos fazer levar a sério o que
dizem tem menos a ver com uma aparência factual, ou com um ar de
elegância conceitual, do que com sua capacidade de nos convencer
de que o que eles dizem resulta de haverem realmente penetrado
numa outra forma de vida (ou, se você preferir, de terem sido
penetrados por ela) de realmente haverem, de um modo ou de
outro, “estado lá”. E é aí, ao nos convencer de que esse milagre dos
bastidores ocorreu, que entra a escrita (GEERTZ, 2005, p.15).
Estas leituras permitiram que eu entendesse melhor o meu lugar, o de um
professor que pesquisa sobre sua prática; e que assumiu a posição do participante
observador: o “observador participa dos acontecimentos, é um dos atores,
registrando as informações depois do acontecimento” (NEGRINE, 2004, p. 68).
As observações contribuíram em duplo sentido em relação às entrevistas:
inicialmente, o olhar sobre as aulas, sobre as relações com os alunos, com os
colegas em situações de reunião ou de informalidade, permitiram ajustes na
estrutura e na forma de abordagem no momento das entrevistas; nas situações que
sucederam as entrevistas, a observação buscou captar os sentidos na ação docente
daquilo que as falas haviam expresso por outra via, criando condições de
identificação de convergências e ou contradições.
No quadro 04 (p. 79) estão listadas situações que atenderam ao processo
formal de observação de situações de prática docente dos colaboradores; no
!
?A!
entanto, dados os espaços de atuação comuns a mim e aos professores
colaboradores no cotidiano da SME, diversas outras situações de convivência se
constituíram ao longo do período de investigação; situações estas que constituíram-
se em registros no diário de campo e ajudaram a construir o quadro de análise e
interpretação do estudo. Entendidas dentro das limitações temporais impostas pelo
cronograma do estudo, as diversas situações de observação parecem ter sido
suficientes para trazer elementos importantes sobre o cotidiano destes professores
de EF da SME, de forma a atender a recomendação de Negrine, para quem o
pesquisador somente deva deixar o campo de observação quando “estiver
convencido de que possui elementos suficientes para proceder a análise e a
interpretação” (NEGRINE, 2004, p. 68). Apresento, a seguir o quadro de
observações realizadas:
QUADRO 04 – OBSERVAÇÕES REALIZADAS
DATA
COLAB./
COLETIVO
SITUAÇÃO
DURAÇÃO
22/01/2009
Elton
Rotina administrativa, contatos com a
comunidade
3 horas
23/01/2009
Elton
Rotina administrativa, contatos com a
comunidade
5 horas
13/12/2008
Otavio
Organização de evento, orientação de
equipes
3 horas
25/03/2009
Otavio
Aulas com para crianças até 11 e outra até 15
anos
3 horas
07/03/2009
Suzana
Atividade recreativa, coordenação das ações
de estagiários
4 horas
18/03/2009
Alice
Rotina administrativa, aula de ginástica
4 horas
26/03/2009
Alice
Rotina administrativa, aula de dança
4 horas
19/02/2009
Lucas
Rotina administrativa, treino de natação
2 horas
06/06/2009
Lucas
Participação em evento, coordenação de
atividade
3 horas
27/01/2009
Jairo
Rotina administrativa, equipe de piscina
6 horas
29/01/2009
Jairo
Rotina administrativa, equipe de piscina
6 horas
05/05/2009
Ronaldo
Equipe de apoio e organização de Congresso
Técnico
2 horas
12/03/2009
Guilherme
Rotina administrativa, contatos com a
comunidade
1h30
19/05/2009
Guilherme
Orientação de equipe de voleibol
2 horas
09/03/2009
grande grupo
Reunião de reinício de atividades
2 horas
25/05/2009
grande grupo
Seminário sobre Portal de Gestão
5 horas
05/03/2009
equipe local
Reunião de trabalho
2 horas
04/06/2009
equipe local
Reunião de trabalho
1h30
!
@;!
Ainda sobre os tempos de observação e sua relação com a realização das
entrevistas (QUADRO 02, p. 74), não estabeleci um padrão rígido de anterioridade
das observações às entrevistas, apesar de estar ciente das recomendações
metodológicas de alguns autores neste sentido, como estratégia para evitar ajustes
intencionais nas práticas dos colaboradores para tornarem-se coerentes com as
suas falas. Dois fatores foram determinantes nesta decisão: primeiramente e
novamente, as grandes limitações de tempo impostas pelo cronograma do estudo;
em segundo lugar, mas não menos importante, o meu alto grau de inserção no
cotidiano de trabalho dos colaboradores, de tal forma que tais ajustes intencionais
provavelmente tornar-se-iam notórios, de fácil identificação, e de certa forma, talvez
mais constrangedoras aos colaboradores.
7.4.3. ENTREVISTAS
Junto à observação, a entrevista é um dos principais instrumentos de coleta
de dados, pois coloca o colaborador num momento de elaboração e reflexão sobre o
seu próprio fazer. Foi instrumento fundamental na relação com os registros oriundos
da observação participante e do diário de campo.
Após ter negociado e recebido o consentimento dos colaboradores
selecionados, mediante o esclarecimento das finalidades, instrumentos e técnicas a
serem utilizadas no estudo, realizei entrevistas semi-estruturadas, buscando dar
conta da complexidade do tema da prática docente e formação profissional na SME.
Ao longo das seções iniciais deste estudo, a análise do contexto de
formação e do conjunto das experiências vividas pelo professorado da SME foi
reiteradamente destacada. Dentro deste cenário, o fazer etnográfico utiliza-se da
escuta dos percursos dos sujeitos e as memórias que têm desse processo,
conferindo a este instrumento um grande valor, por convidar o participante a refletir
sobre sua trajetória e buscar uma síntese de sua experiência. A autobiografia
docente, como tratada por Nieto (2006), possibilita outra linguagem, um olhar para si
mesmo. De certa forma, eu mesmo dou início a este projeto num processo
autobiográfico.
Nesse sentido, a partir das contribuições de Nieto (2006) e Wittizorecki et al
(2006), me aproximei dos referenciais que tratam das narrativas e autobiografias
docentes, partindo da premissa de que como apontam esse últimos autores
!
@:!
pesquisar exige interrogar-se. Assim, antes de iniciar a apresentação e discussão
das informações coletadas, dou início a este processo de olhar para si mesmo,
ensaiando uma escrita autobiográfica de modo a situar o leitor acerca de meus
trajetos e dos lugares de onde falo ao escrever tal trabalho.
Dois autores apoiaram-me sobremaneira nesta minha decisão metodológica.
nas suas considerações introdutórias, Pierre Dominicé aponta que pretende
“oferecer elementos para a formação de outrem ao considerar que todo o formador
precisa conhecer melhor o que foi formador em sua própria história de vida” (2006,
p. 345). Logo a seguir, destaca:
A instabilidade ambiente, a perda de referências culturais, a rapidez
da emergência das novas tecnologias obrigam a uma espécie de
reconversão das bases educativas nas quais se fundam as histórias de
vida. O processo de formação torna-se uma longa busca de si em um
mundo que demanda uma forte consistência pessoal para enfrentar os
desafios que cada um deve encarar na sociedade atual (DOMINICÉ, 2006,
p. 345).
Ao considerar a autobiografia como instrumento de investigação, para este
autor não existe a expectativa de uma narrativa escrita restrita ao aspecto descritivo
(2006, p. 351), nem um “exercício autocomplacente” como alerta Nieto (2006, p. 53).
Aliás, muitas das minhas expectativas sobre o uso das autobiografias docentes vêm
das suas contribuições, como a que segue:
Uso esta estratégia para que os docentes, ao centrarem-se em
si próprios, aprendam a se centrarem melhor em seus alunos. Ou
seja, desenvolver uma autobiografia docente não é simplesmente
algo que se faz para que conheçam mais profundamente suas vidas,
ainda que também possa -lo. Também é um modo para que os
docentes pensem sobre como, através de uma melhor compreensão
de suas vidas, podem ser mais eficazes com seus alunos. Para
alcançar estes objetivos lhes peço que pensem criticamente sobre
suas próprias vidas, sobre o que conseguiriam da educação e sobre
os motivos de suas escolhas (NIETO, 2006, p. 53).
Todas as entrevistas foram realizadas e gravadas individualmente mediante
autorização dos colaboradores, segundo o cronograma apresentado no quadro 02
(p. 74). Logo após, fiz sua transcrição e devolvi uma cópia impressa aos mesmos,
para que pudessem ler e fazer as correções necessárias, de modo a avaliar a
fidedignidade das informações e entendimentos narrados. Com este procedimento
!
@B!
busquei cumprir o primeiro nível de validação dos dados (melhor descrito no item
7.5.2. deste relatório, p. 82). Das oito entrevistas, apenas 2 colaboradores
solicitaram alterações pontuais de seus textos: em ambas situações, a releitura
provocou dúvidas quanto a “forma como seriam interpretadas” as suas falas, pois
acabavam por deixar transparecer, ainda que indiretamente, os seus autores. Feitas
as alterações, os textos corrigidos foram novamente submetidos a apreciação dos
autores para posterior aprovação.
O roteiro da entrevista semi-estruturada utilizada é apresentado no Apêndice
05 (p. 194).
!
7.5. ANÁLISE E TRATAMENTO DAS INFORMAÇÕES
!
7.5.1. CONSTRUÇÃO DE CATEGORIAS DE ANÁLISE
O caminho entre o percurso no campo entre observações, registros e
entrevistas tinha na leitura dos aportes teóricos o seu aspecto referencial e ao
mesmo tempo desacomodador e desafiador. Ou seja, ao mesmo tempo em que
olhava para as informações coletadas, buscava contrastá-las (tentando
desacomodar minhas preconcepções) e aproximá-las ao referencial teórico
elaborado de modo a construir categorias de análise que pudessem trazer subsídios
para responder ao problema de pesquisa, desafiando-me a propor outros olhares
para as perguntas norteadoras do estudo.
Assim, após diversas leituras das entrevistas, dos documentos analisados,
dos registros no diário de campo e das observações realizadas, levantei unidades de
significado que representassem o teor fundamental dos trechos, falas e relatos
acompanhados, lidos e observados no trabalho de campo. Agrupei essas unidades
de significado por sua proximidade temática e, desse modo, construí três grandes
categorias, a saber:
O papel da trajetória docente e as singularidades o mundo da SME;
Política: possibilidades e entraves;
Os múltiplos elementos da formação permanente.
!
@=!
No quadro 05, apresento blocos temáticos que compõem cada categoria e
que constituem o eixo estruturador de análises, interpretações e discussões nos
capítulos que seguem.
!
QUADRO 05 – CATEGORIAS DE ANÁLISE
CATEGORIA
BLOCOS TEMÁTICOS
O PAPEL DA TRAJETÓRIA
DOCENTE E AS
SINGULARIDADES DO
MUNDO DA SME
Experiências incorporadas: dos habitus de vida
aos habitus de professor
Aproximações e contradições com as práticas
da educação física escolar: construindo novos
esquemas de ação na singularidade da SME
Diversidade de práticas na SME: possibilidades
de busca da inovação possibilidades de
preservação de um habitus professoral
incorporado.
POLÍTICA: POSSIBILIDADES
E ENTRAVES
Relações e tensões entre a gestão e os
professores: os limites tênues entre disputa de
projeto ideológico e o personalismo
O papel definidor de um modelo de gestão e o
projeto político pedagógico de formação
permanente
OS MÚLTIPLOS
ELEMENTOS DA
FORMAÇÃO PERMANENTE
O papel da experiência no processo de
formação permanente: conhecer para poder
optar, conhecer para construir novos esquemas
de ação
Os lugares do professor da SME e sua
formação permanente
7.5.2. CONSTRUINDO A VALIDEZ INTERPRETATIVA
A validez interpretativa, dentro da pesquisa etnográfica, se propõe a uma
série de cuidados e procedimentos no sentido de se buscar o rigor científico e
credibilidade que preconiza um trabalho acadêmico, ao mesmo tempo em que
preserva as especificidades dessa forma de fazer pesquisa e produzir conhecimento
no campo da educação.
Autores como Lüdke e André (1986) e Goméz et al. (1996) sugerem como
indicativos de validez nas pesquisa dessa natureza, uma extensa permanência no
!
@C!
trabalho de campo, o intercâmbio de opiniões com outros investigadores e a
aproximação entre diferentes perspectivas de coleta das informações. Nessa
perspectiva, destaco que o trabalho de campo que realizei teve a duração de seis
meses, onde busquei amparo e evidências para dialogar com o referencial teórico
como mencionado em entrevistas, em documentos analisados, em observações
realizadas e nos registros que ia procedendo no diário de campo. Este período foi de
13 de dezembro de 2008 em respeito ao aguardo da aprovação do estudo pelo
Comitê de Ética – até 08 de junho de 2009.
O primeiro nível de validez foi construído quando fiz a devolução das
transcrições aos colaboradores para que avaliassem a fidedignidade de seu relato e
assim conferissem validade as informações de que faria uso posteriormente. Nesse
processo, foi possível que os docentes pudessem alterar e/ou incluir mudanças em
suas declarações.
Num segundo momento, a validez foi construída, como sugere Pérez Gómez
(1998), através da triangulação. Ou seja, confrontei as contribuições dos aportes
teóricos com os achados do trabalho de campo e com minhas próprias elaborações,
pois na medida em que o pesquisador estabelece o contraste de suas diferentes
interpretações subjetivas com os fatos registrados e com as interpretações de outros
indivíduos e grupos internos e externos aos mesmos acontecimentos, se pode ter
um importante instrumental que confira validez a investigação.
Por último, o terceiro nível de validez foi construído submetendo as
interpretações e discussão das informações dessa pesquisa a uma professora e a
um professor de Educação Física (inclusive, docente da SME), ambos experientes e
conhecedores do contexto em que se deu esse estudo. As críticas, sugestões e
considerações desses docentes me apoiaram no sentido de visualizar algumas
preconcepções, de atentar-me para aspectos e temas ainda não explorados e de
atestarem uma certa coerência e adequação das argumentações apresentadas.
!
@D!
8. UM EXERCÍCIO NARRATIVO: A TRAJETÓRIA DO PESQUISADOR E DA
INSTITUIÇÃO SME
Sou professor de EF. Filho de uma professora de EF. Vivi, desde as
primeiras lembranças que ainda tenho da infância, em ginásios e pátios onde
acompanhava a tira-colo aulas de EF ministradas pela minha mãe. Sem pretender
aproximações freudianas, acho que minha relação com o universo profissional que
escolhi tem estreita relação com a minha mãe. Da criança que brincava nestes
espaços, tornei-me o adolescente ligado ao esporte, mais especificamente ao
voleibol. Vivi com a “pretensão” do atleta as rotinas do esporte escolar, das
categorias de base de clube, do status que na década de 70 meu tempo como
estudante de e graus era incontestável: ser de algum dos times do colégio
“era tudo”. Aos 17 anos, posto frente ao vestibular e a escolha de uma futura
profissão, uma encruzilhada: por um lado, o encanto teórico pela química e as
imensas possibilidades e o status da engenharia; por outro, o encantamento pelo
mundo do esporte, daqueles espaços e práticas tão presentes na minha vida.
Durante cinco semestres (de 1980 a 1982) compartilhei das duas: Engenharia
Química na PUC/RS
24
e Educação Física no IPA/IMEC
25
. No entanto,
particularidades no meu contexto pessoal obrigaram-me a optar. E naquele
momento, habitus e experiência, contextos e esquemas de ação conhecidos
(PERRENOUD, 2001, 2002; LAHIRE, 2002; SILVA, 2005; SANCHOTENE, 2007)
balizaram minhas reflexões e conformaram o que eu vim a ser: professor de EF.
Durante a formação inicial minha identificação com as disciplinas ligadas às
práticas esportivas era mais um tempo de jogar do que um tempo para aprender a
ensinar questionava desde então um modelo de formação que avaliava a minha
competência como praticante e não como alguém que deveria saber levar outros
sujeitos a saber fazer. A partir do quinto semestre tive o privilégio de ser aluno do
Prof. Airton Negrine, e a ele reputo dois importantes marcos na minha trajetória
acadêmica, interligados, com desdobramentos sobre a constituição de minha
profissionalidade: o contato com uma pedagogia crítica e um desafio por ele
proposto de que refletíssemos sobre o papel da educação, do professor e da EF,
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
24
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.
25
Instituto Porto Alegre - Instituto Metodista de Educação e Cultura.
!
@>!
onde quer que pretendêssemos exercê-la; intimamente ligada ao primeiro, este
desafio a pensar a profissão (re)aproximou-me dos movimentos estudantis, do
Diretório Acadêmico da ESEF-IPA e, paralelamente, da APEF/RS
26
, entidade que do
final da década de 70 à metade da de 90, promoveu fóruns nos quais foram postos
em debate boa parte dos temas relevantes de ordem política, epistemológica e
organizativa da EF. Meu envolvimento com as questões da categoria culminaram
com a minha participação da diretoria da APEF/RS como vice-presidente, no período
de 1985 a 1987: por dois anos tive a responsabilidade de organizar o Congresso
Nacional e Latino-Americano de EF, em Tramandaí (1986 e 1987). No que se refere
a minha inserção profissional, desde o último semestre da faculdade, quando da
realização do estágio supervisionado, fui contratado pelo Colégio Santa Inês, onde
atuei de 1984 à 2000, como professor de EF de e graus, técnico de voleibol
das equipes masculinas e coordenador da disciplina de EF por 4 anos. Tive inserção
também em academias, atuando como professor de musculação de 1985 a 1999.
Apresento este breve histórico pessoal – e algumas das narrativas que
seguem pela convicção de que este empreendimento acadêmico está fortemente
imbricado com minha história de vida. Aliás, para além de uma contribuição
metodológica, me aproximei fortemente dos textos de Marie-Christine Josso (2004) e
de Sonia Nieto (2006) ao compartilhar com estas autoras o significado e a riqueza
da produção de histórias de vida. A disposição a reflexionar sobre sua trajetória
pessoal e profissional pode ressignificar ou atribuir sentidos à vida: compartilhar
estas reflexões pode contribuir para atribuições de sentidos por outros atores.
Avanço nesta narrativa para o meu ingresso na SME: em outubro de 1990,
recebi um comunicado da Secretaria Municipal de Administração, pois tendo sido
aprovado no concurso público para a Secretaria Municipal de Educação de Porto
Alegre, deveria apresentar-me para avaliações complementares e a partir daí, definir
minha nomeação e lotação como professor da rede pública municipal.
Naquele momento, estando atuando na rede de ensino privado, recém
ingresso na rede de ensino estadual e como professor de musculação em duas
academias de fitness, fiquei num real impasse sobre ocupar ou não esta nova
possibilidade de trabalho afinal, uma das questões que muito influencia este tipo
de decisão é a econômica: poucos são os professores que conseguem sobreviver
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
26
Associação dos Profissionais de Educação Física do Rio Grande do Sul.
!
@?!
dignamente com apenas um emprego, nos marcos salariais vigentes para
professores de Educação Física.
Além disto, a imagem do trabalho na rede municipal era no mínimo, ambígua
se por um lado, tinha um salário bem maior que o da rede estadual e um plano de
carreira confirmado pela administração recém eleita, o espaço de trabalho (escolas)
e o público (comunidades carentes, nos pontos mais periféricos da cidade) não
davam grandes perspectivas de realização profissional. Ainda mais para a área da
Educação Física, pois era amplamente alardeada a carência material e estrutural
das escolas pelos colegas que lá atuavam.
Uma das opções advindas do Concurso Público para a Secretaria Municipal
de Educação (SMED) era a lotação na Supervisão de Esportes e Recreação Pública
(SERP), anteriormente um departamento da referida secretaria DERP
27
,
responsável pela ativação de praças e parques da cidade. Ao fazer o Concurso
Público, pensava na escola como futuro espaço de atuação, mas havia esta outra
possibilidade.
Após muitas conversas com colegas de escola e com outros profissionais de
Educação Física sobre prós e contras, decidi aceitar o comunicado da SMA
28
e,
cumpridos os procedimentos burocráticos, recebi nomeação exatamente para a
SERP, aquela que a maioria dos meus colegas nem sequer tinha noção do tipo de
trabalho nem do local onde este ocorria. Algumas questões pairavam naquele
momento: com que público trabalharia? Quais eram as condições estruturais,
materiais e objetivas, que estariam disponíveis? Havia horário definido, caderno de
chamada, conteúdos definidos a serem desenvolvidos?
Mas, enfim, com o Termo de Posse nas mãos, apresentei-me na sede da
SERP para tentar esclarecer tais e muitas outras dúvidas. Após uma brevíssima
descrição do tipo de trabalho fundamentalmente, escolinhas esportivas, mas
dentro de um projeto “novo” que ainda estava sendo discutido, por conta da recém
empossada Administração Popular, cuja Frente era coordenada pelo Partido dos
Trabalhadores apresentaram-me três locais para lotação: Barro Vermelho
29
,
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
27
Departamento de Esporte e Recreação Pública, subordinado à Secretaria Municipal de Educação e
Cultura (SMEC).
28
Secretaria Municipal de Administração, órgão responsável pela nomeação, procedimentos
burocráticos de ingresso e encaminhamento de documentação para lotação nos diversos setores da
Prefeitura Municipal de Porto Alegre (PMPA).
29
Bairro Restinga, situado na região sul de Porto Alegre.
!
@@!
Terminal Alameda
30
e a Praça 20 de Novembro, ainda não equipada
31
junto ao
Carecão, campo de futebol na Vila Brasília, altos da Av. Protásio Alves, região Leste
da cidade. Nenhuma eu conhecia, mas a última, ao menos, era na mesma rota viária
dos meus outros locais de trabalho.
Havia uma convicção, associada a um grande nível de insegurança e medo:
a faculdade, enquanto espaço de formação acadêmica básica, não tinha me
preparado para nada “disto” que se perspectivava como espaço e público de
docência. Até porque, neste momento, ficavam evidentes algumas dúvidas: afinal, o
trabalho na SERP seria docência? E, em caso afirmativo, que características e
exigências apresentaria?
Os desafios confirmaram-se: não existia um módulo ou espaço específico
para a guarda de um kit de materiais esportivos (este teve que ser negociado por
mim junto à direção de uma pequena escola de ensino fundamental situada em
frente à praça, Escola Estadual Aldo Locatelli, cuja direção gentilmente cedeu um
espaço num depósito), não existiam informações prévias sobre que práticas
esportivas aquela comunidade tinha ou esperava de um serviço público, não sabia
exatamente qual a faixa etária que me procuraria. Algumas respostas começaram a
constituir-se no cotidiano, no diálogo com professores da referida escola; mães que,
ao estranharem a minha presença, perguntavam sobre o que eu fazia ali; com as
primeiras crianças que, vendo uma bola de futebol de campo e uma de voleibol,
pediam “emprestado” para brincarem um pouco e eu, entre tantas dúvidas,
procurava sustentar-me a partir de algumas convicções: teria que ouvir muito, propor
qualquer atividade de forma gradual e flexível, mas, fundamentalmente, reorganizar
minhas expectativas de tempo, forma e estratégias de prática docente. Teria que
reaprender, e de certa maneira, me reinventar como professor.
Eu, com certeza, não tinha respostas sobre o que viria.
Neste cenário, tornaram-se evidentes para mim duas assertivas: a formação
inicial não dava a sustentação nem teórica nem prática que se fazia necessária para
minha atuação; e, em segundo lugar, a instituição SME não apresentava uma
estrutura de qualificação de seus recursos humanos que pudesse dar conta destas
lacunas. Nos fóruns de reunião de professores que se constituíram um pouco mais
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
30
Adaptação de terminal de transporte coletivo em quadra de esportes, no Bairro Partenon - POA.
31
Playground e, ao lado, área gramada, sem infra-estrutura para a prática esportiva.
!
@A!
tarde (conforme apresentado no QUADRO 08, p. 97), pude descobrir que este não
tinha sido um dilema exclusivamente meu. Os colegas que ingressaram comigo,
colocados frente a situações inéditas em suas trajetórias, e mesmo os mais antigos,
face às novas demandas propostas pela administração recém empossada,
relatavam suas dificuldades ou seus descontentamentos. No mesmo ano do meu
ingresso (1990), vários outros colegas ingressaram na então SERP. Éramos um
coletivo novo, ingressando numa estrutura com um grupo de colegas que lá
estava bastante tempo. E com uma direção nova, trazendo propostas e diretrizes
que nitidamente encontravam resistência nestes “veteranos”
32
, onde os
questionamentos sobre as novas propostas de trabalho e discussão ficavam
flagrantes nos debates/embates entre professores e gestores.
Manifestava-se um conflito no que se referia às concepções de esporte e o
seu papel na ação do professorado. Este era um dos focos do debate mais
acalorado e que, de certa forma, repetia o tema de fóruns acadêmicos e de
formação: para uns, o esporte e a própria competição como possibilidades de
educação, de respeito ao outro, de preparação do cidadão para sociedade. Para
outros, o papel elitista e excludente que a competição esportiva trazia, apoiada em
argumentações como: “a competição reforça e reproduz a lógica individualista e
selvagem, característica da sociedade capitalista”, devendo ser, portanto, evitada.
Numa instituição marcada pela iniciação e aperfeiçoamento esportivo, que trazia
como evento do seu calendário os Jogos Interpraças, esta nova diretriz era dinamite
pura.
O significado deste debate não pode ficar desvinculado do pano de fundo do
cenário político partidário. Nos corredores ou nos intervalos das reuniões, vários
professores nomeavam as “novas” propostas, dinâmicas e exigências de fixação de
horário para reuniões, como “as radicalidades do PT”. Por outro lado, ficou evidente
que não haveria muito espaço para divergências em relação a estas novas
orientações, e não por acaso, alguns colegas foram permutados
33
ou simplesmente
colocados a disposição
34
da SMED.
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
32
Professores lotados na SERP, mas que passaram pelos projetos político-pedagógicos anteriores,
ainda enquanto DERP (a alteração de status de “Departamento” para “Supervisão” ocorreu em 1987).
33
Troca de lotação administrativa de um professor da SERP por um da rede escolar, ou em sentido
contrário (da rede escolar para a SERP).
34
Professor disponibilizado para atuar na rede escolar (SMED), independentemente de troca por
outro recurso humano.
!
A;!
Superadas, ou aparentemente superadas as primeiras dificuldades, algumas
propostas iniciais foram se consolidando: o espaço para planejamento e discussão
de forma sistemática foi ajudando a construir um senso coletivo. Mesmo que
marcadas pela disputa de conceitos e práticas, as reuniões sistemáticas
estabeleciam novos pactos e buscavam negociar as soluções para dar conta das
demandas político-pedagógicas sobre o cotidiano da docência.
QUADRO 06: UNIDADES RECREATIVAS DA SERP EM 1987
REGIÃO O.P.
NOME DA UNIDADE RECREATIVA
1
Noroeste
Alim Pedro Pq
2
Centro
Ararigbóia
3
Centro
Florida Pç (Bartolomeu de Gusmão)
4
Centro/Sul
Frederico Guilherme Gaelzer Pq
5
Centro
Jaime Telles
6
Sul
Ipanema Pq
7
Centro
Marinha do Brasil Pq
8
Centro
Moinhos de Vento
9
Centro
Nações Unidas Pç.
10
Centro
Osório Gal. Pç (Alto da Bronze)
11
Partenon/Lomba
Partenon Pq
12
Ilhas Humaitá
Pinheiro Machado Pç
13
Centro
Ramiro Souto Pq
14
Ilhas Humaitá
São Geraldo Pç
15
Centro
Tamandaré
16
Centro
Tenístico José Montaury Pq
DADOS DA UNIDADE DE APOIO ADMINISTRATIVO SERP/PMPA (SCHAFF, 2003).
Um eixo político central da Administração Popular preconizava a inversão de
prioridade nos investimentos e serviços: das áreas mais centrais e privilegiadas, no
que se refere às condições socioeconômicas, de infraestrutura e de bens e serviços
públicos, para as mais periféricas e carentes da cidade. A SERP era um bom
exemplo de concentração de equipamentos e serviços a ser superado: até 1989, das
16 Unidades Recreativas
35
(UR’s) sob sua responsabilidade, 62,5% estavam na
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
35
Nome da estrutura de referência de atuação da SERP geralmente junto a quadra esportiva e ou
campo de futebol, com um módulo para a guarda de materiais esportivos e recreativos, podendo em
alguns espaços, abrigar banheiros públicos e vestiários.
!
A:!
região central da cidade
36
, conforme apresentado anteriormente no quadro 06 (p.
90). Cabia, assim, o desafio de levar equipamentos e uma política de ativação para
praças e parques em áreas até então não contempladas.
Na busca de alternativas para superar dificuldades nos novos espaços, tanto
em infra-estrutura quanto pelo perfil de público-alvo, ganharam espaço outras
propostas ênfase para a recreação e a prioridade do trabalho com crianças até 12
anos de idade.
A pluralidade de experiências, de culturas vividas de trabalho,
estabeleceram tensões com as práticas consagradas na história da instituição: o
esporte e a recreação, até então hegemônicos enquanto práticas, passaram a
compartir espaço com outras atividades relacionadas à promoção da saúde.
Uma proposta apresentada e acolhida como um projeto piloto, o Lazer &
Saúde caminhadas e corridas orientadas, traria uma modificação no conceito de
lotação da carga horária do professor da SERP: este deixava de estar ligado a um
espaço, a Unidade Recreativa (UR), e passava a estar ligado ao um projeto de
trabalho, onde quer que ele estivesse.
Por conta desta modificação, adveio nova lógica administrativa: a lotação do
professor em mais de uma U.R., como forma de atender mais espaços com menos
recursos humanos. Tal determinação, nominada na época como “Projeto Volante”,
foi recebida com resistência pelo professorado, dada as desacomodações de tempo
e espaço sobre suas rotinas pessoais (e conseqüências financeiras, com maiores
gastos com deslocamentos). Recebeu inclusive de alguns professores a alcunha
claramente pejorativa de “espeto corrido”
37
. Mesmo sob um discurso coerente – o de
levar esporte e recreação pública a mais cidadãos a conseqüência, na perspectiva
do professor, foi a da intensificação e da proletarização do trabalho docente, como
apontam os trabalhos de Tardif (2007), Giroux (1997) e Hargreaves (1996).
Contudo, este processo de ampliação de espaços de atuação da SERP
trouxe um aumento da visibilidade da instituição junto à população de Porto Alegre,
e, por conseguinte, novas comunidades passaram a demandar ações em novas
praças e espaços constituídos em torno do esporte e da recreação.
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36
Para um estudo mais detalhado sobre a distribuição de espaços esportivos da SME e as relações
com a demografia de Porto Alegre, ver SCHAFF (2003).
37
Alusão ao sistema de atendimento de churrascarias, em que as carnes são oferecidas de rodízio:
mais do que a referência a forma como a comida é servida, atribuo esta alusão à incessante e
necessária movimentação dos garçons como forma de garantir a satisfação dos usuários/clientes.
!
AB!
Este reconhecimento nas comunidades, aliado a constituição de um novo
canal de comunicação entre sociedade e Poder Público Municipal o Orçamento
Participativo (OP)
38
, passa a estabelecer pressões junto ao Executivo por mais
investimentos em recursos humanos e materiais. Este processo de disputa de
recursos se dava de forma indireta: a direção da SERP demandava junto à direção
da SMED, que somando esta a todas as outras necessidades da rede escolar,
buscava viabilidade junto ao centro de governo.
No final da gestão da Frente Popular (1991), um grupo significativo de
professores da SERP passa a organizar-se em diversos fóruns (coletivos de trabalho
e ou partidários) reivindicando a criação de uma secretaria autônoma, que
viabilizasse uma discussão mais direta das políticas de esporte e lazer para a
cidade.
Este movimento concretiza-se em 05 de outubro de 1993, com a aprovação
da Lei 7330 (ANEXO 01, p. 230), que cria a Secretaria Municipal de Esportes,
Recreação e Lazer de Porto Alegre, no segundo mandato da Frente Popular,
levando as políticas públicas de esporte e lazer para o primeiro escalão nas
discussões de governo.
Segue-se ao processo legal de regulamentação e estruturação, as
providências necessárias às adequações fundamentalmente de reordenamento de
recursos humanos, não pelo novo organograma, mas pelas características
advindas de novas demandas. O Setor de Eventos
39
passou a responder não por
algumas agendas internas, mas passou a articular-se com outras instituições,
fossem outras secretarias, federações esportivas ou entidades privadas para
viabilização de grandes eventos esportivos da cidade. Constituiu-se um novo perfil
de atuação dentro da instituição, que diferia da formação docente aentão exigida,
ao menos no espaço da SME.
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38
Orçamento Participativo canal de controle social e estabelecimento de demandas para
administração pública municipal, instituído pela Frente Popular na sua 1ª gestão (1989-1992).
39
Grupo de professores responsáveis pela proposição, organização e implementação de eventos
pautados pelas UR’s e os de caráter mais amplo (datas comemorativas Dia das Mães, Dia dos
Pais, Dia da Criança; de cunho esportivo abertura do Jogando em Porto Alegre, dos Campeonatos
Municipais, de etapa do Circuito do Banco do Brasil de Voleibol de Areia ou da Liga Mundial de
Voleibol; outros em parceria com federações e ou outras instituições Corrida pela Vida, Meia-
Maratona Cidade de Porto Alegre, atividades da Semana de Porto Alegre, Jogos da Escola Cidadã
(parceria com a SMED).
!
A=!
Novos projetos foram apresentados, alguns na área da recreação, como o
Brincando na Rua, as Brinquedotecas que acabariam por dar origem ao ônibus
Brincalhão, projeto de recreação itinerante que se consolidou como marca de outras
administrações petistas no Brasil.
Em resposta a um movimento de âmbito nacional de valorização das
condições de vida da 3ª idade, um grupo de professores propõe projetos de ativação
e formação permanente para atender este segmento. Rapidamente, estes grupos
constituem-se e crescem em número e em expectativa de atendimento.
Novamente, coloco no foco de análise, a constituição de uma diversificação
de demandas de atuação docente, implicando numa pluralidade de competências,
seja pela característica da atividade em si, seja pelo público a ser atendido. Procuro
evidenciar um processo que se deu num tempo pequeno, com um grupo de
professores também pequeno se tomarmos como referência o quadro de
professores/estagiários de EF da SME, no período entre 1993 e 1997, este era
inferior a 100, dos quais 20% em atividades de gestão (sem atuação direta com
grupos), alguns concentrados em parques/UR’s com grande demanda de atividades
sistemáticas. Considerando uma demanda nominal reprimida em uma cidade como
Porto Alegre, que tem mais de 700 praças, torna-se evidente o desafio do coletivo
da SME ao procurar atender a cidade como um todo.
A partir da diversificação acima apresentada, o modelo de gerenciamento e
de estabelecimento de critérios de lotação começa a definir-se pela área de atuação
do professor, buscando uma aproximação das experiências profissionais, levando
em consideração àquelas externas à SME (atuação em academias de fitness,
dança, junto a grupos de capoeira, lutas). Outras práticas corporais emergem dos
currículos de seus integrantes: as modalidades da dança, ginástica chinesa, ioga,
biodança, musculação são algumas das atividades “guardadas” nas trajetórias
profissionais e que passam a ser negociadas junto aos gestores como possibilidades
de prática docente.
A estrutura das pautas das reuniões semanais, gerais, tentando contemplar
o todo do professorado, não davam conta da pluralidade de atores e práticas: além
dos debates em torno do planejamento, de temas administrativos e pedagógicos
gerais (infância, violência urbana, dimensões da prática esportiva), outros temas
mais específicos e outras aproximações entre pares de docência se faziam
necessários. O cronograma passou a contemplar momentos de formação sob o
!
AC!
enfoque temático das práticas, instância de agrupamento chamado Área de
Atuação, tentando possibilitar a reflexão, o compartilhar de dificuldades e soluções
inerentes as suas peculiaridades.
Em 1997, tendo em vista a consolidação de um novo mapa da cidade
40
(vide
QUADRO 07, abaixo), que procurava afirmar a identidade plural do ponto de vista
social, econômico e cultural das diversas regiões de Porto Alegre e que balizava a
organização comunitária para participação no OP, o tema Regionalização tornou-se
uma diretriz de governo, dentro do eixo administrativo da Descentralização, trazendo
seus desdobramentos para a SME. A matriz de gestão de pessoas, de investimentos
em programas e projetos, bem como de investimentos em infra-estrutura e recursos
materiais, receberam um especial enfoque na busca de redução de desequilíbrios
regionais.
!
QUADRO 07 MAPA DE PORTO ALEGRE, SEGUNDO O ORÇAMENTO
PARTICIPATIVO E O AGRUPAMENTO ADMINISTRATIVO-PEDAGÓGICO
ADOTADO PELA SME
REGIÕES DO O.P.
AGRUPAMENTO
SME
1- ILHAS/HUMAITÁ/NAVEGANTES
2- NOROESTE
REGIÕES 1,2
6- NORDESTE
3- LESTE
REGIÕES 6, 3
5- NORTE
14- EIXO-BALTAZAR
REGIÕES 5,14
7- PARTENON
4- LOMBA DO PINHEIRO
REGIÕES 7, 4
9- GLÓRIA
10- CRUZEIRO
11- CRISTAL
REGIÕES 9, 10 e
11
12- CENTRO SUL
15- SUL
REGIÕES 12, 15
8- RESTINGA
13- EXTREMO SUL
REGIÕES 8, 13
16- CENTRO
REGIÃO 16, divi-
dida em 3 micror-
regiões: CENTRO
1, 2 e 3
41
Construído a partir do texto DIRETRIZES PEDAGÓGICAS, ADMINISTRATIVAS 2004 (ANEXO
02, p. 233).
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
40
Mapa da Regionalização da SME, a partir da matriz do Orçamento Participativo ANEXO 02.
41
Dada a concentração de equipamentos, professores e atividades existente na Região Centro, os
setores administrativo e pedagógico da SME implementaram esta divisão em 3 microrregiões.
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AD!
O tema das disparidades distributivas de espaços públicos de esporte e
lazer sob a responsabilidade da SME e as regiões da cidade foi assunto que abordei
na conclusão do curso de Especialização, apresentado no XIII CONBRACE
(SCHAFF, 2003). Neste estudo, procurei apontar algumas distorções existentes:
tomando como referência o mapa do OP, regiões de grande densidade populacional
tinham reduzidíssima disponibilidade de áreas públicas para a prática do esporte e a
fruição do lazer. Foi com grande satisfação que vi este trabalho nortear algumas
discussões no grupo diretivo da Secretaria e direcionar algumas disputas políticas
por espaços que pudessem incorporar-se a SME, como forma de reduzir tais
distorções.
Retomando as implicações de uma política de descentralização e
regionalização das ações, os professores sentiam-se pressionados no sentido de
desdobrarem suas cargas horárias em espaços e atividades que pudessem de
alguma maneira “superar os insuperáveis” desequilíbrios de atendimento na cidade,
pelos seus aproximadamente 100 professores e 20 estagiários: novamente, a lógica
da intensificação do trabalho docente, anteriormente referido, a fazer-se presente na
vida do professorado da SME. Reflexos da política a pautar a profissionalidade.
Para dar conta das demandas desta diretriz política e, de alguma forma,
criar condições de compartilhamento e superação das tensões e dificuldades
enfrentadas pelos professores, mais uma pauta entrou na rotina das reuniões de
feira, as reuniões por Região: equipes de trabalho organizadas tomando por
referência o mapa das regiões do OP (QUADRO 07, p. 94). Professores de uma
mesma região buscavam identificar as precariedades e as possibilidades de
superação, fosse pela ação institucional direta da SME, fosse pela busca da
constituição de um trabalho em rede. Do diálogo entre a prática cotidiana e a diretriz
política, das reflexões entre professores e gestores, afirmou-se a necessidade de
comprometer cada vez mais lideranças comunitárias com o processo de
planejamento e realização das atividades, de co-gestão dos espaços públicos com a
comunidade organizada, como alternativa para superação da insuficiência de
recursos humanos e materiais. Por decorrência, passava a ser esperado do
professor de EF a habilidade em estabelecer articulações comunitárias: identificar
lideranças, mediar a proposta político-pedagógica estatal e as necessidades
apresentadas pela comunidade. Entre as alternativas que se configuravam no
!
A>!
diálogo entre este coletivo de professores e os gestores emergia a necessidade de
comprometer cada vez mais as lideranças comunitárias com o processo de
planejamento e realização das atividades, bem como da co-gestão na preservação
dos espaços de atuação.
Novo desafio a ser incorporado na prática docente: além da aula, dos
alunos, das tensões cotidianas na relação com o espaço aberto e não-escolar,
agregou-se como demanda institucionalizada a busca da articulação comunitária.
Identificar lideranças, mediar a proposta político-pedagógica do Estado e as
demandas apresentadas pela comunidade cada vez mais organizada estava
sendo chamada a fazê-lo passou a fazer parte das suas atribuições cotidianas.
Para muitos professores, que por militância, convicção pedagógica ou “estratégia de
sobrevivência”, já assentavam suas ações a partir desta lógica participativa, nada de
novo. No entanto, para outros colegas que entendiam suas intervenções educativas
a partir de outros referenciais, de outros esquemas de ação, esta diretriz causou
incômodo, em alguns casos inconformidade. Nestes momentos, muito me
questionei: em que disciplina este tema foi trabalhado na minha formação inicial em
Educação Física? Quando a formação inicial de EF tratou destas questões? De
modo indireto, fiz algumas incursões nos currículos das instituições de formação de
EF, ao buscar junto a outros colegas e estagiários oriundos da minha ou de outras
universidades, se estes conteúdos haviam sido abordados. Por mais legítimas e
coerentes que fossem as diretrizes político-pedagógicas, eu e meus pares
institucionais não conseguíamos lembrar a resposta.
Aprendíamos no fazer cotidiano, no acerto, no equívoco. No entanto, a
concepção de formação permanente, materializada na destinação de tempos e
pautas (nem sempre convergentes com os interesses e necessidades dos
professores) acabou por constituir uma “cultura de compartilhamento de
experiências” com colegas da equipe, de região, que por similaridade dos contextos
de ação, viviam desafios similares e tinham no encontro, na troca e, muitas vezes na
disputa, formas de sustentação.
A seguir, apresento a formatação e a proposta estruturadora das instâncias
de formação no Quadro 08:
!
A?!
QUADRO 08: ESTRUTURA DE REUNIÕES DA SME E SUA CRONOLOGIA
Reuniões Gerais
(desde 1989, ainda SERP)
Com temas político-pedagógicos transversais ou de ordem
administrativa.
Por Equipe de Trabalho
(desde 1989, ainda SERP)
Destinada a momentos de estudo, planejamento de atividades
sistemáticas e assistemáticas, avaliação, tarefas administrativas.
Por Área de Atuação
(de 1996 ao final de 2004)
Tem por finalidade propiciar reuniões de aprofundamento de
estudos e troca de experiências de professores que atuam com
práticas corporais similares. Foram consideradas as atividades
sistemáticas, projetos e programas em atuavam os professores.
Foram assim divididos os grupos de formação:
Recreação: congregava profissionais dos Programas Brincando na
Rua, Brincalhão, Brinquedotecas, Graxaim e ações sistemáticas nas
UR´s.
Promoção à Saúde: envolvia os profissionais dos Programas
Lazer&Saúde, De Bem com a Vida, Musculação, Ginástica e
Alongamento
Práticas Alternativas: referia-se aos professores que constituíram
grupos em torno de conteúdos diferenciados dos até então
hegemônicos na SME: eram eles a Ioga, Biodança, Capoeira,
Dança, Tai Chi Chuan e outros.
42
Esporte: abrange todos os profissionais da SME envolvidos com as
manifestações esportivas grupos de atividades multiesportivas,
futebol, futsal, voleibol, handebol, basquetebol, tênis, ginástica
olímpica, Programa ECCE e outras modalidades.
Reuniões por Região
(de 1998 ao final de 2004)
Dada a relevância atribuída politicamente ao processo de
descentralização administrativa, e desdobrada ao nível das políticas
públicas setoriais, os professores são agrupados segundo as
regiões em que atuam: são objetivos desta instância de reunião:
análise, mapeamento e diagnóstico das características das regiões
da cidade e planejamento de ações.
CONSTRUÍDO A PARTIR DO DEPOIMENTO DOS COLABORADORES E NOS ELEMENTOS
PRESENTES NOS SEGUINTES DOCUMENTOS: A REGIONALIZAÇÃO NA SME, DIRETRIZES
PEDAGÓGICAS E ADMINISTRATIVAS (2000, 2001, 2002, 2003, 2004): ESTE ÚLTIMO,
APRESENTADO NO ANEXO 02, P. 233.
Em 1999, fui convidado a compor a equipe de Assessoria Pedagógica, e
com isto, passei a integrar o coletivo de gestão, do gabinete da SME. O desafio de
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
42
Em 2002, por necessidades de estruturação e coordenação dos trabalhos, as áreas da Promoção à
Saúde e Práticas Alternativas passam a constituir um único coletivo de trabalho.
!
A@!
sair das atividades-fins – da atuação direta junto ao público-alvo e pensar a prática
do professorado a partir da perspectiva da gestão, com base em eixos e diretrizes
políticas gerais da administração municipal, dos seus desdobramentos setoriais, era
(e ainda o é), a um tempo: instigante, desacomodador, muitas vezes, contraditório e
frustrante.
Instigante por uma pluralidade de motivos, mas fundamentalmente: o centro
político, o gabinete do qual passei a fazer parte, entendia que as discussões, ações
e investimentos na formação e reflexão sobre o fazer dos professores era central na
implementação das políticas, fossem elas gerais ou setoriais. A matriz da discussão
democrática, de argumentação e disputa, fazia-se presente e concreta mesmo em
situações muito duras de divergência, fosse conceitual, política ou procedimental.
Além das possibilidades de contribuição com o trabalho do professorado, a
proposição de realinhamento de ações, de redistribuição de pessoas para melhor
atender a população, ia ao encontro dos meus melhores ideais utópicos, políticos;
de possibilidade de alguma forma de contribuição social.
Desacomodador, porque tira o sujeito de posições ou conformistas ou da
irracionalidade crítica para olhar um mesmo contexto sob um outro enfoque: da
possibilidade de propor e implementar a proposta; de colocar-se frente aos limites e
contingenciamentos e buscar a alternativa possível; revisar seu empenho em
tensionar este possível.
Contraditório e frustrante, porque muitas das vezes os aspectos acima
encontram barreiras que não encontramos forças para superar. De todas as que
experimentei nestes cinco anos de gestão de políticas de ordenamento de recursos
humanos e de propostas de formação permanente, destaco duas, para mim talvez
as mais traumáticas. A primeira: aquilo que passei a chamar de contradição
discursiva políticas e ações de esporte e o lazer são fundamentais na construção
de uma sociedade democrática... são importantes na Educação, são preventivas no
campo da Saúde, andam juntas com as de Assistência Social... e por vai; no
entanto, são as menores dotações orçamentárias (este não é tema deste estudo,
mas entendo que poderia ser muito interessante um levantamento pormenorizado
nas esferas municipal, estadual e federal), o investimento em ampliação dos
recursos humanos é sempre colocado em segundo plano (ou outro inferior) de
prioridade. A segunda frustração refere-se ao esforço que empreendi a frente de
minha equipe de assessoria para que os professores coordenadores de ações e
!
AA!
programas, escrevessem sobre suas práticas, de tal forma que, junto com suas
equipes de trabalho, construíssem, para publicação posterior, o registro dos seus
fazeres. Era a concretização do professor sujeito da sua reflexão e da sua escrita.
Tínhamos as condições materiais, em parcerias com a SMED e SMC
43
, tínhamos o
trabalho constituído, consolidado. Ao final de um ano e meio de proposição,
dinâmicas de reflexão e exercícios de escrita, nenhum texto foi produzido. Seja por
um quadro conjuntural ou por minha incapacidade, ficou o projeto irrealizado.
No que se refere às mudanças estruturais, tanto na incorporação de
equipamentos, quanto de recursos humanos, deu-se início, a partir de 2000, a
transferência de responsabilidade de gestão das áreas e equipamentos esportivos
(incluindo as piscinas) dos Centros de Comunidade, até então da FASC
44
para a
SME, abrindo também a possibilidade para que os professores de EF que
atuavam pudessem optar por permanecerem naquela Fundação ou serem re-lotados
na SME, trazendo com eles outras práticas docentes, experiências peculiares na
relação mais próxima com as políticas de Assistência Social, tema este amplamente
abordado por Molina (1997). Do ponto de vista das decorrências desta incorporação
dos CC ao trabalho da SME deu-se a ampliação, e consequente diversificação das
atividades de verão oferecidas para a comunidade, sob o nome de Porto Verão, um
projeto inter-secretarias envolvendo fundamentalmente SME, SMC e até então
FASC. A partir de 2000, a SME passou a responder, além dos já consolidados Verão
da Gurizada, das agenda do ônibus Brincalhão, dos eventos esportivos de voleibol
de areia e futebol, pela ativação e manutenção das piscinas públicas dos sete CC.
Do ponto de vista do trabalho dos professores, a “novidade” abrigou adaptações
tranquilas, mas também forte resistência à incorporação destas outras práticas: para
os professores oriundos da própria FASC, nada de novo; para muitos dos que
estavam na SME, cuidar do espaço das piscinas, da forma como crianças,
adolescentes e adultos entram, utilizam e saem destes espaços, incorporar a
necessidade de uma constante vigília em função dos riscos associados a um grande
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
43
Secretaria Municipal de Cultura de Porto Alegre.
44
Fundação de Assistência Social e Cidadania, instituição autárquica da Prefeitura Municipal de Porto
Alegre, responsável pelas políticas setoriais de assistência social. Oriunda da FESC (Fundação de
Educação Social e Comunitária, criada pela Lei 4.308, de 13/07/77), que articulava ações nas
áreas da educação social, esporte, lazer e cultura. Em junho de 2000, com Lei nº 8.509, passa a
restringir seu foco de ação a programas e serviços para a população em vulnerabilidade social
obedecendo à Lei Orgânica da Assistência Social (Loas), de 1993. Dados extraídos do site
institucional da FASC/PMPA: http://www2.portoalegre.rs.gov.br/fasc/default.php? p_secao=8.
!
:;;!
contingente humano compartindo/disputando espaços no meio aquático, foi recebido
com muito descontentamento e resistência. De 2000 à 2004 vivi os reflexos da
incorporação destas novas práticas sob a perspectiva da gestão, com a promoção
de situações de formação, em situações de compartilhamento das experiências
acumuladas pelos colegas recém incorporados ao coletivo da SME, assim como
com oficinas de primeiros socorros, natação, hidroginástica. De 2005 a2009 tive a
oportunidade de viver na beira da piscina aspectos interessantes e outros de tensão
e insegurança.
Em 2005, com a saída da Frente Popular após 16 anos, a direção da
Prefeitura de Porto Alegre passou para a coligação PPS/PTB
45
, e a direção da SME
ficou sob a responsabilidade do PDT, trazendo as mudanças inerentes às transições
político-partidárias, e como referido em processo similar ao de 1989, trazendo
seus desdobramentos sobre as diretrizes pedagógicas, programas, projetos e, em
decorrência, sobre o fazer cotidiano dos professores.
Outras concepções de trabalho, novos projetos foram implementados como
o Esporte Samba, Amigos do Esporte, Programa Esporte e Lazer da Cidade,
Projeto Social Futebol Clube, Projeto Social Esporte Clube, Pró-esporte, Banco do
Tênis, Bonde da Cidadania e Torcida Solidária pela Paz. E outros descontinuados,
como a sistematicidade de reuniões, da organização do trabalho e formação por
áreas de atuação e por região, assim como o encerramento do Programa Brincando
na Rua. Concepções e projetos que, de certa forma, ressignificavam o papel e a
intervenção político-pedagógico da SME no atendimento da população.
No que se refere às modificações em relação ao grupo de professores,
também se reposicionaram concepções de relação de trabalho e de formação
profissional. Dito de outra forma, entendo que se alterou o lugar do professor na
instituição, em especial de 2005 a 2007, com o turno das manhãs de segunda-feira -
até então consagradas para as diversas instâncias de formação passando a ser
turno de atendimento de turmas; muito mais um entendimento do professor executor
de suas atribuições do que um profissional participativo, fosse pelo
compartilhamento de idéias e projetos, fosse pela sua crítica. Sobre este assunto,
trato das suas implicações ao longo da análise dos resultados, menos pela minha
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
45
Partido Popular Socialista/Partido Trabalhista Brasileiro dados oriundos do site do TRE/RS:
<http://www.tre-rs.gov.br/eleicoes/2004/2t/voto/RS88013S.XML/cand/RS88013_11_23.htm> Acesso
em: ago. 2008.
!
:;:!
percepção e experiência no contexto, mais pelo trabalho de discussão e
interpretação das contribuições dos colaboradores.
Enfatizo neste ponto da narrativa que as alterações, continuidades, tensões
e rupturas são características das sociedades complexas e contemporâneas,
assumindo concretude nas trajetórias pessoais, profissionais e institucionais.
Exceção feita à forma como constituí intencionalmente este texto até aqui, trago as
idéias que referenciaram meu entendimento sobre esta questão:
Crises de adaptação, crises da ligação de cumplicidade ou de
convivência ontológica entre o incorporado e a situação nova, essas
situações são numerosas, multiformes e caracterizam a condição
humana nas sociedades complexas, plurais e em transformação
(LAHIRE, 2002, p. 49).
Empossado o novo coletivo de gestão da SME, procurei o responsável pelo
processo de lotação de professores, tratando da minha reinserção nas atividades-
fins: levando em consideração os conteúdos com os quais tinha aproximação e os
espaços que pudessem demandar pela atuação de um professor com as minhas
características, acabei optando pelo Parque Alim Pedro, na região noroeste da
cidade e pela Praça Edgar Graeff, esta na região leste. Espaços onde estou atuando
até o momento desta escrita.
Das práticas docentes incorporadas, a formação de grupos de iniciação
esportiva de voleibol se constituíram nos meus primeiros desafios. No entanto, as
demandas de uma comunidade articulada, habituadas a contar com o
atendimento diversificado da instituição, impuseram novos desafios à minha
trajetória profissional. Passei a trabalhar com um grupo de terceira idade:
empreendimento inédito, necessidade de articular conhecimentos dispersos sob a
forma de uma metodologia que pudesse atender àquele grupo de senhoras com
utilização de competências com as quais eu tivesse alguma familiaridade. A
abordagem da reeducação postural, incorporada ao longo dos anos como
professor de musculação foi o elemento articulador, associando-se a outros como
alongamento, ginástica natural (oriundos de outros espaços de atuação e formação
permanente). A partir daí, esta dinâmica de aula ganhou alguma repercussão na
comunidade, permitindo que assumisse outro grupo, de maior amplitude etária e
bem mais numerosa. Hoje, tanto quanto o voleibol, que esteve presente na minha
!
:;B!
trajetória profissional desde 1984, agregaram-se, construíram-se estas novas
competências, estes novos esquemas de ação, ligados à reeducação postural, hoje
já fortemente associadas ao meu acervo de práticas docentes.
Procurei nestas últimas linhas, não restringir minha trajetória e a da
instituição ao de uma perspectiva política ou de entendimento e envolvimento com
um determinado projeto pedagógico. Eu permaneço como sujeito de uma instituição
com uma pluralidade de formas de atuação profissional; e a instituição permanece,
implementando políticas, materializando concepções, construindo representações na
relação dialética com a sociedade.
Anterior à discussão propriamente dita dos achados do campo e das
categorias de análise que dele se originaram, entendi ser oportuna a apresentação
deste bloco marcadamente narrativo sobre a história de vida do professor-
pesquisador e das representações que elaborei da história institucional. E enfatizo
que são as representações singulares que construí: longe de apresentar “a
realidade” ou “a verdadeira forma como tudo aconteceu”, apresento um cenário visto
a partir do meu singular ponto de vista.
Espero que, com a construção deste cenário, tenha podido contribuir para
uma melhor compreensão das análises e interpretações dos diversos textos que
foram sendo construídos ao longo do processo etnográfico que apresento a seguir.
!
:;=!
9. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
Dou início à discussão sobre os dados oriundos do campo, da coleta de
documentos e dos elementos interpretados a partir dos diários de campo e da
escuta das entrevistas, pela análise da estrutura, da agenda e forma organizacional
da proposta de formação permanente na SME.
Reapresento neste ponto as categorias centrais que emergiram ao longo do
estudo, derivadas de busca de síntese dos blocos temáticos, e estes, pela
recorrência e ou pela força conceitual, e que orientam o processo interpretativo:
CATEGORIA 01: O PAPEL DA TRAJETÓRIA PESSOAL E DOCENTE E AS
SINGULARIDADES DO MUNDO DA SME.
Constituída a partir dos seguintes blocos temáticos:
Experiências incorporadas: dos habitus de vida aos habitus de professor
Aproximações e contradições com as práticas da educação física escolar:
construindo novos esquemas de ação na singularidade da SME
Diversidade de práticas na SME: possibilidades de busca da inovação
possibilidades de preservação de um habitus professoral incorporado.
CATEGORIA 02: POLÍTICA: POSSIBILIDADES E ENTRAVES.
Constituída pelos seguintes blocos temáticos:
Relações e tensões entre a gestão e os professores: os limites tênues entre
disputa de projeto ideológico e o personalismo
O papel definidor de um modelo de gestão e o projeto político pedagógico de
formação permanente.
CATEGORIA 03: OS MÚLTIPLOS ELEMENTOS DA FORMAÇÃO PERMANENTE.
Esta categoria central derivou dos seguintes blocos temáticos:
O papel da experiência no processo de formação permanente: conhecer para
poder optar, conhecer para construir novos esquemas de ação
Os lugares do professor da SME e sua formação permanente.
!
:;C!
9.1. O PAPEL DA TRAJETÓRIA PESSOAL E DOCENTE E AS
SINGULARIDADES DO MUNDO DA SME
Uma das questões que se colocam desde o início na busca da compreensão
sobre este espaço de atuação profissional da EF porto-alegrense reside sobre quais
são as representações associadas historicamente ao espaço e aos conteúdos
culturais que constituem o trabalho na SME e como eles influenciam a opção dos
professores de EF a quererem integrar-se nesta rede. O que enfoco a seguir trata de
como os colaboradores reportam-se as suas experiências pessoais e ou
profissionais, em momentos diversos de suas vidas, e como estas vivências foram
significativas nas suas opções profissionais pelo trabalho na instituição.
Dada a importância que atribuí aos depoimentos, às narrativas neste estudo
e, seduzido pela forma como aparecem sob diferentes abordagens, nos textos de
Nieto (2006), Josso (2004) e Lahire (2004), ousei neste ponto apresentar uma breve
auto-narrativa, um trecho da entrevista que eu teria dado:
O professor que sou hoje é uma reconstrução de mim mesmo:
sou um todo eternamente incompleto: juntei ao longo de minha
trajetória, pedaços: de minha e professora de EF, austera e
comprometida, que me levou para brincar nos pátios e ginásios de
seu trabalho; do prazer de competir naquilo que achava que sabia e
da recusa de viver o que achava que não sabia; de optar (quase)
sem vacilo pela EF como profissão; de querer ter tempo para outras
paixões como violão, mergulho e computadores; de não achar este
tempo; de ter dificuldades com a velhice; de agradecer uma chefe
minha que me fez trabalhar com grupos de 3
a
idade; por fim, de odiar
as coisas da recreação na EF... e de ter reaprendido a brincar com
os filhos que tive. (ISMAEL, extrato do diário de campo maio/2009)
Estabeleci uma forte identificação com o referencial que procura dar sentido
às práticas da infância e da adolescência enquanto conformadoras de expectativas e
de identidades com o mundo do trabalho: longe de uma análise determinista, trago
elementos das discussões de Lahire (2002, 2004, 2008) sobre como as experiências
em determinados contextos, vão constituindo os acervos que irão ser mobilizados ao
longo das diferentes etapas de vida e em diferentes situações de vida.
Sobre os diálogos feitos à partir de textos deste autor, considero importante
situar que são as análises feitas sobre os sujeitos e a pluralidade de repertórios de
ação que estes mobilizam frente à diferentes situações de vida que configuram as
!
:;D!
grandes contribuições de Lahire para este estudo, e não suas proposições de ordem
metodológica no campo da sociologia.
Ao longo do texto procuro demonstrar como as experiências de vida pessoal
e profissional acabam constituindo-se em elementos de aproximação e interesse
pelas especificidades da profissionalidade da EF e pelas características singulares
do trabalho na SME.
Estabeleço esta discussão sobre esta categoria PAPEL DA TRAJETÓRIA
PESSOAL E DOCENTE E AS SINGULARIDADES DO MUNDO DA SME, a partir de
três idéias centrais, de maior recorrência nos achados do campo:
! Experiências incorporadas: dos habitus de vida aos habitus de professor
! Aproximações e contradições com as práticas da EF escolar: construindo novos
esquemas de ação na singularidade da SME
! Diversidade de práticas na SME: possibilidades de busca da inovação
possibilidades de preservação de um habitus professoral incorporado.!
9.1.1. EXPERIÊNCIAS INCORPORADAS: DOS HABITUS DE VIDA AOS
HABITUS DE PROFESSOR
Professores de EF, dedicados ao trabalho de iniciação esportiva, fortemente
preocupados não somente com aspectos técnicos mas as atitudes dos alunos em
aula, da maneira como se referem ao colega ou ao árbitro: na observação da
intervenção de quatro dos colaboradores, em situações de aula ou na condução de
eventos, em pontos diferentes da cidade contextos sociais distintos, faixas etárias
distintas fui registrando falas, orientações, intervenções como árbitros dos jogos e
identifico uma espécie de fio condutor: a seu modo, os quatro estão preocupados
com as atitudes dos alunos, com “a educação destes guris”, como disse o professor
Otávio. Ele prossegue:
Nós já fomos guris, não é, Ismael? Nós jogamos bola, fomos de
time, tu sabes, não é? Aqui a gente educa mais estes guris que no
colégio... Tu deve te lembrar... tu, do vôlei, deves ter sido aluno do
Brandão: não tinha moleza, ai de ti dizer que estava cansado ou que
não estava a fim... cara, eu carrego isto comigo até hoje... (OTAVIO,
observação dezembro/2008).
!
:;>!
Para tentar dar conta da construção de um cenário em que se a prática
docente de Otávio, somo à reconstituição de diálogos informais e à observação dos
momentos na ação, um extrato da entrevista onde este colaborador põe-se a refletir
sobre seu papel frente aos seus alunos:
Eu sou professor, tenho orgulho de ser professor e a minha
missão, ela é pedagógica, é educativa: mesmo trabalhando com
grupo de futebol, eu sempre procuro colocar valores para a
gurizada... e eu acho que estou no local certo para fazer isto: porque
é uma atividade que eles estão motivados para fazer, eu estou numa
posição em que pelo meu exemplo eu sou respeitado... então, a
minha obrigação é colocar valores para eles, isto é o trabalho do
professor (OTAVIO, entrevista fevereiro/2009, p. 5).
O que aparece de forma significativa é que as experiências vividas no
mundo do esporte e as relações estabelecidas com seus professores de EF
deixaram marcas na vida de Otavio: os esquemas de ação adquiridos contribuíram
na de sua forma de intervir como professor de EF, tomando materialidade na sua
atuação com crianças e adolescentes por meio do esporte. Participa ativamente da
dinâmica da aula, corrigindo individualmente, exigindo empenho; ao ouvir um dos
alunos xingando com palavrões o companheiro, intervém energicamente, falando de
respeito e educação. Neste ponto da descrição, poderíamos supor que a
consciência de estar sob observação estaria condicionando sua atuação:
novamente, refiro-me ao “estar lá” de Geertz (2005) mais do que no período de
observação para este estudo, convivi por 4 anos lado a lado com Otávio e esta é,
efetivamente, a sua rotina.
O significado que as diversas experiências da infância vem constituir um
repertório pessoal e profissional aparece reiteradamente nas falas dos
colaboradores. No entanto, abordo estas narrativas como elementos de um “homem
plural” e não sob uma perspectiva determinista, onde estes elementos
necessariamente constituiriam um homem homogeneamente bom, responsável,
valoroso ou, por via oposta, desregrado, indisciplinado, degenerado: ao compartilhar
das idéias de Lahire (2002, 2004, 2008), retomo as considerações feitas ao tema
no capítulo 2, mas enfatizo a abordagem dada por este autor ao passado e ao
presente do ator, assim referida:
!
:;?!
Nossa intenção é tratar teoricamente a questão do passado
incorporado, das experiências socializadoras anteriores, evitando
negligenciar ou anular o papel do presente (da situação) fazendo
como se todo nosso passado agisse ‘como um homem’, em cada
momento da nossa ação (LAHIRE, 2002, p. 47).
Pude identificar uma regularidade na importância atribuída pelos atores-
colaboradores que reputaram às suas experiências ligadas as práticas de esporte e
ou lazer como significativas na opção pela EF como profissão; como podemos
observar na fala de Elton:
Bom, quando criança, eu brinquei muito. Eu valorizo muito a
experiência prática de vida, a vivência que a pessoa teve antes da
sua vida acadêmica ou durante a sua vida acadêmica, como atleta,
por exemplo [...] Então, como na minha juventude, eu brincava muito,
brincadeira de roda, tinha futebol, nadava no valão que passava na
frente de casa, tinha toda uma vida de esporte, como uma coisa
meio que natural; então, isto foi me formando para que eu, essa
vivência foi me dando uma certeza e uma experiência... porque
quando eu entrei na faculdade e eu queria mesmo fazer EF em
função desta vivência de guri, de rua, de correr, sabe, de brincar
(ELTON, janeiro/2009).
Não apenas as vivências propriamente ditas ou os atores do passado
constituem os referenciais dos futuros professores. A disponibilidade de
equipamentos, as peculiaridades do espaço físico, do contexto cultural, as
configurações familiares parecem também estar presentes nas heranças
incorporadas pelos sujeitos. Uma pluralidade de fatores parecem poder assumir
relevância na constituição de uma futura identidade profissional. É o que trouxe o
depoimento de Ronaldo:
[...] os 3 maiores parques são inaugurados na década de 80
81, 82, aonde eu estou bem na etapa da minha adolescência e
próximo da minha casa inaugura um parque... e aí, com animação,
com professores até hoje, amigos... eu gostei deste caminho e na
sequência vai assim, porque, na realidade, a adolescência, isto com
13, 14 anos, começo a frequentar dos 15 aos 18, faço vestibular
para EF... (RONALDO, entrevista, fevereiro/2009, p.2).
Estes foram alguns extratos de falas e de registros do campo que me
permitiram inferir sentido às experiências do passado no processo de tomada de
decisão num outro tempo; de como estas experiências incorporam-se “sob a forma
!
:;@!
de esquemas ação” (LAHIRE, 2002, p.69). Ou, como aponta Sanchotene, ao referir-
se ao habitus e a forma como estrutura-se a prática dos professores:
Entendo que o habitus (como estruturas estruturantes) constitui
a prática dos professores, inclusive inconscientemente. Pois os
professores, durante a sua própria escolarização e através de
distintas vivências, incorporam disposições para a ação; ou seja,
incorporam expectativas em relação aos alunos e ao funcionamento
da escola que vêm a ser fundamentais nas tomadas de decisões, no
sentido de orientar suas práticas. Deste modo, as experiências
vividas pelos professores são incorporadas e constituem suas
disposições para a ação, seus esquemas de julgamento e de
avaliação, e tendem a influenciar na organização das aulas e na
organização escolar.
Estas disposições constituem e configuram a prática
pedagógica e os padrões de avaliação e de comportamento,
influenciando no planejamento das aulas e nos relacionamentos do
professor com os alunos (SANCHOTENE, 2007, p. 22-23).
As contribuições de Otavio, Elton e Ronaldo poderiam somar-se a outras
deste estudo (a minha, inclusive) a apontarem para uma forte relação entre as
experiências vividas num universo de práticas corporais e a de uma identidade com
o universo profissional ligado a estas práticas corporais. Experiências, esquemas de
ação, disposições, habitus: o passado deixando impressas suas marcas que, sob os
estímulos do presente – sejam eles de tranquilidade ou crise, manifestam-se.
9.1.2. APROXIMAÇÕES E CONTRADIÇÕES COM AS PRÁTICAS DA
EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR: CONSTRUINDO NOVOS ESQUEMAS
DE AÇÃO NA SINGULARIDADE DA SME
Dou início às reflexões sobre este tema, retomando a busca de uma
definição para a prática do professorado da SME: sobre as contradições do
empreendimento de uma ação educativa dotada de formalidades num espaço não-
escolar. Durante um bom tempo, as produções acadêmicas ao referirem-se a ações,
programas, projetos educativos fora do ambiente escolar, diferenciavam-nas como
formais (escolares) e não-formais, pelo caráter transitório, com públicos que não se
repetiam e, por vezes, sem uma intencionalidade, ou, sem o uso do aparato didático-
pedagógico (CARRANO, 2003, p. 17). Estas características do não-formal não
correspondem às experiências vividas nem às observadas do que ocorre
!
:;A!
sistematicamente na SME. Por isto, adotei a denominação não-escolar (ZUCHETTI;
MOURA, 2006, 2007), conforme discussão apresentada no capítulo 2, sobre as
possibilidades da educação além da escola e como se apresenta no universo da
SME. No entanto, nas últimas versões do documento oficial da instituição a que tive
acesso (de 2000 à 2004), intitulado Diretrizes Pedagógicas, Administrativas e
Programação (que teve sua última versão neste formato em 2004) a expressão
utilizada é a da não-formalidade, como segue:
!
De fundamental importância também é destacar a essência
educativa não-formal da atuação dos profissionais da SME, em toda
a riqueza que a intervenção pedagógica no tempo livre, no espaço
informal, de característica eminentemente lúdica, pode promover na
construção de uma educação emancipatória e cidadã (SME, 2004,
p.2) [grifo meu].
!
No entanto, entendo que o emprego desta expressão reflete a terminologia
corrente naquela época para referir-se ao processo educativo empreendido na
instituição. Apesar disto, ratifico a utilização neste estudo da denominação não-
escolar.
A análise de uma categoria como esta, centrada na compreensão de
identidades na prática profissional não leva a construção de linearidades ou
homogeneizações: pelo contrário, conteúdos e práticas ora identificam-se com
àqueles da escola, ora apresentam-se buscando uma distinção do que acontece na
escola. Trago alguns trechos de entrevistas em que diferentes colaboradores
verbalizam como estas similaridades e distinções disputam um lugar em suas visões
do trabalho e nas suas práticas:
[...] Enfim, ali caiu a ficha de que, realmente, eu estava
trabalhando com educação porque, afinal, eu era professora, eu
dava EF, era uma quadra esportiva, tínhamos uma sala de dança
quer dizer, tinham os mesmos instrumentos pedagógicos... eu era a
mesma... as pessoas vinham com o mesmo desejo, ou seja, de fazer
esporte... e as coisas não eram as mesmas... Que coisas eram
estas? O que estava acontecendo? Com isto é que a ficha caiu: “não
estou no mesmo lugar, não posso agir da mesma maneira sou a
mesma professora, mas não posso ser a mesma... alguma coisa
aqui tem que ser diferente...” (SUZANA, entrevista em
fevereiro/2009, p.3) [grifos meus].
!
::;!
Assim como o insight de Suzana, as características distintas do trabalho na
SME podem apresentar-se como um outro mundo, como refere-se Guilherme às
suas descobertas, da construção de sentidos que fez a partir da ação:
Depois e isto foi muito rápido eu descobri algo que eu
nunca imaginei que pudesse haver: atividades gratuitas, públicas
para a população, bancadas pelo poder público; isto foi um negócio
muito legal, foi uma descoberta muito grande e de para cá, eu
comecei a investir muito nisto, tanto que hoje estou nisto. Então
foi uma descoberta de uma outra possibilidade de atividade física
que não somente a dos limites da escola, mas extrapolando os
limites da escola, saindo para a praça, para o parque...
(GUILHERME, entrevista março/2009, p. 2).
Alguns elementos parecem emergir destas considerações de Suzana e
Guilherme, e daquilo que observei na materialidade das aulas: uma delas é que os
conteúdos práticas corporais ligadas ao esporte, à recreação, à dança estão
fortemente associados às representações culturais constituídas histórica e
socialmente, ou seja, vêm investidos dos mesmos significados, seja na escola ou na
praça: o aluno não parece estabelecer distinções em função do espaço institucional
em que as práticas ocorrem.
A outra é que, sob a perspectiva dos professores, as peculiaridades da SME
refletem-se de forma significativa sobre os seus modos de intervenção, das
estratégias que precisam ser mobilizadas para dar conta destas peculiaridades. Em
especial, a não obrigatoriedade e suas implicações no estabelecimento de vínculos
entre alunos e atividades aparece com relevância e, novamente, com significados
contraditórios: esta “ausência” simbólica valores como assiduidade, pontualidade,
traduzidos como “obrigatoriedade” associados à instituição escolar tanto é
apontada como um determinante positivo do trabalho na SME (“o aluno está ali
somente porque quer”) como também é associada ao desafio permanente ao
professorado da SME de superar-se e desenvolver estratégias e competências para
“fidelizar” o aluno. Apresento estes significados contraditórios nas falas que seguem:
[...] então quando eu fui chamada, eu ainda pude optar: na
minha ordem de classificação, foi feita a pergunta: “tu preferes SMED
ou SERP?” Então, para mim, foi possível optar. eu optei por
conhecer as pessoas que estavam trabalhando neste local e a
gente brincava... que era o ‘paraíso do professor de EF’ porque enfim
a gente ia estar trabalhando exatamente com tudo aquilo que a gente
!
:::!
sempre quis, livre de todas aquelas pressões escolares, no sentido
de que o professor de EF é sempre o ‘bonachão’, todo mundo
gosta... e outras pressões que nós, da EF, sabe que enfrenta...
então, era, para mim, considerado o paraíso... (SUZANA, entrevista
em fevereiro/2009, p. 4-5).
Enquanto Suzana exalta a SME como “o paraíso” para uma EF, livre dos
códigos limitadores do universo escolar, vejamos os significados atribuídos por Jairo:
[...] porque o nosso grupo em praça não é um grupo pronto:
então, ele [o professor] tem que conquistar o aluno todo dia; então, tu
tens que chamar, ser simpático, procurar mostrar a importância do
trabalho em praça, que também é importante, através do esporte, o
aluno pode crescer na vida, ele pode se educar não na sala, na
cadeira escolar (JAIRO, fevereiro/2009, p.2).
O ser e estar na SME assume significados distintos, por vezes
contraditórios: os professores da SME ora referem-se à convergência de suas
práticas com as que empreendem ou empreenderam na escola, ora demarcam
profunda distinção entre os dois mundos.
A intervenção sistemática do professor da SME dá-se na configuração não-
escolar (ZUCHETTI; MOURA, 2007): os alunos inscrevem-se na atividade, seja ela a
iniciação esportiva, o grupo de ginástica ou uma turma na brinquedoteca do parque;
passam a compor uma folha de chamada, a atividade tem uma metodologia que a
suporta pedagogicamente e o objetivo final da intervenção do professor é o de trazer
novos elementos e desafios para a formação integral do sujeito; neste sentido, pode-
se identificar forte aproximação com objetivos e métodos propostos para a EF
escolar.
No entanto, evidencia-se uma diferença significativa de ordem simbólica
sobre as instituições, sobre os significados atribuídos pelos diversos atores (alunos,
pais e os próprios professores) ao lócus e às estruturas de formalização das
práticas.
!
[...] a 1
a
grande diferença é a questão institucional mesmo: a
escola é uma instituição [ênfase], ela é reconhecida e a criança,
quando vem, ela está vindo para alguma coisa ela deixa não sei
quantos por cento de si fora, porque ela sabe que a instituição é
uma coisa forte, ela está entrando numa instituição: ela bota o
pezinho dela, a mochilinha dela dentro de uma instituição... e ali tem
todo um código por mais assustada que ela esteja, por menos
!
::B!
sabedora de tudo que ela seja, a instituição está presente na vida
dela... desde os irmãozinhos, a vizinha, a mãe, todo mundo sabe
como é uma escola, como é que funciona, como é a coisa
dentro,... isto, de forma simbólica mesmo... de representação, de
significado... é claro que isto se transforma no momento que ela
entra mas... é isto, é a instituição: cheia de significados, símbolos,
códigos, que a sociedade sabe e... mesmo que seja diferente, a
sociedade tem uma representação disto. A praça pública não, ela
não é uma instituição: primeiro, porque ela é colocada como uma
coisa pública e a coisa pública aberta ... pela população não é uma
instituição tanto que todo mundo depreda, todo mundo é dono...
tanto é que a gente faz sempre aquele discurso: “isto aqui não é
meu, é de todo mundo...” mas este ‘de todo mundo’ é uma coisa
aberta... ‘ah, a árvore é de todo mundo... esta quadra é de todo
mundo’... [sugere um descompasso entre discurso e convicção]: para
a cabeça das pessoas, acostumadas a conviver com o peso das
instituições, ter representação, significado do que é uma praça
pública é uma coisa meio complicada... de dizer que é uma
instituição... nós não somos uma instituição ... Então tem uma
diferença muito grande, da chegada da criancinha na praça
pública... Na praça pública, ela não deixa coisas para trás: ela
traz tudo que ela pode e mais um pouco... diferente da escola:
quando entra na escola, ela deixa coisas... porque a mãe dela
avisou que ela tem que ter ‘um caderno, um lápis, que a
professora...’ ela já vem toda preparada para aquele negócio. Na
praça não! Ela... tinha que cuidar do irmão menor mais novo... a mãe
saiu... está calor... ela pega o irmão mais novo e traz para a praça.
Pode significar ‘n’ coisas ela ter vindo ali: pode significar se livrar das
tarefas domésticas, pode significar ter fugido de alguma coisas, pode
significar ‘vou ali no banco, vou ali na praça...’; tem gente que vem
lavar roupa... dependendo da praça onde eu trabalhei, tem gente que
vem lavar roupa tem que tirar as pessoas, lavando roupa no
bebedouro... tem gente que vem dormir na porta porque acha que ali
é um lugar possível de se dormir... tem gente que vem se drogar,
porque acha que ali é um lugar possível para se drogar... tem gente
beber... cachaça... tem gente que vem transar, tem gente que vem
vender o corpo... Então a praça pública não é uma instituição, aonde
as pessoas saibam quais são as regras de convivência dela... Então,
se um professor, que sai de uma escola, de uma instituição ‘milenar’,
sei se é milenar... secular, pode ser ... formado também para este
tipo de atividade... e vem para um espaço aonde não existe uma
instituição, aonde os usos os mais diversos... então,..., quer dizer...
precisa dizer mais alguma coisa? [Risos, sugerindo obviedade] Eis a
grande dificuldade, eis a grande diferença pode até não ser a
grande dificuldade: pode até ser a grande facilidade; para mim, é a
grande dificuldade... Mas vamos colocar assim: eis a grande
diferença (SUZANA, entrevista fevereiro/2009, p. 5).
A riqueza desta fala de Suzana, ao referir-se aos aspectos simbólicos
atribuídos à escola e a ausência ou a profunda diferença dos que são atribuídos aos
lócus de intervenção da SME, assume contornos quase conceituais. Sobre a escola,
são inúmeros os textos a enfocarem seus significados, as dimensões políticas,
!
::=!
ideológicas, culturais sobre as quais sustentam-se as suas práticas. No entanto,
sobre o universo das ações não escolares como as desenvolvidas na SME, pouco
ou nada a sustentar teoricamente de forma crítico reflexiva as complexidades e
peculiaridades das práticas e das tensões que as caracterizam. Destaco a
relevância da construção de um texto em que os sujeitos da reflexão e da ação
assumem uma posição central.
[...] depois de muito tempo, eu fiquei pensando que... a coisa
da referência era uma coisa muito importante para a gente ser
professor, saber onde está dando aula, porque está dando aula,
quem são as pessoas para quem se está dando aula e muito, muito
importante também, é ter uma relação de grupo que trabalhe em
outros locais e que tenham experiências que possam contribuir para
que a gente se encontre: na verdade eu era uma pessoa que vinha
de um outro lugar, tinha uma experiência pedagógica já, considerada
bem grande, tinha passado por várias instâncias, várias estruturas...
não era uma pessoa que não tinha trabalhado na vila já tinha
trabalhado na vila então não dava para dizer que era uma pessoa
que “estava vindo da escola privada ... então teve...”[sugerindo o que
seria um discurso previsível para um professor sem experiência] -
não. Mas era uma pessoa que nunca tinha tido um trabalho num...
eu vinha da escola: era o meu primeiro trabalho em praça
pública. Então, há uma enorme diferença: à partir daquele momento
caiu a minha ficha eu percebi que estava num outro lugar de
educação: não era a escola. Ali, eu percebi que não era a escola:
no meu primeiro grande fracasso! (SUZANA, entrevista em
fevereiro/2009, p. 2-3) [grifos meus].
!
Tendo em vista as posições dos colaboradores de forma afirmativa sobre o
caráter educativo de suas intervenções, alguns questionamentos poderiam
desdobrar-se. O primeiro, colocando em xeque a abrangência destas posições
individuais: todos os professores da SME trabalham com esta perspectiva educativa
para o seu trabalho? Acredito que não todos, pelo reconhecimento da pluralidade
dos atores, de suas trajetórias e dos contextos múltiplos em que este trabalho se dá.
No entanto, daquilo que registrei, nas observações que empreendi em diferentes
espaços e em diferentes atividades a resposta é afirmativa: sim, o fio condutor das
ações é o da intervenção educativa. O que pude observar é que, respeitadas as
especificidades do espaço e as linguagens, as cargas culturais das atividades, sim,
o objetivo evidente dos professores era a criação de situações educativas, não só no
que se refere ao seu conteúdo quanto aos valores e comunicações intervenientes na
relações estabelecidas. Na aula de futebol do Pq. Alim Pedro e de vôlei do
!
::C!
CECOPAM, na aula de natação do CECOFLOR e do CECOVE e na de dança
novamente no Pq. Alim Pedro, observei professores que acolhiam alunos, que
conversavam com pais sobre eventuais dificuldades, que procuravam motivar alunos
a superarem dificuldades, que demonstravam domínio de estruturas didáticas em
seus conteúdos ou práticas corporais de forma a proporem atividades de caráter
progressivo de forma a facilitar o processo de aprendizagem, a chamada de atenção
pela bagunça ou pelas atitudes indisciplinadas ou desrespeitosas com seus pares.
São preocupações que podemos perceber nesta fala:
[...] porque, na realidade, o esporte... ninguém quer formar
atleta, nós usamos a natação, o voleibol, o futebol, como um meio de
trazer estas crianças, estes adolescentes pro Centro. E depois que
eles estão na mão do professor, na palma do professor, o professor
vai fazer deles um cidadão, com respeito, com dignidade, com
disciplina, com assiduidade ... cobranças, conceitos, valores, coisas
que hoje em dia... hoje em dia, infelizmente, alguns conceitos foram
deixados de lado (ELTON, entrevista janeiro/2009, p. 20).
Importante diferenciar também as atividades sistemáticas, até agora objeto
das reflexões, e as assistemáticas: neste segundo grupo, encontra-se uma imensa
gama de intervenções dos professores da instituição, que vai de programas de
orientação de caminhadas nos parques da cidade (Projeto Lazer&Saúde), do Ônibus
Brincalhão que de forma itinerante, leva equipamentos recreativos aos diferentes
espaços da cidade até os eventos nos finais de semana, sejam eles de alcance
mais comunitário, local, sejam os eventos de grande visibilidade e que viabilizam-se
na articulação de diversas Secretarias Municipais e ou outras instituições
(Federações, Confederações, Clubes). O que apareceu nas falas dos colaboradores
é que especialmente nestes grandes eventos, onde não existe um vínculo com os
participantes, com a comunidade local, poderíamos ter mudanças na forma da
intervenção. Pode aparecer uma outra forma de entendimento da sua atuação; no
entanto, não caracterizou-se de forma clara para mim o enfoque conceitual desta
“outra forma” de atuar: se ela é entendida como contexto também educativo mas
receptivo para que outros atores que não os especialistas, os professores,
possam atuar outros “elementos humanos”, “lideranças culturais informais”, na
perspectiva adotada por Marcellino (1987, p.148) do que ele denomina “um
animador cultural”; ou, se esta outra forma seria referida a ser um recreacionista,
!
::D!
utilizando o termo recreação numa acepção pejorativa, “concebida como simples
prática” (WERNECK, 2000, P.83) ou, como a colaboradora Suzana refere-se à
imagem depreciada do trabalho com recreação, como “o não-lugar do professor de
EF”. Tendo pelo segundo exercício interpretativo, pelas diversas observações de
grandes eventos e das diferentes posturas que os professores assumem. Como
podemos ver nesta fala de Alice, sobre as “diferentes formas” de colocar-se frente
ao evento:
[...] dependendo da pessoa, dependendo do profissional que
estiver trabalhando ali neste momento, naquela atividade, pode ser
as duas coisas, pode ser uma só... ou pode não ser ‘nenhuma’...
[risos, sugerindo um temor pelo que a última alternativa poderia
abrigar]... pode ser uma pessoa que está ali simplesmente e deixa o
papel ali, o papel para a criança e deixa que ela se vire com as
tintas e deu! Sem interferir, sem conversar, sem fazer nenhum
trabalho pedagógico... (ALICE, março/2009, p. 6) [grifo meu].
É interessante destacar que os professores não vêem esta situação como
contraditórias ou excludentes. Pelo contrário, apontam para esta possibilidade como
mais uma das materializações da diversidade de ações para os professores de EF
na SME. Vejamos nos seguintes extratos:
[...] por exemplo, nós temos um evento aqui no sábado, que
tem uma característica...ali, naquele momento, a gente não está
dando nenhuma aula, tu não atendes um grupo específico: tu estás
ali, ajudando na pintura, passam ali um ‘monte’ de crianças e elas
passam... e vão fazer outra coisa... poderia pensar que naquela hora
ali a gente é um animador sócio-cultural... mas a gente não deixa de
ser professor também, nem que a criança esteja ali com a gente,
pintando, seja por 5 minutos... acho que, em termos de trabalho, um
conceito não exclui o outro (ALICE, março/2009, p. 5-6).
Ainda sobre as possibilidades de uma pluralidade de formas, de estratégias
de envolvimento no trabalho, especialmente nos de caráter assistemático, trago a
posição de Ronaldo:
[...] acho que tem vários tipos de diferentes de capacidade:
acho que tem pessoas que tem um perfil mais técnico, pessoas que
tem mais um perfil de animadoras... o legal é que tudo isto cabe, não
é?... Tem desde o cara que é o técnico de voleibol, de futebol,
passando pela pessoa aquela que faz o evento de recreação... o
locutor, que não faz uma locução convencional, que é uma locução
!
::>!
que tem um perfil de animação, de educação... tu vais dar o viés da
animação, considerando a atividade... então, é um profissional …que
pode conter vários tipos de profissional (RONALDO, entrevista em
fevereiro/2009, p. 5).
Ainda aprofundando reflexões sobre este comprometimento do coletivo de
professores com uma ação educativa, poderia propor, de forma pertinente, esta
questão por uma outra perspectiva: todos os professores da rede escolar estão
igualmente comprometidos com uma ação educativa? E se a resposta for negativa (e
como alguns estudos sobre RME/POA
46
têm demonstrado, ela o seria), isto
desconstitui a escola como espaço educativo? Algo destas reflexões/provocações
estão presentes nas contribuições dos colaboradores:
Evidente que nem todos são iguais, tem um universo... mas eu
acredito que a grande maioria com quem a gente convive e conviveu
ao longo destes anos, a grande maioria são educadores. Eu acho
que são educadores eu acho que ser educador é algo que é
anterior... e um educador, assim... social. Eu não sei se todos os
profissionais que atuam nesta Secretaria têm este entendimento ou
porque não querem, ou porque não concordam mas a grande
maioria têm... ou agem não preocupados com a terminologia ou o
conceito da sua ação: mas sabem que atuam dentro deste
entendimento que eu tenho do trabalho (GUILHERME, entrevista
março/2009, p. 5-6).
O que procurei ressaltar na voz dos colaboradores sobre este aspecto da
discussão é a força que a perspectiva educativa assume como elemento identitário
para estes professores de EF na SME, sem qualquer perspectiva reducionista ou
pretensão homogeneizadora; e por entender que, ao negar a força que o sentido
educativo assume na construção da identidade dos professores da SME num
suposto rigor em reconhecer a alteridade e a diversidade dentro do coletivo de
professores, estaria também incorrendo num equívoco da generalização.
A segunda questão, de espectro mais amplo, se dá nas contradições entre a
prática docente e o seu reconhecimento no âmbito legal, no que se refere aos
direitos deste professorado como categoria de trabalhadores em educação, mais
especificamente ao seu direito à aposentadoria especial prevista pelo Plano de
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
46
Já referidas anteriormente, as diversas produções do grupo de estudos do F3P-Efice.
!
::?!
Carreira do Funcionalismo Público Municipal de Porto Alegre: direito dos professores
da rede escolar (SMED) e negado aos professores da SME.
De tal magnitude se coloca esta dúvida que o poder público, nas instâncias
que deliberam sobre os benefícios da aposentadoria especial, não reconhecem o
caráter educativo do fazer do professor da SME, negando-lhe este direito, direito
este garantido aos seus pares atuantes na SMED: para estes, o fato de estarem a
frente de suas turmas a nominada regência de classe os qualifica como
professores; aos lotados na SME, também frente às suas turmas, munidos de suas
chamadas, apoiados no planejamento das atividades, na sistematicidade dos
encontros, na intencionalidade do ato educativo, não tem sua intervenção
considerada como de docência para este fim.
Trago esta questão pois parece-me emblemática deste ser-não-ser do
professor da SME, a começar pelo aspecto legal: a lei 7330, que cria a SME explicita
no seu artigo 2
o
, parágrafo II a responsabilidade da instituição de “democratizar a
cultura corporal humana com orientação didático-pedagógica”; mas
fundamentalmente no que aponta o Parágrafo Único do Art. 10: “as atividades
desenvolvidas por Professor ou Especialista em Educação na Secretaria Municipal
de Esportes, Recreação e Lazer - SME, serão consideradas de ensino para todos
os efeitos legais” (PMPA, 1993). No entanto, para um destes ‘efeitos legais’ a
aposentadoria especial estas atividades desenvolvidas não são consideradas de
ensino.
Este aspecto surge reiteradamente e de forma importante como pauta de
reuniões dos professores e nas suas reivindicações junto as suas instâncias de
representação da categoria (ATEMPA
47
, SIMPA
48
); e os pedidos de aposentadoria
seguem esbarrando em pareceres (busquei, sem êxito, acesso a um destes
pareceres) por não reconhecerem as características de docência e regência de
classe naquilo que fazem os professores da SME; questão esta que vem
perpetuando-se para além das gestões municipais e dos diferentes coletivos político-
partidários. A abordagem desta questão tão específica poderia ser entendida por um
viés reivindicatório; no entanto, o que parece subjazer é uma negação da prática de
um coletivo de professores, de um vínculo com marcos referenciais educativos;
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
47
Associação dos Trabalhadores em Educação do Município de Porto Alegre.
48
Sindicato dos Municipários de Porto Alegre.
!
::@!
instiga, ao menos, uma apropriação mais detalhada do nível de conhecimento que
as instância de gestão tenham sobre a materialidade do trabalho deste
professorado. Não deveria ser desconsiderado que estas questões de caráter amplo
desvalorização salarial, de seu status social, de disparidades isonômicas com
outros profissionais que possuem o mesmo grau de formação acadêmica podem
assumir significados depreciativos na identidade destes professores (ESTEVE,
1999, p. 105). Depreciação esta sobre o status da docência, que é bastante
perceptível nesta fala:
Na hora da opção para que vestibular, claro que tentei
medicina na UFGRS: não estudei nada, dei graças a Deus que não
passei porque era uma tremenda pressão familiar aquela velha
pressão de que ‘alguém tem que não ser professor’ toda a família
era professora e não sei porque, mas toda família de professor, todo
mundo é professor mas o 1
o
que for fazer vestibular a gente diz: “não
faz para ser professor!” Bem, comigo aconteceu a mesma coisa, todo
mundo era professor mas ninguém queria que eu fosse e eu sempre
quis ser (SUZANA, entrevista fevereiro/2009, p. 6).
Em busca de uma síntese, a partir das falas dos colaboradores e da
observação que empreendi ao longo do período de coleta e da minha experiência
como membro deste coletivo, coloco a tensão entre “aproximação e disputa de
identidade” entre o fazer na escola e o fazer na SME desta forma: tanto os
conteúdos principalmente esporte e recreação, hegemônicos nos dois espaços
quanto o papel educativo atribuído à intervenção sistemática do professor da SME,
sugerem forte aproximação entre os dois universos. Os aspectos distintivos,
diferenciadores, parecem afirmar-se nos sentidos atribuídos ao tempo, ao espaço e
à autonomia propositiva, e estes três conectados exatamente pela oposição aos
códigos da escola: da não-obrigatoriedade, da ausência das tensões inerentes à
aprovação ou retenção, das subjetividades associadas à liberdade do ir e vir, do
ingresso na atividade a partir de interesse e ou prazer. Além destes, soma-se a
possibilidade de oferecer à comunidade (sem desconsiderar os interesses
propositivos do professor pela aproximação com as suas experiências) outras
manifestações do movimento humano, culturalmente distintas daquelas consagradas
na escola.
Estes fatores parecem compor uma identidade complexa, apoiada em
elementos de similaridade e de diferenciação, que não parecem ser incompatíveis, e
!
::A!
que por vezes mostram-se nas representações e nos esquemas de ação de um
único professor, mobilizados pelas singularidades dos contextos do presente a partir
da diversidade de experiências acumuladas ao longo de sua trajetória (LAHIRE,
2002, 2004, 2008). O professor de um determinado conteúdo corporal, que atua de
forma reconhecidamente comprometida, exemplar com seus grupos, demonstra
desinteresse e apatia em participação em evento que contraria suas convicções ou
não apresenta conexões mínimas com as suas competências profissionais.
Em outra perspectiva de análise, pude identificar que os professores
parecem lidar de forma singular frente às peculiaridades referentes aos códigos da
EF escolar e não-escolar: para alguns as similaridades com os códigos da escola
são as que subsidiam as assimilações e construções de novos esquemas de ação
para sua atuação na SME. Para outros, dá-se de forma oposta: o não-escolar
assume significados de um “vazio” para o qual o professor pode não encontrar
respostas, não encontrar referências acumuladas dentro do seu repertório, que lhe
permitam suportar os desafios. Aponto para outra dupla perspectiva: professores
que tiveram na escola, nos seus conteúdos e estruturas de formalização, o elemento
limitador, coercitivo de suas expectativas de docência na EF, a pluralidade cultural
que as diversas comunidades e grupos de interesses dispersos pela cidade,
constituem o cenário paradisíaco anteriormente mencionado por Suzana (p. 88
deste estudo); a formação de grupos em torno de uma atividade fundamentalmente
pela motivação dos sujeitos pode assumir uma dimensão central para relações
profissionais prazerosas e realizadoras. Estes mesmos elementos, vistos por outra
perspectiva, de um universo quase ilimitado para a EF na SME, ao qual Elton refere-
se como “[...] olha, a EF é um universo, um universo que não pára, um universo que
gira sempre” (ELTON, entrevista janeiro/2009, p. 6), podem constituir fatores de
insegurança e incerteza para alguns professores. Este contexto, em que o professor
tem tamanha autonomia na identificação e proposição de conteúdos e de definição
de estratégias, pode levá-lo a imobilidade e ao isolamento. Da mesma forma, a
adesão voluntária às atividades, movida por interesse e prazer, pode colocar o
professor frente a situações de fragilidade na criação de vínculos, de esvaziamento
do seu grupo: basta uma semana de chuva (para quem trabalha a céu aberto) ou a
associação de situações de violência com o temor de ir ao parque ou a à praça, para
que fique o professor a pôr em dúvida o quanto daquilo é circunstancial, e o quanto
tem a ver com seu trabalho, com a sua competência profissional.
!
:B;!
Ao finalizar este tópico, encaminho para uma reflexão sobre as inter-
dependências que os professores estabelecem entre suas práticas na SME com
aquelas que se dão no interior dos espaços escolares. E o que emerge de forma
relevante é a inexistência de um padrão, de uma homogeneidade de significados
atribuídos para estas práticas: não ser escola parece agregar de forma diferenciada,
por vezes antagônicas, possibilidades e dificuldades. Antagonismo este que pode
emergir para um mesmo sujeito, dependendo dos contextos a que se encontra
submetido. No entanto, o que parece configurar-se como um elemento articulador
para dar conta destas aparentes incongruências ou diversidades de significados é
esta formação permanente, esta formação em serviço (GÜNTHER; MOLINA NETO,
2005, p. 210) e a capacidade atribuída pelos diferentes sujeitos deste estudo para a
troca de experiências, para o compartilhamento destas experiências com seus pares
de trabalho como forma de construírem uma identidade docente que os sustente.
9.1.3. DIVERSIDADE DE PRÁTICAS NA SME: POSSIBILIDADES DE
BUSCA DA INOVAÇÃO POSSIBILIDADES DE PRESERVAÇÃO DE
UM HABITUS PROFESSORAL INCORPORADO
No bloco anterior, apresentei aspectos relacionados a diversidade, na forma
como os colaboradores situavam-na em relação às peculiaridades da docência na
SME. No entanto, o que identifiquei é que o termo diversidade é empregado em
diferentes sentidos, com diferentes implicações e conectadas pelos professores com
múltiplos aspectos de suas vidas na instituição.
Um destes sentidos, já abordado no último capítulo, refere-se a possibilidade
que este lócus não-escolar tem de abrigar diferentes manifestações culturais
relacionadas ao movimento humano, manifestações estas que ou o encontram
lugar nas aulas de EF ou se ganham um lugar de experimentação, não recebem
adesão por parte dos alunos, dada a força com que o modelo esportivista faz-se
presente nas práticas escolares (BRACHT, 1992).
Ao analisar o rol de atividades encontradas na SME, vemos que a instituição
constituiu-se em espaço poroso para a proposição e implementação de práticas
distintas, abrigando e demandando competências bastante específicas e variadas. O
professor Jairo, até por representar aquele grupo com mais de 20 anos na instituição
!
:B:!
e que, por consequência, viveu diversos momentos da história da SME, refere-se a
estas modificações:
Eu posso até comparar desde o início: no início, as praças e
parques tinham o básico, era o futebol de campo, o futsal, vôlei,
basquete, não tinha... hoje, na SME, tem colega que desenvolve
ioga, ginástica chinesa, capoeira, ginástica localizada, alongamento
(JAIRO, entrevista janeiro/2009, p.3).
Faço posteriormente uma reflexão sobre a estreita dependência que
algumas destas atividades (e a continuidade dos grupos a elas associados) têm com
os profissionais que dominam os conhecimentos, as competências específicas para
implementação destas práticas. No momento, limito-me a listar atividades que
excedem as modalidades esportivas consagradas e cujos conteúdos encontram-
se contemplados nos currículos dos cursos de formação inicial em EF (futebol,
futsal, voleibol, etc.). São elas:
Biodança
Ginástica chinesa
Tai Chi Chuan
Ioga
Capoeira (alguns grupos ligados a Capoeira de Angola outros à Regional)
Dança
Reeducação Postural
Musculação!
Além destes, faço referência a especificidade do trabalho transgeracional:
tanto às crianças de 2 a 6 anos do Projeto Graxaim quanto aos diversos grupos para
idosos, sob diferentes abordagens (musculação, dança, reeducação postural, grupos
de convivência). Deixei intencionalmente para citar uma outra atividade, a corrida de
orientação, projeto proposto em 2003 e implementado a partir de 2004, por um
professor que tinha, entre outros conteúdos em EF, a formação específica nesta
modalidade; entre outras características, o forte apelo ecológico e possibilidade de
contemplar uma modalidade de esporte de aventura justificaram a sua implantação;
anos mais tarde (não tenho a informação precisa), por peculiaridades da trajetória
!
:BB!
profissional, este professor acabou afastando-se da SME e com isto, descontinuou-
se a atividade, desfez-se o grupo, ao menos sob a responsabilidade da SME.
O que busco colocar em questão é: quais os mecanismos para preservação
de uma atividade tão fortemente atrelada às competências específicas daquele
professor? Como dar resposta ao grupo e à demanda criada a partir do despertar de
interesse por esta atividade? Ao dar visibilidade a esta questão, procuro
problematizar a fragilidade que uma ligação personalista entre professor-atividade
apresenta; e que determinadas manifestações culturais do movimento humano nem
sempre encontram na formação inicial a sua sustentação. Não é o objeto desta
reflexão negar a importância das práticas nem tampouco, em função das limitações
expostas, propor que não sejam oferecidas à comunidade. Pelo contrário, vou ao
encontro da discussão de alternativas que possam dirimir estas dificuldades, talvez
possíveis sob propostas específicas de formação permanente.
Ainda sobre esta questão, procurei entender os interesses que pudessem
estar expressos ou ocultos sob esta diversificação de atividades. Primeira
perspectiva: criaram-se condições institucionais que a tornaram receptiva à
ampliação do leque de atividades oferecidas à população de Porto Alegre. Dito de
outra forma, os professores poderiam abrigar projetos neste sentido motivados
pelas idéias ou por “estratégias de sobrevivência” que se apresentados a uma
administração não receptiva, na qual não houvesse eco para tais iniciativas,
poderiam não se viabilizar. Wittizorecki (2001) refere-se acerca disto, destas
disputas de espaço e condições de realização com o trabalho docente, das tensões
entre professorado e gestão:
É nessa perspectiva que o professorado constrói suas
estratégias de sobrevivência [...] e resistência diante das dificuldades
colocadas pelas condições sociais [...], como por exemplo, o uso de
materiais de alternativos, as operações de cooperação, a utilização
de recursos/instrumentos próprios nas aulas, os movimentos de
organização sindical e reivindicações da classe (WITTIZORECKI,
2001, p. 16).
As condições para a proposição e negociação parecem ter-se constituído,
até pelos objetivos institucionais formalizados nos seguintes trechos de um texto
oficial de 1995:
!
:B=!
Faz-se necessário, ao retomarmos este, dando continuidade aos
“processos em construção”, que busquemos nossos referenciais (p.
1).
2) Democratizar a cultura corporal humana com orientação didático-
pedagógica (p. 2).
[Prioridades para 1995] : Assessoramento pedagógico, no sentido de
possibilitar maior construção coletiva (p. 5) (SME, ASSESSORIA
PEDAGÓGICA, 1995).
Conforme busquei historiar ao longo do capítulo 7, em 1991, o projeto-
piloto de orientação de caminhadas abriu perspectivas distintas daquelas existentes
até então, tanto no que se refere a forma de lotação (já abordado no cap. 7) quanto
ao conteúdo do trabalho, afinal entrava em cena com este projeto atividades
voltadas ao eixo da promoção à saúde. Delineava-se desde então perspectivas do
“respaldo institucional”. Tanto que da criação da SME em 1993 até a publicação do
texto acima (1995) o número de projetos específicos subiu para 4. Neste capítulo,
não pretendo deter-me nas implicações políticas isto é o objeto do próximo bloco
temático; o que busco destacar é a existência de um projeto político-pedagógico que
pretendia ampliar sua abrangência e diversificar suas ações. Do ponto de vista
formal, isto encontra-se explicitado ao longo do texto Diretrizes Pedagógicas e
Administrativas, entregue a todos os professores da SME no início do ano, como
referência para o seu trabalho, bem como o dos Responsáveis por Atividades e
estagiários, como segue:
Alicerçados em princípios e diretrizes que tem por pressuposto
a democratização do acesso ao lazer enquanto direito social, a
participação efetiva da população, seja na proposição das políticas
(Conferências Municipais, planejamento participativo regional), seja
no envolvimento cotidiano com as atividades desenvolvidas, a SME
vem ampliando a sua atuação na cidade, diversificando ações e
estabelecendo parcerias com os mais variadas representações
sociais.
O modelo de especulação imobiliária e a alta concentração
populacional que caracteriza a configuração urbana contemporânea
desafia-nos a consolidar políticas de preservação dos espaços
públicos de lazer e potencializar ações em espaços informais, tendo
na regionalização a estratégia de identificação e aproximação com
as diferentes realidades da cidade.
De fundamental importância também é destacar a essência
educativa não-formal da atuação dos profissionais da SME, em toda
a riqueza que a intervenção pedagógica no tempo livre, no espaço
informal, de característica eminentemente lúdica, pode promover na
construção de uma educação emancipatória e cidadã (SME, 2004, p.
2).
!
:BC!
Na base do que diz o documento, a ampliação da abrangência e da
diversificação das ações permite caracterizar, pelo ponto de vista da política
institucional, a constituição de um terreno fértil para as proposições dos professores,
e que passa a ser reconhecido por estes como possibilidade. Alice enfatiza a
importância desta disposição da política institucional com a perspectiva da
diversificação das ações:
Eu acho que é importante, de certa forma, tem relevância para
quem trabalha porque valoriza a experiência e os conteúdos destes
profissionais, ou seja, esta bagagem que eles trazem de algum lugar
que não necessariamente da faculdade eles trazem esta
bagagem e que nesta Secretaria eles podem aproveitar (ALICE,
entrevista março/2009, p. 5).
Esta disposição também é referida por Suzana:
[...] mas pelos profissionais que chegavam na instituição e viam
que havia este espaço aberto e... propunham. Então os projetos que
hoje existem, eles partiram, na sua grande maioria, não da ‘cabeça
política’ mas sim da experiência profissional dos professores: eram
eles que com a sua experiência, o seu desejo, o seu gostar,
propunham para a administração que era aberta (SUZANA,
entrevista fevereiro/2009, p.9).
Cabe, neste ponto, identificar estes diferentes elementos que sustentaram,
do ponto de vista dos professores, a busca de espaço para estas outras práticas,
para a possibilidade de destinarem a sua carga de trabalho para conteúdos e
dinâmicas que ultrapassassem os que até então se apresentavam como os dois
grandes eixos, o esporte e a recreação. Em tempo: mesmo estes dois centravam-se
nas atividades locais implementadas nas Unidades Recreativas: projetos como o
Brincando na Rua e o ônibus brinquedoteca o Brincalhão
49
e o projeto esportivo
Em Cada Campo Uma Escolinha, também significavam inovações, pois alteravam o
conceito de espaço e a relação com a demanda comunitária por atividades de
esporte e lazer; com eles a rua, o beco, o estacionamento, o campo improvisado
eram o locus da ação e a sua presença dava-se pela demanda da comunidade: ao
invés da lógica do cidadão que vai ao serviço, o serviço demandado ia ao encontro
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
49
Mais detalhes sobre este projeto e suas implicações políticas e pedagógicas estão no livro
Brincalhão: Uma brinquedoteca itinerante (RODRIGUES, R. P. [Org.]. Petrópolis, RJ: Vozes, 2000.
!
:BD!
do cidadão. Esta outra opção estratégica, de estabelecimento de relação e de
aproximação entre instituição e sociedade coloca sobre o professor outras
expectativas de intervenção e instiga a mobilização de competências, que não
necessariamente fazem parte do repertório do professorado, como podemos
identificar na fala de Ronaldo:
[...] acho que algumas características são básicas esta
característica que eu comentei antes, das relações comunitárias se
tu considerares o trabalho de ponta, é fundamental hoje em dia,
não se concebe um profissional lá, sozinho na praça, dando aula,
esperando que os alunos venham... se não tiver uma intervenção
junto à escola, uma costura, um coordenador que faça isto, acabou.
Precisa ter uma pessoa que tenha o perfil para este tipo de coisa,
que vá se relacionar, que vá animar aquele espaço (RONALDO,
entrevista fevereiro/2009, p. 5).
Feita esta observação sobre uma outra expressão de diversidade, sob o
prisma de um perfil professor-articulador comunitário, retomo o enfoque para a
busca de espaço pelos professores para outros conteúdos da EF dentro da SME. O
que parece relevante destacar é a pluralidade de interesses que permeavam estes
movimentos de ampliação e diversificação.
Além dos interesses institucionais, estavam ali os dos professores,
compreendidos por mim sob dois aspectos de alto significado, não excludentes, não
contraditórios, mas trazendo motivações distintas.
O primeiro destes aspectos surge de forma direta e objetiva, sobre a
relevância do conteúdo desta ou daquela prática corporal e cultural: a convicção de
sua importância, de suas implicações e possibilidades como práticas de educação,
ou de fruição do lazer ou de promoção da saúde, de acesso à outras culturas. Uma
justificativa clara para dar sentido ao que é feito, como pude constatar na
simplicidade e síntese desta fala:
E a [...] questão é a da relevância do trabalho, não é? Assim:
eu acredito na relevância do trabalho que eu estou fazendo
(OTAVIO, entrevista em fevereiro/2009, p. 4).
Atentos para os conteúdos e interesses que emergem da sociedade e das
aproximações que estes têm com o seu acervo de esquemas de ação, os
professores mobilizam competências que permitam dar respostas esperadas e
!
:B>!
necessárias. Ao referir-me às competências refiro-me a elas como capacidades de
ação:
[...] acredito que chegou o momento de enfrentar o problema
das competências, as quais englobam os saberes, porém não se
limitam a eles! Ao contrário dos conhecimentos, que são
representações organizadas da realidade ou do modo de transformá-
la, as competências são capacidades de ação (PERRENOUD, 2001,
p. 139).
Assim, a atitude propositiva, inovadora permite buscar nas experiências bem
sucedidas incorporadas ao habitus profissional e utilizá-las frente a um contexto
favorável, seja pela demanda estabelecida, seja pelo desafio de possibilitar à
comunidade o contato com diferentes expressões da cultura e do movimento
humano.
[...] isto [a diversidade] é interessante no sentido do
atendimento da população, também: porque se a gente tem uma
diversidade de atividades nas quais as pessoas podem escolher às
quais elas se adaptam melhor... então, se alguém não gosta ou não
pode fazer ginástica, tem que fazer alongamento, ou gosta de fazer
uma biodança, porque se sente melhor ali... ou... uma atividade mais
introspectiva não sei se dá para dizer assim, mas... isto também
é interessante (ALICE, entrevista março/2009, p. 5).
Mas a busca de alternativas dos professores para atuarem com práticas que
lhes são familiares, e pelas quais possam lançar mão de estratégias incorporadas,
sugerem a interveniência de um segundo aspecto, que permeia os interesses dos
professores: construir condições mais cômodas para o exercício profissional. A
palavra “cômoda” não é utilizada em associação com sentidos depreciativos, de
alienação ou desinvestimento. Refere-se mais a construção de condições materiais
de realização pessoal e ou profissional; ou, da redução de fatores de ruptura,
desajustamento e crise para o exercício da profissionalidade na SME, talvez buscar
diminuir as situações de necessidade de “agir com urgência, decidir na incerteza”
(PERRENOUD, 2001, p. 15). Este aspecto surge de forma recorrente, referida e
observada enquanto estratégia de preservação do professor - as “estratégias de
sobrevivência” explicitado em diferentes momentos das falas dos colaboradores.
Seguem alguns:
!
:B?!
Mas aí é que se estabelece esta diversidade: ela se estabelece
de fato por duas vias: uma pela natural, pela profissional e se diria
pela via do intelecto, pela via do ‘mais em cimamais em cima, no
sentido das coisas, das conjunturas, do movimento do mundo e
também pelos interesses: dos profissionais que ali estão e ocupam
os espaços que lhes são abertos e concedidos. Este é um
movimento que pode ser maravilhoso, mas também pode pulverizar
e pode deixar, por algum tempo, dificuldades de se estabelecer
afinal: ‘quem somos nós e para onde nós estamos indo’ uma coisa
de “corpo” [corporativismo] (SUZANA, entrevista fevereiro/2009,
p.10) [grifo meu].
A busca de racionalização dos tempos entre o universo pessoal e
profissional também são fatores significativos. As diversas manifestações
associadas à intensificação do trabalho docente (HARGREAVES, 1996, p. 144)
como a sobreposição dos postos de trabalho, ou a destinação de elevada carga
horária diária para o exercício profissional, são algumas das estratégias de
sobrevivência adotadas. Desta forma, restaria ao professor buscar alternativas de
minimizar o desgaste decorrente destes acúmulos. É o que sugere a fala de
Guilherme, notável por expor de forma transparente os dilemas concretos do início
da carreira, tema este abordado por Cavaco (1999, p. 162-165):
[...] e professor quando está iniciando, se puder pegar tudo que
puder encaixar nos seus horários, vai... então a minha primeira
expectativa foi: “bom, estou conseguindo ajeitar a minha vida,
agregar algo mais sem abrir mão do que eu estava fazendo”, isto
no 1
o
momento. Depois e isto foi muito rápido eu descobri algo
que eu nunca imaginei que pudesse haver: atividades gratuitas,
públicas para a população, bancadas pelo poder público; isto foi um
negócio muito legal, foi uma descoberta muito grande e de para
cá, eu comecei a investir muito nisto, tanto que hoje estou nisto
(GUILHERME, entrevista março/2009, p. 2).
Algumas questões podem ser apontadas: uma delas decorre de uma
conversa informal com uma colega sobre o objeto deste estudo e as inquietações
que me moviam e que acabou constituindo-se numa provocação bastante instigante,
registrada no diário de campo:
Ismael, se tu fores ver esta “diversidade” que tu falas são um
monte de especialistas puxando a brasa pro seu assado
50
, cada um
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
50
Expressão popular equivalente a proteger os próprios interesses.
!
:B@!
dando um jeito de fazer o que gosta e o que sabe, normal... mas é
mais por eles (RAQUEL, diário de campo maio/2009).
Esta abordagem é muito interessante porque até então eu construía análises
e interpretações para a diversidade, vista pelo enfoque global que estas práticas, no
seu conjunto, significavam para a sociedade e para o coletivo de trabalho da SME;
mas visto a partir das individualidades que a compõe, instiga outros olhares e outras
possibilidades interpretativas. Revisitando as práticas e os seus responsáveis, a
grande maioria, senão a totalidade deles trabalha com a sua especialidade a
diversidade parece materializar-se no todo e não nas partes. Aponta para a idéia de
que um professor, convicto sobre a importância de uma prática rica em elementos
culturais diversos, não necessariamente incorpora este conceito ao seu esquema de
ação. Outrossim, aquele conteúdo que caracteriza a sua prática, propicia no todo um
elemento de diversidade. Novamente, isto pode implicar na individualização e nos
riscos de descontinuidade, já apontado anteriormente.
Outro elemento que coloca-se para a análise refere-se ao nível de
autonomia dos professores em elegerem suas práticas e a possibilidade de
distorções na distribuição dos recursos humanos para o atendimento e garantia
desta mesma diversidade. Parece já constituir-se em objeto de preocupação a
possibilidade de concentração em torno de alguns temas ou grupos etários e o
surgimento de “vazios”: o estudo sugere a necessidade de uma mediação entre os
indicadores institucionais de priorização ou equilíbrio de atendimento e as
proposições advindas dos interesses de realização do professorado:
[...] o que eu vejo hoje é que o trabalho da Secretaria muito
predomina adulto e 3
a
idade: se tem pouco trabalho com criança e
adolescente, não sei ... está aberto ... os professores ... eu não sei se
o público que chega é adulto e 3
a
idade, ou se ele tem mais
dificuldade com a criança (JAIRO, entrevista janeiro/2009, p.3).
Ou ainda:
Ela [a EF na SME] tem esta riqueza da diversidade, só que em
vários momentos é eleito, e eu não sei por quê isto, preferências:
para determinada faixa etária, para determinado tipo de atividade... e
aí, acho que, um pouco, digamos que... por conveniência dos
próprios profissionais, que todo mundo na SME não tem pouco
!
:BA!
tempo de casa... as pessoas meio que ‘migram’ para isto que está na
‘crista da onda’ (LUCAS, entrevista fevereiro/2009, p. 8).
Neste ponto da discussão, surgem questões que sugerem forte correlação
entre os elementos norteadores de uma proposta político-pedagógica institucional e
as tensões sobre e a partir das práticas do professorado. Finalizo este tópico,
enfatizando o significado central de uma reflexão sobre as inter-dependências que
os professores estabelecem entre suas práticas na SME, o cenário político e mais
adiante, a formação permanente: seu papel, suas possibilidades, as expectativas
dos professores. Nesta reflexão, coloco em questão o lugar do professor:
protagonista ou executor, intelectual reflexivo ou um técnico a ser (in)formado,
questões que sustentam as discussões a seguir.
9.2. POLÍTICA: POSSIBILIDADES E ENTRAVES
Ao tematizar esta categoria central faço um destaque inicial sobre um
aspecto relevante: nas entrevistas dos oito colaboradores o tema política não sob
um enfoque setorial ou conjuntural mas sim no seu viés partidário esteve presente
e pautou reflexões sobre dificuldades na trajetória de ingresso, em influências sobre
as opções de lotação ou em obstacularizações ao trabalho, ou às proposições de
formação permanente.
Ao cotejar entrevistas com a documentação disponível, pareceu-me
oportuno estabelecer dois cortes de caráter temporal: um, em 1993, com a criação
da Secretaria, no início do segundo mandato da Frente Popular
51
, constituindo o
aparato administrativo, bem como a definição legal e regimental de seu corpo
técnico, os quais persistem até hoje. O segundo corte dá-se em 2005, com o início
da gestão sob a direção do Partido Democrático Trabalhista (PDT), como parte do
governo que assumiu a Prefeitura de Porto Alegre, liderado em 2005 pelo Partido
Popular Socialista e em 2009 pelo Partido do Movimento Democrático Brasileiro
(PMDB).
Isto parece justificar-se fundamentalmente porque este é um corte temporal
sugerido pela análise dos professores colaboradores; ao identificarem modificações,
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
51
Coligação liderada pelo Partido dos Trabalhadores (PT), que ao longo das quatro gestões a frente
da Prefeitura de Porto Alegre estabeleceu
!
:=;!
tanto no que se refere a questões amplas modelos, projetos político-pedagógico-
administrativos quanto às modificações mais pontuais (carga horária destinada
para reuniões de formação, formatação e estratégias de participação dos
professores), os professores apontam para a transição de 2004-2005 como um
momento que demarca alterações significativas na instituição. Situei inicialmente o
quadro de mudanças partidárias na administração central do governo municipal mas
passo, a partir daqui, a me ater a estas mudanças no cenário específico da SME, ou
seja, 1993 à 2004 – PT; e de 2005 até a finalização deste estudo (2009), PDT.
A apresentação desta categoria com o sub-título “possibilidades e entraves”
procura apresentar os aspectos contraditórios, e contemporaneamente
depreciativos, quando associados ao termo central política. Como abordado no
capítulo 4, cabe a política, em especial à política pública, definir o modelo de relação
entre o Estado e a sociedade civil e as regulações entre as esferas públicas e
privadas, estabelecendo os “dispositivos político-administrativos coordenados em
princípio em torno de objetivos explícitos” (MULLER; SUREL, 2004, p. 13) [grifo
meu]; o grifo procura por em questão o quão explícitos os objetivos das ações
políticas têm estado nos tempos que vivemos.
Mas o que procuro enfatizar é que sob o termo “política” está implícito o seu
papel definidor de visões de homem e sociedade e da implementação de ações
coerentes para tornar estas visões um cenário real. Cabe ao Estado, através da
ação política, estabelecer as formas de sua intervenção nos diversos setores da vida
social: economia, educação, saúde e todos os outros que constituem e permeiam a
existência. Ou seja, a política como elemento para as possibilidades.
Dois eixos norteiam as reflexões deste capítulo: o primeiro refere-se às
implicações da ação pública e da atividade política segundo as definições de
Muller e Surel (2004), sobre a docência do professorado. O segundo atém-se as
mesmas implicações mas sobre a matriz da formação permanente.
9.2.1. RELAÇÕES E TENSÕES ENTRE A GESTÃO E OS PROFESSORES:
OS LIMITES TÊNUES ENTRE AS DISPUTAS DE PROJETOS
POLÍTICOS E O PERSONALISMO
O estabelecimento destas reflexões passa pela identificação dos conceitos
sobre os elementos fundantes no que se refere ao papel do Estado, ao papel do
!
:=:!
esporte e do lazer, bem como a identificação clara do projeto político-pedagógico
que sustentação às propostas de formação permanente. Estes conceitos são
determinantes na articulação do discurso institucional, na proposta e implementação
das ações dos professores e no modelo de formação profissional.
Fiz uma opção por não me ater a analisar e confrontar os textos dos
diferentes coletivos políticos por dois principais motivos: o primeiro, pela minha
manifesta identificação e envolvimento político com o coletivo de gestão do primeiro
recorte temporal e participação direta na construção de alguns destes textos.
Pretendi evitar imputar a esta produção acadêmica um teor ideológico; crítico e
posicionado, sim; ideologizado, não. O segundo motivo refere-se a coerência com o
lugar epistemológico e metodológico em que me situo sobre a produção de
conhecimentos: o centro do estudo está nas experiências dos colaboradores e nos
significados por eles atribuídos cabe a mim empreender um esforço de
interpretação e síntese.
Posto isto, apresento alguns extratos das falas dos colaboradores, buscando
compreender como os professores percebem os elementos advindos das questões
políticas sobre o contexto de sua vida profissional na SME.
Eu acho que a Secretaria tinha que ter uma linha pedagógica
bem definida, construída com os professores e com a comunidade. A
comunidade não tem participado em nenhuma decisão da Secretaria,
ultimamente. Acho que participou, nesta 1
a
fase do PT, acho que
participou, pouco, não posso dizer quanto. Mas, assim, o que
ajudaria, além disto, seria afastar a política [atividade política] da
Secretaria (OTAVIO, entrevista fevereiro/2009, p. 7) [grifos meus].
Alguns elementos parecem significativos na fala de Otávio: uma delas é que
a definição da matriz política, das implicações sobre as ações públicas setoriais e as
diretrizes pedagógicas que decorrem das definições anteriores devam estar claras e
enunciadas para os professores. Mesmo que, e nisto remeto para o segundo
aspecto que considerei relevante na fala de Otávio, não haja concordância com o
todo ou com partes desta proposta político-pedagógica. As falas apontam para
importância atribuída para a apresentação, a explicitação das estratégias de
intervenção e as expectativas institucionais para a ação dos professores. Como
segue:
!
:=B!
[...] outra, também, esta coisa da indefinição de linha política:
isto é uma coisa, também, que incomoda. Primeiro lugar, nós somos
servidores públicos, estamos para servir a comunidade... agora, tem
governo que nos esta linha política... e quando este discurso não
está afinado, é complicado porque tu vais na comunidade, um
discurso no qual tu tentas ser o mais isento ou o mais técnico
possível... mas a gente sabe que isto também não existe, sempre
tem uma intencionalidade por trás... nesta intencionalidade tu
corres o risco de ter que chamar a comunidade para dizer diferente
do que tu disseste na primeira vez como aconteceu (RONALDO,
entrevista fevereiro/2009, p.6).
!
Parece importante destacar, no início da apresentação das vozes, o
caráter não-partidário, tanto das análises dos pesquisadores quanto dos
professores-colaboradores, dos quais tive o cuidado de procurar contemplar a
diversidade de posicionamentos políticos partidários, como me parece explicitado
tanto na manifestação anterior de Otavio quanto na que segue:
Então, eu acho o trabalho da Secretaria fantástico, embora
com todos estes percalços que nós estamos vivendo atualmente, o
PT que eu não morro de amores por ele, quero deixar bem claro...
(ELTON, entrevista janeiro/2009, p. 11-12).
O que pretendi apresentar como resultado desta análise é que as tensões
oriundas das disputas entre os partidos – e muitas vezes das tendências e correntes
dentro de um próprio partido, como pude vivenciar enquanto parte deste coletivo
assumem uma relevância sobre a vida profissional dos professores, fragilizando o
significado da instituição enquanto promotora de serviço público setorial, tanto frente
aos trabalhadores quanto frente à comunidade. Reafirmo a abrangência temporal
que este bloco temático abriga. Em um relatório de reunião de professores, de 1989,
estava registrado o seguinte:
Que seja elaborado pelo grande grupo uma “estratégia” para
que as diferentes filosofias partidárias não modifiquem e nem
interfiram no Objetivo Geral da SERP. [Autoria preservada]
Por ocasião das mudanças de Administrações, proponho a
permanência das chefias, por 6 meses, como período de transição.
[Autoria preservada] (extrato do documento RELAÇÃO DAS
PROPOSTAS DO 1º SEMINÁRIO DA SERP, julho/1989, p. 1).
Novamente, aparece na reivindicação de professores a tentativa de limitar a
ingerência das questões político-partidárias sobre as da prática docente. Não parece
!
:==!
haver dúvidas de que as instituições públicas são as interfaces materiais dos
projetos políticos levados ao poder pelo voto popular. Isto manifesta-se na
expectativa dos professores, tratada anteriormente, de uma definição clara das
diretrizes políticas. O que parece ser trazido à pauta é a fragilidade das relações de
trabalho oriunda das identificações pessoais e ou coletivas profissionais com
modelos de gestão ou partidos políticos diferentes dos que estejam à frente da
instituição. Fragilidades como a apresentada neste depoimento:
O que eu quero me referir é assim: que em troca de partidos,
trocam-se os interesses. Aí, assim: teoricamente as coisas que tu
fazias certo, talvez não sejam tão certas... [riso, sugerindo ironia, um
certo tom de sarcasmo] e isto eu o aceitava muito...[riso, idem
anterior]. Então, volto a ter atritos (LUCAS, entrevista fevereiro/2009,
p. 5).
Ou ainda:
Os meus problemas de adaptação foram: primeiro, que eu
entrei com uma orientação política diferente do pessoal que estava
no comando naquela época; não que eu seja engajado em atuação
política partidária: pelo contrário, eu nunca tive nenhuma ação assim.
Mas as pessoas me identificaram com alguns amigos meus que
trabalhavam dentro e tinham esta atuação... eu acho que eu fui
mal recebido neste ponto: eu fui... as pessoas que estavam no
comando, elas não levaram em consideração a experiência que eu
tinha e a carga que eu tinha de conhecimento na EF (OTAVIO,
entrevista fevereiro/2009, p. 2).
A identificação desta fragilidade das condições de trabalho apontam para o
estabelecimento de mecanismo diversos de superação desta realidade: o
enfrentamento, assumindo consequências que possam advir; a participação
silenciosa, enfatizando o papel do servidor público no cumprimento do que é posto,
de atenção mas evitando situações de confrontação; ou a busca de isolamento, na
busca de um lugar alheio ao cenário das disputas e procurando manter as suas
práticas intocadas. Ao colocar desta forma não pretendi reduzir um professor a uma
reação entendo que diferentes conjuntos de circunstância (profissionais, pessoais,
econômicas) podem mobilizar diferentes respostas frente a determinados contextos.
Ao fazer esta reflexão, recorro novamente às contribuições de Lahire (2002, 2004,
2008) sobre a pluralidade de disposições do sujeito e sua grande conexão com o
!
:=C!
contexto e a impropriedade de empreender uma análise homogeneizadora das suas
reações:
[...] realmente não podemos compreender por que indivíduos
com diferentes experiências socializadoras passadas reagem de
forma diferente aos mesmos stimuli externos, se não levantarmos a
hipótese de que esse passado sedimentou, de alguma forma, e se
converteu em maneiras mais ou menos duradouras de ver, sentir e
agir, isto é, em características disposicionais: propensões,
inclinações, hábitos, tendências, persistentes maneiras de ser...
(LAHIRE, 2004, p. 27).
Evitando um sentido padronizador, o que apresento são exatamente os
relatos das experiências e das reações aos contextos por parte dos sujeitos.
Inicialmente, reapresento o enfrentamento adotado como possibilidade:
E as pessoas eram muito resistentes a isto... e eu era turrão:
começava a complicar, então está, então eu vou complicar mesmo
[...] eu achava que eu tinha o direito de me expressar. Mas isto não
foi muito bem entendido na minha entrada na SME, o [dito num
sorriso, que sugeria uma expressão de descontentamento e
descrédito pela forma da condução do trabalho]. eu fui de castigo
para o futebol: eu sou morador aqui da Zona Norte, moro, estudava,
trabalhava em lugares que o a SME também na Zona Norte, e
fui trabalhar pelo ECCE na Zona Sul, mais especificamente Extremo-
Sul/Restinga. Então, finais de semana, sábados, que é quando
tinham os encontros com o pessoal, eu chegava a fazer 200km num
sábado...(LUCAS, entrevista fevereiro/2009, p. 4).
Intencionalmente, apresento o extrato do mesmo colaborador, a mostrar a
pluralidade do sujeito frente aos contextos, quando opta pela segunda alternativa
que enunciei como participação silenciosa:
[...] e era bem isto: era para fazer futebol e eu tinha que fazer o
futebol acontecer; mas, como era uma coisa que eu gostava,
tranqüilo. Achava um desperdício... mas me moldei a aquela
perspectiva da SME (LUCAS, entrevista fevereiro/2009, p. 5).
Diferente do conformismo, ou seja, da aceitação passiva e da concordância,
o que identifiquei foi a adoção do silêncio e do respeito ao mecanismo hierárquico a
dar legitimidade ao cumprimento da tarefa. Tanto na fala acima quanto na que
segue:
!
:=D!
[...] e é uma situação que incomoda... mas isto também faz
parte da função, a gente tenta administrar isto... em algumas vezes,
tu levas os representantes do governo, os responsáveis pela linha
política, para estarem junto contigo na comunidade para dizer: ‘olha,
eu estou representando este governo aqui e em função disto tais e
tais ões o ser tomadas, que entendemos vão ser melhores’ ...
Aí, a parte técnica, tentar te isentar um pouco... é uma forma de
tentar se proteger... claro que quando esta linha é mais clara, fica
mais fácil... e aí a gente não entra nem no mérito desta linha política,
não entro nem no mérito se eu concordo ou se eu discordo: o que
está valendo ali, naquele momento, a comunidade escolheu, a
maioria da comunidade escolheu aquele governo que está ali...
então, neste aspecto, eu acho que eu sou bem tranquilo e resolvido
nesta história... bom, estamos fazendo a proposta que a comunidade
elegeu (RONALDO, entrevista fevereiro/2009, p. 6).
Sobre este último colaborador, tive a oportunidade de observar sua
participação na equipe de apoio durante um Congresso Técnico
52
de uma
modalidade esportiva dos Jogos Abertos Cidade de Porto Alegre (abril/2009).
Identifiquei nas suas intervenções uma mobilização de argumentos coerente com o
que foi expresso em sua entrevista – frente a momentos tumultuados, quando
alguns técnicos que participavam várias edições do eventos questionavam o
formato meramente informativo, no qual se sentiam alijados de qualquer
possibilidade de contribuição ou interferência no que estava sendo proposto
reconheceu que havia de fato, vivenciado outras experiências naquele fórum de
caráter mais participativo e deliberativo mas que:
[...] hoje, temos uma outra proposta de trabalho e temos que
tentar sair daqui com uma proposta para fazer acontecer o
campeonato, conto com a compreensão e a colaboração de vocês
(RONALDO, extrato do diário de campo, abril/2009).
Por último, apresento a terceira forma que identifiquei como reação às
interferências das atividades políticas sobre os fazeres dos professores, busca de
isolamento:
[...] hoje a Secretaria, pelo rumo que está tomando (riso
discreto, aparentando ceticismo) nós vamos [...] de soluções
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
52
Reunião na qual o promotor do evento esportivo reúne os representantes das diversas equipes
participantes com fins a definir detalhes sobre normas, organização e realização do evento.
!
:=>!
pontuais, que não são assim, de coletivo: de nós tratarmos em
reunião de professores, discutir os assuntos, ver assim qual é o
melhor caminho para tomar ... e cada um hoje em dia ... [...] o tem
uma linha definida, pelo que eu vejo hoje. Então me frustra que...
claro, tu tens que tomar uma decisão sozinho (JAIRO, entrevista
janeiro/2009, p. 5).
Ou:
Porque cada unidade e é isto que eu acho que poderia ser
diferente cada unidade meio que tem uma diversidade de tarefas,
não é uma coisa assim: “todo mundo trabalha a mesma coisa”
(LUCAS, entrevista fevereiro/2009, p. 8).
Por fim, no sentido de identificar diferentes manifestações, trouxe esta, da
Alice, que articula isolamento e sua percepção de ausência de espaços de formação
permanente e de construção coletiva:
E eu acho que, para o nosso trabalho, a Secretaria como um
todo acaba perdendo [...]a gente não conversa mais... a gente
simplesmente vem e faz... (ALICE, entrevista março/2009, p. 3).
Destas contribuições estabeleci uma forte relação de sentido ao lugar do
professor em diferentes esferas; neste caso, com seu lugar na discussão do projeto
político-pedagógico, do modelo de gestão de pessoas ao qual está submetido e aos
espaços que constrói (ou que se permite construir) de estabelecer limites claros
entre as atividades políticas e as ações públicas sobre o seu fazer profissional. Esta
reflexão sobre o lugar do professor, entendido como espaço de tensão de
interesses, assume papel importante no estabelecimento das relações entre gestão
e professorado. Um lugar de protagonismo do professor pode ir ao encontro de uma
concepção de uma política de gestão de pessoas, criando espaços para o debate e
a construção coletiva de soluções (geralmente não unânimes); ou ir de encontro à
concepção de gestão, remetendo ao professor o papel de executor,
preferencialmente acrítico. Retomo a metáfora de Antônio Nóvoa (1999, p. 7-10)
para o qual caberia, nestes contextos, o “lugar do morto”. Resta saber qual ou quais
os mecanismos de superação são mobilizados pelos professores.
!
:=?!
9.2.2. O PAPEL DEFINIDOR DE UM MODELO DE GESTÃO E O PROJETO
POLÍTICO PEDAGÓGICO DE FORMAÇÃO PERMANENTE
A formação permanente é o objeto central deste estudo e articula a análise e
constituição do quadro interpretativo. Antes, no entanto, de abordar os aspectos
específicos da formação e os sentidos a ela atribuídos, entendi como precedente a
compreensão do papel exercido pelos diferentes modelos políticos e pelas diferentes
concepções na gestão de pessoas e de propostas de formação profissional. Até
porque este relação foi expressa de forma recorrente, justificando-se como um dos
blocos temáticos a serem abordados, como esta que apresento:
[...] mudar o conceito, mudar o entendimento do professor em
relação ao seu trabalho na recreação pública, de forma a enxergar o
seu trabalho, de valorizar o seu trabalho, de torná-lo importante e
significativo na sua comunidade e na sociedade, passava por uma
discussão da sua própria condição profissional; como é que tu
modificas isto? Através de um trabalho pedagógico muito forte, muito
intencional e muito sistemático e sistematizado (GUILHERME,
entrevista março/2009, p. 7).
No entanto, o processo de formação implementada pelos dois grandes
blocos de administrações municipais (PT, de 1989 à 2004 e PDT, de 2005 até 2009)
parecem apresentar características bastante distintas, tanto na sistematicidade
quanto no papel dos professores na sua .
No tempo que estou aqui na SME, eu acho que isto se perdeu
um pouco, esta questão de formação do profissional em relação às
suas práticas. Acho que se perdeu um pouco porque... eu comentei
antes, que era um desafio da Gerência Pedagógica fazer isto,
entendendo que tendo esta diversidade de modalidades, de
manifestações, conseguir fazer um fio condutor e achar os pontos
comuns dentro da diversidade, isto é um desafio. E acho que, na
medida que em algum momento tem a troca de gestão... este tipo de
coisa... se perdeu um pouco isto, se perdeu bastante disto
(RONALDO, entrevista fevereiro/2009, p. 6).
Retomo o recorte temporal proposto inicialmente. Na análise do primeiro
período (1993-2004), diversos documentos e textos consultados
53
apontavam para
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
53
Documentos 2, 3, 4, 5, 6, 7 e 8 constantes no QUADRO 03, p. 75.
!
:=@!
diretrizes político-pedagógicas, para a matriz norteadora das ações institucionais,
com os desdobramentos na prática docente de seus professores e um conjunto de
propostas de formatação visando o processo de formação permanente de seus
recursos humanos. Esta intencionalidade propositiva de formação permanente
parece ter sido reconhecida pelos professores:
Eu nunca gostei das reuniões de 2
a
feira: o grupo anterior a
este, que eu falei no início, que eu não tinha afinidade política...
tinha uma reunião formativa que não era a formação que eu gostava:
mas pelo menos, eu respeitava. Porque a aquele pessoal tinha uma
linha de trabalho, que agora eu não vejo mais: eles tinham objetivos,
eles tinham uma cartilha que eles queriam que os professores
seguissem, na parte de objetivos que eu acho que era importante:
mesmo não concordando com um ou outro ponto, a Secretaria tinha
uma linha e hoje [referindo-se ao coletivo de gestão da SME pós
2005] não tem mais. Como eu falei: cada um faz conforme a sua
motivação (OTAVIO, entrevista fevereiro/2009, p. 5-6) [grifo meu].
Posições como a anterior, assumem um maior significado pela manifesta
não identificação político-partidária, ou seja, a identificação de que existia um projeto
definido, e que parece não ser mais identificado a partir de 2005, aspecto este
discutido no bloco temático anterior. Cabe analisar como se constituiu a estrutura, a
agenda e forma organizacional da proposta de formação permanente da SME ao
longo do tempo.
Um aspecto abordado anteriormente, parece merecer atenção sob a
perspectiva de análise da implicação política sobre formação pessoal: a disposição
institucional em criar condições para uma política de formação permanente como
elemento estratégico para a implementação das ações públicas, manifestado na
última fala de Guilherme (p. 136), do papel estratégico que a sistematicidade e
profundidade das pautas poderiam conferir ao fazer dos professores.
E traz também um elemento que considero central: coloca o professor no
centro do processo e sua experiência como desencadeadora de reflexão e
construção coletiva. Esta condição de centralidade do professor como razão do
processo de formação permanente e como autor coletivo, surge de forma
substantiva; avança dos textos dos autores que utilizei para discutir a questão do
protagonismo do professor e de sua experiência (NOVOA, 1999, 2007; NIETO,
2006; JOSSO, 2004; ARROYO, 2000) para a voz dos sujeitos em questão:
!
!
:=A!
[...] por isto, é fundamental este trabalho da instituição junto ao
seu corpo docente: que tipo de professor? Que tipo de profissional?
Como é que nós vamos trabalhar estas instancias de classificações?
Acho fundamental e é neste aspecto que eu acho que se perdeu
bastante, com relação a isto: à definição de uma linha mais clara de
atuação, de uma linha de atuação de governo, que tipo de trabalho
vai fazer? E neste aspecto: como é que este profissional que está
na ponta, o que se está dando de subsídio para ele? Como é que ele
vai tratar esta comunidade, de que forma se quer e que subsídios
são dados (RONALDO, entrevista fevereiro/2009, p. 6).
!
Ao encontro da idéia de importância de uma disposição institucional, a
obrigatoriedade da destinação obrigatória das segundas-feiras pela manhã para a
garantia de um tempo coletivo de formação, é referido como fator estratégico na
constituição de uma cultura de formação permanente. Esta relevância é referida
tanto na análise dos documentos normativos propostos pela gestão quanto pelo
professorado e remonta a um tempo anterior a própria criação da SME (ANEXO 04,
p. 263 DOCUMENTO INSTITUCIONAL SERP/SMED, 1989). Não identifiquei na
documentação disponível o registro que institui esta medida. No entanto, isto
configura-se como a realidade, tanto no depoimento dos colaboradores quanto pelo
meu, enquanto membro deste coletivo. A finalidade era exatamente possibilitar um
turno fixo comum a todo o professorado para as comunicações oficiais, de caráter
administrativo e ou pedagógico, conforme apresentado nos cadernos chamados
Diretrizes Pedagógicas, Administrativas e Programação (de 2000 até 2004).
Para dar elementos que ilustrem e facilitem a visualização de diferenças
este contexto construí o seguinte quadro:
!
QUADRO 09 – ESTRUTURA DA FORMAÇÃO DE PROFESSORES NA SME
RECORTE
TEMPORAL
DESTINAÇÃO DE
TURNO PARA
FORMAÇÃO
INSTÂNCIAS TEMÁTICAS DE
ORGANIZAÇÃO
54
PERIODICI-
DADE
DE 1993 À 2004
OBRIGATÓRIA: 2ª
FEIRA MANHÃ
GERAL
POR EQUIPE DE TRABALHO
POR ÁREA DE ATUAÇÃO
POR REGIÃO
SEMANAL,
alternando a
instância.
DE 2005 À 2009
NÃO OBRIGATÓRIA
55
GERAL
EPISÓDICA!
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
54
Faço um maior detalhamento no Quadro 08, na página 96.
55
Em março de 2009, na reunião de abertura, é comunicado aos professores sobre o retorno da
obrigatoriedade da disponibilidade do turno de 2
a
feira pela manhã para reuniões: dado o fato que
vários professores trabalham em outros espaços, ficou como indicativo para 2010.
!
:C;!
Alguns aspectos aparecem na matriz da proposta de tematização das
reuniões sistemáticas do professorado da SME, quando nos seus encontros às
segundas-feiras: não os aspectos administrativos ou pautas de caráter
transversal, mas as reuniões por Área de Atuação e por Região tinham por proposta
associar as discussões aos problemas cotidianos, em espaços que pretendiam fazer
dialogar gestores e os quadros que atuavam diretamente junto à população
(PMPA/SME, 2002, p. 1-7).
Para facilitar a análise da proposta e organização dos espaços e tempos
institucionais para formação que foi sendo construída ao longo do período 1989-
2004, torna-se oportuno revisitar o quadro 08 neste estudo (p. 97) que descreve as
instâncias de reunião e os elementos norteadores destas instâncias de formação.
Seminários internos, reuniões sistemáticas, foram constituídos para auxiliar
na reflexão sobre temas transversais da SME (papel do esporte, lazer e direito
social, inclusão social são alguns destes temas) e a constituição de dinâmicas que
possibilitassem a discussão das propostas. Alicia Fernandes, Jane Prates, Jaqueline
Moll, José Outeiral e Nelson Carvalho Marcellino são alguns dos intelectuais que
foram convidados a participar destes encontros.
Além da formação para o conjunto do professorado, um outro fórum,
denominado Reunião de RA’s
56
, foi constituído (4
a
feira à tarde), com periodicidade
semanal em alguns períodos e quinzenal em outros (não foi possível precisar estas
variações pela via documental, apenas pelos relatos de alguns dos professores-
colaboradores), no qual eram tratados temas de ordem administrativa, assim como
temas voltados à formação profissional e compartilhamento de experiências e
dificuldades. Como nos trouxe o depoimento do prof. Jairo:
[...] pelo menos nós tínhamos um aconchego quando
precisasse, assim, de um socorro: ‘olha, prof
a
. XXX, prof. YYY, eu
estou com um problema ali que eu não consigo resolver; quem sabe
tu vens me ajudar?’ Então, tínhamos setores que nos respaldavam,
dentro da política que era implementada (JAIRO, entrevista
janeiro/2009, p. 5).
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
56
Responsáveis por Atividades, nominação dada aos professores investidos de responsabilidades de
gestão por programas, projetos, Unidades Recreativas (praças, parques, centros de comunidade) ou
modalidades esportivas.
!
:C:!
Este fórum, com professores que desempenhavam tarefas de coordenação
de professores, estagiários e funcionários, tinha um duplo sentido: estabelecer um
fluxo de encaminhamento das demandas políticas, pedagógicas e administrativas
dos setores para as atividades-fins (o atendimento da comunidade) e trazia do
contato com a comunidade as demandas e tensões a serem analisadas e
encaminhadas pelos setores e pelo coletivo de gestão. Ao analisar a construção
histórica deste fórum, parece ocorrer um crescimento em importância e abrangência
ao menos no seu caráter simbólico na medida em que amplia-se e diversifica-se
o trabalho da SME. Como refere Suzana:
[...] esta diversidade, ao mesmo tempo que ela é rica, que ela
vem a atender estes dois veios de necessidades, quer dizer da
população e do professor ela, ao mesmo tempo, faz com que as
pessoas que estejam na administração e na condução deste
processo tenham que “rebolar” para constituir um “corpo docente”,
porque um corpo docente é mais fácil de ser levado quando são 3, 4
ações, todo mundo sabe disto, “vamos dividir isto aqui...”: quando
começa a abrir, começa a complicar controle, coordenação...
inclusive resposta teórica para tudo isto (SUZANA, entrevista
fevereiro/2009, p. 10).
Este modelo até agora apresentado, constituído por estas condições de
tempo, entendimento de pautas e envolvimentos dos professores não foi acolhido de
forma unânime nem atendeu de forma homogênea e interessante a pluralidade dos
professores, seus interesses e a diversidade de suas práticas, como já manifesto em
extratos apresentados anteriormente. Mas parece ser entendido como pelos
professores pela definição de um marco referencial e por apresentar uma
intencionalidade propositiva, como diz Guilherme:
[...] há 16 anos atrás, quando nós estivemos na gestão da
Secretaria, nós tínhamos isto como algo muito importante,
fundamental, e sem ele não se avançaria. Que eram reuniões de
trabalho, reuniões pedagógicas, discussões, reflexões, seminários,
encontros... as vezes, alguns achavam demais... mas se tu
considerares o hoje, eles acham de menos... então, se fosse demais,
as pessoas hoje não achariam que é ‘de menos’ [riso]...
(GUILHERME, entrevista março/2009, p. 7) [grifo meu].
Segue um quadro de textos de alguns dos palestrantes convidados a
colaborar com o processo de formação profissional do professorado da SME:
!
:CB!
QUADRO 10 DEMONSTRATIVO DE TEXTOS UTILIZADOS PARA SUBSIDIAR
O TRABALHO DE FORMAÇÃO PERMANENTE
PERÍO-
DO
TITULO
AUTOR
ANO
INSTANCIA DE
FORMAÇÃO
De 1993
à 2004
Educar pelo e para o Lazer
Lazer e Educação Popular
Considerações sobre o ato
de Estudar
A TV e a erotização precoce
Cidade, democracia e
educação: desafios e novos
itinerários
Educação Moral e Exercício
Democrático
A Educação de um corpo
eticamente cultural
A Contradição Exclusão-
Inclusão Social
A SME e o Movimento de
Regionalização
Adolescência: modernidade
e pós-modernidade
Leila Mirtes Santos
Fernando
Mascarenhas
Paulo Freire
Sonia Thorstensen
Jaqueline Moll
Barbara Freitag
Sandra Mara Coraza
Jane Cruz Prates
SMEPOA Gerência
Pedagógica e
Assessoria
Comunitária
José Outeiral
2003
2003
2003
s/reg.
s/reg.
1999
1999
2001
2002
2002
Reunião Geral
Reunião Geral
Reunião Geral
Reunião Geral
Reunião Geral
Reunião Equipe
Reunião Geral
Reunião Geral
Reunião Geral/
Reunião
p/Região
Reunião Geral
De 2005
à 2009
_
_
_
_
CONSTRUÍDO COM O ACERVO DO PESQUISADOR E CONTRIBUIÇÕES DE COLABORADORES.
O 2
o
ponto de corte temporal, de 2005 até 2009, decorre novamente do
material empírico oriundo do campo - identifiquei uma modificação que parece ser
significativa na agenda de formação até então efetivada na SME, como a supressão
de um calendário sistemático de reuniões, ficando restrita a duas reuniões anuais,
de caráter geral, de viés administrativo e informativo, o mesmo repetindo-se em
2006 e 2007. Em 2008, na reunião de abertura (na qual eu estava na condição de
observador participante), foi anunciada uma retomada de uma agenda de reuniões,
bem como a destinação do turno de 2
a
feira, pela manhã para este fim. Visto que o
!
:C=!
ano letivo tinha iniciado, e muitos dos professores da SME trabalham em outras
instituições de ensino, a adoção da sistematicidade da 2
a
feira reduz-se a um
indicativo de agenda.
Neste sentido, os registros do diário de campo, no que se refere a
observações de três reuniões gerais, um seminário geral e duas reuniões de
formação direcionadas para os professores que iriam atuar na temporada de verão
nas piscinas dos Centros de Comunidade, isto ao longo de 2008 e início de 2009,
trazem indicações sobre pautas eminentemente administrativas, sem uma estrutura
preparada para criar situações de diálogo com o professorado ali presente.
Em outras situações de observação, em que foram abertos espaços para
perguntas, o silêncio e a alguns comentários entre os colegas, permitiam perceber
uma atmosfera de constrangimento e ou descrédito com a abertura de participação.
Segue um extrato do diário de campo, quando da observação de uma reunião sobre
o Portal de Gestão, ferramenta implementada a partir de 2005 nos diversos setores
da administração municipal:
!
‘Daqui a pouco o tempo termina e a verba se extingue...’ [um
colega fala em tom baixo, mas para ser ouvido: ‘é, o portal é para a
gente ver... tu olhas e pronto...’ risos ao seu redor]. [...] Um colega
questiona o fato de estar sob a responsabilidade dos coordenadores
e o pouco envolvimento dos professores “na ponta” [referência aos
professores atuando nas atividades-fins] (DIÁRIO DE CAMPO,
observação outubro/2008).
!
Não da observação participante mas também da análise das vozes
surgem elementos para interpretação de uma ruptura de projeto institucional no que
se refere a formação permanente do professorado:
[...] anteriormente, o Partido dos Trabalhadores, o PT, a gente
notava que tinha, assim, um olhar mais carinhoso para o trabalho
sistemático, dos grupos; tinha reunião todas as 2
a
feiras: ali a gente
conversava, debatia ... tentava trazer problemas, .... todo mundo
falava um pouco dos seus problemas, tentava buscar soluções; eu
acho que tinha um lado mais pedagógico, assim... e nos últimos ...
nos primeiros 3 anos [pós 2005], eu acho que a coisa ficou meio
distorcida, meio que se perdeu... (ELTON, entrevista janeiro/2009, p.
7).
!
:CC!
O que parece emergir de forma importante é que as estratégias e
procedimentos de formação profissional parecem ter gerado efeitos diferenciados no
professorado da SME, ao longo do tempo. Suas aprendizagens ao longo de suas
trajetórias, suas experiências na SME e fora dela, sugerem o estabelecimento de
diálogos singulares com as diretrizes político-pedagógicas, construindo
manifestações também singulares na sua prática docente.
Outro achado que decorre da análise das contribuições dos colaboradores é
a associação direta entre as propostas político-pedagógicas e seus respectivos
partidos políticos: mesmo daqueles colaboradores que explicitamente colocam-se
como não-petistas e, em um dos casos, como anti-petista, ocorre a clara vinculação
de uma concepção de formação permanente com a matriz partidária da Frente
Popular, coordenada pelo PT; e da mesma forma, aparece vinculado ao PDT
(partido à frente da SME, dentro do coletivo no governo municipal de 2005 à 2009),
o movimento de desarticulação e desinvestimento político-pedagógico de formação
deste professorado.
Dito isto, busco trazer para discussão o que um conjunto de elementos
parecem apontar: que a transição político-partidária inerente ao desfecho
democrático eleitoral acabaram por produzir efeitos de descontinuidade no processo
de formação permanente, não somente por uma modificação de agenda mas pela
aparente desconstituição de momentos de compartilhamento de experiências,
dúvidas ou superações de desafios, ou simplesmente de exercício de uma
solidariedade profissional. Estes espaços de comunicação, longe de encerrar em si
as possibilidades de formação e capacitação, são apontados por Esteve (1999)
como de fundamental importância:
A comunicação é o veículo de auto-realização do professor:
partilhando os seus problemas, para não os acumular; analisando
em grupo as tendências mais significativas da mudança social;
expressando as suas dificuldades e limitações, para trocar
experiências, idéias e conselhos com os colegas e com outros
agentes da comunidade [...] A formação permanente deve construir-
se a partir de uma rede de comunicação (ESTEVE, 1999, p. 119).
A articulação a que me propus pretendeu colocar em debate as implicações
de rupturas e ou descontinuidades de uma política de formação permanente sobre o
professorado; pretendi também abordar as expectativas deste coletivo sobre o papel
!
:CD!
da instituição como promotora, como a principal interessada pelo constante
aperfeiçoamento de seus professores, como indica Suzana:
E me sustentaria muito mais, com muito mais qualidade uma
administração que pensasse tudo isto, que acreditasse em tudo isto
e que tivesse conseguido manter um corpo de Secretaria, que eu
acho que isto nós estamos perdendo... (SUZANA, entrevista
fevereiro/2009, p. 14).
Como última reflexão sobre o papel que as dimensões da política assumem
nas vidas do professorado, entendo oportuno o alerta provocativo de Miguel Arroyo,
num breve historiar sobre os meandros entre lutas e conquistas dos educadores:
Lembro de tempos tão próximos em que a mudança de prefeito
ou governador podia significar a mudança do quadro do magistério.
Os apadrinhados e apadrinhadas ocupavam as salas de aula, as
diretorias e os cargos de confiança. [...] Esta visão não está distante.
A categoria teve de lutar para acabar [
?
] com a escolha pelos
políticos de afilhados e afilhadas para diretores(as) das escolas.
Ainda permanece esse costume em tantas redes municipais e
estaduais, como ainda cada administrador escolhe secretário ou
secretária de educação entendendo ou sem entender de educação.
A educação encarada como terra vadia, lote vago (que todos
sabemos para que serve) (ARROYO, 2000, p.189) [grifo meu].
Alerta por dizer do que foi e que as falas e a observação dão conta de
que ainda o é e provocativo, por colocar na tomada de consciência e na
possibilidade de um exercício crítico-reflexivo do coletivo de professores as
perspectivas de mudança de sua própria construção histórica.
9.3. OS MÚLTIPLOS ELEMENTOS DA FORMAÇÃO PERMANENTE
A última categoria e tema central deste estudo, refere-se a formação
permanente. Alguns dos aspectos que permeiam e são permeados por ela foram
abordados: refiro-me às peculiaridades da docência na SME, objeto de discussão na
primeira parte deste capítulo; e as formas como as dimensões da política
estabelecem interfaces em duplo sentido sobre a docência e sobre a formação
permanente, tema do bloco anterior.
!
:C>!
Assim também, passo a pautar as análises pela perspectiva da formação
permanente: os lugares da prática e os lugares do sujeito no processo da construção
da formação permanente. No que se refere a prática, procurei compreender como as
experiências do mundo do trabalho, os saberes, conhecimentos, competências e as
interações humanas operam de forma dialógica e retornam reconstruídas,
ressignificadas para a prática do professorado. Sobre os lugares do sujeito, busco
identificar quais as posições que o professor assume no seu processo de formação,
ou dito de outro modo, de auto-formação.
Tratar da formação permanente sob estes dois enfoques significa
estabelecer diálogos com as histórias de vida, formação inicial, experiências do
mundo do trabalho e, por outro lado, como este professor coloca-se frente ao que
faz, que valor atribui e como dispõe-se a aprender, e que lugar atribui a si mesmo na
produção de saberes e competências.
Questões que afloraram e que me instigaram na busca de compreensão do
papel e do impacto associado à formação permanente articulam-se às
peculiaridades de espaço e tempo do trabalho na SME. Espaço porque, ao contrário
da escola, na qual existe a proximidade física, local, entre os pares de trabalho na
singularidade do seu espaço de convivência, os professores da SME encontram-se
disperso nos diversos equipamentos que compõe a Secretaria de Esportes; alguns
estão em ginásios, parques, centros de comunidade onde constituem equipes de
trabalho, com quem podem compartir experiências. Mas e aqueles que trabalham
sozinhos em alguns destes espaços? Entra aqui uma variável associada ao tempo.
Pois pela peculiaridade da alocação dos seus horários que não necessariamente
atendem ao formalismo dos horários escolares estão sujeitos ao enfrentamento
dos desafios e conflitos da docência, sem a possibilidade presencial da interação, da
busca de apoio com seus pares profissionais ou de um aparato institucional de
suporte pedagógico. Inquietações como esta surgem a partir de manifestações como
a que segue:
[...] uma outra questão, por exemplo: eu trabalho na praça
sozinha isto é uma coisa, para mim, uma coisa desmotivante
porque eu sou uma pessoa que rendo mais trabalhando com os
outros […]Então, isto é um fator desmotivante que é da forma…
que é da estrutura, é da forma como a gente trabalha, não é? [...]
hoje a gente não tem tido mais isto, a gente não tem conseguido
nem sentar para planejar um evento que se faz aqui num sábado,
!
:C?!
[…]Se tu fores pensar, as pessoas são uns meros executores, não
são elementos pensantes do seu próprio trabalho, não estão
refletindo nem pensando (ALICE, entrevista março/2009, p. 7).
Uma fala que estabelece, de certa forma, uma síntese de alguns aspectos
apresentados e que norteiam as discussões dos dois próximos blocos temáticos: o
isolamento no espaço de trabalho, a possibilidade da desmotivação, a mobilização
de competências pelo trabalho coletivo, a descontinuidade de uma estratégia de
produção, de planejamento coletivo, a proletarização da atividade docente, o
exercício reflexivo sobre a ausência de reflexão. Esta fala da Alice, como outras, são
contribuições que imprimem relevância à busca de compreensão do papel da
formação permanente na SME, e que parecem apresentar uma estreita relação com
prática deste professorado.
9.3.1. O PAPEL DA EXPERIÊNCIA NO PROCESSO DE FORMAÇÃO
PERMANENTE: CONHECER PARA PODER OPTAR, CONHECER
PARA CONSTRUIR NOVOS ESQUEMAS DE AÇÃO
A referência a um termo de sentido tão amplo quanto experiência para
associar-se à formação permanente enquanto processo (outra palavra que abriga
um sentido intencional à esta elaboração) tem este exato objetivo: a abrangência
que decorre de um entendimento de que a formação permanente dá-se na vida;
como tal, não é estanque, não é episódica, apesar de também alimentar-se deste
tipo de situação. Dá-se ao longo, por isto, é processo. Como processo, é, por
excelência, inacabada. Esta visão de trajeto, de inacabamento pode ser identificada
nesta contribuição:
[...] por isso que o estudo é fundamental! Por isso tem que
estudar, tem que ler, para descobrir caminhos, para depois, então...
porque mais adiante tu vais encontrar oportunidades: porque aquilo
ali eu li, eu passei por aquilo ali, eu vivenciei aquilo ali ... vou ter
condições, vou dar mais uma lida, vou dar mais uma estudada,
porque eu já vivenciei isto no passado (ELTON, janeiro/2009, p. 20).
Por isto, por este entendimento construído de formação permanente, por
dialogar com autores que entendem e sustentam seu o caráter processual, é que
atribuo forte significado às trajetórias de vida dos professores, alguns fragmentos
!
:C@!
apresentados ao discutir as motivações para prática docente na SME, tema da
primeira categoria central de análise. E estes fragmentos poderiam com certeza ser
reapresentados nesta última, pois a reflexão feita sobre as experiências vividas, as
situações que constituíram-se em insight’s, as relações estabelecidas com os outros,
tenham elas gerado identificações positivas ou negativas, o reconhecimento da
alteridade marcam o permanente e complexo processo de formação.
No âmbito das situações formais de aprendizagem escolares e não-
escolares o que somos hoje contém as experiências da escolarização básica, do
ensino médio (ou da denominação que tiveram a seu tempo) e da formação inicial.
Provavelmente, trazemos marcas de professores e saberes que permanecem, de
alguma forma, incorporadas ao nosso acervo de esquemas de ação, às
competências que desenvolvemos para responder aos nossos contextos de
docência contemporâneos.
A guisa de exemplo destas relações, apresento a fala de uma das
colaboradoras, que aborda como os estudos na formação inicial acabaram
influenciando sua opção de trabalho na SME como a materialização idealizada de
realização profissional:
Eu morava em Marte
57
e tinha conhecimento do trabalho que
era feito aqui em POA na SME, que era um trabalho que lá em Marte
não existia [...] e eu e outros colegas tínhamos como modelo este
trabalho, com um envolvimento inclusive de estudos durante a
faculdade, da importância de um trabalho deste tipo... então, a gente
meio que ficava ‘namorando’ aqui: “ah, que bom seria trabalhar em
POA, na SME...” (ALICE, entrevista março/2009, p. 1).
Sobre a formação inicial em EF e as peculiaridades da docência na SME,
cabe retomar alguns pontos, enfatizando novamente a forma singular como cada
sujeito incorpora saberes e os torna disponíveis enquanto competências. Tendo isto
em conta, o que alguns colabores ressaltam é que no decorrer de atividades ligadas
àqueles conteúdos que foram objeto da formação inicial, pelo aprendizado de suas
técnicas e especificidades didáticas, esta foi significativa e de certa forma sustentou
suas necessidades:
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
57
Nomes fantasia para cidades, associando-os aos planetas do Sistema Solar.
!
:CA!
Bom, a formação inicial, do ponto de vista técnico, de
conhecimento específico dos conteúdos acadêmicos, foi bem
trabalhado, acho que consegui aproveitar bem isto (GUILHERME,
entrevista março/2009, p. 3).
Logo a seguir, no entanto, o mesmo colaborador aponta para a
incompletude da formação inicial para responder a algumas das peculiaridades do
trabalho na SME ou até pelo desconhecimento da instituição como campo de
trabalho para professores de EF:
Agora, do ponto de vista da formação para o que eu faço hoje
eu nem sabia da existência do que eu faço hoje [...]Evidente, hoje
como professor trabalhando numa escolinha de iniciação esportiva
em qualquer modalidade, aprendi na faculdade: o processo
pedagógico, didático, método; e evidente, que a parte especifica a
gente vai aprendendo, vai se atualizando, vai buscando informações
(GUILHERME, entrevista março/2009, p.3) [grifo meu].
Este suporte à prática docente ligada à iniciação esportiva talvez se deva a
esportivização da EF e também dos cursos de EF, como mencionado
anteriormente e sustentado na produção sobre o tema de Valter Bracht (1992).
Historicamente os cursos de EF mantiveram estreita identidade com os conteúdos
relacionados ao esporte.
Em toda esta trajetória, é oportuno reconstruir uma experiência que vivi:
durante um significativo tempo algumas faculdades de EF (ou alguns professores
responsáveis pelas disciplinas de estágio obrigatório) não reconheciam a SME como
espaço para a prática do estágio supervisionado. Faço esta referência com base no
período em que trabalhei simultaneamente na rede privada de ensino e na SME (de
1990 à 2000). Nas diversas vezes em que recebi acadêmicos de EF e que propus a
destinação de algum tempo de estágio nesta outra realidade, tive como retorno:
“meu orientador não topou, disse que tem que ser em escola, EF formal”. Lembro
de, no contato direto com dois destes orientadores, ter exatamente a ratificação
desta argumentação. Quais são os papéis do estágio supervisionado, da prática de
ensino? Nesta negação, talvez resida um pouco do aspecto provocativo do sub-título
– conhecer para poder optar, conhecer para construir novos esquemas de ação.
A outra razão para este sub-título se pelos aspectos afirmativos
decorrentes dos relatos sobre a importância de um contato anterior com a
!
:D;!
instituição, fundamentalmente pelas experiências materializadas nas possibilidades
criadas com os estágios. Cabe destacar as duas alternativas de vivência do estágio
na SME. Uma pela via citada, prevista pelos currículos dos cursos de EF, não
remunerada. A outra é a de contratação: após estar inscrito junto a um cadastro
central na SMA, o candidato é chamado para uma entrevista, onde é analisada a
sua aproximação com as áreas que demandam pelo ingresso de estagiários. No
caso deste estudo, a via de ingresso não é um aspecto relevante; outrossim, a
possibilidade de experimentação das especificidades deste campo de atuação e de
incorporação de outras práticas, de outros códigos da EF são os aspectos
considerados relevantes, como refere Otavio:
A questão da especificidade, isto não deveria ser problema,
porque eu tinha sido estagiário da SME, tinha trabalhado com
grupos autônomos assim; neste ponto eu não deveria ter problemas
e não tive (OTAVIO, entrevista fevereiro/2009, p. 2).
Sobre o papel das experiências de estágio no processo de formação
permanente, de ampliação dos conteúdos, da incorporação de novos esquemas de
ação e de atribuição de novos sentidos à profissionalidade:
[...] na época, eu era acadêmico de EF e sempre gostei desta
parte de esporte, e por ser acadêmico de EF, fui estagiário de
atividades relacionadas à EF. Minha formação era no IPA, então eu
tinha o dia inteiro para exercer, que o IPA era à noite. O prof. XXX
havia sido meu professor quando eu era criança, ele era o
coordenador, deu um bom empurrão...eu gostava muito daquilo ali,
me propiciou algumas experiências muito interessantes nesta parte
da recreação, de trabalhar com crianças nesta faixa etária (LUCAS,
fevereiro/2009, p. 2).
Os elementos abordados até agora parecem afirmar uma forte associação
entre as experiências viabilizadas pelos diferentes tipos de estágio e a apropriação
de esquemas de ação que contribuíram para a opção pelo trabalho na SME, na
condição de professor. No que se refere especificamente ao papel da formação
inicial, o estudo identifica a importância da ampliação dos espaços reconhecidos – e
conveniados, quando for necessário – pelos cursos de EF, de forma a criar as
condições mais diversificadas possíveis, de forma a repercutir sobre a ampliação do
repertório de competências do estudante. Neste estudo, tive contato com
professores que referem-se unanimemente sobre o estágio como experiência que
!
:D:!
aproximou-os das características peculiares da docência na SME. Cabe ressaltar, no
entanto, que em muitos casos deu-se o oposto. Durante minha trajetória na gestão
de pessoas, estabeleci envolvimento direto com o processo de seleção e proposição
de situações de formação para os estagiários: não foram poucos os que não
identificaram-se com o universo das práticas na instituição. Seria importante saber
das estratégias que a formação inicial estabeleceu com estes acadêmicos, de forma
a “reduzir os efeitos negativos do mal-estar docente” (ESTEVE, 1999, p.117), de
constituir condições de discussão sobre os fatores que geraram os desajustamentos
e proposição de situações que permitam sua superação. Este autor destaca ainda a
que “a formação prática incluída no período de formação inicial deveria permitir ao
futuro professor” a identificação de suas características de personalidade e estilo de
ensino, de refletir sobre os principais problemas referentes ao espaço, à organização
e às dificuldades da atividade docente propriamente dita, e o desenvolvimento de
capacidades, de condições de resolução das dificuldades por ele identificadas
(ESTEVE, 1999, 119).
Aliado ao papel da formação inicial e às oriundas da infância e da
adolescência, abordadas anteriormente, passo a discussão da dimensão do
aprender com – o papel que o compartilhamento de sucessos e fracassos, da
possibilidade de estabelecer processos de comunicação constitui como uma
estratégia significativa de formação permanente, de estabelecimento de co-
responsabilidades. Recorro a uma contribuição de Molina Neto e Molina (2005)
sobre o papel do compartilhamento das experiências vividas, da elaboração de
relatos, que constituem-se em importantes reelaborações de contextos históricos e
da cultura vivida:
Produzir narrativas de nossas experiências nos faz viver um
processo profundamente pedagógico, no qual a nossa condição
existencial é o ponto de partida para a construção de nosso
desempenho futuro. É através do exercício da narrativa que
podemos identificar, organizar e nomear os significados que
atribuímos a inúmeros fatos que vivemos, mediante os quais
podemos reconstruir as diversas compreensões que temos sobre
nós mesmos (MOLINA NETO; MOLINA, 2005, p. 35).
Este é um dos sentidos fortemente atribuído pelos colaboradores ao papel
da formação permanente, o de constituição de tempos e espaços para a troca, para
!
:DB!
a comunicação de experiências sejam de êxitos ou de dificuldades de
possibilidade de reflexão compartilhada sobre sua profissionalidade:
[...] e aquele eu considero o meu grande fracasso pedagógico,
o primeiro grande fracasso pedagógico na SME. [...] e muito, muito
importante também, é ter uma relação de grupo que trabalhe em
outros locais e que tenham experiências que possam contribuir para
que a gente se encontre (SUZANA, entrevista fevereiro/2009, p. 2-3).
Assim como na fala de Guilherme:
[...] então, dizer hoje que eu sou uma pessoa muito
identificada, engajada pedagógica e politicamente com a recreação
pública, no esporte e lazer de caráter social, algo que eu fui
construindo gradativamente, inclusive com os colegas dentro do
trabalho, e não algo que tenha surgido [referindo-se à formação
inicial] (GUILHERME, entrevista março/2009, p. 3) [grifo meu].
Este sentido de formação atribui, não aos conteúdos, aos textos ou às
dinâmicas, mas aos sujeitos um papel distintivo no exercício crítico-reflexivo
proposto por Giroux (1997, p. 157-173), exercício este de dignificação da
capacidade de imbricar “pensamento e prática”. E esta reflexão compartilhada atribui
ao outro, ao colega, a busca de pertencimento a um coletivo. O reconhecimento de
si no outro, na alteridade, parece assumir profunda relevância na construção de
sentidos coletivos para a prática docente. Mais que isto, parece constituir elementos
expressivos de identidade na docência:
!
Eu acredito muito no diálogo, na reflexão, como algo que faz
com que as pessoas... momentos como este que nós estamos tendo
aqui, agora... estas coisas fazem as pessoas pensarem, refletirem
sobre as suas práticas, retroagirem um pouco e pensarem a frente
também... ao menos, eu tenho esta visão das coisas: quando nós
dialogamos, pensamos também na frente... (GUILHERME,
entrevista março/2009, p. 7) [grifo meu].
Sobre o reconhecimento do papel do outro no processo de (auto)-formação,
cabe dar lugar à comunidade como este outro, esta dimensão comunitária do
trabalho que é identificada como um dos aspectos distintivos da docência na SME,
como segue neste fragmento:
!
:D=!
Uma outra coisa que eu não tinha muito e que eu aprendi, que
eu passei a enxergar mais aqui e claro que isto já acontecia lá em
Júpiter, entendia isto mas aqui ficou muito mais claro foram as
questões das relações comunitárias: isto aqui, na SME, na época do
ingresso, tinha um peso muito forte, aprendi muito isto na zona
YYY... o coordenador, com o prof. XXX: muito forte esta coisa do
trabalho comunitário, com as comunidades, de ir lá, de conversar, de
fazer reuniões, de chamar, de fazer a questão do horário da quadra,
a construção do horário da quadra, da responsabilização dos
parceiros, de entender os parceiros... então isto foi uma coisa que
aqui eu passei a ter um contato muito mais forte, eram um pouco
diferenciadas estas relações... e acho que isto é uma coisa
fundamental e penso que isto se perdeu um pouco, no decorrer
aí...[parece referir-se a mudança de projeto político] ou muito... aí,
esta avaliação eu deixo para...[risos, sugerindo que a análise
passasse para mim] os mais entendidos; mas eu acho que isto
também é um diferencial muito grande: na escola tem a questão dos
pais, dos alunos, da comunidade escolar... mas penso que ainda
está muito no discurso e pouco na prática; na praça, tu não tens
muito como sair se tu tiveres muito fortes estas relações
comunitárias, ainda mais hoje com o grau de violência, com o grau
de problemáticas que tu tens na rua de segurança, se não tiver uma
relação comunitária muito forte com os teus usuários, com os teus
vizinhos, é muito difícil trabalhar. Então, eu valorizei muito isto na
passagem no VVV, não no VVV: no PPP, com a profª. JJJ,
onde a gente vê esta função de estar junto com os usuários, de estar
conversando, de estar realmente construindo aquele espaço no dia-
a-dia e não como uma coisa do poderblico ou como uma coisa do
coordenador mas como uma coisa da comunidade, porque aí tu
passas a ser valorizado, aquilo ali passa a ser um motivo de toda a
comunidade se unir, reivindicar... então eu acho que isto é também
um diferencial forte (RONALDO, entrevista fevereiro/2009, p. 3-4)
[grifos meus].
Neste fragmento encontrei, além da afirmação do papel do saber da
comunidade, da busca de identificação de seus códigos e necessidades como forma
de aprendizagem para a prática, também a referência à perda, para uma certa
descontinuidade deste canal de comunicação. Esta identificação de descontinuidade
soma-se a outra, abordada sob o bloco temático das políticas, e refere-se a
supressão da destinação sistemática do tempo para formação (de 2005 à 2008).
Estas rupturas parecem ter assumido significativa importância tanto nos aspectos
objetivos da formação quanto aos saberes e às práticas, quanto a outros, mais
subjetivos, ligados à degradação de uma identidade coletiva e a uma diáspora dos
professores dentro da instituição, um movimento que aponta para o isolamento.
Como sugerem os seguintes fragmentos:
!
:DC!
Nós temos membros... se é que temos... acho que talvez
possam ter dois pés, duas cabeças, três braços... não sei se existe
‘um corpo’, no sentido de um corpo mais filosófico de todas as
partes estarem integradas e cada uma ter a sua função. Acho que
isto a gente perdeu um pouco (SUZANA, entrevista fevereiro/2009, p.
14).
A o identificação do eixo norteador, da matriz do projeto político
pedagógico pode criar um vazio no sentido atribuído para pensar a prática:
[...] pelo menos atualmente, dada a motivação das pessoas,
dado o momento político da Secretaria... eu não acredito muito mais
em grandes seminários, grandes encontros, todo mundo... eu não
acredito mais nisto... eu acredito nos pequenos encontros talvez
um dia se pudesse retomar os grandes encontros porque as
pessoas não estão mais motivadas a crescer ou a construir
coletivamente num grande grupo... então eu acredito neste encontros
menores; porque alguns grupos a gente ouve falar mantém uma
certa resistência e conseguem avançar... então, eu acho que isto faz
falta, esta reanimação, esta injeção: eu vejo hoje cada um no seu
canto... (GUILHERME, entrevista março/2009, p. 8).
Neste outro, além de materializar a formação na relação dialógica com o
aluno, aparecem fortes indicativos de um mal-estar docente (CAVACO, 1999, p.
168) e as implicações da formação permanente como elemento de apoio, como
alternativa de superação:
[...] eu tento...tento, na medida do possível, com as coisas que
eu estou fazendo, buscar novas formas... de motivar, inclusive as
alunas... para que eu possa, também, me sentir motivada... mas
acho que, em alguns momentos, eu meio que desisto [...] então
trazer uma pessoa que está estudando determinadas coisas podem
ser importantes para nós, para a nossa reflexão, sobre a nossa
prática, para que isto possa também refletir vou repetir no
trabalho que a gente faz no dia-a-dia. Então, isto hoje não está
acontecendo [...] mas ficam coisas muito soltas, não tem uma linha
de trabalho (ALICE, entrevista março/2009, p. 6).
Estas não são expressões isoladas, nem tampouco desprovidas de
produções sobre estas manifestações de sofrimento associado à docência. Como
sugere o texto de Nieto (2006):
A docência pode ser a mais solitária das profissões. Consiste
sobretudo em trabalhar com alunos a maior parte do tempo, e os
!
:DD!
docentes não podem estar em contato com seus colegas durante o
dia a menos que seja em encontros superficiais (NIETTO, 2006, p.
108).
Este reconhecimento da solidão da prática associada à falta de tempos e
espaços de compartilhamento com os pares, me fez retomar a entrevista de Alice,
quando esta colaboradora passa a referir-se ao que consideraria importante como
superação da sua condição de isolamento, de uma estratégia de (re)construção
identitária, de um sentir-se parte do coletivo:
Eu penso que é o que eu coloquei antes: esta questão da troca
com os colegas, de estar sentindo parte de um grupo, eu acho que é
mais ou menos por aí porque as vezes, até como uma coisa de
desmotivação com relação ao trabalho, é que assim… às vezes a
gente se sente… inútil, não é? eu não sou muitas vezes
acontece isto: “eu não sou uma pessoa necessária”; se eu não
estiver aqui, vai outra pessoa vir e fazer aquele trabalho que eu faria
então, eu não sou uma pessoa essencial, não que eu queira... tu
precisas te sentir amado, tu precisas te sentir necessário… num
grupo! (ALICE, entrevista março/2009, p. 8).
Estes depoimentos carregam consigo marcas distintas, que refletem suas
representações do trabalho na SME; e imprimem aos tempos e aos espaços de
formação permanente, minimamente, dois significados: na sua ausência, o
isolamento, a perda de referências, o sofrimento; na perspectiva de sua existência, a
possibilidade do reencontro e do reencantamento com a prática docente. A respeito
disto, Esteve (1999) traz a seguinte reflexão:
!
O isolamento é a característica comum mais importante dos
professores seriamente afetados pelo desajustamento provocado
pela mudança social. A formação permanente deve construir-se a
partir de uma rede de comunicação, que não deve se reduzir ao
âmbito dos conteúdos acadêmicos, incluindo também os problemas
metodológicos, pessoais e sociais que, continuamente, se
entrelaçam com as situações de ensino. A inovação educativa está
sempre ligada à existência de equipes de trabalho que abordam os
problemas em comum, refletindo sobre os sucessos e as
dificuldades, adaptando e melhorando as práticas de intervenção
(objetivos, métodos e conteúdos). O contato com os colegas é
fundamental para a transformação da atitude e do comportamento
profissional, nomeadamente com os grupos portadores de uma
perspectiva inovadora, cuja experiência permite visualizar ações e
realidades concretas (ESTEVE, 1999, p. 119-120).
!
!
:D>!
Os indícios emersos do campo dão conta de um mal-estar docente face a
um processo de isolamento e desamparo pedagógico para suas dificuldades e
dilemas podendo assumir dimensões que comprometam a pessoa, que é
indissociável do profissional. A pluralidade de suas experiências fazem-no reagir de
diferentes modos, em diferentes tempos da vida e sob diferentes contextos. Ainda
assim, parece pertinente o alerta presente no texto de Cavaco (1999) nos sugere:
A sequência mal-estar profissional/frustração/desânimo/
descrença/cepticismo/fechamento à mudança e às possibilidades de
inovação pode tornar-se um ciclo vicioso a justificar a alienação e um
progressivo desinvestimento (CAVACO, 1999, p. 168).
Busquei apontar o papel central que a formação permanente ocupa em
dimensões diversas para o professorado da SME para além das questões de
produção e compartilhamento dos saberes peculiares que sustentam suas práticas –
o processo interpretativo de observações e depoimentos indica para outros e mais
abrangentes papéis: de construção de identidades, de estabelecimento de redes de
apoio e laços de pertencimento coletivo.
Indica também, da importância de um olhar aprofundado sobre um projeto
político-pedagógico para a SME: parece oportuno entender a formação permanente,
enquanto responsabilidade institucional, de (re)alimentar, de ressignificar a formação
inicial; daí as reiteradas manifestações dos colaboradores a apontar para a
necessidade de reinvestimento sobre uma proposta de formação permanente para a
SME; reinvestimento este, que supõe discussões sobre modelo de gestão de
pessoas e sobre a proposta político-pedagógica. Discussão que parece passar pela
mobilização dos diferentes atores, para que possam expor o que exista de
convergente e de contraditório.
9.3.2. OS LUGARES DO PROFESSOR DA SME NO SEU PROCESSO DE
FORMAÇÃO PERMANENTE
Neste último bloco temático, apresento a discussão que entendo ser central
para pensar o papel da formação permanente: situar os lugares que o professor
ocupa no processo de formação central. As expressão posta no plural para “lugares”
apóia-se numa mesma linha de entendimento, ou seja, em situações complexas
!
:D?!
como as relacionadas ao trabalho, a educação, a cultura do movimento humano e a
formação profissional poucas são as possibilidades para homogeneizações.
Tendo em vista que estes temas já vem se entrecruzando ao longo do
estudo, me permiti reapresentar alguns fragmentos, na perspectiva de dar
visibilidade a outro enfoque que não o que motivou sua utilização originalmente.
Pensar nos lugares do professor em relação a sua formação permanente,
significa pensar nos lugares que a instituição pretende colocá-lo (discussão que
pretendi levar a contento anteriormente) mas também os lugares que ele identifica
para si. Ou seja, sem deixar de levar em consideração os aspectos contingenciais
de âmbito político e que pretendem definir um determinado lugar a ser atribuído ao
professor, correspondem respostas não lineares, heterogêneas e por vezes
contraditórias dos próprios professores. Podem retornar para a instituição sob forma
de identificação e comprometimento com o processo, ou como tensão entre
professores e coletivo de gestão. E mesmo isto, comprometimento e tensão, não se
apresentam como um todo articulado, como coletivo coeso e homogêneo. Nos dois
recortes temporais empregados para a análise, com modelos de formação e
concepções sobre o papel e o lugar do professor no processo, a apropriação de
sentido deu-se de forma heterogênea. Procuro apresentar os fragmentos que
aludem situações de dificuldade, na busca de uma melhor compreensão dos seus
possíveis determinantes. Suzana refere-se a estas tensões no primeiro período:
Naquele momento, as reuniões da SERP eram muito
tumultuadas: a gente não tinha muitas condições de trabalhar estas
coisas assim, do fracasso, assim mesmo... eu estava recém
chegando, era um movimento político muito forte no sentido de grupo
que assumia o poder e grupo que estava no poder; então, as
reuniões, na verdade, elas aconteciam no título do pedagógico mas
elas na verdade... elas encobriam... acho que nem chegava a
encobrir mas... estavam na realidade recheadas de uma disputa de
poder de: grupos que estavam no poder anteriormente e de grupos
que estavam assumindo o poder agora (SUZANA, entrevista
fevereiro/2009, p. 3).
Sobre os movimentos que apresentam-se no segundo período, apresento
dois extratos da contribuição de Guilherme:
!
:D@!
[...] então eu acredito neste encontros menores; porque alguns
grupos a gente ouve falar mantém uma certa resistência e
conseguem avançar... (GUILHERME, entrevista março/2009, p. 8).
Como também:
[...] as vezes, alguns achavam demais... mas se tu
considerares o hoje, eles acham de menos... então, se fosse demais,
as pessoas hoje não achariam que é ‘de menos’ (GUILHERME,
entrevista março/2009, p. 7).
Sobre estas respostas do professorado, sobre as distintas formas de
manifestar alguma ordem de descontentamento, podem ser considerados dois
aspectos: primeiro, que as contingências diversas provocam respostas diversas no
mesmo sujeito e que, apesar de uma proximidade de saberes e de práticas, não
existe unanimidade. O que pode advir como reflexão para pensar a formação
permanente, é que longe de uma idéia de caos ou do democratismo discursivo,
formato e pauta, saberes e estratégias deveriam ser pensados enquanto produção
coletiva gestores de políticas e de pessoas e o professorado. Longe de procurar
unanimidades, os professores parecem esperar pela construção de consensos.
[...] não é a uma reflexão ou... é uma constatação: eu não sei
se é uma crise de identidade mas existe, sim e isto é uma
afirmação é que hoje não há uma unidade (GUILHERME,
entrevista março/2009, p. 8).
Segundo, e intimamente ligado com a primeira reflexão, duas formas
distintas de manifestação de descontentamento aparecem nas falas, sobre dois
momentos distintos: o debate acalorado, “tumultuado” na fala de Suzana, eram
expressões das divergências do primeiro recorte temporal (1993-2004); sobre o
segundo (2005-2009), Guilherme refere-se à resistência, como a dar conta de
estratégia de sobrevivência, de dificuldade de divergir num espaço coletivo. Sugere,
para além da divergência sobre forma ou conteúdo, que subjazem aspectos ocultos,
que o lugar da discordância e da disputa não pertence também ao contexto da
formação permanente.
A orientação dada em março de 2005, extinguindo a destinação exclusiva do
turno para formação e direcionava-o para formação e atendimento de grupos de
!
:DA!
alunos, não gerou a aceitação generalizada no grupo de professores. Embora a
grande maioria tenha acatado esta norma, no reconhecimento de uma outra
orientação de gestão e entendimento de formação, outros propuseram pautas
internas aos seus micro-coletivos de trabalho, buscaram nos elementos de
organização e planejamento de suas ações locais, a justificativa para manterem a
sistematicidade de reuniões. Uma situação de ruptura, que assumia significados
distintos, e portanto, fazia mobilizar respostas distintas. A insubordinação pode ser
entendida neste contexto também como uma forma de “agir na urgência, decidir na
incerteza” (PERRENOUD, 2001), pode assumir um estatuto de “estratégia de
sobrevivência”.
Desde então, diversas manifestações descentralizadas mas não
desarticuladas, tensionavam o grupo gestor da SME por algumas definições sobre a
“linha pedagógica da Secretaria” e alguma definição sobre como se daria o processo
de planejamento, qual seria o modelo de formação a vigorar a partir de então. Afinal,
havia se constituído uma “cultura de formação permanente”, cultura esta marcada
pela formação na ação, e identificada por muitos como estratégia de formação
solidária.
No início de 2007, na primeira reunião do ano, terceira reunião geral neste
2
o
recorte temporal (2005-2009), é distribuído o texto Referenciais Político e
Pedagógico da Secretaria Municipal de Esportes Recreação e Lazer (ANEXO 05, p.
267), com três páginas, anunciadas desta forma por um dirigente do grupo gestor:
“em resposta ao pedido dos professores, estamos entregando este texto”
(reconstituição a partir de memórias minhas e de colaboradores). Ao final de 2006, o
então Gerente Pedagógico é afastado do cargo e o então Gerente Administrativo
passa a acumular as responsabilidades pelos dois setores. O objeto desta análise
não reside sobre o gestor mas sobre a visão do coletivo gestor sobre o significado
de um setor dedicado a tratar das questões de acompanhamento e formação
pedagógica.
No entanto, várias manifestações de professores e Responsáveis por
Atividades (com atribuições de coordenação de espaços ou projetos), nos eventuais
espaços coletivos, reiteravam dúvidas sobre uma matriz de formação ou sobre
pautas fortemente marcadas pelo conteúdo administrativo e ou instrumental. Cabe
ressaltar que os descontentamentos não se davam no decorrer das atividades mas
sim nos corredores, nas situações de troca informal entre os pares, numa
!
:>;!
necessidade de cumplicidade, evitando no entanto situações de confronto. Na
observação da reunião geral ocorrida em 25 de maio de 2009, foram vários os
registros da dispersão do grupo, de conversas paralelas e das críticas ao tema, sem
no entanto serem levadas ao grande grupo.
Novamente, pergunta se foi muito rápido e novamente ouço
murmuradas as brincadeiras de “não, que bom que foi rápido...”
[...] ouço dois colegas... “que porre!” ou “ah, que man
perdida... preferia estar dando aula...” Após uns 20 minutos, ouvimos
colegas que ficaram no saguão próximo ao espaço de reunião
chamavam para retornarmos ao salão. No caminho de volta, alguns
comentários soltos: “...vamos lá...” ou “...parte dois: como custa a
passar, meu Deus...”
[...] o trabalho do professor da SME quando traduzido pelas
cifras do portal reduz nossa ação à centavos por cidadão e refere
sua angústia como servidora que não se [nesta frase, aumenta
significativamente o burburinho na sala, um colega esboça bater
palmas...mas não encontra eco...] (RELATÓRIO DE OBSERVAÇÃO,
maio/2009).
A observação de um aparente descompromisso do professorado com as
pautas apresentadas parece reforçar a reflexão feita por Guilherme, apresentada
anteriormente, mas que suponho oportuna neste outro contexto:
[...] pelo menos atualmente, dada a motivação das pessoas,
dado o momento político da Secretaria... eu não acredito muito mais
em grandes seminários, grandes encontros, todo mundo... [...] talvez
um dia se pudesse retomar os grandes encontros porque as
pessoas não estão mais motivadas a crescer ou a construir
coletivamente num grande grupo... [...] então, eu acho que isto faz
falta, esta reanimação, esta injeção: eu vejo hoje cada um no seu
canto... (GUILHERME, entrevista março/2009, p. 8).
Na reunião inicial de 2009, foram apresentadas modificações pelo grupo
gestor que assume seu segundo mandato à frente da SME com anúncios que
provocaram algumas repercussões no professorado: volta a haver uma Gerência
Pedagógica, como um setor específico e uma das primeiras medidas anunciadas é o
retorno da destinação das segundas-feiras pela manhã para reuniões de formação.
Um dos comentários imediatos de alguns colegas próximos a mim foi: “Olha as
novidades! Estamos voltando tudo ao que era!!! [risos] (DIÁRIO DE CAMPO, março
/2009).
!
:>:!
E o que depreender deste contexto? O que esperam os professores? Como
vêem a situação do seu trabalho na SME?
Definições e protagonismo. Ao longo do estudo, as manifestações dos
diversos colaboradores procuravam expressar, de formas singulares, repletas de
certezas e dúvidas, de eloquências e faltas do que dizer; relatos de imobilidades,
demonstrações de “apesar destas coisas [política] o nosso trabalho é show, Ismael”.
O fragmento a seguir expressa um pouco disto, da busca de definições, de vontade
de produzir sentidos para o trabalho da SME; e uma sugestão de modelo de
formação para a instituição:
Que perfil tem este profissional? Onde é que está acontecendo
efetivamente com sucesso? Acho que este tipo de coisa... porque o
nosso ‘case’, o nosso MBA’ [fazendo alusão à dois termos do campo
do marketing e negócios, sugerindo uma reflexão sobre a ação], a
gente não está nas empresas, a gente está nas comunidades, então
quem tem que nos dar retorno é a comunidade... então, o ‘nosso
case de sucesso’ é ... bom, qual é o nosso ‘case de sucesso’? É o
Parque Alim Pedro? É o Ararigbóia [Parque]? Bom, vamos estudar
estes ‘cases’ (RONALDO, entrevista fevereiro/2009, p. 8).
Um modelo de formação que reflexiona a ação, uma proposta que possibilite
compartilhar experiências. Com os outros professores. Quem está propondo é um
professor. Ele propõe uma dinâmica de pesquisa como base para a docência. Quer
pesquisar sobre o perfil, sobre as competências necessárias para a docência na
SME.
Definições e protagonismo.
!
:>B!
10. CONSIDERAÇÕES TRANSITÓRIAS
Neste último capítulo, em que pretendo trazer as reflexões finais – digo finais
para esta etapa deste estudo mas absolutamente transitórias, dada a
complexidade da docência na SME e das relações da formação permanente com
esta docência, procuro ressaltar meu compromisso em contribuir com a produção de
conhecimento sobre formação permanente e sobre o fazer pedagógico num espaço
não-escolar como a SME.
Na busca de diálogo com a literatura sobre a materialidade de uma ação
educativa em educação física, considerando a diversidade de conteúdos e
manifestações do movimento humano que se efetivam na SME, não encontrei fontes
que pudessem dar conta das peculiaridades deste universo educativo. A maior
proximidade dá-se nos diversos escritos sobre projetos de lazer e suas
possibilidades educativas, ou os relatos de ONG´s que desenvolvem diversas ações
que fazem dialogar esporte e cultura, educação e cidadania. No entanto, as
possibilidades que uma instituição pública como a SME, com sua histórica trajetória
na recreação pública brasileira, de construir sentidos inovadores para o esporte e o
lazer, são instigantes. É pensar como estes professores de educação física, nas
suas ações sistemáticas, de caráter intencionalmente educativo nos campos do
esporte, da recreação, de práticas multiculturais como a capoeira, a dança, a ioga,
entre tantas apresentadas ao longo deste estudo, podem elaborar propostas de
ação a partir destas ricas experiências. A compreensão das singularidades de suas
práticas poderia constituir-se de grande importância na reflexão, organização e
proposição de uma pedagogia não-escolar para a Educação Física.
Por outro lado, a expectativa deste estudo de melhor compreender as
relações existentes entre a formação permanente e prática pedagógica, à partir da
perspectiva do professorado da SMEPOA, possibilitou uma riqueza de
interpretações das rotinas, das caminhadas, das decisões e tensões que se
mostram significativas para estes professores.
Primeiramente, que as peculiaridades do espaço não-escolar podem,
contraditoriamente, constituírem-se em fatores de liberdade, criatividade e realização
do professor, como podem tornar-se determinantes para o seu isolamento e para o
não estabelecimento de vínculos e motivações para o trabalho.
!
:>=!
Decorrente destas peculiaridades do trabalho nestes espaços não-
escolares, o estudo sugere que a formação inicial deva estar sintonizada com o
estudo e a experimentação de pedagogias e práticas que dêem conta destas outras
dimensões do mundo do trabalho da educação física. Principalmente, quando se
leva em consideração o presente cenário da formação inicial, que limita a atuação
do licenciado em EF ao espaço escolar e delega ao bacharel (profissional) de EF a
atuação naqueles outros espaços que excedem a escola, tais como a SME.
A partir desta reflexão decorre uma possibilidade de problematização,
levando em consideração o momento em que se este estudo: como dito no
parágrafo anterior, a SME pertence atualmente ao campo de atuação dos egressos
dos cursos de Bacharelado em EF. O Edital do último Concurso Público para
ingresso na SME restringiu aos egressos de cursos de Licenciatura Plena
58
(extinto).
Somado a esta aparente contradição de aspecto legal, o estudo aponta para um
atuação marcada pela intervenção pedagógica, de efetiva docência; dito de outro
modo, o professorado da SME atribui grande significado ao caráter educativo,
pedagógico em suas práticas cotidianas. Ou seja, está configurada pelo coletivo
uma identidade eminentemente docente. Então, cabe a um profissional/bacharel a
ocupação do espaço de trabalho da SME, identificado com práticas pedagógicas
no entanto, não encontrei elementos nos textos
59
que referenciam os cursos de
bacharelado em EF que vinculem implicitamente disciplinas de formação
pedagógica.
O conjunto de achados oriundo do campo empírico e do processo
interpretativo permitiu identificar que o professorado reivindica tempos e espaços de
formação compreendidos numa perspectiva de direito e necessidade. O papel que
estes sujeitos atribuem ao seu processo de formação profissional parece assumir
um lugar central na possibilidade de realização e de construção de sua identidade
coletiva. O estudo sugere também uma forte relação entre a proposta institucional
de formação permanente e a possibilidade de superação das dificuldades
anteriormente mencionadas, tais como isolamento e desmotivação.
O estudo faz emergir a importância de trazer o professor para a posição de
sujeito na construção de uma proposta de formação permanente: para além de uma
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
58
Item 1.5, Bloco 2, Item 6. do Edital de Retificação 163/08 D.O.P.A. 3418, de 10 de dezembro de
2008.
59
Textos descritos no Quadro
!
:>C!
eleição de conteúdos aonde provavelmente jamais seria produzido consenso dada
a própria diversidade de práticas – a preservação de tempos e espaços para estudo,
planejamento, debate e problematização das situações dos micro-contextos locais e
das reflexões sobre a conjuntura social mais ampla podem constituir-se em
contraponto a intensificação e proletarização do seu trabalho e elementos centrais
para a (re)-construção de uma identidade professoral na SME.
Destaco, no entanto, que o estudo sugere a relevância de constituir esta
proposta de formação permanente a partir das próprias experiências deste
professorado. Experiências como elementos fundantes, pelas singularidades e
peculiaridades destas práticas docentes, anteriormente referidas. Esta construção
não deveria desconsiderar os diversos interesses que marcam estas práticas; ou
seja, o estudo parece apontar para o aspecto desafiador para a proposição de um
projeto político-pedagógico de formação permanente que possibilite a mediação
entre os interesses individuais desde que em consonância com o interesse coletivo.
O protagonismo deste professor, sujeito de sua formação, é entendido como
aspecto central para o estabelecimento de vínculos mais consistentes e
compromissados com a própria formação e com a sua prática; é identificado como
estratégico no fortalecimento de sua identidade singular e coletiva. Ou seja, é
pensar no professor da SME, reconhecendo-se como intelectual transformador, que
tem em suas mãos os conteúdos de esporte e lazer em suas possibilidades de
educação e emancipação, assumindo a reflexão e a produção sobre o seu próprio
fazer pedagógico. Este parece ser um dos significados mais relevantes atribuídos
pelos professores ao seu processo de formação permanente: a possibilidade de
realização de uma formação como auto-formação.
A criação dos referidos tempos e espaços para troca de experiências, a
definição de linhas de atuação, a constituição de uma estrutura de apoio na
superação das dificuldades advindas da prática docente, surgem como demandas
recorrentes nas falas do professorado. Aliada a estas, o estudo sugere a
necessidade expressa pelos professores de uma preservação de suas esferas de
atuação profissional das instabilidades decorrentes da atividade política, das tensões
advindas das disputas partidárias. Sem apontar para expectativas de neutralidade
ideológica, o que sugere a escuta e análise do material empírico é que ao processo
de formação permanente é atribuída uma condição de centralidade na construção de
um sentido de coletividade profissional, de superação de isolamentos, de
!
:>D!
possibilidade de superação de limitações temporais e discursivas das gestões
políticas.
O estudo sugere que a estrutura gerencial e a agenda institucional possam
estabelecer canais de comunicação e construção coletivas, que viabilizem um
processo dialogal efetivo de proposição e implementação das ações de formação
profissional, que superem modelos meramente administrativos ou informativos, que
ultrapassem os breves quatro anos de uma gestão, tendo em vista o tempo da vida
profissional e a riqueza de experiências do seu professorado.
Em suma, este esforço investigativo procurou dar voz ao sujeitos da
instituição SME. Estes sujeitos perspectivam formação permanente e trabalho como
construção coletiva – professorado e gestores responsáveis por uma proposta que
abrigue e permita crescer os elementos constitutivos deste cenário complexo: a
política pública, democraticamente constituída e, portanto, representativa da
sociedade; o professor, que tem na instituição educativa não-escolar riquezas e
desafios ímpares; e por fim, a sociedade, que nos aspectos macro e micro da
realização da sua emancipação e realização, são a razão de ser da ação educativa
e da ação pública.
!
:>>!
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APÊNDICES
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APÊNDICE 01 – CARTA DE ANUÊNCIA DA INSTITUIÇÃO
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APÊNDICE 02 – MODELO DE TERMO DE CONSENTIMENTO
!
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
ESCOLA DE EDUCAÇÃO FÍSICA
GRUPO DE ESTUDOS QUALITATIVOS FORMAÇÃO DE PROFESSORES E
PRÁTICA PEDAGÓGICA EM EDUCAÇÃO FÍSICA E CIÊNCIAS DO ESPORTE
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Você está sendo convidado(a) a participar de um estudo sobre
FORMAÇÃO PERMANENTE E SUAS RELAÇÕES COM A PRÁTICA
PEDAGÓGICA DO PROFESSOR DE EDUCAÇÃO FÍSICA NA SECRETARIA
MUNICIPAL DE ESPORTES, RECREAÇÃO E LAZER DE PORTO ALEGRE.
Neste sentido, pedimos que você leia este documento e esclareça suas dúvidas
antes de consentir, com a sua assinatura, sua participação neste estudo. Você
receberá uma cópia deste Termo, para que possa questionar eventuais dúvidas
que venham a surgir, a qualquer momento, se assim o desejar.
Objetivos do Estudo:
Identificar como os professores da SME percebem a contribuição da
formação inicial e da formação permanente no apoio a sua prática pedagógica.
Compreender como a diversidade de práticas pedagógicas da SME é
percebida pelos professores que nela atuam.
Procedimentos:
Participação em uma ou mais entrevistas, previamente agendadas, a serem
realizadas nas dependências do seu local de trabalho ou estudo, com duração
máxima de uma (1) hora. Esta entrevista será gravada, transcrita e devolvida
para sua confirmação das informações coletadas.
Participação em reuniões, no seu local de trabalho ou de estudo, com outros
colaboradores previamente entrevistados, para consolidar informações comuns
através de um roteiro elaborado pelo pesquisador e construído a partir da
análise do conjunto das entrevistas.
!
:?@!
Permitir a observação de turnos de atividades no seu espaço de trabalho na
SME.
Permitir a participação do pesquisador nas reuniões pedagógicas e ou
administrativas relacionadas ao seu processo de formação permanente
promovida pela SME, no período da investigação.
Riscos e Benefícios do Estudo:
Primeiro: Sua adesão como colaborador(a) com o nosso estudo, não oferece
nenhum risco à sua saúde, tão pouco o(a) submeterá a situações constrangedoras.
Segundo: Você receberá cópia da sua entrevista (individual e coletiva) para
validar, retirar ou modificar as informações, a seu critério, antes do texto ser
transformado em fonte da pesquisa.
Terceiro: Este estudo poderá contribuir no entendimento científico dos
problemas relacionados com a formação e a prática pedagógica, vivenciados pelas
pelos educadores, em âmbitos escolares e não-escolares.
Confidencialidade:
Todas as informações coletadas, sob a responsabilidade do pesquisador,
preservarão a identificação dos sujeitos pesquisados e ficarão protegidas de
utilização não autorizadas.
Voluntariedade:
A sua recusa em seguir contribuindo com o estudo será sempre respeitada,
possibilitando que seja interrompido o processo de coleta de informações, a
qualquer momento, se assim for seu desejo.
Novas informações:
A qualquer momento você poderá requisitar informações esclarecedoras
sobre o projeto de pesquisa e as contribuições prestadas, através de contato com o
pesquisador.
Você poderá trazer acompanhantes para assistirem as entrevistas de coleta
de informações.
!
:?A!
Contatos e Questões:
Universidade Federal do Rio Grande do Sul
Rua Felizardo 750. Jardim Botânico. Porto Alegre/RS
!
Professor Vicente Molina Neto E-mail: vicent[email protected]
Fone (51) 3308-5821
!
Comitê de Ética em pesquisa da UFRGS:
Fone: 33083629
DECLARAÇÃO DE CONSENTIMENTO
Eu, ______________________________________________, Professor(a) da
Secretaria Municipal de Esportes, Recreação e Lazer de Porto Alegre , tendo
lido as informações oferecidas acima e tendo sido esclarecido(a) das questões
referentes à pesquisa, concordo em participar livremente do estudo.
Assinatura _____________________________________
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!
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APÊNDICE 03 – CARTA DE APROVAÇÃO DO COMITÊ DE ÉTICA
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APÊNDICE 04 – TRANSCRIÇÕES DO DIÁRIO DE CAMPO
!
OBSERVAÇÃO DE REUNIÃO GERAL DE PROFESSORES DA SME 04 DE
OUTUBRO DE 2008
DATA: 04 DE OUTUBRO DE 2008
LOCAL: Sala cedida pelo Instituto Porto Alegre (IPA).
DURAÇÃO DA OBSERVAÇÃO: das 8h20 às 12h15, período que compreende da
entrada ao espaço de reunião até a dispersão do grupo ao final da atividade.
TEMA PROPOSTO PELA SME: Informes gerais, apresentação do Projeto Centro de
Fisioterapia Pública e apresentação do Portal de Gestão (pauta informada pelos
Coordenadores dos diversos espaços e projetos da SME aos professores sob a sua
responsabilidade).
ENFOQUE DA OBSERVAÇÃO: Relações interpessoais; proposta e estrutura da
pauta (administrativa e ou pedagógica); características das dinâmicas: envolvimento
e participação do professorado ao longo do evento.
OBSERVAÇÃO
MINHAS
REFLEXÕES
1
A
PARTE:
8h20: Grupos de professores no pátio do IPA, conversando
informalmente num clima de reencontro... ouve-se assuntos
de ordem pessoal, mesclado com profissionais. Algumas
chefias transitam e participam das conversas. Alguns passam
pela mesa externa a sala de reuniões, para assinatura do
ponto e retornam ao pátio para os seus pares de conversa.
Em torno de 9h10, os professores são chamados para a sala
de reuniões, segue-se uma espécie de mutirão de
comunicação: os professores vão passando uns para os
outros um “estão chamando, vamos lá...” De forma ruidosa (as
conversas e brincadeiras entre os colegas continuam) os
professores vão sentando-se. O ambiente da sala é simples:
um banner da SME/PMPA ao lado da entrada, não existe uma
mesa diretora dos trabalhos, apenas uma de apoio, com o
equipamento multimídia e o microfone.
Com um sorriso e um pedido de silêncio acompanhado
de pedidos de alguns dos próprios professores [meio sério,
Os grupos, “as panelas”
vão se mantendo na
configuração dos
lugares para sentar...
Ausência de protocolo
para abertura e
apresentação de
autoridades e
!
:@B!
meio brincando], o Secretário Adjunto as boas vindas
àquele seminário, antecipa que serão anunciadas mudanças
no grupo de assessoria pedagógica e alerta para cuidados
com o período eleitoral (“o que pode e o que não pode...”). Em
seguida, apresenta o palestrante, médico do esporte,
responsável pela Clínica Pública de Fisioterapia, implantada
no Ginásio Tesourinha [projeto implantado pela atual gestão
da SME]. Inicia-se a palestra com a apresentação do projeto,
aponta que talvez muitos professores ainda nem conheçam a
Clínica e, nisto convida a todos para que passem no
Tesourinha para visitarem, e usarem, se necessário [risos]. A
abordagem adotada é a da importância da atividade física, do
combate ao sedentarismo como fator prevalente na saúde [um
colega ao meu lado, prof. de EF e fisioterapeuta me alerta
para o fato de que o texto apresentado no slide do palestrante
está ‘alterado em relação ao texto original’, mas a observação
fica entre nós].
Em seguida, o palestrante justifica as características do
projeto, contextualizando a criação e o aporte de recursos
financeiros e humanos e as limitações decorrentes sobre a
delimitações de público-alvo somente para usuários de
programas e projetos da SME e que não tenham cobertura por
convênio (caráter gratuito para quem precisa). Aponta por
objetivo central recuperar da melhor maneira e no menor
tempo o indivíduo para o retorno às suas práticas regulares.
Anuncia que 2 trabalhos estarão sendo apresentados em
congresso de fisioterapia [funciona em convênio com o IPA,
acadêmicos de Fisioterapia estagiam na clínica], já como fruto
da análise empírica dos atendimentos nestes 6 meses de
existência.
Novamente o colega ao meu lado me chama a atenção e
alerta para problemas de ordem jurídica para a restrição do
acesso: “negar a quem tem convênio ou não é usuário de
atividades da SME pode gerar problemas com o Ministério
Público...”, mas novamente, não socializa com o grande
grupo...
Encerrada a apresentação, o palestrante abre para
questões do grupo. Timidamente, surgem 3 perguntas, sendo
que numa parece-me perceptível um “resguardo/delimitação
de espaço de corpo profissional”: mais que uma dúvida, uma
busca de isentar os professores da SME sobre a
palestrantes; [sem
nenhum cuidado da
pauta do evento, como
os tópicos não fossem
importantes]
Postura tranquila do
público, que
acompanha o
desenrolar da pauta.
[Lembro de um tempo
em que sempre tinham
questionamentos sobre
o porquê daquele tema
ou sobre como seria a
dinâmica: percebo um
ar de acomodação]
[eu e as emissões de
valores... está
coerente... critérios de
acesso e justificativa
geral do projeto...]
Interessante o olhar de
alguns colegas que
buscam ‘confrontar o
dito’ com a minha
análise, como se
dissessem: olha,
Ismael, o que tu dizes
ou pensas sobre isto
?
...
ou ainda: não vais dizer
nada
?
Nem sempre é
cômodo...
(*) Demanda por
formação
!
:@=!
responsabilidade de ocorrências das lesões que levariam os
usuários ao serviço. Outro colega solicita uma oficina para
aproximar as práticas da EF aos cuidados e prevenção de
lesões pela Fisioterapia” (*); outro põe em questão a
demanda por uma equipe multidisciplinar, com a participação
dos prof. de EF; por último, um colega pergunta se existe
algum estudo sobre ocorrências de lesões dos professores da
SME em atendimento na Clínica ao que o palestrante diz
ainda não existir tal estudo.
Uma professora da Assessoria Pedagógica, vendo que
não haviam mais questões e que ninguém da Direção se
apresentava, faz uso do microfone para agradecer ao
palestrante e liberar para o intervalo para o cafezinho de 15
min... irrompem algumas poucas e tímidas palmas...
rapidamente o grupo sai da sala.
INTERVALO: Retorno a um clima de absoluta alegria e
informalidade, muitas risadas, saudações que sugerem um
reencontro depois de muito tempo... circulo por diversos
grupos, participo de alguns bate-papos: futebol, o que estou
fazendo, como está o mestrado, se tenho fotos da minha
filha... Novamente, alguns colegas vêm chamar, dizer que
estão esperando na sala... Lentamente, todos começam a se
dirigir para a reunião.
2
A
PARTE:
10h40: Uma professora da equipe de assessoria pedagógica
apresenta o tema da 2
a
parte da reunião: o Portal de Gestão,
passando a palavra para um outro professor da mesmo setor,
atualmente responsável pela implantação do portal. Apresenta
slide com o Portal, apontando para o modelo de gestão,
destacando para o ineditismo da proposta e da visibilidade da
disponibilidade de verba [ouvem-se risos, acompanhados de
“que verba?”] e da destinação orçamentária segundo ele, se
este modelo permanecer, todos os professores poderão
acessar/acompanhar o processo de dotação e disputa
orçamentária. Relata o histórico da implantação, do
descontentamento de alguns secretários municipais por
entenderem não poderem dispor dos recursos; argumenta,
ainda, pela importância da continuidade deste modelo,
“independente do partido político” (*) [percebo eclodirem
vários cochichos, ouço um deles: “ih, estão em campanha
permanente?
Perguntas não são
feitas ao microfone,
dificultando a
socialização da dúvida
e o entendimento do
contexto da resposta...
[o ambiente e as
expressões dos rostos
sugere desinteresse,
desmotivação...] O que
é do grupo e o que é
meu
?
...
[velhos parceiros... eu
estranho, ninguém está
falando nada sobre o
que foi dito na palestra
por quê
?
]
(*) Dissociação entre
modelo de gestão e a
proposta político
partidária em
exercício.
Vai mudando o
cenário: professores
mudam suas posturas
nas cadeiras, alguns
!
:@C!
eleitoral”].
Uma professora pede a palavra e questionou não
receber material, fruto deste portal apesar da disponibilidade
de verba. Em seguida outra colega questiona a falta de
visibilidade do trabalho cotidiano e das ações da SME dentro
deste modelo de gestão pergunta se o que não está dentro
dos programas ‘não existe dentro deste modelo de gestão?O
apresentador do portal responde sobre a importância de
alimentar o portal, “não adianta reclamar e não alimentar o
sistema” e defendeu que nunca o processo foi tão
transparente, e da conseqüente possibilidade de pressão.
Uma colega é chamada a apresentar sua experiência como
coordenadora de projeto/ação que vem sendo atendido pelo
portal; diz ela: “a verba existe mas permanece entravada pela
burocracia”. Problemas entre cadastro, licitação, questões
políticas, prazos... “Daqui a pouco o tempo termina e a verba
se extingue...” [um colega fala em tom baixo, mas para ser
ouvido: “é, o portal é para a gente ver... tu olhas e pronto...”
risos ao seu redor]. Outra colega argumenta sobre a
importância de encaminhar os pedidos e acompanhar. Um
colega questiona o fato de estar sob a responsabilidade dos
coordenadores e o pouco envolvimento dos professores “na
ponta” [expressão amplamente usada na SME para diferenciar
e, muitas vezes depreciar, os professores que estão nas
atividades-fins – com atendimento ao público – e os que estão
envolvidos com atividades burocráticas ou de gerencia]: que
esta distância dava margem para outros problemas, inclusive
de trabalho feito na Pç. Charrua por não professores de EF
[alguém gritou: “nestas horas, cadê o CREF?”]; o expositor do
tema/coordenador criticou o desvio do tema, enfatizando que
as intervenções ficassem atidas ao tema do portal [sussurros
pela sala incômodo]. Um colega solicita reunião com a
ASSEPLA (Assessoria de Planejamento da SME) sobre as
questões de prazos e licitações. Outro argumenta a
importância de vincular o material com quem solicita: “senão,
quando chega, a bola que tu pediste é dividida com todos e
quem pediu fica com a fração...”
Sem maiores debates, o coordenador do momento
encerra o encontro, visto o adiantado da hora e como avisos
finais, reitera a obrigação da assinatura do ponto de entrada e
saída e aspectos relativos a pontualidade para o inicio das
atividades.
demonstram
impaciência,
esboçam
intervenções.
[Fico com uma
sensação de
ausência/fragilidade de
vínculos de grupo
houve isto, uma vez...]
!
:@D!
Durante esta fala, vários professores estão de saída.
Forma-se uma fila para assinatura do ponto de saída.
no espaço externo, poucos pares conversam
isoladamente; procuro saber quem vai ficar para almoçar por
– ninguém... rapidamente, esvazia-se o ambiente.
!
:@>!
OBSERVAÇÃO DE SEMINÁRIO INTERNO DE PROFESSORES DA SME 25
DE MAIO DE 2009
DATA: 25 DE MAIO DE 2009
LOCAL: Salão de Convenções da AABB Associação Atlética do Banco do
Brasil.
DURAÇÃO DA OBSERVAÇÃO: das 8h20 às 18h15, período que compreende as
atividades da manhã, a convivência no almoço no restaurante local e as atividades
da tarde, com reinício às 14h.
TEMA PROPOSTO PELA SME: Modelo de Gestão realinhamento dos 12 grandes
eixos dos programas de governo; Portal de Gestão: apresentação e a participação
das ações da SME.
ENFOQUE DA OBSERVAÇÃO: Relações interpessoais, estrutura da pauta
(administrativa e ou pedagógica) e características das dinâmicas: envolvimento e
participação do professorado ao longo do evento.
OBSERVAÇÃO
MINHAS
REFLEXÕES
Do estacionamento ao pátio central da AABB, e dali até
o hall de entrada da Sala de Convenções, o reencontro com
colegas de trabalho, alguns dos quais não via quase 3
meses (quando da reunião de abertura de 2009). A forma dos
agrupamentos reflete os coletivos locais de trabalho; a
informalidade é a já observada em outros momentos similares.
Encontro alguns colegas da administração anterior (do
coletivo do Partido dos Trabalhadores) contemporâneos
meus na gestão e que hoje atuam junto ao atual coletivo:
percebo expressões que sugerem algum tipo de
constrangimento, como se quisessem com um olhar,
justificarem-se pelas atribuições assumidas uma delas,
grande amiga, ao me abraçar diz: “... pois é, Ismael, vamos
tocando... do jeito que dá...” No acesso ao salão, a fila para
assinatura do ponto e o recebimento de pasta com
documentos que nortearam as apresentações ao longo do
evento.
Abertura prevista para 8h30 no email de divulgação da
atividade, o grupo em sua grande maioria aguarda no
interior do salão conversando animadamente: brincadeiras de
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
60
Educação Física.
!
:@?!
parceiros de trabalho, sobre a rodada de futebol do final de
semana, alguns relatam episódios dos eventos de trabalho em
que se envolveram recentemente. Circulavam no ambiente,
envolvido com a organização o Gerente Executivo e Gerente
Pedagógica, bem como os assessores que compõe a sua
equipe: em alguns momentos, forte movimentação; em outros,
uma imobilidade que sugeria o aguardo de alguém que ainda
não chegara. Surgem no salão algumas das autoridades
previstas para participação no encontro: o Secretário
Municipal de Esportes, o da Secretaria de Planejamento com
um assessor, o Secretário Adjunto da SME. Às 9h40 um
profissional da Gerência de Eventos assume o microfone,
dando as boas-vindas a todos e constituindo a mesa para
início da atividade: Secretários Municipais e seus assessores
compõe a mesa, assim como um representante da AABB.
Uma breve e informal fala do Secretário da SME,
reiterando as boas vindas aos colegas da mesa e
agradecendo a todos os professores que estejam ali hoje [um
colega próximo a mim brinca: “Mas não é convocação? Então,
quer dizer que eu posso ir embora que eu não tomo falta? -
Risos dos que estão em volta...”
Começa a fala do Secretário Municipal de Gestão: fala
do novo modelo implementado desde o início da
administração Fogaça (*), salientando o contraponto ao que
chama de “ideologização dos governos anteriores”, ao que
parece ocorrer em clara alusão ao PT [esta afirmação não
está envolta em motivações ideológicas?] Alguns cochichos
são ouvidos em pontos distintos da sala. Na sequência de sua
fala, busca diferenciar, a titulo de valorização do trabalho da
SME, a EF
60
escolar e que se nos espaços da SME... traz
o foco para o usuário do serviço público tratado por ele
como ‘cliente’ quebate nas portas dos diversos serviços,
Percebo preocupações
com protocolo não
identificadas em outras
observações realizadas
anteriormente. Suponho
que isto esteja
relacionado aos novos
membros que passaram
a compor a recém
constituída Gerencia
Pedagógica (no período
de 2006 à 2008, o
Gerente Executivo
incorporou a
responsabilidade pela
Gerencia Pedagógica).
(*) 2005-2008, reeleito
para o período 2009-
2012)
[lembro que em todas
as falas que ouvi deste
governo há uma
negativa ao caráter
ideológico inerente ao
processo político
partidário nas diversas
instâncias de gestão do
Estado]
[dúvida: qual é a
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
61
Cargos em confiança: atores na administração pública não concursados.
62
Associação dos Trabalhadores em Educação de Porto Alegre, órgão de representação da
categoria.
63
Orçamento Participativo: modelo de Fóruns de participação das comunidades organizadas,
implantado pela Administração Municipal, em 1990.
64
Síntese dos nomes dos 2 principais clubes e torcidas de futebol de POA, Grêmio e
Internacional.
65
Pedido de Liberação de verba, termo usado pela administração central da PMPA.
66
Companhia de Processamento de Dados do Município de Porto Alegre.
67
Fundo Municipal do Esporte de Porto Alegre.
68
Programa Em Cada Campo Uma Escolinha, que trabalha com escolinhas de futebol de
periferia em parceria com voluntários criado em 1996.
!
:@@!
das diversas secretarias” e aponta para a visão de que o
governo municipal possa implantar uma “porta única”; cita a o
programa Lugar de criança é na escola, dizendo que o
trabalho da SME deve estar presente lá... Cita a sua
participação num congresso Brasil Competitivo
destacando que o modelo tratado “afinava” com o que a
administração municipal de POA fazia desde 2005. Fala do
plano de governo e do plano estratégico exposto nas
campanhas eleitorais e das dificuldades entre o “plano bonito,
que acaba indo parar na gaveta” e as pressões ditadas pelas
demandas da sociedade e a importância da integração e
síntese como forma de otimizar o atendimento do ‘cliente’ da
política pública; imediatamente, faz uma justificativa para o
uso da palavra ‘cliente’... O jargão político-partidário na
exaltação do atual modelo de gestão. Acusou o governo
anterior de administrar com CC´s
61
e de ter levado consigo os
dados da gestão, das finanças e dos programas, deixando a
atual administração “navegando às cegas”. Neste contexto,
encerra a sua fala, agradece e despede-se. [poucas e
desarticuladas palmas] O Secretário da SME despede-se
também, para acompanhar a saída do colega, passando o
microfone para a Gerência Pedagógica [que parecia não
esperar por isto].
Segue-se a apresentação do representante do Comitê
de Gestão para apresentar as linhas gerais do reordenamento
dos programas de governo para a atual gestão. Começa a
apresentar slides com um fluxo utilizado para a análise
estrutural e financeira. Passa a apresentar a composição do
Comitê de Gerenciamento... [enquanto isto passa por mim - e
assim vai, de mão em mão uma lista de sócios da
ATEMPA
62
, passando paralelamente ao tema que está sendo
apresentado na frente, provocando óbvia, mas
aparentemente ‘bem vinda’, distração dos professores]. Na
tela, slides lotados de dados, de difícil visualização, dos eixos
ambientais e sociais, onde estariam as principais ações da
SME, mostrando a síntese dos programas ao longo da gestão,
justificando o realinhamento/reenquadramento dos programas
e projetos. Ao apresentar o eixo financeiro, exalta a
importância da ‘saúde financeira’ para captar dinheiro para as
diversas áreas. Ao falar do eixo da gestão, menciona os 3
programas – Gestão Total, OP
63
e Governança Solidária Local
e informa que os 2 últimos serão ‘fundidos’. A seguir,
apresenta 2 gerentes de projetos ali presentes e destaca que
proposta de
materialização disto?]
[título sugestivo de um
conceito de gestão
?
]
[a justificativa só
reafirma a lógica do
Estado neoliberal, do
indivíduo consumidor de
um produto]
Burburinho na sala:
percebo manifestações
de desinteresse e
incômodo com a
profusão de siglas
referentes a
administração e
finanças.
[Poluídos]
[20 minutos após o
início das sua
exposição pergunta se
está muito rápido e
pede que se houver
dúvidas, “perguntem”…
alguns colegas riem e
sussurram: “pelo
contrário, vai mais
rápido…” mais risadas]
[Eu estranho: e o
momento para
perguntas, de
estabelecimento de
!
:@A!
eles tem ligação com uma Secretaria ou pasta: “eles são da
gestão, com dedicação exclusiva ao seu programa” e aponta
para este fato com mais uma expressão de integração e
transparência desta administração. Novamente, pergunta se
foi muito rápido e novamente ouço murmuradas as
brincadeiras de “não, que bom que foi rápido...”
A gerente pedagógica agradece a participação e chama
para um intervalo de 15 minutos. Rapidamente, todos
levantam-se e saem na direção da mesa de cafezinho
montada na parte externa do salão. Grande alarido e a
retomada de conversa animada e fraterna. A informalidade
toma conta dos grupos de professores. Vou para o salão
aonde acabo me associando aos colegas de parque onde
trabalho: a dupla GRENAL
64
passa a ser o centro da conversa
e das brincadeiras. Grande parte dos professores desce para
a área aberta, onde nas várias mesas, os grupos constituem-
se por associações diversas alguns grupos de um mesmo
programa ou projeto, outros de um mesmo espaço de
trabalho, ou meramente por afinidades pessoais/profissionais.
Opto por não perguntar sobre a impressão dos colegas sobre
a dinâmica da reunião: prefiro circular e ouvir manifestações
espontâneas: na grande maioria dos grupos, ouço conversas
de ordem pessoal, alguns encontros que sugeriam muito
tempo sem compartilhar a companhia de parceiros. Em alguns
poucos grupos, ouço dois colegas... “que porre!” ou “ah, que
manhã perdida... preferia estar dando aula...” Após uns 20
minutos, ouvimos colegas que ficaram no saguão próximo ao
espaço de reunião chamavam para retornarmos ao salão. No
caminho de volta, alguns comentários soltos: “...vamos lá...”
ou “...parte dois: como custa a passar, meu deus...”
10h35 – Professores vão entrando gradualmente; no entanto o
próximo palestrante já dá início a sua exposição...logo após as
suas primeiras palavras, uma colega pede que seja retomada
a exposição da importância do Portal de Gestão, porque os
professores na ‘ponta’ teriam dificuldade de entender o seu
papel. O palestrante reforça o papel de ‘memória’ do próprio
trabalho do professorado da SME. Uma colega reclama a
distancia entre a praça e a comunicação via portal. Outra
questiona a distancia entre o ‘dinheiro virtual’ e a liberação
dos PL´s
65
. O palestrante reconhece que a integração das
ASSEPLAS é um ponto difícil e um desafio para a
administração, fala da necessidade de modificação da
algum debate…será
que não haviam
perguntas? Mas a sala
já está vazia…]
Neste momento,
percebo uma maior
mobilização do grupo
para o estabelecimento
de debate: o volume
das conversas paralelas
sobe.
(*) Qual será a
concepção da
administração para
promover mudança de
cultura? Este já foi um
desafio que pautou
ações lá em 1993.
!
:A;!
cultura...(*) Uma colega questiona os tempos de
envio/inclusão de novas ações e diz que não se
contemplada no modelo apresentado, em que O palestrante
acha que talvez seja uma questão de como as ações estão
representadas: o desafio de reduzir mais de 500 ações à
apenas 12 programas. Um colega pede esclarecimento se o
portal ‘abre e fecha’ para inclusão de dados e se tem prazos e
um planejamento. O palestrante aponta para a complexidade
do sistema que é on-line e do trabalho da PROCEMPA
66
;
sobre a questão planejamento, refere estarmos no momento
do encaminhamento do ‘plano plurianual’ à Câmara de
Vereadores e portanto, fazendo a análise do que é estratégico
– só terá orçamento o que estiver no plano de gestão [!!!] Uma
colega recorda que a SME sempre teve um orçamento ínfimo,
enaltece a transparência do portal e pergunta como dar
visibilidade ao cotidiano da SME? Lembra que não temos uma
legislação que garanta recursos e refere-se a Secretarias
como FASC, Saúde, Cultura... O palestrante aponta para o
caminho via gerente de ação mas da possibilidade de cada
um registrar o que faz [imediatamente, um colega ‘sussurra
alto’: “não é bem assim, não tem senha para todo mundo,
não...” mas não gera uma resposta do palestrante]. Quanto a
verba, confirma a especificidade das verbas mas a
importância das pequenas ações – destaca as do idoso e
aponta para as dificuldades de recursos e o papel importante
do autal secretário de esportes na disputa que faz junto a
Secretaria Municipal da Fazenda. Encerra fala, recebe palmas
(*)
O mediador dos trabalhos, aos apresentar a fala de 2
gerentes de programa do Portal, que farão o próximo bloco,
pede que todas as questões passem a ser feitas por escrito e
não mais orais [dada a proximidade, a informalidade e o
tamanho do grupo, por quê esta limitação
?
] Começa a fala de
um dos gerentes, apontando para a facilidade do Portal:
acesso por secretaria como forma de melhor ‘se ver’ e que o
mapa estratégico seria a ‘ferramenta’ para sentir-se ‘incluído’:
pelo mapa, vemos quais os programas e ações contribuem
para determinado objetivo estratégico, tendo no Portal os
detalhes orçamentários. Começa a falar do Programa ‘A
Receita é Saúde’: em slides, são enumeradas as ações da
diversas secretarias. Na inclusão de novas ações, aponta para
indisponibilidade de verba este ano lista as ações da SME e
seus respectivos gerentes. Apresenta a outra gerente, Márcia,
[!!! Então a
preocupação da colega
procede: se não é vista
a ação, não tem
orçamento
?
Não
existe
?
]
(*) Será por ter aberto
sua fala ao debate?
Muda a postura do
grande grupo: muitos
professores parecem
estar alheios ao que
está sendo apresentado
aumenta o volume
das conversas
paralelas: o palestrante
parece perceber e
aumenta o tom da
voz…
Um colega, ao olhar um
slide apresentado
pergunta ao outro: cadê
o ECCE
68
? Ao que o
colega responde: “é,
não está mesmo…”
Pergunto então aos 2 o
que teria acontecido
!
:A:!
que se apresenta como ex-FASC e da importância de estar
agora com dedicação exclusiva para a gerencia do seu
programa ‘Inclusão Digital’, como forma de poder ter uma
visão mais plural e menos ligada a uma secretaria específica.
A palestrante lista as ações da SME dentro de seu programa e
seus líderes. Duas novas ações: FUNDESP
67
[perdi o 2
a
ação
pergunto ao colega ao lado: “ah, pára, Ismael: este troço
que não tem nada a ver com o meu dia-a-dia? Eu não estou é
ouvindo nada, estou só esperando terminar.” A palestrante
passa a falar do programa ‘Lugar de Criança é na Escola’, no
qual estaria o maior número de ações da SME, apontando
para o slide que trazia esta informação. Percebo que ela
encerra a sua fala: neste momento a conversa paralela dentro
do salão torna inaudível a sua despedida. Apesar da
orientação inicial, uma colega pergunta se existe articulação
entre as ações pois existem problemas de inclusão que
seriam transversais: os 2 palestrantes respondem, a seus
tempos, que isto é uma etapa e que existem fóruns com
representações dos diversos setores. A gerente pedagógica
encerra as atividades da manhã e informa o horário de reinício
da tarde para 13h30 relembra a disponibilidade e do preço
promocional do restaurante da AABB para os professores da
SME.
ALMOÇO: Vários colegas ficam para almoçar juntos, as livre
associações para as mesas reconstitui os pares de trabalho
nas Unidades ou nos programas e projetos, mas não como
um determinante: identifico outras associações por
reconhecida amizade pessoal que ultrapassa as questões das
rotinas de trabalho. Acabo sentando com um colega e amigo
de longa data, a que me referi anteriormente como do
programa hoje projeto ECCE. Amigo, quase vizinho, são
vários assuntos de ordem pessoal: família, esposas. Mas num
certo ponto, ele puxa o assunto da situação da SME, ao que
ele qualifica como “voltamos ao clientelismo na várzea... tudo
que nós lutamos para fazer, a autonomia das ligas, a
participação na organização do Municipal [Campeonato
Municipal de Várzea] se foi; estamos de volta no ‘me dá
medalha’, ‘me fardamento’... cara, tudo é voto, está
reduzido a isto...” Eu pretendia um intervalo na observação
mas percebia nele a necessidade de falar; outra fala que achei
sugestiva referiu-se ao modelo de gestão e de comitê de
disciplina: “aquilo virou uma mini-federação... sei quantas
são as equipes punidas, excluídas, atletas excluídos... Ismael,
com o seu projeto, ao
que um deles responde:
“isto aí é um engodo,
tem projeto aí que
atende meia-dúzia de
crianças… e o ECCE,
na real, nem é mais o
que era…”
5 ou 6 colegas saem da
sala.
Ninguém parece estar
ouvindo mais o debate.
Nenhuma pergunta por
escrito foi enviada…
Percebo um forte
contraste: rostos
‘fechados’ ou
entediados de antes,
são agora de alegria, de
camaradagem e de
envolvimento com
temas do coletivo de
professores: aonde está
este ‘ponto de ruptura’?
!
:AB!
do jeito que vai, a várzea vai se desmanchar... umas
poucas equipes com uma baita estrutura vão sobreviver... mas
também, aí, para jogar com quem? Ouve o que estou te
dizendo, se seguir do jeito que está o Municipal não dura mais
2 anos...” Neste ínterim, outros colegas chegam na mesa, um
deles é representante sindical, traz as agendas das
negociações dos municipários com a PMPA, outros assuntos
informais, mais brincadeiras, fila no cafezinho na saída...
14h O apresentador (mestre de cerimônias) divulga o Dia do
Desafio e situa a participação da SME dentro das ações de
POA, que estará em disputa com Tijuana (México), naquilo
que chama de ‘saudável competição’ pela promoção de
saúde. A gerente geral é chamada a dar início às atividades
da tarde aplausos [professora do quadro, empossada na
função no início deste ano]. No entanto quem toma a palavra
é o professor da assessoria pedagógica, responsável pelo
Portal de Gestão na SME, que retoma a importância de
aproximar o portal da ‘ponta’: que entende que alguns
professores possam não estar apropriados mas que ‘não
admite’ que os coordenadores digam o mesmo, pois eles
foram instrumentalizados e chamados a participarem
ativamente da alimentação dos dados. Em seguida, diz que a
conexão com a internet, que seria fundamental para a 1
a
parte
da reunião não está funcionando, passando então diretamente
para a 2
a
parte: dinâmica em grupos, segundo cores que
estão nas pastas de todos os participantes. Algumas pessoas
da gestão identificam-se como as coordenadoras dos grupos,
buscando a adesão dos outros pares de cor. Um colega
próximo exclama: “trabalho em grupo? e declama: “Ai que
saudades que eu tenho da aurora da minha vida...” [risada
coletiva]. Recebo uma folha com as perguntas que nortearão
a discussão nos grupos; reúno-me com meus pares do grupo
laranja, coordenado pelo coordenador da ASSEPLA da SME;
a gerente pedagógica passa no grupo, apresenta o
coordenador dos trabalhos no grupo e reconhece que ver o
conteúdo do Portal na Internet que seria a etapa anterior
seria fundamental para uma melhor participação nesta etapa
em grupos: vários olhares se cruzam, sugerindo um
questionamento de porque então e para quê; apos a saída da
GP, segue-se um silêncio, sem que nenhuma orientação para
a sequência do trabalho seja dada: alguns escrevem em suas
folhas, outros olham ao redor, outros me olham enquanto sigo
com meus registros. Uma colega diz que vai pedir um curso
Olhando para o grande
grupo, dinâmica parece
sem norte, como se não
tivesse sido prevista
detalhadamente.
Sinto-me tentado a falar
e instigar sobre a
proposta da atividade e
seus desdobramentos
aguardo.
!
:A=!
de informática ninguém interage, a frase morre solta.
Começam a surgir conversas paralelas sobre outros temas: o
que alguns dos colegas estão fazendo nas suas unidades,
novidades, mudanças nos trajetos de vida na SME: um colega
relembra onde começou e com o que está trabalhando hoje,
quase 20 anos depois. O coordenador do grupo pergunta “se
respondemos a folha”: acabo respondendo que sequer
sabia qual era a dinâmica, outros concordam, um começa a
ler o que escreveu... Sou chamado novamente a dizer o que
escrevi: disse desconhecer, como professor da SME, o papel
do Portal para o meu trabalho e ao esboçar uma reflexão
sobre isto, sou imediatamente interrompido pelo coordenador,
a titulo de restringir minha resposta ao que seria, segundo ele,
o centro da pergunta 01 INVIABILIZA-SE O
INVESTIGADOR E SUA POSSIBILIDADE DE OBSERVAÇÃO
E ESTRANHAMENTO. ENTRO PARA A DISCUSSÃO E
DEBATE COMO MEMBRO DO COLETIVO DE
PROFESSORES DA SME ENCERRO A PRESENTE
OBSERVAÇÃO.
!
!
:AC!
APÊNDICE 05 – ROTEIRO DE ENTREVISTA SEMI-ESTRUTURADA
COLABORADOR:
DATA:
HORÁRIO:
Descreve a tua situação funcional na SME atualmente – uma breve
apresentação.
Fale sobre o teu ingresso na instituição (DERP, SERP, SME, FESC, FASC)
Quais as impressões/reflexões que fazes sobre a modificação do último
Concurso para professores de EF, no qual o referencial é unificado –
SMED/SME?
Fale sobre o teu processo de formação como professor, tua trajetória desde a
formação inicial até hoje.
Como você descreveria o trabalho na SME? Que características deste
trabalho são diferenciados e ou importantes para ti?
Diversidade – as possibilidades de múltiplas práticas docentes da SME: mito
ou verdade?
Como vivencias a tua prática docente na SME? Que aspectos da tua prática
docente te motivam e quais as que te frustram?
Que fatores são facilitadores para o teu trabalho na SME?
Que aspectos dificultam o teu trabalho na SME?
Fale sobre a formação profissional promovida pela SME e como ela se
manifesta, como ela dialoga com a tua prática docente.
Que fatores te ajudariam no teu trabalho docente na SME?
!
:AD!
APÊNDICE 06 – PROTOCOLO DE VALIDAÇÃO DE ENTREVISTAS
!
Este formulário encontrava-se impresso ao final da transcrição entregue ao
colaborador.
!
!
Eu, , após a leitura da transcrição da entrevista que concedi
em / / 2009 , sugiro as correções apontadas por mim ao longo do texto acima.
_________________________________
Assinatura
/ / 2009 .
Eu, , após a leitura da transcrição da entrevista que concedi
em / / 2009 , valido seu conteúdo e forma. Desta forma, autorizo sua utilização,
conforme o disposto no Termo de Consentimento.
__________________________________
Assinatura
/ / 2009 .!
!
:A>!
APÊNDICE 07 – TRANSCRIÇÃO DE ENTREVISTAS
ENTREVISTA COM A COLABORADORA SUZANA
REALIZADA EM 20/02/2009
HORÁRIO: 10h.!
ISMAEL: Bom dia, profª. Suzana, obrigado por me receber e colaborar com este
estudo. Vamos estar tratando da prática docente e do processo de formação
permanente desta rede, Secretaria Municipal de Esportes, Recreação e Lazer de
Porto Alegre
69
. Te pediria, inicialmente, que tu descrevesse a tua situação funcional
na SME: como foi teu processo de ingresso? Foi Concurso, não foi Concurso?
Quando foi? Ou seja uma descrição do teu processo de ingresso na instituição.
SUZANA: Bom, foi Concurso, eu era professora da rede estadual e da iniciativa
privada: Santa Inês e nas escolas estaduais da Bom Jesus e Morro Santana. Aí, fiz
um Concurso, na época... foi último ano da Neuza e do Collares [PDT: de 85 à 88]:
eles promoveram o Concurso, eu acho, no último ano de gestão; fiz aquele
Concurso e segui minha vida profissional que estava num caminho. Demorou um
tempo...eu estava... naquela época... quando eu fiz o Concurso, eu era... vice-
diretora, eu acho, da escola estadual... ou eu era professora, coordenadora de
turno, alguma coisa assim... e aí, quando veio a resposta positiva do Concurso eu
estava na direção da escola estadual, eu tinha largado a iniciativa privada e
estava trabalhando como diretora do Coelho Neto, na Bom Jesus. Aí, na época
porque já tinha passado... estas coisas de Concurso... tinha sido prorrogado [o prazo
de validade]... então, na época, por coincidência, era o 1
o
ano de gestão do Collares
e da Neuza no Estado, aonde as escolas que não tinham algum cabo eleitoral ou
alguma coisa relacionada com o PDT, tinham sido nomeadas... porque a gente tinha
eleição de diretores, na época... e eu fui, no tempo do magistério, eu fui a 2
a
diretora
eleita ou a 1
a
diretora eleita da escola: era aquela coisa de Conselho de Pais foi a
1
a
vez que o CPERS tinha conseguido e garantido a Lista Tríplice, na verdade não
era nem eleição direta, não sei nem se hoje continua isto... mas era uma lista
tríplice, a gente fazia um acordo e fazia uma grande eleição na escola e mandava 3
nomes para a SEC, que definia. Quando entrou a Neuza e o Collares, a gente
estava um pouco preocupados com este processo, se achava que podia... porque
no Coelho Neto a gente tinha um grupo de professores daqueles de ‘acreditar na
educação, nas modificações do mundo, do tempo e da história’ [dito com ênfase,
sugerindo uma forte convicção]; enfim, quando... e aí, não havia nenhuma
articulação política e eu, na verdade, me mantive: tinha sido diretora na última
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
69
A partir de agora, representada pela sua sigla: SME.
!
:A?!
gestão, por 2 anos, 3 anos 3 anos, era o mandato, se não me engano e aí,
quando eles foram eleitos e que teve a modificação, e ficou aquela coisa “vamos
continuar, não vamos continuar”, no fim, acabou que o meu nome foi de
permanência: eu estava 6 meses... é, 6 meses como diretora do tempo do
Collares quando veio a nomeação da prefeitura. E eu não pestanejei, porque em 6
meses estava começando a ficar complicado, também as coisas na educação
começam a patinar e a gente não muita saída... então, foi uma luz que se abriu,
eu disse: “é agora, que eu vou”; inclusive financeiramente não se compara... as
condições de trabalho e as condições financeiras: a estrutura e as finanças... então,
não hesitei, eu tinha 40 horas, fiquei com 20 ainda, pedi a demissão do cargo de
direção, voltei para a sala de aula no Estado, fiquei na mesma escola com 20
horas, assumi turmas e fiquei com 20 horas na Prefeitura e na iniciativa privada,
tinha abandonado havia alguns anos, desde que eu entrei no cargo de direção. Bem,
iniciei trabalhando no Chico Mendes [Parque] com aulas... regulares... regulares,
não... mas com grupo de dança, ginástica e vôlei... senão me engano, era vôlei que
eu trabalhava... aí, naquela época era SERP Supervisão de Esporte e Recreação
Pública, não era SME: era vinculada à Educação [Secretaria de], a gestão era do
Olívio e da Esther Grossi [PT]. Na época, a proposta para da Secretaria de
Educação para a SERP era de ampliar o trabalho sistemático nas praças e parques
da cidade; então, havia uma grande reativação de alguns parques que não tinham
trabalho de esporte e lazer ... de recreação e lazer... e também, em algumas
unidades, inclusive, a construção de módulos, para que pudesse abrigar uma
atividade pedagógica e então, que justificasse a presença de um professor. Foi
neste contexto que eu entrei na Secretaria, neste grande parque: este grande
parque funcionava com mais 2 professores, senão me engano o ... estava saindo de
do futebol o ... ou entrando em licença... o EEE, senão me engano... e a RRR
trabalhava comigo e também era uma recém nomeada que trabalhava comigo no
mesmo parque, trabalhando com basquete. E naquela época, tinha uma articulação
com a Secretaria da Cultura, então tinha ... pelo menos, no Chico Mendes, que era a
minha experiência... eles trabalhavam nos finais de semana com uma ativação muito
forte cultural, e ao mesmo tempo, o futebol estava um pouco mais articulado,
então se fazia muito o campeonato municipal da liga adulta que tinha uma liga lá
mais permanente e este trabalho mais de... teatro, apresentações artísticas,
música; e nós aproveitávamos este embalo para fazer alguma coisa com as
crianças, que era a faixa etária que eu trabalhava: eram crianças de 7 à 12, 13 anos
este era o público que eu e a RRR trabalhávamos, fora as mulheres da ginástica,
que eram pessoas acima dos 30 anos. Bom, a experiência ali foi interessante;
eu até brinco que ali foi o meu primeiro fracasso pedagógico, porque eu sempre
gostei de dar aula de dança e todos os lugares por onde eu passei Coelho Neto,
Santa Inês... e eu tenho uma história para contar dali, que vai engatar no papo da
importância do trabalho pedagógico. Eu fazia um grupinho de dança ali, com as
gurias da Vila Valeri Antunes, e eram meninas muito carentes... assim, de quase
no chão, unha preta, cabelo cheio de piolho... mas então, e a gente trabalhava com
umas musicas meio pagode, porque a gente estava meio perdida... que a referência
!
:A@!
que eu tinha... na Bom Jesus, eu consegui entender qual era o signo musical e o
signo da juventude, então foi fácil para mim continuar o trabalho de dança quando
eu vinha do Santa Inês. Ali era um grupo muito estranho porque eu não tinha vínculo
com nada, a praça era solta, quer dizer: as crianças apareciam de repente ... e eu
tinha que dar aula de dança. Então, elas eram quem? Donde é que elas vinham?
Que música? Que dança? Então, era uma coisa muito difícil... e eu, na verdade,
vinha num ritmo e meio que reproduzia as minhas histórias anteriores. Enfim, era
numa sala pequena, dava certo, a gente fazia aulinha e... e elas escolheram junto
comigo uma musica da Xuxa para fazer uma apresentação; tinha um grande palco,
da Cultura... todo mundo... e ali ia se apresentar a dança das meninas do Chico
Mendes. As mães vieram, a gente fez as fantasias com papel crepom, é lógico, era
tudo muito pobre, e eu comprei papel crepom: aquelas coisas bem de professora.
Aí, parque cheio: “lá vem a apresentação do grupo de dança”... as meninas entraram
no palco, elas nunca tinham tido experiência de palco nenhuma [professora parece
reproduzir a tensão, o suspense vivido naquele momento]: nunca, na minha vida
tinha me acontecido isto as meninas paralisaram a musica tocou toda, a platéia
inteira olhando e elas olhando para a platéia... e não fizeram um movimento, um
movimento... meninas que a gente tinha ensaiado, que as mães estavam... Foi,
assim, difícil para poder suportar aquele fracasso, porque na realidade era uma
coisa muito simples, eu tinha feito muita coisa de dança e nada tinha dado de
errado, tudo sempre deu muito certo... e aquele eu considero o meu grande fracasso
pedagógico, o primeiro grande fracasso pedagógico na SME. Enfim, aquilo passou,
tudo ... depois de muito tempo, eu fiquei pensando que... a coisa da referência era
uma coisa muito importante para a gente ser professor, saber onde está dando aula,
porque está dando aula, quem são as pessoas para quem se está dando aula e
muito, muito importante também, é ter uma relação de grupo que trabalhe em outros
locais e que tenham experiências que possam contribuir para que a gente se
encontre: na verdade eu era uma pessoa que vinha de um outro lugar, tinha uma
experiência pedagógica já, considerada bem grande, tinha passado por várias
instâncias, várias estruturas... não era uma pessoa que não tinha trabalhado na vila
tinha trabalhado na vila então não dava para dizer que era uma pessoa que
“estava vindo da escola privada ... então teve...”[sugerindo o que seria um discurso
previsível para um professor sem experiência] - não. Mas era uma pessoa que
nunca tinha tido um trabalho num... eu vinha da escola: era o meu primeiro trabalho
em praça pública. Então, há uma enorme diferença: à partir daquele momento caiu a
minha ficha eu percebi que estava num outro lugar de educação: não era a
escola. Ali, eu percebi que não era a escola: no meu primeiro grande fracasso! Eu
considero isto um emblema, ‘o meu primeiro grande fracasso’, porque, na verdade,
devem ter outros muito menores; mas este é emblemático, tinha até público para
assistir, tinha testemunha [risos]... os outros, a gente não conta... este como tem
testemunha, para contar ... Enfim, ali caiu a ficha de que, realmente, eu estava
!
:AA!
trabalhando com educação porque, afinal, eu era professora, eu dava EF
70
, era
uma quadra esportiva, tínhamos uma sala de dança – quer dizer, tinham os mesmos
instrumentos pedagógicos... eu era a mesma... as pessoas vinham com o mesmo
desejo, ou seja, de fazer esporte... e as coisas não eram as mesmas... Que coisas
eram estas? O que estava acontecendo? Com isto é que a ficha caiu: “não estou no
mesmo lugar, não posso agir da mesma maneira sou a mesma professora, mas
não posso ser a mesma... alguma coisa aqui tem que ser diferente...” Naquele
momento, as reuniões da SERP eram muito tumultuadas: a gente não tinha muitas
condições de trabalhar estas coisas assim, do fracasso, assim mesmo... eu estava
recém chegando, era um movimento político muito forte no sentido de grupo que
assumia o poder e grupo que estava no poder; então, as reuniões, na verdade, elas
aconteciam no título do pedagógico mas elas na verdade... elas encobriam... acho
que nem chegava a encobrir mas... estavam na realidade recheadas de uma disputa
de poder de: grupos que estavam no poder anteriormente e de grupos que estavam
assumindo o poder agora. E pessoas que estavam trabalhando, que tinham
historia na Supervisão, quer dizer, que tinham história nesta coisa de não ser
escola; e eu vinha num movimento de escola, de um movimento até político de
escola, pois eu tinha sido diretora, vice-diretora, tinha trabalhado em eleição... no
Santa Inês tinha sido coordenadora do grupo de EF... então já tinha um certo
movimento político, junto com a educação... mas o mundo era completamente outro,
porque era outra realidade de trabalho, eram outros códigos de trabalho, eram
outras formas que se exigia para se ter, entre aspas, “sucesso profissional”. Enfim,
não para a gente elaborar muito aquele fracasso pedagógico... eu sequer contei
para muitas pessoas, eu acho: para os mais próximos... aquela coisa... porque
não tinha ninguém para me ver, era eu e a comunidade mesmo... enfim, as
mães também não acharam grande coisa, as crianças também... depois, todo
mundo ria... eu chamo de fracasso mais para ilustrar do que realmente... eu
continuei dando aula lá, sem trauma nenhum, a vida continuou no Chico Mendes
sem problema, depois daquela apresentação; mas é mais uma ilustração do que
significa sair de uma escola e entrar numa praça pública e num outro lugar que é
educação, que tem o mesmo ‘modelito’ de professor e aluno mas que não é a
mesma coisa. E também a questão do apoio pedagógico a este profissional... que
também deve ser diferente, não é a mesma coisa. Enfim, ali naquele grupo a gente
foi a várias reuniões, era sempre uma briga; aí, naquela época, era uma briga dos
‘generalistas’ e dos ‘especialistas’: era um discurso muito forte pedagógico de
pessoas que queriam se dizer generalistas, porque entendiam que o trabalho numa
praça pública, num espaço não-formal deveria ser de um professor que estivesse
aberto a trabalhar várias manifestações esportivas e falava-se muito em gesto
esportivo, isto na parte de quem estava na administração, no poder de administrar
e os especialistas, que na verdade, a grosso modo, representava o grupo das
pessoas que tinham perdido o poder, entre aspas, porque alguns ainda
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
70
Educação Física
!
B;;!
permaneciam junto nesta outra administração... alguns não; e eles diziam que os
generalistas eram os que não sabiam esporte nenhum, que não tinham
especialização em esporte nenhum, então diziam que o melhor seria ser
generalista... mas que significava não saber de nada: dizia saber de tudo mas não
sabia de nada. Então a briga pedagógica era esta: quem era o grande cara do
esporte o grande cara do basquete, o grande cara do vôlei, o grande cara do
futebol... e aqueles que se diziam bons em tudo mas não eram bons em nada.
Então era esta a briga pedagógica... acontecia então um trabalho toda 2
a
feira, de
encontros de reuniões, elas eram todo o ‘saco de gatos’ junto, ou seja, juntava todo
mundo numa sala no Parque Marinha do Brasil uma sala com um pilar no meio,
com os bancos “assim...”, onde a gente, para enxergar as pessoas, tinha que fazer
um esforço enorme...a gente chegando não entendia muito... eu digo “a gente”
porque naquela tinham sido nomeadas um grande número de pessoas... então a
gente teve forca, a gente teve peso, éramos quase 40... éramos todos novos, cheios
de ‘gás’... e os ‘antigos’, que era como a gente chamava, que eram os que brigavam,
brigavam, brigavam na reunião e a gente não entendia muito bem por quê; depois,
alguns anos atrás, eu comecei a entender porque mas na hora eu não entendia
nada. Mas eu era ‘toda EF’, toda ‘política’, toda achando que o mundo tinha que
mudar e que o professorado tinha que se unir e que a gente juntos ia conseguir
transformar o mundo e as coisas e a educação [numa entonação que sugeria uma
exacerbação de convicção, de caráter ideológico, quase de uma profissão de ],
então muito ‘peito aberto’, muito assim... livre de grandes disputas pelo poder... e
muito petista, achando que o PT tinha assumido a Prefeitura e que então ‘tudo ia dar
certo’... e que, ‘enfim, seríamos todos felizes’... Enfim, foi esta a conjuntura de
entrada na SME.
ISMAEL: Bom, Suzana, tu fazes uma abordagem muito rica e de alguma maneira
tu já começas a tocar, e tocar profundamente, em alguns temas que são o objeto em
si desta nossa conversa. Quando eu referi aqui a coisa do “fala do teu ingresso na
instituição do ponto de vista do trabalho”, tu tocas numa questão central disto que
seria: uma comparação entre o espaço escolar e o espaço não-escolar. Então, que
tu pudesses aprofundar esta tua reflexão exatamente sobre quais as diferenças que
tu vais percebendo entre este ‘fazer de professora de EF’ no ambiente escolar e
quais são as grandes diferenças deste fazer numa rede não-escolar? E um em-
tempo, que eu gostaria que tu pudesses tocar, sobre a questão do Concurso, é: o
Concurso que fizestes era um Concurso, vamos dizer, de espectro amplo – tu
poderias tanto ir para a rede escolar, como ser lotada nesta rede não-escolar é
isto? Como foi quando te disseram: “olha, professora, a senhora está indo para a
SERP”... isto era algo esperado? Isto conteve surpresas ou desafios, que te
deixaram mais segura, menos segura?...
SUZANA: Primeiro, com relação a esta nomeação: eu era colega da JJJ, que foi
classificada antes, eu era esposa de um outro professor que fez o mesmo
Concurso e tinha sido classificado antes e tinha entrado na prefeitura, então eu
!
B;:!
sabia mais ou menos o que nos esperava... eu me classifiquei entre os 20 primeiros
lugares então quando eu fui chamada, eu ainda pude optar: na minha ordem de
classificação, foi feita a pergunta: “tu preferes SMED ou SERP?”Então, para mim, foi
possível optar. eu optei por conhecer as pessoas que estavam trabalhando
neste local e a gente brincava... que era o ‘paraíso do professor de EF’ porque enfim
a gente ia estar trabalhando exatamente com tudo aquilo que a gente sempre quis,
livre de todas aquelas pressões escolares, no sentido de que o professor de EF é
sempre o ‘bonachão’, todo mundo gosta... e outras pressões que nós, da EF, sabe
que enfrenta... então, era, para mim, considerado o paraíso... quando cheguei lá,
estava preocupada se eu não pudesse optar e pude optar... e optei... vim por
opção, tive esta possibilidade. Com relação às diferenças, eu coloco a 1
a
grande
diferença é a questão institucional mesmo: a escola é uma instituição [ênfase], ela é
reconhecida e a criança, quando vem, ela está vindo para alguma coisa ela já
deixa não sei quantos por cento de si fora, porque ela sabe que a instituição é
uma coisa forte, ela está entrando numa instituição: ela bota o pezinho dela, a
mochilinha dela dentro de uma instituição... e ali tem todo um código por mais
assustada que ela esteja, por menos sabedora de tudo que ela seja, a instituição
está presente na vida dela... desde os irmãozinhos, a vizinha, a mãe, todo mundo
sabe como é uma escola, como é que funciona, como é a coisa dentro,... isto, de
forma simbólica mesmo... de representação, de significado... é claro que isto se
transforma no momento que ela entra mas... é isto, é a instituição: cheia de
significados, símbolos, códigos, que a sociedade sabe e... mesmo que seja
diferente, a sociedade já tem uma representação disto. A praça pública não, ela não
é uma instituição: primeiro, porque ela é colocada como uma coisa pública e a coisa
pública aberta ... pela população não é uma instituição tanto que todo mundo
depreda, todo mundo é dono... tanto é que a gente faz sempre aquele discurso: “isto
aqui não é meu, é de todo mundo...” mas este ‘de todo mundo’ é uma coisa
aberta... ‘ah, a árvore é de todo mundo... esta quadra é de todo mundo... [sugere
um descompasso entre discurso e convicção]: para a cabeça das pessoas,
acostumadas a conviver com o peso das instituições, ter representação, significado
do que é uma praça pública é uma coisa meio complicada... de dizer que é uma
instituição... nós não somos uma instituição ... Então tem uma diferença muito
grande, da chegada da criancinha na praça pública... Na praça pública, ela não
deixa coisas para trás: ela traz tudo que ela pode e mais um pouco... diferente
da escola: quando entra na escola, ela deixa coisas... porque a mãe dela avisou
que ela tem que ter ‘um caderno, um lápis, que a professora...’ ela vem toda
preparada para aquele negócio. Na praça não! Ela... tinha que cuidar do irmão
menor mais novo... a mãe saiu... está calor... ela pega o irmão mais novo e traz para
a praça. Pode significar ‘n’ coisas ela ter vindo ali: pode significar se livrar das
tarefas domesticas, pode significar ter fugido de alguma coisas, pode significar ‘vou
ali no banco, vou ali na praça...’; tem gente que vem lavar roupa... dependendo da
praça onde eu trabalhei, tem gente que vem lavar roupa tem que tirar as pessoas,
lavando roupa no bebedouro... tem gente que vem dormir na porta porque acha que
ali é um lugar possível de se dormir... tem gente que vem se drogar, porque acha
!
B;B!
que ali é um lugar possível para se drogar... tem gente beber... cachaça... tem gente
que vem transar, tem gente que vem vender o corpo... Então a praça pública não é
uma instituição, aonde as pessoas saibam quais são as regras de convivência dela...
Então, se um professor, que sai de uma escola, de uma instituição ‘milenar’, sei lá se
é milenar... secular, pode ser ... formado também para este tipo de atividade... e vem
para um espaço aonde não existe uma instituição, aonde os usos os mais diversos...
então,..., quer dizer... precisa dizer mais alguma coisa? [Risos, sugerindo obviedade]
Eis a grande dificuldade, eis a grande diferença – pode até não ser a grande
dificuldade: pode até ser a grande facilidade; para mim, é a grande dificuldade... Mas
vamos colocar assim: eis a grande diferença, esta é a primeira grande diferença.
ISMAEL: Bem, Suzana, neste encadeamento, nesta teia, eu te pergunto: que tu
pudesses descrever o teu processo de formação, desde a formação inicial, ou seja
o que te conduz a uma faculdade de EF, como é que esta formação se relaciona
com a tua vida profissional, com o teu fazer profissional? E, na sequência, como é
que identificas os processos de formação? Eles efetivamente sustentam as tuas
práticas? E muito importante quando tu colocas este conjunto de desafios, como
tu fizeste agora o que sustentou... ou o que não sustentou, do ponto de vista da
formação, os teus desafios, as tuas dúvidas, as novidades que esta praça repleta
de... vou tentar te parafrasear... de não-significados, de não-tradições do ritual
escolar: o que te sustentou na hora do “agora é comigo”?
SUZANA: Bom, começando pela formação, eu acho que é lugar-comum esta história
de: “eu sempre fui do esporte, sempre gostei, era desta coisas que me dava prazer
de fazer e estar com grupos de...” Realmente, eu sempre gostei de dançar também:
era a musica e a dança sempre foram atraentes, atrativos, mágicos... então, estas
práticas da adolescência e da infância até, traziam o esporte e os professores e as
professoras de EF que eu tive como o grande ‘tchan’ da minha vida: achava um
mundo muito maravilhoso, muito atraente, muito direto, muito claro, muito
transparente, muito ‘pão-pão, queijo-queijo’... eu até brinco, aquela coisa da história,
toda cheia das análises, aquelas coisas muito cheias de curvas... nunca me foram
muito atraentes... apesar de eu me considerar uma pessoa reflexiva, não acho que a
minha cabeça seja apenas uma bola... é também uma bola [risos] mas também tem
outras coisas, convivendo e rodando junto com esta bola lá dentro da minha cabeça.
Então, eu não me considero aquele protótipo da pessoa que é músculo e não
pensa e não fala... e mesmo, na adolescência eu era bastante engajada em grupos
de jovens, em coral... então a vida não era uma quadra e uma bola: eram coisas
que me faziam pensar sobre o mundo e sobre as coisas. Na hora da opção para que
vestibular, claro que tentei medicina na UFGRS: não estudei nada, dei graças a
Deus que não passei porque era uma tremenda pressão familiar aquela velha
pressão de que ‘alguém tem que não ser professor’ – toda a família era professora e
não sei porque, mas toda família de professor, todo mundo é professor mas o 1
o
que
for fazer vestibular a gente diz: “não faz para ser professor!” Bem, comigo aconteceu
a mesma coisa, todo mundo era professor mas ninguém queria que eu fosse e eu
!
B;=!
sempre quis ser: então, a minha 2
a
opção foi EF e graças à Deus, passei e nunca,
em tempo algum quis ser outra coisa; várias pessoas com quem eu convivi, já
tiveram dúvidas, crises... olha, eu tenho a sorte de ter passado esses meus mais de
30 anos de magistério e acho que acertei e muito bem, muito obrigada. E continuo
dizendo que se não fosse professora de EF, seria professora de EF... não consigo
me imaginar fazendo outra coisa. E eu acho que na época da faculdade, a respeito
da minha adolescência já, pensando nas coisas e no mundo... grupo de jovens,
aquelas coisas da igreja mais progressista, uma igreja questionadora, que não é
aquele catolicismo crente que é só... e eu vinha com a semente, aquela, da
esquerda, entre aspas, no sentido de que ‘alguma coisa está mal neste mundo e
alguma coisa tem que mudar’. E chegou na universidade, eu tinha professores na
época muito da Escola Nova, do processo pedagógico não ser aquela imposição...
então, toda esta conjuntura da historia do mundo, que está mudando e as pessoas
que estão dentro dele, vão vivendo de fato e não de brincadeira, percebem que as
coisas têm que ser diferentes, têm que mudar e começam a pensar bom: “daqui
deste bolo todo, o que eu posso aproveitar que tem a ver com o que eu estou
pensando?” Então, na verdade, no final da EF, a gente já tinha toda aquela semente,
aquele ‘formigamento’ ... já estava em cima deste formigueiro que é: que educação é
esta? Para que serve o conhecimento que temos, que ‘ganhamos’, que deu toda
esta polêmica aí... enfim, para que serve este conhecimento... Então, eu me formei
em 1980, em cima deste formigueiro, ele fazia parte da minha existência, se eu
parasse, as ‘formigas me comiam viva’... então eu tinha que me movimentar. E isto
significava me movimentar de verdade: era não ser uma professora acomodada, era
quebrar com todos os paradigmas aqueles do professor de EF que ‘pegava um
jornal, sentava numa cadeira e dava uma bola’... era quebrar com aquele paradigma
de que o professor ‘é a autoridade e o aluno não é nada’, o ‘aluno é um sujeito do
saber’... então, eu me via envolvida nestas quebras de paradigmas todos... num
projeto de escola, muito mais do que um projeto de conteúdo ou de sala de aula...
em trabalhar processo de conteúdo-aprendizagem como uma coisa envolvida na
vida da sociedade, no mundo e não dentro da carteira escolar... então, todos
estes paradigmas educacionais que foram trazidos no período da Nova Escola
eram aqueles que me formaram e que, de certa forma, faziam parte do meu mundo
do rock&roll, do meu mundo do esporte, do meu mundo ‘igrejeiro’ dos grupos de
jovens no sentido mais questionador e transformador da sociedade... enfim, é neste
formigueiro que eu estou sentada a minha vida inteira. E esta formação, ela vem, na
EF, ela não dava muita resposta para isto... quer dizer, estas inquietações não era o
mundo da EF que trazia, teoricamente constituído como uma possibilidade de
fazermos diferente: o mundo teórico da EF ainda sempre era o mais... eu não quero
dizer atrasado, a palavra traz... ele era mais resistente a quebrar paradigmas; o
grupo teórico da EF era, no meu ponto de vista, bastante resistente a quebra da
questão da autoridade, a questões... “bom, eu sou especialista em vôlei... eu sei a
sequência pedagógica, eu vou ensinar vôlei, basquete ou futebol... que história é
esta de ele ser sujeito dele mesmo? Ele tem que vir e fazer o treinamento e eu sou
treinador e ele tem que ir lá...” Então como é que eu vou quebrar isto? Como é que a
!
B;C!
gente vai ensinar o sujeito... ao movimento da cortada, a fazer um bom toque, uma
boa defesa em manchete... ou uma boa defesa no gol... e ele ‘ser sujeito’? Então, a
gente era mais alimentado e começou a ter força pelo pessoal da pedagogia, que
até então não tinha... ou era professor disto ou professor daquilo... pedagogo era
nada... o pessoal da pedagogia começou a ganhar espaço e a buscar textos que
buscassem a tal da multidisciplinaridade, que veio antes da transdisciplinaridade...
então era aí, na questão da multidisciplinaridade que quem tinha mais inquietação,
buscava o seu alimento teórico. E por sensibilidade de alguns teóricos a EF
começava a ser colocada nestes textos teóricos da multidisciplinaridade como uma
coisa importante e isto, claro, sustentava a gente: “puxa, se afinal eu sou um
profissional da EF, eu sou vinculado às coisas do mundo e da transformação do
mundo, tem um grupo que não é da EF, mas está trabalhando com tudo isto que
eu acredito, e alem disto, diz que o que eu faço é uma coisa importante? Então eu
vou com eles!” Então, foi assim que eu fui com eles, fui com eles no sentido teórico,
eles que eu quero dizer, com as pessoas que eram fora da minha área... que não
estavam na EF e no movimento esportivo. Então foi a partir destes textos e desta
conjuntura de busca pedagógica e de acreditar nestes paradigmas, é que então eu
comecei a encontrar mais subsídios para a EF. Ainda era uma posição de um grupo
da EF que não se constituía como EF: a partir deste movimento dos
‘multidisciplinares’ por e desta coisa do movimento e do corpo ser colocado como
uma coisa importante na aprendizagem... e do professor [de EF] ser valorizado na
escola, e da EF ser colocada então como uma coisa importante no processo
inclusive de alfabetização... inclusive, neste período, abriram muitas aulas de EF de
1
a
à 4
a
série, que não tinham... as escolas privadas começaram a abrir um mercado
muito grande para os professores de EF, que antes não tinha era de 5
a
à 8
a
que
era obrigatório então, além de tudo, o mercado de trabalho do professor de EF
começou a ampliar em função disto. Junto deste movimento, começou aquela coisa
da cultura do corpo... e o movimento todo ecológico, tudo tinha que ser mais limpo,
inclusive o próprio corpo... então as academias começaram a proliferar também,
num modelo americano de saúde, neste trabalho mais aeróbio... e o pessoal da
Europa, que vinha com alguns teóricos tratando da não-ginástica, da anti-ginástica,
que juntava o pessoal da yoga, juntava este pessoal que a gente chama... mais ‘zen’
da EF... então, todo este movimento começou a criar dentro da EF os teóricos que
pensassem... a EF de um modo diferente. E começam a aparecer trabalhos que,
mais especificamente dentro do mundo da EF, vão ajudar a refletir o fazer do
professor de EF. Isto é que deu subsídio para começar a pensar um trabalho de
parque e praça vinculado realmente a EF e que tivesse alguma a ver com o mundo
da educação; porque, na verdade, se a gente fosse pensar a partir da instituição
[DERP, SERP] não teria resposta: a resposta, do meu ponto de vista, ao desafio ‘e
porque’ e ‘como’ eu consegui, como profissional, me encontrar num trabalho de
parque e praça vinha por aí, por esta questão multidisciplinar, do processo ser mais
global, que a educação seja uma coisa mais inteira, que as pessoas sejam sujeitos
do seu fazer... então é esta abertura, é esta quebra de paradigma que quebra, na
verdade, um pouco com a questão institucional: porque diz para a instituição
!
B;D!
“olha, instituição, tu tens que mudar, porque esta resposta institucional não está
dando certo...” que abre a brecha para a gente pensar a educação não-formal, no
meu ponto de vista. É esta quebrada da instituição que abre a brecha para pensar a
educação não-formal e eu acho que é que começam a vir as escolas abertas...
pelo menos nessa experiência nossa do município de Porto Alegre. E que é,
verdade isto: as respostas para as dificuldades se fazem a partir da reflexão e do
pensar em conjunto... e isto é que me deu fôlego para continuar, a achar que valia a
pena um processo educativo num parque público, num espaço público tão diverso e
tão sem representações, símbolos e significados formais. E também, dentro da
SME, a gente tinha acalmado um pouco... eu acho que era o... 2
o
mandato... já
era o 2
o
mandato, então as pessoas que tinham perdido um pouco o poder, e que no
1
o
mandato ainda lutavam muito, acho que disseram: “ah, nós vamos ter que
aguentar esta porcaria aí, vamos nos acomodar...”[risos] ... e as reuniões
puderam começar a tratar mais estas coisas dos fracassos pedagógicos, como que
a gente trabalha no espaço não-formal... E a dar mais ouvidos às pessoas do mundo
da EF que pensassem o mundo da EF de uma forma mais ampla, com um corpo de
profissão que não fosse aquele do professor de tal especialidade: que fosse
alguém que tratasse de outras coisas além – que não deixasse de ter valor o
professor de especialidade mas que tratasse de outras coisas também. E aí, a gente
conseguiu ter um período na Secretaria de reuniões um pouco mais específicas,
aonde se tratavam destas coisas... haviam grupos que tratavam das questões
específicas do esporte, enquanto desenvolvimento para a cidade e grupos que
começassem a pensar este fazer mais cotidiano, de uma praça onde a gente chega
e tem um ‘cara’ dormindo na porta, onde o grupo hoje está, amanhã não está, de
quando chove não tem lugar onde dar aula, enfim todas estas dificuldades...
ISMAEL: A tua fala instiga a próxima pergunta, a próxima busca de um
aprofundamento. Tu mencionaste, não digo ainda uma categoria, mas um eixo de
reflexão, que eu tenho buscado no estudo, que é – a prática docente na SME repleta
de diversidade, uma possibilidade de diversidade; isto surge no próprio tecer de um
histórico da instituição, no próprio levantamento do dão empírico na quantidade de
atividades distintas que hoje ocorre na SME... e que de certa forma se como um
quadro comparativo com o fazer da EF na escola, como tu mesma mencionaste.
Então, que tu pudesses, ao tocar em que características são estas desta prática
docente da SME, tocar também na tua percepção sobre esta ideia diversidade, no
cotidiano da SME.
SUZANA: Bom, vamos fazer a ponte com a escola, para a gente ver as diferenças e
então estabelecer melhor esta diversidade. Na escola é possível para um
professor de EF chegar – bom, se ele está trabalhando com criança pequena, ele vai
fazer um trabalho com criança pequena mas vamos pensar assim, na linha da
disciplina: matemática, geografia,..., EF: o professor de EF pode chegar, se não tiver
organização na escola, ele pegou a 5
a
série, deu vôlei; 6
a
dá vôlei, também; na 7
a
,
também e está tudo lindo e maravilhoso. A professora de matemática se não
!
B;>!
ensinou a tal da... aquela que todo mundo odeia... a trigonometria, a da série
seguinte dia: “ah, mas tu não ensinaste trigonometria... puxa, no mínimo
trigonometria eles têm que saber...” e alguém tem que ensinar. Então esta questão
curricular da escola é bem diversa na atividade do professor de EF; enquanto que
nas outras disciplinas existe um certo... vou dizer um certo porque tudo é conjuntura,
é avaliação,... vamos supor um mundo ideal... enquanto nas outras disciplinas existe
um certo grau de organização curricular, aonde o sujeito diz: “não, eu vou dar aula
para a 5
a
série porque eu trigonometria não gosto... ou pois então, trigonometria eu
gosto; e há um acordo entre os professores, então ... na EF é mais livre este
negócio, assim... é possível a diversidade no sentido de que: se eu gosto de vôlei,
dou vôlei; se eu gosto de dar basquete, eu dou basquete... e a gente uma
combinada, e tudo bem: eu sou do basquete na 5
a
, mas eu não estou a fim, eu dou
um futebol e fica tudo certo, entendeu? Ninguém vai me cobrar por causa disto... Eu
posso ser um profissional com uma prática não-exclusiva de determinado
desporto; ou seja, é uma disciplina que permite... a atividade corporal permite esta
liberdade de tu: “olha, vamos fazer expressão corporal, vamos fazer ginástica,
vamos fazer não sei quê...”; então, é por si, uma disciplina com uma atividade
cotidiana diversa; e até, com o meu grupo de vôlei, eu posso um dia chegar e dizer
que hoje nós vamos trabalhar corrida; ‘mas como, corrida?’ ‘sim, corrida, porque nós
precisamos trabalhar impulsão e então...’ e eu trabalho corrida e corrida é atletismo.
Então, neste cotidiano eu posso ser um profissional que estou diversificando, na
parte mais popular da palavra diversificação. Mas na parte da SME, eu vejo o
seguinte: existem dois aspectos que eu gostaria de ressaltar. O 1
o
é: realmente, se a
praça pública, se a SME não é uma instituição onde sai todo mundo saiba o que tem
que acontecer, é terreno fértil para a diversidade por quê não ioga? Por quê não
ginástica olímpica? Pro quê não patins? Por quê não meditação? Por quê não...
biodança? Por quê não vôlei, futebol, basquete? São todas atividades corporais,
todas elas trabalham aspectos do desenvolvimento motor, da percepção corporal,
das valências físicas... quer dizer, em todas estas modalidades tu podes trabalhar
todas as valências que são as desejáveis para o desenvolvimento físico do sujeito;
todas elas trabalham com algum processo cognitivo, porque todas elas vão
necessitar que o sujeito pense, repense, repense... então por quê não esta
diversidade? Então na SME acontece muito isto porque é uma instituição que
permite... não é a instituição escolar: ela não tem uma ‘a instituição’ a instituição
dela é o esporte, a recreação e o lazer, esta é a instituição – é o esporte, a
recreação e o lazer puro! Quer dizer, ‘puro’: no sentido de que... tudo pode; este é
um movimento. O outro movimento político é o seguinte: dependendo da conjuntura
política, dependendo do meu movimento como profissional, as coisas podem se
casar, ou seja: eu sou uma pessoa que sempre gostei do futebol então por quê
não o futebol? E se quem está na administração acha que futebol é importante,
então eu vou apresentar um projeto de futebol porque ‘vai dar tudo certo para mim’...
porque eu gosto de futebol, eles gostam de futebol, eles acham que é importante,
apresento um projeto de futebol e o futebol vai... Então, esta diversidade na SME
começou muito assim: muito mais do que um processo de direção política de “vamos
!
B;?!
diversificar” mas pelos profissionais que chegavam na instituição e viam que havia
este espaço aberto e... propunham. Então os projetos que hoje existem, eles
partiram, na sua grande maioria, não da ‘cabeça política’ mas sim da experiência
profissional dos professores: eram eles que com a sua experiência, o seu desejo, o
seu gostar, propunham para a administração que era aberta [entonação sugerindo
ênfase], no sentido de “vamos criar uma Secretaria, estamos criando uma
Secretaria, precisamos dar respostas para todo mundo...” e aceitavam isto. A
migração, e a gente pode ver que é uma migração, que as vezes um certo
incômodo, é que a migração mais para o adulto do que para a criança, é... passa
a ser normal. Pro quê? Porque a Secretaria, quando foi criada, estava muito forte a
questão do OP
71
, das organizações comunitárias... quem participa muito disto são os
adultos... então, o professores que vem e percebe que existe uma grande demanda
de adultos, que são ouvidos pela administração a administração inclusive diz que
“eles é que são importantes de a gente atender” começam a perceber uma
brecha para colocar o seu atendimento nestes grupos, que são os grupos que estão
reivindicando; e como o serviço público está sempre deixando a desejar falta tudo
para tudo então não tem problema, eu vou atender um grupo de adulto... e se tiver
um grupo de crianças que não estiver sendo atendido, não tem problema nenhum
porque ‘afinal, a gente nunca vai atender todo mundo e todo mundo sabe disto’.
Então começa toda uma luta de prioridade política, de prioridade pedagógica, não
sei se eu fugi do assunto... [ISMAEL: “de maneira nenhuma!]. Mas é que se
estabelece esta diversidade: ela se estabelece de fato por duas vias: uma pela
natural, pela profissional e se diria pela via do intelecto, pela via do ‘mais em cima’
‘mais em cima’, no sentido das coisas, das conjunturas, do movimento do mundo – e
também pelos interesses: dos profissionais que ali estão e ocupam os espaços que
lhes são abertos e concedidos. Este é um movimento que pode ser maravilhoso,
mas também pode pulverizar e pode deixar, por algum tempo, dificuldades de se
estabelecer afinal: ‘quem somos nós e para onde nós estamos indo’ uma coisa de
“corpo”: esta diversidade, ao mesmo tempo que ela é rica, que ela vem a atender
estes dois veios de necessidades, quer dizer da população e do professor ela,
ao mesmo tempo, faz com que as pessoas que estejam na administração e na
condução deste processo tenham que “rebolar” para constituir um “corpo docente”,
porque um corpo docente é mais fácil de ser levado quando são 3, 4 ações, todo
mundo sabe disto, “vamos dividir isto aqui...”: quando começa a abrir, começa a
complicar – controle, coordenação... inclusive resposta teórica para tudo isto...
ISMAEL: Uma coisa que surgiu, quase como um desafio, ou uma inquietação da
própria banca na apresentação do meu trabalho, e que eu imediatamente incorporei
às minhas inquietações, é o pensar uma disputa de conceito e que talvez não seja
sequer uma disputa... mas eu gostaria de te ouvir, de ter a tua reflexão: como te
parece e eu agora vou chamar intencionalmente este coletivo de...profissionais
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
71
Sigla de Orçamento Participativo.
!
B;@!
de EF: estes profissionais atuam como professores no seu fazer cotidiano ou como
animadores sócio-culturais?
SUZANA: Eu acho que tem de tudo e ... eu acho que tem espaço para tudo. Acho
que alguns professores têm um perfil de animador cultural, acho sim... E acho que
tem espaço para tudo, porque em alguns momentos, em algumas atividades de
massa de massa, que eu digo, grandes públicos, grandes eventos... a
necessidade de um animador social, sim. E por quê não um professor de EF nesta
função? Até nem acho ruim... eu acho ruim se for exclusivamente isto: uma
Secretaria exclusivamente de animadores. Acho que perderíamos muito na questão
do processo educativo mesmo, dos sujeitos, da cidade, do mundo... acho que a
gente poderia tranquilamente conviver... e acho que existe professor que é professor
mesmo, que faz aquele trabalho de receber um sujeito, seja ele criança, jovem,
adulto ou 3
a
idade e enxergar esta pessoa que está ali para ter um processo de
aprendizagem... sendo ele um processo ensino-aprendizagem relacionado com a
sua ação corporal – acho que existem profissionais que fazem isto, tanto com
criança, com adulto como com 3
a
idade; é um trabalho de educação, sem dúvida
nenhuma, porque: ele é sistemático, ele tem uma sessão de tempo específico, ele
tem um grupo que tem uma durabilidade ou seja, ele começa em março e vai até
dezembro, é uma ano... a gente não vai chamar de ano letivo mas é um ano no
processo de aprendizagem ele ministra uma sessão com um conhecimento
específico da atividade que ele está exercendo, seja numa aula de voleibol, seja
numa aula de ginástica, seja numa aula de qualquer tipo de aprendizagem corporal,
atletismo, futebol... Então ele está exercendo uma atividade pedagógica educativa,
existe aluno e existe professor e existe processo ensino-aprendizagem, existe
[expressão de ênfase]... e este mesmo professor pode, ao final de semana, ser um
animador cultural, com a mesma tranqüilidade, sem precisar ‘botar no lixo’, ao
contrário, ele pode pegar este processo todo dele, educativo, e enriquecer
sobremaneira a animação cultural dele; pode ser um professor que tem seus grupos
sistemáticos durante a semana e pode ser um animador cultural em pequena escala.
E mais: ele pode ser ‘o professor!’ e pode vir um outro, de um outro lugar, e ser o
animador e ele estar junto... e colocar a serviço deste animador o seu processo de
vínculo e de aprendizagem e de relação que se estabelece entre aluno e professor
durante a semana. Não precisa ser ele o animador cultural do lugar, ele pode estar
dando a aula, e pode chegar outro que seja o animador cultural e ele pegar esta
coisa toda que ele trabalhou durante a semana e colocar à serviço de: ou seja, estar
junto com... e a aí o processo ser maravilhoso. Não acho que competem, não acho...
esta coisa de competir: ‘o que eu faço, o que tu fazes...’ é estritamente vinculada ao
mercado de trabalho... eu acho que o profissional de EF pode ser menor sendo
professor e pode ser menor sendo animador: quero dizer, ‘ser menor’ no sentido
de... ser menos valorizado ou menos competente. E ele pode ser um cara que não
está mais a fim daquele processo de ensino-aprendizagem no sentido do vínculo
sistemático semanal, mas ele permanece, se ele é um bom profissional, permanece
‘investido’ de professor; e ele pode, sim, ser um bom professor tendo um contato na
!
B;A!
vida com o sujeito – eu me considero professora ... dentro do ônibus: eu sou
daquelas tão... imbuída da profissão que as vezes acontece uma coisa dentro de um
ônibus e eu acho que eu sou professora e que eu não posso deixar passar em
branco... e de qualquer maneira, dou de professora. Na época que eu fiz a minha
casa, estava com obra, os funcionários diziam: “estas professoras...” porque dizem
que a gente quer mandar nos outros... mas não é que a gente queira mandar nos
outros, é achar que as pessoas pensar que educação existe, que educação é bom,
que faz bem para a alma, que faz bem para o mundo... então, eu acho que, sim: a
gente pode botar os estagiários de animadores culturais e é o que a gente tem
feito... –meio que “bota aqueles estagiários ali, que eles não estão nem sabendo
muito bem o que eles estão fazendo nem para que estão fazendo e...” jaleco neles,
e eles ficam fazendo que estão felizes e...acham que está tudo bem, tudo certo... até
pode ser que este tipo de animador cultural que a gente queira; mas na verdade, no
meu ponto de vista, o trabalho professor, o trabalho magistério, ele é tão importante
e tão profundo que ele pode ser ‘vestido’ na animação, na sala de aula, dentro da
instituição, fora da instituição, acho que ele pode existir sim, fora do espaço formal
da aula, ele pode ser considerado processo. Talvez, para o mercado de trabalho, a
gente tenha que melhorar isto... eu estou falando de uma instituição SME acho
que a pessoa não deixa de ser: ela pode ser um mau profissional em qualquer
lugar... e ser fraco, ser um professor fraco, ele vôlei mas não vôlei, ele
futebol mas não dá futebol... faz que dá ginástica, faz que é animador cultural, faz de
conta que... faz alguma coisa... Agora, enquanto corpo de Secretaria é possível a
gente ser as duas coisas sem se esvaziar, acho que isto é possível.
ISMAEL: Como tu vivencias a tua prática docente na SME? Com isto, ao que eu te
convido? Que aspectos da tua prática docente te motivam e quais as que te
frustram? Que tu pudesse falar um pouco do teu cotidiano, mesmo que este
cotidiano seja eivado de história... Dito de outra maneira, quais os aspectos são
facilitadores e quais são dificultadores do teu fazer na SME?
SUZANA: Bem, em 1
o
lugar eu acho que tem uma coisa que... eu sempre gosto de
começar por cima... considerando aquele formigueiro que eu dizia que me sentia
sentada, eu acho que eu continuo sentada, no seguinte sentido: eu pedi para sair do
Pq. Ipanema neste final de ano; trabalhei 4 anos ali e ...trabalhei com adultos, com
adolescentes, com mulheres adultas, homens adultos do futebol futebol eu não dei
aula mas estava ali, coordenando aquelas coisas de rodada de futebol, rede, bola,
reunião com os homens do futebol, aquelas coisas de liga de futebol, que não tem
nada, que em Ipanema morreu tudo... mas de qualquer forma, sempre tem os
malucos que gostam da várzea e querem jogar e a gente sempre tem alguma coisa
para fazer com eles ou por eles ali de forma incipiente e frágil, do meu ponto de
vista, nestes últimos 4 anos tinha um grupo de ginástica de mulheres, que eu
considero que foi o grupo que me deu ‘gás’ para ficar, porque eram mulheres que
vinham, faça chuva, faça sol, eu não deixava de dar aula, ao ponto de ter que botar
uma regra: bom, dou aula para 2, se vier 1... porque teve uma vez que vinha só 1
!
B:;!
e aí, depois desta regra, no mínimo sempre tinham 2, porque uma ligava para a
outra e vinham, mesmo com chuva; que foi o que me sustentou ali naquele parque,
nos últimos 4 anos... porque elas sempre estavam lá... faça chuva, faça sol, então
eu sabia que valia a pena eu ir para para aquele lugar que muitas vezes,
principalmente agora no final, eu tinha vontade de não ir mais, tanto que pedi para
sair. Bom, eu trabalhei com criança também, teve um período que eu tive um time de
vôlei legal, a gente até foi se expor naquele campeonato municipal da SME... os
guris lá, bem magrinhos mas valeu como experiência; eu, técnica, nunca fui,
sempre fui professora... porque no nível do técnico acho que exige mais do
profissional, não que... por exemplo, eu vou colocar isto até para ilustrar a coisa
anterior do animador e do professor: por exemplo, na SME tem espaço para quem
quer ser técnico, eu acho... existiria uma boa possibilidade de trabalho para quem
quer ser somente um técnico; e ... o cara que é técnico não deixa de ser um
professor... só que ele está num outro nível; eu não tenho capacidade de ser
técnica, primeiro porque não gosto desta coisa... não gosto mais, fui atleta desta
coisa de olimpíada, de medalha, fui até para os Jogos Brasileiros, eu era atleta
mesmo, fui até para Brasília, passei 30 dias, na época de adolescência, fui da
seleção gaúcha de ginástica rítmica desportiva em 1973, imagina... enfim, posso
dizer que tive a minha experiência no esporte de alto rendimento, não é? Então, este
mundo não é o que eu gostaria de ter mas acho que não teria problema nenhum de
conviver com um profissional desta linha, que ganhasse a mesma coisa que eu,
tivesse uma equipe e fizesse um bom trabalho, muito bem feito, ‘muito obrigado’
e acho que ele estaria sendo um professor. Eu sempre gostei de ser aquela dos
fundamentos básicos... eu posso tranquilamente dar uma aula de vôlei para quem
não sabe ou para quem joga mais ou menos... já para quem joga ‘tri’ bem, eu posso
dar uma aula, prescrever um treinamento, posso... posso dar uma ‘inventada’ ali,
tenho algumas coisas para fazer com aquele sujeito ali, para ele aquecer, para ele
treinar o toque dele... mas mais do que isto não me pede, porque eu não sou uma
pessoa que me arvoro a isto; basquete, idem e assim com os outros esportes... acho
que tem espaço para todo mundo. Mas eu quero voltar é ao ‘formigueiro’: então,
com as crianças eu trabalhei a recreação, que parece que não é nada... recreação é
o lugar que mais parece que não é nada da EF... porque, na verdade, tu não és
nem professor nem animador, porque tu estás ali recreando aquelas criancinhas
pequenininhas... então, eu considero a recreação ‘o não-lugar da EF’... e agora, no
final da carreira, me vejo indo para o ‘não-lugar’ a recreação e na história do
formigueiro é isto: eu, quando vinha no final do ano trabalhando com aquelas
crianças de 3, 4, 5, 6 anos, trabalhando a recreação, eles me adoravam, eu adorava
eles, eu comecei a criar vinculo eram seis, seis só; às vezes eram quatro e
às vezes eram dois, eram ‘pobres, pobres, pobres, de marré, marré, marré’: eu
chamo pobre aquele do chinelo de dedo gasto no dedão e no calcanhar... não tem
maior coisa que descreva para mim a pobreza hoje em dia: é uma criança chegar
com um chinelo gasto no dedão e no calcanhar... puxa, porque o sujeito não tem
dinheiro para comprar um chinelo de dedo .... aquilo, para mim, é o símbolo da
pobreza... pois, não é o ‘havaianas’ este que é o símbolo do Brasil? Então o
!
B::!
havaianas gasto é símbolo da pobreza do Brasil... Enfim, o formigueiro meu continua
porque quando eu comecei no magistério eu tinha gente nesta situação... e hoje eu
estou terminando o magistério e continuo tendo gente nesta situação, então ... eu
não resolvi nada, não é? O que eu fiz da minha vida? Nada, não é? Entende? É
neste sentido do formigueiro maior: ora, para que serve esta ‘bosta’ de EF e da
educação? Se eu continuo tendo o aluno com o chinelinho de dedo gasto? Então, na
verdade, é um grande enigma, este... de: para que serve a educação? Na
instituição, a gente ainda tem: “ah, o cara tem o ‘diploma’ [como decorrência da
instituição formal – escola]: vai ser empacotador do Zaffari... pelo menos tem alguma
coisa...” E na praça, dia o quê? Ele não tem o diploma... aí, alguns amigos, que são
historiadores, trabalham na UNISINOS, pessoas que vivem pelo mundo viajando...
eu estive numa janta com uns amigos da UNICEF, que trabalham na UNICEF, umas
pessoas ‘cheias de gás’ achando que estão mudando o mundo na UNICEF e uma
professora disse: “Ai, eu estou me aposentando e continuo achando que eu só estou
trocando de pobre...” dizem: “não, mas o que é isto, Suzana... que bons
momentos tu deste para aquelas pessoas...” porque a gente quer saber, afinal, o
que a gente está fazendo no mundo? Para que serve a nossa profissão, não é? Por
isto, que alguns vão para serem técnicos, pelo menos serve para alguém disputar e
ganhar uma medalha, pelo menos alguma coisa tem! Então, por isto... e eu não sei
se nós estamos fugindo muito da discussão... mas esta necessidade a SME ainda
tem: afinal nós estamos ali fazendo o quê, para quê? Nós não andamos de ‘toga’, na
praça o grupo vai e o grupo vem; então, alguns profissionais que são vistos como os
mais rígidos, os mais resistentes, os mais retrógrados, por outros que têm uma ideia
de mais... porque na verdade, no meu ponto de vista, eles têm esta necessidade
concreta... eles estão numa EF ‘concreta’: “eu tenho que ver o sujeito diminuir o
abdômen, eu tenho que ver o sujeito perder peso, eu tenho que ver o sujeito sair
jogando vôlei, eu tenho que ver o sujeito sair ganhando uma medalha, eu tenho que
ter a concretude do meu trabalho!” É difícil para o profissional que passou o ano e
ele não fez nada, entendeu? Passou o ano e nada aconteceu... Então esta coisa do
animador cultural versus o professor é um pouco esta briga... de quem tem suporte
para suportar uma vida profissional que onde parece que não fez nada... “nada
aconteceu com o mundo... não fez diferença nenhuma se tu estavas ali, trabalhando
numa praça pública ou não...”: o mundo continuou, muito bem... muito obrigado...
[bate as mãos sugerindo uma sensação de indiferença, de um ‘tanto faz’] e tu,
terminou, passou quatro anos e tu... não fizeste nada... não fizeste nada para
mostrar, a não ser alguns números de... ‘25 alunos do sexo masculino, 31...’ [tom de
voz sugere inconformidade, indignação] ninguém vai ver, tu podes mentir naquela
folha horrores que ninguém vai lá ver, ninguém vai lá ver se é, se não é, se estão, se
não estão... então, me perguntas o que é que me sustenta... olha, me sustenta
acreditar que eu sou professora se é que isto serve para sustentar alguém
acreditar que parece que aonde eu estou parece que eu sou professora’[risos]...
parece que tem alguém interessado naquilo que eu quero dizer ... parece que eu
consigo enxergar as pessoas e ver que elas podem melhorar em tal aspecto ou
não... então, me sustenta muito esta coisa lá de cima, do início da minha carreira – e
!
B:B!
isto me sustenta até hoje se eu tivesse alguma dúvida se eu estivesse em algum
lugar errado, eu já não estaria mais me sustentando... eu acho que eu estaria
naquela de ‘me sustenta o meu salário”... que eu acho péssimo porque se só
sustenta o teu salário, tu estás ‘ralado’...[risos, novamente]. Me sustenta o grupo de
colegas, que são parceiros nas mesmas angústias e que em algum momento te
dizem: “mas isto deu certo comigo”; “bah, deu certo com o sujeito, então pode ser
que amanhã dê certo comigo...” “Ah, mas choveu e não veio ninguém”, “puxa,
também para mim não veio ninguém, então não sou eu, tem outro também que
não veio ninguém;” Então, esta falação me sustenta... E me sustentaria muito mais,
com muito mais qualidade uma administração que pensasse tudo isto, que
acreditasse em tudo isto e que tivesse conseguido manter um corpo de Secretaria,
que eu acho que isto nós estamos perdendo... Nós temos membros... se é que
temos... acho que talvez possam ter dois pés, duas cabeças, três braços... não sei
se existe ‘um corpo’, no sentido de um corpo mais filosófico de todas as partes
estarem integradas e cada uma ter a sua função. Acho que isto a gente perdeu um
pouco ... se é que um dia a gente teve, entendeu?... Na verdade, talvez isto seja a
busca por uma instituição, esta busca deste corpo seja a busca por uma
instituição...eu não sei... vejo todas estas coisas assim: que ao mesmo tempo que
sustentam, ao mesmo não sustentam... na verdade, numa praça pública sozinha... o
que te sustenta são os teus ideais, porque tu não tens ninguém do teu lado... tu
não tens uma Secretaria que te olhar... tu tens uma coordenação que te
cobrar... tu não tens um grupo que te alimentar... sustenta o quê, não é?
Sustenta, a tua vontade, o teu desejo de ser alguém, a tua capacidade de não te
deprimir... porque se tu tens uma facilidade de depressão... porque hoje em dia,
quase todo mundo tem, é o mal do século, não é?... se tu és uma pessoa deprimida,
se tu és uma pessoa que não tem bem certeza se era isto mesmo que tu querias na
tua vida ou, se tu estás começando a carreira, por exemplo, e tu não sabes muito
bem e te botam num trabalho de praça pública? Do jeito que nós estamos
constituídos enquanto Secretaria hoje? Tu não vês sentido naquilo, tu não vês
sentido nenhum. Eu, com toda esta reflexão, que passei por todas estas
instâncias ... muitas vezes me pergunto apesar de acreditar ainda... que seria
muito bom para o espaço público se a gente mantivesse um trabalho de grupo, de
‘corpo’ aonde a gente pudesse estar em todos os espaços abertos... a cidade seria
diferente... mas a gente entrar numa outra discussão que é a discussão que foi
da minha dissertação, que a história do espaço e da cidade: do esporte e da cultura,
do espaço e da cidade. Como é que a cidade está se enxergando neste negócio?
Daí, é outra coisa, que envolve SE
72
, Secretaria de Planejamento,... ah, daí o
‘buraco é mais embaixo’, ou mais em cima, não sei dizer... Mas como professor, o
que sustenta é um corpo e uma reflexão e um estudo e um trabalho pedagógico. Se
não for isto, não sustentação e o trabalho vai morrer... senão for isto vai morrer,
porque, por exemplo, eu que já... tudo isto... estou pedindo para sair! Não quero
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
72
Secretaria de Esportes.
!
B:=!
mais ficar, passei 4 anos ali, estou querendo ir embora, não quero estar ali
sozinha, perdida porque eu vou me deprimir... e eu não estou afim de me
deprimir, entendeu? Porque tu não te sentes mais o que tu és: tu és um pouco
de ‘manutenção’, tu és um pouco de professor, um pouco de animador e ao mesmo
tempo... tu não és nada. Tu és um pouco de tudo, tu não és bem nada, ninguém
nada, a população coitada está ali assim daquele jeito... tu não és nada, ou seja, o
teu trabalho vale: ‘nada’, vale ‘zero’... Não sei se me perdi...
ISMAEL: De maneira alguma, tanto é que está fácil manter a linha de uma semi-
estrutura que norteia esta nossa entrevista. E nos encaminhando para o
encerramento dela, tu mencionas nesta última resposta o que seria o objeto desta
reflexão: formação profissional, agora no viés específico institucional SME: qual é a
relação, quais são as possibilidades... por quê eu menciono isto? Quando tu
disseste que no contato com os teus colegas, na troca de experiências com que
outros pares vivenciam, tu disseste que, de alguma maneira, isto é uma coisa que te
sustentava... Bom, isto como um processo intencional e institucional formação
profissional permanente SME como é que tu a percebes? Como é que ela se
relaciona com o teu fazer? Quando digo: ela se relaciona, é se ela espaço para
uma reflexão histórica, ou seja, não é como ela faz isto ‘hoje’ como é que, desde
que tu ingressaste na SME, este processo, existente ou não, dialoga com a tua
prática pedagógica?
SUZANA: Bem, nós tivemos na SME vários momentos, vários tipos de organização,
de grupo, de Secretaria mas, sem dúvida nenhuma, o mais importante de todo este
tempo, eu considero os momentos aonde havia uma frequência e uma sistemática,
uma preocupação com o fazer pedagógico. No sentido de buscar ter o processo
pedagógico – e tudo que ele envolve, as decisões que ele envolve – como a
prioridade, colocar isto como a grande prioridade da Secretaria; lutar por isto em
todas as instâncias, como a grande prioridade... e quando a gente conseguiu ter
parceiros que percebessem esta grande prioridade, tu consegues valorizar o fazer
da EF e a partir disto, desencadear uma série de relações com outras instituições,
com outras Secretarias, com força e com conteúdo. À partir do momento que a
gente na Secretaria percebe que esta relação que para algumas administrações é
muito complicado ter professor querendo mandar... porque é o formigueiro ‘aquele’,
ali, em pleno burburinho pensar uma proposta pedagógica sistemática,
consistente, permanente significa mexer no abelheiro, no formigueiro
permanentemente, ou seja, é viver em conflito, é viver em confusão. Porque toda
esta diversidade vai vir e vai querer coisas... e além de querer coisas, vai brigar: um
não vai ter clareza do outro, o outro vai querer chutar o balde, mais para um lado,
outro mais para o outro... então, por um lado, que pode parecer ruim
profissionalmente, que é esta efervescência... porque parece que tu nunca estás em
paz, parece que as coisas nunca estão no lugar, parece que a gente está sempre
querendo mais e mais... parece que isto é um nível de ansiedade muito grande e isto
não é bom para o trabalho, como o é bom para a vida, por outro lado, isto surte
!
B:C!
efeitos para a comunidade, que eu considero maravilhosos; e surte efeitos para a
EF, de irradiar e de emanar coisas posições, contatos de forma assombrosa,
considerando o mundo da EF. Então, eu acho que isto ao mesmo tempo é ruim e ao
mesmo tempo é o que faz a gente avançar; o bom seria se a gente pudesse – dizem
que a teoria da vara existe, vem para um lado, vai para o outro até chegar ao
equilíbrio este equilíbrio eu ainda estou para ver [risos]: esta vara, ou o equilíbrio
vai bem para um lado, ou então vai bem para o outro e até hoje não parou. Mas
enfim, que a gente pudesse encontrar uma forma de sobreviver com esta oscilação
da vara, nem tão para um lado, nem tão para o outro, de maneira a ir levando de um
jeito que a gente tivesse momentos de calmaria e momentos de ebulição. Na
verdade, esta Secretaria é muito ambígua: porque ao mesmo tempo que é bom que
ela tenha pouca gente, é ruim que ela tenha pouca gente; e é bom que ela tem
pouca gente porque a gente consegue fazer um processo de ebulição rápido, mas é
ruim que ela tem pouca gente, porque depois que a gente baixou a fervura, todo
mundo se espalha e não se consegue mais encontrar os frutos disto. É um processo
delicado, eu temo até pelo futuro... afinal nós estamos indo para onde? O governo
que nos administra quer bem o que da gente? Eu não tenho hoje clareza disto... não
tenho muita clareza do que a administração está querendo com a SE, realmente...
acho que estamos um pouco a deriva, neste sentido pedagógico... nós estamos indo
para onde cada um está remando e eu não tenho muito claro se a gente está
remando todo mundo para o mesmo lado, tenho as minhas dúvidas. Mas acho
que a formação permanente, para o professor, em qualquer espaço que ele estiver –
desde a academia, passando pela Secretaria é fundamental. Porque o professor
trabalha com o ser humano, com o sujeito e o sujeito todo mundo diz, a mídia diz,
está mudando assustadoramente, com a velocidade da internet; se o sujeito está
mudando com a velocidade da internet e nós, que somos professores, trabalhamos
com este sujeito... a velocidade com que a gente tem que revisar os nossos
processos, e os nossos instrumentos, e os nossos caminhos e os nosso percursos
tem que ser maior... porque se a gente quer educar, a gente tem que estar na frente:
se a gente quer estar na frente – na frente no sentido da análise – e este sujeito está
mudando na velocidade da internet, se a gente não tiver processo de formação
pedagógica permanente, eu não sei... eu acho melhor nem ter professor, é melhor
deixar ele na frente da TV... porque nós vamos nos tornar pessoas obsoletas, o
nosso processo vai ser arcaico, aí nós vamos ser como ‘peças de museu’, para
contar para as pessoas ‘como era antigamente’ - se a gente não fizer este processo
permanente. “Olha, antigamente, a gente dava aula de ginástica assim, dava aula de
calistenia; aí, antigamente a gente passou para não sei quê...” os caras vão estar
adiante da gente sempre, enquanto mundo... se a gente não tiver permanentemente
pensando e repensando a nossa prática pedagógica; está certo que não precisa ser
de uma forma ansiosa, não precisa ser desesperada, não precisa ser tateando no
escuro, não precisa ser pensando que vai resolver todos os problemas do mundo
porque não vai, não precisa ser pensando tudo a todo tempo e a toda hora... Não, é
somente pensar o seu cotidiano, ali a gente pode ter uma estrutura que sustente um
trabalho de praça e parque para professores de EF.
!
B:D!
ISMAEL: Bom, eu encerro, Suzana, com uma pergunta daquelas que tenta fazer
uma amarra do processo de investigação acadêmica com o compromisso de
mudança que tu tanto referiste na tua fala. Tu bens sabes, assim como eu, de
quantas críticas o trabalho acadêmico tem, na medida em que parece ensimesmado
ou fechado nas suas aspirações do mundo acadêmico... sem com isto abrir alguma
porta, algum retorno para os sujeitos desta investigação. Então, eu encerro com a
seguinte questão, que tenta, pelo menos deixar uma dúvida no ar, uma inquietação
no ar... o que te ajudaria no teu trabalho na SME, na tua realização como
profissional na SME? O que tu não tens e que tu vês que poderia te ajudar na tua
prática da SME?
SUZANA: Primeiro, uma coisa sobre a academia: eu acho que o trabalho
acadêmico... existem 2 coisas que as pessoas misturam e portanto fazem a crítica à
academia e dizem que as coisas não servem pra nada... é mentira, existem 2 coisas
diferentes: uma é a coisa da instituição academia – é um mundo, a instituição
academia é um mundo e as pessoas criticam este mundo... bom, mas todos os
mundos têm as suas coisas para serem criticadas... têm as suas relações de poder,
tem as suas lutas, se perde em alguns momentos... e a academia não quer resolver
o mundo, ela só quer estudar, mesmo. E num país como o nosso, isto é um absurdo,
as pessoas não aceitam que existam pessoas que queiram estudar sobre as
coisas... e então, exigem que a academia tome atitudes e seja política... a
academia tem política? Tem, qualquer lugar tem política, tem luta pelo poder, quem
vai ser coordenador, qual o grupo de pesquisa que vai levar mais dinheiro, quem
não vai ter dinheiro, a que serve este conhecimento ... mas isto é uma coisa interna,
é o mundo acadêmico e a gente tem que deixar eles quietos, muito obrigado, quem
quiser que entre dentro, quem quiser viver esta instituição, que viva... Então, eu
acho que as pessoas misturam isto na crítica do trabalho acadêmico. Na realidade o
que as pessoas querem dizer é isto, que é proibido as pessoas quererem estudar
num país onde as pessoas morrem de fome, é isto... e eu acho que está errado, as
pessoas têm que querer estudar, sim e ponto, não querem fazer mais nada... eles
não querem ir para a praça e aguentar 3, 4 subnutridos, ranhentos e dar aula sei
de que: eles querem estudar sobre aqueles caras! Eles não querem estar na
vila, chegando lá, num domingo com aquele sol quente para fazer um evento, com
aquelas mães, com aquelas crianças e com aqueles pais que vão para se
encachaçar... eles não querem fazer isto, eles querem ir estudar sobre estas
pessoas. Qual é o problema? Eles querem fazer isto... e a gente: “não, não pode
porque eles têm que botar o no barro...” não, eles não querem botar o no
barro, eles querem estudar sobre o processo... E isto tem que estar claro para as
pessoas e a academia não tem que ter vergonha disto... no meu ponto de vista é
isto: academia é para estudar. Agora, vem o outro problema: a academia estudo e
produz conhecimento... e as pessoas que estão aqui fora, elas querem estudar?
Elas criticam os caras que querem estudar mas elas que estão aqui fora não querem
estudar, entendeu? Elas não querem pegar aqueles livros e lerem... e ler texto,
refletir... os caras que ganham a eleição: “ah, eu ganhei a eleição, que me interessa
!
B:>!
o que o cara escreveu sobre ‘o alho do bugalho’? Interessa aqui, quem vai ser o
meu conchavo político, para quem eu vou dar... se eu vou me manter no poder na
próxima eleição, se eu vou estar aqui, se eu não vou estar aqui...” Até faz um
seminário, congresso, para ganhar certificado, todo mundo, mas não está
interessando o que os caras estão produzindo teoricamente... “ah, foi aquele cara
que escreveu aquilo ali, aquele cara ali é vinculado à..., um dia trabalhou de CC
73
do
fulano, eu não vou ler nunca o que ele escreveu...” e ele pode ter conseguido
produzir uma coisa maravilhosa, entendeu? Então, na verdade, eu acho que não é
um problema da academia, é um problema da nossa constituição social, política... a
nossa política é ‘o fim’, é burra, é muito burra... e se alguém para pensar e refletir
sobre as coisas seria, no eu ponto de vista, obviamente, para iluminar os caminhos:
não para dar solução, mas para dizer “olha, todo mundo está dizendo isto, vocês
sabem que está todo mundo dizendo isto?” e a gente dizer: “puxa, que legal, estão
dizendo isto... mas será que é mesmo isto?” Então, este é o processo que não
acontece no dia-a-dia... Mas a pergunta não era bem sobre isto... ah, o que me
ajudaria, agora eu sei aonde eu queria chegar... O que me ajudaria muito se a gente
conseguisse, de alguma maneira, aproveitar toda esta produção acadêmica... que a
gente conseguisse, de alguma maneira, dar importância a esta produção
acadêmica... sem a gente se preocupar com o que os caras... se estão com o no
barro, com a mão no barro... eles não querem, eles querem estudar, deixa os caras
estudarem, entendeu? [riso] Me ajudaria muito se a gente conseguisse ultrapassar
esta barreira de ... da coisa política rasa, da cobrança à academia rasa... uma
cobrança que na realidade nos imobiliza, mantém aquela coisa do não ler nada... eu
atualmente estou lendo pouquíssimo com relação ao meu trabalho, quiçá nada...
porque nem nada me é proposto pela instituição, nem uma linha de reflexão... nem é
proposto nada que me diga: “ah, estes caras estão errados, o que eles estão
dizendo é uma barbaridade e eu vou e ... têm uns caras que escrevem muito
melhor que eles.” Nem para isto... então, no meu ponto de vista, a produção
acadêmica me serviria, profissionalmente, para isto: para concordar ou discordar de
alguma coisa; para ter coisas para concordar ou discordar, coisas para pensar... e
hoje, nem para discordar eu tenho... teve um tempo que a gente dizia: “ah, fulano de
tal escreveu tal coisa... ah, que barbaridade se ele acha que vai...” aí, a gente se
movimentava, movimentava o cérebro, não é? Que movimento de cérebro a gente
está fazendo, na instituição, no sentido institucional? Então, a academia serve para
fazer com que as pessoas movimentem o seu intelecto, que elas reflitam sobre o
seu cotidiano. Este são os meus desejos com os projetos, com os trabalhos
acadêmicos: que eles façam com que a gente movimente o nosso... não
formalmente, no sentido de que “o teu trabalho, especificamente...” não! A
existência desta instituição deve servir para isto. É claro, as pessoas dizem: “ah, o
teu trabalho acadêmico vai ficar lá numa pilha...” Tudo bem, vão ter 300, mas
alguma coisa destes 300 vai ‘respingar’ na gente, a gente não precisa conhecer
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
73
Cargo em confiança, alguns nominam como Cargo em Comissão.
!
B:?!
todos os trabalhos acadêmicos que foram feitos... é claro que vai ter um monte de
coisa que ninguém vai ler, óbvio, que maravilha que tenha um monte de coisa que
ninguém leia... mas que alguma coisa a gente leia, que nós leiamos alguma coisa,
que não seja o trabalho de todo mundo mas que sirva, para... o teu trabalho, por
exemplo, que ele sirva, na academia, na formação de professores, que as
pessoas saibam que existe um trabalho assim, que teve um processo, que tem
professores que pensam assim, e que assem a conversar sobre isto naquela
academia e ao formar professores que virão a formar o mercado de trabalho, estas
coisas estejam circulando, estejam circulando na cabeça das pessoas. No meu
ponto de vista é para isto que serve; não vai ser uma coisa assim: ‘aquele trabalho’
vai entrar na cabeça dos dirigentes da SE e os dirigentes da SE vão fazer reuniões e
vão nos dar textos para ler e... não espero mais isto... mas que ele sirva para
iluminar lá, pelo menos [meio acadêmico] e que, ao iluminar lá, que depois as
pessoas que circulem no nosso mercado de trabalho, estas coisas venham a chegar
na cabeça de alguém.
SUZANA: Te agradeço muito, e como em todas as entrevistas, ao encerrar eu
manifesto que ao longo do processo de transcrição, determinados pontos tenham
tamanha riqueza que tenhamos que ... desenvolver mais: foi tão rico que esta
reflexão aqui... que tu possas voltar a me ajudar, mantendo as portas abertas.
!
ENTREVISTA COM O COLABORADOR GUILHERME
REALIZADA EM 12/03/2009
HORÁRIO: 10h.
ISMAEL: Bom dia, prof. Guilherme, agradeço a tua colaboração com este estudo e
começo te pedindo para fazer uma breve descrição da tua situação funcional na
SME: aonde estás, que caminhos seguiste, como entrastes na Prefeitura entrastes
por concurso, entraste por que formato de concurso? Que tempos de instituição tu
viveste?
GUILHERME: Tu me pedes um breve histórico, não é? [Confirmo] É que talvez
não seja tão breve... [risos]. Vinte e poucos anos não é tão breve mas eu vou tentar
ser sintético Eu entrei por concurso público, quando entrei, fiz um concurso para
professor de EF
74
, naquela oportunidade ainda não existia a Secretaria Municipal de
Esporte
75
, era uma Supervisão de Esporte e Recreação Pública
76
dentro da SMED
77
,
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
74
Sigla para Educação Física.
75
Doravante representada por sua sigla, SME.
!
B:@!
então eu fiz concurso para a SMED e quando eu fui chamado... agora eu não me
lembro exatamente o ano... quando eu fui me apresentar para tomar posse, para ser
nomeado eu encontrei o Edgar Meurer, nos altos do mercado, que me convidou
ele nem me conhecia nem eu nem conhecia ele, fui ficar sabendo quem ele era
depois: na oportunidade, ele era o Supervisor me chamou e me convenceu a
trabalhar numa praça pública... nem sabia que existia isto em Porto Alegre
78
, porque
eu era do interior, vim de Santa Maria, estava há pouco tempo em POA... da
faculdade em Santa Maria e estava fazendo um pós aqui... e vim conhecer a
SERP [ISMAEL: era Supervisão, não era Departamento
?
] Foi bem naquele
período, no ano em que eu entrei era Supervisão mas um ano antes era
Departamento... foi naquela transição em que estava o Edgar, depois assumiu o
Bira, o Ubiratã, Hamilton também... em seguida, deu uma reviravolta, o Queiroga
ficou como supervisor 24h ele foi num evento lá no [Pq.] Ramiro [Souto] de manhã,
hastear a bandeira, de tarde já não era mais... mas enfim, aí é que eu fiquei sabendo
que tinha um serviço de recreação pública em POA. Comecei a trabalhar na Pc.
JJTT à noite... porque o quê me levou a trabalhar na SERP? Era que eu não
precisava largar as minhas duas escolas particulares em que eu trabalhava... então,
eu consegui fazer um horário à noite e fim de semana, eu dava aula à noite e fim de
semana; e aí, em 89, quando assumiu a Administração o Olívio [1
a
administração da
Frente Popular, coordenada pelo Partido dos Trabalhadores PT], o Weber
assumiu, eu estava bem belo em casa em fevereiro final de janeiro, início de
fevereiro e o Weber vai bater na minha porta porque eu tinha feito um curso de
pós-graduação com ele na UFRGS... e ele foi porque ele viu meu nome na
relação de professores que compunham a SERP e me chamou e disse: “vamos lá,
vamos juntos, vamos ver qual é que é...”, não tinha... conhecia ele assim... a
partir daí, fiquei naquele ano, acho que 1 ano e pouco... não, fiquei toda a gestão do
Olívio lá dentro e depois, na gestão seguinte... não me lembro bem, teria que pensar
um pouco melhor... eu acho que fiquei 2 anos e meio, depois eu saí do núcleo
administrativo da SERP deu uns problemas políticos internos que até tu fizeste
parte, te envolveste... saí, fiquei na praça... e na gestão seguinte, do Tarso Genro
79
,
voltamos para puder mudar a gestão da Supervisão: encaminhamos o projeto junto
ao Tarso, que se elegeu, para criar a Secretaria... um dos primeiros atos, senão o
primeiro, foi criar a Secretaria... então, eu fiquei nos 12 anos da criação da
Secretaria, durante toda gestão da Administração Popular
80
eu passei por todos os
cargos: desde Unidade Técnica, Gerencia Pedagógica, coordenei o [Ginásio]
Tesourinha uma época pouco menos de um anos o que mais? Eu não fui
coordenador do Setor de Manutenção mas de todos os restantes dos cargos
pedagógicos e administrativo-pedagógicos da Secretaria eu exerci todos eles, até,
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
76
Doravante representada por sua sigla, SERP.
77
Sigla de Secretaria Municipal de Educação de Porto Alegre.
78
Doravante representada pela sua sigla, POA.
79
2
a
gestão da Frente Popular em POA.
80
Nome dado à administração municipal de POA sob a direção da Frente Popular, nas suas 4
gestões, que vão de 1989 à 2004.
!
B:A!
no final, o de Secretário [Municipal]... e atualmente, quando saiu a Administração
Popular [2005], eu pedi para ser lotado aqui no CCC, Centro de Comunidade aqui da
CCC... e estou aqui desde então, vão aí 5 anos...
ISMAEL: Tu tocaste na questão do concurso, e de um concurso para a SMED, onde
talvez a tua expectativa fosse acabar trabalhando na escola. Então eu inicio este
ponto de reflexão te perguntando: como foi isto de talvez numa expectativa de
trabalhar numa rede escolar, cair nesta outra rede, não escolar? Que impactos isto
teve? Qual foi tua recepção para esta realidade? Como isto refletiu sobre as tuas
práticas?
GUILHERME: Bom, inicialmente... a minha primeira entrada foi: “... consegui ajeitar
a minha vida...”, até porque eu não conhecia o trabalho, esta é a 1
a
questão...
porque para que eu assumisse numa escola eu teria que abrir mão de uma outra, e
professor quando está iniciando, se puder pegar tudo que puder encaixar nos seus
horários, vai... então a minha primeira expectativa foi: “bom, estou conseguindo
ajeitar a minha vida, agregar algo mais sem abrir mão do que eu estava fazendo”,
isto no 1
o
momento. Depois – e isto foi muito rápido – eu descobri algo que eu nunca
imaginei que pudesse haver: atividades gratuitas, públicas para a população,
bancadas pelo poder público; isto foi um negócio muito legal, foi uma descoberta
muito grande e de para cá, eu comecei a investir muito nisto, tanto que hoje estou
nisto. Então foi uma descoberta de uma outra possibilidade de atividade física
que não somente a dos limites da escola, mas extrapolando os limites da escola,
saindo para a praça, para o parque... então, foi isto, inicialmente: primeiro foi o
‘ajeitar a vida’... depois, foi um ‘outro mundo’, uma outra possibilidade, que eu
acredito hoje, muito mais abrangente e com um caráter e com uma possibilidade
social muito grande.
ISMAEL: Para fechar este bloco, tu deves estar a par que este último concurso volta
a ter, na realidade, um formato muito semelhante a este, que tu relatas no teu
ingresso, nos idos dos anos oitenta e poucos [GUILHERME: “87, mais ou
menos...”]... na medida em que volta a ser um concurso de caráter unificado: do
ponto de vista do referencial de conhecimento, o professor de EF inscreve-se num
concurso para a ... Prefeitura. Também somos sabedores que num período solo
após a criação da SME, começaram a vir concursos com um viés de especificidade,
um referencial teórico específico, com alguns autores que de alguma maneira
dialogavam com este fazer da SME. Gostaria que tu tecesses algumas reflexões
sobre este processo este é um processo natural? Ou, que desdobramentos podem
advir nos futuros ingressos por este formato de concurso?
GUILHERME: Quando eu fiz o concurso, era assim como tu estás dizendo,
unificado; depois, dentro da gestão da Secretaria, a gente começou a perceber as
diferenças que tinham entre trabalhar numa escola e trabalhar num serviço de
educação não-formal... e nós, na gestão, sempre trabalhamos para que houvesse
uma divisão nos concursos porque o quê acontecia? As pessoas que fizeram
!
BB;!
concurso para trabalhar em escola eram nomeadas para trabalhar na Secretaria de
Esportes
81
, que era muito diferente o trabalho... então, o quê acontecia? As pessoas
ou não se adaptavam ou acabavam se exonerando... então se criou o concurso
separado, que foi um avanço, porque a Secretaria passou a ser conhecida e a se
identificar com alguns profissionais de EF, então aqueles que queriam fazer... que
tinham a intenção de trabalhar na recreação pública, faziam concurso para a
recreação pública; aqueles que queriam a escola, faziam o da escola... e aqueles
que gostavam de trabalhar nos dois, podiam fazer os dois concursos; então, acho
que isto era muito mais democrático e muito mais razoável. Na minha opinião, isto
hoje é um retrocesso: tem mais a ver com questões políticas do que com questões
pedagógicas. Por quê eu falo em questões políticas? Porque tu consegues
‘convidar’ pessoas para trabalhar na instituição e... não pode ser convidado todas
as pessoas têm que ter direitos iguais para trabalhar num espaço público, mediante
um concurso público. Então a minha opinião é a de que foi um retrocesso na
administração em relação ao ingresso de profissionais.
ISMAEL: Vamos ver agora um pouco mais as coisas desta relação entre formação
do Guilherme e o cotidiano dele nesta instituição, SME. Gostaria que tu pudesses
falar da tua formação inicial: onde foi tua faculdade... e que reflexos, que diálogos
esta tua formação inicial lá, Universidade Federal de Santa Maria como é que se
deu o diálogo com os teus desafios na prática? Quando tu chegaste aqui, como é
que foi: esta tua faculdade de EF sustentou os teus desafios, respondeu coisas? Te
deixou em situações de desconforto? Como é que se relacionam: formação inicial e
a tua trajetória?
GUILHERME: Bom, a formação inicial, do ponto de vista técnico, de conhecimento
específico dos conteúdos acadêmicos, foi bem trabalhado, acho que consegui
aproveitar bem isto. Agora, do ponto de vista da formação para o que eu faço hoje
eu nem sabia da existência do que eu faço hoje... então, dizer hoje que eu sou
uma pessoa muito identificada, engajada pedagógica e politicamente com a
recreação pública, no esporte e lazer de caráter social, algo que eu fui construindo
gradativamente, inclusive com os colegas dentro do trabalho, e não algo que tenha
surgido lá. Evidente, hoje como professor trabalhando numa escolinha de iniciação
esportiva em qualquer modalidade, aprendi na faculdade: o processo pedagógico,
didático, método; e evidente, que a parte especifica a gente vai aprendendo, vai se
atualizando, vai buscando informações... mas de maneira geral é isto: não para
dizer que na faculdade eu tive esta formação ou este aprendizado lá.
ISMAEL: Desdobrando esta questão, como é que se constitui o teu processo de
formação? De alguma maneira, tu tocaste nisto falaste inclusive num
aprendizado com os colegas. Como é que vai se constituindo este profissional que
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
81
Doravante representada pela abreviatura SE.
!
BB:!
está hoje, frente aos grupos, frente aos desafios que tiveste na gestão... como é
que tu aprendeste? O que sustentou o teu crescimento?
GUILHERME: Bom, logo que eu entrei na Prefeitura... eu... eu reproduzia o que
aprendi na faculdade, o que eu fazia no colégio, fui fazer na praça... sem ter uma
noção clara da importância daquele trabalho, apenas achava muito legal, muito
bom... “ah, que democrático...”, de estar oferecendo uma escolinha de futsal para
toda a população, para quem quisesse jogar guardados os limites estruturais e
possibilidades de material e de atendimento aliás, material não tinha, eu levava,
comprava... 1, 2 bolas de futsal... pegava bola velha da escola particular que eu
trabalhava... então pegava algum material e levava para lá, porque não tinha
material, era mínimo... mas eu comecei a perceber a importância disto, e aí começar
a ter roda de discussão e de diálogo, foi quando eu assumi a gestão com o WWW, o
MMM, EEE... acho que porque a gente tinha muito tempo, a Secretaria era ainda
muito pequena, tinham 16 Unidades, no papel que na verdade não eram 16,
tinham praças que eu nunca tinha ouvido falar e que estavam na relação, como
responsabilidade nossa apenas para manutenção então, 16 que eram 12 ou 13...
então tínhamos muito tempo e a gente conversava muito, discutia muito sobre isto.
Quando a gente assumiu a Secretaria, na gestão do Tarso, nós começamos a
trabalhar as questões pedagógicas, não tinham reuniões de professores, não tinha
seminário, não tinha nada... então estes diálogos, estas discussões, estes
encontros... ‘a gente com a gente mesmo’, é que começou a dar fundamentação... e
depois, logo no início da gestão, eu e a EEE fomos a um Seminário Internacional de
Políticas de Esporte e Lazer em Santos primeiro nós nos organizamos aqui depois
nós fomos lá... então estas coisas começaram a abrir um pouco os horizontes...
em seguida, nós chamamos o Marcellino [Nelson Carvalho,] para conversar sobre
lazer... [ISMAEL: O seminário foi o de Bertioga
?
] Não, Bertioga eu não fui, eu fui a
Santos com a EEE, dar um curso sobre administração... olha só, um curso sobre
administração de parques e jardins não tinha nada a ver com a prática, que a
gente foi lá desenvolveu outro conteúdo... conteúdo da política, do trabalho, da
relação com o professor... Então, esta construção se deu internamente: se deu no
grupo de profissionais, aproveitando o potencial de cada um.
ISMAEL: Bom, o que eu te peço agora? Nós vamos para um olhar com um outro
viés: como tu descreverias o trabalho na SME? Que características deste trabalho
são diferenciados um pouco tu abordaste isto, o que tu foste percebendo de
diferença e possibilidade do ‘não-escola’ mas que características tu achas que
fazem uma síntese do que é o trabalho profissional nesta Secretaria, nesta rede? E
quais assumem uma relevância muito grande para ti? [GUILHERME: Do profissional
ou do trabalho como um todo
?
] ISMAEL: Do trabalho que é feito nesta Secretaria:
desde a coisa do evento, desde o trabalho de articulação comunitária, destas coisas
que acontecem e que estão no cotidiano o que tu destacas como diferenciado e o
que assume para ti uma relevância?
!
BBB!
GUILHERME: Assim... a primeira coisa que eu acho, do ponto de vista da
população: a espontaneidade, é a não obrigação da atividade, é o participar pelo
prazer de participar... diferente de outro ambiente: por exemplo, na escola, o aluno é
obrigado a participar, ele tem que ir para a escola a escola pode ser prazerosa ou
não, ele é obrigado... no nosso caso, no nosso trabalho, as pessoas participam pelo
prazer; e aí, tem o lado do profissional: ele tem que, sabendo disto, tendo
conhecimento disto, ele vai medir não é ‘medir’ mas o trabalho dele se reflete
nisto... se o trabalho dele é bom, a tendência dele é ter muitos alunos... se trabalho
dele não é muito bom, se ele não tem uma empatia, não percebe este prazer, esta
vontade do público de participar da atividade dele, a tendência é não evoluir em
termos de ‘volume’. Uma outra coisa que eu acho muito importante, que eu
considero um diferencial do nosso trabalho é que nós podemos, no nosso ambiente
de trabalho, trabalhar com a família quando eu falo a família, não é que a escola
não trabalhe... mas trabalha desde a criança, até o adulto, até o avô; e trabalha com
toda a comunidade... é um trabalho muito aberto à participação da comunidade
efetivamente... e uma outra questão, que eu também acho muito importante, é que
este trabalho, pela espontaneidade, pelo prazer, pela não exigência de alguns
burocratismos que às vezes as instituições formais exigem, tu consegues te
aproximar muito das pessoas, dos adultos especialmente... das crianças, tu
consegues mudar certas estruturas... e ele [o trabalho SME] tem um caráter, uma
importância social junto com outras áreas muito importante. Então eu tenho esta
clareza, ou esta visão sobre isto. O que mais dá para falar sobre isto?
ISMAEL: Vou te ajudar a dar uma esticada neste ponto... Quando tu dizes assim: “o
trabalho acaba tendo importantes possibilidades junto à outras áreas...” Que áreas
são estas? O que tu vês nestas interfaces? Quais são as possibilidades que tu vês
de articulações?
GUILHERME: Eu vejo possibilidades de articulação com... a assistência social,
muito legais... não do ponto... da assistência...[parece referir-se ao processo e as
dinâmicas de intervenção próprios da assistência social]... mas de poder ajudar uma
camada da população que talvez não tenha muitas possibilidades cias, então é
uma interface boa... com a cultura, tem uma possibilidade muito boa; com a
educação; com o movimento popular, como um todo; com os movimentos sociais,
como um todo... então quando eu falo de áreas, eu falo destas áreas... com o meio
ambiente, com a área ambiental dá para fazer uma boa articulação...
ISMAEL: As tuas falas até agora estão repletas de reflexões, de um dar nomes...
Explico: surge ao longo dos meus estudos: a SME é um lugar onde a grande marca
é a ‘diversidade’ de práticas pedagógicas, profissionais... que tu pudesse tocar um
pouco nesta questão. Como é que tu percebes e eu até tenho usado nas
entrevistas, esta figura de linguagem: isto é ‘lenda urbana’? Ou isto de fato é real – a
SME é uma rede, é uma instituição de atuação caracterizada por esta coisa da
diversidade de práticas docentes?
!
BB=!
GUILHERME: Eu não diria nem de ‘práticas docentes’: eu concordo contigo... e
foi bom tu teres usado esta palavra porque é uma ‘diversidade’ não de
práticas docentes... porque isto tem um outro espaço muito interessante na SME
que é o seguinte... tem espaço para todos os interesses dos profissionais, inclusive;
vou dar um exemplo: pelas tantas, nós tínhamos um acadêmico, fazendo estágio
conosco e ele tinha interesse, ele sabia..., trabalhava com montanhismo e se
ofereceu para fazer um grupo de aprendizagem de montanhismo... “como assim?”...
aí fizemos uma parede de escalada esportiva dentro do [ginásio] Tesourinha... então
se viabilizou isto... o TTT, uma pessoa que tem um grande conhecimento na área da
ioga, da biodança e tem espaço para isto... e assim vai: o JJJ com tai-chi, com
ginástica chinesa, outro com ioga, o Ismael com vôlei e não vôlei... então, enfim,
um universo... Tem esta possibilidade que, além de permitir... além de possibilitar a
diversidade de ações, tem também a diversidade das práticas profissionais; e mais,
não só isto: aquela pessoa que gosta de trabalhar com escolinha de iniciação e
formação esportiva, que tem um outro determinado caráter, tem espaço; aqueles
que gostam de trabalhar e estudar a área mais lúdica... não, o lúdico até não porque
está entremeado por tudo... mas aqueles que gostam de trabalhar mais com a
criança, com a 1
a
infância, tem projeto específico para isto, ou seja ... e tem uma
outra possibilidade também, que não é da diversidade pedagógica mas a
diversidade de relações com a sociedade porque tu não trabalhas com as
pessoas da vila, da periferia: tu trabalhas com a periferia, trabalha com o clube
social das elites, tu dialogas com as forças armadas... que era o nosso caso nós
não trabalhávamos com as Forças Aéreas, porque não tinha em POA mas com
a Marinha, com o Exército, com a Brigada [Militar]...trabalha com os clubes sociais,
com os clubes esportivos, com as diferentes camadas e universos... dialoga com os
meios de comunicação, tanto os pequenos quanto os grandes... Esta diversidade se
dá em todos os níveis e isto eu acho que... que cria muitas oportunidades outras que
não os ambientes... educacionais escolares.
ISMAEL: Uma outra contribuição que eu recebi ao longo dos meus estudos foi um
questionamento sobre o perfil deste, que eu vou chamar intencionalmente neste
momento, de profissional de EF: bem, este profissional de EF que trabalha nesta
rede, SME de POA, com esta diversidade... ele é um professor, ele é um animador
sócio-cultural? Estas duas nomenclaturas se contrapõem? Se complementam? Como
tu percebes este profissional SME? O que caracteriza o perfil deste profissional?
GUILHERME: Eu acho que tem uma palavra anterior a estas duas: eu acho que ele
é um educador... e aí, eu não vejo esta diferença assim... eu acho que ele é um
educador... então se ele se intitula professor, ou não é professor... ou se ele é um
animador sócio-cultural, não é isto que vai fazer diferença no final. Evidente que
nem todos são iguais, tem um universo... mas eu acredito que a grande maioria com
quem a gente convive e conviveu ao longo destes anos, a grande maioria são
educadores. Eu acho que são educadores eu acho que ser educador é algo que é
anterior... e um educador, assim... social. Eu não sei se todos os profissionais que
!
BBC!
atuam nesta Secretaria têm este entendimento ou porque não querem, ou porque
não concordam mas a grande maioria têm... ou agem não preocupados com a
terminologia ou o conceito da sua ação: mas sabem que atuam dentro deste
entendimento que eu tenho do trabalho.
ISMAEL: Como tu vivencias a tua prática docente na SME? Como é ser professor no
dia-a-dia nesta Secretaria? Que aspectos da tua prática te motivam e que aspectos
desta prática te frustram?
GUILHERME: Bom, o que me motiva? Eu acho que têm algumas coisas boas e
algumas coisas não tão boas. Tem coisas boas administrativas, tem coisas não tão
boas, administrativas. Administrativas boas, por exemplo: nós podemos nos
organizar bem dentro dos seus horários, pode ter uma flexibilidade de trabalho – não
de diminuição de carga horária mas de flexibilidade de trabalho: isto é uma coisa
boa, muito boa que tem o nosso trabalho. O que tem de ruim, comparado com outro
professor, por exemplo, de uma instituição formal? É que... e eu tenho presente para
mim que se trabalha, em termos de volume de trabalho, mais do que [instituição
escolar], porque nós não temos recesso: nós temos férias como todos os outros e
eu não vejo nada de errado nisto, só estou fazendo uma análise comparativa; o bom
é que tu flexibiliza os teus horários, tu organizas de tal forma que fique bom isto
são as questões administrativas. Agora, o que eu acho muito bom no nosso
trabalho, que eu me identifico muito? É poder trabalhar com os teus interesses
profissionais e com isto atender os interesses da comunidade. Os ‘teus interesses’
no seguinte sentido: eu gosto de trabalhar com tal coisa e vou trabalhar isto com a
população, com a comunidade. E mesmo se eu não gosto de um determinado
conteúdo, se eu trabalhar a comunidade, eu sei que de vem uma disposição e um
interesse muito grande de fazer isto. Então, eu acho isto fundamental: a relação que
tu estabeleces com o teu aluno é uma relação muito mais prazerosa. O que é ruim?
Bom, evidente que tudo tem seus espinhos’... ruim é que tu estás ‘cravado’ todo o
fim-de-semana...[risadas] e isto... mas também isto, de um lado... isto é uma ‘faca
de dois legumes’, usando a brincadeira do dito popular... tem o lado bom e o lado
ruim... o lado bom é este – que eu gosto de trabalhar aos fins-de-semana com aquilo
que eu faço: eu gosto de estar envolvido com o evento, com a festa comunitária,
com a população circulando, feliz... eu gosto de organizar um evento esportivo e ver
a criançada se envolvendo, os pais junto, aquele ‘auê’, eu gosto desta zoeira toda...
então este é o lado bom, eu também gosto ... por outro lado, é o seguinte: uma vez
compromissado estás compromissado e com isto, tu acabas abrindo mão... fim-de-
semana é ‘a mais’, então tu acabas abrindo mão de um espaço teu, de um tempo
com a família... eu acho que é isto.
ISMAEL: Agora eu gostaria de trazer uma reflexão: falamos no início da tua
formação acadêmica, falamos do teu processo de ingresso, fizemos várias reflexões
sobre o que é ser professor desta Secretaria, como é o dia-a-dia, quais são as
alegrias... Gostaria de fazer de novo uma aproximação com a questão da formação,
!
BBD!
agora com o viés da formação profissional permanente como tu percebes, que
reflexões tu terias a fazer sobre a formação profissional promovida pela instituição
SME e como ela se relaciona com a tua prática. Este aspecto tem uma historicidade,
foi se configurando ao longo dos estudos que exista uma relação entre as
características desta formação profissional ao longo do ‘tempo’ [institucional]...
então, que tu pudesses fazer reflexões desta ordem: como se o processo de
formação institucional e como ela dialoga com a tua atuação profissional ao longo do
tempo, nesta rede?
GUILHERME: Bom, é bem como tu disseste... isto tem uma história, não para...
há muito tempo atrás, digamos... há 16 anos atrás, a gente tinha muito claro assim...
que mudar o conceito, mudar o entendimento do professor em relação ao seu
trabalho na recreação pública, de forma a enxergar o seu trabalho, de valorizar o
seu trabalho, de torná-lo importante e significativo na sua comunidade e na
sociedade, passava por uma discussão da sua própria condição profissional; como é
que tu modificas isto? Através de um trabalho pedagógico muito forte, muito
intencional e muito sistemático e sistematizado. Então, 16 anos atrás, quando
nós estivemos na gestão da Secretaria, nós tínhamos isto como algo muito
importante, fundamental, e sem ele não se avançaria. Que eram reuniões de
trabalho, reuniões pedagógicas, discussões, reflexões, seminários, encontros... as
vezes, alguns achavam demais... mas se tu considerares o hoje, eles acham de
menos... então, se fosse demais, as pessoas hoje não achariam que é ‘de menos’
[riso]... então, aquilo teve uma marca, um significado... e aquilo, eu acho, é que
ajudou a construir... aquilo que houve antigamente, em outros tempos, possibilitou
pessoas a estudarem, a retomarem suas especializações, a escreverem sobre as
suas práticas, a apresentarem em encontros, a participarem de seminários. 4
anos atrás, isto acabou extinto, foi dado um corte geral nisto... num primeiro
momento, acho que as pessoas se aliviaram por terem que participar de tantas
reuniões... hoje, as pessoas criticam e cobram a volta das reuniões... E hoje, estas
reuniões são reuniões apenas administrativas... então, hoje, se eu tenho alguma
formação de trabalho, ela se muito mais em cima daquilo que a gente construiu e
aprendeu antes... hoje, são só burocráticos, administrativos... não existe... o trabalho
pedagógico, hoje, a formação...aliás, não para dizer que é formação: é apenas a
questão do preenchimento de papéis, de carga horária, de quadro de horários, de
descrever atividades... eu não sei como é que as pessoas que entram hoje
enxergam ou recebem...vêem como são recebidos e como vêem o trabalho da
Secretaria.
ISMAEL: Vou...
GUILHERME: Eu fui sintético nesta última... eu não sei se gostaria de discutir, de
aprofundar um pouco mais...
ISMAEL: Como eu tenho colocado, eu sempre espero que estes momentos de
entrevistas sejam ‘portas abertas’: no processo que se segue, de transcrição e de
!
BB>!
análise, surgem demandas, surgem provocações... muitas nos vemos instigados a
aprofundar alguns pontos e esperamos as ‘portas abertas’... então, este é um
primeiro momento, que tem toda uma riqueza... com isto, eu te pergunto, como
um fechamento deste primeiro encontro: que fatores te ajudariam no teu trabalho da
SME? Se hoje tu fosses fazer uma reflexão sobre o que falta ser buscado como uma
forma de te realizar como sujeito desta instituição... o que seria? Não do ponto de
vista acadêmico... mas, o que te parece que seria o diferencial para que este
profissional pudesse estar melhor aonde está?
GUILHERME: Eu acredito muito no diálogo, na reflexão, como algo que faz com que
as pessoas... momentos como este que nós estamos tendo aqui, agora... estas
coisas fazem as pessoas pensarem, refletirem sobre as suas práticas,
retroagirem um pouco e pensarem a frente também... ao menos, eu tenho esta
visão das coisas: quando nos dialogamos, pensamos também na frente... acho
que faltaria, que falta na instituição... esta possibilidade: das pessoas poderem se
reunir um pouco mais, se reunir por áreas de interesses e poder trocar mais, trocar
sobre a sua prática, sobre o seu dia-a-dia... evidente, que fundamentado...porque
sentar para conversar sobre as suas mazelas, os seus problemas... [expressão e
gestualidade, que sugere por em dúvida o valor] isto ajuda em parte, mas funciona
mais como um elemento de catarse, de baixar ansiedade... mas para crescimento...
isto, eu acho que teriam que ser reuniões sistemáticas, intencionais e embasadas
em documentos, em textos... agora, eu não acredito mais, pelo menos atualmente,
dada a motivação das pessoas, dado o momento político da Secretaria... eu não
acredito muito mais em grandes seminários, grandes encontros, todo mundo... eu
não acredito mais nisto... eu acredito nos pequenos encontros talvez um dia se
pudesse retomar os grandes encontros porque as pessoas não estão mais
motivadas a crescer ou a construir coletivamente num grande grupo... então eu
acredito neste encontros menores; porque alguns grupos a gente ouve falar
mantém uma certa resistência e conseguem avançar... então, eu acho que isto faz
falta, esta reanimação, esta injeção: eu vejo hoje cada um no seu canto...
ISMAEL: Enquanto tu ias falando foi me surgindo uma questão: tu percebes uma
‘crise de identidade’? Acabei de formular isto agora... porque quando tu relatas,
quando tu trazes esta reflexão, que tu não consegues ver a perspectiva, neste
momento, da construção em grandes fóruns, de grandes reuniões e articulações... e
apontas para isto: que as pessoas talvez não vejam um mesmo projeto, um mesmo
projeto político-pedagógico de atuação... estaríamos vivendo um momento de crise
de identidade institucional?
GUILHERME: Ah, esta tua formulação agora, me remete a uma constatação, não é
a uma reflexão ou... é uma constatação: eu não sei se é uma crise de identidade
mas existe, sim e isto é uma afirmação é que hoje não uma unidade. Eu
não sei se não havendo unidade, existe uma crise de identidade: eu sei que não
existe unidade... então eu acho que não tem identidade... hoje cada um faz, cada
segmento faz as suas coisas, não existe um projeto que envolva todos os setores
!
BB?!
articulados... não existe. Isto é difícil de construir, mas no momento, não existe
nada... cada setor procura fazer o seu bem feito e muitas vezes, não é bem feito,
mas procura fazer o ‘seu’ bem feito mas não uma articulação: e isto é um
problema! E isto, tu não enxergas... isto não uma organização de ‘corpo’, mesmo
numa instituição pequena como é a nossa... então eu não sei o que o ‘fulano’
naquela praça faz ‘e também não me interessa’...[gestualidade sugerindo uma
decorrência natural, uma simulação gestual de desmotivação] hoje a coisa é assim...
Eu vou dar um exemplo: hoje os Jogos Abertos, jogos escolares nas modalidades
esportivas [referencia ao JAPA: Jogos Abertos Cidade de Porto Alegre]: cada
coordenador coordena a sua reunião técnica com os que participam do seu jeito e
discutem o regulamento do seu jeito um pode uma coisa: o outro, na sua
modalidade, não pode; então, claro... tem que ‘guardar as características e
peculiaridades da sua modalidade’ mas uma unidade pedagógica esta tem que
existir... e isto não tem! Então, eu acredito que hoje é isto: não existe mais uma
unidade... é difícil de buscar isto... e por conta disto... não existe uma intenção da
instituição em buscar, pelo menos eu não percebo isto...claro que agora, eles estão
na 2
a
gestão, não sei... algumas pessoas que estão assumindo algumas funções,
me parecem pessoas sérias e me parecem ter um histórico de seriedade... mas não
sei se vão conseguir buscar alguma coisa... mas... é, não tem identidade...ou
melhor, tem identidade... a identidade do personalismo e do gabinete... é assim:
antes nós tínhamos um polvo a cabeça com seus tentáculos... hoje tem um polvo
aqui, com seus tentáculos [risos, apontando para o ar, em cima, a outra mão
passando no vazio abaixo, sugerindo um distanciamento do que seria a base] e aqui
em baixo, as ‘sardinhas’ – não tem, não existe esta unidade...
ISMAEL: Prof. Guilherme eu agradeço a tua colaboração, tenho claro que é muito
provável que venhamos a conversar posteriormente, para aprofundarmos alguns
destes temas... sabedor da tua caminhada na instituição, do teu percurso, não
como professor na ‘ponta’ mas a tua experiência nas coisas da gestão... espero ter
as portas abertas para que eu vir a conversar e aprofundar a discussão na medida
em que avance o processo de análise.
GUILHERME: Pode contar sempre comigo, porque este tipo de diálogo que nós
estamos tendo é que poderíamos ter na Secretaria, não é mesmo? É o tipo do
diálogo que eu acho que nos leva a crescer e eu tenho o maior interesse em
acompanhar os resultados deste trabalho...
ISMAEL: Com certeza, este retorno, esta transparência faz parte das crenças que
tenho sobre o trabalho acadêmico e é, inclusive, um compromisso metodológico do
fazer acadêmico com os colaboradores e com a instituição.
GUILHERME: E tu disseste assim: dada a minha experiência, a minha vivência... eu
tenho uma clareza sobre isto: todos nós temos uma experiência e eu não me coloco
em uma situação de um ‘saber mais que os outros’ eu sempre me coloco na
condição de ter experiências, outros também as têm e que nós podemos dialogar e
!
BB@!
construir coletivamente então, nesta medida, eu quero aproveitar esta
oportunidade deste teu estudo para também me ajudar a... porque muitas vezes a
gente ‘acha’ coisas, e entre o ‘achar’ e o ‘ser’ tem bastante diferença... e uma
investigação assim, com todo o rigor que ela tem que ter, tem que ser respeitada e
reconhecida, e lida e ouvida...
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ANEXOS
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ANEXO 01 – LEI 7330: CRIA A SME EM 5 DE OUTUBRO DE 1993
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ANEXO 02 – DIRETRIZES PEDAGÓGICAS, ADMINISTRATIVAS - 2004
DIRETRIZES PEDAGÓGICAS,
ADMINISTRATIVAS E PROGRAMAÇÃO
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2004
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REFERÊNCIA DE POLÍTICA PÚBLICA NO CAMPO DO ESPORTE E LAZER
Nestes 11 anos de existência da Secretaria Municipal de Esportes, Recreação
e Lazer de Porto Alegre, trilhamos um caminho pleno de êxitos, conquistas e
superações de desafios. O reconhecimento alcançado nos âmbitos municipal,
estadual, nacional e internacional nos a convicção de que estamos na direção
certa.
Alicerçados em princípios e diretrizes que tem por pressuposto a
democratização do acesso ao lazer enquanto direito social, a participação efetiva da
população, seja na proposição das políticas (Conferências Municipais, planejamento
participativo regional), seja no envolvimento cotidiano com as atividades
desenvolvidas, a SME vem ampliando a sua atuação na cidade, diversificando ações
e estabelecendo parcerias com os mais variadas representações sociais.
O modelo de especulação imobiliária e a alta concentração populacional que
caracteriza a configuração urbana contemporânea desafia-nos a consolidar políticas
de preservação dos espaços públicos de lazer e potencializar ações em espaços
informais, tendo na regionalização a estratégia de identificação e aproximação com
as diferentes realidades da cidade.
De fundamental importância também é destacar a essência educativa não-
formal da atuação dos profissionais da SME, em toda a riqueza que a intervenção
pedagógica no tempo livre, no espaço informal, de característica eminentemente
lúdica, pode promover na construção de uma educação emancipatória e cidadã.
A partir destes referenciais, a SME reedita este documento que apresenta o
conjunto de eixos, prioridades e diretrizes pedagógicas e administrativas, bem como
a programação geral de eventos para 2004.
1. EIXOS
1.1. Ampliação da abrangência através da articulação.
1.2. Descentralização da diversidade de ações da Secretaria.
1.3. Promoção de políticas de Inclusão Social.
1.4. Radicalização da democracia.
1.5. Ratificação do significado do Espaço Público de Lazer dentro da cidade
formal e informal.
1.6. Implementação das Resoluções da 2
a
Conferência Municipal de Esportes,
Recreação e Lazer e 4
o
Congresso da Cidade, com ênfase no envolvimento
da comunidade no processo de planejamento participativo regional.
2. A SME NO PLANO PLURIANUAL 2002-2005
82
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
82
PMPA, 2001. Plano Plurianual, 2002-2005 p. 64-68.
!
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Estas diretrizes gerais e metas integrantes no Plano do Governo Municipal
de Porto Alegre estão relacionadas ao Lazer, Esporte e Educação:
2.1. DIRETRIZES GERAIS DE GOVERNO:
2.1.1. Priorizar as políticas sociais desenvolvidas nas áreas de educação,
assistência social, saúde e habitação como instrumentos de combate à
exclusão social.
2.1.2. Constituir alternativas que visem potencializar o atendimento aos habitantes
de Porto Alegre em situação de pobreza absoluta, crianças e adolescentes,
idosos e outros grupos em desvantagem social, considerando o grau de
vulnerabilidade da população.
2.1.3. Ampliar o acesso da população aos bens culturais, ao lazer e ao esporte,
promovendo-os também como meios de inclusão social.
2.1.4. Desenvolver ações e medidas visando aumentar a eficiência na prestação de
serviços, através da implantação de novos métodos de trabalho, do
aperfeiçoamento dos instrumentos gerenciais, da capacitação permanente de
servidores, da informatização e da equipagem adequada dos órgãos
municipais.
2.2. METAS GERAIS DE GOVERNO PARA A SME:
2.2.1. Ampliar as escolinhas esportivas nas mais diversas modalidades (basquete,
futsal, voleibol, handebol, dança, tênis, etc.) em Unidades Recreativas e
Centros de Comunidade. (001.0018.001.001)
2.2.2. Realizar o projeto Jogando nas Praças, envolvendo seis modalidades
esportivas. (001.0018.001.004)
2.2.3. Apoiar esportes radicais (por ex., skate e mountain bike). (001.0018.001.005)
2.2.4. Ampliar o programa EM CADA CAMPO UMA ESCOLINHA.
(001.0018.001.006)
2.2.5. Apoiar competições esportivas de âmbito nacional e internacional.
(001.0018.001.007)
2.2.6. Realizar os Jogos Municipais de Estudantes Excepcionais (JOMEEX).
(001.0018.001.010)
2.2.7. Apoiar eventos esportivos de caráter social (por ex., Largada do Cigarro).
(001.0018.001.011)
2.2.8. Incentivar através de convênio com a SMED o uso de áreas esportivas
existentes em praças e parques, por parte dos alunos da rede escolar do
município. (001.0018.001.018)
2.2.9. Aprofundar as relações da SME com a comunidade através da Co-gestão do
OP e do CMD. (001.0019.001)
2.2.10. Realizar cursos, encontros, seminários com lideranças comunitárias,
para formação dos multiplicadores sociais. (001.0019.001.001)
2.2.11. Qualificar e manter os equipamentos esportivos/recreativos
administrados pela SME. (001.0019.002)
2.2.12. Ampliar as atividades sistemáticas oferecidas pelos Centros de
Comunidade, potencializando sua utilização e desta forma transformá-los em
pólos regionais de Esporte, Recreação e Lazer. (001.0019.003)
2.2.13. Estabelecer políticas públicas na área de esportes, recreação e lazer
para o Guaíba e sua orla. (001.0019.004)
2.2.14. Ampliar políticas de esporte, recreação e lazer para crianças e
adolescentes em situação de rua. (001.0019.005)
2.2.15. Implementar ações que estimulem o autofinanciamento de políticas de
esporte, recreação e lazer. (001.0019.007)
2.2.16. Ampliar o atendimento do projeto Graxaim. (001.0019.009)
!
"#(!
2.2.17. Promover a Recreação e o Lazer em locais com carência de espaços
físicos. (001.0019.010)
2.2.18. Ampliação do projeto Ônibus Brincalhão, através de novas aquisições
de ônibus. (001.0019.010.001)
2.2.19. Ampliar o programa Brincando na Rua. (001.0019.011)
2.2.20. Ampliar o número de palestras do projeto “Lazer vai a Comunidade”.
(001.0019.0012.002)
2.2.21. Ampliar o número de Salas de Musculação. (001.0019.012.003)
2.2.22. Cercar e iluminar praças esportivas administradas pela SME, de
acordo com as decisões do Orçamento Participativo. (001.0029.001.002)
2.2.23. Melhorar a limpeza e a manutenção das praças, parques e centros de
comunidade da cidade. (001.0058.001)
2.2.24. Desenvolver trabalho com adultos e terceira idade, na área da
atividade física, buscando uma melhor qualidade de vida. (001.0067.001)
2.2.25. Promover momentos de reflexão sobre o envelhecimento e suas
conseqüências sociais, articulando a inclusão dos adultos e terceira idade na
sociedade de maneira participativa. (001.0067.002)
2.2.26. Construir rampas e adaptar os banheiros das unidades recreativas e
Centros de Comunidade. (001.0069.001)
3. PRIORIDADES PARA 2004
3.1. Promover a inclusão social, articulando ações com a sociedade e
buscando a consolidação da integração entre as diversas Secretarias de
Governo.
3.2. Garantir espaços públicos e ações de esportes, recreação e lazer em
todas as regiões da cidade, possibilitando o acesso a todos os segmentos da
população.
3.3. Consolidar o processo de Regionalização, conforme texto do item 5 deste
Livro, no qual os Centros Regionais constituem-se como referências no campo
do Lazer, Esporte e Recreação, para a articulação entre as diversas
representações governamentais e comunitárias (CARs, Fóruns, Conselhos
Comunitários, Secretarias, entre outros).
3.4. Priorizar a implementação das Resoluções do IV Congresso da Cidade do
campo do esporte, recreação e lazer, conforme item 5.
4. RESOLUÇÕES DO IV CONGRESSO DA CIDADE
83
Criar Centros de Referência nas escolas da SMED, praças e parques,
escolas de samba, CTGS e outros, para atividades de Esporte, Recreação e
Lazer para potencializar e desenvolver um trabalho integrado, priorizando
regiões com maior carência de espaços, otimizando espaços existentes e
ampliando as atividades oferecidas pela SME, garantida a acessibilidade
universal para PPD’s;
Promover políticas públicas que garantam a criação e ativação dos
espaços públicos nas 16 regiões da cidade, ampliando e diversificando
programas, projetos e atividades sistemáticas de esporte, recreação e lazer,
cultura e geração de renda para todas as faixas etárias e modalidades,
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
83
4
o
Congresso da Cidade: 2003 Caderno de Resoluções: GT2 A Construção da Democaracia,
VII: p.18-19
!
"#)!
buscando parcerias com ONG’s, iniciativa privada, Associações de
Moradores. Priorizando as regiões de maior carência e que não dispõem de
espaço, em especial, os loteamentos, os assentamentos e os
reassentamentos, garantida a acessibilidade universal para PPD’s;
Manter, ampliar e diversificar programas, projetos e atividades
oferecidas pela SME, nas diferentes faixas etárias e modalidades, priorizando
as regiões de maior carência, garantida a acessibilidade universal para
PPD’s;
Adequar os espaços existentes em Porto Alegre para utilização universal
(faixa etária, condição física, etc.);
Efetivar a acessibilidade para surdos e demais PPD’s aos espaços da
PMPA, capacitando os recursos dos humanos para atender as suas
diferentes necessidades;
Qualificar os equipamentos de esportes, recreação e lazer das diversas
regiões da cidade, em parceria com outras secretarias, associações
comunitárias e iniciativa privada, promovendo campanhas de conscientização
da importância de preservação desses espaços, garantida a acessibilidade
universal para PPD’s;
Implantar programas de ativação esportiva nas praças e parques da
cidade, em co-gestão com associações comunitárias, associações
desportivas, escolas, conselhos de praça e comunidade em geral, para
qualificação e utilização dos espaços, equipamentos e gerenciamento do
material esportivo, garantida a acessibilidade universal para PPD’s;
Adotar o planejamento participativo para utilização dos espaços públicos
para atividades de esporte, recreação e lazer, garantida a acessibilidade
universal para PPD’s;
Ampliar a oferta de oficinas culturais e esportivas para a cidade,
priorizando as áreas mais carentes, em parceria com outras secretarias,
garantida a acessibilidade universal para PPD’s;
Promover parcerias com escolas, instituições estaduais e federais,
associações e iniciativa privada, com objetivo de garantir o acesso de todos
os segmentos da comunidade (entre eles os PPD’s) durante todo o ano a
atividades de esporte e lazer, aos finais de semana e feriados, desenvolvidas
em espaços públicos, com um trabalho integrado intersecretarias, com o
gerenciamento compartilhado com as comunidades, garantida a
acessibilidade universal para PPD’s;
Promover e incentivar a criação de ciclovias na cidade, incluindo-se
estacionamentos apropriados (também para bicicletas) e contemplando as 16
regiões do OP e as interligando;
Criar espaços adequados e realizar encontros de esportes radicais
(“skate”, hóquei, “bicicross” e outros), e também incentivar a prática de
atividades esportivas que auxiliam o desenvolvimento lógico-matemático
(xadrez, damas e outros) nas diversas regiões da cidade, buscando parcerias
com o poder público e as entidades privadas, com ênfase para o “skate”,
garantida a acessibilidade universal para PPD’s;
Incluir a patinagem nas praças e parques com o Projeto Patinando nas
Praças;
Ampliar a política de incentivo e parceria da SME em eventos esportivos
náuticos com aproveitamento da orla do Guaíba: natação, vela, remo e
triathlon;
!
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Descentralizar e popularizar as atividades de dança para todas as
idades, por meio da ampliação dos eventos, do intercâmbio entre os grupos e
de aulas abertas à comunidade, inclusive para PPD’s;
Definir e implementar uma política de paradesporto que preveja
espaços, materiais, eventos anuais e profissionais capacitados para
contemplar o atendimento de PPD’s nas diversas modalidades;
Garantir, dentro dos programas de lazer e esporte, a realização de
competições incluindo pessoas portadoras de deficiência e surdos;
Ampliar os espaços de convivência da idade em todas as regiões da
cidade;
Construir estratégias de participação dos jovens como “guardiães e
fiscalizadores” do espaço recreativo, de lazer e de convivência;
Criar o Fórum Permanente de políticas públicas de esporte, recreação e
lazer das comunidades surdas e dos PPD’s.
A Regionalização na SME:
A importância dada pela Administração Popular para uma política de
descentralização vem do reconhecimento de que os grandes desafios dos novos espaços
urbanos estão na inversão da prioridade de investimento de recursos materiais e humanos
do centro para a periferia da cidade.
A descentralização vem acontecendo nas Secretarias Municipais de maneiras
diferenciadas, dependendo das necessidades surgidas com o crescimento das demandas
urbanas e das possibilidades estruturais e de Recursos Humanos.
A SME vem consolidando espaços de elaboração e implementação de políticas
públicas nas quais o Esporte, a Recreação e o Lazer, ao invés de símbolos reacionários de
alienação, reafirma-os como direitos sociais, dentro da cidade formal e informal como novas
possibilidades políticas de melhores relações humanas, de auto-estima e de socialização.
Objetivos da regionalização na SME:
Reafirmar a importância da cultura regional de Esporte, Recreação e Lazer.
Aproximar as lideranças comunitárias nas ações regionais.
Possibilitar aos cidadãos afirmarem sua condição de sujeitos na discussão das
políticas de ação no campo do Esporte, Recreação e Lazer, reforçando os
comprometimentos sociais, no âmbito público e privado.
Construir uma relação com a comunidade que viabilize a co-gestão dos
espaços públicos, equilibrando o fluxo de decisões.
Qualificar a estrutura administrativa e operacional nas regiões.
Consolidar espaços de referência da SME nas regiões, constituindo novos
canais de comunicação entre o Poder Público e a comunidade.
Superar sobreposições, articulando as ações das diversas Secretarias, outras
Instituições Públicas e ou Privadas, Comunitárias, qualificando as relações entre
Sociedade e o Poder Público Municipal, priorizando as iniciativas voltadas para a
inclusão social e redução da violência.
A regionalização reafirma o cidadão como sujeito nos processos decisórios dos
assuntos referentes ao Esporte, à Recreação e ao Lazer na cidade, reforçando sua auto-
imagem e seu prazer pessoal, colaborando para sua convivência social e reafirmando os
!
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espaços públicos de Esporte, Recreação e Lazer como espaços onde se expressam a
pluralidade e a diversidade social.
A expectativa desta Secretaria é que se consolidem as ações pedagógicas,
comunitárias, políticas e administrativas nas regiões através dos Centros Regionais, através
da co-gestão com a comunidade, pela constituição de parcerias enquanto processo
educativo, somados aos serviços públicos oferecidos. Significa a busca permanente da
identificação de demandas e de possibilidades de atuação para além dos espaços
constituídos, vendo a região enquanto conjunto de espaços potenciais de ação da SME,
para que projetos e programas sejam estendidos a uma parcela cada vez maior da
população.
Nestes movimentos, a possibilidade de se aprender e descobrir os saberes dos
outros, onde os participantes são autores e atores das atividades implementadas. Assim, o
sucesso da regionalização estará atrelado à sensibilidade do reconhecimento do saber e do
potencial da comunidade.
O processo de regionalização baseia-se também na sistemática qualificação do quadro
de recursos humanos que constitui o serviço público, por não entendê-lo como um
prestador de serviço unilateral, como nos modelos assistencialistas: procura, outrossim,
estabelecer parcerias e canais permanentes de relação com o cidadão, que é co-
responsável e sujeito, não sendo somente cliente deste serviço público.
A ação educativa:
A SME reafirma a importância do saber popular e do processo de ensino e
aprendizagem como co-responsáveis na construção de um novo saber, que se constrói
dialeticamente entre o saber que os professores trazem e o saber que a comunidade traz.
No entanto, reconhece que crianças e adolescentes hoje têm um contato mais intenso com
o modelo esportivo que reproduz as expectativas da mídia: em contraponto, a intervenção
dos Recursos Humanos da SME devem propor uma visão educativa e de articulação
comunitária.
O professor deve ser um articulador, não devendo esgotar suas ações somente na
transmissão de conteúdo, mas entendê-lo como meio de socialização de valores no campo
do Lazer, do Esporte e da Recreação.
Para o movimento de regionalização, é necessário também o reconhecimento das
ações comunitárias, somando ao diagnóstico dos espaços um mapeamento das ações nas
regiões. Para isso, a potencialização estrutural é importante, cujo acréscimo de aporte de
recursos estruturais para diferenciar a nova proposta de regionalização já se encontra
encaminhado.
!
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6.3 As Regiões:
A SME atualmente apresenta a seguinte
estrutura de distribuição regional: Centro 1, Centro
2, Centro 3,
Partenon/Lomba,Humaitá/Ilhas/Navegantes,
Cruzeiro/Cristal/Glória, Nordeste/Eixo
Baltazar/Leste, Norte, Centro-Sul/Sul,
Restinga/Extremo Sul e Noroeste. Nestas regiões,
as equipes de trabalho nos diversos espaços de
atuação são compostas por professores, estagiários
e funcionários.
Buscando a compatibilização entre o mapa
de POA pelo Orçamento Participativo, fórum
consolidado como referência de organização
comunitária, a distribuição dos recursos físicos e
humanos da SME, os CAR’s e a estruturação das
Gerências Regionais, buscamos a seguinte
distribuição:
ILHAS/HUMAITÁ/NAVEGANTES/NOROESTE (1,2);
NORDESTE / LESTE (6, 3);
NORTE/EIXO-BALTAZAR (5,14);
PARTENON/LOMBA DO PINHEIRO (7, 4);
GLÓRIA/CRUZEIRO/CRISTAL (9, 10, 11);
CENTRO SUL / SUL (12, 15);
RESTINGA / EXTREMO SUL (8, 13);
CENTRO (16);
2. POLÍTICAS COMUNITÁRIAS
A participação efetiva da sociedade na discussão das políticas públicas no
campo do lazer é pressuposto básico nas ações da SME. Cabe, portanto, a todos os
segmentos desta Secretaria (Gabinete, Gerências, RA´s, Professores e
Funcionários) estabelecer os canais possíveis de interlocução com a comunidade
portoalegrense.
Mais especificamente, a Assessoria Comunitária, através de sua ação, busca
mediar o contato entre as comunidades e as políticas da Secretaria. Visa, numa
relação dialética, sensibilizar a população para as políticas do Governo e identificar
junto às comunidades suas carências, sugestões e contribuições, procurando
viabilizar o atendimento dessas demandas, numa perspectiva de construção da
cidadania.
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3. ESTRATÉGIAS DE AÇÕES
4. Analisar as possibilidades de implementação de Programas, Projetos, Áreas
de Atuação dentro de cada região, a partir da articulação com lideranças
comunitárias e a avaliação pedagógica, buscando viabilizar a diversidade de
ações sistemáticas e assistemáticas.
5. Investir na articulação com a comunidade, fortalecendo parcerias, apoiando
iniciativas e estimulando a organização e participação de grupos.
6. Potencializar o lazer esportivo e recreativo de cunho participativo,
priorizando o “Jogando em Porto Alegre”, festivais multiesportivos e eventos
regionais.
7. Aproximar as demandas das comunidades locais com as Resoluções da II
Conferência Municipal de Esportes e o IV Congresso da Cidade.
8. Aprofundar o diálogo, viabilizando a implementação das Resoluções da II
Conferência junto ao Fórum de RAs, Reuniões Pedagógicas e Comunitárias.
9. Manter a descentralização dos grandes Eventos da SME (Dia das Mães, Dia
dos Pais, Criançando).
10. Ratificar o investimento na qualificação do Quadro de Recursos Humanos da
SME, através de reuniões sistemáticas, seminários, palestras e grupos de
estudos, a partir da contribuição de palestrantes/oficineiros convidados e ou da
própria Secretaria.
11. ATRIBUIÇÕES DO RESPONSÁVEL POR ATIVIDADES
12. Implementar, em todas as ações no seu espaço de responsabilidade, os
Princípios e Diretrizes da SME, expressos neste Documento ou no Fóruns de
RA’s.
13. Representar as políticas da SME em fóruns regionais ou locais, de forma
articulada com as Gerências e Assessoria Comunitária.
14. Articular as representações (professores e estagiários da SME, de outras
Secretarias, lideranças comunitárias, de Associações, ONG’s, etc.) ligadas ao
campo do Esporte, da Recreação e do Lazer de Porto Alegre, para que
mantenham uma agenda de reuniões para o acompanhamento das Resoluções
da II Conferência Municipal de Esportes, Recreação e Lazer e de planejamento
participativo na sua região ou Programa.
15. Investir no mapeamento da região, identificando as manifestações,
organizações e lideranças na área do lazer esportivo e recreativo.
16. Buscar a articulação com as organizações e lideranças na área do lazer
esportivo e recreativo com o objetivo de potencializar ações nessa área.
17. Promover reuniões de trabalho com parceiros, para apresentação e
constituição de planejamento conjunto.
18. Orientar a ação dos professores da região, garantindo um trabalho que
integre grupos já existentes e fomente a organização de outros.
19. Definir, junto com a Assessoria Pedagógica, a duração das aulas, o
número de aulas por turno e o número de alunos em cada turma, considerando
a especificidade de cada local, atividade, faixa etária (vide item 13.1).
20. Divulgar e aplicar critério administrativo geral para renovação e
preenchimento de vagas de alunos.
21. Efetivar o registro das ações das Unidades Recreativas, Projetos,
Programas e Centros de Comunidade, garantindo o fluxo de comunicação com
!
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as Gerências Pedagógica, Executiva e Planejamento (projetos, relatórios,
demonstrativos mensais, turno-extra, folha-ponto, etc). Lembramos que
investimentos e ampliações das ações dependem da justificativa baseada em
dados qualificados e atualizados.
22. PERFIL E ATRIBUIÇÕES DO PROFESSOR
23. Pautar a sua atuação de EDUCADOR em princípios de
DEMOCRATIZAÇÃO, INCLUSÃO SOCIAL E ÉTICA, baseado na articulação
com a comunidade.
24. Atuar como facilitador no desenvolvimento da corporeidade, vendo o ser
humano de forma integral, não fragmentada (indivíduo inserido num contexto
cultural, social e econômico, que estabelece relações singulares com a fruição
do Lazer, esportivo ou recreativo).
25. Qualificar o registro das ações desenvolvidas.
26. Buscar, dentro dos critérios administrativos da SME, a constante
qualificação teórica através da participação em congressos, seminários, cursos,
extensão acadêmica (pós-graduação, mestrado, doutorado), além dos Fóruns
promovidos pela própria Secretaria (Reuniões por Área de Atuação, Seminário
Interno, Projeto Reflexão, entre outros).
27. Planejar estratégias que visem materializar as diretrizes aqui apresentadas.
28. Intervir junto às parcerias, integrando-as de forma sistemática e em sintonia
com a política pedagógica da SME.
29. Conectar o trabalho desenvolvido com grupo específico (grupo de
ginástica, escolinha de aprendizagem esportiva e outros) com a articulação
comunitária (associações de bairro, escolas, centros de comunidade, etc.). Deve
entender como sua a tarefa de ativação dos grupos da comunidade na área do
lazer esportivo e recreativo comunitários, potencializando sua ação.
30. PERFIL E ATRIBUIÇÕES DO ACADÊMICO DE EDUCAÇÃO FÍSICA:
31. Ter disponibilidade para atuar nas áreas de recreação, esporte e promoção
á saúde, nos diversos programas, eventos e atividades sistemáticas da SME.
32. Estabelecer uma relação constante com o R.A. e Assessoria Pedagógica,
buscando qualificar a sua experiência docente.
33. Estabelecer como referência para sua atuação docente, as diretrizes
expressas neste documento, com ênfase para o item 10 (PERFIL E
ATRIBUIÇÕES DO PROFESSOR, pg. 9).
34. Manter registro atualizado e qualificado de suas ações docentes.
35. Proceder o envio da documentação necessária para renovação do seu
estágio.
12. DIRETRIZES PEDAGÓGICAS GERAIS
36. Democratizar o acesso à participação nos grupos;
37. Direcionar ações na perspectiva da inclusão social;
38. Investir na formação de um sujeito participativo e atuante;
39. Favorecer o desenvolvimento de uma cultura corporal diversificada;
40. Fomentar a valorização e preservação dos espaços, equipamentos e
serviços públicos;
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41. Estabelecer vínculos não só com os usuários, mas também com suas
famílias, na perspectiva de consolidar o aspecto educativo e participativo das
atividades sistemáticas e dos eventos promovidos pelos grupos das Unidades
Recreativas, Programas ou Projetos;
42. Registrar, de maneira sistemática, os dados referentes às diversas ações
da SME: investigações e pesquisas, atendimentos sistemáticos e assistemáticos,
contatos com parceiros e líderes comunitários, reuniões, etc.
43. Incentivar o ingresso de novos integrantes no grupo a qualquer momento e
de forma receptiva;
44. Incentivar e apoiar, na esfera regional e local, o intercâmbio entre os
grupos, através de encontros, festivais, passeios, torneios, campeonatos, etc.
45. Fomentar o intercâmbio intergeracional;
46. Adequar a metodologia de ensino às faixas etárias/fases do
desenvolvimento dos diferentes grupos de população atendida (vide Anexo 1).
47. Crianças:
48. Nas faixas iniciais, a intervenção didática do professor é mais
marcante, caracterizando uma estrutura de aula;
49. Caráter eminentemente recreativo das atividades.
50. Aprofundamento das relações com a família.
51. Adolescentes:
52. Preparar os grupos para a autogestão: a responsabilidade e o
comprometimento do próprio grupo, num processo gradual, com o
desenvolvimento das atividades: a partir dos 16 anos, a estrutura de aula
lugar a outra onde o professor atuará estimulando, orientando e
apoiando as iniciativas do grupo;
53. Adultos e idosos:
54. A dinâmica e as estratégias de acompanhamento do professor
nas atividades sistemática e/ou assistemática deverá ser previamente
planejada e acordada com o Responsável por Atividades em conjunto
com a Assessoria Pedagógica, considerando o processo de co-gestão e
objetivando a autonomia dos grupos.
55. Oportunizar o conhecimento e a instrumentalização referente
aos assuntos de interesse dos grupos, promovendo e divulgando
palestras e vivências sobre temas específicos para a faixa etária.
56. Incentivar a prática de atividade física orientada e,
preferencialmente, sistemática.
57. INSTÂNCIAS DE REUNIÃO:
58. Reuniões Gerais: com temas político-pedagógicos transversais ou de
ordem administrativa.
59. Reuniões por Região: Análise, mapeamento, diagnóstico e
planejamento de ações.
60. Reuniões por Equipe de Trabalho: destinada a momentos de estudo,
planejamento de atividades sistemáticas e assistemáticas, avaliação, tarefas
administrativas.
61. Reuniões por Área de Atuação: visando sistematizar reuniões de
aprofundamento de estudos e troca de experiências, são considerados, para
efeitos meramente didáticos, os seguintes grupos de produção de
conhecimento:
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62. Recreação: congrega profissionais dos Programas Brincando na
Rua, Brincalhão, Brinquedotecas, Graxaim e outras ações.
63. Promoção à Saúde: envolve os profissionais dos Programas
Lazer&Saúde, De Bem com a Vida, Musculação, Ginástica (nas suas
diversas formas), Alongamento, Ioga, Biodança, Capoeira, Dança, Tai Chi
Chuan e outros.
64. Esporte: abrange todos os profissionais da SME envolvidos com
as manifestações esportivas grupos de atividades multiesportivas,
futebol, futsal, voleibol, handebol, basquetebol, tênis, ginástica olímpica,
Programa ECCE e outras modalidades.
65. ORIENTAÇÕES AO PLANEJAMENTO DO TRABALHO PEDAGÓGICO 2004
66. Considerações Gerais:
“O planejamento é uma das conquistas de liberdade maiores que o homem
pode almejar. Porque o plano é a tentativa do homem criar seu futuro; é lutar contra
as tendências e correntes que nos arrastam; é ganhar espaço para escolher; é
mandar nos fatos e nas coisas para impor a vontade humana; é negar-se a aceitar o
resultado social que nos oferece; é rejeitar o imediatismo; é somar a inteligência
individual para multiplicá-la como inteligência coletiva criadora.” (MATUS, Carlos
Adeus Senhor Presidente)
Vendo o ato de planejar segundo este enfoque, buscamos garantir condições
de realização para qualquer atividade que vise ao alcance de objetivos, pois orienta
as ações, envolvendo critérios, prioridades e recursos, a partir da realidade
existente. Considera-se, ao planejar, portanto:
67. avaliações anteriores;
68. as várias dimensões da realidade cognitiva, social, política;
69. os princípios, eixos e diretrizes da política municipal de esportes,
recreação e lazer;
70. os usuários dos serviços, programas e projetos - sujeitos de sua vida;
71. as regiões do Orçamento Participativo;
72. planejamento regional da SME;
73. etapas do calendário geral da SME;
74. os parceiros e suas formas de organização.
75. O planejamento é um roteiro de trabalho por isso, deve ser sucinto, claro, real,
passível de alterações, sempre que necessário.
ROTEIRO PARA ELABORAÇÃO DO PLANEJAMENTO GERAL 2004
IDENTIFICAÇÃO:
Local:
Região:
Prof.:
AVALIAÇÃO DO TRABALHO REALIZADO EM 2003:
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OBJETIVOS:
METAS:
METODOLOGIA:
RECURSOS:
Materiais:
Existentes:
Para aquisição:
Para solicitação:
Permanentes:
De consumo:
Humanos:
Professores:
Estagiários:
Funcionários:
Contratados:
CRONOGRAMA DE ATIVIDADES SISTEMÁTICAS:
CRONOGRAMA DE ATIVIDADES ASSISTEMÁTICAS:
12. INDICATIVOS PEDAGÓGICOS-ADMINISTRATIVOS
DO NÚMERO DE GRUPOS/TURMAS POR TURNO DE TRABALHO
!
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Salvo alguma especificidade (que deve ser analisada com a Chefia
Direta e Assessoria Pedagógica), o professor deve atender a, no
mínimo, três grupos, com duração de 1h15min. Outro indicativo é de
quatro grupos de 45min, com 15min de intervalo entre as aulas –
considerando os turnos com 4 horas.
DA POSTURA DO EDUCADOR NO ESPAÇO DE TRABALHO
É expressamente proibido fumar no ambiente de trabalho.
É expressamente proibido consumir ou apresentar-se ao exercício
profissional sob o efeito de bebidas alcoólicas ou outras substâncias
consideradas drogas ilícitas.
OBS: a não observação das orientações do item 13.2. sujeita o
servidor ao que estabelece o Estatuto do Funcionalismo Público
Municipal de Porto Alegre.
NORMAS PARA AUTORIAS DE TRABALHOS E APRESENTAÇÃO
DA INSCRIÇÃO: Antes da inscrição em eventos para apresentação de
trabalho representando a SME, o profissional deverá solicitar
autorização/liberação. Em havendo autorização, DEFINIR DETALHES
referentes à dispensa e forma de compensação.
DA PARTICIPAÇÃO: Ministrar palestras, realizar apresentações em
seminários, pôsteres.
Forma de participação:
Por convite = Em forma de ofício por parte da Instituição
interessada, dirigido ao Gabinete desta Secretaria.
Por Interesse; Por memorando encaminhando solicitação de
autorização/ dispensa, anexando a programação do evento.
Para qualquer tipo de participação, quando representando a
SME, deve ser encaminhado a Gerência Pedagógica, o texto da fala
ou resumo dos assuntos a serem abordados.
A análise do material a ser apresentado é de
responsabilidade da Gerência Pedagógica.
DA ASSINATURA DOS TRABALHOS:
Sempre que o material produzido for elaborado em horário de
trabalho por solicitação da SME e de divulgação das políticas
da secretaria, a autoria não será nominal, se da SME (ou
setor);
Se a produção for de iniciativa pessoal, será garantida a autoria
nominal, com data e identificação funcional.
OBS: Esta produção será analisada e caso seja necessário, o
autor fica responsável pelas correções sugeridas.
DOS PRAZOS:
Os prazos de encaminhamento à Gerência Pedagógica para análise e
providência relativa às participações (representações, etc...) em eventos,
seminários, palestras, cursos etc., será de no mínimo 15 dias e 45 dias
quando implicar em liberação de recursos financeiros.
LIBERAÇÃO PARA PARTICIPAÇÃO EM CONGRESSOS,
SEMINÁRIOS, CURSOS E OUTROS
Deverá obedecer aos seguintes critérios:
40 h por semestre;
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Garantia de não prejudicar as atividades;
Solicitação por memorando do RA;
Entrega de cópia do certificado para arquivo.
OBS: Durante o período do Projeto Porto Verão não haverá
liberação para participação em cursos, seminários, etc.,
tendo em vista a exiguidade de recursos humanos da SME.
Casos excepcionais serão examinados pelas Gerências.
NORMATIZAÇÃO DOS PASSEIOS COM GRUPOS
Considerando a política de construção de autogestão para grupos
adultos e de idade, atividades como passeios, viagens, chás, jantares, não
devem estar vinculados ao acompanhamento por professor responsável
da SME, salvo análise e liberação específica pelo RA com a Assessoria
Pedagógica.
Número de Passeios por Ano (com crianças e adolescentes): 1 por
semestre.
Priorizar a realização em horário de trabalho (sem hora extra) do
profissional responsável, considerando-se os turnos manhã e tarde (sem
horário corrido).
Se o dia marcado for dia de semana, mas folga do professor, será
contado, no máximo, os turnos da manhã e da tarde (8 horas, se o passeio for
de dia inteiro).
Caso seja impossível organizar o passeio em dia de semana, priorizar
o sábado, considerando os turnos manhã e tarde, sem ser horário corrido.
Passeios marcados para domingo dependerão de análise criteriosa e
autorização pelo RA e Assessoria Pedagógica.
ATENÇÃO:
Até 17 de março de 2004 todo o quadro de horário de professores e estagiários, bem
como o quadro de atividades, deve ser entregue à Gerência Pedagógica.
JOGANDO EM PORTO ALEGRE 2004
PERÍODO DE INSCRIÇÕES: de 30 de março a 23 de abril de 2004,
junto a Gerência de Eventos.
Congressos Técnicos:
Data:
Horário/Local:
VOLEIBOL
28 DE ABRIL DE 2004
BASQUETEBOL
29 DE ABRIL DE 2004
FUTEBOL DE CAMPO
04 DE MAIO DE 2004
HANDEBOL
10 DE MAIO DE 2004
FUTSAL (Pré-Mirim/Mirim)
12 DE MAIO DE 2004
Todos os Congressos Técnicos
serão realizados na Sala de
Reuniões da SME, na Av. Érico
Veríssimo, 843 às 19 horas.
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FUTSAL (Infantil/Infanto)
13 DE MAIO DE 2004
CERIMÔNIA DE ABERTURA: 22 DE MAIO DE 2004
14h – GINÁSIO TESOURINHA
Modalidade
Categoria
Handebol
Futsal
Voleibol
Basquete
Futebol
Pré-Mirim
92/93/94
M/F
93/94
M/F
XXX
Pré-mini
93/94/95 misto
93/94
M/F
Mini
XXX
XXX
93/94/95
M/F
92/93
misto
XXX
Mirim
91
M/F
91/92
M/F
91/92
M/F
91
M/F
91/92
M/F
Infantil
89/90
M/F
89/90
M/F
89/90
M/F
89/90
M/F
89/90
M/F
Cadete
88
M/F
XXX
XXX
XXX
XXX
Infanto
XXX
87/88
M/F
86/87/88
M/F
XXX
87/88
M/F
Juvenil
86/87
M/F
XXX
XXX
86/87/88
M/F
XXX
DIRETRIZES ADMINISTRATIVAS 2004
GERAIS:
Como critérios de operacionalização para a programação 2004, adotamos:
O planejamento deverá ser avaliado, no mínimo por trimestre e, sempre que
necessário, adequado ao contexto;
A programação permitirá uma visão geral das necessidades referentes aos
recursos materiais e humanos;
Todo evento que demandar recursos humanos e ou materiais externos aos
da Região, deverá ser detalhado em Projeto Específico, que será
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identificado por código referente na Programação 2004. Obs. A presença do
evento na Programação Anual não isenta da formulação do referido Projeto
e da análise com a Assessoria Pedagógica.
Esses projetos deverão ser encaminhados à Assessoria Pedagógica com
antecedência de, no mínimo, 10 dias da realização do evento, para que,
após análise e aprovação, sejam encaminhados à Gerência Executiva, para
providências;
Os eventos que não envolverem recursos humanos e ou materiais externos
aos da Região, deverão ser analisados e aprovados pela Assessoria
Pedagógica e relatados em formulário específico para este fim (Relatório de
Atividades Assistemáticas Regionais/Locais).
A solicitação de cancelamento de qualquer evento deverá ser feita, via
memorando, à Gerência Executiva, Pedagógica e ou de Planejamento, com
antecedência de, no mínimo, 15 dias da data prevista, com a devida
justificativa, para posterior análise e parecer.
Cancelamentos de eventos por mau tempo não enquadram-se no item
anterior, devendo, no entanto, dar-se somente no momento e local de sua
realização.
Eventos transferidos somente serão viabilizados em outra data após análise
e autorização das Gerências.
EFETIVIDADE:
O controle da efetividade de professores, funcionários e estagiários é de
responsabilidade dos RA´S, que deverão observar os prazos previstos para
evitar atrasos no lançamento de dados, o que poderá prejudicar a vida
funcional dos profissionais.
Participação em Atividades Extras:
Atividades extras somente serão computadas, quando estiverem previstas no
projeto ou quando forem convocadas pelos RA(s) ou Gerência Executiva;
O registro dos turnos extras é responsabilidade dos RA(s), que devem
também registrar a retirada dos mesmos;
Quando um professor estiver subordinado a mais de um RA, deverá realizar
os turnos extras compatíveis com a carga-horária de cada local, de forma
que os RA(s) estejam cientes dos turnos realizados para compensação sem
prejuízo das atividades sistemáticas; da mesma forma, a definição de
períodos de compensação devem ser acordados entre os RA´s envolvidos;
Os registros de turnos extras deverão ser feitos nos relatórios de evento ou
na planilha de turnos extras (quando não houver projeto específico da
atividade);
Faz-se necessário observar os prazos previstos para entrega de projetos,
relatórios, planilhas, folhas-ponto e demais documentos. Para que o Banco
de Dados permaneça sempre atualizado, os registros devem ser
sistemáticos. Os atrasos na entrega de relatórios inviabilizam o
acompanhamento dos dados.
A documentação deverá ser entregue na 1
a
reunião de RA´s subseqüente ao
mês a que se refere.
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LICENÇA-PRÊMIO:
A SME tem como indicativo a concessão de LP somente nos meses de março,
julho e dezembro.
REDUÇÃO DE CARGA HORÁRIA PARA ESTUDO:
Deverá ser solicitada tão logo ocorrer a matrícula, mediante processo, do
qual conste, inclusive, documento comprobatório de que o curso não seja
oferecido em horário diferente do de trabalho;
A redução somente será computada após aprovação, devendo o professor
recuperar os turnos reduzidos antes da homologação da redução.
DIRETRIZES JURÍDICAS:
ORIENTAÇÕES A CEDÊNCIA DE PRÓPRIOS MUNICIPAIS E ASSESSORIA TÉCNICA
ÀS COMUNIDADES
Quanto à cedência de espaços fechados, tais como salas e quadras de
ginásios, a Grupos autônomos para desenvolvimento de atividades tais como
alongamento, pintura em tela, biodança, yoga, ginástica, reuniões de entidades
comunitárias (associações, ligas), etc.
12.1.1. O grupo deverá encaminhar ofício ao Gabinete da SME, diretamente
ou via Responsável por Atividades, solicitação de cedência, descrevendo a
utilização pretendida, especificando a dependência, o(s) dia(s) da semana e o
horário;
12.1.2. A solicitação deverá estar acompanhada de relação com nomes dos
solicitantes com respectivos números de cédula de identidade e assinatura;
12.1.3. O Responsável por Atividades da Região será solicitado a emitir
parecer sobre a solicitação;
12.1.4. A cedência autorizada terá validade por até 6 meses, encerrando
sempre em 30 de junho e 31 de dezembro;
12.1.5. Será firmado entre a SME e grupo solicitante termo de cedência onde
estarão definidas as responsabilidades das partes;
12.1.6. A renovação de cedência poderá ser requerida quando houver
interesse dos solicitantes;
12.1.7. Qualquer intervenção no espaço físico só poderá ser feita com
autorização prévia da SME;
12.1.8. Todo o investimento, melhoria realizado pelo grupo no espaço cedido,
será integrado ao patrimônio da prefeitura através de doação.
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12.1.9. Quanto à prestação de assessoria de caráter técnico e pedagógico no
desenvolvimento de atividades de lazer esportivo e recreativo com crianças
e/ou adolescentes tais como o realizado pelo programa ECCE e Graxaim.
12.1.10. A comunidade interessada deverá requerer à SME a prestação de
assessoria técnico/pedagógica, apontando em que modalidade entre as que a
SME se propõe prestar;
12.1.11. A solicitação deverá ser encaminhada por entidade comunitária de
representação de moradores, clube de mães, conselho popular ou outra
entidade afim;
12.1.12. O deferimento estará condicionado a análise da solicitação e a
disponibilidade de recursos;
12.1.13. Será firmado entre a SME e a entidade comunitária solicitante termo
de prestação de assessoria onde estarão definidas as responsabilidades das
partes.
ANEXO 01:
CRONOGRAMA DE EVENTOS GERAIS 2004:
PORTO VERÃO 2004:
INTERCENTROS DE NATAÇÃO: 29 de Fevereiro, no CECOVE;
REUNIÃO DE ABERTURA:
08 DE MARÇO – Auditório da Caixa Econômica Federal;
Tema: “Políticas Sociais em Porto Alegre: perspectivas para 2004”
Palestrante: Gérson Almeida, Secretário Geral de Governo de Porto Alegre.
SEMANA DE PORTO ALEGRE:
DE 19 À 28 DE MARÇO;
QUALIFICAÇÃO COM ESTAGIÁRIOS DE EDUCAÇÃO FÍSICA:
20 DE MARÇO, DAS 14h ÀS 19h, SALA 27 DO GIN. TESOURINHA;
ABERTURA DO E.C.C.E.:
FESTIBOL: 27 DE MARÇO – Pq. Ramiro Souto;
CARINHO EM JOGO:
09 DE MAIO - PARQUE DA REDENÇÃO;
ABERTURA DO JOGANDO EM PORTO ALEGRE:
22 DE MAIO – GINÁSIO TESOURINHA;
13º VIVA O BASQUETE:
DE 24 DE ABRIL À 12 DE MAIO;
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CURSO DE ARBITRAGEM PARTICIPATIVA (NÚCLEO COMUM – 3ª EDIÇÃO)
04 E 05 DE JUNHO;
10º VIVA O VOLEI:
DE 10 À 30 DE JUNHO;
CURSO DE ARBITRAGEM PARTICIPATIVA (NÚCLEO ESPECÍFICO: BASQUETE)
26 E 27 DE JUNHO;
CURSO DE ARBITRAGEM PARTICIPATIVA (NÚCLEO ESPECÍFICO: FUTSAL)
01
O
, 02 E 03 DE JULHO;
CURSO DE ARBITRAGEM PARTICIPATIVA (NÚCLEO ESPECÍFICO: HANDEBOL)
09 E 10 DE JULHO;
SEMINÁRIO INTERNO DA SME:
06 E 07 DE AGOSTO (indicativo);
PRA SER PAI TEM QUE BRINCAR:
08 DE AGOSTO – PARQUE DA REDENÇÃO;
2º VIVA O HANDEBOL
DE 14 À 25 DE AGOSTO
CRIANÇANDO (Regionalizado)
Pq. Chico Mendes: 09 DE OUTUBRO
Pq. Marinha do Brasil: 12 DE OUTUBRO
Restinga: 14 DE NOVEMBRO
Entrada da Cidade: 24 DE OUTUBRO
2ª MEIA-MARATONA MERCOSUL-3ª PERIMETRAL
17 DE OUTUBRO;
ATIVIDADE DE ENCERRAMENTO 2004:
13 DE DEZEMBRO (indicativo);
ABERTURA DA TEMPORADA DO PORTO VERÃO 2005:
12 DE DEZEMBRO – Triathlon no Lami;
14 DE DEZEMBRO – indicativo para abertura das piscinas.
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ANEXO 2:
ESTUDO SOBRE METODOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO ESPORTIVO POR
FAIXA ETÁRIA
84
:
FAIXAS ETÁRIAS
Faixa
Etária
Características de
Comportamento
Atividades/Procedimentos
Pode ser trabalhado:
- A Criança quer brincar.
- Gosta de jogar; tem
interesse pelo esporte.
- O jogo deve ter adaptações; as regras podem ser
discutidas junto com as crianças de acordo com o
interesse do grupo.
- Coordenação motora.
- Habilidades.
- Apresenta característica
marcante de individualidade.
- O fundamento que apresenta-se com maior
dificuldade no jogo é o passe; propor atividades que
solicitem a capacidade individual e permitam
progresso.
- Velocidade (através do
aumento da freqüência dos
movimentos).
- Gosta de ser o centro das
atenções.
- Equilibrar os níveis de desempenho na formação das
equipes.
- Aperfeiçoamento dos
hábitos motores naturais.
- Tem curto período de
atenção.
- Preparar atividades diversificadas e de curta
duração.
- Flexibilidade
- Gosta de muita repetição de
atividades.
- Solidificar atividades conhecidas.
- Ritmo.
- Tem dificuldade de aceitar a
derrota.
- Propor situações nas quais ela possa aprender a
ganhar e a perder.
- Resistência: em geral as
crianças são resistentes,
alternam o esforço e o
descanso;
- É dispersiva, imprudente e
bruta.
- Incluir jogos de tocar e pegar o outro.
- É sensível ao que os
adultos sentem pensam
sobre ela.
- Entender que a criança necessita de elogios e
atenção.
- Resistência natural. São
desaconselháveis ações de
grande intensidade.
- Adquire consciência social.
- Oportunizar que a criança aprenda a acatar ordens e
costumes sociais.
- É imitativa (ídolos)
- Proporcionar espaços para jogos e descobertas
- Fase da combinação dos
movimentos fundamentais e
aprimoramento dos mov.
Naturais (andar, correr,
saltar...).
- Proporcionar experiências motoras com elementos
básicos das diferentes modalidades;
- Jogos dirigidos, de perseguição e estafetas;
- Grande número de estímulos (materiais e situações
variadas) e atividades com obstáculos.
- Diferenciação entre sexos
não é acentuada.
- Trabalhar com grupos mistos.
Criança
Até 12
anos
(até 6ª
Série)
- Gostam de medir forças.
- Oportunizar a competição como simples confronto de
capacidades e habilidades, onde o superar ou ser
superado não implique na dor da derrota ou na glória
da vitória, e sim do prazer de participar.
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
84
Realizado pelos Responsáveis por Modalidades, no 2º semestre de 2001, a partir da discuso na
Área de Atuação, com professores, estagiários e RA’s.
!
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FAIXAS ETÁRIAS
Faixa
Etária
Características de
Comportamento
Atividades/
Procedimentos
Pode ser trabalhado:
O objetivo é o jogo
Do coletivo do adolescente
fazem parte 1 ou 2 amigos.
- Planejar atividades em pequenos
grupos (2 a 2, 3 a 3, 4 a 4).
- Dificuldade em definir limites
individuais.
- Incluir a iniciação tática dos
conceitos de ataque e defesa nos
jogos coletivos.
- Força (utilização do
peso do próprio corpo).
- Ainda apresenta
individualidade, mas começa a
transposição do conhecimento
de si para o conhecimento dos
outros (considera o que os
outros pensam).
- Propor jogos de estratégias em
equipes, buscando a execução
correta dos movimentos em
relação aos companheiros.
- Conta com meios para
conquistar sua autonomia.
- Identificar o erro, informar o certo
e reforçar a realização correta.
- Compartilha responsabilidades
e enfrenta as dificuldades.
- Procurar enriquecer a prática
responsabilizando a participação
na arbitragem, na organização,
etc.
- Solicitam realizar movimentos
culturalmente determinados e
apreciam modelos.
- Proporcionar a prática da técnica
das modalidades.
13 ANOS
(entre
12 14)
(7
a
e 8
a
séries)
- Faz opção pela modalidade (s)
pretendida(s).
- Procurar enriquecer a prática
utilizando maior número de
exercícios que se relacionem com
a modalidade.
- Velocidade (em regime
de resistência).
- Flexibilidade
- Ritmo.
- O adolescente quer jogar e
competir.
- Conseguem envolver/
enxergar/ incluir todos enquanto
coletivo.
- Apoiar iniciativas de autonomia e
auto-organização.
- Força ( resistência e
explosiva) não devem
ser aplicados
- O corpo se desenvolve
rapidamente (crescimento) e o
adolescente pode ter atitudes
“sem querer” no jogo, pela
dificuldade de coordenação
motora.
- Propor atividades variadas de
conteúdos técnico e tático.
exercícios de força
máxima antes da
formação plena do
esqueleto.
- Velocidade (
resistência).
- O emocional é muito
importante: fixa-se em modelos e
lideranças.
- Proporcionar experiências
técnico-táticas de tomada de
decisões.
- Flexibilidade.
- Ritmo.
- Costumam discriminar colegas
que diferem das características
do grupo. Agregam-se por
afinidades.
- Estimular atividades integradoras
em jogos que preservem as
características individuais.
- Resistências: aeróbica
(aumento crescente);
anaeróbica (aumento
até 18 anos).
Ado
l
Adolescente
t
es
15 ANOS
(entre
14 16)
- Reestruturação das habilidades
e capacidades motoras.
- Combinar sistemas de jogo que
contemplem as diferenças
individuais existentes no grupo.
!
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- São instáveis e rebeldes.
- Trabalhar o diálogo, o estímulo,
a socialização e a discussão das
regras.
- O objetivo é o jogo competitivo.
- Sentem necessidade de
combinar sistemas ofensivos e
defensivos para atuar no jogo.
- É importante o aprimoramento
das habilidades técnicas da
modalidade (treinamento físico-
técnico-tático).
- Não há limitação para
o desenvolvimento das
qualidades físicas.
- Diferenciação específica dos
sexos.
- Propor atividades que respeitem
as diferentes características de
gênero.
- Experimenta conflitos e
contradições.
- Solucionar conflitos sociais e
pedagógicos surgidos nos grupos.
- Definição da maturação
biológica.
- Planejar também o trabalho
especial direcionado às posições
e funções no jogo.
- Tem coragem para assumir
posturas da sua personalidade.
- Apresentar atividades que
contemplem as diferentes
lideranças.
18 ANOS
(entre 16
17)
- São críticos e observadores.
- Possibilitar o diálogo e valorizar
as idéias dos alunos.
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ANEXO 03 DOCUMENTO INSTITUCIONAL SOBRE POLÍTICAS E
PRIORIDADES DA SME – 1995
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ANEXO 04 DOCUMENTO INSTITUCIONAL DA SERP/SMED COM
SISTEMATIZAÇÃO DE PROPOSTAS DE SEMINÁRIO DE PROFESSORES
1989.
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ANEXO 05 DOCUMENTO INSTITUCIONAL PRESSUPOSTOS POLÍTICOS E
PEDAGÓGICOS DA SME – 2007.
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ANEXO 06 – DOCUMENTO INSTITUCIONAL – REFERENCIAIS E ORIENTAÇÕES
PEDAGÓGICAS SME – 2009.
EXTRATO DA AGENDA 2009
p.11
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p.13
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p.14
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ANEXO 07 EDITAIS PARA O CONCURSO PÚBLICO PARA PROFESSORES
DO MUNICÍPIO DE PORTO ALEGRE - 2008
NOVEMBRO DE 2008
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