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Sêda (1999) acrescenta que, na perspectiva da Doutrina da Situação Irregular
acima referida, crianças e adolescentes eram punidos sob o eufemismo de que
estavam sendo protegidos. Após a promulgação do Estatuto da Criança e do
Adolescente (ECA), o Direito Infracional ganhou autonomia (ROSA, 2005)
25
. Isso
quer dizer que o Direito Infracional não poderia mais ser considerado apêndice do
Direito Penal, de Família ou abordado em conjunto com as demais disposições do
ECA, evitando, assim, o risco da manutenção da Doutrina da Situação Irregular.
Assim, com a Constituição de 1988, crianças e adolescentes são incluídos
nos atributos contidos no Direito Penal. Isso quer dizer que os menores de 18 anos
não são mais punidos pelo que são (Doutrina da Situação Irregular), mas somente
por condutas que a sociedade reprova. Tais condutas estão descritas em lei, tanto
no Código Penal quanto na legislação penal extravagante. Dessa forma, para o
Estatuto, somente é aceita punição para atos definidos no Código Penal, sendo o
Código de Processo Penal somente usado quando as normas gerais do Estatuto
forem insuficientes (SÊDA, 2000).
Nesse sentido, quando é atribuída a um adolescente uma conduta definida
como crime ou contravenção penal
26
, ele pode gozar da presunção da inocência,
assim como o adulto tem direito à defesa por advogado e é submetido a julgamento
para responder a essa conduta. Ele poderá ser sentenciado, sendo-lhe aplicada ou
não medida socioeducativa
27
.
Nesse ponto, cabe frisar o posicionamento de Rosa (2005) ao referir que a
aproximação ao Direito Penal tem pouca coisa de garantista
28
, já que a Doutrina da
Situação Irregular, superada democraticamente, persiste no imaginário dos atores
processuais. Para esse autor, o Direito Penal não é salutar nem para os imputáveis,
25
É importante ressaltar que a Convenção Internacional da Criança, aprovada em 1989, foi de grande
importância para a elaboração do ECA e também responsável pela autonomia do Direito Infracional.
26
“Considera-se ato infracional a conduta descrita como crime ou contravenção penal”. BRASIL.
Estatuto da Criança e do Adolescente. Lei n. 8069 de 13 de julho de 1990. Título III, que trata da
prática de ato infracional, artigo 103.
27
Diferentemente do adulto que, em caso de acometimento de crime ou contravenção lhe é atribuído,
após julgamento, uma pena (referente ao Código Penal).
28
Histórica e culturalmente, o Garantismo surgiu como teoria e prática jurídica direcionadas à defesa
dos direitos de liberdade. Vincula-se ao conceito de Estado de Direito, modelo jurídico destinado a
limitar e evitar a arbitrariedade do poder estatal. Por ser o poder do Estado o que mais restringe ou
ameaça a liberdade pessoal, o Garantismo se desenvolveu como Garantismo penal. Inicialmente, a
palavra Garantismo, no contexto do trabalho de Ferrajoli, seria um “modelo normativo de direito". Tal
modelo normativo se estrutura a partir do princípio da legalidade, que, afirma o autor, é a base do
Estado de Direito. Direito e Razão de Luigi Ferrajoli. Dicionário de Direitos Humanos. Disponível
em:
http://www.esmpu.gov.br/dicionario/tiki-index.php?page=Garantismo