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DENISE DE FÁTIMA STADLER
ASSÉDIO MORAL: UMA ANÁLISE DA TEORIA DO ABUSO DE DIREITO
APLICADA AO PODER DO EMPREGADOR
PONTA GROSSA
2007
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1
DENISE DE FÁTIMA STADLER
ASSÉDIO MORAL: UMA ANÁLISE DA TEORIA DO ABUSO DE DIREITO
APLICADA AO PODER DO EMPREGADOR
Dissertação apresentada como requisito
parcial à obtenção do título de Mestre em
Ciências Sociais Aplicadas, área de
concentração Sociedade, Direito e
Cidadania, da Universidade Estadual de
Ponta Grossa.
Orientadora: Prof Dr Silvana Souza
Netto Mandalozzo
PONTA GROSSA
2007
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3
DENISE DE FÁTIMA STADLER
ASSÉDIO MORAL: UMA ANÁLISE DA TEORIA DO ABUSO DE DIREITO
APLICADA AO PODER DO EMPREGADOR
Dissertação apresentada como requisito parcial para obtenção do título de Mestre
em Ciências Sociais Aplicadas na Universidade Estadual de Ponta Grossa, Área de
concentração Sociedade, Direito e Cidadania.
Ponta Grossa, 14 de fevereiro de 2007.
Prof. ª Dr. ª Silvana Souza Netto Mandalozzo - Orientadora
Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG)
Prof. ª Dr. ª Aldacy Rachid Coutinho
Universidade Federal do Paraná (UFPR)
Prof. ª Dr. ª Lucia Cortes da Costa
Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG)
4
Aos meus pais,
pelo incentivo e compreensão e
pelo muito que contribuíram com
seu exemplo de vida em vinha formação.
5
AGRADECIMENTOS
Gostaria de manifestar todo o meu agradecimento a diversas pessoas que
auxiliaram de alguma forma a materializar este trabalho.
Aos meus mestres, principalmente à Doutora Silvana Souza Netto
Mandallozzo, pela amizade e contribuição com seus conhecimentos e sugestões na
orientação dessa dissertação e à Professora Doutora Aldacy Rachid Coutinho, pelo
apoio, críticas e sugestões recebidas, minha gratidão e respeito.
Também à Professora Doutora Lucia Cortes da Costa, minha gratidão, pela
atenção e disponibilidade e notadamente pela análise crítica da parte final do
trabalho.
Aos professores do Mestrado em Ciências Sociais Aplicadas da
Universidade Estadual de Ponta Grossa e colegas de mestrado, pela agradável
convivência, incentivos e por tudo que me ensinaram.
6
RESUMO
O objeto deste trabalho centra-se na caracterização do fenômeno do assédio moral
na relação de emprego e no tratamento que lhe é dado pelo sistema jurídico. O
exame da questão inicia-se com a análise das formas de revelação do poder no
ambiente de trabalho e da subordinação jurídica do empregado, principalmente
levando-se em consideração a condição do poder diretivo do empregador. Em
seguida, investigam-se as implicações da reestruturação produtiva, na perspectiva
de entender como os novos padrões produtivos influenciam a construção da
subjetividade obreira e podem levar a abusos do poder de mando do empregador
passíveis de caracterizar casos de assédio moral. Além disso, analisa-se a
problemática da aplicação da teoria do abuso de direito e o tratamento dispensado
às práticas abusivas no ambiente de trabalho, buscando-se uma estratégia jurídica
para o enfrentamento do assédio moral. Por fim, examinam-se os projetos de lei que
buscam a regulamentação das condições para punição do assédio moral nas
relações de emprego e o problema do assédio sob a ótica dos Tribunais.
Palavras-chave: assédio moral; poder; subordinação; abuso de direito.
7
ABSTRACT
The subject of the present dissertation focus on the characterization of the
moral harassment phenomenon in the employment relationship and its legal
treatment. The analysis begins on the ways power is reveled in the working
environment and the legal subordination of the employee, especially focusing
the employer directive power condition. Next, the production restructuring
implications is investigated in search of understanding the way new production
patterns interacts in the construction of subjective working ( employee role ) and
makes it possible for the employer to abuse of his directive power in a way
which may be characterized as moral harassment. The problems involving the
abuse of rights theory application and the treatment given to abusive practices
in the working environment is also analyzed in search of a legal strategy to face
moral harassment. At last, the regularizing law proposals of conditions for the
moral harassment punishment in the working environment and the moral
harassment as it is seen by Courts is examined.
Key words: moral harassment; power; subordination; abuse of rights.
8
Era ele que erguia casas
Onde antes só havia chão
Como um pássaro sem asas
Ele subia com as casas
Que lhe brotavam da mão
Mas tudo desconhecia
De sua grande missão:
Não sabia, por exemplo
Que a casa de um homem é um templo
Um templo sem religião
Como tampouco sabia
Que a casa que ele fazia
Sendo a sua liberdade
Era a sua escravidão
(Vinícius de Moraes)
9
LISTA DE SIGLAS
ADI Ação Direta de Inconstitucionalidade
AJUFE Associação dos Juízes Federais do Brasil
ART Artigo
CC Código Civil Brasileiro
CEJ Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal
CF Constituição Federal
CFM Conselho Federal de Medicina
CIPA Comissão Interna de Prevenção de Acidentes
CLT Consolidação das Leis do Trabalho
CF/88 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
DJPR Diário de Justiça do Estado do Paraná
DJMG Diário de Justiça de Minas Gerais
DOU Diário Oficial da União
DOEP Diário Oficial do Estado de Pernambuco
FGTS Fundo de Garantia do Tempo de Serviço
LER Lesão por esforço repetitivo
OIT Organização Internacional do Trabalho
PL Projeto de Lei
Rel Relator
RO Recurso Ordinário
SEPT Síndrome de estresse pós-traumático
STF Supremo Tribunal Federal
TRT Tribunal Regional do Trabalho
TST Tribunal Superior do Trabalho
10
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ............................................................................................... 10
CAPÍTULO 1 - RELAÇÃO DE EMPREGO: PODER E SUBORDINAÇÃO ..........
15
1.1 FORMAS DE REVELAÇÃO DO PODER ......................................................
15
1.2 PODER E SUBORDINAÇÃO .........................................................................
21
1.3 PODER DO EMPREGADOR: O JUS VARIANDI ..........................................
38
CAPÍTULO 2 - O PODER EM FACE DAS MUDANÇAS NO MUNDO DO
TRABALHO .................................................................................
51
2.1
ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO E MANIFESTAÇÕES DO PODER DO
EMPREGADOR .............................................................................................
51
2.2
MUDANÇAS NO MUNDO DO TRABALHO E A CONSTRUÇÃO DA
SUBJETIVIDADE DO TRABALHADOR ........................................................
65
2.3
ABUSO DO PODER DO EMPREGADOR E A TEORIA DO ABUSO DE
DIREITO ........................................................................................................
70
CAPÍTULO 3 - ASSÉDIO MORAL NA RELAÇÃO DE EMPREGO ......................
82
3.1 CONCEITO E ELEMENTOS CARACTERIZADORES ..................................
82
3.2 MODALIDADES DE ASSÉDIO MORAL E CONDUTAS
CARACTERIZADORAS .................................................................................
95
3.3 CONSEQÜÊNCIAS DO ASSÉDIO MORAL ..................................................
102
3.4
ESTRATÉGIAS JURÍDICAS PARA ENFRENTAR O ASSÉDIO MORAL: A
VISÃO DOS TRIBUNAIS ...............................................................................
108
CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................
113
REFERÊNCIAS ......................................................................................................
117
ANEXO A – PROJETO DE LEI N. 4742/2001 .......................................................
125
ANEXO B – PROJETO DE LEI N. 4960/2001 .......................................................
126
ANEXO C – PROJETO DE LEI N. 5887/2001 .......................................................
129
ANEXO D – PROJETO DE LEI N. 2593/2003 .......................................................
131
ANEXO E – PROJETO DE LEI N. 2369/2003 .......................................................
141
ANEXO F – PROJETO DE LEI N. 33/2007 ...........................................................
148
ANEXO G – REPERCUSSÕES DA HUMILHAÇÃO NA SAÚDE, SEGUNDO O
SEXO .................................................................................................
152
ANEXO H – RESOLUÇÃO CFM N. 1488/98 .........................................................
154
11
INTRODUÇÃO
Pesquisar é indignar-se no trânsito pelos acontecimentos, pois eles são a
história em ação. Pesquisar é um modo de descobrir a história, construindo
verdades...fazendo gritar o silêncio!
(Mercedes Vilanova)
Este estudo tem por objeto a análise do fenômeno do assédio moral nas
relações de trabalho. Assim, abordar-se-ão aspectos relacionados à sua ocorrência
e conseqüências, enfatizando as estratégias jurídicas para o seu enfrentamento.
O estudo inicia-se com a busca de uma apreensão teórica do fenômeno do
poder e uma reflexão sobre sua amplitude nas relações de trabalho, sua utilização e
os desvios exteriorizados através de condutas de assédio.
Segundo Weber e Galbraith, a análise do poder centrada em aspectos
econômicos procura enfocar o poder a partir de suas fontes. Foucault estabelece
uma diferente ótica do poder, ao não percebê-lo concentrado em apenas um ponto
da estrutura social, mas diluído nessa estrutura e associado a técnicas e
procedimentos.
O poder presente no ambiente de trabalho é legitimado pelo ordenamento
jurídico com a subordinação jurídica do empregado ao poder de mando do
empregador.
Busca-se realizar uma análise da realidade, entendendo o mundo social de
pesquisa como dinâmico e contraditório a partir das mudanças nas relações de
trabalho através do chamado complexo de reestruturação produtiva.
Verifica-se de que maneira as mudanças organizacionais e de gestão
atingem os trabalhadores quando impõem desqualificações, humilhações,
discriminações, enfatizando-se os aspectos jurídicos relacionados. Para tanto, parte-
12
se da definição de um objeto de estudo de caráter social, buscando o entendimento
das relações entre os trabalhadores e entre estes e seus superiores hierárquicos
dentro da empresa e a compreensão da dimensão dessas relações enquanto
fenômenos sociais inseridas em um contexto muito mais amplo.
A idéia de trabalho concebida no caminho da história humana variou muito.
No início, o trabalho humano era desenvolvido visando atender as necessidades
básicas de sobrevivência, sem reservas ou acúmulos. O homem vivia da caça,
pesca e do que mais conseguia apanhar na natureza, sem grandes esforços. Nessa
época, o trabalho caracterizava-se por uma cooperativa simples – sem divisão de
tarefas ou profissionalização – pois todos sabiam fazer de tudo.
Mais tarde, os homens organizaram-se socialmente e aos diferentes sexos
passou-se a atribuir diferentes trabalhos. Iniciou-se, então, a economia propriamente
dita, com o homem tentando dominar a natureza.
Segundo Oliveira (1997, p. 31), o significado do trabalho variou desde o
sentido moral de sofrimento, encargo, no período escravo, até o de trabalhar,
esforçar-se, no caso do trabalho assalariado dos nossos dias atuais, passando
também a significar, para os trabalhadores, inclusão, auto-conservação e
perspectiva de satisfação das necessidades.
Na Revolução Industrial, era comum encontrar crianças de até oito anos
incorporadas às novas formas de produzir, por serem mão-de-obra barata, dócil e
útil. “Desde cedo, elas deveriam ser ‘domesticadas’ para evitar a ‘marginalidade’.
Deviam desenvolver ‘aptidões’ para o mundo fabril em ascensão. O ‘adestramento’
do corpo era visto como necessário para manter a obediência, a submissão, a
rendição e a docilidade” (BARRETO, 2003, p. 96).
13
Esses aspectos demonstram que a análise da organização do processo de
trabalho, em face da reestruturação produtiva, não deve ser feita dissociada de
alguns aspectos que influenciam diretamente a situação de subordinação dos
trabalhadores ao empregador, como trabalhadores assalariados sob o regime
capitalista de produção.
O regime capitalista pressupõe generalização da produção para a troca, com
a separação direta dos produtores das mercadorias dos seus meios de produção,
que passam a ser detentores de uma única mercadoria, sua força de trabalho. “Para
participar do processo de troca, para ter existência social, o produtor precisa levar
então sua mercadoria ao mercado, onde esta irá defrontar-se com todas as demais
mercadorias. Seu produtor a leva ‘livremente’ ao mercado e vende-a por tempo
determinado, forma única de continuar sobrevivendo” (TEIXEIRA; SOUZA, 1985, p.
65).
O comprador proprietário do capital e dos meios de produção adquire o
direito de usar essa força de trabalho, caracterizando a dicotomia proprietários dos
meios de produção/proletariado. O trabalho alienado é vazio de sentido para o
trabalhador, pois o resultado da atividade passa a ser o trabalho de outrem. “O
trabalho, se por um lado, deu ao homem algum poder, por outro, tornou-o impotente
diante de um enorme instrumental que o obriga a pensar em pôr a salvo a própria
existência humana. De uma parte eleva, libera e civiliza o homem para o mundo; de
outra, reduz o homem a tarefas que o embrutecem, pela rotina desgastante”
(FERRARI; NACIMENTO; MARTINS FILHO, 1995, p. 46).
Segundo Pereira (2005, p. 05), o Direito do Trabalho nasceu justamente “da
necessidade de serem feitas leis intervencionistas do Estado nas relações
trabalhistas, para proteger o trabalhador da insensibilidade capitalista, que
14
transformou o trabalho humano em um produto sujeito inteiramente às leis do
mercado - como uma mercadoria qualquer”.
A categoria trabalho constitui também um campo através do qual se
compreende as transformações do mundo, a vida cotidiana, as formas de
sociabilidade, a construção de identidades, as subjetividades e as representações
que irão constituir a forma de pensar e agir no mundo social.
Rosa (2002, p. 176), em estudo sobre a subjetividade dos trabalhadores em
uma empresa que passou por processo de reestruturação, traz relatos das
impressões dos trabalhadores diante das novas condições impostas:
Começaram a querer mudar a filosofia, puseram a determinação dele (do
gerente geral e diretor industrial já mencionados) (...) se ele visse você sair
de sua máquina, às vezes pra ir pegar qualquer coisa no armário do outro e
tal, já vinha aquela pressão: ‘você num pode sair da máquina, você num
pode ‘(...) se o cara te visse você sair pra ir no banco, vamos supor duas
vezes, então já vinha: ‘pô, por que você está indo no banco toda hora? (a
agência bancária é dentro da empresa); por que você está indo beber água
toda hora?’. Se você está trabalhando num galpão, um galpão de telha de
Brasilit com mais de 40 graus na sua cabeça, você num... sabe, o calor é
terrível! Então você sente vontade de tomar água, você num agüenta, você
tem que sair, às vezes aquele calor te faz sair de perto da máquina porque
só o calor da máquina já te deixa... terrível, você fica abafado, te falta até o
ar, entendeu? Então você ia tomar água, ia lavar o rosto, ia se molhar um
pouco pra voltar, então eles via você sair da máquina às vezes duas vezes,
três vezes, já vinha: ‘por que, pô, toda hora você está indo no banheiro,
você está com problema?’ Num estou com problema, eu estou com calor, o
calor aqui é terrível (torn. fer.).
A reestruturação produtiva assimilou procedimentos adotados na tentativa
de requalificação profissional do trabalhador e no seu disciplinamento, quase o
tornando “um ‘corpo-máquina’, cujas forças podem ser submetidas a uma direção
precisa e cuidadosamente calculada” (ROSA, 2002, p. 171).
No campo da relação de emprego, dentro do poder legal de comando e das
estratégias de reestruturação produtiva, legitimada pela idéia de modernidade e
15
flexibilização
1
, em vista do trato sucessivo e da prestação pessoal do trabalho, as
práticas abusivas dão mostras de que o contrato de emprego é terreno fértil na
incidência de danos ao empregado, com graves conseqüências para suas vítimas:
Quando o projeto de vida e a projeção social de uma pessoa não sofreram
apenas arranhões, mas ferimentos contusivos graves, será necessário todo
um processo de enfrentar-se com a realidade, de assumir as perdas, de
assimilação do sofrimento, de visualizar essa situação como um possível
modo de crescimento interior, de fortalecimento diante de dificuldades não
buscadas, de repensar valores, de repreender a caminhada da vida, de
reforçar laços, enfim de busca ou restabelecimento do sentido da vida
(SILVA, 2002, p. 238).
Nessa esteira é que, partindo de precedentes jurisprudenciais e de
posicionamentos doutrinários acerca do assédio moral, faz-se uma análise de
aspectos a ele relativos, mediante um paralelo entre as condutas assediantes e a
teoria do abuso de direito.
Nesse contexto, o objetivo deste estudo é apresentar uma estratégia jurídica
para enfrentar as situações de assédio moral a que são submetidos os
trabalhadores e oferecer algum subsídio útil ao deslinde das questões que envolvem
o tema.
1
“A crescente produtividade do trabalho social permanece vinculada a uma crescente repressão que,
por sua vez, contribui para o aumento da produtividade. Ou ainda: o progresso deve continuamente
negar-se a si mesmo para continuar sendo progresso. As inclinações dos homens devem ser
continuamente sacrificadas à razão, a felicidade à liberdade transcendental para que os homens
por meio da promessa de felicidade, sejam mantidos no trabalho alienado, permaneçam produtivos,
se proíbam fruir plenamente de sua produtividade e perpetuem assim a própria produtividade”
(MARCUSE, 2001, p. 112).
16
CAPÍTULO 1
RELAÇÃO DE EMPREGO: PODER E SUBORDINAÇÃO
As relações de poder são, possivelmente, as estratégias mais bem
escondidas no corpo social.
(Michel Foucault)
1.1 FORMAS DE REVELAÇÃO DO PODER
As relações de trabalho são também relações de poder e não apenas
relações de produção.
Para a compreensão das interações geradas no ambiente de trabalho, é
necessário entendê-lo como centro de poder e identificar as formas pelas quais o
poder se manifesta em uma organização.
A temática tratada nessa dissertação é relevante porque o estudo das
relações de trabalho ocupa atualmente o centro de discussões na busca de
explicações para relações de submissão e obediência. Pode-se incluir aí a
dificuldade de explicar as situações que dizem respeito à integração dos executivos
e dos trabalhadores na grande empresa moderna, a aceita e mesmo procurada por
muitos sobrecarga de trabalho, a aceitação de uma ideologia de lucro e de
expansão, apesar dos conflitos e sofrimentos que os acompanham (PAGÈS, 1987,
p.11).
“Onde há poder, ele se exerce” (FOUCAULT, 2005, p. 75). Segundo
Foucault, a análise do poder prioriza o modo como o poder se desenvolve, em
detrimento da questão de quem o exerce. O poder é uma relação que perpassa
todas as pessoas. O autor critica as teorizações que vêem o poder como
mercadoria, algo que se possui e se cede por força, razões jurídicas (contratuais) ou
17
econômicas.
2
O poder é uma relação de força e não mercadoria ou manutenção das
relações econômicas de produção. Na microfísica dos poderes em jogo na
sociedade moderna, o poder se difunde entre as camadas mais elementares da
estrutura social, circula e atinge todas as instituições e indivíduos.
Em sua obra “Vigiar e Punir”, Foucault analisa o poder disciplinar na
modernidade como uma nova tecnologia do poder. A partir do estudo das prisões,
com a invenção do modelo pan-óptico de Bentham
3
, demonstra-se a presença do
poder disciplinar em hospitais, conventos, escolas e fábricas (FOUCAULT, 1999, p.
209).
Este poder disciplinar já não age mediante punição exemplar dos suplícios
transformada em espetáculo. Age, sim, pelo controle do tempo, pela visibilidade e
localização dos indivíduos, tornando-os dóceis e úteis à sociedade. Assim, esses
dispositivos do poder disciplinar atingem todos os domínios da vida humana.
A mudança de estratégia do poder denunciada pelo autor é visível no
ambiente de trabalho. No novo modelo de produção, introduzido durante a
Revolução Industrial, o homem é considerado um fator de produção inserido em
uma organização empresarial que favorece o controle e a vigilância. As fábricas com
seus ambientes fechados são planejadas visando a uma arquitetura que permita o
controle sobre os trabalhadores, de forma a tornar visíveis os que nela se
encontram.
2
“No caso da teoria jurídica clássica, o poder é considerado um direito de que se seria possuidor
como de um bem e que se poderia, por conseguinte, transferir ou alienar, total ou parcialmente, por
um ato jurídico ou um ato fundador de direito, que seria da ordem da cessão ou do contrato [...] No
outro caso – concepção marxista geral de poder – nada disto é evidente; a concepção marxista
trata de outra coisa, da funcionalidade econômica do poder” (FOUCAULT, 2005, p. 174).
3
O modelo panóptico de Bentham refere-se à idéia de construção de um modelo prisional de controle
ideal, “constituir uma prisão-máquina com uma cela de visibilidade onde o detento se encontrará
preso como na ‘casa de vidro do filósofo grego’ e um ponto central onde um olhar permanente
possa controlar ao mesmo tempo os prisioneiros e o pessoal. Em torno dessas duas exigências,
muitas variações possíveis: o Pan-óptico benthamiano em sua forma estrita, ou em semicírculo, ou
em forma de cruz, ou a disposição em estrela” (FOUCAULT, 1999, p. 209).
18
Desenvolvem-se técnicas destinadas a reger as relações entre o tempo e os
indivíduos. Para tanto, se adotam procedimentos disciplinares que são visíveis
principalmente na transição para o modo capitalista de produção, em que o controle
do tempo se dá sobre a jornada de trabalho.
Essas técnicas aperfeiçoaram-se, já que se passou dos “cartões-ponto” a
um controle que ocorre de maneira cada vez mais indireta, ou seja, hoje se
controlam mais os resultados e menos a atividade realizada. Assim como no modelo
fordista de produção a velocidade da esteira determinava o ritmo de trabalho,
atualmente é prática cada vez mais comum a imposição de metas de vendas, de
produção.
O poder também se apóia nas inovações tecnológicas. Com os avanços da
informática, tornaram-se possíveis novas maneiras de controle do empregador sobre
o empregado, principalmente sobre as informações recebidas e transmitidas, (como
conversas telefônicas e correspondências eletrônicas ou e-mails
4
). Também surgem
novas formas de controle visual com utilização de “circuito interno de televisão” para
fiscalizar a atividade dos empregados.
5
Os modelos de gestão implantados nas empresas defendem a inserção de
técnicas de controle sobre o trabalhador, baseadas na ordem e na disciplina como
4
Segundo Barros, “quanto à possibilidade de o empregador escutar a conversa telefônica do
empregado, a doutrina espanhola estabelece um critério de razoabilidade que poderá, à luz do
artigo 8º da CLT, auxiliar o intérprete brasileiro na conciliação dos direitos fundamentais da livre
iniciativa e da propriedade (artigo 1º, inciso IV, e 5º, inciso XXII, da Constituição), com o direito ao
sigilo de correspondência e à privacidade (artigo 5º, X e XII, do texto constitucional). Parte a
doutrina espanhola da seguinte distinção: se o telefone é utilizado como meio de execução das
tarefas, o empregador poderá interferir e controlar as chamadas, pois não é considerado terceiro
relativamente à conversa. Nesse sentido começa a se manifestar a jurisprudência brasileira”
(BARROS, A, 2006, p. 575).
5
Poder disciplinar. Abuso. Fiscalização com aparelho de TV em circuito fechado. Não pratica abuso
de direito empregador que, na busca de melhor produtividade, coloca circuito fechado de televisão,
com o intuito de fiscalizar os empregados e o andamento dos serviços. (TRT, 2ª Região, CP RO
2.217/89, Antonio Mazzuca, 4ª Turma, Ac. 10. 767/89).
19
elementos necessários à busca constante de eficiência e produtividade. O que há de
novo é uma renovação da forma de controle, já que este não deixa de existir.
6
Para Weber, o poder é a possibilidade de alguém impor a sua vontade sobre
outras pessoas, possibilidade essa que se legítima quando seu exercício é aceito
pelas pessoas a ele submetidas, suprimindo-se a necessidade de instrumentos de
coerção (WEBER, 1982, p. 211).
Segundo a concepção weberiana, a desqualificação freqüente das pessoas
que se empregam para ganhar um salário é um resultado direto do princípio de
estratificação estamental, peculiar à ordem social, e da oposição desse princípio a
uma distribuição de poder regulada exclusivamente por intermédio do mercado
(WEBER, 1982, p. 224).
Galbrait identifica fatores comuns às noções de poder econômico, político,
militar e religioso e ao poder atribuído à imprensa, à televisão e à opinião pública:
são fontes do poder baseadas na personalidade, propriedade e organização
(GALBRAIT, 1999, p. 3). O autor apresenta ainda os diferentes instrumentos através
dos quais o poder é exercido ou imposto: punição, recompensa e persuasão,
relacionados ao poder condigno, poder compensatório e poder condicionado,
respectivamente. Para o autor, “os instrumentos pelos quais o poder é exercido e as
fontes do direito para esse exercício estão inter-relacionados de maneira complexa”
(GALBRAIT, 1999, p. 3).
6
No chamado modelo de gestão taylorista, inserem-se os princípios da administração científica no
sistema de fábrica e intensifica-se a separação entre trabalho manual e intelectual no processo de
trabalho. A organização da administração científica retira dos trabalhadores e transfere para os
capitalistas o controle de cada fase e atividade dentro do processo de trabalho. O chamado modelo
taylorista-fordista, precursor das “linhas de montagem”, tem como princípio produzir mais, mais
rápido e controlar indiretamente a produção. Defende a hierarquização, a distribuição do poder no
espaço empresarial: a vigilância ocorre a partir de um superior hierárquico. Atualmente, novos
modelos de gestão tentam implantar estratégias de controle com imposição, por exemplo, de metas
individuais e para a equipe, fazendo com que exista autocontrole entre os membros da equipe, já
que o não alcance da meta prejudicará a todos. Assim, o poder não desaparece, muda suas
estratégias.
20
No exercício do poder condigno se busca a sujeição do outro pela ameaça
ou possibilidade de imposição de conseqüências pela não sujeição. A previsibilidade
de punição é a recompensa negativa que faz com que alguém se submeta ao poder
do outro. “É fácil perceber a conexão existente entre as sanções disciplinares e as
relações humanas na empresa. A aplicação de uma penalidade disciplinar afeta a
relação empregado-empregador, bem como a própria moral do grupo” (ROMITA,
1983, p. 13).
Quando a recompensa é positiva, se está diante do poder compensatório.
Este é comum nas organizações em que há recompensa pecuniária como forma de
expressão desse poder. “A coerção compensatória é vista como mais civilizada e
compatível com a liberdade e dignidade do indivíduo do que a coerção condigna”
(GALBRAIT, 1999, p. 18).
Na economia moderna, o poder compensatório tem sua mais importante
forma de expressão através da recompensa pecuniária, que é “o pagamento em
dinheiro por serviços prestados, o que vale dizer, pela submissão aos objetivos
econômicos ou pessoais de outros” (GALBRAIT, 1999, p. 5).
O aumento dos salários dos trabalhadores mais bem qualificados reflete a
presença desse poder, aumento esse que funciona como uma recompensa para
aqueles que se submetem às exigências empresariais. A presença do poder
compensatório também é identificada nas gratificações pagas para elevar a
retribuição pecuniária devida ao obreiro, em decorrência de um evento ou
circunstância tida como relevante pelo empregador ou por norma jurídica, como as
gratificações por tempo de serviço. Há também prêmios vinculados a evento ou
circunstância tida como relevante pelo empregador e vinculados à conduta individual
21
do obreiro ou coletiva dos trabalhadores da empresa, como os prêmios por vendas,
produtividade e assiduidade.
Há ainda o poder exercido por persuasão, educação ou compromisso
voluntário, na forma de poder condicionado, que submete o grupo ou o indivíduo à
vontade de outras pessoas ou organizações. Aqui se pode citar a educação voltada
para a qualificação profissional (os treinamentos oferecidos por empresas para
qualificar e melhorar o desempenho dos trabalhadores), revelando a face desse
poder que busca atingir objetivos de produtividade e competitividade no mercado.
“A persuasão, a educação ou o compromisso social com o que parece
natural, apropriado ou correto leva o indivíduo a se submeter à vontade alheia”
(GALBRAIT, 1999, p. 6). Esse é um aspecto que diferencia essa forma de poder: ele
não é percebido por aqueles que estão submetidos a ele. Nas demais formas de
poder, condigno e compensatório, o indivíduo está ciente da submissão.
Quanto às fontes do poder, Galbrait as classifica como de personalidade,
propriedade e organização, as quais se associam ao poder condicionado, poder
compensatório e poder condigno. Ocorre que na combinação entre as fontes de
poder, haverá a predominância de uma delas, critério adotado para as associações
apresentadas.
A personalidade ou liderança, na linguagem comum, consiste nos atributos
pessoais que podem dar acesso a um dos instrumentos de poder. Nas sociedades
primitivas, a força física permitia o acesso ao poder condigno. Atualmente, os
atributos pessoais estão mais relacionados ao poder de persuasão e, portanto, ao
poder condicionado.
22
A propriedade ou riqueza propicia os meios para comprar a submissão. “O
homem de negócios compra a submissão de seus trabalhadores para que estes
sirvam aos seus objetivos econômicos – ganhar dinheiro” (GALBRAIT, 1999, p. 8).
1.2 PODER E SUBORDINAÇÃO
Refletindo sobre o tema, vê-se que o ambiente de trabalho tem se destacado
como um locus de legitimação de poder decorrente das relações que integram o
direito e o poder, com os trabalhadores submissos ao empregador.
7
A regra geral aplicada ao Direito do Trabalho no Brasil é a de que este ramo
jurídico não se destina a tutelar todo trabalhador, pois os trabalhadores podem
desenvolver suas atividades com autonomia ou com subordinação. Assim, o Direito
do Trabalho como ramo especializado tem como objeto principal regulamentar as
questões que envolvem os trabalhadores empregados, os quais estão em uma
relação de subordinação.
8
Os trabalhadores que desenvolvem suas atividades com autonomia estão
submetidos às regras do Direito Civil.
9
Quanto a esse aspecto é relevante observar
7
Em seus livros de direito privado e de história do direito associativo na Alemanha, OTTO VON
GIERKE sempre defendeu a tese de que a relação que se estabelece entre os dois elementos da
produção é de índole pessoal de hierarquia ou senhoria (Herrschaftsverband), deslocando-se assim
essa relação do plano patrimonial para o das pessoas. Ao contrário da tradição latina, na qual a
relação de trabalho livre se inclui na matéria das obrigações, alguns germanistas, como GIERKE,
preferem classificá-la como relação de poder (MORAES FILHO, 1960, p. 383).
8
Há subordinação quando as modalidades da prestação de trabalho são determinadas pelo
empresário e devem ser seguidas pelos trabalhadores. A organização da empresa exige uma ação
de comando continuada e centralizada na pessoa do empregador, à qual se subordinam, em maior
ou menor grau, todos os dependentes, vale dizer, todos os trabalhadores subordinados (ROMITA,
1983, p. 124).
9
“O marco distintivo firmado pela subordinação, no contexto das inúmeras fórmulas jurídicas
existentes para a contratação da prestação de trabalho, permite o operador jurídico cotejar e
discriminar, com êxito, inúmeras situações fático-jurídicas próximas. O cotejo de hipóteses
excludentes (trabalho subordinado versus trabalho autônomo) abrange inúmeras situações
recorrentes na prática material e judicial trabalhista: trabalhadores autônomos prestando serviços
habituais a empresas (como profissionais de consultoria, auditoria, contabilidade, advocacia etc.);
trabalhadores autônomos pactuando a confecção de obra certa para determinado tomador
(empreitada); representantes comerciais ou agentes distribuidores regidos por legislação própria;
23
que embora não sejam aplicadas as regras justrabalhistas ao trabalho exercido de
maneira autônoma, cabe à Justiça do Trabalho, por força da Emenda Constitucional
n. 45, publicada no Diário Oficial da União (DOU) em 31 de dezembro de 2004
10
,
decidir as questões que envolvam “relações de trabalho”, expressão que veio alterar
a antiga redação que continha a expressão “relação de emprego”.
É difícil identificar a real extensão do significado da alteração atribuída à
expressão “relação de trabalho”. Na tradição jurídica, firmou-se a tendência de
designar-se a relação de emprego como espécie e a relação de trabalho como
gênero, embora seja comum a utilização da denominação geral para ambas.
O Supremo Tribunal Federal (STF), ao conceder liminar na ADI n. 3.395,
proposta pela Associação dos Juízes Federais do Brasil (AJUFE), entendeu que nas
“relações de trabalho” não estão incluídos os trabalhadores que, no âmbito da
administração pública, enquadram-se no regime “estatutário”, cabendo à Justiça do
Trabalho processar e julgar somente questões que envolvam os servidores regidos
pelo regime da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
A decisão leva a crer que houve uma ampliação da competência da Justiça
do Trabalho para além da “relação de emprego”, ampliação essa que, no entanto,
não abrange toda “relação de trabalho”. Como não se esclarece qual deve ser o real
alcance de tal expressão em face da alteração citada, há uma demanda de
contratos de parcerias rurais, etc. Em todos esses casos, a desconstituição do contrato civil
formalmente existente entre as partes supõe a prova da subordinação jurídica, em detrimento do
caráter autônomo aparente de que estaria se revestindo o vínculo” (DELGADO, M, 2006, p. 302).
10
O artigo 114 da Constituição Federal, após a citada emenda, passou a dispor que “Compete à
Justiça do Trabalho processar e julgar: I – as ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os
entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta da União, dos Estado,
do Distrito Federal e dos Municípios [...]” (BRASIL. Constituição Federal, 1988).
24
interpretação mais aprofundada a respeito do assunto por parte dos operadores do
direito.
11
Somente na sociedade industrial é que a relação empregatícia se fixa com
relevância. Do ponto de vista jurídico, essa relação é apenas uma das modalidades
específicas de relação de trabalho juridicamente configuradas.
Os critérios para a caracterização da relação empregatícia estão previstos
na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), em seu artigo 3º e no artigo 2º, caput
12
pressupondo a prestação de serviços do empregado sob a dependência do
empregador.
Pela análise dos artigos citados, conclui-se que uma relação de emprego se
caracteriza pela presença de cinco elementos, quais sejam: prestação de trabalho a
um tomador qualquer; prestação efetuada com pessoalidade; também efetuada com
habitualidade a um tomador ou não eventualidade; efetuada sob subordinação ao
tomador de serviços
13
; e prestação de trabalho efetuada com onerosidade.
14
11
As opiniões se dividem basicamente em duas linhas de interpretação: uma bastante ampliativa e
outra tendente a restringir a referida reforma. [...] Parte da doutrina apressou-se em dizer que a
competência dessa Justiça especializada foi ampliada com vista a abarcar todas as situações que
envolvam trabalho humano direcionado a algum fim, independentemente da existência do tônus
subordinativo. [...] Os autores que compartilham da posição restritiva, comprometidos com a noção
de sistema, com a especialização de competências e com a hermenêutica, entendem que: a
expressão relação de trabalho do inciso em questão se refere às relações dotadas de pessoalidade,
onerosidade, não eventualidade e principalmente subordinação. Ou seja, entendem que o legislador
empregou citada expressão com a transparente significação de relação de emprego (TEODORO,
2006, p. 90-93).
12
“Artigo 2º. Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da
atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviços. [...] Artigo 3º.
Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a
empregador, sob dependência deste e mediante salário” (BRASIL, Consolidação das Leis do
Trabalho, 1943).
13
Embora a CLT utilize a palavra “dependência”, hoje é pacífico o entendimento de que esta
“dependência” corresponde à subordinação jurídica do trabalhador.
14
“Como no contrato de mandato, mas com maior intensidade e generalidade, encontra-se uma das
partes (empregado) permanentemente subordinada à outra (empregador) durante todo o período de
execução do próprio contrato. É um estado de débito permanente (elemento patrimonial), de
direção e fiscalização igualmente contínuas (elemento pessoal)” (ROMITA, 1983, p. 421).
25
Conjugados esses elementos, surge a relação de emprego juridicamente
caracterizada. Porém, “será a subordinação, entre todos os elementos, o que ganha
maior proeminência na conformação do tipo legal da relação empregatícia”
(DELGADO, M, 2006, p. 301).
Cabe aqui destacar o chamado “trabalho parassubordinado” (ou
coordenado), que se situa em uma região intermediária entre o trabalho autônomo e
o trabalho subordinado.
A Itália é a precursora do desenvolvimento do conceito de
parassubordinação
15
, tanto em sede doutrinária, quanto em sede legislativa
(JARDIM, 2003, p. 93).
A lei 533, de 11 de agosto de 1973, que alterou o artigo 409, n. 3, do Codice
de Procedura Civile, prevê que estão sujeitas ao rito processual trabalhista as
“relações de agência, de representação comercial e outras relações de colaboração
que se expressam numa prestação de serviços continuada e coordenada,
preferencialmente pessoal, ainda que sem caráter subordinado” (Codice de
Procedura Civile, 2006, tradução livre).
Os seus elementos caracterizadores são, portanto, a “continuação da
prestação de trabalho”
16
e a idéia de “coordenação”
17
, estando incluídas no
15
A tradução da palavra “parasubordinazione” do italiano para o português é literalmente
parassubordinação, uma vez que o prefixo par(a) é usado em composição que reveste a noção
“para além de”. No caso, resulta portanto em “para além da subordinação” (SILVA, 2004, p. 102).
16
A prestação de serviços deve se destinar a atender uma necessidade do tomador que tenha um
determinado prolongamento no tempo, tendo em vista os interesses de ambas as partes (SILVA,
2004, p. 104).
17
Coordenação, então, significa "ordenar junto": significa que ambas as partes possuem medidas a
propor para alcançar o objetivo comum. No trabalho subordinado, o trabalhador se sujeita ao poder
de direção do empregador, devendo cumprir todas as determinações deste. Não há coordenação.
No trabalho autônomo, os serviços devem ser executados em conformidade com as condições
previstas em contrato. O trabalhador deve realizar a obra ou o serviço, a fim de entregar o resultado
contratualmente prometido. Também não há coordenação. [...] Ocorre que o poder de dar
instruções é diferente do poder de coordenar a prestação dos serviços. As instruções pressupõem a
existência de níveis distintos entre quem as dá e quem as recebe. Já a coordenação se enquadra
em níveis que se unem e até mesmo se sobrepõem. Exatamente por isso surge a necessidade de o
26
conceito de parassubordinação as relações jurídicas em que há dependência
atenuada entre as partes, a qual se situaria em uma região intermediária entre o
trabalho autônomo e a subordinação entre empregado e empregador.
O elemento de conexão entre as várias relações de trabalho
parassubordinado é um vínculo de dependência semelhante ao que une empregado
e empregador, a ponto de justificar a existência de garantias compensatórias
equivalentes (FERRARO, 1991, p. 226 apud SILVA, 2004, p. 103).
O que se deve levar em consideração, portanto, é o fato de que “o trabalho
parassubordinado é semelhante ao trabalho subordinado, mas com ele não se
confunde; e a parassubordinação vai além do conceito tradicional de trabalho
autônomo” (SILVA, 2004, p. 103).
A palavra subordinação
18
deriva do termo latino subordinatio (submissão,
sujeição), seja em relação às coisas ou às pessoas. Portanto, “revela sempre a
condição, que lhes é imposta para que se submetam as regras ou determinações
derivadas ou oriundas do regime que lhes é estabelecido” (SILVA, 1998, p. 775).
O requisito “subordinação” é o marco diferencial da relação empregatícia em
relação a outras modalidades de relação de produção, como a servidão e a
escravidão, que já foram hegemônicas na história dos sistemas socioeconômicos
ocidentais (DELGADO, M, 2006, p. 301).
prestador e o tomador de serviços "ordenarem juntos" todo o trabalho, o que pode levar a
modificações do programa contratual na medida em que este está sendo desenvolvido (Silva, 2004,
p. 104).
18
Ou ainda etimologicamente sub = baixo; ordinare = ordenar (NASCIMENTO, 2005, p. 598).
27
A adoção da teoria da subordinação
19
em nosso ordenamento é influenciada
pelo Código Civil italiano em suas definições de trabalho subordinado, poder do
empregador e trabalho autônomo (NASCIMENTO, 2005, p. 599).
No Direito do Trabalho, embora a subordinação já tenha sido explicada por
seu aspecto subjetivo, os critérios objetivos que a explicam atualmente são ponto
pacífico. Na contratação, o contrato e a qualificação profissional do empregado
somente predeterminam algumas condições de trabalho genericamente, e as
lacunas serão resolvidas pelo poder de determinação do empregador. “Deve
entender-se a subordinação como a exigência técnica e funcional da empresa”
(ROMITA, 1983, p. 124). A subordinação deve ser objetiva, sobre o modo de
realização da prestação, e não sobre a pessoa do trabalhador.
20
Portanto, a subordinação não deve atuar sobre a pessoa, criando-lhe um
estado de sujeição incompatível com a concepção jurídica da subordinação, mas
sobre a atividade realizada, embora a realidade das relações de trabalho muitas
vezes oculte uma verdadeira situação de sujeição do empregado, o que é
incompatível com os princípios trabalhistas de proteção ao trabalhador. Quanto à
questão, Delgado, M. observa que:
19
“Essa teoria projetou-se em nosso direito porque foi prevista pelo artigo 2.094 do Código Civil
Italiano, que define trabalhador subordinado como aquele ‘que se obriga mediante retribuição a
colaborar com a empresa, prestando o próprio trabalho intelectual ou manual sob dependência e
direção do empregador.’ Acrescenta o mesmo Código peninsular (artigo 2.014) que o trabalhador
‘deve observar as disposições para a execução e para a disciplina do trabalho distribuído pelo
empregador e por seus colaboradores dos quais hierarquicamente depende’, e considera
trabalhador autônomo (artigo 2222) aquele que trabalha ‘sem vínculo de subordinação perante o
comitente’, portanto aquele que organiza livremente a própria atividade” (NASCIMENTO, 2005, p.
599).
20
Segundo a análise de Romita (1983, p.38-39), “a exata captação jurídica dos poderes exercitados
pelo empregador não prescinde, contudo, do aspecto subjetivo. O trabalho é inseparável da pessoa
daquele que o presta. A subordinação do trabalhador integrado na organização empresarial e o
conseqüente poder de disposição que o credor de trabalho assume em face da atividade do obreiro
salientam o caráter pessoal da relação de trabalho. O aspecto subjetivo e o objetivo não podem ser,
portanto, isolados um do outro. Ao revés, geram um todo inseparável, que revela uma só realidade:
o caráter pessoal-patrimonial da relação de trabalho subordinado”.
28
Não obstante essa situação de sujeição possa concretamente ocorrer,
inclusive com inaceitável freqüência, ela não explica, do ponto de vista
sócio-jurídico, o conceito e a dinâmica essencial da relação de
subordinação. Observe-se que a visão subjetiva, por exemplo, é incapaz de
captar a presença de subordinação na hipótese de trabalhadores
intelectuais e altos funcionários (DELGADO, M, 2006, p. 303).
Ainda quanto ao tema da subordinação nas relações de trabalho, destaca-se
o debate sobre a sua natureza de fenômeno jurídico inserido no contrato de
trabalho, “estabelecido entre trabalhador e tomador de serviços, pelo qual o primeiro
acolhe o direcionamento objetivo do segundo sobre a forma de efetuação da
prestação de trabalho” (DELGADO, M, 2006, p. 303).
Carnelutti afirma que “a vontade é verdadeiramente a matéria-prima do
Direito; e não há outra, nem mais nobre, nem mais misteriosa” (CARNELUTTI, 2002,
p. 38). Qual é, então, o verdadeiro fundamento que faz com que o trabalhador se
submeta voluntariamente às ordens do empregador; qual a razão da obediência aos
comandos do empregador?
21
Quanto à vontade como fundamento para a observação das regras jurídicas,
em relação à visão marxista “de que o direito não pode ser explicado pela vontade e,
sim, pelas relações sociais”, e de Vishinsky de que “o direito é produto da vontade
da classe dominante”, Correas (1996, p. 113) afirma que
[...] a dificuldade desta definição reside em que a vontade parece ser um
fenômeno da consciência individual, enquanto que classe social é um
conceito aplicável a um conjunto de indivíduos. E assim como não parece
plausível falar da vontade do estado, tampouco o parece com relação a este
sujeito coletivo. A definição de Vishinsky era, ademais, coincidente, ao
menos em aparência, com a idéia de Marx de que o direito não pode ser
explicado pela vontade e sim pelas relações sociais.
Argumenta-se que o Direito do Trabalho é um ramo jurídico protetivo do
trabalhador que busca equilibrar as desigualdades existentes entre trabalhadores e
21
Boa parcela da doutrina hodierna questiona se efetivamente o contrato de trabalho se enquadra no
conceito de negócio jurídico, na medida em que o elemento volitivo é manifestado com reserva
pelas partes, sendo, para alguns, considerado “inexistente” (DALLEGRAVE NETO, 2006).
29
empregadores no campo fático. No entanto, contraditoriamente este direito aponta
que o trabalhador “deve obediência às ordens do empregador” (COUTINHO, 1999,
p. 26). Portanto, os deveres e obrigações dos empregados têm como fonte o direito
que determina a subordinação ao poder do empregador.
Para Marx, a existência de um contrato entre o trabalhador e o proprietário
dos meios de produção, embora pressuponha a existência de um acordo de
vontades, na realidade oculta a sujeição do trabalhador ao empregador, na busca de
garantir sua sobrevivência (MARX, 1962, p. 66). Tal situação propicia a existência de
conflitos entre os trabalhadores e os empregadores que buscam o aumento dos
lucros com o aumento do trabalho excedente, que irá gerar a mais-valia.
22
O conflito existente, denominado luta de classes por Marx, é mantido em
equilíbrio em favor dos que detêm o capital. O fato de possuir ou não o capital é que
determinará quem detém o poder dentro da organização, ou seja, a dependência
dos trabalhadores.
A idéia de dependência está mais vinculada à idéia pessoal e não objetiva
de que derivaram muitas teorias, a qual fundamenta que a subordinação do
empregado derivaria do seu caráter de dependência econômica, técnica ou ainda
social, e não da subordinação jurídica.
Já a idéia de dependência econômica apresenta a relação empregatícia
como reflexo da separação econômica entre empregado e empregador.
23
Origina-se
na doutrina alemã (recebendo contribuições de alguns autores franceses) e é
criticada pela doutrina italiana que, em resposta, apresentou a teoria da
22
A mais-valia é obtida pelo processo de trabalho em que a força de trabalho (que os capitalistas
compram dos operários) é capaz de produzir, numa jornada de trabalho de duração determinada,
um conjunto de bens maior do que aquele requerido para sua própria manutenção. O capitalista
transforma essa mais-valia em capital adicional (descontada a parcela necessária ao seu
consumo), que irá produzir nova mais-valia.
23
Moraes Filho (1960, p. 378) destaca que, em 1913, Paul Cuche era importante representante dessa
teoria.
30
subordinação jurídica. (MORAES FILHO, 1960, p. 378). Funda-se na idéia de que o
trabalho é meio de subsistência do empregado e de sua família. A hierarquia que
marca a estrutura socioeconômica da organização empresarial é um de seus
fundamentos.
Realmente, o trabalho pode levar à satisfação das necessidades essenciais
dos trabalhadores, o que favorece a submissão à organização.
Embora essa teoria enfatize importantes questões presentes na relação de
trabalho que muito a influenciam, pode-se dizer que ela se restringe a aspectos que
não explicam a subordinação nos moldes da legislação trabalhista vigente e sua
relação com o poder de direção do empregador, pois o aspecto econômico “atua na
relação jurídica especifica como elemento externo, incapaz, portanto, de explicar,
satisfatoriamente, o nexo preciso da assimetria poder de direção/subordinação
(DELGADO, M, 2006, p. 304).
Além disso, nada impede que determinado trabalho não seja a fonte de
subsistência do empregado,
24
embora as condições para a existência da
subordinação econômica são quase sempre a regra nas relações de emprego: a
necessidade de utilização do trabalho como único meio de subsistência do obreiro e
a exclusividade de prestação laboral a um empregador. “Na vida real, quem é
dependente de outro, do ponto de vista econômico, tão estreitamente, lhe é
subordinado de certa maneira” (MORAES FILHO,1960, p. 379).
24
Moraes Filho fundamenta as críticas ao critério da subordinação econômica com alguns exemplos:
“Pode não haver dependência econômica e existir contrato de trabalho, quando o empregado,
recebendo uma herança, ganhando na loteria ou, mesmo desde o início da relação de emprego
sendo mais rico que seu empregador, permanece no emprego, podendo até lhe emprestar dinheiro
particularmente, mas nem por isso deixará de formar com ele um contrato de trabalho, devendo-lhe
obediência e subordinação”. Embora os exemplos citados pelo autor não sejam comumente
encontrados, são eficientes para demonstrar a falibilidade do critério econômico para justificar a
subordinação do empregado, que é critério extrajurídico (MORAES FILHO, 1960, p. 379).
31
Porém, maior ou menor disparidade econômica entre empregado e
empregador não deve alterar o conjunto de direitos e deveres impostos na relação
estabelecida.
Nesse sentido, embora se argumente que a subordinação do empregado
decorre da existência de um contrato, sujeito às regras “protetivas” do ramo
especializado do Direito do Trabalho, o dever contratual de obediência e fidelidade
ao empregador é aspecto que denota a verdadeira sujeição do empregado na
relação empregatícia. Nas palavras de Coutinho:
Não há igualdade no campo econômico; não há também igualdade no
campo jurídico. Muito embora seja tutelado pelo direito, que o protege para
minimizar as agruras econômicas, o empregado deve juridicamente
obediência e fidelidade ao seu empregador, ou seja, está em um estado de
submissão da sua vontade à determinação do empregador que detém o
poder de dirigi-lo, controlá-lo, fiscalizar a sua conduta e vida e, por
conseguinte, puni-lo no próprio interesse (COUTINHO, 1999, p. 26).
Quanto à teoria da dependência técnica
25
, esta conclui que o empregado
está sob a dependência do empregador pelo fato de este ser o detentor do
conhecimento necessário ao desenvolvimento do processo de produção em que o
trabalhador está inserido. Está relacionada à direção e orientação na realização do
trabalho. “O empregador é aquele que está em posição, pelo jogo de sua atividade
normal, de dirigir tecnicamente os trabalhos daqueles que se encontram sob suas
ordens”. A subordinação do obreiro, nessa visão, caracteriza-se pela presença de
dois aspectos: 1º “o empregado trabalha para alguém que tem por profissão utilizar
os serviços de outrem (profissionalismo do empregador)”; 2º “as ordens recebidas
pelo empregado podem conter, por parte de quem as emite, caráter de tecnicidade”
25
O critério da subordinação técnica é atribuído à Sociedade de Estudos Legislativos da França, em
1905. Em 1935, E. Hertz, técnico da Organização Internacional do Trabalho, defendia ponto de
vista semelhante ao tentar distinguir a subordinação econômica da subordinação técnica, afirmando
que a primeira é apenas acessória da segunda. Moraes Filho esclarece que Hertz confunde o que
denominou de subordinação técnica com aspectos da própria subordinação jurídica (MORAES
FILHO, 1960, p. 376-377).
32
(MORAES FILHO, 1960, p. 376-377). “A assimetria no conhecimento técnico daria
fundamento à assimetria na relação jurídica do emprego” (DELGADO, M, 2006, p.
304).
O comando técnico e o controle das atividades de produção são apenas um
dos aspectos inerentes à subordinação jurídica, que se refletem no poder de direção
do empregador, não sendo sua presença essencial à caracterização do trabalho
subordinado, já que o empregador pode fazer-se assessorar por outras pessoas no
desempenho dessas tarefas.
A combinação dos critérios de subordinação econômica e técnica influenciou
o surgimento da teoria da subordinação social.
26
Segundo essa teoria, o empregado
necessita do trabalho para sua subsistência e, por essa razão, se submete às
ordens e à direção do modo de produção determinado pelo empregador.
Assim uma pessoa é socialmente dependente sempre que necessitar para
sua subsistência do trabalho que lhe proporciona o empregador, dos
instrumentos que lhe oferece, não trabalhando a seu risco ou porque lhe
obedece às ordens deste possível empregador, do qual é juridicamente um
preposto (MORAES FILHO, 1960, p. 380).
Essa teoria “focaliza apenas o aspecto social da questão, sem passar à
análise do título jurídico que autoriza o empregador a dar ordens ao empregado”
(BARROS, A, 2006, p. 244).
Do ponto de vista jurídico, pouco importa a situação social das partes. O
empregador estaria autorizado a emitir ordens ao empregado e este obrigado a
acatá-las pela existência de um título jurídico válido autorizando.
27
Portanto, o
26
Atribui-se essa teoria a René Savatier, em 1923, buscando estender a lei francesa de acidente de
trabalho (lei de 09 de abril de 1898) a todos os empregados qualificados e não restringi-la aos
operários de fábricas (MORAES FILHO, 1960, p. 379-380).
27
Mesmo um contrato que não esteja revestido de todos os requisitos de validade para o Direito Civil
pode produzir efeitos na esfera trabalhista. A teoria civilista da nulidade sofre algumas adaptações
para formar a teoria trabalhista das nulidades, em que apenas são nulos os atos praticados a partir
da decretação da nulidade, respeitando-se a situação fático-jurídica já vivenciada. Sua aplicação
33
critério mais aceito tecnicamente para justificar o direito do empregador dirigir e
controlar a atividade produtiva e o dever do empregado de submeter-se às suas
ordens é o da subordinação jurídica.
28
A subordinação nesses moldes é um estado de direito e não
necessariamente um estado de fato, “que se evidencia através da contratualidade
existente entre ambas as partes.” Através desse contrato é que se aperfeiçoa “o
vínculo jurídico que entre elas se estabelece, que se origina desse estado de
sujeição” (MORAES FILHO, 1960, p. 381).
A subordinação do empregado ao empregador não é ilimitada. Seus limites
decorrem do próprio contrato e suas fontes formais, da legislação, das negociações
coletivas, dos princípios gerais do direito e de princípios específicos do Direito do
Trabalho, além de sujeitar-se às normas constitucionais, como os princípios de
liberdade, igualdade, dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho,
entre outros compatíveis.
Assim, a relação de trabalho evoluiu dos direitos reais, do operário escravo
no direito romano, da relação de senhoria baseada em direitos pessoais, na Idade
Média, com uma relação de fidelidade entre vassalo e senhor, até o direito das
obrigações com o trabalho assalariado livre vinculando o contrato de trabalho ao
direito de crédito da prestação de serviços.
A subordinação, portanto, não deve mais se dar sobre a pessoa, mas sobre
a atividade a ser realizada. O empregador comanda porque é credor do trabalho
plena ocorre quanto a defeitos relativos à capacidade e forma e quando o bem jurídico afrontado
disser respeito fundamentalmente ao direito obreiro. Justifica-se tal posicionamento por ser inviável
faticamente, após a prestação do trabalho, o reposicionamento pleno das partes às condições
anteriores ao contrato nulo: o trabalho já foi prestado e seu valor transferido, com a apropriação
completa pelo tomador de serviços.
28
“Os autores italianos vêem na subordinação uma espécie de status subiectionis do empregado
diante do empregador, muito semelhante ao do cidadão em relação à soberania estatal” (MORAES
FILHO, 1960, p. 381).
34
(BARROS, A, 2006, p. 247). O empregado tem o dever de obedecer às ordens do
empregador “não como chefe ou hierarca, mas como credor. O trabalhador deve
obedecer não como inferior, mas porque, ao estipular o ajuste, torna-se devedor de
trabalho” (ROMITA, 1983, p. 116).
A Constituição Federal proíbe distinção entre trabalho manual, técnico e
intelectual ou entre profissionais respectivos (artigo 7
o
, inciso XXXII)
29
, porém, a
doutrina faz uma diferenciação entre a subordinação a que está submetido o
trabalhador braçal, “de chão de fábrica” e os trabalhadores intelectuais e os altos
empregados.
Segundo Moraes Filho, quando confrontados o trabalho braçal e o trabalho
intelectual ou técnico, “à medida que vai se elevando o empregado – na escala do
trabalho manual para o intelectual – vai-se adelgaçando a subordinação que ele
deve ao seu empregador, e vai também aumentando o elemento fiduciário que
existe em toda a relação de emprego” (MORAES FILHO, 1960, p. 383).
Normalmente a organização de uma empresa faz surgir uma hierarquia entre
os setores, cargos e funções. Assim, surgem diferenciações entre os empregados,
sendo que alguns deles concentram as prerrogativas de direção e gestão próprias
do empregador. Essa temática envolve situações diferenciadas.
Os cargos ou funções de confiança ou gestão incluídos no artigo 62, inciso II
da CLT
30
, correspondem àqueles empregados no exercício de elevadas funções e
atribuições de gestão – enquadrando-se aqui os cargos de diretores e chefes de
29
“XXXII – proibição de distinção entre trabalho manual, técnico e intelectual ou entre os profissionais
respectivos”. (BRASIL, Constituição Federal, 1988).
30
“Artigo 62. Não são abrangidos pelo regime previsto neste capítulo: [...] II – os gerentes, assim
considerados os exercentes de cargos de gestão, aos quais se equiparam, para efeito do disposto
neste artigo, os diretores e os chefes de departamento ou filial” (BRASIL, Consolidação das Leis do
Trabalho, 1943).
35
departamento ou filial (os poderes de chefe de departamento têm de ser
significativos).
Como empregados que exercem de cargo de confiança entendem-se
aqueles que, “dada a natureza da função desempenhada, em que o elemento
fiduciário, existente em todo o contrato de trabalho, assume especial relevo”
(SÜSSEKIND; MARANHÃO; VIANNA, 1994, p. 292).
A especificidade bancária para os cargos de confiança prevê tratamento
diferenciado no tocante à caracterização do tipo legal, previsto no artigo 224, § 2º da
CLT.
31
Por outro lado, a compatibilidade entre a figura do diretor e do empregado
gera muita controvérsia, já que, no contexto atual, a idéia de direção tem-se
afastado da idéia de propriedade (noção de sócio) – assim, surge o interesse em se
discutir a incidência ou não das normas próprias à relação de emprego aos diretores
não proprietários.
32
Quanto ao sócio empregado, a pessoa jurídica constitui-se entidade distinta
daquela consubstanciada a seus membros, não existindo incompatibilidade entre as
duas figuras jurídicas (sócio e empregado).
“O empregador, quando despido de conhecimentos técnicos altamente
qualificados ou especializados, precisa ter mais confiança em seu empregado
intelectual do que em outro de tarefas meramente manuais” (MORAES FILHO, 1960,
31
“[…] § 2.º As disposições deste artigo não se aplicam aos que exercem funções de direção,
gerência, fiscalização, chefia e equivalentes, ou que desempenhem outros cargos de confiança,
desde que o valor da gratificação não seja inferior a 1/3 (um terço) do salário do cargo efetivo”
(BRASIL, Consolidação das Leis do Trabalho, 1943).
32
Quanto ao empregado antigo que alcança o cargo de diretor, a doutrina se divide e surgem
diferentes interpretações: Süssekind; Maranhão e Vianna (1994, p. 236) optam pela suspensão do
contrato de emprego, dada a incompatibilidade das situações jurídicas, em consonância com o
entendimento do Tribunal Superior do Trabalho, previsto na súmula n. 269; Magano (1980, p. 60)
sustenta que a eleição não altera a situação jurídica do empregado, que continua como tal, a
desfrutar dos direitos inerentes a essa condição.
36
p. 383). Portanto, a presença da fidúcia do empregador pode atenuar a
subordinação do empregado, podendo conferir a este parte do poder diretivo, na
tomada de decisões e até mesmo no controle e fiscalização dos demais
empregados.
Também se cogita atualmente o surgimento de uma “nova subordinação”,
mais atenuada, que, segundo alguns autores, decorre dos avanços tecnológicos, da
globalização, e de outras mudanças no mundo do trabalho, que propiciariam
transformações capazes de atingir a estrutura de comando interno da empresa. um
exemplo desse pensamento é a defesa da existência de uma “parassubordinação”
nos moldes defendidos pela doutrina italiana.
33
Os autores adeptos da idéia de uma tendência à atenuação da subordinação
nas relações de emprego “incorrem no equívoco de entender o poder (nessas
relações) a partir de algumas de suas dimensões” (MELHADO, 2000, p. 92). É que o
fenômeno jurídico da subordinação está diretamente relacionado ao aspecto do
poder nas relações de trabalho, que possui diferentes dimensões e formas de se
manifestar.
Para Melhado, a subordinação típica da sociedade atual é mais intensa
porque rompe com os limites entre o privado e o profissional, havendo maior
interferência na vida privada do empregado e uma supervalorização do
conhecimento técnico.
A relação entre submissão à empresa e poder do trabalhador é também
destacada por Galbrait, que afirma que a maior remuneração dos altos empregados
33
Defende-se que o Direito do Trabalho deveria sistematizar normas que abrangessem, além do
trabalho subordinado, o trabalho autônomo e o parassubordinado com “[...] a construção de um
novo modelo, negociado entre as partes sociais e o Poder Público, que leve à extensão graduada
das tutelas além dos confins da subordinação, partindo de uma disciplina mínima comum a todos os
tipos de trabalho (sejam subordinados ou não) e adotando uma visão global das modalidades de
trabalho que surgiram com a segmentação dos processos produtivos e com a terceirização dos
serviços nas empresas” (SILVA, 2004, p. 195).
37
deve-se também à maior submissão. Esse é um exemplo de exercício do poder
compensatório, que decorre da dedicação e submissão aos propósitos da
organização
34
, pois “ele ou ela não deve falar nem pensar nada que seja contrário
aos objetivos da empresa” (GALBRAIT, 1999, p. 17).
Segundo Marx, a submissão definitiva do trabalho ao capital é obtida, de
maneira geral, “fazendo-se uso da violência, garantida ou acobertada pelo Estado e
de uma legislação que regula não só a disciplina, como também a jornada de
trabalho e os salários” (MARX, 1962, p. 67).
Embora se considerem os critérios da subordinação econômica, técnica e
social insuficientes para explicar a subordinação como elemento caracterizador da
relação empregatícia, estes “estão sempre presentes como pressupostos para a
estruturação do sistema jurídico-laboral, baseado numa ideologia protecionista”
(COUTINHO, 1999, p. 207).
Portanto, o critério juridicamente aceito na caracterização da relação de
emprego é o da subordinação jurídica que sujeita objetivamente o empregado aos
poderes do empregador. Porém, não se pode esquecer que a relação de emprego
deve ser compreendida enquanto fenômeno social inserido em um contexto muito
mais amplo.
35
34
Quanto aos propósitos das organizações empresariais, tem-se buscado uma nova mentalidade que
ultrapasse a visão de expansão, lucro e acumulação do capital, considerando-se também os custos
sociais envolvidos na defesa da chamada “responsabilidade social”. Deve-se considerar que “[...],
para as empresas, essa mudança de alcance da visão do negócio implica, também, redefinir a
própria noção de custo. Não basta buscar o menor custo de produção, se o custo social ou
ambiental embutidos nos produtos forem extremamente elevados [...] Na prática cotidiana, a
empresa constrói esse novo modelo, começando por propiciar relações trabalhistas baseadas no
respeito, na ética na busca da igualdade nas relações de gênero e raça” (GRAJEW, 2003, p. 215-
216).
35
“Por subordinação jurídica entende-se um estado de dependência real criado por um direito, o
direito do empregador de comandar, dar ordens, donde nasce a obrigação correspondente para o
empregado de se submeter a essas ordens. Eis a razão pela qual chamou-se a esta subordinação
de jurídica, para opô-la principalmente à subordinação econômica e à subordinação técnica que
comporta também uma direção que emanaria apenas de um especialista. Trata-se aqui, ao
contrário, do direito completamente geral de superintender a atividade de outrem, de interrompê-la
38
Em um momento histórico de diminuição de postos de trabalho e de
expansão de formas precárias de trabalho subcontratado, terceirizado, a
característica da subordinação se acentua na relação de emprego. Muitas vezes
está mascarada atrás da teoria de um empregado que se coloca ao lado da empresa
como colaborador, cooperado, empreendedor, para que os trabalhadores possam
responder às demandas de um sistema cada vez mais restrito e competitivo.
Harvey (1996, p. 65) afirma que, com a modernidade, observa-se, “no lugar
do trabalho organizado, altos níveis de desemprego estrutural; rápida destruição e
reconstrução de habilidades; ganhos modestos, quando há, de salários reais; e o
retrocesso do poder sindical”.
Na sociedade capitalista, o trabalho passa a ser mercadoria e “quando o
trabalhador não pode trabalhar por falta de emprego ou por falta de acesso aos
meios de produção, dentre eles a terra, fica impedido de produzir as condições
necessárias à sua sobrevivência” (COSTA, 2005, p. 172).
Então surge um novo paradigma produtivo e tecnológico, baseado na
produtividade, competitividade e lucratividade, que, com a globalização, passa a
ocasionar o desemprego estrutural.
36
Com o fenômeno do desemprego ocorre
também a precarização do trabalho, que abre espaço para relações informais de
emprego.
ou de suscitá-la à vontade, de lhe fixar limites, sem que para isso seja necessário controlar
continuamente o valor técnico dos trabalhos efetuados. Direção e fiscalização, tais são então os
dois pólos da subordinação jurídica” (MORAES FILHO, 1960, p. 381-382 apud COLIN, 1931, p. 97).
36
Assim, pobreza e exclusão no Brasil são faces de uma mesma moeda. As altas taxas de
concentração de renda e de desigualdade – persistentes em nosso país – convivem com efeitos
perversos do fenômeno do desemprego estrutural. Se, de um lado, cresce cada vez mais a
distância entre os “excluídos” e os “incluídos”, de outro essa distância nunca foi tão pequena, uma
vez que os incluídos estão ameaçados de perder direitos adquiridos. O Estado de Bem-Estar (que
no Brasil já foi muito bem apelidado de Estado de Mal-Estar) não tem mais condições de assegurar
esses direitos. Acresça-se a isto a tendência política neoliberal de diminuição da ação social do
Estado (WANDERLEY, 1997, p. 82).
39
Tal situação não pode acarretar a retirada da proteção do Estado ao
trabalhador, ou seja, a desregulamentação das relações de trabalho, o que deixaria
que a iniciativa privada regulasse as condições de emprego, mas deve pressupor a
presença do Estado com normas mínimas e gerais que garantam a dignidade do
homem enquanto trabalhador.
Assim, em uma análise das relações que se desenvolvem a partir do
processo de trabalho, não se pode esquecer que além da característica jurídica da
subordinação, fatores extrajurídicos influenciam em um ambiente de obediência e
sujeição, favorecendo a presença de trabalhadores dóceis e submissos.
1.3 PODER DO EMPREGADOR: O JUS VARIANDI
Para o Direito do Trabalho, conforme disposto no artigo 2º da CLT,
empregador é aquele que, “assumindo os riscos da atividade econômica, contrata,
assalaria e dirige a prestação pessoal de serviços” (BRASIL, Consolidação das Leis
do Trabalho, 1943).
Ao reconhecer como legítima a subordinação jurídica, o Direito do Trabalho
legalizou a dominação e o controle do empregador sob o empregado, atribuindo ao
empregador o direito que a doutrina denominou de jus variandi, qual seja, o direito
de variar, de mudar, de alterar o contrato de trabalho de seus empregados.
Quanto à natureza do poder do empregador, a doutrina apresenta
tradicionalmente quatro concepções: como um direito potestativo; direito subjetivo;
um fenômeno de caráter senhorial/hierárquico; e, mais recentemente, o poder como
direito-função.
37
37
“Todas elas correspondem a uma leitura bastante assimétrica do fenômeno do poder na relação
empregatícia, percebendo no empregador o titular quase absoluto (um pouco mais ou um pouco
40
Segundo a concepção que considera o poder do empregador um direito
potestativo, este seria uma “prerrogativa assegurada pela ordem jurídica a seu titular
de alcançar efeitos jurídicos de seu interesse, mediante o exclusivo exercício de sua
própria vontade” (DELGADO, M, 2006, p. 649). Ou seja, é o poder de influir sobre
situações jurídicas de modo unilateral, próprio e automático.
Como noção que consagra a supremacia da vontade do empregador no
contexto do trabalho, “[...] a concepção potestativa corresponde ao elogio do
individualismo possessivo inerente ao mercado capitalista, que foi sua marca
ideológica mais forte no período do liberalismo clássico” (DELGADO, M, 2006, p.
650).
Uma explicação alternativa à concepção potestativa do poder funda-se na
noção de direito subjetivo, caracterizando-se como a prerrogativa conferida pela
ordem jurídica ao titular, no sentido de agir para a satisfação de interesse próprio em
estrita conformidade com a norma ou cláusula contratual por esta protegida. “Direito
subjetivo e obrigação são conceitos especificamente delimitados pelo título jurídico
que os formulou – seja a regra, seja o contrato – não conferindo ao titular a
amplitude de ação inerente à idéia de direito potestativo” (DELGADO, M, 2006, p.
651).
A terceira vertente parte de pressupostos teóricos que vêem o fenômeno do
poder como de natureza hierárquica, o qual “constrói-se a partir de duas
perspectivas teóricas: ou considera a natureza hierárquica inerente à estrutura
diferenciada da empresa ou a considera decorrência necessária do contrato
menos) no contexto da estrutura e exercício desse poder. A quarta concepção (direito-função) - que
é mais recente do que as anteriores – procura, entretanto, incorporar o processo de forças
dialéticas que interagem no espaço empresarial interno e que, ao menos nos países democráticos
centrais, no período pós-Segunda Guerra Mundial, constitui realidade indissimulável. Nesse
sentido, é concepção significativamente mais avançada do que as três precedentes. Não obstante
esse avanço, não consegue suplantar certos limites teóricos que comprometem sua plena validade
(DELGADO, M, 2006, p. 649).
41
empregatício” (DELGADO, M, 2006, p. 652). Essa é uma concepção defendida pela
corrente institucionalista.
38
Novas propostas interpretativas da natureza jurídica do poder apontam para
a concepção de direito-função, entendendo que “o poder é atribuído ao titular para
agir em tutela de interesse alheio, e não de estrito interesse próprio”.
39
Embora as diferentes concepções proponham inovações para diferenciá-las
da concepção potestativa, a estrutura do poder na relação de emprego continua a
apresentar a mesma formulação em todas elas: o contraponto poder do empregador
e sujeição do empregado.
O poder atribuído ao empregador na relação de emprego tem também sido
visto pela doutrina como um poder hierárquico
40
ou um poder diretivo exercido pelo
empregador sobre a atividade do empregado. Alguns doutrinadores também
baseados no artigo 2º da CLT sustentam que o empregador é quem detém o poder
hierárquico manifestado pelo poder diretivo, do qual o poder disciplinar é um
corolário.
41
38
Uma variação dessa vertente é a concepção de poder como senhoria, apontada por Delgado, M.
(2006, p. 652), uma visão defendida por alguns doutrinadores alemães no período que antecedeu a
Segunda Guerra Mundial. Essa concepção entende que “o empregador comandaria o empregado
não como credor, mas como senhor, proprietário, com absoluta assincronia e unilateralidade de
posições”.
39
“O direito-função caracterizava, ilustrativamente, as relações dos pais perante a família (hoje, pai e
mãe, é claro), do administrador perante a fundação, do sindicato perante a categoria, do empresário
perante a empresa. O empregador exerceria, desse modo, seu direito-função não em seu exclusivo
interesse, mas tendo em vista o interesse da comunidade dos trabalhadores contratados”
(DELGADO, M, 2006, p. 654).
40
Quanto à utilização da expressão poder hierárquico para designar o poder do empregador na
relação de trabalho, esta recebe muitas críticas, segundo Delgado, M. (2006, p. 630): “Tal
expressão, afinal, carrega-se de rigidez incompatível com qualquer processo de democratização do
fenômeno intra-empresarial do poder [...] considera-se mais acertado referir-se ao fenômeno global
do poder no âmbito da relação de emprego pela expressão genérica poder empregatício (ou se
preferir, poder intra-empresarial), em vez de poder hierárquico”.
41
Delgado, M. (2006, p. 629) afirma que “a doutrina não tem ainda se utilizado comumente da
expressão poder empregatício para se reportar ao fenômeno aqui em exame. Tem preferido
produzir referências autônomas àquilo que consideramos as diversas faces ou dimensões do
mesmo fenômeno, quais sejam, poder diretivo, poder regulamentar, poder fiscalizador, poder
disciplinar. Não obstante essa tradição, é sem dúvida vantajoso, do ponto de vista teórico e prático,
apreender-se, em uma específica denominação (poder empregatício ou poder intra-empresarial), a
42
Portanto, não existe unanimidade quanto à posição que o poder ocupa na
empresa. Alguns colocam o poder diretivo como sinônimo de controle e comando,
como gênero e o regulamentador e fiscalizador, como espécies.
42
“Mas há sempre
poder e qualquer identificação é mero desdobramento de um todo, incindível. São
revelações e facetas” (COUTINHO, 1999, p. 10).
A necessidade de poder não é exclusividade da forma capitalista de
empresa, das organizações que têm por principal objetivo o lucro. Aparece também
em instituições públicas, assistenciais. Em todas elas se pode visualizar poder de
comando, organização ou direção, ainda que não exercido pelo proprietário do
capital.
O poder do empregador corresponde ao exercício de um poder jurídico
decorrente do contrato de trabalho, mediante o qual o trabalhador está obrigado a
prestar serviços em regime de subordinação. Ambos, subordinação e poder do
empregador, resultam da relação de emprego, “da subordinação surge para o
empregador o poder de comandar, isto é, de dar ordens e, para o empregado, o
dever de cumprir tais ordens” (ROMITA, 1983, p. 124).
A subordinação corresponde ao pólo antiético e combinado do poder
de direção existente no contexto da relação de emprego. Consiste,
assim, na situação jurídica derivada do contrato de trabalho, pela qual
o empregado comprometer-se-ia a acolher o poder de direção
empresarial no modo de realização de sua prestação de serviços
(DELGADO, M, 2006, p. 302).
integralidade de um mesmo fenômeno que apenas se desdobra, no plano operacional, em
dimensões e manifestações variadas”.
42
“A subordinação constitui o poder de direção visto do lado do trabalhador. Por isso, o empregador
organiza e controla os fatores da produção, advém-lhe o poder de dirigir seus empregados. Esse
pode se desdobrar em poder diretivo propriamente dito, isto é, faculdade de dar ordens; em poder
de fiscalização, isto é, faculdade de acompanhar a atividade do trabalhador, para ver se este a
desempenha conforme as ordens dadas; e em disciplinar, isto é, faculdade de punir o empregado
que não se submete ao poder diretivo” (MAGANO, 1980, p. 43).
43
A subordinação traduz-se na “situação em que se encontra o trabalhador,
decorrente da limitação contratual da autonomia de sua vontade, para o fim de
transferir ao empregador o poder de direção sobre a atividade que desempenhará”
(NASCIMENTO, 2005, p. 302).
O conhecimento acerca do fenômeno do poder empregatício é relevante
para a própria compreensão da atual sociedade, pois o trabalho assalariado constitui
uma das formas mais significativas do sistema econômico ocidental, sendo que essa
forma de expressão do poder “[...] sofre os efeitos da configuração global do
fenômeno no conjunto da sociedade (o contexto democrático ou autoritário mais
amplo da sociedade influi na estrutura e na dinâmica do poder internas ao
estabelecimento e à empresa)” (DELGADO, M, 2006, p. 628).
A partir dessa premissa considera-se que o estudo dos aspectos jurídicos do
poder empregatício não podem ser desvinculados de seus reflexos sociais, “efeitos
muitas vezes decisivos à própria compreensão de sua estrutura e dinâmica
meramente jurídicas” (DELGADO, M, 2006, p. 629).
Também são necessárias algumas observações quanto às diferentes
análises feitas a partir da busca da fundamentação do poder empregatício, na
tentativa de explicar a causa ou fator que confere substrato à própria existência
desse fenômeno e que permite sua incorporação no sistema jurídico.
Diferentes correntes doutrinárias de análise dos fundamentos do poder do
empregador na relação de emprego remetem à idéia de organização, norma,
contrato, contrato e propriedade, propriedade privada, controle e instituição que o
explica.
A teoria da propriedade privada identifica a causa do poder empresarial
como decorrente da propriedade dos meios de produção. O direito de propriedade
44
confere também ao empregador o direito de dirigir, controlar, fiscalizar a atividade
empresarial e o trabalho desenvolvido pelo obreiro. Para essa teoria, “o empregador
manda porque é dono” (COUTINHO, 1999, p. 117). O risco do negócio fica todo com
o empregador, o qual não pode transferi-lo ao obreiro, que somente entra com sua
força de trabalho. Em razão disso é que se assegura ao empregador o exercício de
seu poder diretivo.
Sua idéia fundamental desconsiderar que o empregador é proprietário dos
meios de produção, devendo atender à sua função social, e não do empregado. Se
assim não fosse, retrocederíamos ao período da escravidão ou da servidão, em que
os senhores eram proprietários dos escravos e servos e, nesse direito, legitimavam
o seu domínio e poder sobre eles.
43
Pela teoria da instituição
44
, o poder se fundamenta na empresa-econômica
pela própria necessidade de conservação da empresa e direção dela para a sua
finalidade econômico-social, “[...] voltada ao atendimento de um interesse coletivo,
sob controle e comando de um empreendedor” (COUTINHO, 1999, p. 120). A teoria
da instituição define-se, portanto, a partir das finalidades da aplicação do poder, não
se restringindo ao contrato de trabalho que tem como contraprestação o pagamento
de salário.
45
43
O controle da empresa muitas vezes não está nas mãos de seus proprietários, mas de técnicos
preparados para administrá-las. Muitas são as empresas em que poucos possuem quotas do ativo
empresarial suficientes para manterem-se no efetivo controle das atividades. “A dissociação entre
propriedade e controle leva mesmo à assimilação da empresa a um organismo político, em que
cada grupo de pessoas, nele inserido, tende a participar, com maior ou menor intensidade da
gestão respectiva. Tal dissociação constitui, pois, um dos fatores da institucionalização da empresa”
(MAGANO, 1980, p. 60).
44
Segundo Delgado, M. (2006, p. 640) “a instituição como fundamento (título e substrato jurídico) do
poder empresarial interno emerge como concepção relevante na Europa Ocidental da primeira
metade do século XX, associada à inspiração política autoritária que se destacou naquele período
(fascismo, na política; organicismo e corporativismo, no Direito). Após 1945, manteve ainda
razoável influência, embora seja mais rarefeita principalmente em países em que a democracia
ainda é incipiente (como, por exemplo, no Brasil, Argentina, México)”.
45
“Os que fazem repousar o poder em causa sobre a idéia de instituição põem em relevo um aspecto
importante da realidade, porque as grandes empresas, dos dias atuais, apresentam-se como
45
Defende-se o entendimento de que o contrato não esgota o conjunto de
relações entre empregados e empregadores, os quais somente podem ser
compreendidos quando há a integração de ambos na comunidade econômica
constituída pela empresa.
Magano (1980, p. 22) não faz críticas à teoria da instituição, porém, somente
a aceita como complementar à teoria do contrato, ou seja, desde que “se reconheça
que, além do vínculo interindividual, estabelecido entre empregado e empregador,
possa, conforme o caso, sobrepor-se-lhe um outro, de natureza intersocial, ligando
ambos a uma comunidade de trabalho, que é a empresa”.
Para explicar o fenômeno do poder juridicamente aceito, a maioria dos
doutrinadores prefere lançar mão da teoria do contrato,
46
pois quando se utiliza essa
teoria para explicar a legitimidade do poder, faz-se desnecessário o questionamento
acerca da aceitação, consciência ou vontade do empregado (COUTINHO, 1999, p.
124).
A teoria do contrato é a que fundamenta o poder no pacto de vontades que
dá origem à relação de emprego. Ao fazer acordo, as partes assumem direitos e
obrigações nos quais se inclui o poder empresarial, que explica a aceitação da
subordinação pelo empregado como decorrente da necessidade de direção das
atividades:
verdadeiras instituições, já que os elementos componentes de sua estrutura, vistos numa
perspectiva dinâmica, convergem naturalmente para a idéia ou fim a ser alcançado por elas. É este
fim ou interesse coletivo que condiciona cada vez mais a atuação dos órgãos de gestão da
sociedade, como a diretoria, o conselho de administração e a assembléia de acionistas, assim
como o comportamento dos órgãos de co-gestão, como as comissões de empresas. Assim, na
medida em que a empresa se identifique com o apontado modelo de instituição, há de se ver nesta
o fundamento do poder diretivo” (MAGANO, 1980, p. 44).
46
“São contratualistas, ilustrativamente, os juristas italianos Luiza Riva Sanseverino e Renato
Corrado. No Direito inglês, arrolam-se na vertente contratualista os autores Charles Darke e M.
Wright. No Brasil, Délio Maranhão, Nélio Reis, Arion Sayão Romita e inúmeros outros” (DELGADO,
M., 2006, p. 641).
46
A subordinação, por sua vez, é acatada a partir da necessidade de se
detalharem as condições de executoriedade da atividade, de conteúdo
relativamente indeterminado e pelo estado permanente de sujeição do
empregado com sua força de trabalho à vontade e à normativa empresarial,
que impõe uma série de deveres de conduta a esse sujeito contratual em
prol dos objetivos da empresa (COUTINHO, 1999, p. 115).
O empregador exercerá o poder porque assim foi ajustado entre as partes,
mesmo motivo pelo qual o empregado será subordinado ao comando do
empregador. O vínculo de trabalho passa a ser visto como contratual, mantendo-se,
contudo, a subordinação jurídica do trabalhador.
Do contrato, resulta o poder diretivo para o empregador e para o empregado,
o dever de sujeição (subordinação), sendo um o contraponto do outro.
47
Magano (1980, p. 45) discorda daqueles que vêem no contrato o
fundamento para o poder do empregador, afirmando que o contrato “constitui
fundamento meramente formal do poder diretivo.” Quando o trabalhador celebra o
contrato de trabalho com o empregador, embora reconheça neste o poder de lhe
dirigir a atividade, trata-se “[...] do reconhecimento de realidade subjacente,
inalterável pela vontade das partes e decorrente do regime através do qual se
exerce a atividade econômica, nos países do mundo ocidental”.
Quando duas pessoas, plenamente capazes para os atos da vida civil e para
os da vida do trabalho, implementam um ajuste de vontades, esse contrato terá a
força vinculante decorrente desse pacto, produzindo os efeitos do brocardo pacta
sunt servanda,
48
que é revelador da força vinculante dos contratos: os contratos uma
vez firmados vincularão as partes como se lei fossem.
49
47
Do contrato de trabalho deriva a obrigação obreira de lealdade e colaboração com a empresa.
48
Inspirado no princípio do Direito Civil, da inalterabilidade dos contratos (pacta sunt servanda), no
Direito do Trabalho tem-se o princípio da inalterabilidade lesiva ao trabalhador.
49
Em outros modos de produção, como a servidão ou a escravidão, o trabalho é forçado, isto é, só se
extrai mais trabalho da pessoa se você a submete fisicamente e lhe impõe essa carga. No sistema
capitalista, há um tal conjunto de regras sociais que faz com que ninguém possa dizer que está
obrigado. Na verdade, o proletário está obrigado a trabalhar, porque se não trabalhar, não ganhar
47
No Direito do Trabalho, esse princípio é relativizado primeiramente pelas
próprias alterações naturais dadas pela continuidade da relação de emprego, mas
sobretudo se coaduna com o princípio da melhoria das condições de trabalho.
Quanto ao jus variandi, corolário do poder do empregador no contrato de
trabalho, este se caracteriza por uma faculdade que permite a tomada de decisões e
alteração de alguns aspectos do contrato unilateralmente ou o tratamento de
situações nele não previstas, estando limitado pela ordem pública e algumas
cláusulas contratuais básicas.
O jus variandi é classificado como normal ou ordinário e excepcional ou
extraordinário. “O primeiro deriva do próprio poder diretivo do empregador, de um
poder ex fato e ex lege. Aquele, decorrente de exigências técnicas da empresa;
este, com assento, sobretudo, no parágrafo único do artigo 456 da CLT” (GOMES;
GOTTSCHALK, 1995, p. 333).
Delgado, M. (2006, p. 1005) afirma que “pelo jus variandi ordinário, de
maneira geral, ajustam-se, modulam-se ou se alteram aspectos não essenciais da
relação entre as partes.” O jus variandi extraordinário deriva de normas autônomas
ou heterônomas, ao previrem circunstâncias excepcionais que podem incidir
permanente ou provisoriamente no contrato individual.
O jus variandi ordinário trata, portanto, de situações que não estejam
inseridas no contrato nem sejam reguladas por norma jurídica, havendo o
entendimento que o empregador possui a autorização para unilateralmente decidir
salário, morre de fome. Mas, em princípio, e isso é uma ilusão necessária de que todos
compartilham, cada um se insere na economia por livre escolha (SINGER, 1998 apud COUTINHO,
2000, p. 25).
48
tais questões. As demais situações enquadrar-se-iam no chamado jus variandi
extraordinário.
50
Ocorrendo necessidade imperiosa, o jus variandi excepcional poderá “ser
exercido pelo empregador, seja para fazer face a motivo de força maior, seja para
atender à realização e conclusão de serviços inadiáveis, ou cuja inexecução possa
acarretar prejuízo manifesto” (DELGADO, M, 2006, p. 1008).
A ordem do empregador para que o empregado exerça função diversa da
contratada deve constituir uma eventualidade do contrato de trabalho e “a recusa do
empregado, numa emergência caracterizada pela força maior ou caso fortuito,
significaria irregular exercício do jus resistentiae, fato que implica o cometimento de
falta grave” (GOMES; GOTTSCHALK, 1995, p. 333- 335).
A recusa do empregado em submeter-se a ordens abusivas do empregador
fundamenta-se no jus resistentiae, reconhecido como um direito do trabalhador.
Não havendo regra específica para todas as alterações, há uma regra
genérica e um tanto quanto lacunosa, esculpida no artigo 456 da CLT:
[...] a prova do contrato individual de trabalho será feita pelas anotações
constantes da carteira profissional ou por instrumento escrito e suprida por
todos os meios permitidos em direito.
Parágrafo único: a falta de prova ou inexistindo cláusula expressa a tal
respeito, entender-se-á que o empregado se obrigou a todo e qualquer
serviço compatível com a sua condição pessoal. (BRASIL, Consolidação
das Leis do Trabalho, 1943).
50
Do ponto de vista prático, porque de uso mais corrente, interessa examinar o jus variandi normal.
Sendo o empregador o responsável pela direção da empresa, é ele, em primeiro lugar, o juiz das
exigências técnicas relativas a esta, mas o exercício de seu poder no dispor, unilateralmente, a
variação da qualificação, encontra limites em três sentidos diferentes. a) na temporariedade da
alteração unilateral; b) na afinidade da qualificação nova com a anterior; c) na reversibilidade ou
imutabilidade da qualificação originária. (GOMES; GOTTSCHALK, 1995, p. 334). A ordem jurídica
autoriza, por exemplo, o retorno do empregado que exerce cargo de confiança ao cargo
anteriormente ocupado, sem que isso caracterize alteração contratual ilícita (artigo 468, § único da
CLT). A Constituição Federal permite, através de negociação coletiva, a implementação de
importantes modificações contratuais: redução de salários (artigo 7º, VI), jornada de trabalho e
compensação (artigo 7º, XIII), jornada em turnos ininterruptos de revezamento (artigo 7º, XIV);
(DELGADO, M., 2006, p. 1008-1009).
49
Assim, se o contrato de trabalho não especificou as tarefas, os serviços e as
funções relativas ao cargo ocupado pelo empregado, subentende-se que ele se
obrigou genericamente a todo e qualquer trabalho compatível com as suas
condições pessoais.
51
A qualificação será o reconhecimento no contrato de admissão ao empre-
gado de uma dada aptidão, que produzirá o efeito de lhe conferir um tratamento
econômico-jurídico e hierárquico correlato à qualificação convencionada (GOMES;
GOTTSCHALK, 1995, p. 331).
Não se compreende aí aquelas tarefas incompatíveis com o universo gerado
pelas qualificações profissionais de um empregado, pois a subordinação jurídica
refere-se “tão-somente à matéria de serviço, ficando o empregado em igualdade de
condições na formação da relação e na manutenção de suas condições essenciais”
(MORAES FILHO, 1960, p. 385).
Não se pode exigir do empregado tarefas que não estejam dentro do âmbito
contratado. Assim, mesmo que o próprio contrato de trabalho não especifique quais
são as tarefas do empregado, pode-se delimitar um âmbito de atuação. Todas as
tarefas que não estão nesse âmbito contratual são alheias ao contrato e permitem
inclusive a rescisão indireta do contrato consoante o disposto no artigo 483 “a” da
CLT.
52
51
“Condição pessoal: sua qualificação profissional e demais atributos físicos e intelectuais”
(CARRION, 2006, p. 309). “A doutrina italiana concebe a qualificação como a posição que é
atribuída ao trabalhador subordinado na organização da empresa. Refere-se a determinadas
incumbências que, por sua capacidade e aptidão, esteja em condições de assumir, obrigando-se
perante o empregador que delas precisa para o exercício da empresa. Assim considerada, são
elementos da qualificação: a) a capacidade e aptidão do empregado para assumir a incumbência;
b) as exigências técnicas que a qualificação deve satisfazer; c) a posição que deriva da qualificação
contratada, e que servirá para regular os direitos e obrigações das partes” (GOMES;
GOTTSCHALK, 1995, p. 331).
52
Artigo 483 da CLT: “O empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a devida
indenização quando: [...] a) forem exigidos serviços superiores às suas forças, defesos por lei,
contrários aos bons costumes, ou alheios ao contrato” (BRASIL, Consolidação das Leis do
Trabalho, 1943).
50
A classificação apresentada por Gomes e Gottschalk (1995, p. 331) informa
que a qualificação profissional poderá ser objetiva ou real e subjetiva, contratual ou
convencional. A primeira relaciona-se a “uma particular formação profissional do
empregado” quer seja relacionada a cursos de aprendizagem ou a sua experiência
profissional. Até mesmo quando o empregado está desempregado deve ser-lhe
atribuída tal qualificação. A segunda refere-se àquela que deriva da contratação do
empregado, no momento em que se insere na empresa: “consiste na dinamização
da qualificação pessoal objetiva”.
53
“A contratualidade da qualificação é que imprime juridicamente o caráter de
intangibilidade à relação de emprego, não permitindo ao empregador modificá-la
unilateralmente” (GOMES; GOTTSCHALK, 1995, p. 332). A subordinação não
sujeita ao empregador toda a pessoa do empregado, mas é limitada ao âmbito da
execução do trabalho contratado (SÜSSEKIND; MARANHÃO; VIANNA, 1994, p.
236).
Portanto, as alterações de serviços, tarefas e funções fazem parte do jus
variandi do empregador, desde que respeitados os limites do parágrafo único do
artigo 456 da CLT. O artigo 450 da Consolidação consagra uma modalidade de jus
variandi em oposição ao princípio da inalterabilidade previsto no artigo 468 da CLT.
54
Verifica-se ainda que qualquer manifestação do poder diretivo do
empregador deverá sempre se adequar ao direito vigente, tendo como limite
intransponível o respeito à dignidade do ser humano.
53
Um advogado pode ser contratado como escriturário, uma professora como secretária etc.
54
“Artigo 450: Ao empregado chamado a ocupar, em comissão, interinamente, ou em substituição
eventual ou temporária, cargo diverso do que exercer na empresa, serão garantidas a contagem do
tempo naquele serviço, bem como volta ao cargo anterior; [...] Artigo 468: Nos contratos individuais
de trabalho só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e, ainda,
assim, desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de
nulidade da cláusula infringente desta garantia [...]” (BRASIL, Consolidação das Leis do Trabalho,
1943). Enquanto o artigo 450 disciplina as alterações provisórias, o outro fulmina de nulidade as
alterações definitivas (GOMES; GOTTSCHALK, 1995, p. 334).
51
Deste modo, levando-se em consideração a subordinação do empregado e
o poder do empregador, passa-se a analisar alguns aspectos relativos às mudanças
no mundo do trabalho e a deterioração das relações de poder dentro da empresa.
52
CAPÍTULO 2
O PODER EM FACE DAS MUDANÇAS NO MUNDO DO TRABALHO
O trabalho é a atividade humana por excelência, pela qual o homem
transforma a natureza e a si mesmo. Mas nos sistemas onde persiste a
exploração, ao invés de contribuir pela liberdade do homem, o trabalho
torna-se condição de sua alienação.
(Karl Marx)
2.1 ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO E MANIFESTAÇÕES DO PODER DO
EMPREGADOR
Na análise do poder no ambiente do trabalho e da subordinação como
elemento caracterizador da relação empregatícia, verifica-se que estes são
elementos que, dentro do contexto da relação de trabalho, vêm se mostrando de
maneira diferenciada daquela descrita na doutrina clássica; muitas vezes até de
forma dissimulada, em decorrência de novas formas de organização e gestão
estabelecidas pelas empresas.
Em algumas situações, essas mudanças têm levado a excessos que
transbordam o exercício regular do poder do empregador de gerir a atividade
empresarial, até mesmo favorecendo a configuração de um ambiente propício a
situações de assédio.
55
55
ASSÉDIO MORAL — AUMENTO DE PRODUTIVIDADE E LUCRATIVIDADE EM DETRIMENTO
DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA — CARACTERIZAÇÃO DO DANO MORAL —
INDENIZAÇÃO DEVIDA. O ato de humilhar a autora praticado por preposto da reclamada, no
intuito de pressioná-la a aumentar a produtividade, revela-se inaceitável, além de traduzir-se em
inevitável ofensa a princípios constitucionais, em especial, a dignidade da pessoa humana, previsto
no artigo 1º, III, da Carta Maior. Mesmo na competitividade, o ambiente de trabalho deve ser
preservado de sorte a proporcionar a todos salubridade física e emocional, viabilizando um convívio
harmonioso. Num contexto capitalista, o aumento de produtividade e, por conseguinte, de
lucratividade, é desiderato de todos os empresários, porém, não deve ser alcançado por meio de
ofensa à integridade emocional de seus empregados. A atitude assediante (assédio moral) de
preposto da reclamada, representa, sem dúvida, dano moral à autora que era obrigada a trabalhar
em ambiente desgastante e inóspito, permeado de humilhações perante os demais colegas e a
sociedade (TRT 9ª Reg. RO 03036-2004-664-09-00-6 — (Ac. 3
a
T. 32095/05) — Rel. Juíza
Rosemarie Diedrichs Pimpão. DJPR 6.12.05, p. 327.).
53
A reestruturação produtiva merece destaque nas discussões que envolvem
as transformações no mundo do trabalho, pois a partir da industrialização, com o
avanço tecnológico e as novas formas de organização empresarial, muitas
mudanças foram introduzidas nas relações de trabalho e, conseqüentemente, na
vida das pessoas:
Vivem-se formas transitórias de produção, cujos desdobramentos são
também agudos, no que diz respeito aos direitos do trabalho. Estes são
desregulamentados, são flexibilizados, de modo a dotar o capital do
instrumental necessário para adequar-se a sua nova fase. Direitos e
conquistas históricas dos trabalhadores são substituídos e eliminados do
mundo da produção (ANTUNES, 1998, p. 16).
Essa reestruturação da organização da produção ocorre paralelamente à
reestruturação econômica e serve para moldar o sistema produtivo às demandas do
capital. Cabe aqui lembrar que a falta de adaptação de uma empresa às mudanças
da economia e à globalização pode ter como conseqüência o seu desaparecimento.
A capacidade da adaptação rápida dos produtos às exigências do mercado
tornou-se importante para as empresas e exigiu um novo modelo de trabalho
adaptado à flexibilidade da produção. Da mesma forma, os trabalhadores precisam
desenvolver também a capacidade de se adaptar às mudanças no processo
produtivo, que se refletem também em mudanças no Direito do Trabalho.
Ao processo de transformação iniciado com a venda da força de trabalho
assalariada, seguiram-se mudanças nos modelos de organização, sempre visando
maior produtividade, eficiência e lucro.
Para a análise dessas formas de organização do processo de trabalho, é
relevante lembrar alguns aspectos importantes que influenciaram diretamente a
direção que o trabalho seguiu ao longo da história desde a separação entre
produtores e meios de produção.
54
Com o modelo capitalista de produção, os trabalhadores passaram a possuir
uma única mercadoria, a “força de trabalho”, e se transformaram em “trabalhadores
assalariados”; “simples operadores dos instrumentos de produção que não mais lhe
pertencem" (TEIXEIRA; SOUZA, 1995, p. 65).
A separação entre os produtores das mercadorias e seus meios de produção
faz com que o trabalho torne-se vazio de sentido para o trabalhador, pois o resultado
da atividade passa a ser o trabalho de outrem. A força de trabalho é transformada
em uma mercadoria a mais, da qual o trabalhador deverá dispor para ter acesso à
mercadoria dinheiro.
56
A manufatura já possibilitou a redução do tempo de trabalho necessário para
a produção de determinado produto (já que provoca um aumento da produtividade e
do trabalho excedente) e propiciou a divisão técnica do trabalho: divisão do trabalho
em tarefas e especialização dessas tarefas, levando à desqualificação técnica do
trabalho e redução do valor da força de trabalho. Em conseqüência, o processo de
fazer com que o trabalho seja posse do capital, promovido pelo capitalismo,
consuma-se.
Segundo Marx (1962), o processo de trabalho e suas transformações na
sociedade capitalista ocorrem sob o controle do capital.
A função da “gerência científica”, no modelo taylorista, dentro do processo
de evolução do capitalismo, é a de contribuir para a produção de mais-valia,
assegurando a legitimidade e normalidade da forma hierárquica administrativa das
empresas modernas, “por meio de uma adequada estratégia, que possibilita a
56
“A divisão social do trabalho não é uma simples divisão de tarefas, mas a manifestação de algo
fundamental na existência histórica: a existência de diferentes formas de propriedade. A
transformação das formas de propriedade e de divisão do trabalho dá origem à propriedade
capitalista” (MARX, 1989, p.78).
55
intensificação da dominação do capital e a constituição de um trabalho rentável por
um trabalhador submisso” (TEIXEIRA; SOUZA, 1985, p. 69).
“A subordinação ao capital é apenas formal, visto que a rapidez, a força e a
habilidade manual do trabalhador é que vão determinar o ritmo e o volume da
produção.” Nesse momento, o trabalhador com sua força de trabalho é um sujeito
ativo no processo de produção; mesmo que “[...] os instrumentos de trabalho não
mais o pertençam, ele os comanda” (TEIXEIRA; SOUZA, 1995, p. 66).
Com a expansão dos mercados, há necessidade de aumentar a escala de
produção, o que é obtido com a introdução da máquina no processo produtivo:
Na manufatura e no artesanato, o trabalhador se serve de ferramenta; na
fábrica, ele serve à máquina. Lá é dele que parte o movimento do meio de
trabalho; aqui ele precisa acompanhar o movimento. Na manufatura, os
trabalhadores constituem membros de um mecanismo vivo. Na fábrica, há
um mecanismo morto, independente deles, ao qual são incorporados como
um apêndice vivo. (MARX, 1962, p. 43).
A transformação da força de trabalho em mercadoria ocorre em um contexto
em que há a generalização da produção para a troca. O comprador, proprietário do
capital e dos meios de produção, adquire o direito de usar essa força de trabalho
pelo tempo acordado.
Os pequenos produtores do antigo sistema feudal dão origem a uma massa
de trabalhadores livres (até mesmo como exército de reserva), cuja força de trabalho
irá então ser transformada em mercadoria e vendida em troca de salário. Para
Teixeira e Souza (1995, p. 66), “a ‘liberdade’ não conquistada, senão que imposta,
que lhes permite colocar sua força de trabalho à venda, significa a subordinação
completa, definitiva, do trabalho ao capital”.
A forma como o trabalhador é inserido no processo produtivo irá variar
conforme o modelo de gestão.
56
As formas atuais de organização produtiva não são simples superação de
modelos anteriores
57
. Esses modelos representam o resultado da evolução do
sistema de fábrica em que Frederick Winslow Taylor
58
foi o responsável por
desenvolver o método administrativo ao qual emprestou seu nome, o taylorismo.
Taylor elaborou os “princípios da administração científica” e propôs novas
formas de administração através de padrões hierárquicos, com a total transferência
do controle do processo de trabalho para a direção capitalista.
59
O sistema de fábrica foi o responsável pela introdução da separação entre o
trabalho manual e intelectual na organização do trabalho. Com a “administração
científica”, por meio do taylorismo, retirou-se dos trabalhadores o controle das fases
da produção, de modo que cada trabalhador passou a ter conhecimento apenas da
tarefa que deveria desempenhar e não mais da totalidade do processo produtivo.
60
57
“Basta mencionar que, seja nos processos de trabalho onipresentes na indústria japonesa, seja na
profunda reestruturação industrial em curso nos Estados Unidos e na Europa Ocidental, a força de
trabalho demandada tem características nitidamente diferentes das da indústria da produção em
massa do passado recente. Trata-se de mão-de-obra mais educada e mais qualificada, muitas
vezes polivalente (multi-skilled), e sempre de níveis de escolaridade mais altos” (LOPES, 1993, p.
182).
58
Frederick Winslow Taylor, engenheiro americano, dedicou-se a estudos de metodização e
modernização dos processos de trabalho na indústria. Foi engenheiro-chefe da Midvale Steel Co.,
engenheiro mecânico do Instituto de Tecnologia de Stevens, de New Jersey, e presidente da
Sociedade Americana de Engenheiros Mecânicos. Publicou entre outras obras Shop management
(1903) e Principles of cientific management (1911). Em sua obra “Princípios da administração
científica”, Taylor desenvolve um estudo aplicado à fábrica buscando regras científicas para
fundamentar as mudanças na sua rotina que deveriam ser tomadas como estratégicas para o
aumento da eficiência e produtividade (TAYLOR, 1990).
59
O Taylorismo constitui-se num método para aumentar a produtividade do trabalho por meio de: a)
padronização das atividades que o compõem; b) contenção dos custos operacionais; c) melhor
aproveitamento do tempo de execução do trabalho, tornando-o, pois, mensurável e melhor
controlável pelo capital (TEIXEIRA; SOUZA, 1985. p. 68).
60
Separar as fases de concepção e execução do trabalho, entregando à administração o monopólio
do saber, que passa a ser distribuído de forma conveniente e dosada aos operários, então
transformados em exclusivos executantes. Justifica-se esse procedimento devido ao tempo e
estudos necessários à melhor organização do processo de trabalho que, portanto, não podem ser
assumidos pêlos operários, por falta de formação e tempo. Assim, é-lhes destinada a função de
executar, uma vez que a "ciência" do trabalho só pode ser utilizada por quem possui tempo e
formação para tanto. Em função disso, o processo de trabalho torna-se revestido de processos
complexos, uso de laboratórios, cálculos e previsões estatísticas que, em última análise, constituem
um método de classificação e sistematização que aspira à "cientificidade" (TEIXEIRA; SOUZA.
1985, p. 69).
57
Nesse modelo, a organização empresarial é uma combinação de
planejamento, organização, comando, coordenação e controle, “[...] organizar tudo
de forma racional, clara e eficiente; detalhar todas as tarefas e, principalmente,
controlar, controlar, controlar...”. (WOOD, 1992, p. 8).
O controle sobre os trabalhadores deveria existir devido à própria natureza
do trabalhador, para afastá-lo do hábito de “fazer cera”, fazendo com que o
empregado trabalhe mais e de forma mais rápida.
[...] em vez de empregar todo o seu esforço para produzir a maior soma
possível de trabalho, quase sempre procura fazer menos do que pode
realmente, não mais do que um terço ou um dia de trabalho, é
eficientemente preenchido. E, de fato, se ele se interessasse por produzir
maior quantidade, seria perseguido por seus companheiros de oficina [...].
Trabalhar deliberadamente devagar, de modo a evitar a realização de toda
a tarefa diária, fazer cera, soldering, como se diz nesse país, handing it out
como se diz na Inglaterra, can caen como é designado na Escócia é o que
está generalizado na indústria e em grande escala nas empresas de
construção (TAYLOR, 1990, p. 26-27).
Para Taylor, parcela da culpa pelo mau aproveitamento do tempo no
trabalho poderia ser atribuída também aos administradores, que, inclusive,
desconheciam qual o tempo necessário para que o trabalhador desempenhasse
determinada tarefa.
Para solucionar esses problemas, Taylor passa a desenvolver estudos sobre
o tempo necessário para a execução das tarefas nas oficinas, sobre o tempo que
cada trabalhador necessitaria para realizar o seu trabalho. Além disso, buscou
esclarecer a necessidade de “conscientizar” os trabalhadores sobre os benefícios da
colaboração com a administração: se se produz mais em menos tempo, recebem-se
salários maiores pelo aumento na produção.
58
A proposta da divisão de responsabilidades entre trabalhadores e seus
superiores para que haja uma melhor administração na distribuição das tarefas
61
,
constituiu-se em uma das mais importantes idéias da administração científica.
[...] o trabalho de cada operário é completamente planejado pela direção,
[...] na tarefa, é especificado o que deve ser feito e também como fazê-lo,
além do tempo exato concebido para a execução. E, quando o trabalhador
consegue realizar a tarefa determinada, dentro do tempo-limite
especificado, recebe ele aumento de 30 a 100% do seu salário habitual.
(TAYLOR, 1990, p. 42).
O taylorismo baseia-se em uma visão mecanicista, que indica o ajuste das
pessoas e funções ao método de trabalho ou a um projeto organizacional pré-
definido. “A mecanização reduz o trabalho a um ciclo de movimentos repetitivos,
caracterizando-se apenas pelo tempo de sua duração. Designa-se com isso o
fundamento da homogeneização do trabalho e da produção” (ANDRADE, 1993, p.
97). As atividades desenvolvidas são marcadas pela monotonia, pois se executam
tarefas idênticas durante longos períodos.
Através do princípio do controle dos movimentos e do tempo “utiliza-se do
monopólio do conhecimento para controlar as fases do processo de produção e seu
modo de execução. Controlavam-se todos os passos do trabalho vivo” (ANDRADE,
1993, p. 97).
As idéias de Taylor (1990, p. 94) podem ser sintetizadas nos doze
mecanismos a serem utilizados no sistema de administração científica, conforme
apresentados por ele:
1º) estudo do tempo, com os materiais e métodos para realizá-lo
corretamente;
2º) chefia numerosa e funcional e sua superioridade sobre o velho sistema
do contramestre único;
61
Há uma separação entre as funções de concepção/planejamento e de execução do trabalho. O
trabalhador perde o controle não só sobre seu instrumento de trabalho, mas sobre seu próprio
trabalho e o modo de executá-lo (ANDRADE, 1993, p. 97).
59
3º) padronização dos instrumentos e material usados na fábrica e também
de todos os movimentos do trabalhador para cada tipo de serviço;
4º) necessidade duma seção ou sala de planejamento;
5º) princípio de exceção na administração;
6º) uso da régua de cálculo e recursos semelhantes para economizar
tempo;
7º) fichas de instrução para o trabalhador;
8º) idéia de tarefa na administração, associada a alto prêmio para os que
realizam toda a tarefa com sucesso;
9º) pagamento com gratificação diferencial;
10º) sistema mnemônico para classificar os produtos manufaturados e
ferramentas usadas etc.;
11º) sistema de rotina;
12º) novo sistema de cálculo do custo etc.
Pela observação dos resultados da implantação desses mecanismos, Taylor
concluiu que as tarefas passaram a ser realizadas cada vez mais rapidamente, uma
vez se dividiram as tarefas por especialização e se controlou o tempo de execução.
O controle do trabalhador como elemento da produção é condição essencial
para eficiência e aumento na produtividade, daí decorrendo a necessidade da chefia
numerosa (mestre, encarregado, supervisor, chefe de setor, gerente de área,
gerente geral, assistentes etc.). Todos os problemas deveriam ser levados ao
conhecimento do superior imediato.
A influência das idéias de Taylor ultrapassou a fábrica e atingiu outros
setores da vida humana que são marcados pela presença do princípio de
aproveitamento do tempo.
62
Os valores e princípios introduzidos na administração empresarial por Taylor
foram incorporados pelas organizações e lá permanecem. Ainda hoje muitas
empresas “encontram na administração científica uma resposta para seus
62
Tudo que esteja ligado à maximização de recursos no tempo tem a marca inconfundível da
otimização de tempos e recursos, característica da administração taylorista, sejam entregas pelo
correio, robôs em linha de montagem informatizada, alimentação do tipo fast-food como a rede
MacDonald’s, hospitais, lazer previamente planejado e sistemático (excursões), currículos de
escolas e, entre inúmeras outras áreas, cursinhos pré-vestibulares, em que segmentos informativos
ministrados por professores ‘superespecializados’ justapõem-se, pressupondo-se o
‘superaproveitamento’ do tempo em ritmo de trabalho ‘superintensivo’ e oferecendo como
recompensa a ‘prosperidade’ proporcionada pela entrada nas melhores faculdades” (HELOANI,
2003, p. 40).
60
problemas. Mas isso pressupõe condições ambientais estáveis, produtos com
poucas mudanças ao longo do tempo e previsibilidade do fator humano”. (WOOD,
1992, p. 8). Esses princípios foram aperfeiçoados através de práticas gerenciais
difundidas por Henry Ford.
63
Ford buscou aprimorar as técnicas de administração científica com objetivos
voltados à indústria automobilística, implantando um conceito de consumo e
produção em massa através da sua teoria da organização industrial.
64
O fordismo ou taylorismo-fordismo baseia-se no princípio de que uma
empresa deve dedicar-se apenas a um produto e, para isso, deve adotar a
verticalização: todos os componentes são produzidos na fábrica, desde as fontes de
matéria prima até os sistemas de transporte das mercadorias.
65
Para diminuir os custos, a produção deve ser em massa, em grande
quantidade e aparelhada com tecnologia capaz de desenvolver ao máximo a
produtividade dos operários.
66
Assim, aumentou-se a produtividade e diminuíram-se
os custos.
63
“Taylor publicou o seu livro Principles of Scientificn Management em 1911. Seus princípios
influenciaram rapidamente fábricas, escolas, lares e até mesmo igrejas. Quinze anos mais tarde,
em 1926, Ford publicou o artigo ‘Mass Productio’. O impacto dos conceitos relatados moldou as
organizações ao longo de décadas e sua influência atravessou fronteiras geográficas e ideológicas”
(WOOD, 1992, p. 10).
64
Após 1935, o modelo fordista incita a generalização do consumo de massa para o conjunto da
economia. Forma-se assim uma equação em que a reprodução da força de trabalho se transforma
em parte integrante da reprodução do capital. O resultado é um aumento generalizado de consumo,
que vai abrir novas possibilidades de acumulação de capital para o empresário. Ao Estado do Bem-
Estar Social caberia a complementação do modelo fordista, com a garantia de assistência médica e
educação básicas, melhorias urbanas, seguro-desemprego, entre outros benefícios, todos fatores
imprescindíveis para assegurar a continuidade do poder de consumo do trabalhador (HELOANI,
2003, p. 67-68).
65
A mudança paradigmática não é absoluta, permanecendo elementos de paradigmas anteriores. “A
maioria dos autores que estudaram o Fordismo concorda que este processo de trabalho introduzido
nas unidades fabris é uma extensão do Taylorismo, embora tenha ido bem mais longe, quando
analisa todo o instrumental de controle capitalista sobre o trabalho acentuado na doutrina fordista”
(ANDRADE, 1993, p. 99).
66
“O conceito-chave da produção em massa não é a idéia de linha contínua, como muitos pensam,
mas a completa e consistente intercambialidade de partes, e a simplicidade de montagem. Antes da
introdução da linha contínua, Ford já tinha reduzido o ciclo de tarefa de 514 para 2 minutos; a linha
contínua reduziu esse número à metade” (WOOD, 1992, p. 8).
61
Ford foi o precursor da “linha de montagem” que revolucionou a indústria ao
implementar um sistema de controle indireto do tempo de produção: a velocidade da
esteira. O empregado não se desloca no interior da fábrica, mas está fixo enquanto
os objetos circulam determinando o ritmo da produção. Esse sistema de “esteira
rolante” é retratado de forma irônica por Charles Chaplin, no filme “Tempos
Modernos”.
Ainda predomina a idéia de controle do tempo, que não irá desaparecer. No
sistema de fábrica taylorista-fordista, assim como nos novos modelos de gestão, o
tempo está a favor do capital. “No mundo fabril, o tempo é da produção: quanto mais
produzem, mais são exigidos; quanto mais tempo ‘dão’ à produção, menos tempo
têm para si próprios. O tempo é o limite das ações pessoais a favor do tempo
ilimitado das ‘necessidades’ acumulativas do capital” (BARRETO, 2003, p. 138).
Na linha de montagem, o trabalhador desempenha apenas uma tarefa.
Portanto, o conhecimento de todo o processo não é mais necessário, apenas se
executa a tarefa determinada. Para controlar todo o processo, surge a figura do
engenheiro industrial (WOOD, 1992, p. 10).
Dessa forma, os trabalhadores na esteira equiparam-se às máquinas. São
instrumentos do sistema produtivo, reificados; sua única função é operar as
máquinas.
67
Permanece característico do sistema de Taylor o trabalho repetitivo,
monótono e fragmentado (ANDRADE, 1993, p. 99).
67
Reificação: Em filosofia, processo pelo qual se transforma algo móvel, dinâmico, em ser fixo,
estático; tendência a ver todas as realidades do mundo como se fossem coisas, objetos físicos;
Processo pelo qual se objetivam as relações sociais, as relações humanas, os produtos do
trabalho, transformando-os efetivamente em “coisas sociais”, isto é, em sistemas aparentemente
independentes daqueles para os quais este processo se efetuou. (Este conceito de reificação foi
introduzido por Marx, mas coube sobretudo a Luckács desenvolvê-lo).
62
Além disso, o trabalho é altamente especializado, pois cada operário realiza
determinada tarefa. E para que o operário tenha boa produtividade, deve ser bem
remunerado.
A inovação Fordista quanto aos salários deveu-se a duas razões: por um
lado, objetiva-se manter o trabalhador submisso no emprego; por outro lado, se
procurava, pela lógica, fazer com que os trabalhadores se tornassem potenciais
consumidores da produção industrial em massa.
Foi então que se articularam processo produtivo e consumo, articulação
essa que influenciou o modo de vida dos trabalhadores.
A partir de então os princípios do Fordismo se difundiram amplamente,
tornando-se uma das bases da organização industrial moderna, a qual manteve a
idéia de tempo, produtividade, divisão e eficiência já implantada por Taylor.
Esse modelo perde força na década de 70, quando voltam a surgir variações
nos modos de organização empresarial, visando à adaptação às mudanças do
mercado e a novos caminhos para o desenvolvimento econômico.
Somente quando Eiji Toyota e Taiichi Ohno
68
inovam no processo de
organização empresarial com suas idéias na busca por soluções para a evolução da
indústria japonesa após a Segunda Guerra Mundial é que se passa a uma era de
flexibilização no processo produtivo e no processo de trabalho.
68
Na primavera de 1950, o jovem engenheiro Eiji Toyota empreendeu uma visita de três meses às
instalações da Ford em Detroit. Após este período, ele escreveu uma carta para a sede de sua
empresa no Japão, dizendo singelamente acreditar que ‘havia algumas possibilidades de melhorar
o sistema de produção’. De volta ao seu país, Toyota e o seu especialista em produção Taiichi
Ohno, refletiram sobre o observado na Ford e concluíram que a produção em massa não poderia
funcionar bem no Japão. Desta reflexão nasceu o que ficou conhecido por Sistema Toyota de
Produção – ou Produção Flexível. Junto com ele também nasceu a mais eficiente empresa
automobilística conhecida até hoje (WOOD, 1992, p. 12).
63
O modelo de gestão que surge a partir da incorporação das idéias de Eiji
Toyota e Taiichi Ohno é reconhecido como “Toyotismo”, “Acumulação Flexível” ou
ainda “Onismo”.
A acumulação flexível, como vou chamá-la, é marcada por um confronto
direto com a rigidez do fordismo. Ela se apóia na flexibilidade dos processos
de trabalho, dos mercados de trabalho, dos produtos e padrões de
consumo. Caracteriza-se pelo surgimento de setores de produção
inteiramente novos, novas maneiras de fornecimento de serviços
financeiros, novos mercados e, sobretudo, taxas altamente intensificadas de
inovação comercial, tecnológica e organizacional. A acumulação flexível
envolve rápidas mudanças dos padrões do desenvolvimento desigual, tanto
entre setores como entre regiões geográficas, criando, por exemplo, um
vasto movimento no emprego no chamado 'setor de serviços', bem como
conjuntos industriais completamente novos em regiões até então
subdesenvolvidas (tais como a 'Terceira Itália', Flandres, os vários vales e
gargantas do silício, para não falar da vasta profusão de atividades dos
países recém-industrializados) (HARVEY, 1996, p. 140).
O modelo que passou a ser implantado na Toyota trazia como
características importantes as idéias de que os empregos deveriam ser vitalícios,
receber promoções por critérios de antigüidade e participar nos lucros.
Ohno procurou dividir as tarefas em pequenos grupos, e promover encontros
periódicos para discussão de melhorias no processo de produção. Outra inovação
foi a possibilidade de realizar um controle de qualidade no decorrer do processo
produtivo e não somente ao final, como ocorria no modelo de Ford. Assim se
possibilitava a “qualquer operário parar a linha caso detectasse algum problema”
(WOOD, 1992, p. 13).
A Toyota adotou outras mudanças na montagem de seus veículos em
relação ao modelo Ford, procurando organizar os fornecedores das peças e demais
componentes para seus veículos em grupos, formados por companhias
independentes, mas envolvidas no desenvolvimento dos produtos da empresa.
O modelo Ford tinha por filosofia manter à disposição recursos abundantes,
de todos os tipos, para enfrentar qualquer eventualidade. “Os recursos deveriam
64
ficar em estado de prontidão, para cumprir o programa de trabalho com segurança e
lidar com as emergências. Essa era a filosofia do just-in-case”. (MAXIMIANO, 1996,
p. 220).
O sistema que ficou conhecido como just in time opera com a redução dos
estoques intermediários, representando uma superação do sistema just in case de
Ford, pois obrigava cada membro do processo produtivo a antecipar os problemas e
evitar que estes ocorressem (WOOD, 1992, p. 14).
A produção ocorre na medida da demanda, ou seja, não se trabalha com
grandes estoques como ocorria no sistema just in case. Este foi substituído pela
idéia do sistema just in time, que prevê que o bem seja produzido na exata
proporção da necessidade do mercado.
69
A mesma sistemática utilizada com os fornecedores é também adotada
quanto à distribuição, que ocorre em um sistema de parcerias.
Ainda quanto ao controle da jornada, difunde-se a idéia de “tempo flexível”,
que traria ao trabalhador a “vantagem” de programar suas horas de atividade.
“Embora seja utilizada para a reposição de horas de trabalho quando se deseja
proporcionar folga aos funcionários em dias específicos, possui a desvantagem da
direção das atividades que devem ser elaboradas conjuntamente e demandam a
sincronia no que concerne à presença dos trabalhadores” (HELOANI, 2003, p. 120).
Outras inovações surgem com a implantação de um modelo de trabalho de
“consórcio modular”. A fábrica de caminhões da Volkswagen, inaugurada em
novembro de 1996, em Resende, estado do Rio de Janeiro, implantou o consórcio
69
A Toyota necessita hoje de quase metade do tempo e investimento de um produtor convencional
para lançar um novo veículo. Por outro lado, enquanto as fábricas da Ford e General Motors
procuram produzir um modelo por planta, as da Toyota fazem dois ou três. O tempo médio de
permanência dos modelos no mercado também é diferente: os carros japoneses têm um ciclo de
vida inferior à metade do ciclo de vida dos carros americanos (WOOD, 1992, p. 14).
65
modular, idealizado por um alto executivo da Wolksvagen, o espanhol José Ignácio
López Ariortúa, que deixou a General Motors em 1993, para implantá-lo na Wolks.
70
Nesse modelo, os fornecedores das peças dos veículos são trazidos para
dentro da fábrica: cada empresa tem uma doca especial para descarregar suas
peças e uma área contígua à de montagens para guardá-las. Cada fornecedor tem
seu módulo de produção independente; oito ou dez desses módulos fornecem o
produto final.
Este formato de gestão empresarial tem, dentre outras características,
parcerias interfirmas que estabelecem dentro da fábrica relações condominiais entre
si, a produção flexível e a colaboração entre parceiros.
Nesse sistema, a divisão dos trabalhadores em grupos pressupõe que sejam
“construtores de veículos”, de forma que cada grupo seja capaz de montar um carro
completo.
As diretrizes a serem seguidas são de qualidade, produtividade e eficiência –
o trabalhador deve procurar qualificar-se para manter seu emprego. A necessidade
de qualificação profissional é vista como uma forma de ascensão social e também
como uma ameaça.
Também há mudanças no ambiente de trabalho, em que se passa a
organizar os trabalhadores em equipes de trabalho. “A prática e o incentivo de
70
A Volvo já desenvolveu experiências com esse modelo por ocasião da implantação da fábrica de
Uddevalla, na Suécia, em 1988. O modelo implantado está dividido em três áreas: oficina de
materiais, oficina de montagem e prédio administrativo. “Todo o transporte de materiais é
automatizado. Em cada uma das seis oficinas de montagem trabalham 80 a 100 operários divididos
em grupos de oito a dez, sob a supervisão de um único gerente. Cada grupo tem todos os
elementos para montar três veículos simultaneamente. As tarefas são distribuídas de acordo com
as competências, que são constantemente aperfeiçoadas. O planejamento dos recursos humanos é
parte integral da estratégia de produção. [...] Antes de iniciar o trabalho, cada novo operário passa
por um período de treinamento de quatro meses seguidos posteriormente de mais três períodos de
aperfeiçoamento. Espera-se que, ao final de dezesseis meses, ele seja capaz de montar totalmente
um automóvel. Uma característica interessante é que 45% da mão-de-obra são feminina, o que é
causa e conseqüência de várias alterações no sistema de produção. O objetivo de tudo isto é,
obviamente, aumentar a produtividade, reduzir custos e produzir com a mais alta qualidade”
(WOOD, 1992, p. 17-18).
66
atividades em equipe, baseadas na interdependência entre os empregados que as
compõem, aguça-lhes a competição e, paradoxalmente, o individualismo”
(DELGADO, G. N., 2006, p.180).
Estas estratégias estão sustentadas pela caracterização do trabalho como
processo de precariedade e flexibilidade, com jornadas prolongadas e marcadas
pelos conceitos cada vez mais difundidos de cooperativas, autonomia, qualificação,
empreendedorismo, para que os trabalhadores possam responder às demandas de
um sistema cada vez mais restrito e competitivo.
A Consolidação das Leis do Trabalho brasileira, aprovada em 1943, foi
elaborada voltada para um mundo do trabalho estruturado sobre o paradigma
administrativo taylorista-fordista, com muitos de seus dispositivos voltados para o
controle do empregado subordinado, sob o poder do empregador.
Ordem e disciplina são temas tratados com relevância pelo texto
consolidado e, lembrando Foucault (1999, p. 143) “a disciplina ‘fabrica’ indivíduos:
ela é a técnica específica de um poder que toma os indivíduos ao mesmo tempo
como objetos e como instrumentos de seu exercício”.
O Direito do Trabalho, hoje em momento de crise, deve buscar as soluções
e estratégias para garantir direitos trabalhistas e proteger os trabalhadores de
abusos decorrentes das novas formas de gestão e busca de acumulação do capital.
2.2 AS MUDANÇAS NO MUNDO DO TRABALHO E A CONSTRUÇÃO DA
SUBJETIVIDADE DO TRABALHADOR
A reestruturação produtiva e as novas formas de organização do trabalho
também desempenham importante papel na construção da identidade obreira sob as
novas demandas do capital, evidenciando estratégias utilizadas para envolver o
67
trabalhador e atingir sua subjetividade.
71
“As relações de trabalho constituem um
processo criador: produzem, ao mesmo tempo, a subjetividade e a objetividade
humana”. (PALANGANA, 1998, p. 13).
O trabalho possui diferentes dimensões na vida das pessoas, não se
restringindo somente a ser fonte de satisfação de suas necessidades.
72
As
transformações presenciadas no mundo do trabalho, o fechamento de postos de
trabalho, a precarização, o subemprego, a informalidade, a terceirização tem por
conseqüência transformações na vida das pessoas, em seus valores e nas suas
formas de se relacionar com o outro, pois “a vida cotidiana apresenta-se como uma
realidade interpretada pelos homens e subjetivamente dotada de sentido para eles,
na medida em que forma um mundo coerente”. (BERGER; LUCKMANN, 1976, p.35).
Segundo Coutinho (1998, p. 1340), “[...] é fundamentalmente pelo trabalho,
inevitável fonte de preservação da vida e construção da sociedade, enquanto
portador da subjetividade humana, que o sujeito se constitui como ser,
reconhecendo-se a partir da própria transcendência, objetivada na atividade e no
resultado”.
Observe-se a respeito a condição daquele que trabalha e daquele que não
trabalha, segundo Brasil (2003, p. 95) o trabalhado enseja o sentimento de
dignidade ou utilidade, o desemprego, ao contrário, é sinônimo de inutilidade e de
71
“Deste modo, embora reconheçamos que o estranhamento do trabalho, que decorre do modelo
toyotista, tem elementos singulares — dados pela própria diminuição das hierarquias, pela redução
do despotismo fabril, pela maior ‘participação’ do trabalhador na concepção do processo produtivo
—, é de todo relevante enfatizar que essas singularidades não suprimem o estranhamento da era
toyotista. A desidentidade entre indivíduo e gênero humano, constatada por Marx nos Manuscritos,
encontra-se presente e até mesmo intensificada em muitos segmentos da classe trabalhadora
japonesa — e não estamos mencionando aqui as consequências nefastas da toyotização, em
franco processo de expansão em tantos outros contingentes de trabalhadores em diversos países”.
(ANTUNES, 1998, p. 33-34).
72
A identidade do trabalhador é construída coletivamente. O comportamento humano é influenciado e
modificado pelo comportamento da coletividade. A personalidade, as crenças, ditam a forma
dominante de agir de uma pessoa. Entretanto, as condutas praticadas habitualmente pela mesma,
podem ser modificadas ou moldadas pelas condutas praticadas por outros indivíduos.
68
vergonha, sendo que tais sensações são explicadas pela restrição do consumo e
pela incapacidade em sentir-se integrado numa sociedade que reconhece e inclui
pelo trabalho. Em outras palavras, existe, um conjunto de crenças e valores culturais
em que os indivíduos são classificados e rotulados, entre vencedores e perdedores.
Portanto, estar na condição de desempregado pode implicar em exclusão,
pobreza, enfim, em um deslocamento de referenciais de estabilidade como família,
relações de amizade e de desespero em relação ao futuro.
Para o trabalhador as mudanças no mundo do trabalho, transformam
também a vida das pessoas, seus valores e seus relacionamentos. A relação com o
trabalho pode expressar–se pelos sentimentos e ideais de sucesso ou de fracasso.
A subsunção do ideário do trabalhador àquele veiculado pelo capital, a
sujeição do ser que trabalha ao ‘espírito’ Toyota, à ‘família’ Toyota, é de
muito maior intensidade, é qualitativamente distinta daquela existente na era
do Fordismo. Esta era movida centralmente por uma lógica mais despótica;
aquela, a do Toyotismo, é mais consensual, mais envolvente, mais
participativa, em verdade mais manipulatória. (ANTUNES, 1998, p. 33-34).
Segundo Rosa (2002, p. 55) nas relações de produção capitalistas o
exercício do poder tem como objeto o corpo do trabalhador: sujeição das forças do
trabalhador pela disciplina à docilidade, à obediência. Esse processo leva à
construção do modo de ser moral do trabalhador na condição de trabalhador
assalariado - ser passivo, submisso, sem poder.
Nas relações de trabalho há exercício do poder em seu caráter negativo
através da “coerção, proibição, repressão e violência sobre os trabalhadores”, e
nesse aspecto, o poder se revela como algo que se impõe sobre os trabalhadores.
73
73
Os homens se hierarquizam em decorrência do jogo articulado da divisão técnica do trabalho com
a simbolização valorativa de seus próprios interesses. Aos objetos naturais do mundo, referências
concretas de sua experiência e de sua ação produtiva, se unem não apenas simbolizações
conceituais, mas também representações valorativas. Assim, a divisão técnica do trabalho social,
destinada a garantir a produção econômica, leva a uma divisão social do trabalho técnico, de tal
69
Há também a revelação de um aspecto positivo do poder, quando este se revela
“como saber, integrado à produção econômica, na fabricação de sujeitos-sujeitados,
reduzindo-os à forças úteis, produtivas e dóceis”. Os aspectos positivo e negativo do
poder coexistem, porém, o caráter positivo sobrepõem-se ao negativo na “produção
do modo de ser do trabalhador com o trabalho” (ROSA, 2002, p. 56-57).
Funda-se pela necessidade de um novo tipo de controle da subjetividade
obreira, principalmente vinculado à lógica do Toyotismo onde se faz necessário um
processo de constituição de novas qualificações, desenhando-se um novo perfil para
os trabalhadores.
74
Faz-se necessário construir um conjunto de valores e padrões de
socialização que assegurem ao capital que o trabalhador estará efetivamente
comprometido com a produtividade e a competitividade da empresa. “Diminui-se ou
mescla-se, dependendo da intensidade, o despotismo taylorista, pela participação
dentro da ordem e do universo da empresa, pelo envolvimento manipulatório, próprio
da sociabilidade moldada contemporaneamente pelo sistema produtor de
mercadorias”. (ANTUNES, 1998, p. 16).
modo que o poder econômico, propriedade dos meios de produção e dos bens produzidos, se
transmuta em poder político, disposição do domínio sobre os próprios sujeitos produtores. É assim
que o poder político, para se constituir, precisa integrar tanto elementos econômicos como
elementos ideológicos, unindo e fazendo convergir elementos do saber e do fazer (MUCHAIL,
1995a, p. 49).
74
“Marx utiliza-se tanto do termo alienação (Entausserung) quanto estranhamento (Entfremdung)
para se referir ao trabalho na sociedade capitalista [...] alienação (do latim alienatio) concerne à
separação do produtor de seu produto, independentemente das condições e relações sociais em
que essa separação é efetuada, enquanto estranhamento/estranho (do latim insolitus, inusitatus) é
relativo a um contexto histórico definido, em que a separação ocorre numa relação de expropriação,
dominação e mesmo hostilidade em relação à obra do trabalhador. Ainda acrescentamos a isso
que, quando trabalhamos, transferimos um pouco de ‘nós mesmos’, de nossa subjetividade ao
produto ou natureza, espelhando-nos no mundo e vice-versa. Assim, nossa subjetividade é também
incorporada, independentemente do modo de produção adotado ou da técnica dominada”.
(HELOANI, 2003, p. 128).
70
Os micropoderes no exercício do poder do empregador em busca da mais-
valia fabricam o “bom trabalhador”, assíduo, responsável, colaborador (ROSA, 2002,
p. 205).
Expressões como qualificação e capacitação são usadas como sinônimos
para desenvolvimento profissional e possibilidade de ascensão social,
75
com a
construção simbólica da imagem de um trabalhador que pode dispor de seus
conhecimentos para construir uma trajetória pessoal de êxitos, em aliança com o
capital, que dele depende diretamente.
Esse é um contexto que favorece a sujeição do trabalhador. Associa-se
idéias de liberdade e igualdade ao consumo, prazer e realização pessoal ao
trabalho.
76
Um novo perfil de trabalhador parece surgir, modificado pelo modo de
organização do trabalho:
Para começar, o movimento mais flexível do capital acentua o novo, o
fugidio, o efêmero, o fugaz e o contingente da vida moderna, em vez dos
valores mais sólidos implantados na vigência do fordismo. Na medida em
que ação coletiva se tornou, em consequência disso, mais difícil - tendo
essa dificuldade constituído, com efeito, a meta central do impulso de in-
cremento do controle do trabalho - o individualismo exacerbado se encaixa
no quadro geral como condição necessária, embora não suficiente, da
transição do fordismo para a acumulação flexível. (Harvey, 1996, p. 161).
A subjetividade do trabalhador vincula-se à situação em que ele se encontra
na relação de trabalho. “A existência humana, histórica, real, concreta, se delineia
75
Também em tom de ameaça: se o trabalhador não se capacitar, provavelmente será retirado do
mercado de trabalho.
76
“De um lado, a sociedade insiste nos princípios de liberdade e igualdade, que se encontram na
base de suas fortificações. Ela se erige sob a promessa de pôr fim à sujeição do indivíduo à
autoridade do conjunto, tal como no Antigo Regime, de torná-lo dono de sua privacidade. De outro,
desde o século XVIII, o antagonismo entre a materialidade proveniente do trabalho e o discurso
sobre a liberdade torna-se inacobertável. Frustam-se as perspectivas de que com o fim dos laços
naturais, que impunham limites claros à vida o indivíduo, as relações de denominações
desapareceriam. Elas na apenas assumiram uma nova forma, a qual camufla a denominação,
valendo-se de meios e instrumentos sem concretude imediata. A não-liberdade parece ser
proporcional à distância que separa a labuta da auto-atividade. Ao contrário das proferições, as
pistas sugerem um indivíduo, pouco a pouco, coisificado no processo de mercado. Acredita-se que
a extremada divisão do trabalho e o aperfeiçoamento dos mecanismos de controle capitalistas
levam ao atrofiamento do sujeito individual”. (PALANGANA, 1998, p. 14).
71
como um efetivo exercício de práticas produtivas, de práticas políticas e de práticas
culturais. E é esta prática real que constitui o homem, efetivamente construindo sua
‘essência’, histórica e socialmente construída (MUCHAIL, 1995a, p. 47).
As mudanças nas formas de organizar e gerir o trabalho quando fundadas
em relações assimétricas, práticas desumanas, abuso de poder, marcadas por
desqualificações, humilhações, discriminações, podem ter como resultado a
degradação do ambiente de trabalho, pois “contraditoriamente, nas políticas de
gestão cada dia mais a capacidade de resistir a frustrações ou ao estresse é vista
como positiva para o aumento da produtividade”. (BARRETO, 2003, p. 87).
“Tratando da discussão acerca da essência do ser humano, vivemos o
antagonismo do que é digno do humano e o que é útil à sociedade. Entendo que
vivemos uma crise de humanismo, da centralidade do humano, fruto da própria
banalização do homem” (MUCHAIL, 1995b, p. 72). É diante desses significativos
aspectos que envolvem o mundo do trabalho que se faz necessária a abordagem
dos aspectos jurídicos e possíveis estratégias do direito para coibir abusos.
2.3 ABUSO DO PODER DO EMPREGADOR E A TEORIA DO ABUSO DE DIREITO
A reestruturação produtiva e os modelos de gestão têm alterado a maneira
como empregados e empregadores se relacionam no ambiente de trabalho, sendo
que muitas das estratégias utilizadas para melhorar o desempenho das empresas
têm sido usadas também de forma abusiva.
72
O empregador é o titular do direito de dirigir sua atividade, porém este direito
está sujeito a limites, ou seja, o empregador não pode agir de modo a desvirtuá-lo, já
que incorria assim em uma conduta abusiva.
77
O Código Civil brasileiro, em seu artigo 187, dispõe: “também comete ato
ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestadamente os limites
impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”
(BRASIL, Código Civil, 2002).
Mesmo antes de disposição expressa a respeito, “[...] grande parte dos
autores pátrios afirmavam que o abuso do direito encontrava sustentação, ainda que
a contrário sensu, no artigo 160, I, do antigo Código Civil de 1916” (STOCO, 2000, p.
127).
78
Embora o Código Civil brasileiro de 2002 trate expressamente do tema em
seu artigo 187, o abuso do direito antecede a ele,
79
tratando-se de tema “supralegal
de violação dos próprios princípios de finalidade da lei e da eqüidade” (VENOSA,
2004, p. 196).
77
“Não obstante ter sido construída ao longo do século XX pela doutrina e jurisprudência, a teoria do
abuso de direito possui sua origem atrelada ao Direito Medieval, tendo sido observada nos atos
emulativos (aemulatio), os quais podem ser compreendidos como os atos praticados pelos
indivíduos com a intenção deliberada de causar prejuízos a terceiros.[...] A rixa, a briga, a
altercação, é a substância da vida medieval. Brigas de vizinhos, brigas de barões, brigas de
corporações, nos seio das sociedades; brigas entre o poder temporal e o poder espiritual. [...] No
que concerne aos atos emulativos, é imperioso frisar que estes podiam ser constantemente
observados, principalmente, nas relações imanentes ao direito de propriedade, quando proprietários
ou vizinhos exercitavam seus direitos com o objetivo de prejudicar terceiros” (BARROS, J. 2006, p.
01).
78
“Artigo 160. Não constituem atos ilícitos: I – os praticados em legítima defesa ou no exercício
regular de um direito reconhecido [...]”. (CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO, BRASIL, 1916).
79
“[...] sendo articulado na definição do ius o princípio da convivência, uma análise mais detida do
fenômeno impõe conciliar a utilização do direito como respeito à esfera jurídica alheia, e aconselha
fixar-lhe um limite. É precisamente na idéia desta limitação que assenta a doutrina, tão discutida
hoje em dia. Os que vão buscar inspiração no direito romano defrontam-se, na verdade, com uma
espécie de escusativa genérica para o exercício abusivo dos direitos, a qual é atingida por tão
freqüentes exceções que forçam a conclusão segundo a qual, in concreto, aquele sistema nunca
deixou de condicionar o exercício das faculdades jurídicas ao respeito pela norma abstrata de
convivência” (PEREIRA, 1993, p. 466).
73
As teorias que buscam explicar o abuso de direito estão classificadas em
três grupos:
80
“teorias subjetivas”, grupo ao qual pertencem as teorias da intenção,
da gravidade da culpa e da culpa específica; “teorias objetivas”, em que se incluem
as teorias do destino econômico, do fim social do direito e do motivo legítimo; e
“teorias subjetivo-objetivas”, que se caracterizam como teorias ecléticas que buscam
conciliar as subjetivas com as objetivas.
81
As teorias subjetivas encontram o fundamento para o abuso de direito no
elemento subjetivo, na intenção de prejudicar.
82
Segundo o critério intencional, “no
exercício de seus direitos, gozam os indivíduos de plena liberdade, contanto que não
se movam na exclusiva intenção de prejudicar a outrem” (LUNA, 1959, p. 67).
A teoria da má-fé baseia-se na “vontade nociva de causar prejuízo a
outrem”, segundo a qual “o abuso de direito pode ser concebido, quando verificada a
perversidade de quem praticou o ato, sem, contudo, ficar provada a intenção de
prejudicar, que se presume” (LUNA, 1959, p. 70).
80
A respeito da teoria do abuso de direito no sistema jurídico brasileiro é oportuna a colaboração de
Wandelli (2004, p. 456). Ao realizar uma análise da teoria do abuso de direito, o autor busca dentro
do sistema jurídico brasileiro, fundamentos para coibir atos de despedida de trabalhadores em
situações em que não há regra de estabilidade. De seu estudo, conclui o autor que “[...] no âmbito
do direito do trabalho a coibição da despedida abusiva, presente desde os primórdios da teoria do
abuso, evidencia a transição entre racionalidades que o abuso do direito expressa. Cabe ressaltar
que a coibição da despedida abusiva, como aqui entendida, não depende de alterar-se a
interpretação semântica atualmente dominante acerca do artigo 7
a
, l, da Constituição em conexão
com o artigo 10, l, do ADCT, nem o entendimento acerca da eficácia da Convenção n. 158 da OIT.
Ao contrário, embora sejam ambos criticáveis, tais entendimentos se situam no momento anterior
àquele em que se apresenta a questão da abusividade. Identificado o âmbito semântico da regra
permissiva da despedida, é a partir deste que se põe a possibilidade de configuração do abuso do
direito abstrato de despedir. Exibe-se aqui a diacronia entre racionalidades conviventes que o
abuso expressa.”
81
Segundo Luna (1959, p. 67), as teorias subjetivas “apegam-se, demasiadamente, ao passado,
restringindo, em excesso, o campo do ato abusivo” e as teorias objetivas “alargam-se com exagero,
e querem fazer de idéias políticas direito” e a “mistura das teorias subjetivas e objetivas,
encarregam-se de confundi-las e confundir-se.”
82
“É apreciável, na teoria da intenção, o fundamento ético que a anima e a coloca em posição de
relevo diante de doutrina materialistas, que, desprezando as fontes jurídicas romanas, vão buscar,
em legislações estranhas à cultura do Ocidente, a inspiração que não souberam encontrar no velho
direito romano, trabalhando pelos glosadores da mediedade e cientificamente investigado pela
ciência jurídica moderna” (LUNA, 1959, p. 72-73).
74
A teoria da gravidade da culpa concebe o abuso de direito quando existe a
culpa strictu sensu de certa gravidade. “A questão é puramente de grau, de
quantidade: por uma maior ou menor gravidade da culpa, o ato é abusivo ou
perfeitamente jurídico” (LUNA, 1959, p. 74).
Esse critério atribui ao Poder Judiciário a responsabilidade de determinar, no
caso concreto, a gravidade da conduta, e caso esta conduta não atinja a gravidade
considerada censurável para o sistema jurídico, será considerada um ato jurídico
lícito.
83
Para a teoria da culpa específica (a culpa por abuso de direito), esta se
distingue da culpa por ilícito porque “[...] o abuso de direito é um ato culposo, mas
não ilícito! Verdadeira concepção objetiva da ilicitude pelo avesso” (LUNA, 1959, p.
75).
As teorias objetivas afirmam a existência do ato abusivo independentemente
da culpa do autor, baseando-se em dois pontos divergentes principais em relação às
teorias subjetivas: indagar a intenção é confundir ética e direito e, se o abuso é um
ato ilícito, perderia a razão de ser.
84
A teoria do destino econômico funda-se no individualismo ou no socialismo
econômico, e teve em “Saleilles” o seu mais ilustre representante. Este afirma que o
“ato abusivo é um ato anormal, porque contraria a finalidade econômica e social do
direito, ato sem conteúdo jurídico, economicamente prejudicial e reprovado pela
83
“Se o titular de um direito, ao exercê-lo, causa, culposamente, dano a outrem, abusa de direito, seja
grave, ou seja, leve a sua culpa” (LUNA, 1959, p. 74).
84
“A primeira objeção é, filosoficamente, destituída de fundamento. Em primeiro lugar, porque o
direito sem a ética é arbítrio, força, prepotência, tudo, menos direito; em segundo lugar, porque é
tarefa do direito indagar a intenção, quando manifestada no ato. Se assim não fora, que seria do
direito punitivo, fundado no princípio da culpabilidade? Não seria direito, mas capítulo da ética
simplesmente. O abuso de direito, por ser um ato ilícito, não desaparece e deixa de existir. O seu
estudo, meticuloso e bem cuidado, descobre-nos uma interessante faceta do ilícito, mostrando-nos
a riqueza de matéria, contida nos atos ilícitos, e a multiplicidade de aplicação de que é suscetível
essa importante fonte das obrigações civis” (LUNA, 1959, p. 77-78).
75
consciência pública.” Essa teoria se aproxima da definição de interesses
juridicamente protegidos de Jhering, segundo a qual o importante é que esses
interesses sejam legítimos. “O prejuízo, que se causa a outrem, pelo exercício de um
direito em legítimo interesse fundado, não cria responsabilidade civil para o titular
desse direito” (LUNA, 1959, p. 80).
85
Josserand é o precursor da teoria do fim social do direito e do motivo
legítimo para explicar o ato abusivo, adotando um critério finalista, “partindo do
princípio de que o abuso de direito se exerce em conformidade com o direito da
pessoa e em contrariedade às regras sociais” (LUNA, 1959, p. 82).
Como sua teoria foi criticada pelo fato de ter-se traduzido em uma
verdadeira regra moral, que seria, no futuro, regra de direito
86
, Josserand procurou
revê-la propondo como critério o motivo legítimo.
Hamel propõe o critério do “uso normal do direito”. O abuso é caracterizado
pelo exercício anormal dos direitos subjetivos. “Mario Rotondi explica o abuso de
direito como fenômeno social,” considerando o “direito estático, cristalizado nas
normas jurídicas, e o direito dinâmico, emanado do complexo social. No primeiro,
domina o princípio da conservação; no segundo, governa o princípio da evolução”. O
abuso de direito seria um ato conforme o direito estático e contrário ao direito
dinâmico: “numa sociedade em que as idéias antigas, corporificadas nas normas,
predominam, não há falar de abuso de direito; nas sociedades, porém, em que as
idéias novas são acolhidas e se repelem as obsoletas, o ato abusivo considera-se
85
“Além de SALEILLES, explicaram o abuso de direito, pelo critério econômico, os juristas
PARDESSUS, SOURDAT, CHARMONT, GENY, BARTIN e BRÈTHE” (LUNA, 1959, p. 81).
86
“[...] como compreender o julgador o correto sentido da expressão fim social do direito? Se a lei não
diz, onde i-lo buscar? Na moral? Mas que moral? a cristã? a materialista? Na política?... mas que
política? a individualista? a socialista? O fim social do direito, para o juiz católico, é um; outro, para
o magistrado positivista, e bem outro, para o julgador socialista. Só um critério é possível: o técnico”
(LUNA, 1959, p. 86).
76
uma contrariedade ao direito, não importando o formalismo das leis” (LUNA, 1959, p.
90).
Da compreensão das teorias do abuso de direito, observe-se como estas se
relacionam com os dispositivos relativos ao ato ilícito e abuso de direito no Código
Civil de 2002.
87
Para tanto, primeiramente cumpre a análise quanto ao entendimento
da inclusão do abuso de direito no conceito de ato ilícito.
88
Entende-se que o abuso de direito, embora se aproxime da figura do ato
ilícito, na realidade “consiste em um ato jurídico de objeto lícito, mas cujo exercício
levado a efeito sem a devida regularidade acarreta um resultado que se considera
ilícito” (FRANÇA, 1970,p. 45). Portanto, o abuso é que terá como resultado um ato
ilícito e, como conseqüência, os efeitos do abuso de direito identificam-se com os do
ato ilícito.
89
Segundo Barros, J. (2006, p. 05), o que determina a diferença entre o abuso
de direito e ato ilícito é a natureza da violação a que eles se referem:
No ato ilícito a violação é observada quando o indivíduo afronta diretamente
um comando legal, levando-nos a crer que o aludido comando contém
previsão expressa da conduta praticada pelo indivíduo. Já no abuso, o
sujeito aparentemente estaria agindo no exercício de seu direito. Contudo,
na configuração de tal hipótese, o sujeito se encontra violando os valores
que justificam o reconhecimento desse direito pelo ordenamento jurídico.
87
O Código Civil de 2002 trata do ato ilícito na Parte Geral, Livro III, Título III, artigos 186, 187 e 188.
Em seu artigo 186, define ato ilícito e no artigo 187, o abuso de direito: “Artigo 186. Aquele que, por
ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem,
ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.”
88
“As teorias do abuso do direito, como se viu, desenvolvem-se na luta pela afirmação de uma
autonomia dogmática em relação à concepção tradicional de ato ilícito, num claro sintoma da
insuficiência do lícito e do ilícito compreendidos como entidades logicamente absolutas e
abstratamente consideradas” (WANDELLI, 2004, p. 290).
89
O abuso do direito só será ato ilícito se presentes os atributos da culpa, tal como previsto no artigo
186 do Código Civil: ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência. “O elemento subjetivo
é a reprovabilidade ou a consciência de que poderá causar algum mal, assumindo esse risco ou
deixando de prevê-lo quando devia”. (STOCO, 2000, p. 125).
77
Em ambas as possibilidades acima, o sujeito se encontra inserido no plano
da antijuridicidade, sendo que, quando pratica o ato ilícito, viola limites lógico-
formais; já na prática de um ato abusivo, viola os limites axiológico-materiais.
No abuso, não há desobediência a um dever, mas excesso no exercício de
direito, caracterizando abuso de direito. Para Wandelli (2004, p. 456), o abuso de
direito revela um sentido de antijuridicidade que “afeta o conceito de ato ilícito
tradicionalmente assumido no âmbito da dogmática jusprivatística. Inicialmente
lutando por sua autonomia dogmática em face do ato ilícito, é o abuso do direito,
que, de certa forma, agora subsume o ato ilícito. O abuso torna-se a regra.”
Os autores pátrios dividem-se entre as teorias objetivas e subjetivas do
abuso de direito quanto à necessidade ou não de culpa para ensejar a reparação ou
apenas a necessidade de comprovação do nexo causal entre a conduta e o dano.
90
Considera-se mais coerente o entendimento de que a culpa é prescindível
quando se trata da conduta abusiva. Wandelli (2004, p. 293) conclui ainda que,
“havendo dano, a obrigação de reparação tem, na culpa, apenas um requisito
possível, não necessário, podendo ser substituída pela violação abusiva.”
O entendimento do Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça
Federal (CEJ) é no sentido de que “a responsabilidade civil decorrente do abuso de
direito independe de culpa, e fundamenta-se somente no critério objetivo-finalístico”
(Enunciado 37 do CEJ).
91
90
Os autores Washington de Barros Monteiro, Carvalho Santos e Cunha Luna adotam a teoria
subjetiva. Contudo, Clóvis Beviláqua, Pedro Baptista Martins, Sílvio Rodrigues, Castro Filho, e Bittar
abraçam a teoria objetiva (STOCCO, 2002, p. 72).
91
Enunciados aprovados na Jornada de Direito Civil promovida pelo Centro de Estudos Judiciários do
Conselho da Justiça Federal, de 11 a 13 de setembro de 2002 (NEGRÃO; GOUVÊA, 2004, p. 78).
78
O artigo 187 do Código Civil apresenta como fatores de abusividade a
limitação do exercício dos direitos pelo fim econômico ou social do direito, pela boa-
fé ou pelos bons costumes. Ressalte-se a importância do mencionado artigo:
[..] embora a coibição do abuso do direito, por decorrer do próprio sentido
de igualdade perante o ordenamento jurídico, não dependa de previsão em
dispositivo legal específico, o artigo 187 do novo Código consiste em
importante apoio normativo de abertura no âmbito do exercício das
condutas juridicamente permitidas. As referências ao seu fim econômico ou
social, à boa-fé e aos bons costumes, porém, além de consistirem em novas
remissões sistemáticas, não esgotam as possibilidades de significação do
abuso no ordenamento jurídico brasileiro atual (WANDELLI, 2004, p. 456)
Não há no ato abusivo, como no ato ilícito, uma afronta direta a dispositivo
legal, mas a conduta que se baseia em uma norma permissiva que ultrapassa
limites, que são dados por princípios que regem o ordenamento jurídico e contêm
seus valores fundamentais. “A vida do Direito não se reduz a uma sucessão de fatos
desvinculados dos valores que lhes dão sentido e significado, de cuja correlação
dialética emerge a regula iuris (REALE, 2006, p. 02).
A idéia de fim econômico ou social
92
do direito, que parece ser mais
adequada ao sistema brasileiro, é a que concebe a “idéia de um ônus de destinação
legal de certos direitos específicos, como o de propriedade, presente no artigo 5º,
XXII, da Constituição” (WANDELLI, 2004, p. 295).
A limitação do exercício dos direitos pelos bons costumes faz-se baseada
em padrões morais, ao que não basta sejam constatados como costumes. “Devem
passar pelo teste crítico dos princípios positivados, para serem ‘bons’, ou seja, não
92
“[..] a noção de "abusividade", como aqui compreendida, prescindiria de previsão em dispositivo
legal específico, pois se trata de cobrar a realização do sentido da consideração imparcial de todas
as características possíveis da situação singular, à luz do ordenamento jurídico como um todo
íntegro, em um procedimento que considere normas não só enquanto regras, mas também
enquanto princípios. Fia-se, pois, na necessária igualdade de todos perante a lei (CF, artigo 5
e
),
violada quando se desconsideram, injustificadamen-te, outros dados potencialmente relevantes na
situação. A função social, de toda forma, pode ser relida como cláusula de abertura para a
integralidade do ordenamento, considerado como todo íntegro, sem desprezo à hierarquia das
normas e às condensações que naturalmente processam em torno de segmentos da vida social
especificamente tratados pelo direito” (WANDELLI, 2004, p. 299).
79
se trata de simples transposição de uma moralidade vigente em termos de direito
estatal imperativo, mas de submeter esses costumes aos critérios de avaliação
decorrentes do sistema normativo pluralista” (WANDELLI, 2004, p. 297).
O artigo 187 do Código Civil reporta-se, ainda, à limitação do exercício dos
direitos pela boa-fé objetiva.
93
Segundo Venosa (2004, p. 342), “[...] sob o prisma do
novo código, há três funções nítidas no conceito de boa-fé objetiva: função
interpretativa (artigo 112); função de controle dos limites do exercício de um direito
(artigo 186) e função de integração do negócio jurídico (artigo 421).”
O debate sobre a boa-fé no direito brasileiro levou a transformações na
racionalidade jurídica e a uma superação de questões antes vistas somente sob a
ótica formalista positivista. “É a boa-fé o cerne em torno do qual girou a alteração de
nossa Lei Civil [...], a boa-fé não constitui um imperativo ético abstrato, mas sim uma
norma que condiciona e legitima toda a experiência jurídica, desde a interpretação
dos mandamentos legais e das cláusulas contratuais até as suas últimas
conseqüências” (REALE, 2006, p. 02).
Para o Direito do Trabalho, embora reconhecida a aplicabilidade do princípio
da boa-fé, a ele não é dada a mesma projeção prática que recebe no Direito Civil,
sendo escassas suas referências jurisprudenciais na seara trabalhista. Quanto a sua
incidência nas relações trabalhistas destaca-se que:
93
“Na boa-fé subjetiva o manifestante de vontade crê que sua conduta é correia, tendo em vista o
grau de conhecimento que possui de um negócio. Para ele há um eslado de consciência ou aspecto
psicológico que deve ser considerado. A boa-fé objetiva, por outro lado, tem compreensão diversa.
O intérprete parte de um padrão de conduta comum, do homem médio, naquele caso concreto,
levando em consideração os aspectos sociais envolvidos. Desse modo, a boa-fé objetiva se traduz
de forma mais perceptível como uma regra de conduta, um dever de agir de acordo com
determinados padrões sociais estabelecidos e reconhecidos” (VENOSA, 2004, p. 332). “[...] a boa-
fé apresenta dupla faceta, a objetiva e a subjetiva. Esta última – vigorante, v.g., em matéria de
direitos reais e casamento putativo – corresponde, fundamentalmente, a uma atitude psicológica,
isto é, uma decisão da vontade, denotando o convencimento individual da parte de obrar em
conformidade com o direito. Já a boa-fé objetiva apresenta-se como uma exigência de lealdade,
modelo objetivo de conduta, arquétipo social pelo qual impõe o poder-dever que cada pessoa ajuste
a própria conduta a esse arquétipo, obrando como obraria uma pessoa honesta, proba e leal”
(REALE, 2006, p. 02).
80
[...] este princípio de boa-fé tem no Direito do Trabalho um sentido muito
especial, em virtude do componente pessoal que existe neste ramo jurídico.
O contrato de trabalho não cria somente direitos e obrigações de ordem
exclusivamente patrimonial, mas também pessoal. Cria, de outro lado, uma
relação estável e continuada, na qual se exige a confiança recíproca em
múltiplos planos, em direções opostas e, sobretudo, por um período
prolongado de tempo. (RODRIGUEZ, 1983, p. 424).
O contrato de trabalho abrange relações interpessoais que devem pautar-se
no princípio da boa-fé, para a realização da garantia dos direitos fundamentais do
trabalhador.
O titular de um direito possui a prerrogativa legal de usufruir dele desde que
não cause dano, prejudique, atinja direitos alheios. Para o Direito do Trabalho, o
empregador é detentor do poder de direção
94
e as leis trabalhistas lhe garantem
“intervir na esfera jurídica do empregado, dele dependente, para dirigir, comandar”
(ROMITA, 1983, p. 32).
Este poder exercido pelo empregador é, portanto, um poder jurídico voltado
para as atividades da empresa ou do empreendimento e sujeito aos limites impostos
pelo próprio sistema jurídico. Sendo direito do empregador, este não pode exceder-
se aos limites a ele impostos sob pena de incorrer na figura do “abuso de direito.”
Com relação à conduta abusiva do direito, apresentam-se duas sanções. A
ordem jurídica não reconhece o direito àquele que o exerceu abusivamente, tratando
a conduta como ato ilícito. Além disso, o titular que exerceu abusivamente o direito
terá que indenizar o prejudicado pelas perdas e danos, fundado em ato ilícito.
94
Segundo Goulart (2006, p. 149), “no Direito do Trabalho haverá excesso de poder quando o órgão
disciplinar punitivo da empresa aplicar uma penalidade não disciplinar, ou imprópria à natureza da
instituição, ou impossível legal ou estatutariamente de ser usada (ex: detenção física do faltoso) ou
quando incidir uma sanção disciplinar desproporcional, por inadequada (ex.: a despedida em vez da
suspensão) ou por demais intensiva (ex.: uma suspensão exagerada). Também haverá excesso de
poder quando, pelo rigoroso exercício, abusar de seu poder punitivo (ex.: repetição descabida de
repreensões, suspensões).”
81
No ambiente de trabalho, o empregado, embora subordinado, está protegido
legalmente contra abusos, pois “[...] não deve o empregador tratá-lo com rigor
excessivo, envolvendo abuso de direito de comandar. Nestes casos, pode o
empregado negar-se a obedecer às ordens ilícitas, defesas por lei ou contrárias ao
contrato, no uso de um direito seu, legítimo, o chamado ius resistentiae, sem que
isso importe em ato de indisciplina ou de insubordinação” (MORAES FILHO, 1960,
p. 385).
A legalização do poder do empregador não deixou de impor-lhe limites que,
uma vez ultrapassados, transformarão o direito de comando em “abuso de direito”
ensejando todas as conseqüências jurídicas próprias deste instituto.
No que se refere ao poder disciplinar do empregador, Alkimin (2005, p. 57)
ressalta que este “[...] deve ser exercido com intuito funcional, a fim de satisfazer às
exigências da organização do trabalho, e com o respeito devido à dignidade do
empregado e de seus direitos patrimoniais, repelida qualquer forma de abuso de
direito.”
Através de muitas decisões proferidas nos Tribunais, detectou-se que o
poder diretivo do empregador, exercido de forma abusiva, origina ofensas aos
empregados ensejadoras de reparação.
Ferrari e Martins (2006, p. 403) apontam que “[...] uma dessas
arbitrariedades apontadas pela jurisprudência é, por exemplo, a do temor reverencial
infundido ao empregado pelo empregador para cobrar na Justiça do Trabalho
alguma violação de direito”. Assim também ocorre com as revistas de empregados
durante a jornada de trabalho ou na saída do estabelecimento.
95
95
“A revista, como forma de controle do patrimônio do empregador, mormente quando se trata de
empresa que atua no ramo de transporte com guarda de dinheiro, como é o caso dos autos, é
admitida, não só pela doutrina, mas também pela jurisprudência. O simples fato de se realizar
revista encontra-se nos Lea do poder diretivo do empregador, não sendo tal prática motivo de
82
As revistas têm sido aceitas como parte do poder do empregador para o
controle de seu patrimônio, mas igualmente devem ter como limite a “[...] dignidade
do empregado, sua imagem e seu conceito junto aos demais empregados, seus
colegas”, realizadas com prudência, e “[...] devem ter um cunho geral (do
estabelecimento ou determinados setores de trabalho), de modo que se evitem
discricionariedade ou perseguições” (FERRARI; MARTINS, 2006, p. 403).
As relações de trabalho devem também ser marcadas pela urbanidade
96
e
bom relacionamento entre empregados e entre estes e os empregadores. “É a
educação no bom trato, de maneira a não humilhá-los perante colegas ou terceiros”
(FERRARI; MARTINS, 2006, p. 403).
Muitas condutas de assédio moral revelam-se como práticas em que o poder
do empregador transborda para a abusividade e a teoria do abuso de direito parece
ser estratégia jurídica coerente para coibir as condutas abusivas que venham a
caracterizar assédio moral no ambiente de trabalho.
constrangimento para os seus empregados” (TRT 3
a
Reg. RO 18.822/00 — Ac. 4
a
T. — Rei. Juiz
Júlio Bernardo do Carmo. DJMG 16.12.00, p. 25).
96
“O poder diretivo do empregador deve ser respeitado, contudo, sua conduta não pode ser lesiva ao
empregado já que a moralidade é valor protegido pelo ordenamento jurídico. O respeito e a
dignidade do trabalhador devem ser observados em qualquer situação. No caso em apreço,
restaram comprovadas as humilhações sofridas, o excessivo rigor, a maneira como era chamada a
atenção dos empregados na presença de colegas de trabalho e de clientes. A superior hierárquica
era agressiva com os empregados, dirigindo-se aos gritos aos mesmos e sempre de "mau humor",
utilizando-se de adjetivos ofensivos à sua honra e à sua moral, tais como "incapaz" e "burra" e
outras ofensas de ordem particular. Indenização por danos morais que deve ser mantida” (TRT 9
a
Reg. RO 14266-2001-008-09-00-0 — Ac. 4
a
T. 24098/05 — Rei. Juiz Fabrício Nicolau dos Santos
Nogueira. DJPR 23.9.05, p. 461).
83
CAPÍTULO 3
ASSÉDIO MORAL NA RELAÇÃO DE EMPREGO
Para um executivo, o que pesa é a possibilidade de desenvolvimento futuro
e o apoio de quem está em cima. Você quebra um profissional arrebentando
com esses dois fatores: as perspectivas e o reconhecimento. A tática é
terrível. Meu chefe parou de me cumprimentar, me deixava esperando por
horas a fio, me fazia sentir invisível. Eu não tinha mais as informações de
que precisava para trabalhar. Numa situação dessas, os que estão a sua
volta começam a perceber o que está acontecendo e rapidamente todo
mundo se reposiciona. Você caiu em desgraça. Acabei com lesão no rim
esquerdo por causa de hipertensão. Em seis meses, tive três entradas na
emergência por picos de pressão e engordei quase 10 quilos. Hoje tomo
uma medicação fortíssima contra estresse e depressão. Sei que fiz um
trabalho excepcional, tanto que, quando saí, esse mesmo chefe se
apropriou de todas as minhas idéias. A intenção deliberada dele era de me
humilhar. Você se prepara para competir com seu colega do lado, mas não
com o seu chefe. O triste é que, na atual crise de emprego, a gente acaba
engolindo esses sapos por mais tempo. Para cada um que sai, há cinqüenta
esperando.
(Revista Veja, Matéria: “Cale a Boca, Incompetente!”, 31. out. 2001)
3.1 CONCEITO E ELEMENTOS CARACTERIZADORES
Com as mudanças tecnológicas, a reestruturação produtiva e o advento do
ideário neoliberal, o ambiente de trabalho se mostrou mais propício para práticas
abusivas do poder legal de comando do empregador, muitas vezes de maneira
mascarada sob a forma de modernização da empresa, necessidade de qualificação
profissional e adaptação da produção às necessidades do mercado.
Os abusos, assédios e humilhações cometidos no ambiente de trabalho
interferem de forma negativa nas relações no trabalho e na saúde física e mental do
trabalhador.
Essas condutas ensejam o assédio moral, violando direitos da
personalidade com conseqüências para o comportamento da vítima, sua auto-estima
e prejuízos para toda a sociedade.
84
A atual conjuntura econômica e os modelos de gestão que impõem a
necessidade constante de qualificação e superação de metas como critério para
seleção e permanência no emprego fazem com que os trabalhadores tornem-se
mais inseguros quanto à permanência em seus postos de trabalho.
O estímulo à competição para que os empregados, trabalhando cada vez
mais, tentem superar os colegas de trabalho, elimina as relações de amizade, de
forma que antigos “colegas de trabalho” passem a competidores por uma colocação
no mercado.
97
Esses fatores são estimulantes para práticas de assédio e podem
caracterizar um ambiente de trabalho de conflitos e agressões, em que se busca a
eliminação do concorrente indesejado por um colega ou do empregado que já não
se enquadra nos padrões da empresa.
O ambiente de trabalho, que é composto por um conjunto de pessoas
heterogêneas, com diferentes valores, nível socioeconômico, vida familiar e
subordinação do empregado ao empregador ou seu superior hierárquico, mostra-se
propício para diferentes situações de assédio.
98
Tais razões tornam relevante o exame das circunstâncias que envolvem a
prática do assédio moral na relação de emprego, que, não raro, deixam de ser
notadas e são até mesmo desconhecidas pelo próprio assediado. Inicialmente, é
comum que este negue o fato de estar sendo vítima de uma situação de assédio,
97
“Atualmente, a rotina competitiva da atividade econômica e a reestruturação produtiva impulsionam
os empresários a perseguirem melhores resultados em seus empreendimentos. Em virtude das
mudanças rápidas do mercado e das exigências permanentes da empresa, principalmente em
virtude da globalização, resta ao trabalhador cumprir suas tarefas sem questionar, suportando a
angústia, a depressão e a ansiedade, para conservar o emprego” (HEMBECKER, 2004, p. 13).
98
“O meio ambiente do trabalho é o local onde o homem passa a maior parte de sua vida, e onde
desenvolve seus atributos pessoais e profissionais, contribuindo com a produção, distribuição e
circulação de riquezas, podendo ser conceituado como sendo o conjunto de bens materiais e
materiais pertencentes à atividade empreendedora, de fim lucrativo ou não, abrangendo a força do
trabalho humano, as condições de trabalho, enfim a organização da produção do trabalho como um
todo”. (ALKIMIN, 2005, p. 26).
85
pois tem receio de prejudicar a sua atuação ou de criar uma situação ofensiva,
hostil, de intimidação ou abuso no ambiente em que é assediado. Somente quando
já foi excluído do ambiente de trabalho é que a vítima irá procurar ajuda, geralmente
através do Poder Judiciário.
O assédio moral é um fenômeno que pode ocorrer em diferentes ambientes
– família, escolas, empresas, órgãos públicos – mas esta análise deter-se-á ao
estudo do assédio moral no ambiente de trabalho, enfatizando os aspectos jurídicos
que envolvem o tema.
Não existe no ordenamento jurídico brasileiro previsão legal específica para
a penalização do assédio moral, o que torna necessária a visualização de conceitos
doutrinários para a delimitação das condutas e elementos que o caracterizam.
A palavra assédio vem do latim “obsidere”, que significa pôr-se adiante,
sitiar, atacar. Na língua portuguesa, assédio significa insistência inoportuna, junto de
alguém, com perguntas, propostas, pretensões ou outra forma de abordagem
forçada (FERREIRA, A., 1995, p. 66).
O assédio moral constitui-se fenômeno que consiste na exposição dos
trabalhadores e trabalhadoras (quando o assédio ocorre no ambiente de trabalho) a
situações humilhantes e constrangedoras, repetitivas e prolongadas durante a
jornada de trabalho e no exercício de suas funções. Ele é mais comum em relações
hierárquicas autoritárias e assimétricas, em que predominam condutas negativas,
relações desumanas de longa duração, de um ou mais chefes dirigida a um ou mais
subordinados, atitudes essas que desestabilizam a relação da vítima com o
ambiente de trabalho e a organização, forçando-a a desistir do emprego.
O fenômeno em estudo é mencionado por muitos autores por diferentes
86
nomenclaturas
99
: assédio moral, psicoterror, terror psicológico, “mobbing”, “bulling”,
“harassment”, “whistleblowers” e “ijime” são alguns dos termos utilizados.
“Mobbing” (usado na Alemanha, Dinamarca, Estados Unidos, Finlândia,
Itália, Suécia e Suíça), termo utilizado principalmente nos anos 80, consiste em
manobras hostis, freqüentes e repetidas no local de trabalho, visando
sistematicamente a mesma pessoa. O termo, empregado pela primeira vez pelo
etnólogo Konrad Lorenz, vem do verbo inglês “to mob” (maltratar, atacar, perseguir,
sitiar) e “indica literalmente o tipo de agressão praticada por algum animal, que,
circundando ameaçadoramente outro membro do grupo, provoca a sua fuga deste
pelo pavor de ser atacado e morto” (GUEDES, 2003a, p.33).
Leymann (2005) afirma que o “mobbing”, forma particularmente grave de
estresse psicossocial, provém de um conflito que degenera, identificando como
doença profissional enfermidades de natureza psicossomáticas dele derivadas.
Já a palavra “bulling” (usada na Inglaterra e Canadá) origina-se do verbo
inglês “to bully, que significa trato desumano e grosseiro para com os mais fracos,
aproximando-se do tirânico.
100
Por outro lado, “harassment” (usado nos Estados Unidos) pressupõe
ataques repetitivos e voluntários de uma pessoa a outra, dando atenção aos efeitos
nocivos à saúde.
99
“[...] o assédio moral corresponde a um fenômeno típico da sociedade atual, não se restringindo a
um local específico, mas, antes, constituindo um problema de amplitude global. Apesar disso, as
forma como ele se manifesta varia de local para local, o que acaba por dificultar sua definição e
estabelecer uma só terminologia” (FERREIRA, 2004, p. 41).
100
Inicialmente tratou-se de termo que não se relacionava com o trabalho, mas com humilhações,
ameaças que certas crianças ou grupos de crianças infligiam a outras. Mais tarde, estendeu-se às
agressões observadas no exército, nas atividades esportivas, na família, e em relação a pessoas de
idade. Sua gravidade não decorre do ato propriamente dito, mas do efeito futuro do medo sobre a
vítima que pode ter conseqüências trágicas no psicológico dos jovens. É um termo mais amplo que
o “mobbing”. “Vai de chacotas e isolamento até condutas abusivas de conotação sexual ou
agressões físicas. Refere-se mais a ofensas ou violência individual do que a violência
organizacional” (HIRIGOYEN, 2002b, 79-80).
87
Por sua vez, “Ijime” é o termo japonês para definir assédio moral que inclui,
além das humilhações e ofensas, as pressões de um grupo com o objetivo de formar
os jovens recém-contratados ou de reprimir os perturbadores (HIRIGOYEN, 2002b,
p. 83).
Enfim, “Whistleblowers” (usado na África do Sul, Austrália, Canadá, EUA,
Hong Kong, Inglaterra, Nova Zelândia) significa “o que faz soar uma campainha ou
alarme e, por esse motivo, se torna alvo de represálias”. É um tipo específico de
assédio moral destinado a silenciar quem não obedece às regras do jogo
(HIRIGOYEN, 2002b, p. 81).
A escolha do termo “moral” para caracterizar o fenômeno é defendida por
Hirigoyen (2002b, p.17):
O fato de o conceito de assédio moral ter sido tão significativo para um
número tão grande de pessoas em minha obra anterior está provavelmente
ligado à escolha do termo moral. Este mesmo conceito, qualificado de
psicológico, significaria que se tratava unicamente de um estudo sobre
mecanismos psicológicos, ou seja, para especialistas. A escolha do termo
moral implicou uma tomada de posição. Trata-se efetivamente de bem e de
mal, do que se faz e do que não faz, e do que é considerável aceitável ou
não em nossa sociedade. Não é possível estudar esse fenômeno sem se
levar em conta a perspectiva ética ou moral, portanto, o que sobra para as
vítimas do assédio moral é o sentimento de terem sido maltratadas,
desprezadas, humilhadas, rejeitadas [...]
No Brasil, os autores têm preferido utilizar o termo “assédio moral”, que se
tornou o mais utilizado.
101
Guedes (2003a, p. 35) apresenta sua conceituação do fenômeno
considerando que “mobbing, assédio moral ou terror psicológico é uma perseguição
continuada, cruel, humilhante, desencadeada, normalmente, por um sujeito
perverso, destinada a afastar a vítima do trabalho com graves danos para a sua
saúde física e mental”.
101
Ilustrativamente, Alice Monteiro de Barros, Maurício Godinho Delgado, Maria Aparecida Alkimin,
Hádassa Dolores Bonilha, utilizam o termo assédio moral.
88
Leymann (2005), um dos pioneiros a estudar o tema, afirma que “[...] o
conceito de mobbing define-se, assim, pelo encadeamento, ao longo de um período
de tempo, de planos ou ações hostis consumadas, expressas ou manifestadas por
uma ou várias pessoas até chegarem a uma terceira: o objetivo.” Para ele, o assédio
é a situação em que uma pessoa ou um grupo de pessoas exerce uma violência
psicológica extrema, de forma sistemática e freqüente, em média uma vez por
semana, e durante um tempo prolongado, segundo o autor, em torno de seis meses,
sobre uma outra pessoa sobre a qual mantém uma relação assimétrica de poder no
local de trabalho, com o objetivo de destruir as redes de comunicação da vítima,
destruir a sua reputação, perturbar o exercício do seu trabalho e conseguir
finalmente que essa pessoa deixe o emprego.
Critica-se o conceito acima, já que o assédio moral corresponde a um
fenômeno que ocorre não somente entre chefes e subordinados, mas entre colegas
de trabalho, com vários objetivos, entre eles o de provocar a demissão da vítima, o
seu pedido de aposentadoria precoce, licença para tratamento de saúde ou, então,
uma transferência (BARROS, A. 2006, p. 887).
Para Hirigoyen (2002a, p. 65), assédio moral é “toda e qualquer conduta
abusiva manifestando-se sobretudo por comportamentos, palavras, atos, gestos,
escritos que possam trazer dano à personalidade, à dignidade ou à integridade física
ou psíquica de uma pessoa, pôr em perigo seu emprego ou degradar o ambiente de
trabalho.”
A análise das condutas que podem caracterizar o assédio moral e que o
distingue do assédio sexual, por exemplo, demonstra que se trata de um fenômeno
de degeneração do poder nas interações sociais, em que o agressor tenta se
sobrepor à vítima.
89
Pamplona Filho (2006, p. 1079) define assédio moral como “uma conduta
abusiva, de natureza psicológica, que atenta contra a dignidade psíquica do
indivíduo, de forma reiterada, tendo por efeito a exclusão desse individuo do
ambiente e do convívio social.” O autor destaca que a generalidade do seu conceito
deve-se pelo fato de o assédio moral não ser exclusividade das relações de
trabalho, embora a subordinação jurídica e a hipossuficiência do trabalhador o
tornem mais “dramático”.
Atualmente, tramitam no Congresso Nacional alguns projetos de lei com o
objetivo de alterar a CLT e o Código Penal com a introdução de artigos que definem
e punem o assédio moral. O objetivo dos projetos é acima de tudo caracterizar o
“assédio moral”, determinando quando uma ação no ambiente de trabalho ganha
esses contornos.
O projeto de lei n. 4.742/2001 introduz o artigo 146-A no Código Penal
brasileiro, com o objetivo de punir o assédio moral na administração pública e esfera
privada. Porém, é extremamente genérico, pois considera assédio moral
“desqualificar reiteradamente, por meio de palavras, gestos ou atitudes, a auto-
estima, a segurança ou a imagem do servidor público ou empregado em razão de
vínculo hierárquico ou laboral” (BRASIL, Projeto de Lei n. 4.742, 2001).
102
Os demais projetos também incorrem em outras falhas. Os projetos, de
maneira geral, deixam de prever punição para o chamado assédio horizontal, aquele
que ocorre entre colegas em igual nível hierárquico na empresa e o vertical
ascendente, quando subordinados assediam superiores.
102
Quais palavras, gestos, são capazes de desqualificar a auto-estima, a segurança e a imagem de
alguém? “Reiteradamente”: quantas vezes são necessárias que ocorra uma agressão para ser
considerada reiterada?
90
O projeto de lei n. 4.960/2001 insere no Código Penal o artigo 149-A e, em
seu § 1º, tipifica a conduta daquele que “ignora” ou “exclui” alguém sem dirigir-lhe a
palavra diretamente. Veja-se mais uma vez o risco em se aprovar legislação penal
tão lacunosa e as inúmeras interpretações que estas podem suscitar (BRASIL,
Projeto de Lei n. 4.960, 2001).
O Projeto de Lei n. 2369, de 2003, do deputado Mauro Passos, afirma que o
assédio moral “consiste no constrangimento do trabalhador por seus superiores
hierárquicos ou colegas, através de atos repetitivos, tendo como objetivo, deliberado
ou não, ou como efeito, a degradação das relações de trabalho e que: I – atente
contra sua dignidade; II – afete sua higidez física ou mental, ou III – comprometa sua
carreira profissional.”
Acerca dessas considerações, pode-se dizer que o assédio moral se
caracteriza como toda e qualquer conduta abusiva, de natureza psicológica, que
atente contra a dignidade psíquica do indivíduo, de forma repetitiva e prolongada,
que possa causar danos à integridade física ou psíquica de uma pessoa, buscando
a exclusão da vítima do ambiente social.
Da definição acima, se extraem os elementos que irão caracterizar o assédio
moral como: a) conduta abusiva; b) natureza psicológica que atente contra a
dignidade psíquica do indivíduo; c) reiteração de conduta; d) intenção de excluir a
vítima.
O primeiro elemento a caracterizar o assédio moral, portanto, é a
abusividade da conduta, que, na concepção jurídica, corresponde àquela já
verificada e prevista no artigo 187 do Código Civil. Muitas situações em que se
excede no poder diretivo podem ser consideradas assédio moral.
103
103
“A concepção de conduta abusiva aqui utilizada se refere ao abuso de direito como ato ilícito, na
forma propugnada pelo artigo 187 do vigente Código Civil brasileiro. Isso porque o convívio humano
91
Comete assédio moral o empregador que sobrecarrega o empregado com
metas inatingíveis, que o submete a “treinamentos” com situações humilhantes. Ao
ultrapassar os limites do seu direito de dirigir a atividade obreira, estará incorrendo
em uma conduta de assédio.
Nesse sentido, Lippmann (2004, p. 37) afirma que o assédio moral se trata:
[...] do abuso de direito no uso do poder disciplinar do empregador, que
deixa de ser utilizado com a finalidade de incrementar a atividade produtiva,
para servir como instrumento de revanche, intimidação e discriminação. É o
controle desproporcional, ou inadequado, exercido com rigor excessivo, que
atenta contra os direitos de personalidade do trabalhador e que por si já é
fato gerador de dano moral.
A fixação de metas ou a submissão a treinamentos por si só não é uma
conduta de assédio. O que irá desvirtuar tais situações em assédio é justamente o
excesso, o abuso do direito, quando se ultrapassam os limites.
Outro elemento a ser considerado é a natureza psicológica do atentado à
dignidade psíquica do indivíduo. Aqui se distinguirá o assédio moral de outras
situações que ultrapassem a ofensa psíquica, pois “[...] quando a conduta afeta
também aspectos corpóreos do ser humano, pode-se verificar a ocorrência de algum
outro tipo de ato ilícito, qual seja, a agressão física ou o esbulho patrimonial, entre
outros” (PAMPLONA FILHO, 2006, p. 1081).
Aqui reside uma das características mais perversas dessa forma de assédio,
pois atinge a “alma” do trabalhador.
104
Segundo Silva (2002, p. 238-239), a lesão a
enseja o estabelecimento de laços de amizade e camaradagem, em que brincadeiras podem ser
feitas de forma livre. Todavia, quando tais gracejos extrapolam os limites do aceitável, adentra-se
ao campo do abuso de direito, que deve ser duramente reprimido, como ato ilícito que efetivamente
é” (PAMPLONA FILHO, 2006, p. 1081).
104
Assédio moral — Caracterização — Pressupostos objetivos — Desvio de finalidade do instituto. O
dano moral que impõe o dever de indenizar deve-se ancorar em pressupostos objetivos, causados
pela conduta do agente agressor, expondo o ofendido a situações humilhantes e vexatórias,
perante terceiros, maculando diretamente sua honra e imagem. O juiz, condutor do processo, no
momento da formação de sua convicção, deve imprimir lente forte na leitura do contexto probatório,
visando sobrepor-se aos limites subjetivos de ‘pesar íntimo’ do empregado, que muitas vezes tem
origem nas causas e motivações que originaram o rompimento do pacto laborai, sob pena de se
92
sua dignidade implicará prejuízos à sua personalidade, afetando o “modo como o
indivíduo está na sociedade”, podendo transformar a vítima em uma pessoa
dependente, insegura e sem perspectivas:
A lesão material, a lesão ao ter, pode-se reconstruir, porém a lesão ao ser,
deixa marcas que podem ser indeléveis, atingindo a liberdade, o querer, o
atuar intelectual e, portanto, desnaturando a identidade da pessoa e sua
respectiva contribuição à sociedade. Reconstruir um homem lesado
materialmente, reportar às condições em que anteriormente estava, será
possível; poderá continuar desenvolvendo suas atividades na sociedade,
mantendo-se o desenvolvimento tanto dele mesmo quanto de sua família e
do ambiente social para o qual contribuía. Já quando se trata de reconstruir
um homem lesado em seu ser, em sua dignidade, em seu pensar querer ou
sentir, não é simples pois sua vontade, seu intelecto e seus sentimentos e
sua ‘unidade existencial’ podem ter ficado tão comprometidos, que o
impeçam de dirigir sua vontade e suas forças na sua própria reconstrução.
Trata-se de uma forma de dano que atinge a integridade existencial do ser
humano. Os danos localizam-se no território do emocional, no território da
identidade, no território do desenvolvimento da personalidade e da realização do
projeto de vida.
Possivelmente, as conseqüências destes danos irão além, podendo ter
como resultado, a incapacidade para o trabalho, conforme Fiorelli e Malhadas Júnior
(2006, p. 230) “enquanto as máquinas e procedimentos do trabalho mecânico
amputavam dedos, mãos e até braços, os processos do trabalho de altíssima
eficiência, associados às condições de vida – físicas e psíquicas – dos indivíduos
promovem conflitos emocionais capazes de desencadear transtornos de ordem
somática, aparentemente sem qualquer vínculo de causalidade.”
incorrer na banalização do instituto. Inúmeras são as demandas que tramitam neste Foro Laborai,
objetivando o pagamento de indenizações por danos morais, fulcrando-se em ‘sentimentos
subjetivos’ que desvirtuam a finalidade da indenização compensatória, transformando o Judiciário
Trabalhista em ‘roletas da sorte’ (TRT 3
a
Reg. RO 00415-2004-114-03-00-0 — Ac. 6
a
T. — Rel
a
Juíza Maria Cristina Diniz Caixeta. DJMG 16.6.05, p. 9).
93
Assim, descabe falar em necessidade de aferição de efetivo dano
psíquico
105
. Para Milmaine (1995, p. 74), o dano psíquico se configura pela alteração
ou modificação patológica do aparelho psíquico, como conseqüência de trauma que
transborda toda a possibilidade de elaboração verbal ou simbólica.
Nem toda conduta de assédio é suscetível de causar lesão à estrutura
psíquica de uma pessoa, porém, isso decorre principalmente da diferente
capacidade de resistência das potenciais vítimas. Quanto ao dano psíquico,
observa-se que:
[...] supõe sofrimento subjetivo que não necessariamente se expressa por
meio de sintomas ou de qualquer outra alteração psicopatológica. A dor
pode permanecer na esfera subjetiva, sem ultrapassar o plano simbólico.
Pode suceder, deste modo, que o padecimento espiritual seja íntimo, e não
se possam detectar modificações psicopatológicas que tenham entidade
clínica. Nada se pode dizer da medida da dor, a não ser que a pessoa
projete escalas morais convencionais, abertas a todos os extravios da
ideologia, do imaginário social, cultural ou religioso (MILMAINE, 1995, p.
75).
O fato de não ser possível objetivar o dano através de exames clínicos fará
com que este seja submetido aos critérios de quem julga:
Sendo o assédio moral a conduta lesiva, o dano psíquico-emocional deve
ser entendido como a conseqüência natural da violação aos direitos da
personalidade da vítima [...] De fato, a doença psíquico-emocional, como
patologia, pode advir do assédio, mas não necessariamente ocorrerá, nem
é elemento indispensável, pois o que é relevante, na caracterização do
mobbing, é a violação do direito da personalidade, cuja materialização ou
prova dependerá do caso concreto (PAMPLONA FILHO, 2006, p. 1082).
Parte-se do pressuposto de que não há como medir o trauma e o grau de
sofrimento da vítima. “O sofrimento é indissociável da integridade existencial
humana e, como tal, pode configurar dano moral o evento que o desencadeie [...]
105
Na verdade, foi forjando o princípio do respeito à incolumidade física e mental que se reconheceu
a existência de ofensas à integridade psíquica como lesões à liberdade moral da pessoa. Tais
danos poderão atingir temporária ou definitivamente a pessoa, incidir em parcela ou na totalidade
do espectro de sua vida: no seu trabalho, nas relações sociais e afetivas, no seu convívio familiar
etc (SILVA, 2002, p. 207).
94
Não importa saber se o que se sofre no plano fático tem jurídica e cientificamente a
designação de psíquico ou biológico à saúde, seja como for o espaço fático e
normativo se identificam na lesão/proteção da dignidade humana” (SILVA, 2002, p.
208- 211).
O que não se pode aceitar é que alguém que venha ser vítima de conduta
que se enquadre no conceito de assédio e demonstre resistência ao intento do
assediador deixe de ser indenizado ou que o assediador não seja penalizado, pois a
reprovabilidade da conduta assediante não irá desaparecer.
106
Quanto à caracterização do assédio moral, cumpre ainda observar que esta
se dá através da prática de condutas repetitivas e prolongadas, de conteúdo
ofensivo ou humilhante. “Um ato isolado geralmente não tem o condão de
caracterizar, doutrinariamente, tal doença social. [...] Isto não implica, por certo, que
o dano decorrente de único ato ofensivo não venha a ser reparado. O que se quer
dizer é que, em síntese, tal conduta danosa não deve ser tida como assédio moral”
(PAMPLONA FILHO, 2006, p. 1081).
O assédio moral “não se confunde com outros conflitos, que são
esporádicos, nem mesmo com más condições de trabalho, pois pressupõe o
comportamento (ação ou omissão) por um período prolongado, premeditado, que
desestabiliza psicologicamente a vítima” (BARROS, A. 2006, p. 887).
Discussões eventuais não caracterizam assédio moral, mas o
comportamento agressivo e a falta de urbanidade no trato com determinado
106
Já para Nascimento (2004, p. 922) “a configuração do assédio moral depende de prévia
constatação da existência do dano, no caso, a doença psíquico-emocional. Para tanto, é necessária
a perícia feita por psiquiatra ou outro especialista da área para que, por meio de um laudo técnico,
informe o magistrado, que não poderia chegar a tal conclusão sem uma opinião profissional, sobre
a existência desse dano, inclusive fazendo a aferição do nexo causal”.
95
empregado na tentativa de que este deixe o emprego, por exemplo, é característico
do assédio moral.
107
Guedes (2003a, p. 32) faz uma interessante observação ao afirmar que o
assédio moral ultrapassa a violação da intimidade, pelo fato de aquele se
caracterizar como perseguição deliberada contra a vítima:
Enquanto a violação da intimidade decorre do uso abusivo do poder diretivo
do empregador, muitas vezes exagerando no uso de certas práticas
voltadas para a proteção do patrimônio da empresa, o assédio moral, na
realidade, decorre da atitude deliberada de um perverso cujo objetivo é
destruir a vítima e afastá-la do mundo do trabalho.
Também o elemento anímico, no assédio moral, não pode ser desprezado,
já que a conduta abusiva deve ter por finalidade a exclusão da vítima do ambiente.
“Ressalte-se que essa finalidade pode ser implícita ou explícita, pois, em verdade,
se a manifestação é expressa no sentido de afastar a vítima do ambiente social,
nenhuma dificuldade se tem na verificação da ocorrência do assédio moral”
(PAMPLONA FILHO, 2006, p. 1081).
A dificuldade nesse aspecto resulta no fato de que nem sempre a intenção
de exclusão é facilmente visualizada e tal finalidade somente poderá ser extraída
dos fatos postos em juízo.
107
“O assédio moral decorre de tortura psicológica atual e continuada consubstanciada no terror de
ordem pessoal, moral e psicológico, praticado contra o empregado, no âmbito da empresa,
podendo ser exercitado pelo superior hierárquico, por grupo de empregados do mesmo nível e
pelos subordinados contra o chefe, isto é, pode ocorrer no sentido vertical, horizontal e ascendente,
tem como fito tornar insuportável o ambiente de trabalho, obrigando-o a tomar a iniciativa, por
qualquer meio, do desfazimento do contrato de trabalho. O "mobbing" se caracteriza pela prática
atual e freqüente de atos de violência contra a pessoa do empregado, no qual participam,
necessariamente, o ofensor, o ofendido e expectadores (grupo de empregados) uma vez que tem
por objetivo humilhá-lo, constrangê-lo perante os demais colegas de trabalho. Marie-France
Hirigoyen define o psicoterror como sendo "toda e qualquer conduta abusiva manifestando-se
sobretudo por comportamentos, palavras, atos, gestos, escritos que possam trazer dano à
personalidade, à dignidade ou à integridade física ou psíquica de uma pessoa, pôr em perigo sem
emprego ou degradar o ambiente de trabalho" (in assédio moral a violência perversa do cotidiano).
Tratamento grosseiro, autoritário, de caráter impessoal e descontinuado, em período inferior a três
meses, hipótese sub judice, não autoriza condenação em danos morais lastreado em terror
psicológico. (TRT 6ª R. – Proc. 00067-2003-002-06-00-5 – 1ª T. – Rel. Juiz Valdir José Silva De
Carvalho – DOEPE 30.10.2003) (sem grifo no original).
96
Pamplona Filho (2006, p. 1081) observa que há situações em que a intenção
declarada ao público é diametralmente oposta, mantendo-se, pois, oculta a intenção
de exclusão:
É o caso, por exemplo, das campanhas motivacionais tão incensadas no
meio empresarial, notadamente nos ramos destinados à vendas. Se há a
intenção de motivar o trabalhador para o alcance de metas, que se estimule
ou premie os melhores, de forma a fazer com que aqueles, que não tiveram
o mesmo êxito, busquem lograr tal galardão. Contudo, é inaceitável a
imposição de ‘brincadeiras’ que exponham a vítima ao ridículo.
O que se pretende é a desestabilização emocional da vítima, levando-a a
desistir do seu posto de trabalho diante das dificuldades enfrentadas. Isso se torna
mais grave, considerando a dificuldade da vítima (e das pessoas em geral) de obter
a recolocação no mercado de trabalho, pois os índices de desemprego denunciam
que “para cada um que sai, há cinqüenta esperando”.
A vítima tenta resistir a denunciar o assédio; além disso, muitas vezes sua
demora em procurar o Poder Judiciário se deve à forma velada como ocorre o
assédio (a própria vítima demora em se dar conta que está sendo assediada) e à
necessidade de permanecer no emprego, que é meio de subsistência.
3.2 MODALIDADES DE ASSÉDIO MORAL E CONDUTAS CARACTERIZADORAS
O assédio moral “[...] é fruto de um conjunto de fatores, tais como a
globalização econômica predatória, vislumbradora somente da produção e do lucro,
e atual organização de trabalho, marcada pela competição agressiva e pela
opressão dos trabalhos através do medo e da ameaça” (FERREIRA, 2004, p. 37).
O assediador utiliza estratégias que buscam desestabilizar a vítima no
ambiente de trabalho, humilhá-la, desacreditá-la diante dos superiores e colegas, a
97
ponto de que sua única alternativa de resolver essa situação seja abandonar o
trabalho.
Não há agressor e vítima específicos. O superior hierárquico pode ser
agressor, como pode ser vítima, assim como o empregado pode assumir essas duas
posições, bastando a intenção de prejudicar, de ofender, ferindo a auto-estima, a
dignidade da vítima, não importando o meio utilizando, se por gestos, verbal, escrito
etc.
Segundo Guedes (2003a, p. 42), um dos requisitos para a configuração do
assédio é que a vítima e o agressor compartilhem o mesmo ambiente de trabalho.
“[...] Em razão da necessidade de reiteração e sistematização da conduta
assediante, a vítima tem que integrar a organização do trabalho de forma
permanente e sistemática – continuidade da prestação laboral [...].”
A doutrina tem classificado as modalidades de assédio de acordo com a
posição que vítima e agressor ocupam na empresa em vertical descendente (o mais
comum), vertical ascendente e horizontal.
108
A primeira modalidade, o assédio vertical descendente, é aquela em que o
agressor é um superior hierárquico e a vítima, seu subordinado. Essa é a
modalidade mais facilmente identificada, com o instituto do abuso do direito.
O agressor, como detentor do poder de direção, utiliza esse poder
excessivamente para atingir seus objetivos, ferindo a dignidade do trabalhador. “A
ação necessariamente não precisa ser deflagrada e realizada pelo superior, mas
pode este contar com a cumplicidade dos colegas” (GUEDES, 2003a, p. 36).
Comumente se dá quando os subornados são vítimas dos superiores hierárquicos.
108
Pamplona Filho (2006 p. 1080) adota classificação diversa, incluindo o assédio moral misto, que,
segundo o autor, “[...] exige a presença de pelo menos três sujeitos: o assediador vertical, o
assediador horizontal e a vítima. Pode-se dizer que o assediado é atingido por ‘todos os lados’, situ-
ação esta que, por certo, em condições normais, se torna insustentável em tempo reduzido”.
98
Na modalidade horizontal, o assédio se dá entre colegas de trabalho e,
portanto, não há ascendência hierárquica do agressor sobre a vítima. É o tipo de
assédio que ocorre quando dois empregados disputam a obtenção de um mesmo
cargo ou uma promoção, ou quando o empregador, buscando maior produtividade,
impulsiona a competição entre os colegas ou ainda por inveja e inimizades pessoais.
A terceira modalidade, considerada a mais rara, é o assédio moral vertical
ascendente, ou seja, aquele em que os subordinados procuram atingir um superior.
109
“Esta violência de ‘baixo para cima’ não é tão rara como se possa imaginar, a
primeira vista. Como exemplos, pode-se citar situações em que alguém é designado
para um cargo de confiança, sem a ciência de seus novos subordinados (que,
muitas vezes, esperavam a promoção de um colega para tal posto)” (PAMPLONA
FILHO, 2006, p. 1080).
As condutas que podem caracterizar o assédio moral são muitas, e
normalmente estão voltadas para desestabilizar emocionalmente a vítima. Segundo
Lippmann (2004, p. 37), caracterizam o assédio moral, dentre outras atitudes:
- o isolamento da(s) vítima(s) dos demais colegas de trabalho, separando-
a(s) em sala isolada e distante, ou em local humilhante como um corredor,
subterrâneo, garagem etc.;
- críticas públicas, tendendo para a humilhação ou ridicularização;
- tratamento da vítima ou do grupo por um apelido pejorativo;
- brincadeiras, sarcasmos e piadas envolvendo o assediado;
- solicitação de tarefas abaixo ou acima da qualificação do assediado;
- mandar que o empregado faça tarefas inúteis;
- obrigação de cumprimento de metas de resultados impossíveis.
109
“Da nossa experiência conhecemos um caso dessa natureza: uma jovem bacharela em direito,
funcionária de um Tribunal, foi nomeada para ocupar o cargo de Diretora de Secretaria numa Vara
do interior. Ao chegar ao fórum, foi recebida com hostilidade pelo corpo de funcionários, cuja média
de idade girava em torno dos 40 anos. Paulatinamente foi percebendo que suas determinações
para o serviço não eram observadas, e as hostilidades foram evoluindo para atitudes de franco
desrespeito e deboche por parte de alguns funcionários. Apesar do estresse e da insônia que
passou a sofrer, a determinação da jovem diretora, sua capacidade e autocontrole, bem como o
apoio irrestrito do juiz foram decisivos para que preservasse seu cargo e sua autoridade. Não
obstante a insignificância estatística do mobbing ascendente, a crueldade da violência praticada
não é menor do que nos demais casos” (GUEDES, 2003a, p. 38).
99
As condutas descritas como de assédio moral são muitas, e o que irá
agravá-las é exatamente a reiteração mencionada. Quando a situação humilhante
prolonga-se no tempo aparecem suas piores conseqüências.
Acreditamos que, nas entrelinhas de instruções processuais, em
reclamações precedidas pelos famosos ‘Planos de Demissão Voluntária’,
derivados da reengenharia do trabalho, tanto na indústria quanto nos
serviços públicos e privados, escondem-se casos de assédio moral
estratégico. As táticas variam desde retirar do empregado certos direitos
que lhe conferiam status inerente ao cargo exercido, até obrigá-lo a realizar
trabalhos humildes, exigir-lhe empenho desmedido, tal como o cumprimento
de metas na venda de papéis e outros serviços, impossíveis de serem
alcançadas, tornando-lhe o trabalho uma carga estressante e insuportável.
Em certos casos, tudo isso é agravado por um chefe que age como
verdadeira ave de agouro [...] sempre disposto a depreciar o trabalho da
vítima e lembrar que ela tinha deixado de cumprir tais e tais metas, ou que
estava perdendo a memória, sinal de velhice, solapando, assim, a auto-
estima do empregado ou funcionário e ferindo sua dignidade profissional e
pessoal (GUEDES, 2003b, p. 77).
Hirigoyen (2002b, p. 19-36) apresenta situações que não podem ser
consideradas assédio moral, apesar de serem, por vezes, confundidas com ele.
A primeira situação colocada pela autora é o “stress” no meio ambiente de
trabalho. “O termo stress pode ser entendido como o processo de tensão diante de
uma situação de desafio por ameaça ou conquista” (CATALDI, 2002, p. 47).
110
Em relação ao “stress” profissional, deve-se observar o conceito de
“Burnout”
111
, também identificado como “depressão por esgotamento” segundo
Hirigoyen (2002b, p. 19).
110
“[…] os fenômenos estressores advêm tanto do meio externo, como frio, calor, condições de
insalubridade, quanto do ambiente social, como trabalho, e do mundo interno, aquele vasto mundo
que tem dentro das pessoas, como os pensamentos e as emoções, a angústia, o medo, a alegria, a
tristeza. Todos esses fatores denominados de estressores são capazes de disparar no organismo
uma série imensa de reações via sistema nervoso” (CATALDI, 2002, p. 47-48).
111
“Nesse sentido, entende-se que burnout é uma síndrome caracterizada por três aspectos básicos:
a) a exaustão emocional, quando o profissional está diante de uma intensa carga emocional. O
profissional sente-se esgotado, com pouca energia para fazer frente ao dia seguinte de trabalho e a
impressão que ele tem é que não terá como recuperar (reabastecer) as suas energias. Os
profissionais passam a ser pessoas pouco tolerantes, facilmente irritáveis, e as suas relações com
o trabalho e com a vida ficam insatisfatórias e pessimistas; b) A despersonalização também es
presente. É o desenvolvimento do distanciamento emocional que se exacerba. Manifesta-se através
da frieza, insensibilidade e postura desumanizada. Nessa fase, o profissional perde a capacidade
de identificação e empatia com as outras pessoas, passando a ver cada questão relacionada ao
100
Desenvolvido na década de 1970, o termo pode ser entendido “[..] como
fruto de situações de trabalho, em situações de stress crônico entre profissionais
que apresentam grandes expectativas em relação ao seu desenvolvimento
profissional e dedicação à profissão” (CATALDI, 2002, p. 51).
O “stress” e o “burnout” são fatores determinantes de muitas doenças do
trabalho e podem ter como causa a exposição a situações de assédio moral.
O conflito é outra situação que Hirigoyen (2002b, p. 24-28) diferencia do
assédio moral. A autora considera que, em um conflito, as recriminações são
faladas, a “guerra é aberta”. Por outro lado, o comportamento mais comum do
assediador se caracteriza pela dissimulação.
112
A gestão por injúria caracteriza-se pelo comportamento despótico de certos
administradores que maltratam, submetendo todos os subordinados, sem distinção,
muitas vezes até fornecedores e clientes. No entanto, no assédio moral a ação do
assediador é dirigida, possui uma finalidade específica.
As agressões pontuais também não caracterizam assédio moral, pois este
exige que as condutas se prolonguem no tempo, sejam repetitivas. Tais agressões,
embora caracterizem atos de violência, por si só não são consideradas assédio, que
é metódico, premeditado, dissimulado.
Também não caracterizam o assédio moral outras formas de violência
113
(mesmo que situações de assédio possam degenerar e que as pessoas cheguem às
trabalho como um transtorno; c) A redução da realização pessoal e profissional fica extremamente
comprometida. Pode-se entender que surgiu outro tipo de pessoa, diferente, bem mais fria e
descuidada, podendo acarretar a queda da auto-estima, que às vezes chega à depressão”
(CATALDI, 2002, p. 51).
112
“Um conflito é fonte de renovação e de reorganização, pois obriga a se reconsiderar e a se
funcionar sob novas formas. Permite mobilizar as energias e reunir as pessoas, modificar as
alianças, sair da complexidade [...]” (HIRIGOYEN, 2002b, p. 24).
113
Situações de incivilidades, de uma agressão a mão armada ou uma agressão de cliente, violência
física, violência sexual etc.
101
vias de fato) e más condições de trabalho. “Trabalhar em um espaço exíguo, mal-
iluminado e mal-instalado não constitui um ato de assédio em si, salvo se um único
funcionário for tratado especificamente assim ou se tais condições destinarem-se a
desmerecê-lo” (HIRIGOYEN, 2002b, p. 33).
De um modo geral, exigências normais do contrato de trabalho, metas
possíveis e tarefas contratadas são situações que se enquadram no poder de
direção ou no jus variandi do empregador, não são assédio moral, mas abusos como
metas impossíveis, a determinação para que o trabalhador realize com freqüência
funções muito abaixo ou muito acima das suas capacidades, entre outras,
excederam a esse poder e serão abusivas.
Ainda, o “assédio moral” não se confunde com o “assédio sexual”. Este se
distingue pela conotação sexual das condutas que o caracterizam (física ou verbal)
ou pedido de favores sexuais.
114
A Lei n. 10.224 de 15 de maio de 2001 introduziu no Código Penal, no
Capítulo dos Crimes contra a Liberdade Sexual, o delito de assédio sexual, com a
seguinte definição:
Artigo 216-A. Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou
favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente de sua condição de
superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego,
cargo ou função: Pena – detenção de 1 (um) a 2 (dois) anos (BRASIL, Lei n.
10.224, 2001).
114
“As pessoas, normalmente, tendem a confundir os termos “assédio moral” e “assédio sexual”. Uma
e outra violência não são modismos, são fenômenos que, em certos casos, guardam alguma
relação, mas que se distinguem radicalmente porque, enquanto o primeiro visa a dominar a vítima
sexualmente, normalmente pela chantagem, o segundo visa precisamente à eliminação da vítima
do mundo do trabalho pelo psicoterror” (GUEDES, 2003a, p. 39). “[...] A diferença essencial entre as
duas modalidades reside na esfera de interesses tutelados, uma vez que o assédio sexual atenta
contra a liberdade sexual do indivíduo, enquanto o assédio moral fere a dignidade psíquica do ser
humano.Embora ambos os interesses violados sejam direitos da personalidade, não há que se
confundir as duas condutas lesivas, embora seja possível visualizar, na conduta reiterada do
assédio sexual, a prática de atos que também atentam contra a integridade psicológica da vítima”
(PAMPLONA FILHO, 2006, p. 1080).
102
Antes da inclusão desse artigo, o assédio sexual era enquadrado nos crimes
de constrangimento ilegal, ameaça, importunação ofensiva ao pudor, perturbação da
tranqüilidade, injúria e ato obsceno.
Vivot (1995, p. 19) sintetiza os elementos caracterizadores do assédio
sexual:
a) Que se trata de um comportamento de caráter ou conotação sexual;
b) Que não é desejado e, ao contrário, é rechaçado pela pessoa a quem se
dirige;
c) Que tem incidência negativa na situação laboral do afetado, já seja
presente ou futura;
d) Que a conduta pode ser verbal ou física, sempre de natureza sexual;
e) Que o autor sabe ou deveria saber que é ofensiva ou humilhante para o
afetado;
f) Que, em princípio, comporta uma discriminação em razão do sexo;
g) Que, conforme as acepções do conceito, deve ser efetuado pelo próprio
empregador ou seus dependentes hierárquicos;
h) Que habitualmente a destinatária do assédio sexual é uma mulher, mas
também pode ser um homem em certas circunstâncias;
i) Que se normalmente o assediador é um homem, também, poderia ser
uma mulher com relação a um varão ou a uma pessoa do mesmo sexo, ou
vice-versa;
j) Que também pode ser beneficiário do assédio sexual um terceiro, cliente
ou credor;
k) Que o assédio sexual é um conceito subjetivo, já que cada assediado
deve saber que atitudes o afetam ou não;
l) Que resulta praticamente impossível, por suas características, compor
uma lista de atitudes ou situações que comportam um assédio sexual.
O conceito de assédio sexual, embora ainda divergente na doutrina, é
impregnado, na maior parte das vezes, com conteúdo de relações trabalhistas, em
que há sempre um mais forte (o superior hierárquico) e um mais fraco (o
empregado).
115
Existindo uma conduta de natureza sexual contra o trabalhador,
exteriorizada por meio de gestos, expressões faciais, contato físico, todos
indesejados, constrangendo o empregado subordinado, ocorre o assédio sexual,
115
O que caracteriza o assédio sexual é o pedido de favores sexuais pelo superior hierárquico com
promessa de tratamento diferenciado em caso de aceitação e/ou de ameaças, ou atitudes
concretas de represálias no caso de recusa, como a perda do emprego ou de benefícios. É
necessário que haja uma ameaça concreta de demissão do emprego, ou da perda de promoções,
ou de outros prejuízos, como a transferência indevida. É caracterizado pela insistência e
inoportunidade. É a cantada desfigurada pelo abuso de poder, que ofende a honra e a dignidade do
assediado (LIPPMANN, 2004, p. 16).
103
diferente, portanto, do assédio moral em que não há o objetivo da obtenção de
favores sexuais e que pode ocorrer independentemente da presença da
subordinação da vítima ao assediador (assédio moral vertical ascendente e
horizontal).
3.3 CONSEQÜÊNCIAS DO ASSÉDIO MORAL
O assédio moral no trabalho ocorre em um ambiente em que a subordinação
retira do trabalhador a independência que teria em situações que não estivessem
marcadas pela supremacia do poder de um (empregador) em relação ao outro
(empregado). Caracteriza-se por atitudes que revelam o abuso do poder de uma
parte em relação à outra, tratando de uma interação desequilibrada entre pessoas,
fortemente marcada pela sujeição.
Esse contexto é favorável ao surgimento de efeitos danosos à saúde física e
mental dos trabalhadores, sendo que em situações de independência e equilíbrio de
poder, provavelmente a possível vítima estaria em condições de afastar-se das
relações indesejáveis.
As regras de sociabilidade permitem, na maioria dos casos, o rompimento
das relações entre as pessoas, quando percebem sua possível prejudicialidade, o
que fica comprometido em relações em que uma pessoa possui ascendência sobre
a outra.
Com relação à vítima, esses efeitos são desastrosos: a exposição
prolongada a situações humilhantes e constrangedoras poderá levá-las à depressão,
104
à dificuldade de relacionar-se, entre outros sintomas físicos e psíquicos que variam
de acordo com o sexo das vítimas.
116
As mulheres são mais sujeitas a crises de choro, a palpitações, temores,
falta de apetite, enquanto os homens têm sede de vingança, idéia e tentativa de
suicídio. A depressão, a insônia, a sonolência durante o dia e a dor de cabeça
encontram-se presentes em ambos os sexos, mais ou menos na mesma proporção.
Embora as mulheres estejam mais expostas a situações de assédio, as
conseqüências mais graves parecem recair sobre os homens (note-se que entre
eles predominam idéias graves como as de suicídio).
117
Os danos emocionais têm reflexos na vida social e familiar das vítimas. “[...]
Na medida em que a vítima sente que está perdendo seu papel e sua identidade
social, que está perdendo sua capacidade de projetar-se no futuro, verifica-se uma
queda na auto-estima e surge um sentimento de culpa” (SANTUCCI, 2006, 54-55).
O assédio moral no trabalho é um fator de risco que pode ser considerado
doença do trabalho equiparado a acidente do trabalho na forma do artigo 20 e 21 da
Lei 8.213/1991 e Decreto n. 3.048/1999.
118
Sobre esse prisma, compete à Comissão
Interna de Prevenção de Acidentes - CIPA - atuar na sua prevenção e combate.
116
Sobre o tema, verificar a tabela elaborada por Barreto (2003, p. 217), anexo G.
117
“Um trabalhador que sofreu psicoterror ou assédio psicológico em seu trabalho durante algum
tempo apresenta uma série de sintomas semelhantes aos da denominada síndrome de estresse
pós-traumático (SEPT), característica das vítimas de assaltos, catástrofes naturais (terremotos,
inundações), acidentes aéreos, bombardeios, violações etc. O que se acrescenta à definição típica
da SEPT é o fato de que, do mesmo modo que as vítimas de todas essas situações experimentam
um único acontecimento traumático isolado que não mais volta a acontecer, as vítimas do
psicoterror no trabalho costumam vivenciar repetidos ataques, ameaças, ridicularizações e insultos,
com a sensação de "estar sempre na mira" do assediador e de não ter por onde escapar, a não ser
abandonando seu trabalho. A manifestação dos sintomas da SEPT não tem por que ser con-
temporânea aos ataques, pois em numerosas ocasiões as vítimas de assédios psicológicos
passados manifestam essa sintomatologia” (ZABALA, 2003, p. 80).
118
“Lei 8.213, de 24 de julho de 1991, Artigo 20: Consideram-se acidente de trabalho, nos termos do
artigo anterior, as seguintes entidades mórbidas: I – doença profissional, assim entendida a
produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade e
constante da respectiva relação elaborada pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social; II –
doença do trabalho, assim entendida a adquirida ou desencadeada em função de condições
105
O silêncio, o medo das vítimas de reagir às agressões e a inércia dos
superiores são fatores que podem agravar as conseqüências à saúde.
O sofrimento social (humilhação, vergonha, falta de reconhecimento)
normalmente “não tem visibilidade; ele se inscreve no interior das subjetividades
sem, no entanto, ser compartilhado coletivamente” (CARRETEIRO, 2003, p. 58).
Muitas são as situações em que o empregado sem se dar conta do assédio
do qual é vítima se vê como fracassado ou incapaz e somente irá reagir ou buscar
ajuda quando as conseqüências forem irreversíveis, com o surgimento de doenças
ou até mesmo lesões mais graves (como as lesões por esforço repetitivo – LER –
devido à sobrecarga de trabalho).
119
Conforme Goulart (2006, p. 162), “há uma tendência em se apreciar como
doença ocupacional apenas os danos físicos sofridos pelo trabalhador”, o que não
parece ser o critério mais justo, porque muitas vezes exclui aqueles que não
realizam trabalho braçal.
especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relacione diretamente, constante da relação
mencionada no inciso I. [...] § 2º Em caso excepcional, constatando-se que a doença não incluída
na relação prevista nos incisos I e II desde artigo resultou das condições especiais em que o
trabalho é executado e com ele se relaciona diretamente, a Previdência Social deve considerá-la
como acidente de trabalho. Artigo 21: Equiparam-se também ao acidente do trabalho, para efeitos
desta Lei: I - o acidente ligado ao trabalho que, embora não tenha sido a causa única, haja
contribuído diretamente para a morte do segurado, para redução ou perda da sua capacidade para
o trabalho, ou produzido lesão que exija atenção médica para a sua recuperação; II - o acidente
sofrido pelo segurado no local e no horário do trabalho, em consequência de: a) ato de agressão,
sabotagem ou terrorismo praticado por terceiro ou companheiro de trabalho; b) ofensa física
intencional, inclusive de terceiro, por motivo de disputa relacionada ao trabalho; c) ato de
imprudência, de negligência ou de imperícia de terceiro ou de companheiro de trabalho; d) ato de
pessoa privada do uso da razão; e) desabamento, inundação, incêndio e outros casos fortuitos ou
decorrentes de força maior [...]” (sem grifo no original).
119
“As lógicas de invalidação e depreciação ocorrem, em grande parte das vezes, em cenas públicas.
As pessoas se sentem desvalorizadas e diminuídas, e, raramente, compartilham tais sentimentos.
Se, por um lado, a expressão desses sentimentos sofre uma censura do próprio sujeito, por outro, a
sociedade dispõe de poucos suportes para auxiliar sua expressão. Os afetos, frutos do processo de
exclusão, são relegados a passar por um processo que pretende apagá-los, anulá-los, enfim, torná-
los inaudíveis. A esse processo de silenciamento dos afetos, dos quais participam as instituições e
os sujeitos individuais e grupais, denominamos lógica da invisibilidade do sofrimento”
(CARRETEIRO, 2003, p. 58).
106
Aqui a dificuldade reside principalmente na prova do nexo de causalidade
entre o dano e o abalo psicológico sofrido e seus reflexos na saúde obreira
120
, o que
dificulta o afastamento para tratamento com base em condutas de assédio.
Mesmo para aqueles que se afastam para tratamento médico, a situação
não parece ser mais favorável. Segundo relato de Barreto (2003, p. 112-113), que
entrevistou mais de 2.072 trabalhadores de São Paulo, em empresas como a
Nitroquímica e a Avon, os entrevistados revelaram que, ao retornar após
afastamento, aqueles que adoecem são avaliados segundo critérios
preestabelecidos: “os ‘incapazes’ são separados dos ‘normais’ e colocados à parte.”
Essa seleção determina que os reabilitados ou aqueles que mudam de função sejam
transferidos para setores “conhecidos pejorativamente como ‘INPS’, setor dos
inválidos, dos ‘podres’ ou ‘dos inúteis’. [...] É comum identificarem essa ação como
castigo.”
Para os excluídos, os malefícios podem agravar-se com o tempo. “No
assédio moral, as sintomatologias apresentadas pelas vítimas são muito caricatas e
estão mais relacionadas à intensidade da duração do que propriamente às
estruturas psíquicas” (HIRIGOYEN, 2002b, p. 157).
A maioria das pesquisas realizadas sobre o tema relata casos de estresse
que agem como fator que irá desencadear outras doenças. Quando o estresse
passa a afetar inclusive a vida familiar da vítima, chega-se ao estágio que Hirigoyen
(2002a, p. 178) denomina “descompensação”. Segundo a autora, normalmente é a
partir daí que a vítima procura ajuda especializada, em geral apresentando “um
120
A esse respeito, verificar a Resolução n. 1488 de 11 de fevereiro de 1998, do Conselho Federal de
Medicina (anexo H), artigo 10, inciso III: “Artigo 10. São atribuições e deveres do perito-médico
judicial e seus assistentes técnicos: [...] III – estabelecer o nexo causal, considerando o exposto no
Artigo 4º e seus incisos [...]”.
107
estado ansioso generalizado, perturbações psicossomáticas, ou um estado
depressivo.”
A vítima submissa permanece no ambiente hostil, somente procurando
auxílio após a perda do posto de trabalho ou quando a situação chega a
conseqüências mais graves, já que faltar ao trabalho e procurar um médico é pôr em
risco o próprio emprego.
Ferreira, H. (2004, p.70) coloca como uma das conseqüências possíveis da
prática de assédio a aposentadoria por acidente de trabalho, que tem como causa
doença profissional causada por situações de assédio.
121
Além deste fato, das conseqüências econômicas e relativas à saúde das
vítimas, existem ainda algumas conseqüências jurídicas, como o rompimento do
contrato de trabalho (que envolvem inclusive a dispensa indireta e a demissão por
justa causa).
Muitos comportamentos descritos como de assédio moral podem ser
enquadrados em várias alíneas do artigo 483 da CLT, da rescisão indireta, como
rigor excessivo, perigo manifesto de mal considerado e o descumprimento de
obrigações contratuais.
A vítima pode pedir a rescisão indireta acompanhada de pedido de
indenização por danos materiais e morais. Ressalte-se que em uma sociedade
competitiva como a nossa, muitas vezes o objetivo do assediador é se ver livre da
vítima e, desse modo, mesmo através da rescisão indireta, estará atingindo seus
objetivos.
121
Também neste sentido “[...] a indispensabilidade de proteção jurídica seja à saúde mental, seja à
saúde física do trabalhador, demanda o enquadramento do assédio moral no acidente do trabalho
do tipo doença do trabalho (Lei 8.123/91, artigo 20, inc. II), não afastando a possibilidade de a
vítima do assédio moral, em razão da pressão e condições de trabalho degradante, ficar vulnerável,
nessa hipótese, o estabelecimento do nexo causal (trabalho-acidente-incapacidade)” (ALKIMIN,
2005, p. 89).
108
O ideal é a utilização de normas coletivas – de uma lei específica que
determine a nulidade da dispensa, da transferência realizada ou da demissão
formalizada – e eventual punição disciplinar.
As situações de prática de assédio moral tem ensejado condenações à
reparação de danos morais pelos Tribunais pátrios, independentemente de
legislação a tratar especificamente sobre o tema.
Alguns autores defendem que o ideal seria a existência de uma lei federal
alterando a CLT, a exemplo do que acontece em muitos países, definindo e
combatendo o assédio moral.
122
Critica-se tal posicionamento por entender-se que uma estratégia jurídica
para o combate ao assédio moral prescinde da existência de um tipo legal
específico.
A esse respeito acredita-se inclusive que a tipificação das condutas que se
considera como assédio moral é nociva aos trabalhadores na medida em que
delimita o campo de atuação dos operadores do direito às situações previstas em lei
e exclui situações não previstas expressamente.
A tipificação deixa de lado diversas situações que podem caracterizar
também o fenômeno do assédio, afastando a possibilidade de enquadrá-las como
assédio moral.
122
“Depois da Suécia, a França é o segundo país a adotar uma tutela específica contra o assédio
moral ou ‘harcèlement moral’ [...][...] Aprovada em 17 de janeiro de 2002, a lei de modernização
social contém uma importante seção toda dedicada à luta contra o ‘harcèlement moral au travail’ [...]
e define o assédio moral nos seguintes termos: ‘Nenhum trabalhador deve sofrer atos repetidos de
assédio moral que tenham por objeto ou por efeito a degradação das condições de trabalho
suscetível de lesar os direitos e a dignidade do trabalhador, de alterar a sua saúde física ou mental,
ou de comprometer o seu futuro profissional. Nenhum trabalhador pode ser sancionado, despedido
ou tornar-se objeto de medidas discriminatórias, diretas ou indiretas, em particular no modo de
remuneração, de formação, de reclassificação, qualificação ou de classificação, de promoção
profissional, de transferência ou renovação do contrato por ter sofrido ou rejeitado sofrer os
comportamentos definidos no parágrafo precedente ou por haver testemunhado sobre tais
comportamentos ou havê-los relatado”. (GUEDES, 2003b, p. 132).
109
3.4 ESTRATÉGIAS JURÍDICAS PARA ENFRENTAR O ASSÉDIO MORAL: A VISÃO
DOS TRIBUNAIS
Não há dúvidas de que o assédio moral no trabalho é conduta que deve ser
punida. As situações de prática de assédio moral têm ensejado condenações à
reparação de danos morais pelos Tribunais Pátrios, independentemente de a
legislação não tratar especificamente do tema.
Há quem defenda que o ideal seria a existência de uma lei federal que
alterasse a CLT, a exemplo do que acontece em muitos países, de forma a se definir
e combater o assédio moral.
Critica-se tal posicionamento por se entender que uma estratégia jurídica
para o combate ao assédio moral prescinde da existência de um tipo legal
específico. A esse respeito acredita-se inclusive que a tipificação das condutas que
se consideram assédio moral pode ser nociva aos trabalhadores, na medida em que
delimita o campo de atuação dos operadores do direito às situações previstas em lei
e exclui as situações que não ficarem previstas expressamente, afastando a
possibilidade de enquadrá-las como assédio moral.
Nossos Tribunais já começam a se manifestar sobre o tema, e aqui vale
lembrar a força determinante da jurisprudência. Esta vem desenvolvendo a idéia de
assédio moral sem previsão legal explícita e demonstrando preparo e sensibilidade
na proteção aos direitos fundamentais dos trabalhadores, no combate a atitudes
perversas que podem trazer danos à personalidade, à dignidade e à integridade
psíquica do trabalhador.
Quando a empresa adota estratégias que visam aumentar a produção e
diminuir os custos, não se pode esquecer que estas estratégias não devem resultar
na degradação das condições de trabalho.
110
O Tribunal Regional do Trabalho do Rio Grande do Norte condenou a
Companhia de Bebidas das Américas (AMBEV), em ação civil pública promovida
pelo Ministério Público do Trabalho, em razão de prática de medidas motivacionais
abusivas, caracterizadoras do assédio moral.
123
Embora se reconheça como compreensível que o empresário vise ao lucro,
isso não lhe dá o direito de exigir dos seus trabalhadores a prática de atos
humilhantes e constrangedores. O empresário extrapola o seu poder de mando no
momento em que exige uma competição em busca de resultados, deixando de
respeitar os limites individuais de cada um daqueles que coloca sob o seu comando:
ABUSO DO PODER DIRETIVO E FISCALIZATÓRIO. DANO MORAL
CONFIGURADO. REPARAÇÃO DEVIDA. A prática adotada pela
empregadora para a cobrança da produtividade, expondo o empregado a
constrangimento e humilhação, bem como a fiscalização excessiva do
trabalho prestado, através de escuta e gravação de ligações telefônicas,
expondo o trabalhador a situação constrangedora e degradante, configura
ilicitude na conduta empresária. Não obstante se reconheça o poder
empregatício conferido ao empregador, é inadmissível o exercício abusivo
das prerrogativas fiscalizatória e diretiva, de molde implicar agressão à
privacidade, à intimidade e até mesmo à honra do empregado, resultando
na ofensa à dignidade do trabalhador como pessoa humana, em evidente
afronta a princípios constitucionais expressos (artigos l
s
, III e IV, e 170,
caput, da CR/88). Nos termos do artigo 198 do CC-2002, também comete
ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, extrapola os limites
impostos pelo seu fim econômico ou social. Nessa linha, impõe-se à
empregadora a responsabilidade pela reparação dos danos morais
causados à reclamante (artigo 927 do CC-2002). TRT 3
a
Reg. RO
105/2004.016.03.00-0 — (Ac. 1
§
T.) — Rel
a
Juíza Maria Laura F. L. de
Faria. DJMG 10.9.04, p. 5. (RDT n. 10, outubro de 2004, Ed. Consulex,
Brasília, DF)
Dentro do respeito à dignidade do trabalhador, o legislador constituinte de
1988, ao estabelecer princípios gerais e, portanto, também aplicáveis ao direito do
123
A empresa foi condenada em 28 de agosto de 2006 ao pagamento de R$ 1 milhão por danos
morais a seus trabalhadores. “[...] nos autos ficou comprovado que a empresa rio-grandense dividia
seus vendedores em equipes, estipulava metas e promovia, nas reuniões mensais, a distribuição de
prêmios em dinheiro à equipe vencedora e de “prendas” as integrantes da equipe perdedora [...] O
caso da AMBEV é paradigmático. A empresa, de porte nacional, registra condutas abusivas
dirigidas a seus vendedores, em vários estados da federação, apesar de contar com um Código de
Ética e um setor próprio para reclamações denominado ‘setor gente e gestão” (ARAÚJO, 2006, p.
01).
111
trabalho, consagra em seu artigo 1º, inciso III, como fundamento da República
Federativa do Brasil “a dignidade da pessoa humana” (BRASIL, Constituição
Federal, 1988).
124
Impõe-se a garantia de sua identidade e integridade através do livre
desenvolvimento da personalidade, a libertação da “angústia da existência” da
pessoa mediante mecanismos de sociabilidade, dentre os quais se incluem a
possibilidade de trabalho e a garantia de condições existenciais mínimas
(CANOTILHO, 1983, p. 363).
[...] o respeito à dignidade pessoal do trabalhador determina diversas
exigências e proibições, sem que possa estabelecer um catálogo preciso de
condutas impostas ou excluídas. O significado da expressão é suficiente
claro e fecundo para permitir avaliar os atos do empregador e julgar se tem
o devido respeito à dignidade pessoal do trabalhador [...] que deve ser
tratado pelo empregador com o mesmo respeito com que ele próprio deve
tratar o patrão [...] esta afirmação comporta diversas implicações uma delas
tem a ver com o trato pessoal que deve ser correto e digno tanto pela
linguagem quanto pelo tom da voz. Outra é a necessidade de ter a devida
consideração para com o trabalhador diante da clientela ou de terceiros,
abstendo-se de fazer observações ou recriminações (RODRIGUEZ, 1983,
p. 154).
O combate ao abuso do direito deve se articular a uma teoria dos direitos
fundamentais. “[...] assim concebido, o abuso do direito não se presta ao
esvaziamento da proteção dos direitos fundamentais, como em determinado
124
Quanto ao Direito do Trabalho como ramo protetivo dos trabalhadores e seus princípios, pode-se
dizer que “[...] esse garantismo coexiste com o princípio da dignidade humana inserido no artigo 1º,
inciso II da CF, evidenciando que o primeiro fundamento do valor do trabalho é o próprio homem.
Esse princípio da dignidade humana não se confunde com o princípio da proteção, pois é superior a
ele. Trata de elevar a consideração da pessoa que trabalha aos mesmos níveis das que utilizam
seus serviços. Ele pressupõem várias vertentes, ou seja, controles pessoais no emprego devem ser
feitos respeitando a dignidade de quem a eles se submeter; as opiniões políticas, sindicais e
religiosas devem ser respeitadas, vedando-se ainda a discriminação de qualquer natureza, em
função de sexo, cor, idade ou estado civil, além de outras vertentes. O grande desafio que se
encontra é determinar o ponto de equilíbrio entre uma Flexibilização sensível às preocupações
legítimas das empresas e uma legislação que impeça um retrocesso ao antigo arrendamento de
serviços, norteado pela autonomia da vontade, fugindo completamente dos ideais de justiça social”.
(BARROS, 1997, p. 18). A dignidade da pessoa humana também é mencionada pelo constituinte
em outros momentos, a exemplo, o artigo 170 prescreve que “a ordem econômica, fundada na
valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna,
conforme os ditames da justiça social” (BRASIL, Constituição Federal, 1988).
112
momento histórico, mas, ao contrário, põe-se a serviço da abertura à eficácia da
normatividade constitucional em âmbitos das relações privadas que a ela ainda se
mantêm refratários” (WANDELLI, 2004, p. 456).
As condutas que se enquadram nas definições de assédio moral decorrem
de abusos do exercício do poder diretivo do empregador e, conseqüentemente,
ensejam a reparação dos danos causados ao obreiro, conforme disposto no artigo
187 do Código Civil.
Vale lembrar aqui os passos dados em torno da problemática do assédio
moral, sob a perspectiva do abuso de direito como conduta abusiva e que excede os
limites impostos “pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons
costumes”.
Quanto ao dever de “boa-fé”, observe-se o aresto colacionado que resultou
na condenação de empregador que, mesmo após a dispensa do empregado,
praticou atos que atingiram moralmente o empregado:
ASSÉDIO MORAL. PROCEDIMENTO VEXATÓRIO. ABUSO DE DIREITO.
DEVER DE BOA-FÉ E DE SOLIDARIEDADE. DANO E INDENIZAÇÃO. A
exigência de que o empregado percorra diversos setores da empresa, para
verificação de pendências e devolução de material não pode ser aceita sob
a justificativa de agilização do processo de dispensa. Ao contrário, configura
atitude perversa que, deliberadamente, coloca o trabalhador, já desgastado
pela perda do emprego, em situação constrangedora. Trata-se do dever de
boa-fé que deve permear o contrato de trabalho e não se encerra na
rescisão. Há que se incentivar atitudes de solidariedade, na dispensa, que,
além de reduzir os efeitos estressantes do processo demissional, impedirão
que o demitido transmita informações negativas sobre a empresa. Há que
se observar, ainda, que a defesa do patrimônio, pelo empregador, é lícita,
desde que não transborde os limites necessários e atinja o patrimônio moral
do trabalhador. Configurado o dano moral, a indenização se impõe, também
como medida preventiva da reincidência. Recurso provido, no particular,
para condenar o réu ao pagamento de indenização por dano moral (TRT 9ª
R. – RO – 06689-2001-652-09-00-4-ACO-10113-2004 – Rel. Marlene T.
Fuverki Suguimatsu – DJPR 28-05-2004)
A boa-fé representa valores essenciais para o processo produtivo e deve ser
um das condutas nas relações de trabalho, na busca de um Direito do Trabalho que
seja capaz de dignificar o homem.
113
Conforme Coutinho (2000, p. 43-44), a função social do contrato de trabalho
vai além do aspecto econômico de circulação de riquezas para a valorização da
dignidade humana. Mais do que isso, ela tem duplo papel, pois “tanto serve à
proteção dos trabalhadores diante da exploração a que são submetidos, por
exemplo limitando a pactuação em relação à jornada diária ou semanal de trabalho,
quanto serve à preservação do próprio sistema capitalista, estabelecido em um dado
modo de produção, estabelecendo que desídia é justa causa [...].”
As normas jurídicas já existentes devem ser entendidas tendo em vista o
contexto legal em que inseridas e considerando os valores tidos como válidos em
determinado momento histórico.
Não há como interpretar uma disposição ignorando as profundas
modificações por que passou a sociedade, desprezando os avanços da ciência e
deixando de ter em conta as alterações de outras normas, pertinentes aos mesmos
institutos jurídicos.
Quer se sustentar que, na coibição do assédio moral, a teoria do abuso do
direito reconstruída pode contribuir para a efetividade dos direitos fundamentais dos
trabalhadores.
114
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como explicar que o tirano, cujo corpo é igual ao nosso, tenha crescido
tanto, com mil olhos e mil ouvidos para nos espionar, mil bocas para nos
enganar, mil mãos para nos esganar, mil pés para nos pisotear? Quem lhe
deu os olhos e os ouvidos dos espiões, as bocas dos magistrados, as mãos
e os pés dos soldados? O próprio povo. [...] Não somos obrigados a
obedecer ao tirano e aos seus representantes, mas desejamos
voluntariamente servi-los porque deles esperamos bens e a garantia de
nossas posses. Usamos nossa liberdade para nos tornarmos servos. [...] Se
não trocarmos nossa consciência pela posse de bens e se não trocarmos
nossa liberdade pelo desejo de mando, nada daremos ao tirano e, sem
poder, ele cairá como um ídolo de barro.
(La Boétie)
Ao trabalhador devem ser asseguradas as garantias mínimas de um
trabalho digno. E para que isso seja possível, não se pode compreender o
trabalhador como simples instrumento para a realização de determinado serviço.
O que caracteriza o ser humano e o faz dotado de dignidade especial é que
ele nunca pode ser meio para os outros, mas fim em si mesmo
125
. Decorre daí
também a finalidade do Direito do Trabalho de proteção da prestação de trabalho de
uma pessoa a outra.
No presente trabalho, procurou-se demonstrar que o poder se revela entre
as diversas camadas da estrutura social, revelando o ambiente de trabalho também
como um centro de poder.
Para tal análise, é relevante discutir a acentuada subordinação presente na
relação de emprego com a submissão jurídica do empregado ao empregador.
A doutrina aponta a personalidade, a propriedade e a organização como
fontes do poder, o qual é exercido através de instrumentos como punição,
recompensa e persuasão.
125
Para Kant, o homem é um fim em si mesmo e, por isso, tem valor absoluto, não podendo, de
conseguinte, ser usado como instrumento para algo, e, justamente por isto tem dignidade, é pessoa
(KANT, 1993, p. 55).
115
A subordinação é o principal elemento que caracteriza a relação de emprego
e juridicamente deve incidir sobre o modo com que o trabalhador realiza suas
atividades e não sobre sua pessoa.
A centralidade ainda é a do trabalho subordinado, permanecendo a distinção
entre trabalho subordinado (relação de emprego) e trabalho autônomo.
O contraponto da subordinação jurídica é o poder conferido ao empregador
para dirigir a prestação de serviços do trabalhador. O empregador tem o poder de
dirigi-lo, controlá-lo, fiscalizá-lo e puni-lo. Desse poder decorre o jus variandi, o
direito de “variar”, de alterar o contrato de trabalho de seus empregados.
O poder do empregador no contrato de trabalho não é ilimitado, mas tem
como parâmetro o direito vigente e o respeito à dignidade humana.
A reestruturação produtiva, que ocorre paralelamente à reestruturação
econômica, remodelou o processo produtivo e introduziu mudanças na busca de
maior produtividade e eficiência através do maior controle sobre o trabalhador.
Dos princípios da administração científica de Taylor, aprimorados por Ford
até o Toyotismo japonês, entre outros modelos de gestão, tem-se a introdução
gradativa de mudança para a adaptação da produção às exigências do mercado,
com a idéia de flexibilidade da produção e também dos trabalhadores (polivalentes).
As mudanças no processo produtivo se refletem nas relações entre
empregados e entre estes e seus empregadores, introduzindo uma rotina de
competitividade e busca de eficiência como requisitos para a permanência nos
postos de trabalho.
A reestruturação produtiva desempenha importante papel na construção da
identidade do trabalhador. A discussão do tema do poder e da subordinação, que
envolve empregado e empregador nas relações de emprego, se mostra relevante,
116
sobretudo quando as formas de organizar e gerir o trabalho ultrapassam os limites
legais, exteriorizando condutas abusivas.
Os dispositivos presentes no Código Civil brasileiro, destinados a coibir o
abuso de direito, aplicam-se ao Direito do Trabalho e servem como parâmetro para
punir excessos do poder do empregador.
A conduta abusiva insere-se no plano da antijuridicidade e prescinde do
reconhecimento da culpa como requisito para a reparação. Caracteriza-se não pela
inobservância de um preceito legal específico, mas pela prática de um ato que
excede os limites do fim econômico ou social do direito, da boa-fé e dos bons
costumes.
Não obstante o fato de os atos ilícito e abusivo ensejarem a
responsabilidade civil, estes não podem ser igualados. A idéia que deve imperar é a
da existência de diferença quanto à natureza da violação e, por via de
conseqüência, quanto à necessidade de expressa previsão da conduta proibida.
O abuso da conduta também é um dos requisitos para a configuração da
prática de assédio moral, ao lado da natureza psicológica da conduta que atente
contra a dignidade psíquica do indivíduo, da reiteração da conduta e da intenção de
excluir a vítima do ambiente de trabalho.
É desnecessária a comprovação de efetivo dano psíquico para a
condenação por prática de assédio moral, pois este deve ser entendido como
conseqüência natural da violação dos direitos da personalidade da vítima.
A busca por índices de produção elevados e a competição incentivada pela
empresa expõem muitas vezes o trabalhador a comportamentos agressivos, aliados
à indiferença ao seu sofrimento. Ao final, o empregado é dispensado porque não se
sujeita às situações de assédio que lhe são impostas.
117
O assédio moral tem como resultado a degradação do ambiente de trabalho.
Por essa razão, considera-se que o fato de o empregado adoecer resulta das formas
de organizar e gerir o trabalho, fundadas em relações de abuso de poder e práticas
desumanas.
Como ação estratégica para o enfrentamento do assédio moral, defende-se
a aplicação da responsabilidade civil do empregador, independentemente de culpa,
em razão da prática de conduta abusiva, já que na teoria do abuso de direito há
suporte jurídico para a punição das situações de assédio moral.
118
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125
ANEXO A
PROJETO DE LEI N. 4742/2001
126
127
ANEXO B
PROJETO DE LEI N. 4960/2001
128
129
130
ANEXO C
PROJETO DE LEI N. 5887/2001
131
132
ANEXO D
PROJETO DE LEI N. 2593/2003
133
134
135
136
137
138
139
140
141
142
ANEXO E
PROJETO DE LEI N. 2369/2003
143
144
145
146
147
148
149
ANEXO F
PROJETO DE LEI N. 033/2007
150
PROJETO DE LEI N° 33, DE 2007
(DoSr. DR. ROSINHA)
Dispõe sobre o assédio moral nas relações de trabalho.
O Congresso Nacional decreta:
Art. 1° É proibido o assédio moral nas relações de trabalho.
Art. 2° Assédio moral consiste no constrangimento do trabalhador por seus
superiores hierárquicos ou colegas, através de atos repetitivos, tendo como objetivo,
deliberado ou não, ou como efeito, a degradação das relações de trabalho e que:
I - atente contra sua dignidade ou seus direitos, ou
II - afete sua higidez fisica ou mental, ou
III - comprometa a sua carreira profissional.
Art. 3° É devida indenização pelo empregador ao empregado sujeito a assédio
moral, ressalvado o direito de regresso.
§ 1° A indenização por assédio moral tem valor mínimo equivalente a 10 (dez)
vezes a remuneração do empregado, sendo calculada em dobro em caso de reincidência.
§ 2° Além da indenização prevista no § 1°, todos os gastos relativos ao tratamento
médico serão pagos pelo empregador, caso seja verificado dano à saúde do trabalhador.
Art. 4° O empregador deve tomar todas as providências necessárias para evitar e
prevenir o assédio moral nas relações de trabalho.
§ 1° As providências incluem medidas educativas e disciplinadoras, entre outras.
§ 2° Caso não sejam adotadas medidas de prevenção ao assédio moral e sendo
esse verificado, o empregador está sujeito a pagamento de multa no valor de R$ 3.000,00
(três mil reais) por empregado, sendo o valor elevado em 50% em caso de reincidência.
Art. 5° O assédio moral praticado por empregado, após ter sido orientado sobre a
sua proibição, enseja sanção disciplinadora pelo empregador.
Parágrafo único. A sanção disciplinadora deve considerar a gravidade do ato
praticado e a sua reincidência, sujeitando o empregado à suspensão e, caso não seja
verificada alteração no seu comportamento após orientação do empregador, à rescisão do
contrato de trabalho por falta grave, nos termos do art. 482 da Consolidação das Leis do
Trabalho - CLT.
Art. 6° Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
JUSTIFICAÇÃO
O Deputado Mauro Passos (PT-SC) é o autor do presente Projeto de Lei.
Reapresentar tal proposição muito me honra, ao mesmo tempo em que significa reconhecer
a importância da matéria.
A nossa herança colonial e escravocrata ainda é latente nas relações de trabalho e
se manifesta na falta de dignidade durante o contrato e no desrespeito ao trabalhador.
151
Essa herança se manifesta de forma expressa (como as divisões entre área social
e área de serviço, elevador social e de serviço etc) e também de forma velada (preconceito
e discriminação contra o trabalhador braçal, cuja atividade foi aviltada pela prática
escravidão).
A proposição em tela visa romper com isso e discutir um novo padrão de relações
de trabalho, amenizando os conflitos existentes no mundo do trabalho no Brasil, dando
maior dignidade a essas relações.
O Direito do Trabalho (e ao trabalho) é direito fundamental, reconhecido em todo o
mundo como tal. Não basta garantir o direito à vida, deve ser garantido o direito à vida e ao
trabalho dignos. Por isso, o nosso projeto proíbe o assédio moral.
O tema tem sido debatido pela sociedade, sendo bastante discutido pela União
Européia e pela Organização Internacional do Trabalho - OIT.
Com efeito, as pessoas sujeitas a assédio moral são muito mais suscetíveis ao
stress do que as que trabalham em ambiente adequado em que sejam respeitadas. O stress
causado pode gerar outras doenças e representa um risco para a saúde do trabalhador.
As causas do assédio moral estão relacionadas aos problemas de organização do
trabalho, falta de informação, ausência de política de pessoal adequada a respeitar o
indivíduo dentro da instituição ou empresa. É necessário combater o assédio moral que tem
consequências devastadoras para a saúde física e psíquica do trabalhador, afeta a sua vida
familiar, social e profissional, resultando em ausências ao trabalho.
Isso sem mencionar o total desrespeito ao direito fundamental do trabalho e a
dignidade na prestação de serviços. Pode ser seriamente afetada a carreira profissional de
um indivíduo, que se sentirá desestimulado a dedicar- se ao trabalho.
Assim, decidimos reapresentar esse projeto de lei que não configura o assédio
rnoral como crime, mas sim como ilícito trabalhista, que pode gerar o direito à indenização.
Julgamos que a empresa é responsável pelo ambiente de trabalho, que deve ser
saudável. É o empregador que determina a política de pessoal e que decide sobre a
qualidade das relações dentro de seu estabelecimento. Deve, portanto, adotar ações
educativas para que o ambiente seja efetivamente livre de assédio rnoral. Caso não adote, o
empregador é responsável pelo assédio moral praticado.
No entanto, caso um empregado ainda pratique o assédio, apesar de o empregador
ter adotado as medidas cabíveis a fim de evitar tal prática, pode o empregado vir a ser
sancionado, podendo, em última instância, vir a ser configurada a falta grave, em virtude,
por exemplo, de insubordinação e indisciplina.
A maior dificuldade quanto ao termo assédio moral é a sua definição, apesar de
todos intuirmos o seu significado. Em nosso projelo, definimos como o constrangimento do
trabalhador, que deve se sentir importunado com a conduta tanto de superiores hierárquicos
como de colegas.
O comportamento deve ser repetitivo, pois é óbvio que apenas uma brincadeira de
mau gosto não configura o assédio, O stress causado por esse tipo de comportamento
depende da sua repetição. O agente pode ter ou não a intenção de constranger o
trabalhador. Cumpre à empresa evitar que aconteça o ato. Caso o agente o pratique
152
deliberadamente. pode sofrer sanção disciplinadora, que inclui a suspensão e pode ser
fundamento para uma rescisão por justa causa.
O principal aspecto do assédio moral é que tem como objeto ou efeito a
degradação das relações de trabalho. A sua proibição e a sanção, caso seja praticado,
visam tão somente à melhoria das relações trabalhistas, trazendo dignidade e respeito á
execução do contrato de trabalho. Tal conceito representa efetivo avanço no Direito do
Trabalho, cuidando da qualidade das relações, contribuindo para que as pessoas se
conscientizern da importância de um bom ambiente de trabalho para o pleno
desenvolvimento do indivíduo.
O ato pode atentar contra a dignidade do trabalhador ou seus direitos, ou afetar a
sua saúde física ou mental (cumpre lembrar que o stress gera doenças), comprometendo a
carreira profissional.
Sendo verificado o assédio moral, é devida indenização a ser paga pela empresa e
que tem como base de cálculo o valor da remuneração do empregado, que é multiplicado
por dez, e que pode ainda ser dobrado se houver reincidência.
Também devem ser ressarcidas pela empresa as despesas médicas, caso a saúde
do trabalhador tenha sido afetada.
Ressalte-se que o nosso projeto tem a preocupação com os aspectos relacionados
à saúde do trabalhador, mas não se limita a isso. Deseja-se contribuir para a evolução das
relações do trabalho, enfocando a dignidade do trabalho e a garantia dos direitos
fundamentais.
É responsabilidade do empregador tomar todas as providências para evitar o
assédio. Se não forem adotadas, sujeita-se o empregador à multa no valor de R$ 3.000,00
por empregado, valor que pode ser acrescido de 50% em caso de reincidência.
A presente proposta teve inspiração na lei francesa, com as alterações que
julgamos cabíveis, tanto de técnica legislativa como de contexto, adequando ao
ordenamento jurídico brasileiro.
O prejuízo causado pelo assédio moral para o mundo do trabalho e para a
sociedade em geral pode ser evitado mediante a adoção de medidas educativas. É
exatamente o que pretendemos ao conceituar o assédio como ilícito trabalhista. Talvez
aqueles que o pratiquem percebam a gravidade de seus atos e o alcance negativo na vida
do trabalhador.
Diante do exposto, contamos com o apoio de nossos ilustres Pares a fim de aprovar
o presente Projeto de Lei, que certamente marcará a evolução das relações de trabalho no
Brasil.
Sala das Sessões, em de fevereiro de 2007.
Deputado DR. ROSINHA
153
ANEXO G
REPERCUSSÕES DA HUMILHAÇÃO NA SAÚDE, SEGUNDO O SEXO
154
Tabela – Repercussões da humilhação na saúde, segundo o sexo.
Queixas/sintomas/diagnósticos
M
494= 56,8%
%
H
376= 43,2%
% TOTAL
870(42%)
*
%
Irritação 444 90 263 70 707 81,3
Dores generalizadas e esporádicas 396 80 300 80 696 80
Raiva 277 56 376 100 653 75
Vontade de vingar-se 247 50 376 100 623 71,6
Alterações do sono 344 696,6 239 63,6 583 67
Medo exagerado 494 100 86 23 580 66,6
Sensação de piora das dores pré-
existentes
440 89 120 32 560 64,4
Manifestações depressivas 296 60 263 70 559 64,2
Palpitações, tremores 395 80 150 40 545 62,6
Tristeza 494 100 35 9,3 529 61
Sensação de inutilidade 356 72 150 40 506 58
Mágoas 494 100 9 2,4 503 57,8
Vontade de chorar por tudo 494 100 - - 494 56,8
Sentimento de revolta 83 17 376 100 459 52,7
Pensamentos de suicídio 80 16,2 376 100 456 52,4
Vergonha dos filhos 53 10,7 376 100 429 49,3
Pensamentos confusos 277 56 135 36 412 47,3
Indignação 35 7 376 100 411 47,2
Aumento da pressão arterial 197 40 194 51,6 391 45
Desespero/preocupação 345 70 32 8,5 377 43,3
Diminuição da libido 296 60 56 15 352 40,4
Omissão da humilhação aos
familiares
11 2,2 338 90 349 40
Cefaléia (dor de cabeça) 197 40 125 33,2 322 37
Desencadeamento da vontade de
beber
24 5 237 63 261 30
Enjôos, distúrbios digestivos 197 40 56 15 253 29
Sensação de que foi encanado e
traído
82 16,6 157 42 239 27,5
Sensação de que foi desvalorizado 56 11,3 150 40 206 23,7
Decepção, desânimo 67 13,6 131 35 198 22,7
Vontade de ficar só 13 2,6 180 48 193 22
Insegurança 67 13,6 112 30 179 20,6
Sentimento de desamparo 148 30 20 5,3 168 19,3
Falta de ar (dispnéia) 49 10 112 30 161 18,5
Dores no pescoço, MMSS 130 26,3 12 3,2 142 16,3
Dores constantes 95 19,2 38 10 133 15,3
Tonturas 110 22,3 12 3,2 122 14
Falta de apetite 67 13,6 8 2,1 75 8,6
Tentativa de suicídio - - 69 18,3 69 8
Dores nos MMlls 70 14 - - 70 8
Dores no peito - - 34 9 34 4
Fonte: Conversa Prolongada – CCP – STIQPF/SP (2000).
Corresponde ao universo de 2.072 trabalhadores/trabalhadoras entrevistados. (BARRETO, 2003, p.
217).
155
ANEXO H
RESOLUÇÃO CFM N. 1488/1998
156
RESOLUÇÃO CFM 1.488/98
Versa sobre normas específicas para médicos que atendam o trabalhador.
O Conselho Federal de Medicina, no uso das atribuições que lhe conferem a
Lei n. 3.268, de 30 de setembro de 1957, regulamentada pelo Decreto n. 44.045, de
19 de julho de 1958, considerando que o trabalho é um meio de prover a
subsistência e a dignidade humana, não deve gerar mal-estar, doenças e mortes;
— considerando que a saúde, a recuperação e a preservação da capacidade
de trabalho são direitos garantidos pela Constituição Federal;
— considerando que o médico é um dos responsáveis pela preservação e
promoção da saúde;
— considerando a necessidade de normalizar os critérios para o
estabelecimento do nexo causal entre o exercício da atividade laborai e os agravos à
saúde;
— considerando a necessidade de normalizar a atividade dos médicos que
prestam assistência médica ao trabalhador;
— considerando o estabelecido no artigo 1 inciso 4, artigo 6 e artigo7, inciso
XXII da Constituição Federal, nos artigos154 e 168 da Consolidação das Leis do
Trabalho, bem como as normas do Código de Ética Médica e a Resolução
CREMESP 76/96;
— considerando as recomendações emanadas da 12- Reunião do Comité
Misto OIT/OMS, realizada em 5 de abril de 1995, onde foram discutidos aspectos
relacionados com a saúde do trabalhador, medicina e segurança no trabalho;
— considerando a nova definição da medicina do trabalho, ado-tada pelo
Comité Misto OIT/OMS, qual seja: proporcionar a promoção e manutenção do mais
alto nível de bem estar físico, mental e social dos trabalhadores;
— considerando as deliberações da 49
a
Assembleia Geral da OMS, realizada
em 25.8.1196, onde foram discutidas estratégias mundiais para a preservação,
controle e diminuição dos riscos e das doenças profissionais, melhorando e
fortalecendo os serviços de saúde e segurança ligados aos trabalhadores;
— considerando que todo médico, independente da especialidade ou do
vínculo empregatício — estatal ou privado —, responde pela promoção, prevenção e
recuperação da saúde coletiva e individual dos trabalhadores;
157
— considerando que todo médico, ao atender seu paciente, deve avaliar a
possibilidade de que a causa de determinada doença, alteração clínica ou
laboratorial possa estar relacionada com suas ativi-dades profissionais,
investigando-a de forma adequada e quando necessário, verificando o ambiente de
trabalho;
— considerando, finalmente, o decidido em Sessão Plenária em 11 de
fevereiro de 1998;
RESOLVE:
Ari. 1º Aos médicos que prestam assistência ao trabalhador, independentemente de
sua especialidade ou local em que atuem, cabe:
I — assistir ao trabalhador, elaborar seu prontuário médico e fazer todos os
encaminhamentos devidos;
II — fornecer atestados e pareceres para o afastamento do trabalho sempre que
necessário, CONSIDERANDO que o repouso, o acesso a terapias ou o afastamento
de determinados agentes agressivos faz parte do tratamento;
III — fornecer laudos, pareceres e relatórios de exame médico e dar
encaminhamento, sempre que necessário, para beneficio do paciente e dentro dos
preceitos éticos, quanto aos dados do diagnostico, prognostico e tempo previsto de
tratamento. Quando requerido pelo paciente, deve o médico pôr à sua disposição
tudo que se refira ao seu atendimento, em especial cópia dos exames e prontuário
médico.
Art. 2- Para estabelecimento do nexo causal entre os transtornos de saúde e as
atividades do trabalhador, além do exame clinico (físico e mental) e os exames
complementares, quando necessários, deve o médico considerar:
I — a história clínica e ocupacional, virtualmente decisiva em qualquer diagnóstico
e/ou investigação de nexo causal;
II — o estudo do posto de trabalho;
III — o estudo da organização do trabalho;
IV — os dados epidemiológicos;
V — a literatura atualizada;
VI — a ocorrência de quadro clínico ou sub-clínico em trabalhador exposto a
condições agressivas;
VII — a identificação de riscos físicos, químicos, biológicos, mecânicos, estressantes
e outros;
158
VIII — os depoimentos e a experiência dos trabalhadores;
IX — os conhecimentos e as práticas de outras disciplinas e de seus profissionais,
sejam, ou não, da área da saúde.
Art. 3º Aos médicos que trabalham em empresas, independentemente de sua
especialidade, é atribuição:
I — atuar, visando essencialmente a promoção da saúde e prevenção da doença,
conhecendo, para isto, os processos produtivos e ambientes de trabalho da
empresa;
II — avaliar as condições de saúde do trabalhador para determinadas funções e/ou
ambientes, indicando sua alocação para trabalhos compatíveis com sua situação de
saúde, orientando-o, se necessário, no processo de adaptação;
III — dar conhecimento aos empregadores, trabalhadores, comissões de saúde,
CIPAS e representantes sindicais, através de cópias de encaminhamentos,
solicitações e outros documentos, dos riscos existentes no ambiente de trabalho,
bem como dos outros informes técnicos de que dispuser desde que resguardado o
Sigilo profissional;
IV — promover a emissão de Comunicação de Acidente do Trabalho, ou outro
documento que comprove o evento infortunístico, sempre que houver acidente ou
moléstia causada pelo trabalho. Essa emissão deve ser feita até mesmo na suspeita
de nexo etiológico da doença com o trabalho. Deve ser fornecida cópia dessa
documentação, ao trabalhador;
V — notificar, formalmente, o órgão público competente, quando houver suspeita ou
comprovação de transtornos da saúde atribuíveis ao trabalho, bem como
recomendar ao empregador a adoção dos procedimentos cabíveis,
independentemente da necessidade de afastar o empregado do trabalho.
Art. 4º São deveres dos médicos de empresa, que atendem ao trabalhador,
independentemente de sua especialidade:
l — atuar junto à empresa para eliminar ou atenuar a nocividade dos processos de
produção e organização do trabalho, sempre
que haja risco de agressão à saúde. Atuar, visando essencialmente a promoção da
saúde e prevenção da doença, conhecendo, para isto, os processos produtivos e
ambientes de trabalho da empresa;
II — promover o acesso ao trabalho de portadores de afeções e deficiências para o
trabalho, desde que este não agrave ou ponha em risco sua vida. Atuar, visando
159
essencialmente a promoção da saúde e prevenção da doença, conhecendo, para
isto, os processos produtivos e ambientes de trabalho da empresa;
III — opor-se a qualquer ato discriminatório impeditivo de acesso ou permanência da
gestante no trabalho, preservando-a, e ao feto, de possíveis agravos ou riscos
decorrentes de suas funções, tarefas e condições ambientais.
Art. 5
o
Os médicos do trabalho (como tal reconhecidos por lei) especialmente
aqueles que atuem na empresa como contratados assessores ou consultores em
saúde do trabalhador serão responsabilizados por atos que concorram para agravos
à saúde dessa clientela conjuntamente com outros médicos: que atuem na empresa
e que estejam sob sua supervisão, e os procedimentos que envolvam a saúde do
trabalhador, especialmente com relação à ação coletiva de promoção e proteção à
sua saúde.
Art. 6
o
São atribuições e deveres do Perito Médico de instituições providenciarias e
seguradoras:
I — avaliar a (in)capacidade de trabalho do segurado, através do exame clínico,
analisando documentos, provas e laudos referentes ao caso. Atuar, visando
essencialmente a promoção da saúde e prevenção da doença, conhecendo, para
isto, os processos produtivos e ambientes de trabalho da empresa;
II — subsidiar tecnicamente a decisão para a concessão de benefícios. Atuar,
visando essencialmente a promoção da saúde e prevenção da doença, conhecendo,
para isto, os processos produtivos e ambientes de trabalho da empresa;
III — comunicar, por escrito, o resultado do exame médico-peri-cial ao periciando,
com a devida identificação do perito médico (CRM, nome e matrícula). Atuar,
visando essencialmente a promoção da saúde e prevenção da doença, conhecendo,
para isto, os processos produtivos e ambientes de trabalho da empresa;
IV — orientar o periciando para tratamento quando eventualmente não o estiver
fazendo e encaminhá-lo para reabilitação quando necessário.
Art. 7
o
Perito-Médico Judicial é aquele designado pela autoridade judicial ou policial,
assistindo-a naquilo que a Lei determina.
Art. 8
o
Assistente-Técnico é o médico que assiste às partes em litígio.
Art. 9
o
Em ações judiciais, o prontuário médico, exames complementares ou outros
documentos, só podem ser liberados por autorização expressa do próprio assistido.
Art. 10 São atribuições e deveres do perito-médico judicial e assistentes técnicos:
160
I — examinar clinicamente o trabalhador e solicitar os exames complementares
necessários. Atuar, visando essencialmente a promoção da saúde e prevenção da
doença, conhecendo, para isto, os processos produtivos e ambientes de trabalho da
empresa;
II — o perito-médico e assistentes-técnicos ao vistoriarem o local de trabalho devem
fazer-se acompanhar, se possível, pelo próprio trabalhador que está sendo objeto da
perícia, para melhor co-nhecimento do seu ambiente e função. Atuar, visando
essencialmen-te a promoção da saúde e prevenção da doença, conhecendo, para
isto, os processos produtivos e ambientes de trabalho da empresa;
III — estabelecer o nexo causal, considerando o exposto no Artigo 4° e incisos.
Art. 11 Deve o perito-médico judicial fornecer cópia de todos os documentos
disponíveis para que os assistentes-técnicos elaborem seus pareceres. Caso o
perito médico-judicial necessite vistoriar a empresa (locais de trabalho e documentos
sob sua guarda), ele deverá informar, oficialmente, o fato, com a devida ante-
cedência, aos assistentes-técnicos das partes (ano, mês, dia e hora da perícia).
Art. 12 O médico de empresa, o médico responsável por qualquer Programa de
Controle de Saúde Ocupacional de Empresa e o médico participante do Serviço
Especializado em Segurança e Medicina do Trabalho, não podem ser peritos
judiciais, securitários ou previdenciários, ou assistentes-técnicos da empresa, nos
casos que envolvam a firma contratante e/ou seus assistidos (atuais ou passados).
Art. 13 A presente Resolução entrará em vigor na data de sua publicação
revogando-se as disposições em contrário.
Brasília, 11 de Fevereiro de 1998
Waldir Paiva Mesquita Presidente
António Henrique Pedrosa Neto Secretário-geral
Publicada no Diário Oficial da União de 6.3.1998, pág. 150.
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