para que não tenha razão seria preciso que reconstruíssemos as escolas. É êste esfôrço que se está
procurando aqui começar, senhor governador. Todo mundo sabe o que é educação. Qualquer pai ou
qualquer mãe pode vir dizer-nos que coisa difícil e precária é educar. Em nossas casas, todos
estamos vendo como, dia a dia, fica mais difícil exercer influência educativa sôbre os nossos filhos,
arrebatados, como nós próprios, na voragem de mudanças, mutações e transformações sociais sem
conta. Estas dificuldades se alargam, chegam à Igreja, chegam ao Estado e todos se sentem
diminuídos em suas fôrças e em suas respectivas autoridades. Só um educador profissional,
preparado para o mister, com tempo e sossêgo, em uma instituição especial, como a escola, poderá
arcar com a tremenda responsabilidade do momento e da época. Mas, está claro, esta instituição tem
que contar com meios à altura das dificuldades crescentes de sua função.
Daí esta escola, êste centro aparentemente visionário. Não é visionário, é modesto. O comêço que
hoje inauguramos é modestíssimo: representa apenas um têrço do que virá a ser o Centro completo.
Custará, não apenas os sete mil contos que custaram êstes três grupos escolares, mas alguns quinze
mil mais. Além disto, será um centro apenas para 4.000 das 40.000 crianças que teremos, no mínimo,
de abrigar nas escolas públicas desta nossa cidade. Deveremos possuir, e já não só êste, como mais
9 centros iguais a êste. Tudo isso pode parecer absurdo, entretanto, muito mais absurdo será
marcharmos para o caos, para a desagregação e para o desaparecimento. E de nada menos
estamos ameaçados. Os que estão, como cassandras, a anunciar e esperar a catástrofe e a
subversão, irão fazer as escolas que deixamos de fazer para a vitória do seu regime. Se o nosso, o
democrático, deve sobreviver, deveremos aparelhá-lo com o sistema educativo forte e eficaz que lhe
pode dar essa sobrevivência. A inauguração que, hoje, aqui se faz, alimenta essa esperança e essa
ambição. Bem sei que a ambição é desmedida, mas que medida tem a sobrevivência democrática?
Uma palavra ainda sôbre a organização do que estamos a chamar de Centro de Educação Popular,
organização em que apoiamos a nossa confiança em seu êxito.
Recordo-me que a construção dêste Centro resultou de ordem de V. Ex.ª, certa vez em que se
examinava o problema da chamada infância abandonada. Tive, então, oportunidade de ponderar que,
entre nós, quase tôda a infância, com exceção de filhos de famílias abastadas, podia ser considerada
abandonada. Pois, com efeito, se tinham pais, não tinham lares em que pudessem ser educados e
se, aparentemente, tinham escolas, na realidade não as tinham, pois as mesmas haviam passado a
simples casas em que as crianças eram recebidas por sessões de poucas horas, para um ensino
deficiente e improvisado. No mínimo, as crianças brasileiras, que logram freqüentar escolas, estão
abandonadas em metade do dia. E êste abandono é o bastante para desfazer o que, por acaso,
tenha feito a escola na sua sessão matinal ou vespertina. Para remediar isso, sempre me pareceu
que devíamos voltar à escola de tempo integral.
Tracejei, então, o plano dêste Centro que V. Ex.ª ordenou fôsse imediatamente iniciado. A escola
primária seria dividida em dois setores, o da instrução, pròpriamente dita, ou seja da antiga escola de
letras, e o da educação, propriamente dita, ou seja da escola ativa. No setor instrução, manter-se-ia o
trabalho convencional da classe, o ensino de leitura, escrita e aritmética e mais ciências físicas e
sociais, e no setor educação – as atividades socializantes, a educação artística, o trabalho manual e
as artes industriais e a educação física. A escola seria construída em pavilhões, num conjunto de
edifícios que melhor se ajustassem às suas diversas funções. Para economia tornava-se
indispensável que se fixasse um número máximo para a matrícula de cada centro. Pareceu-nos que
4.000 seria êsse número, acima do qual não seria possível a manipulação administrativa.
Fixada, assim, a população escolar a ser atendida em cada centro, localizamos quatro pavilhões,
como êste, para as escolas que chamamos de escolas-classe, isto é, escolas de ensino de letras e
ciências, e um conjunto de edifícios centrais que designamos de escola-parque, onde se distribuiriam
as outras funções do centro, isto é, as atividades sociais e artísticas, as atividades de trabalho e as
atividades de educação física. A escola-classe aqui está: é um conjunto de 12 salas de aula,
planejadas para o funcionamento melhor que fôr possível do ensino de letras e ciências, com
disposições para administração e áreas de estar. É uma escola parcial e para funcionar em turnos.
Mas virá integrá-la, a escola-parque. A criança fará um turno na escola-classe e um segundo turno na
escola-parque. Nesta escola, além de locais para suas funções específicas, temos mais a biblioteca
infantil, os dormitórios para 200 das 4.000 crianças atendidas pelo Centro e os serviços gerais e de
alimentação. Além da reforma da escola, temos o acréscimo dêsse serviço de assistência, que se
impõe, dadas as condições sociais. A criança, pois, terá um regime de semi-internato, recebendo
educação e assistência alimentar. Cinco por cento dentre elas receberão mais o internato. Serão as