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que constitui a reportagem, propriamente dita. Assim, averigua-se, ao longo do texto, a utilização
reiterada da voz passiva em detrimento da voz ativa, bem como, o emprego de verbos na terceira
pessoa do plural, de modo tal que há um ocultamento, duplamente observado, do indígena
enquanto autor da tessitura dos objetos convocados no texto. Vejamos, a seguir, dois exemplos:
1) “Com palha de várias espécies de palmeiras são traçados cestos de diferentes feitios e
tamanhos, cestos para guardar e transportar alimentos e outras tralhas”; 2) “Da argila são feitas
as panelas, as tigelas e os potes para cozinhar, servir e guardar comida, fogareiros e tachos para
guardar farinha e beiju” (RIBEIRO, 1987, s/p., grifos nossos). Dessa maneira, sobressai-se um
tipo de relação dialógica em que os elementos verbais corroboram os visuais e vice-versa.
Importante destacar que, no que diz respeito a esse tipo de relação dialógica, a qual é
bastante recorrente entre as formas verbais e as visuais de publicações centradas em divulgação
científica, constata-se, nessa reportagem em específico, em razão, sobremaneira, da inexistência
de legendas, que tais relações dialógicas são bastante incipientes, posto que não se nota uma
preocupação didática em ilustrar-se, de forma objetiva, cada um, ou parte dos objetos
mencionados no texto verbal, de maneira tal que o pequeno leitor, mesmo após a leitura integral
da reportagem, dificilmente terá uma ideia concreta dos objetos mencionados tanto na
materialidade verbal quanto na visual. Vale a pena informar que a falta de preocupação didática é
depreendida, ademais, pela utilização de substantivos - tal como tipiti
- certamente
desconhecidos pelas crianças às quais a revista é direcionada e que carecem de maiores
explicações no decurso da reportagem. “Também de palha são as peneiras, os abanos de fogo, o
tipiti”. (RIBEIRO, 1987, s/p -grifos nossos.)
Nesse sentido, é evidente que, entre as dimensões verbal e visual da R2/1987 (Casas e
tralhas de índios), estabelece-se, negativamente, uma relação dialógica de ratificação, haja vista
que tanto elementos verbais quanto visuais centram-se no mesmo conteúdo, ou seja, em objetos
confeccionados e utilizados pelos indígenas. Entrementes, faz-se necessário mencionar que se
observa tal ratificação, ademais, nas lacunas de informação constatadas em ambas dimensões: na
verbal há substantivos cujo significado não é esclarecido no decurso da reportagem; na visual, a
Verificam-se três acepções para a palavra tipiti no dicionário Houaiss: 1) cesto cilíndrico de palha em que se põe a
massa de mandioca para ser espremida; tapiti; 2) situação difícil, da qual não se pode sair com vantagem; aperto,
apuro, entalação; 3) jogo roubado, trapaça (Dicionário Eletrônico Houaiss da Língua Portuguesa, versão 3.0, edição
de 2009). Assim, no contexto da reportagem em análise, o vocábulo tipiti remete à primeira acepção.