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MARLENE TEDA PELZER
ASSISTÊNCIA CUIDATIVA HUMANÍSTICA DE ENFERMAGEM PARA
FAMILIARES CUIDADORES DE IDOSOS COM DOENÇA DE
ALZHEIMER A PARTIR DE UM GRUPO DE AJUDA MÚTUA
FLORIANÓPOLIS,
MARÇO DE 2005
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MARLENE TEDA PELZER
ASSISTÊNCIA CUIDATIVA HUMANÍSTICA DE ENFERMAGEM PARA
FAMILIARES CUIDADORES DE IDOSOS COM DOENÇA DE
ALZHEIMER A PARTIR DE UM GRUPO DE AJUDA MÚTUA
Tese de doutorado apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em enfermagem da Universidade Federal de
Santa Catarina para a obtenção do título de Doutor em
Enfermagem. Área de Concentração: Filosofia da Saúde
e Sociedade.
Orientadora: Dra. Lúcia Hisako Takase Gonçalves
Co-Orientadora: Dra. Valéria Lerch Lunardi
FLORIANÓPOLIS
Março de 2005
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Dedicatória
À minha querida mãe, Hildegard Willrich Pelzer, que, pela
primeira vez em minha vida, não pôde estar comigo, como
sempre esteve. Pelo exemplo de viver envelhecendo
dignamente e por todo amor compartilhado. Que falta senti
do teu apoio, da tua torcida!
Agradecimento Especial
Um agradecimento especial às famílias que participaram do
Grupo de Ajuda Mútua de Familiares Cuidadores de Idosos
com doença de Alzheimer em Rio Grande e que tornaram este
estudo possível. Meu agradecimento a todas que
contribuíram para que essa etapa desse certo. Obrigada!
Agradecimentos
À Prof. Dra. Lúcia Hisako Takase Gonçalves, orientadora deste
trabalho, profissional que admiro, pelo apoio incansável, tanto nos
momentos de fragilidade quanto de alegria. Pelo exemplo, pela
determinação, pela competência, pela sabedoria que só os grandes e
verdadeiros mestres sabem compartilhar.
À Prof. Dra. Valéria Lerch Lunardi, co-orientadora deste trabalho.
Pela competência, pelo afeto e pelo acolhimento à minha proposta de
trabalho.
Aos professores Ângela Alvarez, Alacoque Lorenzine Erdman,
Mercedes Trentini, Silvia Maria Azevedo dos Santos, Ceres Ferretti
e Célia Caldas, que se dispuseram a examinar este trabalho,
enriquecendo-o com suas contribuições.
Ao Prof. Dr. Selvino Assmann, do Departamento de Filosofia da
UFSC. Com seu brilhante espírito questionador, compartilhou ricos
momentos de reflexão acadêmica na turma de doutorado, até mesmo em
encontros informais enriquecidos com chimarrão e vinho gaúcho.
À Juliana, amigona do peito, parceira de sonhos e projetos desde o nosso
primeiro dia do doutorado. Que bom que nossos caminhos tenham se
cruzado em Florianópolis.
Aos colegas do doutorado, turma 2001, amigos e parceiros de tantos
estudos, encontros e companhia bem humorada. Obrigada em especial à
Adriana, à Maira, à Edilza, à Ceres e ao Raul, à Valéria, à
Marinelli, à Suzana e ao Theo. Vocês fizeram a diferença!
Aos amigos do peito, Clarisse, Paulo Abreu e Aninha, Cristina, César
Cordazzo e Bianca e Maria Ângela Yunes, amigos do cotidiano em
Rio Grande. Vocês são especiais!
Às amigas de fé e de parceria em tantos projetos, Ângela, Geane e
Helena. Pelo apoio e carinhosa torcida.
À Cecília, à Eliete e à Marta, da Casa do Professor Aposentado
(FUCAPRO). Por tornarem meus dias em Floripa mais familiares e
aconchegantes.
Aos colegas do Departamento de Enfermagem da
FURG, em especial à
Jaqueline, à Kátia, à Mara, à Marta Vaz, à Rose, à Valéria e à
Silvana.
À Cármen Vivian, à Marta e à Gabriela, que com suas mãos mágicas
aliviaram meu cansaço físico e contribuíram para o meu bem-estar.
PELZER, Marlene Teda. Assistência cuidativa humanística de enfermagem para
familiares cuidadores de idosos com doença de Alzheimer a partir de um grupo de ajuda
mútua. Florianópolis, 2005, 132 f. Tese (Doutorado em Enfermagem) – Universidade Federal
de Santa Catarina, Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, 2005.
RESUMO: O desenvolvimento de uma assistência cuidativa de enfermagem para família
cuidadora de idoso com doença de Alzheimer baseada nas concepções da teoria humanística
de Paterson e Zderad (1979) e nos princípios vitais de saúde usuários centrados de Merhy
(1997) foi o objeto da presente tese. A metodologia adotada para o estudo da referida
assistência cuidativa recaiu sobre a modalidade de Pesquisa Convergente-Assistencial que
propicia o desenvolvimento concomitante do estudo do objeto, neste caso a assistência de
enfermagem, com execução experimental dessa mesma assistência. Essa assistência
concebida como uma tecnologia leve de cuidado de saúde preconizado por Merhy, constituiu-
se desde a formação do Grupo de Ajuda Mútua como ação da enfermagem, até o
desenvolvimento de ações cuidativas no interior do Grupo durante seus encontros periódicos
quinzenais, ao atendimento domiciliário, à consulta individual de enfermagem, ao
atendimento emergencial telefônico, ao encaminhamento a outros serviços ou setores, entre
outros. No desenvolvimento da tecnologia cuidativa os princípios vitais de um serviço de
saúde usuário-centrado foram observados: acesso, acolhimento, vínculo e encontro de
subjetividades e autonomização. Enquanto prática cuidativa de enfermagem guiada pela teoria
humanística contemplou orientações metodológicas, como desenvolvimento do meu
autoconhecimento como enfermeira para praticar o atendimento nesta circunstância
específica; desenvolvimento do conhecimento intuitivo do cuidador, buscando bases técnico-
científicas para a compreensão das suas necessidades de cuidado e saúde com vistas a um
melhor viver. Na assistência cuidativa de enfermagem ao familiar cuidador de idoso com
doença de Alzheimer emergiram os seguintes temas: a) o estudo da assistência: uma
construção convergente-assistencial e b) o processo de cuidado com orientação humanística e
usuário centrado, ramificando-se em b1) a minha preparação como enfermeira para vir a
conhecer a família cuidadora em sua situação particular; b2) a enfermeira respondendo às
necessidades da família cuidadora: partilhando habilidades cuidativas; b3) instrumentalizando
familiares acerca da doença de Alzheimer e b4) a assistência cuidativa grupal como um
potenciador de prática cidadã. A continuidade do funcionamento do Grupo de Ajuda Mútua,
dentre outros, constituiu-se não só em instância de assistência mais imediata de vida e saúde,
mas também de um espaço de desenvolvimento pessoal e fortalecimento enquanto grupo para
o encaminhamento de reivindicações e lutas políticas que façam valer os direitos de cidadania
tanto dos portadores quanto dos seus familiares.
PALAVRAS-CHAVE: Idoso. Doença de Alzheimer. Família cuidadora. Tecnologia leve.
Tecnologia cuidativa. Grupo de ajuda mútua.
PELZER, Marlene Teda. Nursing Humanistic Care Assistance for Family Caregiver of
elderly with Alzheimer Disease based on a Mutual Help Group. Florianópolis, 2005, 132f.
Thesis (Doctorate in Nursing) - Federal University of Santa Catarina, Program of Masters
degree in Nursing, 2005.
ABSTRACT: The development of a nursing care assistance for family caregiver of elderly
with Alzheimer disease based on the conceptions of the Paterson and Zderad humanistic
theory (1979) and on Merhy´s (1997) principles, was the object of the present study. The
methodology adopted for the study of the respective care assistance was based on the
assistance-convergent Research modality that furthers the concomitant development of the
object study, in this case, the nursing assistance with experimental execution of this
assistance. Such assistance conceived as a care nursing technology for family caregiver of
elderly with Alzheimer disease, a light health-care technology preconized by Merhy, reaches
from the formation of the mutual help group expressed as nursing action, up to the
development of care actions within the group along their periodic fortnight meetings, to home
attendance, to individual nursing appointments, the emergency phone consultations, and to
referral to other services or sectors, among others. In the development of the care technology,
the vital principles of a user-centered health service were observed: access, reception,
entailment and the meeting of subjectivities and autonomous living. While nursing care
practice guided by the humanistic theory, methodological orientations were contemplated,
seeking to develop the author´s self-knowledge as a nurse for the practice of assistance under
these specific circunstances; also, the development of a caregiver’s intuitive knowledge,
searching for technical-scientific bases to better understand care and health needs turned to a
better living. In nursing care assistance to the family member caregiver who looks after an
Alzheimer patient, the following themes were debated: a) the study of assistance: a
convergent assistance construction; b) the care process having humanistic orientation and and
user-centered, branching into b1) preparation as a nurse to assess the caring family in their
particular situation; b2) the nurse answering to the needs of the caregiver family; the sharing
of care activities; b3) the instrumentation of family members about Alzheimer´s; and b4)
group caring assistance to strengthen citizenship practices. The continuous functioning of the
Mutual Help Group, among others, represented not only a more immediate life and health
assistance, but also a space for personal development and strengthening as a group seeking to
bring up claims and political struggles to validate citizenship rights both of patients and their
family members.
KEYWORDS: Elderly. Alzheimer disease. Family caregiver. Caring technology. Mutual
help group.
PELZER, Marlene Teda. Asistencia cuidativa humanistica de enfermería para los
cuidadores de ancianos con enfermedad de Alzheimer de un grupo de ayuda mutua.
Florianópolis, 2005, 132f. Tesis (Postgrado en Enfermería) - Universidad Federal de Santa
Catarina, Proyeto de Postgrado en Enfermería.
RESUMEN: El desarrollo de una ayuda cuidativa de enfermería para la família cuidadora de
anciano con enfermedad de Alzheimer basada en los conceptos de la teoría humanistica de
Paterson y de Zderad (1979) y en los principios vitales de salud de Merhy (1997) fue el
objetivo de la actual tesis. La metodologia adoptada para el estudio de la referida ayuda
cuidativa bajo sobre la Investigación Convergente-Asistenciale que lo propicia el desarollo
concomitante de estudio del objeto, en esto caso la ayuda de enfermería con la ejecución
experimental de esta misma ayuda. Esta ayuda concebida como una tecnologia ligera del
cuidado de la salud elogiado por Merhy, constituido desde la formación del Grupo de Ayuda
Mutua como la acción de enfermería, hasta el desarrollo de acciones cuidativas en el interior
de Grupo durante su reunión quincenal periódica, a la consulta individual de enfermería, a la
atención emergencial telefónica, la guia a otros servicios o setores, entre otros. En el
desarrollo de la tecnologia cuidativa los principio vitales de un servicio de salud usuario-
centrado habian sido observados: acceso, abrigo, enlace y reunión de subjetividades e
autonomización. Mientras la pratica cuidativa de enfermería dirigido para la teoría
humanistica contemplaba orientaciones metodológicas como desarrollo de mi conocimiento
como enfermera para practicar la atención en esta circunstancia específica; desarrollo de
conocimiento intuitivo de cuidador, buscando las bases técnico-científica para la
comprensiónde sus necesidades del cuidado e salud con vistas a uno mejor vivir. En la ayuda
cuidativa de enfermería al cuidador del anciano com enfermedad de Alzheimer los temas
siguientes habían emergido: a) el estudio de la ayuda: una construcción convergente-
asistencial e b) el proceso del cuidado con orientación humanistica y usuario centrado,
ramificandose en b1) mi preparación como enfermera para venir conocer la família cuidadora
en situación particular; b2) la enfermera que contesta a las necesidades de la família
cuidadora: repartindo habilidades cuidativas; b3) enseñando familiares referente a la
enfermedad de Alzheimer y b4) la ayuda cuidativa grupal como un potenciador de la practica
ciudadana. La continuidad del funcionamento del Grupo de Ayuda Mutua, entre otras,
consistida no solamente de ayuda mas inmediata de vida y salud, pero tambiénde un espacio
de desarrollo personal y del fortamecimento mientra que el grupo para la guía de demandas y
de luchas políticas que hacen valer los derechos de ciudadanía de los portadores cuánto de sus
familiares.
PALABRAS-CLAVE: Anciano. Enfermedad de Alzheimer. Familia cuidadora. Tecnologia
ligera. Tecnologia cuidativa. Grupo de Ayuda Mutua.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................11
2 REVISÃO DE LITERATURA...........................................................................................21
2.1 Doença de Alzheimer: alguns estudos de incidência e suas conseqüências.................21
2.2 Alguns documentos normativos relativos à DA.............................................................25
2.3 A Família no contexto do cuidado...................................................................................33
2.4 Familiares cuidadores e suas demandas por apoio .......................................................37
2.5 Grupo de Ajuda Mútua....................................................................................................41
3 REFERENCIAL TEÓRICO-METODOLÓGICO..........................................................47
3.1 A Teoria Humanística de Paterson e Zderad.................................................................49
3.2 As concepções de Merhy acerca de Tecnologia Leve em Saúde...................................56
4 METODOLOGIA................................................................................................................61
4.1 Abordagem de pesquisa de natureza convergente-assistencial....................................61
4.2 Município de Rio Grande: o contexto do estudo ...........................................................64
4.3 Cuidados éticos de pesquisa e da prática .......................................................................65
4.4 Desenvolvimento da prática cuidativa............................................................................66
4.5 Obtenção e registro dos dados.........................................................................................69
5 PRÁTICA CUIDATIVA DE ENFERMAGEM AOS FAMILIARES CUIDADORES
DE IDOSOS COM DOENÇA DE ALZHEIMER
...............................................................72
5.1 O estudo da assistência: uma construção convergente-assistencial.............................72
5.2 O processo de cuidado com orientação humanística e usuário centrado....................82
5.2.1 A minha preparação como enfermeira para vir a conhecer a família cuidadora em
sua situação particular
............................................................................................................82
5.2.2 A enfermeira respondendo às necessidades da família cuidadora: partilhando
habilidades cuidativas
..............................................................................................................88
5.2.3 Instrumentalizando familiares acerca da doença de Alzheimer.................................106
5.2.4 A assistência cuidativa grupal como um potenciador de prática cidadã....................109
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................................118
REFERÊNCIAS ...................................................................................................................123
ANEXOS ...............................................................................................................................131
ANEXO 1 – Cópia do Termo de Consentimento Informado ...........................................132
1 INTRODUÇÃO
O aumento da população de pessoas idosas é um fenômeno mundial, tendo
assumido importância crescente no cenário de um país em desenvolvimento como o
Brasil, no qual há uma grande variação étnico-cultural e genética. O envelhecimento
populacional produz transformações profundas na sociedade, com mudanças
principalmente no perfil de demandas de políticas públicas, em especial nas áreas de
saúde e seguridade social.
O Brasil começou a apresentar um contingente expressivo de população idosa a
partir da década de 70, embora a população brasileira venha envelhecendo desde o
início da década de 60 (CHAIMOWICZ, 1998). Esse aumento da proporção de
pessoas idosas despertou o interesse dos pesquisadores a partir da década de 80
(KALACHE et al., 1987; BERQUÓ; LEITE, 1988), quando passaram a estudar as
mudanças em curso no país. Segundo o relatório de pesquisa do Conselho Estadual do
Idoso, o Rio Grande do Sul, devida suas características históricas, econômicas e
culturais, é o Estado brasileiro que tem a maior expectativa de vida, destacando-se dos
demais por apresentar um perfil epidemiológico e demográfico-sanitário diferente do
perfil nacional e similar ao dos países desenvolvidos (RIO GRANDE DO SUL, 1997).
No ano de 2000, a expectativa de vida ao nascer no Rio Grande do Sul para mulheres
era de 76,3 anos e de 71,9 anos para os homens (IBGE, 2000). Em Rio Grande,
município situado na região sul do Estado, com 183.461 habitantes, os dados
censitários de 2000 apontaram um percentual de 10,8% de pessoas com 60 anos ou
mais de idade, enquanto a média brasileira era de 8,6%, totalizando em números
absolutos 19.963 idosos.
A ocorrência do fenômeno do prolongamento da vida atingindo maior
quantidade de pessoas idosas eleva a incidência de enfermidades crônico-
degenerativas e incapacitantes, com possíveis conseqüências de dependência física,
cognitiva e social, e significativo impacto na sociedade. A atenção às pessoas em
condições crônico-degenerativas tem exigido novos recursos para maior investimento
12
na área de saúde, tornando-se cada vez mais relevante no âmbito da saúde pública.
Dentre as condições crônico-degenerativas, a demência é uma das mais
importantes causas de morbimortalidade. Nos EUA, as demências representam a
quarta causa de óbito na faixa etária compreendida entre 75 e 84 anos de idade, e a
terceira maior causa isolada de incapacidade e mortalidade (BROOKMEYER; GRAY;
KAWAS, 1998). Já no Brasil, em virtude principalmente do custo elevado da
investigação diagnóstica, há lacuna de dados epidemiológicos generalizadores,
dispondo-se até o momento de dados estatísticos limitados a alguns centros de estudo e
pesquisa.
Com o avançar da idade, as pessoas tornam-se mais vulneráveis às demências,
que em conjunto com as síndromes depressivas são os problemas mentais mais
prevalentes (GARRIDO; MENEZES, 2002). A demência é considerada “uma
síndrome adquirida na qual o prejuízo das habilidades cognitivas é severo, o suficiente
para interferir nas atividades sociais e ocupacionais costumeiras do indivíduo”
(GREEN, 2001, p.13), afetando sobremaneira sua qualidade de vida.
Dentre os distúrbios demenciais, a doença de Alzheimer (DA) é a causa mais
freqüente (EBLY et al., 1994), constituindo-se na síndrome do dano cognitivo
persistente. Heterogênea nos seus aspectos etiológico, clínico e neurológico, é
indiscutível seu impacto na sociedade, sendo atualmente considerada a epidemia do
século XXI. Agitação psicomotora, depressão, alucinações, delírios e outras alterações
psicopatológicas surgem ao longo da sua evolução, trazendo sofrimento não apenas ao
portador, mas também para a família cuidadora.
O interesse por parte dos pesquisadores em avançar no entendimento da DA só
ocorreu nos últimos vinte anos (MACHADO, 2002), embora Alois Alzheimer a tenha
descrito já em 1907. Provavelmente o envelhecimento da população mundial tenha
contribuído para sua inclusão em estudos recentes, devido aos elevados custos
relacionados ao atendimento de saúde dos portadores. O custo econômico de tal
demência é imenso e tem sido fonte de preocupação principalmente dos responsáveis
pela elaboração de políticas públicas sociais e de saúde.
No Brasil, atualmente, na área médica, pesquisas em relação à DA já dispõem
13
de alguns dados estatísticos populacionais, transversais, acerca de sua prevalência e
incidência no país, como os de Herrera et al. (2002) realizado em Catanduva (SP), e os
de Montaño et al. (2002) realizado em de São Paulo (SP). Em ambos os estudos, a
prevalência da demência foi de 7,15% para pessoas idosas com mais de 65 anos.
Outros estudos epidemiológicos guardam semelhança com os encontrados em estudos
escandinavos, americanos e canadenses (ANDERSEN et al., 1997; FILLENBAUM et
al., 1998; McDOWEL et al., 1994).
Ao realizar revisão de literatura usando as fontes Medline, Embase e Psychlist e
o acervo de publicações oficiais britânicas, Cooper (2002), do Instituto de Psiquiatria
de Londres, encontrou como ênfase nos estudos da DA o funcionamento de modelo
preventivo, similar ao desenvolvido para algumas formas de doenças crônico-
degenerativas. A implantação de serviços comunitários de suporte social e de cuidados
de enfermagem no domicílio dos idosos portadores de DA, por sua vez, tem-se
constituído em alternativa para as fases mais avançadas e de maior dependência, que
exigem medidas de suporte. Constatou também que a grande maioria dos idosos
portadores de síndrome demencial vive na comunidade, e, com o passar do tempo, tem
requerido auxílio de um cuidador para a realização de várias atividades da vida diária;
em geral, um familiar próximo.
Além de comprometer o idoso portador, a DA afeta de maneira ímpar a família,
exigindo-lhe novos ajustes em sua dinâmica de funcionamento e sobrecarregando
física e emocionalmente todos os membros. Alguns familiares assumem o encargo de
cuidar do idoso portador de DA, tarefa para a qual não receberam apoio nem preparo
ou treinamento específico, com subseqüente ônus físico, psicológico, social e
financeiro. Acumular o exercício do papel de cuidador com o desempenho de papéis
profissionais e familiares é altamente desafiador, requerendo atenção específica por
parte do poder público e da sociedade. Em revisão sistemática da literatura acerca da
sobrecarga sobre a vida do cuidador de pacientes com demência, Garrido e Almeida
(1999) encontraram quatorze estudos que apontam os transtornos de comportamento
presentes em pacientes dementados como importantes causas, tornam os cuidadores
mais vulneráveis ao desenvolvimento de quadros depressivos e de ansiedade. Como
até o presente momento ainda não há clareza quanto a serem os sintomas comporta-
14
mentais dos idosos dementados os responsáveis pelo impacto sobre a família, é
necessário investir em pesquisa.
Enquanto grupo ativo de consumo, a família do portador de DA está interessada
em tudo o que se relaciona com diagnóstico, prognóstico e cuidados recebidos por seu
membro idoso demenciado. As famílias requerem informações e necessitam de opções
viáveis para fazerem suas próprias escolhas, sem se sentirem culpabilizadas ou
penalizadas pelos profissionais e pelos serviços de saúde. Nesse sentido, Holroyd,
Turnbull e Wolf (2002) realizaram estudo que examinou a experiência de pacientes e
suas famílias quando recebem o diagnóstico de demência. Dos 57 familiares de
diversos grupos de apoio que responderam a um questionário acerca do diagnóstico de
demência, cerca de 50% relatou não ter recebido informações suficientes acerca da
doença. Para a maioria dos familiares, o diagnóstico e o prognóstico devem ser ditos
ao próprio paciente. Os autores sugeriram que os médicos devem envolver mais os
pacientes e suas famílias na revelação do diagnóstico e fornecer mais informações
acerca da demência.
Nesse contexto, as enfermeiras podem oferecer informações detalhadas e em
linguagem acessível acerca da doença e de sua longa trajetória, realizar o treinamento
dos cuidadores, orientar a execução das técnicas básicas de cuidado, participar do
planejamento da assistência e estimular no cuidador a aquisição de habilidades para
preservar o cuidado domiciliar a oferecer ao idoso. Ao trilhar por essa vertente, a
enfermeira irá deparar-se com as diversas formas de cuidar elaboradas pelas
respectivas famílias, condizentes com a cultura própria de crenças, simbolizações,
valores, significados, saberes e vivências.
Enquanto prestadora de cuidados ao seu familiar idoso com DA, a família
constitui-se em matriz cuidadora que merece apoio e valorização por parte dos
profissionais de saúde, representando sua importante aliada. A valorização e a
potencialização do processo de cuidar, conduzido pelas famílias, representam uma
contrapartida para o profissional de saúde trabalhar em parceria, atendendo-a como
cliente também em suas necessidades de saúde, reduzindo, assim, a vulnerabilidade
tanto dos idosos quanto dos seus familiares cuidadores. Dessa forma, é possível evitar
15
ou postergar a institucionalização desses idosos e orientar os cuidadores para que
possam lidar melhor com os desafios que a doença de Alzheimer impõe. Alvarez,
Gonçalves e Schneider (2002) ressaltam que o cuidado do idoso portador de DA
requer muito mais do que o atendimento fornecido pelos serviços de saúde, uma vez
que a família cuidadora torna-se também cliente, requerendo atenção específica,
principalmente apoio educativo e psicossocial para manter sua própria saúde e o
processo de tratamento e cuidados contínuos ao idoso doente. É oportuno lembrar que
a interdisciplinaridade imanente à gerontologia é o princípio mediador entre as
diferentes disciplinas que a compõem, requerendo que o profissional desenvolva
conhecimentos específicos voltados para o campo da velhice, uma vez que nenhuma
ciência consegue explicar a totalidade do objeto. Dessa forma, os conhecimentos
específicos de cada profissional, como o enfermeiro, o médico ou o assistente social,
por exemplo, são complementares e não concorrentes entre si.
A família nutre uma expectativa de receber ajuda por parte da sociedade e do
Estado, de disponibilização de formas eficazes de assistência como opção para o
atendimento à saúde, seja através de serviços de saúde, associações, organizações não-
governamentais e projetos de extensão, entre outros. Uma rede integrada pelo setor de
apoio formal e informal constituiria suporte social ao idoso dementado e sua família.
Nolan (2001a), pesquisador inglês, refere que em vários países desenvolvidos
que vivenciam o envelhecimento populacional há mais tempo, como Grã-Bretanha,
Escócia e Suécia, há tradição de organizações voluntárias que prestam auxílio aos
idosos, inclusive àqueles portadores de demências e suas famílias, somando-se aos
programas de ações públicas. Por sua vez, Claveirole, Mitchell e Whyte (2001)
relatam em seu artigo a trajetória da implantação em 1997, na Escócia, de uma rede de
enfermagem de família, que tem como objetivo fornecer apoio às iniciativas da
“enfermagem de família”, tanto na prática e na pesquisa quanto na educação. Tal rede
tem oferecido efetivo suporte, em parceria do sistema formal com o informal de saúde.
No Brasil, através da Portaria da Secretaria de Assistência à Saúde (SAS) n.
249, de 12 de abril de 2002, do Ministério da Saúde, foram criados dispositivos para
implantar Centros de Referência em Assistência à Saúde do Idoso no âmbito do
16
Sistema Único de Saúde (SUS). A Portaria SAS n. 703, de 12 de abril de 2002, institui
o Programa de Assistência aos Portadores da Doença de Alzheimer, que disponibiliza
medicação gratuita aos portadores, entre outros recursos (BRASIL, 2002).
O cuidado em domicílio ao idoso com DA e familiares, ainda se constitui
perspectiva recente e carente de estudos e de experiências práticas. O modelo clínico,
biomédico, ainda hegemônico, tende a focalizar mais a dimensão patológica da
situação. Contudo, é crescente o interesse em abordar o problema do aspecto
psicossocial, tão presente em famílias cuidadoras de idosos dementados. Investigações
por meio de abordagens qualitativas para ampliar o conhecimento sobre os eventos que
compõem os fenômenos, com base nas experiências dos sujeitos, têm aberto
perspectivas de buscar conhecimentos em múltiplas direções. No campo da saúde, a
busca por novas formas de apreensão, compreensão e explicação dos fenômenos é
essencial, dada a complexidade do processo saúde-doença. Estudos que utilizam a
perspectiva existencial humanista, por exemplo, vislumbram melhor compreensão
acerca do processo de cuidado e da relação entre cuidador e pessoa cuidada.
Durante a realização da minha dissertação de mestrado, ao acompanhar famílias
que possuíam membros idosos com alta dependência em função da doença de
Alzheimer, pude observar que esses familiares estavam sujeitos a constante carga de
tensão, levando-os à exaustão e ao desgaste físico e mental, enquanto desestruturavam
financeiramente (PELZER, 1993).
Hughes, Hope, Savulescu e Ziebland (2002) afirmam que os estudos
fundamentados na abordagem qualitativa são os que permitem atingir a subjetividade
dos atores, fazendo emergir as variadas e complexas questões éticas dos cuidadores,
que devem ser estudadas A revelação de tais questões amplia o entendimento acerca
do cotidiano do familiar cuidador de idoso com DA, permitindo uma visão e uma
abordagem mais compreensiva do fenômeno.
O conjunto de publicações de pesquisa encontrado na literatura nacional é,
ainda, insuficiente para a compreensão desse fenômeno tão complexo. Lacunas de
conhecimento precisam ser preenchidas a favor de uma assistência adequada que
forneça apoio eficiente no enfrentamento da situação de vida, tanto para o portador de
17
DA quanto para a família.
A legislação vigente sobre atenção ao idoso portador de DA é recente,
requerendo o estabelecimento de prioridades de ações de saúde e cooperação entre os
diversos setores. Cabe à enfermagem redefinir sua prática assistencial, desenvolvendo
pesquisas que sinalizem para uma atenção efetiva, solidária, participativa. Nesse
contexto, a enfermagem deve participar da construção de práticas inovadoras que vão
ao encontro das reais necessidades de uma clientela em situação específica de vida e
saúde.
Trabalhos desenvolvidos sobre cuidadores de idosos, como os de Mendes
(1998); Creutzberg (2000); Andrade (2001); Alvarez (2001); Lima (2002); Santos
(2003); Coelho (2004) e Ferretti (2004) destacam entre seus achados a carência de
programas que respondam às demandas e à complexidade do processo de cuidar e ser
cuidado.
A assistência de enfermagem à família que experiencia o cuidado de seu
membro idoso em quadro demencial tipo DA é algo novo e um tanto desconhecido na
prática da enfermagem gerontogeriátrica brasileira, requerendo uma abordagem
especializada e específica, substituindo abordagens comumente praticadas com
qualquer paciente adulto em situação neuropsiquiátrica. Saber atuar nesse contexto,
acenando com novas possibilidades, que resgatem a sensibilidade e a subjetividade no
processo de cuidar em famílias de idosos portadores de DA, desafia-nos enquanto
enfermeiras inseridas num cenário de progressivo envelhecimento populacional.
O cuidado familial prestado ao idoso com DA constitui-se em uma arena
recentemente estudada pela enfermagem brasileira. Em sua tese, Caldas (2000) buscou
compreender o sentido do ser-cuidando de um familiar idoso que vive o processo de
demência. E apontou que a abordagem tradicional funcionalista, que busca eficiência e
eficácia através de atitudes prescritivas, em muito se beneficiaria com a
complementação da abordagem fenomenológica, que considera a dimensão existencial
dos seres envolvidos.
A Teoria da Prática da Enfermagem Humanística de Paterson e Zderad (1979),
que segue o paradigma da Escola de Interação, propõe que as enfermeiras abordem a
18
enfermagem consciente e deliberadamente como experiência existencial, isto é,
desenvolvendo-se com base nas vivências da enfermeira que cuida e do cliente que
recebe o cuidado. A prática da enfermagem humanística está vinculada ao pensamento
existencial, que considera o indivíduo como um ser único e a soma de todos os seus
compromissos, estando sempre num estado de vir a ser. Em tal perspectiva, Paterson e
Zderad (1979) entendem que a enfermeira tem a oportunidade de experimentar e
buscar com os clientes o significado da vida, do sofrimento e da morte e, neste
processo, ela e o cliente se tornam mais humanos. A minha escolha pela Teoria
Humanística de Paterson e Zderad como referencial teórico-metodológico para
conduzir a presente tese pode fornecer subsídios capazes de auxiliar a compreender a
complexidade da experiência vivenciada pelos idosos portadores de Doença de
Alzheimer e por suas respectivas famílias.
Nesse sentido, os princípios da Teoria Humanística orientam-me para um olhar
sobre as ações de cuidado na enfermagem, em direção a um caminho a ser construído e
trilhado em conjunto com as famílias cujos idosos vivenciam um processo demencial.
Ao concluir o mestrado na UFSC, após desenvolver a dissertação sobre famílias
cujo familiar idoso era portador de DA, baseada na relação de ajuda de Travelbee
(PELZER, 1993), regressei à cidade de Rio Grande, onde constatei a ausência de
serviços que acolhesse e atendesse idosos em condições demenciais e suas famílias. A
existência de uma rede de suporte social e apoio para essas famílias pode dividir a
responsabilidade pelo cuidado no âmbito social, minimizando a sobrecarga a que são
submetidos.
O município do Rio Grande vem desenvolvendo algumas ações concretas voltadas
para a população idosa, tais como: Centro de Convivência do Idoso; Grupos de Idosos;
funcionamento do Conselho Municipal do Idoso, no qual a Fundação Universidade Federal
do Rio Grande (FURG) tem assento com dois representantes, e os Programas de Extensão
Universitária da FURG para as pessoas idosas. Contudo, na área da saúde propriamente
dita, não existe ainda instituído serviços de assistência geriátrica.
Nos últimos anos, acadêmicos de enfermagem têm mostrado interesse em
realizar seus trabalhos monográficos de conclusão de curso, assim como desenvolver
19
estudos tendo como foco idosos portadores de DA. Atualmente, o Curso de
Enfermagem da FURG passa por uma reestruturação curricular, na qual se incluiu uma
disciplina optativa na área do envelhecimento humano, ofertada pela primeira vez em
2005. A combinação da necessidade curricular com o interesse espontâneo dos alunos,
são fatores que contribuem para o despontar de interesses comuns nos quais emerge a
importância do conhecimento acerca da doença de Alzheimer em uma sociedade com
um aumento significativo da população idosa. O fato de ter participado na formação de
um grupo de ajuda mútua em Florianópolis ao final do mestrado, fez-me aproximar
dessa modalidade de trabalho, constituindo-se na fonte de aprendizagem inicial. Por
ocasião da realização do doutorado, iniciado em 2001, tive meu interesse renovado em
continuar investindo nessa modalidade de atendimento, desta feita, no município de
Rio Grande, onde anteriormente já havia tido a oportunidade de realizar
acompanhamento de famílias envolvidas com o cuidado do idoso com DA, mas sem
ainda ter definido um referencial teórico-metodológico específico.
A complexidade de problemas suscitados pela doença de Alzheimer requer
respostas por parte dos serviços de saúde que considerem não somente os aspectos
clínicos, mas também os impactos sociais, psicológicos e econômicos associados.
Tendo em vista a minha trajetória no âmbito da enfermagem gerontogeriátrica e
apoiada na literatura pertinente que sinaliza para novos enfoques de assistência,
considerei relevante ensaiar uma prática cuidativa de enfermagem de enfoque
humanístico que contemplasse o acolhimento e o apoio à família cuidadora de idosos
com DA. Esta prática ou assistência cuidativa de enfermagem de enfoque humanístico
se apóia nos preceitos de Paterson e Zderad (1979), representando o encontro entre
sujeitos que podem construir uma relação saudável, compartilhando saber, poder e
experiência vivida. Pressupõe valorizar a dimensão subjetiva dos envolvidos, com o
estabelecimento de laços pessoais de intersubjetividade, na qual a enfermeira mantém
relações éticas e solidárias, menos verticalizadas e mais horizontalizadas, seja com o
idoso portador de DA, seja com o familiar cuidador. Nesse contexto, a enfermeira
presta assistência permeada pela sensibilidade para a escuta e o diálogo, amor e
respeito ao próximo, enfocando cuidado da saúde e o bem-estar em uma dimensão
ampliada, que não se restringe ao enfoque técnico e racional, constituindo-se em fonte
20
de apoio dos familiares e dos pacientes.
Dessa forma, busquei suporte em Merhy (2002), sanitarista que propõe um
novo modo de operar o trabalho em saúde, orientado pela construção de um vínculo
entre profissionais trabalhadores e usuários, na busca de garantir o acesso às ações de
saúde e na necessidade de acolhimento dos usuários aos serviços. A incorporação
dessa dimensão tecnológica, na qual é priorizada a produção de bens-relações,
constitui o universo das tecnologias leves envolvidas no trabalho em saúde.
Tecnologias leves para Merhy (2002) são as tecnologias implicadas com o
conhecimento da produção das relações entre sujeitos. Estão presentes no espaço
relacional profissional trabalhador-usuário e só se materializam em atos. São
componentes vitais da tecnologia leve de acesso ao serviço de saúde: o acolhimento, a
produção de vínculos e encontros de subjetividades e autonomização. Por permitirem
operar os processos relacionais entre o profissional trabalhador de saúde e o usuário,
representam uma ferramenta que viabiliza a concretização de um sistema de saúde
mais humanizado e comprometido com a vida das pessoas (MERHY, 2002).
Um Grupo de Ajuda Mútua foi formado para constituir-se no território ou
espaço intercessor de acolhimento dos familiares cuidadores de idosos portadores de
DA e assim processar a assistência requerida. Propus-me então realizar este estudo,
com a seguinte questão de pesquisa: Como desenvolver uma prática cuidativa de
enfermagem de enfoque humanístico junto à família cuidadora de idoso com
doença de Alzheimer que constitua uma tecnologia assistiva de acolhimento e
vínculo em serviço de saúde?
Considerando o contexto, o estudo pretendido teve por objetivo verificar a
viabilidade de desenvolvimento de uma prática cuidativa de enfermagem de
enfoque humanístico junto à família cuidadora de idoso com doença de
Alzheimer, tendo como instância principal as reuniões do Grupo de Ajuda
Mútua, lócus da realização das relações de cuidado. Este Grupo de Ajuda Mútua
aqui é adotado como o local principal de desenvolvimento de uma tecnologia leve de
acolhimento e de vínculo, através da qual se vislumbra articular pesquisa e assistência,
promovendo a relação de cidadania entre o usuário e o trabalhador de saúde.
2 REVISÃO DE LITERATURA
Apresenta-se aqui uma breve contextualização baseada na literatura de
pesquisas epidemiológicas como também de estudos da enfermagem brasileira relativa
às doenças demenciais no idoso e seu atendimento. Inclui também uma síntese
descritiva dos documentos normativos da área.
2.1 Doença de Alzheimer: alguns estudos de incidência e suas conseqüências
A rápida transição demográfica e epidemiológica, com significativas alterações
no quadro de morbi-mortalidade, faz sobressair às enfermidades complexas e mais
onerosas, típicas de faixas etárias mais avançadas. Tais enfermidades, na imensa
maioria das vezes, são crônicas, de evolução lenta, levando as pessoas idosas a um
maior consumo de serviços de saúde, além de apresentar repercussões significativas no
contexto familiar. Estudos populacionais como o realizado na cidade de São Paulo
(RAMOS et al., 1993) e o do Estado do Rio Grande do Sul, pelo Conselho Estadual de
Idosos do Rio Grande do Sul (1997), indicam que 85 % dos idosos apresentam pelo
menos uma doença crônica, e 10% portam até cinco patologias sobrepostas.
A demência, junto com incontinência urinária, instabilidade postural e quedas,
delírio e depressão constituem-se nos gigantes da geriatria (GORDILHO et al., 2000),
assim identificados por serem considerados eventos típicos da terceira idade e
apresentarem elevada taxa de prevalência. As demências representam significativo
problema de saúde pública pela sua evolução prolongada e complexidade de
manifestações funcionais, emocionais e conseqüências sociais, tanto para a pessoa
idosa afetada quanto para seus familiares cuidadores.
Em revisão de estudos epidemiológicos acerca da prevalência de demência na
22
América do Norte, América do Sul, Europa, Ásia e Oceania, compreendendo o período
de 1994 a 2000, Lopes e Bottino (2002) encontraram elevação das taxas de prevalência
à medida que a idade aumentava. Tal prevalência aumentou significativamente com a
idade, dobrando a cada cinco anos, a partir dos 65 anos.
O Brasil apresenta um dos mais acelerados processos de envelhecimento
populacional entre os países mais populosos, com mais de 15 milhões de pessoas com 60
anos de idade ou mais. Na análise que Veras (2002) realizou acerca desse contexto, o
grupo idoso apresenta maiores índices de morbidade em doenças crônicas e de déficits
físicos e cognitivos, quando comparados aos demais grupos etários. Entre os problemas de
saúde que acometem os idosos está a doença de Alzheimer e outras demências
irreversíveis, que se tornarão cada vez mais relevantes no âmbito da saúde pública.
De acordo com Machado (2002), a doença de Alzheimer (DA) é a causa mais
comum de demência em idosos, constituindo-se em uma doença cerebral degenerativa,
caracterizada por perda progressiva da memória e de outras funções cognitivas, que
prejudicam o portador em suas atividades de vida diária e em seu desempenho social e
ocupacional. Pelo impacto que opera sobre a qualidade de vida, tanto dos portadores
quanto dos familiares cuidadores, e por ocasionar dependência total de outras pessoas,
é considerada um dos maiores problemas de saúde pública da atualidade. Até o
momento, inexistem medicamentos que possam curar ou reverter os danos causados
pela DA. Os inibidores da acetilcolinesterase amenizam os sintomas da enfermidade,
enquanto a memantina, lançada recentemente no mercado brasileiro, retarda a morte
dos neurônios.
Gordilho et al. (2000) referem que as doenças como depressão e demência já
estão entre as principais causas de anos vividos com incapacidade em todo o mundo,
exatamente por levarem à perda da independência e quase que necessariamente à perda
de autonomia, elevando o consumo dos serviços de saúde por parte da população
idosa, com internações hospitalares mais freqüentes, estabelecendo novas prioridades e
novas ações de saúde.
Estudos populacionais de segmentos de idosos residentes em diferentes
comunidades (RAMOS et al., 1993) e estudos longitudinais prospectivos (BOULT et
23
al., 1994) revelam que tanto as doenças físicas quanto as mentais podem levar à
dependência e, conseqüentemente, à perda da capacidade funcional. A dependência
física e mental constitui fatores de risco significativos para a mortalidade, mais
relevantes até que as próprias doenças que levaram à dependência, visto que nem todo
doente se torna dependente.
O interesse dos pesquisadores em avançar no entendimento da DA só ocorreu
nos últimos vinte anos (MACHADO, 2002), embora Alois Alzheimer a tenha descrito
já em 1907. Provavelmente o envelhecimento populacional mundial tenha contribuído
para sua inclusão em estudos recentes, além dos custos relacionados com o tratamento
dos portadores. O custo econômico de tal demência é elevadíssimo e tem sido fonte de
preocupação, principalmente dos responsáveis pela elaboração de políticas públicas
sociais e de saúde. No Reino Unido, por exemplo, Lowin, Knapp e McCrone (2001),
do Centro Econômico em Saúde Mental, realizaram levantamento acerca dos fundos
de pesquisa destinados para a DA e outras três doenças: acidente vascular cerebral
(AVC), infarto agudo do miocárdio (IAM) e câncer. Os custos diretos com a DA
situavam-se entre 7,06 e 14,93 bilhões de libras esterlinas, quantia substancialmente
maior do que a destinada ao AVC (3,2 bilhões de libras esterlinas), ao IAM (4,05
bilhões de libras esterlinas) e ao câncer (1,6 bilhões de libras esterlinas). Os gastos em
pesquisa com doença de Alzheimer foram 57% a mais do que com AVC, 10% a mais
do que com ataque cardíaco e 3% a mais do que com câncer. Já nos Estados Unidos,
onde 2,2 milhões de pessoas foram diagnosticadas com DA, com significativo impacto
no sistema público de cuidado de saúde, o empenho em tornar a progressão da doença
mais lenta pode reduzir o custo mensal de serviços formais em mais de US$
2000/paciente (TARIOT, 2003). Cerca de US$ 36 bilhões/ano são consumidos nos
EUA, em que 79% desses custos são consumidos pela perda de produtividade,
absenteísmo e custos com recolocação de familiares que tem que cuidar dos portadores
(WEINBERG, 2004). Na Austrália, em 2003, os custos indiretos com portadores de
demência, relacionados ao sistema de saúde, alcançou US$ 1,7bilhões, enquanto que
os custos diretos, relacionados ao ônus da família, representaram US$ 3,2 bilhões
(REES, 2004). Dessa forma, postergar o início da DA apenas por um ano pode resultar
em uma redução nos custos sociais anuais de cerca de US$10 bilhões até dez anos
24
após o início da intervenção, reduzindo significativamente o ônus para o sistema de
saúde. Esses estudos de custo da demência são úteis para entender a carga econômica
da doença sobre pacientes, famílias, sistema de saúde e sociedade em geral.
No Brasil, são poucos os estudos epidemiológicos realizados em pessoas com
60 anos ou mais em relação à prevalência da DA, não se dispondo de dados
atualizados de abrangência nacional. Ainda que sejam esparsos os dados
epidemiológicos, os valores encontrados nos poucos estudos disponíveis são similares
aos achados em estudos americanos e canadenses (FILLENBAUM et al., 1998;
McDOWEL et al., 1994). Mais recentemente, começaram alguns estudos, como o de
Nitrini et al. (1995). Ao avaliar 100 pacientes ambulatoriais com demência, os autores
constataram que a DA foi a causa principal de demência, representando 54% da
etiologia dos casos.
Engelhardt et al. (1998) realizaram rastreamento cognitivo de 292 idosos
institucionalizados no Rio de Janeiro, utilizando o Miniexame do Estado Mental com
escores de corte diferenciados em função de escolaridade e constataram comprome-
timento cognitivo em 52,4%. Estudos de incidência, por sua vez, fornecem dados mais
precisos, mas são mais difíceis de realizar porque exigem a fase inicial de avaliação e
pelo menos uma reavaliação alguns anos mais tarde. Ramos et al. (1998) têm
acompanhado desde 1991 uma coorte de 1667 idosos no domicílio e em ambulatório
na cidade de São Paulo, mas seus resultados finais não foram publicados.
A trajetória da doença na demência do tipo Alzheimer é representada por um
declínio, com perdas ocasionais de estabilidade, levando inevitavelmente a uma profunda
deterioração cognitiva e finalmente à morte. A avaliação do estado mental por meio de
uma escala de graduação cognitiva padronizada, o Miniexame do Estado Mental -
MEM, filtra o prejuízo cognitivo e a severidade da demência. O MEM, de Folstein,
Folstein e McHugh (1975) foi recentemente adaptado para a população brasileira por
Brucki et al. (2003) com escores adequados de acordo com a escolaridade
(BERTOLUCCI et al., 1994). Contém diversos itens que permitem examinar a
orientação temporal e espacial, memória de fixação, atenção e cálculo, linguagem,
apraxias (dificuldade de fazer atividades gestuais, de construção e de raciocínio) e
25
habilidades construtivas, perfazendo um escore máximo de trinta pontos. Escores
menores que vinte e quatro são tipicamente interpretados como sugestão de algum
grau de demência. Por sua brevidade e facilidade de administração, é a escala mais
utilizada por profissionais da saúde gerontogeriátrica e pesquisadores.
Por tratar-se de uma doença progressiva, a DA envolve uma série de perdas diante
das quais os membros da família as antecipam e sofrem a cada fase de sua evolução, tendo
que reorganizar o núcleo familiar no sentido de redefinir papéis e responsabilidades.
2.2 Alguns documentos normativos relativos à DA
Os países diferem grandemente na capacidade de responder a novas
necessidades de segmentos populacionais específicos. O envelhecimento tal qual a
saúde, é silencioso, não o percebemos na sua plenitude, na maior parte das vezes
apenas o identificamos quando adoecemos. A assistência à saúde de forma global e a
de enfermagem em particular não deve e não pode ignorar as dimensões: social,
econômica, cultural e política no cotidiano das pessoas em processo de
envelhecimento, com o risco de adotar apenas medidas assistenciais paliativas. Para
isso, é fundamental observar como essa assistência têm-se efetivado na prática,
atrelando-a a um enfoque que transcende o diagnóstico e tratamento de doenças
específicas, no qual o cuidado ambulatorial, domiciliar, hospitalar e em instituições de
longa permanência (ILP) reflita zelo e respeito com o usuário idoso. A promoção da
qualidade de vida do idoso dependente - em estágios avançados de DA - e dos que o
estão cuidando, é meta a ser alcançada, desafiando os profissionais e toda a sociedade.
Nesse sentido, a informação correta e o conhecimento prévio das possíveis
mudanças relacionadas à progressão da DA são de grande importância para um
planejamento efetivo e para avaliar os serviços que atendem tal segmento. Nos Estados
Unidos, por exemplo, a viabilidade de oferecer educação pública e acesso a recursos
na área da DA e outras demências foi estudada, usando um sistema telefônico gratuito
26
interativo de voz. O interesse do público no serviço foi avaliado em estudo conduzido
por Mundt, Kaplan e Greist (2001), em área predominantemente rural. Das 193
chamadas recebidas, com média de nove minutos de duração, um terço aconteceu fora
do período comercial. Preocupação com um familiar, não necessariamente idoso, foi a
razão mais freqüente de chamadas, enquanto a própria saúde foi indicada por 24,75%
das pessoas. Para os autores, essa tecnologia pode oferecer uma alternativa às pessoas
com baixo poder socioeconômico e usuárias de computador e de internet nos EUA. A
vantagem do anonimato, a disponibilidade por vinte e quatro horas ao longo de sete
dias da semana e o baixo custo, dão a essa tecnologia o caráter de ferramenta útil para
oferecer educação ao público sobre as demências.
No Brasil, por sua vez, a Associação Brasileira de Alzheimer (ABRAz),
entidade jurídica sem fins lucrativos criada em 1991, estruturada com base em
diretrizes de organização não-governamental (ONG) e centro de informações sobre a
doença de Alzheimer, oferece atendimento gratuito em horário comercial também por
telefone. Através do serviço telefônico 0800, patrocinado por um laboratório de
medicamentos, voluntários respondem aos questionamentos dos familiares,
possibilitando ao público leigo acesso a informações atualizadas. A ABRAz é
administrada por profissionais da área da saúde e familiares de portadores da DA, que
buscam transmitir informações sobre diagnóstico e tratamento e também orientações
sobre os aspectos cotidianos do acompanhamento do portador. Dentre suas inúmeras
atividades se incluem, além do serviço telefônico gratuito, reuniões mensais de grupos
de apoio, edição de boletim informativo, site na internet, organização de eventos sobre
a DA e cursos específicos para cuidadores leigos (ABRAz, 2003).
A família contemporânea tem sido obrigada a assumir o cuidado de seus idosos
fragilizados, representando a principal fonte de suporte. A própria Constituição
Brasileira (1988, p. 26), no artigo 230, determina que a família, a sociedade e o Estado
têm o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na
comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida.
Segundo Carter e McGoldrick (1997), as mulheres sempre foram figuras centrais no
funcionamento da família, cabendo-lhes considerável responsabilidade como
cuidadoras dos membros mais vulneráveis: as crianças, os doentes e os idosos.
27
Em 1994, ao promoverem o Ano Internacional da Família (AIF), as Nações
Unidas estimularam um processo de mobilização ética, social e política no Brasil,
fazendo frente à posição periférica da família no movimento social brasileiro, numa
tentativa de considerá-la como prioridade política. Aquele Ano Internacional da
Família assinalou também o momento brasileiro de oficialização da família enquanto
foco do cuidado profissional de saúde em atenção básica através do Programa Saúde
da Família (BRASIL, 1997).
Para Kaloustian (1994), os estudos sobre a família brasileira e trabalho social
têm-se expandido na última década. Carvalho (1994), por exemplo, em artigo sobre a
priorização da família na política social brasileira, assinala como sendo um canal de
iniciação e aprendizado dos afetos e das relações sociais. Ressalta a necessidade de
organizar em rede
1
as inúmeras iniciativas de apoio socioassistencial voltadas para a
família, dotando-a de infra-estrutura adequada. A existência de situações especiais de
risco, tais como desemprego crônico, separação e maus-tratos, entre tantos outros
agravos presentes em muitas famílias, tornam-nas incapazes de articular minimamente
os cuidados de seus membros, requerendo atenção específica do Estado para garantir
os direitos de cidadania dos seus membros, como os idosos, por exemplo.
Lidar com a doença crônica de um de seus membros ou qualquer outro evento
estressante e disruptivo, - como alcoolismo, Aids e demência geram tensão e
preocupações na família, impondo-lhe a iniciativa de elaborar seu próprio plano de
intervenção para enfrentar as exigências de determinado membro com problemas,
reajustando e adaptando papéis familiares, uma vez que ela própria pode tornar-se
fragilizada ao longo da trajetória (CARTER; McGOLDRICK, 1997).
Ao Estado compete promover e manter políticas públicas de serviços de
qualidade, com normatização, assessoria e controle. No Brasil a preocupação com
políticas sociais de atenção ao idoso é bastante recente. Em artigo no qual realiza uma
retrospectiva histórica acerca da Política Nacional do Idoso (PNI), Rodrigues (2001)
lembra que até a década de 70 o trabalho realizado com idosos em nosso país era de
1
Aqui entendida como grupos hierarquizados de pessoas que mantêm entre si laços e relações de dar e receber
(CHAPPEL, 1993).
28
cunho caritativo, ficando ao encargo de ordens religiosas.
Como participante ativa à época da elaboração da Política Nacional do Idoso,
Rodrigues (2001) retoma a trajetória percorrida, lembrando que o esforço de
segmentos específicos do governo e de entidades representativas de idosos, como o
Conselho Estadual do Idoso do Rio Grande do Sul, a Associação Nacional de
Gerontologia (ANG), a Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG)
mobilizaram a sociedade em busca do cumprimento de normativas internacionais, com
destaque para primeira Assembléia Mundial sobre Envelhecimento ocorrida em Viena,
na Áustria, em 1982. De acordo com Camarano (2004), essa primeira Assembléia
Mundial sobre Envelhecimento, enquanto marco inicial para o estabelecimento de uma
agenda internacional de política pública para a população idosa, resultou na aprovação
de um Plano Internacional de Ação estruturado em sessenta e seis recomendações para
os estados-membros referentes a sete áreas: saúde e nutrição, proteção ao consumidor
idoso, moradia e meio ambiente, família, bem-estar social, previdência social, trabalho
e educação. O conjunto das entidades aqui citadas e o Plano de Viena constituíram-se
no arcabouço da minuta do Decreto-lei que disporia sobre a Política Nacional do Idoso
e a criação do Conselho Nacional do Idoso. Ao originar a Lei n
o
8.842, de 4 de janeiro
de 1994, regulamentada pelo Decreto-lei n
o
1.948, de 3 de julho de 1996, o país passou
a contar oficialmente com uma política pública direcionada à população idosa, que
prevê a promoção da sua autonomia, integração e participação efetiva na sociedade,
representando um passo no sentido de reconhecer a importância desse segmento etário
em expansão. Posteriormente, em 1997, foi elaborado o Plano Integrado de ação
governamental para o desenvolvimento da Política Nacional do Idoso, com a
participação de representantes da sociedade civil e dos nove Ministérios envolvidos:
Saúde, Educação, Previdência, Trabalho, Cultura, Planejamento, Esporte e Lazer,
Justiça e Indústria, Comércio e Turismo, verdadeiro marco legal no tocante à proteção
social do idoso.
Entretanto, o que está escrito no Decreto n
o
1.948/96 não tem sido executado
convenientemente, pois falta garantir a dotação de recursos financeiros para a
implantação e implementação da Política Nacional do Idoso (PNI). Essa dificuldade
também se deve às mudanças de governo, tanto no plano nacional quanto estadual, e à
29
eventual falta de vontade política por parte dos legisladores, configurando falta de
continuidade do Programa Governamental. Materializar em práticas as conquistas e
avanços estabelecidos no plano legal, legitimando a PNI, com programas densos e
contínuos no tempo, são ainda um desafio para a sociedade brasileira.
A Política Nacional de Saúde do Idoso (PNSI) Portaria Ministério da Saúde de
n
o
1.395/Gabinete Ministerial, de 10 de dezembro de 1999, instrumento de que o setor
de saúde passa a dispor, tem como propósito basilar:
a promoção do envelhecimento saudável, a preservação e/ou a melhoria, ao
máximo possível, da capacidade funcional dos idosos, a prevenção de
doenças, a recuperação da saúde daqueles que adoecem e a reabilitação
daqueles que venham a ter a sua capacidade funcional restringida, de modo a
garantir-lhes permanência no meio em que vivem, exercendo de forma
independente suas funções na sociedade (BRASIL, 1999, p. 21).
Observa-se, entretanto, um evidente descompasso entre a PNSI e a assistência
oferecida à população na rede básica de saúde, cujos cargos profissionais não exigem,
em sua grande maioria, qualificação na área de geriatria/gerontologia.
2
Embora a
Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG) promova anualmente exame
para obtenção do título de Especialista, e inúmeros cursos de pós-graduação de
reconhecida qualidade acadêmica estejam disponíveis, há carência de profissionais
com treinamento especializado em envelhecimento humano. Pode-se afirmar que este
é o cenário atual da realidade brasileira, pois tanto a Gerontologia quanto a Geriatria
são especialidades em construção. Ao abordar a questão do profissional de saúde que
assiste o idoso, Veras (2002) enfatiza que na área médica, por exemplo, a SBGG
reconhece pouco mais de 500 médicos como especialistas em geriatria. A escassez em
gerontogeriatria dos profissionais de saúde requer uma urgente expansão da educação
para capacitar e formar recursos humanos destinados a assistir a população idosa.
É possível constatar no país o dilema em termos de política de saúde para
atender às necessidades das faixas etárias: jovem, madura e idosa, todas demandando
recursos e serviços, uma vez que se convive com os perversos efeitos sociais da crise
2
Geriatria: ramo da ciência médica voltada à promoção da saúde e tratamento de doenças e incapacidades na
velhice. Gerontologia: área do conhecimento científico voltado par o estudo do envelhecimento em sua perspectiva
mais ampla, em que são considerados não apenas os aspectos clínicos e biológicos, mas também as suas condições
e determinações psicológicas, sociais, econômicas e históricas (GORDILHO et al., 2000, p.49-50).
30
econômica. O recurso ao sistema oficial de assistência comumente se revela
inacessível, frustrante e ineficaz, comprometendo os padrões de saúde e da qualidade
de vida da população usuária do SUS, sem garantir-lhe a acessibilidade universal. A
população idosa, particularmente mais vulnerável às condições de pobreza e à
desigualdade social, vivencia tal realidade mais intensamente. Existe ainda uma
incipiente distribuição dos serviços e facilidades para o estrato populacional que mais
cresce em nosso país e que apresenta uma proporção maior de agravos e necessidade
de procedimentos médicos em comparação com os demais grupos etários, implicando
maior utilização dos serviços de saúde e, conseqüentemente custos mais elevados
(VERAS, 2002).
A clientela idosa demanda atenção e cuidado nos diferentes contextos em que se
encontra: na instituição hospitalar, em instituições de longa permanência (ILP), nas
unidades básicas de saúde (UBS) ou na família. Com certa freqüência, tal segmento
não recebe a devida assistência por parte dos prestadores públicos.
Recentemente, o Ministério da Saúde lançou a Portaria da Secretaria de
Assistência à Saúde (SAS) 249, de 12 de abril de 2002, que cria os mecanismos para a
organização e implantação de Redes Estaduais de Assistência à Saúde do Idoso e as
respectivas Normas para Cadastramento de Centros de Referência. Tais redes
estaduais de Assistência à Saúde do Idoso devem ser constituídas por hospitais gerais
que disponham de condições técnicas, instalações físicas, equipamentos e recursos
humanos adequados para prestar assistência à saúde dos idosos, de forma integral e
integrada, para serem autorizados a instalar e fazer funcionar o referido Centro de
Referência. Além da internação hospitalar, tais Centros devem dispor de ambulatório
especializado em saúde do idoso, hospital-dia geriátrico e assistência domiciliar de
média complexidade, além de ter a capacidade de se constituir em referência para a
Rede Estadual de Assistência à Saúde do Idoso (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2002). O
anexo II da Portaria aborda especificamente o tipo de assistência requerida pelos
portadores da Doença de Alzheimer, tanto no hospital-dia quanto na assistência
domiciliar.
A Portaria SAS 703, de 12 de abril de 2002, contempla especificamente a
31
Doença de Alzheimer, determinando que as secretarias estaduais de assistência à saúde
estabeleçam o Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas para seu tratamento,
incluindo as medicações comumente prescritas no rol dos Medicamentos
Excepcionais. A Portaria diz claramente que a aquisição dos medicamentos previstos
nesse Protocolo é de responsabilidade dessas secretarias, em conformidade com o
Programa de Medicamentos Excepcionais. As medidas públicas para a organização de
políticas de atendimento aos portadores e seus cuidadores apontam para uma
sensibilização progressiva do governo e da opinião pública. Ainda incipientes, essas
medidas vêm sendo implantadas paulativamente, principalmente nos principais
hospitais universitários. É esperado para um futuro próximo sua expansão para
diversos contextos geográficos, contemplando comunidades que com maior
concentração de portadores de DA.
O Programa Saúde da Família (PSF), oficialmente instituído pelo Ministério da
Saúde em março de 1994, constitui-se em importante política de cuidado comunitário
para a mudança do paradigma de atenção à saúde, centrado na doença, no hospital e no
modelo asilar. O modelo tradicional de atenção à saúde, associado a uma utilização
irracional dos recursos tecnológicos existentes, apresenta cobertura e resolutividade
baixas, tem limitada eficiência e elevado custo para o sistema de saúde. Por sua vez, o
Programa Saúde da Família, enquanto modelo de atenção à saúde da população,
estruturado de forma a melhorar o acesso aos serviços de saúde, fortalecendo
atividades como a atenção domiciliária
3
àqueles submetidos a situação de alto risco
sócio-sanitário, representa uma abordagem viável quando se almeja a atenção ao
idoso. Em suas bases, prioriza as ações de proteção e promoção à saúde dos indivíduos
e da família, tanto adultos quanto crianças, sadios ou doentes, de forma integral e
contínua, envolvendo os gestores do SUS nos três níveis de governo (federal, estadual
e municipal).
Tal programa, operacionalizado a partir das Unidades Básicas de Saúde (UBS),
tem como ponto central o estabelecimento de vínculos e a criação de laços de
compromisso e de co-responsabilidade entre os profissionais de saúde e a população,
3
Adjetivo utilizado pelo Ministério da Saúde (1996), para significar relativo a domicílio, que se faz no
domicílio.
32
estimulando a participação crítica nas questões de saúde, despertando expectativas de
que também estimule a promoção do envelhecimento saudável. Para Veras (2002),
isso significa manter 80% dos idosos saudáveis e com a sua autonomia preservada,
reservando meios e recursos para aqueles 20% de idosos doentes e/ou fragilizados.
Assim, os idosos independentes e saudáveis, imensa maioria da nossa sociedade, e
aqueles doentes e/ou fragilizados, devem ser vistos em suas especificidades pelos
profissionais que atuam na atenção básica, de modo a identificar precocemente àqueles
em maior risco para o desenvolvimento de doenças graves com abordagem preventiva
que contribua para mantê-los na rotina familiar e na vida em comunidade.
Ainda no contexto do PSF, Silvestre e Costa Neto (2003) enfatizam que o
modelo de atenção deve ser capaz de desenvolver ações que incluam medidas
promocionais, de proteção específica, de identificação precoce dos agravos mais
freqüentes e sua intervenção, assim como medidas de reabilitação que evitam a sua
apartação precoce do convívio familiar e social. Assim, espera-se que o referido
Programa possa funcionar como alavanca para avançar na transformação do modelo de
assistência vigente no país.
Como profissional de saúde voltada para a assistência integral e contínua dos
membros da família vinculadas a UBS e atendidos pelo PSF, a enfermeira há de ter
competências e habilitação específicas que lhe são requeridas nesse contexto, entre as
quais se inclui o atendimento domiciliário ao idoso em situação de risco ou
pertencente a grupos de risco. Tal atendimento se deve quando as condições clínicas e
familiares de seus membros assim o exigirem, bem como o desenvolvimento de ações
para capacitação dos Agentes Comunitários de Saúde (ACS) e de auxiliares de
enfermagem visando ao desempenho de suas funções na atenção integral às pessoas
idosas. (SILVESTRE; COSTA NETO, 2003). Quando realizadas em conjunto com as
competências e atribuições dos demais profissionais que compõem o PSF, essas
competências e habilidades conferem uma forma diferenciada de prestar assistência à
pessoa idosa.
Em 2005, transcorridos onze anos da sua criação e já instituído em diversos
municípios brasileiros, o PSF enfrenta o desafio de materializar-se em ações concretas
33
e estender seu escopo de atuação aos idosos membros das famílias vinculadas às UBS
distribuídas por todo o território nacional. Inúmeros municípios brasileiros têm ainda
poucas Equipes de Saúde da Família, não disponibilizando essa Estratégia ligada à
área de saúde pública para a maioria da população. Convém salientar que o preceito da
descentralização político-administrativa deve ser cumprido de forma que nos
municípios se executem as ações que garantam os direitos sociais de todos, incluindo
os idosos. Por sua vez, a capacitação dos profissionais envolvidos na Estratégia é outro
grande desafio, na medida em que poucos profissionais apresentam o perfil requerido.
Em artigo, no qual trata da abordagem do idoso em PSF, Silvestre e Costa Neto (2003)
destacam iniciativas do Ministério da Saúde em parceria com os gestores estaduais e
municipais e com as universidades, como os cursos de especialização em saúde da
família, entre outros, visando à qualificação da atenção básica e à educação
permanente.
A diversidade, a pluralidade, a heterogeneidade, a instabilidade e a
fragmentação presentes nas famílias, são verdadeiros desafios para os profissionais
que as assistem em suas comunidades (KALOUSTIAN, 1994). Respeitar suas crenças,
idéias e experiências, estar continuamente atento e reflexivo, ir e vir com elas em suas
ressignificações certamente contribuirá para uma abordagem mais valorizadora dessas
famílias, principalmente as cuidadoras de seus membros doentes/fragilizados.
2.3 A Família no contexto do cuidado
Na década de noventa, enfatiza-se no setor de saúde o tema família, que passa a
receber, por parte dos profissionais, um olhar mais atento aos processos saúde-doença
construídos em seu bojo. Em nosso meio, Elsen (1994), pesquisadora na área da
família, refere que o cuidado familial é definido a partir do mundo de significados de
cada família e desenvolvido ao longo do seu processo de viver, o que lhe dá um caráter
de especificidade. Para ela, o cuidado familial se dá ao longo do processo de viver da
34
família e nas diferentes etapas da vida de cada ser humano, em cada estágio com suas
especificidades decorrentes do ambiente sociocultural e das características individuais
de cada membro e de cada família (ELSEN; MARCON; SILVA, 2002).
Em estudo acerca do comprometimento da vida das famílias que convivem com
doença crônica, Kashiwakura, Marcon e Furukawa (2002) enfatizam que a necessidade
de atenção especial recai não só em organismos formais, de instituições de
atendimento à saúde e seus profissionais, mas principalmente em organismos
informais de suporte social, que levam a preservar, ao máximo possível, a capacidade
da família de autocuidar-se e de ser-estar saudável.
Karsch (2003), pesquisadora brasileira na área da gerontologia, lembra que nos
países desenvolvidos há redes de organizações com objetivo de manter a pessoa idosa
em sua casa, graças à oferta de apoio à pessoa afetada e à família cuidadora. O
programa “comida sobre rodas”, que provê um serviço de substituição da tarefa de
cuidador familiar, é exemplo bem sucedido. No Brasil, ainda não existem iniciativas
desse tipo no setor público, cabendo à família, todo o encargo de cuidar do idoso
dependente. Em algumas cidades brasileiras, embora escassas, já surgem iniciativas
públicas formais de assistência aos idosos e a suas famílias. Quanto às redes informais
de serviços de apoio psicossocioassistencial e religioso destinados a outros grupos,
poderiam também incluir os idosos dependentes e/ou fragilizados, como eventual
alternativa para as famílias.
Existe significativa literatura internacional acerca de cuidadores leigos
4
que
prestam cuidados aos idosos no contexto domiciliar e a necessidade de receberem
apoio do sistema formal de saúde. O cuidado informal dirigido às pessoas idosas
constitui-se na fonte predominante de cuidado, compreendendo 80 a 90 % dos idosos
que permanecem no domicílio, indicando crescente reconhecimento de sua relevância
em diversos países (BRODY, 1985; CHAPPEL, 1993; NOLAN, 2001b).
Nolan (2001a) tece considerações acerca das implicações da implementação de
uma parceria com familiares cuidadores na abordagem do idoso no lar. Para esse autor,
4
Para Gonçalves, Alvarez e Santos (2000, p.103), cuidadores leigos, informais ou não-profissionais, em nossa
cultura, têm sido primordialmente a família, destacando-se a mulher.
35
cuidadores desenvolvem habilidades a partir de um processo de tentativa e erro,
apresentando necessidades particulares de informações de que não dispõem. Seu
modelo “cuidadores como peritos”, elaborado em 1996, reconhece as demandas em
constante mudança, com habilidades desenvolvendo-se ao longo do tempo. Salienta
ainda a necessidade de uma mudança cognitiva na forma como os profissionais
percebem os cuidadores. Assim, enfatiza a necessidade de “pensar no cuidador” e de
ser proativo em oferecer informações e treinamento suficiente, de tal maneira que
membros familiares se sintam confiantes nas suas habilidades para prover o padrão de
cuidado que eles gostariam de oferecer ao idoso. No entanto, para os profissionais, tal
modelo pode ser difícil, à medida que desafia sua tradicional base de poder, de serem
os únicos “possuidores” de conhecimento. É importante reconhecer os diferenciais de
poder existentes entre a família cuidadora e cuidadores profissionais, cuja mediação e
negociação se constituem componentes essenciais de uma relação de apoio.
Ainda sob a ótica dos familiares cuidadores, Nolan (2001b) identifica
determinado número de tópicos e desafios futuros se familiares cuidadores realmente
receberem o tipo e nível de apoio de que precisam. Assinala a necessidade de pensar
mais claramente acerca dos resultados pretendidos em serviços de suporte para
cuidadores. Identifica as intervenções que devem ser oferecidas. O autor respalda-se
em alguns protocolos e procedimentos padrão desenvolvidos no Reino Unido para
atender as necessidades peculiares a cada situação com maior criatividade.
Tal análise crítica sinaliza para a necessidade de outra visão de sistema de
cuidado apropriado e abrangente, que valorize o cuidado informal, não-pago, por parte
da família, como alternativa de baixo custo para a medicina tecnologizada que emergiu
na década de noventa. No âmbito de idosos portadores de demência, isto é
particularmente relevante, uma vez que pesquisas sinalizam para o alto nível de
estresse que afeta a vida diária dos familiares cuidadores, mesmo após a
institucionalização do portador em instituição de longa permanência (ALMBERG;
GRAFSTROM; WINBLAD, 1997, apud ERICSON et al., 2001).
Tornatore e Grant (2002) estudaram a sobrecarga em 276 familiares cuidadores
36
selecionados em 100 unidades de 38 nursing homes
5
localizados em Minesotta, nos
EUA. Os resultados demonstraram que familiares cuidadores mais velhos e que
cuidavam do seu familiar por um período mais curto antes da internação no residencial
apresentavam-se mais sobrecarregados do que aqueles mais jovens e com mais tempo
de cuidado do familiar. Ter familiar em unidade de custódia estava associado com
maior sobrecarga, assim como aqueles que percebiam a si próprios como mais
envolvidos no cuidado direto e cujas expectativas acerca dos nursing home eram
baixas. O tempo dispendido no cuidado direto anterior à institucionalização foi
isoladamente o preditor mais poderoso de sobrecarga do cuidado. Os achados
sinalizaram para a importância de estudar as características organizacionais dos
nursing homes, pelo conhecimento das políticas institucionais e práticas que podem ser
mais relevantes para a adaptação do cuidador do que as relacionadas ao idoso. A partir
desse estudo exploratório, os autores esperam direcionar pesquisadores, políticos e
clínicos, entre outros, para futuros questionamentos acerca de como oferecer apoio
mais apropriadamente para familiares cuidadores após a colocação dos idosos em
nursing homes.
Em investigação conduzida recentemente na Suécia, com cuidadores familiares
e profissionais acerca do que consideram ser o melhor cuidado para idosos em
processo demencial, Ericson et al. (2001) obtiveram resultados que sugerem a
necessidade de ambos os grupos trabalharem muito unidos se desejarem que o cuidado
centrado na pessoa se torne realidade.
Nolan, Ingram e Watson (2002), por sua vez, realizaram uma análise crítica
acerca do apoio oferecido às famílias com idosos demenciados. Alertam acerca da
necessidade de reavaliar as formas como intervenções bem sucedidas são definidas,
sinalizando para uma abordagem baseada na parceria, na qual os próprios cuidadores
desempenham um papel significativo em determinar “o que funciona”. No entender
desses autores, não se pode oferecer apoio às pessoas apropriadamente sem entender-
lhes por completo as necessidades. Ao gerar comparações entre famílias e
5
Denominação utilizada em países anglo-saxões para designar residenciais que abrigam pessoas idosas e que
contam com pessoal especializado para prover os devidos cuidados. No Brasil, representa casas de repouso ou
instituições de longa permanência (ILP), mantidas por órgão público, entidades filantrópicas ou exploradas pela
iniciativa privada.
37
profissionais prestadores de cuidado acerca de sua avaliação de quão bem os
cuidadores familiares prestam o cuidado, há evidências de que os prestadores de
cuidado sistematicamente subestimam a amplitude de estratégias de enfrentamento que
as famílias usam, especialmente no domínio cognitivo. Se o que funciona bem para as
famílias não for reconhecido, o risco de intervenções inapropriadas por parte dos
serviços permanecerá, uma vez que perícia não é prerrogativa dos profissionais, dos
que elaboram políticas, mas repousa, antes, de forma crescente nos portadores de
demência e nos seus respectivos cuidadores informais.
2.4 Familiares cuidadores e suas demandas por apoio
No Brasil, em estudo conduzido por Perracini e Neri (2002), na área da
neuropsicogerontologia com quinze familiares cuidadoras de idosos com alto grau de
dependência funcional, estes expressaram falta de ajuda da família e incompreensão
em relação às dificuldades do cuidado. Os dados apontaram para a precariedade da
rede de apoio informal, onde os princípios de solidariedade e de reciprocidade entre as
gerações nem sempre estão presentes. Certamente ainda muitos outros estudos são
necessários para que se possa mapear a situação num país de grandes dimensões e
ampla diversidade étnica, cultural e social como o Brasil.
Ao consultar a bibliografia brasileira acerca de famílias cuidadoras,
encontramos os trabalhos de Mendes (1998), Creutzberg (2000), Andrade (2001),
Alvarez (2001), Lima (2002), Santos (2003), Ferrretti (2004) e Coelho (2004), que
abordam o cuidado familiar ao idoso.
Estudos de Mendes (1998) e Andrade (2001) com cuidadores familiares de
idosos portadores de seqüela de acidente vascular cerebral – AVC destacam a ausência
de suporte, tanto do sistema social quanto de saúde, e a necessidade de políticas sociais
voltadas para a população idosa, enfocando especialmente o idoso dependente e seu
cuidador. Creutzberg (2000) realizou pesquisa com famílias de classe popular
cuidadoras de idosos fragilizados, corroborando os achados de Mendes (1998) e
38
Andrade (2001) quanto à necessidade de programas de cuidado domiciliar que
assistam a família e o idoso de forma integral, continuada, participativa e humanizada.
Alvarez (2001) desenvolveu pesquisa com cuidadores familiares de idosos
doentes e fragilizados, enfatizando a insuficiência de recursos humanos, materiais e
ambientais na qual convivem essas famílias, sem encontrar no sistema oficial público
nem comunitário o apoio complementar necessário.
Retomando os achados de Mendes (1998), Creutzberg (2000), Andrade (2001) e
Alvarez (2001), é possível inferir que os dados trazidos expressam uma necessidade
genuína de apoio por parte das famílias observadas, que continuam desamparadas em
sua longa e desgastante trajetória de prestar cuidado cotidiano ao seu familiar idoso
doente e/ou fragilizado. Os estudos sinalizaram para a precária infra-estrutura quanto a
recursos humanos e programas específicos para responder à complexa demanda das
famílias no processo de cuidar e ser cuidado. Em tal cenário, entendemos que a
enfermeira, por sua formação, é o profissional que poderia ter um papel na articulação
de programas dos sistemas formal e informal, facilitando o cuidado diário e a
manutenção do estado de bem-estar para ambos, a pessoa idosa e demais membros
familiares.
Ferretti (2004) conduziu estudo longitudinal por cerca de um ano e meio
envolvendo 324 sujeitos, pacientes e cuidadores familiares para identificar fatores de
risco para institucionalização do portador de demência. Ambulatório, domicílio e
instituição de longa permanência (ILP) foram os três diferentes campos utilizados para
obter os dados. Os resultados de seu estudo indicaram que o maior risco de
institucionalização foi o estresse dos cuidadores diante das alterações comportamentais
apresentadas pelos pacientes com demência.
Coelho (2004) investigou os saberes e práticas de cuidar e de cuidados do
universo comum de famílias de idosos com doença de Alzheimer utilizando a
pedagogia crítico-reflexiva de Freire aplicada à enfermagem. Seus resultados
mostraram que os familiares cuidadores são porta-vozes de todos aqueles que vivem e
convivem com doentes com Alzheimer e que, a partir da educação dialógica da
enfermeira com esses familiares, é possível diminuir a reincidência de internações e
39
mesmo de acompanhamento ambulatorial dos idosos em questão.
Caldas (2000), em estudo qualitativo com enfoque fenomenológico, buscou
compreender o significado de ser um cuidador familiar de um idoso que vivencia um
processo demencial, partindo da óptica dos cuidadores. Sua abordagem compreensiva
ultrapassa aquela funcionalista, na qual os profissionais de saúde vêem os cuidadores
apenas como meros cumpridores de prescrição, anulando as possibilidades de serem
eles mesmos, livres para decidir. Destaca a importância do apoio afetivo, cujos
cuidados liguem a família aos serviços de apoio e encontrem meios que melhorem a
qualidade de vida.
Lima (2002) também estudou cuidadores familiares de idosos portadores da
doença de Alzheimer. Em seu estudo ressaltou a ausência de um sistema público eficaz
no atendimento de ambos, o idoso e o familiar, e conclui apontando a enfermeira como
a profissional que deveria interagir com o familiar cuidador, prestando-lhe a devida
atenção.
Em seu estudo de enfoque cultural, Santos (2003) acompanhou famílias de
origem nipo-brasileira e brasileira com idosos dementados. Ao analisar as condições
de vida dos cuidadores familiares, a autora ponderou acerca da relevância da busca por
envolvimento e parceria com programas de voluntariado, no sentido de poder-se
pensar em uma ampliação da rede de apoio informal. Enfatizou também a necessidade
dos programas de formação e capacitação de recursos humanos na área da saúde e da
gerontologia que fossem sensíveis aos aspectos culturais os quais são significativos no
cotidiano das famílias na prática de suas funções de cuidadores de idosos dementados.
Sugeriu a criação de um canal de comunicação entre os mentores gestores de política e
os profissionais e familiares, para que juntos encurtem a distância entre as políticas e
as necessidades da população idosa.
Embora com metodologias distintas, as pesquisas dessas três últimas autoras,
todas enfermeiras, focalizam os idosos dementados, assistidos no domicílio por
familiares cuidadores. Respaldadas em uma prática vivida na Enfermagem
40
Gerontológica
6
, seus estudos apontam para um cenário preocupante, retratando uma
realidade que extrapola o contexto geográfico no qual essas pesquisas foram
realizadas, confirmando ainda mais a situação de inoperância no atendimento
continuado dessa clientela específica de idosos dementados e de suas respectivas
famílias cuidadoras. Como enfermeiras, reconhecem ser fundamental que os
cuidadores possam contar com os préstimos profissionais, de apoio técnico-científico
que sejam sensíveis às reais necessidades e expectativas das famílias.
Ao envolver-se com o cuidado ao idoso com demência que ainda permanece no
domicílio ou recém-saído de hospitalização, com ou sem regime de internação
domiciliária, a enfermeira interagirá com aquele familiar que desempenha a função de
cuidador. A assistência ao idoso que vive um processo demencial tem toda uma
dinâmica que difere da assistência ao idoso sem comprometimento cognitivo. Como
enfermeira e elemento da equipe gerontogeriátrica, reconheço a complexidade e a
singularidade do atendimento domiciliário, que recai sobre um ou mais cuidadores na
família, identificado como cuidador leigo ou informal.
Ao articular as atividades de prestação de cuidados de enfermagem voltados
para proteção e promoção da vida individual, de grupos, famílias, comunidades e de
prestação de cuidados que contribuam para o cuidado, recuperação e acompanhamento
de pessoas doentes, como os idosos em processo demencial, a enfermeira acena com
uma prática qualificada no cotidiano do trabalho em saúde, somando-se aos demais
profissionais que compõem a equipe de saúde.
Santos (2003, p.165) lembra que “há poucos trabalhos específicos nesta área,
especialmente dedicados a investigar as experiências, as estratégias e soluções
concretas desenvolvidas pelas famílias cuidadoras de idosos dementados”. A escassez
de infra-estrutura de apoio formal e informal para essas famílias representa um fator
desencadeador de estresse nos cuidadores, comprometendo a qualidade de vida de
todas as pessoas envolvidas.
6
Especialidade do conhecimento e da prática da enfermagem fundamentada nos conhecimentos provenientes da
Enfermagem Geral, da Geriatria, que é uma disciplina médica, e da Gerontologia, área mais abrangente, que se
vem construindo à luz dos conhecimentos de várias disciplinas básicas e aplicadas (GONÇALVES e
ALVAREZ, 2002, p.757).
41
2.5 Grupo de Ajuda Mútua
O espírito gregário identifica a condição humana desde os primórdios da
história da humanidade. A grupalidade ou disposição para agrupar-se tem
acompanhado o ser humano ao longo do seu processo civilizatório. Grupos humanos
se configuram como grupos sociais pela interação pessoal no qual pessoas
compartilham ansiedades, angústias, medos e tristezas e trocam experiências comuns.
Os Grupos de Ajuda Mútua nasceram das primeiras experiências de utilização
de grupos como recurso terapêutico. Em trabalho desenvolvido por Pratt em 1905, nos
Estados Unidos, grupos de pacientes com tuberculose foram criados tendo
inicialmente fins educativos de cuidados. Pratt verificou que uma mera reunião de
cunho educativo teve resultados positivos principalmente no tratamento, sobretudo
pelo efeito muito maior de coesão de grupo através do apoio emocional que cada um
exercia sobre o outro. Tal constatação abriu um vasto leque de aplicações para outras
organizações similares, como, por exemplo, a dos Alcoólicos Anônimos, iniciada em
1935 e que permanece atuante em todo o mundo (ZIMERMAN ; OSÓRIO, 1997).
Posteriormente, na década de 1930, Lewin cunhou a expressão “dinâmica de
grupo”, desviando-se do modelo médico, predominante até então, no qual os grupos
eram utilizados com finalidades estritamente terapêuticas. Ao enfocar o contexto
educacional, Lewin estimulou o desenvolvimento de grupos de crescimento pessoal e
de encontro, expandindo o aprendizado para interessados da comunidade em melhorar
suas condições pessoais e de qualidade de vida (MAILHIOT, 1981).
Estudioso na área de grupos de ajuda mútua desde 1972, Silverman (1984)
refere que a ajuda mútua ocorre quando a pessoa que ajuda e a pessoa sendo cuidada
compartilham um mesmo problema. A pessoa que ajuda seria como um “sobrevivente”
que tendo lidado com sucesso com o mesmo problema, adquiriu autoridade baseada
em sua experiência prática. Para esse autor, Grupos de Ajuda Mútua são geralmente
constituídos por pessoas ou membros familiares que partilham um mesmo problema
ou situação de vida. A efetividade da ajuda está baseada nos seguintes aspectos: os
42
participantes encontram pessoas em condições semelhantes, aprendem que outras
pessoas têm sentimentos semelhantes acerca da situação e de que esses sentimentos
podem ser considerados “normais” nas circunstâncias que vivem e são encorajados,
pela observação, a tornar-se ajudadores um dia. Assim, essa comunidade temporária,
criada na instância de um Grupo de Ajuda Mútua, aumenta o senso de auto-estima pela
possibilidade de exercer a solidariedade e cultivar o altruísmo.
Para Danielson (1993), a oportunidade de desabafar sentimentos e
contrariedades e compartilhar com outros seus problemas, os quais acabam por
verificar que são semelhantes aos dos demais, confere aos participantes do Grupo de
Ajuda Mútua significativo bem estar.
Conforme Barros (1997), grupos de ajuda mútua, definidos com base em Rotes
e Aanes (1992), fundamentam-se em sete critérios: são de apoio mútuo e educacional,
a liderança vem do interior do grupo, reporta-se somente a um único evento
desestruturador de vida, os membros do grupo participam voluntariamente, não têm
interesses financeiros ou fins lucrativos, objetivam o crescimento pessoal dos
integrantes e têm caráter anônimo e confidencial. Esse conjunto de critérios dá uma
idéia acerca das múltiplas configurações que um grupo de ajuda mútua pode
apresentar.
A formação do grupo se dá a partir do estímulo integrador de algum
profissional de saúde, que atuará como moderador, coordenador ou facilitador.
Zimmerman e Osório (1997) descrevem uma série de atributos do grupoterapeuta,
como: gostar do grupo e acreditar na importância de grupos, ser verdadeiro, empático,
acolhedor, ter senso ético e de humor, respeito, paciência, saber perceber se os
participantes estão conseguindo pensar e manter uma comunicação efetiva. As
condições nominadas pelo autor indicam que o grupoterapeuta deve ser um
profissional sensível, que assista o ser humano em sua dimensão total. Cremos que, de
coragem e persistência também, pois a dinâmica de grupo é algo recente, que requer
investimentos.
Os grupos de ajuda mútua são compostos por pessoas portadoras de um
sofrimento compartilhado, com condições crônicas específicas, como hipertensão,
43
diabetes, artrite, Aids ou em situações críticas de enlutamento e surgimento de
demência na família, entre outras. Na instância do grupo recebem suporte, sinalizam
vivências e acontece o aprendizado de novos comportamentos.
A enfermeira é uma educadora por excelência, com papel fundamental na
promoção de saúde e na prevenção de doenças. Atividades grupais são uma realidade
no seu cotidiano, por contemplarem a assistência ao indivíduo, à família e à
comunidade, representando um recurso valioso para ajudar e assistir as pessoas em
suas necessidades, promovendo a educação em saúde.
Como prática social articulada a outras práticas das áreas de especialidade
médica programática, tais como a clínica geral, a neurologia e a geriatria, entre outras,
a enfermagem tem no trabalho grupal uma estratégia que contempla outras formas de
atendimento à saúde, além da consulta médica e da consulta de enfermagem. Trentini e
Gonçalves (2000) lembram que essa é uma tecnologia propícia para a enfermeira
abandonar a tradicional postura diretiva e assumir uma postura participativa em sua
prática assistencial.
A enfermagem brasileira já tem tradição no atendimento de pacientes com
diferentes necessidades em contexto grupal. A partir do final da década de 70,
inúmeras enfermeiras vêm apropriando-se desse método, tendo a saúde pública como
pioneira com grupos de orientação a gestantes (DUARTE; MUXFELDT, 1975,
VARGAS; SCAIN, 1983; MUNARI, 1994), revelando utilidade e eficiência na busca
de soluções para a assistência de determinada clientela, em condições específicas de
necessidades. Assim, existem grupos de usuários diabéticos, hipertensos, gestantes,
artríticos, idosos e mulheres mastectomizadas, entre outros. Esses diversos grupos
podem estar preenchendo as necessidades de determinados serviços de saúde,
disponibilizando uma modalidade de atenção grupal sem ônus para o usuário.
Unidades Básicas de Saúde, escolas e igrejas também acenam com a viabilidade de
acolherem atividades grupais. Nos anos subseqüentes, as atividades grupais
conduzidas por enfermeiras atingiram uma clientela diversificada, vindo a constituir-se
em uma prática freqüente e valorizada, com um campo de atuação em franca
expansão. A partir da década de 90 com a experimentação de novas abordagens
44
grupais vinculadas ao desenvolvimento de tecnologias assistenciais nos cursos de pós-
graduação, a enfermagem vem buscando formar seu próprio corpo teórico nessa área,
como uma de suas práticas assistenciais.
No universo do trabalho em saúde, porém, o cuidado ainda está direcionado em
grande parte para o modelo tecno-assistencial, no qual a utilização de aparatos
tecnológicos é o ponto máximo da terapêutica. A produção dos atos de saúde atrelada
a tal modelo nem sempre consegue atender satisfatoriamente o interesse dos usuários
dos serviços, contribuindo pouco para a melhoria da qualidade de vida.
Para Munari e Furegato (2003), grupo é um espaço de construção conjunta da
realidade, baseada na solidariedade, na confiança e na exposição de sentimentos. A
diversidade de características dos grupos e suas diferentes possibilidades de
organização e estruturação propiciaram a existência de inúmeras modalidades de
grupos, mas todos com uma linha em comum, convergindo para a experiência de
grupo e com determinadas características externas. Entre aqueles que têm como
objetivo oferecer suporte, ajudando pessoas a manter-se ou adaptar-se a novas
situações, estão os de ajuda mútua. De acordo com Trentini e Gonçalves (2000), os
grupos de ajuda mútua pertencem à categoria dos grupos de convivência, que visam ao
crescimento pessoal. Esses grupos proporcionam uma coesão grupal que vincula e une
entre si os membros do grupo e o moderador/coordenador, constituindo-se em
importante elemento terapêutico.
Enquanto moderadora/coordenadora/facilitadora, a enfermeira deve conduzir o
grupo de forma que os participantes se sintam confortáveis para expressar seus
sentimentos e afetos. Isto conduz a um clima psicológico de segurança, de confiança
mútua pela liberdade de expressar sentimentos reais, oportunizando ainda a
manifestação de eventuais sentimentos negativos, em decorrência das circunstâncias
vivenciadas. Segundo Zimmerman e Osório (1997), partilhar com outras pessoas
problemas semelhantes num ambiente acolhedor e solidário, receber informações,
expressar pensamentos e sentimentos e trocar experiências são manifestações que dão
caráter terapêutico ao grupo.
Entre as diversas modalidades grupais existem aquelas que são formadas por
45
membros familiares que compartilham o mesmo problema decorrente de um evento
desestruturador da qualidade de vida e que recebem a denominação de Grupos de
Ajuda Mútua (ALVAREZ; GONÇALVES; SCHNEIDER, 2002). Oferecer apoio
mútuo e educacional, estimular sentimentos de união e de vínculo entre os
participantes e promover o aprendizado de novos comportamentos e atitudes são
algumas das características presentes nos grupos de ajuda mútua.
Grupos de Ajuda Mútua representam uma modalidade de suporte que favorece
o fortalecimento das potencialidades, tanto individuais quanto grupais, nos quais se
oportuniza o exercício da cidadania. Para Munari e Furegato (2003), estimulam
partilhar experiências dolorosas, com a construção de uma crescente intimidade mútua,
em que autenticidade, espontaneidade, confiança e maior consciência de si próprios,
acentuam a humanidade entre os familiares cuidadores.
Já Grupos de Ajuda Mútua para familiares de idosos com doença de Alzheimer
constituem uma prática recente da enfermagem brasileira. A identificação de áreas
ainda não cobertas pelos programas de saúde local, por exemplo, fez com que, por
ocasião da realização do meu mestrado (PELZER, 1993), participasse na formação de
um Grupo de Ajuda Mútua para familiares de idosos com doença de Alzheimer que
atua no ambulatório do HU/UFSC, na cidade de Florianópolis.
Em artigo acerca do Grupo de Ajuda Mútua de familiares de idosos portadores
de doença de Alzheimer e doenças similares, projeto de extensão desenvolvido pelo
GESPI/PEN/UFSC – Grupo de Estudos sobre Cuidados de Pessoas Idosas e inserido
como atividade de assistência do NIPEG/HU/UFSC – Núcleo Interdisciplinar de
Pesquisa, Ensino e Assistência Gerontogeriátrica, na cidade de Florianópolis, Alvarez,
Gonçalves e Schneider (2002, p.6) abordam sua relevância enquanto
recurso psicossocial e educativo útil para apoiar famílias na ampliação da
percepção da complexidade da situação na qual se encontram,
possibilitando-lhes procurar objetivamente por recursos necessários e
instrumentalizar-se para seu enfrentamento. A trajetória de mais de doze
anos das autoras na condução dessa atividade grupal tem proporcionado
significativo apoio aos familiares cuidadores.
A estratégia de grupos de ajuda mútua se contrapõe à organização tradicional
dos serviços de saúde, estruturados em torno da pessoa dependente e nos quais os
46
cuidadores se situam na periferia, permanecendo muitas vezes invisíveis para o pessoal
de saúde. Nesse enfoque, a natureza interativa da atividade não é contemplada. Os
profissionais de saúde, por sua vez, vêem os cuidadores como recursos diante das
múltiplas demandas dos portadores e não como co-partícipes, que requerem atenção,
apoio e cuidado. O sofrimento emocional, os problemas que advêm da carga cotidiana
da enfermidade e os problemas de saúde do cuidador representam um ônus decorrente
do cuidado.
Na área de idosos demenciados, ao reunir membros familiares que partilham um
sofrimento comum, o Grupo de Ajuda Mútua contribui no atendimento de saúde
dessas famílias. Em cenário tão complexo, o estabelecimento de uma rede de apoio é
uma perspectiva plausível para as famílias cuidadoras.
3 REFERENCIAL TEÓRICO-METODOLÓGICO
O referencial teórico que deu sustentação ao estudo realizado baseou-se na
Teoria da Enfermagem Humanística, de Paterson e Zderad (1979), associada às
concepções de Merhy (2002) sobre tecnologia em cuidados da saúde.
Considerando a arena da assistência à família cuidadora de idosos portadores de
DA, ainda não instituída nos serviços oficiais de saúde, a formação e desenvolvimento
de um Grupo de Ajuda Mútua foi a estratégia adotada (MERHY, 2002) de constituição
do espaço de interseção, ou seja, o espaço onde se produzem as relações entre sujeitos,
neste caso, os familiares cuidadores e os profissionais da gerontogeriatria. Assim aí, se
deu o território principal para o desenvolvimento da tecnologia de assistência cuidativa
de enfermagem junto à família cuidadora.
Para essa assistência cuidativa a família cujo membro idoso sofre de doença de
Alzheimer (DA), adotei como referencial a concepção teórica desenvolvida por
Paterson e Zderad que acena com uma perspectiva humanística e solidária. Em meu
entendimento, uma teoria humanística pode auxiliar a enfermeira na condução de uma
trajetória metodológica de conduta profissional na situação em questão. Os modelos de
enfermagem estão baseados em suposições científicas e filosóficas e enquanto
teóricas, Paterson e Zderad colecionam convicções e valores ao formularem seu
modelo teórico. Ao buscar no conhecimento empírico disponível, mais
especificamente nas teorias de enfermagem, encontrei na Teoria Humanística, um guia
norteador para o encontro assistencial com as famílias. Como enfermeira cuidadora e
profissional com interesse na área de saúde do idoso, campo em franco
desenvolvimento, reconheço a necessidade de pautar o meu fazer no cuidado
humanizado extensivo ao familiar cuidador, que desempenha papel incontestável junto
do seu membro idoso em tratamento de doença de Alzheimer.
O conhecimento em enfermagem está sendo produzido em diferentes momentos
e em sociedades caracterizadas por desigualdades sociais, gerando um processo
48
saúde/doença/cuidado em que estão presentes desequilíbrios relacionados às condições
de existência do ser humano, e por outro lado, em diferentes sistemas de saúde nos
quais a profissionalização da enfermeira tem ocorrido de maneira diversificada.
O desenvolvimento de teorias de enfermagem iniciou com Florence Nightingale
em 1859 (MELEIS, 1997), tendo orientado a prática de enfermagem desde então.
É na América do Norte, sob a égide de enfermeiras norte-americanas que as
teorias de enfermagem são introduzidas, de forma consistente, por volta dos anos 70,
com a finalidade de construir um corpo de conhecimentos próprios, tomando o
cuidado, como categoria central da assistência de enfermagem. Enquanto construção, a
partir de uma prática idealizada, as teorias de enfermagem se prestam à uma utilização
na prática assistencial, docente e/ou gerencial.
De acordo com Praeger (2000), a aplicação das teorias nos vários campos da
prática de enfermagem tem sido discutida atualmente, confirmando sua necessidade e
atualidade. As teorias de enfermagem inter-relacionam os quatro conceitos do
metaparadigma de enfermagem: a pessoa, a saúde, o ambiente/sociedade e a
enfermagem.
Pela complexidade do processo saúde/doença/cuidar e pela própria dinâmica da
sociedade, em constante movimento, várias teorias de enfermagem foram sendo
elaboradas e refinadas, com base nos achados de pesquisas que as expandiram.
Paterson e Zderad (1979) incluem-se entre as teóricas que não somente
desafiaram o modelo biomédico, de relativa resolutividade, mas que também, de forma
proativa, conceitualizaram diferentes aspectos do território da enfermagem.
Embora os conceitos adotados por Paterson e Zderad derivem da enfermagem
psiquiátrica, elas afirmam que são aplicáveis em todos os cenários nos quais a
enfermagem ocorre, tornando a teoria generalizável para os vários ambientes de
cuidado. O destaque do seu enfoque sobre a enfermagem oferece um novo caminho a
ser percorrido, no qual enfermeira-cliente sejam sujeitos na realização do cuidado,
base da enfermagem humanística.
Por terem ancorado sua teoria sob a égide da psicologia humanística e da
49
fenomenologia e a forma como expressam seus conceitos, Paterson e Zderad (1979)
avançam rumo a um paradigma emergente que busca assentamento nas pesquisas
qualitativas.
Meleis (1997) ao enfocar a utilização desta teoria na pesquisa e na prática,
refere à necessidade de operacionalização dos conceitos, alguns com nível de
abstração maior, para explorar devidamente o potencial das suas proposições. Na
avaliação que faz acerca das dimensões internas da teoria, afirma seu alto nível de
abstração por desenvolver-se ao redor do interesse em explorar, como conceito, a
interação. Sua singularidade repousa na ausência de fronteiras entre a experiência das
autoras como enfermeiras, teóricas, metodológicas e escritoras. Para esta autora, a
teoria é congruente com valores que circundaram o desenvolvimento da pesquisa e do
conhecimento em enfermagem que emergiu na década de 80 nos Estados Unidos.
Com o intuito de operar as necessidades expressas pelos familiares cuidadores
estabelecendo ações as quais eles possam sentir-se efetivamente cuidados, adotei as
concepções de Merhy (2002) no que diz respeito à tecnologia cuidativa do tipo leve.
Ao articular com uma nova configuração tecnológica de Merhy (2002) que sustenta o
trabalho vivo em saúde constituindo-se em ações executadas pelos profissionais
cuidadores na sua relação direta com o usuário, na dimensão do cotidiano,
contemplando a subjetividade humana, este trabalho em saúde desfoca-se dos
equipamentos e especialistas. O uso de tal tecnologia acena com uma assistência
solidária com o sofrimento do outro, de escuta, de compromisso na defesa dos direitos
do usuário, enquanto um trabalho vivo em atos de cuidado.
3.1 A Teoria Humanística de Paterson e Zderad
A Teoria da Enfermagem Humanística advém do engajamento das autoras na
enfermagem clínica e teórica, tendo trabalhado com clientes, estudantes, enfermeiras e
outros profissionais, constituindo-se no resultado das reflexões das experiências
50
conforme foram sendo vivenciadas. Para Paterson e Zderad (1979), como a
enfermagem humanística se aplica a todas as áreas clínicas, não está fragmentada em
especialidades clínicas, seguindo uma abordagem interclínica, o que certamente
amplia seu enfoque.
A prática da enfermagem humanística está ancorada em princípios filosóficos
do existencialismo e da fenomenologia. O existencialismo é uma abordagem filosófica
para a compreensão da vida, da dimensão do ser humano, da qualidade de ser do outro,
em que o existir é a dimensão primária. Cada ser humano enquanto ser existencial é
singular. A fenomenologia visa a descoberta das essências dos fenômenos, a busca da
compreensão ou do sentido de algo, de como se demonstra, como vivencia o mundo a
partir da existência (PATERSON e ZDERAD, 1979). Dessa forma, propicia uma
compreensão fenomenológica do comportamento humano, podendo ajudar na relação
terapêutica e de ajuda estabelecida entre a enfermeira e o ser cuidado. Ambos,
existencialismo e fenomenologia, valorizam a experiência vivenciada, a capacidade do
ser humano para o conhecimento e o desenvolvimento do novo.
Por reconhecer que as correntes fenomenológica e existencial se
interrelacionam na enfermagem humanística, Paterson e Zderad (1979) pontuam a
importância de descrever fenômenos intersubjetivos experenciados pela enfermeira
para sua maior compreensão. A Teoria da Prática da Enfermagem Humanística de
Paterson e Zderad (1979) propõe que as enfermeiras abordem a enfermagem
consciente e deliberadamente como uma experiência existencial. Seus ensaios
metateóricos apresentam um enfoque existencial alternativo sobre a prática que não
rechaça os avanços tecnológicos da enfermagem, mas sim trata de incrementar seu
valor ao considerar seu uso dentro da perspectiva de desenvolvimento do potencial
humano.
Enquanto experiência existencial, o fazer enfermagem incorpora a transação
intersubjetiva particular, dirigida a nutrir o bem-estar e o mais ser, na qual a
enfermeira e o paciente se encontram, se relacionam num tempo sincronizado e
experimentam um processo de tomar decisões responsáveis. A enfermeira alimenta o
potencial humano, valorizando as capacidades e necessidades do paciente, oferecendo
51
a ajuda necessária.
Segundo Paterson e Zderad (1979), a enfermeira é privilegiada por estar com
pessoas que experimentam a diversidade do significado de ser humano desde o
nascimento até a morte. A enfermeira tem a oportunidade de experimentar e buscar
com os clientes o significado da vida, do sofrimento e da morte. Nesta jornada em
comum, se inserem os idosos com doença de Alzheimer e suas respectivas famílias,
num cenário complexo, repleto de significados e desafios.
Para entender o real significado da manifestação da doença de Alzheimer no
idoso, é necessário que se tenha um profundo conhecimento dos fatores que,
interligados, vão determinar as características deste fenômeno, e em conseqüência,
qual o seu significado para a vida dos envolvidos no seu cuidado. A vivência singular
e única, que só é conhecida por parte das famílias cujos idosos são portadores de DA,
deverá ser compreendida e valorizada pela enfermeira. Isto pode ser percebido na
instância do Grupo de Ajuda Mútua pelos relatos dos familiares, quando verbalizam
suas dúvidas e incertezas.
A prática cotidiana da enfermagem humanística requer da enfermeira
conhecimento profundo do ser humano, isto é, de “si” e do “outro” e das relações que
o cercam, denotando um compromisso existencial voltado para entender e valorizar o
potencial humano. Embora os idosos com DA manifestem alterações do
comportamento, apresentando episódios de irracionalidade, de teimosia, de
desconfiança, de agitação e de nervosismo, devem continuar a ser abordados com
respeito, ser protegidos de falhas e embaraços, assim como ter sua dignidade adulta
preservada. As mudanças no desempenho de papéis (de gênero, familiares, sociais)
que ocorrem podem provocar grande sofrimento tanto para os portadores quanto para
os familiares, que são obrigados a se reorganizarem para viabilizarem os cuidados,
passando a atuar como cuidadores, com evidentes desdobramentos em seus cotidianos.
Ambos, idosos com DA e familiares demandam envolvimento e comprometimento por
parte da enfermeira que pode ajudar as famílias a negociarem uma redistribuição de
papéis e responsabilidades.
A enfermagem humanística ou enfermagem fenomenológica constitui-se então
52
em uma experiência existencial que ocorre através do compromisso da enfermeira de
estar com o cliente e de agir com ele. Ela reside primariamente no campo
intersubjetivo, embora reconheça o desdobramento objetivo, subjetivo e intersubjetivo
da natureza do mundo do cuidado.
A compreensão fenomenológica dos comportamentos humanos pode auxiliar na
relação terapêutica estabelecida, permitindo à enfermeira a constante procura por
novas interpretações originais do mundo do cuidado. No encontro estabelecido entre a
enfermeira e o cliente, a linguagem humana é considerada e valorizada.
Creio que à medida que a enfermeira se envolve pelos princípios dessa teoria,
ela pode valorizar a experiência, muitas vezes dramática, das famílias cujos idosos
possuem doença de Alzheimer, oferecendo contrapartidas viáveis, de caráter menos
intervencionista e com abordagens mais compreensivas. Ao colocar-se próxima,
ouvindo as famílias expressarem seus sentimentos e suas inquietações, funcionando
como apoio, compartilhando as dificuldades encontradas em cada nova etapa da
demência, enfim, interagindo com estas famílias cuidadoras, a enfermeira manterá um
diálogo intersubjetivo pautado no cuidado humanizado.
Por ser a profissional que exercita o ato de cuidar de forma humanística além da
respectiva competência técnica, a enfermeira na instância do Grupo de Ajuda Mútua
valoriza o ser humano, compartilha experiências, mostra-se disponível, aberta a
questionamentos, fazendo-se presente autenticamente.
A Teoria Humanística de Paterson e Zderad (1979) tem como pressuposições
básicas implícitas:
As enfermeiras, consciente e deliberadamente, aproximam-se da
Enfermagem como uma experiência existencial (p.19).
Cada situação de Enfermagem reciprocamente evoca e afeta a expressão e as
manifestações das capacidades existenciais dos seres humanos e sua condição
(p.19).
A Enfermagem Humanística inclui mais que uma benevolente relação sujeito-
objeto competente tecnicamente, guiada por uma enfermeira em benefício de
alguém (p.20).
Enfermagem é uma relação transacional e investigativa, cuja significância
demanda conceptualização fundamentada em uma consciência existencial da
enfermeira de si mesma e do outro (p.20).
Os seres humanos têm uma força inata que os mobiliza para reconhecer
53
suas próprias visões e as visões dos outros (p.32).
Os seres humanos são livres e se espera que se envolvam em seu próprio
cuidado e nas decisões sobre sua vida (p.37).
Enfermeiras e pacientes coexistem, sendo ao mesmo tempo dependentes
e interdependentes (p.32).
A enfermagem fenomenológica de Paterson e Zderad (1979) tem uma proposta
metodológica que descreve a compreensão das diversas situações de enfermagem. Ao
colocar-se como uma teoria da prática de enfermagem baseada na filosofia existencial,
procura o significado da enfermagem no ato existencial e valoriza a experiência como
um meio de desenvolver nova teoria através da descrição fenomenológica da arte-
ciência de enfermagem. É a enfermagem sendo vista dentro do contexto humano.
Nessa abordagem, as teóricas propõem cinco fases distintas que devem ser
caracterizadas no processo de praticar o cuidado da enfermeira junto ao outro, o
cliente, o paciente. A fase primeira é a de Preparação da enfermeira para vir a
conhecer, ou seja, a enfermeira prepara-se para ser uma pessoa aberta às experiências,
estar consciente de sua visão de mundo e aceitar a estrutura perceptiva de outros de
modo a ampliar suas possibilidades de conhecimento acerca da situação dos clientes.
Para Paterson e Zderad (1979), a enfermeira deve subjetivamente vivenciar o outro e
para isto, necessita possuir sensibilidade acerca da condição humana, o que é obtido
através da literatura, artes, teatro e da terapia de conhecimento pessoal, dentre outros.
Assim, pode aprofundar estudos na área das ciências humanas, realizar leituras de
trabalhos literários que incluam reflexão, contemplação e discussão, relacionadas com
o conhecimento e a compreensão do ser. O autoconhecimento é vital para o
estabelecimento de relacionamento interpessoal significativo com os portadores de DA
e seus respectivos familiares no processo de cuidar.
O preparo da enfermeira como ser existencial e responsável pressupõe
conhecer-se a si própria, tomando ciência das suas próprias limitações, fragilidades,
preconceitos, assim como permitir o melhor usufruto de suas potencialidades.
Outra fase da proposta de Paterson e Zderad (1979) é o conhecimento intuitivo
do outro pela enfermeira. O conhecimento intuitivo permeia a relação Eu-Tu na qual
se está aberto ao sentido e ao ritmo das experiências do outro, o que resulta em um
54
conhecimento especial, difícil de expressar. A enfermeira deverá ver o outro com
singularidade, através dos olhos do outro, respondendo aos seus chamados, com
presença autêntica, sentindo também com autenticidade a presença do outro. Para
captar de forma intuitiva o fenômeno de uma determinada situação de enfermagem, as
teóricas sugerem que a enfermeira parta para a situação de enfermagem sem
preconceito, evite expectativas, rótulos e julgamentos, sendo mais capaz de captar,
intuitivamente, as nuances sutis envolvidas na interação humana. Praeger (2000)
acrescenta que conhecer o outro intuitivamente exige estar “dentro” do outro, no ritmo
das experiências do outro, o que presume uma abordagem fenomenológica de estar
aberto ao significado da vivência do outro. Este modo de relacionar-se, característico
de uma relação Eu-Tu, enquanto movimento em direção ao outro, faz com que a
enfermeira esteja na mesma arena que os demais, numa relação de iguais.
No contexto de um Grupo de Ajuda Mútua, esta fase da metodologia
fenomenológica pressupõe que a enfermeira deixe fluir o diálogo a partir dos
depoimentos dos familiares cuidadores, permitindo a fruição da temática. As diversas
formas de expressão verbal e não verbal dos familiares, acompanhadas de maior ou
menor conteúdo emocional, estimulam o conhecimento intuitivo na relação
estabelecida no Grupo. Quando os familiares cuidadores expõem as angústias,
frustrações e cansaço decorrentes de demandas advindas do cuidar, a enfermeira pode
interagir de forma especial com eles no intuito de ajudá-los e confortá-los, olhando e
ouvindo com respeito e consideração, propiciando um ambiente agradável e acolhedor.
Em seguida vem a fase da enfermeira conhecer o outro cientificamente. Aí, a
enfermeira unirá tudo que é conhecido intuitivamente da situação de enfermagem para
conceitualizar a experiência, expressando-a segundo sua vivência e potencial humano
e irá analisar, refletir,comparar, relacionar, interpretar, denominar, contrastar e
categorizar, buscando relação entre as partes.
Segundo Paterson e Zderad (1979, p. 123 ) “ O desafio de comunicar uma
realidade de enfermagem vivida demanda autenticidade consigo próprio e um esforço
rigoroso na seleção de palavras, frases e da gramática precisa”. Para alcançar essa
meta a enfermeira necessita ser capaz de refletir, criticamente, acerca da experiência,
55
ao mesmo tempo em que está imersa nela. Neste exercício reflexivo, a enfermeira
analisa, considera as relações entre os componentes, sintetiza temas e então
conceptualiza ou simbolicamente interpreta uma visão seqüencial acerca desta
realidade de enfermagem vivida. Diante da multiplicidade e complexidade envolvida
na experiência ser familiar cuidador de idoso com doença de Alzheimer, que é
compartilhada com os demais, na instância do Grupo de Ajuda Mútua, a enfermeira
pode colocar-se como parte ativa, também se dando a conhecer, deixando emergir
sentimentos, expectativas, visão de mundo, como ser-humano e ser-enfermeira diante
de uma realidade que faz parte da sua vivência.
A outra fase, é quando a enfermeira sintetiza complementarmente outros
conhecimentos, ou seja, a enfermeira ao comparar e sintetizar múltiplas realidades
conhecidas chega a uma visão ampliada. Ela permite um diálogo entre as realidades,
admitindo as diferenças e contrastes. Neste momento, a enfermeira usa a experiência
pessoal e os fundamentos teóricos de educação e da prática para poder colocar a
situação clínica em perspectiva.
Por fim, vem a fase da multiplicidade, quando ocorre na enfermeira a
sucessão em seu íntimo à unidade paradoxal. Fase na qual o ponto de vista da
enfermeira é expandido, como resultado da realização das fases anteriores. É o
momento de abstração, com desdobramento das múltiplas realidades para uma
conceptualização ou abstração inclusiva, que compreende velhas e novas verdades que
não se contradizem. É o processo de refinamento da captação intuitiva adquirida
anteriormente, a luta com as realidades conhecidas e a realização de um salto intuitivo
para a verdade. O paradoxo, segundo Praeger (2000, p. 247) está no fato de que a
“enfermeira inicia com uma noção geral, uma captação intuitiva sobre a situação,
depois a estuda, compara, contrasta e sintetiza para chegar a uma conclusão que tem
significação para todos: um constituinte descritivo teórico de enfermagem”.
No âmbito de um Grupo de Ajuda Mútua que segue a linha humanística,
pretendeu-se com sua formação agregar pessoas vivenciando a mesma situação-ser
familiar de idoso com DA, constituindo-se na instância que oferece apoio, promotora
de estratégias para modificar o contexto problemático em que se encontram e assim
56
poderem seguir em frente. A diversidade dos vínculos familiares, a heterogeneidade
das manifestações da doença de Alzheimer, as percepções individuais de cada familiar
e suas trajetórias enquanto cuidadores, podem evidenciar um cenário complexo e
multifacetado.
3.2 As concepções de Merhy acerca de Tecnologia Leve em Saúde
Emerson Elias Merhy (2002), médico sanitarista, referência quando o tema é
processo de trabalho em saúde, com expressiva produção intelectual nessa área, há
alguns anos tem buscado e proposto mudanças no modo de se produzir saúde no
Brasil, com vistas a viabilizar a construção de um sistema de saúde mais humanizado e
comprometido com a vida das pessoas. Em seu entendimento, os modelos atuais de
ordenamento das práticas clínicas e sanitárias no âmbito dos serviços de saúde
públicos ou privados, já perderam seu rumo maior: o da defesa radical da vida
individual e coletiva (Merhy, 2002). Para o autor, estes modelos têm-se mostrado
ineficientes e ineficazes perante a vida dos cidadãos e de seus respectivos problemas e
necessidades, sendo marcados pela impessoalidade, falta de interesse e
descompromisso.
Sua experiência em diferentes estabelecimentos que ofertam serviços de saúde e
reflexões teóricas, permitiram-lhe constituir um modo competente de realizar a
mudança de um modelo de atenção corporativo-centrado para um usuário-centrado
(MERHY, 2002), tomando como referência-chave o interesse do(s) usuário(s) dos
serviços, representado enquanto necessidade de saúde. Neste modelo, os profissionais
trabalhadores e os usuários dos serviços atuam mutuamente e permanentemente,
abrindo-se para um processo de troca de informações, acolhimento de problemas e
reconhecimento mútuo de direitos e deveres, podendo, assim viabilizar (in)satisfações
por meio das intervenções que se estabelecerem. Esse modo de operar o trabalho em
saúde, para Merhy (2002), orienta-se pela construção de um vínculo entre profissionais
57
trabalhadores e usuários, na busca da garantia do acesso às ações de saúde e na
necessidade de acolhimento dos usuários nos serviços. Ao pensar, implantar e
vivenciar novos fluxos dentro dos serviços de saúde, redesenhados a partir dos
movimentos reais dos usuários, de suas necessidades, viabilizando a construção de um
sistema de saúde mais humanizado e comprometido com a vida das pessoas, Merhy
(2002) articula uma nova configuração tecnológica que denomina de tecnologia não-
equipamento. Para ele, o processo de trabalho é o resultado da interação de dois
componentes: o trabalho vivo e o trabalho morto. No entender de Merhy (2002), o
trabalho vivo em saúde constitui-se das ações executadas pelos profissionais
cuidadores na sua relação direta com os usuários, situando-se na dimensão do
cotidiano, na qual predomina a subjetividade humana, descentrando o trabalho em
saúde dos equipamentos e dos especialistas. O trabalho vivo é o trabalho em ação, que
está em processo de construção. Durante o trabalho vivo em ato, o profissional
trabalhador pode ser criativo e autônomo quanto aos instrumentos à sua disposição,
dentro de um objetivo que se pretende atingir, renovando-os em conjunto com os
usuários. Embora o trabalho vivo em ato esteja sendo quase que plenamente capturado
por forças instituídas, ainda tem espaço para exercer variações por se tratar de um
trabalho que acontece no exato momento em que ocorre a relação usuário/profissional
trabalhador, onde inevitavelmente aparece o campo da subjetividade humana
(MERHY; ONOKO, 1997).
Por outro lado, o pólo do trabalho morto é constituído por todos os elementos
que estão envolvidos nos processos de trabalho, como máquinas-ferramenta, assim
como também por componentes vinculados ao saber e ao modo de atuar dos
profissionais envolvidos no trabalho e é resultado de um trabalho humano anterior. O
conjunto dos componentes citados define a dimensão tecnológica do trabalho morto,
porém o saber e o modo de atuar dos indivíduos dá sentido ou não à razão instrumental
do equipamento utilizado (MERHY; ONOKO, 1997). O trabalho em saúde ao
englobar tanto o trabalho vivo em ato como o trabalho morto, faz uso da incorporação
tecnológica. Para ele, tecnologia não se restringe a instrumento e equipamento
tecnológico, abarcando saberes constituídos em um processo de trabalho específico,
operando sobre recursos na realização de finalidades perseguidas.
58
Dentro dessa concepção, Merhy (2002, p.49) classifica as tecnologias
envolvidas no trabalho em saúde como:
leve (como no caso das tecnologias de relações do tipo produção de vínculo,
autonomização, acolhimento, gestão como forma de governar processos de
trabalho), leve-duras (como no caso de saberes bem estruturados que operam
no processo de trabalho em saúde, como a clínica médica, a clínica
psicanalística, a epidemiologia, o taylorismo, o fayolismo) e dura (como no
caso de quipamentos tecnológicos do tipo máquinas, normas, estruturas
organizacionais).
No presente estudo, a ênfase está nas tecnologias leves, as quais permitem
operar os processos relacionais entre o profissional trabalhador de saúde e o usuário
com o propósito de conduzir a assistência no interior de um Grupo de Ajuda Mútua de
familiares cuidadores de idosos com doença de Alzheimer.
Nesse contexto, é pertinente a afirmação de Merhy (2002, p.129), de que
todo o profissional de saúde, independente do papel que desempenha, como
produtor de atos de saúde é sempre um operador de cuidado, isto é, sempre
atua clinicamente, e como tal deveria ser capacitado, pelo menos, para atuar
no terreno específico das tecnologias leves [...].
Nessa nova abordagem tecnológica em saúde, tecnologia leve é definida como
sendo
a tecnologia de (e das) relações dos interseçores, no interior dos processos
que podem gerar alterações significativas no modo de se trabalhar em saúde
[...] sob uma ótica analisadora pautada pela ética do compromisso com a
vida e expressa em ato nas dimensões assistenciais do trabalho vivo em
saúde, como a relação de acolhimento, a criação do vínculo, a produção da
resolutividade e a criação de maiores graus de autonomia, no modo das
pessoas andarem na vida (MERHY, 2002, p.105).
No âmbito do universo tecnológico do trabalho vivo em ato na saúde, se
expressam alguns componentes vitais da tecnologia leve como acesso, acolhimento,
vínculo e encontro de subjetividades, e autonomização para concretizar o cuidado
humanizado.
O acesso à saúde está ligado às condições de vida, nutrição, habitação, poder
aquisitivo e educação, englobando a acessibilidade aos serviços, que Merhy (2002)
defende como um direito do cidadão. Pode-se visualizar o acesso como uma primeira
59
etapa a ser vencida pelo usuário quando parte em busca da satisfação de uma
necessidade de saúde.
O acolhimento consiste na humanização das relações entre profissionais
trabalhadores de serviços de saúde e seus usuários. O encontro entre esses sujeitos se
dá num espaço interseçor no qual se produz uma relação de escuta e responsabilização,
a partir do que se constituem vínculos e compromissos que norteiam os projetos de
intervenção. Esse espaço permite que o profissional trabalhador use de sua principal
tecnologia, o saber, tratando o usuário como sujeito portador e criador de direitos
(MERHY, 2002). Ainda, o acolhimento deve construir uma nova ética, da diversidade
e da tolerância aos direitos, da inclusão social com escuta clínica solidária,
comprometendo-se com a busca da cidadania. Nesse sentido, o acolhimento deve
resultar das relações no processo de atendimento, o que ocorre após ultrapassada a
etapa do acesso. No encontro entre profissionais e usuário, dá-se uma negociação
visando a identificação de suas necessidades, uma busca de produção de vínculo, com
o objetivo de estimular a autonomia do usuário quanto à sua saúde.
Outro elemento essencial do atendimento, o nculo, para Merhy (2002)
implica em compromisso e co-responsabilidade que vai se consolidando entre o
usuário e sua família com os profissionais de saúde e respectivos serviços de saúde. O
vínculo com os usuários do serviço de saúde amplia a eficácia das ações de saúde e
favorece a participação do usuário durante o processo de prestação do cuidado.
Enquanto ferramenta, a produção de vínculo deve ser um projeto de toda uma ação de
saúde a fim de que se concretize no trabalho vivo em ato.
A autonomização refere-se ao “processo intersubjetivo que põe em xeque a
produção da autonomia, como capacidade de governar o modo de caminhar na vida”
(MERHY, 2002, p. 122). No tenso campo dos processos de trabalho em saúde, para o
usuário das ações de saúde poder manter ou recuperar graus desta autonomia é
necessário o efetivo comprometimento dos profissionais trabalhadores.
A incorporação desta dimensão tecnológica em saúde, com ênfase nas
tecnologias leves, nas quais a produção de bens-relações tenha prioridade, constitui-se
em recurso importante para a concretização e sustentação de um modelo de assistência
60
que venha produzir cuidado humanizado.
A enfermeira, em decorrência da inserção que tem no processo de trabalho, pela
sua dimensão cuidadora em seu cotidiano profissional, encontra-se em terreno fértil
para comprometer-se tanto com a competência técnica na produção de bens/produtos
simbólicos, quanto com a competência humana, na produção de bens-relações que
contemplam a integralidade humana dos usuários e dos profissionais trabalhadores em
saúde. Atuando nessa perspectiva, a enfermeira responsabilizar-se-á pelas reais
necessidades de saúde dos usuários, indo além do cumprimento de um cardápio
préestabelecido limitado.
O desenvolvimento mais intenso das tecnologias leves implica em outra
alternativa de assistência, em relações mais próximas dos profissionais com o usuário,
redefinindo o trabalho em saúde. Os grupos de ajuda mútua representam uma instância
promissora para profissionais que atuam como assessores técnicos e facilitadores na
dinâmica de relações de apoio e ajuda que soe acontecer em seu interior. No encontro
das subjetividades, o profissional pode ajudar com base nas experiências de vida dos
envolvidos, em seus enfrentamentos peculiares nas situações de saúde-doença, a
produzir atos de assistência e cuidado às necessidades emergidas a cada momento.
4 METODOLOGIA
Para desenvolver o presente estudo, delineei uma prática cuidativa, trilhando
um caminho metodológico próprio em consonância com o objetivo proposto no
projeto e cujo referencial teórico-metodológico se assentava nos preceitos da
enfermagem humanística de Paterson e Zderad e de trabalho vivo em ações de saúde
de Mehry denominado tecnologia do tipo leve. Estratégias na formação de um Grupo
de Ajuda Mútua e seu funcionamento foi necessária, a fim de criar um território para o
desenvolvimento de tecnologia cuidativa de enfermagem voltada para o acolhimento,
vínculo e prática cuidativa da família cuidadora.
4.1 Abordagem de pesquisa de natureza convergente-assistencial
A adoção da abordagem de pesquisa de natureza convergente-assistencial
(TRENTINI; PAIM, 1999) foi um imperativo para a operacionalização do estudo.
Considerando a inexistência de serviços de atenção de cuidados de saúde de familiares
cuidadores junto aos serviços locais de saúde, foi necessário perseguir estratégias na
formação e funcionamento de um Grupo de Ajuda Mútua, a fim de criar um território
para o desenvolvimento de tecnologia cuidativa de enfermagem voltada para o
acolhimento, vínculo e prática cuidativa da família cuidadora.
A metodologia da pesquisa convergente-assistencial se adequou perfeitamente
porque ao desenvolver a prática cuidativa de enfermagem junto aos familiares
cuidadores, durante principalmente as reuniões do GAM, foi possível no mesmo
espaço e tempo, desenvolver procedimentos investigativos em busca da resposta à
questão previamente estabelecida.
62
Tal modalidade de pesquisa (TRENTINI; PAIM, 1999), permite a união dos
métodos de pesquisa e da prática assistencial de enfermagem quando se pretende
estudar e produzir conhecimentos com base na própria prática em desenvolvimento.
Neste tipo de pesquisa prevê-se manter durante todo o processo estreita relação com a
intencionalidade do pesquisador em solucionar ou amenizar problemas da prática,
realizar mudanças no campo da prática ou introduzir inovações na situação social.
Uma de suas principais características consiste na participação ativa das pessoas
envolvidas no espaço social da pesquisa, com conseqüente interação entre estas e o
pesquisador. Inclui atividades de cuidado/assistência dos clientes, constituindo-se
método apropriado para pesquisar a prática assistencial por conduzir o “pensar” do
fazer enfermagem.
A Pesquisa Convergente-Assistencial (PCA) apresenta determinadas
características próprias e convergentes, que a distinguem dos demais métodos de
pesquisa à medida que a prática assistencial complementa a prática de pesquisa e vice-
versa. A seguir, são descritos os critérios que o presente estudo procurou atender para
se caracterizar como tal.
a) Manutenção de estreita relação com a situação social, buscando soluções
para problemas, realização de mudanças e introdução de inovações nessa
situação social.
A proposição desta pesquisa emergiu de uma situação social revelada pela
ausência, no município de Rio Grande, de serviços ou programas de atenção de
cuidados de saúde de famílias cuidadoras de idosos com doença de Alzheimer.
Como enfermeira pesquisadora, adotei como estratégia a introdução de um
lócus de atendimento, mantendo o funcionamento de um Grupo de Ajuda Mútua para
as famílias em questão.
b) Compromisso com a melhoria do contexto social pesquisado.
A estratégia adotada de criação e funcionamento de um Grupo de Ajuda Mútua,
mesmo em caráter inicial como uma atividade de extensão universitária, teve a
pretensão, enquanto pesquisa, de provar tanto sua necessidade quanto sua viabilidade,
63
com a perspectiva de no futuro, vir a se constituir como mais um programa no serviço
de saúde oficial.
c) A Pesquisa Convergente-Assistencial usa métodos e técnicas variadas.
Ao longo da prática cuidativa de enfermagem, enquanto realizando pesquisa
concomitante, não me descuidei de registrar em diário de campo todas as ocorrências
úteis, tais como:
- registro das discussões de reuniões do GAM;
- registro condensado das entrevistas havidas com os membros do GAM em
visitação domiciliária; dos encontros dos membros do GAM com autoridades
sanitárias por ocasião de encaminhamento de reivindicações;
- Análise qualitativa de conteúdo registrado, com base nos preceitos de Paterson
e Zderad (1979) e Merhy (1997), os referenciais adotados.
d) A PCA não se propõe a generalizações.
Os resultados deste estudo não se prestaram à generalização para aplicação
automática em outros contextos, mesmo porque sua pretensão inicial foi contribuir
para a solução da prática de serviço local de saúde do município de Rio Grande
concernente ao atendimento específico da família cuidadora de pacientes idosos,
portadores de DA.
e) O pesquisador assume o papel de provedor de cuidado principalmente
durante a coleta de informações.
Ao apropiar-me da pesquisa convergente-assistencial, assumi concomitan-
temente a função de enfermeira. Nesta proposta, o ato de assistir/cuidar foi
desenvolvido no contexto principalmente das reuniões periódicas do GAM,
estendendo este atendimento ainda em contatos telefônicos, visitações domiciliárias,
atendimentos individualizados e acompanhamentos nos serviços referenciados.
64
4.2 Município de Rio Grande: o contexto do estudo
Rio Grande, município situado na região sul do Estado do Rio Grande do Sul,
com área de 3.338 km
2
e população de 183.461 pessoas habitando em sua maioria na
zona urbana. Do total da população, 6.258 (3,41%) representam pessoas com idade
entre 60 e 65 anos, e 13.705 (7,47%) com idade acima de 65 anos. Esse estrato idoso
representa 10,8% da população total do município, ultrapassando a média nacional.
que é de 8,6%, e a estadual (RS), que é de 10,4% (IBGE, 2000), demonstrando uma
concentração aumentada do contingente idoso na região, uma questão preocupante do
aspecto das políticas públicas sociais e de saúde. Não obstante sua elevada
concentração de população urbana, o município apresenta baixa cobertura de infra-
estrutura básica. Segundo levantamento realizado pelo NEAS – Núcleo de Estudos em
Administração e Saúde Coletiva da FURG, 60% da população recebem menos de três
salários mínimos como renda familiar. Entre a população idosa, 14 % não auferem
qualquer tipo de rendimento (NEAS, 2001).
Na área da saúde, por sua vez, o município conta com dois hospitais gerais, a
Santa Casa de Misericórdia e o Hospital Universitário (HU) da FURG, ofertando
respectivamente 426 e 156 leitos. Para o atendimento comunitário funcionam trinta
Unidades Básicas de Saúde (UBS) distribuídas em quatorze bairros e encontram-se
estabelecidas até o momento quinze equipes de Programa de Saúde da Família (PSF).
Não há ainda instalados no Município programas e ações especificas de
atendimento geriátrico, embora se observe uma expansão do contingente idoso,
provocando importante impacto em toda a sociedade, principalmente no sistema de
saúde.
O Município também não conta com médicos geriatras em seu quadro, já que
essa carreira ainda não foi criada no serviço público. Contudo, no passado havia um
ambulatorio de geriatria no HU/ FURG que cumpria a função, mesmo que de modo
restrito, mas infelizmente foi desativado em 1993 por falta de docente na área da
especialidade. Transcorridos onze anos, não se observaram iniciativas concretas a
65
favor do atendimento de saúde específica para a clientela idosa. Os pacientes idosos
com doença de Alzheimer e similares, têm sido atendidos por neurologistas
particulares ou por convênio, quando é o caso de terem recursos. No mais, são
atendidos pelo SUS, como qualquer paciente, sem atenção específica. Atenção à
família cuidadora de idosos doentes e fragilizados é questão que não se cogita nos
serviços de saúde, muito menos no Município.
4.3 Cuidados éticos de pesquisa e da prática
Como no estudo houve a participação direta dos familiares cuidadores de
membros idosos doentes, dirigia-lhes atenção especial de cuidados éticos e de respeito
aos seus direitos de liberdade em participar da pesquisa cujo objeto de estudo se
constituía no próprio atendimento que recebiam de mim, enfermeira, que era ao
mesmo tempo a pesquisadora.
Para Trentini e Paim (1999), autoras do método da pesquisa convergente-
assistencial, a sistematização de dados obtidos na própria prática assistencial e a
intencionalidade de desenvolver a investigação científica em meio à assistência de
enfermagem impõem a constituição de uma ética apropriada que requer postura
condigna por parte do pesquisador durante todas as etapas do estudo.
Por isso, fornecia aos familiares cuidadores, reiteradas informações necessárias
e esclarecimentos quanto a sua participação no estudo, explicitando os benefícios e
possíveis riscos ou situações de desconfortos; manifestava-lhes o reconhecimento pela
importância de sua contribuição ao estudo, assim obtendo a sua concordância com os
procedimentos metodológicos de prática e pesquisa a serem seguidos em convivência
comum, entre eles e a pesquisadora enfermeira e suas colaboradoras. Neste acordo,
atentei para os direitos humanos constantes na Resolução n.196 do Conselho Nacional
de Saúde, acerca da ética em pesquisa com seres humanos, a qual tem base nos
66
princípios de beneficência, não maleficência, justiça e autonomia. Da mesma forma, os
princípios do Código de Ética Profissional da Enfermagem foram observados ao longo
do estudo enquanto se desenvolvia a assistência cuidativa.
O termo de consentimento livre e esclarecido foi obtido dos familiares
participantes do estudo conforme a Resolução 196 do CNS, como se comprova no
anexo1.
4.4 Desenvolvimento da prática cuidativa
O foco do meu estudo concentrou-se no atendimento da enfermagem a famílias
cuidadoras de idosos doentes e/ou fragilizados ou mais especificamente, de idosos
portadores de DA, motivado pela carência de programas voltados para essas famílias
na comunidade rio-grandina. Por isso, contemplei no desenho da pesquisa para fins de
elaboração de minha tese de doutorado a possibilidade de formar um Grupo de Ajuda
Mútua (GAM) para esses familiares, como estratégia inicial na criação de um território
onde se assentaria o desenvolvimento de tecnologia de assistência cuidativa de
enfermagem, do tipo leve, aqui entendida como um trabalho de cuidados de saúde em
ato, segundo Merhy (2002).
A estratégia de formação de um GAM passou por vários procedimentos de
chamamento dos interessados por meio da mídia, além de convites pessoais a
familiares já conhecidos entre os profissionais dos locais de saúde para participar
no âmbito da Universidade, de um evento técnico–informativo sobre DA,
anunciando uma palestrante com autoridade no assunto, em data que coincidia
com a celebração do Dia Mundial de DA, em 2002. Previu-se, na ocasião do
evento, além da função informativa ao público em geral, também consultar os
presentes quanto a necessidade e importância de formar um GAM. Entre 14
familiares que compareceram ao evento, a manifestação pelo desejo de voltar a se
67
encontrar fez com que se planejasse um novo encontro; como também foi
solicitado aos presentes que indicassem e convidassem pessoas conhecidas em
condições semelhantes para o próximo encontro, adotando o método já conhecido
em pesquisa de “snow ball” para incorporação sucessiva de novos integrantes de
uma amostra ou de um grupo específico. A esse novo encontro anunciado
compareceram 24 cuidadores, representantes de 15 famílias de idosos com DA,
demonstrando interesse pela manutenção dos encontros grupais. Assim,
sucessivamente os encontros periódicos foram sendo programados segundo um
consenso decidido entre os participantes.
Ao longo dos diversos encontros, participaram em média oito familiares,
além de mim e de uma bolsista de extensão. Este tamanho de grupo mostrou-se
viável, favorecendo o compartilhamento de saberes e experiências e
possibilitando a participação de todos. Autores como Silva et al (2003), Trentini e
Gonçalves (2000) e Dias, Trentini e Silva (1995), corroboram essa observação. Os
integrantes do Grupo tinham entre 27 e 72 anos, com predominância de sexo
feminino e de pessoas casadas. Quanto à escolaridade, a maioria tinha ensino
médio completo, havendo também alguns com curso superior e outros com ensino
médio incompleto. A maioria das mulheres era dona de casa, algumas
comerciantes aposentadas, outras professoras aposentadas. Duas familiares,
embora possuíssem curso superior, não exerciam qualquer atividade remunerada.
Transcorrido o período de seis meses, os participantes passaram a discutir
questões que extrapolavam as decisões internas do Grupo ou enfrentamento de ordem
comum, como a necessidade de transformar aquele Grupo em representante regional
da ABRAz, com visibilidade e poder para lutar por direitos do cidadão idoso
necessitado. Tal iniciativa teve o meu estímulo quando levava ao Grupo informações
técnicas atuais e instrumentalizava-o com documentos oficiais, como a política de
saúde do idoso e legislação correlata, embora não se observasse o cumprimento dos
direitos dos idosos no cotidiano de atendimento dos serviços de saúde, no Município.
Planejamentos de trabalho ocorreram com participação dos componentes do Grupo
para a efetiva criação da sub-regional da ABRAz/RS , o que ocorreu em 13 de
setembro de 2003. E assim, o GAM formado no âmbito da FURG passou a constituir
68
uma célula da ABRAz que continua funcionando e dinamizando suas atividades, tendo
ainda a minha participação como membro facilitador, na qualidade de profissional
enfermeira. Tenho também feito articulações com outros profissionais sobre
necessidades e expectativas dos familiares cuidadores, no intuito de contribuir com o
Grupo com uma atitude interdisciplinar conduzindo as discussões com enfoque
multifacetado.
A formação e o funcionamento do GAM têm-se constituído no território,
segundo Merhy (2002), de acolhimento e vínculo dos clientes no serviço de saúde, e
ali pretendi polarizar a dimensão cuidativa com ênfase educativa nas reais
necessidades dos familiares cuidadores de idosos portadores de DA.
No que concerne à dimensão cuidativa, ao guiar-me pelos preceitos da teoria da
enfermagem humanística, observei, em todo o processo de prática e pesquisa, as
recomendações metodológicas de Paterson e Zderad (1979), para atender
adequadamente a determinada clientela, quais sejam: o auto-conhecimento da
enfermeira, a enfermeira conhece o outro intuitivamente, a enfermeira conhece o outro
cientificamente, a enfermeira sintetiza complementarmente outros conhecimentos, a
enfermeira procura desenvolver uma visão do todo coerente a partir de sucessão
múltipla de eventos.
Considerando a visão holística, integral da pessoa humana em suas necessidades de
cuidados da saúde, vali-me de outros métodos de atendimento, além da atenção grupal que
praticava em encontros no GAM, quais sejam: visitação domiciliar, atendimento por
telefone, atendimento individualizado em consulta específica ou para companhia pessoal
em busca de serviços indicados ou referenciados.
A visitação domiciliária acontecia quando emergiam nas discussões o
compartilhamento de experiências dos familiares nas reuniões do GAM, questões que
indicavam tal necessidade segundo minha percepção, o que sempre era conversado à
parte, após a reunião do grupo, ou por telefone, para avaliar sua efetivação, e no caso
positivo, receber a anuência do interessado. O uso do telefone por via dupla, pela
enfermeira ou partindo dos familiares, prática prevista no projeto, mostrou-se útil
principalmente nas questões que envolviam certa urgência na tomada de decisão
69
relativa ao cuidado do idoso no contexto doméstico. Já o atendimento individualizado
se dava sempre que a situação se mostrava particular exigindo intervenção pessoal.
Outra forma era acompanhar, como profissional, um participante ou pequeno grupo
deles, em visita a autoridades sanitárias, para reivindicar direitos do familiar doente e
de sua família, incumbência previamente decidida no GAM.
4.5 Obtenção e registro dos dados
A multiplicidade e a amplitude de dados gerados em processo de construção
guiado por uma abordagem de pesquisa tipo convergente-assistencial, instaram-me a
buscar meios variados e operativos para seu registro. Vali-me do recurso de gravação
em fita magnética de todos os eventos que foram possíveis, quando obtive
consentimento dos participantes envolvidos. Assim, foram gravadas as falas das
reuniões do GAM, entrevistas individuais realizadas com os participantes do GAM,
palestras de convidados às reuniões do GAM e os encontros agendados com
autoridades locais para encaminhamento de reivindicações.
As discussões e reflexões de cada reunião do GAM demandavam em média
duas horas de gravação e outras mais para a transcrição. As entrevistas individuais
ocorreram com alguns dos familiares cuidadores, a partir da solicitação dos mesmos.
Estes eventos forneceram informações acerca do cotidiano da família cuidadora.
Ao longo da visitação domiciliária ative-me a realizar algumas anotações
condensadas, sem proceder à gravação, passando a continuá-las ao voltar para casa.
Diário de campo foi outro recurso adotado: registrei de modo condensado e/ou
expandido todos os dados, nas ocasiões em que me foi impossível fazer a gravação,
como no caso dos telefonemas e de todas as minhas observações e impressões
relevantes no campo e nos atendimentos prestados por mim enquanto enfermeira
pesquisadora praticando a assistência cuidativa. Consulta de documentos foi outro
meio imprescindível: o uso de legislação, normas oficiais e literatura proveniente de
70
autoridades científicas relacionadas à DA e política de atenção ao paciente e família
foram essenciais no processo de construção de tecnologia de assistência cuidativa de
enfermagem na situação específica de atenção à família cuidadora de idosos com DA.
4.5.1 Fase de Análise
Todas essas informações foram reunidas e organizadas sistematicamente, com
dados obtidos em ambientes diversos, modulados pela assistência tanto individual
quanto grupal, sendo analisadas e interpretadas à luz do referencial teórico–
metodológico assumido, para responder à indagação inicial sobre a possibilidade de
ser desenvolvida uma tecnologia de assistência cuidativa de enfermagem dirigida à
família cuidadora de idosos portadores de DA. Pela natureza versátil da pesquisa
convergente-assistencial, que possibilita a um só tempo, desenvolver pesquisa e
assistência, neste estudo foi adotada a análise qualitativa, tendo o próprio GAM se
constituído na unidade de análise.
Trentini e Paim (2004) descrevem a fase de análise e de interpretação em
pesquisa qualitativa fundamentadas em Morse e Field (1995), que consiste de um
processo de apreensão das informações.
a) Processo de Apreensão
Inicia com a coleta de informações, requerendo sua organização. A seguinte
nomenclatura de identificação possibilitou agrupar as informações:
NC = notas de campo (registro das informações obtidas nas reuniões gravadas)
NT = notas teóricas (anotações de reflexões feitas pela pesquisadora ao longo do
processo de implantação da pesquisa)
NM = notas metodológicas (anotações da pesquisadora quanto à necessidade ou não de
retificações no processo metodológico previsto ao longo da pesquisa
71
Para identificar os códigos, as autoras indicam a necessidade de ler, reler e
refletir acerca das informações transcritas, para encontrar a palavra certa que
representa o assunto, pois o código agiliza a continuidade do processo de análise. Com
os códigos identificados, foi realizada a leitura vertical e transversal, a fim de unir as
informações comuns relatadas por cada um em diferentes momentos.
b) Análise e Interpretação
De posse de todos os dados registrados, estes foram ordenados
cronologicamente, mesmo porque as estratégias adotadas para a implementação da
prática cuidativa exigia o acompanhamento do processo de construção enquanto uma
tecnologia leve de trabalho em ato. A análise propriamente dita seguiu aos
procedimentos da técnica de análise de conteúdo, onde na leitura e releitura dos
registros, emergiram vários códigos, os quais foram revistos sucessivamente até que
dois agrupamentos de subtemas foram definidos com base no referencial teórico
adotado.
Esses dois subtemas são objeto de discussão no próximo capítulo e estão
sintetizados como: a) o estudo da assistência: uma construção convergente-assistencial
e b) o processo de cuidado com orientação humanística e usuário centrado,
ramificando-se em b1) a minha preparação como enfermeira para vir a conhecer a
família cuidadora em sua situação particular; b2) a enfermeira respondendo às
necessidades da família cuidadora: partilhando habilidades cuidativas; b3)
instrumentalizando familiares acerca da doença de Alzheimer e b4) a assistência
cuidativa grupal como um potencializador de prática cidadã.
5 PRÁTICA CUIDATIVA DE ENFERMAGEM AOS FAMILIARES
CUIDADORES DE IDOSOS COM DOENÇA DE ALZHEIMER
Por se tratar de uma pesquisa convergente-assistencial, a análise do
desenvolvimento da prática cuidativa ocorreu na junção do processo de assistência e
pesquisa. O Grupo de Ajuda Mútua (GAM) para familiares de idosos com doença de
Alzheimer foi deliberadamente formado, constituindo-se no território ou espaço
intercessor de acolhimento e vínculo, dando início ao estudo da assistência pretendida.
5.1 O estudo da assistência: uma construção convergente-assistencial
Como já referido, diante da ausência de programas de atenção à família
cuidadora no Municipio, associada à crescente prevalência de idosos portadores de
doença de Alzheimer e à perspectiva de um Grupo de Ajuda Mútua ser um recurso
alternativo prático de atendimento às necessidades daquela família, era imprescindível
darmos os primeiros passos para tal prática.
Assim, próximo à data da celebração do Dia Mundial da Doença de Alzheimer,
tomei a iniciativa de convidar a comunidade para participar de uma palestra proferida
por uma enfermeira experiente no cuidado de pacientes portadores de Alzheimer.
Articular sua vinda veio ao encontro de uma afirmação de Paterson e Zderad (1979,
p.19): “a presença e o efeito da presença de alguém pode sentir-se mais vividamente
do que se pode descrever”. A possibilidade de escutar sua experiência profissional
configurou-se em uma estratégia para iniciar um diálogo com as famílias, no sentido
existencial, conforme preconizado pelas teoristas, como forma de relação
73
intersubjetiva, na qual um indivíduo distinto e único se relaciona com o outro.
Encontro esse caracterizado pela expectativa de que haverá uma enfermeira para
atender um paciente, na presente situação as famílias cuidadoras de idosos com DA.
Naquele primeiro momento de encontro com as famílias, considerei relevante e
significativo que elas pudessem apreender vivências e experiências significativas de
outros, como relatado pela enfermeira, acerca dos enfrentamentos de profissionais de
saúde no cuidado de pacientes portadores da doença de Alzheimer.
A decisão de quatorze familiares de optarem por aceitar o convite e
comparecerem a essa reunião poderia ser entendida como uma manifestação de
desenvolvimento do seu “ser mais humano” diante dos sentimentos de “esperança e
temor”(PATERSON e ZDERAD,1979, p.20) solitariamente vivenciados como
familiares cuidadores, sem suficiente apoio por parte do poder público, principalmente
dos serviços de saúde.
Enquanto expressão de um diálogo vivo que começava a ser construído, os
nomes e telefones de todos os participantes foram registrados, de modo a possibilitar
novos contatos. Já naquela ocasião tinha em mente de, num futuro próximo, congregar
diversos familiares para a formação do Grupo de Ajuda Mútua (GAM) como um
recurso alternativo de atendimento no espaço extra-hospitalar, buscando ampliar
espaço de produção de ações de cuidado de saúde. Assim, o GAM pôde configurar-se
numa estratégia para tecer novos arranjos tecnológicos nos quais a produção de bens-
relações seria priorizada (MERHY, 2002). Nesse espaço se deu o “encontro com o
usuário final” (MERHY, 2002, p.51), o familiar cuidador, o qual manifesta
necessidades/demandas, embora na maioria das vezes o foco de atenção e cuidado se
limitava ao portador de DA, como pode ser apreendido na verbalização de alguns
familiares:
“[...] tem horas que a gente fica esgotada, todo o tempo estou em função
dele [...] levando ao médico, fazer o que [...] é um tal de fazer exames e ver
que fisicamente quem está bem é ele, pois eu estou com a pressão e o
colesterol altos [...] ” (Granada, 62 anos)
Nesse relato emerge a complexidade da doença de Alzheimer, que repercute
sobre o familiar responsável em prover os cuidados no domicílio, submetendo-o a uma
74
constante carga de tensão, tornando-o exausto e desgastado, física e mentalmente
(PELZER e FERNANDES, 1997).
Enquanto espaço promotor de bens-relações, o GAM estimulou o vínculo, o
acolhimento e o encontro de subjetividades entre enfermeira, ao mesmo tempo
pesquisadora, trabalhadora de saúde e familiares cuidadores, usuários. Por ser uma
enfermeira com formação gerontológica e com experiência pessoal prévia com
famílias de idosos portadores de DA, ao usar o saber tecnológico, procurei associá-lo
com a produção de bens-relações, com vistas a uma relação cuidativa humanizada.
Paterson e Zderad (1979, p. 59) perguntam: “o que significa para o paciente a
mera presença física da enfermeira?” No contexto do enfoque dado pelas teoristas, o
diálogo é um componente essencial que permeia os atos da enfermeira, é o chamado e
a resposta de ajuda ao longo das interações da transação intersubjetiva entre a
enfermeira e o paciente que necessita de cuidados. Seguindo essa linha de raciocínio,
cabe a indagação: “o que significa, para o paciente idoso, a presença física dos
familiares cuidadores?” Nesta proposta de implementação de uma enfermagem
humanística, as minhas ações como enfermeira buscaram expressar o compromisso
autêntico com o potencial humano do outro, ou seja, dos familiares, considerando suas
manifestações, solicitações e disponibilidades, para que estes pudessem continuar
respondendo às necessidades do idoso ao desempenhar a sua tarefa de cuidar.
Assim, como expressão deste compromisso, novos chamamentos ocorreram de
modo a prosseguir na formação do GAM como território principal no assentamento da
prática cuidativa de enfermagem com enfoque humanístico e acolhedor. Sua
divulgação novamente se deu através da imprensa escrita, com a publicação de um
texto sobre a doença de Alzheimer, além dos contatos telefônicos com aqueles
familiares presentes no encontro anterior. Para o novo encontro, planejamos atividades
de acolhimento aos que chegavam, com música de relaxamento, oferta de chá e café
acompanhados de biscoitos, assim como estratégia de mensagens escritas de
valorização do ser humano. Material sobre a DA e cópia de portarias do Ministério da
Saúde sobre disponibilização de medicação pelo SUS também foram distribuídos com
a intenção de ampliar o conhecimento acerca do cuidado e dos direitos de pacientes
75
com DA.
Vinte e três cuidadores representando famílias de quinze pacientes
compareceram a esse primeiro encontro após a palestra havida no dia internacional de
DA.. Em nosso entendimento, essa resposta ao chamamento reafirmou a existência de
uma lacuna, que poderia ser preenchida com nossa disponibilidade e acolhida para
conduzir a atividade grupal de ajuda mútua entre os familiares de idosos portadores de
DA..
Acolhimento é um dos elementos essenciais do atendimento em serviços de
saúde, favorecendo a qualificação da assistência prestada. Para Merhy (2002), o
acolhimento consiste na humanização das relações entre trabalhadores de serviços de
saúde com seus usuários. Tendo isto em mente, preparei o local onde seria conduzida a
atividade, dispondo as cadeiras em círculo para facilitar a visualização e a escuta
mútua, assim como a participação das pessoas. Esse arranjo e os demais relacionados a
iluminação e ventilação do espaço físico visavam facilitar o bom andamento das
atividades grupais.
Apoiada nas premissas da enfermagem humanística de Paterson e Zderad
(1979), realizei minha apresentação pessoal, procurando repassar aos presentes meu
compromisso existencial como pessoa e enfermeira na formação de um Grupo de
Ajuda Mútua. Paterson e Zderad (1979, p.35) ponderam que “a enfermagem
humanística é um compromisso existencial, que é pessoal e profissional”. Nesse
sentido, tinha a convicção de que em conjunto, eu como enfermeira e os familiares,
poderíamos compartilhar experiências e com a devida exploração e expansão das
relações, alcançar o enriquecimento recíproco.
Na apresentação dos familiares presentes pude observar que os respectivos
vínculos com os portadores de DA eram de diferentes laços familiares, como:
esposa(o), irmã, cunhada(o), filha, sobrinha e neta. Além do tipo de parentesco,
conheci algumas histórias das relações entre os familiares cuidadores e os idosos, seus
recursos pessoais e características da personalidade dos envolvidos que influenciaram
na tomada de decisão para assumir o papel de cuidador. Tais relatos pessoais
indicaram a maneira como se organizava o grupo doméstico diante das demandas de
76
cuidado requerido. Nesse aspecto, Santos (2003) refere que a construção do cuidado
do doente de Alzheimer é um processo multifacetado e varia de acordo com a vivência
sociocultural e as experiências que se refletem no contexto familiar.
A emersão de uma demência progressiva e irreversível com grande sobrevida
em dependência tem imposto a esses familiares o desempenho do papel de cuidador,
provavelmente nunca experimentado antes, o que é evidenciado quando relatam:
“ [..] a relação com minha sogra sempre foi difícil pois ela não se
relacionava bem com a gente, era intransigente, dura e resistente às
mudanças... com a doença, nem as filhas quiseram mais ficar com ela [...]
agora ela está na minha casa, comigo e com meu marido [...] sou eu que
cuido dela, tive que assumir tudo e não está sendo fácil [..] ” (Esmeralda,
50 anos).
“[...] minha irmã gostava muito de sair, dançar, vivia na noite [...] sempre
foi independente, liberal e autônoma. Quando jovem ela nunca quis casar,
não era de ter compromisso na vida, também costumava viajar muito. Agora
está com esta doença [...] sou eu, a irmã mais velha que cuido dela ajudada
pela minha sobrinha [...] ” (Hematita, 72 anos).
As dificuldades de relacionamento e tensões nas relações interpessoais
familiares no passado podem refletir-se no momento da participação nos cuidados ao
idoso com DA, quando estes familiares são compelidos a seguir a “carreira de
cuidador” (ALVAREZ, 2001), tornando-se e sentindo-se sobrecarregados. Ao mesmo
tempo em que estão absorvidos com as situações vivenciadas com o doente de
Alzheimer, também precisam dar continuidade à própria vida e seus projetos pessoais.
Eu estava iniciando a relacionar-me com essas pessoas no que Paterson e
Zderad (1979, p.61) classificaram de “uma rede complexa de relações inter-humanas
que influem no diálogo da enfermeira”, de modo que acreditava que dali em diante
estaríamos juntos em “um mundo real de homens e coisas em um determinado tempo e
espaço”, que se constituiria na minha atuação como enfermeira junto ao GAM.
Por ser o Grupo aberto com adesão constante de novos participantes e no qual
se almejava um clima de liberdade, segurança e confiança, quando seus membros
expunham seus sentimentos e suas experiências enquanto familiares cuidadores,
levantei aspectos relacionados à garantia do anonimato, preservando o sigilo das
informações registradas, retomando-os continuamente à medida que novos membros
77
passavam a participar. Por se tratar de Pesquisa Convergente-Assistencial (PCA), com
dupla intencionalidade: conduzir um processo de assistência articulado a um processo
de pesquisa (TRENTINI e GONÇALVES, 2000), como coordenadora do Grupo
solicitei a permissão para gravar cada encontro, deixando claro que poderiam ver e
ouvir os registros se o desejassem.
Não há como negar que a DA envolve uma série de perdas, transformando a
dinâmica da vida familiar, conduzindo, muitas vezes, as famílias à experiências muito
dramáticas, de conviver com um luto antecipado, de perdas futuras previsíveis, tendo
que aprender e se adaptar continuamente às novas exigências do seu cotidiano. Além
de perder parte da identidade e do desempenho de papéis, o pai, a mãe ou o cônjuge
continua sendo vista como pessoa dependente, que precisa de atenção, apoio e ajuda
cotidiana. Esse idoso fragilizado pela doença de Alzheimer passa a ser um cidadão que
requer do Estado atenção de cidadania tutelada, com direito à assistência digna por
parte do sistema oficial de saúde .
A trajetória desses familiares, como cuidadores informais com escassos
conhecimentos e informações acerca da DA, com demandas econômicas e a
inexistência de contrapartida adequada por parte do sistema formal de saúde,
sinalizava a necessidade imediata de receberem apoio para enfrentar a situação de vida
em que se encontravam.
Nos relatos iniciais, pude perceber a importância de, como enfermeira que
utiliza uma abordagem humanística, vir a desenvolver o bem-estar e o ser mais como
forma de desenvolver o potencial humano. Isto é especialmente relevante no âmbito do
cuidado dispensado ao portador de Alzheimer, em que a sobrecarga, a depressão, o
desgaste, os problemas de saúde e maior limitação social são freqüentes entre
cuidadores (CLYBURN et al., 2000; SANTOS, 2003), tornando-os mais predispostos
ao agravamento de sua saúde e aborrecimentos, o que pode ser constatado a partir de
alguns depoimentos como os que seguem abaixo:
“[..] teve uma vez em que ele tentou se atirar do prédio, já estava com a
janela aberta e uma perna para fora da sacada.Foi o maior susto, aí eu vi
que tinha que ficar sempre perto, tranquei todas as portas, ah! [...] e as
janelas fiquei sem abrir por vários meses. Teve outra vez em que ele jogou
78
uma fralda com fezes pela janela. Me incomodei com o condomínio onde
moro, uma vez que o prédio fica no centro, agora só saio quando uma das
cuidadoras fica com ele. Também não tenho mais participado das reuniões
do meu grupo do[ ...] , não dá [...]” (Ametista, 68 anos).
“[...] do jeito que está minha avó eu acabei trancando o semestre na
faculdade, pois eu não tenho com quem deixá-la [...] teve vez em que abriu a
janela e distribuiu o dinheiro da aposentadoria para qualquer pessoa que
estivesse próxima, quando fui atrás, ninguém na vizinhança tinha visto [...]
mas o dinheiro dela havia sumido [...] é apavorante, é uma doença muito
difícil de lidar [...] (Amazonita, 27 anos).
Essas manifestações indicam a sobrecarga decorrente do cuidar. Observei que o
cuidado informal desenvolvido por cônjuge, filhos, irmãs, sobrinhas e netas é a fonte
primária de assistência ao idoso e, na sua maioria, é constituído de pessoas do sexo
feminino conforme vem sendo registrada na literatura (BAUM; PAGE, 1991;
FERRETTI, 2004).
Dillworth-Anderson et al. (1999) destacam o cuidar como experiência
heterogênea determinada por variáveis históricas e culturais. No caso específico do
Brasil, em que ocorre acelerada tendência de envelhecimento populacional, com
crescente aumento da expectativa de vida (IBGE, 2000), as mulheres predominam
nesse cenário em número e na função de cuidadoras no âmbito doméstico. Isto pôde
ser constatado nos estudos realizados por Caldas (2000), Andrade (2001) e Santos
(2003), em que a maioria dos cuidadores era do sexo feminino.
Considerando a Portaria de Assistência aos Portadores da Doença de
Alzheimer, ainda não cumprida nos contextos locais de assistência, procurei acenar
com alguns elementos capazes de alterar a dinâmica prestador-consumidor para
abarcar o que Merhy (2002, p.131) refere como abrir o jogo de expectativas envolvido
na relação entre o serviço e o usuário final das práticas de saúde, procurando
problematizar as próprias disputas entre o que são necessidades do ponto de vista do
modelo de atenção e do ponto de vista do usuário, fortalecendo o interesse dos
familiares em participar do Grupo e de modo coletivo encaminhar reivindicações à
Secretaria de Saúde do Município.
A busca da abertura de outras possibilidades de agir em saúde, expressa em atos
cuidativos desenvolvidos no interior de um Grupo de Ajuda Mútua (GAM), com a
79
mobilização dos familiares cuidadores, pareceu-me representar uma forma
embrionária do exercício de cidadania desse grupo de pessoas. Merhy (2002), ao
abordar tecnologias em saúde, assinala que a incorporação de nova tecnologia redefine
o trabalho em saúde, afetando as relações dos profissionais com o usuário,
possibilitando encontros de subjetividade, nos quais se dá o encontro com o usuário
final. O Grupo de Ajuda Mútua, enquanto um espaço que possibilita a produção de
acolhimento e vínculo e promove a interação social, o compartilhamento das
experiências vivenciadas, ao invés do isolamento, estimula os familiares a se
adaptarem à perda ambígua e a viverem funcionalmente com a incerteza. Dessa forma,
o Grupo de Ajuda Mútua é território propício para a prestação de assistência no que
concerne à orientação e apoio emocional, promovendo o exercício da cidadania dos
participantes, indo ao encontro do que Merhy (2002, p.105) postula como “a produção
da resolutividade e a criação de maiores graus de autonomia, no modo das pessoas
andarem na vida”.
A partir da década de 90, Grupos de Apoio ou Suporte Familiar sob a chancela
da Associação Brasileira de Alzheimer (ABRAz) têm sido implantados em diversas
cidades, como Florianópolis, Porto Alegre e Bento Gonçalves, entre tantas outras. Em
agosto de 1991, ao ser criada em São Paulo, a ABRAz, entidade sem fins lucrativos e
estruturada como organização não governamental (ONG), tornou-se oficialmente uma
entidade jurídica cuja missão é divulgar a DA e lutar por uma melhor qualidade de
vida para o portador e seu familiar.
A ABRAz faz parte da Alzheimer´s Disease International (ADI), organização
“guarda-chuva” que abriga associações de sessenta e quatro países do mundo inteiro e
que trabalha oficialmente com a Organização Mundial de Saúde desde 1996. Essa
Associação fornece material científico e informações acerca de pesquisas na área da
Doença de Alzheimer, sejam científicas ou voltadas para os cuidados. O intercâmbio
da ABRAz com a ADI aumenta a sua capacidade informativa e sua visibilidade no
âmbito internacional. Todos os membros da diretoria da ABRAz atuam em caráter
voluntário. No Brasil, as regionais estão distribuídas em quase todos os estados da
União, contando inclusive com diversas sub regionais. No Rio Grande do Sul, tem sua
coordenação na cidade de Bento Gonçalves, além de contar com sub-regionais em
80
Porto Alegre, São Leopoldo e Novo Hamburgo. Pela seriedade da entidade e pela
competência técnica da diretoria, a ABRAz conquistou o status de interlocutor que
compõe a mesa de negociações sempre que aspectos relacionados ao bem-estar do
portador e de seus familiares são discutidos pelos poderes públicos. Assim, mediante
representação, compõe o Fórum Nacional de Patologias, o Conselho Nacional de
Saúde e diversos conselhos municipais de idosos e de saúde (ABRAz, 2003, p.6).
É importante destacar que a perspectiva de tornar o Grupo de Ajuda Mútua por
nós organizado em Rio Grande em sub-regional da ABRAz surgiu no decorrer dos
encontros com os familiares, quando lhes apresentei essa ONG de forma sucinta, seu
Boletim Informativo e o livro editado em 2002: “Você não está sozinho” (ABRAz,
2002). Vincular-se à ABRAz representava não apenas dar maior visibilidade ao GAM,
mas principalmente fortalecê-lo, pois como ONG, exerceria marcante função política e
favoreceria a conquista de direitos por parte dos portadores de DA, como os
relacionados ao acesso gratuito à medicação, entre outros benefícios. Pode-se afirmar,
assim, que o trabalho desenvolvido no Grupo de Ajuda Mútua foi constituindo-se no
que Merhy (2002, p. 191) considera como acolhimento na saúde, ou seja, “a
construção de um novo modo de ver a doença, como responsabilidade social, a
construção de novos valores de solidariedade, compromisso e construção da
cidadania”.
A luta pelos direitos dos portadores não é dever somente dos familiares
assoberbados com a complexidade dessa tarefa. A defesa da vida individual e da
divulgação das vias de acesso gratuito à medicação, dentre outros direitos a serem
garantidos à população, também deve ser premissa dos profissionais de saúde, o que
para Merhy (2002, p.146) representa um “posicionamento ético usuário centrado, com
inclusão cidadã e ganhos de autonomia para o usuário”.
A estratégia da apresentação de um vídeo com depoimentos de diversos
profissionais de saúde sobre a DA se constituiu em mais um recurso educativo
disponibilizado aos familiares para que conhecessem serviços de saúde organizados,
com equipe multiprofissional nessa área de cuidado, que socializa conhecimentos
sobre a doença, envidando esforços para oferecer apoio à família. Com isso, objetivou-
81
se ir ao encontro do que Paterson e Zderad (1979, p.31) preconizam como a
valorização do potencial humano de cada participante como “resposta da enfermagem
humanística a determinado evento inter-humano”.
À medida que se discorria sobre a doença, familiares expressavam dúvidas e
dificuldades enfrentadas no seu cotidiano, como as referentes ao atendimento
desumano dos serviços de saúde; à dificuldade de acesso à consulta de neurologia pelo
SUS, às longas filas para agendar consulta dica e incômodo da comercialização de
lugar na fila de espera; à demora para conseguir efetivação dos exames
complementares; ao abandono do usuário à própria sorte; à não-disponibilização pelo
SUS da medicação ao portador de modo sistemático, impossibilitando a continuação
do tratamento. O desgaste provocado no convívio diário com as mudanças de
comportamento dos portadores e da sobrecarga enquanto cuidadores também foi
expressado pelos participantes . Pelos seus relatos, todos vivenciaram tal situação num
período de tempo mais ou menos prolongado, evidenciando uma experiência solitária,
sem receber apoio da rede pública, como as unidades básicas de saúde, o PSF ou do
SUS, de modo geral, para suas demandas enquanto cuidadores e usuários. Aqui
identificou-se um dos preceitos da orientação humanística de Paterson e Zderad
(1979): “a enfermagem é um tipo especial e particular de encontro porque tem uma
finalidade”. Enfermeira e familiares cuidadores têm uma meta ou expectativa em
mente, como seres humanos singulares que são. Minha meta era acolher estes
familiares-usuários dentro do Grupo de Ajuda Mútua e responsabilizar-me por suas
necessidades, buscando a ampliação da dimensão do núcleo cuidador.
Esses primeiros momentos em que estávamos juntos, compartilhando
experiências comuns, possivelmente haviam estimulado o aparecimento de
sentimentos comuns, forjando a identidade do grupo. Dessa forma, delineava-se uma
proposta de Grupo de Ajuda Mútua que atuaria segundo Paterson e Zderad (1979,
p.114), como “um ponto de partida metodológico” no qual como enfermeira estaria
com estes familiares “em momentos críticos em suas vidas, em circunstâncias as mais
diversas e por vezes, as mais íntimas”.
Ao longo de um ano e meio esse processo foi sendo construído, não finalizando
82
agora que cheguei ao término da pesquisa. O GAM, enquanto sub-regional da ABRAz
em Rio Grande, continuará suas atividades e eu, como profissional enfermeira,
continuarei assessorando em suas atividades, na medida das necessidades.
5.2 O processo de cuidado com orientão humanística e usuário centrado
Considerando a orientação fundamental assumida de construção de uma
tecnologia cuidativa com vistas a responder às reais necessidades dos familiares
cuidadores de idosos com DA, um longo caminho de dezoito meses foi necessário,
ainda como um processo de experimentação, para anunciar evidências positivas de
aplicação na prática do desenvolvimento de serviço de cuidado de saúde do referencial
adotado. O processo de trabalho em cuidados de saúde segundo concepções de Merhy
pressupõe um empreendimento contínuo dos serviços de saúde, onde as repostas às
demandas dos usuários são diversas, segundo as circunstâncias históricas, exigindo
com isso uma constante revisão, atualização, aperfeiçoamento e retomada.
5.2.1 A minha preparação como enfermeira para vir a conhecer a família cuidadora
em sua situação particular
Segundo Paterson e Zderad, o autoconhecimento é essencial para a enfermeira
atuar com pacientes em situações específicas como as que envolvem sofrimento,
limitações, sentimentos de perdas e luto, entre outros, pois é a primeira fase dentro da
concepção das teoristas para poder assistir de forma humanística e solidária. Essa fase
requer que a enfermeira esteja aberta, francamente interessada, disposta a correr riscos,
a ser surpreendida e a considerar-se “um objeto de estudo” (PATERSON e ZDERAD,
1979). Minha experiência prévia contribuiu com esta opção de estudo porque tendo
83
formação gerontológica, adentrei-me pela área de neuropsicogeriatria ao iniciar a
estudar a doença de Alzheimer, seu tratamento e o cuidado do portador
primordialmente idoso, e de sua respectiva família cuidadora, por ocasião da
realização da minha dissertação de mestrado (PELZER, 1993).
A minha busca pela aquisição de conhecimento acerca desta doença que até
então desconhecia, incluiu leitura de trabalhos nacionais e internacionais, participação
em eventos científicos específicos de cunho regional e nacional e realização de cursos
de atualização. Além disso, mantive troca de informações com meus pares da
gerontologia, incluindo profissionais outros, além dos colegas enfermeiros e médicos,
o que me permitiu ampliar a visão para um enfoque mais abrangente de ações
psicossocioculturais no enfrentamento da DA. Aqui cabe lembrar Paterson e Zderad
(1979, p.123), ao afirmarem que “quando se conhece, permite-se o diálogo entre as
múltiplas realidades conhecidas [...], quem conhece pode interpretar, selecionar e
classificar”. Como a doença de Alzheimer até o momento ainda se configura em um
evento com determinada complexidade diagnóstica e terapêutica, requer por parte dos
profissionais a busca e troca constante de informações.
As visitações domiciliárias junto a família que vivenciava a doença de
Alzheimer em seu membro idoso permitiu-me observar parte desse cotidiano
altamente desafiador, no qual o familiar cuidador operava no limite de sua capacidade
para oferecer os cuidados necessitados pelo idoso doente. Tal aproximação com as
famílias possibilitou-me uma melhor compreensão acerca das dificuldades e
necessidades especiais da família envolvida no cuidado direto, revelando-me facetas
que até então desconhecia. Já nessa ocasião, observava a evidente necessidade de uma
rede comunitária de suporte social para famílias com idosos portadores de DA,
auxiliando-as nos seus múltiplos encargos, seja no cuidado cotidiano direto do idoso
doente, seja em outros afazeres doméstico-familiares decorrentes desta situação, assim
como no cuidado da vida dos próprios cuidadores sujeitos a sofrer de estresse por
cansaço físico, dificuldades econômicas, preocupações e sentimentos de
incompetência para cuidados mais complexos.
A partir do conhecimento e da experiência derivados desta prática assistencial
84
de enfermagem, pude confirmar a magnitude da doença de Alzheimer, não somente
sobre o portador, mas também sobre sua família, que assume praticamente sozinha o
cuidado domiciliar.
O Grupo de Ajuda Mútua (GAM) em Florianópolis foi formado com a minha
participação, o qual passou a funcionar a partir de 1992 junto ao NIPEG/HU/UFSC
(Núcleo Interdisciplinar de Pesquisa, Ensino e Assistência Gerontogeriátrica) até os
dias de hoje. Essa experiência constituiu-se ao mesmo tempo em uma fonte inicial de
aprendizagem e em uma contribuição pessoal ao fim de minha dissertação de mestrado
na UFSC, por meio da qual, ainda que de forma embrionária, pude exercitar a
aplicação do modelo assistencial sinalizado na Dissertação.
O atendimento grupal sob a forma de grupo de ajuda mútua, representa um
recurso bastante efetivo de apoio educativo e nesse caso, psicossociocultural, aos
familiares cuidadores de idosos com DA. Contudo, se constitui ainda em uma
modalidade de assistência pouco explorada pelos programas de saúde, com
perspectiva de atenção voltada à vida e saúde da família, com vistas também de
manutenção do idoso cuidado devidamente pelos familiares em âmbito domiciliar,
evitando a internação precoce em instituições de longa permanência (MITTELMAN et
al., 1995; BOTTINO et al., 2002).
Pessoalmente, vislumbrei a instância do Grupo de Ajuda Mútua (GAM) como
um espaço próprio onde as pessoas podem estar juntas de forma relativamente
constante, para discutir, aprender, ensinar e até para desabafar a experiência da
situação comum vivenciada, a de ser familiar de um idoso sofrendo de DA. É ali, na
conjunção de sentimentos solidários em grupo, que cada familiar participante sente-se
à vontade para expressar seus sentimentos, preocupações, dúvidas, como também o
desejo de compartilhar experiências bem sucedidas, aprendidas na labuta do dia a dia
de cuidados ao idoso. Assim, cada membro participante do GAM fortalece-se ao
reabastecer-se com ajudas úteis em termos de experiências de cuidado de outrem e de
cuidados de si mesmo, como também por encontrar solidariedade no árduo
enfrentamento cotidiano de sua situação que é comum aos seus pares. Além disso, o
grupo é apoiador pelo fato de se apresentar como um espaço de livre participação e
85
expressão, de reunir pessoas que vivenciam a mesma situação, possibilitando o
compartilhamento das mesmas preocupações e ansiedades, constituindo-se no
momento oportuno da escuta sensível da enfermeira poder participar com seus
préstimos profissionais. Nesse contexto, a enfermeira que segue a abordagem
existencial-fenomenológica da Teoria Humanística de Paterson e Zderad (1979), não
se atém apenas ao enfoque científico-clínico, buscando também o olhar e o
conhecimento intuitivo que permite compreender o significado da experiência
vivenciada pelo familiar cuidador.
Nas minhas vivências assistenciais e docentes junto aos alunos do curso de
graduação em Enfermagem, participando de um projeto de Atenção Primária de Saúde
por meio de visitas domiciliárias em uma comunidade periférica de Rio Grande,
conheci inúmeras famílias possuidoras de familiar idoso com DA. Durante o período
em que estive envolvida com essa atividade, ao prestar assistência de enfermagem aos
idosos que se encontravam sob atenção domiciliar, percebi o desgaste dos familiares
pelo peso do contínuo cuidado e o respectivo esgotamento emocional. Mesmo na
instância do atendimento pela equipe do PSF, as ações realizavam-se de forma
fracionada e descontínua, sem incorporar esse grupo de risco como uma realidade à
qual se deve dar uma resposta individual e coletiva e pela qual há que se
responsabilizar. Nesse contexto domiciliar viu-se aflorar dificuldades para fazer frente
às múltiplas demandas da DA e a ausência de dispositivos públicos competentes,
capazes de lhes dar o devido suporte. Essa adversa e desgastante situação das famílias
despertou inquietações pessoais acerca de como materializar o direito à saúde e à
assistência para produzir ações que tivessem uma resultante humanizadora e
valorizadora sobre as mesmas. Embora na época ainda não tivesse me dado conta,
iniciava a trilhar um caminho que posteriormente iria me conduzir à adoção da Teoria
Humanística de Paterson e Zderad (1979) para assistir famílias cuidadoras.
A enfermagem fenomenológica, conforme desenvolvida por Paterson e Zderad
(1979), sugere uma metodologia para a busca da compreensão e da descrição das
situações de enfermagem, podendo constituir-se em um guia norteador para o encontro
cuidativo da enfermeira com as famílias cuidadoras. A adoção de um modelo teórico
como o desenvolvido por Paterson e Zderad (1979), no meu entendimento, acenou
86
com uma perspectiva humanística e solidária, despertando-me novos entendimentos
acerca da família que se encontra solitária no desempenho de suas funções no cuidado
de seu membro idoso com DA.
Na época do início do doutorado, minha mãe, com mais de noventa anos e que
ainda morava sozinha em outra cidade, começou a apresentar mudanças de
comportamento e déficits de memória indicativos de alterações da doença de
Alzheimer. Essa conjunção de fatores, estar desenvolvendo trabalho sobre a DA e ter
minha própria mãe acometida pela doença, representou uma motivação a mais em
busca de uma abordagem terapêutica que nesse complexo contexto, fosse capaz de
produzir impacto na minha busca por melhor qualidade da assistência de enfermagem.
A experiência pessoal intensificou minha reflexão acerca da relevância da
doença de Alzheimer no cotidiano da família, constituindo-se num aprendizado
constante frente aos transtornos específicos de comportamento que surgiam à medida
que a doença avançava e numa forma de autoconhecimento e abertura de caminhos
para o conhecimento dos outros. Por inúmeras vezes, percebi estar numa caminhada
solitária, assoberbada pelas múltiplas demandas da DA em minha mãe. Sentia-me
desafiada a continuar a agir com fé e coragem, ajustando cada momento para uma
nova condição de vida. Assim, acredito que ter passado por esta experiência contribuiu
para que eu estivesse melhor instrumentalizada para adotar o enfoque de enfermagem
humanística conforme proposto por Paterson e Zderad (1979).
Após ter contribuído para a formação do Grupo de Ajuda Mútua, atuando em
inúmeras reuniões do GAM, em consultas de enfermagem e em visitações
domiciliárias realizadas, constatei que as respostas dadas como profissional enfermeira
às necessidades da comunidade e dos participantes do GAM em particular, desde o
início, tiveram boa acolhida. Tanto a participação dos familiares quanto os
testemunhos emitidos no Grupo demonstravam ser acolhidos e indicavam o
estabelecimento de vínculo. Acenar com informações atualizadas, prestar orientações,
ser sensível à dor, compartilhar experiências, sentimentos e emoções, enfim, atuar
como apoio, veio tornar-se esta convivência única. Como enfermeira desenvolvendo
uma atividade no interior do Grupo de Ajuda Mútua, apoiada na Teoria da Prática da
87
Enfermagem Humanística de Paterson e Zderad (1979), pude estabelecer uma relação
dialógica quer ouvindo, orientando, apoiando e confortando os familiares.
Estar junto em alguns momentos pontuais da vida destas famílias, seja sob a
forma de presença física durante as reuniões quinzenais, na realização da visitação
domiciliária, nos telefonemas emitidos e recebidos e os atendimentos individuais
realizados, consolidou a conquista de um espaço relacional, de cuidado em meio a
intersubjetividade dos participantes (MERHY; ONOKO, 1997).
A partir daí, um novo olhar de reciprocidade vem sendo lançado, reconhecendo
as subjetividades, necessidades e intenções de cada familiar ao participar do Grupo de
Ajuda Mútua. Observando e pensando sobre a trajetória percorrida até o momento,
percebo-me mais próxima da realidade das famílias que participam do GAM de Rio
Grande. O Grupo tem demonstrado ter o valor de luta, de coragem e de força presentes
em cada familiar, independente do estágio da DA no idoso portador.
Tenho procurado estar e mostrar-me comprometida com as necessidades do
Grupo, cujas demandas manifestadas pelos familiares tem-se mostrado múltiplas,
complexas e únicas. À medida que as reuniões do GAM se sucediam, vínculos foram
sendo criados, com o estímulo à manutenção de uma postura empática entre os
participantes, quando me sensibilizava com seu sofrimento, identificava suas
necessidades, reconhecendo nesses familiares-usuários na condição de sujeitos que
falam, julgam, desejam, enfim, portadores de direitos e de opções de vida.
Por também ter convivido recentemente com a DA em minha mãe, compartilhei
algumas dificuldades postas no Grupo pelos respectivos familiares, o que no meu
entender, trouxe uma legitimidade e identidade própria. A aproximação com os
familiares, conforme nos íamos conhecendo melhor e que os encontros se sucediam,
propiciou um relacionamento alicerçado na confiança mútua, na singularidade e
autenticidade de cada participante. Isso implicou em criar laços de compromisso e co-
responsabilidade, abrindo espaço para o uso de novas ferramentas no processo de
trabalho.
Como enfermeira, minha expectativa ao tomar a iniciativa de formar um Grupo
de Ajuda Mútua para familiares de idosos portadores da doença de Alzheimer, era de
88
oferecer um espaço acolhedor, no qual os membros participantes se sentissem
compreendidos, apoiados e respeitados, com a subseqüente melhora da auto-estima e
criação de vínculos nos quais destacasse a busca pelo exercício do direito à cidadania.
Isso possibilitou uma nova forma de trabalhar em saúde, conforme defende e articula
Merhy (2002), partindo de uma nova maneira do profissional de saúde se relacionar
com o sofrimento e com a vida, tanto individual como coletiva. .
5.2.2 A enfermeira respondendo às necessidades da família cuidadora: partilhando
habilidades cuidativas
Como enfermeira que se inspira na teoria humanística de Paterson e Zderad
(1979/1988), o reconhecimento de que cada ser revela-se de forma única, oferece um
contraponto ao modo como trabalhadores de saúde se relacionam com o principal
objeto de trabalho, no presente estudo, a vida e o padecimento dos portadores de
doença de Alzheimer e de seus familiares durante o longo processo de evolução da
doença. Nesses momentos de encontro no GAM, em que os familiares cuidadores
expunham suas experiências, sentimentos e dificuldades através da comunicação
verbal e/ou não verbal, foi possível vivenciar as relações Eu-Tu, Eu-Isso e Eu-Nós de
que Paterson e Zderad (1979) tratam em sua teoria humanística.
Estas autoras entendem a enfermagem como um diálogo vivo, um evento
interhumano, no qual a enfermeira tem em si mesma as possibilidades para
desenvolver relações com as pessoas. As relações sujeito-objeto ou Eu-Isso ocorrem
quando uma pessoa relaciona-se com a outra como um objeto, um propósito realizável,
mediante uma aproximação científica objetiva, obtendo algum conhecimento do outro.
Embora a predominância deste tipo de relação não promova o encontro genuíno entre
as pessoas, é um aspecto necessário da vida humana. Por sua vez, as relações sujeito-
sujeito ou Eu-Tu indicam uma atitude de genuíno interesse na pessoa com a qual
89
estamos interagindo, vislumbrando conhecê-la em sua individualidade singular. O
diálogo intuitivo decorrente do envolvimento do ser humano com outro estabelece um
relacionamento Eu-Tu que abarca a totalidade do ser. Paterson e Zderad (1979)
consideram estas duas formas de relação essenciais para o desenvolvimento do
processo de enfermagem.
A relação Eu-Isso ocorreu nos momentos nos quais utilizando o conhecimento
técnico e científico, forneci informações acerca da doença. Embora reconhecendo sua
pertinência, procurei não ficar restrita à esta dimensão, bastante valorizada pelo
modelo biologicista. A relação Eu-Tu, Eu-Nós foi conduzida concomitantemente nas
reuniões, nas visitas domiciliárias e nos contatos telefônicos, à medida que os
familiares eram acolhidos no GAM por mim e pelos demais participantes. Ancorada
pelo referencial humanista, como enfermeira, estive atenta em manter uma relação
dialógica, ouvindo com empatia, realizando ajuda e apoio quando pertinente.
Em momentos de fragilidade dos familiares cuidadores, de desesperança e de
busca por apoio, pude presenciar situações de choro, tristeza, mágoa, olhares atentos,
gestos e atitudes de interesse pela situação vivenciada, de uns pelos outros. Às vezes,
me aproximava individualmente de alguns familiares e expressava gestos de carinho,
quando havia choro e profunda tristeza, demonstrando meu acolhimento àquele
sofrimento compartilhado no Grupo.
Embora as atividades do Grupo de Ajuda Mútua se concentrassem em reuniões
quinzenais, também se previa a visitação domiciliária (VD) sempre que necessária.
Segundo Bertolozzi (1987, p.23) a VD faz parte do:
conjunto geral da assistência à saúde, contribuindo para a dinamização da
sistemática de ações integradas [...] constitui uma das atividades próprias da
enfermagem, numa abordagem ampla que tem a finalidade de estender as
ações de saúde à população, dentro de um contexto social.
As visitações domiciliárias efetuadas promoveram a aproximação enfermeira-
família, na qual se compartilha, embora de modo momentâneo, o mesmo espaço físico,
possibilitando observar o idoso portador de DA no lócus de sua vida, em convívio
familiar.
90
O fato dos familiares freqüentarem as reuniões do Grupo de Ajuda Mútua e já
haver entre nós um relacionamento pessoal/profissional prévio, facilitava meu acesso
aos domicílios no encontro assistencial, de vez que nessa situação há um determinado
comportamento protocolar mútuo a ser seguido. No transcurso das visitações
domiciliárias, a comunicação fluía com o estabelecimento de uma relação efetiva entre
eu e os familiares cuidadores, constituindo a “presença genuína” referida por Paterson
e Zderad (1979, p.23). Procurava assim configurar-me em uma profissional que estava
ali para oferecer a ajuda necessitada, compartilhar vivências, realizar intervenções
pontuais que se fizessem necessárias, emitindo sugestões construtivas e propiciando
“feed-back” positivo aos múltiplos esforços conduzidos pela família para cuidar do
idoso com doença de Alzheimer. Também enfatizava durante a visita acerca da
importância da vida e saúde do familiar cuidador no contexto da atenção dispensada ao
idoso com DA, visualizando-o como alguém que requer e merece apoio e atenção de
saúde como também respeito e reconhecimento por parte dos profissionais de saúde
pela tarefa que desempenhavam de cuidadores de seus membros dependentes. Assim
durante as visitas, atendi à solicitação dos mesmos acerca do cuidado de saúde, por
exemplo: verificando sinais vitais, interpretando resultados de exames laboratoriais,
indicando a necessidade de revisão de saúde, prática de auto-cuidado, visto que alguns
encontravam-se no limite de suas forças físicas e emocionais. Por vezes, fui solicitada
a acompanhá-los durante suas idas às instituições de longa permanência (ILP) para
idosos, existentes no município, esperando minha avaliação, por recearem internar o
familiar com DA em lugares inadequados.
Ao longo desta trajetória, como enfermeira atuando no campo da gerontologia,
envidei esforços para manter uma postura interdisciplinar imprescindível para
apreender a complexa realidade do idoso e de seus respectivos familiares. Isto incluiu
diálogos com a fonoaudióloga que esporadicamente participava do GAM e com alguns
médicos, com os quais pude compartilhar conhecimentos para repensar a maneira pela
qual se assiste a clientela idosa no Município.
Observei e observa-se de modo geral no país que cuidar de idoso portador de
DA é responsabilidade da família, que arca sozinha com o ônus físico, psicológico,
social e financeiro, em geral de modo duradouro e desgastante, de vez que não há
91
ainda uma rede de serviços públicos voltados ao suporte ao cuidado domiciliar
(KARSCH, 2003; ALVAREZ, 2001; SANTOS, 2003).
Para Karsch (2003), o impacto da política previdenciária na vida das famílias
pobres é significativo, considerando a aposentadoria como o auxílio-doença não se
traduzem em formas eficazes de sobrevivência, pois muitas vezes constituem-se em
fonte única de recursos. Rodrigues (2000), por sua vez, em artigo no qual realiza uma
retrospectiva histórica acerca da Política Nacional do Idoso, é contundente em declarar
que embora contando com uma série de Programas, Projetos, Serviços e Ações a nível
governamental e não governamental, a sua falta de continuidade não atende às reais
necessidades colocadas pelos idosos.
A visitação domiciliária realizada, enquanto ação cuidativa permitiu-me
observar e avaliar as condições ambientais, a dinâmica das relações interpessoais,
assim como a maneira como as famílias prestam o cuidado ao idoso com DA. Como
enfermeira tendo foco na abordagem humanística de Paterson e Zderad (1979), utilizei
o olhar intuitivo e o olhar científico e na fusão destes olhares, implementei o cuidado,
objetivando nutrir o estar melhor e o vir a ser mais, respeitando na medida
conveniente, as estratégias de cuidar e de cuidados das respectivas famílias. Nestas
ocasiões, aproveitava para rever e/ou treinar habilidades dos cuidadores quanto à
higiene pessoal do idoso, locomoção, mudanças de decúbito, conforto geral,
observação das condições da pele, cuidados de feridas, cuidados com sondas
vesical/nasoentérica; cuidados na administração de alimentos visando a prevenção de
acidentes como a aspiração; cuidados com órteses/próteses; cuidados na administração
de medicação oral; prevenção de acidentes e métodos de segurança; exercícios de
estimulação cognitiva; exercícios físicos ativos e passivos; e uso de roupas adequadas.
A aprendizagem e execução de tais cuidados pelos familiares de maneira segura e
confiante, pareceu-me que os mesmos continuariam a manter os idosos cuidados no
lar, sem falar na perspectiva de interná-los.
Nesse sentido, Ferretti (2004) ao realizar visitações domiciliárias com 31
pacientes não institucionalizados por ocasião de um estudo longitudinal de um ano e
meio, verificou influência positiva das intervenções de enfermagem aos cuidadores,
92
diminuindo a sobrecarga física e emocional.
Na relação de cuidar e ser cuidado observou-se na maioria das vezes, pais
idosos/ filhas(os)/nora e genro. Também no caso de idoso com DA a cuidadora era a
própria cônjuge idosa. Observou-se também a presença de netas como cuidadoras. No
caso específico de cuidadoras e portadoras, há uma relação de retribuição no ato de
cuidar, pela existência dos vínculos intergeracionais, nos quais aparecem os vínculos
biográficos e afetivos corroborando com os escritos na literatura (BENJUMEA, 2004).
Tornar-se cuidador principal em geral conduzia a um reconhecimento familiar e social
que induz a um novo status, certamente amparado por maior poder, uma vez que
representa o elo entre paciente, família e profissional de saúde. Em algumas situações
pelo cuidador principal ter acesso à aposentadoria, ao auxílio-doença e/ou ser o
responsável - o cuidador, torna-se o membro da família que cuida dos bens, direitos ou
negócios do portador. Com isso, por vezes pode-se observar conflitos entre membros
da própria família, que disputam a guarda legal daquele portador.
Essa difícil situação foi relatada no GAM por uma familiar neta da portadora de
DA, uma vez que disputava a guarda da avó na justiça com sua própria mãe. Por sua
participação no GAM e por ter observado seu envolvimento efetivo e afetivo no
cuidado da avó, inclusive durante um episódio de hospitalização da mesma,
elaboramos uma declaração que foi encaminhada ao juiz por seu advogado.
Posteriormente, essa familiar cuidadora recebeu parecer favorável e assim pode
continuar a cuidar de sua avó. Por tratar-se de uma situação humana complexa, que
envolvia relações familiares intergeracionais conflituosas, com disputa de acesso a
bens, minha conduta procurou alinhar-se ao que Paterson e Zderad (1979, p. 40)
pontuam como “nutrir o estar melhor e o vir a ser mais”, tanto da portadora quanto da
cuidadora.
Já outros familiares relatavam no Grupo situações de desconforto pessoal e de
estresse, pela resistência dos demais membros da família em reconhecerem que as
manifestações presentes no idoso eram em decorrência da própria doença de
Alzheimer. Sentindo-se sozinhas e fragilizadas, buscaram no espaço coletivo do GAM,
apoio e o resgate de sua auto-estima. Pela diversidade e singularidade das situações
93
que envolviam no cuidado idoso com DA, muitas das questões que não eram comuns
ao Grupo, foram atendidas individualmente, seja em consultas de enfermagem, em
atendimentos telefônicos e em visitações domiciliárias agendadas. Ou ainda
encaminhamento aos serviços/programas devidos.
Por sua natureza humanística, a preocupação da enfermagem fenomenológica
não é com o comportamento resultante, mas com o significado da experiência para o
cliente (Paterson e Zderad, 1979), o que é especialmente relevante na condição em
tela.
Desde os primeiros encontros, algumas pessoas mostraram habilidade e
facilidade em relatar suas experiências como cuidadoras, recebendo feed-back do
Grupo para suas iniciativas e providências tomadas. À medida que os encontros se
sucediam, sentimentos e experiências comuns eram compartilhados e os membros do
Grupo aprofundavam seu conhecimento a partir das vivências dos demais, num
diálogo intersubjetivo, oportunizando à enfermeira conhecer suas identidades
singulares.
Ao fazer a divulgação do encontro pela imprensa, contou-se com a
receptividade das famílias já nas primeiras reuniões, evidenciando uma expectativa
explícita de que haveria uma enfermeira e alguém a ser atendido (PATERSON e
ZDERAD, 1979). A espera e expectativa frente ao encontro, nesta situação,
promovido pela enfermeira, poderiam despertar múltiplos sentimentos entre os
familiares, tais como: ansiedade, temor, responsabilidade, alegria e esperança.
Enfermeira e familiares poderiam e deveriam explorar estes sentimentos
conjuntamente, como pode ser observado no seguinte depoimento:
“Puxa, não pensei que depois de vir aqui eu fosse me sentir melhor [...] eu
estava tão angustiada com esta doença da minha mãe. Escutando o que os
outros falam, me dou conta que não estou só. Aqui a gente pode falar o que
está acontecendo e receber ajuda. Eu vou ler o que está no livro que me
deram e vou dar pra minha filha ler”. (Lápis-lazuli, 46 anos).
Como profissional de saúde articulador do GAM acreditava na necessidade e
importância de prover as famílias com informações sobre a doença e propiciar apoio
psicossocio-educaciconal. Essa verbalização do familiar sinalizava o GAM como o
94
espaço alinhado ao modelo de atenção usuário-centrado preconizado por Merhy
(2002).
Em um determinado encontro, um familiar cuidador questionava sobre seu risco
em desenvolver DA, no futuro, por ser filho de uma portadora, expondo seu temor e
angústia acerca da possibilidade de também vir a ter a doença. Foi-lhe explicado que, o
fator de risco de desenvolver a doença é cerca de 3,5 vezes maior (MACHADO,
2002), que responde por uma parcela pequena, relacionada à rara forma familiar, de
início precoce da DA. É plausível a existência de outros fatores de risco, tanto
genéticos como ambientais, que podem precipitar a doença, mas que ainda não foram
identificados. Essa sua percepção da demência como doença decorrente da herança
genética é uma questão bastante levantada e que Santos (2003) também identificou em
seu estudo junto a cuidadores familiares de origem nipo-brasileira e brasileira.
Após ter recebido a devida informação e orientação contextualizada, o Grupo
passou a discutir esta situação, acolhendo sua apreensão, mas também sinalizando para
a importância de procurar viver com plenitude, não valorizando em demasia tal fator
de risco. Vários familiares se manifestaram, expressando a vivência da mesma
situação, instilando esperança e autoconfiança. Frente a tais emissões, era evidente o
emergir de uma relação sujeito-sujeito (Paterson e Zderad, 1979), na qual membros do
Grupo expressavam sua individualidade singular, com abertura, receptividade e
disposição.
Os familiares eram geralmente assíduos nas reuniões do GAM. Quando surgiam
imprevistos, telefonavam justificando sua ausência e havia ainda os que eventualmente
se ausentavam por hospitalização do familiar. Essas ausências são relativamente
freqüentes em Grupos que operam nesta modalidade de Ajuda Mútua. Por dependerem
de terceiros para sua participação nos encontros, os familiares nem sempre conseguiam
encontrar alguém para deixar o idoso enquanto se ausentava da casa. Outros
participantes traziam vizinhos e conhecidos nas mesmas condições para ingressar no
GAM e assim iam se agregando participantes ao longo do tempo. O engajamento e
disposição dos participantes desde os primeiros encontros de constituição do Grupo,
delinearam-se vínculos de comprometimento de cada um com os demais participantes
95
e com a proposta de trabalho, impulsionando a coesão.
Nos primeiros quatro meses, a freqüência dos encontros foi mensal, passando a
quinzenal a partir do quinto mês, quando se deu a posse da diretoria da sub-regional da
ABRAz/RS. Por solicitação dos participantes o GAM passou a ter encontros
quinzenais. Considerei isto como algo relevante, pois sinalizava, embora de forma
incipiente, que já havia uma identidade coletiva com um espaço que lhes assegurava
acolhimento, vínculo e apoio. Esses aspectos vem corroborar com o real encontro entre
trabalhador e usuários, da forma como propõe Merhy (2002). Em qualquer serviço
onde ocorre um encontro enquanto trabalho de saúde entre um profissional trabalhador
e um usuário, operam-se processos tecnológicos enquanto trabalho vivo em ato que
visa a produção de relações de escutas e responsabilizações, as quais se articulam com
a constituição de vínculos e de compromissos em projetos de intervenção ou atuação
profissional, na saúde.
Já nos primeiros encontros, repassei meu telefone para os participantes do GAM
para que pudessem entrar em contato caso fosse necessário e assim concretizar o que
Paterson e Zderad (1979, p.47) identificam como “a enfermeira é ela própria uma
forma particular de diálogo”. Esperava com isso, apresentar-me aos familiares
cuidadores como uma profissional de saúde sensível às suas demandas e acessível para
acolher e responder de modo imediato aos requerimentos cotidianos do cuidador de
um idoso com DA, no contexto domiciliar.
Inicialmente, alguns familiares mostraram-se gratamente surpresos, pois até
então, não lhes tinha sido oportunizado acesso a este recurso por parte de um
profissional de saúde. Uma vez iniciada esta forma de comunicação, que era por mim
repassada no próximo encontro imediatamente após os telefonemas, vários membros
do GAM passaram também a fazê-lo, relatando dificuldades de cunho pessoal,
frustrações e desorientação quanto ao que fazer em tal nova e desafiadora situação.
Nos diálogos empreendidos, cabia-me ouvir, fazer ponderações, sugerir condutas e
estratégias para lidar com a situação e solidarizar-me com mais facilidade, pois era
também cuidadora de minha mãe. Esse simples ato de escuta à princípio, parecia
produzir a redução da ansiedade e angústia, sinalizando um efeito terapêutico.
96
Como às vésperas de cada encontro fazia circular na imprensa matéria de
divulgação contendo telefone profissional e residencial, inúmeras pessoas passaram a
ligar, solicitando informações sobre a doença, seu tratamento e queixando-se do
atendimento tanto em nível da rede pública quanto privada, verbalizando conflitos
familiares com a situação vivenciada, relatando sua sobrecarga como cuidadores.
Aproveitava nessa ocasião para convidar o interlocutor a participar do GAM.
Na maioria das vezes, era evidente o desgaste emocional e físico, com
telefonemas prolongados, demonstrando a necessidade dos familiares em serem
ouvidos, de expressarem seus sentimentos e de terem acolhidas suas dúvidas e seus
anseios, conforme esta verbalização:
“[...] não sei mais o que fazer, minha mãe caminha sem parar pela casa,
deixa todos nós agitados, está tomando Neozine e Melerril [...] parece que
não faz efeito [...] que doença braba esta, é coisa triste de ver no que a
minha mãe se transformou [...] ” (Sodalita, 42 anos).
Esta filha, participante do GAM, emitiu o telefonema à noite, falava em tom
baixo e parecia transtornada. A agitação da mãe, que não cessou apesar da
administração de dois antipsicóticos, repercutiu nela, familiar cuidadora principal, que
sentia-se impotente e incapaz. Também os sentimentos de indignação e perplexidade
expressos frente à situação vivenciada, indicavam sua dificuldade de interagir com a
portadora. À medida que a ouvia, compartilhei sua frustração em não conseguir ajudar
sua mãe, lembrando-lhe que era consigo própria que devia se preocupar também. Ao
reconhecer a dificuldade da família em lidar com esta desgastante conduta, lembrei-lhe
acerca da importância de permanecerem unidos, mobilizando forças comuns para o
enfrentamento desta doença e suas decorrências. Frente à sua disponibilidade ímpar
para cuidar, sugeri para procurar realizar atividades promotoras de bem-estar e prazer,
tais como escutar música de relaxamento, realizar prática de meditação e relaxamento,
ir ao cinema, realizar uma massagem, ou outra atividade qualquer de sua preferência.
A esse respeito, Coelho (2004) ressalta que o cuidado envolve, além das habilidades
técnicas necessárias, a sensibilidade no cuidar que se expressa de diferentes formas.
Inserir o lúdico é fundamental, pois promove o prazer e a sensação de bem-estar na
busca de uma melhor qualidade de vida.
97
Depois deste diálogo, Sodalita pareceu sentir-se reconfortada, reconhecendo a
necessidade de reservar algum tempo para cuidar de si própria.
Outra familiar, relatou a seguinte vivência ao Grupo:
“[...] meu pai teve que ser internado novamente, houve piora das crises de
agitação e agressividade, em casa estava cuspindo em quem passava perto e
tentou bater na mãe [...] foi triste ver meu pai amarrado na cama [...] só
mais tarde da noite, depois que o médico passou lá para vê-lo e recebeu
calmante é que se acalmou [...] ” (Turmalina, 52 anos).
Nesta situação, em que a cuidadora também era a filha do portador, a internação
representou um evento bastante desestruturador. Embora ciente das características de
comportamento em decorrência da progressão da demência, para ela ficou difícil
manter o equilíbrio. A filha estava tão envolvida depois de ter passado alguns anos em
executar as incomensuráveis tarefas como cuidadora, que chegou a um alto nível de
estresse. Encarava o cuidado como uma “missão”. A crença de que ninguém poderia
cuidar tão bem do seu pai como ela evidenciou uma sobrecarga subjetiva, relacionada
à percepção que o cuidador tem do problema. Seu cônjuge e filhos começaram a
cobrá-la acerca do tempo que dedicava a cuidar do pai. Em decorrência dessa situação,
alertei-a acerca da necessidade de aceitar receber ajuda de outros familiares, de dar
mais atenção para sua família, de que a vida não se restringe ao ato de cuidar e que o
paciente demenciado não é a única pessoa que precisa ser cuidada, para assim poder
retomar o controle sobre sua própria vida. Turmalina ao final do diálogo concordou
com as colocações feitas e verbalizou de que iria rever seu comportamento. Esta
situação assemelha-se aos achados de Ferretti (2004), que indicaram que o maior risco
de institucionalização foi o estresse dos cuidadores frente às alterações
comportamentais apresentadas pelos pacientes com demência.
Embora sem conhecer previamente algumas das pessoas que telefonavam,
buscava ter uma postura de receptividade, de acolhimento e de autenticidade. Neste
curto período de tempo transparecia uma intimidade na qual me tornava depositária da
confiança e de expectativas por parte destes familiares quanto à não continuarem
desempenhando sozinhos os cuidados com o idoso portador da doença de Alzheimer.
Com isto procurava acenar com uma postura humanística no que Paterson e Zderad
98
(1979, p. 56) denominam uma abertura a “uma pessoa com necessidades”, que na
situação em tela, é o familiar cuidador.
Ao telefonar na antevéspera para lembrar acerca do próximo encontro ou então
para aqueles que se ausentavam por mais tempo, percebia a necessidade expressa pelos
participantes de um interlocutor. Familiares relatavam sua rotina de cuidado, sua
necessidade de lidar com várias situações adversas concomitantemente, como prover o
seu familiar portador de DA com cuidados básicos pessoais e de locomoção, cuidá-lo
durante o dia e/ou à noite, realizar cuidados com a casa, cumprir satisfatoriamente a
jornada diária no emprego, lidar com o distanciamento de alguns familiares, além do
aspecto financeiro relacionado a uma série de gastos em decorrência da doença em si.
Nestes diálogos conduzidos ao telefone, nos encontros individuais e durante os
encontros no Grupo, pude perceber que os familiares sentiam-se sozinhos,
sobrecarregados, com necessidade de dividir suas responsabilidades com um outro
familiar. Conforme ouvia seus depoimentos, sentia-me envolvida na transação
intersubjetiva enquanto “indivíduo distinto e único que entra em relação com o outro”
(PATERSON; ZDERAD, 1979, p.49), procurando compartilhar estes momentos
permeados de sentimentos e emoções. Como enfermeira que exercita o diálogo
intersubjetivo com os familiares cuidadores, fiz a seguinte colocação:
“[...]pelo que estás falando é importante comunicar ao médico o
comportamento agitado da tua mãe, este vagar pela casa. Ele
provavelmente irá mudar a dosagem dos medicamentos, enquanto isto não
acontece é importante manter a calma, não se desesperar, sei que não é fácil
[...], já passei por isto com minha mãe, nestes momentos a gente precisa
lembrar que não é somente com o nosso familiar que isto está acontecendo,
por isto é importante trocar experiências, a vivência de outros nos pode
ajudar a entender a nossa e nos fortalecer [...] (Enfermeira-pesquisadora).
Esta intervenção pessoal na qual realizava aconselhamento individual por
telefone combinado aos encontros quinzenais no Grupo de Ajuda Mútua vai de
encontro à uma das conclusões do estudo de Ferretti (2004) acerca de que as
intervenções de enfermagem reduzem significativamente as alterações de
comportamento no portador e o estresse dos cuidadores.
Pela ausência de proposta semelhante ao GAM na região e devido à divulgação
na imprensa, pessoas de cidades vizinhas, como Pelotas, Jaguarão, Canguçu e Pinheiro
99
Machado, localizadas mais ao sul do Estado do Rio Grande do Sul, também passaram
a telefonar, expressando sua necessidade de conhecer mais sobre a doença e como
preparar-se para o cuidado do seu familiar doente. Tendo sido por mim informadas
acerca da data dos próximos encontros, algumas passaram a participar das reuniões do
GAM, entrando em contato com familiares que compartilhavam experiências
semelhantes. Este intercâmbio também se mostrou frutífero, com os membros do
GAM mantendo posturas de acolhimento e de troca de informações, tais como:
perguntando acerca de manifestações da doença no familiar portador, propondo
alternativas frente às dificuldades que estavam sendo postas e dando testemunho
acerca dos seus arranjos domésticos, como ilustra o diálogo a seguir:
“[...] minha sogra agora não caminha mais e a gente dá comida na boca.
Mas o que está difícil mesmo é que ela passa o tempo todo batendo palmas,
ela não cansa, é a gente que já não agüenta mais [...] ” (Jaspe, 38 anos).
Diante da colocação de Jaspe, carregada de tensão e de sentimentos
contristantes, perguntei o que fazia frente a este comportamento alterado para poder
sugerir algumas alternativas.
“Olha, a gente já tentou de tudo, já falamos com ela, que chega a concordar
na hora, mas depois começa tudo de novo”. (Jaspe, 38 anos).
“[...] quem sabe vocês ocupam a mão dela com alguma coisa, para evitar
que bata palmas “. (Turquesa, 39 anos).
“[...] olha eu fiz assim com o meu marido na fase em que ele estava com
isso: eu amarrei as mangas do próprio blusão na ponta dos dedos e soltava
na hora de comer e ir ao banheiro”. ( Ametista, 68 anos).
A declaração de Ametista deixou todos intrigados, mas ao demonstrar como
fazia, ficou claro que era uma estratégia viável que não colocava o portador em risco, e
que, o mesmo permanecia o tempo todo acompanhado pela esposa ou pela cuidadora
contratada. A sugestão de Turquesa e o depoimento de Ametista, sinalizaram
solidariedade e o desejo de ajudar por parte dos demais. A busca de ligações e
vivências semelhantes lhe proporcionaram conhecer enfrentamentos criativos. Dessa
forma, Jaspe pôde constatar de que “não sou só eu que sinto isso e que passo por isso”,
o que reforçou o caráter suportivo do GAM.
100
A seguir, também fiz uma sugestão:
“[...] quem sabe Jaspe tenta fazer uma luva com atadura, que é mole e não
corre o risco de machucar as mãos, o que tu achas disto?” (Enfermeira-
pesquisadora).
Jaspe acenou afirmativamente com a cabeça frente à sugestão e a seguir o
Grupo se envolveu em outro assunto.
Todo este fluxo de familiares, tanto os residentes em Rio Grande quanto os nas
cidades vizinhas, situadas no extremo sul da região sul, refletia a ausência de
programas de apoio, com conseqüente impacto sobre as famílias. Como profissional da
área gerontológica, entendo que a assistência de enfermagem ao idoso e sua família
cuidadora que experinciam um processo demencial como a doença de Alzheimer
(DA), abre novas perspectivas de atuação para a enfermeira, quando articula e
participa de Grupos de Ajuda Mútua. A valorização e estímulo ao engajamento dos
familiares em uma prática participativa, nas quais desenvolvem habilidades e
capacidades para um envolvimento construtivo com o familiar portador de DA, ajuda-
os a se reposicionarem em termos emocionais diante da perda e a continuar a vida sem
sentirem-se culpados.
Conforme os encontros se sucediam e inserções em jornais locais sobre a
doença de Alzheimer e o próprio GAM eram divulgadas, o Grupo foi conquistando
visibilidade na comunidade e alguns médicos passaram a indicá-lo aos familiares de
portadores. Assim, o GAM foi-se constituindo em uma referência para alguns
profissionais médicos que encaminhavam os familiares ao Grupo, vislumbrando a
necessidade de ampliar o processo terapêutico, não se restringindo somente à
dimensão biológica e à terapia medicamentosa. Nessa direção, Machado (2002)
destaca a importância da intervenção interdisciplinar, do envolvimento da família e
dos grupos de apoio. Juntos, potencializam um cuidado bem-sucedido, que melhora a
qualidade de vida do portador da DA, do cuidador e da família. Como enfermeira,
reconheço a pertinência da postura interdisciplinar necessária ao enfoque
gerontológico e concordo com Doll (2004), que afirma que “o aspecto da
interdisciplinaridade não é uma questão para a gerontologia, mas trata-se de um dos
101
seus fundamentos principais”.
Enquanto processo demencial progressivo e irreversível, a DA torna-se uma
situação particularmente complexa e desafiadora, com sobrecarga e expansão da
responsabilidade do grupo familiar ou de uma pessoa apenas, subitamente responsável
por uma série de cuidados de valor terapêutico. Em estudo conduzido por Karsch
(2003), com vistas a traçar o perfil de cuidadores e de suas necessidades ao
proporcionarem apoio a adultos incapacitados, foi mencionado, pelos cuidadores, a
necessidade de trocar experiências com seus pares, de aprender com profissionais
sobre os cuidados e de obter informações sobre as doenças que acometem seus
familiares idosos. Isto também pôde ser observado por mim, não somente na instância
do GAM, como também por meio dos telefonemas recebidos, uma vez que todos os
familiares manifestaram esta necessidade.
Ainda sob o impacto do diagnóstico de provável doença de Alzheimer, estes
familiares encontravam-se sob forte tensão emocional, expondo ao Grupo suas
dúvidas, incertezas e dificuldades para lidar com este acontecimento estressante. É
ilustrativo o comentário feito a esse respeito por um familiar:
“eu e a Turquesa levamos a mãe a dois médicos, que disseram que
provavelmente ela estava com Alzheimer. Isto foi há uns três meses. Agora
ela está tomando Eranz [...] está muito diferente no comportamento, até com
os netos dela. Na hora a gente não sabia o que fazer. Procuramos nos
informar, compramos livro e apostila sobre a doença. Eu tenho horas que
fico mal, penso que sou um candidato a ter a doença no futuro, já tive crises
de choro e fiquei deprimido. Acho que vou acabar procurando ajuda de um
psicólogo para sair dessa”. (Citrino, 38 anos).
Este depoimento, emitido de forma enfática, teve um impacto sobre os demais
membros do Grupo. O fato de ter sido realizado por um homem, familiar cuidador,
profissional liberal, casado e com filhos pequenos, que expunha de forma franca sua
fragilidade em um dos primeiros encontros, sinalizou a necessidade de receber ajuda
para enfrentar esta situação. Iniciar a conviver com a DA em sua mãe e suas limitações
progressivas em decorrência da sua evolução, afetou a saúde mental deste cuidador.
Assim, fazia-se necessário reposicionar seu familiar como uma pessoa doente para ele
próprio tornar-se capaz de conviver de forma saudável com esta situação. Frente a este
depoimento, como profissional e coordenadora do Grupo, passei a tecer alguns
102
comentários, relacionados à maior ocorrência de depressão e estresse entre cuidadores
de idosos com involução cognitiva, como era a situação de todos os que ali se
encontravam; acerca da importância de aceitar a inevitabilidade e irreversibilidade da
doença; de que o paciente não é a única pessoa que precisa ser cuidada e de buscar
saídas saudáveis e novas maneiras de viver junto. Como lembram Paterson e Zderad
(1979, p.39), “a enfermeira humanística é sensível à realidade da situação no sentido
existencial”. Com suas capacidades humanas, necessita dar uma resposta à realidade
experimentada por parte destes familiares, ensejando a mobilização de recursos e a
instilar esperança ao afirmar sua crença nos benefícios advindos ao participarem de um
Grupo de Ajuda Mútua.
À medida que os encontros se sucediam e inserções em jornais locais sobre a
doença de Alzheimer e o próprio GAM eram divulgadas, o Grupo foi conquistando
visibilidade na comunidade e alguns médicos passaram a indicá-lo aos familiares de
portadores. Assim o GAM foi-se constituindo em uma referência para alguns
profissionais médicos que encaminhavam os familiares ao Grupo, possibilitando a
necessidade de ampliar o processo terapêutico, não se restringindo somente à
dimensão biológica e à terapia medicamentosa.
Freqüentemente membros do Grupo relatavam aos demais como criavam
estratégias para lidar com as alterações comportamentais tipo devaneios, alucinações e
reações catastróficas, que requeriam paciência, tolerância, e senso de humor. Um dos
portadores, por exemplo, do sexo masculino, costumava masturbar-se, criando
embaraço e constrangimento à esposa. Outros portadores, diante de terceiros,
afirmavam que o familiar cuidador havia roubado seu dinheiro e objetos pessoais, ou
que a comida estava estragada ou, ainda, que não recebiam alimentação.
Este tipo de manifestações, conhecidos como distúrbios comportamentais,
presentes na fase intermediária, o segundo e mais longo estágio da DA, constituem-se
em distúrbios às vezes graves, mas que em geral, segundo Machado (2002, p.137),
“...ocasionam maior estresse ao grupo familiar e aos cuidadores do que ao próprio
paciente”. A maioria desses episódios irracionais deve-se a modificações no interior do
paciente, que tem dificuldade de descrever com suas próprias palavras o que lhe
103
acontece. Por tornarem-se progressivamente mais inseguros de seu ambiente ou do que
se espera deles, tornam-se mais dependentes dos cuidadores (GWYTHER, 1985).
Diante desse quadro caótico, a ABRAz assessorada por profissionais
especialistas divulga em suas publicações conselhos práticos, como neste caso: não
confrontar, não gritar, não discutir nem tentar explicar racionalmente o desapare-
cimento de objetos, oferecer apoio, manter a rotina estruturada, ordenada e previsível
ao máximo, procurar paliativos para a perda do controle, tentar controlar a situação,
procurar distraí-los lentamente para algo novo e descobrir quais os lugares favoritos
para esconder objetos. Também são incentivadas e consideradas positivas as seguintes
mensagens: “Eu estou aqui, Eu te amo, Eu ajudo e Você sabe” (ABRAz, 2003, p.2).
Nos relatos dos familiares, ao descreverem as estratégias utilizadas, houve o
compartilhamento de conhecimentos do senso comum com os do universo científico,
advindo um aprendizado com diferentes dimensões que configurou uma práxis do
cuidar no universo familiar. Algumas estratégias consistiram em tomar banho em
conjunto com o portador, espaçar intervalos entre um e outro banho, colocar uma
manta sobre a cadeira em que o portador estava sentado durante a masturbação, entre
tantas outras, evidenciando o desenvolvimento de inúmeras habilidades por parte dos
familiares cuidadores. Conforme arrolavam as diversas estratégias, pude observar que
suas ações se constituíam em procedimentos de cuidado bastante apropriadas às
demandas com as quais lidavam enquanto cuidadores. Também quando realizavam a
contenção das mãos ou estendiam um lençol sobre o abdômen do portador enquanto
este se encontrava sentado na cadeira ou poltrona para reduzir o risco de queda,
embora estratégias cerceadoras de forma temporária do movimento, sinalizavam
criatividade e zelo por parte do familiar cuidador.
Para Gwyther (1985, p.12), a DA engloba uma área da saúde em que ninguém
tem “direitos de mercado” com relação a novas idéias para enfrentá-la. Isto, no meu
entender, estimula formas criativas de cuidar, nas quais tecnologias de relações, de
encontros de subjetividade possam operar. De forma autodidata e intuitiva, estes
cuidadores informais desenvolveram um saber prático, a partir de suas próprias
vivências e de seus recursos pessoais, subsidiando um cuidado humanizado.
104
Nestes momentos de maior vulnerabilidade do portador, é imprescindível não
discutir, não restringi-los física nem moralmente, não ter posturas de confrontamento e
discordância e nem do cuidador descarregar suas frustrações sobre o portador. Manter-
se calmo, ser flexível, oferecer segurança, proteção, apoio e amor incondicional,
constituem-se posturas vitais para o enfrentamento desta complexa experiência
existencial. No entender de Paterson e Zderad (apud GEORGE, 2000, p.243 ),
o ser humano é um ser individual necessariamente relacionado com outros
seres humanos no tempo e no espaço. Como todos os seres humanos
dependem de outros para o seu nascimento e seu desenvolvimento, a
interdependência é inerente à situação humana [...] e a existência humana é a
coexistência.
Assim, embora a coexistência dos familiares com o idoso portador de DA
represente um grande desafio, é nesta interdependência que o vínculo entre ambos se
fortalece.
O compartilhamento no Grupo destas experiências de cuidado e do respectivo
ônus físico, emocional, familiar, social e financeiro, proporcionou aos familiares
cuidadores apoio mútuo, aliviando ansiedades, diminuindo o estresse e estimulando o
autocuidado. Isto pode ser evidenciado nas seguintes manifestações:
“ teve uma vez que foi só eu ir até a cozinha que ele colocou um quindim
inteiro na boca. Vocês já pensaram? Felizmente não se engasgou, pois eu
fiquei ao lado toda preocupada. Depois disto eu ofereço pirulito, já comprei
um pacote e vou dando aos poucos [...] ele gosta e fica horas com o pirulito
na mão. Experimentem fazer, vão ver como distrai” (Ametista, 68 anos).
Este episódio, pela forma com que foi relatado pela esposa do cuidador,
suscitou diversas risadas no Grupo, admirado com a estratégia utilizada e pela forma
como foi descrito.
Ainda na mesma linha, fiz a seguinte colocação:
“Pessoal, depois deste depoimento, todos aprendemos de que precisamos
nos manter atentos em relação aos portadores, para evitar a ocorrência de
situações deste tipo. Os portadores, nestas ocasiões, podem ser muito
rápidos e a qualquer momento terem comportamentos que podem colocar
sua segurança em risco. É bom lembrar de que as porções dos alimentos
devem ser pequenas e os líquidos devem ser oferecidos em pouca quantidade
para evitarmos que se engasguem ou que façam uma bronco-aspiração”.
(Enfermeira-pesquisadora).
105
Em outro encontro, ao ser abordada a ocorrência de alterações na pele dos
portadores, em decorrência de lesões nas pernas, vários familiares emitiram
comentários acerca de suas vivências:
“ [...] sabem o que está funcionando na minha mãe? Eu estou usando uma
pomada de papaína que está ajudando a fechar as feridas. Comprei na
farmácia [...]que fica lá na rua [...] e não é caro” (Topázio, 46 anos).
Ao fazer esta colocação ao Grupo, Topázio estava compartilhando a conduta
tomada e que tinha-se mostrado eficaz diante desta situação, servindo de referência
para os demais, pois a seguir, outra familiar fez o seguinte relato:
“[...] pois é, eu não sei o que fazer com as feridas na perna da minha sogra.
Elas estão custando a fechar. Depois ela é gorda e não pára quieta, acho
que isto também atrapalha. Vou comprar esta pomada [...]” (Esmeralda, 50
anos).
Esses depoimentos, vão na direção do caráter informativo e instrutivo dos
encontros do GAM, ao oferecer um meio de trocas de experiências, estimulando o
desenvolvimento de habilidades frente aos problemas que surgem no seu cotidiano
enquanto familiares cuidadores. Também é importante acolher e compartilhar as
frustrações de um insucesso, como relatado por Esmeralda, pois as trocas no Grupo lhe
dão suporte para lidar com a difícil incumbência.
Nos encontros, pautados em um clima de liberdade e solidariedade, a
apresentação formal e os momentos iniciais de silêncio deram lugar a aproximações
entre os membros e comigo enquanto coordenadora do Grupo, que sempre me esforcei
para respeitar e auscultar o próprio processo grupal, denotando relacionamentos
interpessoais e vínculos mútuos, com o partilhamento de experiências pessoais, que
favoreceram a coesão grupal, imprescindível quando se desenvolve este tipo de
atividade.
Para Munari e Furegato (2003), é na instância de um grupo que se treinam
relações humanas, uma vez que há o convívio com pessoas diferentes e o
descobrimento de novos rumos. Ao derivar a abordagem grupal para a área de
neuropsicogeriatria, é possível visualizá-la como um modo de assistir, cuja finalidade
é dar suporte aos cuidadores para seu próprio benefício, fomentar o intercâmbio de
106
informações e estimular estratégias de resolução dos problemas cotidianos.
Acredito que o GAM, ao promover o compartilhar de experiências, contribuiu
para que seus membros pudessem conviver melhor com as manifestações da doença
em seus familiares e a entender os problemas de modo mais realista.
Aqui é pertinente lembrar uma afirmação de Paterson e Zderad (1979, p.50),
acerca da enfermagem: “a enfermagem é um tipo especial ou particular de encontro
porque tem uma finalidade”. Assim também ocorre com o Grupo, que tem um caráter
educativo e terapêutico ao possibilitar o compartilhamento com outras pessoas de
problemas semelhantes, no qual emergem frustrações, conflitos, culpa, tristeza, raiva,
angústia, altruísmo, esperança, socialização e aprendizagem pessoal.
Nos inúmeros encontros com as famílias, pude refletir criticamente acerca das
suas experiências, disponibilizando-lhes conhecimento técnico-científico enquanto
enfermeira com formação gerontológica. Dessa forma, o GAM representou um
território de relações propício ao desenvolvimento de intervenção terapêutica, na qual
pude estabelecer uma ponte entre mundos e expectativas dos familiares cuidadores
com profissionais e serviços do sistema de saúde.
5.2.3 Instrumentalizando familiares acerca da doença de Alzheimer
Considerando a autonomização do usuário segundo Merhy e a potencialização
por parte da enfermeira, das capacidades individuais das pessoas na tomada de decisão
para um viver melhor, é imprescindível uma postura ativa de inter-relação e de diálogo
solidário e comprometido. As famílias constituem importante unidade de cuidado de
seus membros e que demandam informação, solidariedade e apoio. A participação em
um Grupo de Ajuda Mútua, possibilita à enfermeira “experimentar muitos níveis de
intersubjetividade”(PATERSON e ZDERAD, 1979, p. 55) ao conviver com os
diversos familiares, suas respectivas vivências pessoais e potencial humano.
Os familiares através do seu convívio diário com o portador são os primeiros a
107
observar eventuais alterações na memória, o primeiro domínio cognitivo a ser afetado
pela doença. A perda da memória quanto a acontecimentos recentes dificulta o
desempenho de atividades do portador. Os sinais típicos indicam esquecimento de
eventos recentes, repetição das mesmas perguntas, comprometimento do aprendizado
de novas informações e alterações de memória (MACHADO, 2002). Identificar e
avaliar a importância relativa das queixas ou dos sintomas detectados auxilia no
diagnóstico precoce da doença. Para subsidiar os familiares, listagem de problemas de
memória e alterações comportamentais foram distribuídos e seus itens devidamente
comentados com os participantes. O questionário para problemas de memória
composto de onze itens e o de avaliação funcional, com dez itens (GREEN, 2001),
embora constituam avaliações breves, auxiliam no rastreio inicial da demência por
refletirem de maneira objetiva as dificuldades apresentadas pelos idosos no cotidiano.
Pela doença de Alzheimer não ter causa e tratamento definidos, pela diversidade
de fatores etiológicos e fisiopatológicos a ela relacionados (MACHADO, 2002), pelo
impacto do seu diagnóstico ser extremamente desalentador sobre a família e como uma
das maneiras mais importantes de ajudar as pessoas é oferecer-lhes informações, uma
vez que os familiares se encontravam participando de um Grupo de Ajuda Mútua,
diversos materiais acerca da doença foram repassados e seu conteúdo discutido com os
familiares.
Além disso, o informativo da ABRAz, homepage, livros e o kit do cuidador,
distribuído gratuitamente por um dos laboratórios farmacêuticos parceiros da ABRAz
nacional, circularam entre os presentes em todos os encontros. As informações foram
repassadas em linguagem simples, clara e objetiva por se tratar de um público leigo
proveniente de diferentes níveis sócio-econômico-culturais, para assim promover a
aprendizagem dos familiares cuidadores, a ampliação da percepção sobre a DA, e
otimizar a relação cuidador-cuidado.
Oferecer informações corretas aos familiares sobre o que é a DA, após terem
vivenciado a fase inicial de choque emocional pelo diagnóstico recebido, quando a
família luta para ajustar-se à esta nova e desafiadora situação, representou uma
estratégia educativa que permeou sucessivos encontros. Educar os familiares acerca
108
dos sintomas significativos e a conviver com a maré emocional foi útil para auxiliá-los
a restabelecerem a crença de que têm algum controle da situação assim como para
diminuir a reatividade nesta fase. Sempre tive presente oferecer informações de uma
maneira humanizada, para não ficar restrita ao modelo tecno-assistencial, uma vez que
cada familiar e respectivo portador de DA têm uma individualidade e singularidade
que lhes são próprias, indo ao encontro da enfermagem dialogal no mundo real
preconizada por Paterson e Zderad (1979).
A relevância do conhecimento acerca da DA por parte do familiar é sua
configuração como um aliado para enfrentar essa difícil situação, atenuando a
sobrecarga advinda pelo processo de cuidar. Por outro lado, o domínio dessas
informações pode ajudá-los a tomarem decisões e determinadas condutas que
contribuam tanto para a qualidade dos cuidados quanto para o bem-estar do idoso e de
si próprios. Isto pôde ser comprovado no estudo conduzido por Ostwald et al. (1999),
no qual famílias foram selecionadas randomicamente, para receberem informação e
educação com suporte ao cuidador, evidenciando efeito positivo sobre os cuidadores e
pacientes ao longo do tempo. Ferretti e Bertolucci (2002), em estudo ao adaptar
modelos de suporte à realidade brasileira, criaram programa de educação e suporte
dirigido aos cuidadores, que permitiu a aquisição de conhecimentos de manejos não
farmacológicos, facilitando as tarefas diárias com o paciente.
A vinda do presidente da Regional e da Coordenadora de um Grupo de Ajuda
Mútua de Porto Alegre com seus respectivos depoimentos acerca de como
constituíram grupos e de como funcionavam, também representaram recursos valiosos
para impactar ganhos entre os familiares acerca da importância de estarem articulados
entre si. Esta configuração dos familiares em um grupo de ajuda mútua vai ao encontro
do que Merhy (2002, p.132) pondera como abrir-se para novos mundos de
significações, “ético-politicamente comprometidos com a capacidade que o trabalho
em saúde tem em ser uma poderosa arma em defesa da vida individual e coletiva”,
mesmo durante a progressão da demência.
Descrevemos abaixo, algumas falas que traduzem o mencionado:
“[...] vir para este grupo foi a melhor coisa que aconteceu [...] foi na hora
109
certa. “ (Turmalina, 52 anos).
“[...] a partir da informação recebida no Grupo mudou a forma como o
neurologista me tratava [...] ele passou a conversar de forma mais aberta
sobre a DA em minha mãe [...] chegou a me oferecer um livro sobre a
doença [...]” (Ágata, 65 anos).
Em relação ao ocorrido com Ágata, observa-se que este profissional de saúde,
que atua no cotidiano de assistência aos idosos com DA, após a familiar ter
reivindicado como cidadã, usuária e cliente ativa, o direito de receber informações
sobre a DA, mudou sua postura profissional, passando a compartilhar informações e
reconhecendo a necessidade de uma abordagem interprofissional. Pode-se afirmar que
a participação no GAM instrumentalizou-a para ultrapassar barreiras postas no modelo
assistencial, havendo evidente mudança em sua relação com o profissional.
Parece ter havido aqui uma convergência entre as manifestações dos familiares
e a afirmação de Merhy (2002), de que é no cotidiano dos profissionais de saúde que
se gera uma outra maneira de produzir cuidados de saúde, ou seja, na construção de
vínculo efetivo entre os usuários e serviços, garantindo o direito de acesso às ações
resolutivas de saúde, disponibilizadas nesta situação mediante reivindicação da
familiar cuidadora, como usuária de saúde.
Desenvolvendo ações de enfermagem nos encontros do Grupo de Ajuda Mútua,
possibilitou exercer um papel solidário, não diretivo, acolhedor, inspirador de
segurança e confiança. Depois de mais de um ano e meio do funcionamento do Grupo
de Ajuda Mútua, pude observar que a estratégia foi acertada considerando a reposta
positiva dos usuários quanto à necessidade de um lócus de prática cuidativa.
5.2.4 A assistência cuidativa grupal como um potenciador de prática cidadã
Já nos primeiros encontros após ter sido lançada a semente da formação do
Grupo de Ajuda Mútua, pude observar o afloramento de posturas mútuas de parte tanto
da enfermeira quanto dos familiares, potencializadoras da cidadania, quando, um
familiar trouxe matéria publicada em jornal de circulação estadual sobre a liberação da
110
medicação a um portador de DA, após sua família ter ingressado com medida judicial.
Esta situação se deu em decorrência da existência do recém-criado Programa de
Assistência aos Portadores de Doença de Alzheimer que, através da Portaria
703/GAM, entrou em vigor a partir de 12 de abril de 2002. Segundo essa Portaria, os
Centros de Referência em Assistência à Saúde do Idoso passam a ser responsáveis
pelo diagnóstico, tratamento (com distribuição gratuita de medicação),
acompanhamento dos pacientes, orientação a familiares e cuidadores e o que mais for
necessário. Outra Portaria, 843/SAS de 06 de novembro de 2002 estabelece o
Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas para Demência por Doença de Alzheimer,
assegurando a dispensação de medicamentos por parte da Secretaria de Saúde para os
portadores que tenham preenchido os critérios de inclusão no Protocolo de
Tratamento. Estes critérios abrangem avaliação por neurologista e/ou psiquiatra e/ou
geriatra: preencher os critérios clínicos de demência por doença de Alzheimer possível
ou provável e apresentar Miniexame do Estado Mental (MEM) com escore entre 12 e
24. Os medicamentos incluídos nesta Portaria e disponíveis na rede SUS são os
seguintes: Rivastigmina, Donepezil e Galantamina, indicados para a fase inicial da
doença. Essas drogas aumentam a produção da acetilcolina, neurotransmisssor que está
reduzido na doença de Alzheimer, intervindo nas diferentes etapas da
neurotransmissão colinérgica. Há cerca de um ano foi lançado no mercado brasileiro
um outro medicamento, à base da substância memantina, que inibe o fluxo de cálcio
nas células, restaurando a fisiologia e retardando a degeneração celular. A droga é
indicada para estágios intermediários e avançados da DA, mas ainda não está
disponível na rede SUS. As diferentes abordagens farmacológicas têm como foco os
fatores etiológicos e fisiológicos relacionados à doença de Alzheimer e o
comprometimento cognitivo múltiplo (LAKS e ENGELHARDT, 2003). Como todos
os membros do Grupo desconheciam o teor das respectivas Portarias, repassei cópias
deste documento, publicadas em uma edição do Informativo da ABRAz, considerando
que o seu conhecimento é imprescindível para qualquer iniciativa em busca do
cumprimento dos seus direitos.
Na prática, o cumprimento das políticas de saúde, com o acolhimento dos
pedidos pela secretaria municipal de saúde e a adoção dos critérios clínicos pelos
111
médicos nem sempre eram satisfatórios, como se observa nas seguintes manifestações:
“ [...] juntei os documentos necessários para fazer o pedido e ao chegar na
secretaria municipal de saúde a funcionária do guichê disse que tinha que
providenciar mais documentos, com isto eu fiquei sem saber o que fazer [...]
além disso ela me tratou mal, passou a gritar comigo [...] acabei não
voltando e desisti do pedido” (Ônix, 67 anos).
“[...] é complicado reunir este monte de papéis e exames que são
solicitados. Mostrei pro médico o que pediam e ele não se mostrou
interessado, até disse que não precisava tudo isto [...] eu acho que ele não
sabia bem destes testes [...] (Fluorita, 53 anos).
Embora aprovadas, estas Portarias ainda não asseguram aos portadores o devido
atendimento por parte do gestor de saúde. O Estado do Rio Grande do Sul conta até o
momento com três Centros de Referência, todos localizados na sua capital, Porto
Alegre. No entanto, o Estado tem 496 municípios, distribuídos e atendidos por
dezenove Coordenadorias Regionais de Saúde. Rio Grande situa-se a mais de 300 km
de Porto Alegre, sendo que a Coordenadoria Regional de Saúde localiza-se no
município vizinho de Pelotas, a aproximadamente 60 km. Todos os encaminhamentos
e necessidades de saúde são submetidos a esta Coordenadoria Regional, o que pode
constituir-se em motivo de demora e/ou de entrave no cumprimento do que é
assegurado legalmente. Exemplo desta situação pode ser observado na seguinte
verbalização:
“ [...] lá na secretaria me disseram que o processo sai daqui, vai para
Pelotas, depois vai a Porto Alegre, retorna para Pelotas e só daí é que
chega em Rio Grande. Levei mais de um ano para receber o remédio para a
minha irmã. Quando telefonava para a secretaria me diziam que é a
regional em Pelotas que tranca o processo” (Ônix, 67 anos).
Também o telefonema que recebi da esposa de um portador aponta para a
mesma situação:
“ [...] estou telefonando para dizer pra senhora que agora que meu marido
morreu, me ligaram da secretaria para avisar que chegou o remédio dele.
Agora já não adianta mais, é muito triste [...] (Calcita, 65 anos).
Como se pode perceber, o evidente “jogo gerencial público e privado que
impera no cenário dos estabelecimentos de saúde” (MERHY, 2002, p.125), opera
112
constantemente com a produção de dados e informações dentro de suas lógicas
particulares, penalizando as famílias com idosos portadores de DA, não lhes
assegurando uma assistência digna pela rede pública. Os relatos sofridos dos familiares
indicavam atendimento desumano, o não repasse devido da informação em saúde e
inclusive posturas prepotentes por parte de alguns trabalhadores de saúde, como por
exemplo, quando, mesmo enfrentando filas não conseguiam acesso ao neurologista,
deslocavam-se até a secretaria municipal de saúde, sendo tratados com descortesia e
rispidez por determinada funcionária. No meu entendimento, também identifico esta
situação como condição de não-cidadania, que é perpetuada pelos próprios prestadores
de serviço.
A situação descrita acima evidencia o que Veras (2002, p.14) contextualiza
como
[...] um sistema de saúde desorganizado frente às necessidades deste
segmento populacional, com baixa resolutividade, pouco adequado para
enfrentar os problemas de saúde do idoso agravados pela desinformação,
pela dificuldade de acesso aos serviços de saúde, pelo preconceito e
despreparo da sociedade e dos profissionais de saúde[...].
Essa contextualização também é corroborada por Coelho (2004), na conclusão
de sua pesquisa acerca das vivências e experiências de familiares cuidadores de idosos
com DA. Esta autora conclama para a necessidade de repensarmos a questão social do
idoso e para um acompanhamento sistemático da pessoa com Alzheimer. Destaca
ainda, o desafio que representa, não só para a família, mas também para as enfermeiras
e demais profissionais de saúde, cuidar de um doente de Alzheimer.
A busca de assessoria jurídica junto a advogados da Associação dos Professores
da Universidade (AproFURG) para dirimir dúvidas de alguns familiares quanto às
eventuais implicações legais decorrentes do GAM vir a vincular-se à ABRAz,
tornando-se mais uma sub-regional no Estado, se constituiu em outro recurso. A
disponibilidade da coordenação regional da ABRAz, com o envio das normas
estatutárias e demais esclarecimentos efetivados via contato telefônico, agilizaram este
processo, culminando com a instalação oficial em treze de setembro de 2003.
Nestes primeiros momentos de encontro com os familiares, pude perceber a
113
ressonância do Grupo, que aceitava os múltiplos desafios postos e impulsionava a
socialização de informações pelos próprios familiares participantes como as referentes
a sites sobre a DA disponíveis na internet. Esses familiares participantes do GAM,
porta-vozes dos que vivem e convivem com portadores de DA, à medida que
expunham suas experiências, possibilitava a exploração das situações vivenciadas
pelos demais, vindo a constituir-se em um evento positivo para todos, reforçando
assim a mutualidade grupal. Nesse contexto, os próprios integrantes manifestavam
atitude solidária entre si, estabelecendo diálogos, escutando de forma empática,
formulando perguntas acerca de como os demais lidavam com a situação, acolhendo
sugestões de estratégias e procedimentos, discutindo acerca dos sentimentos que
emergiram. Assim, o GAM ia adquirindo valor significativo para seus membros uma
vez que na vivência e prática flexível, os familiares podem extrair demandas de
aprendizagem acerca do estagiamento da DA em seu ente querido assim como, por
encontrarem-se em estágios diferenciados em relação ao tempo de convívio com este
idoso com DA, socializar a forma como lidam com o mesmo.
A elaboração de material sobre a DA que disponibilizei para o Grupo e a troca
de informações sobre a doença também se constituíram em mecanismos eficientes para
apontar caminhos acerca do exercício da cidadania. Estas posturas que emergiram a
partir da organização dos familiares em um coletivo sob a forma de um Grupo de
Ajuda Mútua se alinham “[...] ao interesse coletivo da cidadania, expresso no radical
vínculo do conjunto das ações de saúde com a defesa da vida, individual e coletiva”
(MERHY, 2002, p.126), dando assim visibilidade às suas necessidades específicas e o
afloramento de uma maior consciência política.
Nesse sentido, é relevante a importância de entidades como a ABRAz que, na
constituição do Conselho Nacional de Saúde, dos Conselhos Estaduais e Municipais
do Idoso e de Saúde em diversas cidades brasileiras, pode, com maior
representatividade civil, pressionar o gestor municipal com vistas ao cumprimento do
que está disposto na Portaria 703 de 12 de abril de 2003. A própria ABRAz, em várias
edições do seu Informativo, através da sua assessoria jurídica, orienta e estimula as
famílias a ingressarem com medidas judiciais cabíveis para coagir o Estado ao
cumprimento de suas obrigações, uma vez que é de seu conhecimento que, em
114
algumas regiões, a distribuição de medicamentos não é eficiente.
Apesar das reuniões realizadas com o gestor municipal de saúde e das
expectativas de vermos resolvida a questão do repasse da medicação, via SUS, para os
portadores, novas tratativas tiveram que ser implementadas, visando o cumprimento do
disposto na Portaria 703. Como a configuração da assistência seguida pelo gestor local
do SUS opera em direção à manutenção do modelo médico-hegemônico, numa
abordagem tecnológica e curativista e não como “um bem público, patrimônio de toda
a sociedade, e valor de uso inestimável, tanto individual, quanto coletivo” (MERHY,
2002, p.66), fêz-se necessário provocar uma decisão de forma a otimizar e
disponibilizar o uso dos recursos disponíveis. Como enfermeira, pude provocar uma
articulação do Grupo e de seus participantes com entidades representativas do sistema
formal de saúde, como o Conselho Municipal de Saúde, a 3
a
Coordenadoria Regional
de Saúde, localizada em Pelotas, assim como com o gestor municipal de saúde,
denunciando o não repasse da medicação, os inibidores da acetilcolinisterase, os
entraves burocráticos e o constrangimento moral dos usuários quando procuravam o
serviço público. Acessar estas instâncias legais possibilitou intervir no processo de
trabalho instituído, buscando respostas e saídas, frente à insegurança, impotência e ao
desconforto das famílias pelo atendimento recebido. É importante destacar que nesta
situação-problema levantada, foi pontuada a falta de interesse e responsabilização dos
profissionais acerca dos problemas e necessidades dos usuários, reveladora das
relações micropolíticas institucionais, de um processo silencioso, que obedece muitas
vezes a um padrão do tipo “pacto da mediocridade”, no qual o usuário sai sempre
como o grande prejudicado (MERHY; ONOKO, 1997). Na trajetória percorrida por
cada família ficava evidente o desrespeito aos princípios constitucionais estabelecidos
no caput do Artigo 5
o
da Constituição: todos são iguais perante a lei, sem distinção de
qualquer natureza [...] e o de assegurar a dignidade da pessoa humana.
O controle do SUS pela sociedade se efetiva através dos Conselhos de Saúde
(Ministério da Saúde, 1998), criados para que a população possa intervir na questão da
saúde, promovendo o exercício do Controle Social. Ao agendar a participação na
reunião do Conselho Municipal de Saúde, espaço no qual se efetiva o controle do SUS
pela sociedade, se constituiu em uma atividade conjunta, quando, eu, acompanhada de
115
três familiares, denunciamos o atendimento negligente e a situação dos portadores de
DA e suas famílias.
Por sua vez, ao agendar a ida à reunião do Conselho Municipal de Saúde como
profissional de saúde engajada num Grupo de Ajuda Mútua, no qual eram freqüentes
as manifestações de desagrado e angústia dos familiares pelo não acolhimento de suas
demandas quanto à disponibilização pelo gestor municipal de saúde da medicação para
os portadores de DA, eu esperava promover a aproximação e o diálogo dos
conselheiros com os familiares. A partir dos depoimentos dos familiares, alguns
conselheiros se pronunciaram a favor da abertura de uma sindicância e da necessidade
de encaminhar ao secretário municipal de saúde a presente situação.
Embora estivesse se manifestando de forma ainda incipiente, pude perceber que
o GAM se constituía em uma metodologia em saúde comprometida com a cidadania
dos participantes, alinhando-se na defesa da eqüidade de acesso aos serviços de saúde,
fornecendo informação e atualização sobre pesquisas na área da doença de Alzheimer,
repassando documentos legais pertinentes à DA e à ABRAz , estimulando a
vinculação à ABRAz e oferecendo apoio aos seus participantes. Sobre isso, é oportuno
lembrar Merhy (1997), que salienta que o conhecimento do trabalhador de saúde ao se
somar ao dos usuários para construir uma mútua cumplicidade, objetiva a melhoria
real da qualidade de vida e denota o compromisso com o usuário final das ações de
saúde.
À medida que os encontros se sucediam, novas articulações e mobilizações se
fizeram necessárias para assegurar e garantir o respeito aos direitos dos portadores de
DA e de seus familiares de terem acesso gratuito à medicação, o que legalmente está
assegurado desde 2002. Desse modo, contato telefônico com a Coordenadoria
Regional de Saúde de Pelotas, acerca da não dispensação da medicação e envio através
de fax da relação de famílias que ingressaram com pedidos via secretaria municipal de
saúde foram algumas das providências tomadas no Grupo da minha parte, que
permitiram aplicar os princípios do cuidado humanístico. Como afirmam Paterson e
Zderad (1979, p. 31), “a enfermagem é uma vivência dos humanos, seu conteúdo
inclui todas as respostas possíveis nesta situação, tanto do que necessita como daquele
116
que ajuda em um determinado momento”; assim, diversos movimentos foram
realizados, sinalizando uma coesão grupal estabelecida pela união e luta por um
objetivo comum, tornando possível a relação “Nós”, uma característica da enfermagem
humanística.
Frente à decisão de instalação de uma sub-regional em Rio Grande, aos contatos
com o presidente da ABRAz no Estado do Rio Grande do Sul e às suas orientações,
procedemos à composição de uma diretoria constituída por presidente, secretária,
tesoureira e coordenadora científica. Os nomes surgiram a partir de uma identificação
no Grupo de pessoas que já vinham, de modo mais intenso, realizando articulações
políticas e/ou técnicas, que possuíam mais disponibilidade para estarem presentes nos
encontros e também eventualmente em eventos relacionados à DA. Estas pessoas,
junto com as demais, como indivíduos/cidadãos estavam exercendo seu poder de
participação e organização, no qual o GAM representava um espaço para fazer valer
seus direitos, cientes de sua plenitude. Os familiares participantes do GAM
começaram a perceber que os problemas sociais e de saúde que eles enfrentam, podem
ser prevenidos ou pelo menos minimizados, desde que haja participação e organização.
Para mim, profissional de saúde articuladora do GAM, compor a diretoria acenava
“um vínculo efetivo [...] na busca de uma resolutividade que se oriente por ganhos de
autonomia dos usuários [...]” (MERHY, 2002, p.126).
Em treze de setembro de 2003 procedeu-se à posse desta diretoria, com a vinda
do presidente da ABRAz regional, assim, o GAM foi oficializado, ganhando
visibilidade social e política. Enquanto metodologia em saúde, o GAM significou o
encontro entre necessidades e processo de intervenção tecnologicamente orientado
(MERHY, 2002), operando sobre o campo das necessidades que se fazem presente
nesse encontro, a dos familiares cuidadores.
Depois da posse, membros da diretoria participaram de programas de rádio e de
entrevistas em jornais locais para divulgar informações sobre a DA e sobre as
atividades do Grupo, para protagonizar, como afirma Merhy (2002, p.15), “processos
novos como força de mudança”. Enquanto cuidadores, atuando no espaço privado do
domicílio, estes familiares agora participando do GAM, ganharam visibilidade aos
117
olhos da sociedade e dos profissionais de saúde em particular, desvendando seu
complexo universo de cuidador. O GAM, por sua vez, estimulou a solidariedade de
cada familiar cuidador participante, contribuindo para o estabelecimento de vínculos
entre si. Pôde-se também vislumbrar a promoção do exercício da cidadania com essas
pessoas, que embora no momento constituindo um número pouco representativo de
moradores do município de Rio Grande, compartilham o paradigma da vida em
sociedade.
Pelas crescentes demandas econômicas da DA, decorrentes principalmente com
os custos relacionados com a aquisição de medicação e de outros produtos, como por
exemplo, das fraldas geriátricas, e também como grande parte das famílias
participantes não mora próxima ao centro da cidade, onde se concentra a maioria das
grandes redes de farmácias, o GAM articulou a vinda do proprietário de uma farmácia
que trabalhasse em sistema de cooperativa para disponibilizar o acesso, entre seus
membros, de informações sobre pontos comerciais que trabalham com menor margem
de lucro. Sua vinda desencadeou, entre os presentes, o reconhecimento da importância
e da necessidade de fazer um levantamento prévio acerca do preço dos produtos
consumidos no cuidado dos portadores de DA e de algumas estratégias individuais já
adotadas por alguns participantes, tais como: levantamento de preços pelo telefone e
acompanhamento das promoções pelos folhetos distribuídos pela rede de
supermercados e de farmácias.
Esta forma de proceder por parte de alguns membros, ao ser socializada no
Grupo, demonstrou uma postura de cidadãos conscientizados, que não ficam a mercê
de empresas que tem um valor agregado alto em seus produtos, fazendo valer seus
direitos enquanto consumidores e co-partícipes na prática da cidadania plena.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O desenvolvimento de uma prática cuidativa de enfermagem de família
cuidadora de idoso com doença de Alzheimer foi o objeto da presente tese. Tal opção
se fundou em função do quase inexistente estudo em nosso meio que enfoque a
familiar cuidador como o cliente da enfermagem ou usuário do serviço de saúde.
Considerando a inexistência, em nosso sistema de saúde de serviços ou programas
dirigidos ao atendimento da família cuidadora de idoso dependente, a estratégia adotada
foi a de como formar um grupo de ajuda mútua para abrigar os referidos familiares,
território ou espaço de relações propício ao desenvolvimento de uma assistência cuidativa
requerida por esses familiares os quais com freqüência apresentam-se em estado de saúde
lábil motivado pela extenuante e complexa tarefa cotidiana de cuidar do idoso.
A metodologia adotada para o estudo da referida assistência recaiu sobre a
modalidade de Pesquisa Convergente-Assistencial (PCA), que propiciou o
desenvolvimento concomitante do estudo do objeto, neste caso a assistência de
enfermagem, com a prática da mesma em caráter experimental.
Essa assistência, que concebi como tecnologia cuidativa de enfermagem para
família cuidadora de idoso com DA, uma tecnologia leve de trabalho de assistência
cuidativa em ato preconizado por Merhy (2002), constituiu-se desde a formação do
Grupo de Ajuda Mútua (GAM) como ação da enfermagem, até o desenvolvimento de
ações cuidativas no interior do Grupo durante suas reuniões periódicas quinzenais,
estendendo-se sempre que necessário, ao atendimento domiciliário, à consulta
individual de enfermagem, ao atendimento emergencial telefônico e ao
encaminhamento a outros profissionais ou serviços.
O trabalho grupal, aqui expresso sob a forma de um Grupo de Ajuda Mútua na
área de idosos demenciados e seus respectivos familiares cuidadores, propiciou
pesquisar e trabalhar com postura interdisciplinar. O intercâmbio de informações com
119
alguns profissionais da saúde, como fonoaudióloga, clínico geral e neurologista,
mantido fora do âmbito hospitalar, configurou um convívio democrático e plural. Há
que se reconhecer, porém, a relação de poder presente entre as diferentes profissões, na
qual o médico ainda mantém uma posição hegemônica, nem sempre estando disposto
ao diálogo e à aprendizagem, imprescindíveis no campo da gerontologia. No entanto, a
capacidade integradora e interdisciplinar da gerontologia a partir de determinados
projetos ou problemas de pesquisa, com a criação de arranjos solidários em relação aos
idosos com DA e seus familiares cuidadores, como através de um Grupo de Ajuda
Mútua, condição em tela, possibilita romper fronteiras entre especialidades, assim
como com posturas centralizadoras.
Avançar nas políticas públicas que possam auxiliar as famílais cuidadoras de
idosos com DA é imprescindível no atual cenário brasileiro marcado por carência de
recursos sociais e profissionais para atender novas demandas. O Grupo de Ajuda
Mútua se configura como uma alternativa na rede de serviços e apoio às famílias
cuidadoras no município envolvidas na assistência ao idoso com DA. Vinculado em
conjunto com o programa municipal de saúde, pode postergar a institucionalização do
idoso com DA e reduzir o desgaste do familiar cuidador.
No caminho percorrido, a Pesquisa Convergente-Assistencial (PCA) articulada
pela técnica de grupo de convergência sob a forma de um Grupo de Ajuda Mútua,
ofereceu uma contrapartida concreta de conforto e apoio às famílias cuidadoras,
possibilitando desenvolver pesquisa e assistência ao mesmo tempo, no mesmo espaço
físico-temporal, com os mesmos participantes, conforme postulado por Trentini e Paim
(1999). A articulação intencional entre pesquisa e prática assistencial, principal
característica da PCA, demandou uma postura participativa da enfermeira, com
formação de vínculos com os participantes, na qual saberes profissionais e saberes
populares conviveram mutuamente. Acredito que utilizar o método da pesquisa do tipo
convergente-assistencial para a realização desse estudo contribuiu para um novo
direcionamento da prática de saúde envolvendo famílias cuidadoras de idosos com
DA.
A Teoria Humanística de Paterson e Zderad (1979), guia norteador para o
120
encontro assistencial com as famílias, possibilitou manter um diálogo intersubjetivo
pautado no cuidado humanizado, no qual as dúvidas e opiniões dos familiares foram
ouvidas e consideradas, enquanto porta-vozes de todos aqueles que convivem com
idosos portadores de DA
O envolvimento progressivo com os princípios da Teoria Humanística
favoreceu o compromisso existencial, pessoal e profissional, que adquiriu novos
contornos. A abordagem sensível do cuidado de enfermagem permitiu trocar
conhecimentos e experiências com os familiares cuidadores, tendo o enfoque
humanístico como unidade indissolúvel. Por sua vez, o suporte em Merhy (2002) com
suas concepções referentes ao trabalho vivo e tecnologias leves envolvidas no trabalho
em saúde, vislumbrou a formação de um Grupo de Ajuda Mútua, deliberadamente
constituído para este estudo, que se constituiu em um espaço de acolhimento para os
familiares cuidadores, promovendo o vínculo da enfermeira pesquisadora com os
mesmos. Nesse sentido, ambos os referenciais foram de fundamental importância para
a implementação de uma assistência de enfermagem mais efetiva, solidária e humana.
Enquanto a prática se desenrolava por dezoito meses, observação, registro,
análise e reflexões sistemáticas do processo pesquisa-assistência foram realizados,
resultando em algumas conclusões conforme seguem.
a) A continuidade do funcionamento do GAM – Grupo de Ajuda Mútua de
Familiares Cuidadores de Idosos com Doença de Alzheimer em Rio Grande,
transformando-se até em uma Sub-Regional da ABRAz/RS representa uma
resposta às necessidades de seus participantes, constituindo-se não só em instância
de assistência mais imediata de vida e saúde, mas também de um espaço de
desenvolvimento pessoal e fortalecimento enquanto grupo para o encaminhamento
de reivindicações e lutas políticas que façam valer os direitos de cidadania.
b) Funcionando no município de Rio Grande, esse GAM – Grupo de Ajuda
Mútua de Famílias Cuidadoras de Idosos com Doença de Alzheimer tem sido,
ultimamente, referência para as cidades vizinhas, como Pelotas, Jaguarão,
Canguçu e Pinheiro Machado, pois famílias provenientes dessas cidades têm
buscado os préstimos cuidativos que a organização oferece, configurando assim
121
sua utilidade pública.
c) A tecnologia cuidativa desenvolvida tendo como referencial teórico-
metodológico as concepções da enfermagem humanística (PATERSON e
ZDERAD, 1979), aliadas aos princípios vitais de serviços de saúde usuário-
centrados (MERHY, 2002), revelou-se benéfica, comprovada pela constante
procura por esse cuidado como também de incorporação de novos membros
entre os participantes no GAM.
d) A experiência prática de dezoito meses de condução de tal assistência
cuidativa, com sinais de sucesso, reúne credenciais para sensibilizar órgãos
municipais de saúde e subsidiá-los tecnicamente, na reformulação de programas
de saúde que contemplem a atenção dos idosos portadores de DA e suas
respectivas famílias cuidadoras da municipalidade de Rio Grande.
e) O PSF, que tem como foco do cuidado profissional de saúde em atenção
básica a família, coloca a necessidade de uma atenção especial aos idosos, na
qual se incluem medidas de reabilitação voltadas para evitar a separação do seu
convívio familiar e social, entre tantas outras. Como profissional que vivenciou
o PSF durante um projeto de extensão em parceria com a Secretaria Municipal
de Saúde, entendo que o PSF possa contribuir para promover a atenção primária
de boa qualidade a indivíduos sob circunstâncias específicas do processo de
saúde/doença, a exemplo: os idosos com DA e suas respectivas famílias. A
realidade, no entanto, mostra que os profissionais de saúde que compõem o
PSF, em sua maioria, não possuem capacitação nas áreas de geriatria e
gerontologia. A Política Nacional do Idoso (PNI) e a Política Nacional de Saúde
do Idoso (PNSI) enfatizam a necessidade de que os cuidadores informais
recebam treinamentos básicos referentes a cuidados com a higiene, alimentação
e promoção de conforto, entre outros, o que poderia ser assumido pelas
enfermeiras integrantes do PSF. Tanto a PNI quanto a PNSI ressaltam a
necessidade de formação de núcleos de apoio, que permitam a troca de
experiências entre os cuidadores, o que também poderia ser efetivado no
contexto das UBS, tendo essa mesma equipe do PSF como idealizadora. Na
122
condição de docente de enfermagem com formação na área de gerontologia e
atuando em uma instituição de ensino pública, reconheço a pertinência da
parceria com o gestor municipal de saúde com vistas ao preparo e apoio da
família para o cuidado do idoso com DA. Isto poderia vislumbrar uma melhor
orientação e assistência às famílias cuidadoras de idosos com DA no contexto
domiciliar, para que possam lidar melhor com os desafios que a doença impõe.
f) Ao alinhar-me aos preceitos humanísticos da assistência e às orientações usuário-
centradas de serviços de saúde, sinto-me comprometida em responder às
necessidades dos familiares de idosos com DA, e enquanto enfermeira docente da
FURG, sou movida para em futuro próximo agregar-me a uma equipe de trabalho
com vistas a lutar pela instalação de um programa gerontogeriátrico no HU com
tecnologia cuidativa humanística e usuário-centrado, buscando desenvolver o devido
papel universitário de ensino, pesquisa e extensão.
REFERÊNCIAS
ALVAREZ, A . M. Tendo que cuidar: a vivência do idoso e da família idosa no processo de
cuidar e ser cuidado em contexto domiciliar. 2001. 199p. Tese (Doutorado em Enfermagem)
Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, Universidade Federal de Santa Catarina,
Florianópolis.
ALVAREZ, A . M.; GONÇALVES, L.H.T.; SCHNEIDER, P. Grupo de Ajuda Mútua de
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ANEXOS
ANEXO 1 – Cópia do Termo de Consentimento Informado
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA – UFSC
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENFERMAGEM
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Eu, .........................................................................................................familiar cuidador do/da
senhor/a ..................................................................................................., declaro estar de
acordo em participar como informante na pesquisa “A Enfermagem no Grupo de Ajuda
Mútua para Familiares de Idosos com Doença de Alzheimer”, de autoria da doutoranda
Marlene Teda Pelzer, sob orientação da professora doutora Lúcia Hisako Takase Gonçalves.
Uma vez que me foi afiançado que todas as informações obtidas seriam tratadas com o
máximo respeito e, que o anonimato e sigilo seriam garantidos durante todo o processo de
coleta de dados, relatório final e divulgação do trabalho no meio acadêmico e em publicações
científicas.
Estou ciente de que os responsáveis pela pesquisa estarão aptos a esclarecer-me qualquer
dúvida sobre o desenvolvimento deste trabalho, bem como poderei solicitar para averiguação,
a qualquer momento, todo material produzido ao longo dos encontros.
A minha participação é voluntária e posso desistir a qualquer momento.
Estou ciente que não obterei qualquer benefício financeiro ou de outra ordem ao fazer parte
desta pesquisa.
____________________________________________
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