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intransponível entre os dois mundos – o da música tradicional e o da sertaneja
moderna, que agora ganhava sua forma mais acabada. Foi nessa época que os puristas
inventaram adjetivos pouco amigáveis para defini-los, como sertanojos
(NEPOMUCENO, 2001, p. 198).
No entanto, não são todos os estudiosos que concordam ser Chitãozinho e Xororó o
divisor de águas entre música caipira e sertaneja; vários estudiosos têm como parâmetro o
mercado, quando vão fazer essa distinção. É o que mostra Duarte em sua tese de doutorado:
Alguns autores que analisaram a questão da música popular no rádio, em especial a
música caipira, estabeleceram uma fronteira muito clara entre a música feita no e pelo
rádio e disco – na cidade – e aquela feita sem a presença desses meios de
comunicação – no mundo rural. Tinhorão, nos seus escritos, deixou clara a separação
entre os próprios músicos, inclusive de intenções, no momento em que penetravam
nesse universo do rádio e do disco. Em decorrência disso, segundo ele, a música
caipira autêntica se transformou em música popular urbana de estilo sertanejo,
descaracterizada enquanto arte, tornando-se simples mercadoria de consumo.
Tinhorão chegou mesmo a delimitar a data de nascimento dessa última: 27 de outubro
de 1929, data da primeira gravação pela Victor feita por Olegário e Lourenço (ou
Mandi e Sorocabinha) (DUARTE, 2000, p. 219).
Caldas é adepto desse pensamento. Para ele, a música caipira é uma prática da
preservação de valores culturais;
A importância dessa música, porém, é muito maior do que possa aparecer. Até porque
ela nunca aparece apenas enquanto música. Além da evidente função lúdica, de lazer,
deve-se ainda destacar seu papel na produção econômica através do “mutirão”, no
ritual religioso das festas tradicionais da Igreja e, principalmente, como elemento
agregador da própria comunidade, mantendo-se coesa através da prática e da
preservação dos seus valores culturais. É justamente em torno das festas religiosas,
dos “desafios” das “modas de viola” ou das “cantigas de roda” que o caipira mantém
ainda intacta parte da sua cultura, resistindo, não se sabe por quanto tempo, à eficiente
e avassaladora influência dos valores da cultura urbano-industrial (CALDAS, 1999,
p. 16).
O autor ainda afirma que foi o contato da música caipira com o disco e com a rádio
que a modificou. Duarte sintetizou o pensamento de Caldas, quando escreveu:
qualquer mudança “transformava”, portanto, essa música em produto, em
“mercadoria”, isto é, “em música sertaneja”. Esta última, produzida “no meio urbano
industrial pela indústria do disco”, segundo Caldas, “tornou-se melódica e menos
rítmica”, passou a apresentar “um discurso profano”, etc. Perdeu, portanto sua
“autenticidade”, transformando-se, simplesmente, em produto. Em compensação,
Caldas reconhece que a música caipira continua a ser produzida – ou