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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
INSTITUTO DE FÍSICA
DESENVOLVIMENTO DE UM SISTEMA DE NITRE-
TAÇÃO A PLASMA E INVESTIGAÇÃO DA
INFLUÊNCIA DA TEMPERATURA E COMPOSIÇÃO
DA ATMOSFERA NA NITRETAÇÃO DA LIGA
Ti-6Al-4V
Saulo Cordeiro Lima
Porto Alegre
2010
1
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SAULO CORDEIRO LIMA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM FÍSICA
IF-UFRGS
DESENVOLVIMENTO DE UM SISTEMA DE NITRETAÇÃO A PLASMA E
INVESTIGAÇÃO DA INFLUÊNCIA DA TEMPERATURA E
COMPOSIÇÃO DA ATMOSFERA NA NITRETAÇÃO DA LIGA Ti-6Al-4V
Dissertação realizada sob a orien-
tação do Dr. Marcos Vasconcellos
e apresentada ao Instituto de Física
da UFRGS, em preenchimento
parcial dos requisitos para a obten-
ção do título de Mestre em Física.
Porto Alegre
2010
2
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Agradecimentos
Foram diversas as contribuições e auxílios que, nas mais diversas formas, foram essen-
ciais (quando não imprescindíveis) para a realização desse trabalho. É difícil lembrar e citar
todos que tiveram sua parcela de participação. Entretanto, me sinto voluntariamente obrigado
a mencionar alguns nomes que foram muito importantes e não podem passar em branco. As-
sim, quero agradecer...
Ao meu orientador, o Prof. Dr. Marcos A. Z. Vasconcellos pela sua dedicação e
ensinamentos a mim direcionados. Da mesma forma, à Prof. Dra. Ruth Hinrichs,
minha co-orientadora não-oficial, que sempre contribuiu de forma intensa e crítica.
Ao Laboratório de Implantação Iônica, onde foram feitas as análises por reação
nuclear, necessárias para o desenvolvimento do trabalho. Também ao Laboratório
de Superfícies e Interfaces por disponibilizar o sistema “feiticeira” de aquisição de
dados do experimento de reação nuclear, facilitando enormemente tal tarefa.
À Oficina Mecânica do IF, em especial ao Paulinho (Honoris Causa?!) que sempre
esteve disposto a ajudar, discutir e ensinar diversos quistos técnicos do sistema
construído. Sem tal ajuda seria quase impossível!
Ao Restaurante Universitário que me manteve alimentado.
À Capes que financiou uma bolsa sem a qual nada teria acontecido.
À uma galera com quem dividi o apartamento, o Rafael P. e Rafael O. Com eles
tive um convívio direto e devo levar algumas lições.
Ao pessoal do laboratório: César (durante um tempo), Sirlon e Gilson com os
quais discuti assuntos relacionado ao trabalho ou não.
3
Aos professores, estudantes e funcionários da Pós-Graduação com os quais tive al-
gum contato e que certamente foram indispensáveis.
Atravessando algumas fronteiras e chegando ao estado da Bahia, não poderia deixar de
falar das pessoas que, mesmo indiretamente, estiveram presentes nessa peleja. Minha sincera
gratidão...
Aos meus “broders” Jonas Tadeu, Jeciné e Leonardo com os quais vivi muitos
bons momentos durante muito tempo e que hoje sempre demonstram a mesma ale-
gria nos raros reencontros.
À minha amiga Andrea (uma irmã) que sempre, sempre mesmo, preocupou-se co-
migo e que me tornou um cara mais feliz (ela vai se sentir quando ler isso!).
Ao meu amor, minha namorada Deise, que embora esteja tão distante, me faz mui-
to feliz e é sempre inabalável ao me compreender e incentivar. “Eu chorando pela
estrada, mas o que eu posso fazer?! 'estudar' é minha sina, eu gosto mesmo é d'o-
cê”
À minha família da qual tenho orgulho, meus pais Guilherme e Izabel, e meus ir-
mãos Ivan e Alan. Sempre me deram força e sei que poderei contar com vocês.
Aproveito para pedir desculpas à minha mãe, por sempre deixá-la chorosa e sem
saber quando me verá.
No mais, que perdoem a falta, aqueles cujos nomes não foram aqui mencionados ou
que a atenção merecida não foi dada.
¡Obrigado a Todos!
4
Súmario
Agradecimentos
Lista de Figuras
Lista de Tabelas
Resumo.....................................................................................................................................10
Abstract....................................................................................................................................11
1 - Introdução..........................................................................................................................13
2 - Revisão Bibliográfica.........................................................................................................17
2.1 – Nitretação a Plasma.....................................................................................................17
2.1.1 – O plasma..............................................................................................................18
2.2 – O Titânio, suas Ligas e o Nitreto.................................................................................23
2.2.1 – Aspectos gerais....................................................................................................23
2.2.2 – Estrutura, propriedades físicas e mecânicas do titânio........................................24
2.2.3 – Classificação das ligas de titânio.........................................................................26
2.2.4 – A liga Ti-6Al-4V ou “TiVAl”.............................................................................27
2.2.5 – Nitreto de titânio..................................................................................................30
2.2.6 – O processo de nitretação......................................................................................32
3 – Materiais e Métodos..........................................................................................................37
3.1 Descrição da Câmara de Nitretação...............................................................................37
3.2 Preparação das Amostras................................................................................................43
3.3 Processo de Nitretação...................................................................................................43
3.4 Técnicas de Análise........................................................................................................46
3.4.1 Análise por reação nuclear (NRA).........................................................................46
3.4.2 Difração de raios X em ângulo rasante (GIXRD)..................................................49
3.4.3 Espectroscopia micro-Raman................................................................................51
4 – Resultados..........................................................................................................................58
4.1 Análise por Reação Nuclear...........................................................................................58
4.2 Difração de Raios X em Ângulo Rasante.......................................................................63
4.3 Espectroscopia micro-Raman.........................................................................................69
5 – Discussão............................................................................................................................75
5.1 Formação das Fases e Estruturação................................................................................75
5.2 Estequiometria, Espessura das Camadas e Tamanho de Grão.......................................78
5.3 Espalhamento Raman.....................................................................................................85
6 – Conclusões..........................................................................................................................90
6.1 Sistema de Nitretação.....................................................................................................90
6.2 Caracterizações...............................................................................................................91
6.3 Propostas de Continuidade do Projeto de Nitretação.....................................................92
Referências...............................................................................................................................93
5
Lista de Figuras
Figura 2.1: Curva característica de Voltagem-Corrente [4]....................................................19
Figura 2.2: Desenho esquemático indicando as regiões de descarga luminescente em um plas-
ma [5]........................................................................................................................................19
Figura 2.3: Características gerais e aplicações do titânio e suas ligas [13].............................24
Figura 2.4: Estrutura cristalina do titânio: (a) fase α (hcp) e (b) fase β (bcc) [13].................25
Figura 2.5: Diagrama de fases da liga Ti-6Al-V ilustrando a formação do padrão de Wid-
manstätten [15].........................................................................................................................28
Figura 2.6: O padrão de Widmanstätten dos contornos de grão de uma liga de
Ti-6Al-4V em imagens obtidas com (a) microscopia ótica e (b) microscopia eletrônica de
transmissão [19]........................................................................................................................29
Figura 2.7: Diagrama de fases Ti – N [23]..............................................................................30
Figura 2.8: Parâmetros de rede da fase TiN
x
[24]....................................................................31
Figura 2.9: Distribuição em profundidade do alcance de íons, energia entregue para recuo e
vacâncias geradas pela irradiação de íons de nitrogênio com energias de 50 e 500 eV em dire-
ção a um substrato de Ti-6Al-4V..............................................................................................34
Figura 2.10: Modelo do mecanismo de nitretação iônica por corrente-contínua.
Adaptado de [10]. ....................................................................................................................35
Figura 3.1: Diagrama esquemático do sistema de nitretação: (a) vista frontal; (b) vista inter-
na; (c) conexões do anel da câmara...........................................................................................39
Figura 3.2: Fotografia do sistema de nitretação. (a) Reator com equipamentos anexados: 1)
válvula de bombeamento, 2) medidores de pressão, 3) controladores de fluxo e misturador de
gases, 4) janela; (b) Sistema completo: 5) fonte DC, 6) leitores de pressão, 7) leitor e controla-
dor de fluxo, 8) leitor de temperatura, 9) fonte RF, 10) conexão com os cilindros de gases....40
Figura 3.3: Simulação das linhas equipotenciais com densidade de carga nula. (a) Amostra
sobre o porta-amostra; (b) Amostra nivelada com o porta-amostra..........................................41
Figura 3.4: Simulação das linhas equipotenciais com densidade de carga nula. (a) Sem a pla-
ca paralela; (b) Com uma placa paralela ao porta-amostra.......................................................42
Figura 3.5: Simulação das linhas equipotenciais com densidade de carga nula na sua configu-
ração final com a adição do Shield............................................................................................42
Figura 3.6: Arranjo da amostra, porta-amostra, isolante cerâmico e termopar durante o pro-
cesso de nitretação....................................................................................................................44
Figura 3.7: Ilustração do processo de reação nuclear..............................................................47
Figura 3.8: Ocorrência da reação nuclear em profundidades diferentes na amostra, a depender
da energia das partículas incidentes..........................................................................................48
Figura 3.9: Geometria Seemann-Bohlin para difração de raios X...........................................50
Figura 3.10: Fração G
x
para a contribuição da total intensidade difratada para uma espessura
x e para diferentes ângulos de incidência α..............................................................................51
Figura 3.11: Representação esquemática dos processos de interação da radiação incidente
com os modos vibracionais: (a) Espalhamento Rayleigh; (b) e (c) Espalhamento Raman
Stokes; (d) Espalhamento Raman anti-Stokes (e) fluorescência...............................................52
Figura 3.12: Representação da polarização induzida pelo campo incidente nos átomos da
amostra......................................................................................................................................53
6
Figura 3.13: Modos de vibração de uma rede diatômica linear. (a) Bandas ópticas; (b) Bandas
acústicas. ..................................................................................................................................55
Figura 4.1: Perfis de concentração das amostras nitretadas utilizando uma mistura gasosa
contendo 80% de nitrogênio e 20% de hidrogênio e temperaturas de 500, 600 e 700 ºC........58
Figura 4.2: Perfis de concentração das amostras nitretadas utilizando uma mistura gasosa
contendo 60% de nitrogênio e 40% de hidrogênio e temperaturas de 500, 600 e 700 ºC........59
Figura 4.3: Perfis de concentração das amostras nitretadas utilizando uma mistura gasosa
contendo 50% de nitrogênio e 50% de hidrogênio e temperaturas de 500, 600 e 700 ºC........60
Figura 4.4: Perfis de concentração das amostras nitretadas utilizando uma mistura gasosa
contendo 40% de nitrogênio e 60% de hidrogênio e temperaturas de 500, 600 e 700 ºC........61
Figura 4.5: Perfis de concentração das amostras nitretadas utilizando uma mistura gasosa
contendo 20% de nitrogênio e 80% de hidrogênio e temperaturas de 500, 600 e 700 ºC........62
Figura 4.6: Difratograma da liga Ti-6Al-4V, obtido por difração em ângulo rasante com
α = 2º.........................................................................................................................................64
Figura 4.7: Padrões de difração em ângulo rasante da amostra nitretada a 700 ºC em 80% N2
+ 20% H2, com ângulos de incidência 0,5º, 1º, 2º, 4º e 6º. Os picos correspondentes aos pla-
nos (hkl) das diferentes fases estão indicados...........................................................................65
Figura 4.8: Padrões de difração em ângulo rasante da amostra nitretada a 600 ºC em 80% N
2
+ 20% H
2
, com ângulos de incidência 0,5º, 1º, 2º, 4º e 6º.........................................................66
Figura 4.9: (a) Padrões de difração para a amostra nitretada a 500 ºC. (b) Os mesmos padrões
com o eixo vertical em escala logarítmica. Os ângulos de incidência estão indicados............67
Figura 4.10: (a) Histogramas das intensidades dos picos δ-TiN (200) e ε-Ti
2
N (111) das
amostras nitretadas a 700 ºC em função da concentração de nitrogênio na atmosfera de nitre-
tação. (b) Soma das intensidades dos picos. ............................................................................68
Figura 4.11: (a) Histogramas das intensidades dos picos δ-TiN (200) e ε-Ti
2
N (111) das
amostras nitretadas a 600 ºC em função da concentração de nitrogênio na atmosfera de nitre-
tação. (b) Soma das intensidades dos picos..............................................................................68
Figura 4.12: Espectro Raman das amostras nitretadas na atmosfera com 80% N
2
, nas tempe-
raturas de 500, 600 e 700ºC . A indexação remete-se aos modos de vibração existentes........70
Figura 4.13: Identificação do background existente nos espectros obtidos............................71
Figura 4.14: Separação e identificação das bandas do espectro Raman com subtração do bac-
kground.....................................................................................................................................72
Figura 4.15: Variação das razões das áreas dos picos em função da temperatura de nitretação.
...................................................................................................................................................72
Figura 4.16: Variação das razões das áreas dos picos em função atmosfera de nitretação.....73
Figura 5.1: (a) Padrão de difração em ângulo rasante igual a 0,5º;(b ) Perfil de nitrogênio.. .76
Figura 5.2: Variação da estequiometria da fase TiN
x
com os parâmetros de nitretação.........78
Figura 5.3: Variação da concentração de nitrogênio da fase ε-Ti
2
N com o percentual de nitro-
gênio na atmosfera nitretante....................................................................................................79
Figura 5.4: Micrografias obtidas no sistema FIB. (a) uma imagem no modo de elétrons se-
cundários mostrando a região do recorte efetuado com o feixe de íons. (b) uma imagem obtida
com o feixe de íons indicando, em detalhe, a camada nitretada com espessura maior que 2 mi-
crômetros e a estrutura de grãos sob esta camada.....................................................................80
Figura 5.5: Histogramas das intensidades dos picos δ-TiN (200) e ε-Ti
2
N (111) das amostras
nitretadas a 700 ºC em função da concentração de nitrogênio na atmosfera de nitretação......81
Figura 5.6: Histogramas das intensidades dos picos δ-TiN (200) e ε-Ti
2
N (111) das amostras
nitretadas a 600 ºC em função da concentração de nitrogênio na atmosfera de nitretação......82
7
Figura 5.7: Variação da tensão (a) e da corrente (b) de descarga em resposta à concentração
de nitrogênio da atmosfera de nitretação..................................................................................83
Figura 5.8: Dependência dos tamanhos de grão para as fases δ-TiN
x
e ε-Ti
2
N com a condição
de nitretação..............................................................................................................................84
Figura 5.9: Variação da razão das áreas das bandas óptica e acústica com a estequiometria do
nitreto de titânio........................................................................................................................85
Figura 5.10: Variação da estequiometria da fase TiN
x
com os parâmetros de nitretação. (a)
cópia da figura 5.2; (b) cópia da figura 5.2 com a correção efetuada.......................................86
Figura 5.11: Dependência da largura do pico referente à banda TO com a estequiometria da
fase δ-TiN
x
................................................................................................................................87
8
Lista de Tabelas
Tabela 2.1: Valores das propriedades físicas do titânio comercialmente puro [13]................25
Tabela 2.2: Valores das propriedades mecânicas do titânio comercialmente puro [16]..........25
Tabela 2.3: Valores das propriedades físicas e mecânicas da liga Ti-6Al-4V [16,20]............29
Tabela 2.4: Valores das propriedades físicas e mecânicas do TiN [16]..................................32
Tabela 3.1: Composição química da amostra Ti-6Al-4V ELI (% em massa).........................43
Tabela 3.2: Parâmetros de nitretações das amostras................................................................46
9
Resumo
A nitretação a plasma é um processo de tratamento superficial extensivamente usado
para promover melhoria de propriedades física e mecânica de metais, tais como sua dureza,
resistência ao desgaste e à corrosão, que são necessárias em determinadas condições de uso
mais severo. Neste trabalho foi inicialmente desenvolvido um sistema de nitretação funcional,
com possibilidade de ajuste de diversos parâmetros influentes do processo, como temperatura,
pressão, composição e fluxo da atmosfera nitretante e parâmetros elétricos. Utilizou-se esse
sistema para nitretar amostras de Ti-6Al-4V em três temperaturas (500, 600 e 700 ºC) e cinco
misturas (80, 60, 50, 40, 20 Vol%N
2
com balanço de N
2
).
Empregando as técnicas de reação nuclear e difração de raios X em ângulo rasante,
obtivemos informações sobre a influência da temperatura e composição da mistura na forma-
ção das fases bem como suas estequiometrias e as espessuras dos filmes. Adicionalmente, fo-
ram adquiridos espectros Raman das amostras e então comparada às intensidades relativas en-
tre os picos ópticos e acústicos com a composição obtida por NRA. Procedimento semelhante
foi realizado tomando em conta a largura dos picos, resultando numa proposta de análise se-
mi-quantitativa da estequiometria da fase δ-TiN
x
via espectro Raman.
10
Abstract
Plasma nitriding is a surface treatment widely used to improve physical and mechanic-
al properties of metals, such as hardness, wear resistance, and corrosion resistance that are ne-
cessary under conditions of severe use. In this work a nitriding system was built that allowed
the setting of various process-parameters, such as voltage, current, temperature, pressure, flow
and composition of the nitriding atmosphere. Ti-6Al-4V samples were nitrided in different
treatment conditions and characterized with several analytical techniques. .
Nuclear Reaction Analysis (NRA) and Grazing Incidence X-Ray Diffraction (GIXRD)
gave information about the influence of deposition parameters on the formation of phases,
their stoichiometry, and film thickness. In addition, Raman spectra of the samples were ac-
quired and the intensity ratio between the optical and acoustic peaks was compared with the
composition obtained by NRA. Also the width of the peaks was compared with the deviation
from stoichiometry, resulting in a proposal for semi-quantitative analysis of the δ-TiN
x
phase
via width of Raman spectrum peaks.
11
Capítulo 1
Introdução
12
1 - Introdução
Os materiais metálicos sempre foram, e continuam sendo, extensamente empregados
nos mais diversos ramos da sociedade. Entretanto, uma preocupação se quanto a sua dura-
bilidade, especialmente em situações em que esforços severos são presentes. Sua incompatibi-
lidade com o meio pode comprometer sua sua vida útil, resultando em prejuízos econômicos
e até mesmo humano.
A degradação dos materiais depende, principalmente, do tipo de interação que existe
entre a fase presente em sua superfície e o ambiente em que se encontra, resultando em des-
gaste por abrasão, adesão, erosão, corrosão e desgaste térmico. É possível controlar o compor-
tamento do material frente a esses efeitos alterando-se algumas de suas propriedades superfi-
ciais, como a energia de superfície, morfologia, composição e dureza. As modificações po-
dem ser alcançadas por técnicas de tratamento térmico, recobrimento (PVD e CVD), implan-
tação de íons e tratamentos termoquímicos como por exemplo a nitretação a plasma.
A técnica de nitretação a plasma foi desenvolvida na Alemanha e nos Estados Unidos
na década de 30 e teve seu uso comercial iniciado nas décadas de 60. Atualmente, o uso deste
tratamento termoquímico esta bem sedimentado na indústria e sua opção se deve principal-
mente por ser um processo não poluente, requerer menores temperatura para a nitretação, ser
mais rápido e despassivar superfícies oxidadas. . Além disso, e ao contrário de outros métodos
de nitretação convencionais como a nitretação gasosa e banho de sais, vários parâmetros po-
dem ser regulados (temperatura, pressão, composição do gás, fluxo, tensão e corrente) de ma-
neira a controlar as fases que serão formadas e a espessura dos recobrimentos.
Neste trabalho, a nitretação a plasma foi utilizada para o recobrimento da liga Ti-6Al-
4V que é a mais importante dentre as ligas de titânio. Por combinar propriedades atrativas
como alta resistência mecânica e baixa densidade, ela tem sido muito utilizada nas indústrias
13
aeronáutica e aeroespacial, particularmente para aplicações que requerem resistência em altas
temperaturas. Essa liga também é usada na construção de próteses ortopédicas e ortodônticas.
O tratamento de nitretação a plasma nessa liga promove uma modificação da camada
superficial, formando, por exemplo, a fase δ-TiN
x
que possui alta dureza e baixo coeficiente
de atrito, o que aumenta consequentemente a resistência ao desgaste. Essa camada também
melhora a biocompatibilidade do material, pois esta sofre menores efeitos na presença de flui-
dos corrosivos, o que minimiza a liberação de alumínio no corpo humano, evitando o possível
surgimento de distúrbios de ordem neurológica, como por exemplo o Mal de Alzheimer.
Além das características já citadas, essa fase exibe, a depender da concentração de ele-
mentos intersticiais (nitrogênio), uma ampla faixa de propriedades que também são relevan-
tes em caráter científico e tecnológico, tais como molhabilidade, reflectância, absorbância,
fotocatálise e etc.
Neste contexto, os objetivos desse trabalho são:
Reformar o sistema de nitretação a plasma existente no IF-UFRGS, de maneira
a permitir o rígido controle de um grande quantidade de parâmetros de nitretação para a con-
fecção desses compostos;
Investigada a influência da temperatura do substrato e da composição da at-
mosfera nitretante nas propriedades físico-química do produto final. O intuito principal é veri-
ficar sob que condições se forma a fase estequiométrica δ-TiN, que é particularmente impor-
tante em aplicações tribológicas devido a sua dureza e reduzido coeficiente de atrito.
As técnicas de reação nuclear e difração de raios X em ângulo rasante foram utilizadas
para caracterização das amostras nitretadas, proporcionando a determinação da concentração
de nitrogênio das amostras e a avaliação das espessuras e estruturação das camadas. A espec-
troscopia micro-Raman permite uma rápida verificação da existência do nitreto de titânio e
ainda, por meio de uma análise mais detalhada do espectro, é possível avaliar de maneira se-
mi-quantitativa a estequiometria da amostra nitretada.
O texto está organizado da seguinte maneira: O capítulo 2 apresenta uma revisão bi-
bliográfica do processo de nitretação a plasma, detalha os aspectos da metalurgia do titânio e
da classificação de suas ligas, dando atenção especial à liga Ti-6Al-4V. As propriedades físi-
cas da fase de nitreto de titânio também são revisadas.
14
O capítulo 3 está dividido em duas partes. A primeira descreve o sistema de nitretação
desenvolvido, detalhando a implementação da refrigeração do reator, instalação dos sensores
de pressão e temperatura, instalação e calibração do misturador de gases, do ajuste de fluxo,
do sistema de bombeamento mecânico e fontes de tensão DC e RF. A segunda parte descreve
os procedimentos experimentais adotados em todo o processo para a nitretação de amostras de
Ti-6Al-4V sob diversas misturas N
2
/H
2
, em temperaturas de 500, 600 e 700 ºC e à pressão
constante. Algumas condições foram repetidas para certificar a reprodutibilidade do processo.
A apresentação e revisão dos conceitos das técnicas de análise utilizadas na caracterização das
amostras também são apresentadas neste capítulo.
Os principais resultados obtidos com a utilização das técnicas de reação nuclear, difra-
ção de raios X e espectroscopia micro Raman são apresentados no capítulo 4. A análise e dis-
cussão dos dados estão no capítulo 5 e as conclusões são apresentadas no capítulo 6.
15
Capítulo 2
Revisão Bibliográfica
16
2 - Revisão Bibliográfica
Como salientado no capítulo introdutório, a primeira parte deste trabalho remete-se ao
desenvolvimento de um sistema de nitretação a plasma com capacidade de controlar vários
parâmetros experimentais durante o processo, tais como fluxo de gases, concentração da mis-
tura de gases, temperatura da amostra, pressão estática e dinâmica na câmera e tipo de fonte
usada (DC ou RF). Para atingir este objetivo, foi necessário estudar os fenômenos físicos rela-
cionados ao processo de nitretação, como a natureza do plasma gerado e sua influência na su-
perfície de diferentes materiais. Este é o tema da primeira parte da presente revisão. Na se-
quência, são revisadas as características da liga Ti-6Al-4V, substrato escolhido para investigar
o efeito da composição do gás nas características da camada nitretada.
2.1 – Nitretação a Plasma
A nitretação a plasma, também chamada de nitretação iônica ou nitretação por descar-
ga luminescente, apresenta muitas vantagens quando comparada com processos convencio-
nais de nitretação, em que o endurecimento superficial é alcançado por imersão das peças em
banhos de sais fundidos ou em atmosferas de amônia em altas temperaturas. Os tempos de ni-
tretação são menores do que naquele processo e não são gerados produtos poluentes o que im-
plica menores custos ambientais. Na nitretação a plasma a microestrutura do filme pode ser
controlada com maior precisão. O filme de óxido nativo na superfície do substrato pode ser
removido por um passo inicial de desbastamento iônico induzido pelo plasma (etching), remo-
vendo a barreira de difusão para a incorporação do nitrogênio e aumentando as taxas de nitre-
tação. Na nitretação a plasma é possível utilizar temperaturas de tratamento menores que nos
17
tratamentos convencionais, pois a aplicação de uma diferença de potencial promove a criação
de íons que aumenta a cinética de formação pelo aumento do potencial químico, da reativida-
de das espécies e aumento na geração de defeitos [1].
2.1.1 – O plasma
O termo “plasma” é usado para descrever um volume gasoso eletricamente neutro.
Exibe um comportamento coletivo de longo alcance, mas possui cargas elétricas localizadas
que conduzem correntes elétricas (elétrons livres, íons atômicos ou moléculas ionizadas)
[2,3]. Na média, o plasma é eletricamente neutro, sendo que qualquer desbalanceamento de
carga resulta no surgimento de campos elétricos que tendem a mover as cargas de modo a res-
tabelecer o equilíbrio. Portanto, a densidade de elétrons mais a densidade de íons negativos
deve ser igual à densidade de íons positivos.
Em um sistema fechado contendo um gás em baixa pressão, existe uma fração muito
pequena de íons e elétrons livres. Quando um campo elétrico é aplicado, eles são acelerados e
durante o percurso, podem colidir com outros átomos, ionizando-os e criando novos íons e
elétrons livres num processo em cascata que estabelece um equilíbrio dinâmico característico
de plasma.
Descargas apresentam-se em diferentes regimes, que dependem da intensidade do
campo elétrico [4]. A figura 2.1 ilustra a diferença de potencial entre dois eletrodos em função
da corrente induzida pelo gás.
18
Figura 2.1: Curva característica de Voltagem-Corrente [4].
A região de interesse nesse trabalho para o processo de nitretação é a chamada incan-
descência anômala. Nesse regime, para uma pressão constante, um aumento da tensão aplica-
da produz um aumento na corrente. A densidade de corrente é alta e uniforme em uma grande
área do cátodo, proporcionando a formação eficiente e uniforme de uma camada nitretada [5].
Na incandescência anômala, existe uma sequência de regiões escuras e luminosas que
possuem diferentes distribuições de potencial, densidade de carga e corrente, que são ilustra-
das na figura 2.2 [5].
Figura 2.2: Desenho esquemático indicando as regiões de descarga luminescente em um plas-
ma [5].
19
A luminescência observada próxima ao cátodo é chamada de luminescência catódica.
A cor da luminescência é característica do material do cátodo e surge devido à desexcitação
dos átomos superficiais excitados pelo impacto das espécies do plasma.
Acima dessa luminescência existe um espaço escuro denominado de bainha catódica
que é uma região de baixa concentração de cargas devido ao gradiente de potencial. Nessa re-
gião, os íons são acelerados até o cátodo, que ao atingi-lo, além de provocar o desbastamento
iônico da superfície (sputtering ou etching), implantação e aquecimento, também promove a
emissão de elétrons secundários. Esses elétrons são acelerados na bainha catódica, e nesse
percurso podem chocar-se com átomos neutros presentes nessa região e excitá-los ou ioni-
zá-los (causando aceleração desses para a região do cátodo). Entretanto, como os elétrons se-
cundários ganham bastante energia nessa região, sua secção de choque de ionização é reduzi-
da, o que confere a característica escura desta região.
A grande maioria dos elétrons acelerados na região da bainha catódica alcança a regi-
ão denominada de luminescência negativa. É nessa região onde ocorrem os fenômenos como
transferência de carga, ionizações e excitações e produção de elétrons secundários. Num meio
nitretante (com mistura N
2
/H
2
), as reações mais frequentes na luminescência negativa são
aquelas determinadas pelas colisões elétrons-moléculas [6].
Essas colisões são classificadas como:
i Ionização: Os elétrons mais energéticos (> 15eV), ao colidirem com as moléculas do gás,
provocam a remoção de um elétron desta, produzindo um íon e dois elétrons. Os dois elétrons
formados no processo são acelerados no campo elétrico, adquirindo novamente energia sufici-
ente para causarem novas ionizações (multiplicação de elétrons), promovendo a manutenção
da descarga.
2 2
2 2
2
2
2
x y x y
e N e N
e H e H
e N H e N H
- - +
- - +
- - +
+ ® +
+ ® +
+ ® +
ii Excitação: Se a energia de colisão do elétron for inferior àquela necessária para ioniza-
ção, ocorrerão as seguintes excitações:
*
2 2
*
2 2
*
x y x y
e N e N
e H e H
e N H e N H
- -
- -
- -
+ ® +
+ ® +
+ ® +
20
A relaxação dos estados excitados da eletrosfera é rápida (~10
-8
s) e resulta na emissão
de fótons UV ou visível.]
Essa emissão é responsável pelo brilho do plasma e permite a análise qualitativa das
espécies que compõe o plasma por espectroscopia óptica de emissão (OES).
iii Dissociação: Outra importante reação que ocorre no plasma pela colisão de moléculas
com elétrons energéticos é a dissociação. Dependendo da energia do elétron, poderá haver a
formação de átomos neutros, excitados ou ionizados. Para o caso particular do nitrogênio,
tem-se, por exemplo:
2
*
2
*
2
2
2
e N e N
e N e N N
e N e N N
- -
- -
- - +
+ ® +
+ ® + +
+ ® + +
iv – Recombinação: Quando espécies ionizadas chocam-se com uma superfície, elétrons des-
ta superfície são liberados, neutralizando as espécies pelos seguintes processos de recombina-
ção:
2 2
2 2
x y x y
N e N
H e H
N H e N H
+ -
+ -
+ -
+ ®
+ ®
+ ®
Embora o papel do hidrogênio no processo de nitretação ainda seja pouco compreendi-
do, sabe-se que a cinética do processo é grandemente afetada pela sua presença. Uma das in-
fluências é devida à capacidade do hidrogênio de minimizar as impurezas no plasma (por
exemplo, o oxigênio) [7].
Segundo Branding et al. [8], o surgimento das espécies dominantes em plasma de ni-
trogênio-hidrogênio (NH
+
, NH
2
+
, NH
3
+
e NH
4
+
) frente ao número reduzido das espécies do
plasma de nitrogênio puro (N
+
e N
2
+
) explica esse comportamento, pois a presença do hidrogê-
21
nio diminui a energia necessária para a produção de átomos de nitrogênio via dissociação mo-
lecular por colisão.
Resultados obtidos por Tamaki et al. [9] mostram que camadas mais espessas de nitre-
to de titânio são obtidas em nitretações com misturas de 60%N
2
+ 40%H
2
, que coincidem com
a região de misturas que promovem as máximas emissões das linhas de transição eletrônica
dos radicais NH, corroborando o modelo de Branding. Este autor verificou ainda que houve
um aumento da quantidade de hidrogênio absorvido pela matriz (variando entre 1 e 15 μg/g)
com o incremento da fração desse gás na atmosfera nitretante.
Entretanto, para Walkowicz [10], as espécies de maior importância para o processo de
nitretação são os íons moleculares N
2
+
e a molécula N
2
, que aparecem em maior número em
misturas contendo 75%N
2
+ 25%H
2
.
Um importante conceito associado ao plasma é o chamado “comprimento de Debye”,
λ
D
. Quando um carga elétrica é introduzida num plasma quase-neutro, as espécies carregadas
(principalmente os elétrons devido à sua grande mobilidade) irão se deslocar na tentativa de
neutralizar o campo induzido. Como existe um movimento inerente dessas espécies devido a
energia térmica, tem-se como resultado a formação de uma nuvem de densidade de carga com
dimensão λ
D
(dada pela equação 2.1) em torno da carga intrusa que tenta neutralizá-la.
1/ 2
0
2
B e
D
e
k T
n e
e
l
æ ö
÷
ç
÷
=
ç
÷
ç
÷
ç
è ø
(2.1)
onde:
λ
D
= Comprimento de Debye;
ε
0
= permissividade do vácuo;
e = carga eletrônica;
k
B
= constante de Boltzmann;
n
e
= densidade de elétrons;
T
e
= temperatura do elétron;
Dessa forma, o potencial inicialmente existente é blindado, sofrendo uma atenuação
exponencial, onde o comprimento de Debye é o parâmetro de decaimento característico. Em
outras palavras, o comprimento de Debye é a máxima distância em que um espécime carrega-
do dentro do plasma pode influenciar outro. Seu valor típico, em plasmas de interesse na ni-
tretação iônica é da ordem de 10
-4
m.
Para que haja formação do plasma, é necessário que as dimensões do sistema sejam
muito maiores que o comprimento de Debye [4].
22
2.2 – O Titânio, suas Ligas e o Nitreto
2.2.1 – Aspectos gerais
O titânio é um metal de transição com peso atômico 47,90 e número atômico 22, que é
sólido nas condições normais de temperatura e pressão. Ele é abundante na Terra e tem sido
detectado em meteoritos, na Lua, no Sol e em outras estrelas. Sua concentração na crosta ter-
restre é de cerca de 0,6%, o que o torna o quarto metal mais abundante, depois do alumínio,
ferro e magnésio [11].
Os dois minerais mais comuns que contém titânio são a ilmenita (FeTiO
3
) e o rutilo
(TiO
2
). Os maiores depósitos de rutilo e ilmenita são encontrados em areias de praias, onde
devido à erosão e a intemperização ocorreu a lixiviação dos outros elementos, resultando em
concentrações elevadas destes minerais. A ilmenita ocorre em rochas ígneas e suas maiores
reservas encontram-se na China, Austrália, Índia e África do Sul, enquanto as maiores reser-
vas de rutilo estão localizadas na Austrália, África do Sul, Índia e Serra Leoa [12].
O titânio e suas ligas possuem baixa densidade (60% da densidade do aço), baixo -
dulo de elasticidade (55% do aço) e alta razão resistência-peso, alta tenacidade, boa resistên-
cia à corrosão e boa biocompatibilidade. Essas propriedades fazem do titânio um material tec-
nologicamente muito atrativo sendo considerado um dos mais importantes metais não ferrosos
[13].
Suas características físico-químicas lhe permitem formar uma variedade de ligas com
diferentes tipos de metais (por exemplo, Fe, Al, V, Mo e outros) produzindo ligas de baixa
densidade e alta resistência, úteis na indústrias aeroespacial, química, automotiva e a área bio-
médica. Entre as aplicações mais comuns destacam-se: componentes de aeronaves e de moto-
res, parafusos, próteses de quadril e joelho, placas, arames e instrumentos cirúrgicos [14]. As
propriedades que propiciam as diversas aplicações estão sintetizadas na figura 2.3.
23
Figura 2.3: Características gerais e aplicações do titânio e suas ligas [13].
2.2.2 – Estrutura, propriedades físicas e mecânicas do titânio
O titânio tem dois polimorfos. Em temperatura ambiente, o titânio puro possui uma es-
trutura hexagonal compacta (hcp) denominada fase α. Em 883 ºC (β-transus) transforma-se
em uma estrutura cúbica de corpo centrado (bcc) conhecida como fase β (ver figura 2.4). A
fase β pode ser estabilizada em temperatura ambiente através da adição de elementos de liga e
de processos termoquímicos. Sua coexistência com a fase α é a base para o desenvolvimento
de uma grande quantidade de ligas e propriedades [15].
24
Figura 2.4: Estrutura cristalina do titânio: (a) fase α (hcp) e (b) fase β (bcc) [13]
Na tabela 2.1 constam os valores de algumas propriedades físicas e mecânicas do Ti
comercialmente puro [13].
Tabela 2.1: Valores das propriedades físicas do titânio comercialmente puro [13].
Propriedades Valor Unidade
Número atômico 22
Peso atômico 47,9 u.m.a.
Estrutura cristalina
α-hcp
β-bcc
c=4,6831 a=2,9504
a=3,28
Å
Å
α - β transus
882
0
C
Densidade (fase α)
4,54 g/cm
3
Condutividade térmica (fase α)
20 W.m
-1
K
-1
Calor específico (fase α)
523 J.Kg
-1
.K
-1
Ponto de fusão 1668
0
C
Ponto de ebulição 3260
0
C
Resistividade elétrica 55
μ-cm
A tabela 2.2 mostra alguns valores das propriedades mecânicas do titânio comercial-
mente puro em CNTP.
Tabela 2.2: Valores das propriedades mecânicas do titânio comercialmente puro [16].
Propriedades Valor Unidade
Resistência de ruptura em tração 241,24 MPa
Resistência à compressão 137,86 MPa
Módulo de elasticidade 116 GPa
Módulo de cisalhamento 41,0 GPa
Dureza (Vickers) 60 kg/mm
2
25
2.2.3 – Classificação das ligas de titânio
A estrutura eletrônica do titânio possui uma camada eletrônica incompleta (1s
2
, 2s
2
,
2p
6
, 3s
2
, 3p
6
, 4s
2
, 3d
2
) o que lhe proporciona uma grande afinidade com os elementos hidrogê-
nio, carbono, nitrogênio e oxigênio, todos formadores de soluções sólidas intersticiais [13].
A adição de elementos de liga e a realização de processos termoquímicos permitem o
desenvolvimento de grande diversidade de ligas, alterando a microestrutura e melhorando di-
versas propriedades, tais como tenacidade, resistência à fratura, resistência à fadiga, resistên-
cia à fluência em alta temperatura, resistência mecânica, estabilidade estrutural e dimensional
e ductilidade. A inserção desses elementos altera a temperatura de transição da fase α para β
(β-transus), e dependendo do caso, permite a coexistência das duas fases em uma ampla faixa
de temperatura [13].
A estabilidade das fases α ou β depende do número de elétrons por átomo (elétrons de
valência) do elemento de liga. Elementos com menos de 4 estabilizam a fase α (aumentam a
temperatura do β-transus) e elementos com 4 ou mais são β-estabilizantes (diminuem a tem-
peratura de transição entre as fases).
As ligas de titânio são classificadas de acordo com a estrutura cristalina de suas fases
como: ligas α, β, α+β, quase-α e β metaestáveis, assim definidas:
Ligas α: Solução sólida obtida a partir da adição de estabilizadores α, (por exemplo, Ga e
Sn). Possuem boas propriedades em alta temperatura (como resistência à fluência), mas sua
microestrutura não pode ser modificada através de tratamento térmico. Possuem boa soldabili-
dade e baixa forjabilidade.
Ligas β: compostas por cerca de 30% em massa de estabilizadores β (V, Fe, Al, Cr, etc.), re-
sultando na retenção da fase β em temperatura ambiente. Elas se assemelham a metais refratá-
rios em sua alta densidade e baixa ductibilidade. Possuem grande resistência em alta tempera-
tura e à corrosão. São exemplos dessa classe as ligas Ti-10V-2Fe-3Al, Ti-15V-3Cr-3Al-2Sn e
Ti-11,5V-2Al-11Zr.
26
Ligas α+β: contêm um ou mais elementos estabilizadores da fase α e da fase β, ampliando
significativamente, o campo de estabilidade da estrutura α + β, até a temperatura ambiente. As
propriedades destas ligas podem ser controladas por tratamento térmico, que é usado para
ajustar as quantidades e tipos da fase β presentes. Nesta classe, a liga mais utilizada, e que
será detalhadamente discutida, é a liga Ti-6Al-4V.
Ligas quase α: contêm elementos estabilizadores da fase α e pequenos teores (1 a 2%) de es-
tabilizadores da fase β (Ti-8Al-1Mo-1V e Ti-6Al-2Nb-1Ta-0,8Mo, por exemplo). Pode-se es-
tabelecer nessas ligas um bom compromisso entre a alta resistência das ligas α + β e a resis-
tência à deformação das ligas α.
Ligas β metaestáveis: contêm estabilizantes β com concentração em massa em torno de 10 a
15%. A fase β é retida em temperatura ambiente em condição metaestável. Possui excelente
forjabilidade, tenacidade, capacidade de endurecimento em uma grande faixa de temperatura.
Sua alta densidade e baixa resistência a deformação são algumas de suas desvantagens com
relação as ligas β.
2.2.4 – A liga Ti-6Al-4V ou “TiVAl”
A liga Ti-6Al-4V é uma das ligas α + β de titânio mais utilizadas. Contém 6% de Al e
4% V, estabilizadores α e β respectivamente, que resultam em uma combinação excelente de
dureza e resistência à corrosão. Esta liga vem se destacando em aplicações em diversas áreas
como indústrias aeroespaciais, para a produção de vasos de pressão, implantes cirúrgicos, etc.
[17,18].
A liga Ti-6Al-4V apresenta-se totalmente na fase β para temperaturas acima de 995
ºC. Conforme a temperatura diminui e entra na região de coexistência entre as duas fases,
ocorre uma transformação gradual de fase β α com conversão da estrutura bcc para hcp e a
relação das orientações cristalográficas são tais que os planos basais da fase α crescem parale-
los aos planos diagonais da fase β e a normal dos planos prismáticos da fase α crescem parale-
los às fases normais dos planos {111}[13]. Um cristal bcc pode transformar-se em 12 (doze)
variantes hexagonais, tendo diferentes orientações com relação à orientação da fase β inicial
[18]. Isso resulta no crescimento de uma estrutura lamelar conhecida como padrão de Wid-
manstätten, mostrado na figura 2.5, usando uma seção do diagrama de fases Ti-Al-V com 6 %
em massa de Al. A linha vertical representa o processo de formação da fase α quando o res-
27
friamento é feito a partir da fase β, a uma concentração constante de 4 % em massa de V [15].
As figuras à direita correspondem às texturas existentes em diferentes temperaturas.
Figura 2.5: Diagrama de fases da liga Ti-6Al-V ilustrando a formação do padrão de Wid-
manstätten [15].
Observa-se que abaixo da temperatura β transus, a fase α começa a se formar com sua
estrutura lamelar, formando ângulos próximos a 90º com os contornos de grão.
A Figura 2.6 apresenta imagens obtidas por microscopia óptica (MO) e eletrônica de
transmissão (MET) da liga Ti-6Al-4V, ilustrando a sua microestrutura [19]. Observa-se a pre-
sença do padrão de Widmanstätten formado a partir dos contornos de grão.
28
(b)(a)
Figura 2.6: O padrão de Widmanstätten dos contornos de grão de uma liga de
Ti-6Al-4V em imagens obtidas com (a) microscopia ótica e (b) microscopia eletrônica de
transmissão [19].
Os valores para algumas propriedades físicas e mecânicas da liga Ti-6Al-4V estão lis-
tados na tabela 2.3 [16].
Tabela 2.3: Valores das propriedades físicas e mecânicas da liga Ti-6Al-4V [16,20].
Propriedades Valor Unidade
Densidade 4,43 g/cm
3
Calor específico 526,3 J.Kg
-1
.K
-1
Condutividade térmica 6,7 W.m
-1
.K
-1
Ponto de fusão 1604 ºC
Ponto de ebulição 1660 ºC
Resistividade elétrica 178
μΩ.cm
Dureza(Vickers) 341 kg/mm
2
Módulo de elasticidade 113,8 GPa
Módulo de cisalhamento 44,0 GPa
Resistência de ruptura em tração 950 MPa
Comparando-se as propriedades do titânio (tabela 2.1 e 2.2) com as da liga, pode-se
observar que a dureza da liga é quase 4 vezes maior que a do titânio puro, possui melhores va-
lores de resistência mecânica e módulo de elasticidade, ampliando sua aplicabilidade como
por exemplo, na área biomédica (a presença do alumínio é limitante), onde a durabilidade de
próteses ortopédicas justifica o custo da produção da liga.
Em temperatura ambiente, forma-se sobre o titânio e suas ligas, um filme de dióxido
de titânio (TiO
2
), uma camada de passivação que serve como proteção contra corrosão em
meios aquosos.
A biocompatibilidade de um material utilizado em implantes protéticos está relaciona-
da com sua taxa de corrosão e com a solubilidade dos produtos de corrosão formados. A ca-
mada de passivação aumenta a biocompatibilidade das ligas de titânio, pois evita a lixiviação
de íons para a corrente sanguínea. O titânio tem pouca resistência ao desgaste, o que pode ser
atribuído à sua natureza reativa e aos sistemas de deslizamento de metais hcp [21]. A presença
do filme de TiO
2
melhora a resistência ao desgaste, pela passivação da superfície. Porém a
fragilidade desse filme protetor torna esses materiais inadequados para aplicações sob condi-
ções mais severas. Para ampliar o espectro de aplicações da liga Ti-6Al-4V é necessária a pro-
29
dução de um filme que substitua o dióxido de titânio, que funcione como uma barreira de di-
fusão, possua grande dureza, grande resistência ao desgaste e que tenha ótima aderência ao
substrato. O nitreto de titânio, como se verá a seguir, é um forte candidato para cumprir este
papel.
2.2.5 – Nitreto de titânio
Os nitretos fazem parte do grupo de materiais refratários que têm pontos de fusão ex-
tremamente altos (2000-4000 ºC) [22]. Apresentam alta dureza e têm sido cada vez mais usa-
dos devido a suas propriedades elétricas, que incluem a existência de compostos supercondu-
tores.
Como o titânio pertence à família IV-B da tabela periódica, o nitreto de titânio perten-
ce ao quarto grupo de nitretos. Suas fases mais conhecidas são a fase δ-TiN
X
que possui uma
estrutura cúbica de face centrada e a fase ε-Ti
2
N com estrutura tetragonal, mostradas no dia-
grama de fases na figura 2.7 [23].
Figura 2.7: Diagrama de fases Ti – N [23]
Os nitretos de titânio em temperatura ambiente possuem uma ampla faixa de composi-
ção, indo de 33 at.%N (TiN
0,43
) a valores superiores a 52 at.%N (TiN
1,08
). A figura 2.8 [24]
30
mostra a variação do parâmetro de rede com a composição para o TiN. O parâmetro de rede
atinge seu valor máximo próximo à composição estequiométrica.
Figura 2.8: Parâmetros de rede da fase TiN
X
[24].
Estudos de densidade em função do parâmetro de rede mostram que teores sub-este-
quiométricos de nitrogênio provocam vacâncias na sub-rede do nitrogênio e teores supereste-
quiométricos de nitrogênio provocam vacâncias na sub-rede do Ti. E mesmo na composição
estequiométrica, o TiN possui uma grande fração de sítios vazios em ambas sub-redes, metáli-
ca e não metálica [24].
Roquiny et al. [25] investigaram a importância da estequiometria e estrutura do nitreto
de titânio no aspecto visual dos revestimentos e verificou que sua cor depende da estequiome-
tria, variando desde o cinza metálico até o marrom-avermelhado, passando pelo dourado em
condições estequiométricas.
A fase ε-Ti
2
N existe isoladamente apenas numa faixa estreita de composição de cerca
de 33 at.%, e só existe para temperaturas abaixo de aproximadamente 1000 ºC, o que implica
na impossibilidade da criação dessa fase em processos cuja temperatura de trabalho seja muito
alta. Os parâmetros da rede tetragonal do Ti
2
N são a=b= 4,9452Å e c= 3,0342Å.
Pode-se observar na tabela 2.4 [16] que as características mecânicas do δ-TiN são
muito superiores às do titânio e da liga Ti-6Al-4V. Tal composto possui uma resistividade
muito baixa e também funciona como barreira de difusão.
31
Tabela 2.4: Valores das propriedades físicas e mecânicas do TiN [16].
Propriedades Valor Unidade
Densidade 5,22 g/cm
3
Condutividade térmica 19,0 W.m
-1
.K
-1
Ponto de fusão 2930 ºC
Resistividade elétrica 25
μΩ.cm
Dureza (Vickers) 2300 kg/mm
2
Módulo de elasticidade 600 GPa
Uma vez que os nitretos de titânio são materiais duros, biocompatíveis [26, 27, 28] e
de excelente resistência a abrasão, muitos métodos avançados de processamento tem sido de-
senvolvidos com a finalidade de produzir uma camada nitretada na superfície dos materiais.
Revestimentos a base de nitreto de titânio tem sido usados numa variedade de implan-
tes ortopédicos de ligas de Cr-Mo ou Ti-6Al-4V para próteses de quadril, joelho, ombro e tor-
nozelo [29]. Uma outra aplicação é o revestimento em instrumentos cirúrgicos tais como li-
mas e tesouras [26].
O nitreto de titânio vem sendo empregado em diversos segmentos por causa de sua
alta dureza e resistência à corrosão. Entretanto, essas propriedades são dependentes da con-
centração de nitrogênio no composto, atingindo os melhores desempenhos em testes de dureza
e corrosão quando ocorre a condição estequiométrica da fase δ-TiN [30,31].
2.2.6 – O processo de nitretação
Walkowicz [10] divide o processo de nitretação de um substrato em quatro etapas: i)
geração do plasma; ii) transporte de nitrogênio do plasma para a superfície do substrato; iii)
interação do material do plasma com o material do substrato e iv) criação de um gradiente de
concentração na subsuperfície do substrato respondendo pela difusão deste elemento para o
interior da amostra. Nesse trabalho adotou-se o modelo de Walkowicz, originalmente propos-
to para nitretação em ferro, para o caso do substrato de Ti-6Al-4V.
Na primeira etapa, as principais espécies no plasma são N
2
+
, N
2
, N e N
+
sendo que os
dois últimos são encontrados em menor quantidade. A quantidade observada de íons molecu-
lares é de duas a três ordens de grandeza maior do que a de íons atômicos [10].
32
Na segunda etapa, íons de N
2
+
dominam o transporte de nitrogênio para a superfície do
substrato, acelerados pela diferença de potencial aplicada ao sistema. Colisões com as dife-
rentes espécies reduzem a velocidade final das moléculas de nitrogênio até atingirem a super-
fície do substrato, permitindo que elas adsorvam na superfície. Quast [32] mostrou que esta
redução de energia é menos acentuada para íons atômicos. Íons moleculares apresentam uma
distribuição de energia com valor médio na faixa de 50 a 90 eV enquanto que a distribuição
de energia de íons atômicos apresenta um comportamento contínuo, com valores que variam
de 100 a 600 eV (a máxima diferença de potencial entre cátodo e anodo).
A terceira etapa consiste na interação dos íons e átomos do plasma com a superfície do
material. A energia cinética e a reatividade entre as diferentes espécies regulam esta interação.
A componente de energia cinética é responsável pela implantação de íons, desbastamento de
material e geração de defeitos no substrato.
Utilizando simulações de interação de íons com a matéria [SRIM], podemos ter uma
estimativa da ordem de grandeza dos diferentes fenômenos. Estão indicadas, na figura 2.9, a
distribuição em profundidade de íons implantados (alcance), da energia entregue para eventos
de recúo e o número de vacâncias geradas no substrato.
Os gráficos mostram importantes diferenças entre íons N
2
+
e N
+
. Íons moleculares tem
alcance médio de 7 nm enquanto íons atômicos alcançam 22 nm. A quantidade de energia de-
positada para os íons moleculares é maior do que a depositada por íons atômicos e a quantida-
de de vacâncias induzidas por estas últimas espécies é maior e se distribui por profundidades
de até 50 nm. Considerando a grande quantidade das várias espécies que atingem a superfície
a cada segundo, os resultados sugerem que o fenômeno de adsorção química (controlada por
íons atômicos) tem uma contribuição muito maior do que o de adsorção física (controlada por
íons moleculares).
A profundidade em que os íons são implantados e onde são geradas as vacâncias indi-
cam que os processos de reação ocorrem dentro da estrutura cristalina do sistema Ti-6Al-4V.
33
Figura 2.9: Distribuição em profundidade do alcance de íons, energia entregue para recuo e
vacâncias geradas pela irradiação de íons de nitrogênio com energias de 50 e 500 eV em dire-
ção a um substrato de Ti-6Al-4V.
A reação preferencial de nitrogênio com titânio pode ser atribuída à maior reatividade
entre estes elementos, quando vacâncias próximas ao titânio forem ocupadas por nitrogênio,
ou quando ocorre a introdução de nitrogênio intersticial na rede do α-Ti.
A figura 2.10 apresenta um diagrama esquemático proposto por Walkowicz [10] indi-
cando as quatro etapas descritas acima.
34
Figura 2.10: Modelo do mecanismo de nitretação iônica por corrente-contínua.
Adaptado de [10].
Mas algumas questões permanecem em aberto, por exemplo a difusão do alumínio e
vanádio para o interior da amostra (contra o gradiente de concentração), o papel do hidrogênio
no plasma, na superfície da amostra e na estrutura do substrato e as fases que se formam na
superfície em função das condições de nitretação. Para investigar alguns destes itens, foi utili-
zado o sistema de nitretação construído e descrito no capítulo 3, que permite o controle de -
rios parâmetros.
35
Capítulo 3
Materiais e Métodos
36
3 – Materiais e Métodos
Neste capítulo será apresentado o sistema de nitretação construído neste trabalho com
detalhamento de suas características. Também é apresentado uma descrição das amostras uti-
lizadas e o roteiro de trabalho adotado para o processo de nitretação. Uma breve revisão das
técnicas de análise utilizadas é também exposta neste capítulo.
3.1 Descrição da Câmara de Nitretação
Nos processos de tratamento a plasma, tais como nitretação ou carbonitretação, se bus-
ca a incorporação das espécies existentes na região da descarga luminescente na superfície da
peça sob tratamento. Observa-se que as características físico-químicas da camada dependem
dos parâmetros do processo de nitretação, tais como:
pressão, composição da atmosfera e fluxo do gás no interior da câmara de proces-
samento;
temperatura da amostra durante o processo;
tipo de fonte utilizada para manter o plasma (DC, pulsado, RF, etc), valor da ten-
são e densidade de corrente entre os eletrodos;
tempo de tratamento das amostras;
geometria da amostra, e
geometria dos eletrodos
37
Levando-se em conta estas dependências, foi construído, um sistema de nitretação a
plasma que permitisse o controle destes parâmetros. Foram utilizadas uma fonte DC e eletro-
dos planares justapostos para nitretação de amostras cilíndricas. O sistema foi planejado para
incorporar modificações na geometria dos eletrodos e prevê a utilização de fonte RF (rádio
frequência). Deve-se ter em mente que muitos parâmetros são mutuamente dependentes, não
sendo possível ajustá-los independentemente.
O sistema de nitretação consiste de uma câmara hermética que permite o estabeleci-
mento de atmosferas de diferentes composições, através de controladores de fluxo ligados a
diferentes gases. No interior da câmara um conjunto de eletrodos ligados a uma fonte regulá-
vel de alta tensão (DC) permitem o estabelecimento de um plasma reativo. A amostra fica
imersa nesse plasma.
A câmara cilíndrica com paredes de alumínio consiste de duas partes; um anel (medin-
do 6 cm de altura e 20 cm de diâmetro) refrigerado com água, em que estão localizados todos
os passadores, válvulas, etc. que sejam sensíveis à alta temperatura, e o corpo (um cilindro
com 30 cm de altura e 20 cm de diâmetro) no interior do qual fica o eletrodo superior (cátodo)
e o plasma, que pode ser visualizado por janelas localizadas na parede do cilindro. A câmara
completa comporta um volume de aproximadamente 11 litros.
A câmara está ligada a uma bomba de vácuo do tipo mecânica, marca Alcatel, modelo
2015 Pascal. O valor da pressão no interior da câmara é medido utilizando-se um sensor de
pressão tipo pirani da marca Edward. A pressão de base no sistema é de 2x10
-2
Torr.
Existem quatro entradas para gases na câmara, sendo duas de alto fluxo e duas de bai-
xo fluxo: uma das entradas de alto fluxo, chaveada por válvula magnética, é utilizada para a
execução de “lavagens” com argônio, para facilitar a remoção de água e oxigênio residuais (a
outra não está sendo utilizada). As aberturas de baixo fluxo são utilizadas para a entrada dos
gases de trabalho, e são controladas por dois MFCs (mass flow controller) marca MKS mode-
lo 1179, que permitem ajustar o fluxo em cada um dos canais, propiciando o controle sobre a
razão N
2
/H
2
da atmosfera nitretante. Esses controladores de fluxo foram previamente calibra-
dos por meio de um fluxômetro de bolhas e o valor de fluxo foi ajustado para 20 sccm nas di-
ferentes misturas de gases.
Durante a nitretação a pressão é mantida em regime dinâmico e é medida por um pres-
sostato capacitivo (marca MKS e modelo 722A). A pressão é controlada pelo balanço entre o
fluxo de gás que entra na câmara e o bombeamento reduzido por uma válvula agulha ligada
ao sistema de vácuo.
38
A amostra é aquecida pelo plasma e a temperatura é controlada pelo ajuste da dife-
rença de potencial aplicada entre os eletrodos, não tendo aquecimento adicional. A temperatu-
ra é medida sobre o porta-amostra, com um termopar tipo K (Cromel/Alumel), isolado eletri-
camente por um isolador de sílica. A descarga luminescente pode ser alimentada por uma fon-
te DC de 1 kVA (usada nesse trabalho) ou uma fonte de alta frequência (RF). Um diagrama
do sistema é mostrado na figura 3.1.
Figura 3.1: Diagrama esquemático do sistema de nitretação: (a) vista frontal; (b) vista inter-
na; (c) conexões do anel da câmara.
A figura 3.2 mostra fotografias do sistema em que estão indicados as fontes, os com-
ponentes anexados e os dispositivos eletrônicos que controlam e/ou fazem a leitura dos parâ-
metros de nitretação.
39
Figura 3.2: Fotografia do sistema de nitretação. (a) Reator com equipamentos anexados: 1)
válvula de bombeamento, 2) medidores de pressão, 3) controladores de fluxo e misturador de
gases, 4) janela; (b) Sistema completo: 5) fonte DC, 6) leitores de pressão, 7) leitor e controla-
dor de fluxo, 8) leitor de temperatura, 9) fonte RF, 10) conexão com os cilindros de gases.
Um dos maiores problemas da nitretação a plasma é a obtenção de camadas com ho-
mogeneidade lateral. Bordas e pontas da amostra atuam de maneira a criar campos elétricos
não homogêneos nestas regiões e consequentemente, camadas inomogêneas. Outra dificulda-
de é o isolamento elétrico do eletrodo da base, que também atua como porta amostra. Este iso-
lamento busca impedir a abertura de plasma em regiões diferentes daquela do porta-amostra e
desta forma aumentar a eficiência da nitretação uma vez que são minimizadas as perdas de
energia no sistema. As modificações incorporadas ao sistema para superar estas duas dificul-
dades são descritas a seguir.
Minimização de Bordas e Pontas;
A bainha catódica reveste toda a amostra, direcionando os íons na direção normal à
sua superfície. Entretanto, ao redor de pontas e irregularidades, o campo elétrico apresenta in-
40
(a) (b)
tensidades maiores. Quando o cátodo contém bordas ou pontas finas, o modelo de Watterson
[33] propõe que nas proximidades das bordas, o ângulo de incidência é oblíquo e o fluxo iôni-
co tem um valor máximo pouco afastado da borda. Nas partes planas da amostra, distante da
borda, o fluxo é uniforme e normal à superfície.
Para minimizar o efeito de borda, foi confeccionado um porta amostra com diâmetro
de 5 cm contendo em seu centro um rebaixamento com dimensões adequadas para encaixe da
amostra. Neste orifício a amostra foi inserida, deixando uma fresta menor do que 0,5 mm.
Para ilustrar a influência desse novo porta amostra, foi utilizado um programa de si-
mulação, via método de elementos finitos, para solução de problemas magnéticos, eletrostáti-
cos, fluxo de calor e fluxo de corrente (FEMM 4.2). Para a configuração elétrica presente no
interior da câmara o programa gerou a distribuição de potencial elétrico na região mostrada na
figura 3.3.
Figura 3.3: Simulação das linhas equipotenciais com densidade de carga nula. (a) Amostra
sobre o porta-amostra; (b) Amostra nivelada com o porta-amostra.
Apesar de não terem sido consideradas as diversas regiões que possuem densidade de
carga diferente de zero, pode-se perceber que as linhas equipotenciais em torno da amostra
tenderam a se tornar paralelas à superfície da amostra após a modificação no porta-amostra, o
que proporcionou o direcionamento normal dos íons sobre a amostra. O efeito de borda tende
a se extinguir sobre a amostra aparecendo somente sobre o porta-amostra.
Outro procedimento adotado para buscar maior uniformidade radial da camada nitreta-
da consistiu em aproximar anodo e cátodo, formando um capacitor de placas paralelas, cujas
superfícies equipotenciais são paralelas às placas e onde a densidade de campo é constante. A
simulação das superfícies equipotenciais obtida com o FEMM 4.2 é mostrada na figura 3.4.
41
(b)(a)
Localização de Plasma no Porta Amostra;
Para evitar que ocorra descarga na haste que suporta o porta-amostra, foi adicionada
uma peça cilíndrica oca (shield) em torno do tubo passador de alta tensão que fica em contato
elétrico com a carcaça. A distância radial entre o passador e o cilindro é da ordem de 2 mm,
não muito maior que o comprimento de Debye (λ
D
~ 10
-4
m). Isto impossibilita a abertura de
plasma entre as duas peças e reduz a potência necessária para obter uma dada temperatura de
nitretação. As linhas equipotenciais elétricas para essa configuração foram simulados com o
programa FEMM 4.2 e estão mostradas na figura 3.5.
Figura 3.5: Simulação das linhas equipotenciais com densidade de carga nula na sua configu-
ração final com a adição do Shield.
42
(b)(a)
Figura 3.4: Simulação das linhas equipotenciais com densidade de carga nula. (a) Sem a
placa paralela; (b) Com uma placa paralela ao porta-amostra.
3.2 Preparação das Amostras
Neste trabalho foi utilizada a liga de titânio Ti-6Al-4V ELI, fornecida em barra circu-
lar de 10,0 mm de diâmetro e 100 mm de comprimento pela Titanium Industries, Inc*. A
composição química fornecida pelo fabricante é exibida na tabela 3.1. Essas barras foram cor-
tadas em discos com espessuras de aproximadamente 3 mm.
Tabela 3.1: Composição química da amostra Ti-6Al-4V ELI (% em massa).
N C H Fe O
2
Al V Ti
0,090 0,014 0,0027 0,09 0,12 5,97 3,9 Bal.
Os discos foram lixados com lixas de granulometria: 120, 320, 600, 1200 e 2000 e po-
lidos com pasta de diamante de granulometrias 3, 1 e 0,5 μm, adquirindo um aspecto espelha-
do. Foi utilizado água como lubrificante no lixamento e polimento.
3.3 Processo de Nitretação
A rotina de nitretação das amostras consistiu das seguintes etapas:
Limpeza: As amostras polidas foram submersas em acetona e submetidas a banho de
ultra-som durante 30min para limpar a superfície. A secagem foi realizada em estufa a aproxi-
madamente 60 ºC por 30 min;
Fixação da amostra: Cada amostra foi encaixada no porta-amostra descrito acima.
Uma placa cerâmica, medindo 2 mm x 2 mm foi inserida entre a amostra e a junção do termo-
par, Cromel/Alumel tipo K, para evitar a abertura de descarga sobre este sensor, evitando a al-
teração na leitura de temperatura (figura 3.6).
43
Figura 3.6: Arranjo da amostra, porta-amostra, isolante cerâmico e termopar durante o pro-
cesso de nitretação.
Bombeamento: Para atingir a condição adequada de nitretação, a seguinte sequência de
passos era efetuada após cada colocação de amostra na câmara:
1º - bombeamento inicial até 10
-1
Torr;
- a conexão com o sistema de bombeamento era fechada para a introdução de argô-
nio no interior da câmera até uma pressão próxima da pressão atmosférica. A válvula para
bombeamento era aberta novamente até atingir a pressão indicada acima. Este procedimento
(“lavagens com argônio”) era repetido pelo menos três vezes.
- Bombeamento final por 24 horas atingindo uma pressão de base de cerca de 1,5
2,0 x 10
-2
Torr.
Etching: Uma limpeza da superfície da amostra é realizada por um processo denomi-
nado etching, que consiste na abertura de uma descarga luminescente em atmosfera inerte (ar-
gônio) permitindo remoção de óxidos e possíveis contaminações por bombardeamento com
íons de Ar, promovendo a ativação da superfície. Para fazer etching inicialmente a pressão é
estabilizada em 2,5 Torr e é aplicada uma diferença de potencial entre os eletrodos suficiente
para a geração do plasma. Após um aquecimento da amostra, a pressão é ajustada em 7,5 Torr
e a temperatura elevada para 500 ºC, permanecendo assim por 15 minutos. Durante o etching
se observa a formação de descargas elétricas (“arcos”) enquanto as contaminações estão sen-
do removidas da superfície.
Estabilização de Pressão: Remoção do argônio e a admissão da atmosfera nitretante.
Com um fluxo de entrada de 20 sccm, a pressão de trabalho (10 Torr) é alcançada em 15 mi-
nutos, então nesse intervalo a amostra reduz sua temperatura até que o bombardeio pela ainda
rarefeita atmosfera comece a aumentar a temperatura novamente. Quando a pressão final é al-
44
cançada a temperatura da amostra é de no máximo 300 ºC e regula-se a válvula agulha para
manter essa pressão constante em fluxo dinâmico. A temperatura final é alcançada pela eleva-
ção da diferença de potencial entre os eletrodos e o tempo de estabilização varia entre 10 e 20
min.
Nitretação: Quando a temperatura e a pressão estão estáveis, dá-se o inicio do proces-
so nitretação e inicia-se a contagem do tempo que é de 4 horas. Apenas ocasionalmente, ajus-
tes na pressão e temperatura da câmara devem ser realizados durante o processo, que, entre-
tanto, se mostra bastante estável. Durante os processos de nitretação, verificou-se que a dife-
rença de potencial, a depender da temperatura e atmosfera escolhidas, variava de 300 – 520V.
Da mesma forma, a densidade de corrente variou entre 4 10 mA/cm
2
. Em todas as nitreta-
ções verificou-se a variação desses parâmetros elétricos (no máximo 2% do valor médio) cau-
sadas por flutuações na pressão (9,8 11 Torr), o que também proporcionou mudanças na
temperatura estabelecida numa faixa de ± 7 ºC.
Resfriamento: Ao final do processo, extingue-se o plasma pela redução da diferença de
potencial e a admissão e remoção dos gases são cessadas. A amostra é resfriada dentro da -
mara em atmosfera igual àquela utilizada no processo.
Diversas nitretações foram realizadas previamente à conclusão da câmara até seu esta-
do final, permitindo: i) a familiarização com o processo; ii) a implementação de modificações
que a tornasse capaz de controlar adequadamente os mais importantes parâmetros do proces-
so; iii) determinação das faixas mais adequadas de trabalho de temperatura, pressão, fluxo e
composição da atmosfera nitretante e iv) garantir a reprodutibilidade do processo. Baseado na
caracterização dessas amostras em nitretações preliminares, foi escolhido o fluxo ( 20 sccm),
a pressão (10 Torr) e o tempo do processo (4 horas), deixando variar apenas 2 parâmetros: a
composição do gás e a temperatura de deposição. A tabela 3.2 mostra as condições utilizadas
para nitretação em que foram variadas a temperatura e a relação N
2
/H
2
na atmosfera nitretante.
Para a fase de caracterização e análise da influência da composição no processo, foram
projetadas 15 nitretações, cada uma com um par temperatura/composição único. Nitretações
com repetição de alguns pares de parâmetros (todas em 700 ºC) permitiu verificar a reproduti-
bilidade do filme, que se mostrou, a partir da análise de DRX, satisfatória.
45
Tabela 3.2: Parâmetros de nitretações das amostras.
Temperatura
500 ºC 600 ºC 700 ºC
Atmosfera
80%N
2
+20%H
2
● ●
60%N
2
+40%H
2
● ●
50%N
2
+50%H
2
40%N
2
+60%H
2
● ●
20%N
2
+80%H
2
3.4 Técnicas de Análise
Para estudar a influência dos parâmetros de tratamento nos filmes de nitreto foram uti-
lizadas as seguintes técnicas:
Análise por Reação Nuclear (NRA): Para obter o perfil de concentração de nitrogênio
nas amostras;
Difração de Raios X em Ângulo Rasante: Para identificar as diferentes fases de nitreto
e sua distribuição em profundidade;
Espectroscopia micro Raman: Para identificar a presença de TiN
X
na superfície da
amostra e estabelecer uma correlação entre o espectro Raman e a estequiometria da fase.
3.4.1 Análise por reação nuclear (NRA)
Essa técnica propicia a análise de camadas superficiais usando um feixe de íons leves
com energia na faixa de 0,1 10 MeV. Quando um íon ‘a’ atinge um átomo ‘A’ pode ocorrer
uma reação nuclear. Um núcleo excitado intermediário ‘I*’ é formado e decai para um estado
fundamental ‘B’ emitindo uma partícula ‘b’ que pode ser um fóton γ e/ou um íon (H
+
,He
2+
)
com energias específicas. Essa reação é escrita na forma abreviada A(a,b)B [34].
46
Figura 3.7: Ilustração do processo de reação nuclear.
A probabilidade de ocorrência de uma reação nuclear pode ser expressa em termos de
uma seção de choque σ, definida como a área efetiva para que uma partícula sofra uma coli-
são com o isótopo específico resultando em reação nuclear. A seção de choque é função da
energia das partículas incidentes. Para muitas reações nucleares σ(E) exibe picos muito pro-
nunciados, conhecidos como ressonâncias, em torno de valores bem determinados de energia,
E- E
R
, para as quais a reação é mais provável. De fato, a maioria dos isótopos leves (Z<30)
tem ressonâncias intensas e agudas para reações nucleares induzidas por íons leves em baixas
energias de bombardeamento.
Para um número constante de projéteis incidentes, o número de produtos da reação
emitido ‘b’ depende da quantidade de átomos ‘A’ do alvo. Assim podemos derivar o número
de átomos ‘A’ presente numa amostra a partir da contagem do produto ‘b’ da reação ocorrida.
A calibração é feita com uma amostra padrão, que contenha uma quantidade conhecida de
átomos alvo ‘A’, medida nas mesmas condições que a amostra.
É necessário levar em consideração a composição isotópica dos átomos “A”, tendo em
vista que a reação nuclear é seletiva para determinados isótopos.
A concentração ‘m’ de isótopos ‘A’ numa amostra pode ser obtida a partir da equação
3.1 [35].
( )
AM B
ST ST AM B A
fY
m
Y fY
ε
ε ε ε
=
+
(3.1)
onde ƒ é a fração de isótopos ‘A’ presente no padrão; Y
ST
,Y
AM
são as contagem da partícula
“b” emitida após a reação no padrão e amostra, respectivamente; ε
ST
, ε
A
e ε
B
são as seções de
choque nuclear para o padrão, isótopo ‘A’ e o restante dos átomos da amostra. Seus valores
são tabelados.
47
Fazendo incidir sobre uma amostra que contem um destes isótopos um feixe de partí-
culas com energia exatamente igual à E
R
, a reação nuclear correspondente ocorrerá na su-
perfície do material. As partículas que não sofrem colisões efetivas com os núcleos deste isó-
topo na superfície do material perdem energia ao atravessar o material, não mais satisfazendo
a condição de ressonância.
Aumentando progressivamente a energia dos íons incidentes acima de E
R
, a perda de
energia faz com que a condição ressonante seja satisfeita em camadas localizadas sucessiva-
mente mais abaixo da superfície do material. Assim, os produtos da reação detectados para
energias de incidência mais altas são originadas em profundidades progressivamente maiores
(ver figura 3.8).
Figura 3.8: Ocorrência da reação nuclear em profundidades diferentes na amostra, a depender
da energia das partículas incidentes.
A perda de energia das partículas ao penetrar num meio material é caracterizada pelo
seu poder de freamento, dado por:
( )
dE
S E
dx
=
(3.2)
que depende da natureza e energia da partícula incidente e do material alvo. Esse valor tam-
bém é tabelado para diversos pares íon/alvo.
Assim, é possível determinar a profundidade em que a reação ocorreu resolvendo a
equação 3.2 para:
0
( )
R
E
E
dE
x
S E
=
(3.3)
48
Através das equações 3.1 e 3.3 se converte a curva de contagem de partículas emitidas
versus energia de bombardeamento em uma curva de concentração de determinado isótopo
versus profundidade, ou seja, o perfil de concentração da espécie na amostra.
As medidas de reação nuclear foram realizadas no Laboratório de Implantação Iônica
do IF-UFRGS, utilizando o acelerador High Voltage Engineering Europa de 500 keV.
A reação utilizada para obtenção dos perfis em profundidade do nitrogênio nas amos-
tras foi
15
N(p,αγ)
12
C, cuja energia de ressonância é de 429 keV. A fim de se preservar a inte-
gridade do equipamento, a máxima energia de aceleração utilizada foi de 455 keV, o que per-
mite uma análise em uma profundidade máxima de 200 nm na matriz em questão.
Para quantificar o teor de nitrogênio, foi feita a calibração com um padrão de Si
3
N
4
sob as mesmas condições experimentais das amostras.
Utilizando o programa SRIM [36], foram obtidas as secções de choque nuclear de pró-
tons interagindo com átomos de nitrogênio, titânio e do silício, assim como o poder de frea-
mento, em uma ampla faixa de energia (250-600 keV). A partir desses dados foi feita uma in-
terpolação, propiciando a determinação dos valores desses parâmetros para as energias de in-
teresse, que é de 429 keV para a secção de choque nuclear e o poder de freamento na faixa de
energia entre 429 a 455 keV.
3.4.2 Difração de raios X em ângulo rasante (GIXRD)
Na difração de Raios X convencional com geometria θ-2θ (Bragg-Brentano) os ângu-
los de incidência e de detecção são iguais em relação à superfície da amostra policristalina,
que tem cristalitos orientados de forma aleatória e homogênea em todas as direções. O difrato-
grama permite obter informações sobre composição, estrutura cristalina, grau de cristalinidade
e tamanho de grão a partir das posições, intensidades e larguras dos picos de difração. Quando
o material analisado não está na forma de pó, como é o caso de filmes finos, observa-se fre-
quentemente a intensificação de alguns picos devido a orientações cristalinas preferenciais
(texturas).
A profundidade de análise por difração de raios X está condicionada à composição
elementar da amostra, à densidade do material, ao ângulo de incidência do feixe e ao compri-
49
mento de onda da radiação. Para a análise de filmes finos, cujas espessuras são da ordem de
10
-6
10
-8
m, a geometria θ-2θ se torna inconveniente, pois o caminho percorrido pelo feixe
dentro do filme é muito pequeno, proporcionando uma relação sinal-ruído baixa e uma contri-
buição muito maior do substrato.
Para a realização de difração de raios X em filmes finos, é adequado utilizar a geome-
tria Seemann-Bohlin, na qual o ângulo de incidência é rasante e fixo enquanto o detector faz a
varredura (figura 3.9). Essa técnica é chamada de difração de raios X em ângulo rasante
GIXRD (grazing incidence x-ray diffraction) e promove um significante aumento no caminho
ótico do feixe no interior do filme, de modo que a informação estrutural do difratograma é
principalmente oriunda deste filme.
Figura 3.9: Geometria Seemann-Bohlin para difração de raios X.
Como o feixe atenua-se ao adentrar na amostra, as camadas superficiais contribuem
com o difratograma de maneira mais efetiva que as mais profundas. A equação 3.4 exprime,
para a geometria do GIXRD, a fração G
x
em que uma dada profundidade no filme contribui
para a intensidade total dos picos de difração [37].
µ [1/ ( ) 1/ (2 )]
1
x sen sen
x
G e
α θ α
+
=
(3.4)
onde μ é o coeficiente de absorção de raios X do material, x é a profundidade, α é o ângulo de
incidência e θ é o ângulo de espalhamento de um determinado pico.
A figura 3.10 mostra os gráficos da equação 3.4 onde foi adotado o coeficiente de ab-
sorção do nitreto de titânio (μ
TiN
= 8,49 x 10
-2
μm
-1
), 2θ = 42º e diversos ângulos de incidência.
50
Figura 3.10: Fração G
x
para a contribuição da total intensidade difratada para uma espessura
x e para diferentes ângulos de incidência α.
A variação do ângulo de incidência altera significantemente a profundidade da região
em que os raios X são difratados. A camada que contribui com 95% na intensidade dos picos
é a considerada relevante, ou seja, toda informação contida no difratograma é tida como
oriunda dessa camada [37]. Assim, variando os ângulos de incidência de 0,5 - 6º, varia-se a
profundidade de análise de ~ 0,25 μm (α = 0,5º) a ~ 3,0 μm (α = 6º).
A obtenção de difratogramas em diferentes ângulos de incidência torna possível a ob-
tenção de informações estruturais de camadas superficiais com espessuras distintas, de modo
que a comparação das intensidades relativas de pico das diferentes fases permite concluir so-
bre a homogeneidade da distribuição de fases em profundidade.
As medidas de difração de raios X foram realizadas no Laboratório de Microanálise do
Instituto de Física UFRGS, utilizando o difratômetro SHIMADZU XRD-6000, com o aces-
sório para filmes finos.
3.4.3 Espectroscopia micro-Raman
A espectroscopia micro Raman é uma técnica de espalhamento inelástico de fótons
que proporciona, em poucos segundos, a obtenção de informação química e estrutural de inú-
meros materiais orgânicos ou inorgânicos, permitindo assim sua identificação [38]. Utiliza
51
como fonte de excitação um feixe de laser focalizado por uma lente objetiva, permitindo a
análise de uma região micrométrica da amostra.
Moléculas e sólidos são constituídos de átomos unidos por interações de natureza cou-
lombiana que exibem modos normais de vibração com energias bem definidas (característicos
do sistema em questão), tipicamente na região do infravermelho.
Incidindo sobre o material a ser estudado uma radiação monocromática de energia sig-
nificativamente mais alta, a maior parte (mais que 99%) da luz é espalhada na mesma fre-
quência (espalhamento Rayleigh) e somente uma pequena porção da luz afeta os modos vibra-
cionais da amostra, excitando-os ou fazendo retornar ao estado fundamental, no caso de es-
tarem excitados (espalhamento Stokes e anti-Stokes). A figura 3.11 representa esquematica-
mente a interação da radiação com os modos de vibração.
Figura 3.11: Representação esquemática dos processos de interação da radiação incidente
com os modos vibracionais: (a) Espalhamento Rayleigh; (b) e (c) Espalhamento Raman
Stokes; (d) Espalhamento Raman anti-Stokes (e) fluorescência.
Após a interação com a radiação em (a), (b), (c) e (d), o sistema assume um estado ins-
tável, chamado de estado virtual, e então retorna para algum modo vibracional normal do sis-
tema. Como resultado tem-se em (a) o espalhamento elástico (Rayleigh) onde a energia da ra-
diação emitida é igual à do feixe incidente. Em (b), o sistema retorna para um modo vibracio-
nal vizinho ao original dando origem a um espalhamento Raman Stokes de primeira ordem,
onde é emitido um fóton com energia E
inc
- E
v
, onde E
v
é a energia de vibração do estado final.
52
Em (c), o sistema retorna para um modo vibracional não vizinho ao original dando origem a
um espalhamento Raman Stokes de segunda ordem. No caso (d) tem-se o espalhamento Ra-
man anti-Stokes, onde o sistema já se encontra em um estado vibracional excitado e após inte-
ragir com o fóton assume o estado fundamental, emitindo um fóton com energia E
inc
+ E
v
,
onde E
v
corresponde a diferença de energia entre os níveis vibracionais envolvidos no proces-
so. Quando o fóton incidente chega a promover um estado eletrônico excitado, caso (e), ocor-
re fluorescência, fenômeno muito mais intenso que o efeito Raman, que em geral o oblitera
completamente.
Embora o espalhamento Raman esteja relacionado com os princípios da mecânica
quântica, uma descrição segundo a teoria eletromagnética clássica permite entender a origem
deste espalhamento inelástico. Este modelo é apresentado a seguir:
Um campo elétrico (E) de uma onda eletromagnética (feixe de laser) varia no tempo
no tempo com uma frequência ν
0
e amplitude
0
E
r
como mostra a equação 3.6:
(3.6)
Ao se incidir uma radiação, com frequência alta, geralmente na faixa do visível (10
14
Hz) sobre um material, é induzido um momento de dipolo elétrico em cada átomo ou molécu-
la através do deslocamento relativo entre o caroço iônico (positivo) e a nuvem eletrônica. Essa
situação é representada na figura 3.12.
Figura 3.12: Representação da polarização induzida pelo campo incidente nos átomos da
amostra.
O momento de dipolo induzido é proporcional ao campo incidente:
53
P E
α
=
r r
(3.7a)
onde α é a polarizabilidade da molécula e em geral tem caráter anisotrópico, o que significa
que a iguais distâncias do centro da molécula, α poderá ter diferentes magnitudes quando me-
didas em diferentes direções. A polarizabilidade é escrita como um tensor de segunda ordem:
x xx xy xz x
y yx yy yz y
z zx zy zz z
P E
P E
P E
α α α
α α α
α α α
=
(3.7b)
A polarizabilidade é função das coordenadas normais de vibração, q=q
0
cos2πν
0
, do
conjunto de átomos, onde q
0
é a amplitude de vibração e ν
m
é a frequência do modo normal de
vibração. Para pequenas amplitudes vibracionais, α é uma função linear de q. Assim podemos
escrever:
0
0
...
q
q
α
α α
= + +
(3.8a)
sendo α
0
é a polarizabilidade na posição de equilíbrio. Substituindo o termo de oscilação das
coordenadas:
(3.8b)
Isso quer dizer que a capacidade que os átomos tem de se polarizar na presença do
campo externo depende das frequências dos modos normais de vibração da amostra.
Utilizando as equações 3.6, 3.7a e 3.8b obtemos:
(3.9)
Assim, de acordo com a teoria clássica, o primeiro termo representa a oscilação do di-
polo que irradia na frequência ν
0
, o que corresponde a um espalhamento elástico (Rayleigh).
54
O segundo termo corresponde ao espalhamento Raman de frequências ν
0
+ ν
m
(anti-Stokes) e
ν
0
- ν
m
(Stokes). Conhecendo-se a frequência ν
0
do laser, a partir da detecção da radiação es-
palhada, é possível obter a frequência de vibração da molécula.
O termo (∂α/q)
0
depende da simetria da molécula ou da rede cristalina, e se igual a
zero implica que a molécula/sólido não é Raman ativa.
Os espectros obtidos das medidas são apresentados em intensidade versus desloca-
mento Raman (dado em cm
-1
) que é a diferença entre o número de onda da radiação incidente
e da radiação espalhada, ou seja:
Deslocamento Raman (Raman Shift) =
1 1
inc esp
λ λ
(3.10)
Quando o efeito é observado em cristais, este é devido às vibrações da rede (fônons).
Essas vibrações podem se dar na direção de propagação da radiação (modo longitudinal, L),
ou fazendo ângulo reto com a direção de propagação (chamado de modo transversal, T).
Essas vibrações ainda podem ser classificadas como bandas ópticas (TO e LO) e acús-
ticas (TA e LA). A figura 3.13 ilustra esses modos para o caso de uma rede diatômica linear.
Figura 3.13: Modos de vibração de uma rede diatômica linear. (a) Bandas ópticas; (b) Bandas
acústicas.
Quando a diferença entre as massas é muito grande, a banda óptica (mais energética) é
primordialmente devido à vibração dos átomos mais leves enquanto que a banda acústica se
dá pela vibração dos átomos pesados.
As medidas de espectroscopia Raman obtidas neste trabalho foram realizadas no es-
pectrômetro montado no Laboratório de Microanálise – IF – UFRGS. As amostras são excita-
55
das com um laser de He-Ne e o tamanho do feixe é reduzido para 2 μm ao passar por uma len-
te objetiva com magnificação de 50X.
A profundidade de penetração do laser na amostra (d) depende do coeficiente de ab-
sorção da amostra (k~2) e do comprimento de onda do laser (λ=632,8 nm). Assim, usando a
equação d = λ/4πk, temos que este valor é de aproximadamente 25 nm.
Para cada amostra, foram obtidos três espectros em pontos diferentes de sua superfí-
cie, cada uma com um tempo de aquisição de 100 segundos, e foram combinados obtendo-se
o espectro utilizado para análise. Para cada espectro obtido, procede-se uma segunda aquisi-
ção com o foco do laser ajustado para o interior da superfície, até que se perca o sinal do ni-
treto restando apenas um espalhamento típico de superfícies espelhadas para a obtenção do
background.
56
Capítulo 4
Resultados
57
4 – Resultados
Serão apresentados nesse capítulo os resultados das medidas de reação nuclear, difra-
ção de raios X em ângulo rasante e espectroscopia micro Raman. Esses resultados serão mos-
trados na sequência citada das técnicas, iniciando com amostras nitretadas com misturas mais
ricas em nitrogênio.
4.1 Análise por Reação Nuclear
A figura 4.1 exibe os perfis de concentração das amostras nitretadas com a mistura
80%N
2
– 20%H
2
para todas as temperaturas de tratamento.
58
Figura 4.1: Perfis de concentração das amostras nitretadas utilizando uma mistura gasosa
contendo 80% de nitrogênio e 20% de hidrogênio e temperaturas de 500, 600 e 700 ºC.
A amostra nitretada a 700 ºC apresenta um perfil de nitrogênio com concentração
constante, de aproximadamente 50 at%, dentro da profundidade de medida alcançada.
Em 600 ºC observa-se uma região, entre 0 e 30nm, com um patamar de concentração
de 48 at%. A partir daí, a quantidade de nitrogênio regride com a profundidade até 110 nm,
onde atinge um novo patamar de concentração em torno de 37 at% que se estende para fora do
limite de profundidade da medida.
Na amostra nitretada na mais baixa temperatura, a concentração chega próximo à 44 at
% nos 10 primeiros nanômetros e diminui rapidamente com a profundidade. Em 35 nm apre-
senta-se uma leve tendência de formação de um patamar, depois a concentração segue dimi-
nuindo, apresentando um perfil de difusão. Em torno de 200 nm a concentração de nitrogênio
é quase zero.
Os perfis de concentração para as amostras nitretadas em atmosfera contendo 60% de
nitrogênio são exibidos na figura 4.2.
Figura 4.2: Perfis de concentração das amostras nitretadas utilizando uma mistura gasosa
contendo 60% de nitrogênio e 40% de hidrogênio e temperaturas de 500, 600 e 700 ºC.
59
A amostra nitretada a 700 ºC nessa atmosfera não apresenta diferença em comparação
com a nitretada em atmosfera mais rica em nitrogênio, permanecendo com concentração igual
a 50 at% em toda profundidade observada.
Uma concentração constante igual a 47 at% foi obtida na amostra nitretada a 600 ºC
que se estende da superfície até a profundidade de 50 nm. Embora esse patamar de concentra-
ção seja levemente inferior à obtida na primeira condição de mistura do gás, ele se estende à
maiores profundidades . A partir de então, os perfis passam a ter o mesmo aspecto, estabele-
cendo um novo patamar com concentração de 35 at%.
Esse aumento na espessura do patamar de maior concentração, frente à condição at-
mosférica anterior, foi repetido na amostra nitretada a 500 ºC, onde essa espessura chega a 17
nm e concentração igual a 46 at%. Observa-se muito mais claramente a tendência de forma-
ção de um novo patamar a partir de 30 nm seguido por um perfil difusivo.
Os perfis da mistura com igual concentração de nitrogênio e hidrogênio são mostrados
na figura 4.3.
Figura 4.3: Perfis de concentração das amostras nitretadas utilizando uma mistura gasosa
contendo 50% de nitrogênio e 50% de hidrogênio e temperaturas de 500, 600 e 700 ºC.
60
Nessa composição de gás, a amostra nitretada a 700 ºC apresenta o patamar de con-
centração superficial igual às outras duas composições mais ricas (49 at.%). Porém essa con-
centração não é constante em toda a região, diminuindo muito suavemente, chegando a 47 at.
% em 160 nm.
O patamar de mais alta concentração da amostra nitretada a 600 ºC (48 at.%) possui
uma espessura de 10 nm, que é muito inferior aos casos anteriores. Entretanto, observa-se um
patamar de concentração de 40 at.% entre 40 e 95 nm de profundidade, inexistente nas condi-
ções anteriores. ainda a presença do terceiro patamar em 37 at.% (visualizado em todas as
amostras nitretadas a 600 ºC) situado a partir de 100 nm até o limite da medida.
Em 500 ºC apenas a existência de um reduzido platô nos primeiros nanômetros. O
restante do perfil exibe uma característica de difusão.
A figura 4.4 mostra os perfis de concentração das amostras nitretadas em atmosfera
contendo 40% de nitrogênio e 60% de hidrogênio.
Figura 4.4: Perfis de concentração das amostras nitretadas utilizando uma mistura gasosa
contendo 40% de nitrogênio e 60% de hidrogênio e temperaturas de 500, 600 e 700 ºC.
61
O perfil da amostra nitretada a 700 ºC mostra-se diferente das amostras de mesma
temperatura e em atmosferas mais ricas em N
2
. Apresenta uma concentração muito pequena
na superfície elevando-se até um máximo (46 at.%) em torno da profundidade de 75 nm e re-
torna a decrescer. Entretanto esse comportamento peculiar pode ser devido à existência de
contaminação na superfície da amostra.
A amostra nitretada a 600 ºC assemelha-se às demais, caracterizada por um pequeno
patamar de 47 at.% nos primeiros 15 nanômetros a partir da superfície, seguido de um segun-
do com concentração igual a 43 at.% entre 30 e 60 nm e um terceiro patamar (34 at.%) que
começa na profundidade igual a 140 nm e alonga-se para fora do limite da medida.
A amostra nitretada a 500 ºC apresenta apenas o perfil de difusão que se inicia na su-
perfície com concentração de 45 at.%.
Os perfis de concentração para as amostras nitretadas em atmosfera contendo 20% de
nitrogênio são exibidos na figura 4.5.
Figura 4.5: Perfis de concentração das amostras nitretadas utilizando uma mistura gasosa
contendo 20% de nitrogênio e 80% de hidrogênio e temperaturas de 500, 600 e 700 ºC.
62
Dentre as condições de nitretação propostas (tabela 3.2), não foi obtido sucesso em ge-
rar plasma em apenas uma situação (20% N
2
+ 80% H
2
a 700 ºC). Nesse caso, a formação de
arcos elétricos era intensa e a temperatura de tratamento não foi alcançada. Diversas tentativas
de realizar a nitretação nessa condição foram feitas, obtendo-se o mesmo comportamento. O
risco de danificar a fonte DC provocou a desistência de nitretar sob esses parâmetros. Assim,
a influência dessa composição gasosa sobre a camada nitretada ficou limitada à temperaturas
mais baixas. O insucesso se deve ao fato de que nessa condição, a diferença de potencial é
muito grande, isso implica na saída da região de descarga anômala para adentrar na descarga
de arco.
Em 600 ºC o patamar inicial não alcança a concentração estequiométrica de TiN, pare-
cendo haver apenas uma curva de difusão da superfície até 100 nm e a partir daí um patamar
em 34 at.% que se estende para além da profundidade medida.
Novamente, para 500 ºC apresenta-se uma curva de difusão. Esse caso apresenta o
mais rápido decréscimo da concentração de nitrogênio, obtendo-se apenas 1 at.% em 175nm.
4.2 Difração de Raios X em Ângulo Rasante
Os patamares nos perfis de concentração de nitrogênio obtidos por NRA são indicati-
vos de formação de diferentes fases de nitreto de titânio. Maior compreensão sobre a presença
dessas fases e sua distribuição em profundidade pode ser obtida pela utilização da técnica de
difração de raios X em ângulo rasante feita com um conjunto de ângulos de incidência (0,5º,
1º, , e 6º) que correspondem à investigação de diferentes profundidades dentro da amos-
tra.
Inicialmente, foi obtido o difratograma da amostra virgem da liga Ti-6Al-4V (figura
4.6). O ângulo de incidência (α) escolhido foi de e a varredura do ângulo de espalhamento
(2θ) foi entre 20 e 90º.
63
Figura 4.6: Difratograma da liga Ti-6Al-4V, obtido por difração em ângulo rasante com
α = 2º.
Os picos de difração foram indexados, utilizando o PDF 44-1294 (α-Ti) e o PDF 44-
1288 (β-Ti). Observa-se que quase todos os picos são oriundos da fase α-Ti e apenas foi
identificado o pico mais intenso da fase β-Ti deslocado para a direita (38,48º 39,52º) em
relação à posição contida no PDF 44-1288. Essa ficha é calculada a partir de parâmetros de
rede da fase β-Ti em alta temperatura, de modo que um deslocamento é esperado para uma
medida em temperatura ambiente. A variação angular corresponde a uma diminuição de
2,54% do parâmetro de rede, compatível com o intervalo de temperatura (~ 860 ºC) e o coefi-
ciente de dilatação térmica dessa fase (13,80 μm/m.ºC ).
Para as amostras nitretadas, a região de varredura de 2θ foi limitada entre 33º e 45º,
que contém os picos principais das fases observadas. A figura 4.7 exibe o conjunto de difrato-
gramas com diferentes ângulos de incidência para a amostra nitretada a 700 ºC na atmosfera
mais rica em nitrogênio. Foram utilizados os PDFs 38-1420 para a identificação das fase δ-
TiN, 17- 0386 para ε-Ti
2
N e 44-1294 para α-Ti.
64
Figura 4.7: Padrões de difração em ângulo rasante da amostra nitretada a 700 ºC em 80% N
2
+ 20% H
2
, com ângulos de incidência 0,5º, 1º, 2º, 4º e 6º. Os picos correspondentes aos planos
(hkl) das diferentes fases estão indicados.
Os picos mais intensos obtidos nessa condição são referentes à fase δ-TiN, e sua inten-
sidade varia com o ângulo de incidência, alcançando o valor máximo para o ângulo de inci-
dência igual a 2º. A fase ε-Ti
2
N também é evidenciada nos difratogramas em todos os ângulos
de incidência, e apresenta um pico mais elevado na medida com 4º. Os picos da fase α-Ti(N)
aparecem a partir da incidência de 4º, mostrando que esta fase encontra-se após as camadas
contendo os nitretos. Não foi observado o pico referente à fase β-Ti, o que pode ser devido à
interferência com o pico do plano (111) da fase ε-Ti
2
N.
Significantes mudanças são observadas nos difratogramas da amostra nitretada a 600
ºC sob a mesma mistura 80%N
2
/20%H
2
. Esses difratogramas estão contidos na figura 4.8.
65
Figura 4.8: Padrões de difração em ângulo rasante da amostra nitretada a 600 ºC em 80% N
2
+ 20% H
2
, com ângulos de incidência 0,5º, 1º, 2º, 4º e 6º.
Todas as fases observadas no caso anterior também estão presentes nesta amostra, mas
com uma significante mudança nas relações de intensidade de pico é observada. O pico mais
intenso é agora devido à fase ε-Ti
2
N chegando ao máximo valor no ângulo de incidência igual
a 2º. A máxima intensidade de pico (relativa ao pico mais intenso) para a fase δ-TiN foi obti-
da com ângulo de incidência de 1º.
Nessa temperatura, os picos da fase α-Ti(N) estão presentes desde o menor ângulo de
incidência (0,5º) e crescem à medida que se sonda profundidades maiores, confirmando o
comportamento obtido nas amostras nitretadas nas outras temperaturas. A maior intensidade
para este pico em ângulos de incidência menores evidencia menor espessura da camada ni-
tretada quando comparada com as amostras nitretadas a 700 ºC.
Os difratogramas obtidos para a amostra nitretada em 500 ºC são apresentados na figu-
ra 4.9 e novamente percebe-se grandes mudanças com relação às condições de temperatura
mais elevadas.
66
Figura 4.9: (a) Padrões de difração para a amostra nitretada a 500 ºC. (b) Os mesmos padrões
com o eixo vertical em escala logarítmica. Os ângulos de incidência estão indicados.
Os picos dos difratogramas na figura 4.9(a) são relativos ao substrato (fase α-Ti(N)), e
apresentam pequenas variações na intensidade dos picos em função do ângulo de incidência.
Em escala logarítmica, figura 4.9 (b), os mesmos difratogramas permitem distinguir dois pi-
cos pouco intensos referentes aos nitretos, indicando a pequena espessura destas fases.
Os difratogramas obtidos em mesma temperatura para diferentes misturas gasosas
apresentaram modificações nas intensidades relativas dos picos. Entretanto são muito menos
expressivas do que as alterações obtidas pela variação da temperatura. Ou seja, em todas as
amostras nitretadas a 700 ºC, os picos mais intensos são da fase δ-TiN, enquanto que em 600
ºC o pico mais expressivo é o referente à fase ε-Ti
2
N e em 500ºC os picos da fase α-Ti são
dominantes.
Na figura 4.10 é mostrada a variação das intensidades dos picos de difração das fases
no ângulo de incidência de 1,0º em função da concentração de nitrogênio na mistura gasosa
para as amostras nitretadas a 700 ºC. Utilizamos os picos mais intensos de cada fase para a
contabilidade das intensidades, ou seja, para a fase δ-TiN utilizamos a intensidade do pico re-
ferente ao plano δ-(200) e usamos a intensidade de ε-(111) para a fase ε-Ti
2
N. A intensidade
dos picos referente à fase δ-TiN é maior para a mistura mais rica em nitrogênio e sofre uma
grande redução para as demais (figura 4.10 (a)). A partir daí, não se percebe uma tendência
clara dessa intensidade com a quantidade de nitrogênio na mistura. Quanto à fase ε-Ti
2
N, ob-
serva-se um decréscimo gradativo da intensidade dos picos com a quantidade de nitrogênio na
atmosfera nitretante. A soma dos picos para cada amostra nitretada a 700 ºC é mostrada na fi-
67
(b)(a)
gura 4.10 (b), e fica claro que os picos da fase ε-Ti
2
N apresentam-se, tipicamente, menor que
o da fase δ-TiN.
Figura 4.10: (a) Histogramas das intensidades dos picos δ-TiN (200) e ε-Ti
2
N (111) das
amostras nitretadas a 700 ºC em função da concentração de nitrogênio na atmosfera de nitre-
tação. (b) Soma das intensidades dos picos.
O mesmo procedimento foi utilizado para se obter a variação da intensidade dos picos
em função da mistura utilizada durante o processo de nitretação a 600 ºC e é exibida na figura
4.11.
Figura 4.11: (a) Histogramas das intensidades dos picos δ-TiN (200) e ε-Ti
2
N (111) das
amostras nitretadas a 600 ºC em função da concentração de nitrogênio na atmosfera de nitre-
tação. (b) Soma das intensidades dos picos.
68
Novamente, a condição que resultou numa maior intensidade no pico da fase δ-TiN foi
a mistura 80N
2
-20H
2
. Essa intensidade diminui conforme a quantidade de nitrogênio na mistu-
ra decresce. O pico em 50% tem um comportamento divergente da tendência geral (como a
700 ºC).
A variação na intensidade do pico da fase ε-Ti
2
N não é grande, mas a distribuição de
intensidades segue o que foi obtido na fase δ-TiN, sendo completamente distinta da observada
nas amostras nitretadas a 700 ºC.
A figura 4.11 (b) mostra a soma das intensidades dos picos referentes às duas fases
discutidas, e deixa claro que nessa condição de temperatura a intensidade dos picos da fase te-
tragonal é muito maior.
Esses dados não foram obtidos para as amostras nitretadas a 500 ºC porque nessa con-
dição não se formaram picos com intensidade suficiente para quantificação.
4.3 Espectroscopia micro-Raman
A rede cristalina do TiN é cúbica de face centrada (fcc) cujo grupo de simetria associa-
do (O
h
) é tal que espalhamentos Raman de primeira ordem são proibidos. Entretanto, o pro-
cesso de nitretação a plasma promove a criação de uma estrutura com muitos defeitos, isto é,
presença de sítios vacantes de íons metálicos pesados (titânio) e de íons de nitrogênio. Esses
defeitos reduzem a ordem translacional alterando a simetria efetiva da rede resultando numa
derivada primeira não nula da polarizabilidade e assim induzindo espalhamento Raman de
primeira ordem com dispersão em bandas acústicas e óptica [39].
As bandas acústicas são devidas à vibração dos átomos de titânio com vacâncias de ni-
trogênio vizinhas, enquanto que a óptica é determinada pela vibração de nitrogênio vizinhos
de vacâncias na sub-rede metálica do titânio. Chen et al. [40], afirmam que a razão entre as
bandas acústicas e óptica (A:O) aumenta com a deficiência de nitrogênio.
Esse resultado é esperado, que o aumento da concentração de nitrogênio propicia a
redução da quantidade de sítios vacantes da sub-rede do nitrogênio e o aumento de vacância
na sub-rede metálica, proporcionando redução do espalhamento acústico e aumento do óptico,
respectivamente. Em outras palavras, a relação de intensidades entres os picos das bandas
69
acústicas e ótica depende da concentração de nitrogênio da amostra, que pode ser observado
na figura 4.12.
Na figura 4.12, são apresentados os espectros correspondentes das amostras nitretadas
em atmosfera com 80% de nitrogênio para as três temperaturas. Os espectros foram normali-
zados pelo background para permitir a comparação. A nomenclatura dos picos é TA= trans-
versal acústico, LA= longitudinal acústico, 2A=pico acústico de segunda ordem, TO= trans-
versal óptico, A+O=pico acústico+óptico de segunda ordem, 2O= pico óptico de segunda or-
dem.
Figura 4.12: Espectro Raman das amostras nitretadas na atmosfera com 80% N
2
, nas tempe-
raturas de 500, 600 e 700ºC . A indexação remete-se aos modos de vibração existentes.
Verifica-se em todos os casos a presença de picos de primeira ordem, referentes às
bandas TA ~ 200cm
-1
, LA ~ 300 cm
-1
e TO ~ 560cm
-1
*. Esses picos tornam-se mais intensos
com o aumento da temperatura de tratamento. Isso é devido a variações na refletividade e coe-
ficiente de absorção da luz na amostra, que depende fortemente de sua estequiometria [41].
A relação de intensidades entres os picos das bandas acústicas e ótica também depende
da concentração de nitrogênio da amostra, que pode ser observado na figura 4.12.
70
* Constable [42] verificou que o pico centrado em 560 cm
-1
é uma sobreposição das bandas TO e LO. Entretanto,
devida à dificuldade em separá-los, tratamos como apenas um. Outros autores [40,43,44] consideraram essa regi-
ão como sendo um único pico, identificando-o como banda TO.
Os espalhamentos de segunda ordem, situados em ~ 425cm
-1
(2A), ~ 780 cm
-1
(A+O) e
~ 1100 cm
-1
(2O) tornam-se mais evidentes nas amostras nitretada a 700 ºC, pois possuem
concentração de nitrogênio próxima ou igual à condição estequiométrica. Esse resultado está
de acordo com Spengler [45], que afirma que a formação destas bandas é indício do sucesso
da obtenção de uma camada de TiN estequiométrica.
Para compreender as mudanças do espectro Raman do TiN
X
com as condições de tra-
tamento, foi feito o ajuste na faixa de 140-880 cm
-1
do espectro com um total de 5 curvas
gaussianas, separando os picos de espalhamento Raman. Essas curvas estão sobrepostas a um
espalhamento de fundo backgroundque parece ser peculiar de cada amostra, embora várias
amostras o apresentem semelhantes.
Na região escolhida para o ajuste, esse ruído de fundo obtido com o feixe fora de foco
tem um comportamento exponencial mostrado na figura 4.13.
Figura 4.13: Identificação do background existente nos espectros obtidos.
A separação dos picos gaussianos do espectro Raman é apresentada na figura 4.14
onde se pode observar as bandas TA, LA, 2A, TO e A+O.
71
Figura 4.14: Separação e identificação das bandas do espectro Raman com subtração do
background.
Até 900 cm
-1
a curva apresenta um decaimento exponencial seguindo-se um degrau ca-
racterístico para todos os materiais com superfície refletora que foram observados no sistema.
A influência da temperatura na fração de área dos picos acústicos, ótico e de segunda
ordem (soma da área dos picos 2A e A+O) é mostrada na figura 4.15 nas diversas atmosferas
de tratamento.
Figura 4.15: Variação das razões das áreas dos picos em função da temperatura de nitretação.
72
Para todas as composições de gás, os espectros Raman correspondentes possuem as
mesmas tendências, que são a redução da fração da área do conjunto de bandas acústicas de
primeira ordem e o aumento relativo das áreas das bandas óptica de primeira ordem. Tais ten-
dências informam que a elevação da temperatura de tratamento promove a formação de defei-
tos que propiciam o espalhamento na banda óptica (proeminentemente determinado por va-
câncias na sub-rede metálica) de maneira mais efetiva do que a geração de defeitos que in-
fluenciam no espalhamento acústico.
Verificou-se que a fração relativa dos picos de segunda ordem (2A e A + O) chega a
dobrar o seu valor, o que demonstra uma grande dependência com a temperatura de tratamen-
to, ou mais precisamente, com a estequiometria da fase formada. Esse resultado concorda com
o obtido por Spengler [41].
O comportamento global de variação dessas razões não é independente da atmosfera
de nitretação, e exibe mudanças quando observado em detalhe. Na figura 4.16 é mostrado que
a variação das frações com a mistura é correlacionada com a quantidade de nitrogênio na at-
mosfera, tendo a tendência de diminuir ou aumentar a depender da banda em questão.
Figura 4.16: Variação das razões das áreas dos picos em função atmosfera de nitretação.
73
Capítulo 5
Discussão
74
5 – Discussão
Este capítulo discute os resultados apresentados no capítulo anterior. Inicialmente, in-
dicamos como os resultados de DRX e NRA permitem identificar as fases formadas nas dife-
rentes condições de nitretação e a sua estruturação. As estequiometrias, espessuras e tama-
nhos de grão são avaliados em função das condições experimentais. Finalmente, discutimos
os resultados de espectroscopia Raman buscando correlacionar suas características com as
concentrações medidas com NRA.
5.1 Formação das Fases e Estruturação
Os dados obtidos da análise por reação nuclear indicam a formação de diferentes fases
durante o processo de nitretação com teores de nitrogênio indicados pelos platôs dos perfis de
concentração. Estes teores são compatíveis com as fases δ−TiN e ε−Ti
2
N no diagrama de fas-
es do sistema Ti-N apresentado na Figura 2.7.
Nas regiões mais próximas da superfície, observa-se, nos perfis obtidos por NRA, a
formação da fase δ-TiN
x
com valores de x variando entre 0,8 e 1. Os patamares obtidos entre
33 e 36 at% (dependendo da condição de nitretação) correspondem à fase ε-Ti
2
N, que no dia-
grama de fase ocorre numa estreita faixa de concentração em torno de 33 at%.
Os padrões de difração confirmam a presença dessas duas fases. Os difratogramas em
ângulo de incidência de 0,5º, cuja profundidade de análise é de cerca de 200 nm, confirmam
as fases presentes na região em que se tem o perfil de nitrogênio por NRA constante.
75
Na figura 5.1 são comparados os difratogramas obtidos com ângulo de incidência de
0,5º e os perfis de nitrogênio correspondentes das amostras nitretadas na atmosfera contendo
80% e 20% em volume de nitrogênio e hidrogênio, respectivamente.
Observa-se a correlação entre os dois resultados: Em 700 ºC, onde os picos da fase δ-
TiN são os mais intensos, temos um espesso patamar de concentração correspondente a esta
fase no perfil NRA. Não se observa no perfil de nitrogênio a presença de concentrações que
correspondam à fase ε-Ti
2
N. Embora apareçam picos da fase ε no difratograma corresponden-
te. Isto indica que o patamar de concentração de nitrogênio da fase δ−TiN pura não deve se
estender para muito além da profundidade 150 nm medida neste caso.
Os picos da fase ε-Ti
2
N, apresentam intensidades maiores quando a nitretação é reali-
zada em 600 ºC. Nessa condição, o perfil de nitrogênio demonstra a formação do patamar cor-
respondente à estequiometria dessa fase, a partir da profundidade ~70 nm até profundidades
maiores, enquanto a fase δ−TiN pura existe apenas nos 25 nm iniciais e coexiste em a ε-Ti
2
N
entre 25 e 70 nm. Como a intensidade do difratograma depende do volume amostrado, e em
0,5º se analisa aproximadamente 200 nm (ver figura 3.11), está justificada a intensidade do si-
nal associado a fase ε.
Em 500 ºC, o difratograma é constituído pelos picos da fase α−Ti(N) presente no
substrato (o pico da fase β−Ti, pouco intenso no substrato virgem, tem um overlap significati-
vo com a fase ε). Os picos das fases δ-TiN e ε-Ti
2
N são de pouca intensidade neste caso. Esse
padrão pode ser explicado pelo perfil de nitrogênio, no qual observam-se os estreitos patama-
res de concentração correspondentes às fases de nitretos.
76
Figura 5.1: (a) Padrão de difração em ângulo rasante igual a 0,5º;(b ) Perfil de nitrogênio.
(b)
(a)
Os perfis de nitrogênio apontam para a formação de um filme de nitreto estruturado,
tendo na região mais próxima à superfície a formação da fase δ-TiN
x
seguida da ε-Ti
2
N, for-
mando a “camada de compostos” que é seguida de uma zona de difusão. Essa característica é
corroborada pelo conjunto de difratogramas, em que se verifica que os picos relativo à fase δ-
TiN e ε-Ti
2
N tem suas intensidades máximas em ângulos de incidência diferentes, sendo que
a razão entre as intensidades (TiN/Ti
2
N) tende a diminuir com maiores ângulos.
Semelhantes resultados qualitativos são obtidos para todas as amostras nitretadas em
diferentes concentrações da mistura N
2
/H
2
. A influência da composição do gás remete para a
variação na estequiometria e espessura de cada fase formada conforme será discutido a seguir.
A literatura indica que os elementos de liga (Al,V) difundem em direção ao interior da
amostra e ocorre a formação de uma camada de alumínio segregada entre a camada de com-
postos e a zona de difusão [46,47,48].
Uma outra questão a ser observada é o processo em que essas fases são formadas. O
modelo de Walkowicz [10], detalhado no capítulo 2, descreve a inserção de nitrogênio em
uma matriz de ferro a partir da adsorção das espécies do plasma, sendo os íons moleculares
N
2
+
os predominantes. Aplicando esse modelo às ligas de titânio e considerando o fato de que
a cinética de crescimento das camadas nitretadas obedece a uma lei parabólica [49,50], con-
clui-se que o processo de nitretação é controlado por difusão a partir da superfície para dentro
do material.
Sendo assim, o processo de formação da camada de nitreto condiz com o modelo su-
gerido por Zhecheva [51] para nitretação gasosa, onde tem-se inicialmente a inserção de ni-
trogênio nos interstícios da rede do titânio, formando solução sólida α−Ti(N). Ao atingir o li-
mite de solubilidade ocorre a precipitação da fase ε-Ti
2
N. A faixa de concentração de nitrogê-
nio dessa fase é muito estreita (figura 2.7), e assim, quando por difusão, tenta-se adicionar ni-
trogênio em quantidade maior, precipita-se a fase δ-TiN. É importante frisar que no diagrama
de fase de equilíbrio, é necessária a previa estabilização da fase ε-Ti
2
N para possibilitar a
existência da fase δ-TiN. Porém, considerando que as fases ε e δ surgem por nucleação e cres-
cimento de modo reconstrutivo, a cinética do processo pode permitir uma transformação dire-
ta de α-Ti(N) para δ-TiN
x
se o aumento do teor de nitrogênio for mais rápido que a taxa de
nucleação de ε-Ti
2
N consegue acomodar.
Compatível com esse comportamento se observa (do interior para a superfície) em ge-
ral um patamar de ε-Ti
2
N. Apenas nos perfis de nitrogênio das amostras nitretadas a 500 ºC a
77
taxa de difusão é muito pequena e somente na região da superfície os limites de solubilidade
de α-Ti(N) foram atingidos. Por outro lado, observa-se a formação (ou tendência) da fase ε−
Ti
2
N, e isto significa dizer ela pode ter sido formada nos estágios iniciais do processo e após,
transformada para a fase δ. Outra hipótese para esta observação é devida a Raveh [52], que
afirma que os átomos de titânio que são desbastados por bombardeamento das espécies do
plasma com a superfície da amostra reagem com nitrogênio ainda no estado gasoso e então
ocorre uma deposição de TiN na superfície da amostra seguida de difusão de átomos de nitro-
gênio para o interior da amostra. Entretanto, esse mecanismo não deve ser o dominante na ni-
tretação, pois a taxa de desbaste de átomos de titânio pelos espécimes do plasma é muito pe-
queno e torna-se cada vez menor na medida em que a camada de nitreto vai se formando [53].
5.2 Estequiometria, Espessura das Camadas e Tamanho de Grão
Uma importante dependência da estequiometria da fase δ-TiN
x
com os parâmetros de
nitretação é observada nas amostras confeccionadas neste trabalho. A figura 5.2 ilustra esse
comportamento.
Figura 5.2: Variação da estequiometria da fase TiN
x
com os parâmetros de nitretação.
Em linhas gerais, quanto maior a temperatura e quantidade de nitrogênio da atmosfera
de nitretação, mais rapidamente se alcança a composição estequiométrica TiN na amostra. A
78
discrepância no ponto referente à condição de nitretação com temperatura de 700 ºC em at-
mosfera de 40%N
2
pode ser devida a uma contaminação de amostra, como mencionado no
capítulo anterior.
Obtivemos, nesse trabalho, duas condições que atingiram a condição estequiométrica
da fase TiN. Em ambos os casos a temperatura de tratamento foi de 700 ºC e as misturas fo-
ram as de 60%N
2
+ 40%H
2
e 80%N
2
+ 20%H
2
. Esta última condição demonstrou ser a ideal
para possíveis aplicações, pois além de propiciar a formação da fase estequiométrica, tem a
maior taxa de crescimento de filme, como será demonstrado a seguir.
A dependência da formação de fase ε-Ti
2
N com as concentrações na mistura gasosa só
pode ser avaliadas para as amostras nitretadas a 600 ºC (figura 5.3), pois esta foi a única tem-
peratura em que a fase em questão foi observada dentro da profundidade amostrada nos perfis
NRA. Em todos os casos, a concentração obtida está acima da estequiométrica, o que indica
coexistência de ε-Ti
2
N e δ−TiN. Isso pode ser atribuído ao fato de que a interface entre essas
duas fases (TiN/Ti
2
N) possui uma certa rugosidade ou interpenetração, podendo haver contri-
buição das duas fases de nitreto originando um valor médio da concentração de nitrogênio.
Outra possibilidade é a presença de nitrogênio difundido nos contornos de grão, aumentando a
concentração aparente de nitrogênio nas medidas de NRA.
Figura 5.3: Variação da concentração de nitrogênio da fase ε-Ti
2
N com o percentual de nitro-
gênio na atmosfera nitretante.
79
O valor da concentração de nitrogênio no patamar correspondente à fase ε na tempera-
tura de 600 °C depende da mistura gasosa, tendendo ao valor estequiométrico desta fase na
medida em que o gás se torna mais pobre em nitrogênio. Na mistura 50Vol%N2-50Vol%H2 é
verificada um desvio dessa tendência. Este comportamento será discutido mais a frente.
A faixa de energia utilizada nas análises de NRA foi de 429 keV (condição para quan-
tificar átomos de nitrogênio na superfície) até o limite de 450 keV, devido a restrições técni-
cas do acelerador de íons em acelerar os prótons a energias maiores. Desta forma, é possível
apenas avaliar a espessura total das camadas nitretadas quando o tratamento é executado em
500 ºC e da fase δ-TiNx quando as nitretações são realizadas em 600 ºC. Nas amostrar nitreta-
das a 700 ºC é possível afirmar que possuem camadas mais espessas de δ−TiN compara-
das com os filmes obtidos nas demais temperaturas.
Dada a possibilidade de utilização do sistema FIB (Focused Ion Beam), foi obtida a
micrografia de algumas amostras, revelando que nitretações a 700 ºC formam camadas de ni-
tretos maiores que 2 μm (figura 5.4(b)).
Figura 5.4: Micrografias obtidas no sistema FIB. (a) uma imagem no modo de elétrons se-
cundários mostrando a região do recorte efetuado com o feixe de íons. (b) uma imagem obtida
com o feixe de íons indicando, em detalhe, a camada nitretada com espessura maior que 2 mi-
crômetros e a estrutura de grãos sob esta camada.
Inicialmente a amostra nitretada a 700 ºC foi conformada com o feixe de íons de Ga de
30 keV para obter um corte transversal do filme de nitretos.
Na figura 5.4 (a) se vê uma micrografia de elétrons secundários mostrando a superfície
nitretada rugosa e vários recortes retangulares, onde o feixe de gálio removeu material, expon-
do cortes transversais da camada nitretada.
80
(b)
(a)
Está mostrada na figura 5.4 (b) uma imagem obtida com um feixe de Ga a 30 keV,
varrendo a parede lateral do recorte, detectando os elétrons secundários gerados na sua intera-
ção. O contraste gerado é distinto da imagem convencional de elétrons secundários por causa
do fenômeno de canalização de íons. É possível distinguir na superfície a camada nitretada so-
breposta aos grãos de α-Ti e β-Ti (contraste de orientação).
Considerando a dificuldade em obter os dados de FIB para todas as amostras e levan-
do em conta que as intensidades dos picos de difração dependem da espessura do filme, a par-
tir da variação das intensidades desses picos em função dos parâmetros de nitretação, é possí-
vel fazer uma avaliação qualitativa de como estes influenciam na formação das camadas.
A figura 5.5 mostra a variação das intensidades dos picos de difração das fases em
função da concentração de nitrogênio na mistura gasosa para as amostras nitretadas a 700 ºC,
medidas no ângulo de incidência rasante de 1,0º. Utilizamos os valores dos picos mais inten-
sos de cada fase para a contabilidade das intensidades, ou seja, para a fase δ-TiN utilizamos o
pico referente aos planos (200) e para a fase ε-Ti
2
N o relativo aos planos (111). Esses picos
não tem a mesma intensidade intrínseca e não permitem uma análise quantitativa, apenas a
comparação de quantidades relativas entre os diferentes filmes. Deve-se lembrar que as cama-
das são estruturadas e a intensidade dos picos é influenciada pela espessura da camada supe-
rior que, por sua vez, também depende da condição de nitretação, proporcionando diferentes
percentuais de absorção. Essa é em parte a razão para que a intensidade do pico da fase ε-Ti
2
N
seja em geral menor que o da fase δ-TiN.
81
Figura 5.5: Histogramas das intensidades dos picos δ-TiN (200) e ε-Ti
2
N (111) das amostras
nitretadas a 700 ºC em função da concentração de nitrogênio na atmosfera de nitretação.
Observa-se um decréscimo gradativo da intensidade dos picos da fase ε-Ti
2
N com o
aumento na quantidade de nitrogênio na mistura N
2
/H
2
. A soma dos picos para cada amostra
nitretada a 700 ºC é mostrada na Figura 5.5 (b). A intensidade do pico da fase ε-Ti
2
N é sem-
pre menor que o da fase δ-TiN.
O mesmo procedimento foi utilizado para obter a variação da intensidade dos picos em
função da mistura utilizada durante o processo de nitretação a 600 ºC e é exibida na figura
5.6.
Figura 5.6: Histogramas das intensidades dos picos δ-TiN (200) e ε-Ti
2
N (111) das amostras
nitretadas a 600 ºC em função da concentração de nitrogênio na atmosfera de nitretação.
Novamente, a condição que favoreceu a maior intensidade no pico de difração da fase
δ-TiN foi a mais rica em nitrogênio. Essa intensidade diminui conforme a quantidade de nitro-
gênio na mistura decresce. O comportamento da curva não é monótono, apresentando um li-
geiro aumento da intensidade na concentração de 50% similar ao que ocorre quando a nitreta-
ção é efetuada em temperatura de 700 ºC.
A variação na intensidade do pico da fase ε-Ti
2
N não é grande, mas a distribuição de
intensidades segue a tendência obtida para a fase δ-TiN
x
, sendo completamente distinta da ob-
servada nas amostras nitretadas a 700 ºC. Nesse caso, por ser mais fina, a primeira camada
não influencia tanto na intensidade dos picos da fase ε-Ti
2
N.
Nas amostras nitretadas a 500 ºC a intensidade dos picos das fases de nitreto foi baixa
demais para proceder a comparação.
A figura 5.6 (b) mostra a soma das intensidades dos picos referentes às duas fases dis-
cutidas.
82
O comportamento das intensidades dos picos de difração da fase δ nas amostras nitre-
tadas em 50Vol%N
2
-50Vol%H
2
sempre mostrou um desvio da linearidade. Ao avaliar o com-
portamento dos parâmetros elétricos (tensão e corrente) obtidos durante o processo de nitreta-
ção em função do percentual de nitrogênio na mistura observa-se uma indicação para o com-
portamento acima. A figura 5.7 mostra o comportamento da tensão e da corrente em função
da proporção de nitrogênio na mistura N
2
/H
2
.
Figura 5.7: Variação da tensão (a) e da corrente (b) de descarga em resposta à concentração
de nitrogênio da atmosfera de nitretação.
Enquanto que o valor da tensão para manutenção de uma dada temperatura decresce
com a concentração de nitrogênio de forma monótona e quase linear (linhas contínuas), a cor-
rente tem um comportamento não regular (linhas tracejadas), com tendências a maiores valo-
res com o aumento dessa concentração.
Percebe-se uma forte correlação entre os valores da corrente (figura 5.7 (b))com as in-
tensidades dos picos de difração (ou espessura de camada) mostradas nas figuras 5.5 e 5.6, ou
seja, maiores correntes implicam a formação de camadas mais espessas de nitreto.
Conforme o modelo de Walkowicz [10] os íons atômicos N
+
e moleculares N
2
+
são os
principais responsáveis pela inserção de nitrogênio no material, ou seja, partículas carregadas
são as mais importantes nesse processo. Esse resultado é compatível com o modelo, pois par-
tículas neutras não contribuem para a medida de corrente elétrica. Ainda segundo esse autor, o
papel da inserção de hidrogênio na atmosfera de tratamento é de modificar a condutividade do
gás, resultando na alteração dos parâmetros elétricos e seus subsequentes efeitos. Esta modifi-
83
cação na impedância do plasma pode explicar o comportamento particular observado para as
intensidades dos picos de difração para a condição de mistura 50Vol%N
2
-50Vol%H
2
.
Um aspecto observado nos filmes formados é a variação de tamanho de grão na cama-
da nitretada que pode influenciar o comportamento tribológico e de dureza do material. O ta-
manho médio de grãos das amostras produzidas foi calculado via largura dos picos de difra-
ção, utilizando a equação de Scherrer [37]:
0,9
cos
t
λ
β θ
=
(5.1)
onde λ é o comprimento de onda dos raios X empregados, β é a largura do pico em meia altu-
ra (em radianos) e θ é o ângulo de Bragg [37]. A figura 5.8 exibe os tamanhos de grão para as
diversas misturas de gás nas temperaturas de 600 ºC e 700 ºC.
Figura 5.8: Dependência dos tamanhos de grão para as fases δ-TiN
x
e ε-Ti
2
N com a condição
de nitretação.
Os grãos da fase ε-Ti
2
N apresentam tamanhos maiores que os da fase δ-TiN, e ambos
tendem a crescer com o aumento da temperatura. Tal comportamento pode ser atribuído ao fa-
vorecimento da nucleação das fases em temperaturas mais elevadas.
O tamanho de grão não parece variar significantemente com a composição da atmosfe-
ra, embora exista uma flutuação dessas medidas referentes à fase ε-Ti
2
N.
84
5.3 Espalhamento Raman
Tendo em vista que a profundidade analisada com o Raman é de aproximadamente 25
nm, foi feita uma média da estequiometria nessa região e comparada com a razão entre as
áreas das bandas óticas e acústicas. A Figura 5.9 apresenta a variação da razão das áreas das
bandas óptica e acústica com a composição do nitreto de titânio obtida com NRA.
O ponto correspondente à amostra nitretada a 700 ºC na atmosfera com 40 vol% N
2
não utilizado na figura 5.8, por causa da aparente contaminação na superfície que impede a
avaliação da concentração de nitrogênio (ver figuras 4.4 e 5.2).
Figura 5.9: Variação da razão das áreas das bandas óptica e acústica com a estequiometria do
nitreto de titânio.
A distribuição dos pontos sugere uma curva exponencial. A linha tracejada permite ter
uma idéia quantitativa da concentração de nitrogênio na amostra a partir do espectro Raman.
O ajuste empírico com uma exponencial entre a razão de áreas das bandas e a estequiometria
da fase δ-TiN
x
é dada pela equação 5.2:
6 12,62
( / ) 0,67 1,61 10
X
R O A e
= + ×
(5.2)
Alternativamente, pode-se determinar a estequiometria a partir do espectro Raman
pela função inversa da equação 5.1:
85
6
1 ( 0,67) 10
ln
12,62 1,61
R
X
×
=
(5.3)
A razão adotada entre as áreas dos picos é uma medida das quantidades relativas entre
defeitos provocadas por vacâncias, e a curva informa que a produção de defeitos na sub-rede
metálica cresce drasticamente com a incorporação de nitrogênio.
O controle e conhecimento das características dos nitretos de titânio produzidos são
necessários para atestar sua qualidade e aplicabilidade. Entretanto, as diversas técnicas para
análise composicional possuem limitações intrínsecas que impossibilitam sua utilização, tais
como a necessidade de que as amostras sejam compatíveis com alto vácuo, restrições quanto
ao tamanho e geometria das amostras e em outros casos por serem técnicas destrutivas. Nesse
contexto, a espectroscopia Raman pode servir como uma técnica não destrutiva e de grande
flexibilidade para análise semi-quantitativa da concentração de nitrogênio na superfície de ni-
tretos de titânio.
Como teste da validade da equação 5.3, utilizamos a razão entre os picos do espectro
Raman da amostra contaminada (O/A = 0,924) para estipular sua verdadeira concentração.
Como resultado temos X ~ 0,95, uma estequiometria bem acima da obtida via análise por rea-
ção nuclear. Essa diferença está ilustrada na figura 5.10.
Figura 5.10: Variação da estequiometria da fase TiN
X
com os parâmetros de nitretação. (a)
cópia da figura 5.2; (b) cópia da figura 5.2 com a correção efetuada.
86
O resultado da correção parece corresponder melhor ao esperado, sistematizando a
tendência de concentração de nitrogênio maior para 700 ºC em todas as atmosferas. A razão
entre os picos do espectro Raman mostrou-se não influenciado pela contaminação.
Foi proposto na literatura [43] que as posições dos picos poderiam ser utilizadas para
avaliar a concentração de nitrogênio na amostra. Entretanto, resultados obtidos por diferentes
autores para a variação da localização dos picos em função da estequiometria são conflitantes:
Para alguns autores [43,45,54], todos os picos de primeira ordem tendem a se deslocar para
menores valores com o aumento da concentração de nitrogênio. Por outro lado foi reportado
por Logothetidis [44] um comportamento contrário para a banda óptica. No presente trabalho,
ocorreram variações na posição dos picos, porém isso se deu de forma aparentemente aleató-
ria, sem relação com a temperatura ou estequiometria. Os valores flutuaram em torno de ~
203 cm
-1
(TA), ~ 302cm
-1
(LA) e ~ 557cm
-1
(TO).
Nos resultados desse trabalho foram observadas alterações significativas na largura a
meia altura dos picos (FWHM) em função das condições de tratamento, sendo este parâmetro
mais largo para menores temperaturas e/ou concentração de nitrogênio (figura 5.11).
Figura 5.11: Dependência da largura do pico referente à banda TO com a estequiometria da
fase δ-TiN
x
.
Uma vez que a largura dos picos está relacionada com a ordem da rede cristalina, o
comportamento observado pode ser interpretado como uma medida da desordem da rede. A bai-
xa concentração de nitrogênio promove maiores números de defeito justificando as observações
efetuadas. A colisão dos íons com o material durante o processo de nitretação promove a desor-
87
dem da rede. Entretanto, simultaneamente à nitretação, ocorre um recozimento da amostra que
tende a reordenar a rede, sendo mais eficiente quanto maior a temperatura. Isso explica a redu-
ção da largura dos picos para as amostras nitretadas em 600 ºC e 700 ºC.
88
Capítulo 6
Conclusões
89
6 – Conclusões
O presente trabalho constituiu de duas etapas, a saber: i) modificação, otimização e de-
senvolvimento de um sistema de nitretação a plasma; e ii) confecção e caracterização de
amostras de Ti-6Al-4V nitretadas neste sistema, variando a composição da mistura N
2
/H
2
e a
temperatura das amostras durante o processo. As conclusões apresentadas estão subdivididas
de acordo com estes dois tópicos.
6.1 Sistema de Nitretação
Foi desenvolvido um sistema de nitretação a plasma com controle de diversos parâme-
tros que influenciam na característica final das peças nitretadas. O sistema permite escolher e
ajustar com precisão a temperatura, a pressão, a composição da atmosfera nitretante e o fluxo
de gás. A homogeneidade da superfície nitretada foi melhorada otimizando as geometrias dos
eletrodos.
Testes de reprodutibilidade foram bem sucedidos, mostrando a confiabilidade do siste-
ma desenvolvido.
De todas as condições de nitretação neste trabalho, em apenas uma (20% N
2
+ 80% H
2
a 700 ºC e 10 Torr) a fonte de alimentação DC não atingiu a estabilidade necessária à forma-
ção do plasma, devido à formação de grande quantidade de descargas no interior da câmara. A
implementação de um dispositivo de proteção na fonte DC contra a formação de descargas é
sugerida como medida de otimização do sistema.
90
A possibilidade da utilização da fonte RF em trabalhos futuros está garantida a partir
de testes preliminares efetuados no sistema. A utilização desta fonte em trabalhos futuros vai
evitar a formação de arcos elétricos, promover a formação de camadas mais espessas de nitre-
tos em menor tempo e temperaturas de tratamento, além de flexibilizar a utilização do sistema
para a nitretação de peças não metálicas.
Disponibilizou-se, portanto, no Instituto de Física da UFRGS, um sistema que permite
a fabricação de nitretos pela técnica de nitretação a plasma numa grande variedade de condi-
ções, possibilitando o desenvolvimento de trabalhos acadêmicos e tecnológicos.
6.2 Caracterizações
Amostras da liga de Ti-6Al-4V foram nitretadas com sucesso sob diferentes condições
de temperatura e composição da mistura gasosa N
2
/H
2
. A influência dessas mudanças na for-
mação da camada nitretada foi analisada com o uso das técnicas de difração de raios X em ân-
gulo rasante, análise por reação nuclear e espectroscopia micro-Raman.
A temperatura é o parâmetro mais importante no processo de nitretação, tanto no que
diz respeito a estequiometria da fase δ-TiN quanto na espessura da camada.
A impedância do gás depende da relação N
2
/H
2
apresentando os menores valores (que
correspondem às maiores densidades de corrente) na composição contendo 80 e 50% de nitro-
gênio respectivamente. Nessas condições, também foram obtidas as camadas mais espessas de
nitreto de titânio estabelecendo a correspondência entre a corrente iônica e a espessura da ca-
mada nitretada.
A condutividade do gás não predominou na determinação da estequiometria da cama-
da. Para as temperaturas mais elevadas, a concentração x de nitrogênio em TiNx diminuiu
com o empobrecimento de nitrogênio no gás. Obtivemos a situação estequiométrica (TiNx=1)
em duas condições: 80% N
2
+ 20% H
2
e 60%N
2
+ 40% H
2
, ambas a 700 ºC.
Confirmou-se, a partir das medidas de GIXRD e NRA, o caráter estratificado da cama-
da nitretada, onde a fase cúbica δ-TiN localiza-se na superfície e a tetragonal ε-Ti
2
N logo
abaixo formando então a chamada camada de compostos. Abaixo desta camada verificou-se a
presença de zona de difusão em α-Ti(N).
91
Medidas de espectroscopia Raman confirmam a formação de δ-TiN na superfície das
amostras. A observação do espectro permite avaliar qualitativamente a estequiometria da ca-
mada. O ajuste com curvas gaussianas foi utilizado para obter uma análise semi-quantitava
que concorda bem com medidas feitas com técnicas convencionais. O procedimento proposto
possibilita a execução de uma análise rápida em amostras de formato e tamanhos variados que
seriam inviáveis ou muito caras utilizando algumas técnicas usuais.
6.3 Propostas de Continuidade do Projeto de Nitretação
1. Confecção de fonte DC para controle via computador;
2. Caracterização sistema frente a utilização da fonte RF;
3. Análise da composição do plasma in situ utilizando o sistema de espectros-
copia ótica do Laboratório de Microanálise;
4. Implementação de uma bomba difusora para diminuir a pressão de base do
sistema;
5. Implementação de mais dois controladores de fluxo para a inserção de dife-
rentes gases durante o processo (Metano ou Acetileno) para a produção de filmes
(DLC, por exemplo) sobre o nitreto - geometria duplex;
6. Implementação do sistema tipo gaiola para eliminar os efeitos de borda na
nitretação;
7. Estudo dos mecanismos de formação dos nitretos;
8. Caracterização micro-estrutural e nano-estrutural da camada nitretada;
9. Caracterização da microdureza dos materiais nitretados em função das con-
dições de nitretação;
10. Estudo do efeito da inclusão de outros gases (C, O, etc) durante o processo
de nitretação.
92
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