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Desenho Urbano e Bairros Centrais de São
Paulo
Um estudo sobre a formação e transformação do Brás,
Bom Retiro e Pari
Decio Amadio
FAU-USP
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Desenho urbano e bairros centrais de São PDesenho urbano e bairros centrais de São P
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Desenho urbano e bairros centrais de São P
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Um estudo sobre a formação e tansformação do Brás,Um estudo sobre a formação e tansformação do Brás,
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. Adilson C. Macedo
Decio AmadioDecio Amadio
Decio AmadioDecio Amadio
Decio Amadio
Tese de Doutorado
Área de Estruturas Ambientais Urbanas
Curso de Pós-Graduação
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da
Universidade de São Paulo
São Paulo, 2004.
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III
Agradecimentos
Este trabalho não seria realizado sem a colaboração generosa de tantas pessoas
envolvidas, às quais retribuo com imensa gratidão:
Primeiramente ao meu orientador, Prof. Dr. Adilson Costa Macedo, que
pacientemente esteve presente na elaboração e nas fases decisivas do trabalho
de tese, compreendendo os momentos de “silêncio”, que foram muitos. Aprendi
com o amigo e professor a insistência em delimitar os campos do arquiteto e
urbanista na análise que um trabalho de pós-graduação deve apresentar.
Igualmente grato sou à banca de qualificação, formada pelos Prof. Dr. Lúcio
Gomes Machado e Prof. Dr. Vladimir Bartalini, pelos comentários ao que havia
sido realizado até então e por relevar as possibilidades de complementação da
pesquisa, o que sem dúvida, se constituiu em valiosa contribuição à tese.
À Profª. Drª Cristina Leme e ao Prof. Dr. Paulo Bruna, pelos conteúdos abrangentes
dos seus cursos, que auxiliaram o desenvolvimento dos trabalhos programados,
e por conseqüência, a estruturação da pesquisa e dos enfoques desenvolvidos.
Ao apoio solidário e amigo do arquiteto Alfredo Francelino Faljana, em todo o
árduo processo de montagem dos levantamentos cartográficos, observações
sobre a estruturação do trabalho, conversas voltadas ao tema e à competente
editoração.
Aos colegas professores da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo Braz Cubas,
particularmente a Paulo José Amaral, pelo auxílio permanente na área da
habitação social, Carlos Costa e Marcelo Novaes, pelas importantes imagens.
A todos os alunos pelas lições que juntos aprendemos e particularmente à Márcia
Maria Fonseca e Tatiana Tâmbara Francisco, pelo trabalho de compilação da
hemeroteca. À France Iwashita pela ajuda nas pesquisas iniciais e Wanderléa
Steidle, pela amizade e apoio.
À equipe da Secretaria Municipal de Planejamento do Plano Diretor Estratégico
de São Paulo, coordenado por Ivan Maglio, pelas valiosas contribuições a este
trabalho.
À Helena Mena Barreto, pela cessão do material e de todos os colegas arquitetos
que elaboraram as pesquisas e propostas dos PRIHs, que constaram das pesquisas.
A todos colegas de trabalho na Sub-prefeitura Sé e do Procentro.
Aos amigos da Regional da Sé, da gestão 1989-1992, pela vivência das duras
questões ligadas à gestão pública desta cidade, particularmente ao prof. Vicente
y Plá Trevas e ao prof. Rubens Possati.
V
Aos funcionários das bibliotecas da FAUUSP e SEMPLA, que viabilizaram a coleta
do material cartográfico e de pesquisa.
Aos funcionários do Departamento do Patrimônio Histórico, da Prefeitura de São
Paulo, que igualmente o fizeram.
Aos urbanistas Clementina De Ambrosis e Domingos Theodoro de Azevedo Neto,
que além da sua dedicada colaboração profissional à cidade, traduziram o
resumo do trabalho para o italiano e também ao amigo Stephen McGee, na
versão para o inglês.
A todos os amigos e colegas da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo de São
José dos Campos, experiência inesquecível de ensino, de luta e de trabalho para
rumos diferentes ao exercício profissional e ao país.
Dedico este trabalho à Tereza Cristina Vespoli, minha companheira de vida e de
mundos, que divide comigo a crença e a luta dos dias. Agradeço igualmente o
seu auxílio em todos os momentos, à sua competente contribuição urbanística e
à editoração dos mapas temáticos que constam neste trabalho.
Dedico in memorian este trabalho àquelas pessoas que instigaram a permanente
inquietação social, política e profissional, sem esquecer a dimensão humana
que deve acompanhar o fazer:
À Daisy Amadio Fujiwara, minha irmã amada
À Mayumi Watanabe e Sérgio de Souza Lima, meus mestres queridos.
VII
1. P1. P
1. P1. P
1. P
refáciorefácio
refáciorefácio
refácio
Este trabalho analisa alguns dos resultados da construção da cidade de São
Paulo no tempo e pautou-se por investigar o desenho urbano de uma região
determinada, os bairros centrais, encontrando no seu caminho os desafios que
são colocados pelo método e pela objetividade de enfocar o tema e a área.
Desculpando-me pelo resultado final, que sempre exige outros prováveis
aprofundamentos, o trajeto de realização de um trabalho de pós-graduação,
todos que o fizeram ou o estão elaborando, sabem que não é tão linear como se
supunha inicialmente ser. Em parte, deve-se a isso a contingência de realizá-lo
juntamente com outras atividades profissionais, o que coloca difíceis momentos
para a sua continuidade.
A pesquisa realizada sofreu, portanto, em primeiro lugar, as limitações do próprio
autor, mas foi enriquecedor o aprendizado que o trabalho proporcionou em seu
curso. Sua proposta inicial se baseou nas indagações a respeito da produção da
forma urbana de determinados bairros centrais de São Paulo, em comparação
aos demais que circundam o centro da cidade. Os bairros delimitados, Bom
Retiro, Brás e Parí, foram fruto de um processo de ocupação histórico heterogêneo
e popular, confrontados com os outros que, de maneira diferenciada foram
estruturados.
Um dado significativo que os diversos estudos e trabalhos técnicos pesquisados
permitiram observar, foi o da morfologia urbana existente nos bairros da cidade
ter se mostrado um campo quase que exclusivo dos geográfos. Certamente, não
era desconhecida pelos arquitetos e urbanistas, que se viram na contingência de
formular propostas de Planejamento Urbano para São Paulo, mas ao se
generalizar diretrizes e instrumentos, foram privilegiadas as concepções tecno-
funcionalistas em várias propostas, que não deram atenção aos importantes
aspectos do mosaico estabelecido em cada fração da vida citadina. Com isso a
relação entre espaço e ambiente foi dissociada, apesar de dever nortear o
pensamento urbanístico.
As pesquisas no campo do desenho urbano buscam superar as incompatibilidades
da relação entre cidade, paisagem urbana e edifício, criadas pela divisão das
escalas edifício-cidade e este trabalho se volta a compreender os componentes
de uma estruturação urbana específica, que se traduziu em um ambiente com
diferentes formas de apropriação do território, diferentes tipologias e diferentes
soluções para os objetivos de moradia, trabalho e outras atividades ligadas à
vida de sua população, resultando em um urbano síntese das arquiteturas ou no
seu inverso, uma arquitetura plural e coletivamente estruturada.
Nesse sentido, nos passos iniciais deste trabalho, optou-se por uma reflexão
sobre bairros como o Bom Retiro, Ponte Pequena, Pari, Canindé e Brás, situados
junto à centralidade de São Paulo, mas com grande parte das vantagens dessa
localização sub-aproveitadas, fruto de um processo de esvaziamento populacional
e de deterioração física e ambiental que não encontrou na legislação do
zoneamento que vigorou de 1972 a 2002, ou de outras estratégias urbanísticas,
possibilidades de transformação para melhores padrões de qualidade urbana.
Esse quadro indicou a necessidade de se recorrer ao campo do Desenho Urbano
como forma de compreensão dos processos envolvidos na estruturação desses
bairros e das suas características atuais, destacando as suas formas de ocupação,
seus elementos tipológicos e paisagísticos, isto é, seus elementos de configuração.
Para tanto, a metodologia de abordagem do trabalho, que foi apresentada
preliminarmente no plano de pesquisa, mereceu ser revista e ampliada, para
abarcar as questões urbanas envolvidas.
A investigação propôs hipóteses iniciais que foram confirmadas no seu transcorrer:
necessidade de adensamento dos bairros com infra-estrutura, valorização de
seu patrimônio construído, melhoria da sua qualidade arquitetônica e ambiental,
etc. Foram muitas as propostas urbanísticas concretizadas que coincidiram com
o tempo de elaboração desta tese e que deram sustentação à necessidade de
transformação dos espaços colocados em foco.
Merece destaque o fato de ter ocorrido nos últimos quatro anos um debate
diferenciado sobre a cidade, que levou não apenas à formulação e aprovação
do novo Plano Diretor Estratégico, mas também, e pela primeira vez, à elaboração
de Planos Regionais. Essa nova escala de atuação urbanística no território
proporciona, pelo menos potencialmente, a mudança das abordagens e temas
relacionados aos espaços da cidade e com isso, maiores oportunidades para
ações direcionadas à realidade e problemática local.
Contribuiu também para a estruturação deste trabalho, a prática com ensino de
Desenho Urbano, enfocando as questões do espaço da área central de São
Paulo e de seus bairros vizinhos. Dentro disso, a pesquisa de características
morfológicas, a problematização sobre a ociosidade da ocupação habitacional
e o processo de deterioração do espaço construído, versus as potencialidades
existentes nos bairros centrais, tornaram-se temas presentes cotidianamente e
provocaram um sem número de indagações sobre as perspectivas de
transformação e superação dos problemas existentes desses lugares, vinculando-
os a novos padrões de qualidade urbana e a uma outra imagem de São Paulo,
sempre relacionada aos símbolos arquitetônicos e urbanísticos das áreas de
maior padrão econômico, apagando da memória urbana, espaços altamente
significativos e importantes para a vida do conjunto de sua população.
IX
Outro fator se colocou em auxílio para a escolha do tema e para o
desenvolvimento da pesquisa, que foi o de ter vivenciado pessoalmente essa
região e aprendido com sua organização espacial e social a dinâmica de um
bairro heterogêneo, repleto de contrastes, interrelacionado a outros com as
mesmas características. Este trabalho procura também entender determinados
eventos ou acontecimentos espaciais, que não estavam ao alcance de uma pessoa
que, há décadas atrás, andava por ruas semeadas de casas e fábricas e viajava
de bonde para fazer alguma rara compra “na cidade”, como era chamado o
Centro. A memória pode até se afastar das pessoas, mas permanece gravada
no traçado das ruas, nos limites entre os bairros, sempre subjetivamente fixados,
nas construções modestas e aquelas com maior pretensão, nas sensações dos
espaços diferenciados no mesmo bairro, enfim, percepções que se são pessoais,
foram e continuarão a ser estruturadas coletivamente na cidade e em suas partes.
Buscou-se desenvolver o trabalho a partir de um entendimento sobre a
estruturação do anel de bairros que circunda o Centro de São Paulo, uma vez
que nele ocorreu a diferenciação entre os setores urbanos da cidade. Foram
examinados os processos decorrentes da implantação da infra-estrutura de
transporte, da fixação diferenciada das tipologias habitacionais e do papel
desempenhado pelas políticas do setor público. Essa abordagem destacou os
principais elementos que intervieram na configuração dos bairros centrais, do
fim do século XIX até a atualidade.
A seguir, numa segunda parte, foi examinada em maiores detalhes a estruturação
dos distritos Bom Retiro, Brás e Parí, a fim de se identificar as especificidades
morfológicas de cada bairro, dentro do período 1930-2000. Esse
desenvolvimento reuniu a evolução do traçado, parcelamento e edificação,
relacionando também as ações que provocaram alterações na configuração.
A terceira parte incluiu uma definição de possíveis cenários para alguns dos
espaços desses bairros, não com o objetivo da simulação de projetos ou planos,
mas com o intuito de interrelacionar alternativas hoje já existentes, e que poderão
ser debatidas e aperfeiçoadas em proveito dos moradores e usuários dessas
áreas. Além disso, essa parte reúne o fechamento do trabalho através de suas
conclusões.
XI
RESUMO
Este trabalho analisa um setor urbano de São Paulo que é formado pelo anel de
bairros que envolve o núcleo central da cidade. Seu objetivo é identificar como
a espacialidade dos bairros centrais foi definida e para isso foram investigados
os agentes e fenômenos que regeram a formação desse setor urbano e como se
assemelharam ou diferenciaram dentro do processo de urbanização da cidade.
Foram focalizados três distritos em particular, o Brás, o Bom Retiro e o Parí, que
reúnem uma série de bairros cuja estruturação reporta a própria estruturação da
cidade. Buscou-se compreender as condicionantes que definiram as características
da morfologia urbana dos bairros mencionados e as mudanças ocorridas nessas
áreas, que se constituíram no primeiro locus da industrialização da cidade, e
que também abrigaram funções habitacionais e comerciais diversificadas.
A análise aborda a implantação da infra-estrutura de transportes na cidade,
considerando-a junto com a normatização do uso do solo, as principais
componentes da estruturação espacial dos bairros centrais até a década de
1940. A partir desse período, outros processos interferiram no arranjo desse
setor urbano, provocando ao mesmo tempo, a permanência das suas
características morfológicas e funcionais e uma crescente sub-utilização para
fins habitacionais.
O trabalho foi organizado em três escalas de abrangência para o estudo das
questões relativas ao tema:
.
Escala da cidadeEscala da cidade
Escala da cidadeEscala da cidade
Escala da cidade – envolvendo a macro-configuração, a estruturação dos
bairros centrais e as interfaces existentes no arranjo intra-urbano entre os bairros
e entre o núcleo central. Relação das políticas públicas com os aspectos ligados
à infra-estrutura, ao parcelamento e à edificação. Análise das características
funcionais e morfológicas gerais e tendências recentes de transformação.
.
Escala dos bairrosEscala dos bairros
Escala dos bairrosEscala dos bairros
Escala dos bairros – caracterização dos bairros centrais presentes nos distritos
Brás, Bom Retiro e Parí. Delimitação dos setores e sub-setores, estudo das
características funcionais e morfológicas. Planos e projetos incidentes e articulação
com as propostas de requalificação física-ambiental.
.
Escala localEscala local
Escala localEscala local
Escala local – estudo de alternativas e cenários para o desenho urbano local,
relacionando as propostas urbanísticas formuladas para essas áreas e hipóteses
de desenho urbano para espaços nesses bairros.
XIII
RIASSUNTO
Questo lavoro focalizza un settore urbano di S. Paulo che è formato dall’anello
di quartieri che avvolge il nucleo centrale della città. Il suo obijettivo è quello di
individuare in che modo si è andata formando la caratteristica spaziale dei quartieri
centrali e per fare ciò si é indadgato su quegli agenti e quei fenomini che
contribuirono alla formazione di questo settore urbano e in che modo si sono
somigliati o differenziati nel processo di urbanizazione della città.
Sono stati analizzati tre “distritos”
1
, in particolare: il “Brás”, il “Bom Retiro” e il
“Pari” che raggrupano una serie di quartieri la cui strutura si ricolega alla strutura
stessa della città. Si è cercato di capire i fattori piú marcanti che hanno definito lê
caracteristiche della morfologia urbana dei quartieri citati e i cambiamenti che
sono avvenuti in queste zone, “primo locus” dell’índustrializazzione della città e
che accolsero anche funzioni abitative e commerciali, le più diverse.
L’analisi focalizza la constituzione della strutura dei transporti, insieme alle norme
dell’uso del suolo, e i principali componenti della tipologia degli spazi in questi
quartieri centrali fino alla decade del 1940. Da questo periodo in poi vi furono
altri processi che hanno interferito nella sistemazione di questo settore urbano
provocando allo stesso tempo la conservazione delle sue caratteristiche
morfologiche e funzionali e nel tempo una scarza utilizzazione a scopi abitazionali.
Il lavoro è stato organizzato in tre gradi secondo l’ampiezza dell’argomento:
. Scala della città – comprendendo la macro-configurazione, la strutura dei
quartieri centrali e le relazioni esistenti nello spazio urbano trai i quartieri e il
nucleo centrale. Relazioni delle politiche pubbliche com gli aspetti legati all’infra-
strutura, alle lottizazione e alla edificazione. Analisi delle caratteristiche funzionali
e morfologiche generali nonchè recenti tendenze di transformazione.
. Scala dei quartieri – caratteristiche dei quartieri centrali presenti nei “distritos”
Brás, Bom Retiro e Pari.Delimitazioni dei settori e sotto settori, studio delle
caratteristiche funzionali e morfologiche. Piani e progetti esistenti e la loro sintonia
com le proposte di rivalorizzazione física e ambientale.
. Scala locale – studio delle alternative future per modelare i progetti urbanistichi
dei quartieri e il paesaggio locale.
1
La strutura amministrativa del território nazionale è composta da: stati, municipi e distriti.
XV
ABSTRACT
This work analyses an urban sector of São Paulo that is formed by a ring of
boroughs that surround the city centre. Its aim is to identify how the area of the
inner city boroughs was defined and in order to that we investigated the agents
and phenomena that governed the formation of this inner city sector and how it
differeciated itself within the city urbanization process.
Three boroughs in particular were focused on, “Brás”, “Bom Retiro” and “Parí”,
that gather together a series of neighbourhoods whose structures relate to the
structure of the city. We sought to understand the conditions that define the
characteristics of the urban morphology of the above mentioned boroughs and
the changes taken place in these areas, that constitute the first locus of the
industrialization of the city and housing and commercial diversities as well.
The analysis deals with the introduction of the infrastructure of the city transport
system, considering it together with the restoration of land use, the principle
components of the structure space of central neighbourhoods up until de 1940´s.
From this period on, other processes interfered with the arrangement of this urban
sector, causing at the same time, the unchanging morphological characteristics
and functions and a growing under-use for housing means.
The work was organized into three scales of understanding for the study of the
questions relative to the theme:
. City scale – involving the macro-configuration, the structure of the central
neighbourhoods and the existing interfaces on the infrastructure arrangement
between the boroughs and the city centre. The relation of public policies with
aspects linked to de infrastructure, the partitioning and the buildings. Analyses of
the functional characteristics and general morphologicals and recent transformation
tendencies.
. Neighbourhoods scale – characterization of the central neighbourhoods present
in the Brás, Bom Retiro and Parí. Outlining boundries of the sectors and sub-
sectors, study the functional and morphological traits. Planning and design incidents
and connetions with the environment requalification proposals.
. Local scale – study of alternatives and settings for local urban desing, relating to
the urban proposals put forward for these areas and possibilities of urban design
for spaces in these neighbourhoods.
XVII
SS
SS
S
umárioumário
umárioumário
umário
Agradecimentos pág. III
Prefácio pág. VII
Resumo pág. XI
1. Introdução pág. 01
1.1. Objetivos pág. 03
1.2. Justificativas e caracterização do problema pág. 04
1.3. Pressupostos e Hipóteses pág. 07
1.4. Metodologia pág. 08
PP
PP
P
arte Iarte I
arte Iarte I
arte I
1. Estruturação do anel de bairros centrais pág. 15
1.1 A industrialização emergente: o apito das fábricas
no cotidiano paulista pág. 29
1.2 A cidade e os novos requisitos de sua expansão pág. 38
1.3 A implantação da infra estrutura urbana pág. 50
1.4 Imbricação: transporte, energia e água pág. 52
1.5 Imbricação: sanitarismo, parcelamento do solo e
legislação urbanística até a década de 1930 pág. 68
1.6 Imbricação: sanitarismo e habitação popular nos
bairros centrais – cortiços e as vilas operárias pág. 81
1.7 Imbricação: infra-estrutura e novos bairros de alto
padrão – os bairros-jardim pág. 97
2. O quadro urbano a partir de 1930: área consolidada e formação
metropolitana pág. 107
2.1 A expansão da área urbanizada e novos elementos viários pág. 120
2.2 As propostas urbanísticas para a cidade: 1930-1960) pág. 127
2.2.1 Melhoramentos de São Paulo pág. 130
2.2.2 Relatório Moses pág. 139
2.2.3 Estudos para a Segunda Perimetral, Metrô
e proposta de Plano Diretor pág. 143
2.2.4 Estrutura Urbana da Aglomeração e
Relatório Planejamento pág. 146
2.3 Habitação popular: bairros centrais e periferia 1930-1960 pág. 151
2.4 Legislação: as setorizações consagradas pelas
normas urbanísticas pág. 157
3. As transformações do período 1960-1980 pág. 161
3.1 As propostas de Infra-estrutura e zoneamento do PUB
e PDDI pág. 170
3.2 Cidade Real: Transformações ao longo das
radiais do Plano de Avenidas pág. 180
3.3 Habitação: os espaços diferenciados para os ricos e pobres pág. 242
XIX
4. Período 1980 – década de 2000: novas relações presentes
na cidade pág. 249
4.1 Habitação e o mercado imobiliário pág. 253
4.2 A cidade e as novas ocupações industriais e de serviços pág. 261
4.3. Operações Urbanas: Remodelações dirigidas e
espacialidade corporativa pág. 267
4.3.1. Operação Urbana Água Branca pág. 268
4.3.2. Operação Urbana Faria Lima pág. 275
5. Considerações I pág. 291
PP
PP
P
arte IIarte II
arte IIarte II
arte II
6. Observações sobre a análise dos bairros centrais pág. 301
6.1. Distrito do Bom Retiro pág. 313
6.1.1. Luz pág. 313
6.1.2. Ponte Pequena pág. 320
6.1.3. Bom Retiro pág. 322
6.1.4. Análise dos sub-setores pág. 328
6.2. Distrito do Brás pág. 338
6.2.1. Análise dos Sub-setores pág. 347
6.3. Pari pág. 358
6.3.1. Análise dos sub-setores pág. 362
7. Considerações sobre a estruturação do Bom Retiro, Brás e Pari pág. 403
PP
PP
P
arte IIIarte III
arte IIIarte III
arte III
8. As remodelações da década de 1980 e 1990 pág. 407
8.1. Parque do Tietê pág. 410
8.2. Maharishi Tower pág. 418
8.3. Breves comentários sobre o Parque do Tietê e
Maharishi Tower pág. 423
9. Requalificação dos bairros centrais pág. 425
9.1. Programa reconstruir o centro pág. 427
9.2. Projetos nos bairros Brás e Parí pág. 429
9.3. Propostas do Programa de Habitação no Centro pág. 431
9.3.1. Programa de Reabilitação Integrada
do Habitat – PRIH pág. 433
9.3.2. Conjunto Hab. para o Bom Retiro – Parque do Gato pág. 438
9.4. Propostas do Progrma Habitacional CDHU pág. 440
9.5. Plano Diretor Estratégico pág. 443
9.6. Operações Urbanas Propostas pág. 448
9.7. Planos Regionais Estratégicos dos
Distritos Bom Retiro, Brás e Pari pág. 451
10. Considerações finais pág. 461
Bibliografia pág. 469
1
A
PRESENTAÇÃO
AA
AA
A
PRESENTPRESENT
PRESENTPRESENT
PRESENT
AÇÃOAÇÃO
AÇÃOAÇÃO
AÇÃO
2
3
A
PRESENTAÇÃO
1 Apresentação1 Apresentação
1 Apresentação1 Apresentação
1 Apresentação
1.1 - Objetivos1.1 - Objetivos
1.1 - Objetivos1.1 - Objetivos
1.1 - Objetivos
Este trabalho propõe um estudo para os bairros situados a norte, nordeste e
leste do núcleo central, contidos respectivamente no interior dos distritos Bom
Retiro, Pari e Brás, que objetiva:
. Compreender as condicionantes relativas ao uso e ocupação do solo, que
definiram a morfologia urbana dos bairros abordados. Para tanto será
desenvolvida uma análise da estruturação urbana e das mudanças ocorridas
nessas áreas, que se constituíram no primeiro locus da industrialização da cidade.
. Compreender as características urbanas que eles apresentam atualmente, sob
o ponto de vista funcional e morfológico, já que gradativamente deixaram de
abrigar a localização industrial desde as décadas de 1960 e 1970, transformando-
se em espaços de atividades comerciais especializadas e apresentando também
contínuo esvaziamento populacional a partir da década de 1970.
. O estudo das alternativas e cenários existentes para o desenho urbano local e
regional, relacionando as propostas urbanísticas formuladas para essas áreas e
analisando os possíveis desdobramentos das mesmas
Distritos centrais de São Paulo
4
1.2. Justificativas e caracterização do problema1.2. Justificativas e caracterização do problema
1.2. Justificativas e caracterização do problema1.2. Justificativas e caracterização do problema
1.2. Justificativas e caracterização do problema
Interessou-nos pesquisar, dentro do anel de bairros que circunda o Centro, aqueles
situados ao norte, nordeste e leste do núcleo central devido:
. A origem histórica dos setores escolhidos, ligados às ferrovias, à industrialização
e a formação social que os mesmos apresentaram.
. A inadequação urbanística de serem mantidas áreas sub-aproveitadas próximas
ao Centro, tanto pelos custos impostos à cidade, como também pelas
conseqüências físicas, ambientais e paisagísticas que um vasto setor urbano em
condições de visível precariedade impõe a ela.
. A existência nesses espaços de uma base territorial com disponibilidade de
áreas livres e baixa densidade populacional, que pode suportar um aumento do
número de moradores, aliado a ações revitalizadoras do ambiente urbano, quer
no sentido das suas funções, quer na sua paisagem.
Levando em conta esses aspectos, considerou-se que o processo de ocupação e
adensamento do território que envolve o núcleo central de São Paulo diferenciou
em profundidade os setores urbanos da cidade no que diz respeito ao caráter
funcional e morfológico. A partir da década de 1950 e mais intensamente ao
longo da década de 1960, ocorreu o fenômeno da expansão das atividades
centrais para fora do perímetro do centro tradicional, nas áreas que passaram a
abrigar novos pólos de negócios e serviços. Essa expansão esteve condicionada
ao setor sudoeste, já que por ali, tanto a base fundiária como a proximidade
com bairros de alta renda viabilizaram os investimentos imobiliários.
Os bairros situados ao norte, nordeste e leste da área central, por sua vez, se
constituíram historicamente em um território com a ocorrência de atividades
industriais, serviços voltados às camadas sociais mais populares e alta incidência
de habitação horizontalizada, com fraca presença de verticalização.
Relacionou-se a eles a existência de uma infra-estrutura voltada ao transporte
da população trabalhadora e de cargas, tais como ferrovias, estações e grandes
terminais de linhas de ônibus, além de zonas de comércio atacadista, vias de
tráfego pesado inter-regional, aliados a uma base fundiária fragmentada em
pequenas propriedades e com presença significativa de habitação de baixa renda,
representada pelos inúmeros cortiços. Com esse caráter urbano, mesmo se
localizando junto à centralidade, essas áreas localizadas em terras baixas das
várzeas dos rios Tietê e Tamanduateí, tiveram reforçada a tendência de
desvalorização ambiental e imobiliária.
A situação desses bairros revela simultaneamente um quadro de grande
complexidade e de igual potencialidade urbana. Grande parte da infra-estrutura
industrial encontra-se atualmente esvaziada e mesmo sucateada, por conta das
5
A
PRESENTAÇÃO
transformações estruturais no seio da economia brasileira, que acarretaram, no
âmbito regional, a mudança de uma parcela expressiva de indústrias para fora
do Município e até da Região Metropolitana de São Paulo. Junto a esse processo,
também foi intensificada a especialização terciária de regiões do Bom Retiro,
Brás e Pari, acarretando não apenas a substituição de uma atividade econômica
por outra, mas também repercussões para a população moradora daquelas
localidades. Observa-se nessas áreas um contínuo esvaziamento dos habitantes
nas últimas três décadas e baixo índice de novas construções com finalidade de
moradia.
A histórica característica de existência de uma mescla de habitação de classe
média com a popular, nos distritos do Bom Retiro, Pari e Brás, vem sendo
transformada por essa dinâmica de esvaziamento. Os dados do censo 2000,
divulgados pelo IBGE, demonstram que entre 1991 e 2000, o Bom Retiro perdeu
26,47 % dos moradores, o Brás 26,93 % e o Pari 31,82%.
Comparativamente com distritos Bela Vista e Santa Cecília, que embora perdendo
população mantiveram alta densidade, com 242,9 e 182,3 hab/ha.
respectivamente, aqueles focalizados por este trabalho, além da baixa densidade
populacional que possuem atualmente, demonstram que o processo de
esvaziamento se aprofundou com maior intensidade no período 1991/2000.
Aliada à deteriorarão de parte considerável dos edifícios e do ambiente urbano,
atualmente a reciclagem das antigas fábricas pode ser notada com certa
intensidade, visto se tratar de instalações adequadas para grandes depósitos,
mas dificilmente essas transformações por si só sejam indicadoras de melhorias
TCA TCA ÁREA Densidade
80/81 91/2000 km² hab/ha
B. Vista 85.333 71.825 63.143 -1,55 -1,42 2,6 242.9
B. Retiro 47.542 36.136 26.569 -2,46 -3,36 4 66,4
Brás 38.592 33.536 24.505 -1,27 -3,43 3,5 70
Cambuci 44.807 37.069 28.620 -1,71 -2,83 3,9 73,4
Consolação 77.264 66.590 54.301 -1,34 -2,24 3,7 146,8
Liberdade 82.392 76.245 61.850 -0,7 -2,3 3,7 167,2
Pari 26.942 21.299 14.521 -2,11 -4,17 2,9 50,1
República 60.940 57.797 47.459 -0,48 -2,17 2,3 206,3
Sta. Cecília 94.451 85.829 71.111 -0,87 -2,07 3,9 182,3
B. Funda 17.877 15.977 12.936 -1,02 -2,32 5,6 23,1
32.933 27.186 20.106 -1,73 -3,3 2,1 95,7
Belém 58.300 49.697 38.268 -1.44 -2,86 6 63,8
Mooca 84.501 71.999 63.211 -1,45 -1,44 7,7 82,1
T. distritos 751.874 651.185 526.600 -1,3 -2,23 51,9 101,5
MSP 8.493.226 9.646.185 10.405.867 1,16 0,85 1509 69
Fonte: FIBGE
Distritos Censo de
1980
Censo de
1991
Censo de
2000
6
nos padrões físicos- ambientais das áreas abordadas, uma vez que se prendem
aos interesses do capital comercial e imobiliário
Outros aspectos sobre a caracterização dessas áreas merecem ser mencionados:
1 A heterogeneidade existente no interior dos bairros, com áreas dominadas
pela incidência de numerosos cortiços, espaços com morfologia urbana do início
do século passado, setores ocupados com residências de classe média e áreas
que sofreram renovação urbana radical, como a que ocorreu no Brás, em que o
Metrô demoliu as quadras existentes que deram lugar, posteriormente, a
numerosos edifícios para a classe média, construídos pela COHAB.
2. A exigüidade de espaços livres no tecido urbano desses bairros, principalmente
no Brás, dado o intenso parcelamento do solo e a máxima utilização dos lotes,
características históricas do processo de urbanização. Em contrapartida, há grande
disponibilidade de áreas públicas sub-utilizadas e mesmo não utilizadas,
remanescentes da drenagem da várzea do rio Tietê e do posterior traçado da
avenida Marginal.
3. O predomínio de comércio especializado que ocorre em setores que se
tornaram referência para a cidade e mesmo para outras regiões do Estado e do
país: confecções no Brás e Bom Retiro, zona cerealista, madeireira e de couros
no Brás e comércio de utilidades domésticas e doces no Pari, etc. Nesses locais
a oferta de habitação é condicionada a edificações quase sempre deterioradas,
com alta incidência de cortiços horizontais ou verticais.
4. A diversificação social existente nesses bairros, com pequeno número de antigos
moradores italianos e portugueses, mesclados com imigrantes árabes e judeus
radicados há muitas décadas, migrantes nordestinos, e mais recentemente,
coreanos e os imigrantes da miséria existente nos países latino-americanos
vizinhos, os bolivianos e peruanos, que se constituem na mão-de-obra ultra-
barata para o setor de confecções, que domina o Brás e o Bom Retiro. Essa
população passou a ocupar significativamente os cortiços desses dois bairros
mencionados, além do Pari, Belenzinho e Vila Guilherme, devido à proximidade
das áreas de trabalho e oferta de equipamentos sociais de saúde e educação.
7
A
PRESENTAÇÃO
1.3 – P1.3 – P
1.3 – P1.3 – P
1.3 – P
ressupostos e Hipótesesressupostos e Hipóteses
ressupostos e Hipótesesressupostos e Hipóteses
ressupostos e Hipóteses
O processo de estruturação de São Paulo no período da sua industrialização
implicou na organização de um conjunto de bairros no entorno do núcleo central
da cidade e definiu uma especificidade funcional e morfológica da área da
pesquisa em relação aos demais bairros centrais. Essa dinâmica estabeleceu
uma hierarquia entre os mencionados bairros e considerando esse quadro, o
trabalho associou as seguintes hipóteses:
- As especificidades físico-ambientais do Bom Retiro, Brás e Parí, devem-se, além
das estabelecidas pela sua estruturação inicial, ao fato de após as décadas de
1940 e 1950, esses bairros serem contíguos ao Centro Velho, diferentemente
dos espaços ligados ao Centro Novo. Os lugares próximos ao Centro Velho
tiveram mantidas as condições “antigas” devido a ausência de intervenções
públicas dinamizadoras dos investimentos privados, como ocorreu com o mercado
imobiliário nos bairros centrais a sudoeste.
- As áreas abordadas garantiram ao longo de décadas uma reserva de solo
urbano com valores inferiores a outras localizações junto ao Centro, definidor
da posição hierárquica desses bairros na cidade. Isso não se deveu apenas à
heterogeneidade física e social do Bom Retiro, Pari e Brás, pois os bairros da
Lapa e Pompéia apresentaram nas primeiras décadas do século XX características
tipológicas semelhantes. Para estes últimos, foram decisivos nas décadas seguintes
dois fatores: localização junto à alta renda e junto ao setor terciário de elite.
Junto ao núcleo central, bairros como Bom Retiro, Pari e Brás, se constituíram
em ilhas do terciário inferior, ligados aos setores alimentício, de madeira, vestuário,
máquinas e peças, etc.
- Dadas as características atuais dos bairros pesquisados, os mesmos apresentam
condições para estruturar uma intensa transformação física-ambiental do setor
central da cidade de São Paulo, permitindo o adensamento populacional,
fundamentado na disponibilidade de áreas livres públicas em grande parte
ociosas, tais como a orla ferroviária e as áreas remanescentes do traçado da
avenida Marginal Tietê. A elas, somar-se-iam parcelas desse território que se
encontram atualmente estagnadas, mas que apresentam base fundiária para
aquele adensamento, aliada à oferta de transporte público já instalado.
8
1.4. Metodologia1.4. Metodologia
1.4. Metodologia1.4. Metodologia
1.4. Metodologia
O trabalho considerou o Desenho Urbano como campo do conhecimento, que
reúne os elementos interdisciplinares necessários para a identificação, análise e
proposição para o território enfocado. Para tanto, foram associadas três escalas
de abrangência e uma abordagem metodológica que permitiu a utilização de
diferentes instrumentos de análise, em função dos problemas que cada escala
envolveu:
.
A escala da cidadeA escala da cidade
A escala da cidadeA escala da cidade
A escala da cidade: relacionada à configuração macro, estruturação das áreas
enfocadas e as interfaces existentes no arranjo intra-urbano entre bairros e entre
eles e o núcleo central. Análise das características morfológicas gerais e tendências
recentes de transformação.
.
A escala dos bairros: A escala dos bairros:
A escala dos bairros: A escala dos bairros:
A escala dos bairros: relacionada à caracterização de setores e sub-setores,
suas características morfológicas, aspectos do uso e ocupação do solo.
. A escala local: . A escala local:
. A escala local: . A escala local:
. A escala local: projetos urbanos propostos, alternativas de desenho urbano
contemplando a valorização de espaços públicos, o adensamento habitacional,
equipamentos, etc.
Para a análise da estruturação dos bairros centrais, o trabalho seguiu a elaboração
metodológica de Solà-Morales, constituída das componentes “urbanização,
parcelamento e edificação”, que caracterizam as diferentes maneiras de
organização de ruas, terrenos e casas – infra-estruturas, parcelas e tipos. Esse
autor relacionou a urbanização às formas infra-estruturais dos traçados viários,
as redes de serviço, as margens de água, os nós de comunicação, os grandes
acessos, etc. O parcelamento foi relacionado ao desenho do solo com toda sua
variedade de formas, sistemáticas ou casuais, compostas geometricamente ou
por repetição, dependentes das situações topográficas, agrícolas e cadastrais
precedentes (Solà-Morales, 1997, 15).
Essas categorias permitem uma abordagem do processo histórico do crescimento
da cidade através de instrumentos pertencentes ao campo do arquiteto e urbanista,
segundo o autor mencionado. Isso ocorre porque, ao afirmar que para se entender
a forma urbana em toda sua variedade, significa entendê-la como o resultado
de idéias e projetos sobre “a forma da urbanização + a forma do parcelamento
+ a forma da edificação” e reconhecer a independência que possa existir em
cada uma dessas formas em relação às demais. Solà-Morales defende que dessa
forma ampliam-se os elementos para a pesquisa urbana, se comparado às
abordagens sobre os determinismos dos grandes processos sociais, que se
constituíram em um modismo teórico décadas atrás e que “priva o processo de
urbanização de toda a sua autonomia”, isto é, “adota a cadeia conceitual
industrialização-migrações-urbanização como paradigma causal de uma
seqüência quase indestrutível”, como afirma o autor (Solà-Morales, 1997, 14).
9
A
PRESENTAÇÃO
Relacionada à proposição de Solà-Morales, uma formulação da profª. Maria
Adélia de Souza sintetiza de forma exemplar o desafio colocado aos trabalhos
que desenvolvem estudos a respeito da urbanização: “a direção tomada por
essa expansão, num primeiro momento, pode ser determinada pelo espaço natural
ou pelo espaço produzido (ou pela combinação dos dois); e num segundo
momento, é quase exclusivamente determinada em função do espaço produzido
ou adaptado. Trata-se da sobreposição de um sítio social (fruto do trabalho do
homem) a um sítio natural, onde diferenciação de renda se assemelha a
diversificação morfológica (Souza, 1994, 181).
Para a abordagem do trabalho, adotou-se portanto:
. A compreensão de como as formas infra-estruturais e de parcelamento
transformaram o território enfocado, caracterizando-o em relação aos demais
espaços da cidade. Trata-se de estabelecer uma ligação entre os fatores
determinantes da estrutura espacial, os “poderes homogeneizantes” derivados
da abordagem a partir das relações de produção e os aspectos de
heterogeneidade, também relevantes para o conhecimento do espaço. Com
relação a estes, considera o estudo “Anotações sobre Espaço e Vida Cotidiana
que mesmo “um conceito-chave da análise das cidades, como o de tecido urbano,
busca uma continuidade que não verificamos no espaço cotidiano”, corroborando
a análise da profª. Maria Adélia, onde a heterogeneidade é um elemento intrínseco
no arranjo urbano. (Albano, Werneck, in Espaços & Debates 17, 1986, 37).
. A distinção da abordagem, daquilo que poderia se constituir em um registro
historiográfico. Para a pesquisa da estruturação dos bairros centrais recorreu-se
além das fontes bibliográficas, aos trabalhos sobre planos urbanísticos, legislação
e projetos que intervieram na configuração de São Paulo que, como no caso dos
transportes, “..sempre foram, em qualquer modo de produção, os maiores
modeladores do espaço, tanto intra-urbano, quanto regional”, como afirmou
Villaça (1998,136).
Para fundamentar a abordagem do trabalho, a abrangência das escalas propostas
e conceitos por ele utilizados, consideramos também as formulações do professor
Milton Santos sobre a relação região e lugar, presente no tema proposto e na
realidade fragmentada da cidade:
A região e o lugar não tem existência própria. A região e o lugar, aliás, definem-
se como funcionalização do mundo e é por eles que o mundo é percebido
empiricamente... A cada momento histórico, tais recursos (o capital, a população,
a força de trabalho, o excedente) são distribuídos de diferentes maneiras e
localmente combinadoslocalmente combinados
localmente combinadoslocalmente combinados
localmente combinados , o que acarreta uma diferenciação no interior do espaço
total e confere a cada região ou lugar a sua especificidade e definição particular.
Sua significação é dada pela totalidade de recursos e muda conforme o movimento
histórico ”(Santos, 1995, 131, grifo nosso).
10
Segundo Santos, para o estudo da sociedade e do espaço, o estudo da totalidade
da realidade social se mostra impossível de ser empreendido, sendo necessário
fragmentá-la para em seguida reconstruí-la. Para tanto o geógrafo propôs as
seguintes categorias que representariam o movimento da totalidade: Estrutura,
Processo, Função e Forma, definidoras do espaço em relação à sociedade (1997
57). Segundo o autor:
FF
FF
F
ormaorma
ormaorma
orma é o aspecto visível de uma coisa. Refere-se, ademais, ao arranjo ordenado
de objetos, a um padrão. Tomada isoladamente, temos uma mera descrição de
fenômenos ou de um de seus aspectos num dado instante do tempo.
FF
FF
F
unçãounção
unçãounção
unção, de
acordo com o Dicionário Webster, sugere uma tarefa ou atividade esperada de
uma forma, pessoa , instituição ou coisa.
EstruturaEstrutura
EstruturaEstrutura
Estrutura implica a inter-relação de
todas as partes de um todo; o modo de organização ou construção.
PP
PP
P
rocessorocesso
rocessorocesso
rocesso
pode ser definido como uma ação contínua, desenvolvendo-se em direção a um
resultado qualquer, implicando conceitos de tempo (continuidade) e mudança”
(idem, 50, grifo nosso).
Milton Santos também observou a inter-relação das instâncias urbanas,
caracterizando o espaço como a soma da paisagem (configuração geográfica)
e da sociedade. Quanto ao lugar e localização, afirma que não se pode confundi-
los, pois “o lugar pode ser o mesmo, as localizações mudam Esses conceitos
foram assim explicados:
“A
localizaçãolocalização
localizaçãolocalização
localização é resultante do movimento do mundo, apreendido em um ponto
geográfico, que vem a ser o lugar. O
lugarlugar
lugarlugar
lugar apresenta sempre mudanças de
significação devido ao movimento social, isto porque as frações da sociedade se
transformaram”. Conclui Santos que “lugar é o objeto ou conjunto de objetos. A
localização é um feixe de forças sociais se exercendo em um lugar(idem, 2,
grifos nossos).
11
A
PRESENTAÇÃO
12
13
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
PP
PP
P
ARAR
ARAR
AR
TETE
TETE
TE
1 1
1 1
1
14
15
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
CC
CC
C
APÍTULAPÍTUL
APÍTULAPÍTUL
APÍTUL
OO
OO
O
1: 1:
1: 1:
1:
EE
EE
E
STRUTURAÇÃOSTRUTURAÇÃO
STRUTURAÇÃOSTRUTURAÇÃO
STRUTURAÇÃO
DEDE
DEDE
DE
ANÉISANÉIS
ANÉISANÉIS
ANÉIS
DOSDOS
DOSDOS
DOS
BAIRROSBAIRROS
BAIRROSBAIRROS
BAIRROS
CENTRAISCENTRAIS
CENTRAISCENTRAIS
CENTRAIS
16
17
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
1. Estruturação do anel de bairros centrais1. Estruturação do anel de bairros centrais
1. Estruturação do anel de bairros centrais1. Estruturação do anel de bairros centrais
1. Estruturação do anel de bairros centrais
A ferrovia foi o elemento de infra-estrutura implantado pela economia cafeeira
para ligação das áreas de produção do interior com o porto de Santos, que se
tornou importante organizador do espaço urbano, definindo novos usos e
ocupações e indutor da ampliação da malha viária da cidade. A profunda
mudança que a cidade sofreu da década de 1870 até os anos 30 do século XX,
esteve alicerçada em dois fortes ciclos econômicos, sendo que da metrópole do
café à fase da industrialização que precedeu a crise de 1929, a cidade saltou de
um pouco mais de vinte mil para quase um milhão de habitantes.
Nesse mesmo período, a ocupação física de São Paulo passou aproximadamente,
de modestos 3 Km² para 104 km² (Emplasa, DIF, CIG), atestando a relevância
do processo de expansão, que resultou na organização de uma cidade
estruturalmente hierarquizada, a qual manteve as suas características físicas e
funcionais até a metade do século XX, quando então surgiram novas áreas
industriais, novos eixos de transportes rodoviários e novos setores de serviços.
Mapa 01: Comissão Geográfica e Geológica do Estado de São Paulo, adaptadando os levantamentos
na Planta da Cidade de São Paulo, de 1924, do Serviço Geográfico Militar. As cores mais escuras
correspondem às áreas mais altas, o branco às várzeas.
18
Inúmeros estudos no campo da geografia e da história do urbanismo indicam a
década de 1870 como marco das transformações que a cidade experimentou
nos tempos seguintes, sendo o café o principal agente deflagrador desse processo,
modificando o que era antes o “burgo de estudantes” (1828-72) para “metrópole
do café” ou “capital dos fazendeiros” (1872 a 1918) (Azevedo, 1958, 70).
Quais foram os principais fatores geradores das transformações que São Paulo
experimentou? Considerando a análise de Morse, três aspectos foram
fundamentais para a nova espacialidade da cidade a partir de 1870:
-a função de São Paulo se constituir em ponto mediador para o contato comercial
e ideológico com países estrangeiros
-a transformação técnica ocorrida nos transportes e o aparecimento do mercado
de trabalho nos moldes capitalistas
-a vinda massiva dos imigrantes estrangeiros que crescentemente se fixaram na
cidade
..
..
. (Morse, 1970, 20)
Até o advento das ferrovias, a cidade de São Paulo apresentava o seu núcleo
mais denso e consolidado – o chamado “Triângulo” histórico - circundado por
duas faixas concêntricas, onde ocorriam atividades diversas de caráter semi-
urbano ou rural. O primeiro cinturão, denominado “cinturão das chácaras”,
esteve organizado para a cidade, com função de residência de fazendeiros do
interior e secundariamente com função de produção.
Além disso, nesse cinturão das chácaras havia também instalações que requeriam
isolamento ou grandes áreas, tais como pouso de tropas, cemitérios, hospitais,
depósitos de pólvora, etc. Esses setores, mais próximos aos arredores do núcleo
da cidade, tornaram-se o suporte da expansão urbana de São Paulo.
O segundo, o “cinturão caipira”, que mais tarde foi afetado pela expansão
suburbana dirigida em parte pela ferrovia, se caracterizou por não estar
organizado inteiramente em função da cidade, dada a presença da cultura de
subsistência, áreas incultas e ainda modestos núcleos populacionais que
desempenhavam também algum papel de convergência (Langenbuch, 1971,
76).
A circulação pelo território se deu por modestas rotas principais e caminhos de
ligação entre elas, mais precários ainda. A importância dessa rede de estradas
convergente a São Paulo, foi de torná-la um pólo mediador comercial urbano,
como apontou Morse, e também de estruturar os seus arredores, segundo
Langenbuch.
A significativa circulação de âmbito local e regional para o foco representado
por São Paulo, era ocasionada pela função abastecedora do núcleo central da
19
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
cidade que algumas áreas dos
arredores desempenhavam, além
de centro de peregrinação para
finalidades diversas (Langenbuch,
1971, 74)
É preciso destacar, entretanto,
importância do “sistema São
Paulo-Santos” para o setor da
economia paulista, estabelecido
pelos antigos caminhos, que
colocou a cidade em contato com
o exterior e exerceu atratividade
para senhores de engenho da
cana de açúcar, que antes dos fazendeiros do café, fixaram residência na cidade
(Singer, 1968, 26).
Com a implantação da ferrovia pioneira, a “San Paulo Railway Co”, o sistema
São Paulo-Santos se consolidou, sendo que já na última década do século XIX,
as exportações de café pelo porto de Santos superaram do Rio de Janeiro a sua
posição hegemônica.
Fig 01: Primórdios dos tranportes de carga: tropas e
carros-de-boi
Fig. 02: Estradas de ferro no estado de São Paulo em fins do século XIX
20
As rotas principais que confluíam à cidade ligando-a a outras regiões
apresentavam as seguintes orientações:
-A nordeste para o Rio de Janeiro, ao longo do rio Paraíba, ligando São Paulo à
capital do império e posteriormente da república, além das áreas onde havia
nascido a agricultura cafeeira
-Ao norte, para Minas Gerais, através de Atibaia e Bragança
-A noroeste, em direção a Jundiaí e Campinas, sendo a direção que a ferrovia
inglesa seguiria, penetrando nas novas áreas cafeeiras
-A oeste-noroeste, seguindo a direção de Itu, onde partiram as Monções do
século XVIII em direção a Mato Grosso
-A oeste, para Sorocaba, centro de comércio de animais e desse núcleo em
direção ao sudoeste, para as províncias criadoras de gado (Morse, 1970, 42)
Geograficamente, as ferrovias expandiram a lavoura do café para o oeste, com
a cidade de Campinas desempenhando importante função nessa rede. Com
efeito, a precariedade dos transportes para o planalto e posteriormente para o
porto de Santos limitava a distância da área de plantio para o centro de
comercialização, a cidade de São Paulo, o que na economia da cultura extensiva
do café representava prejuízo comercial dada a inviabilidade de expansão da
produção em terras mais distantes.
Fig.03: Estradas de ferro no Estado de São Paulo em 1929
21
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
Embora não coincidentes em traçado, a correspondência geográfica entre os
antigos caminhos e os eixos ferroviários atendeu aos interesses de escoamento
da produção cafeeira que penetrava os sertões das terras paulistas. Reforçando
a importância da circulação do interior no sentido da capital, apenas oito anos
após a ferrovia Santos-Jundiaí ser concluída, já funcionavam também as quatro
principais ferrovias da Província:
A Cia. Paulista, extensão do eixo Santos- Jundiaí, concluída após as seguintes
etapas:
de Jundiaí a Campinas em 1872; a Limeira e Rio Claro, em 1876 e a Descalvado
em 1881.
Cia. Ituana, construída entre 1873 e 1879, ligando Piracicaba a Itu, a partir de
Jundiaí
Cia. Sorocabana, aberta em direção a oeste, concluída a ligação com Sorocaba
em 1875 e a Tietê em 1883
Cia. Mogiana, aberta em direção ao norte, de Campinas a Moji Mirim e Amparo
em 1875, a Ribeirão Preto em 1878 e Poços de Caldas em 1886, ligando São
Paulo também a uma região do sul de Minas Gerais, trazendo-a à esfera
econômica de São Paulo, como observa o autor.
Cia. São Paulo e Rio de Janeiro, que seguia em direção leste-nordeste, ligando
a cidade à Capital do país através do Vale do Paraíba, com sua cultura cafeeira
já considerada decadente (idem, 228)
Deve ser considerada, como relatou Nestor Goulart Reis Filho, a grande
dificuldade técnica da execução da ligação ferroviária planalto-litoral, iniciada
por Irineu Evangelista de Souza em 1856, o Barão de Mauá, fator que impediu
a realização dos planos elaborados nas décadas de 1830 e 1840 para essa
finalidade, dada a escala dos investimentos e dos riscos que então desestimularam
os investidores (Reis Filho, 1994, 27).
A precariedade dos caminhos utilizados pelas tropas impediu o crescimento do
núcleo urbano de São Paulo, diferentemente das metrópoles coloniais litorâneas
brasileiras, que utilizavam com vantagens o transporte marítimo. Essa precariedade
do sistema arcaico de transporte se apresentava muito mais acentuada no Brasil
do que nos países onde as ferrovias já haviam substituído outras formas de
transporte animal, que utilizavam estradas melhores do que aquelas aqui existentes
e trilhadas pelas rotas tropeiras. Quando esse processo ocorreu em São Paulo,
desencadeou importantes mudanças nos espaços semi-rurais que antes abrigavam
as atividades de apoio às tropas, como indicou Langenbuch: “as ferrovias, antes
de funcionarem como agentes orientadores da reorganização dos arredores
22
paulistanos, provocaram a derrocada do sistema de transportes até então vigente,
isto é, o transporte por tropas de burros” (Langenbuch, 1971, 98).
Como corolário do desmantelamento do antigo sistema de transporte, foram
profundamente atingidas as atividades destinadas a lhe servir de suporte, como
criação, venda, aluguel e tratamento de animais, pousos, abastecimento, etc.
Essa prestação de serviços era a principal função de estabelecimentos ou
aglomerados existentes nos arredores paulistanos (idem, 98). As ferrovias como
inovação técnica dos transportes, como afirma também Reis Filho, “redefiniram
as relações no espaço e permitiram o aparecimento de graus significativos de
concentração em alguns pontos” (Reis Filho, 1994, 27).
Concorreu também para a nova organização espacial da cidade, o fato da
ferrovia utilizar caminhos diferentes das antigas estradas, desvalorizando as áreas
que as rotas atravessavam, e conseqüentemente, as atividades ali presentes. Em
contrapartida, ao valorizar as áreas por onde passavam, as ferrovias provocaram
um desvio nas ruas e caminhos, com o objetivo de se criar acesso elas. O trem
desencadeou uma vocação suburbana nas faixas por onde passava e suas
estações tornar-se-iam pólos de atração de estabelecimentos fabris e de novos
assentamentos, os “povoados-estações”, que se transformaram em núcleos
suburbanos no século XX (Langenbuch, 1971, 129).
Como se observa no mapa 02 (São Paulo, 1810), o plano de ruas de São Paulo
foi polarizado pelo caminho que deixava a cidade para o porto marítimo, fazendo
com que os edifícios existentes se agrupassem ao longo de um eixo norte-sul. O
advento das ferrovias fez com que essa orientação fosse gradualmente modificada.
Já em 1890, o que era considerada periferia urbana havia adquirido forma
circular, alongada a leste em razão da ferrovia para o Rio de Janeiro, e a oeste
em direção ao interior, ao encontro das novas áreas de cultivo do café. Esse eixo
leste-oeste se constituiu no eixo dominante no século seguinte, o século XX (Morse,
1970, 41). As antigas estradas, muitas vezes intransitáveis nos períodos das
chuvas, tornaram-se vias de ligação das áreas que gradativamente se tornaram
povoadas, como por exemplo o Brás, Mooca e a Penha, através da rota que
partia de São Paulo para o Rio de Janeiro.
O crescimento de São Paulo nas décadas seguintes a 1870, foi denominado de
extensão urbana por aglutinação”, na análise de Langenbuch relativa à expansão
do espaço urbano sobre o “cinturão das chácaras”, que passou a integrar a
cidade através de parcelamento do solo. Esse processo se mostrou continuamente
ativo ao longo do século XX (Langenbuch, 1971, 79). Como fator que contribuiu
para a dinâmica de ocupação espacial, diferentemente do que ocorria antes
das ferrovias, o crescimento urbano ocorreu também nas áreas até então evitadas
pela cidade ou pelos velhos caminhos sinuosos das tropas de burros, isto é, as
várzeas e os terraços fluviais de baixadas relativamente enxutas. Como analisou
Ab’Saber “grandes trechos das principais ferrovias que cruzam a cidade
23
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
justapuseram-se aos aludidos terraços” (Ab´Saber apud Langenbuch, idem, 99),
espaços que se configuraram posteriormente como áreas industriais ou de moradia
operária.
Dessa forma, a estruturação da cidade de São Paulo submeteu-se às características
relativas ao sítio físico associada ao transporte de mercadorias da economia
paulista. Segundo Villaça, as barreiras representadas pelo eixo da Estrada de
Ferro São Paulo Railway definiram uma divisão espacial onde um lado do espaço
urbano seria mais vantajoso ao acesso ao núcleo central que o outro. Em virtude
desse fato, as camadas de alta renda tenderam a se localizar no lado mais
vantajoso, mesmo considerando que essa ocupação apresentava também
heterogeneidade social (Villaça, 1998,193).
A análise de Morse também considerou os obstáculos naturais como
condicionantes à ocupação das áreas urbanas ao analisar o crescimento da
cidade como um contraponto entre as várzeas do Tietê e do Tamanduateí ao
norte e ao oeste (Morse, 1970, 356). Ainda segundo o mesmo autor “ao contrário
de muitas estradas históricas que convergiam para São Paulo, as estradas de
Mapa 02: A cidade em 1810. Foram assinaladas as referências:
1. Triangulo Central; 2. Colégio dos Jesuítas; 3. Catedral; 4.Convento de São Francisco; 5.
Convento São Bento, 6. Convento da Luz; 7. Caminho da Luz; 8. Caminho N. S. do Ó;
9. Consolação (caminhos dos Pinheiros)
24
ferro ficaram ao nível dos rios. A São Paulo Railway chegava de Santos margeando
o Tamanduateí, contornava a colina central e então seguia o Tietê antes de dobrar
para o norte. A bacia do Tietê era também seguida pela Sorocabana que vinha
do oeste; e pela Central do Brasil, vinda do Rio, a este. A São Paulo Railway, em
parte pela sua vasta quantidade de desvios, veio determinar a formação de uma
faixa industrial que se estendeu por um amplo arco a este ao norte do centro, e
do qual muitos terrenos já eram indesejáveis por serem baixos e úmidos. Neste
Mapa 03: São Paulo, 1881
Re ferências: 1. Triângulo; 2. Jd. Botânico, 3. Lgo da Concórdia, 4. Rua da Consolação.
5. Sta. Ifigênia; 6. Liberdade.
25
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
arco, principalmente no Brás e na Mooca, foi morar a maioria dos trabalhadores
(idem, 250)
O geógrafo Pasquale Petrone também atribuiu a constituição das áreas industriais
ao Leste, Oeste e Sul da cidade aos trilhos das ferrovias: “Não resta dúvidas que
as principais áreas industriais acompanham as vias férreas – Brás, Belenzinho,
Tatuapé, Comendador Ermelino e São Miguel Paulista ao longo dos trilhos da
Central do Brasil; ainda o Brás, Pari, Mooca, Ipiranga, São Caetano do Sul e
Santo André, acompanhando a Santos-Jundiaí; Barra Funda, Água Branca, Lapa
e Osasco, servidas tanto por esta via férrea como pela Sorocabana”. (Petrone
apud Azevedo, 1958,104).
Villaça observou uma questão ligada à ocupação das áreas cortadas pelas
ferrovias e principalmente pela vizinhança das estações, explicando o caráter da
urbanização da cidade: “note-se que, nesse tempo, as estações ferroviárias eram
equipamentos urbanos de prestígio; praticamente não havia indústrias na cidade,
tanto que, quando Campos Elísios foi loteado, a proximidade com a Estação da
Luz não o prejudicou. Dez anos depois da ferrovia para Santos, a ferrovia para o
Rio e a Estação do Norte (depois Roosevelt) não atraíram alta renda da mesma
forma que a ferrovia na Barra Funda (a oeste), atraiu menos indústrias que o Brás
e a Mooca, a leste. Definia-se, assim, a divisão da cidade em “lado de cá” e
“lado de ládos trilhos” (Villaça, 1998, 193, aspas do autor).
Outro trabalho a apontar as diferenças já existentes na estruturação e apropriação
da cidade afirma que, a partir da década de 1880, passou a haver uma
diversificação de funções com o aparecimento ao lado do centro de bairros
operários e de bairros residenciais para a classe abastada. Segundo essa análise,
“enquanto manteve-se enclausurada na colina histórica, a cidade não conhecia
diferenças funcionais relevantes, além das chácaras em sua periferia. Os primeiros
bairros operários se localizaram nas terras baixas vizinhas ao Tamanduateí,
próximas à colina e nas proximidades das estações ferroviárias e ao longo das
vias férreas (a SPR e posteriormente a São Paulo-Rio de Janeiro), estruturando os
bairros do Brás, Luz e Bom Retiro. Por outro lado, os primeiros bairros residenciais
da elite se instalaram nas terras mais altas situadas além Anhangabau, a oeste,
onde foram abertas ruas largas, como foi o caso de Campos Elísios” (Petrone
apud Azevedo, 1958, 90).
No já mencionado cinturão das chácaras, Villaça afirma ter ocorrido um processo
de urbanização generalizado em todas as áreas circunvizinhas da cidade: “com
a proclamação da República, quase todos os donos de chácaras antigas dos
bairros de Santa Efigênia, Bom Retiro, Brás, Consolação, Liberdade, Cambucí,
Higienópolis, avenida Paulista, Mooca, Pari, Ipiranga, Barra Funda e Água Branca
mandaram abrir ruas e avenidas”. Segundo o autor, esse fato mostra que a
aristocracia paulistana era proprietária de chácaras nos quatro quadrantes da
26
cidade, e não apenas no sudoeste, sendo esse, entretanto, o escolhido para sua
moradia. Sobre a escolha ter recaído nessa área da cidade, Villaça afirma
ainda que esse setor era privilegiado em termos de autenticidade dos papéis
legais de propriedade, o que seria de conhecimento do próprio criador dos
planos urbanísticos para a “cidade nova” na década de 1870, João Teodoro,
para definir localizações em Campos Elísios, Vila Buarque, Consolação e
Higienópolis. (Villaça, 1998, 196)
Em contraponto a essa ocupação da camada de alto poder aquisitivo, bairros
proletários e zonas de comércio e indústria situaram-se no arco Tietê-Tamanduateí.
Do bairro industrial de Água Branca a noroeste, o arco se prolongou pela faixa
industrial e proletária do Pari, Brás, Belenzinho e Mooca, atingindo o Ipiranga e
Vila Prudente a sudeste (Morse, 1970, 357). As áreas do Brás, Mooca, Belém,
Belenzinho, Pari e Catumbi se encontravam divididos apenas pela avenida da
Intendência (atual Celso Garcia-Rangel Pestana), ligando-se à Luz, Bom Retiro,
Canindé e Ipiranga, constituindo uma vasta região fabril e de moradia operária.
(SEMPLA, 1985, 15).
Associado ao crescimento da cidade, o incremento demográfico foi marcado
pela imigração estrangeira, que se constituiu na força de trabalho rural e
posteriormente urbana da economia cafeeira e industrial. Os dados relativos à
entrada de trabalhadores estrangeiros no Estado de São Paulo atestam a
intensidade do movimento migratório: 13 mil entre 1870 e 1880; 184 mil na
década seguinte e 606 mil entre 1890 e 1900 (Furtado, 1971, 128).
O destino urbano dos imigrantes europeus foi analisado por Morse, que
estabeleceu importantes eixos para a compreensão do fenômeno, como se segue
em sua análise: “é fácil compreender que europeus ricos ou da classe média
podiam vir para a capital por conta própria (como haviam feito em menor escala
nas décadas anteriores), atraídos pela sua crescente fama de cidade em rápida
expansão ou por relatos de companheiros. Mas, admitindo-se que até mais ou
menos 1895, a maior parte da imigração da classe inferior era subvencionada e
assim destinada às fazendas, de onde vinham então aqueles estrangeiros que de
1870 a 1890 apareciam como operários têxteis e engraxates, vendedores
ambulantes e trabalhadores manuais? Como explicar que, entre 1872 e 1886, a
população estrangeira da cidade se tivesse elevado de 8% para 25% do total?”
(Morse, 1970, 240).
Segundo esse historiador, esse fenômeno se deveu:
- em primeiro lugar ao fato do sistema de colonização estabelecido pelos
fazendeiros ter ocorrido dentro de moldes capitalistas, assegurando ao imigrante
transporte e satisfação das necessidades vitais, porém mantendo intacta a
propriedade da terra. O trabalhador, denominado então colono, mesmo sem
recursos, estava livre para se transferir, quando cumpridas suas obrigações com
27
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
o proprietário das terras. As disparidades entre as oportunidades urbanas e as
rurais, cada vez mais pronunciadas, deram forças à tendência de fixação na
cidade por parte dos imigrantes.
- em segundo lugar, muitos imigrantes subvencionados se fixaram diretamente
nas cidades. A Sociedade Promotora de Imigração em São Paulo, organizada
pelos cafeicultores e subsidiada pelo Estado, informou que, entre 1886 e 1888,
embora a maioria dos primeiros imigrantes fosse para a agricultura, muitos
encontraram trabalho na capital ou em outras cidades mais populosas do interior,
desenvolvendo consideravelmente todos os ramos de indústria. Segundo essa
pesquisa, de 1889 a 1891 a tendência se inverteu e apenas dois quintos iam
para a agricultura (idem, 240).
Outra análise, que associa a incorporação urbana da força de trabalho dos
imigrantes, aborda o relevante impulso que a economia de mercado nos moldes
capitalistas representou para as transformações subseqüentes em São Paulo.
Enfocando esse tema, Singer afirma que o escravo não dispunha de nenhuma
autonomia como consumidor, já que sua liberdade pessoal era usurpada. Assim,
era sustentado apenas para a subsistência, situação muito diferente dos imigrantes
estrangeiros. Estes últimos obtinham parte da remuneração em dinheiro, passando
a integrar como consumidores a economia de mercado, e não como no caso
dos escravos, a economia de subsistência (Singer, 1968, 43).
Conforme analisou Morse, a dinâmica da ocupação do território nas cercanias
do núcleo urbano de São Paulo foi crescente, denominando-a de lutas pelo
“espaço vital”. O colapso da casa bancária de Mauá , em 1875, ocasionou,
segundo o autor, novo impulso à especulação dos terrenos urbanos. Nesse sentido,
o bairro da Liberdade, que conduzia à zona sul da cidade se transformaria num
bairro “respeitável”. Em contrapartida, segundo o mesmo autor, “para os terrenos
perto da estação (da Luz) só se podia haver pretensões mais humildes”. Um
anúncio da época, reproduzido na íntegra, demonstra essa situação:
“Grande attenção: terreno para os pobres
È a primeira vez que em São Paulo vendem-se lots de terrenos por 200$00.
Quem pensaria que nesta cidade, no pittoresco bairro da Luz, se havia de vender
lotes de terrenos tão baratos, ao alcançe de todos.
Quem quizer verificar esta verdade, recorra á casa de Eugênio Seide, em frente á
estação de carga da estrada de ferro Ingleza, e alli encontrará quem vos mostre
riquíssimos terrenos entre as ruas do Dr. João Teodoro e o Seminário, perto do
jardim botânico, e com bondes a algumas braças de distância, pelo diminutíssimo
preço de 200$000 o lote, terrenos perfeitamente promptos para receber
edificações” (Diário de São Paulo, 20/9/1877 apud Morse, 1970, 249)
28
Em contraste aos bairros fabris que se formaram nas terras baixas, ocorreu o
surgimento do primeiro bairro de alto padrão na cidade em 1879, quando
Frederico Glette, adquiriu extensa chácara a oeste do centro, no bairro de Campos
Elísios. “Depois de traçar mais de uma dúzia de ruas, ao custo de 100 contos,
vendeu os lotes com um lucro igual a oito vezes essa soma. M. Burchard, outro
alemão e sócio de Victor Nothmann, também se dedicou à propriedade imobiliária
nessa zona e abriu a avenida que atravessa o aristocrático bairro de Higienópolis”
(idem, 249)
A partir do parcelamento da área dos Campos Elísios, a ocupação das classes
de alta renda seguiu a direção oeste para posteriormente dirigir-se ao sul, em
direção ao espigão. Villaça considerou frágil a hipótese da busca de terras altas
como a única determinante para explicar a ocupação pelas camadas abastadas
da sociedade paulista na transição para o século XX, salientando ser a
acessibilidade ao centro fundamental para entender o controle sobre os tempos
de deslocamento que as camadas de alta renda detiveram no processo de
ocupação territorial. (Villaça, 1998, 197). Na realidade, como veremos adiante,
o parcelamento de terras baixas foi empreendido pela Cia City na várzea do rio
Pinheiros, nas primeiras décadas do século e com lotes destinados à população
de alta renda.
Em continuidade a essa ocupação, o avanço dos bairros de alto padrão,
considerados por Morse como “um dos mais expressivos aspectos do
desenvolvimento”, começou em 1890 através de Higienópolis até a avenida
Paulista, no espigão, para prosseguir depois pelas vertentes até os Jardins (Morse,
1970, 249). A avenida Paulista, foi inaugurada em dezembro de 1891, a partir
da compra e fracionamento da chácara do Capão e fruto de um projeto do
engenheiro-investidor Joaquim Eugênio de Lima. Os melhoramentos introduzidos
nessa artéria emblemática da burguesia do café duraram mais de uma década,
porém no início do século XX, inúmeras mansões se misturavam ao paisagismo
do grande boulevard criado pelo engenheiro uruguaio.
Considerando os aspectos que a estruturação da cidade apresentou no período
enfocado, mencionamos novamente Villaça que afirmou ser os dois elementos
mais importantes de estruturação do espaço metropolitano, as zonas industriais
e a região de concentração dos bairros das camadas de renda mais altas, pelo
grau de independência que desfrutam na escolha e produção de suas localizações.
Em relação às zonas industriais, estas são determinadas por parte de forças
externas à cidade, como no caso de São Paulo, onde as ferrovias foram indutoras
das principais áreas de ocupação fabril. No caso das áreas de concentração
das camadas de renda mais alta, um fator determinante para essa escolha se
constitui no controle dos tempos de deslocamento espacial, como já mencionado
anteriormente (Villaça, 1998, 140/197).
29
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
1.1. A industrialização emergente: o apito das fábricas no cotidiano paulista1.1. A industrialização emergente: o apito das fábricas no cotidiano paulista
1.1. A industrialização emergente: o apito das fábricas no cotidiano paulista1.1. A industrialização emergente: o apito das fábricas no cotidiano paulista
1.1. A industrialização emergente: o apito das fábricas no cotidiano paulista
A atividade industrial iniciada ainda nas décadas finais do século XIX, de forma
esparsa e ligada a setores tradicionais, tornou São Paulo o principal pólo
econômico e financeiro do país ao longo do século seguinte, possibilitando o
desenvolvimento de uma crescente complexidade urbana, espaços especializados
e novos e importantes atores sociais: a classe média e o proletariado, cujo
crescimento esteve ligado aos novos postos de trabalho tanto na indústria, como
na expansão do comércio e serviços.
A industrialização criou na cidade uma dinâmica diferenciada do período em
que a economia girava em torno do café. Inicialmente porque este se constituía
em produção rural, transladada ao porto de Santos, assim como também ocorria
em relação ao porto do Rio de Janeiro para o escoamento da produção
fluminense. De forma diversa, a exigência fundamental para os estabelecimentos
fabris funcionarem, era a de mão de obra permanente. Isso implicava na existência
de trabalhadores estabelecidos na cidade e em número suficiente para esse
setor empregador. Ligada a esse contingente de trabalhadores, impôs-se a
necessidade da manutenção de suas condições de vida - alimentação, saúde,
habitação, transporte – isto é, a reprodução da força de trabalho, que ocorreu
sob severas condições. Na cidade, novas ocupações e novas funções urbanas
surgiram para tanto, espontâneas ou estruturalmente criadas.
Tomando a entrada do século XX como marco cronológico indicativo das
mudanças urbanas, Saes analisa que até 1900 “a cidade teve sua dinâmica
determinada pelos vínculos com a produção e com o comércio cafeeiro. A partir
de 1900, a cidade adquire crescentemente as feições de uma cidade industrial
na qual a indústria determina o caráter e a dinâmica da capital do Estado” (Saes
apud Eletropaulo, 1990, 33). Reis Filho também abordou esse quadro analisando
que, no período, São Paulo já aparentava possuir a paisagem de um centro
industrial de tipo europeu “com grandes pavilhões das fábricas e ao redor, as
vilas operárias”(1993, 109).
Como mostrava o levantamento de Bandeira Jr e Heitor Ferreira Lima para o
Estado de São Paulo, em 1900, excetuando-se o têxtil, a maioria dos ramos
industriais se encontravam na cidade:
- 20 tecelagens existentes, sendo 8 na capital, com o primeiro, o segundo e o
quinto lugar em tamanho
- 7 fábricas de chapéu, sendo quatro na capital e entre elas as três maiores
- 5 fábricas de calçados, todas na capital
- 10 fábricas de bebidas, sendo nove na capital e uma em Campinas
- 8 fábricas de roupas, todas na capital
30
Fig. 04: Moinho Matarazzo, rua Monsenhor andrade, Brás, 1900.
Fig. 05: Brás, 1925
Fig. 06: Brás, 1953
31
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
- 1 fábrica de cimento, no interior
- 1 fábrica de vidro, na capital (Singer,1968, 48)
De acordo com Wilson Cano, a superioridade da indústria paulista começou a
se estabelecer já entre 1905 e 1907, ganhando impulso entre 1907 e 1913 e se
consolidando durante a I Guerra Mundial. As raízes desse crescimento se deveram
ao maior dinamismo da economia cafeeira, ao desenvolvimento da agricultura
mercantil de alimentos e de um mercado de trabalho amplo, isto é, a um maior
desenvolvimento das relações sociais de produção capitalista (Cano apud
Aureliano, 1981, 35)
Quais fatores contribuíram para a industrialização ocorrer nos moldes como
ocorreu em São Paulo? Uma pré-condição importante foi dada pela economia
cafeeira, transformando a cidade ao longo das três últimas décadas do século
XIX. Segundo Dean: “o comércio do café não gerou apenas a procura da produção
industrial: custeou também grande parte das despesas gerais, econômicas e
sociais, necessárias a tornar proveitosa a manufatura nacional. A construção de
estradas de ferro proveio, toda ela da expansão do café. As linhas foram
construídas pelos próprios plantadores com os seus lucros ou por estrangeiros
seduzidos pela perspectiva do frete do café. Importantíssimo para os primórdios
da indústria, mercê da necessidade de matérias primas importadas, como a juta
e o trigo, o porto de Santos foi igualmente um empreendimento do café” (Dean,
1990, 14).
Outro fato significativo do surgimento e desenvolvimento da industrialização em
São Paulo foi o de ela não ter acontecido dentro dos moldes sociais e econômicos
ocorridos no início do século XIX, no continente europeu. Muitas décadas depois
da industrialização dos países centrais, a que surgiu em São Paulo impôs que o
industrial, no início de suas atividades, se apoiasse no comércio e não na pequena
empresa industrial. Isso porque, numa economia que dependia basicamente de
tudo do exterior, os comerciantes importadores e exportadores
passaram a realizar
operações industriais (ou como querem
alguns autores,
manufatureiras), dando
origem a vários grupos familiares associados à essas atividades, que se
tornaram representantes
da burguesia industrial (Silva, 1995, 90).
O conhecido exemplo de Francisco Matarazzo, que implantou muitas indústrias
nos bairros paulistanos desde o início do século XX, foi seguido também pelo
arquiteto Ramos de Azevedo, que associado a outros italianos ilustres da colônia,
Emílio Menotti Falchi, Nicola e Giuseppe Puglise Carbone e Rodolfo Crespi,
fundou em 1910, a Companhia Cerâmica Vila Prudente (Lemos, 1993,77).
O crescente mercado consumidor urbano era a verdadeira garantia de
rentabilidade aos investidores, com a indústria manufatureira surgindo dentro
do quadro da relação entre importadores e consumidores, ou por perturbações
32
da mesma. (Martins, 1973, 5), ou seja, a eventual falta de um tipo de mercadoria,
poderia ser suprida por similar local.
Em relação a essas condições para o surgimento e desenvolvimento da
industrialização, Singer esclarece que “a constituição do mercado interno para
produtos industriais....toma principalmente a forma de urbanização. As cidades
crescem em função do movimento exportador, pois elas são a sede de uma série
de serviços: transporte, armazenamento, comercialização, embalagem, embarque
e desembarque, complementares do comércio externo” O autor assinala que
essa série de serviços constituiu um setor de mercado interno, dependente do
setor de exportações, mas que evidentemente teve sua produção consumida no
próprio país (Singer, 1968, 44).
A estrutura financeira do grande comércio importador e exportador, com
ramificações em todo o Estado, alargou as possibilidades de substituição de
bens de consumo e além disso, investidores ligados ao comércio ou à economia
cafeeira expandiram os negócios, atuando dentro de conglomerados em
integração vertical para diminuir as incertezas do suprimento de matéria-prima,
do transporte e da energia (Dean, 1990, 72). A conseqüência dessa integração
vertical foi o predomínio dos grandes estabelecimentos, que internalizaram
numerosas etapas da produção e distribuição dos bens de consumo, devido ao
pequeno número de indústrias com condições técnicas e financeiras para participar
nas diversas etapas de produção das mercadorias.
A formação do parque industrial de São Paulo esteve ligada os seguintes fatores,
segundo Petrone:
1. A facilidade inicial de obtenção de energia elétrica
2. A existência e ampliação de um mercado consumidor em razão do aumento
populacional da cidade e do Estado
3. O afluxo de capitais, nacionais e estrangeiros, que possibilitou o surgimento
de grandes estabelecimentos
Fig.07: Cerâmica Vila Prudente, 1914.
33
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
4. Abundância de mão-de-obra operária, inicialmente sendo constituída de
imigrantes e posteriormente resultante do êxodo rural
5. A existência de mercado fornecedor de matérias primas dentro ou nas
proximidades do próprio Estado, como no caso do algodão
6. A existência de uma importante rede de transportes, tendo a cidade como o
seu centro (Petrone apud Azevedo, 1958, 102)
A análise do relatório da pesquisa SAGMACS indicou a onda imigratória como
um dos fatores responsáveis pelo crescimento da indústria em São Paulo,
inicialmente porque encontrou já um setor fabril em gestação no período 1880-
1900, que empregou os imigrantes como força de trabalho. Segundo o
mencionado relatório: (o imigrante) não é apenas ‘braço para trabalho’; traz
consigo a exigência de um nível de vida mais alto; seu papel como consumidor
vai alargar consideravelmente o campo de procura. A procura diversificada de
produtos determinará maiores compras no exterior, e a insuficiência de nossa
capacidade de importar cria a necessidade da produção local. A formação de
um mercado consumidor interno facilitado pelos rendimentos da produção
agrícola, especialmente o café, foi um dos fatores de maior importância no
desenvolvimento industrial de São Paulo” (SAGMACS, PMSP, 1958, I-18).
Para ilustrar as mudanças que o novo período econômico introduziu, dentro do
quadro da produção brasileira, o valor da produção industrial das duas unidades
da federação representadas pelo então Distrito Federal (a cidade do Rio de
Janeiro e sua periferia) e o estado de São Paulo cresceu de 49% em 1907 para
52% em 1920. Nesse mesmo período, o estado de São Paulo cresceu em
participação de 17% em 1907 para 32% em 1920, contra o decréscimo de 33
para 21% do Rio de Janeiro nesse mesmo período (Silva, 1995, 74).
Embora estes sejam dados genéricos sobre o crescimento da industrialização no
estado, estudos mostram que já, entre 1920 e 1938, a cidade de São Paulo
havia superado o Rio de Janeiro enquanto centro industrial. A predominância de
São Paulo e sua capital no processo de industrialização da economia brasileira
pôde ser explicado levando em conta diversos fatores, segundo os estudos de
Singer. Perguntando-se como o centro industrial de São Paulo, de menores
proporções, pôde superar já nas primeiras décadas do século XX, as vantagens
relativas do Distrito Federal, o autor considerou que quando uma área adquire
vantagem decisiva na corrida industrial, ela tende a acumular cada vez mais
essas vantagens em relação às áreas vizinhas (Singer, 1968, 50). Para justificar
essa afirmação, o autor identificou os seguintes fatores:
- A situação geográfica, que assegurou a São Paulo o acesso a uma ampla área
do país, onde se localizava o seu mercado consumidor. O transporte ferroviário,
34
que ligou a cidade ao “hinterland” de São Paulo e do Rio de Janeiro para
atender ao escoamento do café, foi preponderante para essa vantagem.
- A garantia de abastecimento de matérias-primas que o “hinterland” agrícola
representou para um tipo de industrialização baseada na substituição de bens
de consumo importados. Os ramos que mais se desenvolveram nesse período
foram o têxtil e de alimentação. Em São Paulo, apesar do predomínio da lavoura
cafeeira, a produção de algodão foi crescente nas décadas de 1900 a 1930,
proporcionando uma ampla diversificação baseada no aproveitamento da
matéria-prima. Ao contrário, o Rio de Janeiro não gozava das mesmas
possibilidades, devido ao fato de seu “hinterland” permanecer em economia de
subsistência.
- A crescente autonomia que os estados adquiriram com a proclamação da
República, o que representou para São Paulo a participação do governo do
estado no financiamento da imigração estrangeira e de parte da malha ferroviária
paulista.
- A conseqüente expansão do fornecimento de energia elétrica por concessionária
estrangeira, fruto da solicitação de uma industrialização em forte crescimento.
As primeiras instalações geradoras foram construídas num período posterior ao
de 1890 e 1900, quando São Paulo iniciou a sua trajetória de metrópole industrial
do país (idem, 57).
Como vimos anteriormente, o fornecimento de matéria-prima para geração de
energia dependeu inicialmente da ferrovia, o que definiu a proximidade das
indústrias junto à estação ferroviária da San Paulo Railway no Brás. Posteriormente,
a localização junto à ferrovia permaneceu vantajosa, não mais pelo fornecimento
de combustível para as fornalhas das indústrias, mas pelo fornecimento de matéria-
prima para transformação.
Um aspecto relevante foi ainda apontado por Singer, que afirmou ter a
industrialização permitido à cidade de São Paulo crescer mesmo depois da crise
cafeeira de 1930, que entre outras conseqüências, desviou a lavoura para terras
paranaenses e a corrente comercial para o porto de Paranaguá. Esse fator,
segundo o autor, poderia ter tornado São Paulo uma cidade estagnada, usufruindo
apenas do que restou do anterior período de crescimento econômico e urbano
(Singer, 40, 1968), como foi o caso de outras cidades brasileiras, como Belém,
Manaus, Recife e Salvador, que também atravessaram períodos de acumulação
devido a ciclos de exploração de produtos primários.
Em síntese, nas três primeiras décadas do século XX, a industrialização se voltou
principalmente para a substituição por produção nacional dos bens de consumo
importados, sendo a indústria têxtil e de produtos alimentares, os ramos
predominantes (idem, 53). O ramo industrial com maior número de
35
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
estabelecimentos, os cotonifícios, eram 17 em 1900, saltando para 41 em 1915,
com o número de empregados quadruplicado (Dean, 1990, 91). Até 1925, a
cidade contava com 2.000 indústrias e 70.000 operários que ocupavam
principalmente as áreas de várzea próximas aos trilhos ferroviários, sendo os
bairros mais característicos, Brás, Mooca e Belenzinho. Em 1932, o número de
estabelecimentos industriais já havia crescido para 2.100 (Petrone apud Azevedo,
1958, 103 - 137).
As características principais do parque paulista se deveram ao tamanho do
mercado e a tecnologia. Essas duas condicionantes exigiram de alguns ramos
industriais, grandes plantas industriais, que incluíram a produção de energia,como
foi o caso das indústrias têxteis, de vidro, papel, moinhos de trigo, etc, todas
apresentando pouca flexibilidade tecnológica em face das exigências que a
mecanização lhes impunha.
Por outro lado, nos ramos em que não era exigida a mecanização integral, dois
segmentos se fizeram presentes: um com maior flexibilidade tecnológica,
constituído de pequenas empresas, como serrarias, indústrias de móveis, olarias,
artefatos de couro, produtos alimentícios, etc. Outro segmento se constituíu de
estabelecimentos tecnologicamente mais rígidos, preponderando a média
empresa, constituída dos ramos de calçados, curtumes, chapéus, etc.
Com essas características do parque industrial paulista, a paisagem dos setores
urbanos onde a industrialização ocorreu com intensidade, não se configurou
como a de como zonas industriais homogêneas, ocupadas exclusivamente por
estabelecimentos fabris. Segundo Petrone, a existência desses estabelecimentos
intercalados em meio a residências proletárias, deu origem aos bairros mistos e
a razão desse fenômeno ocorreu exatamente por predominarem as fábricas de
tamanho pequeno e médio, destinadas principalmente à transformação. (Petrone
apud Azevedo, 1958, 105).
A heterogeneidade da paisagem e a pouca segregação dos usos estavam
presentes em todas as áreas da cidade, com exceção dos bairros da aristocracia.
A característica de usos mistos esteve presente mesmo nos espaços centrais,
como ocorreu no início do ramo industrial que se tornou o setor de ponta da
industrialização brasileira no período posterior à década de 1950: a indústria
automobilística.
Funcionando basicamente como manufatura, pois apenas a montagem de
automóveis era feita na sede paulista, a Ford que então era a maior indústria
automobilística do mundo, inicialmente se instalou na rua Florêncio de Abreu no
ano de 1919, em um galpão de dois andares, empregando 12 operários. Em
1920, a montadora se transferiu para um galpão maior na Praça da República
e em 1921 passou a ocupar instalações próprias no Bom Retiro, onde permaneceu
até 1951. Esse edifício (ainda existente), situado na rua Sólon e construído
36
especialmente para essa finalidade, teve B.R. Brown como engenheiro responsável
pela obra, que foi supervisor da construção da fábrica norte-americana de Higland
Park, a principal instalação industrial da Ford na época. A montadora iniciou as
operações com um capital de 25.000 dólares, transferidos da filial argentina, e
alcançou já em 1924, a marca de 24.250 veículos, entre automóveis e caminhões
(disponível em <http://www.ford.com.br> em 2004)
Já a General Motors, principal concorrente da Ford nos Estados Unidos, iniciou
as atividades em São Paulo no ano de 1925 no bairro do Ipiranga (para onde a
Ford se deslocou também em 1958), transferindo-se para o município de São
Caetano do Sul em 1929, mas segundo dados da própria empresa, esta havia
alcançado, em 1927, a cifra de 25.000 veículos montados em suas instalações
(
disponível em <http://www.gmb.com.br> em 2004)
Depreende-se desses exemplos que, embora em seu estágio inicial, a
internacionalização da economia para a produção de mercadorias consideradas
bens de consumo duráveis, já se iniciara nesse período. Entretanto a atuação de
empresas estrangeiras, como será abordado adiante, se deu fundamentalmente
na provisão de infra-estrutura e
não na cadeia da
transformação, o que só se
concretizou a partir da década
de 1950. Porém, mesmo que
apenas de forma manufatureira,
os princípios da assembly line,
a linha de montagem
implantada por Henry Ford e
que estruturou a produção em
massa, foram incorporadas nos
primórdios da industrialização
paulistana. Em comum, aos dois
períodos, uma constante: a
localização junto aos eixos de
transporte estruturais, primeiro
ferroviários e depois rodoviários,
devido à dependência ao porto
de Santos em relação à
importação e à distribuição na
escala nacional dos produtos.
As relações espaciais que a
industrialização produziu na
cidade, como foi abordado no
início deste desenvolvimento,
Fig 08 e 09: Acima: antigas instalações da Ford do
Brasil, no Bom Retiro, em 1921.
Abaixo: Aspecto atual do edifício
37
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
foram ditadas primordialmente pelos fatores necessários para a sua viabilização.
Segundo a análise de Francisco de Oliveira, “espacialmente a dinâmica de
acumulação desse capital (industrial) tinha por base a contigüidade física das
unidades de produção, em função sobretudo da ocupação dos poucos territórios
da cidade com infra-estrutura para o desenvolvimento da produção (onde a estrada
de ferro e o abastecimento de água parecem ser os elementos mais importantes),
mas territórios que também oferecessem a possibilidade de acesso à força de
trabalho capaz de colocar em movimento todo esse processo. Essa contigüidade
espacial era ainda pouco relacionada à complementaridade entre essas unidades,
fruto de uma divisão social do trabalho pouco desenvolvida (Oliveira, F. apud
Fernandes, E&D, n° 17, 1986, 71).
Considerada toda a heterogeneidade do território urbano transformado pela
industrialização, a descrição de Petrone, mencionada em diversos trabalhos sobre
o cenário fabril paulistano de então, se constitui em um registro precioso sobre
a paisagem dos bairros industriais: dentro do perímetro urbano, em zonas como
o Brás, a Mooca e o Belenzinho, observa-se um ininterrupto suceder de pequenas
habitações, quase sempre térreas e sem nenhum jardim à frente, geralmente
geminadas (duas a duas, quatro a quatro), todas mais ou menos iguais, de estilo
pobre ou indefinível. Estendem-se assim, em sua monotonia e em sua humildade,
intermináveis, que chegam a ocupar quarteirões inteiros. No meio delas, porém,
surge de quando em vez, a pesada e característica fachada de uma fábrica, ou
então, pequenas oficinas ou fabriquetas. Estas são muito numerosas, aparecendo
instaladas numa casa igual às demais, em antigas garagens, em barracões ou
simples telheiros, no fundo dos quintais. Já as fábricas maiores se destacam,
quando não por suas chaminés, pelo menos pela grande extensão de suas
fachadas e seu amplo portão de entrada “ (Petrone apud Azevedo, 1958, 105).
Fig. 10: Destilação Italiana, 1900
38
1.2- A cidade e os novos requisitos de sua expansão1.2- A cidade e os novos requisitos de sua expansão
1.2- A cidade e os novos requisitos de sua expansão1.2- A cidade e os novos requisitos de sua expansão
1.2- A cidade e os novos requisitos de sua expansão
Confrontando a planta de 1881 – Planta da Cidade de São Paulo, de Henry B.
Joyner – com as de épocas anteriores, Langenbuch indicou a expansão da cidade
nas direções oeste e noroeste, assinalando a urbanização da área entre o Campo
dos Curros (atual Praça da República) e o Vale do Anhangabaú, com os Campos
Elísios em parte arruado, mas sem construções. No Brás, nesse período, a
ocupação já havia ultrapassado as estações do Brás (da SPR) e do Norte (atual
estação Roosevelt). A urbanização seguiu à rua do Brás (atual avenida Rangel
Pestana), que se ligou em direção ao norte a rua do Gasômetro, que também se
constituía em eixo linear de articulação do bairro. A rua Piratininga se apresentava
traçada, juntamente com a rua da Moóca, mas não se encontrava ocupada.
Pela planta de Jules Martin, de 1890, a área entre a Luz, o Brás e o Bom Retiro
já se apresentava arruada (Langenbuch, op. cit, 79).
No período 1872-1893, o Brás teve sua população aumentada quatorze vezes.
A ocupação desse território pelo binômio vila operária-indústria empregadora,
Mapa 04: Gomes Cardin, 1897
39
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
tornou-se uma característica dos bairros fabris atravessados pelos eixos
ferroviários: “iniciado o fracionamento de suas chácaras, foi criada uma nova
mancha urbana, que se caracterizou pelos grandes lotes destinados às indústrias,
entremeados de áreas grandemente parceladas, destinadas à residência e ao
pequeno comércio. Neste processo, está o cerne da diversidade de funções,
observável ainda hoje nos bairros antigos da Zona Leste” (COGEP, 1978, 03)
Os números sobre o crescimento habitacional no Centro e suas cercanias mostram
que uma parcela considerável dos imigrantes estrangeiros fixou-se na Capital,
formando um contingente de trabalhadores autônomos, de estabelecimentos
comerciais e industriais. É possível perceber, que os dois distritos, Brás e Santa Efigênia,
foram aqueles que tiveram sua população aumentada de forma mais expressiva.
Uma descrição da intensidade da ocupação do território da cidade na última
década do século XIX, quando a população passou de 65 mil para 240 mil
habitantes, mostra que: “no norte da cidade, a epidemia de urbanização propagou-
se a partir da Estação da Luz. Santa Ifigênia, Campos Elísios, Barra Funda e Bom
Retiro desenvolviam-se tão depressa como o Brás. Os bondes Notmann e Glete
facilitaram-lhe o acesso, melhor ainda, ofereceram aos fazendeiros terrenos
afastados do centro para o estabelecimento de um bairro novo, de artérias bem
traçadas, com verdadeiras avenidas e bastante espaço para construir
luxuosamente, conforme o gosto do dia; era o bairro dos Campos Elísios,
colonizado pelas melhores famílias paulistanas. Ao longo e de ambos os lados
das vias férreas abriram-se ruas populares na Barra Funda e no Bom Retiro (1884-
1886) pela reforma e prolongamento das ruas Helvetia e José Paulino. A conquista
da Várzea encetou-se com as primeiras casas do Pari e do Canindé” (Mendes
Torres, 1985, 111). A ligação entre o núcleo central e os bairros a leste se dava
por duas artérias, seccionadas pelos trilhos da Estrada de Ferro do Norte. A
principal, que era a antiga estrada da Penha ou rua do Brás – um velho caminho
que ligava o núcleo central aos pousos no percurso para o Rio de Janeiro - e a
rua do Gasômetro, paralela à primeira, e aberta após a instalação do gasômetro
em 1872, que abastecia o sistema de iluminação urbana. A localização do
gasômetro na Várzea do Carmo se deveu à necessidade desse equipamento se
situar nas proximidades da estação ferroviária da “San Paulo Railway Co”, que o
abastecia com carvão importado que chegava do porto de Santos.
40
Como já afirmado, na última década do século XIX a população da cidade
quase quadruplicou. Esse incremento tão significativo acarretou também uma
expressiva ocupação do antigo “cinturão das chácaras”, sendo que a planta de
1897 foi mencionada por Langenbuch como registro desse impressionante
aumento demográfico. O subúrbio de Penha de França, que fora considerado
um aldeamento, apresentava arruamento maior que o de Pinheiros, por exemplo,
e a razão do ocorrido se deveu ao ramal ferroviário que servia a primeira
localidade em detrimento do segundo bairro.
Na planta de 1915, a mencionada tendência de desdobramento se aprofundou
enquanto que a área consolidada da cidade pouco havia se expandido. Entre
1900 e 1920, o acréscimo de população foi de 339.213 habitantes e entre
1920 e 1940, de 715.190 habitantes (Langenbuch, 1971, 82, 131). Levando
em conta o crescimento que a cidade apresentou nas primeiras décadas do
século XX, o quadro 02 e os mapas 04 (pag.38), 05 e 06 nos permitem avaliar
a relação entre o aumento demográfico e a ocupação do território:
Mapa 05: Repartição de Águas e Esgotos, 1915
41
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
Mapa 06: Elaborado em 1929 com a demarcação dos perímetros central, urbano, suburbano e rural.
42
Pode-se depreender, a partir dos dados do quadro 02, que a área ocupada do
território quase quintuplicou no período 1914-1930, enquanto a sua população
praticamente dobrava, no mesmo período. Segundo os números indicadores da
densidade, verifica-se que a cidade mais concentrada espacialmente de 1914
espraiou-se horizontalmente, uma vez que esse índice anteriormente ascendente,
caiu para menos da metade. Os fatores para essa expansão urbana, segundo
Langenbuch, podem ser compreendidos levando em conta:
- A estruturação do setor industrial, ocupando áreas até então desprezadas pela
urbanização, correspondendo a uma localização geográfica em que a malha
ferroviária do estado de São Paulo se tornou em um fator estratégico,
determinando a localização das indústrias ao longo das linhas “San Paulo Railway
e São Paulo –Rio de Janeiro. O transporte ferroviário se constituiu na forma mais
rápida e segura de distribuição, tanto das mercadorias importadas necessárias
às indústrias, quanto do abastecimento dos mercados do interior paulista e do
Triângulo Mineiro.
- O transporte urbano: a nova oferta representada pelo bonde elétrico e a
atratividade das estações ferroviárias. No primeiro caso, já em 1914, todos os
quadrantes de São Paulo haviam recebidos os trilhos dos bondes elétricos da
“Light & Power Co. Ltd” , que atravessavam grandes extensões não urbanizadas
para atender os bairros mais afastados como Santana, Penha de França, Ipiranga,
Vila Prudente, Bosque da Saúde, Pinheiros e Lapa.
Já as estações ferroviárias se constituíram em fator locacional importante,
tendência que se acentuaria nas décadas seguintes com os “subúrbios-estações”.
Os casos de Água Branca e Lapa, bairros que se encontravam centralizados em
relação à estação e o de Penha de França, já mencionado anteriormente, servem
como exemplo dessa atratividade.
- A topografia: com exceção da várzea do Tamanduateí, parcialmente ocupada
após a retificação do rio, a urbanização evitou as várzeas e as áreas baixas. Isso
ocasionou a existência de grandes espaços não ocupados e a correspondente
expansão horizontal para áreas mais propícias.
- Os serviços: polarização em torno de povoados ou antigos núcleos que
apresentavam equipamentos minimamente estruturados, tornando-os mais
convenientes do que as áreas das proximidades que nada ofereciam aos
moradores iniciais. Antigos núcleos como Penha de França, Nossa Senhora do
Ó e Pinheiros se incluíam nesse caso (Langenbuch, op.cit., 85).
Assim como vinha ocorrendo desde as últimas décadas do século XIX, após o
irrompimento da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), o processo de
especulação do solo se aprofundou em São Paulo: “pelas várzeas, acompanhando
as linhas de trens, se instalavam indústrias e se formavam os bairros operários –
Brás, Pari, Mooca, Ipiranga, Bom Retiro, Barra Funda, Água Branca. Pelas colinas
adjacentes ao centro se expandiram os bairros de classe média, entremeados de
43
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
bolsões mais antigos de casebres e gente humilde, enquanto, em torno da avenida
São João, avenida Angélica e avenida Paulista, se localizavam os loteamentos
mais abastados, formando bairros ponteados de grandes sobrados e mansões,
como Campos Elísios, Higienópolis e Cerqueira César. (Sevcenko, 1992, 123)
Na segunda metade da década de 1920 (mapa 06), a área urbana da cidade
apresentava o seguinte arranjo espacial:
1. Um núcleo central, compactamente edificado, limitado ao Norte pelas vias
férreas, a Leste pelo Vale do Anhangabaú, a Oeste pelo Vale do Pacaembú e ao
Sul pelo espigão da avenida Paulista
2. Uma área compactamente edificada, a Leste do Tamanduateí, compreendendo
o Brás, a Mooca, e o Belenzinho, cortada em três pontos por estradas de ferro
3. Uma área pequena, porém populosa, situada na várzea, ao Norte das Linhas
férreas, compreendendo o Bom Retiro, a Luz e a Baixa Casa Verde
4. Uma área a Oeste do Vale do Pacaembu, compreendendo Perdizes, Vila
Olímpia, Água Branca, Lapa e o início do Alto da Lapa
5. Uma zona de bairros novos, situados nas vizinhanças do Tietê (margem
esquerda) e colina da Penha
6. O Ipiranga, então bairro-subúrbio, instalado parte na várzea e parte nas
vertentes do Tamanduateí
7. Uma zona irregular, nucleada pelo centro da cidade, entre o vale do
Anhangabaú e a Aclimação
8. A zona localizada a Sudeste do espigão da avenida Paulista, compreendendo
Vila Cerqueira César, Pinheiros, Vila América e Jardim América
9. Uma zona situada ao sul da avenida Paulista, constituída principalmente
pela Vila Mariana
10. Uma pequena área ao Norte do Tietê, com o antigo núcleo de Santana
(Petrone apud Azevedo, op. cit, 123.)
Ainda segundo o autor, a cidade tinha a seguinte definição de áreas funcionais:
- Zona comercial: que compreendia principalmente o centro tradicional. Dentro
dessa zona, já se estabelecia alguma setorização entre as áreas de comércio
varejista e a do comércio atacadista, instalada junto ao rio Tamanduateí e da
colina histórica. Dentro do Triângulo histórico, ocorria a distinção entre o “mundo
elegante” da rua Direita, das confeitarias, casas de bebida e casas comerciais e
o “mundo dos negócios” da rua 15 de Novembro, dos bancos, redações de
jornais, etc..
- Zona industrial: que se encontrava localizada principalmente nos bairros de
várzea, não longe das vias férreas. Brás, Mooca e Belenzinho eram os mais
característicos
- Área residencial: caracterizada por três modalidades
44
. A dos bairros de classe média, na periferia do centro
. Bairros operários, na vizinhança da zona industrial
. Bairros aristocráticos, incluídos os Campos Elísios, a avenida Paulista, o Jardim
América, Liberdade, Higienópolis e Brigadeiro Luís Antônio (idem, 140).
Associados ao crescimento da cidade, foram necessários diferentes fatores para
a viabilização da atividade econômica e de suporte à população, provocando
dessa forma, transformações na organização espacial, antes apenas articulada
pelo e para o fluxo comercial exportador-importador. Com o crescimento do
parque fabril paulistano, a cidade passou a abrigar uma estruturação de maior
complexidade, fruto da cadeia “produção-circulação-distribuição-consumo”,
como define Milton Santos (Santos, 1997,3).
As redes de infra-estrutura para as novas ocupações urbanas, abastecimento de
água, energia, circulação, transportes e regulação do uso e ocupação do solo,
tornaram-se requisitos da expansão da cidade e da sua gestão. Nesta parte do
trabalho serão analisadas essas formas de distribuição das redes e serviços,
interconectadas com o parcelamento do solo e as suas diferentes formas de
regulamentação, seguindo:
-O papel desses elementos na estruturação da cidade, em particular dos bairros
centrais e qual as diretrizes direcionadas para o atendimento diferenciado às
áreas urbanas, uma vez reconhecido o compromisso das concessionárias que
atuaram em São Paulo com os lucros operacionais.
-A atuação do poder público (estadual e municipal) em relação ao sanitarismo,
que correspondeu à primeira forma de tratamento científico das questões urbanas
ligadas à salubridade e qualidade dos padrões construtivos da cidade,
interconectando as diretrizes higienistas com as leis de uso e ocupação do solo,
habitação social, etc..
No período de três décadas, a começar pelo início do século XX, a cidade de
São Paulo contou com cinco prefeitos, sendo o primeiro eleito para o cargo que
foi criado pela constituição republicana, o Conselheiro Antônio Prado, que
administrou o município de 1899 a 1911. Foi seguido por Raimundo Duprat, de
1911 a 1914, Washington Luís, de 1914 a 1919, Firmiano de Moraes Pinto, de
1920 a 1925 e finalmente José Pires do Rio, de 1926 a 1930.
Os registros urbanísticos atribuem aos antigos prefeitos um elenco de realizações
transformadoras da cidade, e nesse período, principalmente a Área Central,
mereceu atenção especial desses administradores, sendo promovido o
alargamento e embelezamento de várias ruas e logradouros e construção de
elementos notáveis, como o Viaduto Santa Ifigênia, o Teatro Municipal, a nova
45
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
Praça da Sé, etc. Entretanto, a complexidade do processo de crescimento urbano
que São Paulo experimentou, exigiu novas formas de atuação do poder público,
ainda que restritas a alguns setores da cidade, impondo uma racionalidade nas
ações provindas das experiências de urbanistas estrangeiros ou da influência
que suas teorias exerceram nos quadros técnicos paulistanos.
As propostas para remodelação de áreas do Triângulo e do Vale do Anhangabaú
e seu entorno, datam da primeira década do século XX, visando um paisagismo
condizente com a visão da oligarquia cafeeira que dirigia a cidade na República
Velha. Esses projetos procuraram estabelecer um paisagismo monumental,
ligações intra-urbanas mais eficientes no núcleo central e a valorização dos
espaços para o lado sudoeste do Centro. Simões Jr. relacionou a construção do
primeiro Viaduto do Chá (1892) e do Teatro Municipal (1911) como fatos
indicadores dessa intenção (Simões Jr. apud Leme, 1999, 205).
No núcleo central, dentro das propostas de desconcentração da área do Triângulo,
foi construído entre 1910 e 1913 o viaduto Santa Efigênia, cuja estrutura foi
fabricada na Bélgica. Esse Viaduto estabeleceu uma ligação importante do velho
Triângulo com a área da Luz, onde, em 1900, foi inaugurada a nova estação da
San Paulo Railway”. Além disso, o Viaduto Santa Efigênia também foi fundamental
para a conexão do núcleo central com o loteamento planejado dos Campos
Elísios, ocupado pela oligarquia paulista.
Referindo-se à reformulação do Centro que passou a ocorrer a partir do período
de Antônio Prado como prefeito, Rolnick afirma que: “conferir um novo desenho
ao centro significa não só poder ocupá-lo com atividades mais rentáveis, mas
também marcá-lo com uma estética peculiar. O desenho do centro funciona como
uma espécie de sinal do ‘caráter’ da cidade, cartão de visita, imagem que a
cidade exibe para fora, mas sobretudo que o poder urbano exibe para a totalidade
da cidade” (Rolnick in E&D, 17, 1986, 51, aspas da autora).
Até 1920, o ano da proposição do “Perímetro de Irradiação” por Ulhoa Cintra,
posteriormente reestudado por Prestes Maia em 1924 e incorporado ao Plano
de Avenidas em 1930, a Área Central de São Paulo conheceu os seguintes
projetos urbanísticos:
- Remodelação do Vale do Anhangabaú – Augusto Carlos da Silva Telles, 1906
- Melhoramentos do Centro – Diretoria de Obras Municipais – Victor da Silva
Freire e Eugênio Guilhem, 1910
- Grandes Avenidas – Alexandre Albuquerque, 1910
- Melhoramentos no Vale do Anhangabaú e Triângulo – Samuel das Neves,
1911
- Melhoramentos do Centro – Joseph Antoine Bouvard, 1911.
46
No debate surgido das propostas para a área central, contrapuseram-se as
posturas baseadas nas reformas urbanas ao estilo de Haussman (Samuel das
Neves) e daquelas referenciadas em Camillo Sitte, Eugènne Henard e Joseph
Stubem (Prestes Maia e Ulhoa Cintra). Mas coube a Victor Freire, diretor de
obras municipais, a introdução de fundamentos teóricos, preconizando três
preceitos básicos para um plano conjunto capaz de nortear os novos projetos
para a cidade:
1.O princípio técnico, no sentido de se garantir a circulação fácil e rápida de
homens e coisas.
2.O princípio higiênico, ao assegurar uma natalidade elevada e uma mortalidade
reduzida.
3.O princípio estético, no sentido de se fazer artisticamente tudo o que diz respeito
à higiene e técnica, incluindo as construções de utilidade pública, os monumentos
e as obras decorativas em geral (Simões Jr. 1990, 106).
Coube ainda a Victor Freire a sugestão da contratação de um especialista em
urbanismo para um parecer sobre os diversos projetos de melhoramentos
propostos no âmbito do governo municipal e estadual, com aspectos conflitantes
entre si. Tal sugestão baseou-se na experiência de reformulação do centro de
Buenos Aires, executada por Bouvard entre 1907 e 1910 (idem 116).
Efetivamente, apenas o último plano foi implantado, já que “a passagem de
Bouvard por São Paulo revestiu-se de um duplo significado: por um lado seus
estudos sobre a cidade avançaram de forma mais abrangente, propondo não só
soluções para áreas mais distantes do Centro, mas principalmente para as lacunas
semi-rurais do Vale do Tamanduateí e do Vale do Anhangabaú. Por outro lado,
Bouvard conseguiu contemporizar os projetos antagônicos para o arranjo da cidade
vindos de Samuel das Neves e Victor Freire, conferindo ainda uma legitimidade
européia às ações do Poder Público” (ibidem, 120).
No Vale do Tamanduateí, o Parque do Carmo, concluído em 1920 e que em
1921 passou a ser denominado de Parque D. Pedro II, foi projetado por Bouvard
em 1911, mas tornou-se realidade a partir de 1914, com a retificação do rio
Tamanduateí e o aterro da várzea. Inaugurado no início da segunda década do
século XX, esse parque foi o principal vínculo entre os bairros do Brás e da
Mooca. (Urbs, nº8, 1998)
Desde a última década do século XIX, novos aspectos institucionais contribuíram
para a coordenação das ações do poder público, então revestido de novas
atribuições devido:
1.Emancipação política dos municípios a partir da constituição republicana para
os estados (1891), definidora de novas atribuições que seriam canalizadas para
47
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
Fig. 11: Projet de Freire-Guilhem
Fig. 12: Projeto Samuel das Neves:
1-Continuação da ponte lgo. do Ouvidor-Xavier de Toledo.
2-Alargamento da rua Líbero Badaró.
3-Rua lateral ao vale.
4-Construção de edifícios na Líbero Badaró com duas fachadas decoradas.
5-Abertura de praça defronte a Igreja Sto. Antônio (lgo. do Patriarca).
6-Alargamento da rua Miguel Couto.
7-Rua ligando o Lgo. São Francisco à rua da Quitanda.
8-Construção do viaduto Bela Vista.
9-Prolongamento da rua da Quitanda até viaduto da Boa Vista.
48
a Intendência de Obras Municipais (1892), posteriormente denominada Diretoria
de Obras Municipais (1899).
2.Maior legitimação dessa estrutura operacional em relação à administração
estadual devido à especificidade de atuação no urbano
3.Formação específica dos profissionais para essa atividade (engenheiros e
engenheiros-arquitetos) diferentemente dos órgãos estaduais onde os cargos de
direção eram exercidos por juristas, sendo destinada aos técnicos apenas a função
fiscalizadora.
4.Estreita relação dos técnicos com o principal órgão de difusão dos
conhecimentos urbanos, a Escola Politécnica (Simões Jr, apud E&D nº 34, 1991,
73).
Juntamente com o embelezamento do Centro da cidade, a falta de salubridade
fez com que a questão sanitarista assumisse um caráter primordial na atuação
do poder público. Além disso, o crescimento da área urbana, os transportes e a
necessidade de circulação no núcleo central e nos espaços vizinhos, também se
constituíram em temas presentes na cidade, resultando em atuações nos seguintes
campos:
1.No campo das disposições sanitárias, que se constituíram nas preocupações
iniciais do poder público municipal e estadual, para o combate da falta de
salubridade das habitações (dos mais pobres) e de parcelas do núcleo urbano
que ainda não dispunham de serviços básicos de saneamento.
2.No campo da regulamentação urbanística das construções, dos loteamentos
e larguras de ruas, orientada inicialmente pelo enfoque sanitarista e de controle
da expansão desordenada da cidade.
3.No campo do provimento de infra-estrutura urbana, tanto para a população
demandatária, como para sustentar o crescimento da industrialização. Implicou
em pavimentação, drenagem de várzeas, transposições de rios e córregos e
através de concessões a companhias privadas, na implantação das redes de
água e saneamento, eletricidade e transportes.
4.Na ampliação do núcleo central da cidade, numa primeira etapa com objetivos
de embelezamento urbano e posteriormente subordinada a uma nova rede
urbana de circulação, consolidada a partir de 1938 pelo Plano de Avenidas.
Visto que esses campos possuíram aspectos e problemas inter-relacionados, no
desenvolvimento a seguir, além da caracterização de cada um, procurou-se
estabelecer a conexão entre os mesmos, que utilizou o conceito de
imbricaçãoimbricação
imbricaçãoimbricação
imbricação,
o qual, segundo o dicionário de Aurélio Buarque de Holanda, significa disposição
que apresentam certos objetos quando se sobrepõe parcialmente uns aos outros,
49
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
como as telhas de um telhado ou as escamas de peixe” (Holanda Ferreira, 1975,
743).
Essa conexão foi utilizada como um recurso de análise, uma vez que:
- no processo real de ocupação e transformação urbana, os aspectos institucionais,
da infra-estrutura e do espaço construído, embora constituindo fatos de natureza
técnica diferente, ocorrem, se não simultaneamente, pois apresentam tempos
diferentes, pelo menos de forma complementar, uma vez que são parte integrante
de um processo geral que se implanta na cidade.
-
seria extremamente complexo o desenvolvimento de uma análise que
contemplasse, passo a passo, todas as relações existentes entre legislação
urbanística, produção imobiliária, implantação de nova rede viária, redes de
infra-estrutura, configuração espacial, etc.
Dessa forma, os capítulos seguintes do trabalho abordam:
- as redes básicas de transportes, energia, água e saneamento
- as normas urbanísticas relativas ao controle do uso e ocupação do solo, que
também incorporaram a legislação sanitarista
- a habitação popular consentida em grande parte da cidade e que constituiu
uma tipologia importante nos bairros centrais pesquisados
- os espaços diferenciados produzidos pela incorporação de extensas áreas
direcionadas a ocupação segregada da alta renda, os bairros-jardim da “Cia.
City of São Paulo Improvement Ltd.
50
1.3 A implantação da infra-1.3 A implantação da infra-
1.3 A implantação da infra-1.3 A implantação da infra-
1.3 A implantação da infra-
estrutura urbanaestrutura urbana
estrutura urbanaestrutura urbana
estrutura urbana
No início do século XIX, no período que antecedeu a industrialização, as
necessidades de água, energia, saneamento e transporte, foram solucionadas
por meios particulares, sem a existência de sistemas unificados de oferta desses
serviços. Criadas a partir da intensificação do processo de urbanização, as redes
de infra-estrutura apresentaram nos países desenvolvidos, duplo caráter de serviço
público, isto é, foram dirigidas à população e se constituíram em suporte às
atividades econômicas (Toledo apud Deák, Schiffer, orgs, 1999, 264).
Seguindo essa análise de Toledo, a constituição dos serviços de infra-estrutura
ao exigir uma oferta específica, devido a extensão geográfica das redes e a
complexidade de sua operação técnica, reúne condições para o caráter de
monopólio dos sistemas. No plano local, o controle necessário para garantir a
eficiência dos serviços e para não haver desvios das atuações das concessionárias,
se tornou um dos pontos críticos do poder público, que até 1930 não dispunha
de uma legislação integrada para os governos federal, estadual e municipal,
atuando sempre de forma desconexa (idem, 1999, 297).
Assim como também ocorreu no Rio de Janeiro, no caso de São Paulo, desde
1870 as companhias estrangeiras participaram majoritariamente da implantação
e operação de redes, iniciadas com os transportes ferroviários, para se estender
ao gás, eletricidade, transportes e telefonia, como se verifica:
-em 1869, a “São Paulo Railway Co. Ltd”, inicia a operação, construída e
explorada por capitais ingleses.
-em 1872, a usina de gás situada na Várzea do Carmo, a Casa das Retortas,
que produzia e fornecia o gás para iluminação urbana, foi construída e operada
por uma companhia inglesa, a “San Paulo Gas Company Ltda”.
-em 1899 a “São Paulo Light and Tramway Co. Ltd”, com capitais anglo-
canadenses estabelece o monopólio de geração e distribuição de energia e
transportes urbanos. Posteriormente adquiriu a “San Paulo Gás Co Ltda”.
-Em 1914 a Companhia Telefônica do Estado de São Paulo, também se tornaria
subsidiária da Light.
Uma análise sobre a atuação das empresas estrangeiras aborda quais implicações
tiveram os objetivos dessas concessionárias para a cidade: “a carência de recursos
aliada à vinculações externas, teria levado o Estado a apelar para as
concessionárias privadas no fornecimento de serviços público, notadamente os
ingleses e americanos. Essas concessionárias não orientavam suas redes de
serviços para áreas carentes ou para a população em geral, mas para novas
ocupações urbanizadoras, com vista à especulação na forma de demanda
antecipatória, provocando uma marcante elitização dos serviços. Por outro lado,
a escassez e irregularidade dos recursos disponíveis (usualmente empréstimos
51
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
estrangeiros) para atender a maiores compromissos com a provisão de serviços
de utilidades urbanas...impedia que os mesmos fossem despendidos de forma
extensiva sobre a área urbana. Isso provocava, obviamente, grandes desequilíbrios
intra-urbanos na provisão e acesso a essas facilidades”(Smolka apud E & D, n°
21, 42).
Os estudos sobre as empresas concessionárias que atuaram em São Paulo (como
de resto na maioria das cidades brasileiras), mostram que, em se tratando de
investimentos privados que visavam a lucratividade empresarial, a funcionalidade
da cidade como um todo foi preterida ao serem introduzidos novos componentes
na ordenação do espaço urbano. Os verdadeiros monopólios que se formaram
tiveram extensas repercussões, acarretando uma compartimentação social e
funcional da cidade, que assim ficou profundamente marcada e a priorização
de algumas áreas em detrimento de outras definiu, inclusive, os locais em que se
instalaram os bairros-jardim (Eletropaulo, 1993, 51).
Esses aspectos também foram analisados por Saia, que viu na concessão de
serviços públicos da cidade, atrelada à esfera estadual, uma forma negativa de
dependência a grupos estrangeiros, voltados a obter alta lucratividade com baixo
padrão de prestação de serviços, impondo também compromissos negativos no
aproveitamento das disponibilidades espaciais e técnicas (1978, 53).
Outra abordagem que sintetiza a relação entre o poder público e as empresas
concessionárias dos serviços urbanos mostra que a construção dos sistemas de
abastecimento de transporte, água, luz e energia e telefonia consolidou a distinção
entre espaço urbano e espaço rural. Os lucros das empresas foram realizados
principalmente em função da valorização diferenciada das áreas e terrenos da
cidade, ocorrendo mais em função da valorização fundiária gerada pelos
investimentos localizados em infra-estrutura, do que pela distribuição desses
mesmos investimentos pela cidade como um todo. Seguindo essa análise, “essas
companhias, apesar de detentoras da maior racionalidade técnica da época,
esgotaram seus objetivos na realização de lucros financeiros, fugindo a quaisquer
compromissos mais amplos relacionados com a organização do sistema urbano”
(Sempla, 1990, 74).
52
1.4. Imbricação: transportes e energia, água e recursos hídricos1.4. Imbricação: transportes e energia, água e recursos hídricos
1.4. Imbricação: transportes e energia, água e recursos hídricos1.4. Imbricação: transportes e energia, água e recursos hídricos
1.4. Imbricação: transportes e energia, água e recursos hídricos
A imbricação entre o fornecimento de energia elétrica para os diferentes usos
urbanos e a operação de transportes públicos, aliada à utilização dos recursos
hídricos sob a forma de monopólio, fruto da presença da mesma concessionária
em todos esses serviços, provocou ao longo das décadas de 1910 e 1920, inúmeros
conflitos entre o poder público e a população, de um lado, e de outro, a empresa
detentora dos direitos de exploração e operação, a “Light and Power Co”.
Quase sempre os interesses da população foram prejudicados devido à grande
capacidade de manobra da empresa e aos seus laços políticos, resultando na
vinculação da implantação das redes de infra-estrutura e de serviços com o
mercado imobiliário. Essa relação ocorreu através do transporte operado por
bondes, da anexação de grandes áreas nas margens dos rios da cidade e
direcionamento das redes para essas localidades, que transformaram em terras
economicamente lucrativas áreas anteriormente imprestáveis. Como se depreende
dos aspectos mencionados na análise a seguir, foi grande a influência dessa
concessionária de serviços públicos na configuração urbana da cidade,
particularmente na área entres os rios Pinheiros e Tietê.
Em relação aos transportes
na cidade de São Paulo, dois
períodos podem ser
observados:
o primeiro
compreendido entre
1900-1930, com a
predominância dos serviços
de bonde e a entrada dos
primeiros ônibus em 1924;
um segundo período de
1930 a 1965, com uma
inflexão em 1945, onde de
1930 a 45 surgiram
transformações
institucionais na regulação
do serviço, que levaram à
criação de uma empresa
pública de transportes
coletivos e de 1945 em
diante, a vinculação aos
processos ligados ao
desenvolvimentismo e da
implantação da indústria
Fig. 13 e 14: Primórdios dos transportes urbanos na ciadde :
acima, anúncio de diligências, provavelmente ligando a cidade
às redondezas. Abaixo, bonde de tração animal defronte a
antiga estação da Luz
53
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
automobilística (Zioni, 1999, 41-69).
Os diversos estudos existentes sobre o papel desempenhado pelos transportes
em São Paulo, mostram a sua estreita ligação com a valorização das terras. As
ferrovias, inicialmente, seguidas dos bondes elétricos e pelo traçado das linhas
de ônibus, “atuaram diretamente no desenho da expansão da cidade, segundo
uma lógica que não era dada pela ocupação racional e progressiva do território”
(Wolff, 1998, 50).
O exemplo mais claro da atuação das empresas estrangeiras se deu com a “São
Paulo Tramway Light and Power Co. Ltd”, ligada à busca de mercados tanto para
a distribuição de energia para as indústrias e a cidade, como também ao
transporte urbano. A Light tornou-se um instrumento decisivo na expansão da
cidade, já que as linhas de bondes elétricos promoveram mudanças na
acessibilidade intra-urbana, o que significou também a alteração no valor do
solo, que foi apropriado pelo mercado imobiliário. Como passou a ser a única
detentora da distribuição de energia, gás e telefonia, além dos transportes, a
troca de favores e os vínculos com os negócios imobiliários na cidade se
mostraram presentes desde o início da atuação daquela empresa, confirmando
a análise de Smolka citada anteriormente.
Um procedimento permanente da Light foi a contínua incorporação de outras
companhias, com quem disputava litígios a respeito das concessões públicas:
em 1900 foi comprada a Cia. de Água e Luz do Estado de São Paulo, que
contava apenas com dois geradores a vapor na rua Araújo; em 1901 foi
comprada a Viação Paulista e a Cia. Carris de Ferro, em 1914 a Cia. Telefônica
e depois de vários anos de disputas, foi adquirida a San Paulo Gaz Co. Ltd,
como será visto adiante (Eletropaulo, 1990, 170).
Se outras cidades brasileiras já dispunham de hidrelétricas, algumas ruas
iluminadas à eletricidade e no caso do Rio de Janeiro, desde 1892 uma rede de
bondes elétricos, em São Paulo isso ocorreu um ano após a autorização de
operação (1899), quando a Light inaugurou cinco linhas desse transporte. Os
itinerários alcançaram o Largo São Bento, Rua dos Italianos, Vila Buarque, Avenida
Paulista e Brás (idem, 114).
O processo seguido pela concessionária foi de localizar as paradas finais em
lugares de população rarefeita, tais como Penha, Lapa, Santana, Ipiranga, Vila
Mariana, Pinheiros, gerando valorização imobiliária que seguia a direção dos
trilhos. As lacunas entre o centro e bairros já dotados de infra-estrutura, ao
receberem também da Light os serviços de luz e gás, além do transporte, sofreram
altas especulativas no preço dos terrenos e aluguéis, o que se tornou um ponto
crítico da carestia verificada no período que antecedeu a I Guerra Mundial e
seguiu durante a década de 1920. Além disso, essa prática resultou em bairros
desconectados, “uma heterogeneidade de arruamentos desencontrados, além
54
da escassez drástica de
praças, espaços públicos e
amenidades. Essa anarquia
especulativa era o oposto
mesmo de qualquer idéia
de planejamento ou
princípio de urbanismo”
(Cevcenko, 1992, 124).
Reportando-nos a uma
análise sobre a atuação
dessa empresa anglo-
canadense, que dispunha
de representantes junto ao
poder público para a
obtenção das concessões,
temos que: “nestas
condições e cheia de
poderes, a Light passou a
interferir de forma marcante
no desenho e no redesenho de São Paulo. Se os limites espaciais e econômicos
foram delimitados até 1900 pelas ferrovias e pelos bondes de tração animal, a
partir de então os bondes elétricos da Light se constituíram em fator decisivo não
só para uma nova reordenação do espaço urbano, como ainda para a
incorporação de capital ao valor da terra”. Segundo registros, entre 1901 e 1912,
a média anual de linhas implantadas foi de 15,7 quilômetros, totalizando 188,7
quilômetros (idem, 1990,14).
Outro estudo corrobora a mesma visão desse processo, já que os bondes elétricos
alteraram em profundidade a escala de correspondência espaço-tempo, pelo
fato de incorporar uma extensão territorial urbana muito maior à vida cotidiana
dos cidadãos (Eletropaulo, 1993, 53).
Buscando economia na operação dos transportes e dos serviços de distribuição
de energia elétrica e telefonia, a Light desencadeou a saturação das áreas já
urbanizadas, pois até a década de 1920 a acessibilidade oferecida pelo bonde
era uma importante condição para a abertura de novas áreas, visto ser o único
modo organizado de transporte urbano. Uma análise sobre essa empresa nesse
período mostra que “a política de restrição da expansão das linhas de bonde
tendia a produzir um crescente adensamento urbano, conforme aumentava a
população da cidade. A estrutura radial das linhas de bonde, que concentrava
vantagens de acessibilidade no Triângulo Central, agravava essa tendência,
chegando ao congestionamento da área central na década de 1920. A relação
entre a estrutura dos transportes coletivos e congestionamento do Triângulo Central
Fig. 15 e 16: O único meio de transporte organizado na
cidade: os bondes e a frequente superlotação, década de
1920.
55
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
é registrada na argumentação de Prestes Maia contra o Metrô da Light e a favor
do Plano de Avenidas” (Filardo Jr, 1998, 19-20).
A alternativa de negócios coordenados se apresentou com a expansão das linhas
de bonde e da rede de distribuição de energia serem custeadas por loteadores,
como no caso da Cia. City, o que provocou distorções na distribuição desses
serviços na cidade, com o benefício das áreas de incidência da população de
alta renda (idem, 21). De acordo com o estudo sobre essas atividades, as extensões
de linhas e redes para os loteamentos da City, foram estabelecidos em contratos
com a Light, como o de 1915, onde essa empresa recebeu terrenos em troca da
extensão da rede elétrica e de gás (ibidem, 82).
A expansão do sistema de transportes baseado nos ônibus, que passou a ocorrer
em meados da década de 1920, ameaçou o monopólio do serviço de bondes
da Light. Esse crescimento se verificou a partir da crise do fornecimento de energia
elétrica causada pela seca de 1924, havendo a necessidade de suspensão dos
serviços de várias linhas dos bondes. Nos anos seguintes, ocorreram manifestações
da municipalidade em favor dos “auto-ônibus” contra os serviços que eram
oferecidos pela Light. Esses fatos apontaram não apenas a vantagem de um
modo de transporte sobre o outro, mas também a necessidade da atuação direta
do poder público na gestão e operação dos transportes com veículos sobre
pneus (Zioni, 1999, 62-75, aspas da autora).
O crescimento do número de ônibus se constituiu em um dos fatores que foram
utilizados pela Light para incluir em 1927 um plano de monopólio dos serviços
de transporte sobre pneus em São Paulo. As restrições impostas aos bondes para
a livre penetração no perímetro central, não ocorria com os ônibus e automóveis,
que transformaram desde cedo, espaços públicos do Centro em terminais e
56
Mapas comparativos da expansão das linhas de bonde entre 1905 (à esquerda) e 1930 (à
Mapa 07 e 08: Mapas comparativos da expansão das linhas de bonde entre 1905 (acima) e 1930
(próxima página).
57
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
58
Mapa 9: Mapa da Light de 1925, com traçado das linhas de bondes. Notar a extensão das
mesmas em todos os quadrantes da cidade, além da área urbanizada, corroborando a tese de
Smolka sobre a demanda antecipatória. Em amarelo, direção Centro-NO, a linha de transmis-
são de energia.
59
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
60
estacionamentos. O modo de transporte mais elástico, representado pelos ônibus,
resultou também na expansão maior da periferia, alterando as relações de
acessibilidade estabelecidas anteriormente pelos bondes (Lefèvre apud Amadio,
1998, 55)
Como se verifica no quadro, na década de 1930 o número de ônibus mais que
dobrou em apenas seis anos:
Com relação aos serviços de iluminação da cidade e de distribuição de energia
elétrica, estes se constituíram em uma longa disputa entre a Light e a “San Paulo
Gas Company”, que perdurou até o final da primeira década do século XX. A
absorção da companhia de gás se deu em 1913, através da compra no mercado
londrino de suas ações, uma operação realizada por terceiros e repassada a
outra empresa do ramo controlador da Light. Inaugurado o serviço em 1872, a
concessão à “San Paulo Gaz” foi prorrogada por trinta anos em 1897, havendo,
entretanto, cláusulas que permitiam ao Poder Público a contratação de iluminação
elétrica das vias públicas. Por meio de uma estratégia que foi a de instalar
iluminação festiva para as comemorações da Proclamação da República, em
1907, a Light logrou iniciar a conquista do mercado lucrativo do Centro, condição
que impunha para iluminar as áreas suburbanas, não atendidas pela iluminação
a gás (Filardo Jr., 1998, 36).
A sobreposição de competências entre os governos estadual e municipal também
favoreceu o surgimento de espaços para que os contratos com a Light pudessem
ser firmados, sem conflito direto com a concessão à empresa “San Paulo Gaz”.
Visto que o poder de concessão era de competência do governo estadual, a
partir de 1911, sob o impacto da iluminação de vias como as avenidas Brigadeiro
Luís Antônio, Higienópolis e Paulista, foram firmados contratos que se estenderam
para ruas da Penha, Lapa e Ipiranga. Em 1912, sobrepondo-se à iluminação a
gás, as ruas de Santa Ifigênia, Liberdade e Campos Elísios foram também
equipadas com iluminação elétrica (idem, 37).
Um relato da época mostra que “se quiser avaliar a cidade, verá no mapa uma
imensa aranha cujas pernas peludas são as linhas de bonde da Light (‘o polvo
canadense’) rodeadas de casas... De permeio entre as pernas do Canadian
61
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
Octopus, zonas verdes e
vazias. São Paulo tinha
em 1922 a extensão de
Paris, com três milhões
de habitantes nesse
tempo, para uma
população de 600 mil
em São Paulo”
(Americano apud
Sevcenko, 1992, 124).
Como analisou também
Filardo Jr, as empresas
concessionárias de gás,
eletricidade e transportes
urbanos, dispunham de
maneiras legais para adquirir, por meios amigáveis ou não, terras para construção
de instalações, depósitos, garagens de bondes, etc, e em relação à Light os negócios
imobiliários eram inerentes à sua atividade.
Essa articulação entre transporte urbano e o setor imobiliário, existente também
em diferentes cidades do mundo, se fez para garantir o sucesso de loteamentos,
só viabilizados se houvesse a ligação por meio dos bondes com o Centro. Também
na aquisição pura e simples de glebas para valorização, a presença da Light em
negócios imobiliários se fez presente, com atuação coordenada entre figuras da
política paulista ou empresas, como no caso da Cia. City (Filardo Jr., 1998, 79-
80).
Análises sobre a Light mostram que, na segunda metade da década de 1920,
gradativamente o interesse pelos transportes coletivos diminuiu, fruto das
divergências e disputas com o Poder Público que lhe impediram de implantar um
plano que incluía a construção de um sistema de Metrô, absorver o serviço de
transportes coletivo realizado pelos ônibus e aumentar as tarifas para custear
obras na área central. O número de bondes, que em 1910 era de 201, chegou
à metade da década de 1930 perfazendo 567 veículos.
Em face do interesse dispensado aos ônibus e automóveis que o Poder Público
manifestou no Plano de Avenidas, encomendado pelo Prefeito Pires do Rio, em
1928, a Light voltou-se à obras de retificação e inversão do curso do rio Pinheiros,
como forma de ampliar a capacidade de geração de energia elétrica, terminando
a operação do serviço dos bondes em 1947 (Eletropaulo, 1993, 14). Deve-se
acrescentar que, essa inversão autorizada em 1946 pelo presidente Eurico Dutra,
se foi proveitosa para os interesses da concessionária, foi altamente prejudicial
Fig.17: Iluminação festiva da Light.
62
ao meio ambiente e aos mananciais de São Paulo, como demonstram os trabalhos
de Branco, Silva e Alves, mencionados a seguir.
Analisando a baixa capacidade de abastecimento que São Paulo dispunha, aliada
a crescente poluição do Rio Tietê, Murgel Branco comentou que para a então
detentora do monopólio energético, a Companhia Light, “não interessava a
questão do abastecimento e, muito menos, a despoluição do Tietê e Billings, uma
vez que esgotos, ao passar por turbinas, geram eletricidade do mesmo jeito”
(Branco in Polis, nº 3, 1991, 55)
O trabalho de Filardo Jr. é incisivo em apontar a estratégia da empresa: “os
termos leoninos do projeto de modernização dos transportes coletivos (o metrô
da Light) de 1927 e a ampliação no mesmo ano, das concessões do Projeto da
Serra, de forma a incluir as operações imobiliárias no vale do rio Pinheiros, com
perspectivas de ganhos fabulosos, constituíam a única perspectiva de
convencimento dos investidores estrangeiros a assumir o risco Brasil (sic), percebido
então como alto, tanto do ponto de vista do câmbio, quanto da estabilidade
política”. O autor analisou a inviabilidade de aumentos de 50 a 100% no valor
das defasadas tarifas dos bondes ser suportada pelo público, depois das greves
de 1917 e da Revolução Tenentista de 1924. Quanto ao rio Pinheiros, a situação
se apresentou de forma diferente, pois a proposta de retorno das operações
imobiliárias seria feita em mercado futuro, sendo ainda diluído pela expansão
urbana e por isso mesmo aceito pelas autoridades governamentais (Filardo Jr.
1998, 162).
Uma visão abrangente sobre o alcance da atuação dessa concessionária é obtida
através da análise da sua receita nas duas primeiras décadas do século XX: em
1905 o transporte representava principal fonte de receita, 71,3%, contra 28,7%
do fornecimento de energia elétrica para a habitação, comércio e indústria,
perfazendo 4.213 consumidores. Já em 1920, esses números mudaram para
58,2% para o transporte e 41,8% para o fornecimento de energia, significando
54.116 consumidores. Praticamente no mesmo período, o uso da eletricidade
como força motriz da indústria subiu de 4,29% em 1907, para 47, 3% em 1920
(Eletropaulo, 1990, 116).
As usinas que proporcionavam a maior cota de energia, as de São Paulo e
Sorocaba, foram construídas por empresas estrangeiras (européias e norte-
americanas), buscando inicialmente lucros relacionados ao crescimento urbano
funcionalmente dependente do comércio do café (Dean, 1990, 14).
Posteriormente, a geração de energia elétrica tornou-se um importante suporte
para o crescimento industrial, como se depreende da análise de Singer: “As
primeiras fábricas eram acionadas por motores a vapor, alimentados por carvão
de lenha ou carvão importado, mas a produção subseqüente das máquinas
dependia da instalação de sistemas urbanos de energia hidroelétrica (1968,
39). A confirmação desse fato é dada pela construção da primeira usina da
63
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
“Light and Power Co. Ltd”: a usina Parnaíba, construída no município de Santana
do Parnaíba no ano de 1901, e que foi a primeira hidrelétrica no rio Tietê.
Como explicou Singer, a capacidade inicial dessa usina era de 2.000 kw, não
havendo demanda significativa de energia elétrica por parte das indústrias. Já
em 1912, quando a demanda se elevou, a usina passou a produzir oito vezes
mais, uma vez que a capacidade para o atendimento às indústrias já existia.
(idem 39).
O custo ambiental da geração de energia, aspecto que pouca importância
recebeu na época e, ainda mais manipulado politicamente pelos interesses da
concessionária, foi alto para a cidade. Conforme estudo da Secretaria Municipal
de Planejamento “em 1901, com o início do funcionamento da usina de Parnaíba,
a Light define a primeira etapa de um longo plano, visando apropriar-se de todo
o potencial hidráulico da região de São Paulo para a produção de energia elétrica.
Em 1907, represam-se as águas do rio Guarapiranga, um dos formadores do rio
Pinheiros, com finalidade de regularizar o funcionamento da usina. Em 1926,
após represamento do rio Grande – represa Billings – inaugura-se a usina de
Cubatão, alimentada pelo lançamento das águas da Billings serra abaixo. Em
1927, a Light obtém concessão para captar águas diretamente no Tietê e lançá-
las para Cubatão” (Sempla, 1990, 75).
Concomitantemente ao crescimento de fornecimento de energia elétrica, através
da utilização dos recursos hídricos da cidade para esse fim, a ampliação das
redes de distribuição de água e de esgotos se mostrava imperiosa e se constituiu
em um problema crônico, pois, ainda em 1893, uma epidemia de febre amarela
teve como causa a contaminação por esgotos dos poços utilizados para
abastecimento familiar. Essa medida culminou com a formação pelo governo da
Província, nesse mesmo ano, da Repartição de Água e Esgotos – RAE, incumbida
de expandir os serviços que a Companhia Cantareira havia se mostrado incapaz
de fazê-lo.
A RAE logrou completar, de 1895 a 1898, as obras de adução dos recursos
hídricos existentes na Serra da Cantareira, incluindo a construção de novo
reservatório na rua da Consolação, e para isso foi construída até uma ferrovia,
o “Tramway da Cantareira”. Segundo registros dessa atuação, o abastecimento
alcançava apenas algumas áreas urbanas e eliminava as possibilidades de uso
até então gratuito da água: “o primeiro esforço da Repartição de Águas e Esgoto
foi fazer canalizações para regularizar o abastecimento de água em alguns bairros
da cidade. Mas, para forçar os moradores de certos locais a ter água encanada,
a Repartição mandou demolir alguns principais chafarizes que a Cantareira
entregara ao público anos antes, além daqueles que havia nos largos do Carmo
e Rosário. Quando derrubavam esse último, moradores e populares se opuseram
com violência, resistindo até que a força policial entrasse em ação” (Sabesp,
2000, 17).
64
A racionalidade que passou a fazer parte das empresas concessionárias para o
fornecimento dos serviços e sua relação com a ocupação do solo foi assim
assinalada: A construção de sistemas de abastecimento de água, esgotos, etc.
torna inviáveis construções fora das exigências estipuladas por lei. Ou seja, para
se obterem os benefícios oferecidos, por exemplo, pela Companhia Cantareira
era preciso construir-se dentro de determinado perímetro considerado urbano,
bem como obedecer às disposições estabelecidas pela companhia em contrato”
(Silva apud Grostein, 1987, 63).
Reside aqui uma importante mudança, que não se limita apenas à diferença
entre a forma antiga de abastecimento e o fornecimento por rede. O estudo de
Gronstein afirma que o que contribuiu fundamentalmente para a definição das
áreas consideradas urbanas, suburbana e rural, mais do que o Código de Posturas
de 1886, foi o padrão de assentamento das edificações para receberem os
serviços urbanos, estabelecendo-se assim uma nova ordem modeladora de
localização e alinhamentos (Grostein, 1987, 63). Esse estudo corrobora a relação
estabelecida por Solà-Morales (1997) entre urbanização (infra-estrutura),
parcelamento e edificação, para o caso da estruturação das áreas mencionadas.
Abordando as condições gerais de saneamento da cidade, que incluíam a
drenagem, um estudo da Secretaria Municipal de Planejamento analisa a não
aprovação do plano de Saturnino de Brito para a retificação do rio Tietê em
1925, sob a alegação dos altos custos que as desapropriações envolveriam
(Sempla, 1990, 75). Isso impediu a existência de um sistema de áreas verdes e
lagoas de contenção das águas pluviais, que evitariam as freqüentes enchentes
que passaram a ocorrer nas áreas da várzeas e mostra a influência da Light nas
decisões urbanas da cidade e conseqüentemente, no desenho urbano resultante,
pois o plano de Saturnino contrariava os interesses daquela concessionária, uma
vez que o mesmo
propunha o represamento
das águas do rio antes da
cidade.
Os estudos sobre o
abastecimento de água em
São Paulo mostraram que
os recursos hídricos tiveram
ao longo do século XX seu
uso definido para a
utilização em um sistema
hidrelétrico, que ofereceu
energia abundante e barata
para o crescimento do
parque industrial
Fig. 18: Usina de Esgotos da cidade, construída em
1876 às margens do rio Tietê, no bairro da Ponte
Pequena.
65
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
paulistano. O estímulo ao crescimento econômico, ao provocar o crescimento da
aglomeração urbana, desencadeou uma competição entre o crescimento demográfico
e o desenvolvimento industrial no uso da água, fato esse que gerou problemas de
abastecimento em 1929, obrigando a utilização do reservatório Guarapiranga para
o abastecimento público (Amaral e Silva, Polis nº 3, 1991, 58).
Em outra análise, a competição entre os usos dos recursos hídricos também foi
apontada como estratégia da Light em obter a utilização das águas disponíveis
ao abastecimento público para a geração de energia. Conseguindo autorização
governamental do presidente Arthur Bernardes para a construção das represas
Guarapiranga e Billings, em 1925, a concessionária passou a não cumprir os
estatutos da concessão em que constava a ressalva de que o uso energético
daquelas águas não poderia prejudicar o abastecimento da população, tornando-
se, segundo essa análise, proprietária das águas de São Paulo (Alves, idem, 65).
Assim é que, o sistema hidrelétrico estruturado para garantir a produção de energia
passou a comprometer as condições de abastecimento de água, passando também
a se constituir em um fator de agravamento das enchentes (Sempla, 1991, 75).
Diferentemente dos espaços de moradia da alta renda, onde os serviços urbanos
foram implantados já no nascimento dos bairros, a continuidade do processo de
transformação do território implicou na precariedade crescente desses mesmos
serviços para a população mais pobre. No início do século XX, com o crescimento
demográfico, agravaram-se os problemas sanitários e em 1914, ocorreu grave
surto de febre tifóide nos “bairros baixos”, provocado pelo uso das águas já
poluídas do rio Tietê no reservatório do Belenzinho, construído em 1909 (Sabesp,
2000, 26). O reservatório da Mooca, iniciado em 1926, só entrou em
funcionamento onze anos depois, mas, contratos com as concessionárias de
gás, água e esgoto foram estabelecidos pela Cia. City, sendo que entre 1918 e
1928 os únicos bairros novos incorporados às redes de água e esgotos foram os
recém parcelados Jardim América e Jardim Europa (Morse, 1970, 135).
66
Mapa 12 e 13: Áreas
servidas por rede de
água em 1900 (ao
lado) e em 1928
(próxima página).
Mapa 10 e 11: Áreas
servidas por rede de
esgoto: em 1900 (ao
lado) e em 1928 (próxima
página)
67
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
68
1.5. Imbricação: sanitarismo, parcelamento do solo e legislação urbanística1.5. Imbricação: sanitarismo, parcelamento do solo e legislação urbanística
1.5. Imbricação: sanitarismo, parcelamento do solo e legislação urbanística1.5. Imbricação: sanitarismo, parcelamento do solo e legislação urbanística
1.5. Imbricação: sanitarismo, parcelamento do solo e legislação urbanística
até a década de 1930até a década de 1930
até a década de 1930até a década de 1930
até a década de 1930
Frente ao quadro de expansão urbana descontrolada, da abertura de loteamentos
e dos problemas de ordem sanitária, a regulamentação urbanística surgiu como
forma de se condicionar esse processo de expansão a padrões aceitáveis e
estabelecer normas sanitárias para as construções e a cidade, a fim de se debelar
as epidemias cíclicas que assolavam a mesma.
Osello, em seu trabalho sobre o Planejamento Urbano em São Paulo, mostra
que desde as origens a interferência do Poder Público no processo de produção
e reprodução do espaço urbano foram limitadas pelas normas liberais vigentes,
muito embora se reconhecesse a necessidade de controle público sobre as
construções (Osello, 1983, 26).
Segundo o autor, as leis urbanísticas modernas que foram implantadas, se
destinaram a fazer frente aos problemas decorrentes do desenvolvimento industrial
na cidade, formando, segundo suas palavras, dois grupos distintos e
complementares: um de leis sobre os loteamentos e outro de leis sanitárias que
estabeleceu dimensões e características mínimas para as construções urbanas”,
já que as que as precederam, ainda no século XIX, não foram capazes de fazer
frente ao crescimento que a cidade experimentou (idem, 31). No desenvolvimento
a seguir, esses grupos de normas legais serão detalhados, a começar pela
legislação de cunho sanitarista, para posteriormente ser enfocada a relação
entre as normas urbanísticas e o parcelamento do solo dirigido pelo mercado
imobiliário.
O controle urbanístico da cidade, até a década de 1930, através atuação da
municipalidade caracterizada pelo “Planejamento Normativo”, se deu através
dos seguintes instrumentos:
- De 1890 a 1913, vigorou o Código de Posturas sobre a abertura e largura das
vias e execução de obras de 1886 (Lei n° 1.666/13).
- Em 1915 (Lei nº 1874), foi regulamentada a legislação sanitária existente,
relacionando-a também com as construções, e além disso, estabelecida por ato
complementar do ano seguinte (ato nº 849), a subdivisão do município em
zonas central, urbana e suburbana.
- A Lei estadual de 1917 (n° 1956) regulamentou padrões sobre construções,
reformas e licenciamento de edificações.
-1923: Lei de arruamento juntamente com a Lei nº 2.611/23
-1929: Código Arthur Saboya (Lei nº 3.427).
69
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
Os problemas que atingiam os bairros populares vizinhos ao centro, acumularam-
se durante as últimas décadas do século XIX e nas primeiras do século XX. As
condições sanitárias da cidade, nesse período, foram descritas pelo médico Bruno
Rangel Pestana, do Instituto Bacterológico, que demonstrou que 80% dos casos
de febre tifóide ocorridos entre 1913 e 1916, deram-se nos bairros situados em
áreas vizinhas aos rios Tietê e Tamanduateí. Outros casos de doenças demonstram
a freqüência com que epidemias ocorriam na capital: em 1893 e 1908, varíola;
em 1899, 1904, 1913 e 1916, febre tifóide; focos de rubéola em 1906, encefalite
em 1920, febre amarela em 1893 (Bertolli Fº, 2003, 56). Duas situações se
distinguiram, com relação ao enfrentamento desses problemas:
-A determinância geográfica dos acontecimentos, onde as doenças que assolavam
a cidade tiveram como cenário os distritos suburbanos e os bairros operários,
especialmente as áreas onde se encontravam os cortiços.
-A diferença entre os bairros proletários, onde pouco se fez para melhorar as
condições sanitárias e aquelas das áreas nobres da cidade. Segundo relatório
de Emílio Ribas, quando ocorreram casos de febre tifóide em 1895 na Vila
Buarque, “em poucos meses foi feita a total recuperação dos sistemas de água e
esgoto daquela área, vindo a doença a desaparecer completamente da região”
(Ribas apud Bertolli F°, 2003,57).
Mesmo as intervenções paisagísticas na área central, como o alargamento da
rua Líbero Badaró foram relacionadas ao urbanismo sanitarista, como afirmou
Someck, pois nessa área ocorria a incidência de cortiços e de prostíbulos. Nas
palavras da autora “nessa época, o discurso sanitarista domina o pensamento
urbanístico. A eliminação da pobreza coincidia com a eliminação da doença e se
justificava por isso. Não se cogitava qualquer programa de cunho social” (Someck,
1997, 76).
Considerando a escassez de infra-estrutura de saneamento e de abastecimento
de água, um estudo sobre as condições sanitárias das áreas da cidade nas
primeiras décadas do século XX corrobora a distinção existente entre as áreas
urbanas: “a explosão demográfica não foi acompanhada de ampliação
equivalente da rede de serviços básicos...Na virada do século, era quase absoluta
a falta de infra-estrutura urbana na zona leste. Os operários – em sua maioria
italianos – viviam em condições precárias nos casebres e cortiços que proliferavam
no Brás e na Moóca. Transportes, rede de água e esgotos, iluminação pública,
escola e outros serviços eram praticamente inexistentes. A construção de vilas
operárias junto às fábricas representou uma tentativa de algumas grandes indústrias
para remediar essa situação calamitosa....Somente na época da Primeira Guerra
Mundial, tais equipamentos urbanos passaram a ser instalados. As melhorias
urbanas introduzidas no Brás e na Moóca provocaram uma valorização dos
terrenos e, com isso, o deslocamento da população de menor poder aquisitivo
70
para a região mais a leste, onde se formaram novos bairros” (Sempla, 1985,
15).
Para fazer frente aos surtos, as ações do poder público no controle sanitário e no
combate às epidemias (do cólera e posteriormente febre amarela) foram
desencadeadas uma série de medidas que se estenderam do meio urbano ao
controle dos domicílios, resultando nas seguintes ações:
- Criação da Diretoria de Higiene, visando o controle sanitário através de poder
de polícia e a promulgação do Código Sanitário de 1894 (nos moldes do código
francês de 1850);
- A encampação da concessionária Companhia Cantareira de Águas e Esgotos,
em 1892, devido a morosidade na implantação das redes de distribuição de
água e coleta de esgoto;
- A criação da legislação do uso do solo, inicialmente com o Código de Posturas,
de 1886, o já mencionado Código Sanitário e da Lei 38 de 1893 que estabelecia
como obrigatória a aprovação de plantas para as novas edificações de São
Paulo (Bonduki, 1998, 30-38).
Detendo-nos inicialmente na atuação da Diretoria de Higiene, esta se voltou
prioritariamente à tarefa de debelar o surto epidêmico de febre amarela e do
cólera, este último descoberto na Hospedaria dos Imigrantes em 1893. Após a
identificação do foco inicial, as inspeções domiciliares foram adotadas como
estratégia para a descoberta de outras possíveis ocorrências em São Paulo e
essa atuação incluiu além do ataque a focos e remoção dos doentes, a invasão
de casas, desinfecção de imóveis, demolição e queima de casebres, prisão de
suspeitos, etc. (idem, 31).
As medidas sanitaristas tiveram como paradigma a atuação do médico Oswaldo
Cruz, no Rio de Janeiro. Atingida por epidemias de febre amarela e varíola,
Oswaldo Cruz fez derrubar cerca de 600 cortiços do centro daquela cidade,
eclodindo em novembro de 1904, sob o governo de Rodrigues Alves, a “Revolta
da Vacina”, com incontáveis mortos e feridos que se opuseram às medidas
impostas pelo governo central. A incidência das epidemias reduziu-se
drasticamente (469 casos de febre amarela em 1903 e 3500 de varíola em
1904 para números insignificantes, nos anos seguintes). As medidas sanitárias
reduziram as doenças, mas contribuíram para o aumento das favelas na então
Capital Federal (
disponível em <http://www.fiocruz.br> em 2004).
Em São Paulo a questão sanitária foi tratada inicialmente pelo Código Sanitário
Estadual, de 1894, referenciado na Lei de Higiene Residencial, decretada na
França em 1850. As teorias presentes nesses instrumentos influenciaram os
médicos higienistas que desenvolveram a teoria do contágio na qual a propagação
das doenças ocorria em função de um meio inadequado. O combate à presença
71
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
de lixo, águas estagnadas, pântanos e várzeas, aglomerações humanas
concentradas e ar viciado era fundamentado pela “Teoria dos Miasmas”, onde
o ar era o principal vetor de transmissão das doenças (Simões Jr in IPPUR/UFRJ,
1994, s/pág).
Posteriormente, as teorias de Pasteur corresponderam a um avanço científico de
grande importância na identificação dos microorganismos, dando origem a novas
medidas higienizadoras que dirigiram uma atuação ao combate aos insetos e
animais transmissores e propugnaram a vacinação em massa e cuidados com a
insolação, além da ventilação das residências, como forma das populações
evitarem as tão recorrentes doenças e epidemias.
Dessa forma, a teoria do contágio foi deslocada do meio físico (tipos de solo,
rios, pântanos, topografia, ventos) para o meio social, do espaço público para o
espaço privado, apontando para os perigos do modo de moradia e vida da
população miserável das cidades. Como explicou Simões Jr. “a repercussão
desses novos princípios vem trazer alterações significativas na organização dos
ambientes de permanência humana prolongada, e portanto, em muitos dos
parâmetros utilizados pela arquitetura (idem, 1994, s/pág.).
Retomando as teorias sanitaristas anteriores a 1900, focadas na “viciação do
ar”, as mesmas contribuíram para incorporar ao Código de Obras medidas
preventivas como pé-direito e cubagem mínimas por cômodos, que foram
criticados pelo engenheiro Victor da Silva Freire, que chefiou a Diretoria de Obras
Municipais e esteve presente nos congressos internacionais sobre construções de
cidades realizados na Europa entre 1890 e 1920 (Simões Jr, in E&D nº 34,
1991, 73)
Já em 1907, Freire abordou o aspecto higiênico dos Melhoramentos de São
Paulo, mais especificamente em relação à importância da luz e do ar na
salubridade das aglomerações humanas. Comparando com o que se realizava
na Europa, para ele a questão do arejamento urbano se iniciava na arquitetura
da habitação. Apontou o fato dos técnicos e legisladores esquecerem de levar
em conta os fatores “casa e rua, rua e casa para a formação da cidade salubre
e criticou a cópia das disposições estrangeiras que não atendiam as condições
próprias do meio e do clima.
Além disso, o excessivo parcelamento interno das habitações seria o responsável
pelas más condições de insolação e ventilação nas casas de São Paulo, onde
75% das habitações da cidade corresponderiam à repetição de “meia dúzia de
tipos” nos quais os cômodos de permanência habitual e noturna enfileiravam-se
em relação ao corredor, sacrificando o ar e o sol, fazendo com isso, menção ao
mesmo problema encontrado pelo engenheiro inglês John Frick nas casas do
Rio de Janeiro (Freire in Revista Politécnica, 1914, n° 48, 324).
72
Considerando o que foi observado, as alterações na legislação em relação a
casa provocaram:
1. A eliminação das exigências relativas à cubagem, presentes ainda no Código
Sanitário Estadual de 1917 (a lei estadual de 1911 estabeleceu o volume mínimo
de 30m³ por aposento)
2. A diminuição dos pés-direitos, tanto por serem inúteis do ponto de vista da
ventilação, como por encarecer os custos de construção e exigir mais esforço de
um pavimento a outro.
3. A revisão do Código Sanitário, definindo novas disposições em função da
climatologia do estado de São Paulo, prescrevendo a necessidade da orientação
das edificações garantir uma insolação mínima de três a quatro horas por dia.
4. A lei específica sobre insolação, que foi incorporada ao Código de Edificações
de 1916 (ato n° 900/1916) e definiu aberturas para a frente das edificações,
áreas internas ou corredores de iluminação com largura mínima de 2 metros,
podendo ainda crescer em função da orientação da construção em relação à
linha N-S. (Simões Jr in IPPUR/UFRJ, 1994, s/pág.)
Em relação à legislação urbanística voltada às ruas, essa lei incidiu também na:
1. Orientação das ruas, quadras e lotes em relação à linha norte-sul, visando
melhor insolação e buscando dificultar a abertura de ruas com traçados
perpendiculares a ela.
2. O Código de Posturas de 1866 definia a ortogonalidade da malha urbana,
através da obrigação de ruas retilíneas e praças quadradas. As ruas deveriam
ter uma largura invariável de 16m. Victor Freire propôs a diminuição desse padrão
importado da França, alegando ser 8 metros uma largura suficiente e
incorporando para as áreas de expansão da cidade os princípios de hierarquia
viária estabelecidos por Stübben vinculando às dimensões de tráfego local, de
passagem e avenidas e a altura dos edifícios.
3. Pelos instrumentos normativos de 1920 e 1923 (Padrão Municipal e Lei dos
Arruamentos), os edifícios passaram a ter suas alturas fixadas de acordo com a
largura das vias, como será visto adiante.
4. Outra alteração significativa, decorrente da diminuição das dimensões do
arruamento e das quadras, enfatizada por Freire, se deu em relação à economia
proporcionada pela menor necessidade de terraplenagens e de menores distâncias
para a instalação de infra-estrutura urbana (idem, s/pág).
A decorrência dessas medidas em São Paulo foi a de terem transformado a
volumetria, considerada “antiga”, das tipologias existentes.
73
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
Simultaneamente à questão sanitarista, outro problema crescente em São Paulo,
desde as duas últimas décadas do século XIX, foi o da autorização ou proibição
de usos e padrões construtivos em sua área urbana. O rápido crescimento
populacional foi acompanhado do intenso parcelamento das antigas chácaras,
que passaram a servir de base fundiária aos loteamentos. Associado ao
crescimento das atividades econômicas e a conseqüente diversificação da cidade,
o incentivo ao mercado imobiliário também contou com os seguintes fatores:
-o período do Encilhamento, que em 1890 favoreceu a constituição acionária
de empresas que dispunham de emissões de bancos para o financiamento na
compra de terras e para a construção civil (Yazigi, 2000, 100).
-o lançamento de hipotecas sobre os imóveis urbanos, em 1900, como condição
para a concessão de créditos aos fazendeiros, fator que estimulou o processo de
expansão urbana com o lançamento de novos loteamentos (Souza, 1994, 57).
Castillo abordou esses fatores como marcos da intensificação da mercantilização
do solo da cidade. A valorização da terra urbana, a ponto de torná-la um
investimento lucrativo, ocorreu segundo o autor, como um reflexo material
decorrente dos melhoramentos na cidade (Castillo, 1993, 92). Em relação ao
Encilhamento, mencionou que: “é assim, sob esse contexto que São Paulo
conheceu a instalação da Bolsa Livre, de efêmera vigência, de várias companhias
industriais, de casas comerciais e bancos. Muitas dessas companhias e bancos
tinham a atividade imobiliária – venda e compra de terrenos urbanos – sua base
de sustentação” (Barbosa apud Castillo, 1993, 92). É estreita, portanto, a relação
entre os investimentos públicos em infra-estrutura do período, e a conseqüente
internalização desses investimentos pela atividade imobiliária.
O outro fator para a mercantilização do solo, as hipotecas de imóveis urbanos
para subsidiar a expansão cafeeira, teve desdobramentos igualmente importantes
para o mercado imobiliário: “no governo de Bernardino de Campos (1902-
1904), se tomam todas as providências no sentido de habilitar o imóvel urbano
como bem hipotecável para fins de crédito agrícola. Ou seja, a cidade estava se
aprontando, se embelezando para que seus imóveis tivessem
mais que um valormais que um valor
mais que um valormais que um valor
mais que um valor
de uso, mas um valor substancial de trocade uso, mas um valor substancial de troca
de uso, mas um valor substancial de trocade uso, mas um valor substancial de troca
de uso, mas um valor substancial de troca
(idem, 95, grifo nosso).
Um exemplo expressivo da relação entre bancos e investimentos imobiliários foi
dado pelo arquiteto Ramos de Azevedo, que participou de ambos. Segundo
Lemos, em 1911 Ramos de Azevedo fundou o Banco Ítalo Belga, juntamente
com outros ilustres membros da aristocracia local
1
. Já em 1913, fundou a
Companhia Suburbana Paulista, voltada a parcelar as terras entre o Butantã e
Osasco para chácaras, lotes residenciais e industriais (Lemos, 1993, 77).
Em São Paulo, além do núcleo central da cidade, que abrigava o Triângulo
histórico, já haviam sido definidas algumas localizações de bairros da elite, áreas
74
industriais e de moradia popular, estas situadas junto aos bairros onde se situavam
as fábricas. A atividade imobiliária superava a demanda e criava ao longo das
vias de transporte, uma sucessão de loteamentos desconectados e muitas vezes
sem obediência às tímidas recomendações da municipalidade, expressas ainda
pelo Código de Posturas de 1886.
Apenas para as áreas consideradas nobres, as exigências fixadas pelos loteadores
foram rigorosas, preservando-as contratualmente de usos incômodos,
fracionamento e edificações julgadas incompatíveis nesses empreendimentos.
Assim como ocorreu nos Campos Elísios, Higienópolis e avenida Paulista, ainda
no século XIX, esse fato se repetiu também com a Cia. City a partir de 1913 e
com os bairros-jardim de outras empresas loteadoras, como será mostrado
adiante.
A diferenciação dos espaços que a cidade passou a apresentar foi fruto das
diferentes formas de apropriação e comercialização do solo urbano de São
Paulo. Segundo Rolnick, os loteamentos populares prescindiam de proibições
aos usos que foram feitos em outras partes da cidade, como o Triângulo Central
ou na zona urbana, constituindo esse aspecto
um importante fator de atratividadeum importante fator de atratividade
um importante fator de atratividadeum importante fator de atratividade
um importante fator de atratividade
para oportunidades imobiliárias de pequenos e grandes investidorespara oportunidades imobiliárias de pequenos e grandes investidores
para oportunidades imobiliárias de pequenos e grandes investidorespara oportunidades imobiliárias de pequenos e grandes investidores
para oportunidades imobiliárias de pequenos e grandes investidores “(grifo nosso).
Nas palavras da autora, “ao contrário dos loteamentos residenciais exclusivos,
que procuravam predefinir o tipo de uso ao estabelecer um tamanho de lote e,
posteriormente garantir uma forma de implantação através de lei, o loteamento
no subúrbio popular era o que Victor da Silva Freire denominava de ‘lote para o
que der e vier
2
(Rolnick, 1997, 116).
O estudo de Grostein mostra que até 1913 o Poder Público contou com precários
meios de controle e registro dos arruamentos e parcelamentos, atuando com o
Código de Posturas do Município. Apenas em 1913, surgiu a primeira lei de
arruamentos, seguida da lei de oficialização das vias clandestinas em 1916. Até
a promulgação do Código Arthur Saboya, apesar de ser solicitado que os
arruamentos se submetessem a diretrizes viárias ditadas pela municipalidade,
quando da abertura de novas vias, conviviam na cidade dois tipos de vias, as
particulares e as públicas, gerando problemas em relação à clandestinidade das
primeiras (Grostein, 1987, 41).
Em 1923, através da Lei Municipal nº 2611, o poder público buscou interferir
na abertura de loteamentos e arruamentos, visando a continuidade da malha
urbana. Como será visto adiante, essa lei definiu a hierarquização das vias,
padrões para o tamanho dos lotes, taxas de ocupação e recuos, sem contudo
estabelecer os usos que seriam permitidos na área urbana. Embora tenha
avançado em relação às anteriores, essa legislação não logrou resultados na
regulação da expansão da área urbana do município, por conta da prática
75
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
comum do loteamento clandestino e pela falta de fiscalização nas áreas mais
afastadas do núcleo central. (Wakisaka, 1991, 52)
Com exceção do núcleo central e dos bairros de elite, no restante da cidade os
interesses dos loteadores prevaleceram sobre as poucas diretrizes da
municipalidade sobre o parcelamento e arruamento. Até 1923, o loteador era
obrigado a apresentar apenas o traçado do arruamento, sem a delimitação dos
lotes. Além disso, o arruamento poderia ainda não estar de acordo com os
preceitos do antigo Código de Posturas, ou seja, largura de 16 metros e malha
viária ortogonal. A delimitação do perímetro urbano em 1913 foi definido
simplesmente como um círculo com 3.300 metros no entorno da Praça da Sé,
sendo o perímetro suburbano o restante da área do município (idem, 90).
A verdadeira anarquia que se constituiu o processo de parcelamento da cidade,
antes da lei de 1923, permitiu que a ocupação dos lotes dos arruamentos
aprovados ou oficializados fosse feita sem qualquer restrição, dando origem a
bairros como Casa Verde, Vila Cerqueira César, Vila Maria baixa, Jardim Japão,
Vila Pompéia, Vila Jaguara, Vila Mangalot, Vila Anastácio, Aclimação, Bosque
da Saúde, Mirandópolis, etc. (Trapé apud Grostein, 1987, 90)
Mapa 14: A cidade em 1915, Repartição de Águas e Esgotos.
76
A Lei de 1923 instituiu:
-Necessidade de diretrizes viárias para a abertura de ruas ou arruar e lotear com
um plano de referência ou conectado à estrutura já existente da cidade
-Alvarás de licença
-Plano de loteamento das quadras resultantes do arruamento, constando a
situação com curvas de nível, arruamento, espaços livres, plano de nivelamento
das ruas, sistema de escoamento de águas superficiais.
-Obrigatoriedade de saneamento dos terrenos alagadiços para execução de
arruamentos
Além desses dispositivos, instituiu-se a doação de áreas à municipalidade quando
o empreendimento ocorresse em terrenos com mais de 40.000 m², sendo 20%
para as vias de comunicação e uma gradação para áreas livres: 5% da área
total na zona urbana, 7% na suburbana e 10% na rural. Foi instituída também a
área de 300m² como área mínima permitida para os lotes, e o agrupamento de
até seis casas.
Observando o que foi disposto, é necessário mencionar que continuaram a co-
existir as vias públicas e particulares, estas últimas abertas e sob a responsabilidade
de proprietários. A duplicidade de competências transformou as vias particulares
em uma alternativa para os loteadores escaparem dos controles da
municipalidade, fazendo com que fosse adotada uma política de oficialização
recorrente por parte do poder público (idem, 143).
Langenbuch aponta na planta da cidade de 1922, organizada pela comissão
Geográfica de São Paulo, os seguintes arruamentos isolados em maior ou menor
grau da malha contínua da cidade: Vila Maria Baixa e Jardim Japão (então já
interligados), Vila Guilherme, Tucuruvi, Chácara Itaim, Vila Anastácio e
Indianópolis, que aparecia ainda no início de arruamento.
Como núcleos isolados, separados da cidade apareciam Nossa Senhora do Ó,
Casa Verde, Santana, Penha, Vila Gomes Cardim, Vila Prudente, Ipiranga e Vila
da Saúde.
Foi também verificado um início de arruamento entre o bairro da Consolação e
Pinheiros. Entre Perdizes e Lapa, a Vila Pompéia e Vila Romana preencheram os
vazios existentes. Entre a Lapa e Vila Leopoldina, apareceram os loteamentos do
Alto da Lapa e Bela Aliança. Além deles já eram vistos os novos loteamentos
situados em áreas vizinhas ao bloco central da cidade, que já apresentavam
ruas arruadas, como o Pacaembu, Jardim América, Jardim Europa, Jardim Paulista
e Alto da Mooca. Langenbuch concluiu que a maioria dos loteamentos se
encontrava sem ocupação e que o espaço dessa expansão urbana superava
77
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
muito as necessidades da cidade, “permanecendo a especulação imobiliária
que já caracterizara o período anterior, segundo suas palavras (1971, 132).
O Código de Obras Arthur Saboya, de 1929, consolidou as disposições sobre
arruamentos, loteamentos e construções de 1923, contendo ainda normas
relativas à salubridade e estabelecendo gabaritos das construções em função da
largura das vias. Observou-se ainda que, o Código buscou estimular a
verticalização na zona central e tornou-a possível sob condições, na zona urbana.
Com relação a esses novos padrões, esse Código tornou mínimos os padrões
que a legislação de 1920 (lei n° 2 322) considerava máximos. A conseqüência
dessa legislação foi a de possibilitar um potencial construtivo maior para a área
do Centro (que incluía o Triângulo e grande parte da área além-Anhangabaú),
ocasionando com isso a contínua elevação dos preços dos terrenos e imóveis
naquela área (Rolnick, 1997, 129). Na análise sobre a Av. São João, desenvolvida
adiante, será possível verificar a aplicação dessas normas que definiram novas
volumetrias à cidade de São Paulo.
Retomando, o artigo 142 do Código Arthur Saboya instituiu que, para os edifícios
construídos no alinhamento das vias públicas na zona central, a altura mínima
era de cinco metros; duas vezes quando a largura da via fosse de nove metros;
duas vezes e meia quando a largura da via fosse de nove a doze metros e de
treze vezes quando a largura da via fosse mais de doze metros. A lei considerou
a largura da rua São Bento, no Triângulo Central, de nove metros e o Art. 180
proibia a construção com menos de quatro pavimentos (sem contar o
embasamento, isto é, descontado o porão) em todo o Triângulo comercial,
avenida São João, avenida Anhangabaú, ruas do Centro Novo e rua das
Palmeiras, entre a praça Mal. Deodoro e Largo Padre Péricles. Fora dessa zona,
as construções edificadas no alinhamento das vias teriam no mínimo, três metros
sob condição de não servirem para habitação” (Netto, 1947, 46). Essa restrição
se dirigia claramente às condições precárias dos casebres, combatidas pelos
órgãos públicos.
No tocante aos seus dispositivos voltados aos novos loteamentos, como na Lei
de 1923, o Código recomendou o máximo de 20% da área destes para o
sistema viário e 5% para praças. Estipulou ainda uma utilização de 3/5 das ruas
para a parte carroçável e 1/5 para cada calçada (Yázigi, 2000, 107). Também
presente nesse Código, a divisão da cidade por zonas central, urbana, suburbana
e rural, uma vez que a divisão dos perímetros urbano, suburbano e rural datava
de 1914.
Essa divisão incluía como primeira zona, ou Central, toda a área hoje
compreendida atualmente pelo Centro Velho e Centro Novo
3
. Como segunda
zona, ou urbana, um anel compreendendo grande parte dos atuais distritos que
hoje circundam o Centro, incluindo também Lapa, Pompéia, Perdizes, Vila Mariana
e Mooca
4
. Já a zona suburbana incluía as áreas de bairros como Pinheiros,
78
Ipiranga, Santo Amaro, Jabaquara, Tatuapé, V. Guilherme, Santana e Casa Verde
(Netto, 1947, 13)
O sistema viário da cidade foi hierarquizado segundo as seguintes categorias
constantes no Art. 734:
1ª categoria – estradas, só permitidas na zona rural e com largura mínima de
treze metros
2ª categoria – caminhos, igualmente só permitidos na zona rural e com largura
mínima de oito metros.
3ª categoria – passagens, só permitidas para construção de “casas populares”
(sic) com largura mínima de quatro metros.
4ª categoria - ruas de interesse local ou de caráter exclusivamente residencial,
com largura variando de oito a doze metros.
5ª categoria – ruas secundárias, com largura de doze a dezoito metros.
6ª categoria – ruas principais, com largura de dezoito a vinte e cinco metros.
7ª categoria – que abarcava as vias de grande comunicação e as artérias de
luxo com mais de vinte e cinco metros. (Netto, 1947, 162).
Conforme foi observado anteriormente, a cidade apresentou uma expansão
horizontal notável no período 1914-1930, mesma época em que os estudos do
Plano de Avenidas foram desenvolvidos e apresentados, objetivando a
desconcentração da Área Central. Essa expansão, responsável pela ocupação
quase que total dos bairros centrais e pela criação dos subúrbios, trouxe a marca
da cidade irregular. Incapaz de fazer frente aos loteadores, mesmo com a
promulgação do Código Artur Saboya, a municipalidade não dispunha de uma
visão urbanística integrada, muito menos condições de fiscalizar o conjunto de
arruamentos e loteamentos abertos de forma irregular. Já em 1931, o então
prefeito Anhaia Mello comprovava que a cidade clandestina era maior que a
cidade oficial (Rolnick, 1997, 149).
Muito embora os bairros centrais já estivessem grandemente consolidados
enquanto traçado e parcelamento, a liberalidade para com a expansão da cidade
nos subúrbios persistiu até 1950. Como conseqüência desse processo,
denominado de “descontrole consentido” por Grostein, (1987, 172), as
concessionárias de serviços públicos não instalavam redes nas ruas particulares,
já que todas as despesas das instalações correriam por conta do proprietário
das vias e lotes não oficiais, o que obviamente não era feito.
Desse modo, à medida que o processo de abertura de loteamentos teve
continuidade, o poder público se viu na contingência de sucessivas oficializações,
como a de 1936 (Ato 1.123), considerada a primeira grande lei de anistia para
79
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
os assentamentos populares (Rolnick, 1997, 172). A morfologia urbana dos
bairros centrais traz a marca desses eventos.
De forma diversa, nas áreas ocupadas pela população de alto poder aquisitivo,
a legislação se constituiu em uma incorporação de normatizações mais rígidas,
vindas dos loteadores particulares, o que definiu, já nas primeiras décadas do
Mapa 15 e 16: À esquerda: detalhes do mapa de 1915, onde a várzea do rio Tietê foi mapeada
sem os arruamentos e construções do morro do Pari. À direita, detalhe do mapa Sara Brasil, onde
foram registrados lotes, e não arruamentos, que, no caso, ainda eram irregulares.
Fig. 19 e 20: Acima, as travessas e
becos do Morro do Pari. Abaixo,
habitação remanescente do iníco do
século XX.
80
século
passado, um pré-zoneamento para esses espaços específicos: os bairros nobres
e o Centro histórico.
Além da obrigatoriedade de recuos que a legislação instituiu para os diferentes
bairros da cidade, nos bairros de alta renda o Código Arthur Saboya incluiu
também a proibição de construção de fábricas, como no caso do artigo 35,
referente à avenida Paulista e autorizou somente construções para fins residenciais
nas áreas ocupadas pelos bairros-jardim. Nos artigos 39 e 40, que trataram
dessa matéria, cuidou-se inclusive de incluir uma série de medidas necessárias
para que, com a anuência dos proprietários de imóveis distantes até 400 metros
fosse autorizada a criação de núcleos comerciais nas proximidades desses bairros
(Netto, op.cit, 21).
81
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
1.6. Imbricação: sanitarismo e habitação popular nos bairros centrais -1.6. Imbricação: sanitarismo e habitação popular nos bairros centrais -
1.6. Imbricação: sanitarismo e habitação popular nos bairros centrais -1.6. Imbricação: sanitarismo e habitação popular nos bairros centrais -
1.6. Imbricação: sanitarismo e habitação popular nos bairros centrais -
cortiçoscortiços
cortiçoscortiços
cortiços
e as vilas operáriase as vilas operárias
e as vilas operáriase as vilas operárias
e as vilas operárias
Considerando a questão da habitação social no quadro urbano que São Paulo
apresentava no período 1897-1930, foi essencial o contingente de mão-de-
obra ter se mantido próximo aos locais de trabalho, nas etapas iniciais do processo
de industrialização, sendo dois fatores determinantes para tal:
1. O processo de industrialização ter ocorrido impondo condições extremamente
desvantajosas ao operariado, sujeitando-o a moradias de aluguel disponíveis
nas zonas fabris ou em suas proximidades, áreas então desvalorizadas pelo
mercado imobiliário.
2. A abertura de novos espaços urbanos distantes do Centro ocorrer em função
do transporte ferroviário, que não oferecia flexibilidade para os deslocamentos.
Mesmo o bonde, que desempenhava o papel de distribuidor na malha da cidade,
representava um grande dispêndio aos trabalhadores. A comprovação disso é
demonstrada pela necessidade da empresa “Light and Power Co. Ltd.” ter que
destinar algumas de suas composições ao transporte de operários, em que eram
cobradas tarifas mais baratas nas linhas que corriam os bairros centrais com
destino às áreas industriais.
Dessa forma, para a população trabalhadora (incluindo partes da baixa classe
média representada por funcionários públicos e empregados no comércio), as
relações urbanas se pautavam pela proximidade entre os locais de trabalho e de
moradia. Com a ferrovia servindo de principal elemento estruturador da
localização das indústrias, outro fator relacionado ao processo de ocupação
Fig. 21: Bonde operário.
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das atividades foi o bonde, que necessitava de regiões adensadas para sua
operação e foi responsável por um modelo de cidade concentrado, se comparado
com os períodos seguintes da expansão urbana. Ao mesmo tempo que esse
modelo não estimulou a formação de bairros mais populosos distantes do Centro,
cumpriu um papel essencial dentro da estratégia de “manter o trabalhador
próximo ao emprego, uma vez que suas jornadas de trabalho eram extensas e
ele não dispunha de tempo para o transporte” (Sempla, 1985, 14).
O surgimento dos cortiços, como alternativa para a moradia da classe
trabalhadora, remonta o início do ciclo da industrialização em São Paulo, ainda
no final do século XIX, com a vinda massiva do imigrante europeu que se constituiu
na mão-de-obra das fábricas implantadas nos bairros próximos às ferrovias.
Diferentemente do Rio de Janeiro, onde desde meados da década de 1880 a
suburbanização havia se iniciado e já se constituindo em uma das alternativas
de moradia popular, em São Paulo este tipo de habitação se localizou nas áreas
próximas ao Centro, através de edificações com precárias condições físicas e
sanitárias e alta densidade de moradores.
Segundo o estudo de Lílian F. Vaz sobre a habitação popular no Rio de Janeiro,
no começo do século passado, posturas municipais procuraram restringir a
presença das habitações coletivas no núcleo central, ampliando a área de
proibição dos cortiços. Estes se multiplicaram nessa área por se constituir em
uma forma possível de aproveitamento do restrito espaço existente e responder
à necessidade de moradias baratas para os trabalhadores, proporcionando a
obtenção de rendimentos aos proprietários e arrendatários dos prédios e terrenos,
dado o alto valor dos aluguéis (Vaz apud Sampaio (org), 1998, 40/43).
As preocupações com o sanitarismo e o controle social presentes na reestruturação
da parte central da cidade do Rio de Janeiro, então Capital Federal, convergiram
para a ação conjunta dos governos municipal e federal em torno de três focos:
o controle sanitário, urbanístico e de circulação. Esses aspectos se constituíram
no eixo dos melhoramentos propostos no Programa de Renovação Urbana da
administração de Pereira Passos (1902-1906), cuja atuação contra as condições
da habitação popular na zona central, através das obras de saneamento e
embelezamento da cidade, foram conhecidas também pelo nome de “bota-
abaixo”. Como resultado dessas medidas, ocorreu uma dispersão dos moradores
pelas casas de cômodos situadas em áreas mais próximas, pelos subúrbios por
onde circulava a ferrovia e pelas favelas, que “passaram a fazer parte da imagem
urbana carioca num contraponto à modernização” (idem, 44).
Na cidade de São Paulo, nas últimas décadas do século XIX, a tentativa de
estabelecer a proibição de casas de cômodos ou cortiços esteve presente no
Código Sanitário de 1886. A existência dessas habitações, em grande número
na área central e em bairros onde a população negra ocupava, como Bexiga,
83
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STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
Barra Funda e Santa Efigênia, fez com que esse Código incorporasse uma série
de restrições à sua construção e de exigências para as novas edificações. Assim
como ocorreu no Rio de Janeiro, essa intervenção visou adequar a cidade à sua
nova imagem pública e responder às precárias condições sanitárias que grande
parte dos distritos paulistanos apresentava. Como exemplo, mencionamos o
distrito de Santa Efigênia, onde a população passou de 14.025 moradores em
1890 para 43.715 em 1893, e que em 1892 foi atingido por uma epidemia de
febre amarela, sendo responsabilizados o intenso adensamento e as condições
de higiene nas habitações (Rolnick, 1997, 37).
Os problemas que a cidade apresentou no início do século XX se originaram
devido ao rápido crescimento demográfico provocado pelo afluxo de
trabalhadores a São Paulo, iniciado no século anterior. As péssimas condições
dos bairros operários e das suas habitações suscitaram medidas por parte dos
órgãos públicos com o objetivo de debelar os focos de doenças, que tinham
como causa, segundo as teorias higienistas daquele período, o meio promíscuo
em que se encontrava a maioria da população. Nesse sentido, a casa e a cidade
se tornaram objeto de estudos do urbanismo sanitarista, concebido para o controle
das situações críticas originadas pela revolução industrial nos países centrais,
particularmente os europeus.
As condições extremamente precárias para os trabalhadores da cidade de São
Paulo reclamavam por soluções, como atestou Bandeira Junior em 1901: “Nem
um conforto tem o proletário nesta opulenta e formosa capital. Os bairros em
que mais se concentram por serem os que contém o maior número de fábricas,
são os do Brás e do Bom Retiro. As casas são infectas, as ruas, na quasi (sic)
totalidade não são calçadas, há falta de água para os mais necessários misteres,
escassez de luz e esgotos. O mesmo se dá em Água Branca, Lapa, Ipiranga, São
Caetano e outros pontos um pouco afastados. Entretanto sobra espaço para a
fundação de uma grande ou mesmo mais de uma vila operária, com secções
balneárias, lavanderia, escolas noturnas, secções de recreio, posto médico-
farmacia e outros confortos que constituem esses núcleos quando bem organizados
(Bandeira Júnior apud Blay, op. cit., 52).
Embora os cortiços fossem coibidos pela legislação urbanística, inclusive pela
consolidação do Código de Obras Arthur Saboya, na década de 1930 a cidade
dispunha de poucas alternativas para a população trabalhadora que não fossem
as habitações coletivas e estas se constituíram por décadas uma fonte de renda
segura para proprietários e construtores, a despeito de suas precárias condições
e da irregularidade perante as normas urbanísticas.
De acordo com os princípios higienistas, defendidos por urbanistas como Victor
de Assis Freire, as habitações coletivas ocupadas pela população pobre eram
contrárias à saúde física e moral dos trabalhadores. Para debelar as epidemias
84
e estabelecer um controle da “contaminação moral”, o Código Sanitário Estadual,
de 1894, entre outras disposições, proibia as habitações coletivas, as casas
subdivididas e as vilas operárias, estas permitidas apenas se possuíssem até seis
unidades e localizadas fora da aglomeração urbana.
No mesmo ano, a “Comissão de Exame e Inspeção das Habitações Operárias e
Cortiços no Distrito de Santa Ifigênia”, ao constatar a presença nesse distrito de
65 cortiços em 14 quadras, sugeriu o incentivo a empresários para construir
casas operárias distantes 15 quilômetros da cidade. A construção dessas
residências obedeceria aos seguintes critérios:
-Localização reunindo facilidade de comunicação e terrenos baratos.
-Estabelecimento de padrão distinto, implicando em maior aproveitamento
horizontal do lote.
-Transporte através de trens de subúrbio às áreas de emprego.
-Isenção dos impostos municipais e estaduais incidentes sobre as construções.
(Rolnick,1997, 123; Lemos apud Sampaio, 1998, 13; Blay, 1985, 64).
Fig. 22: Cortiço no Bexiga.
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E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
Configurou-se um quadro contraditório em que o Poder Público por um lado
restringia a possibilidade de uma tipologia no Centro e por outro preconizava a
sua construção em áreas mais afastadas (Rolnick, 1997, 59). A mesma Comissão
encarregou-se de definir duas tipologias: uma de casas mais baratas, que
poderiam ser construídas em qualquer área e outra mais cara para substituir os
cortiços centrais ou nos bairros mais próximos. Ficou patente também a relação
que a municipalidade estabeleceu com o transporte ferroviário, no sentido de
dispersar a aglomeração dos núcleos de casas populares para fora do Centro e
da Zona Urbana (Blay, 1985, 73), fato este que se tornaria o modelo de expansão
da cidade nas décadas seguintes, direcionada pela habitação popular.
O crescimento da cidade nas primeiras décadas do século XX trouxe como
conseqüência direta a expansão territorial diferenciada para os diversos segmentos
sociais de São Paulo. Abordando esse processo, Grostein analisa que os loteadores
asseguraram o uso por uma só classe das áreas nobres e ao mesmo tempo, o
poder público legislou de forma a direcionar e incentivar o investimento imobiliário
na produção de novas tipologias residenciais populares, que se constituíram nas
vilas operárias (Grostein in Sampaio, 1998, 103).
Como foi visto no quadro 2, a
população de São Paulo saltou
de 279.000 habitantes em
1905, para 415.000 em 1914,
chegando a 822.400 em 1930.
Em conseqüência desse
incremento, a crise da moradia
nesse período teve duas
componentes: a inexistência de
uma política definidora de regras
para o inquilinato e uma
produção oscilante da
construção civil a partir da
metade da segunda década.
A alta dos aluguéis tornou-se um
fator de pressão sobre o custo
de vida e como a maioria das
moradias da cidade eram
alugadas, o impacto recaiu
sobre a população de menor
renda, com conseqüências
diretas em relação a qualidade
da habitação possível de ser
alugada. Além da imprensa
Fig. 23: Cortiço do Brás, do início do século XX, na rua
Carneiro Leão, foto da década de 1940
86
ligada aos anarquistas e movimentos populares, que denunciaram continuamente
a espoliação que os aluguéis representavam para a classe operária, a crise foi
registrada também pela grande imprensa: “Em São Paulo de há muito tempo
que não há casas para alugar. Não se constrói mais. Os proprietários, que alguns
anos antes estavam numa verdadeira febre de construção, empregando
principalmente em casas para aluguel os seus capitais, com o encarecimento dos
materiais e por outras razões, que nos escusamos de numerar aqui, guardam
agora cuidadosamente o seu dinheiro e, quando abrem suas bolsas, é para
empregá-lo em coisas mais rendosas. Como a população aumenta, o resultado
é que vai se tornando mais difícil alugar-se uma casa e os proprietários vão se
tornando cada vez mais exigentes” (O Estado de São Paulo 25/11/1919, apud
Segawa, 2000, 128)
A queda da produção de construção de casas, que ocorreu durante e após a I
Guerra Mundial foi significativa. Segundo estatísticas da municipalidade, no ano
de 1907 foram registradas 1.237 licenças para construção; no ano de 1913,
esse número cresceu para 5.791, quase 400% a mais que o número anterior,
mas em 1916, foram expedidas apenas 1094 licenças (idem, 131). Outra
pesquisa mostra que entre 1914 e 1918 foram construídos, na cidade inteira,
menos de 6.000 prédios (Bonduki, 1998, 46).
Sob influência das idéias higienistas, as tipologias das habitações - casas
unifamiliares e vilas operárias - seguiram as leis que criaram restrições à
possibilidade de outro tipo de residência popular nas áreas central e urbana,
pelo menos dentro do quadro da legislação instituída. O alcance da legislação,
entretanto, mostrou-se limitado, na medida que a produção dessas habitações
para obtenção de renda de aluguel se constituiu em um empreendimento rentável
para particulares, criando-se um fosso entre os padrões legais e a atividade de
construção de moradias populares desde fins do século XIX.
Os níveis de remuneração da mão de obra trabalhadora não permitiam acesso
a um mercado formal de moradias unifamiliares, propugnado pelo enfoque
higienista e disseminado pelo poder público como o ideal da moradia operária.
A construção barata, com alta densidade de moradores, precárias condições de
higiene e uso comum de sanitários foi a alternativa possível, dadas as condições
de pobreza existentes (Bonduki, idem, 39).
Como a maior área de incidência dessas habitações era o Centro ou os bairros
centrais operários, grande parte dos cortiços e habitações coletivas foi tolerada.
Bonduki menciona a existência de inúmeras referências à demolição das
habitações tidas como insalubres, mas também o fato do poder público nunca
ter podido aplicar ao pé da letra a legislação, pois acarretaria desabrigar uma
grande parte dos trabalhadores que viviam naquelas condições (ibidem, 39).
87
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
Em 1927 uma comissão de notáveis entregou ao prefeito Pires do Rio um relatório
intitulado “A quanto monta a deficiência de alojamentos em São Paulo”, onde
para uma população calculada em 800 mil habitantes, 518 mil residências
apresentavam condições toleráveis de higiene. Os restantes 282 mil habitantes,
relegados aos cortiços e porões, demandariam o equivalente a 45.500 prédios
para seu conveniente alojamento”, segundo o referido relatório concluiu
(R.A.M.,82, 1942, 328).
Nos bairros centrais o aproveitamento máximo do lote urbano para a ocupação
horizontal de casas geminadas tornou-se o modelo para a habitação popular.
Foram previstas tipologias urbanísticas para a construção de conjuntos residenciais
populares pelo Código de 1929 e sua consolidação em 1934. Artigos específicos
da legislação instituíram diretrizes para a “abertura de passagens para a construção
de casas populares”, dispondo sobre a construção de casas com vias de acesso
– as passagens – com 4 metros de largura, que não poderiam fazer parte do
sistema viário da cidade. Os artigos 532 a 542 do Código de 1929, reproduzidos
em 1934 sob os números 749 a 761 foram revogados apenas em 1968 pela lei
nº 7.164 (Grostein apud Sampaio, 1998, 106).
Essas disposições apenas oficializaram a prática existente, já que inúmeras vilas
foram construídas por indústrias ou por particulares. Como afirma Bonduki, a
solução do problema da habitação pela tipologia das vilas, revestiu-se de duplo
objetivo: por um lado a municipalidade, através do discurso higienista, preconizava
a sua construção e a incentivava com isenções; por outro lado, o máximo
aproveitamento dos terrenos e a racionalização das construções tornavam esses
empreendimentos extremamente rentáveis em relação ao capital investido,
acrescido o fato de serem isentos de impostos municipais (Bonduki, 1998, 50).
As vilas obedeceram a diferentes padrões construtivos, o que as colocava em
uma situação mais próxima ou distante daquelas encontradas nos cortiços,
conforme áreas e equipamentos que as caracterizavam. Os cortiços também
possuíam diferenciações quanto às dependências e instalações, comuns ou
individuais. O ponto de ligação entre essas tipologias era a rentabilidade do
investimento imobiliário aferido pelo aluguel, o que ocasionou a sua disseminação
pela cidade (idem, 53). Já nas primeiras décadas do século XX, a paisagem de
bairros como o Brás, Mooca, Ipiranga, Cambuci, Bexiga e Lapa, revelava a
presença das vilas, casas enfileiradas e cortiços em vielas.
O Código de Obras de 1934 revogou a legislação anterior, referente às vilas
operárias, substituindo-as pelo conjunto de normas aplicáveis às casas populares
e condições dos cortiços, estes últimos proibidos. Esse Código instituiu também
a necessidade de aprovação da planta da unidade, juntamente com o
parcelamento da quadra ou área de implantação.
88
Além disso, normas rígidas fizeram parte das “Condições Especialmente Aplicáveis
às Casas Populares e das Condições de Cortiços”, como por exemplo, a proibição
de ocupação superior a 2/3 da área do lote pela construção, a exigência de
recuo lateral de 1.60 metros para unidade isolada ou conjunto de casas. Em
relação ao parcelamento do solo, o artigo 775 do Código Arthur Saboya instituiu
a largura mínima de oito metros para lotes nos bairros considerados populares,
permitidos, aliás, apenas na zona suburbana. Nas demais zonas, urbana e central,
a legislação definiu uma frente mínima de dez metros! (Netto, 1947, 76).
Nesse sentido, a construção de vilas operárias por parte de algumas indústrias,
conquanto atendesse às normas sanitárias, alojava menor número de
trabalhadores em proporção aos cortiços e geralmente eram acessíveis aos
funcionários especializados (Sempla, 1985, 13). Num período em que o Estado
brasileiro não interferia nas relações de trabalho e muito menos nas questões
ligadas à habitação social, Blay caracterizou as vilas, durante a primeira etapa
da industrialização, como uma alternativa de recuperação do investimento
econômico por parte dos capitalistas através do aluguel, da mesma forma como
ocorria com os cortiços (Blay, 1985, 144).
Em se tratando de vilas operárias construídas pelas próprias indústrias, as mesmas
proporcionavam ainda outras vantagens ao empregador-investidor, como por
exemplo, a redução de aluguéis em troca de salários mais baixos, a absorção de
outros membros da família como empregados na fábrica e uma vinculação
casa-emprego que desencorajava a procura de melhores salários por parte dos
empregados, uma vez que isso implicava na obrigatória saída da habitação
(Bonduki, 1998, 49). Da mesma forma, Blay analisou que nas vilas operárias a
casa representou uma forma de reduzir o preço da força de trabalho, ampliar a
capacidade de acumulação (via aluguéis) e induzir o trabalhador a permanecer
no emprego (Blay, op.cit, 53).
Muito embora as vilas não oferecessem um número expressivo de moradias em
relação à demanda existente, suprida pelos cortiços, eram vistas como tipo ideal
de habitação proletária, ainda que eventualmente esse modelo fosse concebido
para áreas bem mais distantes do Centro, como propunha o “Relatório de
Comissão de Exame e Inspeção das Habitações Operárias e Cortiços no Distrito
de Santa Ephigênia” de 1893: A situação mais conveniente para as vilas operárias
deve ser, sem dúvida, aquelas que reúnam facilidade de comunicação, a barateza
dos terrenos, que devem ser amplos, bem como a vantagem de um abastecimento
regular. Em seguida, o relatório propunha a sua localização em torno da cidade
de São Paulo, num raio de 10 a 15 km, mediante certos requisitos como
duplicação de ferrovias, que favoreceriam o surgimento espontâneo dessas
construções “talvez sem maior auxílio dos cofres públicos” (Lemos apud Sampaio,
1998, 35).
89
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
No mesmo Relatório, entretanto, se revelavam as contradições sobre o problema
habitacional, mostrando os limites da atuação liberal do poder público na Velha
República. Recomendações sobre a construção de vilas com a participação dos
poderes municipal e estadual foram feitas, a título de não onerá-los com futuros
combates a epidemias e além disso, foi preconizada a necessidade de construção
das vilas “com auxílios mais diretos, visto não ser tolerável que se condene os
cortiços urbanos e que se desalojem as populações operárias sem lhes
proporcionar facilidades de obter agasalho em qualquer outro posto” (idem, 35).
Apesar dos cortiços serem
combatidos pelo poder público
e pelos membros que os
constituíam, a maioria da
aristocracia paulista, Lemos
apontou a existência de
proprietários de cortiços dentro
da sociedade tradicional tais
como o professor Brasílio
Machado, o Dr. Carmo Cintra,
o fazendeiro de café José do
Amaral Campos, Antonio
Cãndido da Costa Aguiar e
outros que assim agiam para
suplementação de suas rendas
(ibidem, 17).
As recomendações do “Relatório
de Comissão de Exame e
Inspeção das Habitações
Operárias e Cortiços no Distrito
de Santa Ephigênia
convergiram para os aspectos
definidos pela legislação
específica para habitação social,
que surgiu em 1900 através da
Lei 498, estabelecendo as
Prescrições para a Construção
de Casas de Habitação
Operária” fora do chamado
perímetro urbano, ou seja, da
área que abrangia pouco mais
que o Triângulo Histórico. Assim,
nos bairros do Brás, Belenzinho,
Fig. 24, 25 e 26: Cortiços remanescentes nos bairros
centrais.
De cima para baixo: Bom Retiro, Brás e Canindé, 2003
90
Moóca, Pari, Luz, Barra Funda, Água Branca, Ipiranga e Vila Prudente, a
construção das vilas operárias foi permitida com o incentivo de isenção de
impostos municipais, benefício estendido ainda aos agentes construtores (Rolnick,
1997, 125).
Comprovando o déficit que a cidade então apresentava em relação à habitação
social, em 1916 a administração do prefeito Washington Luís procedeu a abertura
de uma “Concorrência Pública para a Apresentação de Projetos de Casas
Proletárias Econômicas destinadas à Habitação de uma só Família”. Esse concurso
foi registrado como tendo alcançado sucesso no relatório entregue ao prefeito
Pires do Rio, em 1927, havendo a premiação de 20 projetos que estariam à
disposição de interessados na sua construção. Entretanto, o próprio relatório
ressalvava ter sido construída apenas uma e assim mesmo pela própria Prefeitura
(RAM, nº82, 1942, 331), não havendo registro qual tenha sido realizado e sua
localização.
Esses projetos foram submetidos a uma comissão julgadora formada por Ramos
de Azevedo, Victor da Silva Freire e Adolfo Augusto Pinto, e as tipologias
selecionadas em quatro grupos revelavam com nitidez os aspectos que eram
pretendidos em relação ao aproveitamento dos lotes e acomodação do programa
exíguo, satisfazendo as condições de higiene, comodidade, estética e economia:
-Grupo 1: projetos de edificações formando blocos de quatro casas geminadas
-Grupo 2: projetos de edificações formando renques geminados
-Grupo 3: projetos de edificações geminadas com apenas uma parede em comum
entre elas
-Grupo 4: projeto de edificações isoladas (Segawa, 2000, 135).
É necessário considerar a vinculação da legislação de 1900 com essas propostas
de “casas proletárias”, ao adotar no programa das habitações áreas mínimas
para os diversos tipos. Além disso, a segregação social mostrou-se presente pelo
fato das diretrizes daquele concurso não terem considerado a área de
implantação, definida apenas como sendo fora do perímetro urbano, assim
também como o custo do terreno, evidentemente abaixo dos valores das áreas
central e urbana (idem, 135).
Além das vilas que as indústrias construíram para parte de seus próprios
empregados, grande parte da produção desses conjuntos foi promovida por
uma gama de agentes que reuniu, desde pequenos investidores a empresas
construtoras e sociedades mutuárias, para a construção de vilas particulares
destinadas ao aluguel. Estas se configuraram com tipologias e dimensões muito
distintas entre si, que ora abrangiam várias quadras, ora constituíam pequenos
conjuntos de casas dispostas no alinhamento das quadras ou em renques
91
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
Fig. 27: Acima: Heliópolis, pseudônimo do engenheiro-urbanista Alexandre de
Albuquerque. Implantação Urbanae orientação derivada de estudos de insolação.
Fig. 28: Acima: elevações e plantas de
Joourdan &Pochon, vencedores do 2° grupo
92
transversais às ruas principais, ou mesmo mescladas as duas formas de
implantação para se obter a máxima ocupação dos terrenos. Tinham em comum
algumas características que garantiram a rentabilidade do empreendimento:
elevada taxa de ocupação, áreas livres exíguas, economia de materiais mediante
a construção de casas geminadas, ausência de recuos, etc. (Bonduki, 1998, 50).
Levando em conta a variedade construtiva que apresentavam, Bonduki afirma
serem imprecisos os limites que diferenciavam algumas vilas dos cortiços-corredor,
pois em muitos casos, a implantação em relação à quadra dessas duas tipologias
era equivalente, uma vez que utilizavam terrenos com grande profundidade e
perpendiculares à rua de acesso. Também, a dimensão entre a menor casa de
vila, constituída de sala, cozinha e cômodo, se equivalia aproximadamente à
maior unidade de cortiço. A diferença existia na oferta de equipamentos como
banheiro e tanque, individuais para as vilas e coletivos para os cortiços, ressalvado
se nos fundos dos cortiços houvesse disponibilidade desses equipamentos para
uma unidade, que assim ganhava novo “status”, podendo ser auferida maior
renda em relação ao seu aluguel (idem, 53/54).
Exemplos de vilas operárias de indústrias, vilas particulares e antigos cortiços
existem em quantidade nos antigos bairros centrais fabris e também em suas
imediações, constituindo uma das principais características morfológicas desses
espaços. Em uma pesquisa realizada sobre as vilas operárias no fim dos anos
1970, foram utilizados dados sobre uma área de 737 hectares englobando
parte dos bairros do Brás, Luz e Mooca, dentro do perímetro de interesse do
Fig. 29: Vila Iaia, rua Visconde de Parnaíba, Brás, 2003.
93
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
Fig. 30: Planta com homenagem ao construtor. Fig. 31: Vista aérea, 2000.
Fig. 32: Edifiação remanescente, 2003. Fig. 33: Planta da residência
de 1 dormitório
“Projeto Cura Brás-Bresser” da linha do Metrô Leste-Oeste
5
. Nessa área foram
relacionadas 162 vilas, com um total de 2.990 lotes, sendo 2.951 ocupados
por residências, perfazendo um total de 11.000 moradores. A maioria desses
conjuntos (71%) foi construída antes de 1930, com 56,5% de casas térreas e os
restantes 43,5% de sobrados (Blay, 1985, 153).
Dentre os inúmeros conjuntos remanescentes do período do início do século XX,
foram relacionadas as vilas a seguir como exemplos relevantes das tipologias
existentes nos bairros centrais:
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Vila EconomizadoraVila Economizadora
Vila EconomizadoraVila Economizadora
Vila Economizadora
Construída em 1907 no bairro da Luz por um mestre de obras italiano (Antonio
Bocchini) para a sociedade financeira de ajuda mútua “A Economizadora Paulista”,
como investimento para habitações de aluguel. (Sempla/Emplasa , 1984, 254;
Bonduki, op.cit, 66). Atualmente a Vila se encontra ocupada predominantemente
pela função residencial, tendo frentes comerciais para as ruas São Caetano e
Cantareira. A maioria das residências ainda mantém as características tipológicas
originais.
94
Fig. 34: Perspectiva Artística da Vila.
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Vila QueirogaVila Queiroga
Vila QueirogaVila Queiroga
Vila Queiroga
Construída no Brás, próximo ao atual Parque D. Pedro II, na antiga Chácara da
Figueira, por José Bernardino de Queiroga, a partir de 1905, para finalidade de
aluguel (Sempla/Emplasa, 1984, 252). Poucas casas não sofreram adaptações
ou acréscimos transformadores da sua tipologia original.
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Conjunto de residências da rua DrConjunto de residências da rua Dr
Conjunto de residências da rua DrConjunto de residências da rua Dr
Conjunto de residências da rua Dr
. R. R
. R. R
. R
odrigo de Barrosodrigo de Barros
odrigo de Barrosodrigo de Barros
odrigo de Barros
Conjunto da década de 1910, construído no bairro da Luz, pertencentes ao
conjunto urbanístico do Museu de Arte Sacra (idem, 258). As casas apresentam
uma ocupação variada, com funções residenciais, comerciais e de serviços e
definem ainda uma volumetria que predomina na rua onde se situam.
Fig. 37 e 38: Conjunto de residências da rua Rodrigo de Barros. Pertencem ao conjunto urbanístico
do Museu de Arte Sacra, 2003.
Fig. 35 e 36: Vila Queiroga, Brás, 2003.
95
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
-
Vila Maria ZéliaVila Maria Zélia
Vila Maria ZéliaVila Maria Zélia
Vila Maria Zélia
Situada no bairro do Belenzinho, próxima ao Pari, sua fundação ocorreu em 1916,
sendo construída pelo empresário Jorge Street para os operários da fábrica de
tecidos de sua propriedade. Obedeceu ao projeto do arquiteto francês Pedariex,
que incluiu igreja católica, grupo escolar, armazéns e depósitos (Blay, 1985, 225).
Na década de 1940, a Vila foi adquirida para servir de modelo ao Instituto de
Aposentadoria e Pensões dos Industriários – IAPI, criado no Estado Novo (Bonduki,
1998, 65). Atualmente a Vila tem suas unidades habitacionais totalmente ocupadas,
mas apenas uma minoria não sofreu transformações. Os equipamentos, por sua
vez, encontram-se totalmente abandonados e em estado de grande deterioração.
Fig. 43: Situação da Vila no início do século XX.
Fig. 39 e 40 (ao alto): Edifícios remanescentes em precário estado de conservação, 2003.
Fig. 41 e 42 (acima): Remanescentes das tipologias residenciais, 2003.
96
-
Conjunto de casas na Baixada do GlicérioConjunto de casas na Baixada do Glicério
Conjunto de casas na Baixada do GlicérioConjunto de casas na Baixada do Glicério
Conjunto de casas na Baixada do Glicério
Casas em renque construídas na Baixada do Glicério em torno de 1910, voltadas ao
programa de casas de aluguel, mostrando uma solução que deixou de ser posta em
prática após a crise de 1929 e da Lei do Inquilinato (SEMPLA/Emplasa, 1984, 256)
- Vila Suíça- Vila Suíça
- Vila Suíça- Vila Suíça
- Vila Suíça
Conjunto de residências também situado na Baixada do Glicério, na rua dos
Estudantes, rua Conde de Sarzedas e Praça Dr. Mário Margarido, datando da
mesma época e igualmente com as mesmas finalidades originais de habitação
para aluguel (idem, 256).
Fig. 44 e 45: Vila Suiça, 2003.
97
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
1.7. Imbricação: infra-1.7. Imbricação: infra-
1.7. Imbricação: infra-1.7. Imbricação: infra-
1.7. Imbricação: infra-
estrutura e novos bairros de alto padrão -estrutura e novos bairros de alto padrão -
estrutura e novos bairros de alto padrão -estrutura e novos bairros de alto padrão -
estrutura e novos bairros de alto padrão -
os bairrosos bairros
os bairrosos bairros
os bairros
-jardim-jardim
-jardim-jardim
-jardim
Diametralmente opostos ao problema da habitação popular, e mesmo à maioria
da cidade, sem normas urbanísticas a definir as atividades e as construções
permitidas ou não permitidas, os bairros-jardim se constituíram em uma exceção,
tanto em relação ao assentamento propriamente dito, quanto ao seu caráter
segregado no tecido urbano. Esses setores consolidaram, já nas primeiras décadas
do século passado, a localização preferencial da população de maior poder
aquisitivo e dos serviços, equipamentos e infra-estrutura a ela ligados.
A partir de 1912, a participação da “Cia. City of São Paulo Improvements Ltd”
teve início na cidade, atuando de forma bastante diferenciada da expansão
desregulamentada que ocorria na maior parte da cidade, exceção feita aos
espaços destinados à população de alta renda já existentes, como Higienópolis,
avenida Paulista e Campos Elísios. Utilizando a concepção das cidades-jardim
inglesas, como haviam proposto seus criadores, Raymond Unwin e Barry Parker,
a City contou também com a participação de Antoine Bouvard e chegou a deter
em 1912, 37% de toda a área urbana da cidade (Rolnick, op.cit, 134).
A participação inglesa na Cia. City não chegou a se constituir uma novidade na
cidade. Desde a implantação da ferrovia “San Paulo Railway”, em 1867,
empreendimentos ligados a infra-estrutura e ao setor têxtil contaram com a
participação de grupos ingleses. A diversificação de investimentos provenientes
da Grã Bretanha se fez presente em diferentes países, atuando nas ferrovias,
portos, telégrafos, carris urbanos, mineração, plantações, bancos, seguros e
comércio. As idéias urbanísticas também se difundiram, sendo a das cidades-
jardim, concebidas por Ebenezer Howard em 1898, uma das que tiveram grande
penetração não só em São Paulo, mas também no Rio de Janeiro, Belo Horizonte
e Goiânia, todas posteriores à experiência paulista (Ottoni apud Howard, 1996,
47).
Os investimentos da Cia. City tiveram grandes proporções, comparadas as áreas
das experiências inglesas das cidades-jardim e as de São Paulo: a área de
Lechtworth era de 1.138 hectares e de outra cidade-jardim, Welwin, de 525
hectares, não computados os cinturões agrícolas. As terras compradas pela
empresa em São Paulo, somavam 1.200 hectares, sendo 109 hectares o
correspondente ao Jardim América. (idem,70)
Iniciando seus negócios numa área ligada ao Centro, ocupada atualmente pela
rua Avanhandava, onde Bouvard interferiu no desenho das ruas em curva, os
bairros-jardim da Cia. City - Jardim América, Lapa e Pacaembu -além de outros
loteamentos como o Jardim Europa e Cidade Jardim, de propriedade de outras
empresas, já apareceram configurados no mapa de 1924, cinco anos após o
lançamento do Jardim América (Wolff, 1998,68)
98
Fig. 48: Plano de Parker e Unwin, de 1919, para o Jardim América.
Fig. 46 e 47: À esquerda: Plano de Letchworth
publicado em 1904. À direita: inserção na região.
99
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
Fig. 50 e 51: À esquerda: loteamento da City do Alto da Lapa.
À direita: loteamento do Pacaembu, década de 1930.
Fig. 49: Planta de 1924, de Gustavo Pujol Jr. A cor vermelha, no centro, indica os lotes
já vendidos naquela data.
100
Essa incorporação imobiliária, até então inédita em São Paulo, se diferenciou
muito do que se observava na cidade, como afirmou Morse, na citação
reproduzida a seguir:
“Uma exceção ao regime dos loteamentos mal planejados, destituídos de
zoneamento e altamente especulativos foi a Companhia City. Os vaticínios sobre
o futuro brilhante de São Paulo, feitos em 1911 pelo arquiteto francês J. Bouvard
levaram o belga E. Fontaine de Laveleye a adquirir mais de doze milhões de
metros quadrados de terrenos na zona oeste da cidade, os quais por sua vez
vendeu em 1912 por novecentos e cinqüenta mil libras à ‘City of San Paulo
Improvements and Freehold Land Co Ltd’, organizada em Londres com um corpo
de quatorze diretores, onde se incluíam ele próprio, Bouvard, Cincinato Braga,
Campos Sales e Lord Baltour. Contratando os serviços do urbanista inglês Barry
Parker – conhecido por seu planejamento da cidade de Letchworth, da aldeia-
jardim de Earswich e do centro cívico do Porto – a City começou a executar
planos de longo alcance para bairros residenciais...exigia do comprador
acatamento às suas estipulações quanto ao tamanho das residências e
conservação dos espaços livres, proporcionando em troca ruas cujo traçado
obedecia à topografia dos terrenos, arborização, todos os melhoramentos, estritas
regulamentações de zoneamento, títulos válidos de propriedade e algumas casas-
modelo...” (Morse, 1970, 367).
O contraste entre os padrões urbanísticos praticados fica evidenciado pela análise
comparativa com outros bairros da cidade:
A City, entretanto, só conseguiu proporcionar uma ou outra ilha estável e planejada
no revolto mar urbano. Dentro da ampla configuração estabelecida pelas várzeas
e pelo maciço, tem sido regra a mistura sem plano de zonas residenciais (da
classe alta e da classe baixa), comerciais e industriais, o que tem levado à rápida
e devastadora ‘contaminação’ (por exemplo Ipiranga, Barra Funda, Campos
Elísios, Glória) bem como à ganância nas valorizações repentinas. Além disso, os
espaços reservados para jardins ou parques infantis são insuficientes, muitas vezes
negligente e inconvenientemente situados e, com algumas exceções, destinados
mais a enfeite do que a uso.” (idem, ,368).
O texto que se segue, de uma publicação da própria Cia. City, expõe também a
formação e atuação da empresa na cidade:
Apesar de seu nome inglês, e de ter sido na origem dirigida e controlada por
ingleses, a Companhia City surgiu por iniciativa de franceses.
Em 1911, contratado pela Prefeitura de São Paulo, chegou a esta Capital o
arquiteto J. Bouvard, encarregado de planejar e construir a Av. São João, no
centro da cidade. Entusiasmado pela capital paulista, o arquiteto entrou em contato
com capitalistas interessados em empreendimentos imobiliários. Conquistando a
101
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
simpatia de alguns deles, retornou à França, onde se dispôs a abrir uma sociedade
que explorasse comercialmente amplas extensões de terra na região da cidade
de São Paulo, situadas fora da zona urbana na época.
Conseguindo inicialmente 12.000.000 m² dos 20.000.000 que haviam sido
solicitados pelo arquiteto, um grupo francês decidiu iniciar os negócios. Como
houvesse, entretanto, dentro dessa sociedade participação de capital inglês, iniciou-
se disputa pelo controle, logo no início de sua incorporação. Com o apoio de
alguns brasileiros, a sociedade passou definitivamente para o controle dos ingleses.
Dessa forma, em novembro de 1911, foi fundada em Londres a ‘City of São
Paulo Improvements and Freehold Land Company Limited’, com a finalidade de
realizar operações imobiliárias e de urbanização em São Paulo.
Em janeiro de 1912 foram adquiridos os terrenos para loteamento, num total de
mais de 12 milhões de metros quadrados correspondentes a áreas retiradas do
centro urbano, praticamente desertas. Essas áreas foram sendo progressivamente
transformadas em aprazíveis bairros residenciais: Jardim América, Pacaembu,
Alto da Lapa, Alto de Pinheiros, Butantã e outros.
A concepção urbanística utilizada para o desenvolvimento desses bairros demonstra
a categoria de um dos maiores arquitetos e urbanistas da época, Sr. Barry Parker,
trazido pela City Improvements para planejá-los” (Cia. City de Desenvolvimento,
1980, 1).
O estudo de Wolff mostra que no mapa de 1924, além dos traçados dos bairros-
jardim, já estavam presentes as áreas do Alto de Pinheiros e Butantã que
posteriormente fizeram parte da expansão da empresa loteadora. Nesse sentido,
segundo a autora, as áreas que a Cia. City tinha como disponíveis definiram um
eixo de concentração dos bairros residenciais de elite da cidade. Essa localização,
decorrente da implantação dos bairros aristocráticos desde as últimas décadas
do século XIX, prosseguiu através do rumo indicado pela rua Augusta, pela Vila
América, Jardim América, Jardim Europa, Cidade Jardim e Morumbi (Wolff,
1998, 68).
A abertura dos loteamentos da empresa seguiu critérios de proximidade com os
espaços já valorizados e segundo Reale, a Cia. City comprou em 1912, 80
terrenos da Cia. Edificadora de Vila América, porém devido ao alto índice de
construções existentes, a City não pôde implantar nenhum plano urbanístico,
atuando em conseqüência, como agente de vendas. Na época, a parte valorizada
do bairro era a compreendida entre as ruas Augusta e Pamplona, que recebeu
melhoramentos inexistentes em trechos próximos, constituídos de padrões mais
modestos (Reale, 1982, 128).
Essa proximidade também foi observada por Wolff na escolha dos loteamentos
da Cia. City, que se orientou pelos padrões que estruturavam as regiões próximas
e os bairros pré-existentes: “foi o caso das primeiras áreas que comercializou nos
102
loteamentos já implantados, Vila América e Vila Nova Tupi, em torno da rua
Augusta e na Vila Romana. Teve também glebas na Vila Mariana e no Ipiranga.
Estas terras da zona sul foram uma das poucas áreas das quais a City se desfez
em bloco” (Wolff, 1998, 68).
O motivo para não ter desenvolvido os loteamentos em outros quadrantes de
São Paulo pode estar na explicação do próprio Barry Parker: “o fracasso ou
sucesso dependiam em um grau excepcional de projeto, planejamento e
gerenciamento, e ainda, do tipo de casa e morador assegurado” (Parker apud
Wolff, 69). Essa estratégia certamente definiu uma hierarquia entre as áreas
adquiridas pela empresa, como mostrou o relato que associou diretamente a
relação de vizinhança entre as glebas daquela empresa: quanto ao Alto da
Lapa, que, segundo os técnicos daquela Companhia Imobiliária, era o local que
oferecia melhores condições para um bairro aristocrático, foi sempre prejudicado
pela vizinhança de um bairro operário, o que impediu que o caráter aristocrático,
que lhe era originalmente destinado, pudesse encontrar todos os requisitos para
firmar-se” (IBGE, 1962, 63)
Através dos dados da Cia. City, torna-se possível avaliar dentro das áreas que
foram adquiridas na cidade até 1931, o predomínio das glebas no setor sudoeste:
Levando em conta as terras que foram adquiridas após a década de 1930, a
atuação da empresa em relação às áreas loteadas destacou o partido urbanístico
e paisagístico, além de associá-los aos critérios contratuais, como mostra a
explicação:
“Em 1954, ano do quarto centenário da cidade de São Paulo, a Companhia City
possuía cerca de 17 milhões de metros quadrados de áreas loteadas. Mantendo
sempre a tradição e os princípios de urbanização com que iniciou suas atividades
nos idos de 1912, a Companhia procurou, reservando amplas áreas verdes,
preservar o conforto de seus bairros jardins, tornando famosos o Jardim América,
103
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
o Pacaembu e tantos outros. O traçado sinuoso de suas ruas, criticado a princípio,
mostrou-se bastante eficaz, sendo precursor da moderna concepção que evita
grande volume de tráfego pelas ruas sossegadas de bairros nitidamente
residenciais....
O padrão de seus loteamentos foi preservado por rígidas disposições contratuais,
capazes de garantir uma série de limitações no aproveitamento racional dos
imóveis, tais como a percentagem máxima de área construída, recuo e altura das
edificações.”(Cia. City de Desenvolvimento, 1980, 13).
Essas características urbanas iniciadas com o Jardim América em 1915, tiveram
dois aspectos pioneiros, como enfatizou Reale: o primeiro se referiu à infra-
estrutura urbana, pois foram colocados à venda lotes providos de todos os
melhoramentos, como rede de água e esgoto, luz elétrica, gás e iluminação
pública. O segundo se relaciona ao plano viário, que abandonou o traçado em
tabuleiro de xadrez e adotou as ruas em curva, “como alamedas de um vasto
jardim, com exceção da avenida Brasil, ampla radial com 20 metros de largura,
que percorria o loteamento de um extremo a outro. As vias internas eram
arborizadas, apresentavam cruzamentos com cantos arredondados, com curvas
de 8 metros, proporcionando ampla visão aos condutores de veículos (Reale,
1982, 147-149).
Como vimos anteriormente, no Jardim América, assim como nos outros bairros
da elite paulistana, a regulamentação do uso do solo foi, desde o início, muito
mais rigorosa do que o instituído nos códigos municipais, sendo incorporada na
totalidade pela municipalidade. As normas foram estabelecidas nos contratos
de compra dos terrenos: a obrigatoriedade do uso residencial, a área máxima
possível ser construída, os recuos obrigatórios do alinhamento das ruas, das
laterais e fundos dos terrenos. A área mínima dos lotes era de 450 m², com
testada de 15 metros, mas a grande maioria dos terrenos possuía area superior
a mil metros quadrados (idem, 150).
As análises em relação à Cia. City mostram a associação dos interesses
imobiliários com as concessionárias de serviços e o próprio poder público, como
um fator determinante para o sucesso dos empreendimentos: graças aos seus
laços com a Light e figuras-chave da política local, a City pôde usufruir do acesso,
em condições privilegiadas, a serviços básicos de infra-estrutura e valorização
estética dos seus loteamentos, podendo contar com serviços subsidiados,
financiados e priorizados da prefeitura, além de isenções de impostos por períodos
prolongados, às expensas dos cofres públicos e de áreas mais populosas e carentes
da cidade, urgentemente necessitadas de serviços básicos. Como resultado, ela
pôde oferecer loteamentos de alto gabarito urbanístico e arquitetônico em
condições excepcionais de venda facilitada, tirando o máximo proveito do surto
de enriquecimento do pós-guerra”. (Souza apud Cevcenko, 1991, 126).
104
Como exemplo dessa associação entre a concessionária de serviços públicos e
os interesses imobiliários, Morse registrou que em 1928 foi iniciada a
pavimentação do bairro Jardim América e em 1934 a City conseguiu o
asfaltamento do mesmo sem qualquer ônus, em contrapartida à cessão de 7 mil
metros quadrados de terrenos de sua prorpiedade, necessários para a abertura
da avenida Nove de Julho, uma artéria do Plano de Avenidas que garantiu a
ligação daquele bairro com o Centro, garantindo um grande fator de valorização
dos terrenos (Morse, 1970, 135).
Além da cessão de áreas para a municipalidade, com finalidade de dotar os
loteamentos com melhores acessos ou equipamentos, os vínculos com as
concessionárias dos serviços públicos, mais especificamente a Light e suas
subsidiárias, também se constituiu uma forma de garantir a valorização dos terrenos
e o sucesso dos empreendimentos imobiliários. Um exemplo foi a implantação da
linha de bonde para servir o Jardim América: a empresa logrou firmar acordo com
a Light & Power para que o bonde que ligava a rua Augusta ao Centro tivesse seu
percurso estendido pela rua Colômbia. A partir de 1918, a linha chamada “Garden
City” passou a funcionar com horários limitados, mas para a implantação e
funcionamento da linha de bonde, era necessário que a rua fosse pavimentada,
serviço solicitado e executado pela Prefeitura. (Wolff, 1988, 50).
A estratégia da cessão de áreas para a incorporação de valor aos
empreendimentos já havia ocorrido antes, dirigida à instalação de equipamentos
de prestígio em meio aos loteamentos de propriedade da empresa, como por
exemplo em 1917, quando amplas facilidades foram dadas para a instalação
do Clube Atlético Paulistano, no Jardim América e em 1929, para a Sociedade
Harmonia de Tênis, no mesmo bairro. No Pacaembu, a empresa cedeu para o
Governo do Estado, em 1921, uma área equivalente a cinco hectares para a
construção de outro equipamento de prestígio para o bairro: o Estádio Municipal.
lvimento, 1980, 12). Em 1935, complementou com mais 2,5 hectares à
municipalidade, que recebeu do governo estadual a área anterior (Cia. City de
Desenvolvimento
Fig. 52 e 53: À esquerda: Jardim América, década de 1930.
À direita, em 1970.
105
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
Notas:
1
Francisco Ferreira Ramos, Hermelindo Matarazzo, Antonio Carlos da Silva Telles, Eugênio
Terroir e Felix Delaborde.
2
“quando não existe em uma cidade a divisão em bairros com destino certo e imutável, como se
pratica na Allemanha e começa agora a realizar-se na América do Norte, é necessário constituir o
lote para o que der e vier” (Freire apud Rolnick, 1997, 45)
3
Zona Central: começa no entroncamento da rua Tabatinguera com a avenida Exterior do Parque
D. Pedro II; segue por esta avenida até seu encontro com a Avenida do Estado; por esta e pelas ruas
Mercúrio, Anhangabaú, Florêncio de Abreu, Mauá, Duque de Caxias, Maria Tereza, Largo e Rua
do Arouche, Praça da República, 7 de Abril, ladeira e Largo da Memória, largo, ladeira e rua do
Riachuelo, rua Rodrigo Silva, rua Livre, Largo7 de Setembro, rua Conde do Pinhal e rua
Tabatinguera.
4
Zona urbana: começa na Ponte Grande, sobre o rio Tietê, segue pela avenida Tiradentes, praça
José Roberto, ruas Jorge Velho, Afonso Pena, Bandeirantes, Joaquim Murtinho, Tocantins,
Mamoré, Capitão Matarazzo, Jaraguá, avenida Rudge, ruas do Bosque, da Casa Verde, Alameda
Olga, segue pela divisa da estrada de ferro Sorocabana até a rua 12 de Outubro, subindo por esta
até a rua Afonso Sardinha, descendo por esta até a rua Anastácio e por esta até a rua Guaicurus e
por esta até a avenida Pompéia, segue pela avenida Pompéia até a rua Desembargador Vale e por
esta, Caiubi, Cardoso de Almeida, avenidas Dr. Arnaldo e Dr. Rebouças, rua Jaú, avenida Brigadei-
ro Luís Antônio, ruas Tutóia, Dr. Amâncio de Carvalho, avenida Conselheiro Rodrigues Alves, ruas
Tangará, França Pinto até a rua Rio Grande, por esta e pelas ruas Dr. Álvaro Alvim, Major
Maragliano, França Pinto até a Domingos de Morais, por esta até a rua Pinto Ferraz, seguindo
pelas ruas Vergueiro, Correa Dias, Apeninos, Pires da Mota, Castro Alves, Safira, avenida Jardim
da Aclimação, ruas Muniz de Souza, Lavapés, Largo do Cambucí, ruas da Independência, Major
José Bento, Vicente de Carvalho, Da. Ana Néri, av. do Estado, ruas Conselheiro João Alfredo,
Mooca, Taquari, rua dos Trilhos, Tobias Barreto, Padre Adelino, Córrego Tatuapé, avenida Celso
Garcia, ruas Catumbi, Cachoeira, Carlos de Campos, Rio Bonito, Hahnemann, Afonso Arinos,
avenida Cruzeiro do Sul até o rio Tietê e por este abaixo, até a Ponte Grande (Netto, 1947, 13).
5
Projeto Cura: “Comunidades Urbanas de Reurbanização Acelerada” – Programa que visava
intervir urbanisticamente nas áreas onde ocorreram desapropriações ligadas à implantação do
Metrô, buscando ordenação de usos e ocupação do solo (Metrô, 48, 1978)
106
107
O
QUADRO URBANO A PARTIR DE
1930:
ÁREA CONSOLIDADA E FORMAÇÃO METROPOLITANA
C
APÍTULO
2:
O
QUADRO URBANO A
PARTIR DE
1930:
ÁREA CONSOLIDADA E
FORMAÇÃO METROPOLITANA
108
109
O
QUADRO URBANO A PARTIR DE
1930:
ÁREA CONSOLIDADA E FORMAÇÃO METROPOLITANA
2. O quadro urbano a partir de 1930: área consolidada e formação2. O quadro urbano a partir de 1930: área consolidada e formação
2. O quadro urbano a partir de 1930: área consolidada e formação2. O quadro urbano a partir de 1930: área consolidada e formação
2. O quadro urbano a partir de 1930: área consolidada e formação
metropolitanametropolitana
metropolitanametropolitana
metropolitana
Os elementos de infra-estrutura implantados na cidade, analisados até então,
aliados aos diferentes padrões de parcelamento do solo, foram decisivos para
que as diversas ocupações e vocações urbanas fossem estruturadas. A partir de
1930 deu-se início ao processo de metropolização de São Paulo, com o
conseqüente desdobramento do espaço urbano muito além dos limites anteriores,
como se verá a seguir.
A inserção do país na nova esfera econômica mundial, iniciada após o crack de
da bolsa americana em 1929, até o período do pós-guerra, em 1945, foi
preponderante para o novo patamar de relações que se estabeleceu nas grandes
cidades brasileiras. Juntamente com o tumultuado cenário internacional, durante
a década de 1930, o Brasil assistiu a implantação do regime autoritário do
Estado Novo, que presidiu uma reformulação estrutural da economia,
beneficiando novos setores de acumulação, que passaram de rurais a urbanos.
Nessa etapa, devido à predominância da industrialização paulista perante aos
demais estados do país e a intensificação das migrações internas (sobrepujando
em uma década a imigração estrangeira do período 1900-1930), aprofundaram-
se os fatores já em curso das décadas de 1910 e 1920, fenômenos esses que de
forma associada contribuíram para um crescimento demográfico exponencial.
A ocupação dos setores da cidade no período agora abordado, pode ser
compreendido levando-se em conta:
1. O momento da concentração populacional, até os anos de 1930,
particularmente da força de trabalho operária, que dependia diretamente do
transporte por bondes e trens para o acesso às áreas industriais, concentradas
ainda no Brás, Bom Retiro, Mooca, Belenzinho, Cambuci, Ipiranga e Água Branca.
Com as restrições de mobilidade ocasionada pelos modos de transportes
disponíveis, mesmo a classe média necessitava residir nas proximidades do centro.
2. O momento em que a necessidade de concentração foi rompida, com a
conseqüente dispersão da cidade, fruto, entre outros fatores, da crescente leva
de migrantes como oferta de mão de obra e a expansão do transporte baseado
nos ônibus, e não apenas nos bondes. (Sempla, 1986,14).
Em relação ao processo urbano que se verificou nesse período, Langenbuch
identificou três características principais:
1. A compactação da área edificada, que ocorreu através do acentuado
crescimento vertical no Centro e de bairros próximos: Santa Ifigênia, Campos
Elísios, Santa Cecília, Vila Buarque, Higienópolis, Consolação, Vila América,
Paraíso, Liberdade e Aclimação. Esse aspecto ocorreu com menor intensidade
na Vila Mariana, Cambuci e Brás, mas incidiu também nos bairros onde se
110
estruturaram subcentros, como foi o caso de Santana, Penha, Pinheiros, Lapa.
Foi notado também o crescimento da densidade nas áreas que não possuíam
uma ocupação efetiva, como foi o caso dos bairros-jardim, Vila Clementino e
Mirandópolis.
2. Expansão da área edificada sobre espaços suburbanos anteriormente não
adensados: tratava-se de áreas mais afastadas da malha viária contínua, raras,
pois o parcelamento precedia o avanço dessa malha. Nesse caso se incluíram
as áreas do Morumbi-Cidade Jardim.
3. Ocupação pela área edificada dos espaços suburbanos anteriormente
ocupados: processo em que as ferrovias ainda desempenharam papel de indução
da ocupação de suas faixas lindeiras, complementadas pela circulação rodoviária
e pela polarização dos “subúrbios-estação”, que se constituiriam em focos de
estruturação e expansão urbana (Langenbuch, 1971, 179, aspas nossas).
Enfocando a cidade no período pós-1930, pode-se observar que o crescimento
populacional esteve profundamente relacionado ao papel de principal centro
dinâmico da economia brasileira, representado por São Paulo. Os registros
mostram que em 1930 a cidade possuía 822.400 habitantes, passando para
1.350.000 habitantes em 1940. Na década seguinte, saltou para 2, 2 milhões
de habitantes (fonte: FIBGE).
Aspectos contraditórios marcaram o cenário urbano no período posterior à década
de 1940: a mesma cidade que passava por uma reestruturação viária na sua
área central, através do Plano de Avenidas, apresentava, em alguns setores, um
alto déficit de construção de moradias novas. A intervenção do Governo Federal
nos contratos de locação dos imóveis, através da promulgação da Lei do
Inquilinato em 1942, provocou repercussões na produção da construção civil,
pois devido o congelamento dos aluguéis, estes deixaram de ser uma atividade
rentável, desestimulando o investidor que aplicava em imóveis para auferir renda
com a locação do mesmo. Por outro lado, apesar da queda verificada na
construção civil comparativamente ao período anterior à Lei do Inquilinato, essa
medida implicou em um fomento à produção para venda e à auto-construção
(Souza, 1994, 98).
Concomitantemente ao crescimento horizontal de São Paulo, através da anexação
de espaços periféricos, o aproveitamento vertical do solo caracterizou-se como
aspecto relevante presente nos espaços centrais, resultando em um fenômeno
que acentuou as diferenças entre os setores consolidados da cidade. Até fins da
década de 1930, a verticalização se mostrou restrita ao Centro histórico e contou
com incentivos para sua intensificação por parte da legislação urbanística, como
no Código de Obras Arthur Saboya, que estabeleceu padrões de aproveitamento
não alcançados durante muitos anos.
111
O
QUADRO URBANO A PARTIR DE
1930:
ÁREA CONSOLIDADA E FORMAÇÃO METROPOLITANA
Em relação à produção de edifícios para a classe média, a criação do condomínio
proporcionou alternativas de viabilização econômica para a compra de
apartamentos. Através dessa forma, inédita até então, de viabilizar financeira e
juridicamente os empreendimentos, tornou-se possível para os interessados dividir
os custos do terreno, da construção e remunerar o responsável pelo processo
através de uma taxa de administração (idem, 109).
O aproveitamento vertical do solo urbano em São Paulo, surgiu como produto
de uma relação entre o capital imobiliário, o capital financeiro, o capital fundiário
e o capital produtivo, articulados numa estratégia de interesse mútuo (ibidem,
27). A convergência dos interesses das empresas voltadas à comercialização do
solo urbano, juntamente com os agentes financiadores, os proprietários de lotes
e glebas e a indústria de construção civil, resultou em operações em que a
verticalização se constituiu em um elemento realizador de lucros para toda essa
cadeia.
A condição necessária para a cadeia de agentes descrita se concretizar foi a da
existência de demanda, que no caso de alguns bairros centrais paulistanos, foi
constituída pela procura das classes médias e altas às localizações próximas ao
Centro e não em sítios mais afastados. Nesse sentido, é procedente retomar a
tese de Villaça sobre o controle que as camadas de alta renda exercem sobre o
tempo dos deslocamentos, para a definição de seu local de moradia (Villaça,
1998,198).
Iniciada na segunda década do século XX, até 1939 a verticalização ocorreu em
São Paulo em sua área central majoritariamente, e com uso comercial
predominante. Dos 813 edifícios então existentes na cidade, 70% localizavam-
se no Centro e 65% atendiam ao comércio e serviços. Duas décadas depois, a
situação se inverteu pois, dos 3.533 edifícios existentes em 1957, 2.720 foram
construídos a partir de 1940. Do total, apenas 29% se situavam no Centro,
enquanto os 71% restantes, nos bairros (Someck, 1987, 54/152).
O estudo de Someck sobre a verticalização em São Paulo mostra que esse
processo apresentou algumas fases, começando com aquela que esteve ligada
à reprodução de padrões europeus, no período que se iniciou em 1920, chegando
a 1939. Além das características tipológicas, com profusão de ornamentação
eclética, ela também ocorreu sem controle de coeficiente de aproveitamento,
sendo o Edifício Martinelli um exemplo desse padrão. Uma segunda fase foi a
que abrangeu de 1940 a 1956, com características tipológicas norte-americanas
e ainda sem limitação de coeficiente de aproveitamento, o que ocorreu a partir
de 1957, ano que segundo a autora, inaugurou a terceira fase da verticalização
até meados da década de 1960, onde o uso do automóvel definiu novas
ocupações e acentuou o crescimento vertical em alguns setores da cidade (idem,
23/25).
112
Para a intensificação da
verticalização do Centro e sua
ocorrência nos bairros vizinhos,
a reestruturação do sistema
viário provocada pelo Plano de
Avenidas foi um fator da maior
importância, como atestam os
estudos de Bonduki (1998),
Meyer (1991), Rolnick (1997),
Someck (1987), Souza (1984)
e Leme (1999). A
transformação da área central
teve como aspecto principal as
mudanças ocorridas no Centro
Novo, isto é, a substituição de
residências, lojas, oficinas e
manufaturas, por edifícios
comerciais. O crescimento
vertical e o adensamento
central dos anos posteriores a
1940, ocorreram como
colorário da acessibilidade
traçada à régua e compasso
para a utilização intensiva dos
veículos produzidos pelo
símbolo mundial do progresso,
a indústria automotiva.
Em alusão a esse processo, Petrone analisou toda a transformação ocorrida na
área central, que teve início com o prefeito Fábio Prado (1934-38) e concluída
por Prestes Maia (1938-45), como a “quarta fundação de São Paulo”. Em sua
análise, essas realizações superaram as de João Teodoro e Antônio Prado e o
conjunto de obras obteve o mérito de transformar a cidade. Segundo suas
palavras: largas e extensas avenidas, diversos viadutos, quarteirões inteiros
transformados, arranha-céus substituindo velhos pardieiros mal arejados e
inestéticos deram a área central uma fisionomia inteiramente nova” (Petrone in
Azevedo, 1958, 152).
Como decorrência da nova acessibilidade proporcionada pelas avenidas do
Plano de Prestes Maia, um fator significativo foi a transformação das tipologias
então existentes nas áreas próximas daquelas vias: mansões que marcaram a
paisagem até as décadas de 1930 e 1940 e que anteriormente dominaram
locais como a avenida Paulista e Higienópolis, gradativamente passaram a dar
lugar a edifícios, prenunciando a verticalização das décadas de 1950 e 1960.
Fig 54: Cartão postal do Edifíco Martinelli.
113
O
QUADRO URBANO A PARTIR DE
1930:
ÁREA CONSOLIDADA E FORMAÇÃO METROPOLITANA
Esse processo, segundo o estudo de Azevedo, pode ser compreendido levando
em conta os seguintes fatores:
1. A grande valorização dos terrenos;
2. A necessidade de se obter lucros mais compensadores;
3. A deterioração de muitas dessas residências construídas no início do século;
4. A impossibilidade ou dificuldade de alugá-las;
5. Os problemas relativos a propriedades de muitos herdeiros;
6. O crescimento do sistema de construção de apartamentos em condomínio
financiados a longo prazo;
7. A desvalorização da moeda devido à inflação no período (Azevedo apud
Macedo, 1987, 75).
Considerando que outras áreas próximas ao centro, como os Campos Elísios,
possuíam características semelhantes às de Higienópolis, possibilitando também
o aproveitamento vertical dos terrenos, e que entretanto o mesmo fenômeno
não se verificou, no período pós-1940 a diferenciação dos setores urbanos vizinhos
à área central se deu com o aumento do aproveitamento vertical dos bairros
próximos ao Centro Novo, escolhidos para local de moradia de uma parcela da
classe média e média alta, que substituiu gradativamente os habitantes das áreas
aristocráticas do período anterior.
Um fato determinante para essa localização residiu na oferta da acessibilidade
provocado pelo Plano de Prestes Maia, que não foi igual para todas as regiões
dos bairros centrais. Como será visto adiante, os setores sul e sudoeste tiveram o
maior número de vias implantadas e nessas áreas o preço dos terrenos já se
apresentava alto em comparação às demais áreas da cidade, devido ao fato da
infra-estrutura instalada nesses bairros ter se constituído no principal indexador
do valor do solo urbano (Villaça, 1998, 138).
Seguindo essa análise, a chave que permite explicar a tendência à concentração,
em maior ou menor grau, da burguesia em uma única região da cidade, segundo
Villaça, é o estudo das localizações dos elementos da estrutura e das suas
correlações com os outros elementos urbanos. A localização dos melhoramentos
em uma região, e não em outra, se torna vital para o estudo do arranjo territorial
decorrente. Nesse sentido, o fator fundamental no caso de São Paulo, foi a
população de mais alta renda usufruir o melhor sistema de vias radiais da cidade
– as avenidas Angélica, Consolação, Rebouças, Nove de Julho e Brigadeiro Luiz
Antônio – localizadas no vetor sudoeste a partir do Centro (idem, 138).
Na área central se concentrou até fins da década de 1960, a maior parte dos
empregos dessa faixa de renda, os seus locais de compra, serviços, órgãos
114
públicos, lazer, cultura, etc...Villaça concluiu que desse modo foi produzida a
melhor localização para as burguesias morarem, tendo como ponto de contato
entre esses bairros, alguns espaços do Centro Novo, representado pelas avenidas
Ipiranga, São Luís, Vieira de Carvalho, Praça da República (ibidem, 154).
Cabe observar que a partir da década de 1940 até a década de 1960, o Centro
Histórico da cidade viveu o seu período de apogeu, embora em seu interior a
divisão entre o Centro Velho e o Centro Novo já apresentasse uma distinção de
contornos sociais, funcionais e espaciais nítidos, o que influenciou a localização
dos bairros de alto poder aquisitivo junto aos espaços do Centro Novo.
Um estudo do IBGE sobre a cidade de São Paulo, datado de 1962, relaciona as
diferenças entre as áreas ocidentais e orientais do Anhangabaú (Centro Velho e
Centro Novo, respectivamente), considerando que, a partir da década de 1940,
gradualmente o Centro Velho passou a abrigar também a função de centro
financeiro, pois antes se apresentava como exclusivamente varejista. O Centro
Novo, após ver a sua função residencial das primeiras décadas do século XX ser
paulatinamente substituída pela comercial, apresentou em fins da década de
1950 uma dinâmica ocasionada principalmente pelas reformulações espaciais,
sendo assim explicada: “a abertura da Avenida Ipiranga e da Rua Marconi, a
construção do Viaduto do Chá, muito mais amplo que o anterior, o deslocamento
do ponto final de bondes e ônibus para a rua Xavier de Toledo e Praça Ramos de
Azevedo, foram todos fatores favoráveis ao desenvolvimento comercial dessa
área, surgindo em poucos anos, numerosos edifícios de muitos pavimentos no
local dos antigos sobrados e residências térreas” (IBGE, 1962, 73).
O mesmo trabalho também apontou:
-Predomínio de comércio de luxo nas ruas Barão de Itapetininga, Marconi, com
a função comercial se estendendo às ruas 24 de Maio, D. José de Barros, Sete
de Abril, Conselheiro Crispiniano, Xavier de Toledo e avenidas São João, Ipiranga
e São Luís. Concentração de consultórios médicos e dentários principalmente
nas ruas Marconi e Xavier de Toledo. Agências bancárias, escritórios comerciais
e de corretagem (idem, 73).
A importância dessa nova centralidade para parcelas da população de maior
renda, não se limitou aos novos postos de trabalho de profissionais liberais ou
comércio especializado, como o trabalho dos geógrafos do IBGE registrou. Foi
também associada ao papel aglutinador de atividades de lazer e cultura
representado pela “Cinelândia”, que distinguia claramente as duas áreas do
Centro, como se percebe na análise: “a localização de modernos cinemas na
Avenida São João, Largo do Paissandu, Avenida Ipiranga e outras vias, bem
como o funcionamento de numerosos restaurantes, casas de lanche, bares, cafés,
trazem ao Centro Novo uma extraordinária movimentação, não só durante o dia,
como até altas horas da noite, particularmente aos sábados, domingos e feriados,
115
O
QUADRO URBANO A PARTIR DE
1930:
ÁREA CONSOLIDADA E FORMAÇÃO METROPOLITANA
contrastando com a escassa circulação que se verifica à noite no centro antigo,
após o fechamento de escritórios e lojas” (ibidem, 73)
Retomando a análise de Villaça sobre a autonomia das classes de renda mais
altas na escolha e produção de suas localizações residenciais, esta se deu como
resultado do seu comando do setor imobiliário urbano e da ligação aos seus
interesses de consumo. Em conseqüência, torna-se importante a rede de inter-
relações espaciais entre os bairros e os outros elementos vitais definidores dos
deslocamentos espaciais, isto é, todos os locais de empregos, comércio e serviços.
Dessa forma, abandonar a área de maior segregação de uma faixa de renda
significa ficar “longe de tudo”, ficar “fora de mão”, piorando a acessibilidade ao
se afastar da direção radial (Villaça, 1998, 203, aspas do autor).
No período 1940-1960 os subcentros de comércio e serviços foram desenvolvidos
pela população constituída pelas classes média e média baixa, que conseguiu
se fixar junto aos locais de trabalho, mas à certa distância do Centro. Todos
esses subcentros não possuíam as mesmas qualidades urbanísticas do Centro
principal, por não contarem com a presença de órgãos do Estado e se constituírem
Fig 55: Praça da Sé, década de 1940.
116
em uma concentração de comércio e serviços com caráter mais popular. Nesse
caso incluíam-se os subcentros de Pinheiros, Santana, Lapa, Penha, Santo Amaro,
etc (idem, 139). Mencionamos também o Brás, que historicamente desempenhou
o papel de maior subcentro da cidade, superado unicamente pelo Centro
tradicional de São Paulo.
Parte desses subcentros remontavam ainda ao período anterior à industrialização
e foram os polarizadores dessas localizações, por apresentarem, como foi
mencionado anteriormente, equipamentos minimamente estruturados, tornando-
os mais convenientes do que as áreas das proximidades que nada ofereciam aos
moradores iniciais. Antigos núcleos como os já citados bairros de Penha de França,
Nossa Senhora do Ó e Pinheiros se incluíam nesse caso. (Langenbuch, 1971, 85).
Os dados populacionais apresentados a seguir mostram a transformação ocorrida
nos setores urbanos de São Paulo, no período que se iniciou em 1934 chegando
a 1960. É possível distinguir os grandes traços desse período, representados
pela expansão da mancha urbana e a diminuição relativa do crescimento
populacional dos bairros centrais, aspectos que serão analisados mais à frente.
No Quadro 6, é possível observar o crescimento da cidade em suas diferentes
regiões, que no período 1934-1960, teve um acréscimo de 2.765.231 habitantes.
É necessário ressalvar a diferença que a divisão político-administrativa dos
subdistritos tem com os atuais distritos, mas a utilidade dos dados não é
prejudicada devido a abrangência geográfica dos mesmos, que mostra a dinâmica
demográfica vivida pela cidade ao longo de três décadas.
Os números mostram que entre 1934 e 1940, além dos subdistritos centrais Sé
e Santa Efigênia apresentarem diminuição de população, com novo decréscimo
na década seguinte, aqueles da industrialização pioneira também sofreram o
mesmo processo, como ocorreu no Bom Retiro, Brás e Mooca. Mesmo o
Belenzinho teve modesto crescimento entre 1940 e 1950, fenômeno que também
ocorreu no Pari. Em contrapartida, percebe-se nesse período 1934-50, uma
inequívoca expansão da cidade em todas as direções, com expressivos aumentos
populacionais nos distritos da zona sul (Jd. Paulista, Indianópolis, Saúde, Ipiranga,
Ibirapuera e Socorro), zona norte (N. S do Ó, Casa Verde, Tucuruvi e Vila Maria)
e da zona leste (Penha, Vila Matilde, Vila Prudente) (Araújo Filho apud Azevedo,
1958, 233).
O principal aumento populacional nesse período se deu em áreas que receberam
de 150 a quase 500% de incremento:
Entre 150 e 200% - subdistritos Tucuruvi, Casa Verde, Pirituba, Osasco, Santo
Amaro, Indianópolis, Saúde e Tatuapé.
Entre 200 e 300% - subdistritos Ibirapuera, Vila Prudente, Vila Maria, Vila Matilde,
Guaianases.
117
O
QUADRO URBANO A PARTIR DE
1930:
ÁREA CONSOLIDADA E FORMAÇÃO METROPOLITANA
118
Entre 370 e 450% - subdistritos de Nossa Senhora do Ó e o distrito de São
Miguel Paulista.
Comparada à ocupação do início da década de 1930, onde a cidade apresentava
vetores de expansão com vazios entre eles, a ocupação de 1950, que ocorreu
em todos os quadrantes, deu lugar ao que foi denominado de “
cidade emcidade em
cidade emcidade em
cidade em
nebulosanebulosa
nebulosanebulosa
nebulosa”, visto o espraiamento se dar sem espaços vazios consideráveis (idem,
241, grifo nosso). O processo de ocupação da periferia urbana pode ser
comprovado pela ocupação predominantemente popular nas áreas que
apresentaram aumento populacional superior a 150%, constituída de “operários
de fábricas e trabalhadores em geral, funcionários públicos de categoria inferior
– que se beneficiam das facilidades oferecidas pelas empresas loteadoras de
terreno ou habitam em casas construídas, aos pouquinhos, nas horas de
folga...”(ibidem, 239).
Já no período 1950-1960, ao norte da cidade, se destacaram os subdistritos
Casa Verde, Santana, Vila Maria, Nossa Senhora do Ó e Tucuruvi, este com
mais de 150% de crescimento, em relação aos demais, na faixa dos 100%. Ao
leste, se destacaram o Alto da Mooca, Penha, Tatuapé e Vila Prudente, este
último com mais de 200% de crescimento. Na região vizinha, ao sudeste, o
Ipiranga também teve crescimento expressivo, na casa de 50%, mas considerado
o crescimento no período anterior, muito acentuado, se constituiu em um vetor
de forte ocupação, juntamente com Saúde, que teve mais de 100%.
Ao sul, destacou-se Santo Amaro, com mais de 150% de crescimento, mas
Ibirapuera e Indianópolis também apresentaram índices expressivos, em torno
de 100%
A oeste, a Lapa se caracterizou por um acréscimo de 20.000 habitantes, que
manteve o mesmo crescimento das décadas anteriores.
A ocupação do sudoeste manteve-se crescente, sem taxas excepcionais, apenas
demonstrando uma ocupação de baixa densidade.
Durante a década 1950-60, todos os bairros tradicionais formados nas primeiras
décadas do século, no entorno do Centro, tiveram crescimento mais reduzido:
A Barra Funda teve um acréscimo de 2.804 habitantes, passando de 29.696
para 32.500.
A Bela Vista, com o maior crescimento de todos os subdistritos envoltórios da
Área Central, teve acréscimo de 12.253 habitantes, passando de 45.657 para
57.906. Deve ser considerada, nesse caso, a verticalização incidente na região
próxima à avenida Paulista, como causadora desse aumento.
119
O
QUADRO URBANO A PARTIR DE
1930:
ÁREA CONSOLIDADA E FORMAÇÃO METROPOLITANA
O Belenzinho praticamente estagnou o seu crescimento populacional,
apresentando mesmo um decréscimo de 193 habitantes, passado de 63.435,
em 1950, para 63.242, em 1960.
O Bom Retiro teve um acréscimo de 3.451 habitantes, passando de 23.043
para 26.494 habitantes.
O Brás teve o decréscimo mais acentuado entre todos os subdistritos da região
e da cidade, passando de 68.138 habitantes para 64.061, o que significou uma
diminuição de 4.077 habitantes. Nesse caso, foi confirmada uma tendência que
já havia se manifestado desde 1934, onde houve decréscimo de 2.041 habitantes
de 1934 a 1940 e de 12.776 habitantes entre 1940 e 1950.
O Pari teve um acréscimo de 5.148 habitantes, passando de 41.079 para 46.227
habitantes, o que pode ser explicado não só pelo adensamento de seu núcleo,
mas também pela ocupação das áreas drenadas da várzea do rio Tietê, cujo
processo de retificação estava em curso.
120
2.1- A habitação popular: bairros centrais e periferia -1930 - 19602.1- A habitação popular: bairros centrais e periferia -1930 - 1960
2.1- A habitação popular: bairros centrais e periferia -1930 - 19602.1- A habitação popular: bairros centrais e periferia -1930 - 1960
2.1- A habitação popular: bairros centrais e periferia -1930 - 1960
Na etapa em que a industrialização se estruturou na cidade, como já abordado
anteriormente, o encortiçamento foi resultado de três aspectos principais: a
necessidade elementar de moradia dos trabalhadores, a ausência de políticas
públicas voltadas a habitação social e a crescente especulação do solo somado
a altos aluguéis, como forma de reposição do capital empregado na construção
das unidades. As formas de habitação popular, os cortiços e as vilas operárias,
coexistiram com a ocupação residencial de baixa renda, cada vez mais freqüente,
das áreas suburbanas da expansão da cidade no período pós 1940.
Nessa etapa, o arranjo urbano de localização da habitação popular foi decorrente
da nova relação moradia-emprego, que alterou aquela estruturada anteriormente,
em virtude da expansão que a cidade apresentou em todos os seus quadrantes.
Analisando esse quadro, um estudo da Secretaria de Planejamento indicou que “a
reprodução operária, no tocante à moradia, apoiou-se no tripé loteamento de
periferia, muitas vezes clandestino, casas próprias e autoconstrução. Assim, embora
a grandes sacrifícios para os trabalhadores, tornou-se possível a expansão para o
espaço urbano disperso. É nessa década, 1930-40, por sua vez, que vêm para São
Paulo grandes levas de migrantes, prosseguindo o aumento demográfico rapidamente
e constituindo vasto exército industrial de reserva
(Sempla, 1985, 14).
A habitação social seguiu um roteiro diferente da etapa anterior, provocado
desta feita, por fatores de ordem institucional, associados às mudanças das regras
da locação, afetando a produção e ocupação imobiliária. Dois desses fatores,
essenciais para o entendimento do quadro urbano que se seguiu, foram a
promulgação da Lei do Inquilinato e a nova lei federal para os loteamentos
urbanos.
A produção de moradias para aluguel havia sido um investimento seguro até a
promulgação da Lei do Inquilinato, em 1942, quando o congelamento dos
valores de locação provocou o desinteresse em relação a esse tipo de produção,
responsável pela grande maioria das habitações em São Paulo. Para o mercado
de baixa renda não houve a migração de capitais que ocorreu em relação aos
de renda mais alta, que transformaram a propriedade imobiliária e a construção
civil em uma alternativa de investimento com grande liquidez e rentabilidade
(Rolnick, 1997, 192).
Para a habitação popular, a Lei do Inquilinato foi mantida até a década de 1960
com modificações, mas uma das conseqüências diretas foi a desaceleração da
construção de moradias de aluguel. A crise dos anos 1940, segundo a visão de
Bonduki, apresentou o problema de forma mais aguda, pelo desestimulo à
produção habitacional privada e insuficiência de iniciativas estatais. O recurso à
construção de casas nos subúrbios e favelas começou a se tornar prática corrente,
121
O
QUADRO URBANO A PARTIR DE
1930:
ÁREA CONSOLIDADA E FORMAÇÃO METROPOLITANA
justificando assim a expansão horizontal da cidade no período agora abordado
(Bonduki, 1998, 248).
Aliada a essas mudanças, a partir de 1937 procedeu-se à regulamentação do
loteamento de terrenos por parte da legislação getulista (Decreto-lei nº 58),
transformada em um incentivo ao auto-empreendimento na periferia, uma vez
que foram privilegiados aspectos jurídicos em detrimento ao controle urbanístico
e da punição ao loteamento clandestino. Com isso, de forma conjugada ao
congelamento de aluguéis, foi proporcionada uma alternativa para a construção
da habitação com recursos dos próprios trabalhadores, sem qualquer medida
que pudesse evitar a precariedade dos loteamentos, uma vez que isso poderia
encarecer o custo do terreno, ocasionando demandas por salários mais altos
por parte desses trabalhadores (idem, 289).
Apesar das diversas propostas e recomendações vindas dos meios técnicos, em
sua maioria referenciadas pelo sanitarismo, a ausência de um plano habitacional
extensivo para o atendimento da crescente demanda por habitação, levando em
conta a análise de Villaça, pode significar o início da atuação que caracterizou
o poder público desde então, no sentido de privilegiar as condições gerais de
produção, em que “as obras de infra-estrutura são priorizadas enquanto as de
habitação são relegadas ao esquecimento” (Villaça apud Deák, org, 1999, 199).
Entretanto, a presença de grandes massas urbanas nas principais cidades
brasileiras, não permitia mais o ocultamento da problemática habitacional. De
acordo com Rossetto, a pressão para que a questão passasse da esfera dos
problemas privados para se constituir em uma questão abordada pelo poder
público aumentava, na medida em que a escassez e as condições de precariedade
de grande parte da população cresciam (Rossetto apud Sampaio, org, 2002, 39).
Como exemplo de propostas de ordem investigativa e técnica, são mencionados a
seguir trabalhos apresentados na Jornada da Habitação Econômica, realizada em
1941
6
, em que esse assunto recebeu um tratamento diverso daquele que o
caracterizara no início do século. Na conferência inaugural, Roberto Simonsen
considerou que o problema da habitação passava a ser principalmente um problema
do urbanismo, levando em conta as necessidades de ordem individual, social,
técnica, demográfica e econômica, salientando ainda que para a sua solução, a
participação do Estado era considerada indispensável
(R.A.M., nº 82, 1942, 25).
Além da partici
pação pública ser ressaltada, a necessidade de produção de um
grande número de unidades, dado o tamanho da demanda, ficou evidenciada
pelo surgimento de propostas de verticalização da habitação popular e a adoção
do sistema de condomínio, como formas de racionalizar a obra, a ocupação do
solo e viabilizar sua construção.
Um exemplo expressivo foi a proposta do engenheiro Siciliano
(idem, 98), que
preconizava como solução, a verticalização da habitação econômica.
122
Argumentando que a mesma deveria se localizar o mais próximo possível do
local de trabalho, mas impossibilitada devido ao alto custo dos terrenos, deveriam
as indústrias se encarregar de construir edifícios para seus empregados, para
viabilizar unidades adequadas aos mesmos. À racionalização da obra, sem
elementos supérfluos para a vida de seus ocupantes, aliava-se a menor ocupação
do terreno e as condições de salubridade, sendo possível prever-se ampliações
futuras para equipamentos, reproduzindo em parte o que havia sido construído
na Vila Maria Zélia. O industrial seria, desse modo, beneficiado triplamente:
-pela permanência dos empregados no local da produção, afastando-os dos
perniciosos cortiços
-pelo aumento da produtividade e manutenção da qualidade dos equipamentos
e das mercadorias produzidas
-pelo retorno “a um juro razoável” do capital invertido na construção (ibidem, 98)
Deve-se registrar que a Jornada de Habitação Econômica ocorreu um ano antes
da promulgação da Lei do Inquilinato, mas pelo menos por essa recomendação,
a idéia da exploração rentista da habitação social ainda persistia.
Um trabalho que analisou mais profundamente as diferenças entre os setores
urbanos da cidade, no tocante à habitação, foi o estudo sobre as condições de
200 moradias em São Paulo, realizado pelo sociólogo Donald Pierson, em 1941.
Nele, os bairros do Bexiga, Moóca e Canindé foram considerados como
representativos do “nível inferior” de moradia, atribuído ao “nível superior”,
aquelas encontradas no Jardim América, Pacaembú e Higienópolis. A área que
foi denominada Moóca pertencia, na realidade, ao bairro do Brás,
correspondendo às ruas Carneiro Leão e Caetano Pinto, onde a incidência de
cortiços era alta. No Canindé a pesquisa foi realizada na Avenida dos Estados,
próxima da ferrovia da Cantareira e no Bexiga, na rua Manoel Dutra (
R.A.M., nº
81, 1942, 201)
. Foram selecionadas dessa extensa pesquisa, algumas
características das habitações dos chamados nível inferior e superior, a saber:
- Sub-parcelamento das edificações
No Brás, 18 edificações comportavam 50 moradias
No Bexiga, 13 edificações comportavam 25 moradias
No Canindé, 13 edificações comportavam também 25 moradias.
Apenas cinco edificações foram consideradas em boas condições, sendo que
três delas se encontravam no Bexiga. Além disso, cerca de um terço delas, no
Brás e no Bexiga, apresentava uso misto, com exceção do Canindé. Neste caso
foram encontrados porões habitados, juntamente com o Bexiga.
Em compensação, todas as edificações do nível superior eram unifamiliares
123
O
QUADRO URBANO A PARTIR DE
1930:
ÁREA CONSOLIDADA E FORMAÇÃO METROPOLITANA
- Área do terreno
No Canindé, máximo de 200 m² e mínimo 60 m²
No Bexiga, máximo de 455 m² e mínimo de 108 m²
No Brás, máximo de 280 m² e mínimo de 15 m² (tratava-se provavelmente de
apenas um aposento)
No Jardim América, máximo de 12.000 m² e mínimo de 300 m²
No Pacaembú, máximo de 3.300 m² e mínimo de 350 m²
Em Higienópolis, máximo de 4.000 m² e mínimo de 126 m²
- Equipamentos
Moóca: 22 tanques para 50 moradias, 20 banheiros
Canindé: 16 tanques para 25 moradias, 16 banheiros
Bexiga: 13 tanques para 25 famílias. 12 banheiros
- Densidade
Brás: 225 habitantes para 67 cômodos usados para dormitório – 3,4 pessoa
por cômodo
Canindé: 3,1 habitantes por cômodo de dormir
Bexiga: 2.5 habitantes por cômodo de dormir
- Rede de água
Bexiga: das 25 habitações, 9 não dispunham de fornecimento de água
Canindé: das 25 habitações, 8 não dispunham de fornecimento de água
Brás: das 50 habitações, apenas 1 não dispunha de fornecimento de água
Em contrapartida, todas as habitações do Pacaembú, Higienópolis e Jardim
América, dispunham de fornecimento de água (
idem, 207/223)
Pierson ressalvava que essa pesquisa se constituíra em uma amostra de um
universo pesquisado pelo censo. A sua abrangência não deixa dúvidas que o
espaço pesquisado foi de bairros próximos ao Centro, sendo colocado também,
que o mesmo deveria ser realizado para uma amostra da área periférica, o que
entretanto não ocorreu (
ibidem, 201).
Juntamente com a dispersão da moradia dos trabalhadores pelo território, a
produção da habitação social nos bairros centrais se restringiu a um número
reduzido de novas unidades construídas pelos Institutos de Aposentadorias e
Pensões - IAPs, com a permanência e crescimento do número de cortiços como
124
alternativa para diminuir os custos do transporte incidentes na renda desses
trabalhadores.
Criados durante o Estado Novo, a partir de 1937, efetivamente as condições
para a atuação dos Institutos de Aposentadorias e Pensões passaram a existir, se
constituindo na tentativa de se estabelecer uma nova cultura da habitação no
país, mediante novas formas de abordá-la “em termos formais, produtivos, sociais
e culturais” (Bonduki, 1998, 142). Apesar de terem sido produzidas inúmeras
referências de conjuntos habitacionais por importantes arquitetos brasileiros, nos
bairros centrais de São Paulo foram construídos apenas três desses exemplares,
na década de 1940 e um na década de 1950.
Segundo as análises sobre a produção de habitação pelos IAPs, esse modelo
chegou à década de 1960 exaurido por problemas de ordem financeira e
administrativa, pois parte dos recursos destinou-se para o financiamento de
edifícios para a classe média e classes de renda mais alta, originando um problema
crônico que se manifestou nas décadas seguintes, quando o BNH passou a
atuar nessa questão. Entretanto, a produção dos IAPs, significou um avanço na
concepção da habitação social, coerente com as soluções da Arquitetura Moderna
adotadas nos países centrais após a I Guerra, tais como os Hôfes, Siedlungen e
ainda as Unités d´Habitacion de Le Corbusier, contando com arquitetos brasileiros
de renome (Monteiro, Bonduki, orgs, 1993, 10).
A seguir, são relacionados dois exemplos desses conjuntos, que foram implantados
em bairros centrais: o Glicério e o Bexiga.
-Conjunto Residencial da Baixada do Carmo
Bairro: Glicério
Órgão financiador: Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Industriários – IAPI
Número de unidades: 480
Construção: década de 1940 Projeto: arq. Atílio Corrêa Lima
Edifício Japurá
Bairro: Bexiga
Órgão financiador: IAPI
Número de Unidades: 288
Construção: década de 1950
Projeto: arq. Eduardo Kneese de Mello
(Bonduki, idem, 171, 184, 187)
125
O
QUADRO URBANO A PARTIR DE
1930:
ÁREA CONSOLIDADA E FORMAÇÃO METROPOLITANA
Com exceção dos conjuntos mencionados, nenhuma outra solução foi
encaminhada pelo Poder Público para tratar da habitação social nos bairros centrais
de São Paulo, que devido ao processo urbano em curso durante as décadas
seguintes de 1960, assistiu ao crescimento da população favelada e encortiçada,
concomitantemente ao crescimento periférico e da degradação ambiental de
significativas áreas da cidade.
Fora do
âmbito oficial, no período 1930-1960 intensificou-se a produção de
novos elementos tipológicos para a habitação de baixa renda e também a de
classe média baixa: nas periferias assistiu-se a presença de conjuntos de casas
térreas, modestamente construídas. Nas áreas mais centrais, conjuntos de
residências assobradadas e geminadas, com o surgimento de edifícios de três
ou quatro pavimentos, não equipados de elevador (Osello, 1983, 165).
Fig. 56: Conjunto do
Glicério: perspectiva
do projeto original
Fig. 57 e 58: Conjunto do Glicério, 2003.
126
Fig. 61 e 62: Cortiço Navio Parado
(acima) e Ed. Japurá (ao lado ), 2003.
Fig. 59 e 60: Implantação do cortiço Navio Parado (esquerda) e Ed. Japurá (direita)
Fig. 63: Ed. Japurá,
2003.
127
O
QUADRO URBANO A PARTIR DE
1930:
ÁREA CONSOLIDADA E FORMAÇÃO METROPOLITANA
2.2. As propostas urbanísticas para a cidade: 1930-19602.2. As propostas urbanísticas para a cidade: 1930-1960
2.2. As propostas urbanísticas para a cidade: 1930-19602.2. As propostas urbanísticas para a cidade: 1930-1960
2.2. As propostas urbanísticas para a cidade: 1930-1960
Dando seqüência à análise das transformações que configuraram a estrutura
urbana da cidade e dentro disso, o processo ocorrido com os bairros centrais,
buscou-se investigar nas propostas urbanísticas para São Paulo, aquelas
direcionadas à infra-estrutura e ao uso e ocupação do solo. Nesse sentido,
assinala-se a predominância dos planos viários na década de 1930 e as propostas
para o zoneamento que ganharam importância nas décadas de 1940, 50 e 60.
Ressalvando se tratar de uma investigação de inegável importância, não cabe
aos objetivos deste trabalho um aprofundamento sobre os problemas e
contradições da parte do poder público para a não implantação das diversas
propostas de planos urbanísticos, mas buscar entender as suas principais
formulações, caracterizando a cidade no período 1930-1960. Outro campo de
análise que também não será desenvolvido é o da relação Estado-Urbano, mas
admitido que após 1930 essa interconexão obrigou a uma abordagem
diferenciada daquela em que as concessionárias de infra-estrutura ditaram os
rumos da expansão urbana.
Face aos problemas de toda ordem que a expansão da cidade apresentava, a
formulação de um plano diretor vinha sendo reivindicado pelos urbanistas
paulistas já em meados da década de 1930, como forma de equacionar o
parcelamento desmesurado, a contínua abertura de ruas sem observância dos
padrões municipais, as construções de todo tipo, conflitantes entre si e o
congestionamento da parte central de São Paulo. As propostas lançadas ainda
em fins da década de 1920, por exemplo nas palestras de Anhaia Melo, foram
retomadas na metade do século, com um quadro urbano muito diferenciado do
seu início, mas com problemas que apresentavam as mesmas raízes: especulação
imobiliária, concentração na área central, carência de infra-estrutura na periferia
urbana, precariedade do transporte público, etc.
Ao longo do período mencionado, uma importante transformação ocorreu na
concepção dos planos, que passaram a não mais se submeter às intervenções
viárias como elementos de organização-estruturação da cidade, mas a uma
visão mais complexa e abrangente dos problemas urbanos, que requereu
instrumentos e atuação diferenciada dos planos viários. Em seu trabalho sobre o
Planejamento Urbano em São Paulo entre 1899 e 1961, Osello distinguiu as
seguintes etapas de formulações urbanísticas:
- Planejamento Normativo – correspondente a normas, leis e códigos que
estipulavam os controles sanitários e urbanísticos referentes a arruamentos,
alinhamentos, edificações e sua altura, situação no lote, insolação, etc...
- Planos de Embelezamento: visando a reformulação da parte central da cidade
128
- As Grandes Realizações: 1926 – 1945. Referente ao período de formulação e
implantação do Plano de Avenidas
- Emergência do Plano Diretor: 1945 – 1961. Nesta categorização foram incluídos
as tentativas de formulação de planos abrangentes, correspondentes ao Plano
Moses em 1950, à proposta de Plano Diretor de 1954 e à pesquisa SAGMACS
(Osello, 1983, 174)
Referindo-se a esse último período, Osello mencionou a importância que as
mudanças de ordem institucional tiveram para com o planejamento da cidade.
Superada a hegemonia do pensamento aristocrático, da etapa do planejamento
normativo e as intervenções viárias, que foram realizadas sob o Estado Novo
getulista, em conseqüência da redemocratização do país, a necessidade de apoio
político para os governantes passou a ser um dado de real e crescente
importância
2
. Osello considerou que, nessa circunstância, o leque de aspectos
que eram considerados problemas urbanos se ampliou, passando daqueles
relativos apenas à área central e proximidades, para os existentes nos bairros
periféricos, que cresciam desprovidos de infra-estrutura e à margem do conjunto
de leis urbanísticas (idem, 174).
Considerados esses novos problemas, fruto da expansão que a cidade
experimentou a partir da década de 1940, dentro do quadro de técnicos
envolvidos com o planejamento da cidade, posturas diferentes foram defendidas
para o encaminhamento de soluções urbanísticas, com vários defensores da
limitação do crescimento urbano, onde se alinharam os engenheiros Gomes
Cardim, Carlos Lodi e Anhaia Melo (ibidem, 174, 176).
De outro lado figurou Prestes Maia, que negava a idéia de controle do crescimento
da cidade, vinda da proibição da instalação de indústrias, aspecto preconizado
por Anhaia Melo ou, do combate à especulação imobiliária, segundo Lodi. De
acordo com Prestes Maia, a cidade não poderia estancar o crescimento
simplesmente, sendo então necessária a adequação periódica das condições
urbanas, ou seja, a distribuição de sua infra-estrutura, necessitando-se para isso,
de um planejamento dinâmico (op.cit, 197).
No campo dos instrumentos urbanísticos, a análise de Feldman indica que o
zoneamento passou a representar, em fins da década de 1940, uma formulação
que deslocou o foco dos planos do início do século, com predominância dos
aspectos viários e estéticos, para o de organização funcional, atribuindo assim
ao sistema viário o papel de interconectar as funções. O zoneamento passou a
ser caracterizado por três aspectos estruturadores de sua atuação: o de ordenar
o solo do conjunto da cidade, o da aplicação sistêmica das normas e o da
proteção dos valores imobiliários, através da vinculação entre uso do solo e seu
controle e os processos econômicos atuantes na cidade (Feldman, 1994, 68,75).
129
O
QUADRO URBANO A PARTIR DE
1930:
ÁREA CONSOLIDADA E FORMAÇÃO METROPOLITANA
A tese da autora considera que o conjunto de normas urbanísticas voltou-se a
uma regulamentação diferenciada, em que predominaram os interesses
imobiliários das áreas mais valorizadas da cidade. Em suas palavras: “o
zoneamento passa a atuar como instrumento que responde às novas necessidades
de controle dos setores mais valorizados da cidade, com a intensificação e
diversificação da atividade imobiliária a partir dos anos 40, em São Paulo. A
demarcação de zonas, com articulação de diferentes índices urbanísticos, amplia
as possibilidades de controle à escala assumida pela ocupação do setor sudoeste
pelas classes da alta renda, e à escala das transformações que ocorrem na cidade”
(idem, 175).
No desenvolvimento a seguir, serão caracterizadas as principais formulações
urbanísticas até a década de 1960, para que os seus aspectos sejam relacionados
ao quadro urbano da cidade, particularmente à infra-estrutura, parcelamento e
edificação.
130
2.2.1. “Melhoramentos de São P2.2.1. “Melhoramentos de São P
2.2.1. “Melhoramentos de São P2.2.1. “Melhoramentos de São P
2.2.1. “Melhoramentos de São P
aulo”aulo”
aulo”aulo”
aulo”
No estudo “Melhoramentos de São Paulo”, Prestes Maia considerava o
zoneamento como o instrumento de estruturação e organização da cidade.
Segundo sua análise, além do zoneamento espontâneo, fruto dos elementos
étnicos, de classe social e de atividades, e do zoneamento que dividia a cidade
nas zonas central, urbana, suburbana e rural, o zoneamento deveria se constituir:
1. Como construtivo e organizador, e não meramente proibitivo
2. Na construção do plano geral da cidade, a repartição desta em zonas se
configuraria como elemento integrante e eficiente (Cogep, 1980, 28)
Nas “Normas de Urbanismo Geral”, Prestes Maia expôs três aspectos visando
ajustar o enfoque para:
1. Início do zoneamento sistemático
2. Escalonamento dos recuos dos edifícios nas artérias principais, procurando-
se também evitar as empenas cegas.
3. Através de diversas leis, fossem estabelecidas as normas urbanísticas para os
bairros-jardim, avenida Paulista e Higienópolis, com a fixação das taxas de
ocupação, dos usos, alturas e recuos das edificações. Prestes Maia denominou
essas de “zoneamento contratual” (idem, 28, 59)
4. Restrições de altura dos edifícios, mais rígidas no Centro que nas bordas do
Perímetro de Irradiação
5. Restrições a indústrias nos bairros centrais, onde o Brás foi destacado
6. Áreas industriais na margem direita do rio Tietê e na margem esquerda do rio
Pinheiros e ao longo das ferrovias (que segundo o estudo do Perímetro de
Irradiação, seriam transferidas para as margens
desses rios)
7. Transferência de indústrias “nocivas” para núcleos afastados
8. Faixas e núcleos comerciais ao longo das avenidas radiais e nos seus pontos
de convergência, nelas se localizando também zonas de habitação coletiva
9. Zonas de habitação individual entre esses setores, garantindo faixas de
arejamento.
Esse conjunto de diretrizes propunha também que, próximo aos distritos industriais,
deveriam se localizar as faixas de “residência de segunda classe”, separadas das
indústrias por um cinturão verde (ibidem, 28).
Muitas dessas normas foram incorporadas na consolidação do Código de Obras
em 1934, mas como já observado, a Prefeitura não contava com meios eficientes
para o cumprimento das mesmas, principalmente nas áreas mais afastadas do
131
O
QUADRO URBANO A PARTIR DE
1930:
ÁREA CONSOLIDADA E FORMAÇÃO METROPOLITANA
Fig 64 e 65:
Acima: Esquema do Perímetro de
Irradiação. Ao lado, Plano Geral
dos Melhoramentos Centrais.
132
centro. Neste, por sua vez, os congestionamentos e conflitos entre o transporte
público e o particular eram permanentes, propondo-se para tanto o Plano de
Avenidas.
Esse Plano, lançado em 1930, foi implantado efetivamente em 1938 com Prestes
Maia como prefeito, tendo sido concluída a sua primeira componente, a avenida
Ipiranga, em 1941. Os problemas do congestionamento do núcleo central tiveram
um peso relevante nas justificativas do Plano que, entretanto, tratou de viabilizar
também as ligações intra-regionais através de vias radiais que interseccionavam
o anel central de avenidas baseadas no “Perímetro de Irradiação” do urbanista
Eugènne Henard
3
.
O “Perímetro de Irradiação” se constituiu na primeira proposta de âmbito mais
abrangente para a expansão da área central da cidade e definiu a concepção
do Plano de Avenidas. Esse plano influiu decisivamente na definição de limites
dos bairros centrais, que passaram a se constituir um anel no entorno do núcleo
central.
O Centro, então limitado ao Triângulo, apresentava três grandes problemas,
segundo a análise de Prestes Maia:
-Exiguidade de área
-Dificuldade de acesso
-Cruzamento de correntes externas
Prestes Maia destacava que um dos fatores mais preponderantes no
congestionamento do núcleo central era o tráfego diametral, que o comunicava
inutilmente a bairros e setores vizinhos, visto a dificuldade das ligações pelos
vales e encostas que os separavam: “este tráfego de travessia, inútil ao centro,
embora até certo ponto criador de ruas comerciais, é um dos fatores mais notáveis
do congestionamento”. Os alargamentos que então se faziam no Centro (1929),
foram avaliados por Prestes Maia como paliativas e “meias-medidas” e nas suas
palavras em relação aos mesmos: “alargamento das ruas 15, João Brícola, 3 de
Dezembro, Anchieta, Álvares Penteado e das praças Antônio Prado, Tesouro, etc.
Nestes empreendimentos, tem-se insistido demasiado e em pura perda. Podem
por vezes apresentar interesse local, mas o seu alcance para a cidade é sempre
insignificante ou nulo” (Maia, 1930, 34).
Entre várias citações dos planos para cidades da Europa e Estados Unidos, Prestes
Maia utilizou dois exemplos que alicerçaram a argumentação do Plano, ambas
utilizando o enfoque urbano-sanitarista. A primeira, a do Rio de Janeiro, em que
a abertura da avenida Rio Branco foi assim comentada: “É o processo brutal do
sventramento
4
que requerem os centros extensos, compactos e insalubres. Viram-
no os napolitanos, após o cólera de 84, aplicado à parte baixa da sua cidade.
133
O
QUADRO URBANO A PARTIR DE
1930:
ÁREA CONSOLIDADA E FORMAÇÃO METROPOLITANA
Dela participou a avenida Rio Branco na capital do país, quando o conselheiro
Rodrigues Aves resolveu transformar um conjunto de vielas e foco de epidemias
numa cidade moderna e sã”. Na segunda citação de planos para as cidades,
Prestes Maia não se negou a comentar a proposta de Paris: Outros, em São
Paulo, desejariam arrasar tudo para reconstruir de novo, como Le Corbusier em
Paris, onde prega avenidas de 200 metros com arranha-céus de 60 andares.
Mas a solução de Le Corbusier, conquanto sugestiva e impressionante, é ainda
livresca, ao menos para a época (idem, 35).
Em função das características que o Centro apresentava então, o “Perímetro de
Irradiação” foi tomado como a concepção urbanística adequada por definir um
circuito fechado ou coletor em que “todas as vias de expansão e penetração
convergem bem para o núcleo central, mas não todas para o mesmo ponto, nem
para o mesmo monumento”, como no caso dos planos de Berlin, Londres e
Moscou. Utilizando-se dos “Études sur les transformations de Paris” de Eugènne
Hénard, referendado também por estudos norte-americanos, explicitou o que se
tornaria a idéia norteadora do Plano para São Paulo, definindo um núcleo central
e anel de bairros no seu entorno:
“todas essas vias, ao contrário, ligam-se a uma espécie de circuito fechado ou
coletor, que nos propomos chamar de Perímetro de Irradiação, e que é traçado a
uma certa distância do centro matemático da cidade. Este perímetro representa
um grande papel no plano das três capitais; é, por assim dizer, o regulador da
circulação convergente, que atingiria a inextricável chãos se todas as vias
concorressem à mesma praça. É ele que recebe as correntes afluentes e que as
distribui em seguida, com auxílio das pequenas ruas secundárias, até o edifício
ou a casa que é o escopo do movimento individual de cada elemento da circulação.
Para que o perímetro de irradiação seja eficaz, é mister, que ele não contenha em
um núcleo muito grande, todos os edifícios principiais, todos os pontos de atração
da cidade, mas antes, que passe através do semeado irregular desses edifícios,
deixando-os ora de um lado, ora de outro do seu percurso fechado” (ibidem,
35).
Mencionando o que seria a palavra de ordem do urbanismo moderno, “espalhar
o movimento e a atividade, multiplicar os centros”, Prestes Maia criticou o papel
preponderante do velho Triângulo: “em São Paulo ainda persiste o prestígio
provinciano do Triângulo. É tempo, de uma vez por todas de fazer-se-lhe justiça.
A vida comercial, administrativa e mundana de um milhão de habitantes, onde se
constroem aduções para uma população de dois milhões, evidentemente
transbordará de uma área de 300 x 600 metros”. Propugnando a forma anelar
do Perímetro de Irradiação como capaz de produzir uma dilatação do centro,
atraindo a circulação e o comércio, assim foram descritas as funções do Perímetro
de Irradiação por Prestes Maia:
134
1.Descentralizar a vida comercial e, assim, ampliar o centro
2.Desviar as correntes de passagem
3.Distribuir a circulação pelas ruas secundárias
4.Integrar no centro os setores segregados
5.Conservar-lhe o aspecto local, na medida do possível (Maia, op.cit, 46).
Abordando as áreas no entorno do núcleo tradicional, Prestes Maia avaliou que
apenas uma reunia condições para a expansão do centro: “Realmente, das regiões
cardeais, três são menos satisfatórias (pelas condições do relevo e outras) a esse
desenvolvimento: Norte (Florêncio de Abreu), Este (Várzea do Carmo) e Sul
(lombada da Liberdade e vale superior do Anhangabaú). O quarto, entretanto,
apresenta as melhores condições. É o tabuleiro de Sta. Efigênia ou, melhor, toda
a zona que se estende além do Anhangabaú, da Luz ao Arouche e mesmo á
Consolação. Vasto, plano, com facilidades de comunicação em todas as direções
(condição indispensável a um centro) e com facilidades de contato com o centro
atual (condição para a transfusão da vida comercial), apresenta os requisitos
necessários para constituir
a principal zona de expansão do centroa principal zona de expansão do centro
a principal zona de expansão do centroa principal zona de expansão do centro
a principal zona de expansão do centro”(Maia, op
cit, 53, grifo do autor).
Na seqüência, Prestes Maia descreve que os requisitos dessa área eram o seu
sistema de ruas, que mesmo consideradas estreitas (13,00 e 16,00 m) e em
xadrez um tanto rígido, era o mais satisfatório dentro de um raio limitado. Possuía
ainda artérias de primeira classe, entre elas algumas diagonais: São João, Barão
de Limeira, Arouche, Conceição, Timbiras, etc, além de diversas praças: Paissandú,
República, Arouche, etc. Eram vizinhas à área as duas maiores estações da
cidade: Luz e Sorocabana. O vetor aludido ficou claramente escolhido como
preferencial à expansão do Centro, conforme suas palavras: detivemo-nos a
seu respeito para tirar esta conclusão: cabe ao poder público preparar
convenientemente a área e incrementar esse movimento,
porque ele vai realizarporque ele vai realizar
porque ele vai realizarporque ele vai realizar
porque ele vai realizar
em grande parte o fenômeno de descentralização de cuja necessidade nosem grande parte o fenômeno de descentralização de cuja necessidade nos
em grande parte o fenômeno de descentralização de cuja necessidade nosem grande parte o fenômeno de descentralização de cuja necessidade nos
em grande parte o fenômeno de descentralização de cuja necessidade nos
capacitamos”capacitamos”
capacitamos”capacitamos”
capacitamos” (Maia, op. cit, 53, grifo do autor).
Discorrendo sobre o sistema viário complementar ao anel de avenidas em torno
do Centro, que o Plano preconizava, Prestes Maia almejou uma hierarquia onde
um conjunto de avenidas radiais principais se subdividiria em outras tantas
secundárias, cumprindo o papel de atender o movimento centrífugo e centrípeto
da população, do centro à periferia e vice-versa. Assim se referiu ao mencioná-
las: que em regra é o sistema radial o mais conveniente e é justamente o que
possui São Paulo.
CabeCabe
CabeCabe
Cabe
-nos torná-lo melhor e completá-lo, aproveitando quando-nos torná-lo melhor e completá-lo, aproveitando quando
-nos torná-lo melhor e completá-lo, aproveitando quando-nos torná-lo melhor e completá-lo, aproveitando quando
-nos torná-lo melhor e completá-lo, aproveitando quando
possível as linhas mestras existentespossível as linhas mestras existentes
possível as linhas mestras existentespossível as linhas mestras existentes
possível as linhas mestras existentes
..
..
. (Maia, op cit, 82, grifo do autor).
135
O
QUADRO URBANO A PARTIR DE
1930:
ÁREA CONSOLIDADA E FORMAÇÃO METROPOLITANA
Em relação ao conjunto da cidade, considerando a legislação vigente no período
da proposição do “Perímetro de Irradiação”, a Lei de Arruamentos de 1923,
Prestes Maia analisou que faltava à cidade um plano de artérias principais, de
modo a possibilitar à Prefeitura definir diretrizes de hierarquização viária conectada
ao parcelamento e arruamento. A estruturação dessa rede viária principal
articularia o necessário zoneamento das funções urbanas e critérios para a
implantação das ruas, quadras e lotes segundo as diretrizes sanitaristas de melhor
insolação, ventilação, adequação topográfica, etc. (Cogep, 1980, 28-29).
No Estudo para o Plano de Avenidas, foram assinaladas como não excedendo
uma dezena, as radiais consideradas básicas, para as quais primeiro deveria ser
dirigido o “cuidado do administrador”: São João, Rio Branco, Tiradentes, Rangel
Pestana, Central do Brasil, Estados, Liberdade, Itororó, Major Diogo, Anhangabaú,
Consolação (Maia, 1930, 97). Tecendo considerações quanto às transformações
que cada uma deveria sofrer, a fim de adequarem-se às exigências da nova
estrutura, temos esse sistema nas seguintes vias principais e radiais secundárias,
que efetivamente possibilitaram a expansão pretendida pelo plano:
--
--
-
Avenida São JoãoAvenida São João
Avenida São JoãoAvenida São João
Avenida São João
Estabelecendo a ligação da Praça Antônio Prado à Lapa, uma avenida de 10
quilômetros prolongável até Osasco e Pirituba. O prolongamento da São João
com a avenida Água Branca mereceria o mesmo tratamento de recuos a serem
definidos por posturas municipais. Essa radial, que inclusive passaria a ser
denominada avenida Colombo, também se constituiria uma alternativa para a
interligação do sistema viário proposto com as linhas férreas (Centro-Lapa).
As alamedas Barão de Limeira e Nothmann foram consideradas radiais
secundárias à São João - Água Branca, servindo o bairro dos Campos Elísios e
articulando-se com a Timbiras, então em projeto para ser ampliada de rua a
componente da rótula central do “Perímetro de Irradiação”. Para a circulação
no distrito de Santa Ifigênia e ampliação do centro, propunha-se entre outras
ampliações, a da rua Visconde de Rio Branco, posteriormente avenida Rio Branco,
que estabelecia a ligação do Centro com a avenida Rudge, no bairro da Barra
Funda e também com o da Casa Verde.
--
--
-
Anhangabaú-Anhangabaú-
Anhangabaú-Anhangabaú-
Anhangabaú-
TT
TT
T
iradentesiradentes
iradentesiradentes
iradentes
Integrada à proposta para o Vale do Anhangabaú e para a “cidade nova às
margens do Tietê”, que fazia parte dos Melhoramentos de São Paulo. Assim, era
prevista como via rápida até a Ponte Pequena e via semi-rápida até Santana. Era
considerada a via mais espaçosa e portanto merecedora de “tratamento
condigno”.
136
A radial secundária era a rua Anhangabaú, para a qual se preconizava um túnel
sob a rua São Bento e uma ligação com a rua Oriente, ao leste, em função de
uma eventual mudança do Pátio do Pari.
-R-R
-R-R
-R
angel Pangel P
angel Pangel P
angel P
estanaestana
estanaestana
estana
Considerada a principal radial do vetor leste, para a qual se preconizava o seu
alargamento no sentido Belenzinho e a solução ao problema representado pela
travessia em nível das ferrovias, juntamente ao Largo da Concórdia, que se
constituía no centro comercial do Brás. Em igual situação se encontrava também
a avenida do Gasômetro.
Como radiais secundárias, a rua Florêncio de Abreu e a Cantareira, esta servindo
a região do então novo Mercado, dos armazéns do Pari e da zona atacadista da
rua 25 de Março. O Estudo do Plano de Avenidas não considerou necessário o
alargamento dessa via “confiando seu desafogo à avenida dos Estados (op.cit
102)”.
Avenida Central do BrasilAvenida Central do Brasil
Avenida Central do BrasilAvenida Central do Brasil
Avenida Central do Brasil
Projeto de via semi-rápida que foi substituída pela atual avenida Alcântara
Machado, ou Radial Leste, contando com as sub-radiais Bresser, Siqueira Bueno,
Álvaro Ramos, Salles Leme e Tatuapé. A função dessa radial seria a de desafogar
as avenidas Rangel Pestana-Celso Garcia, Visconde de Parnaíba e Moóca,
cortando os bairros do Brás, Moóca, Tatuapé e Penha. No projeto original estava
prevista uma largura de 60 metros, que receberia uma linha central de alta
velocidade.
RR
RR
R
ua da Moocaua da Mooca
ua da Moocaua da Mooca
ua da Mooca
Considerada principal pelas ligações e circulação, encontrava obstáculos para
o alargamento devido a densidade das suas construções e o preço dos terrenos.
No estudo inicial seria o início da avenida Central do Brasil e interligava-se com
vias secundárias como a Oratório, duplicada até o Alto da Mooca pela avenida
Paes de Barros, início da ligação com São Caetano e São Bernardo, já
considerados subúrbios industriais.
--
--
-
Avenida da IndependênciaAvenida da Independência
Avenida da IndependênciaAvenida da Independência
Avenida da Independência
Considerada sub-radial pela função viária, mas de grande importância pelo
aspecto paisagístico e cenográfico, ligando-se ainda à avenida Nazareth.
-R-R
-R-R
-R
ua Conselheiro Fua Conselheiro F
ua Conselheiro Fua Conselheiro F
ua Conselheiro F
urtado e Rurtado e R
urtado e Rurtado e R
urtado e R
ua Glóriaua Glória
ua Glóriaua Glória
ua Glória
Definidas como radiais por se ligarem ao Perímetro de Irradiação, servindo ao
Cambucí e Aclimação.
137
O
QUADRO URBANO A PARTIR DE
1930:
ÁREA CONSOLIDADA E FORMAÇÃO METROPOLITANA
-Liberdade-Liberdade
-Liberdade-Liberdade
-Liberdade
O Estudo para o Plano de Avenidas considerava as ruas da Liberdade e Domingos
de Moraes, prolongadas ao norte pela rua Florêncio de Abreu e avenida
Tiradentes, a espinha dorsal da cidade, o que demonstrava ser feita até então a
ligação norte-sul, pelo interior do Triângulo, buscando-se com isso, desviar esse
fluxo através do Perímetro. Prestes Maia considerou ainda algumas componentes
do sistema viário já existentes, que seriam classificadas com algumas diferenças
em relação às artérias cuja execução constava do Plano. Dessa forma, essas
vias poderiam fazer parte da categoria definitiva, de acordo com as necessidades
de circulação, como por exemplo a avenida Angélica, as ruas Netto de Araújo e
Lins de Vasconcelos, que de circuitos secundários passariam a circuitos de primeira
classe (Maia, op. Cit, 117).
Para o setor oeste-sul-sudoeste da cidade foram dirigidas as obras da nova
avenida Itororó, atual 23 de Maio, prolongamento da avenida Nove de Julho
até a avenida cidade Jardim, dobrando sua largura ao atingir o Jardim América;
alargamento da rua da Consolação e conexão com avenida Rebouças e Dr.
Arnaldo e ainda o alargamento da rua Pedroso de Morais.
Para o setor norte-nordeste-leste da cidade foram dirigidas as obras da avenida
Anhangabaú-Inferior, atual Prestes Maia, sendo o tronco do “sistema Y” e ligando
a avenida Tiradentes ao Parque Anhangabaú (o plano original previa cruzamentos
inferiores com a avenida Senador Queiroz e com a avenida São João); a avenida
dos Estados, com um trecho inferior ligando o Parque D. Pedro II com o setor
norte da cidade e o trecho superior ligando a região do ABC; alargamento da
avenida Cruzeiro do Sul; transposição sob viadutos, ou passagem inferior para
as linhas férreas que cruzavam em nível a avenida Rangel Pestana e finalmente,
a avenida Leste, partindo do Parque D. Pedro II para a Vila Matilde. (Porto,
1992, 151).
As avenidas marginais do rio Tietê e Pinheiros também constavam do Plano, e
sua execução só foi concluída na década de 1960, com muitas modificações de
seu projeto original, que previa inclusive uma linha ferroviária na margem direita
do Tietê, para ali se transferirem os trilhos que cortavam a cidade.
Em 1944 foi definido o alargamento da avenida Pedroso de Morais, que obedecia
diretrizes da Cia. City e teria a função de interligar, através da avenida Rebouças,
a marginal Tietê e a via Anhanguera. Também foi definida a avenida Sumaré,
que interligava a Lapa ao espigão da Paulista e ao Araçá. Outras artérias
propostas, cujas obras também se iniciaram nesse período foram a avenida
Jaguaré, interligando a Lapa e Osasco, a ligação avenida Brasil e Sena Madureira.
O alargamento da Avenida São João também foi concluído até o Largo de
Perdizes (Padre Péricles), assim como o túnel da avenida Nove de Julho (Cogep,
1980, 55).
138
Ao alterar a acessibilidade intra-urbana, diminuindo os tempos de deslocamento
para o automóvel e os ônibus, o Plano consagrou o arranjo das localizações na
cidade: os setores residenciais de alto padrão e seus serviços, os setores
atacadistas, a moradia da classe média, o centro de negócios ampliado, os
acessos às áreas industriais, os bairros populares próximos e os subúrbios, etc.
Foram relacionadas a seguir duas observações que sintetizaram a importância
que esse Plano teve para a cidade:
A concepção de cidade, implícita nas propostas do Plano de Avenidas, de
ocupação extensiva do solo estruturada por um sistema viário radial-perimetral,
corresponde ao nível de estrutura urbana, por um lado, ao novo padrão de
ocupação periférico da cidade e, por outro lado, garante uma integração mais
eficiente entre os diferentes bairros e o centro da cidade. Prepara-se dessa forma
uma estrutura urbana mais integrada e homogênea, condições necessárias à
expansão do processo de industrialização que ocorrerá na próxima década (Leme,
1999, 397)
O novo sistema viário, projetado pelo engenheiro Francisco Prestes Maia, iria
permitir a extensão da cidade em direção à periferia, ao mesmo tempo em que
se priorizava o transporte através de automóveis e ônibus. A área sudoeste da
cidade, privilegiada por maciços investimentos, foi particularmente beneficiada
pelo Plano. A importância desse modelo na configuração da metrópole paulistana
foi decisiva, dela resultando um centro verticalizado, adensado e a continuação
de um padrão periférico que as linhas férreas já haviam definido e que a
flexibilidade trazida pelo ônibus multiplicou” (Sampaio, (org), 1999, 22).
139
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QUADRO URBANO A PARTIR DE
1930:
ÁREA CONSOLIDADA E FORMAÇÃO METROPOLITANA
2.2.2. R2.2.2. R
2.2.2. R2.2.2. R
2.2.2. R
elatório Moseselatório Moses
elatório Moseselatório Moses
elatório Moses
Mesmo com a abertura das avenidas do Plano de Prestes Maia, os problemas
que a cidade apresentava não se restringiam apenas ao sistema viário, como
indicavam os vários trabalhos e participações técnicas dentro e fora de órgãos
oficiais. Em 1950 a Prefeitura de São Paulo contratou o “IBEC-International
Basic Economy Corporation”, instituto de Nelson Rockfeller, para elaboração de
um estudo para São Paulo, que abrangia: relatório sobre o planejamento de
obras públicas e novos estudos daquelas necessárias, sistema de vias arteriais,
transporte coletivo, sistemas de parques e praças, engenharia sanitária relativa à
coleta de lixo e aterros, retificação do rio Tietê e zoneamento de suas várzeas a
serem urbanizadas, plano de zoneamento para a cidade e métodos de
financiamento de obras públicas (Leme, org, 1999, 398).
Esse Relatório, elaborado por uma equipe de especialistas norte-americanos foi
dirigido por Robert Moses, urbanista responsável pela renovação urbana de
Nova Iorque no pós-guerra, que entre outras recomendações, descartou o sistema
de transportes de massa sobre trilhos e prescreveu a revisão do Código Arthur
Saboya para normatizar e redirecionar a concentração existente no Centro
(Amadio, 1998, 60). Seus estudos resultaram em um conjunto de propostas
onde três problemas iniciais foram considerados:
1. Falta de uma planta oficial atualizada, com todas as ruas e melhoramentos,
já que a existente, o levantamento aerofotogramétrico SARA-Brasil, datava de
1929. Em decorrência disso, foi contratado o levantamento que resultou na
planta do consórcio VASP- Cruzeiro do Sul, em 1954.
2. Ausência de um zoneamento que fixasse normas para utilização do solo e
para a altura dos edifícios.
3. A ausência de um código de obras atualizado (Cogep, 1980, 93).
Fruto de uma legislação que datava ainda da década de 1930, a cidade era
dividida em quatro zonas - central, urbana, suburbana e rural - e as prescrições
existentes nesses perímetros eram apenas de diferenciação de usos (reservando
as áreas exclusivamente residenciais), limitações de altura e ocupação das
edificações dentro de cada zona. Segundo Moses, as normas necessárias para a
cidade, constantes de um novo zoneamento urbano, deveriam ser dirigidas para :
- O estabelecimento de restrições à concentração de construções na área central,
limitando-se também alturas e usos.
- Revisão e reunião dos dispositivos legais existentes que estabeleciam normas
ao uso e ocupação do solo em áreas determinadas.
140
- Definição do uso das construções, uma vez que na cidade se mesclavam
indústrias ao lado de residências, edifícios ao lado de habitações unifamiliares e
nas áreas mais distantes do centro, construções para qualquer finalidade.
O corpo normativo que o Relatório propôs para o zoneamento da cidade incluiu
a subdivisão do uso do solo nas seguintes categorias:
- Indústria: tipos I1 e I2
- Comércio: tipos C1 e C2
- Residência: Ri, R2, R3, R4 (idem, 96)
Nessa subdivisão, a área central corresponderia à categoria de distrito C1,
possibilitando residência, comércio e até indústrias leves. A altura das edificações
e a área construída sofreriam reduções para a diminuição dos congestionamentos.
No distrito C2, envolvendo o C1, seriam permitidos os mesmos usos além da
presença de armazéns e depósitos.
Para a indústria, além do Relatório considerar a maior parte da cidade reservada
aos distritos I1 e I2, seguindo as áreas existentes e em expansão, propunha a
limitação do crescimento industrial ao leste e para a descentralização dessas
Fig. 66: Sistema viário proposta pelo Relatório Moses
141
O
QUADRO URBANO A PARTIR DE
1930:
ÁREA CONSOLIDADA E FORMAÇÃO METROPOLITANA
atividades e maior facilidade para o transporte de operários, a recomendação
de uso industrial para as vizinhanças do canal do rio Pinheiros. Sobre as zonas
industriais, o Relatório não considerava possível a transferência de parte das vias
férreas para a margem direita do rio Tietê, argumentando, além dos custos
dessa transferência, as conseqüências que a a mesma poderia acarretar nas
áreas industriais existentes.
As zonas de habitação foram propostas como R2 e R3, exclusivamente residenciais,
com R1 permitindo uso misto juntamente com comércio e indústrias leves, mas
seguindo uma restrição à expansão desses usos caso uma zona se mostrasse
mais residencial, isto é, propondo uma transformação de R1 para R2 ou R3. Na
R4, a gama de usos era maior, apenas não se admitindo indústrias pesadas ou
nocivas, mas transferindo para uma futura revisão, a adoção de parâmetros
mais detalhados (Cogep, 1980, 96, 97).
Na prática, assim como as categorias C1 e C2 abrangiam quase todas as
atividades já existentes no centro e bairros centrais, o mesmo acontecia com as
demais, tanto para indústria, como para o uso residencial. À parte a ausência de
um levantamento cadastral atualizado para a elaboração desse trabalho, as
recomendações para o zoneamento constantes no relatório Moses foram
consideradas genéricas e superficiais, tais como a reserva de áreas para parques
e sistema viário precedendo a definição de zonas (Cogep, 1980, 97). Segundo
ainda a sua equipe de consultores, essa proposta de zoneamento deveria tomar
como base e ajuda para a redação do seu decreto de regulamentação, o
zoneamento de Nova Iorque (Leme, 1999, 398).
A influência das concepções norte-americanas foram visiveis também nas
recomendações e propostas visando preparar a cidade para o aumento do
número de automóveis, através da ampliação dos espaços para estacionamentos
privados nas construções, ainda que unifamiliares e o estabelecimento da tarifação
de estacionamento na área central.
O outro aspecto, relativo aos transportes, foi que mesmo considerando as
vantagens de um sistema radial sobre trilhos na solução dos problemas dos
transportes coletivos, essa solução foi preterida, dando lugar a recomendações
de melhoria do sistema de ônibus (que incluía a compra de 500 veículos) e
construção de vias expressas, sob alegação dos altos custos envolvendo o
transporte baseado no metrô. Algumas das radiais propostas incluíram a reserva
de faixas para um sistema rápido de transporte, que no início seria baseada nos
ônibus que posteriormente poderiam ser substituídos por trilhos (idem, 1980,
99).
As vias arteriais consideradas prioritárias pelo Relatório Moses foram:
- Ligação, através de via expressa na marginal do rio Tietê, das rodovias
Anhanguera e Dutra
142
- Ligação da zona sul com a via Anhanguera através da marginal do rio Pinheiros
- Ligação norte-sul através do prolongamento da avenida Tiradentes na direção
da Itororó (23 de Maio), com faixa para transporte rápido.
- Ligação do anel central com a via Anchieta através da avenida dos Estados
- Via expressa para a Penha, correndo paralela aos trilhos da ferrovia, dispondo
também de faixa reservada para transporte rápido.
Como se percebe, várias dessas vias já faziam parte daquelas propostas no
Plano de Avenidas, o que juntamente com recomendações relativas ao Código
de Obras, zoneamento industrial, exigências para estacionamentos e limitações
para construções, se encontravam também em estudos nos órgãos de
planejamento da Prefeitura (idem, 99,100).
Apesar das observações que numerosos autores fazem em relação a esse Relatório,
considera-se que esse estudo teve um papel estratégico na época de sua
elaboração, dado o impasse existente causado pelo fato do planejamento urbano
em São Paulo ser disputado pelas correntes lideradas por Anhaia Melo e Prestes
Maia, uma disputa entre o controle da expansão da cidade de um lado, que
incluía até a proibição de instalação de novas indústrias e de outro lado, a
expansão contínua da cidade (Leme, 1999, 399). As críticas se direcionaram à
superficialidade das propostas que o Relatório incluiu, ao fato de muitas se
basearem na experiência norte-americana e principalmente ao fato de suas
recomendações negarem o transporte estrutural sobre trilhos, o que já era
reivindicado e postergado desde o Plano Light, de 1927.
143
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1930:
ÁREA CONSOLIDADA E FORMAÇÃO METROPOLITANA
2.2.3. Estudos para Segunda P2.2.3. Estudos para Segunda P
2.2.3. Estudos para Segunda P2.2.3. Estudos para Segunda P
2.2.3. Estudos para Segunda P
erimetral, Metrô e proposta de Plano Diretorerimetral, Metrô e proposta de Plano Diretor
erimetral, Metrô e proposta de Plano Diretorerimetral, Metrô e proposta de Plano Diretor
erimetral, Metrô e proposta de Plano Diretor
Outro estudo que estava sendo desenvolvido desde 1953 era o da conclusão do
projeto da Segunda Perimetral, confiado a Prestes Maia. Nesse trabalho, a ênfase
viária era novamente justificada pela necessidade de ampliação das avenidas
do “Perímetro de Irradiação”, construídas entre 1938 e 1948 quando o próprio
Prestes Maia era prefeito. Visava a ampliação do anel central de avenidas através
de um outro circuito exterior, que se integraria às vias marginais aos rios Tietê e
Pinheiros, também em projeto (Cogep, 1980, 117).
Parte dessa nova componente viária já havia sido iniciada ainda sob a gestão de
Prestes Maia, que foi o alargamento da avenida Duque de Caxias, com a
aprovação do projeto da avenida Amaral Gurgel, ambas se configurando como
ruas locais, antes dessa intervenção. Constavam ainda o alargamento das ruas
Pedroso e Tamandaré, para acesso à várzea do Glicério e das ruas Piratininga,
Monsenhor de Andrade ou Bresser, interligando-as com a rua João Teodoro, na
área Brás – Pari (idem, 115).
Outro aspecto levado em conta pelo plano era o da eliminação dos obstáculos
causados pelas linhas férreas, que ao contrário do que o Relatório Moses
propunha, eram deslocadas para a margem do rio Tietê, segundo a proposta
original de Prestes Maia, desaparecendo dessa forma as barreiras dos trilhos
nos bairros do Brás, Belém, Moóca, Penha, etc. (ibidem, 117).
Diferentemente da ligação diametral Norte-Sul proporcionada pelo sistema “Y”,
implantado no Plano de Avenidas, a diametral Leste-Oeste se revestia de especial
importância nesse plano, uma vez que a travessia entre as avenidas São João e
Rangel Pestana era dificultada pela passagem através das vias do Centro Velho
(op. cit, 117).
Em 1955, o mesmo Prestes Maia foi nomeado presidente da comissão para
elaboração de um projeto de Metrô. Esse grupo propôs que, antes mesmo da
construção desse modo de transporte, fossem concluídas as avenidas definidas
pelo Plano de 1930 e presentes também no projeto da Segunda Perimetral. As
direções do Metrô seriam coincidentes com as das novas vias, que incluiriam
faixas exclusivas para a posterior implantação de trilhos (como o Relatório Moses
também propôs), e seriam voltadas inicialmente para o sul, norte e leste, para
posteriormente, outras três linhas alcançarem o oeste, o sudeste e o sudoeste.
Essa implantação implicaria na maior parte das linhas ser em superfície ou aérea,
havendo pouca extensão em nível subterrâneo (Osello, 1983, 201).
Tanto a proposta da Segunda Perimetral quanto a do Metrô não se concretizaram,
sendo que a perimetral leste-oeste foi concluída apenas em fins da década de
1960, parte através de via elevada e passagem sob a Praça Roosevelt, com
144
grandes perdas para o ambiente urbano e funcionando fundamentalmente como
corredor de tráfego para automóveis, como será visto adiante.
Em relação ao estudo para implantação do Metrô, este teve seu projeto
abandonado pelo poder público e também sofreu críticas por parte de técnicos
com afinidades às idéias de Anhaia Melo. Em sua análise desse projeto, Gomes
Cardin enumerou os pontos negativos de sua concepção, considerando ser um
projeto concentrador, já que se apoiava numa rede rádio-concêntrica, induzindo
a um maior adensamento de atividades na área central. Para esse técnico do
Departamento de Urbanismo, o controle do uso do solo deveria preceder as
obras, sendo anuladas as futuras vantagens do Metrô devido ao adensamento
que poderia induzir (idem, 201)
As diferenças profundas entre a concepção urbanística de Anhaia Melo e a de
Prestes Maia ficam explícitas nesse período: o primeiro buscava no planejamento
um controle sobre a iniciativa privada e o crescimento caótico da cidade e o
segundo, uma afirmação da obra pública como solução para os problemas
urbanos, sendo necessário para tanto um planejamento técnico e pragmático
(ibidem, 190,193).
Em contraposição aos planos viários preconizados por Prestes Maia, a concepção
defendida pelos técnicos do Departamento de Urbanismo, como o engenheiro-
arquiteto Carlos Lodi, pautava-se por um planejamento estruturado em três eixos
de atuação:
- Ser abrangente, envolvendo todos os aspectos urbanos, integrando aqueles de
ordem jurídica, financeiras, administrativas, técnicas e sociais.
- Se constituir em rumo, uma formulação diretiva que subordine as atuações
técnicas específicas.
- Ser flexível, adaptável às transformações urbanas, constituindo-se em um
processo contínuo associado às políticas administrativas (Feldman, 1996, 48).
Deve ser considerado que as propostas para o Plano Diretor de 1954 constituíram
um rol de análises e propostas com continuidade dentro do Departamento de
Planejamento da prefeitura, que após incorporar as pesquisas realizadas no
final da década de 1950, foram apresentadas na década seguinte novamente
como proposta de Plano Diretor. Com relação ao projeto de Segunda Perimetral,
que posteriormente foi denominada Contra-Rótula, não foi concluída na sua
totalidade e também mostra a significativa distância entre um planejamento
urbano voltado ao controle do crescimento urbano, como Anhaia Melo
preconizava e a ênfase viária presente nos planos de Prestes Maia, que inclusive
vinculou o trajeto do Metrô ao traçado das avenidas. Este modo de transporte,
cujo projeto e execução por diversas vezes foram adiados sob a alegação dos
altos custos envolvidos em sua implantação, foi preterido em relação à expansão
145
O
QUADRO URBANO A PARTIR DE
1930:
ÁREA CONSOLIDADA E FORMAÇÃO METROPOLITANA
viária, e só foi inaugurado vinte anos depois, em 1974, com o funcionamento
da linha Norte-Sul.
Fig. 67 : Proposta de Prestes Maia para o metrô de São Paulo, 1955.
Fig. 68 : Esquema das linhas da propostade metrô de Prestes Maia.
146
2.2.4. Estrutura Urbana da Aglomeração P2.2.4. Estrutura Urbana da Aglomeração P
2.2.4. Estrutura Urbana da Aglomeração P2.2.4. Estrutura Urbana da Aglomeração P
2.2.4. Estrutura Urbana da Aglomeração P
aulistana - SAaulistana - SA
aulistana - SAaulistana - SA
aulistana - SA
GMAGMA
GMAGMA
GMA
CS e RCS e R
CS e RCS e R
CS e R
elatórioelatório
elatórioelatório
elatório
PlanejamentoPlanejamento
PlanejamentoPlanejamento
Planejamento
Foram reunidos nesta última abordagem sobre o urbanismo na década de 1950,
dois trabalhos, consubstanciados em relatórios, que seguiram a linha da
descentralização urbana de São Paulo, como encaminhamento de soluções aos
problemas existentes. As pesquisas da SAGMACS, iniciadas em 1956 se
mostraram qualitativamente diferenciadas dos trabalhos anteriores, e além de
serem aproveitadas para as análises e diagnósticos do projeto de plano diretor
apresentado em 1961, serviram para referenciar os planos posteriores e
estabeleceram uma nova compreensão dos problemas urbanos de São Paulo,
malgrado não terem se convertido concretamente em planos aplicados.
Em 1956 a Prefeitura de São Paulo contratou a Sociedade para Análise Gráfica
e Mecanográfica Aplicadas aos Complexos Sociais – SAGMACS
5
para realização
de pesquisa em conjunto com a Comissão de Pesquisa Urbana, vinculada ao
Departamento de Urbanismo. Este incorporou a pesquisa da SAGMACS na
publicação de seus trabalhos realizados entre 1957 e 1961, que se
consubstanciaria no relatório denominado Planejamento, apresentado ao governo
do estado nesse último ano (Feldman, 1996; Leme, 1999).
Fig. 69: Estudo SAGMACS: Polos regionais
147
O
QUADRO URBANO A PARTIR DE
1930:
ÁREA CONSOLIDADA E FORMAÇÃO METROPOLITANA
Apesar das diferenças entre as propostas do Departamento de Urbanismo de
1961 e as que constaram do relatório da SAGMACS, o estudo aprofundado da
estrutura sócio-econômica da cidade serviu de base às recomendações de
multipolarização da cidade, fundamentada na reorganização do uso do solo
para descentralizar suas atividades, a distribuição de zonas industriais, subcentros
e zonas residenciais, como forma de reduzir o excessivo fluxo para a área central
e seus bairros mais próximos (Cogep, 1980, 153).
A análise da estrutura urbana levou em conta uma setorização do território para
obtenção de conjuntos relativamente homogêneos da população, formulando a
hipótese de que a vida coletiva da população se organizava em três unidades:
- a Elementar, baseada em uma setorização que considerava os limites naturais
e construídos num raio máximo de 2 Km e população de 1000 habitantes. Essa
seria a escala onde as necessidades cotidianas da população deveriam ser
satisfeitas.
- a Complexa, que agregava várias unidades elementares e corresponderia a
um diâmetro de 3 Km.
- a Completa, que agregava um conjunto de unidades elementares e complexas,
constituindo um território com certa auto-suficiência e contendo também uma
unidade Polar, representada por um sub-centro secundário. Essa escala foi
delimitada a partir dos equipamentos comerciais, de serviços e sociais.
A análise da estrutura urbana da cidade definiu também três regiões:
- a região central, que formava o núcleo mais concentrado de comércio e
serviços
- a região externa ou periférica, com maior atração do sub-centro regional que
o centro principal
- a região de transição, no entorno da região central, com certa autonomia, mas
dependente da central para finalidades específicas (idem, 153).
Através dos levantamentos dos equipamentos e serviços, o trabalho da SAGMACS
consolidou, dentro do planejamento, a idéia de que as condições de moradia e
falta de equipamentos e infra-estrutura da já extensa periferia da cidade, se
constituíam em um problema urbano prioritário. Identificou a especulação
imobiliária como responsável pelo crescimento desprovido de infra-estrutura,
com grande sub-aproveitamento do solo, problemas que evidenciavam a ausência
de urbanismo metropolitano e de descentralização administrativa (Osello, 1983,
211,212).
No que se refere à recomendações incluídas na parte conclusiva do relatório, a
centralização da cidade foi analisada como tendo atingido o seu limite máximo
148
de saturação econômica e física, e as artérias projetadas da Segunda Perimetral
junto com a proposta de Metrô poderiam congestioná-lo mais ainda. Segundo a
SAGMACS, a característica monopolar da cidade necessitava ser alterada
mediante:
- a transformação da sua aglomeração em multipolar, através do desenvolvimento
de subcentros em cada unidade completa, da mesma forma que uma cidade
média.
- uma necessária organicidade entre unidades de várias escalas, sem o que a
multipolaridade não seria suficiente para a alteração da estrutura presente. Essa
organicidade, que moldaria uma nova concepção de zoneamento diferenciada
daquela com finalidades funcionalistas, estaria baseada numa escala que partia
do loteamento, a sua agregação em uma unidade elementar, a agregação delas
em uma unidade complexa, o conjunto dessas que constituiriam uma unidade
completa e estas as unidades municipal e supra-municipal.
- o estabelecimento de uma rede viária fundamentada na estrutura multipolar,
que partiria de um anel externo, constituído pelas avenidas marginais, com
estações rodoviárias ao longo das mesmas que interconectariam subcentros
regionais também dispostos nas proximidades das mesmas. Além de defender a
proposta do Departamento de Urbanismo para essas vias, o Relatório procurou
inverter o fluxo irradiador da centralidade, através da idéia de uma nova
acessibilidade à extremidade da área central consolidada. Esse Relatório previa
ainda a necessidade de ligações entre esses subcentros e a adoção de um sistema
metropolitano interligado aos outros modos de transporte, rodoviário e ferroviário,
necessário para uma aglomeração suportar mais de 10 milhões de habitantes
(Cogep, 1980,157).
- Como proposta para descentralizar a excessiva concentração representada
pela monopolaridade, o relatório propôs também a criação de um novo centro
que seria desenvolvido em São Mateus, onde havia área disponível para tanto.
Esse novo núcleo suportaria uma população de 200 a 300 mil habitantes e foi
concebido para desempenhar estrategicamente as funções de capital política e
econômica, superando a escala da aglomeração (idem, 158).
RR
RR
R
elatório do Departamento de Planejamentoelatório do Departamento de Planejamento
elatório do Departamento de Planejamentoelatório do Departamento de Planejamento
elatório do Departamento de Planejamento
Elaborado após o Relatório da SAGMACS, o relatório do Departamento de
Planejamento, de 1961, sintetizou as propostas que esse órgão desenvolvia e
defendia para o Plano Diretor, incorporando a linha defendida por Anhaia Melo
e pela SAGMACS, de descentralização da cidade. Fundamentava-se nas pesquisas
desenvolvidas pelo próprio Departamento e pela SAGMACS, que resultaram
149
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QUADRO URBANO A PARTIR DE
1930:
ÁREA CONSOLIDADA E FORMAÇÃO METROPOLITANA
em um complexo conjunto de coleta, análise e interpretação de dados sobre os
variados aspectos da vida urbana. Estava estruturado em:
- Planejamento da circulação e transporte através de planos viário, rodoviário e
ferroviário.
- Legislação para o uso e ocupação do solo visando a estruturação dos aspectos
relacionados à vida e trabalho da população.
- Descentralização da administração pública, com nova estrutura dos órgãos de
planejamento (ibidem, 166).
Com relação à estrutura de circulação e transportes, o plano viário desse relatório
partiu de uma crítica ao sistema rádio-concêntrico da cidade através da
transformação do sistema radial-perimetral, implantado pelo Plano de Avenidas,
em uma nova estrutura diagonal-perimetral, baseado em diametrais expressas,
vias principais e locais, criando uma divisão urbana baseada em bolsões de
grande ou pequena extensão. Das quatro principais componentes, apenas duas
diferiam das propostas por Prestes Maia: a diagonal norte-sudeste, através da
ligação entre as avenidas Cruzeiro do Sul e dos Estados e a diagonal sul-leste,
composta pelas avenidas Radial Leste e Itororó, ambas projetadas e a serem
construídas. O anel rodoviário proposto pelo relatório Planejamento equivalia à
terceira perimetral, do plano de Prestes Maia e a diagonal norte-sul era formada
pelas avenidas Anhangabaú (Prestes Maia)-Tiradentes e Nove de Julho, ambas
existentes no período (Cogep, 1983, 165; Osello, 1983, 218).
A ligação sul-leste se constituiu na principal obra desse plano para o centro da
cidade, uma vez que transformaria o sistema “Y” existente, em um “H”, através
da ligação por um túnel sob a Liberdade, das duas avenidas projetadas. Essa
obra se encarregaria também de descongestionar a perimetral do Plano de
Avenidas (atual Rótula), ao absorver parte do fluxo que se dirigia ao Brás através
das Praças João Mendes e Clóvis Bevilácqua, para atingir a avenida Rangel
Pestana. A ligação entre as avenidas Cruzeiro do Sul e Estados seria uma via
paralela a Tiradentes-Anhangabaú, passando ao leste da área central e
interligando a zona norte ao Brás, Ipiranga e as cidades industriais do ABC
(Cogep, op. cit, 167)
Apesar de ter proposto um conceito diverso do existente, o plano viário do Relatório
“Planejamento” absorveu os projetos existentes de administrações anteriores,
constituindo, segundo Feldman, uma “continuidade à adequação da cidade ao
sistema sobre rodas iniciado por Prestes Maia”. Segundo a autora, as vias
propostas se restringiam ao sistema viário principal, não alcançando as áreas
mais distantes desprovidas de acessibilidade e suas melhorias viárias e as ligações
intra-bairros não se concretizaram (Feldman,1996, 61).
150
Na mesma direção, Osello analisou que a nova estrutura viária poucos resultados
acarretaria para a pretendida descentralização, pois não se diferenciava da
estrutura radial que a cidade possuía. Um exemplo é a diagonal sul-leste proposta,
em que o traçado da Segunda Perimetral defendido por Prestes Maia também
possibilitava a mesma ligação, desafogando a perimetral existente e evitando
uma obra de alto custo representada pelo túnel projetado (Osello, 1983, 218).
A nova estruturação urbana, compatibilizada com a dos bairros, e onde a vida
local se desenvolveria, seria resultante da malha viária composta de vias expressas
e as principais locais, consideradas “precintos viários”, ou seja, ligação entre
uma hierarquia e outra (Cogep, op. cit, 171).
No interior dos 27 distritos que seriam formados por essa malha, os instrumentos
normativos presentes no novo zoneamento, estariam voltados à compactação
da cidade através de parâmetros de densidade, à formação e desenvolvimento
de núcleos distritais compostos por comércio, serviços e equipamentos e à
adequação das localizações industriais. Mesmo com a tendência já existente de
expansão das atividades centrais para o vetor sudoeste, o relatório “Planejamento“
propunha também a criação de um novo centro, que diferentemente do relatório
da SAGMACS, se localizaria ao norte do núcleo central (Osello, op. cit, 220;
Cogep, op.cit, 173), idéia que teria continuidade no Plano Urbanístico Básico –
PUB, de 1968.
Em relação à legislação de uso do solo propriamente dita, foram incluídas nesse
relatório leis já existentes, que incidiam sobre:
- a classificação das atividades urbanas, dividindo a cidade em cinco tipos de
zonas: industriais, predominantemente residenciais, exclusivamente residenciais,
mistas e central (lei 4805/1955).
- os coeficientes de aproveitamento para edifícios residenciais e comerciais (lei
5261/1957)
- a regulamentação dos bairros da Cia. City, Pacaembú e Pacaembuzinho (Lei
4792/1955) (Feldman, 1996, 64, 105).
No que se refere às propostas mais gerais contidas no Relatório, voltadas à
descentralização da cidade, no período seguinte as mesmas sofreriam críticas
sobre sua eficácia, uma vez que a ênfase viária e nas obras urbanas se tornariam
novamente predominantes com a volta de Prestes Maia à prefeitura após 1961.
À proposição das unidades de vizinhança, ele contrapôs o raciocínio de serem
divisões fictícias, uma vez que a mobilidade da população ocorreria devido às
condições sociais, profissionais e culturais presentes. Ainda segundo Prestes Maia,
a rede viária principal subordinaria outras medidas urbanísticas necessárias para
a cidade e o verdadeiro problema urbano não se configurava na falta de
planejamento, mas no grande atraso das obras necessárias para São Paulo, isto
é, na atualização de sua infra-estrutura (Osello, 1983, 222).
151
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QUADRO URBANO A PARTIR DE
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ÁREA CONSOLIDADA E FORMAÇÃO METROPOLITANA
2.3. A expansão da área urbanizada e novos elementos viários2.3. A expansão da área urbanizada e novos elementos viários
2.3. A expansão da área urbanizada e novos elementos viários2.3. A expansão da área urbanizada e novos elementos viários
2.3. A expansão da área urbanizada e novos elementos viários
Os trabalhos de Meyer, Saia e Petrone sobre a expansão urbana que ocorreu na
cidade mostram que o processo de metropolização em curso implicou na
mudança de escala da aglomeração, que como já visto, rompeu uma estruturação
que se apresentava até fins da década de 1930 muito mais concentrada. Meyer
analisou essa dinâmica relacionando o crescimento em extensão das faixas
residenciais e industrias na periferia, a compactação acompanhada pela
verticalização da área central e mais tarde nas áreas do entorno do centro e a
construção da rede rodoviária complementando o sistema ferroviário, como os
principais elementos presentes nesse processo (Meyer, 1991, 17).
Por sua vez, Saia abordou a expansão que a cidade sofreu, referindo-se ao que
denominou ter se constituído um crime urbanístico o crescimento ocorrido, dos
130km², que a cidade ocupava em 1930, para 420km² em 1954, expansão
essa que foi dirigida pelo setor imobiliário sem qualquer diretriz ou disciplina
urbanística (Saia, 1978, 237).
Em sua análise sobre o crescimento da área urbanizada no período 1925-1950,
Petrone indicou a importância dos elementos de infra-estrutura como indutores
da ocupação de setores da cidade:
1. Ao Norte, as obras de drenagem e retificação parcial do rio Tietê, aliadas à
ferrovia da Cantareira, com seus ramais na direção do Tremembé e do município
de Guarulhos.
2. A Oeste, através da ocupação da faixa entre a ferrovia e a radial Água Branca,
favorecendo a ligação com a Lapa e da ocupação dos espaços atualmente
ocupados pelos bairros ao sul da rua Guaicurus.
3. A Leste, seguindo os trilhos da antiga Central do Brasil e ao longo da radial
Celso Garcia, espaços onde se multiplicaram os bairros populares. Segundo o
autor, essa ocupação se deveu ao crescimento do Brás, que expandiu a cidade
à distância de 10 quilômetros do centro.
4. Igualmente para o Sudeste, a ferrovia foi a responsável pela expansão,
interligando a área central da cidade ao bairro do Ipiranga , com desdobramentos
na direção do ABC. Petrone analisou que a característica principal dessa expansão
não foi a distância alcançada, mas sua rapidez, uma vez que o perfil da ocupação
foi de bairros proletários.
5. Ao Sul, a interligação da cidade com o núcleo de Santo Amaro representou a
maior distância da expansão, devendo-se ao transporte por bondes, às rodovias
e à construção das represas da Light. Nessa região, apesar do surgimento de
bairros residenciais de classe média, estabelecimentos industriais também se
152
instalaram, “estendendo a influência da cidade até um raio de mais de 15
quilômetros”, segundo o autor.
6. Finalmente ao Sudoeste, que teve sua expansão diferenciada dos outros vetores,
onde não foram determinantes as indústrias ou sistema viário. Imputou-se ao
ocorrido nessa área, os melhoramentos desenvolvidos na várzea do rio Pinheiros,
que transformaram os terrenos imprestáveis, como no caso dos bairros-jardim
América e Europa, ou muito acidentados, como no caso do Pacaembu, locais
onde foram se instalar bairros residenciais de alta renda. Segundo a análise “e
assim tinha de acontecer, pois as despesas realizadas com aqueles melhoramentos
só poderiam elevar os custo dos terrenos, ocasionando uma natural seleção no
que se refere aos seus habitantes”. Prosseguindo na abordagem, essa ocupação
de alta renda ligou-se àquela em direção ao Sul, preenchendo os vazios entre as
mesmas, apesar de um ritmo mais lento em direção ao velho núcleo de Pinheiros
(Petrone apud Azevedo, 1958, 148-149).
Foram consideradas ainda nessa análise, três elementos que possibilitaram a
intensificação da ocupação urbana, em todos os quadrantes da cidade: a
retificação dos rios Tietê e Pinheiros, com a conseqüente drenagem de suas
várzeas, a abertura das avenidas do Plano de Prestes Maia e a construção de
rodovias. Estas, no período já próximo à década de 1960, cresceram de
importância e equipararam-se às ferrovias, no tocante à indução da ocupação
urbana (idem, 149).
Assim é que, com exceção do crescimento para o Norte, onde a Serra da
Cantareira se constituía em obstáculo naquele período, todos os outros quadrantes
associaram um dos modos de transporte, ferrovia ou rodovia, ou mesmo, os
dois. Ainda seguindo a análise do geógrafo, a relação das rodovias com o
crescimento urbano ocorreu:
-Para o Leste, além da antiga Central do Brasil, a via Dutra passou a estabelecer
ligações com os bairros operários de São Miguel Paulista e Ermelino Matarazzo,
que também abrigavam funções industriais.
-Ao sudeste, a ferrovia Santos- Jundiaí e a via Anchieta estabeleceram o binário
de ligação com as cidades do ABC, então pólos industriais consolidados,
interligando-as à São Paulo.
-Ao Oeste, a mesma Santos-Jundiaí e Sorocabana, aliadas à via Anhanguera,
desempenharam o papel de indutores de expansão e elementos de interconexão
com Pirituba e Osasco, que além da Lapa e Vila Industrial Jaguaré, abrigavam
moradia operária e indústrias.
-Ao Sul, as avenidas Nove de Julho e Cidade Jardim se constituíram vias urbanas
de expansão da ocupação próxima ao Centro, mas Petrone salientou a
importância da avenida Santo Amaro, que estabeleceu a ligação daquele núcleo
153
O
QUADRO URBANO A PARTIR DE
1930:
ÁREA CONSOLIDADA E FORMAÇÃO METROPOLITANA
à área de consolidada de São Paulo, ressaltando a mescla existente entre bairros
residenciais e de área em que algumas indústrias já se encontravam em
funcionamento (idem, 157-158).
Ainda que não mencionadas nesse trabalho, outras duas importantes rodovias
se encontravam no quadrante sudoeste, a via Raposo Tavares e a estrada de
ligação São Paulo-Curitiba, ambas juntas ao Butantã e próximas a Pinheiros.
A relevância das estradas de rodagem como principal elemento de infra-estrutura
relacionado à acessibilidade, manifestou-se também na estruturação ou
crescimento dos seguintes elementos, segundo Langenbuch.
- Os “subúrbios-estação”, surgidos nas décadas anteriores devido às ferrovias,
que passaram a ser conectados à cidade consolidada através de ônibus,
favorecidos pela nova circulação rodoviária.
- Intensificação da ocupação suburbana através dessa circulação, dando origem
aos “subúrbios-ônibus” e aos “subúrbios-entroncamento”, estes últimos pontos
de concentração e cruzamento de correntes de circulação.
- Impulso à industrialização ao longo das principais rodovias, onde os
estabelecimentos puderam se situar em localizações aptas à expansão e sob
novos padrões construtivos. (Langenbuch, 1971, 258).
Espacialmente, o resultado da expansão da área urbanizada pode ser verificado
através dos números a seguir:
O crescimento da cidade foi analisado por um estudo da Secretaria Municipal
de Planejamento, que apontou as características presentes nesse modelo
expansão: A partir de 1940...o tripé loteamento periférico /autoconstrução/
moradia própria, altera profundamente a estrutura urbana paulistana, alargando-
a para a periferia e deixando-a apta à industrialização acelerada. Para tanto,
expandiu-se a rede viária, facilitando a circulação de mercadorias e da força de
trabalho, num contexto em que o transporte coletivo passa a ser o ônibus, e não
mais o bonde. O reflexo dessa expansão é percebido pela acentuada queda da
densidade demográfica bruta, que cai de cerca de 110 habitantes por hectare,
em 1914, para 47 hab/ha em 1930. Em 1960 era ainda menor, 24,6 hab/ha...”
(Sempla, 1990, 35).
154
Se a industrialização pioneira se pautou por uma concentração espacial específica
em relação ao tecido urbano da cidade, no período 1930-1960 agora analisado,
com uma inflexão na década de 1950, as transformações ocorridas na base
industrial fizeram com que o setor não se baseasse mais em bens de consumo
não duráveis, como alimentação, vestuário, mobiliário, etc, pois a partir da
década de 1950 passou-se a produzir bens de capital e de consumo durável, o
que produziu novas localizações fabris.
Analisando esse novo quadro, Fernandes considerou que “essas indústrias,
estruturadas já num momento de integração do mercado consumidor em nível
nacional e de novos desenvolvimentos dos transportes e comunicações, além de
novas necessidades da própria produção...apresentam também novas
características de localização, articulando outros espaços a essa lógica produtiva,
espaços que vão muito além da simples continuidade física. Aliás, é nesse processo
que a região metropolitana de São Paulo se constitui de fato” (Fernandes in E&D,
n° 17, 1986, 71).
Um fator fundamental para a nova espacialização metropolitana foi a instalação
da indústria automobilística no quadrante sudeste da cidade e em municípios
vizinhos dessa região, São Caetano do Sul, Santo André e São Bernardo. Em 31
de janeiro de 1956, o presidente Juscelino Kubstchek instituiu o Grupo Executivo
da Indústria Automobilística-GEIA, órgão que precedeu o funcionamento das
montadoras e autorizou a entrada no mercado brasileiro das mesmas. Durante
mais de uma década e meia a totalidade dessas indústrias esteve sediada em
São Paulo (com exceção da Fábrica Nacional de Motores, no Rio de Janeiro),
expandindo suas unidades do ABC para o Vale do Paraíba. Com isso, todo o
parque industrial de setores co-ligados às montadoras localizaram-se nas
proximidades dessas concentrações ou num raio próximo da metrópole.
Nesse período, a importância da infra-estrutura rodoviária, que veio se somar às
ferrovias, manifestou-se como determinante para as novas localizações industriais.
Langenbuch mencionou esse fator de atratividade relacionando-o à posição
que os municípios do ABC tinham em relação à ferrovia e a situação intermediária
que essas cidades tinham entre a metrópole e o porto de Santos (Langenbuch,
1971, 215).
Mais uma vez, o terminal marítimo desempenhou um papel estratégico, pois as
indústrias automobilísticas receberam maquinaria pesada do exterior e mesmo a
montagem dos veículos dependia da importação, dado o baixo índice de
nacionalização das peças no início de funcionamento do setor. Completando
esse quadro, algumas indústrias puderam aproveitar instalações de grande porte
já existentes, enquanto outras construíram novas plantas industriais que
arquitetonicamente procuraram traduzir a pujança da empresa (idem, 1971,
215).
155
O
QUADRO URBANO A PARTIR DE
1930:
ÁREA CONSOLIDADA E FORMAÇÃO METROPOLITANA
O mesmo estudo mostra que, nesse período, a importância da ferrovia já não se
equiparava à rodovia, uma vez que o transporte pesado passou a se dar pelas
estradas, fator que reforçou ainda mais a sua atratividade. Também com relação
ao transporte de passageiros, o transporte ferroviário passou a apresentar uma
crescente incapacidade de atender a demanda, o que também provocou a
expansão do modo de transporte baseado nos ônibus (ibidem, 190,215).
Sobre as transformações que as rodovias provocaram na cidade e seus limites
com municípios vizinhos, foi observado que:
A Via Dutra intensificou a ocupação residencial e industrial ao leste, incluindo a
porção sul de Guarulhos e de parte da zona leste paulistana próxima ao Tietê.
Isso foi importante porque, anteriormente, o acesso a essa região se dava
exclusivamente pela avenida Celso Garcia, que segundo Langenbuch, era há
duas décadas a avenida mais congestionada da cidade (op. cit, 206).
Por sua vez, a via Anchieta intensificou fortemente o crescimento urbano de São
Bernardo do Campo, em diferentes setores onde predominaram as ocupações
habitacionais e em outros, as industriais. Apesar da importância da indústria
automobilística, outros ramos também se localizaram nessa área, somando-se
àquele do setor moveleiro, que caracterizou o período da industrialização baseada
nos setores tradicionais (op. cit, 209).
As condições topográficas e o fato da via férrea não ter induzido uma ocupação
mais intensa, nem habitacional nem industrial, fez com que no setor noroeste a
Via Anhanguera não ocupasse o mesmo papel desempenhado pelas duas
rodovias anteriores, permanecendo aquele território, no período que antecede a
década de 1960, caracterizado por uma ocupação agroindustrial ligada às
indústrias de Perus e Caieras (op. cit, 212).
As demais rodovias mencionadas, Raposo Tavares, Régis Bittencourt e Fernão
Dias aproveitaram parcialmente o traçado de caminhos pré-existentes e
desempenharam pouca influência na área mais próxima à cidade, constituindo
uma ligação com setores industriais mais distantes ou com áreas de lazer e
habitacionais fora de São Paulo (op. cit, 214).
Diversamente do período em que a cidade se estruturou compactamente, o
espraiamento urbano ficou evidenciado como uma das características principais
das décadas de 1940 e 1950, como os estudos de Petrone (1958) e Langenbuch
(1971) mostraram, direcionado pelas transformações na estrutura de circulação
e estabelecendo o padrão de expansão horizontal e autoconstrução periféricas
que persistiu nas décadas seguintes.
O item “Aspectos Históricos do Desenvolvimento” que inclui a análise “Fatores
Governamentais no Desenvolvimento”, constante no Plano Urbanístico Básico-
156
PUB, de 1968, abordou com precisão esses fatores presentes no período
analisado:
“Com a II Guerra Mundial, face às dificuldades de obtenção de produtos
importados e à demanda insatisfeita, o desenvolvimento industrial passou a ser
uma necessidade. São Paulo, embora com um mercado e um parque industrial
incipientes, reunia as melhores condições de localização para se beneficiar dos
estímulos industriais criados. Na década de 50, com a política desenvolvimentista
e a implantação da indústria automobilística, o processo de industrialização ganhou
novo impulso. Nesse período, as dimensões do parque industrial já eram de tal
ordem que os grandes incentivos federais criados para estimular a industrialização
de outras regiões do País não alteraram o processo de desenvolvimento da
Metrópole” (PUB, 1968, 42).
Na seqüência, esse documento relacionou também a importância das ações do
governo federal no tocante à construção de rodovias, a partir de 1950,
ressalvando que embora tenha havido a responsabilidade do governo estadual
na construção da maioria delas, as rodovias federais Presidente Dutra, Fernão
Dias e Regis Bittencourt, ampliaram a rede viária do Estado de São Paulo,
particularmente suas ligações com os estados vizinhos (idem, 42).
Fig. 70: Densidade demográfica,
1950.
157
O
QUADRO URBANO A PARTIR DE
1930:
ÁREA CONSOLIDADA E FORMAÇÃO METROPOLITANA
2.4. L2.4. L
2.4. L2.4. L
2.4. L
egislação: as setorizações consagradas através da normatização urbanísticaegislação: as setorizações consagradas através da normatização urbanística
egislação: as setorizações consagradas através da normatização urbanísticaegislação: as setorizações consagradas através da normatização urbanística
egislação: as setorizações consagradas através da normatização urbanística
A evolução da legislação corresponde ao período em que o Código Arthur
Saboya foi promulgado e permaneceu em vigor, incorporando alterações
referentes à demarcação dos bairros de alta renda, ao estabelecimento de
coeficientes de aproveitamento na área central e aos critérios para classificação
de atividades incômodas:
Em 1934 houve a incorporação do artigo 40 ao Ato 127 do Código Arthur
Saboya. Esse artigo demarcou a área do Jardim América, perdurando até 1954,
representando a preservação do uso residencial ao bairro em formação. A lei
3571, promulgada em 1937, ampliou a aplicação do Ato 40, que da sua
incidência em áreas, como os Jardins, passou a ser aplicável também a vias
públicas consideradas estritamente residenciais. A questão envolvendo essa lei
foi a de preservação dos valores imobiliários, em função das modificações que
já estavam ocorrendo nos bairros de alta renda, sendo necessária a definição de
locais para a construção de edifícios ou outros usos. Na década de 1950, essa
lei sofreu modificações para permitir a construção de edifícios de serviços na
avenida Paulista e nas outras vias onde a lei também incidia, permissão para
comércios locais, como floriculturas e salão de beleza, além de museus e agências
bancárias, segundo Feldman. De acordo com essa autora, esse conjunto de
alterações introduzidas na legislação demonstra a presença de interesses existentes
em cada parte da cidade, integrando o processo de construção do zoneamento,
que se tornou sistemático a partir de 1947 (Feldman, 1994, 97,99).
A demarcação dos bairros da Cia City ocorreu entre 1954 e 1957, seguindo os
moldes do zoneamento de parcelas da cidade ocupadas pela elite. Dessa forma,
em 1954 aos bairros Jardim Paulistano, Jardim Europa, Vila Nova Conceição,
Vila Paulista e Vila Primavera, foi aplicado o artigo 40 e, em 1957 ao Alto da
Lapa e à avenida Morumbi. Em 1955, ocorreu a demarcação dos bairros do
Pacaembú e Pacaembuzinho, através da Lei 4.792 (idem, 102,103, 105).
Alterações no zoneamento dos bairros-jardim foram propostas pela própria Cia.
City, ainda em 1948, para dotar o Pacaembú de área de serviços. Para tal
finalidade, a partir de prescrições da própria empresa, foi definido o coeficiente
igual a 2 para abrigar o centro comercial, que após divergências de ordem legal
com a Prefeitura, foi previsto em lei de 1951 (ibidem, 107).
Souza abordou esse assunto considerando ser uma característica desse período,
a adoção de normas para áreas e ruas com padrão dos bairros-jardim,
incorporando-se medidas na legislação urbanística para preservação do valor
dos imóveis e da presença de usos incômodos na vizinhança (Souza, 1994,
222). Além dessas leis, outras se destacaram por tratar dos usos incômodos e
dos coeficientes de aproveitamento:
158
Lei 4805/55 – Lei dos Ruídos:
Definição de zonas estritamente residenciais, predominantemente residenciais,
mistas e fabris. Os seus perímetros foram delimitados em 1958, consolidando a
situação existente no Bom Retiro e Jaguaré, no tocante às indústrias, e os bairros
de alta renda, no tocante à habitação. O restante da cidade foi considerada
zona mista (idem, 223).
A espacialização resultante da demarcação das zonas industriais, que evitou
sua implantação nas áreas estritamente residenciais no vetor sudoeste,
obedeceu ao que já existia na cidade, ou seja, as áreas industriais dispostas
ao longo dos eixos ferroviários e rodoviários e seus espaços vizinhos, tais
como várzeas e áreas sub-ocupadas. Da análise dessa norma, se depreende
que não houve intenção de alterar a estrutura existente, a não ser em dois
casos, representados pelas áreas ao norte e nordeste da áreas central - Bom
Retiro, Pari e Brás, que apesar de sua vocação fabril tradicional, foram
consideradas mistas visando a expansão das atividades centrais de comércio
e serviços para as mesmas (Osello, 1983, 224).
Essa delimitação consagrou as áreas industriais existentes, como foi visto, mas
proporcionou também uma importante caracterização funcional do conjunto de
bairros analisados neste trabalho – Bom Retiro, Luz, Pari, Canindé e Brás – já
que nas décadas seguintes, a proporção entre estabelecimentos industriais e
comerciais tornou-se favorável a estes últimos, configurando assim a nova vocação
desses espaços: bairros residenciais pouco verticalizados, com presença de
atividades comerciais, setores de indústrias leves (não incômodas, como prescrevia
essa lei para as zonas mistas) e serviços locais.
Lei 5261/57 – Lei dos Coeficientes de Aproveitamento
Essa lei foi decorrente da proposta de Anhaia Melo visando o controle da
verticalização e da densidade. Estabeleceu um coeficiente de aproveitamento 4
para construções com finalidades habitacionais e 6 para comerciais. Foi fixada
ainda densidade líquida máxima de 600 habitantes por edifício residencial através
de cota de 35 m² de área mínima para cada habitação (Feldman, 1996, 110).
Segundo estudo da Secretaria Municipal de Planejamento, a verticalização no
período de 1940 a 1957 apresentava as seguintes características:
- A média dos coeficientes de aproveitamento no Centro variava de 8 a 10,
sendo ultrapassado em alguns casos, como por exemplo no Edifício Martinelli,
construído em fins da década de 1920 .
- Nesse período, 71% ainda estavam localizados próximos ao Centro, mas apenas
25% destinados ao uso comercial e passando a ter metade de seu número
159
O
QUADRO URBANO A PARTIR DE
1930:
ÁREA CONSOLIDADA E FORMAÇÃO METROPOLITANA
pertencentes a unidades de aluguel, contra 79% do período anterior da
verticalização, que apresentava predominância central e para aluguel.
- Apesar da definição dos coeficientes para a área central, a partir da lei de
1957, fora dela a legislação permitia até 25 andares, através da fixação de um
gabarito de 80 metros, não representando restrição à construção vertical, visto
as limitações construtivas da época (Sempla, 1990, 110).
Posteriormente à promulgação dessa lei, o mercado imobiliário adotou uma
estratégia para burlar as limitações impostas, através da construção de edifícios
comerciais com coeficiente 6, para transformá-los em residenciais, após o “habite-
se”. As prescrições sobre densidade e cota mínima de terreno por unidade,
elevaram a área mínima de apartamento para 210 m², fator que colaborou
para a expansão da verticalização para o vetor sudoeste, uma vez que ali se
encontravam as condições necessárias de base fundiária e renda (idem, 110).
Esse processo de crescimento vertical no quadrante sudoeste, já estudado nos
trabalhos, de Souza (1994), Someck (1987 e 1997), Villaça, (1998), Rolnick
(1997), caracterizou com maior intensidade a expansão imobiliária diferenciada
da cidade a partir de então, e com ela, os requisitos para sua continuidade,
podendo ser identificadas as seguintes decorrências:
- aos elementos da infra-estrutura, já delineados desde o Plano de Avenidas,
juntaram-se novas remodelações viárias nas décadas subseqüentes à de 1950,
objetivando atender o crescimento dos deslocamentos por automóveis.
- juntamente com a consolidação dos bairros da alta renda, através da legislação
urbanística promulgada especificamente para os mesmos, o setor de serviços
também se transformou, adequando a demanda antes existente apenas na área
central, para novas espacializações do terciário. Como para a sua relocação
necessitou ocupar áreas que anteriormente não eram destinadas a essas
atividades, a remodelação espacial do setor sudoeste passou a se constituir um
ciclo contínuo que reforçou a necessidade de mais ampliações do viário em
conseqüência do processo de verticalização como será visto adiante. A rua da
Consolação, na década de 1960 e a avenida Paulista, no início da década de
1970, são exemplos dessas transformações, irradiando também a ocupação
para espaços próximos.
- esse conjunto de fatores que passou a influir decisivamente na expansão das
atividades centrais para fora do perímetro central, contribuiu ao processo de
mudanças que o centro passou a apresentar a partir da década de 1960, onde
os espaços que associavam prestígio para as mais amplas atividades do setor de
serviços (consultórios, escritórios, bancos, comércio de luxo, etc), deixaram aquela
região para se instalar junto à nova centralidade terciária, a avenida Paulista.
160
161
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
C
APÍTULO
3:
A
S TRANSFORMAÇÕES DO
PERÍODO
1960-1980
162
163
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
3. As transformações do período 1960-19803. As transformações do período 1960-1980
3. As transformações do período 1960-19803. As transformações do período 1960-1980
3. As transformações do período 1960-1980
A cidade, nesse período, seguiu as tendências delineadas a partir da segunda
metade da década de 1940, mas com intensidade bastante superior em relação
ao processo de metropolização e adensamento central. Essa dinâmica
correspondeu ao processo de acelerada urbanização que o país apresentou no
pós-guerra e em relação ao mesmo, Souza mostrou que a população urbana
brasileira quase triplicou entre 1940 e 1950, tendo esse processo apresentado
duas características principais:
- o aprofundamento das diferenças inter e intra-regionais
- a polarização de mão-de-obra exercido pelos centros mais dinâmicos (Souza,
apud Déak, Schiffer, orgs., 199, 126).
Um conjunto de fatores econômicos, de âmbito nacional e regional, concorreu
para que a industrialização em curso desde o pós-guerra confluísse
majoritariamente para a região metropolitana de São Paulo, tornando-a o pólo
mais dinâmico da economia brasileira e em conseqüência, um forte indutor das
migrações para a cidade de São Paulo e municípios vizinhos, como é possível
observar pelos dados a seguir
1
.
A partir das informações do quadro 8, pode-se relacionar o acentuado
crescimento populacional com pressões, ainda maiores que as ocorridas nas
décadas passadas, à capacidade das redes de infra-estrutura, transformando o
saneamento, transportes e habitação em problemas que assumiram uma escala
tal que, a partir da metade da década de 1960, a participação dos agentes
financeiros para a construção da casa popular e de programas de saneamento
para as periferias urbanas, extremamente precárias, foi estruturada a partir do
nível federal, como alternativa à demanda expandida pelo intenso processo de
urbanização que o país apresentou nesses anos.
Ano População
Crescimento
decenal
Saldo Vegetaivo
decenal
Saldo migratório
Taxa de
cresc.anual (%)
1950 2.198.096 871.835 242.810 629.025 5,18
1960 3.666.701 1.468.605 667.459 801.146 5,25
1970 5.924.615 2.257.914 972.571 1.285.343 3,92
1980 8.493.226 2.568.611 1.424.665 1.143.946 3,67
Quadro 8
Município de São Paulo - Evolução da População
(Fonte: FIBGE/Sempla)
164
Essa nova etapa da urbanização se associou a duas características da
industrialização nesse período: a grande diversificação do parque fabril, e o
início de sua descentralização.
Esse modelo de industrialização teve como marco inicial o Plano de Metas de
1956, que priorizou a indústria pesada de produção de bens, continuando na
década de 1960 a expansão industrial até o seu auge, caracterizado pelos anos
do “milagre econômico”, a partir de 1968 até os primeiros anos da década
seguinte. Com a crise que marcou esse modelo econômico a partir de 1974,
tanto o município de São Paulo, quanto a Região Metropolitana apresentaram
uma desaceleração do ritmo industrial, desenhando-se a partir daí a
desconcentração espacial do setor, que ganhou impulso na década de 1980
(Emplasa, 1994, 35).
Deve-se acrescentar ainda à essa dinâmica a incidência da legislação estadual,
a partir de 1978 e também federal
2
, que em conjunto redefiniram a localização
industrial, impondo limites à sua expansão na cidade e transferência para espaços
regionais próximos a ela.
Esse processo, que se fez notar com maior nitidez na década de 1980, não
impediu nem diminuiu a expansão periférica que por fim estabeleceu a
conurbação da cidade com os municípios vizinhos da Região Metropolitana
(criada institucionalmente em 1973). A área urbanizada do Município de São
Paulo em 1962 era de 624,5 Km², saltou para 700 Km² na década de 1970 e
848 Km² em 1985, representando mais de três vezes a área ocupada do início
da década de 1950, que era de 267,5 Km² (Emplasa/Sempla).
Conjuntamente ao processo de expansão da área urbanizada através do
parcelamento dos espaços periféricos, sem os requisitos mínimos de infra-estrutura,
equipamentos e serviços, o crescimento do setor terciário estruturou-se com bases
na nova etapa da economia brasileira, principalmente nas cidades região Sul-
Sudeste. A explicação estrutural para tanto recai sobre a perda que o setor
secundário já apresentava na década de 1970, sendo considerado o setor de
serviços, construção civil incluída, “um regulador de absorção de mão-de-obra
urbana” (Souza, 1999, 128 apud Deák, Schiffer, orgs)
Nessa dinâmica estiveram presentes a ampliação do mercado de consumo para
a classe média e sua inclusão em programas de financiamento de bens, antes
inacessíveis para um grande número de famílias dessa classe social, como por
exemplo automóveis, eletrodomésticos, televisores e principalmente a casa própria.
Dessa forma, diversos agentes, inclusive governamentais, fizeram parte da
mediação entre a produção e consumo, ampliando e diversificando a cadeia de
atividades urbanas. Sinteticamente, nesse novo quadro, os seguintes aspectos
pode ser identificados:
165
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
- a diversificação industrial, que gerou serviços especializados voltados à produção
em massa.
- a expansão dos serviços vinculados às ocupações de alta qualificação
(ampliando o mercado “white collar).
- a crescente condição de metrópole nacional, que centralizou serviços
especializados.
- os ajustes produtivos, tecnológicos e de gestão, promovidos a partir de 1980
na indústria, que incorporou novas atividades decorrentes da terceirização
(Emplasa, 1994, 41).
Esses elementos mostram um processo qualitativamente diferente das etapas
anteriores, devido às alterações na cadeia produção–circulação–distribuição-
consumo, causadas pela maior presença do trabalho intelectual nesse circuito
(Santos, 1997, 3). À crescente gama de bens e mercadorias produzidas, verificou-
se uma intensificação da reformulação espacial do setor de comércio e serviços,
em curso desde a década de 1950, mas acelerada no período agora abordado.
Em São Paulo, esse processo induziu a transformações espaciais, como a que
ocorreu na avenida Paulista, que passou a concentrar as sedes administrativas
das grandes indústrias, empresas multinacionais e bancos, estando a verticalização
agora vinculada a utilização do automóvel, como indicam as análises de Someck,
1997; Villaça, 1998 e Souza, 1994. Um exemplo paradigmático da
transformação funcional e espacial da nova centralidade de São Paulo ocorreu
na avenida Paulista com a construção em 1955 do Conjunto Nacional, na
totalidade de uma quadra ocupada por uma mansão demolida, cujo projeto
havia sido de Victor Dubugras (Amadio, 1998, 40).
Segundo análise sobre as atividades urbanas ligadas ao setor terciário e
residencial, três fatores são decisivos para a viabilização da localização: o mercado
imobiliário, as empresas de incorporação e a ação das instituições financeiras
(Vargas, 2001, 86-283). Com relação ao mercado imobiliário, a necessidade
de estacionamentos para uma frota de automóveis em crescimento foi, por
exemplo, um ponto que influiu no deslocamento das atividades de serviços para
fora do Centro tradicional, na direção da avenida Paulista. No caso dos demais
agentes, a participação das políticas oficiais de estímulo à construção civil,
caracterizada a partir da década de 1960 e mais fortemente através dos planos
e programas pós-1964, tiveram papel decisivo para as novas configurações
espaciais ocorrerem (Souza, 1994, 83) .
A identificação desses fatores estaria incompleta se não fosse também considerado
o papel que a legislação urbanística desempenhou, juntamente aos interesses
do mercado imobiliário, no aumento dos coeficientes de aproveitamento que
possibilitou a verticalização desses novos espaços de serviços da cidade. Nesse
166
Fig. 71 (ao alto): Conjunto Nacional em obras.
Fig.72 (acima): Condomínio Conjunto Nacional, década de 1960.
167
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
sentido, a Lei dos Coeficientes de Aproveitamento (Lei n° 5261), instituída em
1954, sofreu modificações em 1961 e 1964, quando foi adotado o coeficiente
6 para todo tipo de construção (Rolnick, 1997, 199), fator preponderante para
a viabilização da verticalização da avenida Paulista.
Um estudo do IBGE sobre a “Região da Capital Paulista” contido no “Guia do
Estado de São Paulo” de 1962, aborda esse processo ressaltando as novas
construções do Centro e regiões vizinhas, registradas como forma de enfatizar o
contraste morfológico entre o núcleo central, intensamente verticalizado e as
áreas periféricas e bairros residenciais, com predominância de casas térreas e
sobrados: É bem verdade que, numa análise mais pormenorizada da paisagem urbana,
verificaremos a crescente construção de edifícios de apartamentos residenciais ao longo das
radiais e em algumas áreas periféricas (Vila Buarque, Santa Ifigênia, Bela Vista, ou bairros
como Santa Cecília, Higienópolis ou avenida Paulista) tende a tornar menos acentuado o
contraste, no que se refere ao tipo de construções” (IBGE, 1962, 65).
Nessa etapa a utilização do automóvel como meio de deslocamento da classe
média foi consagrada, já que a frota de veículos cresceu permanentemente ao
longo da década de 1960 e das seguintes, resultando na necessidade de contínuos
investimentos em obras viárias. Apesar da crise dos transportes públicos, as
ampliações de avenidas, construção de viadutos e ênfase nas obras de grande
vulto, marcaram a fase mais aguda do “milagre econômico”, onde a abertura de
espaços na malha viária para a indústria automobilística se tornou uma necessidade
urbanística que exigiu investimentos públicos para a expansão econômica do setor
privado, estratégia financiada por vultuosos empréstimos do exterior
3
.
Fig. 73: Pátio da
Volkswagem do Brasil,
década de 1960.
168
De toda forma, a distinção entre as áreas da cidade foi fortalecida pela caracterização de
dois setores que corresponderam:
- Àqueles vinculados ao terciário avançado, onde a tecnologia de ponta se caracterizou
como componente principal (os edifícios sofisticados, os serviços vinculados ao mercado
financeiro, imobiliário e corporativo, o crescimento das comunicações e processamento
computacional), que ampliou o seu desdobramento funcional e tipológico para o quadrante
sudoeste.
- Àqueles vinculados ao comércio e serviços tradicionais, cuja característica continuou
sendo a do emprego de mão-de-obra sem maior especialização técnica e a adaptação
física de instalações dos bairros tradicionais, processo verificado no Brás, no Pari e no Bom
Retiro.
O quadro mostrado a seguir, que demonstra a dinâmica populacional da cidade nas duas
décadas a partir de 1960, revela a tendência de esvaziamento dos distritos do centro
histórico, todos com taxas negativas de crescimento de 1960 a 1970, e apenas o Cambucí,
Santa Ifigênia, Mooca, Barra Funda e Sé apresentando pequeno crescimento entre 1970
e 1980. É necessário ressaltar que nessa última década a linha Norte-Sul do Metrô já havia
sido concluída, não representando incentivo ao adensamento no entorno das estações
situadas nos bairros da Luz e Ponte Pequena, ambos pertencentes ao distrito Bom Retiro.
Por outro lado, todos os outros distritos da cidade apresentaram crescimento, alguns com
valores muito elevados, comprovando a direção à localizações mais periféricas, como é
possível inferir para o caso de Santo Amaro, Socorro, Vila Prudente, São Miguel Paulista,
Tucuruvi e Pirituba.
No chamado centro expandido, os maiores crescimentos se registraram entre 1970-1980
nos distritos de Santa Cecília, Cerqueira Cézar
5
, Vila Mariana, Liberdade, Indianópolis e
Perdizes. Nesses locais, o crescimento moderado, mas constante, certamente se relacionou
com a verticalização dos bairros, que ocorreu e se disseminou em todos os distritos, mas
com pontos de concentração em Higienópolis e Vila Buarque (distrito Santa Cecília), Paraíso
(distrito Vila Mariana), Liberdade, Moema (distrito Indianópolis), região próxima à avenida
Paulista e Pinheiros (distrito Cerqueira César) e Perdizes.
Nesse sentido, considerando o trabalho de Someck sobre o processo de verticalização da
cidade, o crescimento populacional esteve relacionado aos períodos que a autora classificou
como verticalização induzida pelo uso do automóvel (1957-1967), da verticalização
resultante do período do “milagre econômico”, que contou com a participação do BNH
na promoção do desenvolvimento imobiliário (1967-1972) e da verticalização pós-
zoneamento, que atravessou um período de desaceleração com o fim do “milagre”, mas
definiu os setores de maior incidência de construção de edifícios (Someck, 1997,24).
169
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
170
3. 1 As propostas de infra-3. 1 As propostas de infra-
3. 1 As propostas de infra-3. 1 As propostas de infra-
3. 1 As propostas de infra-
estrutura e zoneamento do PUB e PDDIestrutura e zoneamento do PUB e PDDI
estrutura e zoneamento do PUB e PDDIestrutura e zoneamento do PUB e PDDI
estrutura e zoneamento do PUB e PDDI
A exemplo do ocorrido nos períodos anteriores, a participação do planejamento
na cidade foi caracterizada pela produção de trabalhos técnicos que, embora
tenham realizado análises aprofundadas sobre a complexidade e contradições
da estruturação urbana, tiveram pouca influência para transformar o quadro
apontado. Em face disso, duas direções podem ser consideradas:
- As semelhanças entre o afirmado e os dois planos, Urbanístico Básico - PUB
(1968) e Diretor de Desenvolvimento Integrado - PDDI (1971), são observadas
no que se referiu às diretrizes que esses trabalhos propuseram e que não foram
concretizadas: extensas malhas viária e metroviária, resultando em nova
estruturação urbana; novas áreas de expansão das atividades terciárias e
institucionais ao norte da centralidade, sub-centros regionais estimulando a
desconcentração existente, etc..
- As diferenças que ocorreram por causa da consolidação da Lei de Zoneamento,
decorrente do PDDI e da implantação do Metrô, em 1974, cujos estudos foram
iniciados no período do PUB e constavam em suas propostas. Pelo fato desses
aspectos terem se consolidado, pode-se considerar que, desde o Código Arthur
Saboya e o Plano de Avenidas, cujas obras foram efetivamente concluídas na
década de 1960, o mesmo não havia ocorrido com outras propostas de
planejamento urbano voltadas a dotar a cidade de infra-estrutura e normas de
parcelamento e edificação, descontada a legislação promulgada na década de
1950, como foi visto anteriormente.
Embora o PUB tenha sido um extenso trabalho de planejamento, muito mais
aprofundado do que as propostas anteriores datadas da década de 1950, alguns
elementos o ligam aos conceitos anteriormente propugnados. Nesse sentido,
segundo Feldman, a característica de se constituir em um plano abrangente de
todos os aspectos da vida urbana e de compreender a Região Metropolitana, fez
com que o PUB
4
se constituísse no modelo de plano defendido há quase quatro
décadas por Anhaia Melo (Feldman, 1996, 146).
No diagnóstico-síntese, o Plano relacionou os problemas decorrentes da falta
de controle do uso do solo, além do atendimento precário dos serviços urbanos
e transportes. Em relação a esses últimos temas, foi descrito que em 1968, 45%
da população não dispunha de abastecimento de água, 63 % não era servida
por rede de esgoto e 10% não dispunha de coleta de lixo, sendo ainda muito
deficiente o sistema de pavimentação e de iluminação pública (apenas 40% das
ruas oficiais eram pavimentadas e só 24% das mesmas dispunham de iluminação).
Um dos motivos da excessiva concentração da cidade, segundo essas análises,
se encontrava na grande deficiência dos serviços urbanos, que no caso do
transporte público incluía as extensas jornadas diárias para o deslocamento da
população (PUB, 1968, 13).
171
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
Em relação ao uso do solo, o Plano descreveu a cidade apresentando uso
comercial tanto na área central, como nos subcentros regionais de Santana,
Lapa, Pinheiros, Santo Amaro, Brás e Penha, alem dos eixos seguindo as vias de
transporte. A área central se prolongava nas avenidas São João, Rangel Pestana,
Consolação, Brigadeiro Luís Antônio e Liberdade. O uso industrial, por sua vez,
desenvolvia-se ao longo das ferrovias e das rodovias Dutra e Anchieta,
destacando-se as concentrações da região Brás-Moóca, Vila Leopoldina, Jaguaré
e Jurubatuba.
No tocante ao uso residencial, que atingia 75% da área de ocupação urbana, o
Plano descreveu a sua distribuição como sendo a de uma área de grande
densidade em torno do eixo centro principal e dos eixos comerciais, zonas de
residências de padrão elevado na região oeste, no Vale do rio Pinheiros e as
zonas residenciais populares, que embora se distribuíssem no restante da área
da cidade, predominavam na periferia aquelas de mais baixo padrão. O PUB
considerou que essa distribuição evidenciava certa segregação, “embora não
muito nítida (idem, 12).
A falta de controle do uso do solo foi considerada como causadora de uma
grande mistura na sua distribuição, provocando inconvenientes devido aos usos
incompatíveis. Nesse caso, diferentemente das propostas anteriores de
zoneamento, que fixavam coeficientes de aproveitamento para cada zona de
uso definida, o PUB estabeleceu uma variação mais complexa dentro de cada
zona, vinculada ao tamanho da parcela do solo, sendo admitida, além da mistura
de usos e tipologias, o uso residencial em todas as zonas. Para a proposta de
zoneamento foram definidas 13 categorias de uso e 10 zonas (Feldman, 1994,
146).
A maior flexibilização construtiva e funcional, até na mesma construção, implicava
em controles mais rígidos de parâmetros urbanísticos na ocupação dos lotes,
para os seus recuos, gabaritos, áreas livres e áreas arborizadas. Por outro lado,
foram propostos índices de aproveitamento superiores aos praticados até então:
7 para usos residenciais e serviços e 10 para garagens verticais, se estas últimas
fossem construídas praticamente isoladas no lote, dado os recuos exigidos (idem,
147,148)
As propostas de construção de um novo sistema viário e de transportes
direcionaram-se a:
- Expansão do sistema de transportes de passageiros por trilhos (Metrô), de
66km para 450 km, utilizando 185 Km das faixas de domínio das ferrovias de
modo a atender 40% dos passageiros que utilizavam transportes coletivos. Esse
sistema deveria estabelecer ligações entre sub-centros regionais propostos e deles
com o Centro.
172
- Construção de sistema de vias expressas com 388 Km no interior do Município
de São Paulo (815 Km contando com a Região Metropolitana). Esse sistema
previa ainda a adoção de controle de fluxo e deveria atender 55% do tráfego
total, ocupando 5% da área urbana (ibidem, 29).
Para o Centro metropolitano, considerado do rio Tietê à avenida Paulista, o
Plano destacou a necessidade da regulamentação pormenorizada do uso do
solo, além do detalhamento das linhas e estações do Metrô e da circulação dos
ônibus e pedestres, incluindo a localização de estacionamentos e de terminais.
Ao norte da área central estava prevista a localização do Centro Administrativo
Municipal, nas proximidades do rio Tietê, no bairro da Ponte Pequena.
Para as áreas de alta e média densidades, entre os rios Tietê e Pinheiros, o Plano
previa transformações decorrentes da construção do Metrô e do sistema viário,
sendo necessário também, um planejamento em conjunto com aquele da área
central. Essa área incluía os principais corredores de atividades múltiplas, sendo
aquele julgado mais importante, o do espigão divisor de águas entre os rios e
onde estava situada a avenida Paulista. Para ele, o Plano propunha uma
regulamentação especial a ser desenvolvida, com ênfase em seus aspectos
paisagísticos.
No vale do rio Tietê, a também necessária proteção paisagística e do
prosseguimento das obras de retificação da sua calha, associaram um plano de
uso do solo voltado à sub-utilização das áreas, à relevância de sua posição
central e aos equipamentos propostos.
Um aspecto já proposto pela SAGMACS era o do planejamento distrital como
complementar às escalas metropolitana e municipal, que seguindo o proposto
pelo Plano, se estenderia também “ao nível das unidades de vida em que a
cidade pode ser decomposta. A subdivisão regional já existente serviria de limites
ao planejamento detalhado de cada área (fora da delimitação daquelas de alta
e média densidades já mencionadas), para as quais foi recomendada também a
criação de conselhos de representantes sob a presidência do administrador
regional
5
. O planejamento distrital deveria desenvolver a regulamentação do
solo, a localização de equipamentos sociais e do traçado do sistema viário arterial
e local e o conselho de representantes teria a finalidade de assessoramento dos
planos distritais, que seriam realizados por um proposto Escritório Municipal de
Planejamento (op. cit, pag 128, 129).
Como se depreende pelo exposto, o PUB considerou como essencial a existência
do planejamento urbano a longo prazo e propôs uma minuta de projeto de lei
do Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado. Assim como a proposta de
Plano Diretor de 1961 associou os estudos da SAGMACS (incorporadas também
pelo PUB no que se referiu às unidades territoriais), o Plano Diretor de
173
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
Desenvolvimento Integrado se constituiu na formalização do PUB em lei (Sócrates,
1993, 261).
Assim sendo, em 1971 o PDDI foi instituído e incorporou as diretrizes do PUB,
dando continuidade à proposta do sistema de vias expressas, uso do solo, controle
da poluição ambiental, circulação, transportes e incentivos ao desenvolvimento
urbano, assumindo uma associação de plano viário com zoneamento,como
modelo de plano, segundo as análises de Feldman e Yoshioka (Felman, 1994,
153; Yoshioka apud Sócrates, 1993, 18).
Entretanto, o PDDI não foi uma simples continuação do Plano anterior, pois em
seu desenvolvimento constaram aspectos diferenciados do ponto de vista
conceitual e concretos, afastando-se do PUB em relação ao seu elemento mais
importante, a estruturação urbana a partir dos elementos de infra-estrutura viária
e de transportes, apesar de a princípio admiti-los.
Essencialmente o PDDI utilizou uma hierarquização do sistema viário, articulando
uma complementaridade entre as zonas, equipamentos e serviços, áreas verdes,
etc. Partiu, portanto, da proposta de divisão da cidade em módulos com cerca
de 9 Km² que se constituiriam em unidades com certa auto-suficiência no tocante
à moradia, trabalho, cultura, lazer e atividades administrativas. Segundo os seus
defensores, esses bolsões ou zonas não se caracterizariam apenas por uma
consolidação das situações urbanas existentes, no interior de cada uma, mas
nas mesmas seria aplicada uma normatização e uma disciplina de uso do solo
de modo a tornar a cidade mais organizada, eficiente e humana (Feldman,
1994, 163; Sócrates, 1993, 276).
Entretanto, como mostram as análises sobre o PDDI, este se fundamentou na
malha viária proposta para romper a estrutura radio-concêntrica da cidade,
com a diferença de que a mesma poderia ser implantada ao longo do tempo,
pois as áreas de seu percurso encontrar-se-iam preservadas pelas normas do
zoneamento. Por não serem imprescindíveis, as vias expressas poderiam ser
substituídas por arteriais, com a mesma disposição ortogonal e com funções
relativas à ligação metropolitana, estruturação urbana e expansão periférica.
(Sócrates, 1993, 277).
Considerando a delimitação deste trabalho de tese à análise dos aspectos
propositivos dos planos, relacionados à infra-estrutura e do uso do solo
(normatização do parcelamento e tipos de edificação), inúmeros autores e
trabalhos da Secretaria de Planejamento apontam os motivos do PDDI não ter
logrado concretizar os padrões de circulação e transportes propostos. À
semelhança do PUB, a elaboração e aprovação do Plano se deu em meio ao
clima de ufanismo do “milagre econômico”, desconsiderando os custos de
implantação da rede viária e descolado da prática imposta à cidade pelo mercado
imobiliário formal e informal
6
. Outro motivo, a crise de petróleo de 1974, se
174
constituiu em argumento para forte contestação (técnica, bem entendido) à
proposta da malha de vias expressas, gerando uma expectativa em relação ao
transporte público, que também não se efetivou (Osello, 1983; Sócrates, 1993;
Feldman, 1994).
Ainda em 1973, um documento da Secretaria Municipal de Transportes analisou
a baixa mobilidade da população, comparada à de outras cidades do mundo,
causada pela precariedade dos modos existentes, pela concentração de atividades
originadas da estrutura urbana e pelo subdimensionamento do sistema viário,
propondo para um horizonte de vinte anos, a reestruturação da circulação
baseada na integração de modos, desestímulo ao transporte individual e reserva
de faixas ao longo da malha viária, a fim de garantir as necessárias ampliações,
como é explicado pela citação a seguir:
Através dos conhecimentos que se dispõe e das experiências em outros países,
este sistema viário deve ser dimensionado de modo a exigir uma reserva de área
compatível com as características da cidade.
Outro elemento do novo sistema deverá ser o desestímulo ao transporte individual,
favorecendo o aparecimento de novos tipos de transporte rápido em massa, como
melhor alternativa para as viagens urbanas.
A importante atividade-meio, que é o transporte, deve ser desenvolvida sobre a
infra-estrutura de um sistema adequado de vias expressas e arteriais, de vias de
distribuição e locais, complementadas com um sistema de transporte coletivo
integrado. Por fim, harmonizando o transporte individual e o de carga com esses
sistemas, obteremos o equilíbrio que assegurará o perfeito desempenho desta
função urbana (SMT, 1973, s/paginação).
Para a obtenção dos objetivos expressos, a estrutura viária proposta seguiu aquela
desenvolvida pelo PUB, articulada com o plano do Pequeno Anel Rodoviário e
considerada complementar ao Metrô e ferrovias (idem, s/pag.)
Analisando os resultados concretos das propostas do PDDI para circulação e
transportes, um estudo da Secretaria Municipal de Planejamento considerou a
enorme redução de suas componentes, conforme expresso na citação a seguir,
reproduzida por se tratar de uma análise conclusiva sobre a questão:
As propostas técnicas de transporte urbano sobre trilhos e sobre pneus já haviam
se confrontado na década de 1930, tendo vencido o pneu com o Plano de Avenidas
de Prestes Maia. Na intensa atividade de planejamento, do final da década de
60, início da de 1970, as grandes alternativas se confrontavam novamente. O
PUB (1968) propunha uma extensa rede de Metrô de 650 Km como novo elemento
estruturador do transporte metropolitano; o Projeto DERMU, por sua vez,
preconizava uma rede composta de malha quadrada, de 4Km de lado, de vias
expressas, totalizando cerca de 400 Km de extensão. Desta vez, porém, não
houve vencedor nem vencido. Nenhuma das alternativas chegou a eliminar a
175
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
outra, senão que ambas foram reduzidas a tal ponto que, em conjunto,
reproduziram e mesmo aumentaram o nível de carência em infra-estrutura viária
e de transportes, após um período inicial de algum alívio e uma tímida
reestruturação da aglomeração metropolitana.
Essencialmente, o que foi implantado em 20 anos, desde 1970, é um embrião de
ambos os projetos. Do Metrô, uma “rede” mínima, com 45 Km, composta de
duas linhas em cruz; do sistema de vias expressas, apenas as Marginais do Tietê
e do Pinheiros e a Avenida 23 de Maio, se não considerarmos a Radial Leste e
avenida dos Bandeirantes” (Sempla, 1990, 154)
Fig. 74: Vias expressas e artérias - PUB
176
Se as propostas do PUB E PDDI relacionadas à estrutura urbana não foram
efetivadas da forma proposta pelos mesmos, o resultado do longo processo de
propostas urbanísticas foi a normatização de uso e ocupação do solo representada
pela Lei de Zoneamento da Cidade de São Paulo
7
. Segundo a análise de Feldman
em relação ao papel desempenhado pelo zoneamento, este passou a substituir o
plano urbanístico através da inclusão de um modelo de organização da cidade e
do atendimento de demandas dos espaços mais valorizados da cidade (idem, 8).
Convergindo também à tese da autonomia que zoneamento ganhou em relação
ao PDDI, outra análise mostra que apesar da predominância dos aspectos
normativos sobre todos os outros propostos pelo Plano Diretor, o zoneamento se
consolidou como o mais importante instrumento urbanístico já estabelecido para
a cidade, absorvendo os seguintes objetivos:
1. Assegurar a reserva e destinação dos espaços necessários ao desenvolvimento
das atividades urbanas em localizações adequadas.
2. Assegurar, através do controle do uso e ocupação do solo, a concentração
equilibrada de atividades e da população no território do município.
3. Orientar e estimular o desenvolvimento urbano (Sócrates, 1993, 105;
Zoneamento, 1978, 1).
Fig. 75: Hipótese de estrutura metropolitana, 1990
177
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
O zoneamento utilizou para a definição dos tipos de zonas em que a cidade foi
dividida, uma relação das categorias de uso com o sistema viário existente e a
malha viária proposta pelo PDDI, a hierarquização dessas vias, os vários tipos
de usos existentes, bem como sua ocupação, a infra-estrutura e equipamentos
sociais, taxas de ocupação, recuos, densidades, etc.. Processados por
computadores, os dados serviram para constituir um mapeamento de uso por
quadras, associado ao cadastro de rendas imobiliárias, onde o valor venal de
cada lote se encontrava fixado. Através desse cruzamento de informações sobre
a situação existente, o perímetro de cada zona foi fixado, obedecendo aos
parâmetros de predominância de uso, da densidade populacional e dos
coeficientes de aproveitamento também predominantes (Sócrates, op. cit, 112/
116).
É importante frisar a profundidade das pesquisas que embasaram a proposta de
zoneamento, pois as mesmas foram desenvolvidas utilizando informações
vinculadas à escala dos lotes, agregados em quadras
8
. Para cada quadra,
pesquisou-se a área bruta, área e porcentagem de ocupação, quantidade de
casas e prédios, alem das áreas vazias. Os usos da área construída foram
especificados em porcentagens para residências, edifícios, comércio, serviços,
indústria, equipamentos, etc. No tocante ao uso residencial, até mesmo a
quantidade e área de residências coletivas e cortiços foram detalhados (idem,
116).
Chegou-se assim a uma divisão da cidade em zonas com perímetros delimitados,
abrangendo todo o município, com o objetivo de estabelecer o equilíbrio entre
as funções urbanas de habitação, trabalho, circulação e lazer. A caracterização
dessas zonas obedeceu os seguintes critérios:
1. Manutenção das situações existentes de uso e ocupação do solo, estruturadas
ao longo do tempo.
2. Demarcação de faixas de alta e baixa densidades em função de diretrizes do
PDDI para as vias expressas, transportes coletivos, pólos e corredores de atividades.
3. Vinculação da localização de futuros pólos regionais ou expansão dos existentes
com a oferta de circulação e transportes, observando a disponibilidade de espaços
para as funções urbanas e tendências para o setor de comércio e serviços.
4. Delimitação das áreas industriais a partir das diretrizes e estudos setoriais do
PDDI.
5. Delimitação dos perímetros obedecendo a elementos físicos existentes, tais
como vias de circulação, espaços livres, cursos d’água, etc, como forma de
evitar a divisão de uma mesma quadra em zonas diferentes.
A primeira lei do zoneamento da cidade caracterizou oito tipos de zonas:
178
Z1 – uso estritamente residencial, com densidade demográfica baixa
Z2 – uso predominantemente residencial, com densidade demográfica baixa
Z3 – uso predominantemente residencial, com densidade demográfica média
Z4 – uso misto, com densidade demográfica média e alta
Z5 – uso misto, com densidade demográfica alta
Z6 – uso predominantemente industrial
Z7 – uso estritamente industrial
Z8 – usos especiais (Zoneamento, 1978, 4)
Para cada zona, as categorias de uso foram enquadradas em padrões de
conformidade e não conformidade, existindo ainda padrões de tolerância e de
adequação para os mesmos. Essas categorias encontravam-se concebidas em
linhas gerais já nos planos da década de 1950 e 1960. Até 1980 várias alterações
foram incorporadas ao zoneamento, criando zonas para corredores de uso
especial, zonas de proteção dos mananciais e zonas de transição entre as áreas
mistas e as estritamente residenciais. Nesta última alteração, foram criadas as
zonas 17 e 18, nas áreas junto às Z1, a fim de definir uma gradação de uso e
intensidade de ocupação do solo, mas que na realidade proporcionou uma
nova oportunidade para a verticalização do entorno das áreas residenciais de
alto padrão.
Além das normas voltadas à ocupação das áreas consolidadas, o zoneamento
dispôs também sobre o parcelamento de zonas consideradas de expansão urbana,
definindo uma série de exigências à abertura e aprovação de loteamentos.
A vinculação do parcelamento do solo com a Lei de Zoneamento foi um dos
aspectos de diferenciação do PDDI com os planos. Entretanto, o maior rigor da
legislação e sua vinculação a uma proposta de estrutura urbana polinucleada e
com menor intensidade de crescimento centrífugo, concepções já presentes na
SAGMACS e no PUB, não impediu a continuidade do parcelamento indiscriminado
das áreas periféricas da cidade.
Outro ponto do PDDI em relação à aglomeração urbana que merece destaque,
foi a redução do coeficiente de aproveitamento 6 para 4, e a não inclusão como
área construída dos espaços sob pilotis e garagens de edifícios desde que não
excedessem duas vezes a área do lote . O rebaixamento do coeficiente não
impedia, entretanto, a construção dos edifícios cuja licença se encontrava em
andamento, sujeitando-os aos critérios anteriores dessa legislação (Feldman,
1994, 154; Souza, 1994, 234; Sócrates, 1993, 129). Ao não incluir as garagens
como área construída, na prática, a Lei liberou a construção desses espaços
179
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
vinculados ao programa dos edifícios de classe média, que já contava com altos
índices de motorização na década de 1970.
Como foi abordado no início deste capítulo, os dois planos, PUB e PDDI, não
alteraram a dinâmica que a cidade apresentava, dirigida pelo mercado
imobiliário. O parcelamento extensivo da periferia urbana, para finalidade de
habitação de baixa renda e a concentração de atividades no centro expandido
tiveram continuidade, apesar da existência da legislação promulgada e de
diretrizes que, em pouco tempo, foram abandonadas. Como exemplo podem
ser mencionadas as ambiciosas propostas para a rede de circulação e transportes,
a nucleação modulada da cidade, a proteção aos ambientes frágeis, como os
mananciais e a Serra da Cantareira, as diretrizes voltadas às margens dos rios
Tietê e Pinheiros e a proposta do Centro Administrativo ao norte da área central,
existente desde o Relatório de Planejamento de 1961 e também incorporado
pelo PUB.
Por sua vez, as conseqüências da Lei de Zoneamento sobre a estruturação da
cidade, e em particular dos bairros centrais abordados neste trabalho, foram
relevantes no que se referiu à consagração dos usos e ocupações já existentes,
uma vez que admitiu para a extensa zona mista que caracterizou as zonas Z2, a
nucleação das indústrias, galpões e armazéns dos bairros do Bom Retiro, Pari e
Brás, que como veremos adiante, se tornou em um dos fatores que fortaleceu o
afastamento da população moradora, conforme o Quadro 9 mostrou.
180
3.2. Cidade real: T3.2. Cidade real: T
3.2. Cidade real: T3.2. Cidade real: T
3.2. Cidade real: T
ransformações ao longo das radiais do Plano de Avenidas.ransformações ao longo das radiais do Plano de Avenidas.
ransformações ao longo das radiais do Plano de Avenidas.ransformações ao longo das radiais do Plano de Avenidas.
ransformações ao longo das radiais do Plano de Avenidas.
Após terem sido examinados os planos urbanísticos nas suas propostas que visa-
ram alterar a infra-estrutura e o uso e ocupação do solo da cidade, o capítulo
presente analisa as transformações reais que ocorreram entre as décadas de
1930 e 1970 em algumas das radiais componentes do Plano de Avenidas, rela-
cionadas com o conjunto de bairros abrangidos por este trabalho.
Vale lembrar que o Plano de Avenidas definiu um vetor para o crescimento do
centro, como foi explicado pelo próprio Prestes Maia na exposição do Plano: “É
o tabuleiro de Sta. Efigênia ou, melhor, toda a zona que se estende além do
Anhangabaú, da Luz ao Arouche e mesmo á Consolação. Vasto, plano, com
facilidades de comunicação em todas as direções (condição indispensável a um
centro) e com facilidades de contato com o centro atual (condição para a transfusão
da vida comercial), apresenta os requisitos necessários para constituir
a principala principal
a principala principal
a principal
zona de expansão do centrozona de expansão do centro
zona de expansão do centrozona de expansão do centro
zona de expansão do centro”(grifo do autor) (Maia, op cit, 53).
As avenidas foram divididas em sub-setores correspondentes a áreas com
características diferenciadas e foram considerados como limites nos mapas SARA-
Brasil, de 1930, VASP, de 1954 e Gegran, de 1972, aqueles definidos pela atual
divisão distrital da cidade.
Fig. 76: Os traçados em preto correspondem aos elementos viários estudados no mapa
GEGRAM
181
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
3.2.1 - Componentes do Sistema Norte3.2.1 - Componentes do Sistema Norte
3.2.1 - Componentes do Sistema Norte3.2.1 - Componentes do Sistema Norte
3.2.1 - Componentes do Sistema Norte
--
--
-
Sul: Avenidas Nove de Julho, PSul: Avenidas Nove de Julho, P
Sul: Avenidas Nove de Julho, PSul: Avenidas Nove de Julho, P
Sul: Avenidas Nove de Julho, P
restesrestes
restesrestes
restes
Maia e TMaia e T
Maia e TMaia e T
Maia e T
iradentesiradentes
iradentesiradentes
iradentes
O viário analisado inclui o sistema “y” constante no Plano de Avenidas, as avenidas
Anhangabaú (superior e inferior), futuras Nove de Julho e Prestes Maia e as
avenidas Tiradentes-Santos Dumont:
Sub-setor 1 – Corresponde à extensão da avenida Nove de Julho, do túnel sob
a avenida Paulista até o Viaduto do Chá, entendido este como um limite da área
do centro com os bairros ao sul.
Na década de 1930 verificou-se o adensamento do bairro do Bexiga e a ligação
do centro com os bairros-jardim através da avenida que ainda recebia o nome
de Anhangabaú. As primeiras desapropriações e as obras dessa avenida tiveram
início em 1920, na gestão de Pires do Rio, configurando-se nos planos iniciais
como uma avenida-parque até a Paulista, superando inicialmente esta última
através de rampas. Apenas em 1933 as obras foram retomadas, na gestão de
Fábio Prado e concluídas por Prestes Maia em 1941, já com o nome de Nove de
Julho (Porto, 1996, 124).
O túnel sob o espigão da avenida Paulista foi inaugurado em 1938. Segundo
Bosetti, no final dos anos 1940 surgiram os primeiros edifícios na avenida Nove
de Julho e durante as décadas de 1950 e 60, cerca de 69% dos prédios foram
construídos, com grande contraste entre a verticalização nessa via e o interior do
bairro do Bexiga. Definiu-se a vocação residencial ao longo da Nove de Julho,
com a oferta de prédios de moradias baratas, destinadas ao aluguel ou venda.
Nas décadas de 1970 e 80 passou a ocorrer estagnação devido à diminuição
de lotes desocupados (Bosetti apud Sampaio, org, 2002, 85).
Sub-setor 2 – do Viaduto do Chá até os trilhos da ferrovia, na Estação da Luz.
Sub-setor 3 – Da ferrovia até o rio Tietê.
1 – O mapa de 1930 mostra a avenida Nove de Julho, ainda com sua
denominação anterior, sem ocupação em todo o trecho correspondente à atual
Praça 14 Bis, que se chamava Praça São Manuel, até o espigão da avenida
Paulista. Apenas na altura da confluência com a rua Rocha (ref.1), percebe-se
uma concentração de edificações. Da Praça até o Largo da Memória, percebe-
se os fundos de lotes da ocupação da rua Santo Antônio (ref. 2) e do outro lado,
a rua Avanhandava mostrando o traçado sinuoso que Bouvard definiu para o
viário do primeiro loteamento da Cia. City (ref. 3).
No mapa de 1954, elaborado a partir de vôo de 1954, com o atual traçado já
definido e o túnel executado (ref. 4), percebe-se que os taludes provenientes do
corte da avenida Nove de Julho ainda se encontravam sem ocupação até a
Praça 14 Bis (ref.1), para daí em diante se verificar um parcelamento de grandes
lotes e a ocupação por edifícios lindeiros à Avenida. A área da rua Avanhandava
182
Fig. 77: Vista da Av. Anhangabaú, futura Nove de Julho, à partir do
Parque Trianon, 1920.
Fig. 78: Construção do Tunel 9 de Julho, década de 1930.
183
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
já se mostrava edificada e é possível notar também a mudança do parcelamento
e da ocupação no entorno da Praça das Bandeiras e Largo da Memória, indicativas
da verticalização da área central.
No mapa de 1972, toda a extensão da avenida Nove de Julho já havia sido
ocupada por edifícios, no Vale do Anhangabaú e implantado também o elevado
sobre a Praça 14 Bis (ref. 5) e junto ao centro, o viaduto sobre a avenida 23 de
Maio (ref. 6).
2. Esse sub-setor mostra uma das principais transformações viárias do Plano de
Avenidas, que foi a abertura da ligação do Parque do Anhangabaú com a avenida
Tiradentes. Pelo mapa de 1930 verifica-se ainda existir o paisagismo definido
pelo projeto de Bouvard para o Vale e a ligação deste com a região da Estação
da Luz se fazendo pelas ruas da Conceição, futura Cásper Líbero (ref. 7), Brigadeiro
Tobias (ref. 8) e Florêncio de Abreu (ref. 9), com esta última estabelecendo a
ligação Norte-Sul pelo interior do Triângulo. A rua Anhangabaú (ref. 10), que foi
incorporada em parte pela futura avenida de ligação com o Norte, dirigia-se à
região do Parque Dom Pedro II. As edificações ainda existentes naquela quadra
são remanescentes desse período, como indica a foto da ampliação da via.
O mapa de 1954 mostra o Vale do Anhangabaú já alterado pela retificação de
traçado e implantação de passagem subterrânea sob a avenida São João (ref.
11), implantados respectivamente por Prestes Maia e Ademar de Barros. A avenida
Anhangabaú, também implantada, apresentava considerável mudança no
parcelamento, que indica a verticalização de algumas faces de quadra ao longo
do eixo viário. Outra componente do Plano de Avenidas, a Senador Queirós
(ref. 12), também já havia sido ampliada, percebendo-se a ocupação vertical
denunciada pelos grandes lotes ao longo de seu percurso. A passagem
Fig. 79: Praça 14 Bis,
década de 1950.
184
subterrânea da avenida Anhangabaú sob a Senador Queirós, que havia sido
prevista naquele Plano, não foi executada.
O mapa de 1972 mostra a existência das obras do Metrô ao longo da avenida
Prestes Maia (ref. 13), denominação definitiva da avenida Anhangabaú. A
ocupação revela mudanças ao longo do seu percurso, com a alteração das
faces de quadra, indicando a verticalização que ocorreu também na avenida
Senador Queirós.
3 – Pelo mapa de 1930, o trecho da avenida Tiradentes mostra essa via com seu
traçado antigo, anterior a sua conexão com a Santos Dumont. Ocorria um
estreitamento a partir das ruas Bandeirantes e Rodrigo de Barros (ref. 14) e nas
proximidades da avenida Tamanduateí, existia a Praça José Roberto ladeada
pela rua Itaporanga (ref. 15). Após vencer o rio Tamanduateí, a avenida se
estreitava novamente, chegando até a Ponte Grande (ref. 16), que conectava a
Tiradentes à avenida Voluntários da Pátria, em Santana. Junto da Ponte Grande,
verificava-se a existência da Praça dos Esportes, ladeada também pela
continuidade da rua Itaporanga (ref. 17).
O mapa de 1954 mostra o traçado da via já alterado, conectada à avenida
Santos Dumont (ref. 18), aberta por ocasião da inauguração da Ponte das
Fig. 80: Transformaçãoes viárias: Alargamento da Avenida Anhangabaú, futura Prestes Maia.
185
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
Bandeiras em 1942. O novo traçado incorporou a rua Itaporanga antes e depois
de vencer a avenida dos Estados e o rio Tamanduateí, sobre nova ponte. Dessa
forma, a Praça José Roberto ficou situada entre as avenidas Santos Dumont e
Tiradentes ref. 19). O trecho entre o rios Tamaduateí e o Tietê mostra o novo
traçado, com a ponte das Bandeiras situada a jusante da antiga Ponte Grande
(ref. 20). Mesmo com essa ampliação, não se verifica a transformação do
parcelamento ao longo das vias, em relação à década de 1930.
O mapa de 1972 revela um reordenamento do parcelamento em determinadas
quadras, principalmente entre a rua Bandeirantes e a avenida dos Estados. Nessa
altura, a passagem do Metrô mostra a vala aberta defronte ao trecho da
Pinacoteca do Estado (ref. 21) e a transformação da Praça José Roberto em
canteiro de obras. A estação do Metrô em elevado sobre o rio Tamanduateí e
sua extensão na Ponte Pequena, em direção a avenida Cruzeiro do Sul, são
outras transformações já concluídas (ref. 22). A estação denominada Ponte
Pequena, passou a ser conhecida como Armênia, assim como a antiga Praça
José Roberto, novamente reconfigurada pelo Metrô. No trecho entre os rios
Tamanduateí e Tietê, a Ponte das Bandeiras passou a superar também a avenida
marginal, com as alças incorporando uma parte da antiga Praça dos Esportes,
denominada Bento de Camargo Barros (ref. 23 ).
Fig. 81: Ponte Grande em um Cartão Postal
186
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
S
ISTEMA
N
ORTE
-S
UL
: A
V
. T
IRADENTES
, P
RESTES
M
AIA E
N
OVE DE
J
ULHO
.
Mapa índice 1930:
Ligação Norte-Sul antes da abertura das
avenidas atuais.
Sub-setor 3
Sub-setor 2
Sub-setor 1
187
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
S
ISTEMA
N
ORTE
-S
UL
: A
V
. T
IRADENTES
, P
RESTES
M
AIA E
N
OVE DE
J
ULHO
.
Mapa índice 1954:
Componente Norte-Sul: (Avenida Tiradentes,
Av. Prestes Maia e Av. Nove de Julho).
Sub-setor 3
Sub-setor 2
Sub-setor 1
188
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
S
ISTEMA
N
ORTE
-S
UL
: A
V
. T
IRADENTES
, P
RESTES
M
AIA E
N
OVE DE
J
ULHO
.
Mapa índice 1972:
Componente Norte-Sul: (Avenida Tiradentes,
Av. Prestes Maia e Av. Nove de Julho).
Sub-setor 3
Sub-setor 2
Sub-setor 1
189
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
S
ISTEMA
N
ORTE
-S
UL
: A
V
. T
IRADENTES
, P
RESTES
M
AIA E
N
OVE DE
J
ULHO
.
Componente Norte-Sul:
Sub-setor 1, 1930
Componente Norte-Sul:
Sub-setor 1, 1954
Sub-setor 1, 1972
22
22
2
11
11
1
33
33
3
11
11
1
55
55
5
66
66
6
44
44
4
190
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
S
ISTEMA
N
ORTE
-S
UL
: A
V
. T
IRADENTES
, P
RESTES
M
AIA E
N
OVE DE
J
ULHO
.
Componente Norte-Sul:
Sub-setor 2, 1930
Componente Norte-Sul:
Sub-setor 2, 1954
Componente Norte-Sul:
Sub-setor 2, 1972
1010
1010
10
99
99
9
77
77
7
88
88
8
1111
1111
11
1212
1212
12
1313
1313
13
191
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
S
ISTEMA
N
ORTE
-S
UL
: A
V
. T
IRADENTES
, P
RESTES
M
AIA E
N
OVE DE
J
ULHO
.
Componente Norte-Sul:
Sub-setor 3, 1954
Componente Norte-Sul:
Sub-setor 3, 1972
Componente Norte-Sul:
Sub-setor 3, 1930
1414
1414
14
1515
1515
15
1616
1616
16
1717
1717
17
1818
1818
18
1919
1919
19
2020
2020
20
2121
2121
21
2222
2222
22
2323
2323
23
192
3.2.2 - Componente L3.2.2 - Componente L
3.2.2 - Componente L3.2.2 - Componente L
3.2.2 - Componente L
este 1: Avenida Reste 1: Avenida R
este 1: Avenida Reste 1: Avenida R
este 1: Avenida R
angel Pangel P
angel Pangel P
angel P
estanaestana
estanaestana
estana
Dentro do limite do atual distrito do Brás, a avenida Rangel Pestana foi dividida
em três sub-setores:
Sub-setor 1 – correspondente ao trecho que se inicia na Praça Clóvis Bevilacqua
até o final do Parque Dom Pedro II
Sub-setor 2 – dos limites do Parque D. Pedro II até os trilhos da ferrovia
Sub-setor 3 –dos trilhos da ferrovia até a rua Júlio César da Silva, superando as
ruas Bresser e João Boemer.
1. Através do mapa de 1930, a Rangel Pestana ainda não havia recebido essa
denominação no trecho que abrangia o seu início, na rua Santa Tereza até o
Parque D. Pedro II. Denominada Ladeira do Carmo (ref. 1), apresentava como
marco o convento ali existente, demolido em 1928 para dar lugar ao futuro
edifício da Secretaria da Fazenda (Porto, 1996, 153). Essa via superava o rio
Tamanduateí através da ponte construída em 1895 (ref. 2), cruzando o Parque
em nível (idem, 152). Este ainda exibia o paisagismo do projeto de Bouvard,
realizado em 1911, com o rio Tamanduateí retificado e ainda a presença da Ilha
dos Amores ao lado da ponte. Na Ladeira do Carmo, a ocupação mostra apenas
o parcelamento das quadras entre a rua 25 de Março e a Santa Tereza (ref. 3).
Confrontando o mapa de 1930 com o de 1954, já são percebidas inúmeras
transformações no viário e no parcelamento. De 1926 a 1930 a gestão de José
Fig. 82: Parque D. Pedro II - “Ilha dos amores” - 1910.
193
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
Pires do Rio promoveu o alargamento da antiga Ladeira do Carmo (ibidem,
152) e em 1942, no governo de Prestes Maia, foi aberta a Praça Clóvis Bevilacqua
defronte ao Palácio da Justiça (ref. 3) e ampliada a Rangel Pestana que incorporou
a Ladeira do Carmo. Nessa Praça, o Plano Melhoramentos de São Paulo previa
a instalação do Paço Municipal da cidade (Amadio, 1998, 58). O Parque D.
Pedro II já havia perdido parte de suas características originais, com nova
canalização do rio Tamanduateí e a avenida Rangel Pestana seccionando sua
área interna, superando-o através de nova ponte (ref. 2). A ocupação revela a
transformação do parcelamento das quadras entre a rua 25 de Março e a Praça
Clóvis (ref. 3) e a sua manutenção na rua do Carmo. O edifício da Secretaria
Estadual da Fazenda, projeto da década de 1940 de Júlio Ferrúcio Pinoti,
encontrava-se ainda em obras em 1954, quando do vôo VASP (informação
prestada pelo arq. Márcio Serra, da Secretaria Estadual da Fazenda, 2004)
O mapa de 1972 mostra as profundas mudanças introduzidas pelo complexo
de viadutos construídos em 1968 durante a gestão de Faria Lima (ref. 4), e a
destruição da Praça Clóvis Bevilacqua e quadras vizinhas, para a construção da
Estação Sé do Metrô (ref. 5). A ocupação das quadras lindeiras à avenida (ref.
1e 3) se mostra completa, só não ocorrendo verticalização ao longo da rua do
Carmo.
2 – No mapa de 1930, o sub-setor compreendido entre o Parque D. Pedro II e os
trilhos ferroviários mostrava a Rangel Pestana com todas as referências
implantadas, visto datarem da transição do século XIX para o século XX: Grupo
Escolar Romão Puiggari, de 1898 (ref. 1), Igreja Matriz do Brás, de 1903 (ref. 2)
Fig. 83: Ponte sobre o rio Tamanduateí, cartão postal, aproximadamanete 1930.
194
Fig. 84: Pça Clóvis, década de 1950.
e Estação do Brás, de 1897 (ref. 3) (Sempla/Emplasa, 1984, 388-420; Porto,
1996, 152). O parcelamento e a ocupação revelam a implantação dos maiores
edifícios ao longo da avenida, que já apresentava caráter misto. Além disso,
entradas e passagens para o miolo das quadras do Brás podem ser percebidas,
que apresentavam uma das maiores incidências de habitações coletivas e cortiços
da cidade (ref. 4). As quadras próximas à ferrovia, por sua vez, configuravam-se
como densamente construídas, verificando-se a presença de galpões da zona
fabril. A avenida Rangel Pestana possuía uma passagem em nível sobre a ferrovia,
servida por porteiras, o mesmo acontecendo com rua do Gasômetro.
Comparado com o mapa de 1930, o de 1954 indica poucas alterações no
parcelamento, o que demonstra ter havido a manutenção das funções
anteriormente existentes. No caso da quadra entre as ruas Caetano Pinto e
Piratininga, verifica-se inclusive o aumento da área construída em seu interior,
com a entrada se dando pela Rangel Pestana. Esta ainda contava com passagem
em nível sobre a ferrovia (ref. 5), enquanto na rua do Gasômetro já havia sido
construído o viaduto, que exigiu a divisão da quadra defronte ao mesmo (ref. 6).
A principal alteração no mapa de 1972 é a da construção do viaduto da avenida
Rangel Pestana sobre os eixos ferroviários (ref. 7), caracterizando-a como um
corredor ligando a Zona Leste ao centro da cidade pelo complexo viário
implantado sobre o Parque D. Pedro II.
195
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
3. No sub-setor que se inicia nos trilhos da ferrovia e se estende até a rua Júlio
César da Silva, nas proximidades do Largo Senador Moreira Barros, pelo mapa
de 1930 é possível identificar o Largo da Concórdia e a Praça Agente Cícero,
defronte da Estação do Norte, ambos com sua configuração original (ref. 8).
Percebe-se também, através dos mapas índices, o estreitamento de pista que
ocorre na avenida algumas quadras após o Largo, o que se manteve nas décadas
seguintes (ref. 9). Outra referência importante, nas proximidades da Escola Normal
do Brás (ref. 10), era a garagem de bondes (ref. 11), que ocupava uma grande
área na quadra onde se situava.
O mapa de 1954, confrontado com o de 1930, mostra o Largo da Concórdia
seccionado para a passagem da pista de acesso ao viaduto da rua do Gasômetro
e também dos trilhos de bonde que por ele circulavam, acessando os bairros ao
leste (ref. 12). Verifica-se ter ocorrido a manutenção das características gerais da
ocupação, com a ocorrência de lotes maiores nas proximidades do Largo da
Concórdia (ref. 13). Essa era a zona comercial que se formara desde a década
de 1940, quando ali se instalaram grandes lojas de departamentos e de móveis
(Porto, 1996, 153).
Através do mapa de 1972, a principal transformação ocorrida foi aquela
provocada pela construção do viaduto sobre a ferrovia, que alterou o entorno
Fig. 85: Construção
da Estação Sé do
Metrô, com a praça
Clóvis Bevilacqua já
desconfigurada.
196
do Largo da Concórdia, contribuindo para torná-lo um terminal de ônibus (ref.
14). Sua construção anexa, o Teatro Colombo, já fora demolida e foi transformada
a garagem de bondes que, com a extinção destes, passou a ser ocupada por
ônibus (idem, ref. 14). Percebe-se através da comparação com os mapas
anteriores, a manutenção das características da ocupação também nesse sub-
setor, assim como ocorreu nos anteriores.
Fig. 86 e 87: Acima: Largo
da Concórdia em 1950 com
as velhas porteiras do Brás ,
substituídas por viaduto em
1968.
Ao lado: Largo da Concórdia
em 1958.
197
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
A
VENIDA
R
ANGEL
P
ESTANA
Mapa índice 1930.
Sub-setor 3
Sub-setor 2
Sub-setor 1
198
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
A
VENIDA
R
ANGEL
P
ESTANA
Mapa índice 1954.
Sub-setor 3
Sub-setor 2
Sub-setor 1
199
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
A
VENIDA
R
ANGEL
P
ESTANA
Mapa índice 1972.
Sub-setor 3
Sub-setor 2
Sub-setor 1
200
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
A
VENIDA
R
ANGEL
P
ESTANA
Rangel Pestana:
Sub-setor 1, 1930.
Rangel Pestana:
Sub-setor 1, 1954.
Rangel Pestana:
Sub-setor 1, 1972.
33
33
3
11
11
1
22
22
2
33
33
3
55
55
5
44
44
4
201
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
A
VENIDA
R
ANGEL
P
ESTANA
Rangel Pestana:
Sub-setor 2, 1930.
Rangel Pestana:
Sub-setor 2, 1954.
Rangel Pestana:
Sub-setor 2, 1972.
11
11
1
33
33
3
22
22
2
44
44
4
66
66
6
55
55
5
77
77
7
202
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
A
VENIDA
R
ANGEL
P
ESTANA
Rangel Pestana:
Sub-setor 3, 1930.
Rangel Pestana:
Sub-setor 3, 1954.
Rangel Pestana:
Sub-setor 3, 1972.
1010
1010
10
99
99
9
1111
1111
11
88
88
8
1313
1313
13
1212
1212
12
1414
1414
14
203
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
3.2.3 - Diametral L3.2.3 - Diametral L
3.2.3 - Diametral L3.2.3 - Diametral L
3.2.3 - Diametral L
esteeste
esteeste
este
--
--
-
Oeste: ROeste: R
Oeste: ROeste: R
Oeste: R
adial Ladial L
adial Ladial L
adial L
esteeste
esteeste
este
A componente diametral do Plano de Avenidas correspondente à ligação Leste-
Oeste, teve como principais vias do percurso as avenidas São João e Rangel
Pestana, ambas conectadas até 1948 pelo interior do Triângulo, e posteriormente
pelo “Anel de Irradiação”, a atual Rótula Central, passando necessariamente
pelas Praças João Mendes e Clóvis Bevilacqua.
Vale lembrar que na década de 1950 a proposta para uma avenida de ligação
leste-oeste havia recebido, nos planos de Moses para o sistema expresso e de
Prestes Maia para o Metrô, calha segregada para o transporte público, feita por
ônibus e trilhos, respectivamente. Ao invés disso, quando concluída, configurou-
se como via que dividiu as áreas dos bairros existentes em seu trajeto, não
incorporou os espaços reservados ao transporte de massa e na extremidade
oeste de seu percurso, implantou as pistas do Elevado Costa e Silva, destinado
exclusivamente ao transporte individual.
Para o entendimento das transformações decorrentes da abertura dessa
componente, a mesma foi dividida em três sub-setores, correspondentes ao
conjunto de bairros Bexiga-Liberdade-Glicério e ao Brás, este contendo duas
delimitações: até os trilhos ferroviários, abrangendo a atual divisão dos distritos
pertencentes aos bairros centrais e no sub-setor seguinte, superando-a para
analisar a continuidade da Radial. A divisão, portanto, considerou:
Sub-setor 1 – Percurso da atual Praça Roosevelt até o final do Parque D. Pedro II.
Sub-setor 2 – Percurso do Parque D. Pedro II até os trilhos ferroviários.
Sub-setor 3 – Percurso dos trilhos ferroviários até rua Bresser.
1. Pelos mapas de 1930 e 1954, o trecho da Radial que cortou os bairros do
Bexiga, Liberdade e Glicério ainda não havia sido implantado, sendo possível
notar a magnitude da escala dessa intervenção através do traçado atual projetado
sobre o tecido urbano dos bairros atingidos e comparando com o viário já
finalizado no mapa de 1972.
Partindo da Praça Roosevelt, visível em sua configuração original pelo mapa de
1954 (ref. 3), o traçado seccionou as quadras compreendidas entre as ruas
João Passaláqua, Conselheiro Ramalho e Major Diogo (ref. 1), tomando a direção
da rua Jaceguai cujo leito foi incorporado à via expressa, superando as avenidas
Brigadeiro Luís Antônio e Liberdade e entre essas duas, o Vale do Itororó (futura
23 de Maio), sob viaduto (ref. 2). Essa orientação exigiu numerosos cortes e
retirada de terra, para se obter as cotas que permitiram à via estar liberada de
cruzamentos com as ruas e avenidas existentes. Os diversos taludes entre a Praça
Roosevelt e o bairro da Liberdade testemunham essa a cirurgia urbana, como
por exemplo, o aquele entre a Praça Almeida Júnior, na Liberdade, e a via
expressa implantada.
204
O Glicério foi superado através de viaduto que teve continuidade sobre o Parque
D. Pedro II (ref. 4), daí se bifurcando em direção ao norte e ao leste. Em
conseqüência, a área sudeste do Parque foi seccionada pela passagem do elevado
e recebeu em seu entorno alças de acesso da avenida dos Estados e rampas de
chegada para a avenida Rangel Pestana , a Luz e a Moóca.
2. O percurso da Radial Leste que cortou o Brás no sub-setor que se inicia no
Parque D. Pedro II pode ser analisado através do traçado projetado sobre o
mapa de 1930, que foi implantado entre as ruas Visconde de Parnaíba e da
Moóca, incorporando o leito das ruas Cel. Seabra e Placidina, além da demolição
do casario existente (ref. 5). No mapa de 1954 verifica-se a implantação da
Radial Leste já iniciada, com percurso se estendendo até a rua do Hipódromo,
quando ainda era interrompida por uma quadra remanescente e a partir daí
seguindo até encontrar outro obstáculo, representado pelos trilhos da Santos-
Jundiaí. Pelo mapa de 1972, o traçado da Radial já se encontrava concluído
nesse trecho, superando a ferrovia por viaduto.
3. O sub-setor seguinte se encontra fora da delimitação dos distritos pertencentes
aos bairros centrais enfocados neste trabalho, mas constitui importante área de
transição com a Moóca. Pelo mapa de 1930 é possível observar o sistema viário
interrompido em ambos os lados pela ferrovia, o mesmo ocorrendo no de 1954.
Pela projeção do traçado atual nessas duas cartas, percebe-se que a orientação
da via expressa seguiu a da rua Conselheiro Justino, incorporando-a e demolindo
parte das quadras lindeiras. No seu prolongamento, cruza as ruas do Hipódromo
e Bresser, com esta última superando a Radial por viaduto, como é possível
observar na carta de 1972.
Fig.88: Elevado Costa e Silva, nas proximidades da Praça Roosevelt.
205
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
R
ADIAL
L
ESTE
Futuro traçado da Radial Leste (traçado em
vermelho), mapa índice 1930.
Sub-setor 3
Sub-setor 2
Sub-setor 1
206
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
R
ADIAL
L
ESTE
Mapa índice 1954.
Sub-setor 3
Sub-setor 2
Sub-setor 1
207
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
R
ADIAL
L
ESTE
Mapa índice 1972.
Sub-setor 3
Sub-setor 2
Sub-setor 1
208
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
R
ADIAL
L
ESTE
Mono Mono Mono Mono Mono Mono Mono Mono Mono Mono
Mono Mono Mono Mono Mono Mono Mono Mono Mono Mono
Futura Radial Leste (traçado em vermelho), sub-setor 1, 1930.
Radial Leste, sub-setor 1, 1972.
Futura Radial Leste (traçado em vermelho), sub-setor 1, 1954.
22
22
2
44
44
4
33
33
3
11
11
1
22
22
2
209
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
R
ADIAL
L
ESTE
Futura Radial Leste (traçado em vermelho), sub-setor 2, 1930.
Radial Leste, sub-setor 2, 1972.
Futura Radial Leste (traçado em vermelho), sub-setor 2, 1954.
55
55
5
210
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
R
ADIAL
L
ESTE
Futura Radial Leste (traçado em vermelho),
sub-setor 3, 1930.
Radial Leste, sub-setor 3, 1972.
Futura Radial Leste (traçado em vermelho),
sub-setor 3, 1954.
66
66
6
66
66
6
66
66
6
211
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
3.2.4 - Diametral L3.2.4 - Diametral L
3.2.4 - Diametral L3.2.4 - Diametral L
3.2.4 - Diametral L
esteeste
esteeste
este
--
--
-
Oeste: Avenida São JoãoOeste: Avenida São João
Oeste: Avenida São JoãoOeste: Avenida São João
Oeste: Avenida São João
Para a compreensão dos aspectos da estruturação dessa componente, além dos
mapas cadastrais, foi também utilizado um trabalho da socióloga Lucila Hermann,
que pesquisou a avenida São João nos seus estudos sobre Ecologia Urbana na
metade da década de 1930. Nesse período, esse trabalho apontou as seguintes
características físicas e sociais da São João:
- Ocorreram remodelações em dois períodos na Avenida. O primeiro, iniciado
em 1911, incluiu a retificação e desapropriações do trecho inicial, provocando
a saída das famílias de alta renda para a Água Branca, em função da expansão
comercial e deterioração que o trecho apresentou. O segundo realizado na
administração de Pires do Rio, entre 1926-1928, abrangeu o trecho entre a rua
Vitória e a Praça Marechal Deodoro, que apresentava tendência à verticalização
para fins de moradia e uma área de deterioração que, segundo Hermann,
antecedia a área de alta renda da Água Branca (Hermann apud RAM, XCIX,
1944, 16;26). Como será visto adiante, essa segunda etapa da ampliação se
estendeu até a década de 1930.
- O Código Arthur Saboya estabeleceu para o lado par da avenida (direito no
sentido centro-bairro), que sofreu a reformulação de 1911, o gabarito mínimo
de quatro andares, fazendo com que na década de 1930 os edifícios desse lado
fossem novos e com melhores condições que os do lado esquerdo, mencionados
por Hermann como sendo constituída de “prédios velhos e baixos”. No lado par,
81% dos prédios possuíam quatro andares ou mais, enquanto que do lado ímpar,
68% das edificações eram de apenas um andar (idem, 15;25).
Para analisar essa avenida, sua extensão foi dividida em três sub-setores:
Sub-setor 1 – correspondente ao seu início na Praça Antonio Prado até a avenida
Ipiranga
Sub-setor 2 – da avenida Ipiranga até a alameda Glete
Sub-setor 3 – da alameda Glete até a avenida Pacaembu
1. No mapa de 1930, todo o trecho compreendido pelo primeiro sub-setor já
havia recebido ampliação, assim como o segundo até a rua Helvetia. Segundo
o estudo sobre a São João, do seu início até a rua General Osório, a avenida
apresentava 96% de prédios comerciais, situados principalmente do seu lado
ímpar, isto é, lado esquerdo no sentido centro-bairro. O trecho inicial ligava-se
ao centro e cruzava o Vale do Anhangabaú, que ainda possuía o paisagismo
original do projeto de Bouvard (ref. 1). Hermann mencionou uma série de razões
para a transformação da morfologia desse trecho, principalmente até o Largo
do Paissandu, pois levando em conta a valorização daquela zona e a legislação
que proibia prédios com menos de 8 andares, a verticalização ocorreria
necessariamente.
212
Comparando a carta de 1930 com a de 1954, verificam-se alterações no
parcelamento, com maior divisão dos lotes no lado esquerdo da avenida, sentido
centro-bairro e importantes alterações viárias implantadas pelo Plano de Avenidas,
implicando na reestruturação do Vale do Anhangabaú que também incorporou,
em 1954, a passagem subterrânea no cruzamento com a São João (ref. 2). Foi
também igualmente transformada a avenida Ipiranga (ref. 3), a primeira
componente do Plano de Prestes Maia a ser implantada, sendo concluída em
1941 (Amadio, 1998, 58). No mapa de 1972, a ocupação ao longo da avenida
manteve-se sem alterações significativas, uma vez que a verticalização ocorrida
nas décadas de 1950 e 1960, já havia se consolidado, entrando em declínio, a
partir desse período, a construção de edifícios.
2. Pelo mapa de 1930, o sub-setor que se inicia na avenida Ipiranga, mostra
essa via e a Duque de Caxias sem os alargamentos que o Plano de Avenidas
implantou. A Ipiranga ainda era ainda denominada como rua (ref. 3) e a futura
Duque de Caxias incorporou o traçado da rua Maria Tereza (ref. 4), quando de
sua ampliação. O Largo do Arouche também mostrava a configuração anterior
ao Plano de Prestes Maia, que o interligou posteriormente à Praça da República
pela ampliação da rua Vieira de Carvalho (ref. 5). Na altura da rua Helvetia, o
mapa de 1930 registrou uma obstrução ainda existente ao alargamento da via
(ref. 6), o que comprova o fato da ampliação da São João ter demolido o lado
par da avenida, como mencionou Hermann, e por esse motivo, ali implantadas
as novas tipologias na década de 1930.
Fig. 89: Largo do Arouche e
Rua Vieira de Carvalho, década
de 1940.
213
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
O mapa de 1954 registrou as avenidas Ipiranga e Duque de Caxias (ref. 4) já
alargadas, o mesmo ocorrendo com a nova configuração do Largo do Arouche
e da avenida Vieira de Carvalho, transformada em um boulevard (ref. 5). Nesse
sub-setor a São João abrigou uma das mais simbólicas funções resultante da
modernização da cidade, que foi a Cinelândia. Esta começou a formar-se fora
do Triângulo, no Centro Novo, nos anos que antecederam a II Guerra Mundial,
chegando ao seu auge na década de 1950, consagrando a São João como
eixo principal da área que chegou a concentrar 25 salas de cinema (idem, 49).
Percebe-se pelo mapa de 1954 a transformações ocorridas no parcelamento
das faces de quadra da avenida, atestando já ter ocorrido a substituição das
construções antigas também no lado ímpar, que não fora atingido pelos
alargamentos da via nas décadas de 1910 e 1920.
O mapa de 1972 mostra a manutenção das características do parcelamento,
com transformações indicativas da continuidade da verticalização na década de
1960, como por exemplo, a quadra em que situou o edifício do cine Majestic,
na esquina da Duque de Caxias (ref. 7), a do edifício Andraus, entre as ruas
Aurora e Pedro Américo (ref. 8) e aquela onde foi erguido o então edifício-sede
do City Bank, na esquina com a avenida Ipiranga (ref. 9). A transformação mais
profunda ocorreu nas quadras entre as ruas Sebastião Pereira e Frederico Steidel,
que foram cortadas pela via elevada construída sobre a São João no final da
década de 1960, correspondente à ligação Leste-Oeste (ref. 10). A alça de
acesso ao viaduto, na rua Helvetia, se situou exatamente no ponto em que, uma
quadra interrompia o trecho alargado da avenida, pelo mapa de 1930.
A partir do trecho em que o viaduto se desviou da São João, rompendo as
quadras mencionadas, seguiu sobre a avenida Amaral Gurgel até a altura da
rua da Consolação, quando se transformou em via subterrânea à Praça Roosevelt,
também construída nesse período, interligando-se ao complexo viário da Radial
Leste, como foi visto na análise sobre essa componente.
3. No sub-setor que se inicia na rua Helvetia, seguindo até a avenida Pacaembu,
o mapa de 1930 mostra a antiga configuração viária da São João, que terminava
no encontro da rua das Palmeiras com a Praça Marechal Deodoro (ref. 11). A
rua das Palmeiras interligava a São João com a avenida Água Branca, área de
concentração da alta renda, como já mencionado. O trecho agora enfocado,
juntamente com a rua das Palmeiras, foi analisado em 1935 por Hermann como
apresentando a maior densidade da avenida, em relação às demais áreas. A
relação utilizada pela autora foi a de habitantes por metro linear, impossível de
ser convertida para metragem quadrada por não se conhecer os critérios que
foram utilizados. De qualquer forma, a área enfocada apresentava a densidade
de 1,6 indivíduos por metro linear, enquanto que aquela vinculada ao centro
apresentava 0,66 e a de transição 0,73. Hermann creditava esse índice ao fato
de existirem construções de 4 e 8 andares, na Praça Marechal Deodoro e pelo
aproveitamento máximo do parcelamento, com média de 3 metros de frente
214
Fig.90 e 91: Avenida São João: Ao alto, lado ímpar da avenida com as
constrções antigas, de gabarito baixo, poupadas no alargamentos da via
entre 1910 e 1920. Acima, vista aérea, sentido centro,década de 1950.
215
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
(Hermann apud RAM, XCIX, 1944, 33). Em relação ao antigo sistema viário,
pode-se notar também que nesse período a avenida Pacaembu conectava-se à
rua das Palmeiras (ref. 12).
Pelo mapa de 1954, a continuação da avenida São João já havia se completado,
executado sobre o leito da rua das Palmeiras, que passou a ter início na Praça
Marechal Deodoro (ref. 13). Foi igualmente implantada a continuação da avenida
Pacaembu, através de um corte no terreno e da construção de um viaduto para
esse novo trecho da avenida São João (ref. 14). Essas obras constaram também
do Plano de Avenidas, que implantou melhoramentos em várias vias da cidade.
Percebe-se que, para a alinhar o novo trecho com a Praça Marechal Deodoro, o
alargamento da rua das Palmeiras ocorreu sobre as quadras do lado par (à
direita no sentido centro-bairro), como aconteceu nos outros setores da avenida
São João nas décadas anteriores. Com isso, mantiveram-se as características
nas quadras do lado ímpar não atingidas pelas demolições, como é possível
notar comparando os mapas de 1930 e 1954, mas houve grande transformação
nas novas faces de quadra, indicando parte da verticalização desse trecho da
avenida já ter ocorrido ao longo das décadas de 1940 e 1950.
O mapa de 1972 mostra a via elevada percorrendo a avenida e seccionando a
praça Marechal Deodoro para a implantação de uma rampa de acesso (ref.
15). Essa interferência, com início na Largo Padre Péricles (ref.16), provocou a
instantânea decadência de toda a área, em troca da ampliação do fluxo para
automóveis. É necessário considerar que poucas alterações foram registradas
na ocupação, uma vez que a verticalização das faces de quadras lindeiras à
avenida já havia ocorrido nas décadas anteriores à construção do elevado.
216
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
A
VENIDA SÃO
J
OÃO
Mapa índice 1930.
Sub-setor 1
Sub-setor 2
Sub-setor 3
217
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
A
VENIDA SÃO
J
OÃO
Mapa índice 1954.
Sub-setor 1
Sub-setor 2
Sub-setor 3
218
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
A
VENIDA SÃO
J
OÃO
Mapa índice 1972.
Sub-setor 1
Sub-setor 2
Sub-setor 3
219
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
A
VENIDA SÃO
J
OÃO
Av. São João, sub-setor 1, 1930.
Av. São João, sub-setor 1, 1954.
Av. São João, sub-setor 1, 1972.
11
11
1
33
33
3
22
22
2
220
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
A
VENIDA SÃO
J
OÃO
Av. São João, sub-setor 2, 1930.
Av. São João, sub-setor 2, 1954.
Av. São João, sub-setor 2, 1972.
66
66
6
44
44
4
55
55
5
44
44
4
55
55
5
77
77
7
88
88
8
99
99
9
1010
1010
10
221
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
A
VENIDA SÃO
J
OÃO
Av. São João, sub-setor 3, 1930.
Av. São João, sub-setor 3, 1954.
Av. São João, sub-setor 3, 1972.
1212
1212
12
1111
1111
11
1414
1414
14
1313
1313
13
1616
1616
16
1515
1515
15
222
3.2.5 - Componente sudeste: Avenida dos Estados3.2.5 - Componente sudeste: Avenida dos Estados
3.2.5 - Componente sudeste: Avenida dos Estados3.2.5 - Componente sudeste: Avenida dos Estados
3.2.5 - Componente sudeste: Avenida dos Estados
Foi considerada nesta análise o limite do distrito Brás, para a definição da extensão
ao sul da avenida dos Estados, que se prolonga até a marginal do rio Tietê. Por
cruzar toda a cidade, no sentido sudeste-norte, acompanhando a canalização
do rio Tamanduateí, essa avenida encontra em vários trechos, outras avenidas
que fizeram parte do sistema viário proposto no Plano Melhoramentos de São
Paulo. Foi dividida em três sub-setores:
1. Correspondente ao trecho que se inicia na Baixada do Glicério até os trilhos
ferroviários na transição dos bairros Luz e Brás
2. Da ferrovia até a altura da Praça Armênia
3. Da Praça Armênia até a marginal Tietê.
1. Pelo mapa de 1930, nesse sub-setor a avenida tinha o Parque D. Pedro II
como uma área de transição, já que pelo traçado da época, contornava-o pela
rua da Figueira, do lado do Brás, e pela ruas Pedroso Alvarenga e 25 de Março,
do lado do centro. Sua denominação anterior, avenida Tamanduateí, correspondia
à maior parte de sua extensão, pois a avenida do Estado compreendia um
pequeno trecho entre a antiga rua Anhangabaú, atual Carlos de Souza Nazaré
e o início do Parque D. Pedro II. Ao longo das vias formadoras dessa ligação
sudeste-norte, encontravam-se importantes equipamentos, como o Mercado
Municipal e o Pátio do Parí, além evidentemente do próprio Parque. Nesse sentido,
conectava essa região com bairros da Moóca,Ipiranga e as cidades do ABC.
Comparando-se o mapa de 1954 com o de 1930, percebe-se que a avenida
ainda contornava o Parque D. Pedro II, com uma transformação na sua parte
norte, em que seccionou uma quadra junto da rua Américo Brasiliense para
interligar a rua Santa Rosa com a avenida Senador Queirós. Nesse período, o
rio Tamanduateí já havia recebido a sua retificação no interior do Parque e sobre
ele foram construídas duas pontes, interligando as ruas Paula Souza e Carlos de
Souza Nazaré com a área do Pátio do Parí e da zona cerealista.
O mapa de 1972 mostra duas alterações profundas produzidas na década de
1960, que se constituíram na passagem das pistas da avenida dos Estados pelo
interior do Parque D. Pedro II e na implantação do complexo de viadutos que,
assim como o novo traçado viário da avenida, seccionaram completamente o
Parque. Por se tratar de uma área com ocupação antiga, relativamente poucas
transformações ocorreram com o parcelamento ao longo do período analisado,
podendo-se perceber que as principais ocorrências estiveram ligadas mais ao
lado do centro, do que o do Brás.
2. Esse sub-setor inclui ao longo do percurso da avenida, a Vila Economizadora
e a estação Tamanduateí do “Tramway” da Cantareira como principais referências.
A morfologia dessa área também se manteve sem alterações significativas,
223
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
comparados os mapas de 1930, 1954 e 1972, dando continuidade às
características populares dos bairros da Ponte Pequena e do Canindé, situados
no seu entorno. Merece ser lembrado que, nesse trecho da avenida dos Estados
foi realizada no início da década de 1940 a pesquisa de Donald Pierson sobre
os cortiços do Canindé, o que revela a ocorrência desse tipo de habitação nas
quadras ao longo de sua extensão (Pierson apud RAM, LXXXI, 1942, 201).
3. Esse sub-setor apresentava no mapa de 1930, a avenida cruzando o antigo
traçado da avenida Tiradentes e uma ocupação extremamente rarefeita, visto
que sua maior parte se encontrava na Várzea do Tietê, ainda não retificado.
Percebem-se duas áreas utilizadas por equipamentos públicos: a do Depósito
Municipal e da Limpeza Pública. Tinha ainda como travessa a rua Itaporanga,
posteriormente incorporada ao novo traçado da avenida Santos Dumont, como
mostra o mapa de 1954.
É entretanto, pelo mapa de 1972, que as maiores transformações podem ser
observadas, pois devido a conclusão da retificação do rio Tietê, a área ao longo
da avenida foi totalmente ocupada por equipamentos públicos: no lado direito a
Secretaria Estadual dos Transportes e a SABESP, e do lado esquerdo, as
dependências da Administração Regional da Sé e o incinerador da usina de
transbordo de lixo. Sempre margeando o canal do rio Tamanduateí, na foz deste
com o rio Tietê, a avenida também se interrompeu, conectando-se à marginal,
sem transposição das pistas e do rio.
224
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
A
VENIDA DOS
E
STADOS
Mapa índice 1930.
Sub-setor 3
Sub-setor 2
Sub-setor 1
225
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
A
VENIDA DOS
E
STADOS
Mapa índice 1954.
Sub-setor 3
Sub-setor 2
Sub-setor 1
226
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
A
VENIDA DOS
E
STADOS
Mapa índice 1972.
Sub-setor 3
Sub-setor 2
Sub-setor 1
227
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
A
VENIDA DOS
E
STADOS
Av. dos Estados, sub-setor 1, 1930.
Av. dos Estados, sub-setor 1, 1954.
Av. dos Estados, sub-setor 1, 1972.
228
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
A
VENIDA DOS
E
STADOS
Av. dos Estados, sub-setor 2, 1930.
Av. dos Estados, sub-setor 2, 1954.
Av. dos Estados, sub-setor 2, 1972.
229
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
A
VENIDA DOS
E
STADOS
Av. dos Estados,
sub-setor 3, 1930.
Av. dos Estados,
sub-setor 3,
1954.
Av. dos Estados,
sub-setor 3, 1972.
230
3.2.6 - Componente sudoeste: a R3.2.6 - Componente sudoeste: a R
3.2.6 - Componente sudoeste: a R3.2.6 - Componente sudoeste: a R
3.2.6 - Componente sudoeste: a R
ua da Consolaçãoua da Consolação
ua da Consolaçãoua da Consolação
ua da Consolação
O trecho analisado dessa radial tem o seu inicio no cruzamento com a avenida
São Luís e termina na avenida Paulista, não sendo incluída, portanto, a sua
continuidade dentro do Jardim América, pelo fato de apresentar outras
características históricas e morfológicas, inclusive não tendo sido ampliada na
década de 1960, como foi o caso do trecho enfocado dentro do distrito
Consolação. Esta via correspondia ao conceito de “radial de primeira classe”,
de Prestes Maia e o seu alargamento foi por ele iniciado em 1965, no seu
segundo mandato como Prefeito (Porto, 1996, 60).
A rua da Consolação foi dividida em três sub-setores por caracterizarem áreas
com influências diferenciadas:
Sub-setor 1 – do cruzamento da avenida São Luís até a rua Maria Antônia
Sub-setor 2 – da rua Maria Antônia até a rua Maceió
Sub-setor 3 – da rua Maceió até a avenida Paulista
Para a compreensão de alguns dos aspectos da transição ocorrida entre as
décadas de 1950 e 1970, além dos mapas cadastrais, foi utilizado um estudo
do geógrafo José Domingos Tírico publicado em 1958 no Boletim Paulista de
Geografia – BPG, que permite identificar as características dessa via antes de ser
transformada pela ampliação do seu leito.
- A rua possuía 641 edificações (incluindo o trecho da avenida Paulista até a rua
Estados Unidos), com 10 terrenos vagos, apenas 10% das edificações com mais
de 2 andares e destas, 38 edificações de 5 a 20 andares. 50% das edificações
da rua se constituíam em casas antigas (Tírico apud BPG, 1958, 37).
- Rampas e patamares: 1-Rampa da Biblioteca (ref. 1), 2-Patamar dos Judeus
(ref. 2), 3-Rampa da rua Maria Antônia (ref. 3) 4-Patamar do Grupo Escolar (ref.
4) 5-Rampa do Cemitério (ref. 5), 6-Patamar do Cinema (ref. 6), (idem, 30).
1- Esse sub-setor apresenta grande influência do centro, sendo possível perceber
no mapa de 1930 essa área ainda com o arruamento anterior a abertura das
avenidas Ipiranga e São Luís e da construção da Biblioteca Mario de Andrade e
Praça D. José Gaspar, estas situadas na chácara da família Souza Queiroz, cujas
instalações foram demolidas posteriormente (ref. 7). Tírico menciona a mescla
de residências junto ao centro comercial, existente em fins do século XIX, fazendo
crer que no trecho até a rua Araújo ainda se verificavam as antigas construções,
que gradualmente se tornaram habitações coletivas. A Igreja da Consolação se
encontrava ladeada pelo casario da chácara de Martinho da Silva Prado, demolida
na década de 1940 (Porto, 1996, 59) e a Praça Roosevelt ainda não existia (ref.
8). A Igreja de Nossa Senhora da Consolação teve projeto de Maximiliano Hehl,
o mesmo da Catedral de São Paulo. Com o lançamento de sua pedra fundamental
em 1910, a primeira fase concluída em 1934 e a segunda apenas em 1959
(ibidem, 58).
231
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
O antigo traçado indicava a rua Martins Fontes ainda em projeto e a rua Major
Quedinho acessando a Consolação pela avenida Nove de Julho.
Mesmo com as transformações viárias visíveis no mapa de 1954, percebe-se a
manutenção das características do parcelamento, indicando ser essa a área
mencionada por Tírico, correspondente à “Rampa da Biblioteca” e o “Patamar
dos Judeus”, ocupada principalmente por casas antigas. Essa primeira rampa
da rua da Consolação (ref. 1) possuía antigos casarões transformados em casas
comerciais e o mencionado patamar (ref. 2), situado entre as ruas Amaral Gurgel
e Maria Antônia, possuía uma concentração de lojas de móveis, comércio exercido
por membros da colônia judaica, onde se encontravam 7 lojas do lado da Amaral
Gurgel e mais 3 do outro lado da Consolação (Tírico, 1958, 43). Certamente
utilizando as antigas construções, o autor menciona também a existência de
concentração de cortiços, que nesse sub-setor se localizavam principalmente
entre as avenidas São Luís e rua Araújo e entre a Rego Freitas e Maria Antônia
(idem, 39).
Fig 92: Biblioteca
Mario de andrade e
Praça D. José Gaspar,
década de 1950.
232
Outra categoria de habitação coletiva existente na rua da Consolação era a de
pensões, disseminadas em toda sua extensão, mas com concentração próxima
ao Cemitério. Somava-se uma terceira categoria que era a dos prédios existentes
nos três primeiros quarteirões, mesclados aos casarões e que segundo o autor,
formava-se em zona de prostituição. De qualquer forma, foi indicada a posse
dos antigos casarões por empresas imobiliárias, que aguardavam o momento
de derrubá-las para a construção de prédios de apartamentos (ibidem, 41).
Na carta de 1954 percebe-se ainda a presença de dois espaços públicos já
configurados: a Praça Dom José Gaspar, com a Biblioteca Mario de Andrade,
inaugurada em 1942 (ref. 7) e a Praça Roosevelt (ref. 8), da mesma época. No
entorno dela, já havia ocorrido a transformação das antigas construções, que
deram lugar à verticalização (op.cit, 36) e seu espaço era ocupado por feiras
livres e posteriormente para estacionamento de automóveis (Amadio, 1998, 66).
As transformações viárias mostram a incorporação de um trecho da rua Epitácio
Pessoa para a formação da avenida Ipiranga. Próximo à Praça Dom José Gaspar,
o Viaduto Major Quedinho substituiu a rua do mesmo nome anteriormente
existente e a rua Martins Fontes já fora aberta também, ambas situadas junto à
área de verticalização do centro. Nota-se na quadra triangular configurada pela
rua da Consolação e as avenidas Ipiranga e São Luís, as antigas construções da
Fig 93: Cruzamento da Rua São Luiz com Rua da Consolação, 1954.
233
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
Rampa da Biblioteca ainda ladeando a área do Edifício Copan (ref. 9), que se
encontrava em construção em 1954, na época do vôo do levantamento Vasp.
O mapa de 1972 mostra transformações radicais na configuração do
parcelamento e do sistema viário: percebe-se que a Rua da Consolação foi
alargada exatamente sobre as antigas edificações existentes na “Rampa da
Biblioteca (ref. 10)”, o mesmo ocorrendo no trecho entre as ruas Rego Freitas e
Amaral Gurgel, o antigo “Patamar dos Judeus (ref. 11)”. Segundo o estudo
mencionado, justamente esse trecho foi analisado como apresentando maior
deterioração da rua (Tirico apud BPG, 1958, 51). A presença dos lotes de grandes
dimensões indica a verticalização ter ocorrido já quase completamente na década
de 1960, com a única exceção de um estacionamento ao lado do Edifício Copan.
O sistema Leste-Oeste se encontrava implantado, destruindo parte da quadra
entre as ruas Rego Freitas e Amaral Gurgel. Nessa esquina, a quadra oposta foi
cortada também para acomodar a alça de acesso do Elevado Costa e Silva para
a rua da Consolação. O edifício-praça, construído em vala aberta, incorporou
pistas subterrâneas de ligação com o setor Leste da cidade e substituiu a antiga
Praça Roosevelt, envolvendo a Igreja da Consolação com inúmeros volumes e
escadarias. Ainda não concluída, foi inaugurada no aniversário da cidade do
ano de 1970 pelo general-presidente Médici e o prefeito-indicado Maluf (Amadio,
1998, 66).
2 –Esse sub-setor que se estende da rua Maria Antônia até a rua Sergipe, possui
duas referências que se associaram ao conjunto da cidade ainda no século XIX:
- O Cemitério da Consolação, inaugurado em 1858, então denominado
Cemitério Municipal. (op. cit), 1958, 30; Porto, 1996, 56).
- O Reservatório da Consolação, inaugurado em 1881, pertencente ainda à
Cia. Cantareira (Porto, 1996, 58).
Fig 94 e 95: À esquerda, Pça. Roosevelt, 1957; à direita, tipologia remanescente na R. da Consolação,
vizinha ao reservatório da Consolação (à direita da edificação), 2003.
234
Compreende, pela denominação utilizada no estudo de Tírico à “Rampa da rua
Maria Antônia (ref. 3)”, o “Patamar do Grupo Escolar (ref. 4)” e a “Rampa do
Cemitério (ref. 5)”.
Confrontando-se as cartas de 1930 e 1954, assim como ocorreu no sub-setor
anterior, naquele agora abordado percebe-se a manutenção das características
básicas do parcelamento e da ocupação, confirmando a existência de um grande
número de edificações antigas nessa rua. Aludindo ao período de 1958, Tírico
mencionou a grande predominância de pensões nas quadras entre as ruas Maria
Antônia e Sergipe. Nesse trecho também foi registrada, nas quadras fronteiriças
ao Cemitério, a existência de uma série de atividades ligadas ao mesmo, como
floriculturas e marmorarias (Tírico apud BPG, 1958, 41-43). A carta de 1954
registra também a existência do Grupo Escolar São Paulo (ref. 12), na esquina
da rua Antônia de Queiroz, inaugurado em 1933, situado em uma área então
vazia pelo mapa de 1930 (Porto, 1996, 60).
Entretanto, a transformação mais profunda é registrada na carta de 1972, uma
vez que os trabalhos de alargamento da rua já tinham sido concluídos.
Comparando com a carta de 1954, percebe-se que o novo traçado foi ampliado
em sua largura sobre as quadras do sentido bairro-centro, verificando-se a perda
de recuos ou mesmo a demolição dos edifícios que estavam posicionados nessas
quadras, como por exemplo, o recuo do Colégio Marina Cintra, antigo Grupo
Escolar São Paulo. Esse trecho, o da “Rampa do Cemitério”, era justamente
composto por casas térreas geminadas, das primeiras décadas do século XX e
de propriedade de empresas construtoras, que segundo Tírico, esperavam ainda
no final da década de 1950 o plano municipal de alargamento para “iniciar a
derrubada valorizadora (Tírico, 1958, 52). Em conseqüência, a substituição
das edificações e a mudança no padrão do parcelamento denunciando a
verticalização, podem ser percebidas através da análise dos dois mapas cadastrais.
3 – Esse sub-setor é compreendido pela rua Sergipe até a avenida Paulista.
Corresponde ao “Patamar do Cinema” vindo a se constituir em um espaço que
apesentava predominância habitacional e pequeno comércio local, segundo o
estudo. Confrontando os mapas de 1930 e 1954, pode-se perceber a
manutenção das características básicas do parcelamento, sendo que em 1958
foi registrada a existencia de três cinemas nas proximidades da avenida Paulista.
Nessa esquina, através do mapa de 1954, podem ser identificados os edifícios
Anchieta, do escritório MM. Roberto, de 1948 e defronte a este, o edifício
projetado por Giancarlo Palante.
O mapa de 1972 mostra a implantação do complexo viário de ligação da rua
da Consolação e avenidas Rebouças e Paulista (ref. 13). Essa última já havia
sido alargada também e recebido pista subterrânea para a ligação com a avenida
Rebouças. O projeto da “Nova Paulista”, entretanto, não foi implantado na
íntegra. Uma matéria jornalística indica a reestruturação feita no projeto original,
235
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
sob a alegação de correção dos erros verificados nas interligações, como por
exemplo, a não existência das mesmas entre as avenidas Paulista e Rebouças e
entre a Angélica, Rebouças e Dr. Arnaldo (FSP, 04/7/1970). Optou-se, nessa
nova versão, pela alternativa com maior possibilidade de acessos aos eixos do
sudoeste e oeste, eliminando-se a pista subterrânea que percorreria toda a avenida
Paulista, de acordo com o projeto apresentado na gestão Figueiredo Ferraz.
Pode-se notar que o lado mais atingido pelo alargamento da rua da Consolação
foi o do sentido bairro-centro, uma vez que nele foi incorporada uma faixa
maior de ampliação do que o lado oposto. Com isso, todos os edifícios perderam
os recuos ou mesmo foram demolidos. Prova desse fato foi a entrada para a
galeria subterrânea de travessia de pedestres do lado dos cinemas, construída
em 1970, ter sido embutida na fachada lateral do edifício projetado por Palante,
encravada na esquina com a avenida Paulista. Devido essas transformações não
terem afetado as quadras do sentido centro-bairro, o parcelamento e a ocupação
entre a rua Maceió e a avenida Paulista mantiveram as características, o mesmo
não ocorrendo com a quadra logo após o cruzamento desta, sentido Pinheiros,
que se tornou uma ilha em meio ao sistema viário implantado. Nessa esquina,
apesar do Edifício Anchieta ter perdido os recuos frontal e lateral, a entrada da
galeria subterrãnea pôde ser implantada no passeio público, mesmo sendo uma
interferência para o mesmo e para esse edifício (ref. 14).
Fig 96: Rua da Consolação, no cruzamento com a Av. Paulista, 2003. À esquerda, edifício Anchieta,
projeto do escritório MM Roberto; à direita, edifício projetado por Giancarlo Palante.
236
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
R
UA DA
C
ONSOLAÇÃO
Mapa índice 1930.
Sub-setor 1
Sub-setor 2
Sub-setor 3
237
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
R
UA DA
C
ONSOLAÇÃO
Mapa índice 1954.
Sub-setor 1
Sub-setor 2
Sub-setor 3
238
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
R
UA DA
C
ONSOLAÇÃO
Mapa índice, 1972.
Sub-setor 1
Sub-setor 2
Sub-setor 3
239
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
R
UA DA
C
ONSOLAÇÃO
Av. da Consolação, sub-setor 1, 1930.
Av. da Consolação, sub-setor 1, 1954.
Av. da Consolação , sub-setor 1, 1972.
33
33
3
88
88
8
22
22
2
11
11
1
99
99
9
77
77
7
88
88
8
1111
1111
11
88
88
8
99
99
9
1010
1010
10
77
77
7
77
77
7
240
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
R
UA DA
C
ONSOLAÇÃO
Av. da Consolação, sub-setor 2, 1930.
Av. da Consolação, sub-setor 2, 1954.
Av. da Consolação , sub-setor 2, 1972.
55
55
5
44
44
4
44
44
4
1212
1212
12
55
55
5
241
A
S TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO
1960-1980
R
UA DA
C
ONSOLAÇÃO
Av. da Consolação, sub-setor 3, 1930.
Av. da Consolação, sub-setor 3, 1954.
Av. da Consolação , sub-setor 3, 1972.
1414
1414
14
1313
1313
13
66
66
6
66
66
6
66
66
6
242
3.3 Habitação: espaços diferenciados para os ricos e pobres3.3 Habitação: espaços diferenciados para os ricos e pobres
3.3 Habitação: espaços diferenciados para os ricos e pobres3.3 Habitação: espaços diferenciados para os ricos e pobres
3.3 Habitação: espaços diferenciados para os ricos e pobres
Duas características principais marcaram o período 1960-1980 no que se referiu
à habitação social e também às transformações nas condições de moradia da
classe média brasileira, em particular a de São Paulo:
- O aprofundamento do sistema de auto-empreendimento ou autoconstrução
para a produção da habitação popular associado ao recrudescimento do
retalhamento do solo urbano nas áreas periféricas da cidade.
- A criação do Sistema Financeiro de Habitação, que através do Banco Nacional
de Habitação - BNH se vinculou ao desenvolvimento imobiliário da classe média,
para o financiamento da casa própria.
Como foi visto, após a construção das vilas operárias no início do Século XX, à
habitação social apenas foram direcionados os programas dos Institutos de
Aposentadorias e Pensões, implantados a partir do Estado Novo. No período
Fig. 97: Distribuição percentual de domicílios segundo as classes de renda, PUB, 1968.
243
AS TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO 1960-1980
pós-1964, a atuação do Banco Nacional de Habitação provocou um divisor de
águas ao direcionar inicialmente seus recursos à construção de grandes conjuntos
na periferia da cidade, e posteriormente, ao subvencionar a compra da casa
própria para a classe média, financiando dessa forma, a verticalização dos bairros
do centro expandido da cidade, a partir da década de 1970.
Esses aspectos podem ser traduzidos da seguinte forma: o Sistema Financeiro de
Habitação utilizava os fundos de tempo de serviço da população (FGTS), que
eram geridos pelo BNH e os aplicava na política habitacional do regime pós-
1964. Se as taxas de inadimplência tivessem crescimento permanente, a única
forma de não provocar uma crise no FGTS (e com isso desestruturar toda a
cadeia ligada ao desenvolvimento imobiliário e construção civil) seria a de
subsidiar crescentemente a habitação social, transferindo renda para as classes
populares. Esse caráter social-distributivo, antípoda do modelo de acumulação
imposto pelo regime autoritário, certamente ocasionaria conseqüências à
estruturação urbana, podendo encaminhar mais recursos aos crescentes
problemas das favelas, cortiços e das periferias.
Entretanto, o BNH se constituiu como um banco e para que a insolvência dos
mutuários fosse minimizada, passou a direcionar os financiamentos àquelas faixas
de renda com condições de suportá-los, isto é, da renda média baixa e alta.
Com isso, não apenas se agravaram os problemas das classes populares em
relação à moradia e condições de vida, como parte dos recursos da poupança
de todos os trabalhadores registrados do país foram drenados para financiar a
classe média, o setor imobiliário e de construção civil, resultando essa cadeia na
verticalização do milagre”, como Someck a classificou (1997, 25).
No que se referiu à construção dos conjuntos do BNH, a atuação voltada às
classes de baixa renda dos órgãos federais, estaduais e municipais significou
uma negação dos problemas existentes nas áreas consolidadas, desencadeando
entre outras conseqüências:
1. A desarticulação entre políticas urbanas e a produção da cidade, que provocou
o agravamento dos problemas relacionados aos custos de implantação de infra-
estrutura e equipamentos sociais, a extensão da área urbanizada e aumento das
distâncias a serem vencidas cotidianamente pelos moradores.
2. A ausência de cuidados para com a qualidade de vida dos moradores e para
com o destino das áreas que receberam os conjuntos, aprofundando o processo
de especulação imobiliária resultante da criação de novas áreas vazias entre a
área urbanizada da cidade e os novos conjuntos (Andrade, Bonduki, orgs, 1993,
19).
Bonduki (1998, 282) indicou que graças à disseminação da auto-construção
impulsionadora do crescimento periférico, em 1970, 54% dos domicílios já eram
244
próprios e 38% de locação. Em 1950 esses números eram quase inversos, sendo
37% de domicílios próprios e 58% de locação
9
. O ítem “outras formas de
ocupação” cresceu numericamente de 23.290 domicílios (5% do total) em 1950,
para 101.877 (8% do total) em 1970, indicando possivelmente o crescimento
das favelas.
Ainda segundo Bonduki, a dinâmica do crescimento periférico justificou o pequeno
número de favelas que a cidade apresentava até a década de 1970. A contínua
transferência para o próprio trabalhador do encargo de construção de sua
habitação, associada à grande quantidade de terras para parcelamento nas
áreas periféricas, foram as matrizes dessa solução que fez frente à reduzida
participação de investimentos públicos e privados na produção da habitação
social e nas suas condições urbanas (idem, 313).
Em contraponto ao espraiamento urbano e suas implicações habitacionais e
ambientais, na área consolidada da cidade, particularmente nos bairros centrais,
a participação do poder público limitou-se, quando muito, a políticas
assistencialistas voltadas à população de baixa renda moradora de habitação
coletiva, visto os cortiços terem permanecido como única alternativa para essa
população nos espaços melhor equipados e estruturados da cidade.
Três formas de relação dos cortiços com o entorno urbano mostraram-se presentes
nos bairros junto à área central da cidade:
- Cortiços surgidos no período de consolidação dos bairros que se caracterizaram
por abrigar residências, majoritariamente populares, indústria e em menor escala,
comércio. Situados em bairros como Brás, Pari e Moóca, os mesmos revelam
semelhanças construtivas, sendo em sua maioria casas térreas construídas em
lotes estreitos.
- Cortiços existentes em área de urbanização antiga, anterior a 1930, onde
ocorreu processo de deterioração urbana relacionado ao incremento de atividades
terciárias, principalmente o de comércio atacadista, tornando desinteressante a
permanência de habitação das diversas camadas da população nesses bairros.
- Cortiços existentes em áreas de urbanização antiga que sofreram transformações.
Por essas mudanças não implicarem em alterações significativas dos imóveis,
estes passaram a se tornar interessantes para as camadas de renda média e
baixa, como por exemplo na Mooca e Barra Funda, mas também encontrados
na Consolação, Liberdade, Aclimação, Pinheiros e Perdizes. Em alguns casos,
como o da Barra Funda, mesmo o padrão da maioria das residências unifamiliares
se constituiu como médio-baixo e baixo, nessas áreas. (Sempla, 1985, 66/180).
Os motivos presentes no processo diferenciado de transformação dos bairros
centrais, já foram abordados anteriormente e sua produção se deveu à
acessibilidade provocada pelo Plano de Avenidas no setor sudoeste, que ao
245
AS TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO 1960-1980
Fig. 98 e 99: Mapa
temático, crescimento
populacional
246
mesmo tempo se constituiu no quadrante preferencial de moradia das faixas de
renda mais altas, atraindo o setor terciário avançado e toda uma rede de serviços
voltados à essa população, tais como educação, saúde, lazer, cultura e consumo,
como foi o caso dos shoppings centers. Tal setorização não apenas permaneceu
ao longo da década de 1980, como também foi reforçada nas seguintes pelo
surgimento de outros espaços caracterizados pelo seu direcionamento ao mercado
habitacional de elite e de funções corporativas.
Outra explicação presente quando são feitas comparações entre os bairros
próximos ao Centro, é a de que o intenso parcelamento do solo daqueles com
origem popular ou de renda média baixa se constitui em sinônimo de dificuldade
para a agregação de lotes necessária à verticalização. Essa relação entre o
aproveitamento vertical do solo e a estrutura fundiária, embora procedente, como
analisou Souza (1994, 237), deve ser complementada com desdobramentos
provocados por outros fatores, como:
1. A Lei de Zoneamento de 1972, no tocante à fixação dos coeficientes de
aproveitamento diferenciados e também pela consolidação dos usos e vocações
dos setores urbanos. Nesse sentido, a análise de Souza comprova a inviabilidade
de ocorrer a verticalização nas zonas Z2 em lotes com menos de 700 m², devido
as determinações da legislação e de taxa de ocupação, havendo portanto maior
procura de lotes com maior metragem quadrada na cidade. Assim, a mesma
autora mencionou a maior valorização das zonas Z3, em face do maior coeficiente
permitido e da procura para verticalização das áreas equipadas e valorizadas
(idem, 238).
Com a consagração das vocações urbanas pela Lei de Zoneamento, os espaços
com incidência de atividades atacadistas, indústrias e outras ocupações comerciais
de âmbito metropolitano viram reduzido o valor do solo urbano e rebaixada sua
atratividade para finalidade habitacional, uma vez que para o mercado imobiliário
os lucros de um empreendimento poderiam ser consideravelmente menores nas
áreas “não-nobres” da cidade, mesmo estando próximas à centralidade, devido
aos riscos ligados à demanda incerta e ciclo mais longo de retorno.
2. Os investimentos públicos diferenciados na produção da infra-estrutura urbana,
particularmente no sistema viário, o principal indutor das novas ocupações da
verticalização como foi visto no capítulo anterior. Tal aspecto é patente se
comparadas as reformulações urbanísticas de eixos como as avenidas
Consolação, Paulista, Faria Lima, todas a partir da década de 1960 e para o
caso das duas últimas, incorporando projetos destinados a não apenas ampliar
o fluxo de veículos, mas também implantando novas qualidades paisagísticas e
simbólicas àquelas vias.
De maneira diversa, além da quase inexistência de recursos públicos voltados à
reformulação da infra-estrutura viária para os bairros situados ao norte, nordeste
247
AS TRANSFORMAÇÕES DO PERÍODO 1960-1980
e leste da área central, quando foram executadas, direcionaram-se exclusivamente
à função de circulação e transporte, como no caso da avenida Tiradentes, após
a implantação da linha Norte-Sul do Metrô e da implantação do elevado Costa
e Silva, na região central e junto aos bairros Santa Cecília e Barra Funda, estes
situados a oeste do centro.
3. O direcionamento do mercado imobiliário que incorporou os investimentos
públicos em infra-estrutura, pressionou constantemente mudanças da Lei de
Zoneamento nas bordas das áreas mais valorizadas e “expandiu” o status das
mesmas para localizações próximas. Nesse caso, mesmo em bairros com o
parcelamento constituído de pequenos e médios lotes, a transformação tipológica
ocorreu através da substituição da ocupação horizontal pela paisagem vertical.
No período abordado, trechos inteiros de bairros como Itaim, Vila Olímpia,
Santana, Moema, Pinheiros, Santa Cecília e Mooca, entre outros, apresentavam
um grande número de edifícios sendo construídos para a classe média.
248
Notas:
1
Sobre o assunto ver “O II PND e a Política Urbana Brasileira: Uma Contradição Evidente” da
professora Maria Adélia A.de Souza em Deák, Schiffer (orgs)
2
“Na década de 1970, após o II Plano Nacional de Desenvolvimento - PND, iniciou-se um
processo de reversão da concentração industrial, associado à desaceleração do crescimento,
notadamente dos setores de bens de consumo duráveis e não duráveis. Dessa forma, os anos 70
caracterizaram-se pela redução do peso relativo da indústria metropolitana nos contextos estadual
e nacional” (Emplasa, 1994, 37).
Em 1975 impôs-se restrições às indústrias poluidoras na Região Metropolitana de São Paulo,
através do decreto lei nº 1413. Em 1978, a lei estadual nº 1817 instituiu o zoneamento industrial
que considerou as diretrizes de descentralização do I Plano Metropolitano de Desenvolvimento
Integrado – PMDI (Lagreca, 1999, 198)
3
Sobre o assunto: “A fonte de recursos desses investimentos governamentais foram empréstimos
concedidos pelo Banco Mundial, inicialmente através do programa norte-americano “Aliança
para o Progresso”. Para agenciar a alocação desses recursos, constituíram-se grandes empresas
estatais (responsáveis pelos diversos serviços de infra-estrutura), que passaram a alimentar uma
verdadeira rede de escritórios especializados na produção de megaprojetos e relatórios
intermináveis, destinados a justificar os empréstimos e intermediar interesses particulares”
(Sempla, 1990, 77)
4
Constituição das empresas participantes e dos órgãos financiadores:
As empresas participantes foram: ASPLAN S.A – Assessoria em Planejamento; Leo A. Daly
Company Planners-Architects-Enginieers; Montor Montreal Organização Industrial S.A; Wilbur
Smith & Associates.
Órgãos financiadores: Ministério do Planejamento e Coordenação Geral; Financiadora de
Estudos e Projetos S.A – FINEP; United States Agency for International Development – USAID
(PUB, 1968)
5
As administrações regionais foram considerados como unidades urbanas pelo PUB, que incluiu
também os distritos . Em 1965 foram criadas 7 ARs, em 1968 existiam 11 e o Plano propunha
uma ampliação para 16 administrações regionais, proposta também existente no SAGMACS
(Sócrates, 1993, 254).
6
Nesse sentido, a proposta de Plano Diretor de 1985 analisou que a Marginal do rio Pinheiros e a
avenida Nações Unidas, ao sediar um novo centro terciário avançado, provocaram a expansão
residencial de Santo Amaro e Campo Limpo, ao invés da zona leste, como propunham as
diretrizes do Plano (Sócrates, 1993, 34)
7
Lei n° 7.805, de 1° de novembro de 1972, promulgada pelo prefeito nomeado José Carlos de
Figueiredo Ferraz.
8
Dados constantes do Cadastro Territorial, Predial, Conservação e Limpeza – TPCL, da
Secretaria Municipal de Finanças.
9
Em números absolutos, no ano de 1950 São Paulo contava com 264.174 domicílios ocupados
por locatários e 167.953 ocupados por proprietários. No ano de 1970 a cidade contava com
486.472 domicílios ocupados por locatários contra 683.830 ocupados por proprietários (Bonduki,
1998, 282)
249
P
ERÍODO
1980-
DÉCADA
2000:
AS RELAÇÕES PRESENTES NA CIDADE
CC
CC
C
APÍTULAPÍTUL
APÍTULAPÍTUL
APÍTUL
OO
OO
O
4: 4:
4: 4:
4:
PP
PP
P
ERÍODOERÍODO
ERÍODOERÍODO
ERÍODO
1980 - 1980 -
1980 - 1980 -
1980 -
DÉCADDÉCAD
DÉCADDÉCAD
DÉCAD
AA
AA
A
DEDE
DEDE
DE
2000: 2000:
2000: 2000:
2000:
ASAS
ASAS
AS
RELAÇÕESRELAÇÕES
RELAÇÕESRELAÇÕES
RELAÇÕES
PRESENTESPRESENTES
PRESENTESPRESENTES
PRESENTES
NANA
NANA
NA
CIDCID
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CID
ADEADE
ADEADE
ADE
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251
P
ERÍODO
1980-
DÉCADA
2000:
AS RELAÇÕES PRESENTES NA CIDADE
4. P4. P
4. P4. P
4. P
eríodo 1980 – década 2000: as relações presentes na cidade.eríodo 1980 – década 2000: as relações presentes na cidade.
eríodo 1980 – década 2000: as relações presentes na cidade.eríodo 1980 – década 2000: as relações presentes na cidade.
eríodo 1980 – década 2000: as relações presentes na cidade.
A tarefa de sintetizar transformações urbanas no período agora abordado, não
é de fácil execução, considerando se tratar de um processo ainda em curso e
com aspectos múltiplos e interconectados. A diferença está entre o distanciamento
existente em relações das outras etapas, que permitiu divisar com maior clareza
os agentes participantes, os cenários produzidos e as conexões entre a cidade e
externalidades político e econômicas. Para o período agora enfocado, as
transformações urbanas produziram situações que, embora concretas e traduzidas
espacialmente, ainda apresentam e apresentarão desdobramentos, seja por
motivos da dinâmica social e imobiliária, seja por escolhas ou decisões urbanísticas
ou institucionais.
Por essas razões, a análise agora desenvolvida enfoca as linhas gerais da abertura
da economia brasileira ao mercado mundial e se volta às principais decorrências
dessa dinâmica na cidade: a desconcentração industrial, o crescimento do setor
terciário e o recrudescimento da exclusão social. Esses temas, presentes em
numerosas análises das ciências sociais, da economia e do urbanismo, traduziram-
se concretamente em novas espacialidades, integradas ou não à cidade
consolidada.
Com relação a esse quadro, Spósito analisou a dinâmica da trama urbana
constituída de várias centralidades em definição e diferentes periferias em
constituição” e destacou três processos que redefiniram o uso do solo no interior
das cidades, que podem ser relacionadas à analise aqui desenvolvida para São
Paulo:
- a lógica de comportamento espacial das empresas industriais.
- definição de novas configurações do habitat humano, que incluíram desde os
grandes conjuntos construídos para a baixa renda na periferia da cidade à
loteamentos fechados, apresentados como paraísos habitacionais em que se é
facultado viver fora ou dentro da cidade.
- a estratégia de localização dos equipamentos de consumo de bens e de serviços,
que potencializam fluxos para setores da cidade e novos preços das localizações
assim produzidas. Incluem-se nesse caso os shopping centers, centros de exposição
e convenções, centros empresariais, etc. (Spósito apud Damiani, (org), 2001,
90).
Na década de 1980 transformações estruturais começaram a ser introduzidas
na orientação macro-econômica brasileira, com o esgotamento do modelo de
substituição de importações que caracterizou a industrialização desde fins da
década de 1940, produzindo reflexos na cidade de São Paulo, tanto espaciais
quanto em relação aos empregos. Chamada de “década perdida”, devido às
crises de acumulação, aos fugazes períodos de crescimento e alta inflação, ocorreu
252
nesse período o início de um ajuste que se aprofundou nas décadas de 1990 e
2000, que foi caracterizado por três condicionantes:
1. A exigência de qualificação dos recursos humanos
2. A difusão e incorporação pela industrialização de novas tecnologias
3. Novas formas de divisão do trabalho e cooperação, introduzindo a flexibilização
de prestação de serviços, automação, reengenharia e a entrada de tecnologia
nos processos de gerenciamento (Sempla, 1990, 20; Rolnick, 2001, 62)
O processo de transformações ocorrido na cidade no período 1980-década de
2000 será sintetizado através das dinâmicas caracterizadas a seguir.
253
PERÍODO 1980-DÉCADA 2000: AS RELAÇÕES PRESENTES NA CIDADE
44
44
4.
1. Habitação e o mercado imobiliário1. Habitação e o mercado imobiliário
1. Habitação e o mercado imobiliário1. Habitação e o mercado imobiliário
1. Habitação e o mercado imobiliário
O quadro observado no período posterior à década de 1980 mostra a diferença
acentuada entre as apropriações pelas classes sociais relacionadas à habitação.
Enquanto a valorização do solo da área consolidada produzida pela infra-estrutura
e rede de serviços instaladas induziu à ampliação do aproveitamento vertical, a
explosão do crescimento periférico e dos cortiços nos bairros centrais denunciaram
as condições de empobrecimento de amplas camadas da população, mostrando
reflexos em quase todos os distritos da cidade.
Em contraponto ao crescimento da verticalização da classe média, a extinção
do BNH em 1986 implicou na redução de investimentos públicos para habitação
social. Durante o período 1973-1986, em decorrência da política econômica
brasileira e da incapacidade do Sistema Financeiro de Habitação atender a
demanda por moradias, São Paulo apresentou um crescimento das favelas de
mais de 1000%, com quase um milhão de favelados distribuídos em 1600 núcleos
pela cidade (Sempla, 1985, 14).
Outro aspecto crítico associado à incapacidade de atendimento das demandas
habitacionais foi o fenômeno observado, desde a década de 1960, relacionado
ao declínio do número de moradores dos bairros centrais, onde a transferência
da população de baixa renda para localidades periféricas permaneceu um dado
presente na expansão centrífuga da cidade, em que a possibilidade de auto-
construção e aluguéis mais baixos foram os atrativos. Rolnick (2001, 67) atribui
ao fenômeno a continuidade da exclusão territorial presente na cidade. Observou-
se, na realidade, um duplo movimento em relação a esse processo:
- o mapa de cota residencial por distritos mostra que os índices mais altos de metros
quadrados de área construída residencial por habitante, encontrados nos distritos
do centro expandido, se associam à diminuição demográfica desses mesmos setores:
Faixa 90,0 m² ou mais: distritos Morumbi e Jardim Paulista
Faixa 65 a 89 m²: Santo Amaro, Campo Belo, Itaim Bibi, Moema, Pinheiros,
Alto de Pinheiros
Faixa 43 a 64,9 m²: Vila Andrade, Butantã, Vila Leopoldina, Lapa, Perdizes,
Santa Cecília, República, Bela Vista, Liberdade, Vila Mariana, Saúde, Mooca,
Tatuapé.
Faixa 25 a 42,9 m²: Sé, Barra Funda, Bom Retiro, Brás, Pari, Belém, Ipiranga,
Cursino, Vila Prudente, Água Rasa, Carrão, Vila Formosa, Vila Matilde, Penha,
Casa Verde, Santana, Vila Guilherme, Mandaqui e Tucuruvi.
Faixa até 24,9 m²: os demais distritos do município
- além disso, o processo de esvaziamento dos bairros centrais foi diferenciado
em relação às regiões aonde a habitação já vinha perdendo espaços para o
254
comércio e serviços e que não houve interesse do mercado imobiliário na
produção de novas unidades, dadas as condições urbanas presentes ou às
dificuldades de financiamento para as camadas de baixa renda. Um estudo da
Secretaria Municipal de Planejamento mostrou que o fenômeno se constituiu em
um processo combinado: ocupação horizontal nas bordas da cidade e aumento
das taxas de ocupação em cortiços e habitações precárias, como mostram os
dados a seguir:
. Na década de 1960-1970, 84% do crescimento populacional ocorreu na
periferia.
. Na década de 1970 -1980, 86% desse crescimento foi registrado nos distritos
mais distantes do Centro.
Fig. 100: Emplasa / Sempla, 2000
255
PERÍODO 1980-DÉCADA 2000: AS RELAÇÕES PRESENTES NA CIDADE
. Entre 1980 e 1987, o mesmo índice decresceu para 69%, com o aumento de
11% da população nos anéis central e interior, em relação à 1% na década de
1960 e 7% na década de 1970 (Sempla, 1990, 36).
Embora indicasse diminuição relativa do crescimento das áreas periféricas de
São Paulo durante a década de 1980, o quadro da distribuição da população
no município resultante do Censo de 2000 mostrou o recrudescimento dessa
expansão, aliada ao esvaziamento dos distritos centrais:
- De 1991 a 2000 a região central perdeu 19,7% dos moradores, enquanto a
cidade cresceu 7,8%
- 53 dos 96 distritos da cidade perderam população desde 1991
- Enquanto os distritos centrais perderam moradores, no extremo Oeste, o distrito
Anhanguera ganhou 210% desde 1991 (FIBGE/FSP 10/5/2001,C1).
Esse processo pode ser entendido levando em conta três aspectos principais,
segundo o observado por três urbanistas (Carlos Guilherme Mota, Luís Carlos
Costa e Raquel Rolnick):
- A incapacidade da maioria da população arcar com os custos dos
empreendimentos imobiliários do mercado formal.
- Mudança de uso dos imóveis nas áreas próximas ao centro.
- Deterioração do espaço urbano nessas áreas (FSP, 10/5/2001, C1).
Nos espaços em que ocorreu um grande número de empreendimentos imobiliários
para a camada de poder aquisitivo mais alto como Tatuapé e Morumbi, a
população moradora original foi obrigada a se transferir.
Outros aspectos presentes na ocupação habitacional da cidade, que contribuíram
para o agravamento das condições de moradia foram o aumento do número de
domicílios desocupados, revelado também pelo Censo de 2000 e o crescimento
da informalidade urbana. Outra matéria jornalística compilada a seguir, mostra
a extensão desses problemas:
“12% dos domicílios estão desocupados”
A cidade de São Paulo tem um domicílio particular vago para cada dez existente
em seu território...
De acordo com o Censo 2000, são 3,551milhões de domicílios particulares no
município, dos quais exatos 420.327 estão vagos. O montante equivale a quase
12% do total e seria suficiente para dar a cada morador de rua da cidade (9.000
hoje), 47 imóveis para morar...
Segundo Luiz Carlos Costa, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da
Universidade de São Paulo, esse é o resultado do divórcio entre a valorização
imobiliária e o poder aquisitivo...
256
A solução, segundo urbanistas, passaria por incentivos diversos vindos do poder
público, inclusive fiscal, para a ocupação desses imóveis por famílias de renda
mais baixa...
Segundo a urbanista Raquel Rolnik, está claro que o mercado não foi capaz de
resolver a contradição entre oferta e demanda...
O distrito com mais domicílios vagos é Sapopemba (9.073 domicílios).
Percentualmente quem lidera é a Sé com 26,84% dos domicílios vagos. O centro
conta com 6% do total de domicílios, mas conta com 9% do total de vagos...
Segundo o Censo 2000 comparado com o de 1991, mostra que a população da
cidade cresceu apenas 7,87% enquanto o número de domicílios particulares saltou
para 39,82%. Isso ocorre devido as famílias nucleares e extensas se desmembraram
em indivíduos que optam por viverem sozinhos e, então, multiplicam-se as
habitações mais rapidamente do que a população”. (JT, 26/3/01).
Distanciada do divórcio entre a valorização imobiliária e o poder aquisitivo das
massas de baixa renda, a verticalização para a classe média caracterizou a
atuação do mercado imobiliário em quase todos os setores do centro expandido
da cidade: no Leste, nos bairros do Tatuapé e Penha, ao norte, em Santana, ao
oeste, Perdizes, Pompéia e Lapa, ao sul, na região de Vila Mariana, Moema e
Santo Amaro e ao sudoeste, no Itaim, Pinheiros, Cerqueira César e Vila Madalena.
Excetuando o quadrante sudoeste, parte do crescimento vertical das outras regiões
pôde ser atribuído também à acessibilidade criada pelas linhas do Metrô
implantadas nessas áreas nas décadas de 1970 e 1980, que se somaram ao
sistema viário implantado anteriormente.
Segundo dados da Emplasa/Sempla (2000/2001), os maiores índices de
verticalização residencial no período 1991-1999 ainda se encontravam na região
da cidade considerada central, abarcando os distritos Sé, República, Santa Cecília,
Bela Vista, Consolação e Jardim Paulista, todos apresentando índices próximos
ou superiores a 90%.
Com índices entre 50 e 75%, situaram-se os distritos de Vila Mariana, Moema,
Itaim-Bibi, Pinheiros, Barra Funda , Bom Retiro, Brás, Cambucí e Liberdade,
além de Campo Belo, Saúde, Cursino, Vila Andrade e Vila Sônia.
Os distritos que apresentaram ao longo da década de 90 percentuais significativos
de crescimento vertical foram: Vila Andrade (crescimento de 22%), Vila Sônia,
Morumbi, Vila Leopoldina, Casa Verde, Mandaqui, Tatuapé (crescimento de 18%)
(disponível em:Cd-rom Emplasa/Sempla, 2000).
No período posterior a década de 2000, dando continuidade às tendências da
década de 1990, mas com diminuição da verticalização da área central, segundo
dados divulgados sobre os lançamentos de edifícios, as áreas preferenciais
incluíram um território da cidade de aproximadamente 1.500 km² , abrangendo
a Vila Andrade, Moema, Santo Amaro, Campo Limpo, Lapa, Butantã, Barra
257
PERÍODO 1980-DÉCADA 2000: AS RELAÇÕES PRESENTES NA CIDADE
Funda, Tatuapé e Parque do Carmo. Visando a proximidade com bairros já
verticalizados de padrão médio e alto, as localizações junto à Lapa e Vila Romana
foram classificadas no ano de 2002 como as preferenciais para verticalização,
já que seriam beneficiadas com a saída das indústrias existentes na região (FSP/
Embraesp, 20/01/2002, pag 2).
A lógica imobiliária se implantou nas diferentes regiões da cidade levando em
conta elementos específicos de atratividade e valorização a cada uma delas:
Fig. 101: Emplasa / Sempla, 2000
258
Mono mono mono
Fig. 102: Folha de São Paulo, caderno de Imóveis 2, de 20/02/02
259
PERÍODO 1980-DÉCADA 2000: AS RELAÇÕES PRESENTES NA CIDADE
Na zona oeste: segundo a construtora Klabin Segal “a cidade irá crescer para
onde resta lugar. A Vila Romana tem potencial para funcionar como uma
continuação de Pompéia, Perdizes e Lapa”. Com relação a Barra Funda, ainda
segundo a empresa, as transformações ocorridas na Água Branca seriam os
elementos de atração àquele bairro, semelhantemente o ocorrido com a Vila
Olímpia, para o caso da reestruturação urbana (idem, 2).
Na zona sul: as obras viárias previstas na Operação Urbana Águas Espraiadas,
como a ligação entre as avenidas Chucri Zaidan e João Dias, tornaram-se as
indutoras da verticalização da Chácara Santo Antonio, transformando-se em
uma continuação da Berrini e do Brooklin, segundo a empresa imobiliária Abyara
(ibidem, 2).
Segundo a pesquisa realizada no ano de 2002 sobre o mercado imobiliário, a
cidade apresentou 9.723 ofertas de apartamentos novos. Nesse universo, a menor
participação foi representada pela zona central, que devido a saturação do
espaço para construções verticais, participou com apenas 3,4%. A zona sul, por
sua vez, com maior extensão territorial (724 km²), concentrou a maior parte dos
lançamentos, 37,9%, sendo que o bairro do Itaim Bibi participou majoritariamente
com 9,5% (op.cit, 2).
De acordo com os consultores das empresas imobiliárias, os elementos de infra-
estrutura e as Operações Urbanas se constituiriam nos principais fatores de
incentivo à verticalização. Assim ocorreu também para os distritos a leste, como
o de Itaquera, com 36 lançamentos e o do Tatuapé com 26, no período
compreendido entre dezembro de 1999 e novembro de 2001, onde o Metrô se
tornou elemento indutor à ocupação. Com o lançamento da Linha 4, o mercado
imobiliário já projetava a intensificação vertical na Vila Sônia. Para o mesmo
período, foram verificados 74 lançamentos no Morumbi, 35 no Butantã, 34 no
Campo Limpo e 26 em Moema (op. cit 2).
Confirmou-se, portanto, a tendência de concentração de lançamentos
habitacionais nos quadrantes em que o processo de valorização imobiliária já se
fazia presente desde as décadas de 1970 e 1980, estendendo-se para novos
distritos e bairros nas décadas seguintes. No Brás, Bom Retiro e Pari, entretanto,
pode-se considerar que a verticalização apresentou-se como exceção,
restringindo-se a exemplares isolados, como os indicadores populacionais e de
lançamentos já demonstraram. No primeiro bairro deve-se mencionar a
construção, em meados da década de 1980, do grande conjunto de torres da
COHAB ao longo da área demolida pelo projeto Cura na década de 1970. De
toda a forma, esses distritos serão analisados mais profundamente na Parte II
deste trabalho, uma vez que juntamente com transformações que podem ser
notadas atualmente, os novos instrumentos de planejamento urbano poderão
260
alterar a dinâmica de ocupação nesses espaços, promovendo o adensamento
habitacional para distintas faixas de renda da população.
Fig. 103: Duas torres construídas no Canindé, junto ao Morro do Pari,
2000/2003.
261
PERÍODO 1980-DÉCADA 2000: AS RELAÇÕES PRESENTES NA CIDADE
4.2 A cidade e as novas ocupações industriais e de serviços4.2 A cidade e as novas ocupações industriais e de serviços
4.2 A cidade e as novas ocupações industriais e de serviços4.2 A cidade e as novas ocupações industriais e de serviços
4.2 A cidade e as novas ocupações industriais e de serviços
O fim da proteção ao parque industrial brasileiro, que foi mantida durante o
longo período do regime militar, resultou na reconversão industrial que a cidade
experimentou, com grandes diferenças entre o processo de descentralização
desse setor ocorrido na década de 1970. Nesta nova etapa, as inovações
representaram para a indústria um aumento de valor da produção acompanhado
de diminuição de empregos (Sempla, 1990, 20).
Essa dinâmica se apresentou como qualitativamente diferente dos momentos
anteriores, onde a estrutura industrial presente na cidade e os setores de construção
civil, do comércio e serviços garantiram acesso aos empregos, quer especializados
ou não. Da segunda metade da década de 1980 em diante, seguiu-se uma
transferência de colocações de trabalho nos setores da economia, resultante da
reestruturação ocorrida, como indicam os dados a seguir:
- Entre 1988 e 1998 houve uma diminuição da atividade industrial no Município
de São Paulo, que caiu de 29,1% para 17,8%, respectivamente (Dieese apud
Ferreira, 2003, 64).
- No mesmo período, o desemprego subiu de 8,2% para 17% (idem)
- O aumento do setor de serviços cresceu de 51,3% para 62,4% entre 1988 e
1998 (PMSP apud Ferreira, 2003, 64)
- Os empregos do setor de serviços subiram de 41% em 1989 para 54,8% em
1999 (Veras apud Ferreira, 2003, 64).
-Em 1999 17,8% da mão-de-obra empregada vinculava-se à indústria de
transformação, 2,4% à construção civil e 79% ao setor de comércio e serviços
(Sempla 2000/2001, vol 3, 14)
Fruto desse quadro de mudanças estruturais, as transformações no interior da
cidade puderam ser observadas fundamentalmente através dos seguintes
elementos:
- Esvaziamento das áreas industriais tradicionais, principalmente daquelas
espacialmente ligadas às ferrovias. Essa transformação teve início na década de
1980 aprofundando-se na seguinte, onde as empresas que ocuparam as faixas
da industrialização pioneira ao longo dos eixos ferroviários ou em bairros
próximos, como Brás, Mooca, Ipiranga e Lapa, transferiram-se ou cessaram de
funcionar devido ao conjunto de fatores da lógica produtiva. Pesaram nessas
mudanças as relações com transporte, localização em áreas sempre
congestionadas e as características construtivas: porte incompatível com os ajustes
impostos pela “reengenharia”, obsolescência e inadequação das instalações frente
às novas exigências produtivas e da legislação municipal e estadual para o setor, etc.
262
- Relocação industrial para o interior do estado ou nas cidades próximas da Região
Metropolitana. Embora o aprofundamento do processo de reestruturação da
economia tenha efetivamente reduzido o número de empresas industriais, segundo
estudo da Secretaria Municipal de Planejamento, a relocação significou uma maior
flexibilidade de localização ao invés de perda de poder do centro de decisões,
que no caso da cidade de São Paulo (Sempla, 1990, 22).
Nesse sentido, diferentemente da hierarquia estabelecida por uma grande
concentração industrial em relação aos demais municípios ou regiões, como
ocorreu, o centro de decisões passou a exercer a sua liderança devido aos atributos
de competitividade implantados, resultando daí a exigência de qualificação dos
recursos humanos, serviços industriais especializados e setores financeiros e
gerenciais integrados. Nesse sentido, o estudo da Sempla afirmava que: “a
evolução tecnológica, baseada crescentemente em meios sofisticados de
comunicação, com plantas industriais flexíveis e integradas horizontalmente, ao
mesmo tempo que torna a produção menos enraizada, reserva o papel de liderança
exatamente no local onde estas inovações são geradas e difundidas” (idem, 22).
O tempo confirmou essa assertiva e São Paulo continuou a exercer o papel de
centro de decisões, assim como ocorreu em grandes centros internacionais em
que a cadeia produtiva baseada no Fordismo e no Taylorismo cedeu ante os
novos padrões tecnológicos, de cooperação e divisão do trabalho (ibidem, 22).
Aludindo a esse processo, Rolnick inferiu que a cidade chamada de locomotiva
do progresso brasileiro na segunda metade do século XX, transformou-se após
essa reestruturação “em um dos nós da conexão da economia nacional com o
resto do mundo” (Rolnick, 2001, 63).
O processo de reconversão industrial que se implantou, além de provocar o
esvaziamento e mesmo o sucateamento de grande parte das instalações industriais,
e por conseguinte dos bairros em que estas se implantaram, implicou em um
desdobramento dos espaços do terciário avançado para além dos limites anteriores,
dirigido pelas necessidades ditadas pela crescente internacionalização econômica.
As linhas gerais desse processo, aqui descritas sinteticamente, servem de referência
às decorrências espaciais ocorridas na cidade a partir de então, que verificou:
- O aprofundamento da “crise” da área central (aspas nossas), expressa pela
transferência de empresas e estabelecimentos comerciais para as novas
localizações, com maior prestígio urbano, apesar da área ter sido alvo de
constantes investimentos públicos, como foram as obras do Metrô e
pedestrianização do Centro. Esse processo, em curso desde a década de 1960,
aprofundou-se nas seguintes e as intervenções que ocorreram se restringiram
em sua quase totalidade às exigências de circulação e transportes (Amadio,
1998, 131). Com relação à transferência de atividades para outras áreas da
cidade, Villaça analisou que: “a suposta deterioração do centro (inclusive suas
263
PERÍODO 1980-DÉCADA 2000: AS RELAÇÕES PRESENTES NA CIDADE
dimensões política e ideológica) é antes de mais nada, uma questão de
transformação de localizações. O que supostamente ‘deteriorou’ não foram os
edifícios, mas os seus ‘pontos’. O que deteriorou não foi o Martinelli enquanto
edifício, mas o seu ponto” (Villaça apud Amadio, idem, 131, aspas do autor).
Esse quadro remete à continuidade do processo de substituição de localizações
imposto pelo setor de serviços e o mercado imobiliário ao conjunto da cidade,
pois mesmo a aprovação da Operação Urbana Centro em 1997, não acarretou
qualquer alteração de rota do poder público ou da iniciativa privada na área
central até o ano de 2001, quando a requalificação da área central foi retomada,
incluindo nessa estratégia os bairros que o circundam, como será abordado adiante.
- O setor de serviços avançados, por sua vez, desdobrou-se dos espaços por ele
estruturados e consagrados desde a década de 1960: a região da avenida
Paulista e a avenida Faria Lima. Esse movimento, dirigido pelas atividades de
ponta das corporações transnacionais, incluindo indústrias de alta tecnologia, o
setor financeiro e empresas de consultoria, auditoria, seguros e agências,
direcionou-se a espaços da cidade com ampla flexibilidade para a implantação
de grandes conjuntos empresariais e de atividades a eles conectados.
Essas áreas foram enfocadas nas teses de doutorado de Van Wilderode (2000) e
Whitaker Ferreira (2003) e serão abordadas também na análise sobre as
Operações Urbanas desenvolvida adiante. As teses mencionadas aprofundam a
investigação sobre os espaços corporativos conectados à economia globalizada,
situados na região da marginal do rio Pinheiros, assim como outro trabalho da
Fig. 104: Emplasa / Sempla, 2000
264
Secretaria Municipal de Planejamento (2000/2001) também mostra a
concentração de edifícios “inteligentes” como fruto da relação da globalização
e desenvolvimento urbano que a cidade apresentou nesse período.
A incorporação de áreas para a construção de edifícios de escritórios nas avenidas
Faria Lima, Luis Carlos Berrini e Nações Unidas, constituiu um vetor de nova
expansão do mercado imobiliário para o sudoeste, implicando também na
implantação de infra-estrutura por parte do poder público nessas áreas. Com
relação à região da Berrini e Nações Unidas, como mostra Wilderode, cerca de
quase dois milhões de metros quadrados para escritórios com características do
marketing imobiliário de “edifícios inteligentes”, foram incorporados entre 1980
e 1999. No início da década de 1980, a avenida Paulista ainda concentrava
mais da metade desses edifícios, sendo que uma década depois, dois terços dos
mesmos situavam-se na maior concentração desses espaços da cidade, a avenida
das Nações Unidas (Wilderode, 2000, 208).
Segundo o autor, dois fatores sustentaram as transformações ocorridas quanto à
propriedade imobiliária: a gradual perda de importância da ocupação pelo
proprietário corporativo, processo que passou a existir após a década de 1980
e o desenvolvimento de outras formas de participação entre propriedade e uso,
o que direcionou parte da demanda para edifícios de alto padrão e para a
direção dos espaços de aluguel. (idem, 221, 223).
Na raiz da emergência dos novos espaços do setor terciário avançado, várias
estratégias mercadológicas se entrelaçaram, como pode ser observado a seguir
pelas informações compiladas de matéria jornalística intitulada “Marketing
‘inventou’ núcleo comercial da marginal Pinheiros”:
“Segundo uma tese da FAU-USP, a ocupação da região da marginal Pinheiros por
grandes empreendimentos comerciais é fruto de uma estratégia de marketing da
indústria imobiliária (sic). Afirma também que no período de 1975 a 1998, o
crescimento da importância da marginal coincide com o início da decadência do
centro e com a migração de companhias e de instituições públicas.
A marginal passa a ser comercializada pelos promotores imobiliários como ‘centro
metropolitano do futuro’ – e não outros centros como as avenidas Paulista e
Brigadeiro Faria Lima.
O levantamento, feito pelo professor Eduardo Alberto Nobre, revelou que, em
1975, 54% tinham como endereço o centro, 14% a avenida Paulista, e 11%, a
marginal Pinheiros. Em 1998, 41% delas já estavam na marginal, 21%, na Paulista,
e apenas 18%, na área central.
Nobre também analisou o discurso de incorporadoras e concluiu que a
‘insegurança’ foi destacada para criar ‘uma imagem negativa do centro’ e ‘atrair
o cliente corporativo para outras regiões’...
Em 1971, a marginal não tinha obras de drenagem e abrigava moradias de
média renda e pequenos focos industriais. O arquiteto Carlos Bratke, autor dos
265
PERÍODO 1980-DÉCADA 2000: AS RELAÇÕES PRESENTES NA CIDADE
primeiros prédios da região, conta que chegou a estudar a Barra Funda, mas
escolheu a marginal pelo baixo custo dos terrenos, por ser próxima ao Morumbi,
pela topografia plana e pelos projetos viários que seriam construídos.
Ele diz que o início foi como um ‘balão de ensaio’: ‘Compramos um terreno e
deu certo, compramos mais um e deu certo’. Mas reconhece a importância dos
‘formadores de opinião’ nas fases seguintes da ocupação. ‘É muito importante
que se lance a coisa. Alguém influente tem que chegar e dizer: o chique é a
marginal. É assim que acontece” (FSP, 30/11/2003, Imóveis 1, pag1, aspas do
editor ).
Outro registro fornece dados sobre a expansão do mercado imobiliário no setor
de escritórios de alto padrão, baseados nas análises de empresas de consultoria
especializadas nesse segmento:
Fig. 105: Emplasa / Sempla, 2000
266
- Segundo a consultoria “Cushman & Wakefield Semco”, o primeiro trimestre do
ano de 2003 apresentou uma retomada de resultados positivos na absorção
desses imóveis, visto ter se verificado um recuo da alta vacância e aumento da
demanda. Segundo a empresa, nesse período foram absorvidos 181mil m² úteis,
sendo 69 mil m² na região da avenida engenheiro Luís Carlos Berrini e da Vila
Olímpia. O ano de 2000 foi indicado como o período de maior expansão desse
setor pelos seguintes motivos: “havia pouco novo estoque e alta demanda gerada
pelas companhias ‘ponto com’, o que acarretou na construção de novos
empreendimentos”. Segundo o diretor de negócios imobiliários dessa empresa
(Paul Weeks), a concepção de novos edifícios foi feita de maneira pontual, sem
análise de longo prazo. O resultado foi um aumento de estoque representado
no ano de 2002, por mais de 200 mil m² nesse segmento. (Gazeta Mercantil,
15/7/03, A17).
- A empresa de consultoria, a “Jones Lang LaSalle”, indicou que a cidade dispunha
de um total de 450 mil m² úteis vazios em escritórios de classe A e AA. Para
2003 previam-se 170 mil m² e em projeto mais 760 mil m², sendo que 40%
desse total entrariam no mercado até 2006 e o restante até 2008. Segundo o
diretor de operações dessa empresa (Helmut Fladt), o mercado de escritórios
começou a se renovar a partir de 1993, quando “antes disso, a cidade não tinha
prédios inteligentes, eram edifícios com lajes pequenas e a maioria dos
empreendimentos comerciais estava concentrada na região da avenida
Paulista(idem, A17).
Ligado à expansão das atividades do terciário, segundo a empresa “Cushman Wakefield
Semco” o setor de escritórios apresentou um estoque no ano de 2002 de 7,75 milhões
m², sendo 53,3% da categoria C. Entretanto, a mesma consultoria aponta que o
segmento de escritório da categoria A e AA teve crescimento a partir dos primeiros
anos da década de 1990, quando segundo a empresa “os empreendimentos
começaram a agregar valor por conta da demanda do mercado” (ibidem, A17).
Fig. 106: Novo cartão postal: Marginal Pinheiros, altura da Av. Águas Espraiadas, 2000.
267
PERÍODO 1980-DÉCADA 2000: AS RELAÇÕES PRESENTES NA CIDADE
4.3. Operações Urbanas: remodelações dirigidas e espacialidade corporativa4.3. Operações Urbanas: remodelações dirigidas e espacialidade corporativa
4.3. Operações Urbanas: remodelações dirigidas e espacialidade corporativa4.3. Operações Urbanas: remodelações dirigidas e espacialidade corporativa
4.3. Operações Urbanas: remodelações dirigidas e espacialidade corporativa
Um aspecto relevante ao uso e ocupação do solo das áreas consolidadas da
cidade, surgido no período posterior à década de 1980, diz respeito às Operações
Interligadas e Urbanas, que se constituíram em instrumentos baseadas no conceito
de solo criado e fundamentaram-se na obtenção de recursos para obras urbanas
através de parcerias com o setor privado. As primeiras, as Operações Interligadas,
foram aprovadas em 1986, vigorando até 1998, quando foram julgadas
inconstitucionais. Esse instrumento introduziu um mecanismo de contrapartida
para a municipalidade da valorização decorrente do aumento do potencial
construtivo permitido, conforme a situação requerida pelo empreendimento. Essa
exceção à legislação do zoneamento, através do aumento do coeficiente de
aproveitamento de um empreendimento, seria convertida em pagamento de um
número estipulado de habitações de interesse social destinado à população
favelada (Sempla, 2000/2001, n°4, pg.5).
Os projetos dos empreendimentos eram submetidos à Secretaria Municipal de
Planejamento e as licenças de aprovação ocorreram mediante as condições
definidas pela Comissão Normativa de Legislação Urbanística – CNLU, da
mencionada Secretaria. Inúmeras críticas foram feitas ao processo como um
todo, sendo a principal, aquela que se referia à contrapartida destinada à
Habitação Social, que em muitos casos não possibilitava nenhuma transformação
da situação das favelas, dado o número reduzido de unidades que se obtinha
através desse instrumento.
Já as Operações Urbanas, formuladas em 1985, foram incluídas na Lei Orgânica
do Município de São Paulo apenas em 1989, e consistiram no estabelecimento
de uma estratégia público/privada para a renovação de partes do território da
cidade, onde a potencialidade de desenvolvimento poderia ser ampliada através
de investimentos da municipalidade, concentrando para o local os interesses
dos agentes privados (idem,6).
A participação pública foi vinculada à oferta de infra-estrutura suplementar e às
ações voltadas à reversão dos aspectos de desqualificação ambiental, seja em
função da obsolescência dos elementos construídos ou seja em função das
limitações impostas pela legislação do zoneamento. O instrumento de geração
de recursos das Operações Urbanas, necessários para o custeio das melhorias
públicas, se constituiu em uma concessão onerosa às exceções da normatização
urbanística: esse mecanismo teria como ponto de partida a fixação de novos
parâmetros para os coeficientes de aproveitamento de cada lote, em uma
determinada área de interesse. O novo potencial permitido passaria a ser utilizado
pelos proprietários de imóveis ou agentes imobiliários mediante o pagamento
de contrapartida financeira, cujo montante seria reempregado na própria área-
foco da Operação Urbana. Esse instrumento previa um estudo específico para
268
definição dos objetivos e diretrizes urbanísticas, devendo também ser
regulamentado sob a forma de lei (ibidem, 6).
A operação urbana Anhangabaú foi a pioneira, datando de 1991 e se aplicou
a um perímetro de quadras envoltórias do Vale, então em fase conclusiva das
obras de reurbanização. Após três anos de vigência e não apresentando os
resultados esperados de atração dos interesses imobiliários, seu prazo se extinguiu.
Foi seguida pelas Operações Urbanas Faria Lima e Água Branca, de 1995 e
Centro, de 1997 (op.cit, 5). Desde a primeira, a gestão das Operações Urbanas
passou a ser atribuição da Empresa Municipal de Urbanização – Emurb.
Essas Operações Urbanas tiveram resultados bastante diferenciados, em relação
aos objetivos propostos: a Operação Urbana Centro não logrou a pretendida
requalificação da Área Central, mesmo incorporando incentivos para a construção
de edifícios com coeficientes de aproveitamento, que em alguns casos, chegava
a doze vezes a área do terreno. Apenas a partir do ano de 2001, esse instrumento
foi submetido a estudos de revisão de suas diretrizes, passando a fazer parte de
outras estratégias de reabilitação urbana. Observando a sua aplicação no
transcorrer de quatro anos desde sua aprovação, é possível inferir que “...as
limitações à reversão do processo de deterioração e desqualificação do Centro,
apontado pelo próprio mercado imobiliário, encontra o exemplo oposto na situação
de outras áreas da cidade, como é o caso do novo pólo de edifícios comerciais
na marginal Pinheiros, área em que se concentrou grande parte dos recursos do
poder público municipal nos últimos anos...” (Amadio, 1998, 132).
Essa estratégia de concentração dos investimentos privados no sul-sudoeste da
cidade, favorecidos por uma política urbana a eles dirigida, provocou também
limitações ao alcance da Operação Urbana Água Branca, como será visto a
seguir. Apenas na região de abrangência da Operação Faria Lima, a reformulação
físico-ambiental provocada pela espacialidade corporativa foi implantada em
profundidade e devido a essa escala, a análise do seu resultado e desdobramento
urbanístico se mostra importante para a elucidação das formas diferenciadas de
ocupação entre esse e os demais setores da cidade.
4.3.1. Operação Urbana Água Branca4.3.1. Operação Urbana Água Branca
4.3.1. Operação Urbana Água Branca4.3.1. Operação Urbana Água Branca
4.3.1. Operação Urbana Água Branca
A Operação Urbana Água Branca abrange uma área de 504 hectares na região
Oeste, onde grandes investimentos públicos vinculados ao transporte, lazer e
cultura foram implantados em fins da década de 1980 (Terminal Intermodal
Barra Funda e Memorial da América Latina), somando-se a outros já existentes,
como o Parque da Água Branca e SESC Pompéia e que atraiam também
investimentos privados, como a construção do Shopping West Plaza e mais
recentemente dois grandes edifícios de universidades particulares. A área,
entretanto, apresenta uma série de problemas ligados à interrupção de sua malha
269
PERÍODO 1980-DÉCADA 2000: AS RELAÇÕES PRESENTES NA CIDADE
viária pelos eixos ferroviários, obsolescência de grande parte das construções,
drenagem deficiente e grandes vazios urbanos. Dada a sua localização, a
Operação Urbana estabeleceu como objetivos:
- Promoção de novos padrões de uso e ocupação, compatíveis com as
potencialidades da região
- Definição de diretrizes para a ocupação racional dos grandes vazios urbanos
- Melhoria do sistema de drenagem
- Ampliação do sistema viário
- Estabelecimento de padrões ambientais adequados para a criação de novos
espaços públicos, implantação de áreas verdes e controle da permeabilidade do
solo (Operação Urbana Água Branca, PMSP/Emurb, 1995, 3)
A sua divisão em dez sub-áreas visou identificar, em cada uma delas, as principais
características urbanas e a adoção de estratégias de intervenção para as mesmas.
Essa divisão teve como parâmetros:
. A proximidade do Terminal Barra Funda e seu raio de influência
. Interferência do sistema viário existente e proposto
. Características similares em relação ao uso e ocupação do solo
. Compatibilidade em relação ao zoneamento
Fig. 107: Mapa das principais áreas de atuação da Operação Urbana Água Branca
270
. Existência de glebas vazias públicas e particulares
A leitura da lei que promulgou a Operação Urbana Água Branca mostra um
leque de objetivos partindo da melhoria das condições físico-ambientais da área
como um todo, ao adensamento e reestruturação espaciais devido aos novos
padrões de uso e ocupação do solo, à oferta de empregos no setor terciário, ao
controle do uso industrial e à provisão de habitação de interesse social. Foram
também previstas aberturas de vias e construção de pontes, como forma de
reestruturar a acessibilidade da área, contribuindo também para a ocupação
dos espaços isolados.
As decorrências urbanas de maior visibilidade dessa Operação foram a
reestruturação de usos de trechos da avenida Francisco Matarazzo, a construção
de edifício de escritórios da Telefonica, junto ao Viaduto Antártica, a demolição
de parte dos galpões da rua Tagipurú, que faziam fundos ao Memorial da América
Latina e a demolição da quase totalidade das antigas instalações das Indústrias
Matarazzo, que deram lugar a quatro torres de escritórios. Foram também abertas
duas avenidas paralelas à ferrovia, mas que não estabeleceram uma ligação
maior com o sistema viário devido às interrupções ocasionadas pelos viadutos
existentes.
Uma matéria jornalística expôs o porte do mencionado empreendimento
construído na antiga área industrial:
A área que era ocupada pela antiga sede das Indústrias Matarazzo, de 75.000m²,
na Barra Funda, deverá se transformar em um complexo comercial, com isso,
deverá se impulsionar o mercado imobiliário. Para o consultor imobiliário do
projeto (Lincoln Jorge Marques), a região que inclui trechos da Barra Funda e
Campos Elísios, que antigamente eram destinadas às indústrias passarão para
comércios e serviços.
Esta região não se torna atraente apenas pela disponibilidade de áreas, mas
também pela infra-estrutura do bairro, o metrô, a proximidade do centro e de
bairros nobres Higienópolis, Pacaembu, Perdizes e Pompéia, além do fácil acesso
às estradas.
Na Barra Funda, nas décadas de 10 e 20, predominavam as grandes casas da
classe média paulistana, pertencentes aos industriais e empresários do café, mas
na década de 30, a região foi se deteriorando progressivamente.
Um outro fator que é apontado como um problema para a região foi a construção
do elevado Costa e Silva, entre os anos de 1969 e 71. Além de enfrentar o
problema das inundações freqüentes.
Em contrapartida, o trecho é favorecido por uma ampla área de lazer e serviços,
tais como, o Memorial da América Latina, o Parque da Água Branca, o Playcenter,
a Sociedade Esportiva Palmeiras e o Shopping West Plaza.
O terreno de 75.000m² da sede das indústrias Matarazzo foi dividido em 13 lotes
para criar um grande pólo comercial.
271
PERÍODO 1980-DÉCADA 2000: AS RELAÇÕES PRESENTES NA CIDADE
O primeiro projeto é um complexo com quatro torres de conjuntos comerciais
(com área média a partir de 672m²), orçado em R$ 150 milhões, que será
subsidiado por fundos de pensão
5
.
De acordo com o diretor da Ricci Engenharia.... existe uma expectativa que essa
região se desenvolva, sendo uma alternativa para quem não quer ficar na região
da marginal Pinheiros” (FSP, 08/3/1998).
Após dois anos, sob o título “Centro Comercial mudará a Água Branca”, a
construção de um setor de torres para o terciário na região Oeste foi registrada
da seguinte forma:
O empreendimento da Ricci Engenharia está mudando radicalmente a região
da Água Branca, com a tentativa de não transformar o trânsito da avenida Francisco
Matarazzo em um caos e sem ferir a lei de zoneamento, que proíbe edificações
com altura superior a uma vez a área construída. Para que isso ocorra, a empresa
primeiramente teve que fazer um estudo de impacto ambiental.
O resultado foi a inclusão do projeto na Operação Urbana Água Branca, criada
em 1995 para a revitalização da região. A solução adotada pela empresa foi
financiar a construção de uma avenida, paralela a linha do trem, que começa no
viaduto Antarctica e termina na avenida Santa Marina, na Pompéia.
A construtora está investindo R$ 20 milhões na construção dessa avenida e na
drenagem dos terrenos para evitar enchentes” (FSP, 23/7/2000).
Em 2001 houve um concurso de projetos para a nova sede do Museu de Arte
Contemporânea, vencido pelo arquiteto suíço Bernard Tschummi, cujo local de
implantação escolhido foi a área vizinha às torres de serviços em construção, no
espaço da antiga Indústria Matarazzo. Embora se constituísse em outro
equipamento cultural, numa região que já contava com o Memorial da América
Latina e o Sesc Pompéia, os objetivos envolvidos na escolha do local foram os de
proporcionar diversificação funcional ao plano de reconfiguração urbanística
daquela região, mas passados três anos do resultado do concurso, esse projeto
para o novo Museu ainda não havia se concretizado.
Mesmo contando com as ações descritas, diferentemente do pretendido a
Operação Urbana Água Branca não provocou uma transformação nos moldes
ocorridos na região da marginal Pinheiros e sua vizinhança. O fato é que os
seus resultados se mostraram restritos a verticalização de algumas áreas, como
aquela em que foram implantadas as mencionadas torres e na avenida Marquês
de São Vicente, nas imediações da avenida Pacaembu. Esse processo prendeu-
se à construção do Fórum Trabalhista e de empreendimentos privados de edifícios
de escritórios anexos.
Em alusão à relativa falta de atratividade dessa Operação Urbana ao setor
de edifícios de escritórios de alto padrão, foi considerado em uma análise
sobre o mercado imobiliário que os grandes interesses desse setor estavam,
272
já em 1998, concentrados na região das avenidas Luís Carlos Berrini, Nações
Unidas e Nova Faria Lima, não havendo a mesma disponibilidade de capitais
privados para a Água Branca, por ser considerada investimento de retorno
mais longo. Considerava ainda que, apenas pela presença de uma grande
empresa internacional de telefonia na rua Tagipurú, foi possível o
empreendimento na área da antiga indústria Matarazzo ser lançado, sem
apresentar a mesma demanda que a região da Berrini apresentava
6
.
Além dessas observações, é certo também que os altos investimentos públicos
no sistema viário daquele novo distrito do terciário avançado, estabeleceram
uma diferenciação com a área da Água Branca sob o ponto de vista da
internalização desses investimentos por parte da iniciativa privada.
Dentro do objetivo de revisão das Operações Urbanas, no início do ano de
2004 foi anunciado pela Prefeitura de São Paulo o concurso de projetos
denominado “Bairro Novo”, incidente em uma área de grandes dimensões
(1milhão de m²) no perímetro da Operação Urbana Água Branca. Essa
competição propôs em seu edital os objetivos já contidos na própria Operação
Urbana em relação aos espaços e equipamentos públicos, aos novos usos e
ocupações, à requalificação da paisagem e ainda à indicação de estratégias
Fig. 108: Matéria jornalística: verticalização e uso de escritórios na Barra Funda
273
PERÍODO 1980-DÉCADA 2000: AS RELAÇÕES PRESENTES NA CIDADE
de implantação das propostas, contemplando as ações
públicas e privadas
necessárias à viabilização. Esses elementos foram sintetizados na apresentação
do concurso que se voltou à propostas para um desenho urbano de “um novo
bairro paradigmático de uma São Paulo metrópole global, justa, moderna e bela
(Bairro Novo, Concurso Nacional para um Projeto Urbano, termo de referência,
PMSP, 2004, p.2).
Condizente com as observações feitas aos resultados da Operação Urbana Água
Branca desde a sua promulgação em 1995, o enunciado desse Concurso incluiu
a seguinte análise:
A Operação Urbana, embora definisse as condições legais para que fossem
firmadas parcerias entre a iniciativa privada e o Poder Público Municipal, carecia
da proposta de um plano que servisse, a um só tempo, como fio condutor do
processo de reurbanização da área e como instrumento de interlocução efetivo
entre a Prefeitura, os empreendedores, os proprietários, moradores e usuários da
região” (idem, 3).
Essa área, remanescente do período da industrialização pioneira da cidade foi
escolhida pelo Concurso por se tratar de uma das últimas áreas subutilizadas
que restaram na região entre os rios Tietê e Pinheiros e que segundo o urbanista
Jorge Wilheim, Secretário Municipal de Planejamento de São Paulo, não se obteve
resultados com a Operação Urbana lançada em 1995 (FSP, 25/4/2004, C1).
Dois depoimentos foram selecionados, como registro dos objetivos urbanísticos
que envolveram esse Concurso:
O interesse do mercado imobiliário pela região vai crescer com ou sem projeto.
A grande vantagem de ter um planejamento urbanístico é que você não deixa o
mercado imobiliário tão solto. Você pensa parâmetros de ocupação para oferecer
aos empreendedores, que sozinhos pensam apenas nas suas construções, com
resultados que não são bons do ponto de vista urbanístico”.
Eduardo Della Mana, diretor do Secovi (Sindicato de Construtoras e Imobiliárias)
(idem, C1).
“Eu não quero fazer uma nova Faria Lima. Que o prolongamento da avenida foi
um sucesso de lançamento de imóveis, é indiscutível. Agora, que seja um lugar
bom de morar, é discutível. O Bairro Novo vai ser bom para morar, e nós temos
a convicção de que dá para ganhar dinheiro e fazer uma coisa boa para morar
Jorge Wilheim, Secretário Municipal de Planejamento de São Paulo (ibidem,
C1).
Esses depoimentos vão de encontro ao ambiente urbano que foi produzido pela
outra Operação Urbana analisada a seguir, mais precisamente à ênfase que foi
dada ao mercado imobiliário de alto padrão voltado ao setor de serviços. No
tocante ao mencionado Concurso na Água Branca, a sua divulgação no Instituto
274
de Arquitetos e Urbanistas de São Paulo incluiu também a menção de se constituir
na primeira experiência de planejamento de um bairro da cidade realizada pela
PMSP, já que os bairros planejados existentes foram aqueles implantados pela
iniciativa privada, isto é, os que a Cia. City criou nas primeiras décadas do
século XX, como este trabalho abordou anteriormente.
Assim, estabelecendo um paralelo com a Operação Urbana Faria Lima e o
Concurso para a Reconversão Urbana do Largo da Batata, proposto em 2002
pela Prefeitura de São Paulo e que será visto a seguir, pode-se observar uma
mesma estratégia para o desenvolvimento de novas centralidades, na qual a
iniciativa privada integra um papel preponderante e o poder público “libera
através da Operação Urbana as ocupações para obtenção de fontes de recursos
para a implementação de infra-estrutura e usos públicos.
Entretanto, por se tratar de uma região onde a mescla de usos e da população
moradora definiu o seu caráter urbano, os desdobramentos das propostas que
serão apresentadas e mesmo implantadas, deverão contemplar essas
características, uma vez que a expansão de padrões urbanísticos adequados
Fig. 109: Foto aérea destacando a área de intervenção, objeto do concurso “Bairro Novo”.
275
PERÍODO 1980-DÉCADA 2000: AS RELAÇÕES PRESENTES NA CIDADE
para habitação, incluindo a de baixa renda, e espaços para uso público, poderão
irradiar para os bairros vizinhos um processo qualitativamente superior ao que
os mecanismos de mercado impuseram à reestruturação.
4.3.2. Operação Urbana F4.3.2. Operação Urbana F
4.3.2. Operação Urbana F4.3.2. Operação Urbana F
4.3.2. Operação Urbana F
aria Limaaria Lima
aria Limaaria Lima
aria Lima
A Operação Urbana Faria Lima abrange uma área de 450 hectares situada na
região sudoeste da cidade, sabidamente uma das mais valorizadas e de maior
dinâmica imobiliária de alto padrão para usos residenciais e de serviços. Proposta
pela iniciativa privada na segunda metade da década de 1980, durante a gestão
municipal de Jânio Quadros, posteriormente foi parcialmente incorporada no
projeto de Plano Diretor de 1991 e encampada pela administração Maluf em
1993, com aprovação final no ano de 1995 (Sempla, 2000/2001, n° 4, 7).
A justificativa técnica de melhoria do sistema viário da região sudoeste embasou
essa aprovação, sendo proposta e executada através do prolongamento da
avenida Faria Lima em direção à avenida Bandeirantes e Pedroso de Morais, nos
bairros de Vila Olímpia e Pinheiros respectivamente. Essa ligação proporcionaria,
segundo a justificativa, uma via paralela à marginal Pinheiros, contribuindo para
desafogá-la.
Levando em conta que a existência da Operação Urbana vinculou-se à
participação da iniciativa privada, programaticamente foi considerado essencial
o equilíbrio entre os interesses dos setores público e privado. Assim sendo, foram
propostos os seguintes objetivos:
1. O adensamento populacional e melhor aproveitamento da infra-estrutura
existente, bem como de sua ampliação, viabilizada pelos recursos provenientes
da Operação Urbana
2. A renovação urbana da área de incidência da Operação
3. Obtenção de recursos para investimentos públicos oriundos das contrapartidas
estabelecidas para a área de incidência direta e indiretamente beneficiadas (idem, 18)
.
A exposição de motivos dessa Operação Urbana, estabeleceu as seguintes análises
sobre o seu alcance:
A Zona Sul, como toda a Cidade de São Paulo, não tem uma política adequada
de ocupação de sua área ou um planejamento específico formulado a partir da
correta utilização de seu sistema viário...A Operação Urbana objetivada nesta
mensagem foi proposta de forma a garantir que a introdução e a integração de
diversos melhoramentos viários da marginal do Pinheiros e nos bairros de
Pinheiros, Itaim, Vila Olímpia e Vila Funchal, seja complementada pela adoção
de uma política de adensamento e ocupação do solo na região, compatível
com a maximização do uso das redes de infra-estrutura, de transportes e de
276
serviços, que serão implementadas juntamente com o novo sistema viário”
(Sempla, idem, 18).
Essa Operação Urbana teve a sua área dividida em cinco sub-perímetros -
Pinheiros, Itaim, Vila Olímpia, Vila Funchal e Uberaba - definidos pela situação
lindeira à avenida Faria Lima e os seus trechos prolongados. Contou com um
cálculo para a definição do potencial adicional de construção da ordem de
1.250.000 m² para as áreas diretamente beneficiadas, constantes no interior dos
sub-perímetros e de 1.000.000 m² para as áreas indiretamente beneficiadas,
estas consideradas como as não pertencentes aos sub-perímetros relacionados,
mas incluídas no interior da Operação Urbana (Lei Municipal 11.732/95, s/pág).
Um documento da Secretaria Municipal de Planejamento descreveu as seguintes
ações que deveriam ser desencadeadas com os recursos obtidos pela venda do
potencial adicional de construção:
O programa de investimentos inclui, além de obras viárias, um novo terminal de
ônibus e habitações de interesse social, destinadas à venda financiada para a
população favelada existente no perímetro e no seu entorno. Inclui também a
construção de habitações multifaminilares, para a venda financiada à população
residente na área desapropriada e que queira continuar na região e a aquisição
Fig. 110: Operação urbana Faria Lima.
277
PERÍODO 1980-DÉCADA 2000: AS RELAÇÕES PRESENTES NA CIDADE
de imóveis para a implantação de praças e equipamentos institucionais, necessários
para comportar o aumento populacional decorrente da Operação Urbana. O
custo previsto para essas obras foi estimado, à época, em 150 milhões de dólares,
incluídos 120 milhões para desapropriações” (Sempla, 2000/2001, n° 4, 7)
Confirmando os interesses do mercado imobiliário nessa área como um todo,
apenas cinco anos após o início dessa Operação Urbana e utilizando apenas
25% do estoque de terrenos, os seus resultados foram registrados da seguinte
forma, em relação à duas diretrizes urbanísticas:
- Utilização da concessão gratuita de área computável de 20% do lote quando
os projetos de edifícios reservam no pavimento térreo espaços destinados à
circulação e atividades de uso abertos ao público. Foram incorporados até o
ano 2000, dez mil metros quadrados para essas finalidades.
- Os resultados tidos como positivos em relação ao incentivo à agregação de
lotes, uma vez que nos bairros cortados pela extensão da avenida Faria Lima,
Pinheiros e Vila Olímpia, o parcelamento considerado antigo só permitiria a
construção vertical mediante o remembramento dos lotes. Nesse caso, foi
verificado que no universo das 85 propostas aprovadas até então (ano 2000),
50% fizeram uso desse recurso, proporcionando assim “uma melhor configuração
das quadras na região” (idem, 21).
Com relação ao uso do solo, os projetos aprovados permitiram a seguinte leitura:
- Predominância de edifícios de escritórios nas áreas lindeiras à avenida Faria
Lima.
- Em Pinheiros, nas proximidades da avenida Pedroso de Morais, a ocupação
mostrou-se mais variada, tendo sido aprovados edifícios de escritório, com um
deles contendo centro de convenções (Centro cultural Tomie Otake, n.a), flats e
hotéis, uso comercial em edifícios de pequeno porte e ampliação de colégio
particular.
- Predominância de uso residencial nas proximidades das avenidas Cidade Jardim
e Juscelino Kubistschek, havendo também junto a essa última a aprovação de
edifícios de escritório com áreas comerciais.
- Na região denominada Uberaba, refletindo a ocupação da Vila Nova
Conceição, a vocação para uso comercial de alto padrão manteve-se.
- Nas Vilas Olímpia e Funchal, as propostas aprovadas incluíram edifícios
residenciais, de escritórios e reformas de edifícios existentes (ibidem, 21).
Deve-se incluir além das intervenções viárias diretas da Operação Urbana, os
investimentos de grande monta empregados na construção de túneis interligando
as avenidas 23 de Maio e Parque Ibirapuera, Juscelino Kubistschek e Cidade
Jardim, que ampliaram ainda mais a acessibilidade de automóveis para essas
278
áreas. O sistema de túneis iniciado na gestão Jânio Quadros, interrompido
durante a de Luiza Erundina e retomado pela de Paulo Maluf, estendendo-se à
de seu sucessor Celso Pitta, criou as condições necessárias para alavancar a
dinâmica imobiliária e o retorno financeiro desejado para os investimentos
privados canalizados para a área
7
. Essa interdependência entre infra-estrutura
viária e mercado foi confirmada na entrevista de um diretor de consultoria
imobiliária, a Empresa Brasileira de Estudos de Patrimônio - Embraesp, para o
qual a valorização da área deve-se ao conjunto de incentivos da operação
urbana e a obras como os túneis Jânio Quadros e Ayrton Senna(Luís Paulo
Pompéia, FSP, 08/4/2002, 1)
Além disso, os programas de relocação da população favelada, como a que
ocupava a Juscelino Kubstschek, foram incorporados ao Projeto Cingapura, que
não implantou nenhum conjunto na área, mas sim em outros espaços da cidade.
Acrescente-se também a ausência de um dos objetivos propostos na Lei da
Operação Urbana em relação aos usos urbanos: a ampliação da avenida Faria
Lima, tanto na direção do Itaim quanto na de Pinheiros, não incorporou nenhum
espaço público, restando o paisagismo do canteiro central da avenida como
aumento de área verde e permeável. Apenas em 2002 a Emurb anunciou a
construção de uma praça na Vila Funchal, resultante da extensão da avenida
Faria Lima em direção à Luís Carlos Berrini.
A drenagem de recursos públicos para essa Operação Urbana, se comparada à
Operação Urbana Centro, aprovada dois anos depois, revela uma estratégia
que foi a de privilegiar estritamente as localizações com maior interesse do
mercado imobiliário, produzindo uma nova centralidade do terciário avançado,
um espaço sempre mais segregado no quadrante sudoeste.
A comprovação dessa situação é revelada pelo balanço realizado no ano 2000,
quando se afirmou ter sido a Operação Urbana revestida de sucesso devido aos
benefícios urbanísticos obtidos até então. Nesse ano, segundo os dados divulgados,
arrecadou-se aproximadamente 168 milhões de reais, montante que superou os
custos das obras viárias realizadas, empregando-se parte dessa quantia para o
ressarcimento das desapropriações (Sempla, 2000/2001, 22). Fica comprovada,
portanto, a participação dos recursos orçamentários para o rápido desfecho das
indenizações, mesmo porque estas não poderiam ter sido viabilizadas com a
venda do potencial construtivo, uma vez que todo o processo de remembramento
dos lotes e aprovação dos projetos foi posterior às transformações do parcelamento
pré-existente e, por conseguinte, os recursos eram então inexistentes.
O predomínio dos interesses imobiliários na Operação Urbana Faria Lima ocorreu
mesmo sob a nova gestão municipal que assumiu a Prefeitura a partir de 2001.
Sob o sugestivo título de “Construtoras vendem obra não-prioritária”, um jornal
de São Paulo relatava no ano de 2001 o papel das incorporadoras e construtoras
na “venda” do prolongamento da avenida Faria Lima até a Engenheiro Luís
279
PERÍODO 1980-DÉCADA 2000: AS RELAÇÕES PRESENTES NA CIDADE
Fig. 115: Novos lançamentos de alto padrão, 2004.
Fig. 111 e 112: Acima: Op. Urb. Faria Lima, trecho
Pinheiros, 2004. Ao lado, Marginal Pinheiros, 2003.
Fig. 114: Praça Vicente Pinzon em obras, 2004.
Fig. 113: Proposta da nova Praça Vicente Pinzon, o primeiro espaço público resultante da
Operação Urbana Faria Lima.
280
Carlos Berrini. Nesse ano, apesar dos desmentidos da Administração Regional
de Pinheiros, imputando a essa obra um caráter não prioritário e especulativo,
anúncios de empreendimentos já publicavam o mencionado trecho nas suas
peças publicitárias. Esse foi o caso do “Continental Square Faria Lima”, da
construtora “InPar”, cujo diretor anunciava que “a expectativa no mercado é que
as obras sejam feitas em no máximo dois anos”. Além desse, outros 12 lançamentos
de edifícios comerciais concentravam-se nas proximidades do referido
prolongamento, como mostra o mapa dessas incorporações (FSP, 08/4/2001).
No ano de 2002, para promover o mencionado empreendimento, a empresa
“InPar” publicou um anúncio de página inteira divulgando a retomada do projeto
de prolongamento pela Prefeitura, como mostrou o seu título: ”Agora é pra (sic)
valer: o prolongamento da Av. Faria Lima está decidido. Não perca tempo de
decidir por essa opção de investimento: Fundo de Investimento Imobiliário
Continental Square Faria Lima(FSP, 23/3/2002, A11). Um fac-símile de matéria
jornalística anexada a esse anúncio informava que dos 30 milhões de reais
orçados para essa obra, a iniciativa privada iria arcar com 16 milhões (idem, A11
).
Já em abril de 2002, a consultoria imobiliária “Colliers International do Brasil”
fez publicar o informe publicitário sob o título: O prolongamento da Av. Nova
Faria Lima deve elevar o valor dos imóveis da região da Vila Olímpia em até 30%”
(FSP, 04/4/2002, A2). Essa peça publicitária destacou:
- O aumento da demanda para a ocupação e para novas incorporações da
região devido ao prolongamento viabilizado pela parceria entre o Movimento
Colméia, uma ONG constituída pela associação de moradores, usuários e
empresários da Vila Olímpia, em parceria com órgãos da Prefeitura, que envolveu
a EMURB, CET e Administração Regional de Pinheiros.
- O megaempreendimento da construtora InPar, então descrita como uma das
maiores investidoras do projeto de prolongamento. A transcrição do anúncio
mostra que a certeza que a empresa depositava na mencionada ampliação
viária não estava equivocada: ..(o) “Continental Square Faria Lima irá marcar o
centro da região, já que está sendo implantado no principal trecho da nova
avenida. Razão mais do que suficiente para agradar aos investidores ou
proprietários de unidades no empreendimento...” (idem, A2)
Divulgado por fim, no ano de 2002, o programa de extensão do sistema viário
anunciado pela EMURB previa:
- Prolongamento da avenida Hélio Pelegrino, interligando a avenida Faria Lima
à rua Funchal, além do alargamento da mesma entre as avenidas Bandeirantes
e Juscelino Kubischek, afim de conectar a Faria Lima com a avenida Luís Carlos
Berrini. Essa interligação previu a criação de uma praça formada pela nova
avenida Hélio Pelegrino e a alameda Vicente Pinzon.
281
PERÍODO 1980-DÉCADA 2000: AS RELAÇÕES PRESENTES NA CIDADE
Fig. 116: Lançamento de edifícios comerciais, 2001
Fig. 117: Matéria abordando as obras anunciadas pelas construtoras, 2001
282
Fig. 118 e 119: Divulgação do empreendimento Continental Square, 2002.
Fig. 120: Continetal Square Faria Lima, lançamento
do empreendimento, 2002.
Fig. 121: Empreendimento concretizado,
2004.
283
PERÍODO 1980-DÉCADA 2000: AS RELAÇÕES PRESENTES NA CIDADE
- No quadrilátero formado pela avenida dos Bandeirantes e ruas Funchal, Gomes
de Carvalho e alameda Vicente Pinzon, implantação de projeto piloto para
adequação da largura das vias, alargamento de passeios, abertura de galerias
técnicas para o enterramento de fiação aérea, novos equipamentos, tais como
postes, orelhões, pontos de táxi e ônibus e novo paisagismo. Dessas ações
anunciadas, a ONG Colméia também arcaria com uma parte destinada à
iniciativa privada. (Operação Urbana Faria Lima, folder Emurb, 2002, s/pag).
Também vinculado à Operação Urbana Faria Lima, no ano de 2002 a Prefeitura
de São Paulo lançou o “Concurso Público Nacional de Reconversão Urbana do
Largo da Batata”, espaço público que perdeu suas características morfológicas
históricas, tornando-se uma área remanescente das intervenções implantadas
ao longo do tempo na avenida Faria Lima. Segundo o edital dessa competição
de projetos, sinteticamente seus objetivos se ligaram à:
-“Valorização em quantidade e qualidade dos espaços públicos destinados à
circulação, acessibilidade, estar, lazer, cultura, especialmente em função dos fluxos
de pedestres, incluindo tratamento paisagístico e possíveis desapropriações, se
necessário”.
-“Alteração e reformulação do sistema viário com estudo de alternativas para o
tráfego na área
-“A articulação física e formal dos elementos de infra-estrutura, parcelamento do
solo, traçado da malha de circulação, espaços abertos e edificações e hipóteses
de nova configuração volumétrico-arquitetônica e funcional das quadras lindeiras
ao Largo” (Edital - Concurso Público Nacional de Reconversão Urbana do Largo
da Batata, PMSP/EMURB, 2002, pg 1)
Fig. 122: Mapa da EMURB.
284
Além desses objetivos, considerados centrais para a definição do alcance do
Concurso, foi a ele associada também a nova estação Faria Lima do Metrô,
projeto do governo estadual e o conseqüente remanejamento das linhas de
ônibus municipais e intermunicipais interconectados, por sua vez, com os trens
urbanos da CPTM. Dessa forma foram relacionadas as propostas provenientes
desse Concurso à escala estrutural metropolitana e para a viabilização do mesmo,
foi determinado o valor limite de 60 milhões de reais, quantia obtida através da
venda do potencial construtivo da própria Operação Urbana (idem, 1).
Segundo os autores do projeto vencedor
9
, as intervenções previstas incluíam a
desapropriação da área de uma cooperativa desativada para a abertura de
uma grande esplanada, a construção de um edifício de 22 andares para uso
privado cuja contrapartida prevista seria a de um prédio de uso público com
finalidades culturais. Além de calçadões e bulevares nas ruas vizinhas ao Largo,
o projeto previu o remanejamento do terminal de ônibus existente, a retirada de
linhas intermunicipais na região e a construção de garagens subterrâneas (Urbs,
nº 27, ago 2002, 40).
Não cabe aos objetivos deste trabalho analisar as propostas urbanísticas e
arquitetônicas contidas nesse projeto, mas deve-se registrar que passados mais
de dois anos da divulgação dos resultados do Concurso, inúmeras alterações
ocorreram na previsão de sua implantação, bem como outros fatores urbanísticos
se interpuseram na área-foco e de abrangência do mesmo. Inicialmente, o
cronograma de obras da Linha 4 do Metrô sofreu consecutivos atrasos, sendo
apenas iniciado na primeira metade do ano de 2004, conforme anunciado pelo
Governo do Estado de São Paulo. Em se tratando de um elemento estruturador,
esses adiamentos implicaram também no postergamento das ações municipais
relacionadas diretamente à proposta de reconversão urbana, entre elas, a
transferência dos terminais de ônibus que ocupam o Largo, a desapropriação
dos imóveis e áreas apontados no projeto, etc.
Em segundo lugar, outros elementos foram incorporados à área, não previstos
ou relacionados no recente Concurso, tais como as alterações no sistema viário
provocados pelo rebaixamento das avenidas Euzébio Matoso e Cidade Jardim.
Anunciados em fins do ano de 2003, embora tivessem seus custos orçados em
149 milhões de reais financiados pela própria Operação Urbana, representaram
um reforço suplementar ao uso de automóveis em uma região que num passado
recente, de outras gestões municipais, já havia recebido obras semelhantes.
Retomando o foco no uso e ocupação do solo, a questão mais crítica se relaciona
à subordinação dessa Operação Urbana, desde sua origem, à estratégias do
mercado imobiliário. Estas impuseram a profunda reconfiguração
dos bairros
das Vila Olímpia e Funchal através da extensão da avenida Faria Lima e do sistema
viário interligado a ela, para a expansão dos serviços avançados e ainda uma polarização
285
PERÍODO 1980-DÉCADA 2000: AS RELAÇÕES PRESENTES NA CIDADE
Fig. 125 e 126: Maquetes eletrônicas da proposta vencedora, concurso do Largo da
Batata (Arq. Tito Livio Frascino e equipe).
Fig. 123 e 124: Aspecto atuaL do Largo da Batata,
2003.
286
de investimentos públicos e privados em um setor urbano que deu continuidade à
segregação histórica de usos e ocupação na área consolidada da cidade.
Conforme afirmou Alessandri Carlos, a Operação Urbana Faria Lima se constituiu
em uma estratégia entre os promotores imobiliários, o setor financeiro e o poder
público a eles associado. Esses agentes estiveram presentes na estratégia de
constituição do novo eixo empresarial da avenida Faria Lima e a respeito da
dinâmica ocorrida na Vila Olímpia, a autora analisou que: “havia uma certa
estabilidade no mercado imobiliário, o que significa que a propriedade mudava
pouco de mãos, pois a dinâmica do mercado estava na dependência dos pequenos
proprietários. A consolidação da mancha urbana, por meio da generalização da
mercantilização do solo urbano, associada à necessidade de reestruturação da
malha viária da região, impõe como única solução a interferência do Estado para
redefinir os limites da propriedade do solo urbano – não o anulando, mas fazendo
a propriedade trocar de mãos , e possibilitando, com incentivos, o remembramento
dos pequenos terrenos, permitindo com isso as mudanças de usos e funções,
necessárias à continuidade da reprodução do capital” (Carlos, 2001, 23/25).
A situação urbana dos bairros na área do Itaim, Vila Olímpia e Funchal difere
daquela de Pinheiros, onde nem mesmo o “Concurso de Reconversão Urbana
do Largo da Batata” logrou a reestruturação pretendida, pelo menos a curto
prazo. Nos bairros do sul-sudoeste, a transformação morfológica provocada
pela Operação Urbana foi tão radical, que a identidade dos mesmos, antes
espaços de moradia horizontal com parcelamento acentuado e serviços locais,
alterou-se totalmente, havendo indícios da continuidade desse processo, como
já assinalado.
Assim é que, a ligação do Itaim, Vila Olímpia e Vila Funchal com as avenidas Luís
Carlos Berrini, Águas Espraiadas (renomeada Dr. Roberto Marinho) e Nações
Unidas, definiu uma área altamente diferenciada do restante da cidade e mesmo
de outros locais centrais. Inúmeros trabalhos e pesquisas voltam-se a estudar esse
território em que os interesses corporativos aliados ao mercado imobiliário e ao
poder público, criaram uma localização sem precedentes, tanto pela escala dessa
ocupação, quanto pelo caráter de individualidade com que cada elemento se
relaciona com o lugar.
Conforme divulgado pela Prefeitura de São Paulo, dos 2,25 milhões de metros
quadrados de potencial adicional de construção definidos pela Operação Faria
Lima, restam 58%, um total equivalente a 1,31 milhões. A extensão dos interesses
imobiliários poderá se ampliar com os novos mecanismos anunciados em 2004
para a compra do potencial construído e as já mencionadas alterações viárias
na área de Pinheiros.
Com relação aos índices de aproveitamento, estes passarão a serem vendidos
em leilão, de acordo com a Lei 13.769, de 26/01/04. Para a construção de até
287
PERÍODO 1980-DÉCADA 2000: AS RELAÇÕES PRESENTES NA CIDADE
quatro vezes a área do terreno, o comprador terá que obter no mercado os
“Certificados de Potencial Adicional de Construção – Cepacs”. Segundo as
informações do poder público municipal, foram arrecadados ao longo de nove
anos o equivalente a 300 milhões de reais, que se vincularam ao pagamento da
outorga onerosa de cada projeto aprovado. Com a nova forma de obtenção do
potencial construído, este poderá ser comprado antecipadamente, à medida em
que a decisão de construir for tomada (FSP, 22/01/01, Imóveis, 1).
Ao mesmo tempo em que se abre a opção à compra antecipada de “Cepacs”,
favorecendo a escolha de lotes mais baratos, a nova regra poderá simplesmente
provocar especulação com os novos papéis. Outro risco é o da verticalização
continuar ocorrendo com maior intensidade onde atualmente já existe uma grande
concentração, o que pode ser evitado, segundo técnicos do poder público, com
um custo maior de compra dos mencionados certificados nessas regiões.
Outro aspecto a ser considerado é o das conseqüências do aumento de
acessibilidade que as reformulações viárias provocarão. Cabe indagar se os
mesmos efeitos urbanos verificados na região da Vila Olímpia, não poderão
ocorrer com a ligação do setor Pinheiros da mencionada Operação Urbana
Faria Lima, com àquela proposta em 2003 para a Vila Leopoldina, que se interliga,
por sua vez, com a Operação Urbana Água Branca, analisada anteriormente.
Por fim, justificando o sub-título “Remodelações dirigidas e espacialidade
corporativa”, pode-se avaliar a Operação Urbana Faria Lima como tendo
Fig. 127: Vila Olímpia e Vila Funchal: Contraste das diferentes tipologias e gabarito, 2004.
288
Fig. 128: Operação urbana Águas Espraiadas
289
PERÍODO 1980-DÉCADA 2000: AS RELAÇÕES PRESENTES NA CIDADE
realizado uma incorporação sem precedentes para os espaços do setor do terciário
avançado, com resultados profundamente distanciados dos objetivos de
adensamento populacional e melhor aproveitamento da infra-estrutura existente,
uma vez que, além das observações que já foram formuladas, pode-se considerar
também que :
. Promoveu-se a formação de uma extensa área mono-funcional, dado o uso
predominante dos edifícios construídos. Com essa desertificação do espaço
urbano, mesmo as funções de moradia para a classe média foram relegadas,
quanto mais a habitação social, que não foi contemplada pela cirurgia urbana
promovida pelos agentes do mercado imobiliário.
. Os espaços em si se mostram eminentemente anti-urbanos: a escala do pedestre
inexiste em quase toda a extensão da Operação Urbana, o automóvel predomina
sobre o transporte público e os usos lazer e consumo que se constituem na
animação urbana, conforme já assinalava Jacobs, foram confinados e em
decorrência, ampliam a segregação funcional e social.
. A escala de “gentrificação” foi correspondente à do desmantelamento dos
espaços pré-existentes nos bairros afetados pela Operação Urbana, onde se
impôs a reestruturação espacial
radical de seus elementos
morfológicos e sociais, conforme
também assinalou Alessandri
Carlos (2001). Subjacente a essa
dinâmica, as estratégias de
marketing conduziram os
investimentos privados a se
concentrar em novas localizações
na cidade, potencializadas por
investimentos públicos,
flexibilizadas pela legislação
pertinente às Operações Urbanas
e na direção dos setores de
moradia das faixas de renda mais
altas. Assim, outros espaços
foram relegados a segundo ou
terceiro plano, pois os interesses
imobiliários não reconheceram
na área central tradicional de São
Paulo, os requisitos necessários
para o “Central Business District”
da cidade mundial.
Fig. 129: Pensão-Cortiço em primeiro plano, Ceasar
Park ao fundo. Rua da Olímpiadas, 2004.
290
Notas:
1
Sobre o assunto, Gottdiener (1993) , Sassen (1994), Harvey (1995)
2
Na gestão municipal de 1989-1992, a requalificação da área central foi entendida como de
importância estratégica para a cidade, tanto sob o ponto de vista funcional quanto simbólico. Para
tanto foram desenvolvidos projetos pontuais conjuntamente com a conclusão do novo Vale do
Anhangabaú e também proposta e aprovada a Operação Urbana Anhangabaú. Os dois outros
governos municipais que sucederam o de Luiza Erundina, voltaram-se aos interesses imobiliários
no quadrante sudoeste, que ditaram as pesadas e onerosas intervenções urbanas concentradas
nesse setor.
3
As Operações Interligadas foram aprovadas pela Lei n° 10.209/86.
4
Operação Urbana Anhangabaú: Lei 11.090/91, administração Luiza Erundina; Operação Urbana
Faria Lima: Lei n° 11.732/95; Operação Urbana Água Branca: Lei n° 11.774/95, ambas na
administração Paulo Maluf; Operação Urbana Centro: Lei n° 12.349/97, administração Celso
Pitta (idem, 5).
5
Sobre os fundos de pensão, origem dos investimentos para a construção dos novos centros do
terciário avançado em São Paulo, ver Wilderode, FAUUSP, 2000.
6
Intervenção do economista Paulo Sandroni no debate sobre o projeto do Maharishi Tower,
Sindicato dos Arquitetos de São Paulo, 1999.
7
Segundo dados divulgados, os gastos em obras na gestão 1993-1996 representaram um terço de
todas as obras licitadas no Brasil. Os custos declarados do túnel Ayrton Senna, com um
quilometro e meio de extensão, foram de 552 milhões de reais (Amadio, jornal Página Central
n°1, out/1997, 35)
8
Operações Urbanas Carandiru-Vila Maria, Vila Leopoldina e Vila Sõnia.
9
Equipe vendecora - 1º Prêmio – São Paulo SP (projeto nº 40)
Arquitetos Tito Livio Frascino, Fernando Pires, Alexandre Stefani, Letícia Lodi, Andréa Soares e
RosaMariaLeal.
Engenheiro:JaimeVaisman
Consultores: Engenharia de Transporte: Protran Engenharia S/C Ltda / Instalações: Projetar
Engenharia de Projetos S/C Ltda / Estruturas: Leão & Associados Engenharia de Projetos S/C Ltda
/ Sistemas Construtivos: Universal Engenharia e Construções Ltda / Paisagismo: Arq. Sérgio Rubens
Castanho Fiúza
.
291
CONSIDERAÇÕES I
5. C5. C
5. C5. C
5. C
ONSIDERAÇÕESONSIDERAÇÕES
ONSIDERAÇÕESONSIDERAÇÕES
ONSIDERAÇÕES
I I
I I
I
292
293
CONSIDERAÇÕES I
5. Considerações I5. Considerações I
5. Considerações I5. Considerações I
5. Considerações I
Visando facilitar o entendimento das análises desenvolvidas na Parte I deste
trabalho, que abrangeu a
Escala da CidadeEscala da Cidade
Escala da CidadeEscala da Cidade
Escala da Cidade mencionada na metodologia, foram
relacionadas algumas considerações ainda parciais, mas que procuram alinhavar
o desenvolvimento até aqui realizado.
Em fins do século XIX e início do século XX, a ocupação dos espaços próximos ao
núcleo central ocorreu vinculando os elementos naturais e de infra-estrutura,
somados à dinâmica social de uma cidade em transformação do seu caráter
econômico. A rede de transporte, dirigida inicialmente para o atendimento da
economia cafeeira, transformou-se em importante elemento organizador do
espaço urbano, principalmente das atividades industriais e residenciais, delineando
a setorização das atividades e tipologias que a cidade seguiu nas décadas
seguintes.
Em relação à expansão urbana, não se logrou o controle desse processo, apesar
de se constituir em matéria do Código de 1929 e sua consolidação de 1934.
Os estudos sobre esse período mostram que, ao abdicar na prática dessa
responsabilidade, o poder público criou as condições para que o setor privado
assumisse o controle quase que absoluto da terra urbana. Incapaz de atuar em
relação a abertura de loteamentos por parte do setor imobiliário, que criou uma
crescente clandestinidade urbana nas franjas da cidade, sucederam-se anistias
com o objetivo de “regularizar” o que foi produzido sem as mínimas obediências
em relação às normas da legislação urbana (Scherer, Grostein, SMC, 184, 48,
aspas nossas).
Importante agente da ocupação dos bairros nesse período foram as linhas de
bonde, que dobraram os percursos dos eixos ferroviários, ao invés de servir as
áreas não atendidas pelos mesmos, como foi o caso, ao Leste, da linha da
avenida Rangel Pestana–Celso Garcia, correndo paralela à ferrovia Central do
Brasil e a Oeste, a linha de bonde da avenida São João-Francisco Matarazzo,
correndo paralela à Santos – Jundiaí e Sorocabana. Nesses trechos, o bonde foi
o responsável pela distribuição de passageiros, propiciando a ocupação dos
espaços entre as estações com um caráter misto, onde pequenas fábricas, oficinas
e comércio conviveram com habitações de renda média e média baixa (Metrô,
1979, 19).
A imensa maioria dos imóveis, no período que perdurou até a década de 1940,
eram destinados à locação, mesmo para domicílio da classe média e a moradia
dos trabalhadores esteve condicionada à habitação coletiva – os cortiços - e
vilas operárias. Ambas tipologias caracterizaram os bairros próximos ao centro
em que as áreas industriais em crescimento e a rede organizada de transporte
294
público, baseada nos bondes, definiram a localização da mão-de-obra junto
aos postos de trabalho.
Considerando as propostas e projetos urbanísticos para a remodelação viária e
estética da cidade, as transformações que o Plano de Avenidas desencadeou a
partir de 1938, consagraram as componentes principais da estrutura urbana de
São Paulo. Sempre associado à negação do transporte coletivo sobre trilhos e
de ter favorecido a utilização dos ônibus e carros, a principal decorrência desse
sistema viário foi, entretanto, a relação estabelecida com a verticalização de
alguns bairros centrais em função do aumento da acessibilidade intra-urbana,
particularmente ao vetor sudoeste que recebeu a maiorias das novas radiais.
No período que se seguiu à década de 1940, concomitantemente à crise da
habitação provocada pela Lei do Inquilinato, assistiu-se à transferência ao
trabalhador de todo o ônus da produção de sua moradia, que implicou no
retalhamento das áreas periféricas da cidade. Essa etapa correspondeu às
mudanças de ordem estrutural da economia do país e em particular da cidade,
provocando o afluxo de migrantes e a conseqüente dispersão da moradia popular,
facilitada pela expansão do sistema viário e das rodovias, como demonstraram
os trabalhos de Petrone (apud Azevedo 1958) e Langenbuch (1971).
O conceito “periferia” foi associado à distância geográfica com a área equipada
da cidade e também imputado aos espaços desprovidos de infra-estrutura para
a oferta de condições razoáveis de habitabilidade. Depreende-se que, no período
de expansão desses loteamentos consolidou-se, por outros caminhos, a
concepção existente na República Velha de afastamento da habitação popular
do núcleo consolidado da cidade. Porém, a combinação de transporte ferroviário
e de ônibus, que viabilizou a expansão para as áreas distantes do centro, se
mostrou sempre insuficiente, obsoleta e qualitativamente aquém dos padrões de
conforto que o serviço deveria oferecer, o que foi confirmado taxativamente no
relatório síntese do PUB, de 1968.
A característica principal dessas áreas foi a da abertura de loteamentos, que
ocorreu sem cumprimento às normas urbanísticas estabelecidas pelo poder
público, como descontrole consentido” (Grostein, 1987). Nos distritos centrais,
a construção irregular para finalidades de habitação das classes de renda mais
baixa – os cortiços – desafiou as medidas oficiais de controle e erradicação da
habitação coletiva, preconizadas desde o início do século passado pelo enfoque
urbano-sanitarista. O crescimento do número de cortiços nos bairros próximos
ao centro ocorreu como resultado da inexistência de políticas oficiais para a
habitação social, situação que perdurou nas décadas seguintes, como mostraram
os índices de crescimento da população moradora em condições sub-normais
na cidade.
295
CONSIDERAÇÕES I
Apenas com os Institutos de Aposentadorias e Pensões – IAPs, foram formuladas
alternativas à moradia popular, através de um pequeno número de conjuntos
implantados nos bairros centrais, que incorporaram inúmeros elementos do partido
modernista de habitação coletiva. O profundo abismo entre o pequeno número
de unidades produzidas e a dinâmica do mercado imobiliário formal e clandestino,
participante da produção da cidade, fizeram com que os conjuntos implantados
fossem mais uma exceção do que uma alternativa condizente com o tamanho
do problema então existente.
Fomentada pelo crescimento industrial da cidade, a complexidade dos problemas
urbanos obrigou o poder municipal, na década de 1950, buscar instrumentos
para intervenção, vindos de estudos e planos globalizantes e isso se constituiu na
característica que distinguiu os trabalhos desse período, daqueles realizados nas
décadas anteriores, aonde a ênfase ao sistema viário predominou, principalmente
devido à atuação de Prestes Maia como urbanista e como Prefeito entre 1930-
1945 (e posteriormente na década de 1960). Entretanto, apesar dos diagnósticos
e propostas do relatório Moses e do trabalho do SAGMACS, a situação na área
consolidada era da existência de 40% de espaços estocados pela especulação
imobiliária, enquanto a dispersão centrífuga do crescimento urbano originava o
crescimento desordenado da periferia, fato que se intensificou nas décadas
seguintes.
Retomando as categorias de análise morfológica desenvolvidas por Solà-Morales
– “urbanização, parcelamento e edificação” – depreende-se o papel
preponderante para a modelagem do espaço urbano desempenhado pelo setor
público (Prefeitura e Governo do Estado), uma vez que, como poder político e
burocrático, a ele coube a condução de normas e diretrizes que beneficiaram os
diversos atores da cena urbana, através:
1. Das concessões às companhias de serviços públicos, que atuaram de forma
monopolista nas quatro primeiras décadas do século XX, estabelecendo vínculos
com o setor imobiliário, como foi o caso da “Light and Power Co”, onde a infra-
estrutura instalada se constituiu num importante fator de valorização do solo,
provocando com isso, além da distribuição desigual dos serviços, uma crescente
diferenciação funcional e espacial entre os bairros anexos ao centro.
2. Da incapacidade de efetiva regulamentação e gestão urbanística em relação
aos diversos agentes do setor imobiliário, proprietários de terras, incorporadores
e construtores, que tiveram seu campo de ação livre, tanto para a definição dos
espaços da elite, como para a produção da cidade irregular.
3. Da implantação de um pré-zoneamento, que evoluiu do centro histórico para
os bairros de elite: as restrições para usos impostas inicialmente no velho Triângulo,
tiveram seqüência nos bairros aristocráticos a oeste e sudoeste, com a
incorporação das normas ditadas pelos loteadores à legislação urbanística, quer
296
para o tamanho dos lotes e os índices de ocupação, quer para os padrões
construtivos. Contribuiu para a consagração dessa setorização a acessibilidade
criada pelas avenidas do Plano de Prestes Maia, que alterou a relação de
aproveitamento do solo, principalmente das áreas em que a escassez relativa da
base fundiária se prendeu a melhores padrões urbanísticos ofertados, como nos
Campos Elísios, Higienópolis e avenida Paulista, inicialmente e depois no Jardim
América, Jardim Europa, Pacaembu e Sumaré.
Como resultado direto desse processo, coube à verticalização dar continuidade
às diferenças originadas por esse pré-zoneamento. Em contaponto, nos bairros
não caracterizados como nobres, ou mesmo tidos como fabris, foi admitida uma
ampla liberdade para o parcelamento e a produção do espaço. Os padrões
urbanísticos resultantes dessa utilização foram fatores preponderantes para que
essas áreas também continuassem a se constituir em uma reserva de solo mais
barato (comparativamente aos bairros onde a moradia das classes média e alta
predominava), atraindo além de indústrias, o uso comercial e ocupação
horizontalizada, com forte presença de habitações coletivas e cortiços. Bairros
como Belém, Moóca, Bom Retiro, Brás, Canindé e Parí tiveram sua morfologia
urbana estruturada segundo essas condicionantes.
Essa compartimentação resultou em um processo diferenciado para os espaços
de vida e moradia da população: uma renovação constante nos bairros
conectados ao Centro Novo – Consolação, Santa Cecília e parte do Bexiga –
através da verticalização e a consolidação de condições urbanas que passaram
a não propiciar a permanência dos moradores dos bairros do Brás, Bom Retiro
e Parí, ocorrendo uma transferência para outros setores da cidade. Isso se deu,
entre outros fatores, pela disputa nesses bairros entre a função comercial e a
residencial, que provocou além do gradual esvaziamento populacional, verificável
já nas décadas de 1960 e 1970, o desinteresse do setor imobiliário em novas
construções, realimentando o círculo de desvalorização dessas localizações.
Para isso contribuiu também a Lei de Zoneamento de 1972, consagrando os
usos e ocupações existentes, admitindo para a zona mista de baixa densidade
(Z2), a nucleação das indústrias, galpões e armazéns dos bairros do Bom Retiro,
Pari e Brás. A conseqüência foi a desvalorização dos terrenos com coeficiente de
aproveitamento igual a 2, uma vez que para a construção de edifícios altos, foi
necessário situá-los em zonas com coeficientes maiores. Nessa “brecha”
penetraram (mais ainda) os usos representados por armazéns de estocagem e
revenda, lojas de confecções e produtos domésticos, pequenas indústrias, etc.
Por outro lado, alimentando o círculo de atratividade, nas áreas onde o setor de
serviços criou novos postos de trabalho da classe média – o setor “white colar
moderno e complementou as condições de lazer e cultura dos seus moradores,
houve o incremento da população através do processo de verticalização
297
CONSIDERAÇÕES I
habitacional, que exigiu também, da parte do poder público, investimentos na
acessibilidade e no ambiente construído desses espaços. Apesar das
recomendações do PUB e PDDI em direcionar um setor administrativo no norte
da área central, na região de baixa densidade da Ponte Pequena, naquele período
o terciário avançado “escolheu” a região da avenida Paulista como a nova
centralidade, aliás, como os próprios Planos tinham percebido.
Em conjunto ao processo de expansão da área urbanizada através do
parcelamento dos espaços periféricos, a partir da década de 1970 e mais
fortemente na seguinte, a cidade verificou a diversificação industrial e o
crescimento do setor terciário, estruturado pela nova etapa da economia brasileira,
em que estiveram presentes a ampliação do mercado de consumo para a classe
média, patrocinada no período do “milagre brasileiro”.
A década de 1980 mostrou um processo qualitativamente diferente das etapas
anteriores, devido às alterações na cadeia “produção–circulação–distribuição-
consumo”, operadas pela maior presença do trabalho intelectual nesse circuito,
o que resultou em um crescimento dos serviços especializados (Santos, 1997,
3). A distinção entre as áreas da cidade foi fortalecida pela caracterização de
áreas que corresponderam:
- Aos setores vinculados ao comércio e serviços do varejo e atacadistas, que
requereram adaptação física de instalações dos bairros tradicionais, processo
verificado no Brás, no Pari e no Bom Retiro.
- Aos setores vinculados ao terciário avançado, onde a tecnologia se caracterizou
como componente principal. Assim como ocorreu na região das avenidas Paulista
e Faria Lima, nas décadas de 1950, 1960 e 1970, a ocupação a partir de 1980
da Marginal Pinheiros significou a formação de um novo setor de escritórios de
alto padrão, numa área anteriormente caracterizada por vazios urbanos e
depósitos industriais. No vetor sudoeste, o mercado imobiliário condicionou a
atuação do poder público à reestruturação da infra-estrutura e do parcelamento
do solo.
Essa subordinação dos investimentos públicos aos interesses privados pode ser
observada com nitidez em dois momentos: na década de 1970, com a
implantação da Nova Paulista, que adequou essa avenida e a radial de acesso,
a Consolação, à crescente verticalização que ocorria em sua extensão. Mais
recentemente, na Operação Urbana Faria Lima, onde o elevado aporte de
recursos públicos sustentou a dinâmica imobiliária que reconfigurou radicalmente
região, impulsionada pela implantação de sistema viário para automóveis e
remembramento do parcelamento, ambas condições necessárias para a
verticalização do período da globalização.
298
299
C
ONSIDERAÇÃO SOBRE A ANÁLISE DOS BAIRROS CENTRAIS
PP
PP
P
ARAR
ARAR
AR
TETE
TETE
TE
2 2
2 2
2
300
301
C
ONSIDERAÇÃO SOBRE A ANÁLISE DOS BAIRROS CENTRAIS
CC
CC
C
APÍTULAPÍTUL
APÍTULAPÍTUL
APÍTUL
OO
OO
O
6: 6:
6: 6:
6:
CC
CC
C
ONSIDERAÇÕESONSIDERAÇÕES
ONSIDERAÇÕESONSIDERAÇÕES
ONSIDERAÇÕES
SOBRESOBRE
SOBRESOBRE
SOBRE
AA
AA
A
ANÁLISEANÁLISE
ANÁLISEANÁLISE
ANÁLISE
DOSDOS
DOSDOS
DOS
BAIRROSBAIRROS
BAIRROSBAIRROS
BAIRROS
CENTRAISCENTRAIS
CENTRAISCENTRAIS
CENTRAIS
302
303
C
ONSIDERAÇÃO SOBRE A ANÁLISE DOS BAIRROS CENTRAIS
6 – Considerações sobre a análise dos bairros centrais6 – Considerações sobre a análise dos bairros centrais
6 – Considerações sobre a análise dos bairros centrais6 – Considerações sobre a análise dos bairros centrais
6 – Considerações sobre a análise dos bairros centrais
A extensão territorial e social definida pelos bairros, possui uma compreensão
direta para o conjunto da sua população moradora ou usuária, pois neles estão
presentes os elementos mais facilmente reconhecíveis da identidade local, que
podem ser expressos pelos aspectos já mencionados “urbanização (infra-estrutura),
parcelamento e edificação”, além daqueles de ordem social e funcional,
associados por exemplo, ao perfil de renda dos habitantes, relações de vizinhança,
vocação da área, etc. Incluem-se também as referências presentes na área,
sejam elas construídas, monumentos ou edificações significativas e também a
paisagem.
Em se tratando de bairros tradicionais de São Paulo, como são o Bom Retiro,
Brás e Pari, cuja estruturação reporta o trajeto histórico da própria cidade, ocorrida
na transição da economia agrícola e comercial para a industrial, os elementos
que os caracterizam tem um significado fortemente vinculado às origens sociais
da ocupação pioneira e embora tenham sofrido transformações acentuadas ao
longo do tempo, é possível observar a permanência dessas características,
mescladas com os novos usos existentes e novas apropriações por parte da
população moradora e dos usuários. Como indicou Villaça, o estudo da história
(no caso, a estruturação urbana de um ou mais espaços), se faz do presente
para o passado, e não de forma inversa (apud Deák, Schiffer, orgs, 1999, 181).
Nesse sentido, analisar o desenho urbano desses bairros representa um esforço
para de aprofundar um olhar voltado às características ou qualidades com que
esses espaços foram constituídos. É justo entender, portanto, que essas qualidades
são expressas pela morfologia urbana das partes do território investigado.
Outro conceito que merece atenção é o de identidade, associada a um
determinado espaço urbano. Como alerta Ramos, embora apresentando aspectos
diferenciados, pois nenhum bairro é totalmente homogêneo, a identidade vincula-
se ao bairro como um todo, dentro de um todo maior que é a cidade a qual
pertence. Seguindo essa formulação, o significado da mesma é o de se constituir
em identidade sócio-espacial (Ramos, 2001, 9), pois sua caracterização ocorreu
relacionada a uma localização urbana e a processos sociais, como já foi assinado.
Essas proposições ligam-se à análise sobre os bairros centrais desenvolvida na
presente etapa do trabalho. Na Parte I, a escala de abrangência foi a da
estruturação do anel de bairros envoltórios do núcleo central de São Paulo,
chegando a consolidação de seus usos e ocupações, o que implicou em investigar
os processos gerais envolvidos na formação e transformação dessa morfologia,
que ocorreu de forma diferenciada entre os quadrantes da cidade . Como foi
indicado na metodologia, a partir dessa escala, desenvolveu-se uma investigação
sobre os aspectos da estruturação interna dessas áreas enfocando suas
características morfológicas específicas e as relações espaciais e funcionais
304
existentes entre os bairros. Nesse sentido, a análise ampliará a escala de
representação, passando dos mapas de abrangência municipal para a cadastral
desse território pesquisado.
Na sua origem os bairros das cidades brasileiras ligaram-se à tradição trazida
de Portugal, onde os mesmos corresponderam à organização das paróquias da
Igreja Católica: cada uma delas tinha sua igreja e seu santo de devoção, com a
comunidade organizada em torno dela e de outros elementos como os mercados
e feiras (F. Santos, 1988, 116). Em relação a esse quadro, Sposati relacionou a
divisão intra-urbana da cidade à herança republicana desses territórios paroquiais,
uma vez que cabia à Santa Sé receber declarações de casamento, nascimento e
morte, além dos seus vigários procederem também ao registro de terras dentro
de suas freguesias, como dispunha a Lei de Terras de 1850, regulamentada em
1854 (Sposati, 2001, 44).
Devido ao processo histórico de estruturação, nas áreas mais antigas das cidades
a permanência dos elementos urbanos torna mais fácil identificar os bairros –
tanto sua forma quanto as atividades ali existentes - ao contrário do que ocorre
nas periferias, onde as áreas dos bairros se tornam maiores e seus limites e
setores mais imprecisos (F. Santos, 1988, 116). Nesse caso, a morfologia urbana
desvenda não apenas dados históricos e geográficos, mas também da hierarquia
social existente na cidade.
Com relação à área de abrangência, F. Santos propôs que para os habitantes de
um bairro, sua existência está mais ligada ao seu centro que ao reconhecimento
dos limites que o caracterizam, isso porque na centralidade local ocorre a
superposição de significados (as trocas, os serviços, os espaços de culto ou
institucionais, etc.), que se mostra mais importante do que precisar onde começam
e terminam zonas homogêneas ou de se definir tecnicamente os perímetros de
abrangência (1988, 116).
A respeito dos limites entre os bairros se constituir em um entendimento difícil de
ser precisado, comparado às divisões de origem oficial, o geógrafo Renato S.
Mendes considerou também que “em virtude da sua individualização resultar da
‘vox populi’, além de não se confundir com a subdivisão político-administrativa, o
bairro dificilmente pode ser delimitado com absoluto rigor, a exemplo do que
costuma ocorrer com as regiões geográficas. Seus limites são imprecisos, quase
diríamos impalpáveis, sendo comuns os casos em que seus próprios moradores
divergem de opinião a respeito de uma ou mais ruas, quanto à sua inclusão neste
ou naquele bairro. É que antes existem zonas de transição do que propriamente,
linhas demarcatórias rígidas entre a maioria dos bairros da Paulicéia”. Nesse
sentido, segundo o autor, em alguns casos torna-se impossível delimitar onde
acabaria um bairro e começaria outro, porque o “coração do bairro” seria mais
305
C
ONSIDERAÇÃO SOBRE A ANÁLISE DOS BAIRROS CENTRAIS
fácil identificar, mas sua extensão não seria possível ser delimitada com precisão
(Mendes apud Azevedo, (org), 1958, 186)
Assim, os bairros constituem setores de agregação e organização do espaço
urbano e sua caracterização é condicionada aos aspectos históricos de sua
formação, às especificidades físicas e sociais, tais como sistema viário, constituição
de quadras e lotes, tipologias edificatórias, população moradora, etc. Entretanto,
apesar de sua importância na organização do tecido urbano e do conjunto de
vida da sua população, os bairros não constituem unidades referenciadas político-
administrativamente como são os sub-distritos e distritos. Estes reúnem um número
variado de bairros em seu interior e ainda que sua delimitação tenha sido alterada
ao longo do tempo
1
, dados e informações fundamentais para o urbanismo foram
em continuam sendo vinculadas a eles e não aos bairros.
Frente a esse quadro de setorização da espacialidade da cidade, recorreu-se a
uma inter-relação necessária para o aprofundamento da análise sobre o Brás,
Bom Retiro e Pari, que vinculou os elementos informacionais disponíveis – estes
vindos da divisão político-administrativa dos distritos – e os de cunho morfológico
relacionados aos bairros, ainda que no caso de São Paulo suas delimitações por
muitas vezes não sejam precisas.
Mendes também identificou esse problema no seu estudo analítico sobre os
bairros da cidade, de 1958, considerando que os bairros possuem origens
populares, decorrentes dos primeiros habitantes que lá se fixaram, não
dependendo da iniciativa dos poderes públicos e sendo posterior a criação oficial
de distritos ou subdistritos. Esse autor afirmou que “todavia, na maioria dos
casos, o que a lei reconhece como subdistrito não corresponde ao que a população
considera como bairro, embora o nome possa ser exatamente o mesmo. É que o
bairro possui determinadas características muito próprias que, com o passar do
tempo, se reforçam e acabam por individualiza-lo de maneira inconfundível, tanto
para os que nele habitam, como no conceito geral da população citadina (Mendes
apud Azevedo, (org), 1958, 185).
Persiste, contudo, a necessidade de uma compreensão urbana mais aprofundada
dessa abrangência espacial, a fim de auxiliar e precisar o que dela se desejou
obter. Para tanto, inicialmente se recorreu à proposição que entende o espaço
como algo que transcende a dimensão físico-material ao compreendê-lo como
espaço social (Ramos, 2001,9).
Ao se transportar esse conceito para o campo da arquitetura e do urbanismo, é
possível estabelecer uma primeira aproximação com a idéia de “lugar onde se
manifestam os fatos urbanos, isto é, a área em que é possível detectá-los” proposta
por Aldo Rossi (1995, 62). Para a delimitação dos fenômenos que ocorrem
nessa superfície, Rossi defendeu a proposição de “área-estudo” como método
de trabalho e como definição de um elemento qualitativo da cidade. Serviu-se
306
dessa definição para precisar os fatos que ocorrem em determinado local, como
por exemplo a relação entre o parcelamento e um tipo de habitação, que exige
uma investigação sobre os lotes vizinhos para a observação se o objeto de estudo
se revela uma ocorrência única ou resultado de condições mais gerais da cidade.
Isto significa perceber não apenas o fenômeno isolado, mas o tecido urbano
onde o mesmo se realizou.
Assim sendo, a área-estudo reúne também um espaço definido por características
históricas, coincidentes com um fato urbano preciso. Nesse caso, se delimita um
conjunto com características próprias e qualidades dos fatos urbanos cujo
reconhecimento constitui a aproximação com o conhecimento da própria estrutura
dos mesmos. Colabora para o conhecimento dessa estrutura a identificação da
relação entre tipologia edificatória e morfologia urbana, uma vez que, segundo
Rossi, em sua grande parte, a estrutura pode ser esclarecida através dessa relação
(idem, 63).
Foi indicado como essencial para a análise do entorno urbano analisado, a
definição dos limites da área estudada, quer entendido como “área-estudo”
associada ao conceito sociológico de bairro, quer ao conceito de recinto”,
entendido como uma seção da cidade. Ao fazer essa observação, Rossi pretendeu
ressaltar as diferenças que existem entre os fatos urbanos na cidade que podem
ser obscurecidas por análises distorcidas, presentes no campo da arquitetura e
urbanismo, nas quais o crescimento urbano se configura como um processo
contínuo (ibidem, 63).
Avançando na elaboração desse autor, as partes da cidade definidas pelas “áreas-
estudo” constituem-se em unidades do conjunto urbano, que se destacam por
apresentar diferentes momentos de crescimento ou que, como determinados
bairros, adquiriram caráter próprio. O estudo dos mesmos se destaca como o
momento particular do estudo da cidade”, onde dois de seus traços estariam
configurados: a massa e a densidade, manifestadas pela continuidade da
ocupação espacial no plano horizontal e vertical (op. cit, 67).
Ao associar o conceito de área-estudo ao conceito de bairro, Rossi considerou
ser este último um setor da forma urbana estreitamente ligado à evolução e
natureza da cidade, ocorrendo nessas partes uma experiência (urbana) concreta.
Assim, dentro da morfologia social, o bairro se constitui em uma unidade
morfológica e estrutural caracterizada por “uma certa paisagem urbana, por um
certo conteúdo social e por uma função; portanto, uma mudança num desses
elementos é suficiente para fixar o limite do bairro” (op.cit, 70). Rossi prosseguiu
reafirmando as diferenciações que são partes integrantes da cidade: “mas
sustentamos aqui que esses bairros não são tão subordinados, mas suas partes
relativamente autônomas; suas relações não são explicáveis como uma simples
função de dependência, mas devem ser referidas a toda estrutura urbana (op.cit,
307
C
ONSIDERAÇÃO SOBRE A ANÁLISE DOS BAIRROS CENTRAIS
70). Nesse sentido, cabe retomar a formulação de Ramos, no que se refere à
relação do bairro a um todo maior que é a cidade, a qual ele pertence.
Se sob o ponto de vista morfológico o bairro se configura como “momento
particular do estudo da cidade”, como propôs Rossi anteriormente, duas
formulações sociológicas se contrapõe no que se refere ao caráter organizador
da vida de sua população. A primeira estabelece uma análise na qual o bairro
se constitui como unidade de base da vida urbana, favorecendo ao seu morador
se referenciar física e coletivamente através dessa unidade sócio-espacial. Essa
proposição estabelece ainda o bairro como lugar onde se desenvolve a vida
pública e se organiza a representação popular (George apud Ramos, 2001, 11)
A segunda concepção estabelece uma crítica a essa proposição, sendo encontrada
na formulação de Lefebvre, para quem o entendimento de bairro é o de uma
unidade sociológica relativa, possível de ser pensada apenas tendo a cidade
como totalidade. Nesse sentido, a base da vida urbana não seria o bairro, mas
sim o centro, isto porque a noção de centralidade seria o fator que tornaria
possível a cidade e seus bairros. Nesse caso, se quis afirmar que o bairro além
de não se constituir em uma unidade autônoma, submete-se sempre a processos
que moldam seu caráter físico e social (Lefebvre apud Ramos, 2001, 11). Nesse
sentido, as formulações de Lefebvre podem também ser estendidas aos processos
gerais intervenientes na formação local, já que os bairros sintetizaram
espacialmente um fluxo originado na centralidade, seja ela um lugar “centro” (a
rede viária radio-concêntrica), centro das decisões políticas, ou ambas.
Para a pesquisa deste trabalho, delimitar a área-estudo implicou em seu corte
espacial e foi necessário relacionar as breves análises sociológicas para
aprofundar seu entendimento. Considerar os bairros como base da vida urbana
e assim, além de material, local de identidade e referência social, levanta a
indagação de quais relações urbanas existiram para que isso tivesse campo
para ocorrer.
Uma das respostas para essa questão foi indicada quando as análises sobre a
estruturação dos bairros pesquisados (assim como outros tantos da cidade)
enfocaram as limitações à mobilidade existente em São Paulo até a década de
1940, que implicou na grande proximidade entre os locais de moradia e trabalho.
A espacialidade resultante, isto é a morfologia urbana, teve suas características
estruturadas em função dessa alternativa ou condicionante de vida da população.
Nesse caso, é válido relacionar esse aspecto com a profunda identificação entre
os habitantes e os seus locais de moradia na cidade, como foi o caso dos bairros
do Bexiga, Barra Funda, Bom Retiro, Brás, Pari, Belém, Mooca, Ipiranga, Lapa,
etc., que de maneira característica participaram do cenário urbano de São Paulo.
Dessa forma, compreender a investigação sobre a morfologia urbana como “o
estudo analítico da produção e da modificação da forma urbana no tempo”
308
(Samuels apud Del Rio, 1991, 71), implica em reconhecer articulação apontada
por Lefebvre para uma caracterização do fenômeno urbano, isto é, a compreensão
de duas estruturas que atuam em simultaneidade: a
morfológicamorfológica
morfológicamorfológica
morfológica, reunindo os
sítios, as situações, os imóveis, ruas, praças, monumentos, bairros e vizinhança
e a
sociológicasociológica
sociológicasociológica
sociológica, reunindo por seu turno, a complexa distribuição da população,
suas categorias sócio-profissionais, dirigentes e dirigidos, etc. (Lefebvre, 2004,
109, grifo do autor).
Levando em conta essa fundamentação, serão desenvolvidos os seguintes
conteúdos nos capítulos subsequentes:
1. Análise dos distritos Bom Retiro, Brás e Parí através de sua formação histórica
e através de documentação cartográfica, a fim de inventariar as transformações
ocorridas nesses espaços a partir da década de 1930. Os distritos foram
divididos em sub-setores, que corresponderam no caso do Bom Retiro e do
Pari, a delimitação dos bairros no seu interior. Para tanto foi utilizado como
critério a conceituação de Rossi sobre a unidade morfológica e social que
caracteriza a noção de bairro, onde a mudança de algum dos elementos
internos pode fixar o limite entre os mesmos e os demais em seu entorno
(Rossi, 1995, 70).
2. Análise dos projetos de transformação radical desses bairros e projetos de
requalificação direcionados aos bairros pesquisados.
3. Indicação de cenários possíveis para áreas específicas desses bairros,
relacionando as propostas existentes e outras que poderão somar-se às
mesmas.
309
C
ONSIDERAÇÃO SOBRE A ANÁLISE DOS BAIRROS CENTRAIS
Notas:
1 A Lei Municipal n° 11.220 de 1992 instituiu os atuais 96 distritos como divisão administrativa
adotada também pelo I.B.G.E como unidade de coleta de informações. Um número variado de
distritos são englobados pelas Sub-prefeituras, que são unidades de gestão. Antes disso, segundo
Spozati, a Lei Municipal n° 14.334 de 1944 havia criado a sub-divisão no interior do distrito,
denominando-se então sub-distritos às 38 sub-áreas à qual a cidade inteira havia sido dividida.
Foram criados também por essa Lei, os distritos de São Miguel Paulista, Guaianases, Itaquera,
Parelheiros e Perus. Em 1948 foi a vez da criação do distrito de Jaraguá, em 1959 o de Ermelino
Matarazzo, em 1980 o de Itamim Paulista e em 1985 os de São Mateus e Sapopemba. Em 1991 a
cidade contava com 48 sub-distritos e 10 distritos (Sposati, 2001, 29)
310
311
C
ONSIDERAÇÃO SOBRE A ANÁLISE DOS BAIRROS CENTRAIS
312
313
E
VOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
6.1 - Distrito do Bom R6.1 - Distrito do Bom R
6.1 - Distrito do Bom R6.1 - Distrito do Bom R
6.1 - Distrito do Bom R
etiroetiro
etiroetiro
etiro
6.1.1- L6.1.1- L
6.1.1- L6.1.1- L
6.1.1- L
uzuz
uzuz
uz
O atual distrito do Bom Retiro engloba os bairros da Luz, Ponte Pequena e do
próprio Bom Retiro. O bairro da Luz se caracteriza por ser a ocupação mais
antiga, devendo o seu nome à antiga Ermida da Luz, erguida em 1585 ainda no
local posteriormente ocupado pelo Convento da Luz, quando essa área era
denominada de Guaré e se constituía no limite da cidade junto à várzea do
Tietê. As vias de comunicação principais foram o Caminho da Luz,
correspondendo à atual rua Florêncio de Abreu, que cortava o então denominado
Campo da Luz. Outra via que também ligava essa área ao centro era a rua
Alegre, atual Brigadeiro Tobias (Cesar et alli, 1977, 65). Essa área corresponde
àquela intermediária entre os atuais bairros da Luz, Ponte Pequena e Canindé.
A circulação primitiva esteve condicionada a rústicas pontes sobre o ribeiro Guaré,
sobre o Tamanduateí e sobre o rio Tietê. Denominadas de Pontes Pequena e
Grande, efetivamente apenas em 1866 foi inaugurada a ponte metálica projetada
por um engenheiro da San Paulo Railway que estabeleceu uma ligação satisfatória
com os Campos de Santana e os caminhos que levavam a Minas Gerais e
Goiás. Essa ponte foi reformada em 1924 e substituída pela atual Ponte das
Bandeiras em 1942, durante a primeira gestão de Prestes Maia como prefeito
(Jorge, 1988, 39-49). Pelos mapas existentes, a Ponte Pequena, que superou o
rio Tamanduateí e emprestou o seu nome ao bairro, localizou-se nas proximidades
da atual Praça Armênia, cruzando o rio na altura da rua Pedro Vicente, sendo
toda a área de várzea já aterrada nas primeiras décadas do século XIX, chamando-
se Aterrado de Sant’Anna (Cesar et alli, 1977, 78).
Na segunda metade do século XVIII foi construído o Convento da Luz, que
atualmente abriga o Museu de Arte Sacra. Esse edifício recebeu uma ampliação
no início do século XX, guardando sua atual configuração. Na última década do
século XVIII, foi criado o Jardim Botânico, que efetivamente foi concluído em
1825, tornando-se o maior espaço aberto da cidade, passando a ser denominado
Jardim Público (idem, 67). Mesmo perdendo parte de sua área para a construção
do Liceu de Artes e Ofícios e da nova Estação da Luz, inaugurados em 1900 e
1901 respectivamente, desde o século XIX o Jardim da Luz se manteve como um
dos locais prediletos para o lazer dos paulistanos por muitas décadas seguintes.
No século XIX o bairro da Luz recebeu ainda outros equipamentos importantes:
a Cadeia Pública, ou Casa da Correção, inaugurada em 1852 e o Seminário
Episcopal, de 1855. Do primeiro edifício só resta o portal de entrada junto à
avenida Tiradentes, sendo a área ocupada pela Caixa Econômica Federal desde
meados da década de 1970. Com a República, a Cadeia Pública recebeu o
nome Presídio Tiradentes, sendo ali encarcerados os sindicalistas da década de
314
1910, o escritor Monteiro Lobato, preso durante o Estado Novo e os perseguidos
políticos do regime pós-1964 (Jorge, 1988, 73-78).
Novos edifícios somaram-se aos anteriores: em 1895 foi concluído o Quartel da
Força Pública e em 1900 o Liceu de Artes e Ofícios, ambos projetados por
Ramos de Azevedo. Foi construída entre 1888 e 1992 a primeira usina elétrica
Fig. 131: Seminário Episcopal, 1860.
Fig. 130: Convento da Luz, 1875.
315
E
VOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
da cidade, que fornecia energia para
o quartel e o hospital da Força
Pública, localizados juntamente a ela
na rua João Teodoro. Na parte lateral
do Jardim Público, junto à atual
avenida Tiradentes, em 1894 foi
construído o prédio do Instituto de
Eletrotécnica, também com projeto
de Ramos de Azevedo, que se
tornaria o edifício principal da Escola
Politécnica. Ao lado dela, junto à
esquina da avenida Tiradentes, se
encontrava a casa do Marquês de
Três Rios, onde efetivamente foi
iniciado o curso da Politécnica e que
posteriormente foi demolida (Cesar
et alli, 73).
Com relação à Estação da Luz,
concluída em 1901, o estudo de
Toledo indica ter sido esse um
símbolo da Metrópole do Café, com
o projeto e todo o seu material
importado da Inglaterra. A construção dessa Estação de 7.500 m² criou um
novo centro focal na cidade, beneficiada ainda pela sua situação junto ao Jardim
Público (Toledo, 1983,82). Seu projeto foi creditado a Charles Henry Driver,
membro do Real Instituto Britânico de Arquitetos e essa obra se constituiu em um
dos exemplos mais importantes da utilização do ferro na arquitetura paulistana
na transição dos séculos XIX e XX (Kühl apud JT, 08/3/1997, 2).
Da mesma época, a Vila dos Ingleses constituiu um exemplar de conjunto de
residências de classe média, implantada numa área em que a proximidade com
a estrada de ferro conferia status. Foi projetada pelo engenheiro Eduardo de
Aguiar D’Andrada, chileno de nascimento, e consta que foi local de residência
dos engenheiros ingleses da San Paulo Railway (SEMPLA/Emplasa, 1984, 263)
A estruturação viária se deveu, como já abordado, às duas vias de comunicação
principais do centro com o Campo da Luz, que foram o Caminho da Luz,
correspondendo à atual rua Florêncio de Abreu e a rua Alegre, atual Brigadeiro
Tobias. Segundo Jorge, essas ruas formavam uma bissetriz interrompida pelos
trilhos da San Paulo Railway que seccionava a área no sentido leste-oeste,
interrupção solucionada com o rebaixamento dos trilhos em seis metros, por
ocasião da construção da Estação da Luz. No sentido norte-sul, o Caminho da
Luz, posteriormente rua da Luz, se articulava com o “caminho da Freguesia de
Fig. 132: Aspecto atual da chaminé da
primeira usina elétrica da cidade.
316
São João de Atibaia”, dando origem ao traçado da atual avenida Tiradentes,
denominação recebida em agosto de 1916, no período republicano. Em 1870
foi proposta também uma ligação direta das porteiras da ferrovia até as margens
do Tietê, via formada muitas décadas depois pela atual avenida Santos Dumont
(Jorge, 1988, 93).
Outra via importante para a estruturação local e ligação com o Brás, foi a rua
aberta em 1872 na gestão de João Teodoro, que recebeu o seu nome. Essa rua
interligou as duas estações ferroviárias da San Paulo Railway, e posteriormente
também a da Estrada de Ferro do Norte, recebendo ainda na última década do
século XIX, a estação principal do Tramway da Cantareira. A ligação entre a Luz
e o Bom Retiro foi estabelecida através do prolongamento da rua João Teodoro
e da abertura da rua Três Rios, a primeira, atual Ribeiro de Lima, conectando-se
com a alameda Glette e a segunda com a Nothmann, ambas acessando o
então recém parcelado Campos Elísios (Jorge, 1988, 85; Toledo, 1983, 70).
Um elemento de destaque presente na área de transição entre a Luz, Ponte
Pequena e Pari foi a implantação do Tramway da Cantareira, que esteve
relacionado com a expansão da infra-estrutura da cidade em fins do século XIX
e com a própria expansão urbana dos bairros ao norte da cidade. A ferrovia
serviu inicialmente para o transporte de materiais das obras de abastecimento
de água da Cia. Cantareira, transformada na Repartição de Águas e Esgotos –
RAE, após ter sido encampada. em 1892 pelo Governo do Estado. Sua finalidade
foi a de substituir as juntas de boi necessárias para conduzir as tubulações e
demais insumos ao alto da Serra, sendo implantados 13 quilômetros dessa
Fig. 133: Estação da Luz, 2001.
317
E
VOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
pequena ferrovia, que iniciou sua operação em 1893, ainda com a estação
inicial situada em Santana. (disponível em: ferrovias urbanas <http://
www.wernervana.hpg.com.br> em 2004)
Em 1894 foi concluída a primeira estação no Pari, na rua João Teodoro esquina
com a rua Cantareira, já que toda a tubulação necessária ao abastecimento de
água passou a ser embarcada desse ponto e os trilhos margeavam o Tamanduateí,
seguindo ao norte pela avenida Cruzeiro do Sul. Em 1918 o antigo galpão
cedeu lugar à nova estação, denominada Tamanduateí. A ferrovia também
incorporou a função de recreio, servindo para transporte de passageiros para o
alto da Serra da Cantareira.
Um ramal alcançando o Campo da Luz foi construído em 1897, percorrendo a
rua Jorge Miranda e com estação no cruzamento dessa via com a atual avenida
Tiradentes. Destinou-se ao transporte de tijolos produzidos pelas olarias da Vila
Galvão e se situou estrategicamente junto à Estação da Luz e da região central,
no local onde atualmente há uma das saídas da Estação Tiradentes do Metrô,
junto ao Quartel da Polícia Militar (ibidem).
Em 1904 os seus trilhos foram estendidos também à Várzea do Carmo,
alcançando a Estação Mercado, situada na atual Praça Fernando Costa através
da rua da Cantareira, assim denominada em função do percurso do trem. Esse
prolongamento teve a dupla finalidade de transporte do material para as obras
de retificação do rio Tamanduateí, uma vez que as pedras utilizadas provinham
da região da Cantareira e também para atender os passageiros situados junto
ao centro da cidade. A partir de 1918 essa extensão foi desativada, substituída
pelo serviço de bondes, mais eficiente e que interligava também essa área com
Santana, voltando a ser a estação principal aquela situada na rua João Teodoro.
Em 1927 pretendeu-se a eletrificação da linha ferroviária, o que não foi levado
a cabo, mas em 1942, com a ferrovia da Cantareira sendo incorporada à
Sorocabana, iniciaram-se estudos para o aumento da bitola. (Jorge, 1988, 90;
disponível em <http:// www.wernervana.hpg.com.br> em 2004).
Em 1910 foi a vez do início de operações do ramal que ligou o bairro de Guapira,
posteriormente denominado Jaçanã, à linha inicial. Chegando no limite do
município de São Paulo com Guarulhos, o prolongamento desse ramal atingiu
aquela cidade já em 1912. Essa ligação, seguindo na direção da Parada Inglesa,
conectou bairros até então servidos por um sistema viário precário (Jorge, 1988,
90; disponível em <http:// www.wernervana.hpg.com.br> em 2004). Mesmo
apresentando limitações técnicas quanto ao número de composições e sua estreita
bitola (60 centímetros), esses trilhos favoreceram o crescimento dos subúrbios-
estação, processo analisado por Langenbuch (1971), além de contribuir para a
ocupação da área da Vila Guilherme e Vila Maria, segundo o mesmo autor.
318
Fig. 134: Mapa Sara-Brasil,
mostrando a localização da
Estação Tamanduateí, “Tramway
da Cantareira”, 1930.
Fig. 135: Mapa esquemático
com o percurso do “Tramway da
Cantareira
Fig. 136: Antigo local da
estação Tamanduateí, hoje Liceu
de Artes e Ofícios de São Paulo.
319
E
VOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
Anteriormente ao Plano de Avenidas a Tiradentes ligava-se à rua Florêncio de
Abreu compondo a espinha dorsal da cidade, conectadas com as ruas da
Liberdade e Domingos de Moraes, já que a ligação norte-sul se efetuava pelo
interior do Triângulo (Maia, 1930, 117). Entre 1938 e 1945 foi construída a
Anhangabaú Inferior”, posteriormente apenas Anhangabaú, recebendo na
década de 1960 a denominação definitiva de Prestes Maia, como já visto na
Parte I.
Aproximadamente até o período que seguiu a II Guerra Mundial, o bairro da Luz
apresentou referências únicas para a cidade, representadas pelas estações
ferroviárias de caráter monumental da Ferrovia Santos-Jundiaí, antiga San Paulo
Railway, e da Sorocabana (Ramos de Azevedo, 1914 e Stokler das Neves, 1926).
Devido às limitações da rede rodoviária de então, todo o transporte para o
interior de São Paulo e outros estados do país, com exceção do Rio de Janeiro,
tinha seu ponto inicial ou final nessa área. Esse fator foi determinante para o
apogeu de uma rede hoteleira nas cercanias das estações, mas com o declínio
do transporte ferroviário a partir da década de 1950, também foi gradualmente
abandonada.
Outros marcos relevantes seguiram o mesmo destino devido ao processo de
abandono crescente do bairro em relação a outras áreas da cidade: o Jardim da
Luz perdeu o status de cartão postal da cidade que manteve durante décadas,
substituído por outros espaços com seletividade social exigida pelas elites, como
o Jardim Trianon, a Praça da República e o Parque da Aclimação. Na década de
1960, foram transferidas as Escola Politécnica e a Faculdade de Odontologia e
Farmácia. Parte do patrimônio histórico foi seriamente ameaçado enquanto que
as condições de moradia da população local também se precarizaram, podendo
ser verificada essa situação pelo aumento do número dos cortiços nessa área.
320
6.1.2- P6.1.2- P
6.1.2- P6.1.2- P
6.1.2- P
onte Ponte P
onte Ponte P
onte P
equenaequena
equenaequena
equena
Adjacentes à Luz, e tendo com esse bairro espaços que poderiam ser considerados
comuns dada a impossibilidade de se estabelecer limites divisórios precisos, o
Bom Retiro e a Ponte Pequena tiveram sua formação baseada no parcelamento
das chácaras e sítios a partir do século XIX, limitando-se a oeste com o bairro
dos Campos Elísios e a leste com o Canindé, respectivamente.
Os mapas de 1881 e 1897 mostram aspectos formadores do bairro da Ponte
Pequena no Aterrado da Luz: no primeiro, além do rio Tamanduateí a área em
continuidade ao Caminho da Luz ainda não havia sido arruada, havendo apenas
pontes de travessia sobre esse rio e sobre o Tietê. No mapa de 1897, a área já
apresentava o viário delineado, mostrando as ruas atualmente existentes - Pedro
Vicente, Guaporé, Porto Seguro, Eduardo Chaves – e a rua Itaporanga, paralela
à avenida Tiradentes, que ao contrário desta, não atravessava o rio Tietê. A
Ponte Grande, de concepção ferroviária, alinhava-se a avenida Tiradentes,
deslocada à montante da atual Ponte das Bandeiras. Esta deu continuidade ao
traçado monumental da avenida Santos Dumont, que por sua vez, incorporou o
leito da rua Itaporanga.
Desde o início de sua ocupação, o bairro se caracterizou pela modéstia das
moradias e pela mescla da habitação com algumas indústrias e com o comércio.
As vilas e as travessas, ruas consideradas não oficiais pelo Código de Obras de
1929, comprovam ter sido a Ponte Pequena um dos bairros constituintes da
extensa faixa de urbanização com características populares, que se estendeu ao
longo das terras pouco valorizadas da várzea do Tietê: Catumbi, Canindé, Bom
Retiro e Barra Funda. A situação desses bairros e particularmente a Ponte Pequena,
pode ser traduzida pelas enchentes periódicas que ocorreram naquela área em
Fig. 137: Ponte Pequena, 1881.
Fig. 138: Ponte Pequena, 1897.
321
E
VOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
1906, 1919 e 1929 (Eletropaulo, 1993, 28; Sevcenko, 1992, 29). Segundo
registros da enchente de 1919, foram atingidas as “pessoas mais pobres e
humildes da cidade” em alusão aos numerosos moradores que ocupavam a
área atingida, concentração que ocorria segundo Sevcenko, justamente pelos
preços mais baratos dos terrenos e dos aluguéis (Sevcenko, 1992, 29).
Das construções notáveis, a Ponte Pequena só possuiu o registro da Estação de
Tratamento de Esgotos, posteriormente demolida. O perímetro do bairro, antes
delimitado pela várzea do Tietê ao norte e ao leste e o Aterrado da Luz a oeste,
foi definido posteriormente pelas avenidas Santos Dumont ao oeste e a Cruzeiro
do Sul a Leste, que possuía desde 1894 os trilhos do Tramway da Cantareira,
criando assim um limite com o bairro do Canindé. A rua Pedro Vicente, por sua
vez, que estabeleceu a ligação entre os dois bairros, cruzava a avenida Cruzeiro
do Sul através de passagem de nível sobre os trilhos da Cantareira.
Embora atingida periodicamente pelas cheias do Tietê, a Ponte Pequena dividia
com o Bom Retiro a presença dos clubes de regatas e das competições de remo
e natação da cidade, visto a Ponte Grande primeiramente e depois a Ponte das
Bandeiras terem sido a linha de chegada dessas provas. Sua toponímia guarda
também os locais anteriormente utilizados para o transporte fluvial, como ocorre
com a denominação das ruas Porto Seguro e Porto Calvo, caminhos que
acessavam os meandros do rio.
Um fato relevante associado à linha do Tramway e à infra-estrutura implantada
nessa região, foi o do aproveitamento de estruturas metálicas para a construção
da ponte sobre o rio Tietê. Os elementos estruturais utilizados para a construção
dessa travessia vieram de um viaduto projetado pelo engenheiro Alberto Kuhlmann
em 1888, a ser construído na área central da cidade, ligando o Largo São Bento
com o Largo do Paissandu. Posteriormente à importação dos componentes, a
Câmara dos Vereadores impediu a construção dessa via elevada, sendo as peças
depositadas próximas à várzea do rio e aproveitadas para a construção de três
pontes, sendo uma delas a da
ferrovia. Essa ponte foi
desmontada em 1964 para a
construção da atual ponte
Cruzeiro do Sul, sendo que a
ferrovia foi totalmente
desativada em 1965 (Jorge,
1988, 90; diisponível em <http:/
/www.wernervana.hpg.com.br>
em 2004).
Fig. 139: Projeto para a ponte sobre o Rio Tietê,
reaproveitando estruturas metálicas da ligação Paissandu-
São Bento não executada.
322
6.1.3 - Bom R6.1.3 - Bom R
6.1.3 - Bom R6.1.3 - Bom R
6.1.3 - Bom R
etiroetiro
etiroetiro
etiro
Com relação ao Bom Retiro, antigos registros indicam ter sido inaugurada por
volta de 1859 a primeira grande olaria da cidade nesse bairro (Jorge, 1988,
78). Denominada como Olaria Manfred, utilizou a argila da várzea dos rios
Tamanduateí e Tietê e seu proprietário, Manfred Meyer, após adquirir uma grande
extensão de terras, procedeu ao seu arruamento, que originou o parcelamento
de parte do bairro. Pelos registros históricos, desde o seu nascimento o Bom
Retiro apresentou o caráter de uso misto, uma vez que nele abrigaram-se os
imigrantes italianos e também foram instaladas fábricas, como a de tecidos na
rua Anhaia e uma cervejaria na rua dos Italianos (Dertônio, 1971, 12).
Apesar da presença dos imigrantes e das indústrias nessa área, o loteamento da
chácara Mauá, empreendida em 1879 pelos alemães Glete e Nothman, que
originou o bairro vizinho dos Campos Elísios, proporcionou a presença da
aristocracia cafeeira no entorno do Bom Retiro, onde entre 1880 e 1890, também
foram loteadas as chácaras “Bom Retiro”, que emprestou o nome ao bairro, a
“Dulley”, o “Sítio do Carvalho”, entre outras. Essa dinâmica certamente influenciou
a existência de equipamentos de prestígio no bairro, além da Escola Politécnica,
como os que se seguem:
- na área ocupada pela chácara Dulley, onde foi aberta a rua Três Rios, foi
construída a Escola de Farmácia em 1904, que funcionava desde 1899 na
Santa Efigênia e em 1912 anexou a Escola de Odontologia e Obstetrícia (idem,
13-38).
- nessa mesma rua, foi iniciada em 1907 a construção do Colégio Santa Inês,
projeto do engenheiro-arquiteto Domingos Delpiano, que havia projetado
também Liceu Coração de Jesus em fins do século XIX (SEMPLA/Emplasa, 1985,
389). Foi fundado para ser uma casa de educação exclusivamente para meninas
e moças e para atividades beneficentes e assistenciais. Atendeu durante muito
tempo em regime de internato, sendo que em 1928 passou a sediar também o
curso normal (Disponível em: <http://www.portal.prefeitura.sp.gov.br/
dph.smc.pmsp>em março 2004).
- embora situado nas imediações do Bom Retiro, mas praticamente no seu limite
com Campos Elísios, foi construído na passagem dos séculos XIX e XX outro
colégio de ordem religiosa, o Liceu Coração de Jesus, igualmente de Delpiano,
inaugurado em 1900 como um liceu de comércio, artes e ofícios anexo ao
Santuário do Sagrado Coração de Jesus. A construção desde último foi iniciada
em 1881 e concluída em 1901 (SEMPLA/Emplasa, 1984, 175-389).
Outro equipamento instalado no bairro, no começo do século XX, juntamente
com a estação de tratamento da Ponte Pequena, mostra as preocupações
sanitárias existentes na cidade: o Desinfetório na rua Tenente Pena, que atuava
323
E
VOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
na desinfecção de casas quando surgia o registro de doenças epidêmicas
(Dertônio, 1971, 34).
Nas décadas seguintes, a ferrovia San Paulo Railway, futura Santos-Jundiaí, ao
percorrer os limites entre o Bom Retiro e os bairros vizinhos, definiu os espaços
lindeiros à linha que foram ocupados pelas indústrias. Esse fato, aliado à imigração
européia, transformou o Bom Retiro em um bairro com características operárias,
sendo registrado em sua toponímia os locais ocupados pelas colônias, como
por exemplo a rua dos Italianos, ou a rua dos Imigrantes, futura José Paulino.
Um estudo sobre a formação do Bom Retiro considerou ter surgido esse bairro
com estrutura e funções específicas, atribuindo esse fato às poucas ligações com
outros bairros, situação só melhorada por volta de 1900 quando se construiu a
passagem de nível sob as ferrovias, resultando a ligação da alameda Nothman
com a rua Silva Pinto, além de melhoramentos nas ligações com a Santa Efigênia,
com o Brás e o Parí (Mendes apud Azevedo (org) 1958, 197).
Pela Lei municipal nº 3.427 de 1929, parte do bairro ainda se encontrava em
área suburbana, sendo o limite entre a zona urbana definido pelas atuais ruas
Jorge Velho, Salvador Leme, Afonso Pena, Bandeirantes, Joaquim Murtinho,
Guarani, Tocantins, Matarazzo, Jaraguá e avenida Rudge (Dertônio, 13-17).
Ao longo das primeiras décadas do século XX, o Bom Retiro se transformou num
mosaico de etnias, que se juntaram aos primeiros moradores, como mostrou
Véras em seu estudo sobre a imigração estrangeira: sírios-libaneses e armênios
a partir de 1920, estes últimos refugiados do massacre turco e os judeus, que na
década de 1930 já somavam 20.000 pessoas, sendo o Bom Retiro a primeira
preferência dessa população, que superou os imigrantes italianos no bairro (Véras,
2003, 92-94).
A função comercial no Bom Retiro se iniciou a partir da rua José Paulino, que no
início do século passado estabelecia a ligação do bairro com o centro e com a
rua São Caetano e os bairros do Brás e do Pari. Para os usuários da ferrovia que
utilizavam a Estação da Luz, a penetração às ruas do bairro se dava por essa via.
Essa função de ligação fez com que a rua José Paulino apresentasse um caráter
comercial diversificado, com membros da colônia portuguesa explorando as
lojas de produtos alimentícios, os da colônia árabe as de roupas e a partir de
1940, a colônia judaica também voltada a esse setor (Dertônio, 1971, 78-79).
Na rua Sólon, devido à proximidade da ferrovia e da facilidade em se estender
ramais, inúmeras indústrias se instalaram nas primeiras décadas do século XX,
entre elas, a montagem dos carros da Ford, como já visto anteriormente. No caso da
Barra Funda, a área contígua ao Bom Retiro, recebeu um parcelamento que favoreceu
a presença de grandes lotes para as indústrias, havendo mesmo uma continuidade
viária entre os dois bairros, como no caso das ruas Barra do Tibagí e do Bosque.
324
Ao longo do século XX, o Bom Retiro gradualmente cedeu os locais de moradia
para o comércio, embora mantendo certas concentrações caracterizadas por
tipologias diferenciadas, mas com predomínio popular, como ocorreu nos espaços
próximos da Barra Funda. Apenas em áreas próximas ao Jardim da Luz e rua
Três Rios uma setorização de renda mais alta passou a predominar, expressa por
edifícios de gabarito médio ocupados principalmente por membros da colônia
judaica.
O Bom Retiro já apresentava os traços presentes na atualidade desde a década
de 1950, quando Mendes assim descreveu sua morfologia: “O bairro do Bom
Fig. 140: Ferrovia
e antiga fábrica
Ford, 2004.
Fig. 141: Orla
ferroviária, antigo
Moinho Santista.
325
E
VOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
Retiro nada apresenta de especial em sua paisagem urbana. Predomina o casario
velho e modesto, em geral datando de fins do século XIX e início do atual. Mas
há dois aspectos dignos de referência: em primeiro lugar a penetração dos
‘arranha-céus’ residenciais, sobretudo na rua Prates e vizinhanças; em segundo
lugar a recente conquista da várzea pelo bairro, através dos prolongamentos de
muitas de suas ruas e a ligação com a várzea da Barra Funda, no trecho servido
pela avenida Rudge. Daí vem resultando uma certa separação entre duas porções
do bairro – a que localiza nas colinas (com suas fábricas, oficinas, casas de
comércio, população israelita) e a que se expande pela várzea do Tietê (com
população de nível de vida bem mais modesto) (Mendes apud Azevedo, (org),
1958, 204).
Mendes também verificou a existência do fenômeno da diminuição da população,
pois o subdistrito do Bom Retiro tinha em 1934, 28.449 habitantes, em 1940,
27.617 e em 1950, 23.043 habitantes. Contudo, o mesmo apresentava altos
índices de densidade demográfica, pois enquanto a Santa Ifigênia possuía746
hab/Km², o Bom Retiro tinha 9.600 hab/Km² (idem, 199)
A partir da década de 1960 o bairro começou a receber membros da colônia
coreana, que se instalaram no ramo de confecções, substituindo gradualmente
ao longo das décadas seguintes, a participação dos árabes e judeus no setor.
Outro fenômeno foi o do fechamento ou transferência das indústrias que
anteriormente ocupavam o bairro, proporcionando o crescimento das atividades
comerciais direcionadas ao ramo de confecções e também a atratividade para
grupos de imigrantes latino-americanos se fixarem no Bom Retiro ou em bairros
vizinhos, em busca de oportunidades de trabalho.
Fig. 142: Chácara Carvalho,
residência de Antônio Prado,
Barra Funda.
326
Fig. 143: Vista aérea, Bom Retiro, sentido Av.
Estados, 2001.
Fig. 144: Vista aérea, Bom Retiro, sentido Barra
Funda, 2001.
327
E
VOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
Fig. 145: Vista aérea, Bom Retiro, sentido Anhembi,
2001.
328
6.1.4 - Análise dos sub6.1.4 - Análise dos sub
6.1.4 - Análise dos sub6.1.4 - Análise dos sub
6.1.4 - Análise dos sub
--
--
-
setoressetores
setoressetores
setores
O distrito do Bom Retiro já apresentava pelo levantamento cartográfico de 1930
quatro vias estruturais, as avenidas Rudge, Tiradentes, Tamanduateí (futura dos
Estados) e a Cruzeiro do Sul. A avenida Tiradentes, a principal ligação norte-sul
da cidade, conectava a rua Voluntários da Pátria, em Santana, através da Ponte
Grande. A Avenida Cruzeiro do Sul, que dividia a Ponte Pequena e o bairro do
Canindé, ainda não havia recebido essa denominação na carta de 1930 e se
constituía em uma via, com os trilhos do trem da Cantareira correndo em nível
elevado por aterro em seu eixo.
Com exceção das ruas que chegavam na Várzea do rio Tietê, praticamente todo
o sistema viário se encontrava implantado, bem como a maioria da área já se
encontrava parcelada e ocupada. A principal alteração viária ocorreu exatamente
com na ligação norte-sul, como já enfocado na análise da evolução das radiais
do Plano de Avenidas.
O distrito pode ser divido em três sub-setores, que correspondem
aproximadamente à extensão dos bairros em seu interior, definidos por
características morfológicas e funcionais:
1º – Esse sub-setor caracteriza-se por se constituir em uma referência histórica e
paisagística da cidade, formado pela área envoltória do Jardim da Luz,
incorporando a Estação e a quadra entre o jardim e a atual Praça Cel Fernando
Prestes, onde se localizaram também a Cadeia Pública e o Colégio Prudente de
Morais. Apresentava-se integrado ao norte e oeste com a área do Bom Retiro e
ao sul com a área central, onde, como foi visto anteriormente, ainda não havia
sido aberta a avenida Anhangabaú Inferior. Ao leste compreende a face de
quadra da avenida Tiradentes onde se situavam o Colégio Arquidiocesano, o
Quartel da Força Pública e o Convento de N. Sª da Luz, atual Museu de Arte
Sacra, estendendo-se até a avenida Tamanduateí, incorporava as ruas 25 de
Janeiro, São Caetano, João Teodoro, Jorge Miranda e tendo como limite a rua
Rodrigo de Barros.
O mapa de 1954, confrontado com o de 1930, não mostra alterações no entorno
do Jardim além do novo edifício do Colégio Prudente de Morais, projeto de
1950 do arquiteto Hélio Duarte e acréscimos no Presídio Tiradentes. Ao sul, a
avenida Anhangabaú já havia sido aberta, formando a componente principal
do Plano de Avenidas juntamente com a avenida Tiradentes. No mapa de 1972,
a alteração mais evidente foi a da obra da construção da linha Norte-Sul do
Metrô defronte a Pinacoteca do Estado, antigo Liceu de Artes e Ofícios. Como
decorrência da implantação da linha subterrânea do Metrô, nessa época a avenida
Tiradentes perdeu o conjunto escultórico em homenagem a Ramos de Azevedo,
situado defronte da Pinacoteca do Estado, antigo Liceu de Artes e Ofícios, que
estabelecia uma relação com esse edifício e o Jardim da Luz, além de criar uma
identidade a uma das principais portas da cidade.
329
E
VOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
Fig. 147: Conjunto escultórico em homenagem à
Ramos de Azevedo na Av. Tiradentes, déc. 1950.
Fig. 147: Av. Tiradentes, 1920.
Fig. 146: Av. Tiradentes, 1907.
330
Entre as ruas Jorge Miranda e João Teodoro encontravam-se implantados os
edifícios do Quartel da Cavalaria, a Usina Elétrica, o Hospital da Força Pública,
o Liceu de Artes e Ofícios e a Estação Tamanduateí, do Tramway da Cantareira.
As ruas Jorge Miranda e da Cantareira já haviam perdido os ramais da ferrovia.
O limite constituído pelas avenidas Tamanduateí (atual dos Estados) e Cruzeiro
do Sul caracterizava-se como uma transição entre os bairros da Luz, Brás e
Canindé. A Vila Economizadora, construída em 1907, bem como todo o casario
já se encontrava implantado nesse sub-setor, na confluência da Ruja S. Caetano
com a Av. Tamanduateí.
Pelo levantamento cadastral de 1954 a ocupação permaneceu inalterada, tanto
em relação às quadras entre as ruas João Teodoro e 25 de Janeiro, quanto às
instituições militares e religiosas. Já pelo levantamento de 1972 verifica-se a
retirada dos trilhos e a demolição das instalações do Trem da Cantareira, ocorrida
em 1964. A demolição de parte das instalações da antiga Usina de Energia só
foi ocorrer na década de 1980 para o alargamento da rua João Teodoro.
Nas ruas João Teodoro e São Caetano, a ocupação se mostrou diferenciada em
relação às especializações que foram se desenvolveram em cada uma delas. Na
primeira, verificou-se o uso
para moradia com diferentes
tipologias em sua extensão
com maior presença de
estabelecimentos comerciais
na direção da avenida
Tiradentes. Verifica-se a
permanência de antigas
residências unifamiliares,
juntamente com pequenos
edifícios, com o pavimento
térreo, por vezes, também
possuindo estabelecimento
comercial. O perfil dessa rua
é mais diversificado do que o
da São Caetano, pois reuniu
desde lojas para venda de
fardamentos militares, cestas
de vime, oficinas, depósitos
variados, hotéis e até
indústrias de pequeno porte.
Na rua São Caetano a
ocupação diversificada
incluiu um setor comercial
especializado em confecções
Fig. 149: Gabarito remanescente. R. Francisco
Sá Brabosa, travessa da R. Cantareira, 2004.
Fig. 150: Rua Cantareira, sentido centro, 2004.
331
E
VOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
para noivas, edifícios de serviços e lojas de máquinas de costura, vocações que
foram reforçadas desde a década de 1950. Além da presença da Vila
Economizadora nessa própria via, a moradia popular coexistiu também com as
atividades comerciais em toda sua extensão, fato verificado pela presença de
inúmeros edifícios residenciais de gabaritos baixo e médio, que foram construídos
desde as primeiras décadas do século XX, concentrados principalmente no trecho
entre as ruas Monsenhor Andrade e da Cantareira.
Nas transversais às ruas João Teodoro e São Caetano, a tipologia construtiva
predominante foi a de moradia horizontalizada, em sua maioria de pequenas
residências térreas ou mescladas com espaço para comércio, implantadas nas
divisas dos lotes, constituindo conjuntos agrupados. Embora sempre essa área
tenha apresentado uso misto, a não renovação dos imóveis causada pelo
crescimento da atividade comercial e da circulação, provocou alterações tanto
na antiga tipologia quanto no perfil dos moradores, com significativo aumento
da população encortiçada desde a década de 1970. Devido a esse processo,
para essa área foi proposto no
ano de 2002 um plano para
atuação conjunta de habitação
social e requalificação
ambiental, o Programa de
Reabilitação Integrada do
Habitat – PRIH Luz, da
Prefeitura de São Paulo, que
será abordado adiante.
2º – Esse sub-setor
compreende a área mais
relacionada com a identidade
do Bom Retiro, que abarca o
seu perímetro comercial e os
espaços que foram ocupados
por atividades industriais, na
transição com o bairro da
Barra Funda. Como não
poderia ser diferente, devido a
integração dos espaços, alguns
locais e marcos são
identificados também com a
Luz, como por exemplo, a
Escola Politécnica. Além dela,
no interior desse sub-setor, pela
carta de 1930 as principais
referências já se encontravam
Fig. 151: Rua São Caetano, 1957.
Fig. 152: Tipologias remanescentes. Rua
João Teodoro, 2004.
332
implantadas na rua Três Rios,
representadas pelo Colégio
Santa Inês e pela Escola de
Farmácia e Odontologia.
Apesar do sistema viário se
encontrar quase totalmente
implantado, a avenida
Tiradentes apresentava seu
antigo traçado, além da ruas
Bandeirantes, Prates, Jorge
Velho, Salvador Leme e João
Kopke constarem ainda
como vias projetadas e consideradas pela legislação municipal de 1929 como
pertencentes ao perímetro suburbano.
Ao sul, os eixos ferroviários se constituíram em uma barreira vencida em apenas
três locais: pela avenida Tiradentes, devido ao rebaixamento da linha férrea,
pela ponte desta sobre a alameda Nothmann e pela passagem em nível na
alameda Rio Branco. Apesar da barreira representada pelos trilhos, até essa via,
posteriormente denominada avenida Rio Branco, o parcelamento apresentava
características semelhantes às do Bom Retiro, mudando além desta para lotes
muito maiores no então aristocrático bairro dos Campos Elísios.
Pelo levantamento de 1954, a principal alteração nesse sub-setor foi a de ter
sido concluída a ocupação da área compreendida entre as ruas Bandeirantes e
Rodolfo Miranda, indicando a continuidade da vocação mista do bairro, com
residências e galpões. Além disso, percebe-se o início de transformação do
perímetro compreendido pelas ruas Prates, Afonso Pena, Bandeirantes e Três
Rios, onde alguns lotes foram remembrados para permitir o aproveitamento
vertical, como foi observado pelo estudo de Mendes, já em 1958.
No levantamento de 1972 verifica-se a ocupação dos poucos lotes que ainda
figuravam vazios na carta cadastral anterior, comprovando a intensificação do
parcelamento, como no caso da rua Anhaia, mais próxima à ferrovia e do final
da rua Prates, interrompida pelos muros da Administração Regional da Sé. O
perímetro compreendido pelas ruas Prates, Afonso Pena, Bandeirantes e Três
Rios apresentou considerável remembramento dos lotes, indicando o aumento
da verticalização que seguiu um padrão de gabaritos médios, configurando
uma área de uso misto com serviços mais voltados à população moradora do
que nos quarteirões comerciais. Essa ocupação definiu também uma ocupação
mais homogênea da classe média, com a presença de famílias da colônia judaica.
Ao norte esse sub-setor delimita-se pela Várzea do rio Tietê e pelas avenidas
Rudge e Tiradentes a oeste e leste respectivamente. A rua Júlio Conceição
Fig. 153: Rua Três Rios.
333
E
VOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
estabelece a transição da área comercial com aquela que foi ocupada pelas
indústrias. Pela carta de 1930, a malha viária já interconectava toda a área do
bairro, se constituindo em prolongamento daquela que estruturava também a
Barra Funda. A principal barreira à ocupação urbana era a Várzea do Tietê, mas
já existiam os clubes de regatas na margem desse rio, que se constituía em
importante área de recreio. Outras presenças eram a da Limpeza Pública e do
Depósito Municipal, nas áreas que receberiam posteriormente a usina de
transbordo de lixo e a Administração Regional da Sé.
O parcelamento permite identificar grandes lotes a partir da rua Tenente Pena
em direção à Várzea do Tietê, configurando a área industrial do Bom Retiro,
também ligada à Barra Funda pelo sistema viário e pelas linhas das ferrovias.
Ruas como Barra do Tibagí, no Bom Retiro e do Bosque, na Barra Funda,
apresentam continuidade de traçado, da divisão fundiária e da ocupação,
entremeando lotes de grandes e pequenas dimensões.
A carta de 1954 mostra que o aumento da ocupação da Várzea do rio Tietê, nos
vinte e sete anos que separaram esse levantamento cadastral do anterior, não se
mostrou tão intenso quanto o verificado no período seguinte, até 1972.
Considerando que as fotos aéreas foram realizadas em 1954, verifica-se a
continuidade do padrão anteriormente existente, sendo significativo o
parcelamento ao longo da avenida Rudge, que contrasta com o das outras vias
estruturais do bairro, devido ao fato da ocupação dessas já haver ocorrido antes
da década de 1950.
Outra diferenciação ocorre na transição do Bom Retiro com a Barra Funda, já
que nesse último bairro é possível se verificar um significativo aumento da
ocupação, principalmente na sua área mais baixa. Devido a eliminação de alguns
meandros existentes na margem esquerda do rio Tietê, pelo levantamento de
1954 já começara a ser configurada a área de equipamentos públicos ao longo
do canal do Tamanduateí. A implantação da avenida Santos Dumont e da Ponte
das Bandeiras, como anteriormente visto, definiram o principal eixo de ligação
norte-sul da cidade.
Fig. 154: Detalhes dos mapas de 1930, à esquerda (Ponte Grande) e 1954, à direita (Ponte das
Bandeiras) sobre o rio Tietê.
334
Pelo mapa de 1972 a ocupação ao longo do rio Tietê se caracterizou como a
principal alteração em relação ao período anterior, uma vez que as características
morfológicas gerais foram mantidas sem mudanças significativas. As
transformações foram provocadas pela implantação de dois importantes
elementos infra-estruturais: a conclusão da retificação do Tietê e do traçado da
avenida marginal ao rio, ambos concluídos em fins da década de 1960. Esses
dois elementos contribuíram para a existência de inúmeras áreas lindeiras
remanescentes, desde a Lapa até o Belenzinho, e no caso do Bom Retiro,
ampliaram a ocupação da Várzea e definiram os espaços públicos ocupados
pelo Parque onde foi implantado o Estádio Municipal de Beisebol, entre as duas
pistas da marginal. Seguindo a margem esquerda do canal do Tamanduateí,
implantou-se também a área do Departamento de Limpeza Pública, com usina
de transbordo de lixo e incinerador e as dependências da Administração Regional
da Sé, ambas ocupando aproximadamente seis hectares.
Na margem direita do canal, foi construído o edifício da Secretaria Estadual de
Transportes e toda a área restante foi ocupada pelas instalações da SABESP,
configurando uma área de continuidade ao clube de regatas que ficou segregado
do rio Tietê devido às pistas expressas da marginal.
Na atualidade, dois setores apresentam maior presença da habitação no bairro:
. O setor constituído por edifícios de gabarito médio no quadrilátero das ruas
Afonso Pena, Bandeirantes, Três Rios e Correia de Melo, que inclue ruas Guarani
e Amazonas.
. O setor constituído pelo perímetro das ruas Sólon, avenida Sérgio Tomás, avenida
Rudge e rua dos Italianos, que incluem as ruas Barra do Tibagí, Jaraguá e Javaés.
Nesse caso, verifica-se a presença de edifícios com poucos andares e a presença
maior de habitação horizontal, ainda com conjuntos de características populares
do início do século passado, como é o caso do renque de casas na rua Barra do
Tibagí e dos conjuntos na rua Sólon.
3º - Esse sub-setor compreende o bairro da Ponte Pequena e uma área de
transição entre este e o bairro da Luz, em que a rua Rodrigo de Barros fecha o
perímetro entre as avenidas Tiradentes e Cruzeiro do Sul, sendo que o rio Tietê
era vencido na época pela Ponte Grande.
Com o sistema viário totalmente implantado já na década de 1930, a área entre
as ruas Rodrigo de Barros e Pedro Vicente permite observar o intenso
parcelamento, com poucos lotes vazios. As construções, alinhadas ao longo do
comprimento dos lotes, revelam as características morfológicas existentes até a
atualidade, com a presença de inúmeras vilas entre as avenidas Tiradentes e
Cruzeiro do Sul. Acima da rua Pedro Vicente, o conjunto de vias interligava as
avenidas mencionadas com a Praça dos Esportes, atual Bento de Camargo,
335
E
VOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
Fig. 160: Rua Barra do Tibagi.
Fig. 159: Tipologia remanescente na Rua Barra do Tibagi.
Ao fundo, verticalização na Barra Funda.
Fig.158: Rua Sólon, tipologia remanescente.
Fig. 157: Rua Sólon, tipologia remanescente.
Fig. 156: Rua Amazonas: Quadras com edifícios
de gabarito médio.
Fig. 155: Tipologia remanescente, Rua Sólon.
336
delimitada pelas ruas Itaporanga, Porto Seguro e avenida Tiradentes, com a
Ponte Grande posicionada no eixo desta última. Como foi observado
anteriormente, a rua Pedro Vicente se constituía na interligação entre os bairros
da Ponte Pequena e do Canindé, possibilitando aos seus moradores acesso à
zona norte através da Ponte Grande e Voluntários da Pátria.
Pelo mapa de 1954 a ocupação apresenta-se basicamente inalterada, sendo
perceptível apenas o adensamento resultante da construção em lotes que pelo
levantamento cadastral anterior se mostravam vazios. Exemplo do ocorrido é
encontrado na quadra compreendida pelas ruas Porto Seguro, Porto Calvo, Dom
Rodó e Guaporé, que se mostrava desocupada na carta de 1930, tendo sido
ocupada por galpões de uma tecelagem posteriormente. Em relação ao traçado
viário, a maior alteração foi a da abertura da avenida Santos Dumont e demolição
da Ponte Grande, passando a Praça dos Esportes a ser ladeada por duas avenidas.
O mapa de 1972 indica que a conclusão da canalização do rio e da implantação
da avenida marginal possibilitaram o surgimento de outras áreas públicas junto a
esta última, ocupada também por um clube. Outra alteração presente em 1972
foi a conclusão da Igreja da Boa Morte, situada na rua Guaporé, apenas indicada
no levantamento anterior, mas que se constituiu em uma referência do bairro.
A intervenção mais significativa foi, entretanto, provocada pela presença do
Metrô, já indicada no mapa de 1972, tendo reconfigurado a praça existente na
avenida e implantado estação aérea, projeto do arquiteto Marcelo Fragelli. A
linha do Metrô, por superar a Ponte Pequena em elevado, não ocasionou
demolições nesse bairro, preservando a configuração estruturada ao longo do
século XX, incorporando apenas uma rua paralela à Pedro Vicente para
adequação de terminal de ônibus. Para a travessia do rio Tietê, utilizada pela
linha do Metrô, foi construída a ponte Cruzeiro do Sul que em 1964 desativou a
antiga ponte ferroviária do Trem da Cantareira.
Verifica-se ainda na atualidade a presença das antigas tipologias nas faces de
quadra não atingidas pela reformulação viária da avenida Tiradentes. Defronte
à Praça Armênia, inúmeras quadras são constituídas de pequenas vias de acesso
à avenida dos Estados, com casario remanescente da história da cidade, um
conjunto urbano com forte presença de cortiços.
Fig. 162: Casario remanescente, R. Deocleciana,
utilizado como cortiço, 2004.
Fig. 161: antigas instalações industriais,
R. Deocleciana.
337
E
VOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
Fig. 170: Tipologias remanescentes, R. Eduardo
Chaves.
Fig. 169: Detalhe de
edificação remanes-
cente, R. Eduardo
Chaves.
Fig. 163: Antiga entrada, Favela do Gato, 2003.
Fig. 164: Margem do Rio Tamanduateí com a
Favela do Gatojá retirada. Ao fundo, Hotel
Anhembí, 2004.
Fig. 165: Vila Operária, Av. Tiradentes.
Fig. 166: Tipologia remanescente, Av. Tiradentes.
Fig. 167: Casario remanescente, R. Porto Seguro.
Fig. 168: Antiga instalação industrial, R. Porto
Seguro x R. Porto Calvo.
338
6.2. Distrito do Brás6.2. Distrito do Brás
6.2. Distrito do Brás6.2. Distrito do Brás
6.2. Distrito do Brás
Ocupando a parte oriental da cidade, antigos registros mostram o Brás como
um local estruturado pela estrada que ligava as duas colinas históricas dos tempos
coloniais: São Paulo de Piratininga e Nossa Senhora da Penha de França. A
Estrada Geral, ou Caminho da Penha, atual avenida Rangel Pestana, possuía
algumas chácaras na sua margem e dois braços procuravam os bairros da Moóca
e do Pari: o primeiro seguia em direção ao atual Alto da Moóca e o segundo
pelas atuais ruas do Gasômetro e Monsenhor Andrade (Torres, 1985, 58).
Assim como os caminhos que atravessavam o Campo da Luz tiveram finalidade
religiosa e o fizeram também para ligar a cidade com Minas Gerais, as atuais
avenidas Rangel Pestana e Celso Garcia se constituíram em rotas religiosas e
vias de importância social e econômica, ligando a Imperial Cidade de São Paulo
à Côrte, através do Vale do Paraíba (idem, 58). Depois do Convento do Carmo,
ampla área vazia o separava da capela do Senhor Bom Jesus dos Matozinhos,
construída pelo português José Brás e que apresentava alguma concentração de
população no seu entorno. Nesse local, foi construída posteriormente a atual
igreja Matriz do Brás, concluída em 1903. (ibidem, 65-75). Durante décadas o
bairro foi ocupado apenas por chácaras, como a de Inácio José de Araújo, que
desde 1860 plantava uvas para fazer vinho. Nesse local passou a existir
posteriormente o Largo do Brás, renomeado em 1865 em homenagem à Praça
da Concórdia em Paris.
A chegada das ferrovias alterou profundamente a situação da acanhada Freguesia
do Brás e foi seguida de obras importantes para aquela região, como o aterrado
da Várzea do Carmo. Como foi analisado por Morse e Langenbuch na Parte I
deste trabalho, a preferência das ferrovias pelos terrenos planos não permitiu a
coincidência de traçado com os velhos caminhos coloniais, provocando a
decadência de núcleos que serviam de apoio às tropas de burros, como foi o
caso da Freguesia do Ó e da Penha, diferentemente do Brás, que mesmo sendo
antigo pouso de tropas, recebeu em 1865 a San Paulo Railway e em 1875 a
Estrada de Ferro do Norte (DPH, 1980, 38)
Iniciando os serviços de infra-estrutura urbana que foram implantados na cidade
por grupos estrangeiros, em 1872 o Brás recebeu a primeira usina de gás,
construída e explorada por ingleses. Localizou-se nas proximidades da atual
Casa das Retortas, na rua da Figueira, que cortou a chácara de propriedade da
Marquesa de Santos. Essa usina se destinava ao fornecimento de energia para a
iluminação pública e só com a drenagem da Várzea do Carmo, empreendida
no governo de João Teodoro (1872-1875), foi viabilizada a sua operação. O
primeiro edifício foi demolido por volta de 1912, funcionando quase duas décadas
com a Casa das Retortas, construída em 1889 para as mesmas finalidades (DPH,
1980, 20).
339
E
VOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
No ano de 1877 a Estação do Norte foi concluída, com o Brás já sendo ligado
ao Bom Retiro através das ruas abertas na Luz, sendo que esses dois bairros
também receberam a estação da Estrada de Ferro Sorocabana em 1875. As
funções comercial e industrial mudaram o aspecto desses bairros, havendo nos
registros da Câmara Municipal menções sobre o fluxo de mercadorias e pessoas
entre as Estações do Norte e Sorocabana, que exigiam melhoramentos das vias.
No Brás, iniciou-se a transformação do entorno do Largo da Concórdia, como
também das ruas Piratininga e Carneiro Leão. (DPH, 1980, 38-39; Torres, 1985,
108).
Em fins do século XIX o incremento populacional do Brás decorreu da imigração
estrangeira, particularmente dos italianos, premidos pela crise no campo de seu
país de origem: em apenas quatro anos, de 1886 a 1890, o bairro viu sua
população saltar de 5.998 para 16.807 habitantes. A escolha do Brás como
local de moradia pode ser explicada tanto pela presença de indústrias, que
foram um fator de atração à mão de obra destinada inicialmente à lavoura
cafeeira, como também da Hospedaria dos Imigrantes, que passou a funcionar
a partir de 1888 na rua Visconde de Parnaíba. Estudos mostram também uma
preferência pelo Brás dos imigrantes napolitanos, enquanto que no Bom Retiro
se concentraram os venetos e no Bexiga os calabreses (DPH, 1980, 43), devendo-
se a essa distribuição os seus antecedentes histórico-sociológicos da região de
origem na Itália (Véras, 2003, 85).
Em 1881 o bairro mostrava traçadas as ruas do Gasômetro, do Brás (atual
Rangel Pestana), além da Piratininga. Monbeig mencionou a “epidemia de
urbanização” que ocorreu na cidade entre 1890 e 1900, quando sua população
saltou de 65 mil para 240 mil habitantes, ocorrendo nesse período a abertura
de ruas populares no Bom Retiro e Barra Funda, além do início da urbanização
do Canindé e Pari (Monbeig apud Torres, 1985, 111).
Até os primeiros anos de 1900, no Largo da Concórdia funcionou o Mercado
do Brás. Na sua fachada a inscrição “Intendente de Obras Dr. Gomes Cardim,
Câmara Municipal de 1897” indicava a época de sua construção. Após sua
desativação em 1906 o
edifício foi arrendado e
passou a abrigar o Teatro
Colombo, também chamado
Teatro do Brás, planejado por
Artur Fried e inaugurado em
1908. Em 1966, quando já
não funcionava há cinco
anos, esse Teatro que
recebeu importantes
companhias dramáticas e
Fig. 171: Teatro Colombo.
340
musicais européias, sofreu um incêndio e foi destruído (disponível em:<htpp://
www.igc.sp.gov.br>2004). Atestando sua importância para o bairro, outro
elemento de referência situado no Largo da Concórdia foi o do Cine-Teatro
Frontão do Brás, edifício de 1927 que abrigou sede de clube social e dos cines
Babilônia e Brás, transformando-se posteriormente em loja de eletrodomésticos
e totalmente descaracterizado na década de 1990 (SEMPLA/Emplasa, 1984,
349).
Conhecido como um bairro com forte presença do proletariado, na passagem
do século XIX o Brás reunia um conjunto de estabelecimentos de ensino para
diferentes faixas da sua população, alguns deles voltados ao aprendizado dos
filhos dos operários, como foi o caso da Escola Profissional Feminina Prof. Carlos
de Campos, de 1911 e da Escola Normal, futuro Colégio Anchieta e Romão
Puiggari do final do século XIX.
Na Várzea do Carmo, posteriormente aos melhoramentos que deram origem ao
Aterrado do Gasômetro e do Aterrado do Brás, realizados durante o governo de
João Teodoro, em 1888 foi proposta e autorizada a construção de um parque,
através de concessão da Câmara Municipal, sendo o mesmo viabilizado quase
vinte e cinco anos depois. O Parque da Várzea do Carmo, a partir de 1921
denominado Dom Pedro II, apenas foi viabilizado com a venda de parte da sua
área para financiamento das obras, operação ocorrida em 1914. No ano 1917,
em meio ao grave surto de gripe espanhola que assolou a cidade, as obras
foram iniciadas, com a Várzea do Carmo dividida em vinte e cinco áreas e
implantado em quatro anos o projeto realizado em 1911 por Antoine Bouvard.
Com toda a sua área ajardinada e equipada com rede subterrânea de drenagem,
o Parque recebeu em 1920, o Palácio das Indústrias, importante elemento do
plano de recuperação da Várzea do Carmo. Nesse ano, embora incompleto,
esse edifício destinado a exposições agrícolas, comerciais e industriais, recebeu
a Exposição Internacional de São Paulo, o primeiro evento desse tipo a ocorrer
na cidade. O Palácio, cujo projeto é atribuído a Domiziano Rossi, da equipe de
Ramos de Azevedo, foi concluído apenas em 1924, ano de sua inauguração
oficial (SEMPLA/Emplasa, 1984, 417).
Em 1925, outro equipamento de prestígio foi destinado ao entorno do Parque, o
Mercado Municipal, que mesmo não se situando no Brás, foi indutor da ocupação
comercial de parte da área do bairro. Com as obras iniciadas em 1928 e
concluídas em 1933, o edifício de quase 13 mil metros quadrados projetado
por Ramos de Azevedo tornou-se uma referência arquitetônica da cidade e a
sua central de abastecimento por mais de três décadas, transferindo para lá os
comerciantes que ocupavam até então o Mercado Velho, na rua 25 de Março
(URBS, set/out 1998, 56). Com esse equipamento monumental, consolidou-se
no Brás a área de comercialização de produtos primários, a Zona Cerealista,
341
E
VOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
Fig. 174: Colégio
Romão Puiggari.
Fig. 172: Colégio
José de Anchieta.
Fig. 173: Colégio
Carlos de Campos.
342
beneficiada também pelas ferrovias que transportavam as safras do interior e
dos subúrbios próximos da cidade.
A retificação do rio Tamanduateí e o aterro da Várzea, a partir de 1914,
implicaram num duplo benefício para a área do Brás e para a cidade. Para a
primeira, pelo Parque ter se constituído na área de lazer principal dos bairros
fabris a leste do núcleo central e para a cidade por ter obtido uma ligação dos
bairros do sudeste com o norte, além daquela do centro com os bairros do leste.
Mas, já em 1938 o Parque recebeu a construção do viaduto da avenida Rangel
Pestana, o prolongamento da rua Tabatinguera e da avenida Mercúrio (URBS,
jun/jul 1998, 52) e o Plano de Avenidas consagrou a avenida dos Estados como
radial, que cortou o Parque longitudinalmente, estabelecendo a ligação com os
municípios industriais do ABC.
Sob o ponto de vista econômico, no Brás estruturaram-se pelo menos cinco
fortes atividades, além da industrial, constituídas pela zona de comércio
diversificado, zona cerealista, zona madeireira, confecções e máquinas
operatrizes. Um estudo sobre a função comercial do Brás assim descreveu a
espacialidade da área que se estendia do Largo do Brás até a rua Bresser, que
reunia lojas, agências bancárias, cinemas, bares e confeitarias: A paisagem
urbana, nessa principal área do comércio varejista, não se distingue pela beleza
dos edifícios. Na verdade, a maioria das casas comerciais aloja-se em velhos
pardieiros, construídos em fins do século passado e em princípios do atual; as
reformas feitas nas fachadas de alguns deles não conseguiram esconder ou
disfarçar seu aspecto anti-estético. Os ‘arranha-céus’ de cimento armado são,
ainda, em número relativamente pequeno, o que contribui para que o Brás e
arredores ofereçam uma fisionomia antiquada, em contraste marcante com a
vizinha Área Central da cidade” (Mendes apud Azevedo, (org), 1958, 241)
A zona cerealista,
formada pela vizinhança
com o Mercado
Municipal, foi a única
área de abastecimento de
grãos e hortifrutigranjeiros
até a década de 1960,
quando uma grande
enchente determinou o
início dos estudos de um
centro de abastecimento
na Vila Leopoldina,
estando a Zona Cerealista
já comprometida com os
congestionamentos e
Fig. 175: Viaduto Rangel Pestana, inaugurado em 1968.
343
E
VOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
inadequação dos depósitos em uma área de grande circulação. Em 1969 o
Ceasa foi inaugurado na zona oeste da cidade, mas a Zona Cerealista não se
transferiu por inteiro. Embora sem a mesma importância que possuía
anteriormente, continuou a ser alvo de seguidos planos para sua mudança total
e apenas em meados da década de 1990, após longo período de deterioração
ambiental, parte de sua área passou por um processo de requalificação dos
depósitos e edifícios residenciais que foi planejado e executado pelos próprios
comerciantes locais.
A zona madeireira começou a receber os primeiros estabelecimentos no início
da década de 1940, quando uma loja foi aberta na rua do Gasômetro.
Igualmente à Cerealista, recebeu estudos para sua transferência devido ao
impacto provocado na área pelo transporte de cargas, que passou a utilizar
intensamente os caminhões a partir da década de 1950. Com a descentralização
das lojas, o Brás dividiu com os bairros de Pinheiros, Lapa e Butantã esse tipo de
comércio, mas uma outra especialização, a do comércio de couros, também se
localizou nas ruas próximas à avenida Rangel Pestana, ambas caracterizando a
maior concentração desses estabelecimentos na cidade.
A zona de confecções e de máquinas operatrizes, por sua vez, se estruturaram
em conseqüência direta das indústrias têxteis e metalúrgicas existentes no Brás,
através do processo de vizinhança e aglutinação. As confecções seguiram ao
longo da rua Oriente, ocupando gradativamente suas transversais, tais como
Silva Telles, Müller, Barão de Ladário, etc. Uma hipótese para essa ocupação é
a de ter ocorrido um processo semelhante ao da rua José Paulino, em que a
área passou a ser alvo do trabalho de membros da colônia sírio-libanesa, que
Fig. 176:
Recuperação de
galpões da Zona
Cerealista.
344
como explicou Véras, havia se fixado nas proximidades da zona do mercado, a
partir da década de 1920 (2003, 92-94). Uma comprovação desse fato pode
se encontrar na toponímia original da rua, que era a de “rua do Oriente”. A
zona de máquinas operatrizes ocupou principalmente a rua Piratininga, junto à
concentração de metalúrgicas do Brás e das zonas fabris da Moóca e Ipiranga,
bairros estes acessados por essa via e que também possuíam grande número de
indústrias desse ramo.
Juntamente com as transformações ocorridas no Brás, o Parque D. Pedro II, que
foi considerado o “vestíbulo da cidade”, por Prestes Maia, também perdeu suas
características originais, tornando-se cada vez mais um local de passagem. O
Palácio das Indústrias abrigou entre 1947 e 1968 a Assembléia Legislativa do
Estado e posteriormente, órgão da Secretaria de Segurança Pública. A partir de
1968 foi implantado também o complexo de viadutos que seccionou o Parque,
constituindo-se em uma intervenção que comprometeu profundamente seu espaço
e qualidade de área pública.
Um desses viadutos, conectou a zona oeste ao traçado recém-completado da
Radial Leste, que na década de 1950 recebeu nas propostas de Moses para o
sistema expresso e de Prestes Maia para o Metrô, calha segregada para o
transporte público, feita por ônibus e trilhos, respectivamente. Ao invés disso,
quando concluída, configurou-se como via expressa que dividiu as áreas dos
bairros existentes em seu trajeto, não incorporou os espaços segregados
reservados ao transporte de massa e na extremidade oeste de seu percurso,
implantou as pistas do Elevado Costa e Silva, destinado exclusivamente ao
transporte individual e causador de intenso impacto na avenida São João e suas
imediações.
Outra transformação de grande escala ocorrida na morfologia dessa área foi
desencadeada como decorrência da passagem da linha Leste-Oeste do Metrô.
A partir de 1975, essa intervenção implicou na desapropriação e demolição de
944 casas de 28 ruas do Brás (DPH, 1980, 60), que deram lugar a um grande
espaço vazio quando em 1977 as obras finalmente foram iniciadas. Muitas
Fig. 177: Sistema viário cortando o Pq. D. Pedro II.
345
E
VOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
dessas casas e vilas não se encontravam no trajeto da linha, mas em seu entorno.
Essa intervenção integrou o Projeto CURA Brás-Bresser (Comunidades Urbanas
de Recuperação Acelerada) e eram previstas as seguintes atuações no bairro:
1 – Programa para implantação de habitações, comércio e serviços na quadra
entre a rua Piratininga, Campos Sales e Caetano Pinto. Foram propostos edifícios
habitacionais de 14 andares com seis apartamentos em cada andar-tipo.
2- Construção de escola de educação infantil e creche junto à Estação Bresser.
Construção de creche na rua da Alfândega e Centro Cultural na rua Domingos
Paiva.
3- Reurbanização do Largo da Concórdia.
4- Recuperação da Praça Agente Cícero e das áreas entre os Viadutos Rangel
Pestana e do Gasômetro.
5- Recuperação da área sob o viaduto Alberto Marino para a ampliação da
Praça Agente Cícero
6- Construção de uma passagem subterrânea sob o leito da ferrovia, ligando a
Praça Agente Cícero à avenida Rangel Pestana (idem, 60).
O então denominado “Novo Bairro”, seria o resultado dos programas de
recuperação urbana desenvolvidos pelo Projeto CURA na região. O órgão
municipal encarregado dessas intervenções, a EMURB, previa que a na área
onde as mesmas seriam implantadas, ocorreria uma transformação tal que se
igualaria ao cenário de outras áreas da cidade densamente povoadas, com
vários prédios e sobrados de dois e três andares, absorvendo uma parte do
crescimento da população. Uma publicação técnica da Prefeitura e do Metrô
afirmava que “o antigo centro de concentração dos imigrantes italianos, o bairro
do século XIX,
será esquecido pelos paulistanos, tornandoserá esquecido pelos paulistanos, tornando
será esquecido pelos paulistanos, tornandoserá esquecido pelos paulistanos, tornando
será esquecido pelos paulistanos, tornando
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--
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se mera recordaçãose mera recordação
se mera recordaçãose mera recordação
se mera recordação
da história de São Pda história de São P
da história de São Pda história de São P
da história de São P
aulo”aulo”
aulo”aulo”
aulo” (PMSP/Metrô, 1979, 115, grifo nosso).
Fig. 178: Interveção do Projeto CURA na região das hoje estações
de metrô Pedro II e Brás.
346
Fig. 179: Interveção do Projeto CURA na região das hoje estações
de metrô Brás e Bresser.
347
E
VOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
6.2.1 Análise dos sub6.2.1 Análise dos sub
6.2.1 Análise dos sub6.2.1 Análise dos sub
6.2.1 Análise dos sub
--
--
-
setoressetores
setoressetores
setores
O sistema viário do setor urbano que engloba o distrito do Brás apresentava
pelo levantamento cartográfico de 1930 uma avenida estrutural de grande
importância, a Rangel Pestana, e outras vias articuladoras de sua área com os
bairros vizinhos, as ruas Oriente, do Gasômetro, da Figueira e Moóca. O Brás
foi dividido em quatro sub-setores correspondentes às referências existentes em
cada um, áreas de transição entre um sub-setor outro, e também entre o bairro
e aqueles a ele interligados:
1º- Esse sub-setor foi definido por se caracterizar como uma área de influência
mútua entre Parí e Brás, dada toda a malha viária implantada integrar essa
área, que se comunicava também com a Luz através das ruas São Caetano e
João Teodoro. A primeira se constituiu no acesso principal tanto à penetração
dos bairros do Canindé e Parí, através da avenida Valtier, como também do
Brás, através da Monsenhor Andrade. Essa via atravessava os trilhos da San
Paulo Railway em nível, atingindo assim um setor do Brás com grande número
de indústrias e acessando também a rua Oriente.
A rua João Teodoro (atual limite de distrito entre o Brás e o Parí) e as poucas
quadras que a distanciavam da rua Oriente apresentavam um parcelamento
uniforme, caracterizado por uma série de ruas ortogonais, muitas vez interrompidas
por quadras de maiores dimensões, como é o caso das ruas Elisa Whitacker,
Henrique Dias e Júlio Ribeiro. Verifica-se que a continuidade desta última rua foi
assinalada como não oficial no Levantamento Sara Brasil.
A continuidade da malha viária entre o Brás e o Parí revela uma diferenciação
importante com a do entorno do Bom Retiro, pois ali a disposição das linhas
ferroviárias interrompia ligações com os Campos Elísios e Santa Efigênia. Apesar
dos trilhos também seccionarem o Brás, a continuidade das vias permitiu uma
integração acentuada entre os bairros envoltórios, criando barreiras ao longo
dos eixos ferroviários pelo fato de ali ter se instalado um grande número de
indústrias, margeando mais a San Paulo Railway do que a Ferrovia do Norte.
Mesmo assim é possível observar na carta cadastral de 1930 a continuidade do
tecido urbano de uma vasta região, compreendendo o Brás, Parí, Canindé,
Belenzinho e Moóca.
Além da proximidade com as estações ferroviárias, outro aspecto importante
para a estruturação dessa área foi o do transporte de bondes. O mapa da Light
de 1925 já mostrava a linha que vinha da Luz e percorria a ruas São Caetano,
Monsenhor Andrade e Oriente até o seu final. Essa rua desempenhou um papel
de via de penetração e distribuição percorrendo longitudinalmente parte do Brás,
o mesmo ocorrendo com a rua João Teodoro em relação ao Parí. Ambas em
paralelo direcionavam-se à área do Catumbí e Belenzinho, através de ligações
348
com outras vias, interconectando áreas com grande atividade industrial e de
moradia popular.
Um dos limites desse sub-setor foi formado pelo Pátio do Parí, que reunia os
armazéns e ramais ferroviários da San Paulo Railway e que funcionou como
alfândega seca da cidade. Esse espaço já possuía a configuração atual, cercado
por armazéns e edificações ao longo da rua São Caetano e Monsenhor Andrade.
Nessa via, entre a rua Oriente e a linha férrea e próxima ao Parí, situou-se a
Escola Profissional Feminina Professor Carlos de Campos, criada em 1911. Essa
escola instalou-se, inicialmente, num antigo sobrado na rua Monsenhor de
Andrade, onde anteriormente funcionou o Colégio Azevedo Soares. Em meados
da década de 1920, esse primeiro edifício foi considerado inadequado, o que
levou o Governo do Estado a construir um novo prédio para a escola, de acordo
com os preceitos de higiene, harmonia e beleza. Em 1930, foi entregue a primeira
etapa da construção, sendo que a outra prevista não foi executada (disponível
em <http:// www.etecarlosdecampos.com.br> em 2004).
Uma alteração ocorrida na rua Monsenhor de Andrade diz respeito à passagem
em nível sobre a ferrovia da área do Parí para a área do Brás, que favorecia o
acesso ao Largo da Concórdia ou à Estação Roosevelt, que era intensamente
utilizada até a década de 1970 e que posteriormente foi fechada. Como
alternativa para a travessia ao outro lado da mesma rua, restou a passarela
metálica implantada também pela San Paulo Railway no final da rua Rodrigues
dos Santos, que conecta a rua do Bucolismo, no outro lado da ferrovia.
Esse sub-setor apresenta a rua Oriente e avenida Rangel Pestana como as duas
vias principais, com a diferença que na primeira, as ruas transversais de ligação
Brás-Parí não foram interrompidas ao cruza-la, enquanto que na Rangel Pestana,
a malha viária não manteve a continuidade, apresentando ligações seccionadas
entre os dois lados daquela avenida. Além das estações ferroviárias, teve como
referências espaços e equipamentos que caracterizaram o bairro – o Teatro
Colombo e o Largo da Concórdia – fronteiriços às Estações do Norte e do Brás,
além de outro estabelecimento de ensino importante nesse bairro, a Escola
Normal, posteriormente Colégio José de Anchieta, com as mesmas funções
daquela situada na Praça da República, posteriormente denominada Caetano
de Campos .
Pela carta de 1930 é possível verificar a concentração dos grandes lotes e
instalações industriais nas áreas lindeiras à San Paulo Railway, que caracterizavam
a principal zona fabril da cidade. O parcelamento intenso da área, como de
resto em todo o bairro, apresentava raros vazios e apenas nas proximidades da
rua Bresser os lotes apresentavam dimensões maiores,mas também com caráter
industrial. No cruzamento das ruas Bresser e Sampson foi construído um conjunto
que exemplifica a permanência das características construtivas do início do século
349
E
VOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
XX, a Vila Simeone, que manteve nas cartas de 1954, 1972 e na foto aérea de
2000 a mesma configuração verificada no levantamento Sara-Brasil. Através
dessa carta cadastral é possível verificar nessa Vila a solução da abertura de
travessas, usual nas áreas e conjuntos de habitação popular da época, que por
descumprirem as normas urbanísticas que definiam as larguras das mesmas,
passavam a ser consideradas não oficiais.
A transformação urbana mais destruidora de um espaço que se constituiu em
importante referência do bairro, ocorreu no Largo da Concórdia e seu entorno
imediato. Confrontada com o levantamento de 1930, na carta de 1954 se verifica
a existência do viaduto da rua do Gasômetro sobre os trilhos da San Paulo
Railway, que em sua extremidade junto ao Largo, seccionou uma grande quadra
lindeira à ferrovia. O Largo contava ainda com o Teatro Colombo, mas parte de
sua área junto a avenida Rangel Pestana foi cortada para receber trilhos dos
bondes que utilizavam o viaduto e estabeleciam a ligação do centro com o
Belém, Tatuapé, Mooca e Penha.
O mapa de 1972 mostra a existência do outro viaduto sobre a linha ferroviária,
construído em 1968 para solucionar o problema da passagem em nível da
avenida Rangel Pestana. Adotando uma das alternativas preconizadas por Prestes
Maia, que propunha também uma passagem subterrânea para o local, o Viaduto
contou com balanços laterais para a espera de linha do Metrô, o que nunca
ocorreu (Torres, 1985, 199). Apesar de resolver o problema de circulação viária
da maneira mais econômica do que uma passagem subterrânea, ao substituir as
“Porteiras do Brás”, esse viaduto ocasionou impactos no entorno do Largo, como
o enclausuramento do pedaço de quadra que já havia sido seccionada pelo
viaduto do Gasômetro, um obstáculo à Estação Roosevelt e um sempre crescente
fluxo de veículos na avenida Rangel Pestana, além de espaços precários nos
baixos dos viadutos. Na década de 1960, o Largo da Concórdia se transformou
em um terminal de transporte e em 1966 perdeu sua última característica relevante
com o incêndio do Teatro Colombo (idem, 175).
Atualmente a função comercial, ligada às confecções, predomina no sub-setor,
com maior presença de habitação entre as ruas João Teodoro e Oriente. Entre
esta e a avenida Rangel Pestana, com exceção de alguns espaços remanescentes
na rua Rodrigues dos Santos, o comércio ocupa todas as quadras. Ocorre também
uma renovação de tipologias, com prejuízo à arquitetura e às funções
anteriormente existentes, como é o caso da substituição dos galpões anexos ao
Pátio do Parí, na rua Monsenhor Andrade e da demolição da maior parte das
instalações do antigo colégio Liceu Acadêmico São Paulo, na rua Oriente. Em
ambos os casos, os remanejamentos estão ligados à construção de centros de
compras do ramo de confecções.
350
Fig. 180 e 181: Rangel
Pestana - à esquerda,
Igreja Matriz do Brás; à
direita, tipologia de
verticalização da década
de 1940.
Fig. 182, 183 e 184: Ao lado, vila operária na Av.
Rangel Pestana. Abaixo: À esquerda, Shopping de
confecções; à direita, transformação do antigo Liceu
Acadêmico São Paulo, 2004.
351
E
VOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
2º – A análise deste sub-setor no mapa cadastral de 1930 permite observar que,
devido a presença das estações do Norte e da San Paulo Railway, os lotes de
maiores proporções para as instalações industriais não se localizaram junto aos
trilhos da San Paulo Railway, estando distribuídos pelo conjunto de quadras.
Duas vias transversais à Rangel Pestana, ruas do Hipódromo e Bresser, cruzavam
a ferrovia Essa última prolongava-se também até o Parí, cruzando a rua João
Teodoro, e se constituía num dos raros eixos transversais à avenida Rangel Pestana
a promover a ligação nordeste – sudeste, ou seja, a ligação entre o Parí e a
Mooca.
As Estações Ferroviárias se constituíram nas principais referências desse setor,
juntamente com a Hospedaria dos Imigrantes, situada na rua Visconde de
Parnaíba, denominada no levantamento Sara-Brasil “Departamento Estadual do
Brasil”. Esse edifício foi projetado por Mateus Haussler, a partir meados da década
de 1880, que projetou posteriormente o Palácio dos Campos Elísios em 1899
(SEMPLA/Emplasa, 1985, 428). Está situado atualmente na área do distrito da Moóca,
mas a identificação histórica sempre a relacionou com o bairro do Brás. Na década
de 1940, substituindo os trens que chegavam do Porto de Santos com imigrantes
europeus para a Hospedaria, os chamados “paus de arara”, caminhões vindos do
Nordeste trazendo migrantes miseráveis, faziam ponto perto dos muros da Estação
Roosevelt (disponível em <http://www. patrimoniosp.com.br> em 2004).
Outra referência que a carta cadastral de 1930 permitia observar era a garagem de
bondes situada na avenida Rangel Pestana, esquina com rua José de Alencar, que
ocupava também uma grande área da quadra. Essa garagem recebia os bondes que
percorriam o trajeto do centro ao Brás, através da rua Oriente e os que ligavam
o centro à Penha. Dentro da malha viária desse sub-setor, encontrava-se também
a Estação de Bombeiros do Norte, situada na rua do Hipódromo.
Observa-se que em 1930 a passagem pela Ferrovia do Norte era feita em nível
pelas ruas do Hipódromo e Bresser, em 1954 apenas pela Bresser e na década
de 1970 já se fazia por viaduto através dessa via, permanecendo a passagem
do Hipódromo interrompida. Nesse sentido, é o sub-setor em que a barreira dos
trilhos ferroviários criou mais interferências até a década de 1970, sendo acrescido
na década seguinte, também o Metrô.
Em fins da década de 1970 a construção do Metrô trouxe outra intervenção de
vulto, desta feita no limite do sub-setor com a Moóca. Foi representada pela
implantação da Estação Bresser e a desapropriação das quadras do entorno
dentro do programa de renovação urbana do Projeto CURA Brás-Bresser. Junto
a essa Estação, duas quadras foram desapropriadas e todas as habitações
demolidas para dar lugar às torres residenciais que foram construídas apenas
em meados da década de 1980, como ocorreu também na extensão da linha
em direção da Estação da Sé, em outra área do Brás.
352
Atualmente esse sub-setor se
apresenta com um processo de
encortiçamento elevado em suas
construções, particularmente no
perímetro compreendido entre as
ruas Dr. Almeida Lima, junto à
estação Roosevelt, do
Hipódromo, avenida Rangel
Pestana e Vinte e Um de Abril,
que inclui as ruas Cavalheiro,
Paulo Afonso e Uruguaiana.
Nesse espaço, a quase totalidade
dos edifícios e residências,
abrigam habitações coletivas em
precário estado e além dos
inúmeros depósitos, e
transportadoras, a região serve
ainda como rodoviária de ônibus
particulares que se dirigem ao
nordeste do país. Outro aspecto
evidente é a total ausência de
áreas livres e espaços públicos,
pois os poucos existentes,
abrigam as atividades do
comércio informal.
Fig. 185: Hospedaria dos Imigrantes, 1910.
Fig. 186: Tipologia remanescente, Rua do Hipódromo.
Fig. 187 e 188: À esquerda, Família Garibaldi, Rua Uruguaiana 2001. À direita, o mesmo edifício em 2004.
353
E
VOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
3º – Esse sub-setor e o seguinte apresentam como uma das características urbanas
principais, a de estabelecer contato com o núcleo central, realizado através de
toda extensão do Parque D Pedro II. Nele, as inúmeras referências que a carta
de 1930 permite identificar, já eram existentes desde o final do século XIX: Pátio
do Parí, Largo do Parí, Casa das Retortas, Vila Queiroga, rua Monsenhor de
Andrade, rua do Gasômetro, etc. A rua da Alfândega interligava a rua do
Gasômetro ao Pátio do Parí, que tinha a rua Américo Brasiliense (atual Prof
Eurípedes Simões de Paula) como uma das delimitações. A mesma situação se
apresentava no mapa de 1954, sendo que o de 1972 mostra a rua Mendes
Caldeira já aberta, definindo novos acessos tanto pela rua Santa Rosa, como
pela da Alfândega, além de nova delimitação ao Pátio.
Duas outras importantes referências situavam-se na rua Monsenhor Andrade: o
Moinho Matarazzo e a Tecelagem Mariângela, do mesmo grupo empresarial. A
primeira indústria tinha também um dos seus limites de lote lindeiro à ferrovia e
o outro com a rua Flórida, atual rua do Bucolismo. Entre esta última e sua
paralela, a rua Sampaio Moreira, foi implantada uma vila de casas populares
também com acesso através de rua não oficial pelo mapa de 1930, atualmente
denominada rua Vadico.
Tanto a rua do Gasômetro quanto a avenida Rangel Pestana possuíram linhas
de bonde que acessavam ao centro. Na primeira, em direção aos bairros, a
linha bifurcava-se na direção da rua Piratininga e na direção da Monsenhor
Andrade. Na Rangel Pestana, a linha seguia na direção da Penha, passando em
nível pelo cruzamento com os trilhos da San Paulo Railway e ladeando a Ferrovia
do Norte após sua estação. Outra característica da rua do Gasômetro e da
avenida Rangel Pestana era a de não possuírem os viadutos sobre os eixos
ferroviários, como já visto.
Ainda pelo mapa de 1930, o Parque dom Pedro II apresentava o paisagismo
original de Bouvard e a rua do Gasômetro o cortava transversalmente defronte
ao Palácio das Indústrias, superando em sua outra extremidade, os trilhos da
estrada de ferro em nível. Em 1954 o Parque já era cortado por bondes através
da Rangel Pestana, cuja passagem sobre os trilhos da ferrovia Santos-Jundiaí
ainda se fazia em nível. Pelo mapa de 1972, tanto a rua do Gasômetro quanto
a avenida Rangel Pestana superavam os trilhos ferroviários por viadutos.
Assim como essas travessias sobre a ferrovia provocaram desdobramentos na
região do Largo da Concórdia, contribuindo para sua descaracterização, o
complexo de viadutos implantado a partir de 1968 causou o aprofundamento
da deterioração do Parque Dom Pedro II e do seu entorno. Com o Parque
retalhado por vias expressas aéreas, seu caráter de área de lazer foi abandonado
e apenas na década de 1990 sua requalificação foi ensaiada com a transferência
da sede da Prefeitura para o Palácio das Indústrias.
354
Outro espaço livre presente no sub-setor analisado é do Pátio do Pari, área de
galpões ferroviários implantada a partir de 1891 pela San Paulo Railway para o
depósito de mercadorias de exportação e importação e que com o declínio dos
transportes ferroviários, entrou em desuso, com seus 16 hectares constituindo
uma interrupção do tecido urbano entre a área central e os bairros da Luz, Pari,
Canindé e Brás.
Nesse sub-setor encontram-se também delimitadas duas áreas de comércio
especializado de São Paulo, que emprestaram forte identidade ao local e ao
próprio bairro do Brás: a Zona Cerealista e a Madeireira, articuladas entre o
Parque D. Pedro II, o Largo da Concórdia e a avenida Rangel Pestana. A morfologia
desse perímetro intercala galpões utilizados por depósitos, com edifícios de
moradias e ainda vilas remanescentes das primeiras décadas do século XX, como
é o caso da Vila Queiroga.
Atualmente esse sub-setor aglutina uma série de espaços de interesse, que
receberam iniciativas públicas e privadas para sua reabilitação: como já
mencionado, em fins da década de 1990, os galpões da zona cerealista foram
reformados pelos seus proprietários, que promoveram melhoramentos também
em diversos edifícios residenciais dessa área. Por outro lado, a Prefeitura definiu
projetos para o Parque D. Pedro II e rua do Gasômetro, incluindo nessas ações,
a reconversão do Palácio das Indústrias como um Centro de Convenções e a
Casa das Retortas em museu e centro cultural. No primeiro semestre de 2004 houve
também a desapropriação do edifício São Vito, para futura requalificação como
habitação social.
Fig. 189, 190 e 191: Acima, à esquerda: Vila Vadico;
à direita, Tipologia remanescente na Rua Piratininga.
Ao lado, tecelagem Mariângela, início do séc. XX.
355
E
VOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
Fig. 192: Rua do
Gasômetro, 1957.
Fig. 193: Rua do
Gasômetro,2003.
Fig. 194: Rua do Gasômetro:
Tipologia remanescente, comércio
de madeiras, 2003.
356
4º– Pelo mapa de 1930 esse sub-setor apresentava implantadas as suas
referências principais, representadas pelos grandes tanques cilíndricos do
Gasômetro, fronteiriços à rua da Figueira e ao Parque Dom Pedro II, além do
Grupo Escolar do Brás, atual E.E Romão Puiggari, edifício de 1898 projetado
por Ramos de Azevedo, fronteiriço à Matriz do Brás e junto da Escola Técnica
Masculina, na rua Piratininga.
Como nos espaços do Bom Retiro, Parí e do próprio Brás, o parcelamento do
solo obedeceu ao padrão de lotes com testada de pequena metragem e bastante
profundos em relação à quadra, proporcionando a ocupação intensiva pelos
cortiços e vilas, exemplificado pelo perímetro compreendido pelas ruas Carneiro
Leão, Visconde de Parnaíba e Piratininga, que abrangia também as ruas Caetano
Pinto, Campos Sales e Paraná, espaço integrado por um grande número de
cortiços. O exame dessa carta mostra também uma série de ruas consideradas
não oficiais, como é o caso da Travessa Malvina, na rua Piratininga, próxima a
Escola Técnica Masculina e da Vila Rosa, na rua Carneiro Leão próxima a Azevedo
Júnior.
A presença de lotes ocupados por edifícios de grandes dimensões na carta
cadastral de 1930, revela também a continuidade da principal zona fabril da
cidade, que acompanhava a ferrovia e se mesclava ao tecido urbano, revelando
a intensidade da ocupação então existente. A rua da Moóca estabelecia o limite
entre a ocupação com as características anteriores e aquela com maior
aproveitamento para finalidade de moradia. Nesse caso, como de resto em
toda a área pesquisada, verificava-se também a presença de diversas ruas
consideradas não oficiais, como era o caso do entorno da rua Xingu, próximo à
rua Coronel Cintra, onde assim foram nomeadas a Vila Alvarenga e a rua Andrade
Reis.
Fig. 195 e 196: À
esquerda, tipologia
remanescente, Rua
Caetano Pinto. À
direita, sinal do
tempo: Trilho de
bonde na Rua Martin
Bouchard.
357
E
VOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
Fig. 197 e 198: À esquerda, Travessa Sobral x R. Carneiro Leão. À direita, antigas instalações industriais
na R. Carneiro Leão.
Fig. 199: R. Carneiro Leão x Av. Rangel Pestana.
358
6.3. P6.3. P
6.3. P6.3. P
6.3. P
aríarí
aríarí
arí
Situado a nordeste do núcleo central, as origens do Pari remontam ao século
XVI, pois já em 1593 o Caminho do Pari era conhecido. A sua denominação
deriva da atividade da pesca baseada em um processo primitivo de captura que
utilizava uma cerca de taquara, denominada Parí, que atravessava o rio de
margem a margem. O Pari começou a ser urbanizado em fins do século XIX, em
conexão com a Luz e o Brás, sendo a ferrovia o elemento estruturador de indústrias
e de vilas operárias. Em seus limites com o Brás, foi instalado também um
equipamento que desempenhou importante papel na definição da vocação da
sua área envoltória: a alfândega seca no Pátio do Pari, um conjunto de depósitos
da San Paulo Railway ligados ao comércio de importação e exportação.
Conectado ao Parí, as origens do Canindé também remontam o século XVI,
quando era conhecido por Guaré. Em 1856 o bairro era constituído pela Chácara
Couto de Magalhães, loteada em fins do século XIX, ganhando o nome de uma
das principais cidades do estado do Piauí. (Gazeta do Brás, nov. 1976; NP, 7/
11/1976, 12). Destacando-se na planície ocupada pelos bairros do Pari e
Canindé, o Morro do Pari, também chamado de Alto do Pari, foi o local que
apresentou uma urbanização caracterizada por vielas e becos, relacionada aos
imigrantes que ocuparam gradativamente o local. No início do século XX, toda
a área dos bairros do Pari e do Canindé ainda abrigava as atividades das olarias,
de propriedade dos italianos e da criação de gado, dos portugueses (idem, 12).
As olarias deixaram ainda na toponímia da rua que liga o Pari (bairro mais alto)
ao Canindé (bairro mais baixo), o testemunho dessa atividade.
Em 1911 foi iniciada a construção daquela que se tornou a mais importante
referência do bairro, a Igreja de Santo Antônio do Pari, fruto de uma ação entre
os doadores das colônias italianas e portuguesas para sua construção. Essa
Igreja formou juntamente com o Lgo. Padre Bento um espaço que emprestou
forte identidade ao bairro, recebendo também
um conjunto escultórico.
Por estar próximo ao centro da cidade de São Paulo e de outros bairros populosos,
a ocupação do Parí se realizou de forma crescente, sendo elevado à categoria
de 25º Subdistrito da Capital pela lei nº 8.637 de 1934. Sua extensão, de 5,46
Km², abrangia o Canindé, a Vila Guilherme e vilas adjacentes, sendo que em
1964 a Vila Guilherme se desmembrou desse subdistrito, que passou a abranger
somente o bairro do Canindé, com sua área caindo para 2,75 Km². Em
conseqüência dessa diminuição, a sua densidade demográfica, que era de 64,1
hab/ha em 1960, aumentou para 111,6 hab/ha (ibidem, 12).
As transformações urbanas ocorridas no Parí e no Canindé alteraram uma
paisagem que, segundo o capomastri Oliviero Fuzari, na década de 1920 era
ainda formada por pastos, chácaras e várzeas. Segundo esse mestre-de-obras
italiano, nascido em Lucca, na Toscana, a sua atividade foi intensa já na metade
da década de 1930, tendo construído aproximadamente 100 casas na área do
359
EVOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
Fig. 200: Casario rema-
nescente na R. Juruá,
Canindé, 2003.
Fig. 201, 202 e 203: Ao
lado, Pça. Padre Bento em
1957. Abaixo, à esquerda,
placa comemorativa da
inauguração do conjunto
escultórico; à direita, Pça.
Padre Bento em 2003.
360
Pari e Canindé, dentre elas 16 sobrados na rua Juruá e todos os da rua Mario
Ibara de Almeida, entre outras obras (op. cit, 12).
Nas primeiras décadas do século XX, parte do Parí já se encontrava conectado
ao Brás e ao Belenzinho, onde as vilas operárias como a Queiroga e Vila Maria
Zélia já haviam sido construídas, assim como ocorria com a Luz, no caso da Vila
Economizadora. Na área compreendida pelo Canindé, as quadras ao longo da
atual avenida Cruzeiro do Sul revelam a similaridade da tipologia com as da
Ponte Pequena, situadas entre essa via e a avenida dos Estados, antiga
Tamanduateí. Por contar, além do obstáculo representado pela Várzea do Tietê,
com áreas que permaneceram vazias por longo período, como o do Campo da
Força Pública ou da proximidade das lagoas formadas pela extração de argila,
o bairro mostrou setores rarefeitos demográficamente e em alguns casos,
ambientes semi-rurais que perduraram por muitas décadas.
Sob o ponto de vista da ocupação, ao longo das décadas de 1950 e 1960 o
Parí e o Canindé mantiveram as características básicas dos períodos anteriores:
a mescla da habitação com indústrias de pequeno e médio porte, baixa oferta
de serviços públicos, área comercial com predominância do ramo de confecções
na transição com o Brás e diversificado número de indústrias em seu tecido
urbano. Grande parte do casario do início do século XX, construído já como
cortiço ou adaptado para tal, mesclava-se nas ruas com renques de casas térreas
ou de pequenos sobrados. O sobrado que incluía um salão comercial no térreo
e uma residência no andar superior foi também uma tipologia disseminada desde
as primeiras décadas do século XX, com grande permanência ainda nos dias
atuais.
Apesar da predominância dessas tipologias, um diferencial foi o de alguns
conjuntos de quadras se caracterizaram por apresentar um padrão de moradia
muitas vezes superior às demais, tanto no Parí, em maior grau, quanto no Canindé.
Esse fato comprova a forma menos segregada de moradia que existiu nesses
bairros, e em geral na cidade. As quadras mencionadas apresentavam lotes de
maiores proporções, um casario com recuos frontais e laterais, maiores volumes
e jardins, todos esses exemplos do “morar à francesa” (Lemos, 1999, 23)
característicos dos bairros de alta renda da cidade, reproduzidos em escala
reduzida outras nas áreas da cidade.
Diferentemente do Bom Retiro e do Brás, onde tal ocorrência se verificou em
quantidade muito menor, aquelas formadas no Pari e no Canindé contrastavam
com os inúmeros cortiços e até uma favela já existente na década de 1960. Algumas
hipóteses podem ser formuladas:
- Sob o ponto de vista da ocupação ocorreu uma substituição das primeiras
construções desses bairros, ou simplesmente o preenchimento dos lotes ainda
vazios, ambos denunciados por edificações mais recentes.
361
EVOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
- A ocupação horizontal predominante no Parí e Canindé atendia a um setor da
classe média que em outros bairros encontrou na verticalização uma alternativa
de novas formas de moradia, como pode ter sido o caso do Bom Retiro.
- No Brás e no Bom Retiro, tanto a idade das construções, quanto a
homogeneidade do parcelamento, constituído predominantemente de pequenos
lotes, impedia a existência dos setores de moradia horizontal de padrão médio
encontrados no Pari. Um indicador dessa diferença é o maior número de pequenos
edifícios no Brás e no Bom Retiro, que no Canindé e Parí. Como se sabe, as
construções com até quatro pavimentos foram uma solução econômica para a
moradia popular e de classe média em bairros centrais a partir da década de
1940, barateando o custo da habitação.
Nas décadas de 1960 e 1970 as inúmeras indústrias alimentícias e revendas
que se aglutinaram no distrito, emprestaram ao mesmo uma de suas características
mais recentes: a de bairro doce”, que no entanto já nas décadas seguintes
entrou em declínio. Esse fator se deu em função da legislação municipal e estadual,
limitadoras das atividades e da ampliação dos estabelecimentos, bem como ao
crescente interesse comercial em relação à utilidades domésticas de baixo custo,
que se tornou uma especialização do local.
Fig. 204, 205 e 206: Acima, à esquer-
da, ilustração jornalística mostrando
casario da R. Padre Lima, o mesmo
aparecendo em foto de 2003 à direita.
Ao lado, edificação remanescente,
também na R. Padre Lima.
362
6.3.1. Análise dos sub6.3.1. Análise dos sub
6.3.1. Análise dos sub6.3.1. Análise dos sub
6.3.1. Análise dos sub
--
--
-
setoressetores
setoressetores
setores
Diferentemente dos setores urbanos Bom Retiro e Brás, todo o setor do Parí não
contou com vias que fizeram parte do sistema estrutural da cidade para a
ocupação de seu território, o que o configurou e ainda configura como uma ilha
entre os bairros ao norte e ao leste do núcleo central.
Os mapas históricos mostram a abertura de ruas em continuidade ao tecido já
existente de bairros contíguos, como comprova a situação no detalhe do mapa
de 1915 em relação ao de 1930. A inexistência de uma carta cadastral anterior
ao levantamento Sara Brasil impede o exame da ocupação dos lotes, mas pode-
se verificar que o sistema viário já havia sido em grande parte implantado, com
exceção de algumas vias interrompidas em 1915.
Pelo mapa de 1930 o setor do Parí foi subdividido em três sub-setores, que
obedeceram basicamente o critério da proximidade das áreas internas dos mesmos
com os bairros limítrofes:
1° – O primeiro sub-setor corresponde à área que o bairro do bairro do Canindé
abrange, mostrando a grande extensão ainda não ocupada da Várzea do Tietê,
próxima ao morro do Pari (ref. 1). A área lindeira à ferrovia da Cantareira, atual
avenida Cruzeiro do Sul (ref. 3), apresentava-se a partir da rua João Teodoro com
o arruamento contínuo ao da Ponte Pequena e Luz, estando o espaço do Campo
de Manobras da Força Pública, identificado no mapa de 1915, ainda não ocupado
em 1930, assim como parte do seu entorno imediato, esparsamente urbanizado
(ref. 4).
Toda a região próxima da estação Tamanduateí (ref. 5) encontrava-se ocupada,
principalmente as transversais à rua do Canindé, como a Vidal de Negreiros,
Afonso Arinos e Pasteur, que se caracterizavam como área de habitação popular.
Apenas nas proximidades da rua João Teodoro se verificava a presença de lotes
de grandes dimensões ocupada por galpões (ref. 6), corroborando as análises
que indicaram ter restado à habitação popular ocupar as terras mais baixas dos
bairros fabris. Como assinalado anteriormente, a rua Pedro Vicente estabelecia
a ligação ao norte entre o Canindé e a Ponte Pequena, cruzando a linha de trem
em nível. Acima dessa rua e da rua Araguaia, já na Várzea, apenas edificações
isoladas e uma série de ruas assinaladas como não oficiais podem ser percebidas
pelo mapa cadastral, indicativas da estrutura semi-rural ainda existente nessa
região, mencionada na entrevista de um antigo morador do bairro.
A avenida Valtier (ref. 7) configurou um dos limites desse sub-setor com o seguinte,
o do bairro do Parí, possuindo pelo mapa de 1915 o início de arruamento nas
extremidades junto às ruas João Teodoro e das Olarias, não havendo continuidade
a partir desse ponto. Já em 1930 a mesma via mostra-se traçada, o mesmo
ocorrendo com sua continuação até a rua Araguaia, a rua Padre Vieira. O
363
EVOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
mapa da Light de 1925 não indicava o funcionamento de linha para o Canindé,
pois o bonde mais próximo fazia o trajeto das ruas São Caetano, Monsenhor
Andrade e rua Oriente. Como o mapa cadastral indica ter sido implantada a
linha de bonde para o Canindé (linha 49) e nas áreas mais alagadiças ela
requereu previamente aterros, pode ser considerada a hipótese dessa área
indicada como não ocupada em 1915 ter recebido essas melhorias para posterior
parcelamento.
No mapa de 1954 as alterações mais perceptíveis ocorreram na área próxima
ao Campo da Força Púbica, nas imediações das ruas Canindé e Araguaia.
Diferentemente das quadras anteriormente estruturadas, formou-se um setor
residencial com características diversificadas: na rua Araguaia e Itaquí, setores
mais populares, na rua Olarias e Pascoal Malatesta, setores de classe média,
com esta última rua se constituindo na única do bairro com padrão de casas
isoladas, com recuos e padrão construtivo diferenciado.
Fig. 207: À esquerda, mapa de 1915 mostrando o seccionamento da Av. Valtier; à direita, a mesma
avenida em mapa de 1930.
Fig. 208: “Morar à francesa”,
edificação na R. Pascoal
Malatesta, Canindé.
364
Em comparação à carta de 1930, na de 1954 o Campo da Força Pública
apresentava ocupação, o mesmo ocorrendo com o entorno do campo dos clubes
Estrela do Pari e Serra Morena, nas proximidades da rua da Piscina. Outra
alteração ocorrida se refere à existência da garagem de bondes na rua Padre
Vieira, esquina com a rua Araguaia, uma vez que na anterior a mesma não se
encontrava assinalada (ref. 8). A existência de lagoas formadas pela extração de
areia ou argila, interrompia a rua Pascoal Raneri (ref. 9), cuja continuação era
denominada Estada do Porto e ocupava uma grande extensão onde, no início
da década de 1960 se implantou a Associação Portuguesa de Desportos (ref.
10), limitada pela rua Azurita e posteriormente a Escola Técnica Federal, situada
na rua Pedro Vicente (ref. 11).
Ainda pelo mapa de 1954, a Várzea do rio Tietê apresentava certa ocupação ao
longo das ruas Pascoal Ranieri e Araguaia, apesar de não haver sido definido o
arruamento em alguns trechos. Na carta de 1972, além dos equipamentos
mencionados anteriormente, percebe-se o adensamento da ocupação, bem como
o traçado viário definitivo, com exceção da avenida Bom Jardim, que era
interrompida por galpões de transportadoras na altura da rua Iturama (ref. 12),
trecho que posteriormente foi vencido, ligando-a com a rua Araguaia.
Predominam no parcelamento os lotes de pequenas dimensões, com inúmeras
vilas e ruas com casas em renque, geminadas de ambos os lados. Em meio a
essa tipologia, pelo mapa de 1972 encontravam-se distribuídos galpões de
empresas transportadoras e de indústrias alimentícias, que se fixaram no Canindé
e no Parí durante as décadas de 1960 a 1980. A área próxima à rua da Piscina
caracterizou-se por reunir espaços públicos e privados ligados ao esporte e
educação, contrastando com o restante do bairro, densamente ocupado.
Atualmente, nesse sub-setor dois processos ocorrem simultaneamente: a disputa
do comércio por pontos de venda e a construção de duas torres habitacionais
no Canindé. No primeiro caso, novas construções ou reconversão de edifícios
Fig. 209 e 210: À esquerda, A. A. Serra Morena; à direita, Clube Estrela do Pari.
365
EVOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
existentes se expandem ao longo da avenida Valtier e suas travessas, com atividade
voltada principalmente a utilidades domésticas. Nesse processo, foi inclusive
demolido antigo casarão naquela avenida, que serviu nos últimas quatro décadas
como órgão público destinado ao combate de endemias e epidemias. Mais
recentemente foi construído um conjunto para habitação de interesse social, na
Rua das Olarias, que também poderá contribuir para a reversão do processo de
esvaziamento populacional que a área apresentou.
Fig. 212 e 213: Ao lado,
Conjunto Olarias no início
de sua construção; abaixo,
em fase de conclusão.
Fig. 211: Verticalização no
Canindé, ao fundo.
366
Fig. 214 e 215: À esquerda, antigas instalações do Cine Haiti; à direita, habitação econômica no
Canindé.
Fig. 216 e 217: À direita, grandes equipamentos
ao longo da Marginal Tietê
À esquerda, antigas instalações da indústria
Tostines na Av. Valtier, 2004.
367
EVOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
2°– Esse sub-setor caracteriza a área do bairro do Parí propriamente dito,
intercomunicando-se com a do Canindé e com a do sub-setor seguinte,
caracterizada por ser área de transição com o Brás. O mapa de 1930 indica já
haver ocorrido a ocupação das quadras ao longo da avenida Valtier, assim
como em parte de suas transversais (ref. 7). Assim como o sub-setor anterior, nas
proximidades da rua João Teodoro, o parcelamento indicava a presença de
lotes ocupados por galpões industriais em meio aos lotes habitacionais e na rua
Thiers, entre a Hanemann e Conselheiro Dantas, a presença da indústria inglesa
de ensacamentos de juta (ref. 10), que ocupava metade dessa quadra e
permaneceu por muitas décadas no bairro, visível na fotografia aérea da década
de 1940.
Os mapas de 1915 e de 1930 mostram a adoção de uma solução incomum
não só nesse sub-setor, como também em todos os outros bairros analisados,
que foi a do traçado viário não obedecer as regras de arruamento ortogonal.
No mapa de 1915, a rua Rodrigues dos Santos estendia-se até a Várzea do
Tietê, havendo uma área não ocupada entre ela e as ruas Paraíba e Carlos de
Fig. 218: Vista aérea, Pari, década de 1940.
368
Campos, sendo que no cruzamento das ruas Hanemann e Conselheiro Dantas
já estava configurado o desenho triangular do Largo Padre Bento (ref. 11). No
mapa de 1930 já haviam sido traçadas a rua Rio Bonito (ref. 12), como assim
passou a ser denominada a rua Rodrigues dos Santos a partir da rua Hanemann,
e as ruas em arco paralelas Coronel Morais (ref. 13) e Padre Lima (ref. 14),
seccionadas em ângulo pelas ruas Dr. Ornelas e Pacheco e Silva, ambas
interconectadas à Carlos de Campos através do Largo Eduardo Rudge.
Essa solução, incomum pelo fato da legislação exigir ruas retas desde 1923 (Lei
Municipal 2611), não havia sido implantada ainda no mapa da Light de 1925,
indicando que o arruamento e posterior parcelamento dessa área foi feita de
forma conjunta pelo mesmo agente e que se procurou seguir um traçado mais
orgânico que o usualmente feito então na cidade, pois os arcos além de
Fig. 219: À esquerda, ruas em arco do Pari, em mapa de 1915; à direita, o mesmo local em mapa
de 1930.
Fig. 220: Lgo. Eduardo
Rudge, Pari.
369
EVOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
contornarem o Morro do Parí a partir da rua Rio Bonito, permitiram uma extensão
maior para ser loteada e quadras mais homogêneas do que aquelas executadas
simplesmente pela extensão do arruamento existente.
A área dentro do sub-setor analisado, definida pelas ruas em arco, teve
características predominantemente residenciais, uma vez que, apesar de áreas
livres, não se registravam os galpões industriais comuns em outros sub-setores,
como os do Bom Retiro e Brás. Na carta de 1954 percebe-se o aumento da
ocupação de toda essa área, não havendo mais lotes desocupados e na de
1972, apenas remembramentos de lotes com novas construções. Como foi
abordado anteriormente, essas quadras se caracterizaram por apresentar um
padrão de moradia muitas vezes superior às outras do bairro, principalmente no
Parí, com extensão desse padrão até a avenida Bom Jardim, devido à ocupação
no entorno do Morro do Parí.
No mapa de 1930, a rua Carlos de Campos (ref. 15), antiga denominação da
atual avenida, já havia sido alargada em relação a 1915 apenas até a rua
Cachoeira, acessando as áreas alagadiças da Várzea e transpondo o rio Tietê,
estabelecendo a ligação do Parí com a Estrada da Coroa, na Vila Guilherme,
ainda esparsamente ocupada em suas áreas mais baixas. Consta que a essa
primeira ponte, de madeira e latões, foi construída a mando do loteador da Vila
Guilherme, Guilherme Praum, em 1929. Assim como não haviam sido
conquistados os terrenos da Várzea na área do Canindé, o mesmo ocorria no
Pari, havendo apenas algumas indicações de arruamento projetado.
Essa situação se alterou nas décadas seguintes, pois em 1954 a ocupação do
Morro do Parí e do seu entorno imediato se apresentava bem mais consolidada
que na carta de 1930, embora ainda apresentasse vazios. O limite da área
urbanizada até o rio Tietê era a avenida Bom Jardim (ref. 12) e, com a
Fig. 221 e 222: À esquerda, tipologia mais recente na R.
Padre Lima.
À direita, Travessa Ester M. Bergsten, Morro do Pari.
370
pavimentação desta na década de 1960, não apenas ocorreu o adensamento
da área analisada, como houve a expansão da ocupação horizontal até a
Marginal do Rio Tietê (ref. 16). Contrastou com o padrão construtivo implantado
anteriormente nas proximidades do Morro do Parí, que apresentava lotes e
habitações maiores, pois a área mais recentemente urbanizada, seguiu a
ocupação do Canindé, com intenso aproveitamento do solo, pequenas ruas ou
vielas entre as quadras e entremeada com grandes lotes, no caso, de indústrias
alimentícias, de embalagens e transportadoras.
Atualmente, nesse sub-setor, o mercado imobiliário se encontra estagnado para
fins habitacionais, não se registrando nenhum lançamento de novas unidades,
apesar de suas características. Propostas e projetos definidos pelo Plano Regional
Estratégico, poderão reverter esse processo, possibilitando ações que
potencializem essas áreas para fins de residência e também para a melhoria da
paisagem urbana.
- Esse sub-setor do Pari caracterizou-se por estabelecer uma transição com o
Brás e o Catumbi. A integração do tecido urbano do Pari com o Brás ocorria
com a continuidade da malha viária e homogeneidade da ocupação caracterizada
pelo intenso parcelamento das quadras. Mais próximo à Várzea, a rua Silva
Telles tinha ainda, pela carta de 1930, uma parte de sua extensão projetada (ref.
17), entre as ruas Carlos de Campos e Santa Rita, sendo esta última o limite com
o Catumbi e Belenzinho (ref. 18). Esparsas edificações indicavam a continuidade
da ocupação do Catumbi sobre as áreas do Parí (ref. 19), nas proximidades do
rio Tietê, permitindo observar que a urbanização não havia conquistado a Várzea
desse rio, certamente devido à procura de terras mais altas e menos sujeitas às
inundações.
Assim como ocorreu com a avenida Bom Jardim, a sua extensão, a avenida
Pedroso da Silveira (ref. 20) somente se mostrou traçada na carta de 1954, com
grande parte das quadras do perímetro definido entre esta e a avenida Carlos
de Campos, rua Santa Rita e rua Joaquim Carlos já ocupadas. Na rua Santa
Rita localizavam-se a Igreja do mesmo nome e a grande garagem dos bondes
que serviam o Brás (ref. 21), ambas referências dessa área.
Como foi analisado anteriormente, a continuidade do tecido urbano entre os
bairros do Parí, Brás, Belenzinho e Catumbi revelava uma extensa área de usos
mistos, habitação popular e de classe média, que obedecia os padrões
consolidados pela finalidade de aluguel para essa faixa de renda. Na área de
transição entre o Brás e o Catumbi, verificou-se a construção de inúmeras vilas
e renques de casas geminadas dominando as ruas. Esse padrão pode ser
observado também pela carta de 1972, ocorrendo apenas a ocupação das
poucas áreas vazias ou lotes subdivididos (ref. 22).
371
EVOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
A travessia do rio Tietê se fazia pela ponte de concreto que ligava diretamente as
avenidas Carlos de Campos e Guilherme, na Vila Guilherme. Dotada de apenas
uma pista e inúmeras vezes coberta pelas cheias do rio, em fins da década de
1960 essa ponte foi substituída pela atual, já com quatro pistas e construída em
arco abatido com apoios (ref. 23). Outras alterações que a carta de 1972 permite
observar em relação à de 1954 é a Praça Ilo Ottoni, antes uma grande rotatória
na extremidade daquela ponte e os edifícios da Biblioteca Municipal Adelpha
Fiqueiredo (ref. 24) e do Colégio Estadual Frei Paulo Luigi, ambos edifícios
modernistas da década de 1960. Essa área contava ainda com um campo de
futebol e equipamentos, que posteriormente passaram a fazer parte de um Centro
Desportivo Municipal – CDM.
Atualmente esse sub-setor não apresenta nenhum indício de transformação do
seu meio construído que possibilite, através de novas unidades habitacionais,
um aumento do número de moradores. Em parte da sua área, ocorre também
uma disputa com o comércio interligado ao Brás, além de antigas atividades,
como comércio tradicional e oficinas. Entretanto, foi proposto um projeto para
moradores da terceira idade, no entorno da Biblioteca Adelpha Figueiredo, que
também incorpora outros equipamentos sociais. Juntamente com esse edifício,
poderão se somar outras ações, como por exemplo, a integração do CDM hoje
existente ao bairro (ref. 25), uma vez que as duas áreas são de propriedade
municipal e se encontram defronte uma da outra, na avenida Carlos de Campos.
Fig. 223: Ponte sobre o Rio Tietê, ligando Av. Carlos de
Campos e Av. Guilherme, 1958.
372
Fig. 225: Vista do Pari, 2002.
Fig. 224: Vista aérea, década de 1940.
373
EVOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
374
Bom RBom R
Bom RBom R
Bom R
etiro 2etiro 2
etiro 2etiro 2
etiro 2
BomBom
BomBom
Bom
RR
RR
R
etiro 3etiro 3
etiro 3etiro 3
etiro 3
Bom RBom R
Bom RBom R
Bom R
etiro 1etiro 1
etiro 1etiro 1
etiro 1
375
EVOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
Mapa índice 1 - Sub-setores dos
distritos Bom Retiro, Brás e Pari,
1930.
PP
PP
P
ari 1ari 1
ari 1ari 1
ari 1
PP
PP
P
ari 2ari 2
ari 2ari 2
ari 2
PP
PP
P
ari 3ari 3
ari 3ari 3
ari 3
Brás 1Brás 1
Brás 1Brás 1
Brás 1
Brás 3Brás 3
Brás 3Brás 3
Brás 3
Brás 2Brás 2
Brás 2Brás 2
Brás 2
Brás 4Brás 4
Brás 4Brás 4
Brás 4
376
Bom RBom R
Bom RBom R
Bom R
etiro 2etiro 2
etiro 2etiro 2
etiro 2
Bom RBom R
Bom RBom R
Bom R
etiro 1etiro 1
etiro 1etiro 1
etiro 1
377
EVOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
Mapa índice 2 - Sub-setores dos
distritos Bom Retiro, Brás e Pari,
1954.
BomBom
BomBom
Bom
RR
RR
R
etiro 3etiro 3
etiro 3etiro 3
etiro 3
PP
PP
P
ari 1ari 1
ari 1ari 1
ari 1
PP
PP
P
ari 2ari 2
ari 2ari 2
ari 2
PP
PP
P
ari 3ari 3
ari 3ari 3
ari 3
Brás 1Brás 1
Brás 1Brás 1
Brás 1
Brás 3Brás 3
Brás 3Brás 3
Brás 3
Brás 2Brás 2
Brás 2Brás 2
Brás 2
Brás 4Brás 4
Brás 4Brás 4
Brás 4
378
Bom RBom R
Bom RBom R
Bom R
etiro 2etiro 2
etiro 2etiro 2
etiro 2
BomBom
BomBom
Bom
RR
RR
R
etiro 3etiro 3
etiro 3etiro 3
etiro 3
Bom RBom R
Bom RBom R
Bom R
etiro 1etiro 1
etiro 1etiro 1
etiro 1
379
EVOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
Mapa índice 3 - Sub-setores dos
distritos Bom Retiro, Brás e Pari,
1972.
PP
PP
P
ari 1ari 1
ari 1ari 1
ari 1
PP
PP
P
ari 2ari 2
ari 2ari 2
ari 2
PP
PP
P
ari 3ari 3
ari 3ari 3
ari 3
Brás 1Brás 1
Brás 1Brás 1
Brás 1
Brás 3Brás 3
Brás 3Brás 3
Brás 3
Brás 2Brás 2
Brás 2Brás 2
Brás 2
Brás 4Brás 4
Brás 4Brás 4
Brás 4
380
Bom RBom R
Bom RBom R
Bom R
etiro 2etiro 2
etiro 2etiro 2
etiro 2
Bom RBom R
Bom RBom R
Bom R
etiro 1etiro 1
etiro 1etiro 1
etiro 1
381
EVOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
Foto índice 1 - Sub-setores dos
distritos Bom Retiro, Brás e Pari,
Base, 2000.
BomBom
BomBom
Bom
RR
RR
R
etiro 3etiro 3
etiro 3etiro 3
etiro 3
PP
PP
P
ari 1ari 1
ari 1ari 1
ari 1
PP
PP
P
ari 2ari 2
ari 2ari 2
ari 2
PP
PP
P
ari 3ari 3
ari 3ari 3
ari 3
Brás 1Brás 1
Brás 1Brás 1
Brás 1
Brás 3Brás 3
Brás 3Brás 3
Brás 3
Brás 2Brás 2
Brás 2Brás 2
Brás 2
Brás 4Brás 4
Brás 4Brás 4
Brás 4
382
11
11
1
22
22
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33
3
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44
4
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55
5
66
66
6
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77
7
88
88
8
99
99
9
1010
1010
10
1930: 1. Estação da Luz; 2. Presídio Tiradentes; 3. Convento N. Senhora da Luz;
4. Quartel da Força Pública; 5. Rua João Teodoro; 6. Estação Tamanduateí (Cantareira);
7. Rua São Caetano; 8. Av. Tiradentes (Estados); 9. Vila Economizadora; 10. Rua Cantareira.
1954
Bom RBom R
Bom RBom R
Bom R
etiro: Subetiro: Sub
etiro: Subetiro: Sub
etiro: Sub
--
--
-
setor 1 (Lsetor 1 (L
setor 1 (Lsetor 1 (L
setor 1 (L
uz)uz)
uz)uz)
uz)
383
EVOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
1972
2000
384
11
11
1
22
22
2
33
33
3
44
44
4
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55
5
66
66
6
77
77
7
88
88
8
99
99
9
1010
1010
10
1111
1111
11
1212
1212
12
1313
1313
13
1414
1414
14
1930: 1. Colégio Sta. Inês e Faculdade de Farmácia e Odontologia; 2. Escola Politécnica; 3. Pça José
Roberto; 4. Depósito Municipal; 5. Limpeza Pública; 6. Clube Tietê; 7. Av. Rudge; 8. R. Júlio Conceição;
9. R. Sólon; 10. R. Barra do Tibagi.
1954: 11. Área de equipamentos públicos; 12. R. Três Rios; 13. R. Bandeirantes; 14. R. Prates.
Bom RBom R
Bom RBom R
Bom R
etiro: Subetiro: Sub
etiro: Subetiro: Sub
etiro: Sub
--
--
-
setor 2 (Bom Rsetor 2 (Bom R
setor 2 (Bom Rsetor 2 (Bom R
setor 2 (Bom R
etiro)etiro)
etiro)etiro)
etiro)
385
EVOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
1515
1515
15
1616
1616
16
1717
1717
17
1818
1818
18
1919
1919
19
1972: 15. Usina de transbordo e Administração Regional da Sé; 16. Estádio de baseball e parque
público; 17. Área SABESP e Secretaria de Transportes; 18. Área verticalizada.
2000: 19. Favela do Gato.
386
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11
1
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33
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3
44
44
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55
5
66
66
6
77
77
7
88
88
8
1930: 1. Av. Tiradentes, Pça. dos Esportes e Ponte
Grande; 2. R. Porto Seguro; 3. R. Pedro Vicente;
4. R. Rodrigo de Barros.
Bom RBom R
Bom RBom R
Bom R
etiro: Subetiro: Sub
etiro: Subetiro: Sub
etiro: Sub
--
--
-
setor 3 (Psetor 3 (P
setor 3 (Psetor 3 (P
setor 3 (P
onte Ponte P
onte Ponte P
onte P
equena)equena)
equena)equena)
equena)
1954: 5. Av. Santos Dumont e Ponte das
Bandeiras; 6. Pça. dos Esportes;
7. Tecelagem (R. Guaporé, Dom Rodo, Porto
Calvo e Porto Seguro); 8. Pça. José Roberto.
387
EVOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
1972: 9. Pça Bento de Campos (antiga dos
Esportes); 10. Estação Metrô Ponte Pequena (atual
Armênia) e Pça. Armênia (antiga (José Roberto).
99
99
9
1010
1010
10
2000
388
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1
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33
33
3
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55
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88
8
99
99
9
1010
1010
10
1111
1111
11
1930: 1. R. João Teodoro; 2. R. São Caetano; 3. R. Oriente; 4. Lgo. da Concórdia; 5. Av. Rangel Pestana;
6. Escola Normal (atual E. E. José de Anchieta); 7. R. Bresser; 8. Colégio Carlos de Campos.
1954: 9. Colégio Carlos de Campos; 10. Lgo. da Concórdia; 11. R. Bresser e Vila Simeone.
Brás: SubBrás: Sub
Brás: SubBrás: Sub
Brás: Sub
--
--
-
setor 1setor 1
setor 1setor 1
setor 1
389
EVOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
1212
1212
12
1313
1313
13
1414
1414
14
1972: 12. Ponte de ligação entre R. Rodrigues dos Santos e R. do Bucolismo; 13. Viaduto sobre a ferrovia
Santos-Jundiaí (antiga “San Paulo Railway”).
2000: 14. Lgo. da Concórdia.
390
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1010
1010
10
1930: 1. Estação do Norte; 2. R. Conselheiro; 3. Estação de bondes; 4. R. Uruguaiana; 5. R. do Hipódro-
mo; 6. R. Bresser; 7. Hospedaria dos Imigrantes; 8. Estação de Bombeiros.
1954: 9. Passagem em nível na R. do Hipódromo; 10. Passagem em nível na R. Bresser.
Brás: SubBrás: Sub
Brás: SubBrás: Sub
Brás: Sub
--
--
-
setor 2setor 2
setor 2setor 2
setor 2
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EVOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
1111
1111
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1212
12
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1313
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1414
1414
14
1515
1515
15
1616
1616
16
1972: 11. Estação Roosevelt; 12. Antiga garagem dos bondes; 13. R.F.F.S.A. (atiga Central do Brasil);
14. Àrea do Projeto CURA Brás-Bresser.
2000: 16-17. Àrea do Projeto CURA Brás-Bresser.
1717
1717
17
392
11
11
1
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22
2
33
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55
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66
66
6
77
77
7
88
88
8
99
99
9
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1010
10
1010
1010
10
1111
1111
11
1212
1212
12
1313
1313
13
1414
1414
14
1930: 1. Pátio do Pari;
2. Largo do Parí;
3. R. do Gasômetro;
4. Casa das Retortas;
5. Vila Queiroga;
6. Av. Rangel Pestana;
7. R. da Alfândega;
8. Projeto para a R. Mendes caldeira;
9. Moinho Matarazzo;
10. Largo do Brás.
1954: 10. Pátio do Pari; 11. R. do Gasômetro;
12. R. do Bucolismo; 13. Tecelagem Mariângela
(Matarazzo); 14. R. Mons. Andrade.
Brás: SubBrás: Sub
Brás: SubBrás: Sub
Brás: Sub
--
--
-
setor 3setor 3
setor 3setor 3
setor 3
393
EVOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
1515
1515
15
1616
1616
16
1717
1717
17
1972: 15. R. Mendes Caldeira; 16. R.
Gasômetro; 17. R. Mons. Andrade.
2000
394
11
11
1
22
22
2
33
33
3
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44
4
55
55
5
66
66
6
1930: 1. Tanques do Gasômetro; 2. Grupo Escolar Romão Puiggari; 3. R. Piratininga; R. Caetano Pinto;
5. R. Visconde de Parnaíba; 6. R. Placidina.
1954
Brás: SubBrás: Sub
Brás: SubBrás: Sub
Brás: Sub
--
--
-
setor 4setor 4
setor 4setor 4
setor 4
395
EVOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
88
88
8
99
99
9
1010
1010
10
1111
1111
11
77
77
7
1972: 7. Quadras demolidas do Projeto
CURA, 8. Radial Leste.
2000: 9. Estação Metrô Brás e torres habitacionais;
10. Radial Leste (Av. alcântara Machado); 11. R.
Martin Bouchard.
396
11
11
1
22
22
2
33
33
3
44
44
4
55
55
5
66
66
6
77
77
7
44
44
4
88
88
8
99
99
9
PP
PP
P
ari: Subari: Sub
ari: Subari: Sub
ari: Sub
--
--
-
setor 1setor 1
setor 1setor 1
setor 1
19301930
19301930
1930
19541954
19541954
1954
397
EVOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
1010
1010
10
1212
1212
12
1111
1111
11
19721972
19721972
1972
20002000
20002000
2000
398
1515
1515
15
1212
1212
12
1313
1313
13
1414
1414
14
1111
1111
11
1010
1010
10
77
77
7
33
33
3
1010
1010
10
1515
1515
15
1212
1212
12
PP
PP
P
ari: Subari: Sub
ari: Subari: Sub
ari: Sub
--
--
-
setor 2setor 2
setor 2setor 2
setor 2
19301930
19301930
1930
19541954
19541954
1954
399
EVOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
1616
1616
16
1212
1212
12
19721972
19721972
1972
20002000
20002000
2000
400
1919
1919
19
1717
1717
17
1818
1818
18
2020
2020
20
2121
2121
21
PP
PP
P
ari: Subari: Sub
ari: Subari: Sub
ari: Sub
--
--
-
setor 3setor 3
setor 3setor 3
setor 3
19301930
19301930
1930
19541954
19541954
1954
401
EVOLUÇÃO DA OCUPAÇÃO
2323
2323
23
2424
2424
24
2525
2525
25
2222
2222
22
19721972
19721972
1972
20002000
20002000
2000
402
403
CONSIDERAÇÕES SOBRE A ESTRUTURAÇÃO DO BOM RETIRO,BRÁS E PARI
CC
CC
C
APÍTULAPÍTUL
APÍTULAPÍTUL
APÍTUL
OO
OO
O
7: 7:
7: 7:
7:
CC
CC
C
ONSIDERAÇÕESONSIDERAÇÕES
ONSIDERAÇÕESONSIDERAÇÕES
ONSIDERAÇÕES
SOBRESOBRE
SOBRESOBRE
SOBRE
AA
AA
A
ESTRUTURAÇÃOESTRUTURAÇÃO
ESTRUTURAÇÃOESTRUTURAÇÃO
ESTRUTURAÇÃO
DODO
DODO
DO
BB
BB
B
OMOM
OMOM
OM
R R
R R
R
ETIROETIRO
ETIROETIRO
ETIRO
, B, B
, B, B
, B
RÁSRÁS
RÁSRÁS
RÁS
EE
EE
E
P P
P P
P
ARIARI
ARIARI
ARI
404
405
CONSIDERAÇÕES SOBRE A ESTRUTURAÇÃO DO BOM RETIRO,BRÁS E PARI
7. Considerações sobre a estruturação do Bom R7. Considerações sobre a estruturação do Bom R
7. Considerações sobre a estruturação do Bom R7. Considerações sobre a estruturação do Bom R
7. Considerações sobre a estruturação do Bom R
etiro, Brás e Petiro, Brás e P
etiro, Brás e Petiro, Brás e P
etiro, Brás e P
arí.arí.
arí.arí.
arí.
Os bairros situados nos distritos do Bom Retiro, Brás e Parí, foram enfocados
através dos mapas cadastrais da cidade e outras fontes existentes, com a finalidade
de se obter um entendimento topológico desses espaços, complementando os
aspectos já abordados na Parte I deste trabalho, que estruturaram a configuração
e as funções desses bairros centrais analisados. Procurou-se também um registro
que expressasse a interação das estruturas morfológicas e sociológicas, conforme
propôs Lefebvre (2004, 109), pois dessa maneira pôde ser contemplado o
objetivo-problema desse desenvolvimento, que se revestiu em identificar como a
espacialidade dos bairros centrais foi definida e quais transformações ocorreram,
concomitantemente aos processos gerais da cidade.
Os bairros analisados se constituíram historicamente em um território com a
ocorrência de atividades industriais, serviços voltados às camadas sociais mais
populares e alta incidência de habitação horizontalizada, com fraca presença
de verticalização. A essas características somou-se também a existência de uma
infra-estrutura voltada ao transporte da população trabalhadora e de cargas,
tais como ferrovias, estações e grandes terminais de linhas de ônibus, além de
zonas de comércio atacadista, vias de tráfego pesado inter-regional, aliados a
uma base fundiária fragmentada em pequenas propriedades e com presença
significativa de habitação de baixa renda, representada pelo grande número de
cortiços. Com esse caráter urbano, mesmo se localizando junto à centralidade,
essas áreas localizadas em terras baixas das várzeas dos rios Tietê e Tamanduateí,
tiveram reforçada a tendência de desvalorização ambiental e imobiliária.
Percebeu-se através dos capítulos que analisaram as transformações ocorridas
ao longo das principais radiais do Plano de Avenidas, das Operações Urbanas
e da estruturação dos bairros, o quanto que foram diferenciados os processos
de remodelação da infra-estrutura, do reparcelamento e da verticalização na
cidade. A leitura comparativa dos mapas mostrou, mais que a permanência das
características urbanas dos bairros analisados, a sua quase estagnação, se
confrontado com o ocorrido em outros bairros da cidade.
Mas cabe perguntar qual estagnação ocorreu, se os bairros em tela apresentam,
sem dúvida, uma dinâmica comercial importante? A resposta para essa questão
não se relaciona a apenas um aspecto, pois ocorreu no Bom Retiro, Brás e Parí,
um processo interligado de depreciação do uso habitacional e perda das
qualidades paisagísticas e ambientais. Inúmeras áreas nesses bairros se encontram
extremamente rebaixadas, quer pelo padrão de suas construções, quer pelo uso
pela população encortiçada, quer pela interferência com atividades prejudiciais
à moradia, como tráfego intenso, funções comerciais que extravasam para as
ruas a circulação dos veículos e das mercadorias, etc.
406
Nesse caso se enquadram boa parte do Canindé, a região da João Teodoro e
São Caetano, na transição entre a Luz e o Parí, o entorno da estação Roosevelt
e parte da zona cerealista, no Brás e as quadras entre a avenida Tiradentes e
avenida dos Estados, na Ponte Pequena. Não se configuram com problemas
idênticos, já que existe uma variação em razão da localização, dos imóveis
presentes no lugar e do número de habitantes e usuários existentes. Mas, sem
dúvida constituem um quadro de extrema complexidade social e urbano.
Já foi citado também, no capítulo referente ao Zoneamento, o caráter conservador
que revestiu esse instrumento, quando de sua aprovação, em 1972. A manutenção
das vocações, usos e ocupações se constituiu, sem dúvida em uma das razões
para as áreas aqui analisadas terem permanecido com os mesmo padrões, ou
até mesmo pior. Mas em outras áreas da cidade, nas proximidades de setores de
alta renda, as zonas de baixa densidade se transformaram, certamente porque:
. Não contavam com atividades que provocavam os impactos urbanos como os
das zonas de comércio atacadista ou da proximidade de grandes terminais de
transportes ou eixos viários de tráfego pesado;
. Houve remodelação da infra-estrutura urbana, preparando o bairro, ou parte
dele para a verticalização;
. Se constituíram em zonas de transição, uma reserva de área pronta a ser
incorporada pela expansão da verticalização, como comprovam os casos de
Moema e das Vilas Madalena e Olímpia, entre outros.
Relacionado a essa análise, nos capítulos da parte seguinte do trabalho serão
analisados dois conjuntos de projetos para o Bom Retiro, Brás e Parí. O primeiro
grupo é composto por duas propostas, das décadas de 1980 e 1990, não
realizadas, mas bastante esclarecedoras quanto às finalidades de transformação
do existente, que direcionaram uma cirurgia urbana de grandes proporções para
a remodelação da infra-estrutura e da morfologia. O segundo grupo inclui uma
série de planos, projetos e programas do poder público, com vistas à reversão
do processo de esvaziamento populacional, através da utilização das áreas mais
equipadas e do estancamento da degradação do ambiente e da paisagem urbana.
E
STRUTURAÇÃO DE ANÉIS DOS BAIRROS CENTRAIS
PP
PP
P
ARAR
ARAR
AR
TETE
TETE
TE
3 3
3 3
3
407
AS REMODELAÇÕES DAS DÉCADAS DE 1980 E 1990
CC
CC
C
APÍTULAPÍTUL
APÍTULAPÍTUL
APÍTUL
OO
OO
O
8: 8:
8: 8:
8:
AA
AA
A
SS
SS
S
REMODELAÇÕESREMODELAÇÕES
REMODELAÇÕESREMODELAÇÕES
REMODELAÇÕES
DD
DD
D
ASAS
ASAS
AS
DÉCADDÉCAD
DÉCADDÉCAD
DÉCAD
ASAS
ASAS
AS
DEDE
DEDE
DE
1980 1980
1980 1980
1980
EE
EE
E
1990 1990
1990 1990
1990
408
409
AS REMODELAÇÕES DAS DÉCADAS DE 1980 E 1990
8- As remodelações das décadas 1980 e 19908- As remodelações das décadas 1980 e 1990
8- As remodelações das décadas 1980 e 19908- As remodelações das décadas 1980 e 1990
8- As remodelações das décadas 1980 e 1990
Os dois projetos seguintes foram incluídos neste trabalho visando duplamente,
analisar o partido urbanístico dos mesmos, que adotou a demolição de parte
dos bairros considerados deteriorados como necessária aos seus objetivos e o
contraponto deles com as propostas de requalificação dos espaços e funções
existentes.
410
8.1. - P8.1. - P
8.1. - P8.1. - P
8.1. - P
arque do Tarque do T
arque do Tarque do T
arque do T
ietêietê
ietêietê
ietê
Esse projeto nasceu de um convite do então Prefeito Jânio Quadros ao arquiteto
Oscar Niemeyer
1
para, segundo as palavras do ex-prefeito, “reconciliar o rio
com a cidade”. Conforme esclarecia o próprio memorial do projeto, tratou-se
de um “parque metropolitano central, inserido na trama urbana da Cidade, na
margem esquerda do rio Tietê, alongando-se pelos bairros da Lapa, Barra Funda,
Bom Retiro, Parí, Belenzinho, Tatuapé e Penha, numa extensão de dezoito
quilômetros e largura variável de trezentos a mil metros” (Niemeyer et alli, 1986,
s/pag).
O Parque agregaria aproximadamente 10 milhões de metros quadrados de
espaços verdes, bosques e jardins, além da implantação de equipamentos e
serviços de interesse social nos setores de educação, saúde e cultura, prevendo-
se cerca de um milhão de usuários diários. Em sua exposição de motivos, o
memorial descritivo do projeto também relacionava sua existência como elemento
de grande importância para a macrodrenagem da cidade, uma vez que seria
implantado no trecho mais crítico do canal, representando uma alternativa menos
onerosa para o aumento da vazão e rebaixamento da linha d’água, além do
acréscimo da área permeável no limite urbanizado da várzea, contribuindo para
a diminuição do escoamento superficial, estravazamento das águas e redução
da erosão. Nesse sentido, nas áreas baixas sujeitas a inundações, seriam
Fig. 226: Implantação do Projeto Tietê no município de São Paulo.
411
AS REMODELAÇÕES DAS DÉCADAS DE 1980 E 1990
implantados apenas equipamentos como parques, campos esportivos e demais
elementos passíveis de resistir aos efeitos temporários das cheias. Relativo a
esses problemas, o memorial considerou também a viabilização de postos de
navegação de serviços, tais como, materiais e equipamentos de desassoriamento,
materiais de construção e deposição dos resíduos sólidos. Numa segunda etapa
estava prevista também a navegação turística e esportes náuticos (idem, 1986,
s/pag.).
O sistema viário, importante elemento de configuração da proposta, seria
estruturado em dois níveis: a circulação externa afastada do rio, composta por
via expressa elevada e via de superfície, ambas no limite do Parque e com
separação de fluxos de diferentes modalidades. A circulação interna seria
composta por vias-parque, acessos de serviço e estacionamentos. (ibidem, 1986,
s/pag).
As edificações previstas no Parque englobavam os seguintes conjuntos:
1. Centro cívico – Situado no cruzamento dos eixos cardeais, no centro do
Parque, entre as avenidas Santos Dumont e Cruzeiro do Sul. Constaria
dos edifícios-sede do governo municipal, suas secretarias e empresas, a
fim de criar um ponto de identificação do governo para a população.
Reuniria um edifício do governo do município e quatro de secretarias e
empresas municipais, além de auditório, praça cívica para um milhão de
pessoas e garagens para 9.000 veículos. A área construída chegaria a
440.000 m².
2. Centro cultural – situado na região entre o Belenzinho e o Tatuapé,
englobando:
. Centro de divulgação para exposições , biblioteca, cinema e museu;
. Centro de criação, com escolas de música, dança e artes gráficas e
visuais
. Centro de eventos, reunindo teatro para 1000 pessoas, auditório para
2000 pessoas e auditório aberto para 50.000 pessoas
. Centro de convivência, reunindo áreas de animação cultural e exposições
ao ar livre, restaurantes e comércio especializado.
. A área construída desse complexo seria de 120.000 m²
3. Escritórios – O projeto do Parque do Tietê reunia dois setores que
juntamente com o Centro Cívico formariam uma sucessão de conjuntos
na área central do Parque, que seria mais densamente edificada. Os
setores empresariais seriam o Cruzeiro do Sul, na Ponte Pequena e o das
Bandeiras, próximo à foz do rio Tamanduateí. Propunha-se a sua
construção pelo setor privado e constaria dos seguintes elementos:
412
. Setor Empresarial das Bandeiras: 5 torres de 40 andares, área construída
850.000 m², atendendo 57.000 usuários
. Setor Empresarial Cruzeiro do Sul: 3 torres de 40 andares, área construída
400.000 m², atendendo 27.000 usuários.
4. Habitações – O projeto previu dois setores residenciais, situados a leste e
oeste, com apartamentos de 60, 90 e 120 m², construídos através da
participação da iniciativa privada. Num primeiro momento, os conjuntos
seriam erguidos em áreas disponíveis, perfazendo um total de 10.000
moradores. Os restantes dos 150.000 moradores previstos seriam
alocados na área do Parque, respeitando-se o direito de preferência dos
moradores que seriam deslocados. As torres seriam construídas segundo
o plano de massas prefixado no projeto e o memorial considerava que a
COHAB não havia ainda atingido o patamar de 80.000 unidades entre
apartamentos e casas, embora atuasse desde 1965. Os setores seriam:
. Setor Residencial Aricanduva
65 blocos de habitações – 13.200 unidades
Área construída: 1.200.000 m²
População: 66.000 habitantes
. Setor Residencial da Água Branca
86 blocos de habitações – 16.800 unidades
Área construída: 1.800.000 m²
População: 84.000 habitantes
. Apoios: educação e saúde, esporte e lazer, abastecimento e comércio
5. Núcleos de lazer
O Parque do Tietê previa o atendimento para até um milhão de pessoas
ao longo de sua extensão, onde seriam dispostos campos e quadras
esportivas, balneários, pistas e tanques de modelismo, parques infantis,
abrigos, restaurantes, enfermarias, vestiários, sanitários, etc. Numa
segunda etapa, junto à margem do rio, seriam instalados núcleos esportivos
de náutica (op. cit, 1986, s/pag).
Uma vez descritas as proposições gerais do Parque do Tietê, o seu lançamento
foi cercado de sérias críticas que consideraram tanto o processo de escolha e
vinculação da equipe, determinado pelo executivo municipal, quanto pelo seu
caráter urbano. Nesse sentido, as observações de entidades profissionais e
arquitetos convergiram para o fato de haver se desconhecido os projetos já
existentes para as áreas de incidência da proposta do Parque. Como foi abordado
na Parte I deste trabalho, pelo menos dois planos urbanísticos propuseram a
implantação de um setor administrativo municipal nas imediações da Ponte
Pequena, o Relatório do Departamento de Urbanismo (1961) e o Plano Urbanístico
413
AS REMODELAÇÕES DAS DÉCADAS DE 1980 E 1990
Básico (1968), que fundamentou o Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado
de 1972.
Além do setor administrativo da Ponte Pequena mencionado nos planos
urbanísticos, foram também relacionados, o Plano de Saturnino de Brito, de
1928, e as oportunidades existentes na margem direita do Tietê, que na década
de 1960 reuniam o Campo de Marte e amplas áreas desocupadas, que
posteriormente receberam equipamentos como o Shopping Norte, sistema viário
e indústrias. Esses elementos fizeram parte de um projeto desenvolvido à época
do Departamento de Urbanismo da Prefeitura sem continuidade nas gestões
posteriores a 1966. Em meados da década de 1970, outra proposta de edifício
administrativo na Ponte Pequena foi formulada, desta feita pelo escritório Rino-
Levi, que indicava a existência de áreas públicas disponíveis e sua posição
Fig. 227: Maquete, Projeto Tietê
Fig. 35 e 36:
Fig. 228: Ilustração, Projeto
Tietê.
414
estratégica junto ao eixo viário norte-sul e ao Metrô (Wilheim apud Projeto, nº
86, abril 1986, 87).
Apesar dos argumentos em defesa dessa mega-operação da parte de seu principal
autor, Oscar Niemeyer, que considerou essa cirurgia urbana uma solução radical
e necessária para corrigir o erro que representou o “emparedamento” do rio
Tietê pelas duas marginais (Niemeyer apud Projeto, idem, 88), os debates
conduzidos pelos órgãos de representação dos arquitetos e urbanistas
2
apontaram
questões mais amplas, que trataram da conveniência da operação de renovação
urbana proposta, devido ao fato de haver outras áreas com maior carência de
serviços públicos e habitacionais. Outros aspectos críticos mencionados se
relacionaram à viabilidade econômica da operação, uma vez computados os
recursos para desalojamento e transferência de pessoas e empresas, além da
destruição do patrimônio comercial e imobiliário. Nesse sentido, sem um estudo
de viabilidade econômica e urbanística que ponderasse os riscos da implantação
ou de superdimensionamento, o projeto como um todo poderia se mostrar
inadequado a curto prazo, tanto pelas áreas de ocupação inviável, quanto pela
apropriação pelos interesses especulativos das áreas mais vantajosas (Projeto,
nº 86, abril 1986, 87).
A participação dos setores populacionais atingidos e dos profissionais vinculados
aos problemas urbanos da cidade ampliaram a repercussão do assunto no campo
popular e no técnico especializado, resultando em um sério questionamento
Fig. 229: Implantação da proposta ao longo da Marginal Tietê.
415
AS REMODELAÇÕES DAS DÉCADAS DE 1980 E 1990
quanto ao justo ressarcimento das desapropriações que seriam realizadas, da
oferta de condições habitacionais equivalentes ou melhores às desfrutadas, da
preservação do patrimônio e interdisciplinaridade no tratamento dos aspectos
envolvidos no conjunto da proposição. Há que se considerar, em meio aos
contraditórios existentes, o então recente período de redemocratização do país e
da própria cidade, que havia eleito há menos de um ano seu primeiro prefeito
por voto direto, justamente Jânio Quadros.
Duas considerações podem ser acrescidas ao que foi observado no período:
. a primeira envolve os instrumentos urbanísticos então disponíveis para a
viabilização da operação urbana necessária para o deslanche do projeto do
Parque. O arquiteto Benedito Lima de Toledo apontou na época o fracasso do
Projeto CURA no Brás (e também no Jabaquara) em que as extensas áreas
desapropriadas resultaram em espaços abandonados (idem, 87). Isso
demonstrava o fim do ciclo de investimentos em grandes obras urbanas que
caracterizou o período da década de 1970. Ao mesmo tempo, a possibilidade
de participação da iniciativa privada em empreendimentos urbanísticos não tinha
sequer a garantia dos instrumentos de contrapartida. As Operações Interligadas
foram aprovadas pela Lei n° 10.209 de 1986, mas através das mesmas
relacionou-se o aumento do coeficiente de aproveitamento das construções à
provisão de determinado número de unidades de habitação social. Além disso,
a cidade não contava com um Plano Diretor atualizado, capaz de proporcionar
416
alternativas consistentes para o conjunto da área e sua viabilização, já que a
mais recente proposta (1984) havia sido retirada da Câmara pelo executivo e
vigorava o PDDI de 1972, incapaz de responder a esse tipo de proposição.
Nesse sentido, Jorge Wilheim, Secretário de Planejamento em cuja gestão foi
formulada a mencionada proposta de Plano, também mencionou os estudos
que haviam sido realizados para a Várzea da Barra Funda, então prestes a
receber o novo terminal do Metrô, e que não foram considerados no Parque do
Tietê (ibidem, 87).
. Uma segunda consideração se relaciona à área urbana então abarcada pela
renovação urbana incluída no mencionado projeto. Nos bairros do Bom Retiro,
Ponte Pequena, Canindé e Parí, os limites do Parque se ampliavam para abrigar
o Centro Cívico, incorporando o parque existente na foz do Tamanduateí, onde
se situava o Estádio Municipal de Beisebol, no primeiro bairro, passando pela
Praça Armênia, na Ponte Pequena, Ginásio da Polícia Militar e rua Itaquí, no
Canindé, rua Rio Bonito no Parí, até o seu limite na rua Santa Rita, quando a
largura do Parque Tietê diminuia. Nessa altura, a alça da ponte da Vila Guilherme
seria deslocada da avenida Carlos de Campos para a rua Silva Telles, uma rua
local. Já no bairro do Belenzinho, conectado ao Parí, o Parque chegava até o
limite da Vila Maria Zélia. Além disso, como o seu memorial esclarecia, o limite
do Parque era percorrido pela nova via expressa estrutural, que substituiria a
marginal do Tietê em dois níveis, resolvendo em superfície o fluxo local e em
elevado a circulação de passagem.
Todos esses elementos reforçaram a reação de diversos segmentos, desde os
moradores do Parí, um dos setores mais atingidos, às categorias profissionais
que não entendiam ser esse projeto viável sob o ponto de vista urbanístico e
econômico e legítimo sob o ponto de vista social, dado os desdobramentos que
o mesmo provocaria na cidade através de uma atuação, que mesmo de grande
escala, era pontual e desconectada das demandas urbanas mais gerais da cidade,
que incluíam a recuperação do patrimônio construído e priorização para os
problemas sociais mais prementes.
Passadas as etapas de apresentação, o projeto do Parque Tietê foi abandonado
pelo próprio Prefeito que o havia solicitado e julgado não prioritário pela gestão
municipal seguinte. O arquiteto Oscar Niemeyer, que mais tarde elaborou o
Memorial da América Latina (1989) e o Sambódromo (1992), declarou em
matéria jornalística sobre os projetos não realizados em São Paulo, entre eles o
Parque do Tietê: “...em São Paulo, três vezes isso ocorreu. Só falta de sensibilidade
ou de otimismo pode explicá-lo. E um deles foi a urbanização do rio Tietê. Recordo-
me do empenho com que elaboramos o projeto. A equipe que organizei com
colegas dessa cidade. A razão indiscutível que o recomendava: dar a praia que
lhe falta...e o projeto claro, irrecusável que apresentamos. Desviar uma das
estradas que acompanham aquele rio, criando a praia artificial tão desejada. Aí
417
AS REMODELAÇÕES DAS DÉCADAS DE 1980 E 1990
seriam previstos os equipamentos que o local imaginado exigiria...um grande
parque aquático como o que agora projetei para Moscou. Faltou entusiasmo. O
entusiasmo com que Ciccillo Matarazzo iniciou o Ibirapuera e Octavio Frias iniciou
o Copan, com a longa e ondulada fachada de vidro que o caracteriza (FSP, 12/
11/2001, 3).
Não se trata de analisar tardiamente a estética dos edifícios propostos ou a
importância de uma intervenção para resgatar o rio Tietê para a cidade, mas
sim o caráter urbanístico proposto por esse projeto. A citação de Oscar Niemeyer
foi incluída para ilustrar esse caráter, o da “arquitetura grande”, a prevalência
do desenho sobre a cidade real, que conforme afirma Adilson Macedo, “a
arquitetura grande como conceito e metodologia é diferente da maneira de ver
os espaços segundo uma ordenação orgânica...” (Macedo apud SEDUR 1986,
33). Nesse sentido, é importante a menção também feita por Niemeyer na
apresentação do projeto do Parque, deste se constituir em “uma obra que
representaria para São Paulo mais do que representou para o Rio de Janeiro a
abertura da Avenida Rio Branco – julgada por Le Corbusier, da maior importância,
entusiasmado com a coragem e o discernimento de Pereira Passos, que a construiu
(Niemeyer et alli, 1986, s/pág.)
418
8.2. Maharishi T8.2. Maharishi T
8.2. Maharishi T8.2. Maharishi T
8.2. Maharishi T
owerower
owerower
ower
Na metade do ano de 1999, foi divulgada a surpreendente notícia da construção
do edifício mais alto do mundo, que seria implantado numa área situada entre
o Brás, Luz e Parí. Apresentado pelos empreendedores e pela Prefeitura
simultaneamente, o prédio seria produto do grupo Brasilinvest junto com o
Maharishi Global Development Fund (MGDF), fundo internacional de
investimentos imobiliários, de Nova Iorque, que financiaria em US$ 1,65 bilhões
essa obra. (FSP, 8/6/1999, 3-6). Segundo os investidores, o prédio teria 108
andares e 494 metros de altura, superando a Petronas Tower, na Malásia, que
registrava 452 metros. Na tentativa de “abrasileirar” o nome do edifício, esse
passou a ser denominado de “São Paulo Tower”, e segundo o representante
desse empreendimento, o objetivo do projeto era “fazer com que a cidade
concretize finalmente a sua vocação de cidade global e centro mais importante
de negócios da América Latina(Garneiro in OESP 03/6/1999, D11).
Ao contrário do Parque do Tietê, em que a equipe liderada por Niemeyer produziu
na ocasião um estudo preliminar de implantação, não foi apresentado nenhum
elemento mais concreto do mega-edifício, apenas divulgada uma simulação de
sua implantação e volumetria por maquete eletrônica. Todo o debate sobre o
mesmo transcorreu sem um único documento técnico, seja dos seus
empreendedores, seja da Prefeitura que abraçou a proposta, pois apenas foram
utilizadas as informações divulgadas por jornais e revistas. O projeto foi
desenvolvido nos Estados Unidos pelo arquiteto Minori Yamasaki
3
, o mesmo
autor do Word Trade Center de Nova Iorque. Sua concepção baseava-se na
arquitetura védica, incorporando elementos da cultura hindu e a edificação
piramidal era composta da junção de quatro torres que seriam separadas por
um vazio interno e divididas em seis blocos de 15 andares cada um. Previa-se
uma circulação diária de 80 mil pessoas e 25 mil automóveis (Veja, novembro
1999).
O componente de marketing urbanístico representado pelo gigantismo do edifico
fez com que sua altura fosse aumentada para superar os 508 metros do
International Financial Center em Taiwan, que seria concluído em 2002, vencendo-
o por 2 metros para se constituir no prédio mais alto do mundo quando fosse
finalizado em 2005. Sua implantação exigiria uma base de 7,5 hectares e seria
feita num parque de um milhão de metros quadrados (Super, março 2000, 57).
Descontados os quase 100 metros de diferença entre as cotas do Parque Dom
Pedro II e da avenida Paulista, o mega-edifício seria visto nesse local com 410
metros de altura, equivalentes a duas vezes e meio o Edifício Itália (165 metros).
Esse projeto recebeu de pronto o apoio da gestão municipal de então, sendo
firmado protocolo de intenções com os empreendedores objetivando uma linha
de incentivos para a desapropriação de terrenos, a liberação de avenidas,
419
AS REMODELAÇÕES DAS DÉCADAS DE 1980 E 1990
Fig. 230: Progrma - Maharish Tower
420
mudanças no parcelamento e no zoneamento (FSP, 8/6/1999,3-6). Conforme
o presidente do órgão gestor da área central, o Procentro, afirmou na ocasião
“existe na região central, na área em que está prevista a construção do prédio,
áreas industriais, pátio ferroviário e galpões abandonados, que, se o proprietário
não os renova, a Prefeitura tem o direito de fazer isso, previsto na Lei da Operação
Urbana Centro. Isso pode ser feito para um projeto como esse”. Mencionou
ainda que por se tratar de um projeto com capacidade de reconfigurar a cidade,
mudando suas ruas, novas estações de ônibus e Metrô, necessitaria de apoio do
governo local, em qualquer parte do mundo onde fosse construído (Fiusa in FSP,
8/6/1999, 3-6).
Após inúmeras contradições sobre o fato da arquitetura do prédio permanecer
ou não como Minori Yamasaki havia definido, o que se confirmou, sua
implantação foi definida como abrangendo a área compreendida pelas ruas
São Caetano, ao norte, avenida Rangel Pestana, ao Sul, Rua Antonio Paes, a
oeste e rua Barão de Ladário, ao leste (FSP, 17/10/1999, 3-11. Uma equipe de
arquitetos brasileiros ficou a cargo das adaptações necessárias no prédio e da
sua implantação
4
e apesar das dúvidas sobre sua viabilidade, sua realização foi
defendida levando em conta os argumentos da reurbanização da área Brás-
Parí, da geração de empregos que o mesmo poderia proporcionar e da
arrecadação em impostos à cidade, pois o representante da Brasilinvest previa
cerca de 2.200 empregos diretos e 3.200 indiretos (OESP, 03/6/1999, D11) e a
geração de 15 milhões de reais de IPTU por ano (Garnero in FSP, 17/10/1999,
3-11).
Vista como uma região que apresentava decadência e deterioração, a área da
implantação correspondia exatamente à da Zona Cerealista. Seu entorno contaria
com um monotrilho, sendo prevista ainda uma linha de Metrô na rua São Caetano
e uma ligação dessa área com o Aeroporto Internacional de Cumbica também
por trilhos. A construção de um anel viário de acesso ao prédio, com um custo
estimado em R$ 378 milhões também estaria a cargo dos empreendedores.
Apesar do gigantismo da renovação urbana e da sua arquitetura totalmente
estranha aos parâmetros culturais e paisagísticos da cidade, o Maharishi Tower
contou com apoios importantes, que incluíram os do arquiteto Oscar Niemeyer
e da Associação Viva o Centro, entidade envolvida com a recuperação do Centro
(FSP, 17/10/1999, 3-11).
Entretanto as críticas ao empreendimento voltavam-se aos riscos envolvidos numa
operação de tal magnitude, a mutilação de uma importante área da cidade, o
isolamento da torre em meio ao parque previsto, a sua incompatibilidade
arquitetônica, etc. Como no projeto do Parque do Tietê, uma parcela da
população mostrou-se refratária à proposição, a dos antigos moradores dos
bairros atingidos, receosos da transferência para outras localizações mais distantes
e em apartamentos pequenos.
421
AS REMODELAÇÕES DAS DÉCADAS DE 1980 E 1990
Fig. 231: Montagem com a
implantação do empreendimen-
to.
A localização do edifício e a utilização dos instrumentos previstos na Operação
Urbana Centro para um único empreendimento também se constituíram em
uma polêmica: o presidente do Procentro mencionou ter sido o local de
implantação uma das condições da gestão municipal para a construção da torre
com seu apoio e incentivo. Nas suas palavras “o interesse era que ficasse em
uma área que estivesse em processo de degradação e não em uma área já
congestionada de prédios” (Fiusa in FSP, 8/6/1999, 3-6). Ocorre que uma
realização de tal envergadura, baseada na reconfiguração radical do território,
só poderia ser viabilizada com incentivos urbanísticos, mas o valor do solo urbano
se constituía em um claro impeditivo para a construção do mega-edifício na
área das Operações Urbanas então em curso, na avenida Faria Lima e na Água
Branca.
Configurou-se um cenário em que a especulação imobiliária se mostrou um
elemento presente na realização dos objetivos do grupo associado americano-
422
brasileiro responsável pelo empreendimento: o seu lançamento em São Paulo
ocorreu após a recusa de Miami e de uma cidade da Holanda em aceitarem o
projeto (Super, 2000, 61) e a sua localização na região Brás-Parí implicava em
incorporar um valor do solo bastante depreciado em relação a outras áreas
mais valorizadas da cidade e que contava ainda com áreas públicas, como o
Pátio do Parí. Além disso, a região era estratégica do ponto de vista da localização:
servida por transporte ferroviário e do Metrô, que previa na época a extensão da
Linha 4 para o Brás, passando pela rua São Caetano, proximidade da Marginal
do Tietê e com acesso ao Aeroporto Internacional.
Em maio de 2000, no mesmo dia em que o Prefeito foi afastado por medida
judicial, o grupo brasileiro anunciou sua intenção de retirar o projeto para
aprovação, visando apresentá-lo na gestão municipal seguinte, por discordar
da demora no envio do projeto para a Câmara Municipal e da exigência de um
depósito de 1,65 bilhões de dólares como garantia de realização do mesmo (JT,
29/5/2000). Na realidade, nada fazia crer que a megatorre teria as facilidades
urbanísticas e políticas apontadas quando de seu anúncio, devido ao tempo
necessário para executar todas as desapropriações, a incorporação de áreas
públicas como as vias de circulação ou o Pátio do Parí, de propriedade federal,
as transformações necessárias na infra-estrutura existente, etc. Na prática, o
projeto foi abandonado, já que a gestão municipal que assumiu a cidade a
partir de 2001 adotou outros caminhos para o tratamento das áreas urbanas de
São Paulo com os problemas que a região do Brás-Parí apresentava, para a
qual havia sido proposto simplesmente o seu parcial desaparecimento com a
construção daquele que seria o maior edifício do mundo.
Fig. 232: Maquete
eletrônica da implantação.
423
AS REMODELAÇÕES DAS DÉCADAS DE 1980 E 1990
8.3 – Breves comentários sobre os projetos P8.3 – Breves comentários sobre os projetos P
8.3 – Breves comentários sobre os projetos P8.3 – Breves comentários sobre os projetos P
8.3 – Breves comentários sobre os projetos P
arque do Tarque do T
arque do Tarque do T
arque do T
ietê e Maharishi Tietê e Maharishi T
ietê e Maharishi Tietê e Maharishi T
ietê e Maharishi T
owerower
owerower
ower
Com o objetivo de examinar a concepções das propostas urbanas direcionadas
aos bairros pesquisados, foram relacionadas aquelas que maior divulgação
tiveram nas décadas de 1980 e 1990, por caracterizarem uma prática de
renovação urbana radical, implicando na destruição de grandes extensões do
tecido urbano do território enfocado. Ambas propostas provocaram polêmicas
pelo gigantismo da escala de intervenção, característica típica das “cirurgias
urbanas” apregoadas no período posterior à II Guerra Mundial e que visaram a
substituição dos espaços das cidades considerados anômalos por outros
funcionalmente e formalmente adequados à novas funções.
Foram incluídos nesse rol de intervenções dois projetos: o Parque Tietê, de 1986
e o “Maharishi Tower”, de 1999. Inicialmente pode-se dizer que, apesar da
escala (urbana), foram concebidos como o próprio termo designa: projetos. As
diferentes linguagens da arquitetura proposta por cada um, convergem para o
ponto comum da renovação total de espaços dos bairros aqui pesquisados,
como se os mesmos não tivessem nenhuma importância na história da cidade e
para a vida de seus próprios habitantes.
A semelhança desse aspecto não pode ser confundida, porém, com a mesma
inserção junto ao mercado imobiliário: enquanto que o Parque do Tietê foi
justificado por um discurso poético e técnico, o “Maharishi Tower” o fez direta e
pragmaticamente, sem intermediação entre a megatorre do capitalismo
globalizado e sua implantação local, que exigia a eliminação do existente em
seu entorno. O primeiro, não reconheceu os mecanismos e interesses (ocultos
ou não) presentes em um corte de centenas de quadras ao longo do Tietê, nem
como viabilizar financeiramente a operação, nem como evitar a apropriação
pelo mercado imobiliário dos investimentos públicos. O segundo viabilizar-se–ia
através da compra pura e simples do território, conforme os empreendedores
anunciaram e da utilização dos instrumentos da Operação Urbana Centro,
conforme os integrantes da gestão municipal daquela época confirmaram.
Em parte pelo seu gigantismo, em parte pelo caráter autoritário de sua
proposição, ambos os projetos foram inviabilizados. Para os objetivos deste
trabalho, foram analisados primeiro como um registro das propostas dirigidas
ao Bom Retiro, Brás e Pari e como um contraponto à ações que possibilitam a
permanência da identidade morfológica, associada também à recuperação das
funções de moradia e trabalho da população. Entretanto, não se mostra distante
o paralelo entre essas duas propostas e os resultados que as operações urbanas
podem desencadear na cidade se não forem definidos os parâmetros de limitação
para as forças atuantes na configuração do espaço urbano, figurando entre as
principais, o mercado imobiliário.
424
Notas:
1
O projeto foi desenvolvido em 1986 na EMURB por uma equipe de arquitetos convidados por
Oscar Niemeyer: Hélio Pasta, Hélio Penteado, Júlio Katinsky, Ruy Otake e Walter Makhol..
2
O Instituto de Arquitetos do Brasil-SP e o Sindicato de Arquitetos de São Paulo divulgaram
publicamente sua posição crítica ao projeto do Parque do Tietê e à forma como foi proposto.
Além de matérias jornalísticas, as notas dos dois órgãos foram registradas na referência
bibliográfica mencionada no texto.
3
Além do projeto das torres gêmeas de Nova Iorque, destruídas no atentado terrorista de 11 de
setembro de 2001, o arquiteto Minori Yamasaki projetou na década de 1950 o conjunto de Pruitt-
Igoe, que foi implodido em 15 de julho de 1972, fixando segundo Charles Jenks, a morte do
Movimento Moderno de Arquitetura (Arantes, 1995, 49).
4
Alcindo Dell’ Agnese, Benedito Abud, Cândido Malta Campos Filho, Edo Rocha. (FSP, 17/10/
1999, 3-11)
425
REQUALIFICAÇÃO DOS BAIRROS CENTRAIS
CC
CC
C
APÍTULAPÍTUL
APÍTULAPÍTUL
APÍTUL
OO
OO
O
9: 9:
9: 9:
9:
RR
RR
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EQUEQU
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ALIFICAÇÃOALIFICAÇÃO
ALIFICAÇÃOALIFICAÇÃO
ALIFICAÇÃO
DOSDOS
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AIRROSAIRROS
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ENTRAISENTRAIS
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..
..
.
426
9 – R9 – R
9 – R9 – R
9 – R
equalificação dos Bairros Centraisequalificação dos Bairros Centrais
equalificação dos Bairros Centraisequalificação dos Bairros Centrais
equalificação dos Bairros Centrais
Os planos, programas e projetos relacionados a seguir foram propostos dentro
do âmbito do poder público municipal a partir de 2001 e consideraram como
diretriz principal a valorização dos bairros centrais em suas dimensões
morfológicas e funcionais, contemplando também a necessidade de adensamento
populacional nessas áreas providas de infra-estrutura, transportes, equipamentos
de saúde, educação e lazer. Nesse sentido, foram também relacionadas as ações
do órgão estadual responsável pela produção de habitação nas faixas social e
econômica, que incidiram nos bairros aqui pesquisados.
Foram caracterizados três eixos para sintetizar as atuações urbanísticas:
- Projetos de redesenho de espaços públicos
- Programas habitacionais
- Planos urbanos: Plano Diretor Estratégico e Planos Regionais
427
REQUALIFICAÇÃO DOS BAIRROS CENTRAIS
9.1 – P9.1 – P
9.1 – P9.1 – P
9.1 – P
rograma Rrograma R
rograma Rrograma R
rograma R
econstruir o Centroeconstruir o Centro
econstruir o Centroeconstruir o Centro
econstruir o Centro
Diferentemente dos projetos que propuseram a renovação urbana dos bairros
centrais, em maio de 2001 o “Plano Reconstruir o Centro” foi desenvolvido pelo
poder público municipal para, através de políticas urbanas integradas, reverter
as tendências que o centro e os bairros que o circundam apresentaram nas
últimas décadas. As estratégias definidas por esse Programa foram:
- O resgate do caráter público do espaço público
- A ampliação do uso residencial e garantia à diversidade de funções
- Consolidação da identidade do centro metropolitano
- Promoção de ações urbanísticas com inclusão social
- Criação de mecanismos de gestão democrática, voltados para o interesse
coletivo
(AR-SÉ/Procentro/PMSP, 2001,20)
Esse Plano analisou os seguintes aspectos: Território, Patrimônio, Acessibilidade,
Diversidade funcional e social, Moradia e Trabalho.
Fizeram parte do Plano, propostas reunidas nas categorias: eixos de requalificação
da paisagem urbana, projetos paisagísticos específicos e programas de habitação:
Eixos de requalificação da paisagem urbanaEixos de requalificação da paisagem urbana
Eixos de requalificação da paisagem urbanaEixos de requalificação da paisagem urbana
Eixos de requalificação da paisagem urbana
Para os bairros centrais enfocados neste trabalho, foram definidas as seguintes
atuações
- Av. Carlos de Campos / Rua Oriente/ Rua Barão de Ladário: distritos Pari e
Brás – eixo de ligação entre os distritos Pari e Brás. Implantação de projeto
paisagístico nas vias, valorização das praças e espaços públicos e apoio ao
centro comercial do Brás.
- Rua Três Rios e Praça Coronel Fernando Prestes: distrito Bom Retiro: projeto de
requalificação paisagística da Praça, estendendo esses padrões para o eixo da
rua Três Rios, onde, além dos estabelecimentos comerciais, estão instalados o
Teatro TAIB, a Oficina Cultural Oswald de Andrade e o Colégio Santa Inês.
2. Projetos paisagísticos específicos
- Orla ferroviária e Pátio do Pari:
- Parque Dom Pedro II:
- Projeto para a rua 25 de Março
- Projeto para o Mercado Municipal, seu entorno e consolidação de pólo
gastronômico
428
- Zona cerealista: transferência das atividades atacadistas e utilização de áreas
ocupadas por galpões, para fins habitacionais, incluindo a possibilidade de novos
espaços públicos.
3. Morar no Centro
Contribuir para o repovoamento da área central, viabilizar moradia para a
população de baixa renda no centro e nos bairros vizinhos, reabilitar edifícios
desocupados para uso habitacional e melhorar a qualidade de vida dos
moradores do centro (AR-SÉ/Procentro/PMSP, 2001, 29).
O programa previa as seguintes atuações
- Produção de novas unidades habitacionais, através da construção de edifícios
ou reforma e reciclagem de prédios vazios.
- Perímetros de reabilitação integrada do habitat – PRIH: intervenção integrada
em conjunto de quadras com concentração de moradias precárias, havendo
novas construções para habitação social, melhoria das condições dos cortiços,
reabilitação do patrimônio, criação ou melhoria de espaços para atividades
econômicas e das áreas verdes e equipamentos.
- Implantação do sistema de locação social, com valores compatíveis com os
salários dos locatários
- Viabilização de soluções habitacionais específicas para moradores de rua,
casa de abrigo de mulheres e idosos.
- Projeto habitacional para os moradores da Favela do Gato, situada na Marginal
Tietê, integrada com o parque e centro esportivo do Estádio Municipal de baseball.
Em 2002, o Plano Reconstruir o
Centro se tornou referência para os
projetos enviados ao Banco
Interamericano de Desenvolvimento
- BID, visando a obtenção de
financiamento para sua execução.
O montante desse financiamento,
que superava a quantia de US$ 100
milhões, contava ainda com a
contrapartida municipal. Entretanto,
por exigência dessa instituição, os
programas e projetos, restringiram-
se ao centro, excluindo as demais
propostas voltadas aos bairros
centrais, que ficaram sob o encargo
da Sub-prefeitura Sé.
Fig. 233: Mapa esquemático, Programa Reconstruir o
Centro, 2001.
429
REQUALIFICAÇÃO DOS BAIRROS CENTRAIS
9.2. P9.2. P
9.2. P9.2. P
9.2. P
rojetos nos Bairros Brás, Projetos nos Bairros Brás, P
rojetos nos Bairros Brás, Projetos nos Bairros Brás, P
rojetos nos Bairros Brás, P
arí e Bom Rarí e Bom R
arí e Bom Rarí e Bom R
arí e Bom R
etiroetiro
etiroetiro
etiro
No ano de 2002, foram propostas ações para locais nos bairros do Brás, Pari e
Bom Retiro. No primeiro foram desenvolvidos projetos paisagísticos para a Praça
Torquato Neto e um projeto preliminar para a praça Benemérito José Brás,
debatido junto à população moradora e usuária do local. No distrito do Pari, foi
implantado novo projeto para Largo Padre Bento, que deveria se conectar ao da
avenida Carlos de Campos e ao Centro de Apoio Integral ao Idoso, na
extremidade dessa via. No Bom Retiro foi desenvolvido o Projeto de Habitação
Social para a Favela do Gato, integrado ao de requalificação do parque público
existente nessa área.
Praça Torquato Neto
Área anexa à Praça Benemérito José Brás, de menores dimensões
(aproximadamente 5.000 m²) e com a mesma interferência da linha aérea do
metrô Leste-Oeste. Esse espaço também recebeu um projeto de requalificação
no início da década de 1990, logo após a que ocorreu na praça maior. No
início de 2002, foi implantado novo projeto paisagístico
1
, contemplando as
solicitações de moradores e entidades com sede nas imediações. No entorno
dessa praça encontram-se várias torres residenciais da COHAB, sendo a mesma
utilizada pelos moradores dos edifícios, principalmente os jovens. Conta com
rampa de skate e quadra de futebol e a maior parte de sua área não se encontra
impermeabilizada, como no caso da praça José Brás.
O projeto buscou adequar os equipamentos e principalmente valorizar
paisagísticamente um espaço um tanto confinado nas sobras de quadras entre
as tradicionais ruas do Brás, Caetano Pinto e Carneiro Leão.
Fig. 234: Projeto para Praça Torquato Neto.
430
Largo Padre Bento
Assim como as propostas e projetos no Brás, esta intervenção foi executada pela
Subprefeitura Sé antes do distrito Pari ser integrante da Subprefeitura Moóca.
Esse projeto
2
faria parte de uma intervenção que buscava articular espaços
públicos existentes ao longo da ligação Pari-Brás, através da implantação de
melhores padrões paisagísticos para a Praça Ilo Ottoni, avenida Carlos de
Campos, Largo Eduardo Rudge, Largo Padre Bento e Largo da Concórdia,
proposto pelo Plano Reconstruir o Centro, intervenção essa que ocorreu apenas
no local aqui mencionado.
Definido urbanisticamente pelas vias que interligam os bairros Pari e Brás, o
Largo Padre Bento se constitui em uma centralidade local da maior importância,
tanto pelo seu caráter histórico, quanto paisagístico e funcional. O seu formato
triangular é dominado, em um dos lados, pela escala monumental da igreja
Santo Antônio do Pari, construída em 1922, e seus outros lados ocupados por
pequeno comércio e super-mercado. Em sua proximidade existem residências e
edifícios habitacionais de gabarito médio, sendo para eles um espaço de lazer e
descanso bastante raro, devido a intensa ocupação do bairro.
O Largo é apropriado por moradores da região de diversas faixas etárias.
Diariamente são utilizadas mesas para jogos pela terceira idade e espaços de
recreação para crianças e adolescentes. Eventualmente o espaço serve de local
para quermesses e uma feira de produtos alimentícios bolivianos, que ocorria
aos domingos à noite e ali permaneceu por algum tempo, foi transferida para
outra localidade do bairro, já que na região é grande a presença da colônia
boliviana, mas no Largo essa atividade se mostrou inapropriada.
A intervenção consistiu em recuperar as qualidades paisagísticas do local, através
da demolição das barreiras causadas por canteiros altos e inadequados,
substituição do mobiliário,
melhoria da iluminação
pública, construção de
baia para táxi, tratamento
fito-sanitário, substituição
do piso e aumento da
área permeável. Buscou-
se também a valorização
do conjunto escultórico
implantado em um dos
vértices do espaço, que se
constitui em uma
importante referência
urbana do bairro.
Fig. 235: Projeto para Praça Padre Bento.
431
REQUALIFICAÇÃO DOS BAIRROS CENTRAIS
9.3. P9.3. P
9.3. P9.3. P
9.3. P
ropostas do Propostas do P
ropostas do Propostas do P
ropostas do P
rograma Habitação no Centro - PMSPrograma Habitação no Centro - PMSP
rograma Habitação no Centro - PMSPrograma Habitação no Centro - PMSP
rograma Habitação no Centro - PMSP
As propostas que se seguem, situadas nos bairros do Pari, Brás e Bom Retiro,
fizeram parte do programa que a Prefeitura de São Paulo desenvolveu para a
área central da cidade, considerando aí também os bairros que o circundam.
Os estudos tiveram início em 2001 e os projetos foram debatidos por setores da
administração pública e da sociedade civil, sendo considerados também os meios
de viabilização para os mesmos, uma vez que se mostrava impossível atender a
demanda existente com os recursos orçamentários de uma gestão municipal.
Esse Programa partiu da premissa que a cidade de São Paulo sofreu historicamente
um processo de expulsão da população de baixa renda para as áreas periféricas
e de esvaziamento dos espaços mais centrais, próximos a oferta de empregos e
dotados de equipamentos sociais e infra-estrutura. Entretanto, para as faixas de
renda média, média/baixa e baixa, o Centro apresenta uma alternativa concreta
para a produção de unidades habitacionais pelos seguintes motivos:
. Alguns bairros centrais em que o Programa incide não estão no foco de interesses
do mercado imobiliário para a produção de apartamentos de luxo ou de edifícios
de escritórios.
. Apresentam disponibilidade de áreas livres e possibilidade de reforma de edifícios
residenciais e comerciais para habitação social
. É a região da cidade melhor servida pelo transporte.
Apesar desses aspectos vantajosos para a localização de habitação social na
área central e bairros circunvizinhos, esse estudo demonstrou que desde 1995
as cooperativas autofinanciadas, que atuam no mercado residencial da Grande
São Paulo, não construíram nessa área pelo alto valor dos terrenos existentes.
Um reflexo dessa situação, que alia o esvaziamento do uso habitacional nos
bairros e área central e alto preço do solo urbano, é a grande incidência de
cortiços. Ainda em 1993, segundo dados da FIPE, o anel de bairros que circunda
o centro abrigava 20% da população encortiçada de São Paulo. O Programa
desenvolvido pela Prefeitura analisou que essa população pagava valores muito
altos de aluguel para morar em péssimas condições, sendo que uma parte dela
poderia arcar com programas de locação social e outra parte em programas de
aquisição de unidades.
Utilizando recursos dos agentes habitacionais públicos e privados (Caixa
Econômica Federal, CDHU, Fundo Municipal de Habitação e cooperativas) a
atuação do Programa de Habitação de Interesse Social foi focado nas seguintes
modalidades:
. Intervenções em terrenos ou edifícios isolados: buscando oferecer solução
habitacional através da produção de novas unidades ou reforma e reciclagem
432
de edifícios existentes, visando também a recuperação física e funcional de quadras
abandonadas ou sub-utilizadas.
. Perímetros de reabilitação integrada do habitat (PRIH): objetivando intervenção
em áreas dos bairros centrais que apresentam quadras deterioradas com a
incidência de cortiços. A produção habitacional nesses casos se dará
conjuntamente com a criação e requalificação de equipamentos, ampliação de
áreas verdes, melhoria das condições de cortiços e reabilitação do patrimônio.
De maneira complementar a essas modalidades, foi estudado ainda um programa
público de locação social, compatível com as necessidades familiares e com a
capacidade de pagamento da população usuária. Esse sistema, para famílias
com renda até 6 salários mínimos, fez parte do convênio entre a Prefeitura e a
Caixa Econômica Federal através do Programa de Arrendamento Residencial –
PAR, que previu a reforma ou construção de imóveis residenciais ou comerciais
para fins de moradia e seu arrendamento com opção de compra após 15 anos.
A ampliação dessa modalidade, que se constitui na solução básica das políticas
habitacionais européias há décadas, além de interferir nos preços de aluguéis
praticados pelos proprietários de cortiços, contemplou os seguintes aspectos:
. O percentual de domicílios alugados na área e bairros centrais é bastante
superior ao de outros bairros
. Grande concentração de cortiços que atende população com menor renda ou
sem condições de comprová-la
. Existência de reivindicação por parte dos movimentos sociais por moradia,
para que seja viabilizado (SEHAB, 2001,4).
433
REQUALIFICAÇÃO DOS BAIRROS CENTRAIS
9.3.1. P9.3.1. P
9.3.1. P9.3.1. P
9.3.1. P
rograma de Rrograma de R
rograma de Rrograma de R
rograma de R
eabilitação Integrada do Habitat eabilitação Integrada do Habitat
eabilitação Integrada do Habitat eabilitação Integrada do Habitat
eabilitação Integrada do Habitat
PRIH PRIH
PRIH PRIH
PRIH
Esse programa foi desenvolvido pela Secretaria da Habitação da Prefeitura de
São Paulo e objetivou uma atuação voltada à habitação social em áreas dos
bairros centrais juntamente com a revitalização urbana do entorno, já que os
locais onde a incidência de cortiços foi verificada, apresentavam também parte
de sua estrutura física deteriorada, como é o caso de partes do Glicério, Brás,
Parí, Canindé, Moóca, Bexiga, etc.
Os seus objetivos foram assim definidos:
- Valorização das potencialidades do bairro e da comunidade como protagonistas
das transformações urbanas
- Promoção e mobilização de grupos visando a sua organização e o exercício da
cidadania
- Inclusão social da população de baixa renda e melhoria das condições
habitacionais.
Os programas foram desenvolvidos tendo como base levantamentos físico-
ambientais detalhados por um “escritório-antena”, que pesquisou o número de
cortiços, moradias precárias, imóveis ociosos ou de interesse de preservação,
oportunidades imobiliárias, assim como as características paisagísticas e
ambientais dos espaços livres (PMSP/SEHAB, março de 2004).
A pesquisa dos perímetros 1, 2 e 3, referentes ao setor que reúne os bairros Luz,
Brás e Parí, foi desenvolvida por uma assessoria contratada pela Secretaria
Municipal de Habitação e COHAB
3
. Esse trabalho foi iniciado em 2001 e
concluído em 2002.
PP
PP
P
erímetro 1erímetro 1
erímetro 1erímetro 1
erímetro 1
O Perímetro 1 foi delimitado pela Av. Tiradentes, Rua João Teodoro, Rua da
Cantareira, Rua Mauá (linha do trem) até a Av. Tiradentes novamente.
Corresponde à área de transição Luz-Parí e encontra-se dentro da Operação
Urbana Diagonal Sul.
Levantamento da área
Número de quadras: 22
Área aproximada: 22,23 ha
Uso predominante: comercial/ residencial
Resumo de Usos: residencial/cortiços – 81 unidades
Serviços públicos: 5 Imóveis
Oportunidades na área: 29.157 m²
Unidades Novas – 979 unidades
Unidades Reabilitadas (reforma de cortiços) – 324 unidades
434
Total de Unidades – 1296 unidades
Imóveis tombados –Vila Residencial (V.Economizadora - 6 quadras) e Igreja
Percentual da área verde existente: 0%
Problemática da área: Esse perímetro se caracterizou pela presença de galpões
de fábricas, terrenos e estacionamentos na Rua 25 de Janeiro, além do cortiço
da “Vilinha” da rua 25 de Janeiro. Nele se incluíam cerca de 56 cortiços nas
Ruas João Teodoro, Dutra Rodrigues, Djalma Dutra, Dom Antonio de Melo,
Guilherme Maw, Rua da Cantareira, Francisco Sá Barbosa, Pedro Álvares Cabral.
A área apresentava ainda diversos terrenos de propriedade da Cúria Metropolitana
de São Paulo, passíveis de serem utilizados em futuros projetos.
A grande concentração de cortiços, a presença de imóveis indicando
oportunidades imobiliárias e a existência de entidades prestadoras de serviços
públicos e comunitários indicavam ter o Perímetro 1 grande potencial para
requalificação integrada.
PP
PP
P
erímetro 2erímetro 2
erímetro 2erímetro 2
erímetro 2
O Perímetro 2 situou-se no bairro do Canindé e se incluía dentro da Operação
Urbana Diagonal Sul. Foi delimitado pela Av. do Estado, Av. Cruzeiro do Sul,
Fig. 236: PRIH, perímetro 1.
435
REQUALIFICAÇÃO DOS BAIRROS CENTRAIS
Rua Vidal de Negreiros, Rua Conselheiro Dantas, Rua Carnot, Rua Alexandrino
Pedroso, Rua Thiers, Rua João Teodoro, Rua Monsenhor Andrade, Rua São
Caetano até avenida do Estado.
Levantamento da área
Número de quadras: 20
Área aproximada: 28,90 ha
Cortiços – 73 unidades
Uso misto: residencial-comercial
Percentual de áreas vazias: 0,49 % (área 1.443 m²)
Serviços públicos: 2 imóveis
Oportunidades na área: 44.805 m²
Número aproximado de habitação para serem produzidas:
Unidades Novas – 1494 unidades
Unidades Reabilitadas – 300 unidades
Total de Unidades – 1794 unidades
Imóveis tombados – Patrimônio: não há
Percentual da área verde existente: 0%
Problemática da área: o Perímetro 2 caracterizou-se pela presença de grande
número de cortiços com tipologias variadas: edificações de 2 pavimentos com
presença de comércio no pavimento térreo e cortiço no pavimento superior,
cortiços tipo casa isolada com entrada independente e cortiços de quintal com
Fig. 237: PRIH, perímetro 2.
436
maior aproveitamento do fundo dos lotes e miolos de quadras. Nesse perímetro
foi construído no final da década de 1990, um conjunto habitacional pela CDHU
e o “Programa de Atuação em Cortiços – PAC” previa ainda outras intervenções
nas suas proximidades, como será visto adiante.
Estudos e análises mais aprofundados indicaram potencialidade para a
reabilitação urbana e habitacional por meio de reformas e transformações físicas
mínimas nos imóveis, com o envolvimento dos proprietários, moradores e até
comerciantes da região para a melhoria da habitabilidade nas moradias – com
provável diminuição do adensamento e provisão de unidades habitacionais na
região – reformas e restauros de fachadas e requalificação dos espaços públicos
urbanos, em operações fomentadas pela Prefeitura com a participação de outros
setores nesse processo.
PP
PP
P
erímetro 3erímetro 3
erímetro 3erímetro 3
erímetro 3
O Perímetro 3 foi delimitado pelo Viaduto Gasômetro, Rua Correia de Andrade,
Rua Sampaio Moreira, Rua Monsenhor Andrade, Rua do Bucolismo, Rua Rodrigues
dos Santos, Rua Silvio Penteado, Rua Barão de Ladário até o Viaduto do
Gasômetro novamente. Abrange parte do bairro do Brás e localiza-se dentro da
Operação Urbana Centro.
Levantamento da área
Número de quadras: 5
Área aproximada: 15,33 ha
Uso predominante/ Resumo de Usos:
Imóveis ociosos – Galpões
Percentual de áreas vazias: 0,53 % (área = 822 m²)
Serviços públicos: nenhuma unidade
Oportunidades na área: 34.936 m²
Número aproximado de habitação para serem produzidas
Unidades Novas – 1165.
Unidades Reabilitadas: 0
Total de Unidades – 1165
Imóveis tombados – 57
Percentual da área verde existente: 0%
Problemática da área
O Perímetro 3 caracterizou-se pela presença de grande quantidade de áreas de
imóveis vagos ou ociosos como galpões de fábricas vizinhos ao Pátio Ferroviário
do Pari e o antigo Moinho Matarazzo. Nesse quadrilátero estão situados edifícios
e galpões com valor arquitetônico, grandes áreas ociosas, degradadas, sem
437
REQUALIFICAÇÃO DOS BAIRROS CENTRAIS
integração com outras partes da cidade, apresentando também subutilização e
inadequação das soluções de circulação para pedestres e automóveis. Além da
produção habitacional, esse Perímetro também se mostrou adequado à produção
de equipamentos de cultura, esporte, lazer. As áreas circunvizinhas também
poderão ser requalificadas para esses ou outros usos, como por exemplo, áreas
verdes.
A definição desse Perímetro intencionou provocar a integração das quadras de
ambos os lados, separadas pela linha férrea, e também por isso, decadentes,
degradadas e abandonadas. Visou também contribuir para soluções integradas
de reabilitação, articuladas com os outros dois perímetros da mancha Pari/Brás
2 – utilizando, por exemplo, as operações casadas de desadensamento-remoção
e provisão habitacional.
Fig. 238: PRIH, perímetro 3.
438
9.3.2 – Conjunto habitacional para o Bom R9.3.2 – Conjunto habitacional para o Bom R
9.3.2 – Conjunto habitacional para o Bom R9.3.2 – Conjunto habitacional para o Bom R
9.3.2 – Conjunto habitacional para o Bom R
etiro – Petiro – P
etiro – Petiro – P
etiro – P
arque do Gatoarque do Gato
arque do Gatoarque do Gato
arque do Gato
Esse projeto foi desenvolvido pela SEHAB/COHAB para abrigar os moradores
da “Favela do Gato”, que se formou a partir de 1993 às margens do rio
Tamanduateí, junto à sua foz com o rio Tietê. Tratava-se de uma área que
apresentava riscos de desabamentos, inundações e incêndios, que de fato ocorreu
no início do ano de 2001.
A população foi remanejada para abrigos provisórios nas proximidades do local
sendo cadastrada para as futuras unidades no conjunto habitacional a ser
construído. Embora se tratando de uma favela, pelo fato da mesma se encontrar
em bairro central, a área em que estava instalada foi considerada uma ZEIS-3
(Zona Especial de Interesse Social), o que segundo o Plano Diretor aprovado em
2002, vinculava projeto urbanístico também para o seu entorno.
A área onde o projeto foi desenvolvido localiza-se entre a avenida Marginal
Tietê pista expressa e local, tratando-se de área pública com 17,5 hectares onde
foi construído o Estádio Municipal de Baseball Mie Nishii e ao longo do tempo
cedida para várias entidades que instalaram galpões para escolas de samba,
além de dois Centros Desportivos Municipal – CDM.
Além dessas características, a área localiza-se defronte ao complexo do Anhembi,
do outro lado do rio Tietê. Tal situação colabora ainda mais para a vocação de
parque público desse espaço, com utilização intensiva dos equipamentos não só
para a população que irá ocupar o conjunto habitacional, mas para toda a
região vizinha que não possui áreas públicas com qualidade. O projeto para o
conjunto previu também áreas para oficinas, centros de formação de mão-de-
obra para confecções, tenda para shows e torre mirante de 40 metros de altura.
Fig. 239: Maquete do projeto Favela do Gato, 2002.
439
REQUALIFICAÇÃO DOS BAIRROS CENTRAIS
O conjunto contou com 10 blocos de prédios de 4 andares, somando 486
unidades (aproximadamente 112 a mais que as famílias cadastradas da Favela
do Gato) . Essas unidades foram compostas por tipologias com áreas úteis de
27, 36 e 48 m², respectivamente para kitchnete, apartamento com 1 e 2
dormitórios. Para a população moradora, o conjunto contou também com quadras
esportivas e creche. No edifício, localizado na transição entre o conjunto
habitacional e o Parque foi proposto também serviços tais como padaria, farmácia
e banca de jornal e revistas (SEHAB/COHAB, 2002).
Fig. 240: Parque do Gato, 2004.
440
9.4. P9.4. P
9.4. P9.4. P
9.4. P
ropostas do Propostas do P
ropostas do Propostas do P
ropostas do P
rograma Habitacional CDHUrograma Habitacional CDHU
rograma Habitacional CDHUrograma Habitacional CDHU
rograma Habitacional CDHU
A atuação desse órgão esteve relacionada ao Programa de Atuação em Cortiços-
PAC, que implantou um conjunto no Canindé e
a construção de torres
habitacionais populares no bairro do Brás. Intencionou reorientar a aplicação
de recursos para habitação popular, dirigindo parte dos mesmos para construção
de moradias em áreas centrais de cidades médias e grandes. No caso específico
de São Paulo, o foco foi dirigido para o Centro e os bairros vizinhos com maior
incidência de cortiços da cidade.
Os objetivos do programa voltaram-se para três atuações principais:
1. Além da produção de moradias, a possibilidade de induzir a renovação urbana
e a revalorização de áreas degradadas da idade.
2. Otimização da infra-estrutura, serviços e equipamentos públicos, em face
da sub-utilização dos mesmos.
3. Construção de tipologias habitacionais passíveis de permitir o adensamento
das áreas, através da utilização de potencial construtivo para reduzir os custos
da produção das unidades (CDHU, 1996, 2).
O estudo analisou que as formas de produção de habitação popular adotadas
pelo poder público historicamente se basearam no barateamento das unidades
habitacionais, através da relação preço-localização dos terrenos, o que de
maneira geral conduziu a ocupações na periferia da cidade, onerando o poder
público pela necessidade de provimento de infra-estrutura nas áreas desprovidas
da mesma. O estudo preliminar propôs ainda o objetivo de responder a curto e
médio prazo a demanda que era estimada em 115.000 unidades, representando
um universo de 600.000 pessoas moradoras em cortiços na cidade de São
Paulo (idem, 2).
Em 1998 esse Programa sofreu alterações em sua estruturação, com a entrada
do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) na construção de moradias
no município de São Paulo. Como resultado das alterações introduzidas no
programa, estabeleceu-se a meta de 5000 moradias para serem construídas de
2002 a 2005, sendo 4.400 delas no município de São Paulo (CDHU, 2002).
As torres que foram construídas na rua Canindé fizeram parte de um grupo de
projetos não implantados, também propostos ao distrito do Pari. Contudo, os
Perímetros de Reabilitação Integrada do Habitat, vistos anteriormente, incluíram
essas propostas, como foi o caso do diagnóstico elaborado para o Perímetro 1,
na Luz. O mapa do PAC Piloto também mostra essa interface, já que foram
assinalados atuações nas ruas Dutra Rodrigues e Guilherme Maw.
441
REQUALIFICAÇÃO DOS BAIRROS CENTRAIS
Conjunto rua CanindéConjunto rua Canindé
Conjunto rua CanindéConjunto rua Canindé
Conjunto rua Canindé
Dados do projeto:
Início: 1999
Conclusão: maio de 2002
Número de unidades: 160
Área: 42 m²
Projeto: arq. Ruy Otake
Fig. 241 e 242: Ao lado, torre CDHU, 2003.
Abaixo, vista da inserção urbana das edificações
Fig. 243: Mapa esquemático com áreas de intervenção, PAC Piloto.
442
PP
PP
P
AA
AA
A
C PC P
C PC P
C P
ilotoiloto
ilotoiloto
iloto
PP
PP
P
rograma Programa P
rograma Programa P
rograma P
ro Lro L
ro Lro L
ro L
arar
arar
ar
Através desse programa foram
construídas torres habitacionais no
Brás para a faixa econômica. Em
2003 foram erguidos quatro
edifícios na rua Sampaio Moreira,
junto da linha férrea, em um
espaço anteriormente ocupado
por galpões em precárias
condições. Esse conjunto se
encontra localizado dentro do
Perímetro 3 do PRIH-Brás, sendo
construídas 200 unidades com
área de 42 e 48 m².
Seguindo as mesmas
características tipológicas, no ano
de 2004 foram construídas na rua
Martin Buchard, 252 unidades em
área que já contava com as torres
da COHAB, construídas no fim da
década de 1980, junto da estação
Brás do Metrô. O adensamento
populacional nessa área era
previsto pelas Zonas de Especial
Interesse Social ZEIS-3, definidas
no Plano Diretor Estratégico e
abordadas a seguir.
Fig. 244, 245 e 246: De cima para baixo:
Conjunto na R. Cel. Francisco Amaro, Brás, 2003.
Ponte metálica de ligação Brás-Pari, junto ao
conjunto acima mencionado e galpões que foram
demolidos, 2003.
Conjunto na R. Martin Bouchard, Brás, 2004.
443
REQUALIFICAÇÃO DOS BAIRROS CENTRAIS
9.5 – Plano Diretor Estratégico9.5 – Plano Diretor Estratégico
9.5 – Plano Diretor Estratégico9.5 – Plano Diretor Estratégico
9.5 – Plano Diretor Estratégico
Com relação aos planos e programas urbanísticos para a área dos bairros centrais,
30 anos após a promulgação da Lei de Zoneamento de 1972, foi aprovado no
ano de 2002 o Plano Diretor Estratégico do Município de São Paulo
4
e após o
mesmo, foi iniciada a elaboração dos Planos Regionais Estratégicos das
Subprefeituras, apresentados no segundo semestre de 2003 para debate na
Câmara Municipal e aprovado em 2004 ( Lei 13.885/2004).
Para compreensão das propostas dos Planos Regionais Estratégicos incidentes
nos bairros centrais, sintetizamos os principais aspectos contidos no Plano Diretor
Estratégico:
. ELEMENTOS ESTRUTURADORES
Rede viária estrutural
Rede estrutural de transportes
Rede de eixos e pólos de centralidade
Rede hídrica estrutural
. ELEMENTOS INTEGRADORES
Habitação
Equipamentos sociais
Áreas verdes
Espaços públicos
. MACROZONEAMENTO
1. Macrozona de Proteção Ambiental: mananciais, áreas com cobertura vegetal
e áreas a serem recuperadas. As zonas de uso incidentes nesta área são:
ZER – 1: zona exclusivamente residencial de baixa densidade
ZERp: zona exclusivamente residencial de proteção ambiental
ZMp: zona mista de proteção ambiental
ZCPp: zona centralidade de proteção ambiental
ZPDS: zona de proteção e desenvolvimento sustentável
ZLT: zona de lazer e turismo
ZPE: zona especial de preservação
2. Macrozona de Estruturação e Qualificação Urbana: área urbana consolidada
Na macrozona de Estruturação e Qualificação Urbana a instalação do uso
residencial e o desenvolvimento das atividades urbanas estão subordinados às
exigências dos elementos estruturadores definidos no Plano Diretor Estratégico e
nos Planos Regionais Estratégicos das Subprefeituras. Estão compreendidas nessa
porção do território, as seguintes zonas de uso:
444
Zonas de Centralidade: PZonas de Centralidade: P
Zonas de Centralidade: PZonas de Centralidade: P
Zonas de Centralidade: P
olarolar
olarolar
olar
, Linear e Linear em Zer – ZCP , ZCL e ZCLz -, Linear e Linear em Zer – ZCP , ZCL e ZCLz -
, Linear e Linear em Zer – ZCP , ZCL e ZCLz -, Linear e Linear em Zer – ZCP , ZCL e ZCLz -
, Linear e Linear em Zer – ZCP , ZCL e ZCLz -
destinadas a uma maior diversidade e intensidade dos usos não residenciais,
admitindo usos potencialmente incômodos. Com exceção da ZCLz, com regras
mais restritivas, o que distingue as lineares das polares é que integram as ZCL,
os lotes lindeiros a trechos de vias internos à zona mista, numa faixa de até 40
metros medidos a partir do alinhamento da via. Ambas com predominância de
usos não residenciais, classificam-se de acordo com os coeficientes de
aproveitamento em:
a. ZCLa – coeficiente de aproveitamento básico igual a 1,0 e máximo variando
de 1,0 até o limite de 2,5;
b. ZCLb - coeficiente de aproveitamento básico igual a 2,0 e máximo variando
de 2,0 até o limite de 4,0;
Fig. 247: Macrozoneamento,
PDE, 2002.
445
REQUALIFICAÇÃO DOS BAIRROS CENTRAIS
c. ZCPa - coeficiente de aproveitamento básico igual a 1,0 e máximo variando
de 1,0 até o limite de 2,5;
d. ZCPb - coeficiente de aproveitamento básico igual a 2,0 e máximo variando
de 2,0 até o limite de 4,0;
Zona estritamente residencial – ZERZona estritamente residencial – ZER
Zona estritamente residencial – ZERZona estritamente residencial – ZER
Zona estritamente residencial – ZER. Correspondem às Z1 no antigo zoneamento
Zona predominantemente industrial – ZPIZona predominantemente industrial – ZPI
Zona predominantemente industrial – ZPIZona predominantemente industrial – ZPI
Zona predominantemente industrial – ZPI: destinadas à implantação de usos
diversificados, preferencialmente para usos industriais incômodos e outras
atividades não residenciais incômodas. São estabelecidos os coeficientes de
aproveitamento: mínimo igual a 0,1; básico igual a 1,0 e máximo igual a 1,5.
Zona mista – ZM: corresponde ao restante do território da Macrozona de
Estruturação e Qualificação excluídos os perímetros de ZER, ZPI e Zonas Especiais.
Caracteriza-se pela conjugação de usos residenciais e não residenciais, inclusive
no mesmo lote ou edificação, respeitados os critérios de incomodidade e
qualidade ambiental do uso residencial. Classificam-se em:
ZM-1: densidade demográfica e construtiva baixa, coeficiente de aproveitamento
básico e máximo iguais a 1,0;
ZM-2: densidade demográfica e construtiva média, coeficiente de aproveitamento
básico igual a 1,0 e máximo variando de 1,0 até o limite de 2,0;
ZM-3a: densidade demográfica e construtiva alta, coeficiente de aproveitamento
básico igual a 1,0 e máximo variando de 1,0 até o limite de 2,5;
ZM-3b: densidade demográfica e construtiva alta, coeficiente de aproveitamento
básico igual a 2,0 e máximo variando de 2,0 até o limite de 2,5;
. ZONAS ESPECIAIS – situam-se em qualquer zona do território do Município,
têm características específicas e normas próprias de uso e ocupação do solo e
edilícia.
1. Zona de proteção ambiental: ZEPAM
2. Zona de produção agrícola/mineral: ZEPAG
3. Zona de proteção ao patrimônio cultural – ZEPEC: transferem potencial
construtivo
4. Zona Especial de Interesse Social 1 – ZEIS 1: área abrangida por favelas e
loteamentos precários;
5. Zona Especial de Interesse Social 2 – ZEIS 2: áreas com predominância de
glebas, terrenos não edificados ou subutilizados adequados à urbanização;
6. Zona Especial de Interesse Social 3 – ZEIS 3: áreas encortiçadas no espaço
urbano consolidado
446
7. Zona Especial de Interesse Social 4 – ZEIS 4: glebas ou terrenos não edificados
e adequados à urbanização em áreas de proteção ambiental para atender
população removida de áreas de risco e de preservação permanente.
As Zonas de Especial Interesse Social – ZEIS 3 se constituem em uma categoria
de zona especial quanto às regras de parcelamento, uso e ocupação do solo
“objetivando a criação de condições favoráveis para uma atuação concentrada
de agentes públicos e privados visando a melhoria das condições de habitabilidade
dos cortiços e a reforma de edifícios abandonados, com a destinação de novas
unidades para a provisão habitacional” (PDE, PMSP, 2002).
Essas zonas estarão isentas do pagamento da outorga onerosa pelo direito de
construir acima do coeficiente máximo permitido, podendo ainda ser isenta dessa
cobrança a área construída destinada a outros usos desde que haja HIS em
igual proporção no mesmo empreendimento. Em síntese, nessas áreas será
possível atingir o limite máximo igual a 4,0 (quatro) sem o pagamento de
contrapartida, obedecidas as condições acima descritas.
. NOVOS INSTRUMENTOS URBANÍSTICOS
Área de Intervenção Urbana – AIU
AIU parques lineares
AIU eixos viários
AIU eixos de transporte coletivo
AIU eixos e pólos de centralidade
Parcelamento, edificação e utilização compulsórios (segundo Estatuto das Cidades)
Incidência do direito de preempção (segundo Estatuto das cidades)
Áreas de operação urbana
. NOVOS INSTRUMENTOS DE GESTÃO URBANA
. Transferência do direito de construir
. Operações urbanas consorciadas
. Fundo de Urbanização – reunir e canalizar os recursos de outorga onerosa
. Zoneamento ambiental
. Estudo de impacto ambiental e de vizinhança
. Avaliação ambiental estratégica
Com relação aos coeficientes de aproveitamento permitidos, o Plano Diretor
Estratégico definiu o índice máximo de 2,5 para toda a cidade, com exceção
das zonas estritamente residenciais ou outras que pudessem receber algum tipo
de restrição, como por exemplo, as áreas que contam com imóveis tombados,
as ZEPECs. O coeficiente adicionado equivaleu a 4, também para as Operações
Urbanas e eixos e pólos de reestruturação, havendo a contrapartida da outorga
onerosa (concessão paga) para a passagem de C.A= 2,5 para C.A= 4.
447
REQUALIFICAÇÃO DOS BAIRROS CENTRAIS
Fig. 248: Pólos regionais, PDE, 2002.
448
9.6. Operações Urbanas P9.6. Operações Urbanas P
9.6. Operações Urbanas P9.6. Operações Urbanas P
9.6. Operações Urbanas P
ropostasropostas
ropostasropostas
ropostas
O principal diferencial entre as Operações Urbanas –O.U. propostas após 2001
e as O. U. Faria Lima, Água Branca e Centro, aprovadas anteriormente, refere-
se ao fato de que estas últimas não obedeceram nenhum projeto urbanístico
quando de sua implantação. Entre as nove Operações Urbanas aprovadas no
Plano Diretor Estratégico
5
, quatro incidiram nos distritos Bom Retiro, Brás e Pari
as O.U. Centro, Diagonal Sul, Diagonal Norte e Celso Garcia. De acordo com
a Secretaria Municipal de Planejamento Urbano , as Operações Urbanas foram
definidas pela Lei Federal do “Estatuto da Cidade”
6
como intervenções dentro
de perímetros e condições determinadas por lei própria e constantes no Plano
Diretor Estratégico, sendo que esse instrumento determinou a exigência de um
projeto próprio que abordasse problemas relativos a quatro esferas urbanísticas:
infra-estrutura, meio ambiente, transporte e habitação social (Sempla, 2004, s/
pág).
Nesse sentido, cada Operação Urbana necessariamente incluiu um Plano de
Ordenação Urbanística-PRIOU, que em linhas gerais compreende:
- Estudo de viabilidade de diretrizes, que através da caracterização e definição
das propostas arquitetônicas, urbanísticas e paisagísticas constituirão um
programa de investimentos públicos direto para a operação urbana em tela,
contendo análises de viabilidade de sua implantação, custos e prazos. Objetiva-
se a seleção dos projetos de obras públicas e alternativas para a viabilização da
O.U. quanto às negociações envolvendo concessões urbanísticas,
desapropriações, etc.
- Estudo de potencial de construção: proposição de cenários de configuração
do sistema edificado, que observando as pré-existências físicas, sociais e
ambientais existentes, formulará as possibilidades de ampliação do potencial
construtivo dentro do proposto pelo Estatuto da Cidade e pelo Plano Diretor
Estratégico.
- Plano Geral de Implementação: compatibilização, articulação e integração
dos elementos de caracterização e propositivos da Operação Urbana. O seu
objetivo é o de estabelecer linhas prováveis de encadeamento das ações, estipular
as fases de implementação, custos e benefícios esperados através de uma
abordagem de conjunto que inter-relaciona as escalas, temas e fatores de
transformação, associando programas de investimentos públicos e indução ao
investimento privado (PMSP, 2003, 7).
A “Operação Urbana Diagonal Sul” foi criada com o objetivo de revitalizar o
uso de um território com cerca de 20 milhões de m² disposto ao longo da
ferrovia que corta os bairros do Ipiranga, Vila Prudente, Moóca, Brás e Pari.
Para tanto, sua atuação se relaciona ao provimento e atualização da infra-estrutura
de drenagem, viária e de transportes, na requalificação urbanística do espaço
449
REQUALIFICAÇÃO DOS BAIRROS CENTRAIS
construído e do patrimônio histórico, incluindo o aumento dos espaços livres e
aumento da densidade populacional através de alternativas para a habitação
de várias faixas de renda.
Tendo em vista o adensamento, revitalização do uso do solo e habitação, as
diretrizes dessa Operação Urbana definiram quatro intervenções em torno de
estações projetadas como transposições e centralidades: Tamanduateí, Ipiranga,
Moóca e Largo da Concórdia. Prevê-se ainda outra centralidade projetada no
Pátio do Parí. Segundo essas diretrizes, os recursos da Operação Urbana serão
destinados também para a reurbanização de favelas e para as melhorias
necessárias às áreas das Zonas de Especial Interesse Social ZEIS-3.
Em parte dos setores sudeste e leste dos distritos centrais, sobrepõe-se à Diagonal
Sul a “Operação Urbana Centro”, em curso desde 1997. A pouca eficácia desse
instrumento, utilizado apenas para venda de potencial construtivo e o coeficiente
de aproveitamento então aprovado para essa área, que em alguns casos chegava
a 12, levaram a uma série de estudos sobre sua revisão devido a sua coincidência
com a O. U. Diagonal Sul nos setores próximos da orla ferroviária e com os
índices aprovados no Plano Diretor Estratégico, que estabeleceram em 4 o
coeficiente máximo na cidade.
Com relação à Operação Urbana Diagonal Norte, que compreende o vetor
noroeste estruturado pela ferrovia a partir do anel de bairros centrais, sua
Fig. 249: Mapa-síntese das Operações Urbanas e ZEIS,
2002.
450
implantação condicionou-se à revisão da Operação Urbana Água Branca, que
conforme foi examinado na Parte I deste trabalho, recebeu propostas vindas do
Concurso Nacional para Projeto Urbano “Bairro Novo”. Entretanto, entre esta
área e os bairros abrangidos pela O.U. Diagonal Sul ocorre um diferencial
importante que é a do valor do solo dos bairros da Barra Funda, Água Branca e
Lapa, que impõe outras medidas aos interesses já existentes do mercado
imobiliário, diferentemente do que acontece no vetor sudeste.
Além das Operações Urbanas mencionadas, foi proposta também para os bairros
do Belém, Belenzinho, Brás e Pari a Operação Urbana Celso Garcia, objetivando
requalificar física e funcionalmente os espaços desses bairros, como por exemplo
a própria avenida Celso Garcia, esvaziada tanto sob o ponto de vista populacional
como de suas atividades econômicas.
451
REQUALIFICAÇÃO DOS BAIRROS CENTRAIS
9.7. Planos R9.7. Planos R
9.7. Planos R9.7. Planos R
9.7. Planos R
egionais Estratégicos dos Distritos Bom Regionais Estratégicos dos Distritos Bom R
egionais Estratégicos dos Distritos Bom Regionais Estratégicos dos Distritos Bom R
egionais Estratégicos dos Distritos Bom R
etiro, Brás e Petiro, Brás e P
etiro, Brás e Petiro, Brás e P
etiro, Brás e P
ariari
ariari
ari
Os Planos Regionais Estratégicos (PRE) propostos para os distritos aqui enfocados
se constituíram em uma oportunidade relevante para a análise de seus aspectos
urbanos, problemas e potencialidades locais, não contemplados na escala do
Plano Diretor Estratégico, porém norteados pelos seus instrumentos aprovados
sob a forma de lei.
Efetivamente, pela primeira vez a cidade contou com essa escala de planejamento
urbano, cuja proposição já fora formulada desde o relatório da SAGMACS e da
proposta do PUB, nas décadas de 1950 e 1960, respectivamente. Os trabalhos,
iniciados no ano de 2002, foram conduzidos em duas etapas, compreendidas
pelo quadro situacional e pelo quadro propositivo, com a participação de setores
da população que reuniu moradores, entidades, empresas e militantes de
movimentos sociais, de meio ambiente, etc.
Os distritos Bom Retiro, Brás e Pari tiveram uma dinâmica diferenciada em relação
a esse processo, uma vez que fizeram parte de subprefeituras diferentes, o que
impediu análises mais integradas sob o ponto de vista da relação entre os bairros
centrais, extensão de projetos voltados à paisagem urbana, etc. Entretanto, as
diretrizes definidas pelo Plano Diretor Estratégico e pelas Operações Urbanas
por ele criadas, estabeleceram um pano de fundo comum, estruturado pelo
emprego dos coeficientes de aproveitamento mínimos e máximos, pelos critérios
voltados aos pólos e eixos de centralidade, que se converteram nas Áreas de
Intervenção Urbanística -AIU e pelas políticas urbanísticas de transportes, meio
ambiente e habitação.
De acordo com a Secretaria Municipal de Planejamento, o Plano Diretor
Estratégico do Município de São Paulo definiu como ação estratégica da Política
de Urbanização e de Uso do Solo (Artigo 78 da Lei Municipal 13.430/01) o
desenvolvimento de Planos Regionais para as subprefeituras (Inciso IX).
Segundo o § 3° do Artigo 273, “Os planos regionais deverão ser elaborados com
a participação dos munícipes dos diversos bairros que compõem cada região,
nos diagnósticos, concepção, aprovação, monitoramento, fiscalização e revisão
em todas as ações, com base em plena informação, disponibilizada pelo Executivo,
a elas concernentes, em tempo para subsidiar o processo de discussão, elaboração
e decisão”.
Segundo o Artigo 274, “os Planos Regionais, observando os elementos
estruturadores e integradores do Plano Diretor Estratégico, complementarão as
suas proposições de modo a atender às peculiaridades do sítio de cada região e
às necessidades e opções da população que nela reside ou trabalha.”
No Artigo 277 lê-se que “Nos Planos Regionais deverão constar, no mínimo:
452
I - delimitação das novas áreas em que se aplicam os instrumentos da Lei Federal
n° 10 257, de 10 de julho de 2001 - Estatuto da Cidade;
II - hierarquização do sistema viário local e plano de circulação e transporte;
III - proposta de destinação de áreas e equipamentos públicos e áreas verdes;
IV - áreas reservadas para bolsões, conforme lei 11 322 de 22 de dezembro de
1992;
V - projetos de intervenção urbana;
VI - proposta de tombamento ou outras medidas legais de prestação e preservação
de bens móveis e imóveis da região;
VII - aplicação no território da subprefeitura, das diretrizes de uso e ocupação do
solo previstas no Plano Diretor Estratégico;
VIII - proposta de composição, com Subprefeituras vizinhas, de instâncias
intermediárias de planejamento e gestão, sempre que o tema ou serviço exija
tratamento além dos limites territoriais da Subprefeitura;
IX - proposta de ação articulada de planejamento e gestão com as Subprefeituras
e municípios limítrofes, com base em diretrizes governamentais para a Política
Municipal de Relações Metropolitanas;
X - proposta de ações indutoras do desenvolvimento local, a partir das vocações
regionais;
XI - indicação de prioridades, metas e orçamento regional para a Subprefeitura;
XII - proposta de prioridades orçamentárias relativas aos serviços, obras e atividades
a serem realizadas da Subprefeitura” (PRE Subprefeitura Sé, Quadro situacional,
PMSP/SEMPLA/Polis, 2002, 9).
O processo de análise urbana dos territórios da Subprefeitura Sé, que entre
outros abrange o distrito Bom Retiro, priorizou os subsídios para a elaboração
de uma estratégia de regulação do uso e ocupação do solo visando dar
sustentação aos programas, propostas e ações definidos para a região. Os
objetivos específicos que se inseriram nesse escopo foram:
.”Definição de diretrizes para mudanças de zoneamento no centro
.Detalhamento de critérios de sub-utilização e não utilização de imóveis e
levantamento de áreas passíveis de utilização desse instrumento
.Revisão das áreas delimitadas como Zonas Especiais de Interesse Social
.Definição de diretrizes para a revisão da Operação Urbana Centro e diretrizes
para elaboração de Operação Urbana Diagonal Sul
.Definição de áreas de preservação histórica e ambiental para aplicação da
transferência do direito de construir
.Definição sobre a destinação das áreas públicas da Subprefeitura(idem, 10).
Em relação à Subprefeitura Mooca, que abrange os distritos do Pari e Brás, o
Plano Regional definiu os seguintes objetivos específicos:
453
REQUALIFICAÇÃO DOS BAIRROS CENTRAIS
“.Detalhamento de critérios de sub-utilização e não utilização de imóveis e
levantamento de áreas passíveis de utilização dos instrumentos do Estatuto da
Cidade
.Revisão das ZEIS estabelecidas
.Definição de áreas verdes e de preservação histórica e ambiental para aplicação
do instrumento de transferência do direito de construir
.Propor uma articulação e implementação de instrumentos urbanísticos que
estimulem a preservação de conjuntos arquitetônicos históricos como vilas, fábricas
e casario
.Levantamento dos conjuntos de interesse histórico local
.Levantamento e definição à destinação das áreas públicas da Mooca
.Revisão da malha viária e sistema de transporte visando integrar vias estruturais
propostas e sugerir novas vias locais em áreas carentes das mesmas
.Estabelecer priorização em relação às demandas habitacionais mais urgentes,
como favelas, cortiços e habitações precárias
.Propor diretrizes e rever perímetros das Operações Urbanas Celso Garcia e
Diagonal Sul” (PRE Subprefeitura Mooca PMSP/SEMPLA/Polis, Quadro situacional,
2002, s/pág.).
Uso e ocupação do solo
De acordo com as diretrizes do Plano Diretor Estratégico, os instrumentos
urbanísticos incidentes nos distritos compreendidos por este trabalho caracterizam
toda a sua área com coeficiente de aproveitamento passível de atingir o índice
igual a 4, exceção feita aos espaços com a presença de imóveis tombados. Tal
situação é resultante da sobreposição a esse território das Operações Urbanas
Centro, Diagonal Sul, Diagonal Norte e Celso Garcia, além dos eixos de
transportes estruturais, que implicam na delimitação de uma faixa de 300 metros
(por face de quadra) ao longo dos corredores servidos por ferrovia, Metrô e
corredores de ônibus e num raio de 600 metros no entorno das estações desses
modos de transporte.
Com isso, o PRE deve definir as diretrizes para áreas adensáveis e não-adensáveis,
através da utilização de parâmetros sobre a capacidade da infra-estrutura
existente, tal como carregamento do sistema viário e das redes de serviços
públicos. Além disso, o estoque de potencial construtivo
7
para outorga onerosa,
obtido pela diferença entre os coeficientes básico (utilização do c.a.= 2,5) e
máximo (utilização do c.a.=4) mostra que não poderá ser utilizado em sua
totalidade, devido a diversos fatores, tais como a presença de imóveis tombados
e das construções existentes não serem substituídas em sua totalidade por novas
edificações com coeficiente de aproveitamento máximo.
O Plano Regional da Subprefeitura Sé detectou que as áreas com maior estoque
de potencial construtivo se encontram presentes nos locais de usos
454
predominantemente não residenciais, com baixa densidade de moradores. Para
essas áreas foram definidas diretrizes que observam o estímulo aos usos
residenciais, aproveitando-se o estoque do potencial construtivo, principalmente
naquelas quadras com mais de 80% da área construída com usos não residenciais.
Para tanto, os controles de adensamento e de incomodidade deverão se constituir
em parâmetros definidores do desempenho da ocupação (PRE Subprefeitura Sé,
2004, 21).
Habitação social
Para os bairros compreendidos pelos distritos Bom Retiro, Pari e Brás, os Planos
Regionais consideraram as propostas para Habitação Social formuladas pelos
órgãos públicos diretamente relacionados ao problema, delimitando assim as
áreas de ZEIS 3 constantes nessa região. Para se ter uma idéia aproximada da
demanda, tendo como base a ZEIS 3 que compreende o “Perímetro de
Reabilitação Integrada do Habitat-PRIH” no bairro da Luz, foi estabelecido um
índice para calcular o estoque estimado de todas as ZEIS 3 aprovadas na
Subprefeitura Sé. Esse cálculo do estoque de potencial construtivo foi feito a
partir da diferença entre o aproveitamento bruto real e o aproveitamento potencial.
Chegou-se ao valor de 882 568,44 m². Considerando que 50% desse estoque
destina-se à Habitação de Interesse Social – HIS e estimando unidades com 50
m² de área, tem-se uma produção estimada de 8.825,68 unidades. (PRE
Subprefeitura Sé, 2004, 65). Para os distritos do Pari e Brás, tal cálculo não foi
desenvolvido, limitando-se o Plano Regional a delimitar as áreas de incidência
do direito de preempção e das ZEIS.
Diretrizes para a definição das áreas de intervenção urbana
Para o distrito Bom Retiro, que compreende os bairros da Luz, Bom Retiro e Ponte
Pequena, foi proposto um conjunto significativo de intervenções urbanísticas:
. Integração ferroviária das estações Brás, Luz e Barra Funda
. Linha ferroviária entre o Brás e o aeroporto Internacional de Cumbica em
Guarulhos
. Modernização da linha ferroviária entre o Brás e o município de São Caetano
do Sul na região do Grande ABC paulista
. Conjunto de ações previstas no Programa de Reabilitação do Centro envolvendo
intervenções nas áreas dos calçadões, no Parque dom Pedro II, dentre outras
. Conjunto de ações do Programa Morar no Centro envolvendo as definições
para os Perímetros de Reabilitação Integrada do Habitat – PRIH
. Conjunto de ações previstas no projeto Monumenta Luz
Algumas dessas propostas se relacionam ao governo estadual e outras ao governo
municipal e se constituem em intervenções estruturais e pontuais que irão provocar
455
REQUALIFICAÇÃO DOS BAIRROS CENTRAIS
diferentes impactos sobre a realidade da Subprefeitura Sé. Foram propostas
também intervenções complementares nas vias estruturais e eixos que atravessam
e articulam esses perímetros. São elas:
. Rio Tamanduateí – reabilitação urbanística e paisagística ao longo do rio
articulando o parque proposto na ZIR do Cambucí, o equipamento metropolitano
a ser implantado no Parque Dom Pedro II e a Reabilitação da Foz do rio Tamaduateí
. Avenida Tiradentes – reformulação viária buscando a integração do conjunto
arquitetônico no perímetro Monumenta Luz melhorando a oferta de espaços
públicos no local (PRE Subprefeitura Sé, 2004, 89).
Já para os distritos do Brás e do Parí, os seguintes Pólos e Eixos de Centralidade
foram selecionados para serem alvo de projetos urbanísticos visando sua
reestruturação, para os mesmos serão relacionados projetos de desenho urbano
da via e do entorno, melhoria na acessibilidade do pedestre, espaços para carga
e descarga de veículos, programas paisagísticos, etc.: Largo da Concórdia, Largo
Padre Bento e avenida Rangel Pestana. Além dessas indicações, foram
selecionados os seguintes eixos e ruas comerciais a requalificar:
. Rua do Gasômetro
. Ruas de comércio especializado no Brás e Pari: rua Oriente, rua Maria Marcolina,
rua Silva Teles, rua Thiers, avenida Valtier, rua Cavalheiro, rua Almirante Barroso,
rua Firmino Whitacker, rua Monsenhor Andrade e avenida Carlos de Campos
(PRE Subprefeitura Mooca, 2004, 2).
Com relação às Zonas Especiais de Proteção Ambiental e ao Patrimônio Cultural
(ZEPAMs e ZEPECs), no distrito Bom Retiro foram delimitadas as áreas de incidência
do Projeto Monumenta e para o Brás e o Pari foram propostas:
Brás: Estação do Pari, Antigo Lanifício Paulista (rua João Boemer), Gasômetro
da rua da Figueira, ponte metálica da estrada de ferro (altura da rua do
Bucolismo), residências no entorno da Vila Queiroga.
Pari: traçado urbano e casario remanescente do Morro do Pari, edifício industrial
da rua Thiers x rua Hanemamm, Igreja Santo Antônio do Pari, edifício do Liceu
Acadêmico São Paulo, ETE Carlos de Campos.
Os mapas que fizeram parte do Plano Regional das Subprefeituras Sé e Mooca,
apresentados a seguir em uma montagem conjunta, demonstram as situações
descritas em relação ao uso e ocupação do solo propostas:
Mapa Macrozona de Estruturação e Qualificação Urbana
- as cores em tom laranja variam da mais clara à mais escura, representando:
- Zonas de Centralidade Linear e Polar A
- Zonas de Centralidade Linear e Polar B
456
Considerando que toda a área consolidada foi caracterizada como de uso misto,
essa gradação mostra as zonas menos e mais permissivas em relação aos
coeficientes de aproveitamento. De acordo com o exposto anteriormente, são
áreas envoltórias aos eixos de transporte estrutural que poderão chegar até o
coeficiente máximo permitido, de acordo com critérios e parâmetros estabelecidos
para cada caso.
Nas tonalidades cinza as áreas correspondem:
- Cinza claro: zona mista de baixa densidade
- Cinza médio: zona mista de média densidade
- Cinza escuro: Zona mista de alta densidade – A
- Cinza mais escuro: zona mista de alta densidade – B
Essa gradação implica na densidade real existente para cada zona, estando
praticamente todo o Pari na zona de média densidade, com a presença de alta
densidade tipo A no Canindé, nas imediações da av. Cruzeiro do Sul (alta
densidade tipo B só se aplica ao distrito Santa Cecília, com forte presença de
verticalização).
Como é possível observar, comparando-se o mapa mencionado com o que
inclui as Operações Urbanas e as Áreas de Intervenção Urbanas – AIU, todo o
território se encontra sob a incidência de ambos instrumentos, variando no caso,
as diretrizes direcionadas a cada um deles, mas que possibilitam a utilização dos
coeficientes de aproveitamento máximo, de acordo com os critérios para o
adensamento dessas áreas.
Finalmente, deve-se considerar que parte dos projetos propostos para as Áreas
de Intervenção Urbanística já tiveram início, sendo alguns indicados anteriormente,
como foi o caso daqueles implantados no Bom Retiro, no Parí e no Brás. De toda
maneira, o conjunto de instrumentos urbanísticos aqui expostas de maneira
sintética, mostra a possibilidade de ser desencadeado um processo capaz de
articular as transformações mais imediatas e aquelas que demandam um prazo
mais longo para sua efetivação, visando a requalificação física, funcional e
ambiental do território abordado e melhores condições de moradia para os
atuais e para os novos habitantes desses bairros.
457
REQUALIFICAÇÃO DOS BAIRROS CENTRAIS
Fig. 250: Plano Regional Estratégico: Macrozona de Estruturação e Qualificação Urbana, bairros centrais, mapa 1, 2004.
.
458
Fig. 251: Plano Regional Estratégico: Macrozona de Estruturação e Qualificação Urbana, bairros centrais, mapa 2, 2004.
459
REQUALIFICAÇÃO DOS BAIRROS CENTRAIS
Notas:
1
Subprefeitura Sé/Procentro: arq. Alonso Lopes e equipe.
2
Sub-prefeitura Sé/Procentro: arq. Decio Amadio e equipe.
3
Ação Direta– Assessoria para Habitação.
4
PDE: Lei Municipal n° 13.430, de 13 de setembro de 2002.
5
Vila Maria, Vila Leopoldina-Jagaré, Vila Sônia, Diagonal Norte, Diagonal Sul, Celso Garcia,
Rio Verde-Jacu, Santo Amaro, Tiquatira e Capela do Socorro.
6
Estatuto da Cidade: Lei Federal n° 10.257 de 10 de julho de 2001.
7
O estoque do potencial construtivo levou em conta os coeficientes de aproveitamento bruto das
quadras fiscais.
460
461
CONSIDERAÇÕES FINAIS
CC
CC
C
APÍTULAPÍTUL
APÍTULAPÍTUL
APÍTUL
OO
OO
O
10: 10:
10: 10:
10:
CC
CC
C
ONSIDERAÇÕESONSIDERAÇÕES
ONSIDERAÇÕESONSIDERAÇÕES
ONSIDERAÇÕES
F F
F F
F
INAISINAIS
INAISINAIS
INAIS
..
..
.
462
463
CONSIDERAÇÕES FINAIS
10. Considerações finais10. Considerações finais
10. Considerações finais10. Considerações finais
10. Considerações finais
II
II
I - No primeiro período abordado por este trabalho, que abrangeu das décadas
finais do século XIX às três primeiras do século XX, a estruturação dos bairros no
entorno do Centro já havia ocorrido de forma quase que completa, uma vez que
as principais tendências espaciais já tinham sido definidas. Como indicaram os
mapas de 1930, apenas a Várzea do Tietê não fora ocupada, pois o rio ainda
não se encontrava canalizado. Na década de 1950, o levantamento
aerofotogramétrico Vasp, mostra que parte dessa área já recebera urbanização,
mostrando-se consolidada na década seguinte.
Como foi observado nas considerações da Parte I deste trabalho, a área
compreendida pelos bairros do Bom Retiro, Brás e Parí se diferenciou morfológica
e funcionalmente dos demais bairros centrais, pelos processos que aqui se
procurou aprofundar, implicando em um quadro que provocou a ociosidade
para fins habitacionais e deterioração ambiental e paisagística de consideráveis
parcelas dos referidos bairros.
Não caberia repetir as considerações anteriores para caracterizar essa dinâmica,
mas sim apontar as diferentes atuações urbanísticas verificadas entre os bairros
ao sudoeste e aqueles aqui focalizados, processo este que se implantou já nas
primeiras décadas do século XX, mas se aprofundou a partir de 1950, com a
setorização cada vez mais pronunciada que a verticalização habitacional e dos
serviços desencadeou nos espaços vizinhos do Centro Novo em direção à avenida
Paulista.
Sinteticamente, tal processo se deveu:
1. Primeiramente as concessões às companhias de serviços públicos, que atuaram
de forma monopolista nas quatro primeiras décadas do século XX, onde a infra-
estrutura instalada se constituiu num importante fator de valorização do solo,
provocando com isso uma crescente diferenciação funcional e espacial entre os
bairros anexos ao centro.
2. Incapacidade de efetiva regulamentação e gestão urbanística em relação aos
diversos agentes do setor imobiliário, que tiveram seu campo de ação livre para
a definição dos espaços da elite e para a produção da cidade irregular.
3. Implantação de um pré-zoneamento que incidiu no Centro e nos bairros
aristocráticos a oeste e sudoeste, com a incorporação das normas ditadas pelos
loteadores para o tamanho dos lotes, os índices de ocupação e os padrões
construtivos. Como foi visto, contribuiu para a consagração dessa setorização a
acessibilidade criada pelas avenidas do Plano de Prestes Maia, que alterou os
valores do solo urbano nos diferentes bairros centrais. Nesse sentido, as
ampliações das avenidas Nove de Julho e Consolação foram fator necessário,
mas não suficiente para o crescimento vertical nos moldes que ocorreu nos
464
bairros de renda mais alta, já que as condições de segregação já haviam sido
postas anteriormente. Prova disso é o fato de terem ocorrido outras ampliações,
como no caso da avenida Tiradentes, e o mesmo processo não ter ocorrido.
4. Os padrões urbanísticos resultantes da utilização e ocupação do solo nos
bairros analisados neste trabalho foram fatores preponderantes para que essas
áreas continuassem a se constituir em uma reserva de solo mais barato, atraindo
além de indústrias, o uso comercial e ocupação horizontalizada, com a presença
de habitações coletivas e cortiços.
5. Segundo essas condicionantes, a compartimentação resultou em um processo
diferenciado para os espaços de moradia e vida da população: uma renovação
constante nos bairros conectados ao Centro Novo e a consolidação de condições
urbanas que passaram a não propiciar a permanência dos moradores dos bairros
do Brás, Bom Retiro e Parí. Isso ocorreu, entre outros fatores, pela disputa nesses
bairros entre a função comercial e a residencial, que provocou além do gradual
esvaziamento populacional, verificável já nas décadas de 1960 e 1970, o
desinteresse do setor imobiliário em novas construções, realimentando o círculo
de desvalorização dessas localizações.
Observadas as características topológicas do território analisado, depreende-se
que em seu interior a diferenciação de áreas, de padrões construtivos e de
conservação, constituem uma marca da morfologia urbana ali existente. Em
primeiro lugar, as terras baixas e os setores próximos às aglomerações fabris ou
instalações ferroviárias receberam as ocupações populares, ainda existindo uma
considerável parcela das construções remanescentes do início do século passado,
geralmente bastante deterioradas. Em segundo lugar, as diversas atividades
comerciais contribuem para o rebaixamento da paisagem urbana às funções
utilitárias, não só pelo excesso visual de anúncios e outros elementos, mas também
pela descaracterização das tipologias, que passam por um processo de
transformação para serem adaptadas às atividades do comércio. Mesmo
referências que haviam sido indicadas para proteção no recente processo dos
Planos Regionais Estratégicos, foram demolidas parcial ou totalmente.
Levando-se em conta essas observações, quando o tema deste trabalho foi
definido, relacionando-o ao desenho urbano dos bairros centrais, o desafio de
seu desenvolvimento foi aprofundar os fatores que estruturaram essas
configurações, particularmente do Bom Retiro, Brás e Pari, procedendo ao
cotejamento com as hipóteses formuladas. Como a estruturação da cidade
privilegiou a localização de determinados atores em detrimento de outros, torna-
se importante associar a afirmação de Villaça, que analisou ser a localização
dos bairros de classe média, seu comércio e serviços, determinada pela interação
dos fatores de acessibilidade, proximidade com local de trabalho, etc, que
minimizam os deslocamentos. À medida que essas áreas se definem, crescem
465
CONSIDERAÇÕES FINAIS
progressivamente as exigências por padrões ambientais e de vizinhança requeridos
por essa classe (1978, 22). Segundo o mesmo autor, a localização dos
melhoramentos em uma região, e não em outra, se torna vital para o estudo do
arranjo territorial decorrente (1998, 138).
Para compreender o processo de estruturação da configuração dos espaços
pesquisados, foi também fundamental associar a formulação do prof. Milton
Santos sobre a relação região e lugar, uma vez que os bairros pesquisados
consistiram no recorte urbano de um todo: “a região e o lugar não tem existência
própria. A região e o lugar, aliás, definem-se como funcionalização do mundo e
é por eles que o mundo é percebido empiricamente...a cada momento histórico
os recursos como o capital, a população, a força de trabalho, o excedente, são
distribuídos de diferentes maneiras e
localmente combinadoslocalmente combinados
localmente combinadoslocalmente combinados
localmente combinados, o que acarreta
uma diferenciação no interior do espaço total e confere a cada região ou lugar a
sua especificidade e definição particular (1995,131, grifo nosso). Nesse sentido,
essas formulações também podem ser relacionadas ao objetivo-problema desta
tese, que foi o de identificar nas categorias propostas por Solà-Morales
“urbanização, parcelamento e edificação” e suas combinações, a matriz da
configuração espacial do território analisado.
Conforme mostraram as análises desenvolvidas neste trabalho, essas categorias
devem ser entendidas dentro da formulação de Lefebvre para a caracterização
do fenômeno urbano, que é composta de duas estruturas que atuam em
simultaneidade: a
morfológicamorfológica
morfológicamorfológica
morfológica e a
sociológicasociológica
sociológicasociológica
sociológica (Lefebvre, 2004, 109). Por isso,
estabelecendo um paralelo com Lefebvre e citando mais uma vez o prof. Milton
Santos para elucidar as condicionantes da diferenciação morfológica: “lugar é o
objeto ou conjunto de objetos. A localização é um feixe de forças sociais se
exercendo em um lugar(Santos,1997, 2).
IIII
IIII
II - Entre o início da elaboração do trabalho, no ano 2000 e sua conclusão, foi
possível acompanhar o desenvolvimento dos diversos planos e projetos propostos
para o território enfocado. Nesse sentido, pode-se afirmar que tal dinâmica
alicerçou as duas justificativas expostas no início da tese, relativas à:
- A inadequação urbanística de serem mantidas áreas sub-aproveitadas nos
bairros centrais, tanto pelos custos impostos à cidade, como também pelas
conseqüências físicas, ambientais e paisagísticas que um vasto setor urbano, em
condições de visível precariedade, à ela impõe.
- A existência nesses espaços, de uma base territorial com disponibilidade de
áreas livres e baixa densidade populacional, que pode suportar um aumento do
número de moradores, aliado a ações revitalizadoras do ambiente urbano, quer
no sentido das suas funções, quer na sua paisagem.
466
A imobilidade que atualmente se verifica para o mercado imobiliário de classe
média, poderá ser alterado com o emprego dos instrumentos do Plano Diretor
Estratégico, das Operações Urbanas propostas para a área e dos Planos
Regionais, que estabelecem os critérios para o adensamento das mesmas. Nos
parece que a principal estratégia para esses bairros seria a de combinar duas
frentes de atuação urbanística, a saber:
1. O aumento de densidade através do incentivo à moradia de faixas de renda
diversificadas, o que poderá ser garantido pela existência das ZEIS 3 que
possibilitam a construção de habitação social nas áreas delimitadas pelos
perímetros dos PRIHs e nos demais espaços definidos como tal. Esse instrumento
possibilita o acesso à moradia popular nas áreas centrais, que de outra forma
seria inviabilizada pelo aumento do preço do solo urbano, decorrente da atuação
do mercado imobiliário formal.
Por outro lado, atualmente assiste-se uma produção residual de novas unidades
para classe média nesses bairros, em relação a outros quadrantes dos bairros
centrais e do centro expandido. Essa atuação, que ocorre de forma esporádica
em algumas áreas, como a do Canindé, poderá ser dinamizada através dos
instrumentos que prevêem maiores coeficientes para as áreas dotadas de requisitos
urbanísticos para tal: infra-estrutura e transporte de massa. Entretanto, embora
seja desejável esse aumento da densidade habitacional através de novas
construções, é necessário que o mesmo ocorra dentro de parâmetros que
conduzam a uma interação com a morfologia existente, e não sua destruição, e
para isso, os instrumentos também previstos nos Planos Diretor e Regionais
Estratégicos deverão ser aplicados quando necessário, tais como as ZEPECs,
que contemplam as áreas de proteção histórica e cultural.
2. A implantação de novos padrões físico-ambientais, através de propostas de
desenho urbano que articulem desde grandes espaços vazios ou sub-utilizados,
como as áreas lindeiras às ferrovias, pátios ferroviários e áreas municipais ociosas
às atuações relacionadas à melhoria da qualidade local sob o ponto de vista de
sua configuração e ambiente. Exemplos dessa potencialidade se encontram em
espaços dos três distritos enfocados:
Bom Retiro: onde os próprios públicos da Subprefeitura Sé e da Limpurb (usina
de transbordo de lixo) poderiam ser reconvertidos para funções que abrigassem
moradia e ao mesmo tempo, reintegrassem a margem esquerda do Tamanduateí
ao bairro, que atualmente já conta com o Parque do Gato na foz daquele rio.
Como essa área historicamente se mostrou desabitada e atualmente parte das
instalações estão ociosas e apresentam também inconveniência ambiental, um
plano seria necessário para assegurar novos padrões de desenho urbano para o
local.
467
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Pari: novos projetos para a revalorização do bairro poderão se integrar a outros
recentemente construídos, como o do conjunto habitacional da rua Olarias, não
apenas para habitação, mas como complemento à habitabilidade local,
promovendo a melhoria dos seus padrões urbanísticos. Nesse caso se incluem
as áreas entre as ruas da Piscina e Araguaia, que já dispõe de equipamentos
públicos de educação e de esportes, e que integrados aos terrenos municipais
atualmente desocupados, e portanto merecedores de novas destinações, poderão
configurar um setor importante para a vida da sua população moradora.
Brás: o adensamento populacional que irá ocorrer nas proximidades da Praça
Benemérito José Brás (Estação Brás do Metrô), fruto da construção de conjuntos
habitacionais, faz com que esse espaço, que ainda se configura como um grande
vazio, mereça tratamento paisagístico condigno, integrando-o à rua Piratininga,
à Rangel Pestana e rua do Gasômetro, de maneira a lograr não apenas a
valorização local, mas contribuindo também para a do Brás, o bairro que é a
mais importante testemunha das transformações urbanas da cidade de São Paulo
em mais de um século de história.
468
469
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GENS
fig 01-PMSP/SMC; fig 02 e 03–Massarani/Dellelis, 1999; fig 04 e 05-Gerodetti/Cornejo,
1999; fig 06-Ed. Melhoramentos, 1953; fig 07-Lemos, 1993; fig 08-Ford do Brasil; fig
09- autor; fig 10-Gerodetti/Cornejo, 1999; fig 11 e 12-Segawa, 2000; fig 13, 14, 15,
16- PMSP/SMT; fig 17-PMSP/SMC/DPH; fig 18-Sabesp, 2000; fig 19 e 20-autor; fig
21 <
www.wernervana.hpg.com.br>; fig 22-Ed. Melhoramentos, 1953; fig-22- PMSP/
SMC/DPH; fig 24, 25, 26-autor; fig 27 e 28-Segawa, 2000; fig 29-autor; fig 30-
Toledo, 1996; fig 31- PMSP/Procentro, 2000; fig 32-autor; fig 33 e 34-Bonduki, 1998;
fig 35 a 42-autor; fig 43-Toledo, 1996; fig 44 e 45-autor; fig 46,47, 48-Howard,
2002; fig 49-Toledo, 1996; fig 50 a 53-Cia City, 1980; fig 54-PMSP/SMC/DPH; fig
55-Ed. Melhoramentos, 1953; fig 56-Bonduki, 1998; fig 57 e 58-autor; fig 59-Bonduki;
fig 60-PMSP; fig 61-Bonduki; fig 62 e 63-autor; fig 64-PMSP/SMC/DPH; fig 65-Toledo,
1996; fig 66-Somekh/Campos, 2002; fig 67-Metrô; fig 68-Cogep, 1980; fig 69-
Someck/Campos, 2002; fig 70-Azevedo, 1958; fig 71 e 72-Condomínio Cj. Nacional;
fig 73-Quatro rodas especial n° 4; fig 74 e 75-PUB, 1968; fig 76-Gegran 1972; fig
77-Gerodetti/Cornejo, 1999; fig 78-Portela, 2004; fig 79-Arq. Folha de São Paulo; fig
80-Ed. Melhoramentos, 1953; fig 81,82,83-Gerodetti/Cornejo, 1999; fig 84-Ed.
Melhoramentos, 1953; fig 85-Metromix, 2003; fig 86-PMSP/SMC/DPH; fig 87-Arq.
Folha de São Paulo; fig 88-autor; fig 89 e 90-PMSP/SMC/DPH; fig 91e 92-Ed.
Melhoramentos, 1953; fig 93-Portela, 2004; fig 94-Arq. Folha de São Paulo; fig 95 e
96-autor; fig 97-PUB, 1968; fig 98 e 99-Vespoli, 2004; fig 100 e 101-SEMPLA/Emplasa,
2000; fig 102 FSP 20/2/02; fig 103-folder FGF/KRUT; fig 104 e 105-SEMPLA/Emplasa,
2000; fig 106-Studio Stajano, 2000; fig 107-PMSP/SEMPLA/EMURB, 2004; fig 108-
FSP 08/3/98; fig 109-folder PMSP/SEMPLA/EMURB, 2004; fig 110-PMSP/EMURB,
1995; fig 111 e 112-autor; fig 113-folder EMURB, 2002; fig 114 E 155-autor; fig 116
e 117-FSP, 2001; fig 118, 119, 120-FSP, 2002; fig 121-autor; fig 122-folder EMURB,
2002; fig 123 e 124-autor; fig 125 e 126-PMSP/SEMPLA/EMURB, 2002; fig 127-
autor; fig 128-EMURB, 2004; fig 129-autor; fig 130 e 131-Portela, 2004; fig 132-
autor; 133-Postcard, 2001; 134-SARA-Brasil, 1930; fig
135<www.wernervana.hpg.com.br>; fig 136-autor; fig 137 e 138-Cerqueira Cesar
(org), 1975; fig 138<www.wernervana.hpg.com.br>; fig 140 e 141-autor; fig
142<www.boniconsilii.com.br
>; fig 143, 144, 145-autor; fig 146-Gerodetti/Cornejo,
1999; fig 147-PMSP/SMC/DPH; fig 148-Arq. Folha de São Paulo; fig 149 e 150-
autor; fig 151-Arq. Folha de São Paulo; fig 152 e 153-autor; fig 154-mapas SARA-
Brasil e VASP; fig 155 a 170-autor; fig 171-PMSP/SMC/DPH; fig 172 a 176-autor; fig
177-eq. Melissa, 1999; fig 178 e 179-PMSP/METRÔ, 1979; fig 180 a 184-autor; fig
185-PMSP/SMC/DPH; fig 186 a 190-autor; fig 191-PMSP/SMC/DPH; fig 191-Arq.
483
Folha de São Paulo; fig 193 a 200-autor; fig 201-Arq. Folha de São Paulo; fig 202 e
203-autor; fig 204-FSP, 2001; fig 205 e 206-autor; fig 207-mapas 1915 e SARA-
Brasil; fig 208 a 217-autor; fig 218-PMSP/SMC/DPH; fig 219-mapas 1915 e SARA-
Brasil; fig 220, 221 e 222-autor; fig 223 Arq. Folha de São Paulo; fig 224-Ed.
Melhoramentos, 1953; fig 225-autor; 226 a 229-Niemeyer, 1986; fig 230-
Superinteressante, 2000; fig 231-montagem a partir de FSP 17/10/99,; fig 232-JT,
29/5/2000; fig 233-PMSP/Adm.Regional da Sé/Procentro; fig 234 e 235- PMSP/
Subprefeitura Sé; fig 236- PMSP/SEHAB; fig 237 e 238- Vespoli; fig 239 e 240- PMSP/
SEHAB; fig 241 e 242-autor; fig 243-PAC-CDHU; fig 244 a 246-autor; fig 247 e 248-
PMSP/SEMPLA; fig 249-autor; fig 250 e 251-PMSP/SEMPLA.
MAPMAP
MAPMAP
MAP
ASAS
ASAS
AS
mp 01- Toledo, 1996; mp 02, 03, 04, 05-FAUUSP; mp 06, 07, 08-Rolnick, 1997; mp
09 Ligação/Sabesp, 2000; mp 10, 11, 12, 13-Rolnick; mp 14 e 15-FAUUSP; mp 16-
SARA-Brasil
CRÉDITCRÉDIT
CRÉDITCRÉDIT
CRÉDIT
OSOS
OSOS
OS
Tratamento gráfico dos mapas e editoração: arq. Alfredo Francelino Faljana
Mapas temáticos – soc. Tereza Cristina Vespoli
São Paulo, novembro de 2004
Livros Grátis
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