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FUNDAÇÃO EDSON QUEIROZ
UNIVERSIDADE DE FORTALEZA - UNIFOR
CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS - CCJ
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO CONSTITUCIONAL
DEMOCRACIA NO PODER JUDICIÁRIO: FICÇÃO OU REALIDADE?
João Everardo Matos Biermann
Fortaleza CE
Agosto, 2009
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JOÃO EVERARDO MATOS BIERMANN
DEMOCRACIA NO PODER JUDICIÁRIO: FICÇÃO OU REALIDADE?
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Direito como requisito parcial
para a obtenção do Título de Mestre em
Direito Constitucional, sob a orientação do
Prof. Dr. José Filomeno de Moraes Filho.
Fortaleza Ceará
2009
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B588d Biermann, João Everardo Matos.
Democracia no Poder Judiciário : ficção ou realidade? /
João Everardo Matos Biermann. - 2009.
280 f.
Dissertação (mestrado) Universidade de Fortaleza, 2009.
Orientação: Prof. Dr. José Filomeno de Moraes Filho.
1. Poder Judiciário. 2. Democracia. 3. Magistratura.
4 Jurisdição. I. Título.
CDU 342.56
3
JOÃO EVERARDO MATOS BIERMANN
DEMOCRACIA NO PODER JUDICIÁRIO: FICÇÃO OU REALIDADE?
BANCA EXAMINADORA
___________________________________________
Prof. Dr. José Filomeno de Moraes Filho
Universidade de Fortaleza - UNIFOR
___________________________________________
Prof. Dr. Newton de Menezes Albuquerque
Universidade de Fortaleza - UNIFOR
__________________________________________
Prof. Dr. João Luiz Nogueira Matias
Universidade Federal do Ceará - UFC
Dissertação aprovada em: _____/______/________
Às gerações passadas, pela pertinácia de seus
ideais;
Às gerações atuais, para que entendam que
nada é perfeito e pleno;
Às gerações futuras, para que respeitem os
antepassados e acreditem que não há certezas
absolutas que não possam ser superadas;
Aos magistrados, promotores, advogados,
procuradores, defensores, professores, agentes
da segurança, servidores públicos, acadêmicos
e ao povo, na sua mais ampla dimensão, para
que entendam que a Magistratura é apenas um
meio mediante o qual se procura realizar
Justiça, e para o que é imprescindível a
participação coletiva;
Às minhas filhas (Lara, Lais e Carolina), com
amor incondicional, para que multipliquem a
bondade, a harmonia, a sabedoria, a tolerância,
a compaixão e estendam a solidariedade até o
limite de suas forças;
À minha esposa Lise Anne, por seu amor,
companheirismo e comunhão.
Aos meus pais Hans e Angélica, por suas
parcelas de contribuição para a minha
existência;
Aos meus irmãos, parentes e amigos, por
acrescerem algo mais à minha vida;
À humanidade, para que compreenda que
somos apenas pequeníssima parte do todo, que
deve ser respeitado, preservado e
compreendido.
AGRADECIMENTOS
Aos mestres com os quais privei de seus conhecimentos.
Ao meu orientador, o Professor José Filomeno de Moraes Filho, pela aceitação do
encargo, por sua paciência e pelo engrandecimento que, penso, imprimiu a este trabalho, com
suas ponderações e observações.
Aos servidores do Curso de Mestrado em Direito Constitucional da Universidade de
Fortaleza (UNIFOR), pela dedicação em suas atividades, com resultados para todos os
mestrandos.
À Universidade de Fortaleza (UNIFOR), pela disponibilização de sua estrutura
organizacional e a seriedade com a qual conduz os seus serviços educacionais, acreditando e
investindo na Educação, como forma de contribuir para a superação das desigualdades
regionais e a construção de uma sociedade mais harmônica e justa.
Provar que tenho razão significaria
reconhecer que posso estar errado.
P.A. Beaumarchais
(Comediógrafo francês, 1732-1799)
As bodas de Fígaro, I, 1.
Quem pode duvidar de viver, de lembrar, de
compreender, de querer, de saber, de julgar?
Mesmo se duvida, vive; se duvida, lembra de
onde nasce sua dúvida; se duvida, quer chegar
à certeza; se duvida, pensa; se duvida, sabe
que não sabe; se duvida, julga não dever
concordar irrefletidamente. Portanto, quem
duvida de outras coisas não deve, porém
duvidar destas, pois, se não existissem, não
poderia mais duvidar de nada.
Santo Agostinho (354-430)
A Trindade, X, 10, 14.
RESUMO
A ruptura do monopólio estatal da Jurisdição, com ampliação para a atuação de
outros agentes, afora os membros do Poder Judiciário, com competência para
algumas matérias ou compartilhada com a estrutura jurisdicional tradicional, é uma
das temáticas abordadas neste trabalho, que apresenta exemplos dessa prática em
prestações jurisdicionais atuais e propõe a inserção de outras experiências. A
democratização interna nos órgãos do Poder Judiciário, quer na sua estrutura
administrativo-financeira (autogoverno), quer no processo de recrutamento de
magistrados, no Primeiro e Segundo Graus de Jurisdição, e na busca gradativa de
regras uniformes para o equilíbrio das condições de exercício da função
jurisdicional, é outro tema abordado, por extensão. Como fio condutor dessas
ideias, subjaz a adequação do conceito de Democracia Participativa aplicado ao
Poder Judiciário, para justificar o princípio encartado no Art. 1º, parágrafo único,
da Constituição Federal brasileira de 1988, de que Todo o poder emana do povo,
que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos da
Constituição Federal. A participação ativa da sociedade civil, por meio de grupos
organizados, é, nesta dissertação, um dos mecanismos para se alcançar a
descentralização do Poder no Judiciário e promover, em sua estrutura, a inserção do
elemento político da cidadania, justificando e legitimando, materialmente, o Poder
Judiciário.
Palavras-chave: Poder Judiciário. Democracia Participativa. Recrutamento de
Magistrados. Jurisdição. Sociedade Civil.
ABSTRACT
The end of the state monopoly over jurisdiction, with the extension to the
performance of other agents, excluding the members of the Judiciary Power with
competence for some matters or shared with traditional jurisdictional structure in
one of the topics discussed in this work, which presents exemples of that practice in
current jurisdictional renderings and proposes to insert other experiences. The
internal democratization in the Judiciary Power bodies, whether in their
administrative-financial structure (selfgovernment) or in the process of recruiting
magistrates in the first and second degree of jurisdiction, and in the gradual search
for uniform rules for the balancing of conditions for the exercise of the practice of
jurisdictional function is another topic discussed by extension. As a guiding thread
of such ideas underlies the adequacy of the concept of participatory democracy
applied to the Judiciary Power in order to justify the principle inserted in Article 1,
unique paragraph of the Federal Brazilian Constituition of 1988, according to
which Every power emanates from the people, who exercise it by means of
representatives elected or directly within the terms of the Federal Constitution.
The active participation of civil society through organized groups in this
dissertation is one of the mechanisms to obtain decentralization of the Judiciary
Power and promote in its structure the insertion of the political element of
citizenship, by materially justifying and legitimating the Judiciary Power.
Key words: Judiciary Power. Participatory Democracy. Recruitment of Magistrates.
Jurisdiction. Civil Societ.
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 Diferenças entre justiça restaurativa e justiça retributiva .....................................141
Quadro 2 Dados de mandatos nas Cortes Constitucionais....................................................171
Quadro 3 Experiência de mandatos nas cúpulas judiciárias .................................................171
Quadro 4 Critérios de idades mínima e máxima para ingressar nos tribunais e no Conselho
Nacional de Justiça................................................................................................187
Quadro 5 Dados dos limites de idade nas Cortes Constitucionais........................................189
Quadro 6 Dados dos Ministros do Supremo Tribunal Federal .............................................190
Quadro 7 Dados dos Ministros do Superior Tribunal de Justiça ..........................................191
Quadro 8 Dados dos Ministros do Tribunal Superior do Trabalho.......................................192
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 Dados estasticos do PIB, população e quantidade de desembargadores estaduais, por
região......................................................................................................................219
Tabela 2 Participação regional no PIB nacional – ano base 2006........................................220
Tabela 3 Quantidade de desembargadores estaduais por região, com percentuais Posição em
20.11.2008..............................................................................................................221
Tabela 4 População por região, com percentuais.................................................................222
Tabela 5 População por desembargador estadual ................................................................223
Tabela 6 Magistrados da Justiça Estadual, por 100.000 habitantes.....................................224
Tabela 7 Magistrados estaduais por cada 100.000 habitantes, por região...........................226
Tabela 8 Magistrados da Justiça do Trabalho, por cada 100.000 habitantes.......................228
Tabela 9 Magistrados da Justiça do Trabalho, a cada 100.000 habitantes 2004/2007 (cargos
providos) ...............................................................................................................230
Tabela 10 Magistrados da Justiça do Trabalho, a cada 100.000 habitantes 2004/2007 (cargos
existentes)..............................................................................................................232
Tabela 11 Varas do Trabalho – situação em agosto de 2008.................................................234
Tabela 12 Despesa total da Justiça do Trabalho, por habitante 2004/2007...........................235
Tabela 13 Magistrados da Justiça Federal, por 100.000 habitantes.......................................239
Tabela 14 Número de habitantes por Juiz Federal do Primeiro Grau posição em 30.03.2008.....241
Tabela 15 Justiça Federal de Primeiro Grau - Juízes(as) Federais e Substitutos(as) ............242
Tabela 16 Justiça Federal de Primeiro Grau – Quadro consolidado de Juízes(as) Federais e
Substitutos(as).......................................................................................................244
Tabela 17 Justa Federal de Primeiro Grau Varas Federais e Juizados Especiais Federais. ..245
Tabela 18 Justiça Federal de Segundo Grau – Quadro de desembargadores ........................255
Tabela 19 Despesa total da Justiça Federal, por habitante.....................................................255
Tabela 20 Processos distribuídos e julgados no Superior Tribunal de Justiça, no período de
7.4.1989 a 31.12.2008...........................................................................................257
Tabela 21 Movimento processual no Supremo Tribunal Federal, nos anos de 1940 a 2008 .....259
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1 Participação regional no PIB nacional – ano base 2006. ......................................220
Gráfico 2 Quantidade de desembargadores estaduais, por região, com percentuais
Posição em 20.11.2008........................................................................................221
Gráfico 3 População por região, com percentuais.................................................................222
Gráfico 4 População por desembargador estadual ................................................................223
Gráfico 5 Magistrados da Justiça Estadual, por 100.000 habitantes.....................................225
Gráfico 6 Magistrados estaduais por região, com percentuais..............................................226
Gráfico 7 Magistrados da Justiça do Trabalho, por cada 100.000 habitantes.......................229
Gráfico 8 Magistrados da Justiça do Trabalho, a cada 100.000 habitantes 2004/2007 (cargos providos)......231
Gráfico 9 Magistrados da Justiça do Trabalho, a cada 100.000 habitantes (cargos existentes) ......233
Gráfico 10 Despesa total da Justiça do Trabalho, por habitante 2004/2007..........................236
Gráfico 11 Despesa total da Justiça do Trabalho, por habitante ............................................237
Gráfico 12 Magistrados da Justiça Federal, por 100.000 habitantes......................................240
Gráfico 13 Despesa total da Justiça Federal, por habitante....................................................256
Gráfico 14 Processos distribuídos, julgados e acórdãos publicados no Superior Tribunal de Justiça.......259
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ADCT - Ato das Disposições Constitucionais Transitórias
ADI - Ação Direta de Inconstitucionalidade
AJD - Associação dos Juízes para a Democracia
AMB - Associação dos Magistrados Brasileiros
APAE - Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais
CADE - Conselho Administrativo de Defesa Econômica
CLT - Consolidação das Leis do Trabalho
CNJ - Conselho Nacional de Justiça
DECON - Defesa do Consumidor
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
LOMAN - Lei Orgânica da Magistratura Nacional
MDJ - Maisons de Justice e Droit
OAB - Ordem dos Advogados do Brasil
ONG - Organização Não Governamental
ONU - Organização das Nações Unidas
PCA - Procedimento de Controle Administrativo
PEC - Proposta de Emenda Constitucional
PIB - Produto Interno Bruto
PROCON - Programa de Orientação e Proteção ao Consumidor
STF - Supremo Tribunal Federal
STJ - Superior Tribunal de Justiça
STM - Superior Tribunal Militar
TAC - Termo de Ajustamento de Conduta
TJE - Tribunal de Justiça Estadual
TRF - Tribunal Regional Federal
TRT - Tribunal Regional do Trabalho
TSE - Tribunal Superior Eleitoral
TST - Tribunal Superior do Trabalho
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO........................................................................................................................15
1 A TRANSÃO DA DEMOCRACIA REPRESENTATIVA E INDIRETA PARA A
DEMOCRACIA DIRETA E PARTICIPATIVA: A REPERCUSSÃO NO PODER
JUDICIÁRIO.......................................................................................................................19
2 CONCEITUAÇÃO PRÉVIA DE INSTITUTOS, PRINCÍPIOS E GARANTIAS: A
CONSTRUÇÃO DA PROBLETICA DEMOCRÁTICA NO PODER JUDICIÁRIO ....38
2.1 Jurisdição .....................................................................................................................38
2.2 Independência do Judiciário.........................................................................................42
2.3 Independência do juiz ..................................................................................................44
2.4 Imparcialidade do juiz..................................................................................................51
2.5 Neutralidade do juiz.....................................................................................................55
2.6 A legitimidade do Poder Judiciário..............................................................................58
3 MODELOS DE SELEÇÃO DOS JZES NO BRASIL E NO DIREITO COMPARADO :
MÚLTIPLOS SISTEMAS...................................................................................................74
3.1 Brasil ............................................................................................................................76
3.2 Alemanha .....................................................................................................................79
3.3 Espanha ........................................................................................................................80
3.4 Estados Unidos.............................................................................................................81
3.5 França...........................................................................................................................82
3.6 Inglaterra ......................................................................................................................83
3.7 Itália .............................................................................................................................85
3.8 Portugal ........................................................................................................................85
3.9 Suíça.............................................................................................................................86
3.10 Japão............................................................................................................................86
14
4 DEMOCRACIA E PROJEÇÃO DA SOBERANIA POPULAR NO PODER JUDICIÁRIO E
NA DEFESA DA ORDEM JURÍDICA: POSSIBILIDADES, ENTRAVES, SUGESTÕES.....87
4.1 Aberturas para a legitimação e a democratização externas da função judiciária e no
Poder Judiciário................................................................................. 88
4.1.1 Justiça Arbitral .......................................................................... 88
4.1.2 Tribunal do Júri ......................................................................... 91
4.1.3 Juizados Especiais ...................................................................... 95
4.1.4 Justiça de Paz ............................................................................ 99
4.1.5 Autotutela .............................................................................. 104
4.1.6 Composição paritária nos órgãos decisórios da Justiça do Trabalho .......... 106
4.1.7 Justiça Eleitoral........................................................................ 110
4.1.8 Quinto constitucional................................................................. 114
4.1.9 Critério federativo na composição dos tribunais ................................. 119
4.1.10 Ministério Público .................................................................. 124
4.1.11 Acessibilidade ao Judiciário ....................................................... 126
4.1.12 Insncias extrajudiciais ou diferenciadas para a resolução de conflitos: a
desjudicialização.................................................................... 135
4.2 Aberturas para a legitimação e a democratização internas no Poder Judiciário ........145
4.2.1 Mitigação das garantias constitucionais: vitaliciedade, inamovibilidade e
irredutibilidade de subsídios ....................................................... 145
4.2.2 Subsídio dos magistrados ............................................................ 150
4.2.3 Eleições internas no Poder Judiciário .............................................. 153
4.2.3.1 Composição dos órgãos diretivos dos tribunais .............................154
4.2.3.2 Composição do órgão especial dos Tribunais de Justiça................156
4.2.3.3 Participação de juízes nos Conselhos da Magistratura...................156
4.2.3.4 Coordenação das Escolas da Magistratura .....................................157
4.2.3.5 Comissões internas setoriais nos tribunais .....................................158
4.2.3.6 Composição das bancas examinadoras em concursos públicos para
servidores do Poder Judiciário e juízes...........................................158
15
4.2.3.7 Seleção de magistrados para cursos de pós-graduão e congressos ...159
4.2.4 Escolha dos membros do Supremo Tribunal Federal e dos Tribunais Superiores .. 160
4.2.5 Mandatos para os membros dos tribunais ......................................... 169
4.2.6 Idades mínima e máxima de acesso ou nomeação para os tribunais........... 174
4.2.7 Idade para aposentadoria compulsória dos magistrados......................... 188
4.2.8 Promoção de magistrados por merecimento: critérios........................... 192
4.2.9 Democratizão do Conselho Nacional de Justiça e criação de Ouvidorias
estaduais e distrital.................................................................... 197
4.2.10 Distribuição equitativa de servidores e cargos comissionados nas unidades
judiciárias ............................................................................ 202
4.2.11 Permuta interestadual entre juízes ................................................ 203
4.2.12 Publicização de decies, ardãos e despachos: a comunicação eletrônica... 211
4.2.13 Ampliação e descentralização do acervo bibliográfico dos tribunais: uma
proposta cooperativa................................................................ 214
4.2.14 Distribuição equitativa de juízes, desembargadores e ministros nos órgãos
judiciários: critérios e tabelas...................................................... 215
4.2.15 Formação demaras de interlocução pré-judicial com os diversos setores
sociais e a participação do cidadão magistrado nas instituições sociais,
filantrópicas e agrupamentos coletivos .......................................... 261
4.2.16 Orçamento participativo ........................................................... 264
CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................................267
REFERÊNCIAS .....................................................................................................................270
INTRODUÇÃO
O parágrafo único do Art. da Constituição Federal brasileira de 1988 prevê: “Todo o
poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos
termos desta Constituição”.
No Art. 2º, a Carta Federal elenca como “Poderes da União, independentes e
harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”. Logo, a premissa inicial é a de
que o poder do povo, quando exercido através desses três Poderes, expressa-se diretamente ou
por meio de representantes eleitos.
Sendo assim, por que o povo não elege os membros do Poder Judiciário, que o
representaria através da delegação do poder soberano popular? O representante eleito, na
democracia semidireta brasileira, em relação ao Poder Judiciário, é o mesmo que o
representante concursado?
Essa reflexão desafia as Teorias da Democracia e do Poder, eis que a práxis democrática
brasileira quanto ao Poder Judiciário parece seguir um modelo quase que excludente daquele
reservado ao processo político utilizado para os dois outros Poderes, o Legislativo e o
Executivo, atribuindo ao Judiciário não a terceira enumeração dentre os Poderes e na
disposição topográfica do texto constitucional, mas também uma forma diferente de
manifestar a vontade geral do povo.
A crise institucional permeia o Poder Legislativo brasileiro, acusado de constante
envolvimento em corrupção, cooptação pelo Poder Executivo
1
, transmigração partidária,
1
Filomeno de Moraes, sobre o Poder Judiciário, afirma: “[...] Por isso, sem desprezar o patente progresso
relativo à convivência democrática no Brasil nos anos recentes, é inquestionável o caráter atrofiado, truncado, de
muitas das instituições políticas. Por conta disso, em grande medida, a organização política brasileira tem
problemas no que diz respeito ao processar a diversidade do País e de expressar a pluralidade de interesses e
valores socialmente subjacentes. Esse caráter delegativo ( e pouco representativo, por via de consequência) tem
razões mais antigas, oriundas de uma formação histórica de forte ênfase no Poder Executivo, da vocação
eminentemente anti-representativa enquistada na cultura política brasileira e da recorrência ao autoritarismo, o
qual, desgraçadamente, tem imprimido no desenvolvimento político nacional uma lógica de ciclos de contração e
ciclos de abertura política”. MORAES, Filomeno. Separação de Poderes no Brasil Pós-88: Princípio
Constitucional e Práxis Política. In: SOUZA NETO, Cláudio Pereira de; BERCOVICI, Gilberto; MORAES
16
inércia legislativa, caracterizando renúncia tácita às suas funções, loteamento de órgãos
públicos, empreguismo e distinções vencimentais acentuadas, assim como atinge o Poder
Executivo, hipertrofiado, com o ofertório cada vez maior de cargos comissionados ou de livre
nomeação, uso indiscriminado de medidas provisórias, usurpando a competência do Poder
Legislativo, utilização do aparelho policial como meio de coerção política, ações
assistencialistas de feição populista, concentração e aplicação de recursos orçamentários em
regiões de grande densidade econômica, desequilibrando o pacto federativo, dentre outras
manifestações.
O Poder Judiciário, diante da perplexidade e do descrédito do sistema político atual, tem
intervindo intensamente nas decisões sobre políticas públicas e nos desvios e ausências
frequentes da representação política, assumindo, por meio dos juízes, a função típica de
“oráculo da democracia”, incorporando valores morais e políticos às discussões de natureza
jurídica.
Essa judicialização da política, diante do protoprincípio da separação dos poderes,
conduz a reflexões sobre a legitimação das decisões judiciais, uma vez que originadas de
agentes que não são escolhidos direta ou indiretamente pela expressão da soberania popular,
através do sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos.
2
No entanto, qual o nível de atendimento das demandas populares, aqui entendidas como
decorrentes da soberania, na democracia representativa moderna? Expressa-se unicamente
essa soberania através do mecanismo formal de eleição dos membros de um Poder?
A relação entre legitimidade e democracia representativa, quando analisada em relação
ao Poder Judiciário, tem sido questionada na medida em que se amplia o tema em face do
perigo reputado ao “governo dos juízes”
3
e ao populismo judicial, sem que a vontade popular
tenha meios seguros e eficazes de controle da expressão judiciária, através do dinamismo
inerente à alternância do processo eleitoral.
FILHO, Jo Filomeno de; LIMA, Martônio Mont’Alverne Barreto (Org.). Teoria da Constituição: Estudos
sobre o lugar da política no direito constitucional. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003. p.151-197, p.190.
2
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal,
1999, (Art. 14).
3
“Num livro escrito em defesa da magistratura, denominado Le complot des juges (Paris, ed. Du Félin, 1993),
Yves Lemoine, antigo magistrado francês, inclui um capítulo intitulado ‘O governo dos juízes’ que começa com
estas palavras: ‘Eis a frase de efeito lançada. A frase que vem à boca de cada político que pensa provocar, desse
modo, o arrepio das massas populares (‘o governo dos juízes’, pior, talvez: o complô dos juízes)’”. DALLARI,
Dalmo de Abreu. O poder dos juízes. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 94-95.
17
Em torno desses assuntos, propõe-se analisar o modelo utilizado pela democracia
brasileira para a escolha dos membros do Poder Judiciário e as manifestações da soberania
popular nesse Poder, legitimando-o. Para tanto, apresentar-se-ão os mecanismos atualmente
disponíveis e utilizados nesse procedimento, perpassando a experiência do Direito
Comparado, analisando teorias e o pragmatismo constatado empiricamente, elaborando
críticas e propondo sugestões, algumas delas já visitadas pela doutrina e por bandeiras
corporativas, outras, decorrentes da subjetividade do autor, possíveis de serem implementadas
mediante alterações legislativas e adoção de uma teoria democrática com viés participativo e
político na dinâmica externa e interna do Poder Judiciário, com viso à ampliação de sua
democratização.
Este estudo tem como ponto de partida a investigação do momento de transição da
democracia representativa e indireta para a democracia direta e participativa, com sua
repercussão no Poder Judiciário, incursionando, para a construção da problemática
democrática desse Poder, por conceituações, princípios e garantias que moldaram a estrutura
de sustentação dessa expressão da soberania popular.
Ao adentrar em temas como jurisdição, independência do judiciário, independência,
imparcialidade e neutralidade do juiz e legitimidade do Poder Judiciário, o interesse do
pesquisador visa à tentativa de reformulação, em algumas ocasiões, e ao aproveitamento, em
outras situações, dos alicerces de construção de uma democracia para o Poder Judiciário, com
uma dogmática que se transforme e se adapte à realidade do Poder, o qual deverá ser exercido
em sua possível plenitude, pela máxima representação da sociedade organizada que, para
tanto, necessita de ampla expressão política, em todos os níveis de manifestação.
Alguns exemplos e aplicativos no âmbito do Direito Comparado são expostos, para que
se possa sobre eles imprimir críticas, mas também deles se aproximar em busca de um modelo
adequado à realidade nacional, principalmente no estágio atual de questionamento das
certezas absolutas e de busca da unidade pela solidariedade, no intercâmbio de uma
globalização em seu aspecto universalizante, no sentido da colmatação das diferenças.
Assim é que a aparente fragmentação do poder estatal, na função judiciária, não visa ao
seu enfraquecimento, mas, ao contrário, à sobrevivência do Estado que, enquanto gestor da
organização e pacificação sociais, não se apresenta mais, definitivamente, como o único reitor
dos vetores cada vez mais aleatórios das forças de influência societária, por exaurimento de
18
sua credibilidade, pela irracionalidade da lógica política, pela emergência da
imponderabilidade, pela exiguidade e limitação de seus recursos e pela infinitude da natureza
humana.
Se o monopólio da força subsiste, para uns, como forma de agregação política, propõe-
se a ideia, não menos verdadeira, de que o consenso dialético elaborado pelas diversas forças
sociais tende, por sua experimentação constante, ao estabelecimento de uma ordem dotada de
maior fluidez e flexibilidade, adequada às transições permanentes da práxis social.
Portanto, a abertura proposta, no plano externo e interno, para o exercício da função
judiciária não seria tão absurda, se se considerar os albores da democracia e as ideias
revolucionárias que romperam o ancien régimen e implodiram o absolutismo esclarecido.
A democracia, no Poder Judiciário, assim como o mito, estaria mais próxima da
realidade; seria menos ficcional.
1 A TRANSIÇÃO DA DEMOCRACIA REPRESENTATIVA E
INDIRETA PARA A DEMOCRACIA DIRETA E
PARTICIPATIVA: A REPERCUSSÃO NO PODER JUDICIÁRIO
Inicialmente, para não se incorrer em constatações unicamente empíricas ou teóricas, o
exercício idealizado e imaginativo, longe de reduzir-se a devaneios insuperáveis, busca, no
caso concreto, contribuir para a aproximação entre o Ser e o Dever-Ser da democracia.
Lessa, a pretexto do discurso entre o déficit empírico dos filósofos políticos e o oposto
simétrico do déficit imaginativo, lembra o concurso a que se submeteu Rousseau, perante a
Academia de Dijon, que indagava aos candidatos a respeito do caráter das desigualdades; se
elas tinham origem natural e se podiam ser justificadas de algum modo. Afirma Lessa:
Se Rousseau fosse um cientista social empiricamente orientado, o que diria? Ele,
provavelmente, olharia para o lado e para o passado e constataria a virtual
universalidade empírica da desigualdade. Então, ele responderia: a desigualdade tal
como atestam minhas tabelas e minhas entrevistas diretas está no mundo desde
sempre, e não tenho meios para inferir que as coisas possam passar-se de modo
distinto. Mas, felizmente, para todos nós, o que Rousseau fez? Decidiu escrever um
tratado – o magnífico Discurso sobre as Origens da Desigualdade entre os Homens -,
cujo preceito metodológico básico eu acho adorável. Rousseau propõe-se a fazer
uma história da desigualdade e adota a seguinte premissa: comecemos por afastar
todos os fatos.
[…]
Em outras palavras, a decisão intelectual de Rousseau orienta-se pela imaginação ou,
se quisermos, invenção de realidades e valores empiricamente não existentes.
[…]
A história da ciência política é em grande medida uma história de tentativas de
elucidação de fatos e artefatos postos no mundo por teorias. Esse é o ponto que eu
acho mais interessante: fatos e artefatos institucionais que decorrem de invenções
intelectuais.
1
A reflexão que se propõe é estabelecer associações possíveis e formular críticas e
sugestões da práxis e da Teoria do Poder, que vinculando a soberania a uma de suas funções –
a Judiciária, possa projetar o mais concretamente possível a vontade popular, direta ou
indiretamente, como expressão de Poder no Estado ou do Poder do Estado, com a participação
da sociedade civil.
1
LESSA, Renato de Andrade. A teoria da democracia: balanços e perspectivas. In: PERISSINOTO, Renato
Manseff; FUKS, Mário (Org.). Democracia: teoria e prática. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2002. p. 33-54, p.39-
40.
20
Indaga-se, então: a) Se o povo elege diretamente seus representantes para o exercício
das funções legislativas e executivas, por que não o faz em relação às funções judiciárias? b)
Há manifestação da soberania popular no exercício das funções judiciárias? c) Como a
soberania popular se manifesta no Poder Judiciário da democracia contemporânea?
Essas perguntas parecem imbuídas de uma logicidade tal, que é preciso compreender o
processo histórico de dominação dos seres humanos e a construção dos seus mecanismos de
submissão, para que a reestruturação desse Poder não se limite à infantilização dos porquês.
Em rápido corte histórico, admite-se que o homem desceu das árvores, quando se sentiu
seguro para enfrentar os outros animais. Aprendeu a arar a terra e a cultivar seus alimentos.
Caçou e domesticou animais. Acresceu nutrientes ao seu cardápio. Fortaleceu-se. Cercou a
terra e definiu a propriedade. Organizou-se em grupos e começou o seu processo de
socialização. Da organização social surgiu o homem cidadão-público. Sua ânsia de poder, seu
medo, a necessidade de mais víveres para os clãs, dentre outras razões, impulsionaram-lhe
para a conquista de novos territórios e, com isso, a dominação de outros povos.
Com o desenvolvimento das primeiras armas, lapidando a pedra bruta e forjando o
bronze e o ferro, tudo lhe imprimia o sentimento do poder. O fogo, a roda e a pólvora
ajudaram nessa saga.
Com as conquistas, os derrotados eram mortos ou devorados, resolvendo-se o problema
da escassez de alimentos com a eliminação do inimigo. Depois, o homem descobriu que
escravizando o semelhante adquiriria mais poder e se dedicaria a outras tarefas. Nesse ponto,
a escravatura era um avanço para o próprio derrotado. Este agora o seria mais fonte
alimentar nem seria morto.
Adiantando a ampulheta narrativa, os grupos humanos, vencedores e perdedores, se
organizariam e voltariam a disputar o poder. Havia grandes fossos e desigualdades sociais, a
despeito de parcerias e conformações. A natureza gregária humana superaria sua natureza
bruta. Habilidades as mais diversas se expandiam no processo de politização dos grupos. O
homem dominava a filosofia, as artes, a astronomia, o comércio e a manufatura.
Havia necessidade de gestão para essa riqueza. Religiosos, nobres e segmentos
estratificados do corpo social buscavam a melhor forma de domínio de uns sobre os outros. O
21
soberano feudal era justificado por todos os meios de poder: o teocrático, o aristocrático, o
burguês. O poder de um ou de alguns continuava sendo o alvo da constante busca.
Surgia, em prosseguimento, o Estado burguês, como organização política do poder. A
sociedade que se via representada por esses novos ideais, agora buscava configurar o seu
próprio poder. Mas quem era esse novo soberano a quem todos confiavam o seu destino,
aquele ou aquilo que teria o poder para organizar o conflito e impor a solução?
Organizar esse poder implicava dizer sistematizar o poder de algo, de um ou de alguns
sobre outros. Mas a liberdade do homem, burilada depois pelo desenvolvimento da razão, não
foi uma busca desde os primórdios?
O que fazia então os homens, se submeterem uns aos outros? A resposta a essa angústia
de La Boétie transformou-se em um clássico sobre da servidão humana. La Boétie indagava:
Em suma, se todo ser que tem o sentimento da sujeição e procura a liberdade; se os
bichos, até os criados para o serviço do homem, podem se submeter depois de
protestarem um desejo contrário - que vício infeliz pode então desnaturar o homem,
o único que realmente nasceu para viver livre, a ponto de fazê-lo perder a lembrança
de sua primeira condição e o próprio desejo de retomá-la?
2
Para Etienne, mesmo o poder do povo era perigoso se, ainda que elegendo o seu
soberano, não se exaurisse o seu ciclo servil. Em um mundo de tiranias, Etienne assomava o
seu pessimismo, e dizia:
três tipos de tiranos. Falo dos maus Príncipes. Uns possuem o Reino por eleição
do povo, outros pela força das armas e outros por sucessão da raça. Os que o
adquiriram pelo direito de guerra comportam-se nele como em uma terra
conquistada, com se bem sabe e se diz, com razão. Comumente, os que nascem reis
não são melhores; nascidos e criados no seio da tirania, sugam com o leite o natural
do tirano, consideram os povos a eles submetidos como seus servos hereditários; e
segundo a tendência a que estão mais inclinados, avaros ou pródigos, se utilizam do
Reino como de sua própria herança. Quanto àquele cujo poder vem do povo, parece
que deveria ser mais suportável, e creio que o seria, desde que se visse a lugar tão
alto, acima de todos os outros, lisonjeado por um não sei quê que chamam de
grandeza, não tomasse a firme resolução de não descer mais. Quase sempre
considera o poderio que lhe foi confiado pelo povo como se devesse ser transmitido
a seus filhos. Ora, quando eles e ele conceberam esta idéia funesta, é realmente
estranho ver como superam todos os outros tiranos em vícios de todo tipo e aem
crueldades. Não encontram melhor maneira de consolidar sua nova tirania senão
aumentando a servidão e afastando tanto as idéias de liberdade do espírito de seus
súditos que, por mais recente que seja a sua lembrança, logo ela se apaga
inteiramente de sua memória. Assim, para dizer a verdade, vejo bem alguma
diferença entre estes tiranos, mas não que se possa fazer uma escolha: pois se
chegam ao trono por caminhos diversos, sua maneira de reinar é quase sempre a
mesma. Os escolhidos pelo povo tratam-no como um touro a ser domado; os
2
LA BOÉTIE, Etienne de. Discurso da servidão voluntária. Tradução de Laymert Garcia dos Santos. 4. ed.
Comentários: Claude Lefort, Pierre Clastres e Marilena Chauí. São Paulo: Brasiliense, 1999, p. 82.
22
conquistadores, como uma presa sobre a qual tem todos os direitos; os sucessores,
como um rebanho de escravos que, naturalmente, lhes pertence.
3
Em síntese, indagava o jurista e filósofo francês:
[…] o que é aproximar-se do tirano senão recuar mais de sua liberdade e, por assim
dizer, apertar com as duas mãos e abraçar a servidão?
[…]
Que condição é mais miserável que viver assim, nada tendo de seu, recebendo de
outrem sua satisfação, sua liberdade, seu corpo e sua vida?
4
Mas se a imagem simbólica do soberano era sombra que iria atormentar os povos desde
os primórdios de sua organização, mister investigar como se deram as primeiras organizações
políticas democráticas, entendendo-se democracia como sendo
aquela forma de exercício da função governativa em que a vontade soberana do
povo decide, direta ou indiretamente, todas as questões de governo, de tal sorte que
o povo seja sempre o titular e o objeto, a saber, o sujeito ativo e o sujeito passivo do
poder legítimo.
5
A democracia como forma de Estado (Staatsformen), como denominam os alemães, ou
como forma de Governo, para os franceses, apresenta-se doutrinariamente sob a forma direta,
semidireta ou indireta.
6
Na democracia direta clássica, o povo reunia-se na Ágora e decidia,
direta e indiretamente, as questões das cidades-Estado gregas, através de assembleias
populares.
Nas praças, que funcionavam como Parlamentos, apenas os homens livres decidiam. Era
uma democracia aristocrática. Cidadãos e Estado se confundiam. A força do Estado era a
força do cidadão. Não havia diferença entre o homem e a coletividade. O homem afirmava a
sua personalidade na polis. O demos agia com funções legislativas, executivas e judiciais. O
espaço diminuto das cidades e a população, igualmente, limitada a esses territórios, assim o
permitiam.
Vencido o grande hiato da Idade Média, com a alteração dos meios de produção da
economia feudal e da relação com a posse da terra, o poder político e econômico forjado nesse
período não encontrava força para sustentar-se no regime de vassalagem em que se
estabelecia, como forma de servidão. Bonavides assim descreve essa transição:
3
Ibid., 1999, p. 82-83.
4
Ibid., 1999, p. 33.
5
BONAVIDES, Paulo. A Constituição Aberta. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 17.
6
Id. Ciência Política. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1983, p. 233.
23
[…] a burguesia das navegações, do comércio florescente, das manufaturas
próximas, das empresas lucrativas, criara nas cidades a cada passo a base da
sociedade nova e da riqueza maior, que vinha substituir a da sociedade dos feudos e
da riqueza menor, que era doravante a terra.
As exigências econômicas impuseram assim de imediato aos fundadores de
dinastias, ao monarca consolidador do Estado Moderno, a abertura de amplos
condutos àquelas forças da produção, cujo ímpeto mais cedo ou mais tarde acabaria
por romper a hierarquia social das classes.
7
A monarquia absolutista que havia se consorciado com a ordem findante – o feudalismo
medieval – e a classe emergente – a burguesia – sobrevivem o quanto podem.
Ciente de seu poder econômico, formado pela nova ordem comercial e industrial,
incrementada com a expansão dos mercados e dos novos territórios descobertos, a burguesia
avança em suas pretensões e assume o poder político, destronando a intermediação
absolutista. Bonavides explica:
[…] A burguesia sempre se sentiu politicamente oprimida e politicamente espoliada
de baixo da monarquia absoluta. Os monarcas de direito divino governavam com a
aristocracia territorial e o clero, numa sociedade regida por privilégios intactos quais
eram os da feudalidade, consistindo em ordens, graus, títulos, estamentos,
corporações e estemas, toda uma camada de exceções vexatórias à burguesia e que,
na linguagem de Marx, assinalavam esplendidamente, meridianamente, a
permanência da superestrutura política e jurídica do feudalismo, em desacordo com
a infra-estrutura burguesa de teor econômico.
A fim de alforriar-se politicamente, isto é, a fim de resolver a contradição entre o
poder econômico auferido e a sujeição política a que ficara reduzida é que a
burguesia conspirou, se fez revolucionária, empunhou armas e se volveu contra a
realeza absoluta, até promover-lhe a queda fragorosa, mediante atos de ferocidade e
violência, quais foram os episódios trágicos marcados no calendário de sangue da
Revolução de 1789.
8
Instalava-se o Terceiro Estado, a burguesia efetivamente no poder. O aparato teórico
dessa nova ordem vinha sendo implementada. O homem político por essência da
democracia clássica grega, tanto esquecido, cede espaço ao homem econômico,
majoritariamente. A vida civil e o realce às individualidades afastam o homem das questões
públicas. Aperfeiçoa-se o mecanismo da representação política da vontade popular.
9
É o
homem político representante dos interesses do homem individual, no advento do Estado
liberal. Essa representação avulta-se com a doutrina da duplicidade, no século XVIII, na qual
duas vontades legítimas, diferentes e autônomas, atuavam a vontade popular – a do eleitor e a
7
Id. Teoria do Poder. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 171.
8
Ibid., 2007, p. 167.
9
Para Rousseaua iia dos representantes […] vem do governo feudal, desse iníquo e absurdo governo, que degrada
a espécie humana e desonra o homem. Nas antigas repúblicas, mesmo em monarquias, nunca o povo teve
representantes, e era desconhecida tal expressão”. ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do Contrato Social ou Princípios do
Direito Político. Tradução Pietro Nassetti. São Paulo: Martin Claret, 2007, Livro III, cap. XV, p. 87-88.
24
do representante eleito aquela, limitada ao ato formal de votar; esta, limitada ao exercício
político da representação outorgada.
A soberania seria repensada. A autoridade do soberano deveria encontrar limites. As
ideias de Rousseau e de seu Contrato Social, juntamente com as de Montesquieu, com o
Espírito das Leis e a Teoria da Separação dos Poderes, vicejavam em França, assim como as
de Locke, na Inglaterra, palcos de Revoluções distintas, mas igualmente transformadoras. Em
França, com rupturas mais evidentes com o ancien régime; na Inglaterra, de forma mais
consensual e interativa com a ordem anterior. Para Rousseau, a soberania não poderia ser
representada. Afirmava o genebrino:
Digo, portanto, que, não sendo a soberania mais que o exercício da vontade geral,
não pode nunca alienar-se; e o soberano, que é unicamente um ser coletivo,por si
mesmo se pode representar. É dado transmitir o poder, não à vontade.
A soberania é indivisível pela mesma razão de ser inalienável. Porque ou a vontade
é geral, ou não; ou é a do corpo do povo, ou só de uma parte dele. No primeiro caso,
a vontade declarada é um ato de soberania e faz lei. No segundo, não é mais que
uma vontade particular, ou ato de magistratura; é, quando muito, um decreto.
[…]
A soberania não pode ser representada pela mesma razão por que não pode ser
alienada; consiste ela essencialmente na vontade geral, e a vontade não se
representa; ou ela é a mesma, ou outra, e nisso não meio termo; logo os
deputados do povo não são, nem podem ser, representantes seus; são comissários
dele, e nada podem concluir decisivamente.
[…]
[…] Seja como for, no momento em que um povo elege representantes, cessa de ser
livre, cessa de existir.
10
Dois teóricos do Estado moderno, Rousseau (1712-1778), com a ideia de democracia
direta, e Montesquieu (1689-1755), com a de democracia indireta e representativa, eram,
contudo, céticos em relação ao governo direto do povo, como se estabeleceu entre os gregos.
Propugnavam pela liberdade e pela igualdade, mas mesmo para Rousseau:
Rigorosamente nunca existiu verdadeira democracia, e nunca existirá. É contra a
ordem natural que o grande número governe e seja o pequeno governado.
Não se pode imaginar que o povo reúna-se continuamente para cuidar dos negócios
públicos, e é fácil ver que não poderia estabelecer comissões para isso sem mudar a
forma de administração.
[…]
Se houvesse um povo de deuses, seria governado democraticamente, mas aos
homens não convém tão perfeito governo.
11
10
Ibid., 2007, p. 36-89.
11
Ibid., 2007, p. 67-68.
25
Na representação política proposta por Montesquieu, a descrença na capacidade coletiva
do povo também era evidente. Dizia Montesquieu:
Uma vez que, em um Estado livre, todo homem que supõe possuir uma alma livre
deve ser governado por si próprio, é necessário que o povo, em seu conjunto, exerça
o poder legislativo; mas como isso é impossível nos grandes Estados, e nos
pequenos estaria sujeito a muitos inconvenientes, é preciso que o povo exerça pelos
seus representantes tudo o que não pode exercer por si mesmo.
[…]
A grande vantagem dos representantes é que estes são capazes de discutir as
questões públicas. O povo não é, de modo algum, apto para isso, fato que constitui
um dos grandes inconvenientes da democracia.
[…] a palavra dos deputados expressaria melhor a voz da nação;
[…]
Havia um grande vício na maioria das antigas repúblicas: o povo tinha o direito de
tomar resoluções ativas que requerem certa execução, coisa de que ele de modo
algum é capaz. Ele deve tomar parte no governo para escolher seus
representantes, e isso é tudo o que pode fazer.
Sempre há, em um Estado, indivíduos que se distinguem pelo nascimento, pelas
riquezas, ou pelas honras; mas, se eles se confundissem com o povo e tivessem
direito a um voto, como os outros, a liberdade comum seria sua própria escravidão, e
eles não teriam nenhum interesse em defendê-la, que a maioria das resoluções
seriam (sic) contrárias a eles. Sua participação na legislação, portanto, deve ser
proporcional às outras vantagens que possuem no Estado.
12
O Estado liberal precisava firmar sua identidade e sua estabilidade. A liberdade como
sustentáculo filosófico através do exercício da vontade dos novos agentes do poder deveria ter
limites objetivos e aparentemente impessoais – a constituição e a lei – as quais seriam,
doravante, expressões da representação da vontade geral. Com ela, a burguesia substitui a
vontade absoluta dos reis e impõe um componente político que legitimará o novo soberano
o mercado do nascente capitalismo moderno prometendo segurança ao cidadão e a seus
novos representantes burgueses. A legalidade equivale, nesse instante, à legitimidade.
Mas se para Rousseau “uma lei que de sua natureza requer unânime
consentimento, e é o pacto social” e […] “a oposição de alguns ao pacto social não invalida o
contrato, dele os exclui”,
13
para Montesquieu, com a sua teoria, a concentração de poder,
mesmo na nova ordem liberal, é uma ameaça à instabilidade institucional. Propõe então, para
a segurança da liberdade política, a separação do poder, fracionando as funções da soberania
estatal. Estava criado o sistema de freios e contrapesos, de contenção do poder.
12
MONTESQUIEU, Charles de Secondat. Do Espírito das Leis. Tradução de Jean Melville. São Paulo: Martin
Claret, 2005, Livro XI, cap. VI, p.167-168.
13
ROUSSEAU, Jean-Jacques, op. cit., 2007, Livro IV, cap. II, p. 95.
26
A função judiciária, até então concentrada em torno do poder feudal e, na sequência, do
absolutista, agora representava a vontade da lei, que, por sua vez, representava politicamente
os grupos subjacentes da nova sociedade comercial e industrial. Troca-se o fetiche divino pelo
fetiche do mercado. Transfere-se a servidão ante o absolutismo esclarecido para a servidão ao
comando legal. O juiz, nesse contexto, era apenas o porta-voz da lei. Continua escravo da
legalidade e a ela servil. Dizia Montesquieu:
Há em cada Estado três espécies de poder: o poder legislativo, o poder executivo das
coisas que dependem do direito das gentes, e o poder executivo daquelas que
dependem do direito civil […]
Chamaremos este último ‘o poder de julgar’, e o outro chamaremos, simplesmente,
‘o poder executivo do Estado’ […] não haverá liberdade se o poder de julgar não
estiver separado do poder legislativo e do executivo […]
Tudo então estaria perdido se o mesmo homem, ou o mesmo corpo dos principais ou
o dos nobres, ou o do povo, exercesse estes três poderes: o de criar as leis, o de
executar as resoluções públicas e o de julgar os crimes e as querelas dos particulares.
[…]
O poder de julgar não deve ser dado a um senado permanente, mas exercido por
pessoas extraídas da classe popular, em certas épocas do ano, de modo prescrito pela
lei, para formar um tribunal que apenas dure o tempo necessário.
Dessa forma, o poder de julgar, tão terrível entre os homens, não estando ligado nem
a uma certa situação, nem a uma certa profissão, torna-se, por assim dizer, invisível
e nulo. E ninguém mais terá, constantemente, juízes diante dos olhos: temer-sea
magistratura, e não os magistrados.
Será necessário mesmo que, nos grandes processos, o criminoso, concomitantemente
com a lei, escolha os seus juízes, ou que, pelo menos, possa recusar um tão grande
número deles, que aqueles que restarem sejam considerados como de sua escolha.
14
Prosseguia Montesquieu:
Entretanto, se os tribunais não devem ser fixos, os julgamentos devem sê-lo a um tal
ponto, que nunca sejam mais que um texto fixo da lei. Se representassem uma
opinião particular do juiz, viver-se-ia na sociedade sem saber precisamente quais os
compromissos que nela são assumidos.
[…]
Dos três poderes dos quais falamos, o judiciário é, de algum modo, nulo. Restam
dois, portanto, e como esses poderes necessitam de um poder regulador para
moderá-los, a parte do corpo legislativo, que é composto de nobres, torna-se muito
capaz de produzir esse efeito.
[…] Porém, os juízes da nação não são, conforme já dissemos, mais que a boca que
pronuncia as palavras da lei, seres inanimados que desta lei não podem moderar nem
a força e nem o rigor.
15
14
MONTESQUIEU, Charles de Secondat, op. cit., 2005, Livro XI, cap. VI, p. 165-167.
15
MONTESQUIEU, Charles de Secondat, op. cit., 2005, Livro XI, cap. VI, p. 167-172.
27
Para Raymond Aron, “a idéia essencial de Montesquieu não é a separação dos poderes
no sentido jurídico do termo, mas o que poderíamos chamar o equilíbrio das forças sociais,
condição da liberdade política”.
16
A concepção política de democracia parlamentar, sob o amparo de constituições e leis,
logo mais seria questionada, quando as promessas de uma paz celestial e duradoura,
apregoada pelo liberalismo, não mais continham a classe trabalhadora, que aglomerada em
massa reivindicante, fornecia o combustível necessário para a transição do Estado liberal para
o Estado social, apresentando-se como atores de um Quarto Estado.
O consenso liberal, como de resto toda ordem consensual, tende à sua exaustão pela
eclosão de novas subjetividades e antigos dissidentes da vontade geral. As revoluções
socialistas fomentadas a partir do final do século XIX, agenciadas pelas sociedades de massas
e nacionalismos exacerbados, acusam a insuficiência dos parlamentos e denunciam a crise do
Estado liberal e de seu modelo de representação política.
A sociedade, outrora separada do Estado, e sobre ele prevalecente, era conduzida por
uma ordem jurídica na qual o individualismo prevalecia.
As grandes guerras do início do século XX e o ilusionismo da supremacia individualista
liberal denunciado pela crise financeira daqueles anos insuflam os novos descontentes os
trabalhadores – em busca de direitos fundamentais mais efetivos. Cobra-se agora o retorno do
Estado para o gerenciamento da crise. A legalidade já não corresponde à legitimidade.
Bonavides descreve o momento:
Dessa porfia de classes, brotou o Estado social, com a prevalência de uma
concepção da materialidade dos direitos fundamentais. Surgiu, assim, o advento do
Estado de Direito de segunda dimensão, onde a garantia dos direitos fundamentais já
não consiste, como no primeiro, em afirmar direitos blicos subjetivos. Mas
consiste em fazer do legislador, segundo assinalou Grimm, o agente de uma
normatividade positiva em favor da consolidação da liberdade, em contraste
portanto, com o legislador negativo das chamadas reservas de lei, conforme era
índole do Estado liberal.
[…]
Nesse segundo Estado de Direito a democracia pelas vias representativas não se
confina à supremacia de uma classe. Tendo por pressuposto o sufrágio universal,
perde ela o teor formal que a revestia, abrindo o raio de sua abrangência
participativa a todos os estados, ou seja, a todas as classes. Essa abertura em verdade
traz o fermento da dissolução e da crise do sistema representativo em suas bases
16
ARON, Raymond. As etapas do pensamento sociológico. Disponível em:
<http://www.arqnet.pt/portal/teoria/aron_montesquieu.html>. Acesso em: 17 set. 2007.
28
clássicas, a saber, prepara a introdução do princípio democrático na sociedade
contemporânea com um conteúdo de cidadania e uma força nova de concretude, que
têm reflexos importantíssimos na reforma da velha concepção dos direitos
fundamentais e de sua hermenêutica tradicional […]
17
Em prosseguimento, ampliam-se os direitos fundamentais. As atrocidades da Primeira
Grande Guerra estuporaram a sociedade em transformação. A reconstrução dos Estados
atingidos também foi o despertar da centralidade humana enquanto gênero, e não mais
limitada à relação individual ou societária.
Novos valores e garantias fundamentais constitucionalizados, reformulação da
hermenêutica clássica, estímulo e participação na cidadania e no Estado, demandas mais
concretas que afloram da realidade sinalizam a presença do Estado social, desconstruindo
muros ideológicos, ampliando o conceito de soberania para a formação de blocos
comunitários, propugnando por direito à solidariedade, à paz, ao desenvolvimento, à
informação, à comunicação, à proteção do consumidor e do meio ambiente, aos benefícios da
biogenética, à educação e à saúde básicas, ao acesso de bens naturais de uso comum da
humanidade, às tecnologias e, embora de primitiva origem, mas de coletiva preocupação
atual, pelo direito à garantia das fontes alimentares e hídricas.
A universalização e a globalização desses direitos inserem a pluralidade democrática
como princípio afirmativo do gênero humano, não conceitualmente, mas positivado na
ordem jurídica internacional. Bonavides acresce:
Como se vê, a democracia caminha, a largos passos, para deixar de ser tão-somente
forma de governo, de Estado, de república, para subir a um grau superlativo de
princípio, de valor e de normatividade, derivado de sua proclamação e
reconhecimento como direito da quarta geração.
Na escala da legitimidade constitucional, o século XIX foi o século do legislador, o
século XX o século do juiz e da justiça constitucional universalizada; já o século
XXI está fadado a ser o século do cidadão governante, do cidadão povo, do cidadão
soberano, do cidadão sujeito de direito internacional […] Ou ainda, do cidadão
titular de direitos fundamentais de todas as dimensões; século, por fim, que de
presenciar nos ordenamentos políticos do Terceiro Mundo o ocaso do atual modelo
de representação e de partidos […]
18
Estaria então a democracia participativa no século XXI caminhando para a prevalência
da democracia direta em vez da representativa? O povo, em sua dimensão comunitária e
pluralista, no Estado social, finalmente expressará a sua soberania, sendo o próprio poder no
Poder? Para Bobbio,
17
BONAVIDES, Paulo, op. cit., 2007, p. 512-513.
18
BONAVIDES, Paulo, op. cit., 2007, p. 351.
29
[…] entre a democracia representativa pura e a democracia direta pura não existe,
como crêem os fautores da democracia direta, um salto qualitativo, como se entre
uma e outra existisse um divisor de águas e como se a paisagem mudasse
completamente tão logo passássemos de uma margem à outra. Não: os significados
históricos de democracia representativa e de democracia direta são tantos e de tal
ordem que não se pode pôr os problemas em termos de ou ou, de escolha forçada
entre duas alternativas excludentes, como se existisse apenas uma única democracia
representativa possível e uma democracia direta possível; o problema da passagem
de uma a outra somente pode ser posto através de um continuum no qual é difícil
dizer onde termina a primeira e onde começa a segunda.
19
Entendendo que o fluxo do poder poderia ter duas direções, sendo a ascendente -
tipicamente, nos Estados modernos - o poder burocrático, e a descendente, o poder político
exercido em todos os veis da estatalidade, em nome e por conta do cidadão, dizia Bobbio
que
[…] o processo de democratização, ou seja, o processo de expansão do poder
ascendente, está se estendendo das relações políticas, das relações nas quais o
indivíduo é considerado em seu papel de cidadão, para a esfera das relações sociais,
onde o indivíduo é considerado na variedade de seu status e de seus papéis
específicos, por exemplo de pai e de filho, de cônjuge, de empresário e de
trabalhador, de professor e de estudante e até mesmo de pai de estudante, de médico
e de doente, de oficial e de soldado, de administrador e de administrado, de produtor
e de consumidor, de gestor de serviços públicos e de usuário, etc.
[…] se hoje se pode falar de processo de democratização, ele consiste não tanto,
como erroneamente muitas vezes se diz, na passagem da democracia representativa
para a democracia direta quanto na passagem da democracia política em sentido
estrito para a democracia social, ou melhor, consiste na extensão do poder
ascendente, que até agora havia ocupado quase exclusivamente o campo da grande
política (e das pequenas, minúsculas, em geral politicamente irrelevantes
associações voluntárias), para o campo da sociedade civil nas suas várias
articulações, da escola à fábrica: falo de escola e de fábrica para indicar
emblematicamente os lugares em que se desenvolve a maior parte da vida da maior
parte dos membros de uma sociedade moderna […]
20
Bobbio não vê nesse processo evolutivo, portanto, a eclosão de um novo tipo de
democracia, mas “a ocupação, pelas formas ainda tradicionais de democracia, como é a
democracia representativa, de novos espaços, isto é, de espaços até agora dominados por
organizações de tipo hierárquico ou burocrático.”
21
Para ele, avança-se da democratização do
Estado à democratização da sociedade. Pergunta, então, Bobbio:
É possível a sobrevivência de um estado democrático numa sociedade não
democrática?
[…]
19
BOBBIO, Norberto. O futuro da democracia: uma defesa das regras do jogo. Tradução de Marco Aurélio
Nogueira. 6. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1986, p. 97.
20
Ibid., 1986, p. 54-55.
21
Ibid., 1986, p. 55.
30
[…] a democracia política foi e é até agora necessária para que um povo não caia
sob um regime despótico; mas é também suficiente?
22
Considerando que o sufrágio universal ampliou o direito de participação, mesmo
indireto, com a extensão do voto às mulheres, e encurtou a idade para o exercício da
capacidade eleitoral ativa, Bobbio reconhece o índice de desenvolvimento democrático de um
povo não mais pelo mero de pessoas aptas a votar, mas pela variedade das questões nas
quais se vota e pelo “espaço no qual o cidadão pode exercer o seu próprio poder de eleitor.”
23
Nesse trajeto democrático, o italiano interroga, inclusive, sobre a necessidade do
autogoverno em oposição ao desejo dos governados de serem deixados em paz, afirmando
que
O efeito do excesso de politização pode ser a revanche do privado […] a apatia
política […] Ao ativismo dos líderes históricos ou não-históricos pode corresponder
o conformismo das massas […] indiferentismo [qualunquismo] dos que cultivam o
seu ‘particular’.
24
Admite Bobbio a existência de diversos centros de poder, que transformam a sociedade
contemporânea de monocráticas em policráticas, localizando essas instâncias dentro do
Estado, mas não identificadas com ele. Sendo assim, poderia haver sociedade pluralista não
democrática e sociedade democrática não pluralista. A sociedade feudal representaria a
primeira hipótese e a democracia, dos antigos, na polis, a segunda.
25
Bobbio equaliza a teoria democrática, em contraposição aos regimes autocráticos, e a
teoria pluralista, com fluxos monocráticos ou policráticos de poder, afirmando:
[...] A teoria democrática e a teoria pluralista m em comum o fato de serem duas
propostas diversas mas não incompatíveis (ao contrário, são convergentes e
complementares) contra o abuso de poder […] A teoria democrática toma em
consideração o poder autocrático, isto é, o poder que parte do alto, e sustenta que o
remédio contra este tipo de poder pode ser o poder que vem de baixo. A teoria
pluralista toma em consideração o poder monocrático, isto é, o poder concentrado
numa única mão, e sustenta que o remédio contra este tipo de poder é o poder
distribuído […] a república de Rousseau é simultaneamente democrática e
monocrática, enquanto a sociedade feudal é simultaneamente autocrática e
policrática.
26
Com base nessa concentração, o Estado moderno seria, para Bobbio, simultaneamente
democrático e policrático, ora sendo possível o exercício da democracia direta, ora o da
22
Ibid., 1986, p. 55-56.
23
Ibid., 1986, p. 56.
24
Ibid., 1986, p. 56-57.
25
Ibid., 1986, p. 58.
26
Ibid., 1986, p. 60.
31
indireta ou representativa, dependendo da vastidão do território, do número de habitantes e da
multiplicidade dos problemas que devem ser resolvidos. Para resolver os conflitos da
democracia representativa, nesse contexto, propõe Bobbio a democratização da sociedade
civil para minorar a tendência à formação das pequenas oligarquias, o que reconhece como
sendo o defeito daquela expressão democrática, sugerindo que o poder não seja apenas
distribuído, mas, também, controlado.
27
Nessa elaboração não é esquecida a problemática do dissenso no discurso democrático,
principalmente pela dificuldade de se alcançar o consenso integral, aliás, preocupação que
remonta ao pessimismo de Rousseau. Santos recorre ao tema e acrescenta:
[…] foi a subjetividade que levou à democracia, também é essa subjetividade que
impõe a perene demanda por novos experimentos, novas formas de interação e
novas propostas utópicas, que obriga à liberdade de ousar e de providenciar a quebra
da rotina.
Os produtores de poder são, também, os irredentos de sempre, que não abdicam da
liberdade subjetiva. É nesses irredentos, sobretudo, que se funda o impulso para a
transcendência de cada momento histórico. E com isso, produzem quanta de poder,
em adição à quantidade do poder atual que se exaure na distribuição prevalecente
[…] São os que possuem a inclinação aventureira de transpassar o que está posto e a
serenidade de ignorar a ameaça do ostracismo. É nos irredentos que sempre se
origina a agonia criadora da dramaticidade democrática, a de legitimamente
reclamar por realizações que a democracia não pode atender […]
28
A equação lógica de Bobbio, então, monta o vetor do futuro democrático:
[…] a liberdade de dissentir tem necessidade de uma sociedade pluralista, uma
sociedade pluralista consente uma maior distribuição do poder, uma maior
distribuição do poder abre as portas para a democratização da sociedade civil e,
enfim, a democratização da sociedade civil alarga e integra a democracia política.
29
Enquanto Bobbio acreditava no sistema representativo, mediado por novos grupos de
poder da sociedade civil, outros visionários insistem na reinserção do mecanismo da
democracia direta para a formação do consenso e da tolerância ao dissenso democrático. Para
muitos cientistas políticos não haverá, porém, o fim da representação democrática, mas
o importante e essencial, absolutamente indispensável para definir hoje a identidade
da democracia direta, é que o povo tenha ao seu imediato dispor, para o desempenho
de uma desembaraçada e efetiva participação, os instrumentos de controle da
mesma. Sem isso a participação será sempre ilusória, e o é nas chamadas
democracias representativas do Terceiro Mundo, onde aqueles instrumentos
27
Ibid., 1986, p. 61.
28
SANTOS, Wanderley Guilherme dos. O paradoxo de Rousseau: uma interpretação democrática da vontade
geral. Rio de Janeiro: Rocco, 2007, p. 157.
29
BOBBIO, Norberto, op. cit., 1986, p. 63-64. Sobre o direito ao dissenso, ver também MORAES, Filomeno.
Direito à oposição. O Povo, Fortaleza, 28 nov. 2006, p. 4.
32
compõem, não raro, o biombo atrás do qual se ocultam as mais obnóxias ditaduras
sociais de confisco da liberdade humana.
30
Atraído pela ideia da democracia direta, mas não totalmente convicto quanto ao seu
destino, Santos analisa o tema:
A democracia direta é uma idéia sedutora. Sedutora e generosa. Há uma confissão de
humildade na prática de consultar o eleitorado sobre questões excessivamente
controversas. A concessão de um mandato não equivale a alguma lúcida
transferência de intimidades telepáticas entre um e outro. Sensata, portanto, a
providência de requisitar a opinião expressa dos mandantes na eventualidade de
sérias divergências entre os mandatários.
31
Mencionando plebiscitos e referendos como expressão da opinião dos mandantes,
vislumbra o autor a possibilidade de “descompasso, ou melhor […] aparente desencontro
entre a opinião do público e a preferência da maioria parlamentar”.
32
Acresce Santos, ainda,
que:
O parlamento vem a ser precisamente o lugar em que são expostos argumentos
contraditórios, em que se processa a persuasão de uns, a reconsideração de outros e a
deliberação que, afinal, raramente corresponde imaculadamente a alguma das
opiniões originárias. A opinião expressa em plebiscito escapa ao contraditório,
estando contaminada por maior probabilidade de celebrar um erro entre todas as
opiniões possíveis. O senso comum compartilha com os ideólogos a ilusão de que o
número assegura a qualidade de uma opinião, mas não conexão necessária entre
uma coisa e outra. O número atribui poder causal, dele decorrendo, figuradamente, a
força desta. Por isso mesmo, a substituição das instituições representativas e
parlamentares por mecanismos deliberativos sem mediação equivaleria a transferir
poder causal, produtivo, a preferências sustentadas sem o filtro do confronto
argumentativo.
33
Conclui Santos:
Não como recorrer de decisões plebiscitárias. Os perdedores em tais decisões são
perdedores absolutos. Além disto, não se supõe legítimo submeter aos parlamentos
propostas contrárias aos resultados dos plebiscitos […] Uma sucessão de escolhas
plebiscitárias daria lugar à constituição de um contingente de cidadãos condenados
ao silêncio por tempo indeterminado. Na verdade, o mecanismo se converteria em
uma fábrica de ostracismo ideológico. Uma parcela da população, suficientemente
homogênea, seria capaz de impor, sem a mediação do confronto argumentativo
parlamentar, o exílio interno dos dissidentes minoritários […] mecanismos
complementares da democracia direta […] entretanto, devem permanecer
submetidos ao confronto conciliatório tendo em vista a capacidade produtiva
(destrutiva) que detêm. São instrumentos relevantes e potencialmente úteis, sem
dúvida. Mas são essencialmente, omnifuncionais, tanto servem à democracia como
podem beneficiar tiranias […]
34
30
BONAVIDES, Paulo, op. cit., 2007, p. 499.
31
SANTOS, Wanderley Guilherme dos, op. cit., 2007, p. 7.
32
SANTOS, Wanderley Guilherme dos, op. cit., 2007, p. 7.
33
SANTOS, Wanderley Guilherme dos, op. cit., 2007, p. 8.
34
SANTOS, Wanderley Guilherme dos, op. cit., 2007, p. 9-10.
33
No cotejo entre a proposta reformista de Bobbio, dirigida à democracia representativa,
com ampliação dos centros de poder até então excluídos, e a sua compreensão da limitação da
sociedade nos grandes aglomerados, a partir do século XX, de fazer valer a vontade geral
diretamente pelos mecanismos existentes e à disposição da democracia participativa
35
(referendos, assembleias de cidadãos, plebiscitos, vetos e consultas populares, orçamentos
participativos, recall, propostas legislativas populares, dentre outros), escapava ao visionário
da democracia futurista, por limites temporais, as novas realidades com as quais o poder,
enquanto mito simbólico, viria delas se apropriar, ou porque não dizer, idealizar, como forma
de propor uma nova dimensão ao percurso da dominação.
Trata-se da tecnologia interativa e digital, da virtualidade da realidade, dos votos e
consultas eletrônicos e instantâneos, adotados em todos os quadrantes da convivência
humana, da internet como rede universal de conexão da informação, do fetiche
consumológico, dos seres pré-construídos, reprogramados, reconstruídos e planejados
biologicamente, da opinião pública e publicada,
36
das inteligências artificiais, dos home-work,
dos controles estatísticos compulsivos e substitutivos da subjetividade, da volatilidade e
ciclotimia dos mercados e das matrizes dos desejos e das paixões humanas, das
emergencialidades bionaturais (fome, sede, oxigênio, controles climáticos, tragédias
ambientais, etc.), do bombardeio da informação e da contrainformação, enfim, de tudo aquilo
que a ciência e a imaginação humanas têm aceleradamente transformado de ficção em
realidade objetiva. Parece configurar-se o que Ribeiro sintetizou com a observação de que
“nenhuma realidade cabe nas versões e formatos que o homem criou para digerir o mundo e a
si próprio”.
37
Ao contrapor-se toda essa parafernália aos obstáculos outrora reconhecidos para a
operacionalização da vontade geral pela via democrática direta, não se está apologizando,
35
“Quanto ao referendo, que é o único instituto de democracia direta de concreta aplicabilidade e de efetiva
aplicação na maior parte dos estados de democracia avançada, trata-se de um expediente extraordinário para
circunstâncias extraordinárias. Ninguém pode imaginar um estado capaz de ser governado através do contínuo
apelo ao povo: levando-se em conta as leis promulgadas a cada ano na Itália, por exemplo, seria necessário
prever em média uma convocação por dia. Salvo na hipótese, por ora de ficção científica, de que cada cidadão
possa transmitir seu voto a um cérebro eletrônico, sem sair de casa e apenas apertando um botão”. BOBBIO,
Norberto, op. cit., 1986, p. 53-54.
36
“A opinião pública não existe em estado natural. Ela é construída a partir de sentimentos e expressões
verbalizadas e traduz um certo estado de espírito, a percepção do sentir-se bem ou descobrir-se marginalizado,
como pessoa e cidadão […] Para Bourdieu, a opinião pública não existe; resulta de uma relação que se realiza
entre os que emitem uma opinião e a percepção dos que a vêm conhecer, por via de uma leitura feita por
mediadores de todo o gênero […] Nunca a opinião pública pareceu representar papel tão importante na
democracia quanto em nossos dias […] MENEZES NETO, Paulo Elpídio de. Quem faz a opinião pública. O
Povo, Fortaleza, 28 set. 2008, p. 7.
37
RIBEIRO, Regina. A teoria das cebolas. O Povo, Fortaleza, 16 out. 2008, p. 6.
34
como consequência, a certeza do atingimento, somente pelo voto individual e instantâneo, da
real e concreta satisfação das necessidades materiais e da realização efetiva e plena dos
direitos fundamentais do gênero humano, até porque, em muitas ocasiões, ainda é no
burburinho das propostas pré-elaboradas que surge a fórmula adequada para o resultado útil.
Santos localiza em Rousseau essa preocupação:
O parágrafo relevante sobre a concepção algébrica da vontade geral encontra-se no
capítulo III, do Livro II do Contrato e diz o seguinte: ‘Há freqüentemente muita
diferença entre a vontade de todos e a vontade geral; esta não visa senão o interesse
comum, a outra contempla o interesse privado e não mais do que a soma dos
interesses particulares: mas retirem dessas mesmas vontades o mais e menos que se
entredestroem e restará pela soma das diferenças o interesse geral’.
38
Ademais, se pesa contra a democracia representativa a crítica do seu esvaziamento por
conta da manipulação dos centros de poder parlamentar ou do seu conformismo, manifestado
por um governismo suspeito, inerte e opressor do dissenso político, – o governo da oposição –
não é tão segura a ideia de que a vontade geral, manifestada diretamente, principalmente no
âmbito das grandes complexidades que envolvem aspectos da soberania interna e externa,
também não sofreria a influência dos mesmos manipuladores. Para Xavier:
A democracia aparece nos debates contemporâneos como uma idéia transtemporal,
como modalidade particular de encenação política, produzindo uma aparência de
que todos os partidos políticos, movimentos sociais e seus membros são
democráticos. Porém, o que esse fenômeno negligencia é a dimensão experimental
da democracia, o fato dela ser inerente às lutas concretas, às disputas de interesses e
às agonias da conjuntura política.
39
Esse caráter transtemporal, transcendente ou experimental da democracia talvez seja um
elemento importante para a retomada no cenário atual, da ideia de democracia direta, nos
limites em que a institucionalidade comportar, com a relatividade possível, diferente da ideia
absoluta que se estabeleceu na polis grega. Os obstáculos procedimentais foram vistos
como contornáveis ou de riscos semelhantes ao da democracia representativa. A sua prática
não implicaria o abandono dos diálogos parlamentares nas questões para as quais uma nova
ordem possa reservar o espaço necessário. Bonavides, mais veemente na ideia, entende que:
Uma democracia desse quilate e teor, em que cada lei e cada ato administrativo de
superior interesse público ficam sujeitos à iniciativa e à sanção do povo dirigente,
fará que alguns sobreviventes do sistema representativo assumam ainda, no contexto
do regímen, uma função útil, mas meramente auxiliar, instrumental e subsidiária,
provavelmente de segundo ou terceiro grau.
Nesse caso, se houver ainda mandatos parlamentares, seu exercício não poderá
esquivar-se jamais a um controle popular absoluto, traduzido inequivocamente na
38
SANTOS, Wanderley Guilherme dos, op. cit., 2007, p. 56, nota 14.
39
XAVIER, Uriban. Democracia: modo de vida. O Povo, Fortaleza, 23 set. 2008, p. 7.
35
completa imperatividade do respectivo mandato popular. Sujeita-se assim o agente
infiel e transgressor da vontade do povo à destituição pelos mecanismos peculiares a
essa forma de democracia.
[…]
Cada ato de deliberação e produção legislativa de maior importância não se efetivará
sem a certeza de que o elemento popular poderá ser sempre e eficazmente o juiz que
há de sentenciar a aprovação ou derrogação das decisões tomadas. Todos os grandes
atos da vida política serão assim referendados pelo povo em última instância.
40
A democracia direta proposta por Bonavides “não se confunde com os seus próprios
meios instrumentais […] com o formalismo nem tampouco com a materialidade de suas
técnicas […] postula […] a legitimidade fundamental e substancial do processo político
[…]”
41
O Poder Judiciário, nesse contexto, foi um agente importante para a consolidação do
Estado social e a superação de suas crises. A carta de princípios e valores fundamentais
inseridos nos textos constitucionais seria, pouco a pouco, interpretada e efetivada pela nova
hermenêutica. O Judiciário, por seus membros, não seria mais a boca da lei, mas
acrescentaria um discurso principiológico ao texto normativo, dando efetividade à regra
estática.
O Poder Legislativo, embora passível de renovações constantes, continuava inerte em
sua função legiferante emergencial, como se os grupos de poder representassem apenas a
extensão das mesmas oligarquias governativas, partidárias
42
e familiares.
43
A renúncia tácita a impor-se como legislador efetivo das transformações sociais
aceleradas abriu flancos nesse Poder, que foram ocupados pelo governo do Executivo, com a
parcimônia sobre as Medidas Provisórias e o preenchimento das lacunas legais, pelo Poder
Judiciário. “Fora da hermenêutica não há Direito nem Ciência do Direito; tampouco há
Constituição ou Direito Constitucional”, acrescenta Bonavides.
44
A atuação do Supremo Tribunal Federal como “Tribunal Constitucional, colégio
legislador de primeiro grau e espécie de constituinte de plantão”
45
, é identificada como
40
BONAVIDES, Paulo, op. cit., 2007, p. 500.
41
BONAVIDES, Paulo, op. cit., 2007, p. 505.
42
Sobre a necessidade de se criar “cláusulas de desempenho para regular o funcionamento dos partidos e sua
representação nas instituições da democracia”. CAMPOS, Fábio. Eleição vai firmar grupo de partidos no Brasil.
O Povo, Fortaleza, 18 set. 2008, p. 18.
43
Sobre o tema CARVALHO, Erivaldo. A família como extensão do poder no Ceará. O Povo, Fortaleza, 4 ago.
2008, p. 21.
44
BONAVIDES, Paulo, op. cit., 2007, p. 510.
45
BONAVIDES, Paulo. O futuro da Constituição está na democracia participativa. Diário do Nordeste,
36
consequência da inércia do Poder Legislativo e como forma de rivalizar com a hipertrofia do
Poder Executivo. Afirma Bonavides:
Porquanto, ao dizer o que é a Constituição, em certa maneira, não raro está a legislar
com mais rapidez, aliás, que as duas casas do Congresso, podendo a esse respeito,
rivalizar com o Executivo, na velocidade com que este expede medidas provisórias.
Mas a decadência congressual e executiva é tamanha no país pelas increpações de
corrupção e por escândalos que cercam tanto o Legislativo como o Executivo, que
estes dois Poderes, dado que tenham origens mais democráticas, perderam, todavia,
em decorrência portanto de razões morais, maior parcela de credibilidade que a
‘constituinte togada’. A meu ver, enquanto não se fizer mais legítima, mais
autêntica, mais democrática, a ação governativa do Executivo e do Legislativo, o
que unicamente se obterá com o cidadão governante da democracia participativa no
topo do exercício efetivo da soberania, o regime estará mais bem protegido e
resguardado com os arestos legislativos dos ministros do Supremo.
46
Sobre essa interferência do Judiciário nos outros Poderes, o atual presidente do
Supremo Tribunal Federal respondeu à crítica, esclarecendo:
[…] esse é um desejo trazido pela própria Constituição. Segundo ele, na inércia do
Legislativo, o Judiciário está sendo obrigado a enfrentar questões que não estão no
ordenamento jurídico, como foi o caso da greve dos servidores públicos e do tempo
de aposentadoria nas atividades insalubres.
47
Esse novo Poder Judiciário que surgiu com a Constituição Federal de 1988 precisa
implementar, na sua dimensão política e jurídica, “o controle final e supremo do povo em
todas as instâncias do poder”,
48
adotando “o princípio democrático erigido à categoria de
direito fundamental”,
49
preenchendo lacunas e contendo excessos dos demais Poderes, o que é
natural existir na construção de um processo democrático civilizatório, porém, também deverá
conciliar essas novas funções, das quais foi alijado ao longo da história construtora do Estado,
com a sua própria abertura ao princípio da democracia participativa, promovendo e
operacionalizando o acesso à justiça; à participação popular, isolada ou conjunta, na prestação
jurisdicional, reconhecendo que na sociedade de massas e pluralista do século XXI, “o
processo de inclusão social é decisivo e parece ser a senha para entender essa transformação
no capitalismo e na democratização da América Latina e sua integração ao mundo global”.
50
A democratização no Poder Judiciário não implicará a perda de sua função jurisdicional,
nem das garantias de seus membros – juízes em todos os graus – e não afetará o seu
Fortaleza, 31 ago. 2008, p. 4.
46
BONAVIDES, Paulo, op. cit., 2008, p. 4.
47
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Passado e futuro do direito brasileiro se encontram em seminário
no STJ. Disponível em: <http://www.stj.gov.br/portal_stj/pubicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=89072>.
Acesso em: 18 out. 2008.
48
BONAVIDES, Paulo, op. cit., 2007, p. 517.
49
BONAVIDES, Paulo, op. cit., 2007, p. 517.
50
PARENTE, Josênio. Democracia de massa. O Povo, Fortaleza, 12 abr. 2008, p. 5.
37
autogoverno, mas contribuirá para que, podendo o povo exercer o seu poder soberano, por
meio de representantes eleitos, ou diretamente, nos termos da Constituição Federal, elegendo
juízes em todas ou em algumas instâncias específicas, ou ainda, corroborando com os meios
atuais de recrutamento dos magistrados, promova o aperfeiçoamento do Estado democrático
participativo e reconheça o outro enquanto gênero humano.
Isso é uma expectativa e procurar-se-á teorizar nos capítulos seguintes, reconhecendo
vantagens nos modelos atuais, criticando posições obsoletas, redimensionando ideias antigas e
sugerindo modificações razoáveis. Possivelmente, ao final, possa-se concluir, com a
perplexidade de Lessa que,
[…] talvez a democracia não tenha uma teoria. A democracia é um desses acasos
históricos, uma coisa que aconteceu em alguns países, que foi copiada em outros.
Não é de modo algum um conceito universal. Ela é um evento histórico, datado,
específico de certas sociedades […] No máximo o que é um conjunto de
expectativas nossas com relação à democracia. Expectativas, temores e apostas, sem
as quais não vivemos, que por razões pragmáticas e retóricas designamos como
teorias.
51
Outra hipótese é aceitar que ainda não se chegou ao fim da história, e que as
expectativas, as experiências e as ações humanas são ilimitadas e imprevisíveis.
51
LESSA, Renato de Andrade, op. cit., 2002, p. 54.
2 CONCEITUAÇÃO PRÉVIA DE INSTITUTOS, PRINCÍPIOS E
GARANTIAS: A CONSTRUÇÃO DA PROBLEMÁTICA
DEMOCRÁTICA NO PODER JUDICIÁRIO
No desenvolvimento desta dissertação serão abordados alguns temas que se apresentam
doutrinariamente como institutos próprios, princípios e garantias, que se inter-relacionam e
são necessários à compreensão deste trabalho.
Embora cada um deles pudesse ser objeto de um estudo independente, gerando
dissertações específicas, procurar-se-á firmar agora uma conceituação básica para facilitar a
assimilação do ponto central deste estudo, que é a constatação, a defesa e a ampliação do
exercício da soberania popular no processo de democratização e legitimação externa e interna
da função judiciária.
Para tanto, este capítulo tratará de conceitos sobre jurisdição, independência do
Judiciário e do juiz, imparcialidade e neutralidade do juiz e, por fim, legitimidade do Poder
Judiciário.
2.1 Jurisdição
Rocha afirma que:
a compreensão do Poder Judiciário requer uma prévia definição da jurisdição uma
vez que o Poder Judiciário se define, substancialmente, em razão do que faz, isto é,
em razão do exercício da função jurisdicional, configurando-se, assim, como o
Poder do Estado a quem compete o exercício da função jurisdicional.
1
Continua Rocha, afirmando, ainda, que o conceito de jurisdição é empírico, quanto à
sua origem, assim como os conceitos jurídicos, que são obtidos através da abstração
1
ROCHA, José de Albuquerque. Estudos sobre o Poder Judiciário. São Paulo: Malheiros, 1995, p. 9.
39
generalizadora, quanto à extensão, sendo um conceito geral, que é obtido por abstração das
particularidades das jurisdições concretas.
2
Na elaboração da ideia conceitual de jurisdição, o autor relaciona critérios da literatura
jurídica referentes ao objeto (solução de conflitos), ao sujeito (realização pelos membros do
Poder Judiciário), à forma de atuação (o processo) e à substituição de atividades (substituição
das partes no pronunciamento sobre situação jurídica alheia).
3
Nesse trajeto construtor, Rocha também ressalta o aspecto relativo desses liames
identificatórios, colacionando exceções e críticas a todos eles.
Correlacionando Estado, Direito, Sociedade e conflito como pressupostos necessários
para conceituar a jurisdição, Rocha destaca o papel daquele nas modernas sociedades
industriais, fragmentadas em classes, grupos e corporações, com seus múltiplos interesses,
sendo necessárias forças de coesão e de coerção para a solução de conflitos e a
implementação de decisões.
Para tanto, com apoio em Kelsen, o autor realça, no processo de conceituação da
jurisdição, a função estatal de criação e aplicação de normas, preponderando esta sobre
aquela, considerando a função de concreção terminal do direito e o processo de individuação
do sistema jurídico, prevalecendo na aplicação o princípio da legalidade sobre o princípio
democrático, este, presidindo, essencialmente, a fase criativa do Direito.
4
Em defesa do monopólio da jurisdição pelos órgãos do Judiciário, como um complexo
orgânico unitário, regido por um estatuto comum, Rocha atribui a essa centralidade o primeiro
traço tipificador da função jurisdicional na Constituição, fundamentado no Art. 5º, incisos
XXXV e XXXVII, e no Art. 92, ambos da Carta Federal, salvo as exceções previstas no
próprio Texto.
Para que essa função estatal seja efetiva e confiável, satisfazendo as necessidades de
certeza e segurança jurídicas, entende o doutrinador que a jurisdição como instância que
realiza as funções de interpretar e aplicar as normas jurídicas deve agir coativamente e de
2
Ibid., 1995, p. 18.
3
Ibid., 1996, p. 18.
4
Ibid., 1996, p. 22.
40
modo terminal, transformando as proposições normativas abstratas e gerais em disciplina
efetiva de fatos concretos e reais, estendendo-se aos processos cautelar e executório.
5
Rocha, ao sustentar ser a jurisdição monopólio dos membros do Judiciário, salvo as
exceções expressas na Constituição, agrega também a esse conceito certas prerrogativas dos
sujeitos exercentes dessa função (independência e imparcialidade), as quais, por metodologia
deste estudo, serão abordadas em tópicos separados.
Por fim, alude o autor também às garantias das partes, no conteúdo conceitual de
jurisdição, acostando como elemento estrutural na atuação do poder estatal o princípio do
devido processo legal (Art. 5º, inciso LIV, da Constituição Federal), projetando-o através do
princípio do contraditório e do princípio da igualdade processual, essencialmente.
Portanto, em síntese de todos esses elementos constitutivos, Rocha conceitua jurisdição,
no Direito brasileiro, como a “função de atuação terminal do direito, realizada por órgãos do
Judiciário independentes e imparciais, decidindo conflitos de interesses através do devido
processo legal”.
6
Excluído desse conceito está, para o autor, a jurisdição voluntária, por entender não
tratar-se de atividade jurisdicional propriamente dita, porque não visa a concluir
definitivamente o processo de efetivação do Direito e não tem por objeto um conflito de
interesses, dentre outras diferenças.
Zaffaroni, admitindo que o Judiciário, como outras instituições, não tem uma só função,
afirma que:
A função judiciária é a ‘jurisdição’, ou seja, ‘dizer o direito’, como um terceiro que
esteja situado ‘supra partes’, diante de um conflito, mas, na realidade isto não passa
de um simples sinal da essência da função judicial, sem constituir uma descrição de
sua complexidade e menos ainda de sua dimensão política.
É inquestionável que dirimir conflitos entre pessoas é uma função judicial, mas isto
não serve para caracterizá-la, porque há outros órgãos do Estado que fazem o
mesmo, sem contar os muitos particulares que também o fazem. De toda forma, não
dúvida de que dirimir conflitos é uma função judicial e que é necessário que os
cidadãos gozem de um eficaz serviço judiciário e de um amplo acesso a ele […]
7
5
ROCHA, José de Albuquerque, op. cit., 1995, p. 23-25.
6
Ibid., 1995, p. 34.
7
ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Poder Judiciário: Crise, Acertos e Desacertos. Tradução de Juarez Tavares. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. 35.
41
Rodrigues entende a jurisdição como a função estatal que tem por escopo atuar o direito
e garantir sua eficácia, de forma imparcial e, em última instância, no caso concreto, quando
provocada.
8
Liebmann
9
conceitua jurisdição como “o poder que toca ao Estado, entre as suas
atividades soberanas, de formular e fazer atuar praticamente a regra jurídica concreta que, por
força do direito vigente, disciplina determinada situação jurídica”.
Enfim, no desenvolvimento deste trabalho, serão abordadas exceções previstas pela
Constituição Federal, com caráter substitutivo da jurisdição estatal, mesmo quando
conflitos de interesses na composição de litígios, em torno de bens patrimoniais ou de direitos
disponíveis entre pessoas maiores e capazes, como é o caso da arbitragem, cuja decisão final,
chamada sentença arbitral, produz entre as partes e seus sucessores os mesmos efeitos da
sentença proferida pela jurisdição prestada pelo Poder Judiciário (Art. 31, da Lei n.º
9.307/96), configurando, por si, exemplo de quebra do monopólio estatal da prestação
jurisdicional, salvo quanto à sua implementação coercitiva. Nesse sentido, confira-se
Carmona:
Por outro lado, considerando que a função do árbitro não difere substancialmente
daquela desempenhada pelo juiz estatal, foi inserido na lei o disposto no Art. 17,
equiparando árbitros e funcionários públicos para os efeitos da legislação penal.
[…]
O Art. 32 determina que a decisão final dos árbitros produzirá os mesmos efeitos da
sentença estatal, constituindo a sentença condenatória título executivo que, embora
não oriundo do Poder Judiciário, assume a categoria de judicial. O legislador optou,
assim, por adotar a tese da jurisdicionalidade da arbitragem, pondo termo à atividade
homologatória do juiz, fator de emperramento da arbitragem. Certamente,
continuarão a surgir críticas, especialmente de processualistas ortodoxos que não
conseguem ver atividade processual muito menos jurisdicional fora do âmbito da
tutela estatal estrita.
10
E continua Carmona:
Para rebater a idéia tacanha de jurisdição, não há lição mais concisa e direta que a de
Giovanni Verde: ‘A experiência tumultuosa destes últimos quarenta anos nos
demonstra que a imagem do Estado onipotente e centralizador é um mito, que não
pode (e talvez não mereça) ser cultivado. Deste mito faz parte a idéia que a justiça
deva ser administrada em via exclusiva pelos seus juízes’.
8
RODRIGUES, Horácio Wanderlei. O Poder Judiciário no Brasil. In: Cadernos Adenauer III, (2002), n. 6, O
terceiro poder em crise: impasses e saídas. Rio de Janeiro: Fundação Konrad Adenauer, fev. 2003, p. 13, nota 1.
9
LIEBMANN, Enrico Tullio. Manuale di Diritto Processuale Civile. Reimpressão da 2. ed. Milão, 1968, v. I,
n. 1, p. 3 apud THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil: procedimentos especiais. 38.
ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007. v. I, p. 38.
10
CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e processo: um comentário à Lei n.º 9.307/96. 2. ed. São Paulo:
Atlas, 2004, p. 42-45.
42
[…]
O conceito de jurisdição, em crise muitos anos, deve receber novo enfoque,
para adequar-se a técnica à realidade. É bem verdade que muitos estudiosos ainda
continuam a debater a natureza jurídica da arbitragem, uns seguindo as velhas lições
de Chiovenda para sustentar a idéia contratualista do instituto, outros preferindo
seguir idéias mais modernas, defendendo a ampliação do conceito de jurisdição, de
forma a encampar a atividade dos árbitros; outros, por fim, tentam conciliar as duas
outras correntes.
[…]
O fato que ninguém nega é que a arbitragem, embora tenha origem contratual,
desenvolve-se com a garantia do devido processo e termina com ato que tende a
assumir a mesma função da sentença judicial.
11
Nessa hipótese e noutras que se abordarão ao longo desta dissertação, tem-se por
substituída ou mitigada a função jurisdicional estatal na formação do título judicial, muitas
vezes relegada aquela tarefa a atividade meramente homologatória, em jurisdições
voluntárias, e nas contenciosas com resultados conciliatórios ou transacionais, assim como
naquelas em que a soberania dos veredictos apenas impõe uma decisão técnica, condicionada,
em sua moldura, ao juízo valorativo impresso pelo Conselho dos Heliastas.
Nesse viés é que se percebe, mesmo que ainda precariamente, forte incursão ampliativa
da soberania popular na co-prestação da jurisdição, total ou parcialmente, não se podendo
mais, em caráter absoluto, atribuir à função estatal o caráter de atuação terminal do Direito,
salvo se necessária a coação para a sua efetiva implementação, poder este ainda exclusivo do
Estado.
2.2 Independência do Judiciário
Para reforçar a separação de funções do Poder do Estado, o constituinte imprimiu a essa
distribuição as ideias de independência e harmonia. Diferente da independência institucional
do Judiciário,
12
no entanto, é a do agente, pessoa física e individual que integra aquele Poder.
Divide-se a independência do Judiciário em independência política e independência
administrativa. A independência política decorre da relação com o poder estatal, tem como
finalidade a defesa de sua liberdade contra o próprio poder político ilimitado e garante o
controle da constitucionalidade dos atos das outras duas funções da soberania do Estado, a
legislativa e a executiva.
13
11
Ibid., 2004, p. 45-46.
12
C.F./1988, op. cit., (Art. 2º).
13
ROCHA, José de Albuquerque, op. cit., 1996, p. 111.
43
A independência administrativa é o autogoverno da Magistratura, que lhe assegura
competência de autogestão administrativa, financeira, orçamentária e disciplinar.
14
Essa independência, que em relação aos demais Poderes do Estado lhe assegura
identidade própria, no plano interno é exercida de forma concentrada e autocrática, com pouca
democratização, sendo mínima a participação dos membros do Judiciário os magistrados -,
que têm baixa interferência nas decisões que lhes atingem, assim como a dos consumidores e
operadores do aparelho judicial jurisdicionados, servidores auxiliares e advogados -, que
pouco opinam ou são ouvidos no aperfeiçoamento desses serviços.
Como toda expressão de poder, o Judiciário também se sujeita a limites na sua
independência. Esses limites são exercidos pelos outros Poderes, de forma constitucional e
política. Assim é que o Presidente da República é quem escolhe e nomeia os Ministros do
Supremo Tribunal Federal e dos Tribunais Superiores. Quanto aos juízes dos Tribunais
Regionais Federais, dos Tribunais Regionais do Trabalho e os egressos da advocacia, junto
aos Tribunais Regionais Eleitorais, também é o chefe do Poder Executivo Federal quem os
nomeia. Nos Estados e Distrito Federal, são os governadores quem escolhem e nomeiam
alguns membros do Poder Judiciário estadual, que ingressam nas Cortes da Justiça Comum
preenchendo as vagas reservadas ao quinto constitucional. No caso dos membros dos
Tribunais Superiores e Supremo Tribunal Federal, ainda é necessária a aprovação da maioria
absoluta do Senado Federal, demonstrando também a incursão do Poder Legislativo.
Um segundo limite à independência do Judiciário dá-se pela dependência deste Poder de
uma Polícia Judiciária vinculada e subordinada ao Poder Executivo, tanto na esfera federal
quanto na estadual. Não havendo uma polícia própria, a força coercitiva da jurisdição fica à
mercê do Comando do Poder Executivo, no plano operacional, resultando, por vezes,
conflitos entre Poderes, principalmente em relação às ordens judiciais dirigidas contra a
Administração Pública.
Outro nível de restrição à independência do Judiciário dá-se no plano do controle fiscal
e orçamentário pelo Legislativo, sendo que, neste último, também com controle do Executivo.
O controle legislativo fiscal opera-se através da Lei de Responsabilidade Fiscal, que impõe
limites aos gastos do Judiciário quanto às despesas com pessoal, em percentual equivalente a
6% das receitas correntes líquidas da União e dos Estados, respectivamente. A isso, acresça-se
14
C.F./1988, op. cit., (Arts. 96 e 99).
44
o limite prudencial imposto
15
no Art. 22, parágrafo único, da referida lei, que cria um subteto
para esse limite, reduzindo-o, na prática.
O controle orçamentário dá-se através dos Poderes Legislativo e Executivo. No primeiro
caso, mediante as tratativas que se desenvolvem durante a votação do orçamento. No
segundo, porque embora aprovada a versão final do orçamento, é o Poder Executivo o gestor
do Tesouro Estadual, ficando as liberações orçamentárias condicionadas ao seu crivo. Dallari,
a respeito, discorre:
Um sinal claro do desrespeito é o tratamento dispensado ao Poder Judiciário em
matéria orçamentária. Em primeiro lugar, a parte do projeto de lei orçamentária
relativa ao Judiciário, que este prepara e remete ao Executivo para integrar o projeto
geral do Estado, normalmente sofre cortes, às vezes substanciais, como se as
despesas ali previstas fossem supérfluas ou adiáveis. São raros os Estados em que
isso não ocorre […] E depois de aprovada a lei orçamentária não existe, de parte dos
chefes do Executivo de modo geral, a preocupação de entregar prontamente ao
Judiciário a parcela dos tributos a ele destinada […] Essa é uma conseqüência da
maldefinida aliança entre o chefe do Executivo estadual e a chefia do Judiciário, que
gerou a idéia de que os governadores dos Estados não precisam preocupar-se em
cumprir com rigor suas obrigações constitucionais para com o Tribunal de Justiça,
pois este será sempre dócil e cooperativo.
16
2.3 Independência do juiz
Para Zaffaroni, não se há de confundir a independência moral ou ética, algo individual e
da consciência, sobre a qual o direito apenas possibilita a sua formação, com a independência
jurídica do juiz, aquela garantia de que o magistrado não estava submetido às pressões
externas ao Poder Judiciário, nem às internas, do próprio Poder.
17
Rocha entende que a independência do juiz deve envolver a independência funcional e a
independência estatutária ou administrativa. Por independência funcional, refere-se, como
Zaffaroni, às interferências internas e externas. A título de interferências administrativas ou
estatutárias, menciona o risco de subordinação administrativa do juiz a outros núcleos de
poder.
18
Ambos os autores são unânimes na crítica à estrutura militarizada, hierarquizada e
verticalizada da organização do Poder Judiciário, que estabelece uma relação de subordinação
administrativa no sistema de promoções entre os juízes de Primeiro e Segundo Graus.
15
Art. 20, I-b e II-b, da Lei Complementar n.º 101, de 04 de maio de 2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal).
16
DALLARI, Dalmo de Abreu, op. cit., 2007, p. 144.
17
ZAFFARONI, Eugenio Raúl, op. cit., 2007, p. 87-88.
18
ROCHA, José de Albuquerque. Teoria Geral do Processo. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 1996, p. 144.
45
Nesse sentido, entendem que a independência funcional é atingida pela dependência
administrativa, uma vez que a estrutura tecnoburocrática característica da Magistratura no
Brasil, com cargos escalonados em carreiras, proporciona o desenvolvimento do que Rocha
denomina de “pequena oligarquia dos tribunais”
19
e Zaffaroni, de “corpos colegiados que
exercem uma ditadura interna”.
20
Contra essa estrutura verticalizada, conhecida como bonapartista ou napoleônica,
propõe Zaffaroni um modelo horizontal, que reconheça “igual dignidade a todos os juízes,
admitindo como únicas diferenças jurídicas aquelas derivadas da diversidade de
competência”.
21
É verdade, frise-se, que a instituição de critérios objetivos para promoções de juízes, o
advento dos controles exercidos pelo Conselho Nacional de Justiça e a possibilidade, sempre
presente, de promoções por antiguidade, em grau de alternância às promoções por
merecimento, arrefecem as críticas formuladas, mantendo um espaço reservado contra os
eventuais desvios.
No plano da independência externa do juiz, uma série de aspectos que se relacionam
à sociologia, envolvendo o relacionamento do juiz com o meio social em que vive, as mídias,
as atividades acadêmicas, associativas e filantrópicas, enfim, um conjunto de elementos que
integram a sua personalidade, incluídas aí, também, as suas inclinações políticas.
Os regimes ditatoriais se organizaram sob o manto da força e da supressão das
individualidades e subjetividades. E foram poucos, até então, os lapsos de convivência em um
Estado Democrático de Direito, desde o início da independência desta nação.
Com o constitucionalismo moderno e as pressões internacionais por mais respeito aos
Direitos Humanos, às liberdades de expressão e com a adoção de um rol mínimo de garantias
fundamentais, individuais e coletivas, o positivismo legal perdeu espaço para a sua vertente
principiológica e o Judiciário caminhou no mesmo sentido, adotando um viés mais realista e
menos abstrato na interpretação da norma jurídica.
19
Ibid., 1996, p. 149.
20
ZAFFARONI, Eugenio Raúl, op. cit., 1995, p. 89.
21
ZAFFARONI, Eugenio Raúl, op. cit., 1995, p. 89.
46
Esse comportamento influenciou os magistrados à proximidade com a sociedade,
desenvolvendo toda a sua pluralidade enquanto indivíduos inseridos no contexto dos
problemas a eles submetidos.
O juiz, reservado e absorto, começou a falar, a apresentar-se na imprensa, a expressar-se
não como a boca da lei, mas escutando, auscultando, vendo e sentindo, mais próximo da
problemática social.
Desafeiçoado a essa abertura, surgiram os riscos da superexposição e as dificuldades
para a manutenção da razoável distância, necessária ao não comprometimento de sua
independência.
Acresça-se a isso a percepção de que, sendo uma expressão da soberania estatal, o Poder
Judiciário também é um poder político e, como tal, deve buscar todas as formas consentidas
pelo ordenamento jurídico para a solução dos conflitos, dentre elas, a conciliação e a
transação.
Para conciliar é preciso comunicar-se. Essa comunicação, quando se no plano dos
direitos individuais, assume uma postura mais intimista e reservada, a despeito da
publicidade, em regra, do processo.
O problema reside quando da abordagem das questões coletivas, dos direitos difusos,
homogêneos ou não. Surge, então, a prática das audiências públicas, nas quais a discussão das
questões aloja-se nas Ágoras específicas, conforme a temática. É uma espécie de preparação
para a formação de juízos valorativos, escutando e ouvindo a voz da sociedade.
Nesse espaço estão as grandes discussões, como as do aborto, interrupção da gravidez
de fetos anencéfalos, Lei de Biossegurança, terras indígenas, direitos de minorias,
inelegibilidade e corrupção eleitorais, dentre outras, com realização de audiências,
inaugurando essa nova fase de participação popular na antessala da jurisdição.
Assim, o juiz, acostumado apenas a falar nos autos, tem se pronunciado nesses debates
públicos, anunciando, por vezes, opiniões pessoais ou colegiadas, antecipando julgamentos e
decisões.
47
Afora isso, o Judiciário também tem incursionado em espaços até então reservados ao
Executivo e ao Legislativo, provocando insatisfação nos membros daqueles dois Poderes, que
o acusam de intromissão indevida.
Se para uns essa atitude do Judiciário é apenas exercício de sua função política prevista
na Constituição para efetivar direitos e garantias fundamentais, para outros é típica incursão
em assuntos alheios a sua competência, gerando crise institucional.
Como consequência do que se denominou de judicialização da política, a estrutura
orgânica desses poderes reage com a também denominada politização da justiça, como num
sistema de freios e contrapesos, em busca do equilíbrio.
Importante, portanto, que haja razoabilidade no exercício desse novo papel do Judiciário
e de seus membros, para que, ao se exporem perante a sociedade, os juízes não percam a
serenidade do debate; a equidistância necessária à imparcialidade; não antecipem decisões
ainda passíveis de amadurecimento pelo contraditório das partes; não frequentem os
noticiários além do necessário, competindo com as tradicionais manchetes; nem se deixem,
acima de tudo, ser cooptados pelo brilho dos salões e dos palácios, fartos de transeuntes
habilidosos na construção de vínculos que comprometem a isenção das consciências
julgadoras. Nesse sentido, lembra Roseno:
Por muitos anos, seguindo rigidamente os ditames da Lei Orgânica da Magistratura,
o Judiciário adotou uma postura extremamente cautelosa e discreta em relação à
divulgação de suas ações. Mas, ao dar as costas ao sentimento das ruas, corria
também o risco de ver a população dar as costas ao próprio Judiciário, e resolveu
mudar de atitude perante a mídia e a sociedade.
22
Conclui Roseno, afirmando que essa nova transparência é “certo modo de sair de um
extremo para outro”, entendendo ser desejável um certo equilíbrio “porque já há muitos
membros do Judiciário que adoram a mídia, o que também não está correto”.
23
Para assegurar no plano normativo e com status constitucional a independência do juiz,
a Constituição Federal previu garantias mínimas, quais sejam: vitaliciedade, inamovibilidade
e irredutibilidade de vencimentos.
A vitaliciedade, como uma das garantias constitucionais do juiz, é prevista no Art. 95,
inciso I, da Constituição Federal, sendo adquirida após dois anos de exercício da função de
22
ROSENO, Marcelo. In: NORÕES, Edilmar. Transparência. Diário do Nordeste, Fortaleza, 04 set. 2008. p. 3.
23
Ibid., 2008, p. 3.
48
magistrado, em se tratando do Primeiro Grau de jurisdição. No Segundo Grau, a vitaliciedade
é adquirida automaticamente, após o magistrado nomeado entrar em exercício.
A perda do cargo durante o período bienal que antecede a obtenção dessa garantia
pressupõe a deliberação do tribunal a que o juiz estiver vinculado, decisão administrativa esta
que deverá ser adotada pelo voto de 2/3 de seus membros efetivos.
24
Após a sua aquisição, a
perda do cargo dependerá de decisão judicial transitada em julgado, nada impedindo, porém,
que o juiz seja posto em disponibilidade remunerada, até o final do processo, o que
corresponde, na prática, a uma subtração provisória do seu exercício jurisdicional.
Por um aspecto, a exigência desse típico estágio probatório
25
seria algo até salutar para o
processo de aferição do desempenho funcional do juiz, como ocorre para os servidores
públicos civis, aos quais se atribui a estabilidade no cargo de provimento efetivo, provido por
concurso público, após três anos de efetivo exercício, somente perdendo o cargo em virtude
de sentença judicial transitada em julgado; mediante processo administrativo; e por meio de
procedimento de avaliação periódica de desempenho, na forma de lei complementar,
assegurada, em todos as situações, a ampla defesa e o devido processo legal.
26
O elemento distintivo dos dois exemplos é que, durante o período de estágio probatório,
o juiz presta a jurisdição e, portanto, necessita de independência em suas convicções jurídicas,
enquanto o servidor blico tem apenas relação de subordinação administrativa, devendo
antes, como depois de sua efetivação no cargo, agir conforme orientação de seu superior
hierárquico, salvo, para evitar transgressão legal; por reserva de consciência; ou, em
raríssimas hipóteses, quando lhe é dada a possibilidade de formar juízo valorativo.
Sendo assim, nesse período probatório, o juiz está monitorado não apenas pelas regras
objetivas que tem a cumprir, mas por seu perfil ideológico, suas convicções políticas e
associativas, suas manifestações públicas acerca da própria carreira e de suas nuances e sua
liberdade interpretativa em questões polêmicas.
As partes processuais mais sagazes, sabendo dessa semi-independência momentânea,
por vezes ameaçam juízes com representações junto ao Conselho Nacional de Justiça ou às
24
C.F./88, op. cit., (Art. 95, I) e Lei Orgânica da Magistratura Nacional, Art. 22, II, alíneas “a” a “d”. BRASIL.
Lei Orgânica da Magistratura Nacional (L.C.) 35, de 14 de março de 1979. Dispõe sobre a Lei Orgânica da
Magistratura Nacional. Disponível em: < http://www2.camara.gov.br >. Acesso em: 31 maio 2009.
25
Ibid., (Art. 93, VIII).
26
Ibid., ( Art. 41).
49
Corregedorias dos Tribunais, para alcançarem decisões mais conservadoras e rigorosamente
ortodoxas, próximas de uma inalterabilidade factual. Não é raro se ver notáveis modificações
de perfis ocasionalmente solícitos e momentaneamente conformados, tornando-se mais
autênticos, inovadores e criativos, após a aquisição da vitaliciedade.
Outro aspecto quanto à vitaliciedade, é o fato de que, no Segundo Grau de jurisdição,
essa garantia é automática e imediata ao exercício funcional. Até certo ponto, explica-se essa
diferenciação em relação ao Primeiro Grau, considerando que esses juízes quando ascendem
aos tribunais alcançaram a vitaliciedade. Os tribunais, porém, não são formados apenas de
juízes de carreira. também vagas para membros do Ministério Público e da Advocacia,
reservadas pelo quinto constitucional.
A justificativa de que os membros do Ministério Público já são vitalícios quando
escolhidos para os tribunais, devido ao longo tempo de exercício funcional, não é defensável,
considerando que o estágio a que se submeteram foi para um cargo distinto, com experiências
e atribuições diversas das inerentes à Magistratura.
Quanto aos advogados, maior razão não para esse diferencial, eis que, nem sempre
eles são egressos de cargos públicos anteriores e, ainda que o fossem, não há vitaliciedade nos
eventuais cargos reservados a funções advocatícias que, de resto, são cargos distintos dos
reservados a magistrados.
Portanto, o razoável seria que fosse extinto esse discrimen em relação aos juízes de
Primeiro Grau ou fosse estendida aos membros de tribunais egressos do quinto constitucional
a mesma regra imposta para vitaliciar juízes, avançando-se na democratização interna no
Poder Judiciário.
Atente-se, inclusive, para a possibilidade de que advogados e membros do Ministério
Público, que outrora tiveram pleitos negados por juízes não vitalícios, possam se encontrar,
posteriormente, na condição de magistrados relatores de processos de vitaliciedade desses
mesmos juízes, se acaso vierem a compor os tribunais a que estão vinculados esses
magistrados.
Isso é mais uma demonstração da condição de pouca independência a que está
submetido o juiz durante o período anterior à aquisição da vitaliciedade.
50
A inamovibilidade é outra garantia constitucional que contribui para o reforço da
independência do juiz, assegurando-lhe o direito de não ser removido ou promovido para
outra vara ou comarca, sem a sua anuência.
Isso implica dizer que mesmo a carreira na Magistratura se organizando em níveis
burocráticos e verticalizados, ao juiz é assegurado o direito de, empossado em uma comarca
ou unidade jurisdicional, permanecer até quando lhe aprouver, recusando promoções ou
remoções, mesmo em prejuízo de sua ascensão funcional, salvo se aposentar-se por ato
voluntário ou compulsório, for posto em disponibilidade, promovido ou removido no
interesse público (Art. 93, VIII, da Constituição Federal e Art. 45, I, da LOMAN).
Essa garantia evita que juízes sejam deslocados de uma região específica ou de varas
onde tramitem processos cujas partes estejam descontentes com decisões judiciais ou
tramitação de processos.
A irredutibilidade de subsídio, ressalvado o disposto nos Arts. 37, X e XI; 39, § 4º; 150,
II; 153, III e 153, § , I, da Constituição Federal, encerra o rol de garantias reservadas pelo
Art. 95 da Carta Política.
Com isso, também se quer preservar a remuneração pelo exercício da função
jurisdicional, contra represálias dos outros dois Poderes, e mesmo do próprio Judiciário, por
suas cúpulas.
O pagamento pelo trabalho do juiz não será objeto de barganha pelos Poderes que
interferem no orçamento público, nem pelos setores paraestatais de pressão política, daí é que
o constituinte estipulou regras que criam paradigmas remuneratórios no próprio Poder
Judiciário e proibiu acréscimos excepcionais aos limites delineados, assim como benefícios
fiscais e tributários privilegiados.
Um desses mecanismos de proteção ao subsídio percebido pelo juiz é a recomposição
do seu valor real, assegurando-lhe revisão anual e geral. Enfim, essas são garantias que
asseguram a independência do juiz no plano constitucional, sobre as quais se proporão
mitigações e ponderações no decorrer desta dissertação, a fim de se desenvolver ideias toantes
à dinâmica de democratização do Poder Judiciário.
51
2.4 Imparcialidade do juiz
Para Rocha, a imparcialidade no sentido objetivo consiste na “indiferença do juiz a
respeito das situações jurídicas objeto do processo”;
27
e no sentido subjetivo, na “eqüidistância
a respeito das partes em relação às quais a sentença opera efeitos”.
28
Rocha entende ser a imparcialidade “um dos atributos essenciais da atividade
jurisdicional”. Afirma ainda que:
[…] a imparcialidade só pode ser compreendida em seu pleno significado se a
considerarmos à luz da finalidade da jurisdição que […] é garantir a eficácia do
ordenamento jurídico, em última instância, no caso concreto […] a imparcialidade,
antes de ser um fim em si mesmo, não é outra coisa senão um meio para permitir a
realização daquela finalidade que constitui a essência da jurisdição. Com efeito, se a
finalidade da jurisdição é garantir a eficácia do próprio ordenamento jurídico e,
indiretamente, o interesse das partes, então o juiz tem a posição de um terceiro em
face das partes e dos interesses em conflito […]
Por conseguinte, a imparcialidade é um atributo derivado da finalidade assinada à
jurisdição, e não um atributo autônomo e independente […]
29
Sendo um atributo essencial da jurisdição, e considerando a tese encampada pelo
legislador acerca da jurisdicionalidade da arbitragem, é razoável admitir, e assim previu a lei
de arbitragem, que a imparcialidade também seja um atributo derivado da finalidade destinada
às formas de prestação jurisdicional não estatais ou não exercidas diretamente por um juiz
togado, investido da função de um poder estatal.
Assim é que, na arbitragem, o Art. 14 da Lei n.º 9.307/96 previu a adoção das mesmas
regras de impedimento e suspeição estipuladas no Código de Processo Civil para os juízes
togados. Rocha, no entanto, admite haver duvidosa constitucionalidade em relação à
competência do árbitro para julgar sobre a sua própria suspeição ou impedimento, “o que
violaria o princípio universal da imparcialidade do julgador, uma das garantias fundamentais
do devido processo legal assegurado na Constituição”.
30
Na verdade, a exceção de suspeição ou impedimento, a despeito de ser decidida pelo
próprio árbitro, nos órgãos arbitrais colegiados a decisão será do colégio e não de um árbitro
isolado, no caso, o Presidente, salvo expressa disposição das partes, em contrário.
27
ROCHA, José de Albuquerque. Teoria Geral do Processo. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2006, p. 81.
28
Ibid., 2006, p. 81.
29
Ibid., 2006, p. 81-82.
30
Ibid., 2006, p. 103.
52
Se ainda assim persistirem razões para a sustentação da parcialidade do árbitro, resta
ainda a possibilidade de se recorrer ao Poder Judiciário para postular a decretação de nulidade
da sentença arbitral prolatada com esse vício, sem prejuízo da responsabilidade civil e penal
do árbitro e da instauração de procedimento ético para apurar o seu desempenho.
31
A previsão da imparcialidade do árbitro na jurisdição arbitral está consignada,
expressamente, no § 6º do Art. 13 e no Art. 14 e seu § 1º da Lei n.º 9.307/96.
Portanto, mesmo na jurisdição que não é prestada diretamente pelo Estado, como no
caso da arbitragem, remanesce a ideia de imparcialidade como garantia para o seu exercício.
Uma abordagem da imparcialidade, como princípio geral informativo da jurisdição, no
âmbito dos processos civil e penal, e como direito fundamental subjetivo da parte a um
processo público, justo, équo e com todas as garantias, é desenvolvida por Souza, em tese de
doutorado sobre os aspectos da (im)parcialidade positiva e negativa do juiz.
32
Souza constata que, “na democracia, a confiança no correto exercício da atividade
jurisdicional […] é pressuposto indispensável para se alcançar o adequado e necessário clima
de pacificação social e convivência harmônica entre seus concidadãos”, afirmando que “a
garantia de que o processo será conduzido por um juiz ou magistrado imparcial, ou a
necessidade de que o julgador se situe como terceiro que irá valorar interesses alheios, é da
essência da atividade jurisdicional no Estado contemporâneo”.
33
Desconstruindo criticamente, consoante afirma o prefaciador de sua obra, o conceito de
imparcialidade judicial, propõe Souza a reconfiguração da aplicação processual desse
atributo, sob o prisma da (im)parcialidade positiva e da (im)parcialidade negativa do juiz,
procurando “romper com a perspectiva meramente formal e abstrata da imparcialidade do
juiz”, por entender, como Michel Mialle, que “o pensamento crítico parte da experiência de
31
Os Arts. 17 e 33 da Lei n.º 9.307/96, preveem a responsabilidade criminal do árbitro e as hipóteses de nulidade
da sentença, respectivamente. A responsabilidade civil do árbitro não está prevista especificamente nessa lei,
mas a doutrina no assunto e alguns órgãos arbitrais já inseriram em seus regulamentos previsões sobre essa
responsabilidade, a exemplo do Centro de Arbitragem da mara de Comércio Brasil/Canadá (no Art. 6.3) e do
Centro de Arbitragem da mara Americana de Comércio de São Paulo (Art. 7.1). CARMONA, Carlos Alberto.
Arbitragem e processo. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2004, p. 227.
32
Artur César de Souza é Juiz Federal vinculado ao Tribunal Regional Federal da Região, Pós-doutor pelas
Universidades: Universitá Statale de Milano - Itália, Universidade de Valência - Espanha e Universidade Federal
de Santa Catarina (UFSC).
33
SOUZA, Artur César de. A parcialidade positiva do juiz. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 19.
53
que o mundo é complexo: o real não mantém as condições da sua existência senão na luta,
quer ela seja consciente, quer inconsciente”.
34
Souza entende que “o conhecimento do juiz no processo não se por uma atitude
imparcial (passiva), mas pela interação do meio processual, das partes, e de sua própria
experiência do mundo que é construída e se deixa construir”. Nesse sentido, no plano
processual, a ideia de soberania democrática popular é destacada, em perfeita “harmonização
entre processo e democracia […] segundo os parâmetros de um processo público com todas as
garantias”.
35
Para Souza, a parcialidade positiva do juiz tem
por finalidade a efetivação material dos princípios fundamentais previstos na
Constituição Federal […] uma vez que os princípios constitucionais incorporam as
noções básicas da ordem jurídico-política, pode-se considerar que eles são mais que
simples normas jurídicas; na verdade, são verdadeiras ‘idéias forçasrepresentadas
pela síntese axiológica de um determinado complexo normativo.
A feição positiva do princípio da imparcialidade é resultado dessa síntese axiológica
de um determinado complexo normativo‘principiológico’ previsto na Constituição
Federal […] não é um fim em si mesmo, mas é estruturado apoiando-se mutuamente
nos outros princípios consagrados pelos textos constitucionais, entre eles, aqueles
que estabelecem os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil como
a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, e a erradicação da pobreza,
marginalização, reduzindo as desigualdades sociais e regionais.
36
Souza propugna por uma “parcialidade positiva do juiz como instrumento de superação
das desigualdades sociais, culturais e econômicas no processo penal ou civil, para além da
igualdade meramente idealista e formal”. Souza critica a via idealista da noção do direito e do
processo, afirmando que, assim, procura-se “sustentar um universalismo a-histórico e um
pluralismo de explicações”.
37
Para ele,
uma coisa é o idealismo de um processo penal ou civil que represente a aplicação
dos princípios democráticos, como o da igualdade, o da ampla defesa e o do
contraditório. Outra coisa bem diferente é a realidade concreta desse instrumento de
perfectibilização da tutela jurisdicional.
[…]
Em certas circunstâncias efetivamente a necessidade de se reconhecer as
diferenças para que se possa igualar […]
[…]
Reconhecer as desigualdades das partes, independentemente da posição que exercem
na relação jurídica processual, é de rigor, não para igualá-las, concretamente, pois as
diferenças sociais, culturais e econômicas sempre estarão presentes na realidade,
mas, sim, para permitir a realização de atos concretos e eficazes que possam atenuar
essa lamentável e indesejável circunstância da vida.
34
SOUZA, Artur César de, op. cit., 2008, p. 23.
35
SOUZA, Artur César de, op. cit., 2008, p. 194.
36
SOUZA, Artur César de, op. cit., 2008, p. 232-233.
37
SOUZA, Artur César de, op. cit., 2008, p. 202-203.
54
A alternativa para esse lamentável quadro da natureza humana é realçar a
parcialidade positiva do juiz, seja em relação ao réu ou mesmo em relação à vítima
do crime e à sociedade como um todo, a fim de que, por meios legítimos conferidos
pelo ordenamento jurídico, e que não são poucos, possa promover-se o
desenvolvimento da relação jurídica processual penal ou civil com base nos
princípios democráticos fundamentais previstos na Constituição Federal brasileira de
1988.
38
A imparcialidade também apresenta uma função negativa, qual seja, a “proibição de que
os juízes atuem no processo de forma a se inclinar em favor de determinada parte por
interesse pessoal ou qualquer fator discriminatório”.
39
Para tanto, regras de abstenção e
recusa previstas nos Códigos de Processo Civil e Penal, relativas à suspeição e ao
impedimento do magistrado. Nessas hipóteses, “a imparcialidade seria um requisito de
legitimação do juiz para sua participação no processo”.
40
A imparcialidade, embora não expressa no texto constitucional, decorre da
“densificação de um princípio constitucional ou como direito fundamental a um processo
público e com todas as garantias”.
41
Desse modo, ainda que não haja referência expressa no
texto constitucional, o § 2º do Art. 5º da Constituição Federal dispõe que os direitos e
garantias expressas na Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos
princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais ratificados pela República
brasileira.
A regra do § do Art. da Constituição Federal também acresce ao texto
constitucional tratados e convenções internacionais sobre Direitos Humanos, constando em
muitos deles a garantia da imparcialidade do juiz. São exemplos desses instrumentos legais: a
Declaração Universal dos Direitos Humanos (Art. 10) e o Pacto Internacional de Direitos
Civis e Políticos (Art.14).
Na legislação infraconstitucional, os dispositivos legais relativos à imparcialidade
negativa do juiz estão nos Arts. 252 e 254 do digo de Processo Penal e Art. 134 e 135 do
Código de Processo Civil, elencados de forma taxativa e assim aceitos pela jurisprudência
majoritária brasileira.
Portanto, a (im)parcialidade do juiz, do árbitro ou de qualquer outra instância julgadora,
quer no sentido positivo, quer no negativo, é essencial para o estabelecimento da confiança e
38
SOUZA, Artur César de, op. cit., 2008, p. 203-204, 207-211.
39
SOUZA, Artur César de, op. cit., 2008, p. 233.
40
SOUZA, Artur César de, op. cit., 2008, p. 122.
41
SOUZA, Artur César de, op. cit., 2008, p. 55.
55
da reciprocidade necessárias à consolidação da democracia participativa, na qual “[…] a
justiça não pode ser administrada sem o controle do povo em nome do qual os magistrados
proclamam fazer justiça”.
42
Essa (im)parcialidade, que se apresenta no aspecto subjetivo pelas restrições negativas
dirigidas à pessoa do juiz (impedimento e suspeição), e no aspecto objetivo, com a ação
positiva que considera as partes de um todo (diferenças diversas), com reflexos na relação
jurídica processual, parte da premissa, para Souza, de que “a justiça humana é parcial, pois a
sua humanidade não pode deixar de se resolver na sua parcialidade”.
43
E que:
Por meio de uma racionalidade crítica que rompe com a totalidade processual
dominante (atual concepção do princípio da imparcialidade), o juiz deve abandonar
sua subjetividade solipsista de apenas realizar um ato de conhecimento no âmbito de
atividade jurisdicional, para por meio de sua sensibilidade reconhecer a
exterioridade das vítimas, das diferenças sociais, econômicas e culturais.
O juiz não deve tematizar o outro (vítima inferiorizada na relação jurídica
processual), mas deixar transparecer um desejo metafísico de proferir uma decisão
équo e justa, pois o juiz, em relação às vítimas do sistema, tem uma responsabilidade
ética pré-originária à totalidade do sistema jurídico dominante.
44
2.5 Neutralidade do juiz
Para Rocha, neutralidade não se confunde com imparcialidade. Enquanto esta é
elemento estrutural da jurisdição, afetando-a, aquela não é da essência da jurisdição. A sua
ausência não implica a perda da imparcialidade.
45
A neutralidade como um conceito de indiferença em relação a valores políticos e
ideológicos pressupõe a ideia de que a jurisdição não é prestada por um Ser pensante,
humano, e que traz consigo uma formação multi e interdisciplinar.
Valores políticos, técnico-jurídicos, econômicos, psicológicos, ideológicos, espirituais,
culturais, enfim, preenchem todo o Ser do juiz, moldando a sua personalidade, e influi,
naturalmente, no conteúdo da prestação jurisdicional.
A ideia de um juiz dotado de pureza quase divina, alheio aos humores ambientais,
asséptico, marginalizado da sociedade, é também mencionada criticamente por Griffith, que
encontra na doutrina a afirmação igualmente irônica de que o juiz “quando se dispõe a julgar,
42
SOUZA, Artur César de, op. cit., 2008, p. 195.
43
SOUZA, Artur César de, op. cit., 2008, p. 144.
44
SOUZA, Artur César de, op. cit., 2008, p. 254.
45
ROCHA, José de Albuquerque, op. cit., 1995, p. 31-32.
56
deve atuar como um eunuco político, econômico e social, e desinteressar-se do mundo fora do
tribunal”.
46
Acrescenta Zaffaroni:
Em princípio, ao pretender que o juiz como pessoa possa ser ‘neutro’, por dotes
pessoais que o situam acima dos conflitos humanos, associa-se à sua imagem
pública um componente sobre-humano ou divino, que obviamente não é mais do que
um produto de manipulação, mas que chega à imaginação coletiva e produz
exigências de atitudes dirigidas aos juízes, sob o ângulo desta percepção de seu
perfil.
Como ninguém é uma divindade, em medida maior do que todos o somos, ninguém
pode assumir o papel de divindade e cumpri-lo satisfatoriamente e muito menos por
nomeação estatal, no nível individual a disparidade entre as exigências de atitudes e
a capacidade individual gera conflitos individuais muito graves, que afetam a
identidade e conduzem a erros de conduta, tais como o ‘moralismo’ daquele que se
considera juiz da ética de todos os concidadãos, a onipotência de quem afirma estar
combatendo os piores males e flagelos de toda a humanidade e contendo os
genocídios, a rigidez angustiante que se traduz em conflitos familiares, quando não
em uma verdadeira ruptura depressiva.
47
Prossegue Zaffaroni, afirmando que:
Definitivamente, esta imagem não é mais do que um instrumento da ditadura ética
da pior espécie, condicionada pelo processo interacionista, que nos explica a
tendência em assumir as atitudes que nos exigem conforme os estereótipos e a
corresponder positivamente a eles. A ‘moralidade judicial’ ou ‘ditadura ética’ (na
versão doutrinária mais sofisticada, a ‘etização do direito’) é produto desse
mecanismo.
48
Concluindo que essa articulação tem “a função política de considerar que os juízes são
alheios ao poder”,
49
Zaffaroni insiste que:
Não é em vão que, entre muitas besteiras, se fale da judicatura como um
‘sacerdócio’, com o que se prepara a opinião pública para que considere como
inconveniente qualquer atitude judicial que implique uma limitação ou um freio ao
exercício do poder partidário ou uma crítica ao sistema. O público perde de vista o
fundamental papel político do juiz e inclusive o rechaça como improcedente, que é o
que todo autoritarismo pretende para exercer o poder sem qualquer limitação. O juiz
perde-se numa estranha e nebulosa imagem de santo e pai rigoroso e moralista, que
condena o mundo. Isto corresponde, certamente, a uma mitologização da figura do
juiz, elaborada através de séculos e que sobrevive enfaticamente nesta imagem,
cujas raízes inconscientes não são difíceis de perceber.
50
Rocha afirma, também, que “se do ponto de vista axiológico inexiste neutralidade, do
ponto de vista do direito positivo não há nada obrigando o juiz a ser neutro político-
46
GRIFFITH, J.A.G. Giudici e política in Inghilterra. Milano, 1980, p.188 apud ZAFFARONI, Eugenio
Raúl, op. cit., 1995, p. 91.
47
ZAFFARONI, Eugenio Raúl, op. cit., 1995, p. 160.
48
ZAFFARONI, Eugenio Raúl, op. cit., 1995, p. 160-161.
49
ZAFFARONI, Eugenio Raúl, op. cit., 1995, p. 161.
50
ZAFFARONI, Eugenio Raúl, op. cit., 1995, p. 161.
57
ideologicamente”.
51
Caso isto existisse, a norma seria ineficaz, por “exigir comportamento
sobre-humano do juiz”.
52
Dallari, crítico severo do conceito de neutralidade absoluta e defensor da politicidade do
“cidadão-juiz”, entende que:
Os juízes exercem atividade política em dois sentidos: por serem integrantes do
aparato de poder do Estado, que é uma sociedade política, e por aplicarem normas
do direito, que são necessariamente políticas. Mas, antes de tudo, o juiz é cidadão e
nessa condição exerce o direito de votar, o que não é desprezível quando se analisa o
problema da politicidade de suas decisões. Não há como pretender que o juiz,
fazendo uma escolha política no momento de votar, fique indiferente ao resultado da
votação. Ele deve querer, como é óbvio, que sejam vencedores o candidato e o
partido de sua preferência […]
53
E finaliza Dallari:
[…] O juiz sempre terá de fazer escolhas, entre normas, argumentos, interpretações e
até mesmo entre interesses, quando estes estiverem em conflito e parecer ao juiz que
ambos são igualmente protegidos pelo direito. A solução do juiz será política nesse
caso, mas também terá conotação política sua decisão de aplicar uma norma ou de
lhe negar aplicação, pois em qualquer caso haverá efeitos sociais e alguém será
beneficiado ou prejudicado.
Por todas essas razões merece acolhida a precisa conclusão do jurista argentino
Roberto Dromi, na obra El Poder Judicial (Tucumán, ed. UNSTA, 1982, a propósito
da politicidade jurídica: ‘Deve recuperar-se o critério que o Direito é uma ordenação
imposta pela ‘razão prática’, e não pela ‘razão pura’. A neutralidade jurídica é uma
quimera. Todo Direito, por sua própria condição, está inspirado numa ideologia
política, à qual serve, como ferramenta jurídica do sistema. Mesmo os intentos
jurídicos ‘puristas’ teorizados em abstrato se inserem num contexto estatal
determinado, onde a racionalidade normativa fica à mercê da circunstância política’.
O reconhecimento da politicidade do direito nada tem a ver com opções partidárias
nem tira, por si só, a autenticidade e a legitimidade das decisões judiciais. Bem ao
contrário disso, o juiz consciente dessa politicidade fará um esforço a mais para
conhecer e interpretar o direito, considerando sua inserção necessária num contexto
social, procurando distingui-lo do direito abstrato ou do que é criado artificialmente
para garantir privilégio, proporcionar vantagens injustas ou impor sofrimentos a
outros com base exclusivamente numa discriminação social.
54
Portanto, o que é proibido ao juiz pela Constituição Federal é a atividade político-
partidária (Art. 95, parágrafo único, inciso III), sob a forma de militância. A liberdade de
manifestar o pensamento, sem o anonimato; a liberdade de consciência e de crença; e a
liberdade de expressão da atividade intelectual, artística, científica, e de comunicação,
independentemente de censura ou licença, são direitos e garantias fundamentais previstos no
51
ROCHA, José de Albuquerque, op. cit., 1995, p. 31.
52
ROCHA, José de Albuquerque, op. cit., 1995, p. 31.
53
DALLARI, Dalmo de Abreu, op. cit., 2007, p. 89.
54
DALLARI, Dalmo de Abreu, op. cit., 2007, p. 89-90.
58
Art. 5º, IV, VI e IX , da Constituição Federal, e que não afetam negativamente o juiz ao
prestar a jurisdição.
2.6 A legitimidade do Poder Judiciário
Para a introdução do tema da legitimação do Poder Judiciário, é necessária antes alguma
conceituação sobre o que são legalidade e legitimidade. Bonavides leciona que:
A legalidade nos sistemas políticos exprime basicamente a observância das leis, isto
é, o procedimento da autoridade em consonância estrita com o direito estabelecido.
[…] traduz a noção de que todo poder estatal deverá atuar sempre de conformidade
com as regras jurídicas vigentes. Em suma, a acomodação do poder que se exerce ao
direito que o regula […] o funcionamento do regime e a autoridade investida nos
governantes devem reger-se segundo as linhas-mestras traçadas pela Constituição,
cujos preceitos são a base sobre a qual assenta tanto o exercício do poder como a
competência dos órgãos estatais […] O conceito de legalidade se situa assim num
domínio exclusivamente formal, técnico e jurídico.
55
Por legitimidade, Bonavides entende como sendo o
questionamento acerca da justificação e dos valores do poder legal. A legitimidade é
a legalidade acrescida de sua valoração. É o critério que se busca menos para
compreender e aplicar do que para aceitar ou negar a adequação do poder às
situações da vida social que ele é chamado a disciplinar. No conceito de
legitimidade entram as crenças de determinada época, que presidem à manifestação
do consentimento e da obediência.
56
E continua Bonavides:
A legalidade de um regime democrático, por exemplo, é o seu enquadramento nos
moldes de uma constituição observada e praticada; sua legitimidade será sempre o
poder contido naquela constituição, exercendo-se de conformidade com as crenças,
os valores e os princípios da ideologia dominante, no caso a ideologia democrática.
57
A esse aspecto jurídico-filosófico do binômio legalidade-legitimidade, Bonavides
acresce as influências da teoria da legitimidade como representação dominante do poder, de
natureza sociológica, com as manifestações weberianas da legitimidade: a carismática, a
tradicional e a legal ou racional.
58
Para Vasconcelos:
55
BONAVIDES, Paulo, op. cit., 1983, p. 113-114.
56
BONAVIDES, Paulo, op. cit., 1983, p. 114.
57
BONAVIDES, Paulo, op. cit., 1983, p. 114.
58
“[...] Max Weber faz que a legalidade repouse sobre três formas de manifestação da legitimidade: a
carismática, a tradicional e a legal ou racional [...] A autoridade carismática assenta sobre as ‘crenças’ havidas
em profetas, sobre o ‘reconhecimento’ que pessoas alcançam os heróis e os demagogos, durante as guerras e as
sedições, nas ruas e nas tribunas, convertendo a e o reconhecimento em deveres invioláveis que lhe são
devidos pelos governados. O poder carismático se baseia, segundo o sociólogo, na direta lealdade pessoal dos
seguidores.A autoridade carismática [...] conserva nas suas formas mais puras o caráter autoritário e imperativo.
a autoridade tradicional se apóia na crença de que os ordenamentos existentes e os poderes de mando e
59
Todo grupo social pressupõe organização interna e estrutura de poder, por mais
embrionária que seja, que lhe assegure a manutenção e o desenvolvimento. Mas o
poder, para impor-se necessita de autoridade, isto é, ser legítimo.
59
Situando a legitimidade no plano da instância de valor e não no da validade, afirma o
autor que a temática tem natureza filosófico-política e deságua no campo das ideologias,
sendo o Direito e a democracia “termos que se exigem, se implicam e se completam. Apenas
o poder de formação democrática pode ser tido por autorizado e, portanto, legítimo”.
60
Diz
mais:
Parece ter ficado claro que a legitimidade não é condição criada e imposta pelo
Estado, conquanto ele mesmo, para impor-se como poder soberano, dependa de
legitimação. Não se de supor, apressadamente, que o Direito positivo capaz de
legitimar-se seja só aquele criado pelo Estado.
61
Em sua Teoria da Norma Jurídica, Vasconcelos inter-relaciona legitimidade, Estado e
Democracia, quando doutrina que:
A fundação do Estado importa, em termos definitivos, um ato de transferência de
poder. Isso não resulta na alienação de sua titularidade, que permanece intacta, com
o corpo social; recebe o Estado, apenas, delegação para exercitá-lo. E o fará em
nome do povo. É a teoria que nos legou o Liberalismo, como tal positivada nos
textos constitucionais modernos, a exemplo do nosso, onde se lê: ‘Todo o poder
emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos
termos desta Constituição’ (Art. 1º, parágrafo único). Projetando-se a formulação no
plano jurídico, tem-se que, enquanto o Estado se converte em juiz da legalidade, fica
o povo como árbitro supremo da legitimidade.
62
O povo que compõe a nação, com inserção em um contexto político-econômico
globalizado, cuja estabilidade é vital para a consolidação de indicativos sociais favoráveis e
direção comportam a virtude da santidade. O tipo mais puro, prossegue Max WEBER, é o da autoridade
patriarcal, onde o governante é ‘senhor’, o governado o ‘súdito e o funcionário o ‘servidor’ [...] presta-se
obediência à pessoa por respeito, em virtude da tradição de uma dignidade pessoal que se reputa sagrada. Todo o
comando se prende intrinsecamente à tradição, cuja violação brutal por parte do chefe podeeventualmente pôr
em perigo seu próprio poder, cuja legitimidade se alicerça tão-somente na crença acerca de sua santidade. A
criação de um novo direito em face das normas oriundas da tradição é em princípio impossível.
Conseqüentemente, a direção política do meio social goza de uma solidez e estabilidade que se acha sob a
dependência imediata e direta do aprofundamento da tradição na consciência coletiva. Quanto ao último tipo, o
da autoridade ‘legal’, que informa toda a época do racionalismo ocidental, temos o poder fundado no estatuto,
na regulamentação da autoridade [...] o tipo mias puro é o da autoridade burocrática. Sua concepção fundamental
se resume na postulação de que qualquer direito pode ser modificado e criado ad libitum, por elaboração
voluntária, desde que essa elaboração seja formalmente correta. A obediência se presta não à pessoa, em virtude
de direito próprio, mas à regra, que se reconhece competente para designar a quem e em que extensão se de
obedecer [...] o poder racional ou legal cria ademais em suas manifestações de legitimidade a noção de
competência, o poder tradicional a de privilégio e o carismático, desconhecendo esses conceitos, dilata a
legitimação até onde alcance a missão do chefe, na medidade de seus atributos carismáticos pessoais, conforme
observa aquele pensador”. BONAVIDES, Paulo, op. cit., 1983, p. 121-122.
59
VASCONCELOS, Arnaldo. Teoria Geral do Direito: teoria da norma jurídica. 3. ed. São Paulo: Malheiros,
1993, v. I, p. 236.
60
Ibid., 1993, p. 238.
61
Ibid., 1993, p. 238.
62
Ibid., 1993, p. 246.
60
autoafirmação da diversidade cultural não só pelo resgate do déficit histórico democrático,
no caso brasileiro, como pela projeção na constante reorganização do poder mundial dispõe
hoje de uma ordem constitucional cuja legalidade pode ser experimentada de forma
autocrática ou participativa, dependendo para isso do viés interpretativo que se dê ao texto de
suas normas. Faria identifica algo semelhante como sendo a crise da legitimidade, e afirma:
Assim, se o processo de legitimação indica o grau de solidez e o nível de aceitação
de um sistema político, todo o problema da legitimidade envolve, basicamente, uma
crise de mudança social, uma vez que a ordem institucional não é um corpo em
repouso, mas um processo permanente: nesse sentido, o movimento inicial é a ruína
total ou parcial, lenta ou súbita, da ordem constitucional, motivada de um lado por
novas exigências dos diversos grupos sociais, e de outro, pela ineficácia do sistema
político em captar as necessidades de alteração e modernização de suas regras
(enrijecendo-se em sua criatividade e aumentando a tensão entre governantes e
governados). Daí a importância do papel exercido pelo consenso ao maximizar as
potencialidades de um sistema político, possibilitando o equilíbrio, evitando o clima
de tensão e garantindo o ajustamento dos valores que correspondem, no sentimento
coletivo, à aspiração de justiça […]
Mesmo porque, se o conceito de legitimidade tem um caráter empírico, na medida
em que a legitimidade jamais encontra uma resposta única, mas pressupõe o
concurso da opinião pública e implica a capacidade de um sistema político de
manter a crença de que as instituições vigentes são as mais apropriadas à sociedade,
nosso esforço apenas terá algum sentido se nossa visão pragmática da democracia e
nossa abordagem retórica do direito forem suficientemente sensíveis para fazer uma
leitura ideológica dos diferentes argumentos possíveis, decifrando os topoi políticos
e jurídicos, compreendendo a deformação de sentido que eles são capazes de
produzir.
63
Ruivo, tratando do poder e de sua legitimação, também alude à necessária participação
da sociedade na instituição jurídica, predicando:
Com a expansão do Estado, porém, alarga-se o sistema político em detrimento do
cultural: a administração abandonou a sua autonomia e exige-se mais lealdade. A
intervenção e planificação administrativa de novas áreas alarga o ‘público’,
invadindo zonas de tradicional autolegitimação e debilitando os esquemas de
justificação. O ‘sentido’ começa a constituir algo de escasso (e a administração
tradicionalmente não o produz).
A essa expansão do Estado corresponde, pois ‘um acréscimo mais que proporcional
das necessidades de legitimação’. E para se manter enquanto aparelho externo à
sociedade, desconexo na imagem do conjunto e reservando-se todo um potencial
legitimador, o Estado vai descarregar sobre algumas das suas funções a tarefa de
assegurar essa crença de adequação em resposta ao ficit de legitimação. A
renovação e revitalização da instituição judiciária e do ‘papel do juiz’ torna-se assim
de extrema importância pela repercussão, pelo efeito legitimador de retorno, que
passa a ter sobre todo o sistema social: discutem-se então as formas de garantia de
legitimidade das decisões judiciais o processo em si, a garantia de acesso à justiça,
a posição do juiz face às partes e sua imagem social. Em suma, conexão entre
aparelho judicial e sociedade: aproximação do processo de tomada de decisão e
participação.
[…]
63
FARIA, JoEduardo. Sociologia Jurídica: Crise do direito e práxis política. Rio de Janeiro: Forense, 1984,
p. 46 e 103.
61
Proximidade e participação, para além de legitimarem o processo de tomada de
decisão do aparelho judicial, vêm, assim, também legitimar globalmente a
sociedade. Não descontinuidades entre os seus processos, continuando, pois, o
aparelho judicial a reproduzir as relações econômicas dentro dos limites de uma
compatibilidade funcional.
64
Sales, sobre o tema, propõe a legitimação da função judiciária pela submissão do juiz à
Constituição e à lei, afirmando que: “O juiz, ao controlar a aplicação da lei através de uma
interpretação constitucional, garantindo a efetividade dos direitos fundamentais e o Estado
Democrático de Direito, possui legitimação democrática”.
65
O ordenamento jurídico, portanto, para Sales, é o limite da legitimação do Poder
Judiciário, e acrescenta:
O Poder Judiciário brasileiro, mesmo com todos os problemas da estruturação desse
Poder […] as freqüentes declarações e inconstitucionalidade de legislação elaborada
pelo Poder político com pouca preocupação com as normas, princípios e valores
constitucionais, constituem uma esperança e uma expressão clara da nova tendência
da função jurisdicional, cuja total legitimação democrática, no entanto, atingirá o
seu ponto mais alto quando, dentro dos limites impostos pelo ordenamento jurídico,
cumprir suas tarefas constitucionais.
66
Nessa moldura de submissão do Judiciário à Constituição e à lei, vislumbra-se a ideia de
cisão entre a natureza jurídica e a natureza política da função jurisdicional, como se esses dois
atributos não fossem partes da mesma estrutura – o Poder do Estado.
Esse poder estatal é a manifestação da soberania popular, que encontra na Constituição
sua extensão e seus limites. O problema reside no delineamento desse mecanismo dialético e
orgânico e na sincronia dessas duas forças e das suas características atávicas de expansão e
compressão.
As raízes históricas dessa dinâmica de separação das funções estatais encontram sua
formulação dogmática ainda entre os revolucionários franceses que, ávidos pela
reestruturação do poder do ancien régime, emolduraram a atuação do Judiciário, tornando
seus membros meros servidores da lei. Nesse sentido, Rocha afirma:
De fato, a submissão do juiz à lei é uma derivação lógica da posição hegemônica da
Assembléia e de seu produto, a lei, que, por sua vez, é a expressão da hegemonia
burguesa.
64
RUIVO, Fernando. Aparelho judicial, Estado e legitimação. In: FARIA, José Eduardo (Org.). Direito e
Justiça: a função social do judiciário. São Paulo: Ática, 1989. p. 66-94, p. 87-90.
65
SALES, lia Maria de Morais. Poder Judiciário: o modelo tecnoburocrático e a Constituição Federal de
1988. Dissertação. (Mestrado em Direito). Faculdade de Direito. Universidade Federal do Ceará (UFC),
Fortaleza, 2000, p. 123.
66
Ibid., 2000, p. 120.
62
Sabemos que, no antigo regime, os juízes (parlements’), além das tarefas
jurisdicionais, exerciam também funções políticas, como a expedição dos arrets de
réglemen’ verdadeiros textos normativos através dos quais regulavam matérias
pretensamente conexas com o exercício da jurisdição e, bem assim, o registro de
atos normativos do monarca (droit d’enregistrement’), por meio dos quais
controlavam sua conformidade às leis fundamentais da monarquia (controle de
constitucionalidade), oportunidade em que dirigiam ao soberano as remontrances’,
que eram reclamações sobre a incompatibilidade dos atos reais, e que podiam levar
à recusa do registro caso não atendidas.
67
Prossegue Rocha:
Pois bem, com o advento da Revolução de 1789, o Judiciário sofre, como vimos,
mutilações que redundam em perda dessas competências políticas e conseqüente
desqualificação ao papel de simples e estrito aplicador das leis da Assembléia,
mutilações que marcam todo o processo de formação do modelo de juiz que guia a
magistratura do continente até os anos cinqüenta deste século [o século XX] e
continua guiando a magistratura da América Latina.
Desse modo, a idéia-força da Revolução de 1789, do culto da lei, gera a imagem do
juiz servidor da lei, do juiz tributário da lei, enfim, do juiz ‘boca da lei’, na
expressão de Montesquieu, em visível contraste com os tribunais do antigo regime
(‘parlements’), caracterizados pela influência na direção política do Estado.
[…]
Em conclusão, a imagem do juiz que emerge da Revolução de 1789 é a de um
aplicador mecânico da vontade do legislador sem nenhuma liberdade criativa.
[…]
[…] a razão da persistência dessa imagem do juiz, na Europa continental, até os anos
cinqüenta deste século [século XX], e na América Latina, até os dias correntes,
devemos buscar a explicação em dois fenômenos interdependentes: de um lado, a
funcionalidade dessa imagem aos interesses dominantes, sobretudo a exigência de
certeza do direito imprescindível ao cálculo econômico da economia de mercado e,
de outro lado, a inércia intelectual, característica das grandes correntes de
pensamento, como é o positivismo jurídico, que sobrevém às condições histórico-
materiais que lhe deram origem.
68
Justificando essa separação funcional e originária do Poder Jurisdicional, com arrimo
constitucional, Sales apoia a sua ideia no pensamento de Gomes, que afirma:
Ressalta-se que a legitimação democrática do Judiciário é estruturalmente, portanto,
totalmente diversa da dos demais poderes do Estado. Divide-se em duas fontes de
legitimação do Poder Judiciário: a legitimação formal, assegurada pelo princípio da
legalidade e da sujeição do juiz à lei; a legitimação substancial, que consiste na
função e capacidade da jurisdição de tutelar os direitos fundamentais e garantir o
Estado Democrático e Constitucional de Direito.
69
Insistindo ainda no tema da separação das funções política e jurisdicional, continua
Sales, com o entendimento de Gomes:
67
ROCHA, José de Albuquerque, op. cit., 1995, p. 96-97.
68
ROCHA, José de Albuquerque, op. cit., 1995, p. 97-98.
69
GOMES, Luiz Flávio apud SALES, Lília, op. cit., 2000, p. 121.
63
A legitimação política, porque é representativa, não significa que é mais
importante ou goze de maior hierarquia perante a legitimação judicial (formal ou
legal); ambas as modalidades de legitimação foram concebidas pelo Poder
Constituinte e estão previstas pela Constituição; ambas estão no mesmo de
igualdade. Se o constituinte quisesse poderia Ter (sic) estruturado de modo distinto o
Poder Judiciário.
Não o fez, certamente, por respeito à tradição brasileira que afasta qualquer tipo de
eleição direta (do povo) para cargos judiciais. Não cabe discutir qual das duas
legitimações é a mais democrática: ambas o são. O que se espera, isto sim, é que
cada Poder estatal cumpra suas tarefas, sobretudo as constitucionais rigorosamente
dentro dos seus limites, sob pena de rompimento do necessário equilíbrio entre os
poderes.
70
Buscando na democracia a legitimação da função judiciária, independentemente do
sufrágio universal, Zaffaroni arremata:
Uma instituição não é democrática unicamente porque não provenha de eleição
popular, pois, nem tudo o que provém dessas origens é necessariamente
‘aristocrático’. Uma instituição é democrática quando seja funcional para o sistema
democrático, quer dizer, quando seja necessária para sua continuidade, como ocorre
com o Judiciário.
Quando se diz que o Poder Judiciário tem legitimidade constitucional, mas não
legitimidade democrática, se ignora sua funcionalidade democrática. Pareceria que o
reconhecimento da função política do Judiciário fosse incompatível com a nomeação
por concurso público, por exemplo, e que seria paradoxal que aquele possa julgar em
nome do povo, quando não é eleito pelo povo.
[…]
Pensamos que a legitimidade não é julgada unicamente pela origem, senão também,
e às vezes fundamentalmente, pela função. Segundo nosso ponto de vista, o
prioritário no Judiciário é sua função democrática, ou seja, sua mencionada utilidade
para a estabilidade e continuidade democrática.
71
Até aqui, algumas construções linguísticas do discurso doutrinário despertam
interrogações, tais como: se a legitimação do Poder Judiciário está em sua submissão à
Constituição e à lei, os outros dois Poderes, que criam a norma e cumprem o que nela está
previsto, igualmente não estão sujeitos à moldura legal? Mais do que sujeição, não realiza
também o Poder Legislativo o controle de legalidade primeiro, no momento da elaboração da
norma, mesmo que em abstrato? serventia na interpretação e sanção judiciais concretas,
quando a norma é alterada posteriormente, alcançando resultados pretéritos, em benefício de
situações genéricas e abstratas, tornando inócua a função jurisdicional exercida? A
continuidade, a funcionalidade e a estabilidade democráticas a que se refere Zaffaroni,
também não são funções legislativas e executivas?
70
SALES, Lília, op. cit., 2000, p. 122.
71
ZAFFARONI, Eugenio Raúl, op. cit., 1995, p. 43-44.
64
Ser funcional, nesse discurso, dando continuidade e estabilidade à ordem democrática,
parece antes traduzir as ideias de instrumentalidade, constância, automatismo e permanência
do que as de adequão, dinamismo, autonomia e incerteza, estes, eventos típicos da ocorrência
social e que se prestam à formulação da legalidade e de sua legitimidade fundante e justificante.
Essa sustentação semântica quanto à legitimação da função jurisdicional e à definição
de um locus próprio, dissociado do elemento político do poder, através de uma lógica
racional, linear, certa e objetiva, impede a percepção ampla da função a ser exercida pelo
Judiciário e a necessidade de fundamentação legitimamente mais abrangente e pluralista, sem
prejuízo da ideia de que, em algum momento, toda e qualquer ordem experimentará um lapso
de certeza, permanência e consenso, porém, trazendo em sua própria estrutura o gérmen da
dúvida, da incerteza, da temporalidade, da pluralidade.
Advertindo sobre a necessidade de integração da configuração normativo-constitucional
com o processo político efetivo, ao analisar a questão no plano do Princípio da Separação dos
Poderes, Moraes afirma:
[...]
Cumpre lembrar, porém, que a idéia de que nem a constituição nem a lei são capazes
de, por si sós, modificar a natureza das coisas ou das constituições não é
incompatível com a filosofia subjacente ao Do Espírito das Leis. O mesmo havia
sido intuído pelo teórico pioneiro do Estado moderno, quando, n’O Príncipe,
observou que ‘[...] há tamanha distinção entre como se vive e como se deveria viver,
que aquele que trocar o que se faz por aquilo que se deveria fazer, aprende antes sua
ruína do que sua preservação’. (MAQUIAVEL, 1996, p.73).
Por conseguinte, a compreensão do princípio da separação de poderes não pode
limitar-se à sua configuração normativo-constitucional, fazendo-se necessária a
integração de tal configuração com o processo político efetivo, em outras palavras,
um diálogo permanente entre a teoria constitucional e a teoria política.
72
Essa desconexão entre o poder judicial e poder sociopolítico é visto por Ruivo como um
dos cernes da crise de legitimidade no Poder Judiciário, cujos membros tendem a ser apenas
agentes burocráticos de uma ordem legal cristalizada. Para Ruivo:
[…] o aparelho judicial aparece à superfície da sua atividade como que em
desconexão com o sistema político global, desconexão essa que, no fundo, não é
senão reflexo da ideologia da separação veiculada pela prática científica ideológica
que subjaz à ciência jurídica enquanto dogmática. Desde logo, a separação entre
legalidade e ética social […] a separação entre o político e o econômico […] a
separação entre o Estado e a sociedade atinge, portanto, o próprio Estado: um dos
seus aparelhos, o judicial, é empurrado para a sociedade para melhor satisfazer a
idéia de não intervenção e de seleção ‘natural’ ao nível econômico-social. Tal
72
MORAES, Filomeno. Separação de Poderes no Brasil Pós-88: Princípio Constitucional e Práxis Política,
op.cit., 2003, p. 153-154.
65
desconexão é, portanto, extremamente relativa, posto que os juízes exercem a sua
atividade decisória no contexto do sistema político e normativo de que fazem parte
integrante. O que os distingue dos outros ‘atores políticos’, para utilizar a
terminologia de Peltason, ‘não é o fato de se encontrarem fora do sistema, mas de
estarem de modo diferente com ele relacionados’.
73
Entendendo ser a teoria da separação dos poderes uma dupla ficção, no tocante ao fator
de desconexão a que se referiu, Ruivo acrescenta:
Separam-se os poderes, separa-se Estado e sociedade, ficando o poder judicial em
situação de extrema ambigüidade. Se enquanto exercício de poder ele é empurrado
para a sociedade, para resolver eventuais conflitos que perturbem a pacificidade da
liberdade contratual que caracteriza as relações da área privada, o domínio dos
sujeitos de direito, e, nesse sentido, ocultando o poder, do lado da sociedade assiste-
se ao movimento inverso: de modo progressivo, o juiz vai sendo relegado para a área
do Estado, não porque se encontra vinculado à lei deste, mas também porque a
própria lei (em conformidade com o desenvolvimento do Estado) vai crescentemente
abandonando a sua função meramente ordenadora, intervindo na configuração da
esfera privada. O aparelho judicial adquire, deste modo, uma característica que, se
por um lado, é essencial ao seu funcionamento, por outro, como veremos, pode ser,
em alto grau, geradora de contradições: referimo-nos ao fato de a ilusão de
desconexão se realizar face ao sistema político, mas, para poder frutificar, ter de se
operar conjuntamente com uma efetiva distanciação da própria sociedade. E cada
vez mais se teoriza a independência do juiz na medida em que este, cada vez mais,
se transforma em funcionário público […] como acabamos de ver, o ‘poder’ judicial
é algo de ilusório, a partir da própria teoria que o alicerça […]
74
Constata Ruivo, então, que o Estado “expande-se cada vez mais, alastrando as suas
funções à sociedade civil”. Nesse sentido, “o Estado, que pretendia continuar a pairar
neutralmente sobre a sociedade, parece ‘socializar-se’; por outro lado, a sociedade parece
estatizar-se”.
75
Assim, uma das fontes possíveis de legitimação do Judiciário a decorrente da origem
do poder, pela teoria da democracia representativa, esta, verdadeiro dogma, tanto no processo
de recrutamento dos juízes, quanto na aceitação de mecanismos de eleição dos membros e
dirigentes dos tribunais -, poderia ser assimilada pela norma constitucional como tentativa de
reconexão entre os elementos político e jurídico do poder estatal, considerando a constatação
de que o princípio da separação absoluta e pura dos poderes já não regula a realidade
sociopolítica nacional, e o fato de que as diversas funções do poder do Estado se estabelecem,
na contemporaneidade, com relações de interpenetração visivelmente percebidas. Nesse
sentido, entende Ruivo que:
Tudo se confunde, portanto. E a isso não escapa também a separação dos poderes.
Altera-se por completo o contexto histórico em que se produzira a teoria. E os três
73
RUIVO, Fernando, op. cit., 1989, p. 72.
74
RUIVO, Fernando, op. cit., 1989, p. 75-76.
75
RUIVO, Fernando, op. cit., 1989, p. 76.
66
poderes básicos crescentemente se interpenetram, irrompem no espaço que,
inicialmente, a cada um havia sido atribuído. A administração perde o seu papel de
mera executora neutral de normas gerais, incrementando-se o seu poder Legislativo:
e aqui a teoria sofre adaptações, falando-se numa espécie de capacidade legislativa
por delegação. O Executivo transforma-se assim num Executivo legislador: quer
devido ao novo tipo de problemas, e conseqüentes resoluções, que lhe surgem
(vindo a lei, pouco a pouco a perder também o seu caráter de norma geral e a referir-
se a situação concretas diretamente determinadas pela esfera econômica), quer
devido à progressiva tecnicização do poder político (que consigo traz a ideologia do
vazio ideológico e a nova idéia legitimadora da resolução dos problemas de
crescimento econômico), quer ainda devido à unidade do poder que o Executivo
cada vez mais representa (unidade de exercício direto e unidade de controle das
funções dispersas).
Conseqüentemente, o Parlamento vê-se despojado do monopólio da produção
jurídica […] pela expansão das autorizações legislativas concedidas ao Executivo ou
até pela própria renúncia à regulamentação.
76
Quanto ao Poder Judiciário, entende Ruivo que
o extravasar dos seus domínios faz-se pela via do Legislativo: é por exemplo, a
integração das lacunas através de decisões da suprema instância, é a apreciação
judicial da constitucionalidade das leis […] O que é importante é que todas estas
incursões de cada uma das funções do Estado no campo da outra e no espaço
originariamente reservado à sociedade civil podem vir a proporcionar ao Judicial
uma nova idéia configuradora desse seu poder.
77
Admitindo que a ideiasica de produção de decisões para a solução de conflitos
continuará a mesma no Poder Judiciário e que a vinculação à lei mantém-se como princípio
geral nos sistemas fechados continentais, Ruivo vaticina:
Que se passa então? Será que, no momento em que o Legislativo apagar-se parte
da sua função de controle do Executivo, o Judicial vai saltar em defesa da idéia de
soberania popular (até ai consumada no Parlamento), incorporando-a e, desse modo,
prefigurando as condições para se assumir como verdadeiro poder ao assegurar a
proteção do cidadão contra as arbitrariedades do Estado e do Estado existente em
cada cidadão?
78
O cenário apresentado por Ruivo faz lembrar a construção de um trocadilho linguístico
que se difundiu em textos jurídicos, demonstrando a dificuldade que encontra a doutrina em
compatibilizar os elementos político e jurídico da estrutura legitimamente. Trata-se das ideias-
conceito de judicialização da política e politização da justiça, que nada mais são do que a
materialização desse divisionismo.
Vista a legitimação do Poder Judiciário sob o aspecto funcional, resta analisar a
possibilidade de legitimação desse Poder sob as luzes da representatividade popular, mediante
76
RUIVO, Fernando, op. cit.,1989, p. 76-77.
77
RUIVO, Fernando, op. cit.,1989, p. 77.
78
RUIVO, Fernando, op. cit.,1989, p. 77.
67
eleições externas, pelo povo, e internas, pelos próprios membros do Poder ou por setores da
sociedade.
A fórmula mágica para a melhor expressão da vontade geral não existe. Um dos grandes
elos perdidos, ou quem sabe, jamais alcançados pelo homem, é exatamente a busca dessa
interseção, dessa ligação entre o que é, enquanto realidade fática e o que pode ou deve ser,
enquanto ideação. Isso é o consenso, o caminho contínuo da democracia. Se a noção de caos
imprime a perspectiva de desordem, não é menos aceitável a afirmação de que mesmo no caos
existe uma ordem a ser decifrada, ainda que para tanto admita-se que a resposta seja a
contínua busca das soluções.
A democracia participativa, como meio de exercício da soberania popular, tem sido uma
das propostas de mediação dessa vontade geral. Albuquerque observa essa opção e afirma:
Democracia Participativa pode parecer uma fórmula política confusa, imprecisa em
termos conceituais, na medida em que a participação já se inscreve como um
pressuposto lógico, ontológico, indissociável da idéia democrática.
Participação que também propicia interpretações dúbias semanticamente, na medida
em que pode traduzir formas de poder ‘abstratas’, vazadas em fórmulas
procedimentais, limitando-a ao reconhecimento da esfera autônoma do indivíduo na
realização dos Direitos Civis, ou viabilizar-se, mitigadamente, no âmbito dos
Direitos Políticos, através da representação política, segundo a ótica restritiva da
concepção liberal de Estado.
Outra compreensão mais ampla da participação, consentânea com as matrizes sociais
do pensamento filosófico, político, jurídico, moderno e contemporâneo, procura
relacioná-la à expansão dos processos de exercício direto do poder pelo povo,
diminuindo os espaços da manifestação da representação política, tendo em vista a
tendência ineliminável flagrada por Rousseau, da autonomização dos interesses
dos representantes frente aos representados.
[...]
Neste sentido, a idéia de Democracia Participativa revigora-se como resposta a uma
demanda crescente da sociedade civil por um novo tipo de Estado, em que
instituições jurídicas e políticas dêem vazão à livre expressão da vontade popular,
atualmente represadas pelos mecanismos burocráticos do Estado e no caso brasileiro
ainda assumem uma dimensão mais preocupante, dado a natureza patrimonialista,
autocrática, exterior, de nossas instituições em face da soberania popular.
79
Pergunta-se, então: Se o povo não participa diretamente para a formação da função
judiciária, enquanto instância decisória, estaria ele exercitando o seu poder e sendo dele
destinatário?
Müller sugere algo:
[...] é de se perguntar se antes o papel do povo no trabalho dos administradores,
governantes e juízes não foi visto de forma demasiado idealista. Onde funcionários
79
ALBUQUERQUE, Newton de Menezes. Democracia Participativa: o exercício da soberania popular. In:
SOUZA FILHO, Oscar d' Alva (Coord.). BONAVIDES, Paulo (Consultor Especial). Reforma política: novos
caminhos para a governabilidade. Universidade Aberta do Nordeste, [s./d.]. p. 113-128.
68
públicos e juízes não chegam ao seu cargo por meio de uma eleição pelo povo, a sua
ação se liga de forma demasiado etérea à ação originária do povo ativo - à eleição de
parlamentares que colaboram na promulgação de textos de normas, que foram
depois implementadas de forma defensável no Executivo e no Judiciário.
[...] no Estado Democrático de Direito, o jurista o pode brincar de pretor
romano. Os poderes ‘executantes[‘
ausführenden
’]
Executivo e Judicrio o
eso apenas instituídos e o o apenas controlados conforme o Estado de
Direito; estão também comprometidos com a democracia. O povo ativo elege os
seus representantes; do trabalho dos mesmos resultam (entre outras coisas), os
textos das normas; estes o, por sua vez, implementados nas diferentes funções
do aparelho de Estado; os destinarios, os atingidos por tais atos o
potencialmente todos, a saber, o ‘povo enquanto população. Tudo isso forma
uma espécie de ciclo [
Kreislauf
] de
atos de legitimação, que em nenhum lugar
pode ser interrompido (de modo o-democrático). Esse é o lado democrático
do que foi denominado estrutura de legitimação.
80
Vidal, desembargador do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, defende o
concurso público para o recrutamento de juízes, citando o Senador Nabuco:
O grande mérito do concurso é afastar in limine os absolutamente incapazes. Em
abstrato, ninguém poderá seriamente negar que o concurso oferece tríplice
vantagem: à magistratura os mais amestrados na ciência do direito, eleva o juiz
no conceito público e torna difícil o ingresso de incapazes. Soma total: mais um
elemento de independência do juiz. Na prática, poderá alguma vez não corresponder
o concurso ao ideal doutrinado? Concedido - mas se o concurso não serve para, em
regra, dar a medida da aptidão científica do candidato, servirá o pleno arbítrio do
governo?
81
Barbi, na defesa do concurso público, também assinala:
A exigência de concurso público para ingresso na magistratura de primeiro grau teve
a grande vantagem de fazer melhor seleção no plano intelectual. Outra vantagem
desse sistema é que permitiu o acesso de bacharéis originados da classe média e da
classe pobre, mesmo quando desprovidos de proteção política. O resultado final foi
verdadeira democratização na escolha dos juízes, pelo predomínio apenas das
qualidades intelectuais, independentemente da classe social de origem.
82
Criticando o sistema de carreira funcional no Poder Judiciário, Almeida Filho,
desembargador do Tribunal Regional Federal da Região, defende a eleição para juízes e
esclarece:
[...] mesmo os juízes chamados de carreira, em tese, m o direito de subirem do
ao
Grau, isso porque a promoção por antigüidade poderá deixar de ser acatada
pelo tribunal, se dois terços de seus membros assim o entenderem, e na denominada
80
MÜLLER, Friedrich. Quem é o povo? A questão fundamental da democracia. Tradução de Peter Naumann.
São Paulo: Max Limonad, 2003, p. 59-60.
81
VIDAL, José. O Poder Judiciário: A Magistratura e os Sistemas de Escolha dos Juízes. In: Anais Forenses do
Estado de Mato Grosso, n.50, Milesi, 1981 apud BANDEIRA, Regina Maria Groba. Seleção dos Magistrados
no Direito Pátrio e Comparado: Viabilidade legislativa de eleição direta dos membros do Supremo Tribunal
Federal. Disponível em: <http://www2.camara.gov.br/internet/publicacoes/estnottec/tema6/pdf/200366.pdf>.
Acesso em: 10 out. 2007.
82
BARBI, Celso Agrícola. Formação, Seleção e Nomeação de Juízes no Brasil, sob o ponto de vista da
humanização da Justiça. Revista de Processo, São Paulo, n. 11/12, p. 32-36, jul./dez. 1978 apud BANDEIRA,
Regina Maria Groba, op. cit., 2007.
69
promoção por merecimento, a bem da verdade, não existe mérito e - o que é pior -
muitas vezes demérito no promovido, que a logra à custa de conchavos e
vassalagens, não condizentes com nenhum homem e, muito menos, quando exerce o
ofício judicante.
83
Nesse mesmo sentido, a opinião de Machado, juiz federal da 21ª vara da Seção
Judiciária do Ceará, para quem
o merecimento do juiz em um Estado Democrático de Direito como se auto-
intitula a República Federativa do Brasil (art. , da Constituição Federal), não
pode continuar a ser aferido pelo filhotismo, afilhadismo, nepotismo,
sectarismo, ou qualquer outra forma de apaziguamento; tampouco, pela
subserviência servil e, nem mesmo, pelos títulos e ilustrações com que se
adorna o magistrado mais vaidoso, para sobre si chamar a ateão do tribunal,
pois o o as qualidades de filho, afilhado, parente, pupilo, amigo, conivente
ou douto, que o eficncia ao ofício de ‘dar a cada um o que é seu’, sim, as
qualidades apontadas pelo Ministro Lindhdurst, da Corte Suprema dos Estados
Unidos da América: honestidade, habilidade e coragem. Segue que, a o ser
extinta a carreira, extinta deveria ser a promoção por merecimento, com o
critério ou a falta de critério, com que é o rito do magistrado atualmente
aferido.
84
Nesse artigo, Machado defende a realização de concurso público, de provas apenas
escritas, sem provas orais, para todos os membros dos tribunais, estando aí, segundo ele, a
chave democrática para o fim da carreira na Magistratura.
Narrando as dificuldades do sistema eletivo para seleção de juízes, Reis menciona
estudos de André Tunc, Suzanne Tunc e de Harold Laski, nos Estados Unidos, dizendo que
as conseqüências deste democratismo judiciário foram péssimas. No início
deste século, as descrões de observadores europeus mostravam o
amesquinhamento da magistratura escolhida por eleão popular e o abalo na
sua indepenncia [...] os candidatos o eram procurados entre as pessoas de
valor, mais aptas para as fuões judiciárias, mas que o obteriam a maioria
dos sufgios. Eram preferidos advogados ambiciosos, intrigantes e insinuantes,
sabedores de como seduzir os eleitores. Deviam participar dos
meetings
e
contribuir para a caixa do partido, mas, se eleitos, seus vencimentos seriam
inferiores aos honorios que auferiam como advogados. Por vezes, o candidato
a juiz chegava ao ponto de anunciar, nos comícios, como julgaria as questões.
Era uma magistratura bil, na qual a população o tinha confiança nem
gozava de respeito [...] Por ocaso de processos importantes, os jornais
preparavam de tal maneira a opinião blica, a favor desta ou daquela decio,
que o magistrado era constrangido a segui-la, se não quisesse ser obrigado a se
demitir. Em Dakota do Norte, houve juízes que buscavam o favor de seu
eleitorado pela publicação de manifestos semanais acerca dos assuntos
judiciários.
85
83
ALMEIDA FILHO, José Baptista de. O fim da carreira ou do falso mérito e o controle do incontrolável.
Revista do Tribunal Regional Federal da Região, Brasília, v. 8, n. 1, p. 27-30, jan./mar. 1996 apud
BANDEIRA, Regina Maria Groba, op. cit., 2007.
84
MACHADO, Agapito. Concurso para todos os Poderes. Diário do Nordeste, Fortaleza, 09 jun. 1995 apud
BANDEIRA, Regina Maria Groba, op. cit., 2007.
85
REIS, Carlos David S. Aarão. A Escolha dos Juízes pelo voto popular. Revista de Processo, n. 78, p. 217-
231, abr./jun. 1995 apud TUNC, André; TUNC, Suzanne. Le Système Constitutionnel des États-Unis
70
Gonçalves também condena o sistema da eletividade, ao afirmar:
Em Roma, na França, na Suíça, na Rússia, na Iugoslávia e nos EUA - em
alguns de seus Estados - e, inclusive no Brasil Colônia quanto aos jzes da
vintena e os juízes ordinários, e no Brasil imrio quanto aos jzes de paz,
vigorou o sistema de seleção de jzes através de manifestação popular por
meio de votos [...] Hoje, tanto entre nós como em Roma, na Fraa, e em
Portugal, não subsiste mais o critério da eletividade pela evidência de sua
impropriedade. A uma porqueo é fácil para selecionar aquele que reúne
requisitos de personalidade e caráter, cultura geral e tamm jurídico-científica.
A duas pelo indisfaável comprometimento que passa a vincular o votado ao
votante, retirando daquele toda condição de ser imparcial no pronunciamento de
sua decio.
[…]
Por fim, o sistema de concurso público de provas para aferão do
conhecimento cienfico do candidato, e de títulos, que é o predominante em
nosso País e que tem dado mostras ao longo dos anos, comparado com os
demais critérios e pses, é o mais eficaz.
86
Enfim, em alguns países do sistema da common law, adota-se o sistema de seleção de
juízes por meio de eleição. Nos países que adotaram a tradição romano-germânica (civil law),
o sistema utilizado foi o do concurso público. A se admitir, portanto, a representação da
soberania popular no Poder Judiciário através da seleção de juízes pelo concurso público,
surge um paradoxo na democracia, entre o controle dos atos de governo e o sistema
representativo. Appio, então, indaga:
Como controlar o conteúdo dos atos políticos sem afrontar diretamente um
regime democrático ancorado na representação popular? O controle judicial não
representa, na ptica, um modelo de democracia aristocrática?
O conteúdo das decisões poticas o pode ser objeto de revio judicial, por
conta de sua legitimidade, decorrente do sistema representativo de exercício do
poder político no Brasil, bem como, pela clara interfencia em atividades
privativas dos demais Poderes da Reblica. Recorde-se, todavia, que o papel
construtivista da Constituição não consiste em uma atribuição exclusiva dos
governos eleitos, mas sim, numa tarefa que transcende os limites da
representatividade formal e da estrutura ornica do Estado. Nesse sentido, a
democracia participativa não revoga os fundamentos da democracia
representativa, mas apenas amplifica os instrumentos de proteção direta deste
valor constitucional [...] Não existe um conflito real entre democracia
representativa e participativa, na medida em que se trata de conceitos
complementares.
[…]
O controle judicial das poticas públicas implicará a substituão da vontade
dos membros dos demais Poderes pela vontade dos juízes, ou seja, a
d’Amérique. Paris, Domat Montchrestiein, 1954 e LASKI, Harold. The Tecnique of Judicial Appointment in
Studies in Law and Politics, New Haven, Yale University Press, 1932 / El Estado Modern: sus instituciones
políticas y económicas. Barcelona, Bosch, 1932 apud BANDEIRA, Maria Regina Groba, op. cit., 2007.
86
GONÇALVES, Willliam do Couto. O Juiz na História, critérios de sua escolha e a escola da magistratura.
Revista de Processo, São Paulo, n. 60, p. 180-186, out./dez. 1990 apud BANDEIRA, Maria Regina Groba, op.
cit., 2007.
71
substituição de um ato de vontade de agentes estatais eleitos pela vontade dos
o-eleitos.
[...] Contudo, a interveão judicial será mais pronunciada nos casos em que o
governo eleito se distanciar dos programas inicialmente propostos, na medida
em que o Poder Judicrio gozará, nestes casos, de uma legitimidade material
que decorre, exatamente, do sistema representativo.
87
E prossegue Appio, relacionando legitimidade e democracia:
A relação entre legitimidade e democracia é intensa, quando se considera a
superão dos postulados tradicionais de um sistema fundado exclusivamente na
representação popular, pois, como adverte Leonel Severo da Rocha, ‘não existe
mais a legitimidade em si; transcendente e indiscutível, justa e imaculada. A
legitimidade passa a ser um direito conquistado, todos os dias, transforma-se
num discurso no qual a justificação depende da práxis argumentativa racional’.
Já nos casos em que os governos eleitos seguem rigidamente os programas
propostos durante o debate eleitoral, a interveão judicial se mostra mida,
na medida em que, ao alterar uma política governamental, os óros do Poder
Judicrio terão de sustentar a legitimidade de suas decisões, à medida que o
o eleitos pela população, mas sim escolhidos através de mecanismos internos
de seleção […]
Portanto, a margem de discricionariedade política outorgada pelo próprio
constituinte aos governos eleitos não pode ser suprimida por força de uma
decisão judicial, sob pena de afronta ao sistema representativo e indevida
invasão de atribuições políticas.
88
Müller também questiona a legitimidade do Poder Judiciário, quando afirma:
Se desse modo os eleitos não mais decidem (porque decidem o ‘mercado’, bolsa
de valores, o FMI, o Banco Mundial & Cia.) e aqueles que decidem não o
eleitos, faz-se mister desenvolver estratégias de resistência democrática. Do
contrário, as formas de democracia direta ou participativa ficam inteiramente
impossibilitadas e mesmo a democracia tradicional do modelo representativo
sucumbe diante de uma exclusão que cada vez menos pode ser acobertada
a(sic) uma exclusão da esfera na qual o tomadas as decisões de longo
alcance.
89
Portanto,
ou se aceita que o Poder Judiciário é apenas um órgão administrativo,
formado por agentes políticos recrutados por concurso público, restrito a uma parcela da
aristocracia intelectual de formação privativamente jurídica, com grau de insindicabilidade
popular e perpetuação antidemocrática, representando o discurso oculto da tecnoburocracia,
das ideologias liberal, socialista e mercadológica, expresso no ordenamento jurídico que lhe é
dado interpretar, ou se admite, por esforço de conformação com o que está consolidado
doutrinariamente e com ideias defendidas por alguns teóricos da democracia, que
87
APPIO, Eduardo. Discricionariedade Política do Poder Judiciário. Curitiba: Juruá, 2006, p. 139-131.
88
Ibid., 2006, p. 141-142.
89
MÜLLER, Friedrich. A democracia, a globalização e a exclusão social. CONFERÊNCIA NACIONAL DOS
ADVOGADOS: CIDADANIA, ÉTICA E ESTADO, XVIII, 2002. Brasília, v. I, p. 262-274, p. 264, 2003 apud
APPIO, Eduardo, op. cit., 2006, p. 111-112.
72
a legitimidade do Poder Judiciário advém do grau de eficia social de suas
decisões, uma vez que os direitos sociais se constituem em condições de
possibilidade do exercício da liberdade humana, mas […] que o se trata de
defender um populismo judicial, mas sim, de um compromisso com a
‘continuidade da sociedade’[] que a judicialização da política é resultado da
aquisão de uma parcela de legitimidade política, retirada dos demais Poderes,
os quais teriam sido vítimas de uma colonizão.
90
Albuquerque sustenta, nesse mesmo sentido, “que a legitimidade das decisões judiciais
se assenta nos valores que ela busca consagrar, mediante a diuturna atualização de sua
fórmula política”.
91
Müller amplia a discussão e propõe que:
[...] para preservar democraticamente um sistema, a democracia o basta como
mecanismo único no plano institucional. Ela deve fundar-se nos direitos
humanos para todos. Exige um Estado de Direito configurado nos seus detalhes,
para que a implementação, a concretização das normas, democraticamente
deliberadas, disponha dos pametros mais operacionais posveis. E essa
democracia necessita, sobretudo, de uma política direcionada para estabelecer
equibrios sociais, de uma política justa, para que,
com efeito, todo o povo
possa participar democraticamente.
(grifo original).
[...]
[...]. E quando as instituições estatais encarregadas o zelam suficientemente
pelo cumprimento da sua tarefa de supervio da construção ou chegam mesmo
a violar a planta de constrão, a constituição, os cidadãos devem defender-se
:
resistência democrática
por meio da sociedade civil
. (grifo original).
Por sua vez, tanto a resistência quanto a atividade carecem de três condições
necessárias na democracia: direitos humanos eficazes; uma política social
empenhada na compensação das desigualdades […] e formas do Estado de
Direito, nas quais a resistência e a atividade possam expressar-se legalmente.
92
Müller, contrariamente aos que propugnam pela aceitação da atual matriz democrática
das decisões do Poder Judiciário, que é decorrente de autorização do legislador constitucional
ou em virtude da adoção de conteúdos hermenêuticos e interpretativos que efetivam os
direitos e garantias fundamentais, propõe, para o Poder Judiciário,
como participação regular dos poderes de Estado: a eleão de juízes pelo povo
(e.g. apenas para determinadas instâncias - inferiores - ou apenas para formas
espeficas como os jzes de paz ou as cortes arbitrais, ou apenas para
determinadas áreas do direito como o Direito Trabalhista [...] e é mesmo
necessária para a eleão de juízes constitucionais, ao menos pelo
parlamento).
93
90
ARRUDA JÚNIOR, Edmundo Lima; GONÇALVES, Marcus Fabiano. Direito, ordem e desordem: eficácia
dos direitos humanos e globalização. Florianópolis: Ida, 2004, p. 42-51.(Coleção Direitos Humanos) apud
APPIO, Eduardo, op. cit., 2006, p. 111.
91
ALBUQUERQUE, Mário Pimentel de. O órgão jurisdicional e sua função: estudos sobre a ideologia,
aspectos críticos, e o controle do Poder Judiciário. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 185 apud APPIO, Eduardo,
op. cit., 2006, p. 111.
92
MÜLLER, Friedrich, op. cit., 2003, p. 125-127.
93
MÜLLER, Friedrich, op. cit., 2003, p. 129.
73
Todo o pulsar entre esses dois modelos de exercício da soberania popular nas
funções jurisdicionais estabelece uma tensão válida na busca de soluções, as mais
próximas da vontade geral, constantemente em construção, visando à concreção da
democracia material.
Outra hipótese é apenas referendar a democracia formal e seus princípios retóricos.
Essa democracia
o visa ‘racionalizar autoridadepela participação dos cidaos, em processo
discursivo de formão de vontades. Nessa democracia o igualdade
potica. O pluralismo de elites substitui a autodeterminação do povo e afasta as
decisões que pactuam ou imem uma norma judica das pressões por
legitimação. O resultado disso é um direito extremamente funcional ao sistema
ecomico, mas que o cumpre a sua função de integração social legítima,
porque os destinatários o podem questionar a validade das normas a serem
seguidas e o fardo da integração social é carregado pela facticidade (coação de
saões exteriores). Daí surgem questões importantes: como pode surgir um
sistema de direitos que possua uma nese normativa legítima? E qual o critério
para o exame da legitimidade de pretenes de validade normativa no âmbito do
direito? Um questionamento profundo da democracia representativa liberal
individualista requer a construção de sistemas interpretativos independentes
da crença na legitimidade das instituões vigentes, para que possa restringir e
minar sistematicamente o só a capacidade adaptativa do modelo como
tamm as teorias que o sustentam. Nesta trilha, o pensamento de Jürgen
Habermas, ao encetar um caminho laando o da teoria do agir
comunicativo, possibilita a crítica da democracia formal, e, sobretudo permite
investigar o fundamento de validade de uma ordem jurídica legítima.
94
O mesmo raciocínio utilizado na análise da representatividade democrática externa para
a formação do Poder Judiciário pode ser extensivo ao seu corpo interno, como consequência
lógica da legitimação recebida pelo povo. Neste caso, quer se adote o princípio da
representatividade política ou o da funcionalidade para a continuidade democrática, lembra-
se, por oportuno, a advertência de Bobbio: “Enquanto a presença de um poder invisível
corrompe a democracia, a existência de grupos de poder que se sucedem mediante eleições
livres permanece, ao menos até agora, como a única forma na qual a democracia encontrou a
sua atuação”.
95
No Capítulo 4, adiante, serão expostas ideias e sugestões sobre a operacionalização da
democratização no Poder Judiciário.
94
JUSEFOVICZ, Eliseu. Democracia e legitimidade do direito à luz da teoria habermasiana. In: LOIS, Cecília
Caballero (Org.). Justiça e Democracia: entre o universalismo e o comunismo: a contribuição de Rawls,
Dworkin, Ackerman, Raz, Waltzer e Habermas para a moderna teoria da justa. São Paulo: Landy, 2005, p. 153-195.
95
NORBERTO, Bobbio, op. cit., 1986, p. 11.
3 MODELOS DE SELEÇÃO DOS JUÍZES NO BRASIL E NO
DIREITO COMPARADO: MÚLTIPLOS SISTEMAS
A complexidade da dinâmica social e econômica atual, com suas múltiplas e intrincadas
relações, formando cada uma delas micro-organizações, atribui à função judiciária a solução
de demandas não mais apenas limitadas a conflitos intersubjetivos, mas a contextos de
variados interesses coletivos e difusos.
Nesse sentido, o questionamento sobre as formas de acesso a uma das funções da
soberania estatal – a judiciária – é objeto de contínua reflexão, desde quando o individualismo
marcante do Estado liberal não conseguiu alcançar o idealismo propugnado de paz e bem-
estar social.
O que se constata na realidade das organizações políticas e nas diversas formas de
governo, é que tem se mantido quase historicamente inalterado o processo de escolha e
recrutamento dos juízes na grande maioria dos países, atendendo a critérios puros ou mistos,
instrumentalizando-se através de escolhas populares diretas e semidiretas; designações através
do Poder Legislativo; do Poder Executivo; do Imperador; do Rei; do Príncipe; do próprio
Poder Judiciário; de concursos públicos e mediante escolha dentre notáveis.
Bandeira, ao analisar os diversos métodos de seleção dos magistrados, menciona
classificação de Zaffaroni, para quem, quando o ingresso e a demissão dos juízes ocorrem por
juízo político, tem-se o modelo empírico-primitivo; nos casos em que a exigência de
seleção técnica e carreira estruturada no poder interno da cúpula, o modelo é o
tecnoburocrático e quando o Poder é entregue a um órgão pluralista, separado das últimas
instâncias e formado por juízes eleitos horizontalmente por outros magistrados, a estrutura
judiciária seria a do tipo democrático contemporâneo. No esquema dessa classificação, os
países latino-americanos adotam o modelo empírico-primitivo, com exceção do Brasil, cuja
Justiça segue o modelo tecnoburocrático.
1
1
BANDEIRA, Regina Maria Groba, op. cit., 2007.
75
Essa mesma classificação atribuída ao modelo brasileiro, no sentido tecnoburocrático, é
a adotada por Rocha, quando afirma que:
[...] os governantes das diferentes justiças são escolhidos dentre os membros dos
respectivos tribunais, por eleição, na qual votam apenas os componentes desses
mesmos tribunais. Trata-se, evidentemente, de um modo de acesso ao poder e de
uma forma de exercê-lo, caracteristicamente autocrático, uma vez que a chefia é
privativa da pequena classe de magistrados dos tribunais que se auto-elegem,
perpetuando-se no poder e dele marginalizando a grande maioria.
[...]
Esta articulação entre magistratura e dirigentes do Judiciário reveste importância sob
dois aspectos, entre outros. O primeiro, relacionado à sua compatibilidade com o
princípio democrático inscrito no art. 1º da Constituição, conforme o qual, o Brasil é
um Estado Democrático de Direito, incompatível, pois, com uma organização
autocrática, de vez que a essência da democracia é a participação de todos e o
exercício do poder pela maioria. Lembre-se, por oportuno, que o princípio
democrático tem um âmbito de aplicação geral, estendendo-se a todos os setores do
Estado, especialmente ao Judiciário, uma de suas instituições fundamentais. O outro
aspecto refere-se à influência dessa forma de organização na atuação funcional do
juiz.
2
Rocha, analisando a estrutura interna do Judiciário brasileiro, entende tratar-se de uma
organização burocrática, no sentido weberiano. E acrescenta:
Para Weber a burocracia é, essencialmente, um sistema de organização do poder que
tem como principais características os elementos seguintes: a) a distribuição vertical
do pessoal dentro da organização; b) a profissionalização; c) a propensão por um
método decisório técnico.
A distribuição vertical do pessoal dentro da organização origem ao processo de
hierarquização do poder [...] A organização burocrática aparece, pois, com a
configuração geométrica de uma pirâmide.
A profissionalização significa que os membros da organização se atribuem um
âmbito de atividades que consideram de sua peculiar competência.
Finalmente, a propensão por métodos decisionais técnicos exprime a idéia de que os
membros da organização formulam suas decisões com base em critérios técnicos e
não voluntários ou subjetivos.
3
Na ordem esquemática dessa classificação, Rocha conclui ter o Judiciário brasileiro
estruturação correspondente aos traços essenciais da organização burocrática tipificada por
Weber, principalmente quanto à verticalização das funções, sendo os órgãos do Judiciário
uma autocracia, “no sentido de que são independentes da coletividade dos administrados,
sobre os quais exercem um poder praticamente absoluto”.
4
Ao descrever as diversas formas de seleção dos juízes para o exercício da função
jurisdicional, não se pode esquecer que em Estados distintos há fórmulas diferentes de
2
ROCHA, José de Albuquerque, op. cit., 1995, p. 43-44.
3
Ibid., 1995, p. 44.
4
Ibid., 1995, p. 45.
76
organização política, algumas delas democráticas e outras nem tanto, porém, são exemplos
acreditados pelo povo que, conformado, também participa com a aceitação da delegação
outorgada a seus representantes.
A seguir, uma breve síntese do modelo de recrutamento de juízes no período
republicano brasileiro e no direito comparado.
3.1 Brasil
A Constituição Imperial brasileira de 1824 dispunha sobre nomeação de juízes-
árbitros e a eleição de juízes, nos Arts. 160 e 162, respectivamente. Os juízes eleitos eram
chamados de juízes de paz e eram os responsáveis pelas tentativas de conciliação, sem as
quais não se iniciava processo algum.
A Constituição de 1891 não previu a forma de seleção dos juízes ao longo dos Arts. 55 a
62 de seu texto. Não havia proibição de atividade político-partidária dos juízes. O Presidente
da República nomeava os ministros do Supremo Tribunal Federal, que chegou a ter um
ministro médico (Barata Ribeiro), nomeado por Floriano Peixoto, pois à época exigia-se
apenas notável saber e reputação, além de idade superior a 35 anos (Art. 56).
Os juízes federais tinham cargos criados pelo Congresso (Art. 55) e eram nomeados
pelo Presidente da República, mediante proposta do Supremo Tribunal Federal (Art. 48, n.º
11), acontecendo o mesmo com os cargos criados para os tribunais.
A Constituição de 1934 introduziu a regra do concurso público para o provimento de
cargos de juiz de Primeiro Grau nos Estados, Distrito Federal e Territórios, mediante normas
de organização judiciária locais (Art. 104, alínea “a”). O acesso aos graus superiores se dava por
antiguidade e por merecimento, respeitando-se a regra do quinto constitucional, reservando-se
vagas para advogados e membros do Ministério Público (Art. 104, alínea “b” e § 6º).
Os Estados podiam manter a Justiça de Paz eletiva, fixando-lhe a competência (Art.
104, § 4º), assim como podiam criar cargos de juiz com investidura limitada a certo tempo e
competência para julgamento das causas de pequeno valor, preparo das excedentes da sua
alçada e substituição dos juízes vitalícios (Art. 104, § 7º).
Os juízes federais eram nomeados pelo Presidente da República dentre brasileiros natos
de reconhecido saber jurídico e reputação ilibada, com idade entre 30 e 60 anos, indicados, na
77
forma da lei e por escrutínio secreto, pela Corte Suprema (Art. 80 e seu parágrafo único).
Criou-se a Justiça Eleitoral e a Justiça Militar como órgãos integrantes do Poder Judiciário
(Art. 63, alíneas “c” e “d”).
A Corte Suprema era composta por onze ministros, nomeados pelo Presidente da
República, com aprovação do Senado Federal, dentre brasileiros de notável saber jurídico e
reputação ilibada, alistados eleitores, com idade entre 35 e 65 anos, salvo se magistrados
(Arts. 73 e 74). Vedava-se ao juiz atividade político-partidária (Art. 66).
A Constituição de 1937 manteve as mesmas regras para os juízes estaduais, do Distrito
Federal e dos Territórios (Arts. 103 a 110) e não previu a existência de juízes e tribunais
federais dentre os órgãos do Poder Judiciário (Art. 90). Havia, no entanto, como na
Constituição de 1934, juízes e Tribunais Militares (Art. 90, alínea “c”); juízes de paz eleitos e
juízes de investidura temporária, com competência para causas de pequeno valor.
A Corte Suprema voltou a chamar-se Supremo Tribunal Federal, composto de 11
ministros, nomeados pelo Presidente da República, com aprovação do Conselho Federal,
órgão assemelhado ao Senado Federal, que deixou de existir durante essa Constituição. A
idade mínima para o cargo era de 35 anos e a máxima, de 58 anos (Arts. 97 e 98).
A Carta de 1946 constitucionalizou a Justiça do Trabalho, inserindo como órgãos
integrantes do Poder Judiciário juízes e Tribunais do Trabalho. A Justiça Eleitoral e a Justiça
Federal, outrora compondo o texto constitucional de 1934, mantiveram-se fora da Carta de
1937 e 1946. Surgiu o Tribunal Federal de Recursos. Havia vedação para o exercício de
atividade político-partidária. Juízes estaduais eram recrutados por meio de concurso público
de provas. Manteve-se a Justiça de Paz temporária.
A Constituição de 1967 restabeleceu a previsão de juízes federais (Art. 112, inciso III) e
criou o Conselho Nacional da Magistratura. O recrutamento para juízes estaduais e federais
dava-se mediante concurso público de títulos e provas (Arts. 123, § 1º e 144, inciso I).
Havia Justiça de Paz temporária para celebração de casamentos; juízes togados com
investidura limitada no tempo, para julgamento de causas de pequeno valor e crimes que não
cominassem penas de reclusão.
78
A Constituição de 1969 repetiu as regras da Constituição de 1967, acrescendo a
possibilidade de a lei exigir dos candidatos prova de habilitação em curso de preparação para
a Magistratura (Art. 144, inciso I, alterado pela Emenda Constitucional n.º 7, de 13.04.1977).
A atual Constituição de 1988, com as Emendas Constitucionais n.º 19/98, 20/98 e
45/2004, prevê a exigência mínima de 3 anos de prática em atividade jurídica, para o ingresso
na carreira de magistrado, além de concurso público de provas e títulos, com aferição do
merecimento nas promoções, dentre outras exigências, mediante o aproveitamento do juiz em
cursos oficiais ou reconhecidos de aperfeiçoamento (Art. 93, inciso II, alínea c). Também são
previstos cursos oficiais de preparação, aperfeiçoamento e promoção de magistrados, como
etapa obrigatória do processo de vitaliciamento, ministrados em Escolas Nacionais de
Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados. A Lei Orgânica da Magistratura Nacional - Lei
Complementar Nacional n.º 35, de 14.3.1979 -, foi recepcionada como constitucional, e
também dispôs que a lei podia exigir dos candidatos para inscrição em concursos de seleção
de juízes título de habilitação em curso oficial de preparação para a Magistratura (Art. 78, § 1º).
A Justiça de Paz, consoante a Constituição de 1988, é remunerada, composta de
cidadãos eleitos pelo voto direto, universal e secreto, com mandato de quatro anos e
competência para celebrar casamentos, verificar os respectivos processos de habilitação e
exercer atribuições conciliatórias, sem caráter jurisdicional, além de outras que venham a ser
previstas na legislação.
Os membros dos Tribunais Superiores (Superior Tribunal de Justiça, Tribunal Superior
do Trabalho, Tribunal Superior Eleitoral e Superior Tribunal Militar), do Supremo Tribunal
Federal e do Conselho Nacional de Justiça, este, agora instalado, são escolhidos e nomeados
pelo Presidente da República, independente de concurso público, com observância de uma
complexidade constitucional consensual, formada pela reunião de vontades envolvendo uma
corporação classista (Ordem dos Advogados do Brasil); membros de tribunais estaduais,
distrital e regionais; a sociedade (Ministério Público); as Forças Armadas (Exército, Marinha
e Aeronáutica); juízes de Primeiro Grau; os Estados, representados pelo Senado Federal e o
povo, representado pela Câmara Federal.
Também independe de concurso público a escolha dos membros dos Tribunais de
Justiça Estaduais e Distrital, dos Tribunais Regionais Federais, Eleitorais, Trabalho e dos
Tribunais Militares Estaduais, cujo acesso se através de critérios de merecimento e
79
antiguidade, alternadamente, em relação a juízes de carreira concursados no Primeiro Grau de
jurisdição; e pela regra do quinto constitucional, para os membros do Ministério Público,
também concursados no Primeiro Grau, e os da Advocacia. O ingresso de advogados e
membros do Ministério Público é instrumentalizado por um procedimento envolvendo quatro
fases (eleição direta entre os pares; formação de lista sêxtupla pelos respectivos órgãos
superiores; redução a uma lista tríplice pelos tribunais destinatários; e escolha e nomeação
pelo Presidente da República, no caso dos Tribunais Regionais do Trabalho, Federais e
Eleitorais, e pelos Governadores dos Estados e do Distrito Federal, em se tratando de
Tribunais de Justiça Estaduais, Distrital e Tribunais Militares Estaduais.
Nos exemplos seguintes (3.2 a 3.10), colhe-se das pesquisas de Nalini e Bandeira
síntese das principais características do recrutamento de juízes em alguns países.
3.2 Alemanha
Em regra, os juízes são selecionados com base em exames finais nas faculdades de
direito. O sistema seletivo é o de adestramento teórico-prático, comum a todas as profissões
legais. Compreende estudos nas universidades, nos ofícios judiciários e na Administração
Pública, de quatro a cinco anos. Ao final do período de dois anos de prática nos tribunais, em
repartições públicas e em bancas de advogados (Referendardienst), o Referender submete-se a
um exame estatal (Assesorexamen). Há aferição vocacional e parte desse adestramento é
remunerada. Após a seleção, um período probatório de três a cinco anos. A carreira na
Magistratura atende a critérios de antiguidade e merecimento.
São escolhidos os candidatos que obtiverem as melhores notas no Assesorexamen,
nomeados para as instâncias inferiores da Judicatura, dentre aqueles com idade entre 25 e 26
anos.
Vencido o estágio de prova, o juiz é nomeado em caráter vitalício, pelo Ministro da
Justiça. Participa da seleção uma comissão (Richterwahlausschuss), com integrantes diversos,
segundo a entidade federativa, formada por representantes do Parlamento, da Judicatura e do
Executivo.
5
5
WOLF, Manfred. Ausbildung, Auswahl und Ernennung der Richter. RePro, 10/125-126 apud NALINI, José
Renato. Recrutamento e preparo de juízes. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1992, p. 24.
80
A comissão encarregada avalia o rito do candidato, ouve o Conselho Judicial
(Presidialrat), cuja opinião não é vinculativa, e, após, indica o nome do aprovado para a
nomeação.
A escolha dos juízes do Tribunal Federal Constitucional (sundesverfassungssricht) dá-
se dentre nomes indicados pela Câmara Federal (Bundestag) e pelo Conselho Federal
(Bundesrat), em partes iguais, para um período de 12 anos (Lei Fundamental, de 23.5.1949,
Art. 94).
Existem ainda juízes não profissionais, os escabinos (Schoffen), em tribunais penais e
assessores (Ehrenamtliche Richter), atuando em órgãos judiciais. São escolhidos por comitês
populares ou associações profissionais e sindicais e designados pelos tribunais ou pelo
Executivo, para períodos anuais. Wolf afirma ainda, consoante Nalini, que:
Tais juízes leigos concorrem com os profissionais para decidir os assuntos tanto nos
aspectos de fato como de direito. Os escabinos atuam nos Tribunais Penais de
primeira instância e de apelação, mas não nas Cortes Federais. Os assessores atuam
nas salas mercantis dos Tribunais Civis de Apelação e nos Tribunais
Administrativos e Financeiros tanto de primeira como de segunda instância,
enquanto os assessores dos Tribunais Sociais e do Trabalho funcionam tanto em
primeira instância como em apelação, e inclusive nos Tribunais Supremos Federais.
6
3.3 Espanha
A seleção dos juízes, antes realizada através da Escuela Judicial, agora é feita pelo
Centro de Estudos Judiciales, por meio das oposiciones, que são formulações teóricas
preparadas para aferir o nível do candidato. O aspirante permanece por um período de cerca
de três meses no Centro e submete-se às oposiciones, que não são difíceis, porque um
consenso de que é “melhor um juiz inexperto do que comarca vaga”.
7
A aposentadoria compulsória dos juízes e funcionários públicos dá-se aos 65 anos e
cerca de um juiz para cada 10.800 habitantes.
Critica-se a política de formação dos juízes dizendo que se privilegia mais a quantidade
do que a qualidade. A Ley Orgánica del Poder Judicial, de 1985, reduziu o número de temas
escolhidos nas oposiciones (provas seletivas), substituindo a oralidade e os prazos limitados,
por uma maior liberdade expositiva em provas escritas, com maior duração.
6
Ibid., 1992, p. 24.
7
BLANCA, Luiz Gago. La formación de los Jueces. Revista Independiente de Justicia, B. C. Publicaciones,
Madri, fev./mar. 1991, p. 32 apud NALINI, José Renato, op. cit., 1992, p. 41.
81
Após a aprovação nas oposiciones, o aspirante é admitido como estagiário no Centro de
Estudos Judiciales, cujos resultados são adicionados às provas teóricas realizadas, podendo
repetir o curso, se reprovado. Durante o curso prático no Centro, o aspirante recebe uma
remuneração, mensalmente.
3.4 Estados Unidos
Não concurso público. Os juízes federais são nomeados pelo Executivo, após
indicação de nomes de profissionais com indiscutível valor jurídico, sugeridos pelos
Tribunais, Congresso Nacional, Associações de Classe, vinculando a discricionariedade.
Schwartz destaca que, na prática, o Gabinete do Advogado Geral, o FBI, a Associação
Nacional dos Advogados, o Comitê Judicial do Senado, os senadores da unidade federada em
que se apresenta a vaga e grupos privados que apoiam ou se opõem aos candidatos interferem
diretamente no processo.
8
No plano da Justiça Estadual, são as unidades federadas que escolhem o processo.
Assim, em 37 estados, os juízes locais são eleitos; em nove estados, é o Poder Legislativo que
os designa; e no restante, são escolhidos pelo Governador.
vários métodos de seleção, porém os mais comuns são: a) o Merit Selection,
conhecido por Plano do Missouri; b) o Elective Selection; e c) o Executive Appointment
Selection.
Pelo Plano Missouri, forma-se uma Comissão composta pelo Presidente da Suprema
Corte local, três advogados e três representantes do povo, indicados pelo Governador. Propõe-
se uma lista tríplice e o Governador escolhe um nome, que exercerá o cargo de juiz por um
ano. O juiz submete-se a uma votação popular para a confirmação de seu nome. Após a
confirmação, o juiz exercerá suas funções por doze anos em um Tribunal de Apelação e por
seis anos em uma Corte de primeira instância, podendo ser reeleito. Quase sempre os juízes
são egressos da classe dos advogados militantes, podendo ainda ser servidores públicos ou
professores.
8
SCHWARTZ, Carl E. Judicial Selection, Supervision and Removal in the United States. RePro, 10/121 apud NALINI, José
Renato, op. cit., 1992, p. 63.
82
Nas nomeações dos juízes federais, quase sempre o Presidente da República referenda
nomes de seu Partido Político. O mesmo ocorre no plano estadual, com os juízes sendo
referendados pelos governadores.
Os juízes federais nos Estados Unidos podem ser destituídos por má conduta,
mediante um processo instaurado no Congresso Federal. Consta que apenas nove juízes
federais, incluindo um membro da Suprema Corte, foram processados, e quatro
condenados. Schwartz afirma que:
A eleição popular dos juízes fracassou nos Estados Unidos e o sistema de
designação dos candidatos por titulares do Poder Executivo, com aprovação
legislativa ou sem ela, também demonstrou sua ineficácia pela excessiva influência
partidária e inclusive a possibilidade de corrupção, e até os procedimentos que
combinam ambos os sistemas para levar em consideração a capacidade dos
candidatos, como o chamado ‘Plano Missouri’, que deixou muito poder em mãos
dos colégios de Advogados locais e nacionais.
9
Bandeira, ao comentar a crítica sobre o processo seletivo de juízes nos Estados Unidos,
cita o professor Meador, catedrático de Direito da Universidade da Virgínia, que em sua obra
American Courts questiona a adequação da função jurisdicional ao sistema eleitoral, que
demanda, entre outras providências, filiação partidária e apresentação de plataformas pelos
magistrados. Dentre as críticas de Meador, Bandeira destaca:
O financiamento de campanha é outro grave problema, com o crescente aumento de
custo, principalmente da publicidade televisiva, essencial para o sucesso da disputa.
Nesse passo, os candidatos têm que levantar fundos junto a advogados e empresas
que podem ser partes em processos futuros. Conclui o professor, então, que o dano à
objetividade judicial e à aparência dessa objetividade é óbvio.
10
3.5 França
Não obrigatoriedade de formação universitária específica em matéria jurídica para a
Magistratura. Isso é exigido apenas para a Advocacia.
A Magistratura judicante francesa de grau tem formação funcional na École
Nationale de la Magistrature Française, em curso com duração de três anos, com aulas
teóricas e práticas, além de formação humanística e sociológica. Após esse curso e diversos
estágios, os candidatos se submetem a concurso.
9
Ibid., 1992, p. 63.
10
BANDEIRA, Regina Maria Groba, op. cit., 2007.
83
Aprovados nessa fase seletiva final, o Conseil Supérieur de la Magistrature, presidido
pelo Presidente da República e integrado por doze membros magistrados e três não
magistrados, opina sobre o aproveitamento do candidato.
Há ainda uma Magistratura administrativa e contábil, com um centro de formação
próprio, a Escola Nacional de Administração. A carreira de magistrado tem seleção
competitiva e seletiva e adota critérios de mérito e antiguidade nas promoções.
A Escola Nacional da Magistratura francesa surgiu em 1970, por transformação do
Centro Nacional de Estudos Judiciários e como resposta a uma crise que acometeu os
métodos de recrutamento da Magistratura masculina francesa, predominando a feminização
da Magistratura.
11
É preocupação da Escola francesa o despreparo entre candidatos homens e mulheres,
com nível básico de conhecimentos insuficiente, ausência de autoridade e racionalidade
mínimas.
A Escola francesa pugna por uma formação eclética para o magistrado, incluindo
matérias atinentes às ciências humanas e sociais. Para a formação francesa, diz-se que:
O Magistrado deve ser um homem de decisão e de reflexão e não apenas um técnico
do Direito. Ele não é mais considerado, hoje, como um padre exercendo qualquer
função sacra. A profissão exige uma cultura geral muito aprofundada e de noções
gerais em disciplinas muito diversas: medicina, contabilidade, ciências humanas etc.,
todas em evolução constante.
12
3.6 Inglaterra
Não necessidade de qualificação jurídica para a Magistratura inglesa. um
Conselho Consultivo Nacional para o Treinamento de Magistrados, denominado National
Advisory Council on The Training of Magistrates.
Nalini afirma que todos os agentes que exercem funções judicantes, dos juízes da
Câmara dos Lordes e das Cortes Superiores, aos magistrados estipendiados e juízes de paz,
são independentes tanto do Legislativo como do Executivo.
11
BOIGEOL, Anne. La Formation des Magistrats. Actae de La Recherche en Science Social, Rapport/1954,
par le Conseiller Ancel, v. 64/50 apud NALINI, José Renato, op. cit., 1992, p. 44-45.
12
HUET, Sophie. La Formation des Magistrats. In: La Formation des Magistrats, La Justice. Les Cahiers
Français, n. 156-157/23 apud NALINI, José Renato, op. cit., 1992, p. 46.
84
A Coroa, aconselhada pelos ministros, nomeia os altos membros do Judiciário: os
Lordes de Apelação vitalícios, o Lorde Presidente da Suprema Corte, o Master of the Rolls, o
Presidente do Tribunal de Testamento, Divórcio e Almirantado e os juízes da Corte de
Apelação (Court of Appeal), todos por recomendação do Primeiro Ministro.
O Lorde Chanceler nomeia os juízes inferiores da Alta Corte (Puisne Judges), os juízes
das Cortes Distritais (exceto no Lancashire, onde eles são nomeados pelo Chanceler do
Ducado de Lancashire), os Presidentes das Sessões Trimestrais, as autoridades judiciárias dos
burgos, os magistrados metropolitanos e outros juízes remunerados. Os juízes de paz são
nomeados pelo Lorde Chanceler em nome da Coroa.
Nas nomeações para os condados, o Lorde Chanceler é assessorado pelo Lorde
Lieutenant, com a assistência de um comitê consultivo local e, quanto aos burgos, por outro
comitê consultivo. Nalini acrescenta que:
Exceção feita no caso do Lorde Chanceler que, sendo o Chefe do Judiciário para
alguns fins, é também destacado membro do Governo nomeado por recomendação
do Primeiro Ministro, considerações políticas não intervêm na nomeação dos juízes.
Nem estes, tampouco, são escolhidos no seio da numerosa classe dos servidores
civis do Judiciário. Exceto os juízes de paz, os magistrados na Inglaterra m sido
sempre escolhidos entre os advogados militantes (barristers). O juiz de um burgo
(que trabalha só meio expediente) deve, por exemplo, ter sido um barrister com pelo
menos, cinco anos de atividade ininterrupta; prazo que se dilata para sete em relação
a juiz distrital ou magistrado estipendiado.
Em certas circunstâncias, v.g., em casos de prevaricação ou incapacidade provada,
juízes das cortes inferiores podem ser removidos de sua posição pelo Lorde
Chanceler, mas todos os juízes superiores (exceto o próprio Lorde Chanceler que,
como Ministro do Gabinete, muda com o Governo), exercem o posto enquanto se
conduzirem bem, sujeitos apenas à remoção por ordem do Soberano, mediante
comunicação apresentada por ambas as Casas do Parlamento. Esta disposição da Lei
da Judicatura (Consolidação) de 1925 – que deriva, por via da Lei da Suprema Corte
de Judicatura, de 1875, do Act of Settlement, de 1701 teve por fim perpetuar a
independência do judiciário. A idade compulsória para aposentadoria dos juízes é de
75 anos.
13
Nas Cortes do interior, tendência de nomeação de advogados que não foram bem-
sucedidos em sua profissão, sendo tidos como honestos, mas de pouco preparo intelectual. Os
magistrados que ocupam cargos remunerados, em regra, atuam nos grandes centros e são
afeitos à matéria criminal.
ainda magistrados leigos, nomeados por recompensa a serviços públicos,
funcionando aos pares, sem necessidade de preparo jurídico. São criticados pela desproporção
13
Ibid., 1992, p. 52.
85
nas punições aplicadas, pela tendência ao partidarismo e pela discriminação de classes em
delitos menos graves.
3.7 Itália
O concurso público é a forma adotada na Itália. O certame é realizado para acesso único
tanto a juízes, como a promotores e funcionários de carreira diretiva do Ministério da Justiça.
Exige-se saúde comprovada (poder escrever e ouvir); moral aferida (não ter sido
condenado por crime doloso ou não responder a processo semelhante) e prova de
conhecimentos escrita e oral. O concurso transcorre em prazo longo, durante dois a três anos.
A Constituição italiana, de 22.12.1947, possibilita ao legislador infraconstitucional a
regulação da participação popular direta na Magistratura, por designação ou eleição, de juízes
honorários para todas as funções inerentes aos juízes concursados (Art. 106). Podem exercer
cargo de vogal no Tribunal Supremo (Consiglieri di Cassazione), por méritos pessoais,
mediante designação do Conselho Superior da Magistratura, catedráticos de universidades
jurídicas e advogados com pelo menos quinze anos de exercício.
3.8 Portugal
O Centro de Estudos Judiciários é uma instituição responsável pela formação inicial,
complementar e permanente de magistrados, subordinado ao Ministério da Justiça.
Para o ingresso no Centro, o candidato submete-se a testes de aptidão, exceto se doutor
em Direito, advogado, conservador e notário, com pelo menos sete anos de atividade
profissional e classificação de serviço não inferior a bom, ou informação favorável da Ordem
dos Advogados. Essa reserva limita-se a um quinto das vagas disponíveis.
Os testes envolvem prova escrita e oral, em temas sobre questões sociais, econômicas,
culturais e jurídicas. A banca é presidida pelo diretor do Centro e é formada por um júri
composto por um magistrado do Ministério Público, dois professores do Centro e duas
personalidades de reconhecida idoneidade no domínio da cultura.
A formação inicial do magistrado exige dez meses de atividades teórico-práticas;
estágio de iniciação junto aos tribunais, com duração de dez meses; estágio de pré-afetação
86
junto aos tribunais, com duração de seis meses; e três meses de atividades de formação
complementar, a serem realizadas nos primeiros cinco anos de exercício da Magistratura.
Os participantes do curso e estágio proporcionado pelo Centro de Estudos Judiciários
podem optar, ao final, conforme seu aproveitamento, pela Magistratura Judicial, pela
Magistratura do Ministério Público, pela Conservadoria (registro imobiliário) ou pelo
Notariado (titularidade dos cartórios de notas ou tabelionatos).
3.9 Suíça
Os juízes dos Cantões o eleitos pelo povo, para mandatos de 4 a 6 anos, podendo ser
reeleitos até que completem 65 ou 70 anos. No plano federal e em vários tribunais cantonais,
os juízes são eleitos pelo Parlamento. A Confederação Helvética, a exemplo dos Estados
Unidos, tem regras distintas para os seus Cantões.
3.10 Japão
Ao terminar os estudos universitários, os candidatos se submetem a um exame nacional
de caráter jurídico. Após o resultado, os aprovados ingressam no Instituto de Prática e
Investigação Jurídica, para treinamento constante de teoria e prática, por dois anos, junto a
diversos tribunais.
Ao final, submetem-se a um segundo exame, perante um comitê especial, presidido pelo
Presidente da Suprema Corte. Concluída essa etapa, os candidatos estão aptos a funcionar
como juízes assistentes, funcionários do Ministério Público ou exercer a Advocacia.
O Presidente da Suprema Corte é nomeado pelo Imperador, após indicação do Gabinete,
que designa os demais membros da Corte. Na primeira eleição seguinte da Câmara de
Deputados, os juízes da Corte têm suas nomeações revistas pelo voto popular, ocorrendo outra
aferição similar após 10 anos. Até esse período, os juízes podem ser destituídos e,
ultrapassando essa fase, são vitaliciados, exercendo suas funções até os 70 anos. Na primeira
instância, a compulsória dá-se aos 65 anos. Para ser designado juiz titular, é preciso
experiência anterior de pelo menos 10 anos como juiz assistente, podendo adicionar-se a esse
período o tempo de prática junto ao Ministério Público ou na Advocacia.
4 DEMOCRACIA E PROJEÇÃO DA SOBERANIA POPULAR
NO PODER JUDICIÁRIO E NA DEFESA DA ORDEM
JURÍDICA: POSSIBILIDADES, ENTRAVES, SUGESTÕES
Seja qual for a forma de expressão da vontade geral na democracia, como manifestação
da amplitude do poder político, jurídico, econômico, cultural, enfim, da vontade da sociedade
pluralista, impõe-se a abertura da legalidade para a legitimação dos diversos núcleos de poder
que formam a soberania popular.
Se essa expressão se por meio de delegação indireta do poder, de forma semidireta e
compartilhada ou diretamente, são questionamentos que a experimentação, a construção
teórica, a tensão decorrente da luta interna entre esses centros de poder e as novas
configurações da ordem globalizada irão determinar, com a dialeticidade quase atávica que
caracteriza o equacionamento dessas variáveis, que se mesclam e se organizam
simultaneamente no processo de tentativas, constatações e expectativas, na construção da
realidade.
No Poder Judiciário, a efetivação do Princípio Democrático do Estado de Direito pode
se dar mediante ampliação da legitimação democrática na prestação jurisdicional, publicidade
de decisões e assuntos diversos de sua estrutura, acessibilidade xima aos serviços
prestados, simplificação das formalidades instrumentais, aperfeiçoamento do processo de
recrutamento, formação e garantias dos magistrados, dotação orçamentária compatível com as
necessidades materiais do Poder, estruturação das carreiras, otimização da relação existente
entre a quantidade de magistrados e de processos, equilíbrio da representação judiciária no
pacto federativo, sistemas de controle, dentre outras nuances que, por metodologia desse
trabalho, serão abordadas como aberturas externas e internas para a legitimação e a
democratização do Poder Judiciário.
88
4.1 Aberturas para a legitimação e a democratização externas da função
judiciária e no Poder Judiciário
Consiste a ideia de legitimação e democratização externas da função judiciária e no
Poder Judiciário, em ações pelas quais o povo e a organização da sociedade civil se inserem
na dinâmica desse poder, participando na formação da prestação jurisdicional consensual ou
conflitual, com ou sem a intermediação de juízes togados, em uma fase específica do
reconhecimento do Direito ou na sua atuação efetiva e executória, assim como também nos
meios de acessibilidade aos serviços e agentes prestacionais demandados.
Às práticas existentes e às outras extintas, somam-se sugestões e críticas no sentido
da sua ampliação, restabelecimento e modificação, para aproximar e diminuir os espaços
democráticos excludentes, na tentativa de romper com o dogmatismo que aparelha os
mecanismos de dominação do poder.
4.1.1 Justiça Arbitral
Conceitua-se a arbitragem como sendo
meio alternativo de solução de controvérsias através da intervenção de uma ou mais
pessoas que recebem seus poderes de uma convenção privada, decidindo com base
nela, sem intervenção estatal, sendo a decisão destinada a assumir a mesma eficácia
da sentença judicial [...] colocada à disposição de quem quer que seja, para solução
de conflitos relativos a direitos patrimoniais acerca dos quais os litigantes possam
dispor.
1
Distingue-se a arbitragem da mediação e da conciliação, essencialmente, porque “o
objetivo da primeira é a obtenção de uma solução imposta por um terceiro imparcial,
enquanto as duas últimas visam à celebração de um acordo”,
2
atuando este terceiro apenas
como aproximador das partes, as quais resolverão o conflito, pessoalmente e diretamente.
Conciliação e mediação, como meios autocompositivos de solução das controvérsias diferem,
basicamente, pela atuação de um terceiro intercalado aos conflitantes, agindo o mediador
como um potencializador de sugestões das próprias partes e o conciliador, exercendo uma
função mais ativa, propondo, inclusive, sugestões.
3
1
CARMONA, Carlos Alberto, op. cit., 2004, p. 51.
2
CARMONA, Carlos Alberto, op. cit., 2004, p. 53.
3
CÂMARA, Alexandre Freitas. Arbitragem: Lei nº 9.307/96. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 1997, p. 129.
89
Como alternativa à solução de controvérsias, a arbitragem é meio através do qual
rompe-se o monopólio da atividade compositiva estatal de natureza jurisdicional, quando se
tratar de dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis e mutuamente acordados.
A ampliação da legitimação popular para o exercício da função outrora tipicamente
estatal foi recepcionada por alguns doutrinadores, como Carnelutti, como um equivalente
jurisdicional, pois entendia o jurista italiano que a jurisdição apenas poderia ser prestada pelo
Estado, resumindo-se a decisão arbitral, apenas por semelhança, ao método estatal de
resolução das lides.
Para situar a evolução desse método e a natureza jurídica da decisão arbitral, mister um
breve esboço de sua utilização ao longo da história universal e também da nacional.
Os babilônios já resolviam seus conflitos por meio da arbitragem pública. Os hebreus
assim procediam, para conflitos privados. No caso dos gregos, entre as cidades-Estado, “havia
um tribunal intermunicipal, no qual questionava-se a existência da arbitragem compromissória
e da obrigatória”.
4
O tratado pactuado entre Espanha e Atenas, em 455 a.C., previa cláusula
compromissória como meio de solução pacífica dos conflitos de interesses. Na Roma antiga
havia o arbitramento clássico, que só veio a perder força quando o Estado se publiciza,
perdurando até o fim do Império. No período Justiniano
a decisão arbitral tinha valor intrínseco. Cabia ao árbitro o exame e a decisão de
pendências relativas ao preço na compra, venda e na locação. Na Constituição de
Justiniano (531 a.C.) se houvesse cláusula de penalidade haveria interferência do
magistrado na execução do laudo arbitral.
5
Com a concentração do poder no Estado romano, desaparece a figura do iudex ou do
arbiter, reunindo-se nas mãos do pretor as etapas do in jure e apud judicem, por delegação da
auctoritas pelo Imperador. Surge, então, a figura do juiz como órgão estatal, com o poder-
dever de prestar a jurisdição.
Na sociedade feudal e no âmbito da common law, a arbitragem também teve papel
importante e decisivo como método de solução de conflitos.
4
STRASSMANN, Karin; LUCHI, Cínthia. O instituto da arbitragem no Brasil. Disponível em:
<http://jusvi.com/artigos/19677/1>. Acesso em: 17 abr. 2008.
5
Ibid., 2008, on-line.
90
No Brasil, a previsão da arbitragem constou da Constituição Imperial de 1824 (Art.
160), para a solução de litígios cíveis. Em 1831 e em 1837, litígios referentes à locação de
serviços eram resolvidos por meio de arbitragem e, em 1850, com o advento do Código
Comercial brasileiro, as locações mercantis eram submetidas à justiça arbitral.
A Constituição atual do Brasil, mesmo que sumariamente, menciona a arbitragem,
direta ou indiretamente, como meio de solução pacífica dos conflitos, consoante disposições
em seu preâmbulo, no Art. 4º, inciso VII, e no Art. 114, §§ 1º e 2º.
A Lei n.º 9.307, de 23 de setembro de 1996, finalmente, dispôs sobre o uso da
arbitragem no Brasil, sendo este o instrumento legal que regulamenta a matéria.
O Art. 31 dessa lei assegura que “a sentença arbitral produz, entre as partes e seus
sucessores, os mesmos efeitos da sentença proferida pelos órgãos do Poder Judiciário e, sendo
condenatória, constitui título executivo”. Consoante essa prescrição normativa, Carmona
afirma que:
[...] O legislador optou, assim, por adotar a tese da jurisdicionalidade da arbitragem,
pondo termo à atividade homologatória do juiz, fator de emperramento da
arbitragem. Certamente continuarão a surgir críticas, especialmente de
processualistas ortodoxos que não conseguem ver atividade processual e muito
menos jurisdicional – fora do âmbito da tutela estrita [...]
6
Verde acrescenta:
A experiência tumultuosa destes últimos quarenta anos nos demonstra que a imagem
do Estado onipotente e centralizador é um mito, que não pode (e talvez não mereça)
ser cultivado. Deste mito faz parte a idéia que a justiça deve ser administrada em via
exclusiva pelos seus juízes.
7
Assim, salvo para arguir a validade e a eficácia da sentença arbitral brasileira, nas
hipóteses elencadas no Art. 32 da Lei de Arbitragem, e mediante o procedimento do Art. 33
dessa norma, a sentença arbitral produz entre as partes e seus sucessores o mesmo efeito da
sentença proferida pelos órgãos do Poder Judiciário. Quanto ao argumento de que a
arbitragem é inconstitucional, Barral afirma:
Não se trata aqui de um mito, mas de análise equivocada da natureza jurídica da
arbitragem e dos limites impostos pelo art. 5º, XXXV, da Constituição de 1988.
Uma resposta fácil a esta assertiva seria dizer que o dispositivo constitucional se
dirige ao legislador, no sentido de não afastar a apreciação pelo Judiciário, enquanto
6
CARMONA, Carlos Alberto, op. cit., 2004, p. 45.
7
VERDE, Giovanni. Arbitrato e giurisdizione. L’Arbitrato secondo la Legge, 28/83. Nápoles, Jovene Editore,
1985, p. 161-182, esp. p.168, trad. livre apud CARMONA, Carlos Alberto, op. cit., 2004, p. 45.
91
na arbitragem esse afastamento se efetiva pela própria vontade das partes, em
relação a direito sobre o qual têm disponibilidade. Se podem contratar, transacionar
ou dispor do direito em questão, as partes podem delegar a terceiro o direito de
determinar o destino do mesmo.
8
Para efeito deste estudo, suficiente apenas demonstrar que a arbitragem como meio
alternativo de solução de conflitos é uma das formas de ampliação da legitimação democrática
no exercício da jurisdição, mesmo que limitada às hipóteses legais, viabilizando, assim, o
acesso do povo não só aos resultados da prestação jurisdicional, mas ao seu próprio exercício,
eis que, nos termos do Art. 13, da Lei n.º 9.307/96, “pode ser árbitro qualquer pessoa capaz e
que tenha a confiança das partes”, entendida a capacidade como sendo a prevista no Código
Civil brasileiro, excluídos os relativamente e os absolutamente incapazes (Arts. 3º e 4º,
respectivamente), assim como as pessoas jurídicas. a pessoa física pode ser árbitro,
inclusive analfabetos e estrangeiros.
4.1.2 Tribunal do Júri
Uma das formas de manifestação da soberania popular na função judiciária, com
legitimação consagrada no ordenamento jurídico, é através da composição do Tribunal do
Júri, onde pessoas do povo são sorteadas, em lista previamente elaborada, para integrar o
Conselho de Sentença que julgará os crimes dolosos contra a vida.
Sua origem remonta à própria noção de Direito. Doutrinadores diversos encontraram a
instituição do júri no período Mosaico, entre os judeus do Egito, sob a orientação de Moisés.
Em Roma, havia os judices jurati. Na Grécia antiga, havia os diskatas. Em Atenas, o
Areópago, composto por antigos arcontes, os quais julgavam segundo as suas consciências. A
Heliéia, espécie de Tribunal Popular, integrado por heliastas, que eram cidadãos optimo jure,
também julgava segundo o mesmo critério.
Atribui-se à Inglaterra, na época do Concílio de Latrão e da Carta Magna, em 1215, a
origem moderna da instituição do Tribunal do Júri, quando foram abolidas as ordálias ou
Juízos de Deus, consolidando-se o instituto do Tribunal do Júri no sistema do Common Law.
Com a Revolução Francesa e a desconfiança dirigida aos juízes togados, oriundos de
castas familiares, o Júri ratifica sua força popular, sendo exigida a condição de eleitor para o
8
BARRAL, Welber. A arbitragem e seus mitos (resposta ao juiz Silva Salvador). Revista da Escola Paulista da
Magistratura, São Paulo, ano 2, n. 5, p. 143-155, jul./dez. 1998.
92
exercício da função, dispensada a justificativa para os votos e admitindo a condenação apenas
por maioria, diferente do sistema inglês, que exigia a totalidade dos votos.
Na Europa, apenas a Bélgica, a Noruega, a Espanha, a Inglaterra e alguns Cantões da
Suíça (Gêneve, Friburgo e Zurich) admitem a instituição do Tribunal do Júri. Adotam essa
prática, também, a Austrália, a África do Sul, os Estados Unidos e, na América do Sul, apenas
o Brasil e a Colômbia.
9
No Brasil, em 1822, instituiu-se o Tribunal do Júri, com competência exclusiva para os
crimes de imprensa, àquela época.
A Constituição de 1988 previu a instituição do Júri no Art. 5º, inciso XXXVIII,
assegurando a plenitude da defesa, o sigilo das votações, a soberania dos veredictos e a
competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida, inserindo-o no Título dos
Direitos e Garantias Fundamentais, elevando-o à condição de cláusula pétrea.
As características de um ritual solene, com sigilo dos votos e soberania dos resultados
do julgamento, muito se assemelham ao processo democrático eleitoral, no qual cada eleitor
representa um voto, com igual significância, manifestando-se secretamente e com a garantia
republicana de que os resultados serão respeitados.
Assim, como não é necessária a qualidade de alfabetizado para a obtenção da
capacidade eleitoral ativa, sendo suficiente a condição de eleitor e, portanto, de cidadania, no
Tribunal do Júri também se exige ser o jurado cidadão, maior de 18 anos e com notória
idoneidade.
É bem verdade que a capacidade eleitoral ativa inicia-se aos 16 anos (Art. 14, § 1º,
inciso I, alínea “c”, da Constituição Federal), facultativamente, enquanto o Código de
Processo Penal restringe a 18 anos a idade mínima para o jurado (Art. 436), além da condição
pessoal de notória idoneidade, normalmente aferida dentre cidadãos que integram a
burocracia estatal, associações de classe e de bairros, sindicatos profissionais ou núcleos
comunitários (Art. 425, § 2º, do Código de Processo Penal).
9
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Curso de processo penal. São Paulo: Saraiva, 2002. v. 4, p. 79.
93
Esse segmento representa apenas parcela da cidadania, porém, abrange praticamente
todas as classes sociais que atualmente se encontram organizadas sob a forma de vínculos
profissionais.
Esse espectro do tecido social, de onde se podem convocar jurados, é a comprovação de
que é possível, sob o ponto de vista da Teoria da Democracia, ampliar a margem da soberania
popular na função judiciária.
A competência, hoje, do Tribunal do Júri, para o julgamento dos crimes dolosos contra
a vida (Arts. 121 a 126 do Código Penal), além daqueles que lhe são conexos ou continentes,
realça a importância que o legislador imprimiu à valoração do maior crime contra a natureza
humana, que é a morte de alguém, concedendo ao povo o direito de julgar o criminoso,
consoante a prova dos autos a justiça formal mas também, de acordo com os valores de
cada nicho comunitário, considerando que as razões materiais do crime e a sua valoração
diferem, territorialmente, segundo a cultura e a íntima convicção dos julgadores de fato.
Nisso consiste a soberania dos veredictos, embora tenha a norma e a doutrina
relativizado essa soberania, ao prever que, sendo o réu condenado ou absolvido, em face de
argumentos contrários à prova dos autos, poderá submeter-se a outro Júri, se anulado o
primeiro julgamento pelo juízo ad quem, em razão de apelação, procedendo-se assim, apenas
por mais uma vez, salvo se no primeiro julgamento o acusado foi absolvido e no segundo ele
foi condenado. Nessa condição, por preponderância do direito à liberdade, igualmente direito
fundamental, possível será um terceiro julgamento (Art. 593, inciso III, alínea “d” e § 3º, do
Código de Processo Penal). Outra hipótese de mitigação do princípio da soberania dos
veredictos no Tribunal do Júri é a revisão criminal (Art. 621, do Código de Processo Penal).
A abertura democrática a ser implementada no Tribunal do Júri poderia consistir,
doravante, na ampliação de sua competência para o julgamento de outros crimes ou conflitos
comunitários, uma vez que a Constituição Federal quando garantiu a competência desse
Tribunal para os crimes dolosos contra a vida, não excluiu a possibilidade de que a lei
ordinária possa estender esse rito processual especial para outras demandas, como havia a
previsão em 1822, quando a instituição do Júri foi criada no Brasil para os crimes de
imprensa, exclusivamente.
94
Com esse elastério, o Conselho de Sentença, que julga os maiores crimes os dolosos
contra a vida - poderia assumir outras competências, dando aos seus veredictos a legitimação
popular, por representarem largo segmento do povo ativo.
Aliás, na forma como se regulamentou o processo, no sistema tecnoburocrático
brasileiro, na fase reservada ao juiz togado, após o réu ter sido pronunciado, restam apenas a
aplicação da pena, após o veredicto dos jurados, a decisão sobre a liberdade provisória do réu,
se acaso pender recurso de eventual sentença condenatória, o exercício do poder de polícia no
recinto do julgamento e a presidência dos atos processuais daquele momento. A principal
função é a dos jurados, que condenam ou absolvem o réu. A subsunção da pena ao veredicto é
ato quase que mecânico e automático, diante das respostas à quesitação apresentada aos
jurados.
Pode-se até dizer que esse procedimento é uma forma de expressão da democracia
participativa, coexistindo o poder estatal formal, expressão da soberania indireta, por
intermédio dos juízes concursados; e a soberania popular, diretamente exercida pelos juízes de
fato e do fato, selecionados em procedimento cujo acesso é ampliado ao cidadão.
Vislumbra-se, mesmo que limitadamente, a aproximação no exercício dessa vontade
geral, decorrente da lei, com o poder delegado e a manifestação direta da convicção popular.
Ademais, a dialética dos procedimentos no Tribunal do Júri permite até que se alcancem
resultados assemelhados aos do Recall, pois a sessão de julgamento no Tribunal pode ser
deslocada para outra comarca, se ocorrer a hipótese do Art. 427 (desaforamento), havendo
indícios de que, dentre outras razões, os jurados estejam sendo fortemente influenciados pela
efervescência dos fatos e das interferências sociais e políticas; quando o juiz togado
desconstitui o Conselho de Sentença, nas hipóteses do Art. 466, § (o jurado manifesta
opinião sobre o processo), do Art. 497, inciso V (o réu é considerado indefeso) e do Art. 481
(a verificação de qualquer fato essencial para a decisão da causa não puder ser realizada
imediatamente), todas do Código de Processo Penal; por deficiência da acusação (neste caso é
a sociedade que não se bem representada) e, por último, quando o próprio Estado anula o
julgamento, determinando que outros jurados, novamente reunidos, exerçam o direito-dever
de julgar o réu (quando há recurso por julgamento contrário à prova dos autos, por exemplo).
95
Portanto, é o Tribunal do Júri, com a sua dinâmica, uma das formas de exercício da
função judiciária com a presença direta do povo, quebrando o monopólio da prestação
jurisdicional, pelo menos em seu conteúdo material.
4.1.3 Juizados Especiais
Os juizados especiais e os juizados de pequenas causas, previstos na Constituição
Federal de 1988 (Art. 98, inciso I e seu § 1º e Art.24, inciso X, respectivamente), representam
marco importante no processo de dessacralização do formalismo processual, no sentido da
ampliação do acesso democrático à função jurisdicional, caminho este que abrange elementos
de facilitação, tais como: isenção de custas processuais, competências específicas, dispensa de
advogados, desobrigação de honorários sucumbenciais, rito especial, principiologia própria,
redução das vias recursais, adoção de mecanismos mediadores e conciliatórios, enfim, um
microssistema jurisdicional próprio e adequado à pluralidade da sociedade e de suas
microlesões.
Embora os juizados especiais tenham absorvido, na prática, as funções dos juizados de
pequenas causas, a verdade é que remanescem competências diferenciadas, mantidas por
entendimentos doutrinários e jurisprudenciais ratificadores da distinção efetivada pela
Constituição Federal.
O Supremo Tribunal Federal, na Ação Direta de Inconstitucionalidade n.º 1.807-5,
10
tendo como requerente o governador do Estado de Mato Grosso e relator da medida liminar o
Ministro Sepúlveda Pertence, decidiu, por unanimidade, no sentido dessa diferenciação,
quando afirmou:
[...]
2. Dada a distinção conceitual entre os juizados especiais e os juizados de pequenas
causas (cf. STF, ADIn n.º 1.127, cautelar, 28.9.94, Brossard), aos primeiros não se
aplica o art. 24, X, da Constituição, que outorga competência concorrente ao Estado-
membro, para legislar sobre o processo perante os últimos.
[...]
10
BRASIL, Supremo Tribunal Federal. ADI nº 1.807-5/DF, Relator da medida liminar Ministro
Sepúlveda Pertence. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?
numero=1807&classe=ADI&origem=AP&recurso=0&tipoJulgamento=m>. Acesso em: 18 ago 2009.
96
Nesse sentido, constituições estaduais ainda distinguem expressamente esses dois
órgãos do Poder Judiciário do Estado, a exemplo da Constituição do Estado de São Paulo, no
Art. 54, inciso VIII (juizados especiais) e inciso IX (juizados de pequenas causas), e a do
Ceará, no Art. 124, prevendo os juizados especiais, e no Art. 125, dispondo sobre os juizados
de pequenas causas.
Contudo, com a edição da Lei n.º 9.099, de 26.9.1995, legislando sobre os juizados
especiais cíveis e criminais e revogando, em seu art. 97, a Lei n.º 7.244/84, que dispunha
sobre os juizados de pequenas causas, e com o advento da Lei n.º 10.259, de 12.07.2001,
instituindo os juizados especiais cíveis e criminais no âmbito da Justiça Federal, a existência
de juizados de pequenas causas ficou condicionada à sua criação, por lei complementar
estadual, de iniciativa dos Tribunais de Justiça, considerando a competência concorrente
prevista no Art. 24 da Constituição Federal.
No limite desta proposta democratizante, evidenciar-se-á apenas a ideia dos juizados
especiais, tal como ela foi criada e como poderia ser ampliada.
Bhagwati, magistrado indiano, presidente do Comitê de Direitos Humanos da
Organização das Nações Unidas (ONU) e conselheiro regional do Alto Comissariado de
Direitos Humanos para a Região da Ásia e do Pacífico, na defesa da democratização de
soluções e do acesso à justiça, propõe que:
O foco das atenções dos direitos humanos deve se voltar para as camadas mais
destituídas e vulneráveis dos países em desenvolvimento, para quem a vida é uma
eterna vigília e a quem Gandhi, o Pai das Nações, disse: ‘Eu tive a dor de observar
pássaros que, por desejo de força, não puderam ser acariciados nem com um
alvoroço de suas asas. O pássaro humano sob o céu da Índia se levanta mais fraco do
que quando pretendia se aposentar. Para milhões, é uma eterna vigília ou um eterno
transe’.
11
Quando se busca o entendimento no sentido da democratização dos meios de acesso à
função judiciária, pela participação do maior segmento social possível, direta ou
indiretamente, no processo decisório, pretende-se também alcançar nível de
comprometimento tal, com a prestação jurisdicional, que o conflito submetido ao Estado não
seja apenas um exercício formal da cidadania, mas a perspectiva real de obtenção de respostas
para a satisfação da pluralidade humana.
11
BHAGWATI, P. N. Democratização de soluções e acesso à justiça. Revista da Associação dos Magistrados
Brasileiros, Brasília/DF, ano 5, n. 12, p. 44-47, 2º sem. 2002.
97
Essa dimensão, a seu turno, realiza-se com base no respeito à complexidade da
sociedade, repleta de variados pleitos, tão urgentes quanto efêmeros, tanto mais importantes
quanto essenciais à formação de um sentimento firme e crescente de autoestima civilizatória e
coletiva, pressuposto indispensável para a estruturação do sentimento de pertencimento que
deve ser atributo de uma nação.
Grandes causas, com grandes ou desiguais litigantes, difíceis soluções, processos
complexos e demorados, ineficácia e inefetividade, formalismo desmesurado, burocracia
entediante, maestros que regem uma orquestração sinfonicamente inaudível pela grande
massa, não se adaptam a microdireitos e microlesões, cuja valoração não se pode submeter a
princípios de bagatela e insignificância, pois no conjunto das pequenas demandas, das
querelas mais comezinhas, no dinamismo das pequenas relações de troca do ambiente social,
forma-se a ideia real da cidadania de um povo.
Os juizados especiais são a promessa vigorosa de infiltração no tecido comunitário, de
uma nova forma de exercer não somente o jus discere, mas também o jus dare. Não se trata
de uma justiça distributiva de benefícios populistas ou da aplicação de um direito alternativo,
mas da adoção de alternativas informais, necessárias a uma “criação jurídica complexa”
12
que
restaure, em curto prazo, direitos lesados, restabeleça a crença na igualdade, diminua a
precariedade dos acessos ao aparelho jurisdicional, disponibilize cenários físicos
geograficamente mais próximos do local de residência das partes, isente custas, dispense
advogados ou os torne facultativos, tenha celeridade, adequando o tempo processual ao tempo
das emergências postuladas, afaste o medo e o pânico presenciais e adote o direito como
pedagogia de transmissão do conhecimento e não como instrumento de poder intelectual dos
mais astutos e abastados.
Pequenas causas, soluções despadronizadas, equidade, instalações simples e
convidativas, ações conciliatórias e mediadoras, juízes presentes e próximos aos fatos sociais
que serão apreciados, sem toga nem galhardões, primazia da oralidade, flexibilização máxima
da regra processual, unidades julgadoras descentralizadas, tudo isso forma um espaço de
aproximações onde os pequenos conflitos, dos mais desassistidos ou não, podem ser
rapidamente resolvidos, evitando a fuga dos contendores em direção a tutelas parajurídicas ou
simplesmente descomprimindo o fluxo natural de tensionamento social, muitas vezes
12
SANTOS, Boaventura de Sousa. Pela mão de Alice: o social e o político na pós-modernidade. São Paulo:
Cortez, 1995, p. 179.
98
mascarado por índices de baixa litigiosidade, que mais representam a descrença na função
judiciária do que o respeito aos seus mecanismos.
Assim, algumas sugestões poderiam ser implementadas, com características próprias
para essa justiça especial, tais como:
a) Ampliação da legitimação ativa dos demandantes, inclusive por substituição
processual, prática utilizada para a proteção das camadas mais vulneráveis e
desprovidas das comunidades, como os desempregados, os sem-terra e sem-teto,
índios, menores, mulheres violentadas, mendigos, imigrantes, deficientes físicos,
necessitados de serviços urgentes de saúde, excluídos do ensino formal básico,
vítimas domésticas, vizinhos, dentre outros, independentes do valor da causa;
Para a garantia e proteção contra a violação de direitos humanos, por exemplo:
A Suprema Corte da Índia abriu suas portas para ampliar a doutrina do locus standi,
o que é conhecido como a chance de proporcionar e possibilitar aos pobres a
oportunidade de trazerem seus problemas diante dos tribunais [...] no documento
‘Nomeação de Juízes e Transferência de Caso’, sustenta que apesar de a regra
comum da jurisprudência anglo-saxônica afirmar que uma ação somente pode ser
trazida pela pessoa a quem o dano foi causado, esta regra pode e deve partir da
observação da pobreza massiva e da ignorância do povo. Ou seja, quando o dano é
causado a uma pessoa ou a uma classe de pessoas que, por razões de pobreza,
inabilidade ou desvantajosa posição socioeconômica não pode aproximar-se dos
tribunais para obter sentenças judiciais, qualquer pessoa ou representante de
organização não governamental, agindo de boa-fé, pode mover uma ação no tribunal
procurando reparação judicial para o dano causado a essa pessoa ou classe de
pessoas e, nesse caso, os tribunais não insistirão na petição regular a ser preenchida
pelo indivíduo ou pela ONG que assumir a causa [...]
13
b) Descentralização e aumento das unidades dos juizados especiais, instalando-as nos
diversos bairros das cidades, desenvolvendo a percepção de proximidade do
aparelho judicial com a população de seu entorno, como num sistema de integração
de ações sociais localizadas. Nesse contexto, juízes, promotores, conciliadores,
advogados, partes e sociedade seriam elos de uma mesma corrente, com ações
conjuntas nos diversos setores da sociedade civil de suas circunscrições,
produzindo resultados mais adequados às peculiaridades locais;
c) Ampliação da competência material do Art. 3º da Lei n.º 9.099/95, incluindo outras
demandas atualmente excluídas, como as de família, tributárias, fiscais,
previdenciárias, desde que haja consensualidade;
13
BHAGWATI, P.N., op. cit., 2002, p. 46.
99
d) Eleição dos conciliadores e juízes leigos dentre cidadãos e por meio deles, desde
que residentes na mesma área constante do cadastro eleitoral dos Tribunais
Regionais Eleitorais, correspondente à circunscrição das unidades dos juizados
especiais, com mandatos fixos e com suplentes.
4.1.4 Justiça de Paz
Outra forma de solução de conflitos e interesses, legitimando a participação popular e
contribuindo para a ampliação do espaço reservado aos cidadãos na função judiciária, pelo
menos nas jurisdições não contenciosas, diz respeito à Justiça de Paz, prevista na Constituição
Federal de 1988, em seu art. 98, nos seguintes termos:
Art. – 98 – A União, no Distrito Federal, e os Estados criarão:
[...]
II – justiça de paz, remunerada, composta de cidadãos eleitos pelo voto direto,
universal e secreto, com mandato de quatro anos e competência para, na forma da
lei, celebrar casamentos, verificar, de ofício ou em face de impugnação apresentada,
o processo de habilitação e exercer atribuições conciliatórias, sem caráter
jurisdicional, além de outras previstas na legislação.
O que se verifica na redação deste inciso é que o constituinte, ao utilizar o termo
jurisdição, o fez com conotação de jurisdição contenciosa, desprezando a diferenciação que o
legislador processual adotou e a doutrina consagrou, entre jurisdição voluntária e jurisdição
contenciosa.
Pela jurisdição voluntária, o Estado atua por meio de órgãos do Poder Judiciário
14
,
exercendo atos de administração de interesses que têm alguma significação e gravidade e que
a lei houve por bem destinar à função estatal a sua atribuição, por entender que essa
intervenção desfrutará de maior idoneidade e independência do que se fosse realizada por
outros órgãos públicos.
Na jurisdição voluntária, não partes e sim interessados ou participantes. Não
conflitos ou litígios e sim interesses a serem tutelados em favor de seus titulares. Como não há
conflito, em princípio, não há contraditório, o que poderá surgir no decorrer do processamento
do pedido, transformando a jurisdição em contenciosa.
14
Para maior compreensão, vide capítulo 2, retro.
100
É pressuposto da jurisdição voluntária “um negócio ou um ato jurídico, e não, como
acontece na jurisdição contenciosa, uma lide ou uma situação litigiosa.”
15
Theodoro Júnior
afirma, com fundamento nas lições de Pietro-Castro, que:
Os órgãos judiciais são convocados a desempenhar uma função administrativa
destinada ‘a tutelar a ordem judiciária mediante a constituição, asseguramento,
desenvolvimento, e modificação de estados e relações jurídicas com caráter geral, ou
seja, frente a todos’.
16
Portanto, para que a disposição constitucional tenha coerência e unidade, por
principiologia que lhe é inerente, forçoso é admitir que a jurisdição excludente a que se refere
a norma máxima é a contenciosa, prestada por um dos órgãos do Poder Judiciário, consoante
o rol descrito no art. 92 da Constituição Federal, no qual os juízes de paz não se incluem,
mesmo porque o Supremo Tribunal Federal pacificou o entendimento de que as decisões
arbitrais também são forma de jurisdição e, como a Justiça de Paz, os tribunais arbitrais
também não integram o aparelho do Poder Judiciário.
O que causa espécie e reflexão é o fato de que, sendo a competência o limite da
jurisdição, por definição doutrinária, algumas matérias sejam obrigatoriamente e
privativamente submetidas ao Poder Judiciário, e outras não, em se tratando de jurisdição
voluntária, mesmo que com características próprias, como as descritas, embora tenham
notória relevância, como a relação jurídica resultante no casamento e de sua habilitação
formal, inclusive os seus atos impugnativos.
Parece que se prenuncia, com isso, uma crescente abertura constitucional, com
repercussão processual, no sentido de que, paulatinamente, a jurisdição enquanto primazia do
Estado, com possibilidade de contraditório, coação (embora esta também exista na jurisdição
voluntária) e lide (enquanto conflito de interesses qualificados por uma pretensão resistida) -
características da jurisdição contenciosa -, será a que efetivamente remanescerá como
atividade exclusiva do Poder Judiciário, no plano da jurisdição propriamente dita.
As demais atividades jurisdicionais atinentes à tutela e proteção de interesses privados
ou mesmo públicos, inseridas na ordem jurídica, mas passíveis de resolução por meios
alternativos de solução de conflitos (arbitragem, mediação, conciliação), os atos consensuais,
15
MARQUES, José Frederico. Manual de Direito Processual Civil. Campinas: Bookseller, 1997. v. I, n. 62, p.
79-80.
16
PRIETO-CASTRO Y FERNANDIZ, Leonardo. Derecho Concursal, Procedimentos Sucessores, Jurisdicción
Volontaria, Medidas Cautelares, Madrid Editorial Tecnos, 1974, n. 135, p.180 apud THEODORO JÚNIOR,
Humberto. Curso de direito processual civil: procedimentos especiais. 38. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007. v.
III, p. 378.
101
ainda que representando relações jurídicas, como o inventário, a partilha amigável, se com
partes capazes, a separação e o divórcio, estes, nos termos da autorização concedida pela Lei
n.º 11.441, de 04/01/2007, e as atribuições dos juízes de paz, são também formas de jurisdição
voluntária, agora, e cada vez mais, compartilhadas entre o Poder Judiciário e instituições
outras que, privativamente ou por delegação do Poder Público, prestarão jurisdição, no
sentido autocompositivo, heterocompositivo ou simplesmente fiscalizatório e tutelador.
Ao contrário do que se apregoa como sendo uma ação orquestrada tendente à
terceirização da atividade jurisdicional, que se iniciou com as funções de administração
judiciária de interesses ou conflitos privados, para prosseguir, em futuro contínuo, com a
jurisdição contenciosa, atendendo à vertente globalizante dos mercados, entremostra-se a
inafastável capacidade que têm os grupos e as comunidades plurais de realizarem a
construção social da realidade,
17
em que o fazer hermenêutico não se limite às instâncias
oficiais, por ser inerente a todos, como numa sociedade aberta dos intérpretes da
Constituição, adequando-se à teoria da democracia.
18
O juizado de paz no Brasil, historicamente, “foi uma tentativa de introduzir novas bases
para a administração da Justiça Colonial, marcada pelo centralismo e pelo distanciamento do
povo; buscava a descentralização e a democratização”.
19
Flory afirma que:
LA PRIMERA gran reforma de la década liberal fue también la primera
modificación importante del sistema judicial. La creación en 1827 del puesto de juiz
de paz (juez de paz) señaló el comienzo del período de reforma y el ascenso
inminente de los liberales; el juez de paz brasileño, como se concibió originalmente,
sería un magistrado sin entrenamiento, y sin paga elegido para ejercer en asuntos
de poca importancia y conciliaría a los litigantes en perspectiva [...]
20
O que precedeu à instituição dos juízos populares, dentre eles, o juízo de paz, foi a
formação de um corpo de juízes para o julgamento das causas de abuso de liberdade de
imprensa, criado pelo Decreto de 18 de junho de 1822, que era uma extensão, no Brasil, da lei
adotada pelas Cortes portuguesas, no ano anterior.
21
Este Conselho era composto de 24
17
BERGER, Peter L.; LUCKMANN, Thomas. A construção social da realidade. 7. ed. Petrópolis: Vozes,
1987.
18
HÄBERLE, Peter. Hermenêutica constitucional: a sociedade aberta dos intérpretes da constituição
contribuição para a interpretação pluralista e “procedimental” da constituição. Tradução de Gilmar Ferreira
Mendes. Porto Alegre: Fabris, 1997.
19
RODYCZ, Wilson Carlos. O juiz de paz imperial: uma experiência de magistratura leiga e eletiva no Brasil.
Disponível em: <http://www.tj.rs.gov.br/institu/memorial/RevistaJH/vol3n5/sumario_vol3n5.php>. Acesso em:
28 abr. 2008.
20
FLORY, Thomas. El juez de paz y el jurado en el Brasil imperial. México: Fondo de Cultura Económica,
1986, p. 81.
21
El decreto de las Cortes del 12 de julio de 1821 creó el sistema de jurado para juzgar los delitos de la prensa en
102
jurados, nomeados pelos ouvidores das Relações ou das comarcas, dentre “homens bons,
honrados, inteligentes e patriotas”.
22
Decidiam sobre os fatos e a pena era aplicada por um
juiz. Foi essa a primeira norma que previu órgãos jurisdicionais no Brasil.
Posteriormente, pela Lei de 15 de outubro de 1827, foram criados os juízes de paz. Em
todas as freguesias ou paróquias deveria haver um juiz de paz e um suplente, eleitos
juntamente com os vereadores, pela mesma sistemática. A recusa ao mandato era proibida,
salvo moléstia impeditiva ou exercício de emprego que o impossibilitasse.
O juiz de paz, no Império, tinha competência para:
- Conciliar as partes antes da demanda;
- Processar e julgar as causas cíveis cujo valor não excedesse a dezesseis mil-réis;
- Manter a ordem nos ajuntamentos (reuniões públicas), dissolvendo-os no caso de
desordem;
- Pôr em custódia os bêbados durante a bebedice, corrigindo-os por vício e
turbulência;
- Dar sermões em prostitutas escandalosas, obrigando-as a assinar termo de bem viver,
com a cominação de penas;
- Fazer destruir os quilombos;
- Fazer autos de corpo de delitos;
- Interrogar os delinqüentes, prendê-los e remetê-los ao juiz competente;
- Ter uma relação dos criminosos para fazer prendê-los;
- Fazer observar as posturas policiais das câmaras;
- Informar ao juiz de órfãos sobre incapazes desamparados e acautelar suas pessoas e
bens, enquanto aquele não providenciasse;
Portugal (B-CLB, 1821-1822, pt.1, pp. 19-28). Esta ley se extendió a Brasil el 18 de junio de 1822 (B-CLB,
1822, pt. 2, p. 23-24). FLORY, Thomas, op. cit., 1986, p. 181, nota 28.
22
RODYCZ, Wilson Carlos, op. cit., 2008, on line.
103
- Vigiar sobre a conservação das matas públicas e obstar nas particulares ao corte de
madeiras reservadas por lei;
- Participar ao presidente da província quaisquer descobertas úteis que se fizessem no
seu distrito (minas);
- Procurar a composição das contendas e dúvidas sobre caminhos particulares,
atravessadouros e passagens de rios ou ribeiras, sobre uso das águas empregadas na
agricultura ou na mineração, dos pastos, pescas e caçadas, sobre limites, tapagens e
arcadas das fazendas e campos, e sobre os danos feitos por familiares ou escravos;
- Dividir o distrito em quarteirões que não contivessem mais de vinte e cinco fogos.
Rodycz acresce que o juiz de paz tinha competência também para impor penas de multa
até o máximo de trinta mil réis ou um mês de prisão ou três de correção, conhecer das multas
por contravenção às posturas municipais, registrar livros de estrangeiros que fossem morar no
seu distrito, nomear em seu distrito os delegados de quarteirão, conhecer ex officio dos crimes
policiais em seu município, presidir juntas paroquiais de alistamento da Guarda Nacional,
processar, cumulativamente com os juízes criminais, ex officio, os crimes públicos a a
pronúncia, julgar as habilitações para a naturalização de estrangeiros.
23
Essa, em apertada síntese, é a experiência democratizante da função judiciária exercida
no passado imperial pela justiça de paz, com mais amplitude, e hoje, limitada pela disposição
do Art. 98, inciso II, da Constituição Federal, mas com a abertura que o próprio constituinte
facultou ao legislador ordinário, quando permitiu que outras matérias pudessem ser
conhecidas e decididas por esses juizados.
Os juízes de paz são eleitos pelo povo, dentre cidadãos, por voto secreto, direto e
universal, com mandatos fixos e jurisdição específica, mesmo que não contenciosa.
É, pois, uma abertura precursora da participação popular na administração da justiça e
na prestação jurisdicional, no âmbito do poder do Estado e no exercício da soberania.
23
RODYCZ, Wilson Carlos, op. cit., 2008, on line.
104
4.1.5 Autotutela
A evolução das sociedades humanas tornou inevitável que o uso da força individual ou
grupal fosse contido, em prol da pacificação social e da domesticação do chamado estado de
natureza, que dificultava a formação de uma sociedade civil e a superação de conflitos sociais,
econômicos e políticos.
A falta de uniformização na solução das demandas interindividuais e intergrupais
deturpava a noção de justiça e a de razoabilidade. Os problemas eram enfrentados na forma
primitiva de organização social, mas havia sempre a prevalência do mais forte, do mais hábil
e do mais organizado, restando continuamente novos conflitos latentes a dificultar o alcance
de uma paz mais duradoura e confiável.
Maia Filho atribui a essa lei da causação circular o fato de que, em todos os espaços
sociais e em todas as épocas históricas as tensões internas sempre estiveram inevitavelmente
presentes com toda a sua força dramática, incontrolável e desagregadora”.
24
É, pois, com o advento do Estado moderno que a noção de jurisdição como atividade
estatal começa a se firmar, simultaneamente com a própria ideia de Estado, com sua divisão
em funções orgânicas.
A idealização de uma sociedade racionalmente estruturada, onde o poder e a soberania
deixassem de ser encarnação de uma fonte única, personalista e absoluta, impulsiona a
revolução burguesa do Estado liberal, instituindo uma nova ordem de dominação, sendo
necessário um ente que pudesse sobrepairar à desagregação que advinha da novel
convergência de forças.
Essas novas forças atuantes na formação do Estado moderno surgiram, segundo Maia
Filho, com fundamento no pensamento de Saldanha,
como convergência de dois processos, um de centralização concentração e outro
de legitimação absolutização,
25
conduzidos com superior competência pelas
classes sociais interessadas na implantação de uma estrutura monopolística de poder,
no caso, a classe dos proprietários de bens materiais.
26
24
MAIA FILHO, Napoleão Nunes. A antiga e sempre atual questão da submissão do poder público à jurisdição.
Revista Dialética de Direito Processual, São Paulo: Dialética, n. 1, 2003. p. 146-159, p. 148.
25
SALDANHA, Nelson. Estado de Direito, Liberdades e Garantias: estudos de direito público e teoria
política. São Paulo: Sugestões Literárias, 1980, p. 59 apud MAIA FILHO, Napoleão Maia, op. cit., 2003, p. 151.
26
MAIA FILHO, Napoleão Nunes, op.cit., p.151.
105
A autotutela como meio de solução dos próprios conflitos cede o seu lugar para o novo
centro de poder, o Estado, que criará uma função própria para dizer o direito e distribuir a
justiça. Maia Filho acresce que:
Vistas as coisas deste modo, o monopólio estatal da jurisdição, vencendo a aludida
fase autotutelar, afirma, por um lado, a verificação definitiva do poder do Estado
Moderno, que passa a ministrar com exclusividade aos indivíduos as soluções mais
desejáveis do ponto de vista da pacificação social, que assim se torna um macrofazer
do Poder Público, isto é, a solução dos conflitos passa a ser estratégica para o grupo
governante, impondo-se a mesmo contra a vontade de ambos os conflitantes
originários; a essa característica da jurisdição chamou-se de força substitutiva da
vontade das partes.
27
A visão de Maia Filho sobre o poder jurisdicional do Estado, decorrente da absorção da
função de conciliar ou mediar conflitos inevitáveis, em substituição aos próprios sujeitos
contendores, parece não admitir a quebra do monopólio desse poder, quando assegura que:
[...] teria de ser mesmo a natural evolução das instituições, máxime quando se
entende que a própria estrutura do Estado se encaminha para não permitir a atuação
de parceiros no exercício do seu poder; a tendência natural das estruturas de poder é
a de expandir constantemente a sua dominação, eliminando os adversos e os
concorrentes e neutralizando os opositores; essa é a regra e a lição da história
humana.
28
Contudo, o Estado tem cedido essa primazia, como se apercebe com a possibilidade
de composição conflitual em outros núcleos que não o exclusivamente estatal, admitindo
também coparticipações, como são os casos mencionados da arbitragem, da justiça de paz,
do tribunal do júri, das intervenções consensuais no direito de família e das sucessões, estas,
realizadas pelas serventias judiciais, a título exemplificativo.
A autotutela como modo de tratamento dos conflitos em que a decisão é imposta pela
vontade de um dos sujeitos envolvidos repousa, para Rocha, “[...] no poder de coação de uma
das partes. Serve, assim, à parte mais forte. Nela, o critério da justiça da decisão é sacrificado
uma vez que o fator predominante é a força”.
29
Mas foi a ordem jurídica que autorizou a coexistência, juntamente com a função
jurisdicional, dessa primitiva forma de solução conflitual, em situações tais que parece
emergir algo como um direito natural a uma reação instantânea e emergencial para a garantia
de um direito fundamental, quer seja ele o direito à vida, ao patrimônio, ao trabalho ou à
produção.
27
MAIA FILHO, Napoleão Nunes, op. cit., 2003, p. 151.
28
MAIA FILHO, Napoleão Nunes, op. cit., 2003, p. 151.
29
ROCHA, José de Albuquerque, op. cit., 1996, p. 33.
106
São exemplos de autotutela ainda presentes no ordenamento jurídico: a legítima defesa
(Art. 23, inciso II) e o estado de necessidade (Art. 23, inciso I), ambos do Código Penal
brasileiro; a legítima defesa e o estado de necessidade (Art. 188, incisos I e II,
respectivamente), do Código Civil brasileiro; a reintegração ou manutenção da posse por ato
do próprio possuidor, quando ameaçado ou esbulhado legítima defesa da posse ou desforço
possessório (Art. 1.210, § 1º); a poda de raízes e ramos de árvores que ultrapassarem a
estrema do prédio (Art. 1.283); o penhor legal, em favor dos hospedeiros, estalajadeiros ou
fornecedores de pousada ou alimento, sobre as bagagens, móveis, jóias, ou dinheiros dos seus
consumidores ou fregueses (Arts. 1.468 a 1.470), todos do Código Civil brasileiro; o direito à
greve e ao lockout (Arts. 9 e 37, inciso VII, da Constituição Federal); a prisão em flagrante
delito por qualquer um do povo (Art. 301, do Código de Processo Penal), dentre outros.
O relevante e destacável dessa forma remanescente de exercício da justiça e aplicação
do direito, cuja abertura, por força consuetudinária, ainda se manteve em paralelo ao poder
jurisdicional atual, é que todas essas ações autotutelares podem ser exercidas com a força e a
coerção necessárias para a sua efetividade, assim como ocorre na jurisdição estatal
tradicional.
Na autotutela, reage-se à lesão atual ou iminente de um direito, existe um conflito
antecedente e se aplica força para implementar uma decisão, enfim, estão presentes algumas
das características típicas da jurisdição, em caráter emergencial e com apoio na ordem
jurídica.
É, pois, mais uma forma democratizante de se ampliar o acesso popular ao exercício da
jurisdição, no seu aspecto participativo.
4.1.6 Composição paritária nos órgãos decisórios da Justiça do Trabalho
Até o advento da Emenda Constitucional n.º 24, de 1999, a jurisdição trabalhista era
exercida, no primeiro grau, por Juntas de Conciliação e Julgamento. Dispunha o art. 111 da
Constituição de 1988, até então:
Art. 111 – São órgãos da Justiça do Trabalho:
I – o Tribunal Superior do Trabalho;
II – os Tribunais Regionais do Trabalho;
III – as Juntas de Conciliação e Julgamento.
107
Essas Juntas eram compostas de um juiz do trabalho, magistrado de carreira, que as
presidia, e de dois juízes classistas, sendo um representante dos empregados e outro dos
empregadores. Assim, também, era a previsão disposta no art. 647 da Consolidação das Leis
do Trabalho (CLT):
Art. 647 – Cada Junta de Conciliação e Julgamento terá a seguinte composição:
a) 1 (um) juiz do trabalho, que será seu Presidente;
b) 2 (dois) vogais, sendo um representante dos empregadores e outro dos
empregados.
Parágrafo único - Haverá um suplente para cada juiz classista.
30
Os juízes classistas ou vogais, assim como os seus suplentes, deveriam ser brasileiros;
ter reconhecida idoneidade moral; ter mais de vinte e cinco e menos de setenta anos de idade;
estar no gozo dos direitos civis e políticos; estar quite com o serviço militar; contar com mais
de dois anos de efetivo exercício na profissão e ser sindicalizado, o que se provava mediante
documento expedido pelo respectivo sindicato. Sua nomeação era de competência, no caso
das Juntas de Conciliação, do Presidente do Tribunal Regional do Trabalho em que serviam.
Os vogais não precisavam ser bacharéis em Direito e geralmente não o eram. Seus
nomes eram escolhidos por organizações sindicais, mediante eleição da categoria a que
pertenciam, paritariamente, dentre empregados e empregadores, compondo listas tríplices que
eram encaminhadas aos Tribunais Regionais do Trabalho, para escolha e nomeação pelo
Presidente do Tribunal.
Dentro de quinze dias, a partir da posse, que se dava perante o Presidente da Junta, a
investidura do vogal ou suplente poderia ser impugnada por qualquer interessado.
A investidura dos juízes classistas se dava por três anos, podendo se estender por até
dois períodos iguais, totalizando seis anos. Os juízes classistas tinham como prerrogativas:
participar das audiências da Junta a que integravam; aconselhar as partes à conciliação; votar
na solução das controvérsias submetidas ao pronunciamento da Junta e em matérias de ordem
interna que o Presidente daquele colegiado submetesse ao seu pronunciamento; pedir vista
dos processos pelo prazo de vinte e quatro horas no máximo e formular, por intermédio do
30
BRASIL. CLT (1943). Consolidação das Leis do Trabalho. Decreto-lei nº 5.452, de 01 de maio de 1943,
alterado pelo Decreto-lei 9.797, de 09 de setembro de 1946. Dispõe sobre a Consolidação das Leis do
Trabalho, Brasília/DF, 2009.
108
Presidente, aos litigantes, testemunhas e peritos, as perguntas que quisessem fazer para
esclarecimento dos conflitos submetidos ao pronunciamento da Junta.
31
Essas Juntas poderiam conciliar, instruir ou julgar, com qualquer mero de sua
composição, sendo, porém, indispensável a presença do Presidente, cujo voto prevalecia em
caso de empate. No caso de embargos, deveriam estar presentes todos os membros da Junta e,
na execução e liquidação das decisões, funcionava apenas o Presidente.
Com essa técnica decisória, tanto a prestação jurisdicional era compartilhada, na
formação do título executivo judicial trabalhista, como, por vezes, ante a dinâmica do
confronto de propostas, pretensões e resistências, havia casos em que a Junta deliberava por
maioria de dois votos contra um, decidindo os dois juízes classistas no mesmo sentido, por
consenso obtido no decorrer do processo, sendo voto vencido o do juiz togado trabalhista.
Apenas quando havia empate, é que o voto do juiz presidente prevalecia.
Aliás, reconhecendo como positiva essa sistemática no plano da democracia, Santos
afirma, referindo-se ao Poder Legislativo, que:
O parlamento vem a ser precisamente o lugar, em que são expostos argumentos
contraditórios, em que se processa a persuasão de uns, a reconsideração de outros e a
deliberação que, afinal, raramente corresponde imaculadamente a alguma das
opiniões originárias.
32
Nos Tribunais Regionais do Trabalho e no Tribunal Superior do Trabalho também havia
juízes classistas, escolhidos paritariamente. Nos Tribunais Regionais, os vogais eram
escolhidos pelas Federações, com base territorial na região e, no Tribunal Superior do
Trabalho, pelas Confederações Nacionais, após aprovação pelo Senado Federal. Em ambas as
situações, os juízes eram nomeados pelo Presidente da República, dentre os nomes que
compunham listas tríplices, com mandatos de três anos, podendo ser reconduzidos
indefinidamente, desde que continuassem sendo indicados pelo colégio eleitoral que os
escolheu.
No Tribunal Superior do Trabalho, havia 17 juízes togados e 10 classistas, e a
composição dos Tribunais Regionais variava conforme o Estado, porém, num como noutro, a
participação de juízes classistas era sempre paritária.
31
MALTA, Christovão Piragibe Tostes. Prática do processo trabalhista. 23. ed. São Paulo: LTr, 1992, p. 136.
32
SANTOS, Wanderley Guilherme dos, op. cit., 2007.
109
Portanto, a ideia de representantes de empregados e empregadores era, até o advento da
Emenda 24, uma característica da Justiça do Trabalho.
O percurso dessa prática inicia-se no governo do presidente Washington Luís quando,
mediante a Lei Paulista n.º 1.869, de 10 de novembro de 1922, criava-se uma Justiça Rural do
Trabalho, com representação classista e competência restrita a ações sumárias para a cobrança
de dívidas oriundas dos contratos e obrigações, decorrentes da interpretação e execução dos
contratos de locação de serviços agrícolas de valor limitado, inspirada nas Comissões
Paritárias da Espanha.
33
Posteriormente, em 1932, surgiram as Comissões Mistas de Conciliação (Decreto n.º
21.396, de 12 de maio), para compor dissídios coletivos, e as Juntas de Conciliação e
Julgamento (Decreto n.º 22.132, de 25 de novembro, alterado pelo Decreto n.º 24.742, de
1934), para os dissídios individuais. Em 1934, a Justiça do Trabalho foi inserida oficialmente
na Constituição Federal promulgada naquele ano, em 16 de julho, vinculada, porém, ao
Ministério do Trabalho (Art. 122). Embora não incluída como órgão do Poder Judiciário, o
Supremo Tribunal Federal admitia a natureza judicial das suas decisões.
O Decreto-lei n.º 1.237, de 2 de maio de 1940, modificado pelo de n.º 2.851, de 10 de
junho, e regulamentado pelo Decreto n.º 6.596, de 12 de dezembro, possibilitou que as Juntas
executassem suas próprias decisões, com autonomia, independente da Justiça Comum.
A Consolidação das Leis do Trabalho surge com o Decreto-lei n.º 5.452, de de maio
de 1943, e, finalmente, a Constituição Federal de 1946 insere a Justiça do Trabalho como
órgão do Poder Judiciário (Art. 94).
A Constituição Federal de 1988, como mencionado em tópico anterior, previu também a
possibilidade da intervenção arbitral na Justiça do Trabalho (Art. 114, §§ e 2º), na hipótese
de dissídios coletivos.
Outra reforma nas leis trabalhistas que inseriu a participação paritária entre empregados
e empregadores, no sentido da resolução conflitual, deu-se com a edição da Lei n.º 9.958, de
12 de janeiro de 2000, que alterou a Consolidação das Leis Trabalhistas, criando as
Comissões de Conciliação Prévia, com a atribuição de tentar conciliar os conflitos individuais
do trabalho (Arts. 625-A a 625-H, da CLT).
33
MALTA, Christovão Piragibe Tostes, op. cit., 1992, p. 130.
110
Essas Comissões são uma forma derivada das Comissões Mistas de Consulta e
Colaboração previstas também no Art. 621 da CLT, com origem constitucional no Art. 11 da
Carta Federal de 1988.
Martins, em estudo do assunto, afirma que “a maioria das reclamações trabalhistas é
pouco complexa, sendo que 60% delas resulta em acordo”
34
, daí justificar-se a criação dessas
Comissões, que são meio extrajudicial de composição de conflitos individuais, mediante
conciliação, resolvendo-se o litígio na própria empresa ou no sindicato, evitando o
ajuizamento da ação.
Enfim, presume-se que a exclusão dos juízes classistas da composição dos órgãos da
Justiça do Trabalho parece ter caminhado no sentido inverso da origem de seus institutos,
como que expressando a necessidade de autoafirmação do Poder, afastando-se de uma
experiência histórica que surgiu com feição mais democrática, se considerada a maior
participação das partes diretamente interessadas no conflito, para a função de prestar a
jurisdição, de forma célere, efetiva e legítima.
Os juízes classistas representavam, praticamente, todos os setores da sociedade; eram
eleitos; havia alternância nos cargos (no Primeiro Grau); suas decisões, quando majoritárias,
suplantavam até mesmo as dos juízes togados e, acima de tudo, decidiam sobre direitos e
obrigações, dos quais eram diretamente destinatários. Nada mais democrático.
Se lhes faltava a competência para determinar coercitivamente o cumprimento de seus
julgados, nas decisões colegiadas havia pelo menos a impressão de que o povo encontrava-se
presente, exercendo, compartilhadamente, o poder que lhe é inerente na Democracia. A
mudança não depôs a favor da soberania popular.
4.1.7 Justiça Eleitoral
A Justiça Eleitoral é mais um espaço onde se dá a manifestação da soberania popular no
processo decisório do Poder Judiciário e na composição de seus órgãos.
34
MARTINS, Sérgio Pinto. Comissões de conciliação prévia e procedimento sumaríssimo. São Paulo: Atlas,
2006, p. 65.
111
Consoante o Art. 118 da Constituição Federal de 1988, são órgãos da Justiça Eleitoral: I
– O Tribunal Superior Eleitoral; II – os Tribunais Regionais Eleitorais; III – os Juízes
Eleitorais; IV – as Juntas Eleitorais.
Os membros desses órgãos têm mandatos e, nas composições dos tribunais, reserva
de vagas para advogados.
No Tribunal Superior Eleitoral, dois de seus sete membros são escolhidos dentre
advogados de notável saber jurídico e idoneidade moral, indicados pelo Supremo Tribunal
Federal em lista sêxtupla e nomeados pelo Presidente da República.
A Constituição Federal não dispôs sobre as idades mínima e máxima dos membros do
Tribunal Superior Eleitoral, porém, este Tribunal decidiu, por unanimidade, que os advogados
que compuserem aquele órgão terão que cumprir a regra do Art. 94 da Constituição Federal,
neste tocante, devendo contar com mais de dez anos de efetivo exercício profissional, como
exigido nos Tribunais Regionais Federais e nos Tribunais de Justiça.
35
Esse também é o posicionamento da 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal, que
entende aplicar-se, de forma geral, às hipóteses de indicação de advogado para compor os
órgãos colegiados do Poder Judiciário, a exigência mínima de dez anos de efetivo exercício de
atividade profissional.
36
Assim, dispensados estão os advogados da idade mínima de 35 anos, sendo, por
isso, mais amplo o acesso deles aos Tribunais Eleitorais do que o dos demais membros, juízes
de carreira. Isso é, de certa forma, uma abertura para a flexibilização dos limites etários nos
tribunais que decidem sobre aspectos vitais do direito à cidadania, qual seja, o voto direto e
secreto, no sufrágio universal, através do qual se exerce a soberania popular.
37
Nos Tribunais Regionais Eleitorais também dois juízes escolhidos dentre seis
advogados de notável saber jurídico e idoneidade moral, indicados pelos Tribunais de Justiça
e nomeados pelo Presidente da República.
35
BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Mandado de Segurança n.º 2.833/2001-MG. Relatora: Ministra Ellen
Grace, decisão unânime. Diário de Justiça, Brasília, DF, 1 mar. 2002. Disponível em:
<http://www.tse.gov.br/servicos_online/catalogo/publicacoes/revista_eletronica/internas/rj13_2/paginas/acordao
s/ac2833.htm>. Acesso em: 31 maio 2009.
36
BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral. Recurso Ordinário em Mandado de Segurança n.º 24.334-5-PB. Relator:
Ministro Gilmar Mendes, decisão unânime. Diário de Justiça, Brasília, DF, 26. ago. 2005. Disponível em:
<http://www.tse.gov.br/servicos_online/catalogo/publicacoes/revista_eletronica/internas/rj17_1/STF24334_5.ht
m>. Acesso em: 31 maio 2009.
37
C.F./1988, op. cit., ( Art. 14).
112
Outra característica que insere os Tribunais Eleitorais na dinâmica democrática é a
alternância dos mandatos de seus membros, os quais servirão por dois anos, no mínimo, salvo
motivo justificado, e nunca por mais de dois biênios consecutivos, sendo os substitutos
escolhidos na mesma ocasião e pelo mesmo processo, em número igual para cada categoria.
38
Isso é importante porque é um precedente constitucional para a mitigação das regras da
vitaliciedade e da inamovibilidade, possibilitando a razoabilidade da proposta de exercício,
por prazo determinado, das funções da magistratura nos tribunais, sob a forma de jurisdição
contenciosa, atividade normativa ou consultiva, como ocorre na Justiça Eleitoral, ou como
controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário, no caso do Conselho
Nacional de Justiça, igualmente órgão do Poder Judiciário, cujos membros também são
escolhidos com mandatos pré-fixados e com composição plural.
39
Essa alternância do Poder, nos órgãos da estrutura do Judiciário, acompanha a constante
mutabilidade da realidade social, que se manifesta por forças diversas, cuja composição,
salutar ao exercício democrático, representa a adequação necessária ao processo de integração
e legitimação da soberania popular, numa interpretação constitucional aberta, que acomode as
várias pressões sociais, ideológicas e políticas, produzindo-se a si mesma.
Integram ainda a Justiça Eleitoral, as Juntas Eleitorais. Estas, consoante previsão do Art.
36 do Código Eleitoral, compõem-se de um juiz de direito, que será o presidente, e de dois ou
quatro cidadãos de notória idoneidade, nomeados sessenta dias antes da eleição, depois de
aprovação do Tribunal Regional, pelo presidente deste.
Essas Juntas têm competência, nas zonas eleitorais sob sua jurisdição, para apurar as
eleições, resolver as impugnações e demais incidentes verificados durante os trabalhos da
contagem e da apuração, expedir os boletins referentes aos votos apurados em cada seção e
expedir diplomas aos eleitos para cargos municipais.
40
Os membros das Juntas Eleitorais também gozam, no exercício de suas funções e no
que lhes for aplicável, de plenas garantias, e serão inamovíveis.
38
C.F./88, op. cit., ( Art. 121, § 2º).
39
C.F./88, op. cit., ( Art. 103-B, caput, e § 4º).
40
BRASIL. Código Eleitoral (1965). Leis e legislação eleitoral: código eleitoral e legislação correlata. 3. ed.
Brasília: Câmara dos Deputados, 2002, Art. 40.
113
Como as Juntas decidirão por maioria de votos as impugnações
41
, suas decisões podem
suplantar até o voto do juiz eleitoral, como acontecia nas antigas Juntas de Conciliação e
Julgamento da Justiça do Trabalho. Isso é a demonstração evidente de que a jurisdição
eleitoral prestada naquela oportunidade pode prescindir do juiz concursado, no que pertine à
eficácia de sua manifestação. Transitada em julgado, impõe-se aquela decisão com a mesma
definitividade inerente à jurisdição comum. Trata-se de abertura democrática à legitimação da
jurisdição por outros agentes que não os juízes togados.
Proposta que poderia ser implementada no âmbito dos Tribunais Regionais Eleitorais é
a divisão, quanto à origem das carreiras de seus membros, em proporções idênticas, entre a
magistratura estadual e a federal, atualmente desigual em favor dos magistrados estaduais,
considerando que a matéria especializada e a igualdade dos direitos políticos no pacto
federativo atingem igualmente competências estaduais e federais.
A escolha destes magistrados também poderia ser realizada por meio de eleição direta
entre todos os juízes estaduais e federais, de acordo com a categoria da qual são egressos,
possibilitando a indicação de juízes de todas as instâncias e entrâncias, que igualmente lidam
com a mesma matéria, ainda que respeitando a regra do “quinto na antigüidade”, em cada uma
das entrâncias nas quais se divide a organização judiciária dos Estados, fazendo-o de forma
alternada, de modo a facultar a todos o mesmo direito, reservando aos Tribunais de Justiça
apenas a indicação de seus membros junto aos Tribunais Regionais Eleitorais, através de
eleição pela composição plena daqueles órgãos.
A forma como se dá atualmente a indicação desses juízes privilegia os magistrados de
entrância final, que disputam também as inúmeras vagas nas diversas zonas eleitorais das
capitais, havendo, portanto, inexplicável diferenciação.
O argumento da experiência, antiguidade na carreira ou maior aprimoramento
intelectual não se compatibiliza com o fato, muitas vezes evidente, de que todos são juízes
concursados; zonas eleitorais disponíveis tanto em comarcas do interior como na especial;
alguns juízes das capitais têm até menos tempo na magistratura do que outros do interior,
tendo obtido maior experiência com o exercício da função eleitoral, em todo o seu processo e,
por último, em face da inclusão do exercício das funções de juiz eleitoral junto aos Tribunais
Regionais Eleitorais, em muitos Estados, como elemento de avaliação objetiva nas promoções
41
Ibid., 2002, Art. 169, § 1º.
114
de magistrados, nas vagas destinadas ao critério do merecimento, com pesos
superdimensionados, tornando-se esse evento fator de desequilíbrio dentre os juízes
concorrentes à progressão funcional na carreira.
O exercício da Advocacia por juízes ou suplentes dos Tribunais Eleitorais egressos da
categoria de advogados é permitido, conforme decisão liminar concedida pelo Supremo
Tribunal Federal, em 6 de outubro de 1994, na Ação Direta de Inconstitucionalidade n.º
1.127-8, ajuizada em face da proibição contida no Art. 28, da Lei n.º 8.906, de 4 de julho de
1994.
Ocorre, no entanto, que mesmo proibido o exercício da advocacia eleitoral a esses
juízes, nas circunscrições de suas atuações, muitos são os momentos em que esses
magistrados-advogados postulam perante juízes estaduais que exercem a magistratura de
Primeiro Grau eleitoral, cumulativamente com a da Justiça Comum.
Por terem seus nomes submetidos à escolha dos Tribunais Regionais Eleitorais, e por
serem suas decisões passíveis de reapreciação por esses mesmos magistrados, questionável
poderá ser o nível de imparcialidade, tanto dos juízes eleitorais dos tribunais quanto dos juízes
eleitorais de Primeiro Grau, considerando o poder de influência de uns sobre os outros.
Nesse caso, a ubiquidade funcional autorizada, em vez de contribuir para o
aperfeiçoamento democrático, desperta nos cidadãos a dúvida de que o processo decisório
eleitoral, de alguma forma, pode não reunir a isenção ideal.
Melhor seria que, durante o biênio eleitoral, o advogado que fosse escolhido para
exercer função jurisdicional junto aos tribunais recebesse vencimentos semelhantes aos dos
demais integrantes, juízes de carreira, ficando impedidos de praticar qualquer ato inerente à
advocacia, em qualquer instância do Poder Judiciário, afastando a suspeição sobre o seu
nome.
4.1.8 Quinto constitucional
Consiste o instituto do quinto constitucional na destinação de um terço das vagas do
Tribunal Superior do Trabalho, Superior Tribunal de Justiça, Tribunais Regionais Federais,
Tribunais Regionais do Trabalho e Tribunais de Justiça Estaduais, para advogados e
representantes do Ministério Público, escolhidos alternadamente.
115
No Tribunal Superior Eleitoral não se aplica essa regra, porém, reservam-se duas vagas
para advogados, das sete existentes, não havendo participação do Ministério Público na
composição do tribunal, funcionando o parquet apenas como fiscal da lei. O mesmo ocorre
nos Tribunais Regionais Eleitorais. No Superior Tribunal Militar, 20% das vagas são
destinadas a advogados, civis, restando ao Ministério Público apenas uma das quinze vagas
que compõem o Tribunal.
Percebe-se, assim, que a distribuição dos cargos nesses dois últimos tribunais não
atende ao critério proporcional de igualdade e alternância, da mesma forma que nos demais.
No Supremo Tribunal Federal não há essa exigência na escolha de seus membros,
porém a práxis política que comanda o processo de nomeação de seus ministros tem
preservado, ao longo de sua história, a indicação de nomes oriundos da classe dos Juízes, do
Ministério Público e dos Advogados.
No Direito brasileiro, o quinto constitucional foi introduzido pela Carta Federal de
1934, limitado à Justiça dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios, assegurando:
Art. 104 Compete aos Estados legislar sobre a sua divisão e organização
judiciárias e prover cargos observados os preceitos dos Arts. 64 a 72 da
Constituição, menos quanto à requisição de força federal, e ainda os princípios
seguintes:
[...]
b) investidura, nos graus superiores, mediante acesso por antigüidade de classe, e
por merecimento, ressalvado o disposto no § 6º;
[...]
§ - Na composição dos tribunais superiores, serão reservados lugares,
correspondentes a um quinto do número total, para que sejam preenchidos por
advogados, ou membros do Ministério Público, de notório merecimento e reputação
ilibada, escolhidos em lista tríplice, organizada na forma do § 3º.
O Poder Judiciário, consoante o Art. 63 da Constituição de 1934, compunha-se dos
seguintes órgãos:
Art. 63 – […]
a) a Corte Suprema;
b) os juízes e tribunais federais;
c) os juízes e tribunais militares;
d) os juízes e tribunais eleitorais.
116
A Justiça dos Estados, Distrito Federal e Territórios era disciplinada em capítulo
distinto, não integrando o rol dos órgãos acima mencionados, competindo privativamente aos
Estados:
Art. 7º - […]
I decretar a Constituição e as leis por que se devam reger, respeitados os seguintes
princípios.
[...]
e) garantias do Poder Judiciário e do Ministério Público locais.
Poletti afirma que:
Prevaleceu a tese da dualidade, vencida a proposta unitária, que federalizava toda a
Justiça, da Comissão. Arthur Ribeiro, Ministro do Supremo Tribunal e que saíra da
Comissão por não concordar com o unitarismo, viu a sua opinião vitoriosa na
Constituinte, sobretudo porque sustentada pelos representantes originários dos
Estados mais fortes, e ricos da Federação.
42
Surgido no período do governo Vargas, o instituto do quinto tem recebido críticas,
taxando-o de corporativo, oportunista e inadequado ao modelo tecnoburocrático adotado no
Brasil para a seleção de seus juízes, pela via do concurso público.
Alegam os opositores desse direito que a inserção no Poder Judiciário de cidadãos com
atuação funcional distinta daquela estritamente estatal não mais se compatibiliza com a
pluralidade atual de seus membros, considerando os fenômenos da juvenilização e da
feminilização da magistratura.
43
Entre as inúmeras vantagens da participação de advogados na composição dos tribunais,
mídias e literatura jurídicas elencam, ainda:
a) A oxigenação da magistratura concursada com a experiência própria dos
advogados junto ao público consumidor da prestação jurisdicional;
b) A fiscalização dos atos do Poder Judiciário por um contingente maior da
população;
c) O fato de a advocacia ser atividade essencial à administração da justiça, nos termos
do Art. 113 da Constituição Federal de 1988;
42
POLETTI, Ronaldo. Constituições brasileiras: 1934. Brasília: Senado Federal e Ministério da Ciência e
Tecnologia, Centro de Estudos Estratégicos, 2001. v. 3, p. 52.
43
BONFIM, Benedito Calheiros. Extinção ou manutenção do quinto constitucional? Disponível em:
<http://www.amb.com.br/portal/index.asp?secao=artigo_detalhe&art_id=61>. Acesso em: 6 maio 2008.
117
d) Visão diferente, qualidade e multivivência jurídicas;
44
e) A mitigação do autoritarismo dentro do Estado;
45
f) Maior dose de cidadania e vivência social;
46
g) A democratização do Judiciário;
h) A quebra do corporativismo e do hermetismo no Poder Judiciário.
No rol das críticas, colhe-se, também:
a) Os advogados continuam a defender o interesse de seus clientes dentro do
Tribunal;
b) Os advogados escolhidos integram grupos políticos restritos dentro da categoria
que os indicou;
c) Os advogados ficam submissos à estrutura do Poder Judiciário durante os anos que
antecedem a sua escolha;
d) Não há oxigenação nas idéias e no processo decisório e jurisprudencial;
e) O Conselho Nacional de Justiça já exerce a fiscalização do Poder Judiciário;
f) Os advogados aspiram ao ingresso nos tribunais, relegando a magistratura de
Primeiro Grau;
g) Os advogados são reprovados nos concursos para juízes e querem entrar pela porta
do fundo dos Tribunais;
47
h) Os advogados adquirem vitaliciedade logo ao ingressarem nos tribunais,
diferentemente dos juízes concursados;
44
BRASIL. Superior Tribunal de Justa. Ministro sar Rocha defende quinto constitucional em seminário da
OAB. Disponível em: <http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area+398&tmp.texto=87040>.
Acesso em: 6 maio 2008.
45
BRITTO, Cezar. OAB: quinto constitucional é melhor andoto ao Estado policial. Disponível em:
<http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=87055>. Acesso em: 6 maio 2008.
46
Ibid., 2008.
47
OLIVEIRA, Antônio Cláudio Mariz de. Magistratura não é emprego. O Estado de São Paulo, São Paulo, 2
abr. 2008. Disponível em: <http://www.amb.com.br/portal/index.asp?secao=mostranoticia&mat_id=12903>.
Acesso em: 6 maio 2008.
118
i) Desestímulo à magistratura de carreira;
j) Retardo da progressão funcional da magistratura de carreira;
k) Discrepância entre as idades dos advogados e a dos juízes de carreira, sendo menor
a daqueles, em regra, favorecendo a eternização nos cargos e dificultando a
renovação dos quadros;
l) Os advogados já participam das bancas de concursos para juízes;
m) Risco de que a composição dos tribunais superiores tenham mais advogados do que
juízes de carreira, em face da origem dos primeiros, se ingressaram nos Tribunais
Inferiores também oriundos da classe dos advogados.
Em suma, entre críticas e defesas, aparecem algumas propostas, dentre elas:
a) Concurso público para advogados, que os membros do Ministério Público se
submeteram a concurso externo na carreira;
b) Ingresso no quinto constitucional somente a partir do Primeiro Grau de jurisdição,
como os demais juízes de carreira, submetendo-se aos mesmos sacrifícios, deveres
e condições (oxigenação em todas as atitudes);
48
c) Suprimir a fase de redução das listas oferecidas pela OAB, perante os tribunais,
remetendo-as diretamente ao Chefe do Poder Executivo;
d) Aumento do período mínimo de efetivo exercício profissional, como pré-requisito
de ingresso nos tribunais, de 10 para 20 anos;
e) Estipulação de mandatos, possibilitando a alternância dos cargos e o retorno do
advogado ao seu exercício profissional original;
f) Constituição de bancas técnicas especializadas para sabatinar os advogados
indicados;
g) Reformulação dos estatutos da OAB para dificultar a rejeição por seu Conselho, de
nomes consagrados em votação direta pela categoria dos advogados.
48
RODRIGUES, Francisco César P. A polêmica do “quinto constitucional”. Disponível em:
<http://www.amb.com.br/portal/?secao=artigo+detalhe&art_id=848>. Acesso em: 6 maio 2008.
119
Não são poucas as observações sobre esse tema, inclusive sobre a autonomia da OAB
quanto ao direito de elaborar as listas sêxtuplas de advogados, segundo os critérios que
estipular em seus regulamentos, não podendo os tribunais preterir todos os nomes, salvo se
eles não preencherem o critério do notório saber jurídico, aferido objetivamente, e o da
reputação ilibada, apurada através de certidões públicas. Satisfeitas essas condições, o direito
é subjetivo e de competência exclusiva do órgão classista.
O que se deve realçar, para este estudo, é que a participação de advogados e
representantes do Ministério Público, com ou sem as alterações que venham a ser
implementadas nessa prática constitucional, é mais uma maneira de se ampliar a presença
popular, mesmo que para segmentos restritos da sociedade, mas que trazem consigo as
impressões imediatas de quem busca o acesso ao Poder Judiciário ou tem como função a
defesa da sociedade.
Em muitos países, como se viu, os membros dos tribunais e os juízes têm origem em
diversos setores da sociedade, não se fechando em feudos do saber e do poder. Devem
expressar, assim, democraticamente, a pluralidade da sociedade.
49
Os tribunais ou a magistratura de Primeiro Grau não seriam o locus definitivo de grupos
autoesclarecidos e eternos, mas representariam a abertura e a alternância que deveriam ser
inerentes ao Poder, sem prejuízo de sua força aglutinadora e impositiva.
4.1.9 Critério federativo na composição dos tribunais
Por serem os Tribunais Superiores (STJ, TST, TSE e STM), assim como o Supremo
Tribunal Federal, instâncias recursais finais, salvo, naqueles, quanto às competências
materiais ou funcionais originárias e específicas, sua composição, considerando a garantia do
princípio do equilíbrio federativo, deveria respeitar, mediante critérios, a igualdade e a
proporcionalidade que o legislador constitucional assegurou aos Estados e ao povo, no Senado
e na Câmara Federal, respectivamente.
Os argumentos da imparcialidade e independência, afora as demais prerrogativas
constitucionais dos membros desses tribunais, não afastam a premissa de que, sendo o juiz um
49
Para Filomeno Moraes “[...] é desnecessário dizer que a consolidação da democracia brasileira está em função,
em grande medida, da institucionalização de um judiciário democrático, republicano e independente”.
MORAES, Filomeno. Quinto Constitucional. O Povo, Fortaleza, 29 maio 2007, p. 4.
120
Ser político, por essência, reúne em torno de si um conjunto de valores que se forma ao longo
de sua vida, recebendo forte influência dos padrões sociais, culturais, étnicos e econômicos,
dentre outros, do local de suas origens ou do lugar onde, mais demoradamente, exerceu suas
atividades funcionais.
Não sendo e nem podendo ser neutro, o juiz conduzir-se-á, como todo ser humano,
reagindo segundo o padrão individual e coletivo que vivenciou, impregnando suas decisões
com o verniz de sua formação.
O Brasil é um continente que aglutina povos, valores e costumes, os mais diversos. A
aplicação do direito não está imune ao reflexo que esses elementos hão de repercutir na
personalidade do juiz.
Assim como o que sentido ao texto da norma é a interpretação, que é subjetiva, o
trabalhador, o empresário, o Poder Público, os grupos, o poder econômico, a prática política,
os costumes, as tradições, enfim, a cultura de uma região não é igual à de outra. Há, por
vezes, tolerância entre populações diversas, dentro de um mesmo espaço territorial e sob uma
soberania única, em função de um pacto social e de uma ordem jurídica que sinaliza com
mecanismos compensatórios e igualitários, que se inserem no conjunto de forças, equilibrando
o sistema de tensionamento político e social.
Bercovici, analisando o problema do federalismo no Brasil, afirma que um dos aspectos
fundamentais da garantia de igualdade é o da igualdade política.
50
Discorrendo sobre o
modelo da proporcionalidade na Câmara Federal e o da igualdade, no Senado da República,
acrescenta:
Wanderley Guilherme dos Santos defende para os sistemas representativos a ‘regra
de ouro’ de José de Alencar. Segundo sua interpretação, a ‘regra de ouro’ de José de
Alencar consistiria no fato de as minorias representadas no Parlamento não serem
esmagadas pela maioria, nem, por outro lado, terem condições de impedir a maioria
de governar. A regra é a do equilíbrio entre o direito da minoria à representação e o
direito da maioria ao governo não despótico de uma minoria. Os problemas advindos
do respeito a essa regra são notados com muito mais intensidade em um Estado
federal representativo como o Brasil, onde as disparidades regionais são a regra.
Acaba sendo no Congresso Nacional que os Estados minoritários, econômica,
populacional e eleitoralmente, procuram defender seus interesses e compensar
inferioridades.
Assim, autores como Wanderley Guilherme dos Santos e Paulo Bonavides defendem
a manutenção dos privilégios na representação para os Estados menores, em
50
BERCOVICI, Gilberto. Dilemas do Estado Federal brasileiro. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004, p.
77.
121
detrimento dos grandes Estados, pois vêem nessa distorção a garantia do equilíbrio
federativo [...]
51
Essa ideia de equilíbrio federativo na escolha de representantes dos Estados e da
população e segundo critérios de igualdade e proporcionalidade, poderia também orientar as
indicações de magistrados no âmbito dos Tribunais Superiores e do Supremo Tribunal
Federal, por se tratar de órgãos de um Poder cujos membros são vitalícios e inamovíveis,
diferentemente do Poder Legislativo, além do fato de serem escolhidos, ao final, pelo Chefe
do Poder Executivo Federal.
A técnica constitucional adotada para a eleição dos representantes do Legislativo e do
Executivo não atribui ao povo, igualmente, o voto, como possibilita que suas escolhas
possam ser revistas periodicamente, contribuindo para a constante aferição de valores e
propostas no âmbito da democracia.
Isso ainda se torna mais evidente, na medida em que cada Estado da Federação é
contemplado com o mesmo número de Senadores e a representação na Câmara Federal é
variável, atendendo ao crescimento da população, respeitados os limites mínimo e máximo.
No Poder Judiciário, além do povo não eleger os magistrados, no caso dos tribunais,
somente os membros destes órgãos finalizam a lista de inscritos ou pré-selecionados, podendo
até recusar seus nomes, e é o Chefe do Poder Executivo quem os chancela, no final do
processo.
Essa interferência de reduzido número de vontades, associada ao crivo final de uma
única pessoa, suscita questionamentos no plano da teoria da democracia, pelo risco de que
haja a perpetuação de uma hegemonia política, intelectual, jurisprudencial ou cultural,
definida no momento das escolhas, adquirindo uma estabilidade que não mais se
compatibiliza com a regra da alternância do poder.
Poder-se-ia argumentar que o critério de escolhas atende a um sistema de alternâncias
entre advogados, juízes federais, desembargadores dos Tribunais de Justiça estaduais e
distrital, representantes do Ministério Público Federal, Estadual, do Distrito Federal e dos
Territórios, sendo isso, por si, mais abrangente do que a vinculação federativa adotada pelo
Poder Legislativo Federal.
51
Ibid., 2004, p. 89-90.
122
A assertiva não é verdadeira, na medida em que muitos são os candidatos e poucos são
os escolhidos. Ademais, Estados com um grande número de membros nos Tribunais de
Justiça, como é o caso de São Paulo, onde só o número de desembargadores excede a
quantidade de todos os juízes e desembargadores estaduais de unidades federativas menores.
No Superior Tribunal de Justiça, instalado desde abril de 1989, foram nomeados, até
o momento, ministros oriundos, por local de nascimento, de dezenove Estados, contando na
atual composição efetiva com membros de apenas treze Estados,
52
do total de vinte e sete
Unidades Federativas estaduais. Há ministro naturalizado brasileiro, o que engrandece a
nação, mas apenas um membro, dentre todos, oriundo da Região Norte e outro da Região
Centro-Oeste do País, de um total de onze Estados que compõem essas regiões.
53
No Supremo Tribunal Federal não tem sido diferente. Em toda a sua história, que
remonta ao Império, somente vinte Estados legaram juristas para os seus quadros, compondo-
se o Supremo Tribunal Federal, hoje, de membros egressos de apenas sete Estados.
54
Esse referencial pertine apenas aos Estados de nascimento desses ministros.
Considerando que alguns deles são nascidos em Estados menores, e durante muito tempo
procuraram obter formação intelectual nos grandes centros e não mais retornaram às suas
origens, a estatística aferida pelo berço de nascimento é mais desfavorável ainda para os
menores e menos destacados Estados.
Pergunta-se, então, de que adianta a preocupação com o Estado de origem, a
universidade onde se graduou ou o local onde o ministro exerceu mais demoradamente a sua
ocupação anterior, se a norma a ser interpretada é a mesma e o tribunal decide por colegiado?
Responde-se com a simplicidade de argumentos e a notoriedade dos fatos: a norma, em
dado momento histórico, é única; as interpretações ao texto da norma diferem, porque fruto da
subjetividade do intérprete. E é na interpretação que se refaz a norma, adequando-a ao caso
concreto, colegiadamente.
52
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Ministros aposentados e ex-ministros. Disponível em:
<http://www.stj.jus.br/web/verMinistrosSTJ?parametro=3>. Acesso em: 9 maio 2008.
53
Id. Ministros ativos. Disponível em: <http://www.stj.jus.br/web/verMinistrosSTJ?parametro=1>. Acesso em: 9
maio 2008.
54
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/principal/principal.asp>.
Acesso em: 31 maio 2009.
123
E mais. A mente que interpreta jamais se abstrairá totalmente dos valores sobre os quais
foi formada, dos dogmas e paradigmas herdados de seus antecedentes, porque tudo funciona
como num sistema complexo. Dir-se-á: não se poderá esperar brotar morangos das algarobas,
água perene dos rochedos inóspitos da caatinga ou xiquexique dos pomares de pêssegos e
amoras. É a ordem natural dos fatos.
As desigualdades regionais, consolidadas dentro do federalismo capenga brasileiro,
continuarão, porque desigual também é o processo de escolha dos membros desses tribunais.
O Senado Federal, que aprova a escolha dos nomeados pelo Presidente da República,
limita-se ao ritual do sistema imposto pela base do governo, ou seja, do Chefe do Poder
Executivo. Tudo continua pacificamente como está. Nos Estados Unidos não é diferente,
conforme acentua Zaffaroni:
Em geral, os presidentes nunca nomeiam juízes que não sejam de seu próprio
partido. As administrações republicanas desde Reagan conseguiram renovar 70% da
magistratura federal e alteraram substancialmente a composição da Suprema Corte.
[...]
O candidato a magistrado federal é submetido a uma quantidade de filtragens
seletivas para evitar a arbitrariedade presidencial, mas o certo é que todos os
controles são puramente políticos, quer dizer, de mero poder.
[...]
A sociedade norte-americana tem múltiplos aspectos admiráveis, dentre eles um dos
mais importantes é sua incrível capacidade de autocrítica, mas não acreditamos que
sua estrutura judiciária pertença a este elenco. A concentração de poder nas mãos de
poucos juízes da Suprema Corte conduz a uma incrível partidarização de sua
seleção. Esta instituição não é uma mostra de equilíbrio, mas um campo de luta
partidária direta, delimitada de forma a favorecer aos que tenham determinado
perfil.
55
Enfim, enquanto não houver uma fórmula que se aproxime, nos tribunais, da ideia que
se criou para o Poder Legislativo, de representações paritárias e proporcionais, não se te
uma interpretação jurídica abrangente para todas as regiões do País, no sistema federativo de
governo e de poder.
Os Estados do Acre, Roraima, Amapá, Rondônia, Amazonas, Maranhão, Piauí, Ceará,
Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Bahia, Espírito Santo, Santa Catarina,
Paraná, Mato Grosso do Sul, Goiás, Tocantins e Distrito Federal, todos aguardam uma vaga
na composição atual do Supremo Tribunal Federal.
55
ZAFFARONI, Eugenio Raúl, op. cit., 1995, p. 109-111.
124
O mesmo se diga em relação aos Estados do Acre, Amapá, Rondônia, Roraima, Pará,
Maranhão, Piauí, Sergipe, Rio Grande do Norte, Espírito Santo, Mato Grosso, Mato Grosso
do Sul, Tocantins e Distrito Federal, quanto ao Superior Tribunal de Justiça.
56
Neste Tribunal
33 ministros. Pelo menos um poderia ter nascido ou se formado em cada um desses
Estados. Quanto ao Supremo, poderia haver um sistema de rodízio (federalismo regional),
contemplando todo o país num dado intervalo temporal. Acredita-se que pessoas capazes,
com reputação ilibada e notório saber jurídico em todos os Estados brasileiros, assim como
uma pulverização ideológica com viés partidário ou não. Que outros fatores reais do poder
impedem esse processo?
4.1.10 Ministério Público
A Constituição Federal dispõe em seu texto:
Art. 127 O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função
jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime
democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.
Art. 129 – São funções institucionais do Ministério Público:
[...]
II Zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância
pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas
necessárias a sua garantia.
[...]
A essencialidade do Ministério Público para a função jurisdicional, na prática
democrática brasileira, reforça o arco legitimante do Poder Judiciário, na medida em que os
representantes ministeriais agem em nome da sociedade, ora como parte, ora como fiscal na
defesa da ordem jurídica e dos princípios do Estado Democrático de Direito.
Poder-se-ia até dizer que o povo se faz presente por meio do Ministério Público, pelo
menos nas matérias referentes a direitos indisponíveis, interesses de incapazes, estado das
pessoas, pátrio poder, tutela, curatela, interdição, casamento, litígios sobre direitos coletivos e
difusos, patrimônio público e social, meio ambiente, populações indígenas, controle externo
da atividade policial, ações penais públicas, ações diretas de inconstitucionalidade e
declaratória de constitucionalidade, usucapiões, falências, ações civis públicas, dentre tantas
outras.
56
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Disponível em:
<http://www.stj.gov.br/publicacao/engine.wsp#>. Acesso em: 31 maio 2009.
125
Nos tribunais que prestam a jurisdição estatal, o Ministério Público também tem seu
lugar garantido nas sessões plenárias das instâncias federais, trabalhistas, militares, estaduais
e eleitorais.
A Lei Orgânica do Ministério Público também destaca essas funções, atribuindo a cada
Estado da Federação a competência para o estabelecimento de normas específicas de
organização, atribuições e estatutos.
Instituição dotada de funções distintas, mas interativas com as do Poder Judiciário, aos
membros do Ministério Público foram asseguradas as mesmas garantias e prerrogativas dos
magistrados, quais sejam: vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de subsídios. O
mesmo se diga em relação às vedações quanto ao recebimento de honorários, percentagens,
exercício da advocacia, participação em sociedades comerciais, atividade político-partidária.
Introduzindo espécie de reciprocidade no controle externo exercido pela sociedade civil,
das funções administrativas, financeiras e do desempenho funcional dos membros do Poder
Judiciário e do Ministério Público, a Emenda Constitucional n.º 45/2004 inseriu no texto da
Carta Federal, o Conselho Nacional de Justiça, como órgão do Poder Judiciário (Art. 103 B,
caput), tendo como membros, dentre outros, um representante do Ministério Público da União
(Art. 103-B, inciso X) e outro do Ministério Público estadual (Art. 103-B, inciso XI).
Em contrapartida, criou-se também o Conselho Nacional do Ministério Público (Art.
130-A, caput), com as mesmas funções do Conselho Nacional de Justiça, quanto aos membros
do Ministério Público, com a participação de dois juízes, um indicado pelo Supremo Tribunal
Federal e outro pelo Superior Tribunal de Justiça (Art. 130-A, inciso IV).
Discute-se, atualmente, sobre a desnecessidade da presença do Ministério Público nos
Conselhos Estaduais da Magistratura, sob a alegação de que ali tramita matéria estritamente
do Poder Judiciário, pertinente a sua organização interna, não havendo a mesma interseção em
relação à presença de juízes nos órgãos correlatos do Ministério Público estadual.
Os Regimentos Internos dos Conselhos Estaduais de Magistratura também asseguram a
presença do Ministério Público em suas sessões, com diversas atribuições, dentre elas:
intervenção oral em qualquer assunto sobre o qual tenha oferecido parecer, ou quando instado
a opinar; representação ao Conselho sobre faltas e omissões no cumprimento dos deveres por
parte dos juízes de Primeiro Grau de jurisdição e servidores do Poder Judiciário; oferecimento
126
de parecer nas representações contra juízes de Primeiro Grau, nas reclamações contra atos
praticados pelo Presidente, Vice-Presidente, Corregedor Geral da Justiça e desembargador do
Tribunal de Justiça, nos processos administrativos contra decisão de Juízes da Infância e
Juventude, nos recursos de competência do Conselho Superior de Magistratura e nas
correições parciais e gerais.
57
A essas atribuições do Ministério Público acrescem-se as funções de intermediação de
conflitos sociais, exercidas em caráter conciliatório ou por mediação, destacando-se os
Termos de Ajustamento de Condutas (TAC), que resolvem, no plano extrajudicial, grande
parte das demandas que chegariam inevitavelmente ao Poder Judiciário.
Percebe-se, portanto, o largo espectro da contribuição do Ministério Público na
consolidação dos princípios do Estado Democrático de Direito e na projeção da soberania
popular no Poder Judiciário e na defesa da ordem jurídica, legitimando, a seu modo, a função
judiciária.
4.1.11 Acessibilidade ao Judiciário
A acessibilidade ao Poder Judiciário ou aos outros meios de prestação jurisdicional
abrange uma série de instrumentos, caminhos, direitos e deveres, mediante os quais o
princípio democrático se implementa no corpo social. Essa acessibilidade deve promover e
disponibilizar ao povo, dentre outras condições:
a) Igualdade de oportunidades para postular a prestação jurisdicional;
b) Disponibilidade de defesa técnica;
c) Franquia das custas processuais quando necessárias;
d) Distribuição equitativa e territorial dos órgãos jurisdicionais;
e) Comunicação ágil, adequada e atualizada dos atos e assuntos judiciários;
f) Prédios adequados, acolhedores e funcionais;
g) Disponibilização de meios de locomoção para situações excepcionais;
57
CEARÁ. Atribuições do Ministério Público do Estado do Ceará. Art. 16. Regimento Interno do Conselho da
Magistratura do Estado do Ceará. Diário de Justiça, Fortaleza, CE, 14 jul. 2004, p. 10-17.
127
h) Garantia da integridade física e moral dos beneficiários;
i) Servidores, magistrados, promotores e defensores, em quantidade suficiente;
j) Controle e fiscalização sobre os atos administrativos do Poder Judiciário e as
decisões do aparelho jurisdicional;
l) Legitimação ordinária ou extraordinária sobre interesses difusos coletivos,
homogêneos;
m) Utilização dos mecanismos legais de participação popular, inclusive o controle
de constitucionalidade.
Alguns desses instrumentos, direitos e deveres serão abordados sob a matriz da abertura
externa, neste subtítulo, e outros serão reservados ao título e subtítulos seguintes (abertura
interna), por melhor se adequarem à metodologia sequencial dos temas.
Frise-se, no entanto, que muitos desses tópicos têm repercussão tanto na democratização
externa quanto na interna, no âmbito do Poder Judiciário.
A Constituição Federal de 1988 dispõe sobre o acesso ao Poder Judiciário, ao
reconhecer o princípio do Estado Democrático de Direito, com realce para a soberania, a
cidadania e a dignidade da pessoa humana (Art. 1º, I, II e III); o princípio da igualdade
perante a lei (Art. 5º, caput); a prestação judiciária estatal, integral e gratuita, aos que
comprovarem insuficiência de recursos (Art. 5º, LXXIV), o princípio da inafastabilidade da
apreciação pelo Poder Judiciário de lesão ou ameaça a direito (Art. 5º, XXXV); o princípio do
devido processo legal (Art. 5º, LIV); o princípio do contraditório e da ampla defesa (Art. ,
LV); o princípio da razoável duração do processo e dos meios que garantam a celeridade de sua
tramitação (Art. 5º, LXXVIII); e a Defensoria Pública como instituição jurisdicional do Estado,
para a orientação jurídica e a defesa, em todos os graus, dos necessitados (Arts. 134 e 135).
O mesmo preceito de acessibilidade ao Judiciário, em igualdade de condições, está
previsto na Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948, no Art. 7º, que por força
do Art. 5º, §§ e 3º, da Constituição Federal de 1988, alcança também a condição de Direito
Fundamental.
128
Nesse sentido, o Estado deve proporcionar todos os meios ao exercício desse Direito,
disponibilizando defensores públicos em número suficiente e com subsídio compatível com a
complexidade das funções que lhe são inerentes, como previsto no Art. 135 da Carta Federal.
O que se verifica, atualmente, em muitos Estados brasileiros, é uma enorme diferença e
desproporção dos recursos orçamentários aprovados para essa carreira e para a remuneração
dos seus membros, se comparados com os mesmos benefícios alocados para o Ministério
Público e o Poder Judiciário.
Há Estados com inúmeras comarcas sem defensores públicos, sendo essas funções
exercidas por advogados contratados pelos municípios, com remuneração menor do que o
desigual subsídio dos defensores concursados. Ademais, como esses advogados são
subordinados a órgãos dos Poderes Executivo ou Legislativo, são passíveis de direcionamento
político-partidário, com sério risco de discriminação no atendimento dos cidadãos de
inclinação política oposta aos governos, principalmente nos pequenos municípios, onde as
divisões políticas são mais intensas.
A conclusão a que se chega é que na busca de se alcançar a celeridade e os resultados
estatísticos de produtividade processual, a proteção do direito do desassistido tem sido
relegada a atos meramente formais, com ausência de defesa técnica efetiva e muitas vezes
limitada à subscrição de termos e peças processuais sumários e intempestivos, por falta de
bons advogados e em número suficiente.
O processo para o necessitado torna-se um embuste, deixando-o sujeito à própria sorte.
O Ministério Público e o Poder Judiciário, ambos com remuneração e prerrogativas
constitucionais diferenciadas, sobrepõem-se ao Estado-defensor, postulador, orientador e
consultor. Qual a razão de ser dessa discriminação, quando se avançou do estágio
dimensional do Estado social, de normatividade e status positivo, para a categoria de Estado
social democrático, onde o princípio da democracia eleva-se à dimensão de direito
fundamental?
Atente-se, por exemplo, às condições dispensadas aos Procuradores dos Estados. Estes
profissionais são mais bem remunerados do que os defensores públicos; em geral, são lotados
nas capitais ou nas grandes cidades, com direito a usufruírem de condições de vida melhores e
ainda podem advogar, exceto contra a Fazenda Pública que representam.
129
Qual a diferença entre o Procurador do Estado e o Defensor Público, no que tange à
fonte pagadora, à relevância das funções, à quantidade e complexidade dos serviços, ao nível
intelectual, à forma de investidura? Nenhuma, exceto pelo fato de que os Procuradores
estaduais defendem o tesouro estadual e os defensores públicos defendem parte considerável
da população que enche os cofres públicos. Razoável seria que ambos recebessem o mesmo
tratamento, inclusive com o mesmo padrão remuneratório e as garantias constitucionais
assegurados a juízes e promotores.
As custas judiciais, com todos os seus consectários (honorários sucumbenciais,
emolumentos cartoriais etc.) também integram o conceito de assistência jurídica integral. Leis
específicas regulamentam a matéria, porém, não raro, veem-se litígios processuais sobre o
assunto, que consomem mais energia das partes do que o próprio direito material.
casos até mesmo de pessoas jurídicas com advogados particulares constituídos, que
recebem o benefício da gratuidade judicial.
58
Exigir do hipossuficiente o pagamento das
despesas processuais para postular, defender-se e implementar direitos é o mesmo que negar-
lhe a jurisdição antecipadamente.
Nas ações de habeas corpus e habeas data, pela importância que o legislador
constitucional imprimiu a essas garantias constitucionais (Art. 5º, LXXVII, C.F./88), foi
assegurada a gratuidade a todos quantos delas faça uso, independente da condição financeira
desfrutada, assim como aos atos necessários ao exercício da cidadania (título de eleitor,
direito de votar, certidão de nascimento, dentre outros).
A comunicação ágil, adequada e atualizada dos atos e assuntos judiciários é outra
vertente do acesso à justiça. Por agilidade, entenda-se a emergência necessária para transmitir
as soluções judiciárias, a fim de que o direito seja aplicado com brevidade. A adequação
refere-se aos meios utilizados para a comunicação estabelecida entre o usuário do serviço
jurisdicional e o órgão prestador da jurisdição ou das atividades administrativas correlatas. É
o caso de se falar em inclusão digital, informatização de rotinas, disponibilização de
equipamentos, uso de dio, TV, fax, telefone, mensagens eletnicas, cumprimento efetivo de
mandados judiciais, eficiência dos sistemas de entrega de correspondência, imprensa escrita etc.
58
Refere-se ao MATO GROSSO. Processo MC n.º 14.816. Registro n.º 2008/0220893-4, requerente: UNICOM
ENGENHARIA E COMÉRCIO LTDA. Requerido: Município de Rondonópolis. Relatora: Min. Eliana Calmon
Segunda Turma. Disponível em: <http://www.stj.gov.br/portal
_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=89662>. Acesso em: 23 out. 2008.
130
Se o Brasil é um país de grande extensão territorial, com péssima malha viária, sistema
de distribuição de correspondências monopolizado, poucos servidores para o exercício do
oficialato de justiça, baixo índice de inclusão digital e alto contingente de analfabetos, é
importante que haja adequação da comunicação dos assuntos e atos judiciários às
peculiaridades de cada comunidade, evitando generalidades igualitárias. O argumento de que
as dificuldades das partes não são as mesmas dos advogados que lhes representam, não se
sustenta ante a assertiva de que há hipóteses, a exemplo do jus postulandi, em que se dispensa
advogados e, se necessários estes profissionais para a representação judicial das partes, tanto
eles poderão estar em situações semelhantes de insuficiência material, como estas,
independente da representação, têm o direito subjetivo de ser informadas pessoalmente sobre
os assuntos e atos judiciários.
A atualização da comunicação refere-se à permanente informação a que o cidadão tem
direito numa sociedade onde a notícia se tornou uma mercadoria ávida por consumidores e
com excessiva volatilidade. Nesse sentido, mister que a imprensa escrita e as mídias
eletrônicas tenham todo o acesso possível à informação produzida pelo Judiciário para que o
conjunto da sociedade possa atualizar-se sobre os fatos que interferirão em suas vidas.
Até mesmo a comunicação eletrônica estabelecida em sites oficiais de órgãos do Poder
Judiciário precisa se manter atualizada em tempo real, para acompanhar a virtualidade da
informação. Não é mais razoável que essas fontes de consulta eletrônica demorem muito a
comunicar fatos que são do domínio público, tornando a notícia inservível para os
interesses do consumidor desse produto democrático.
Fala-se em atualização também do banco de dados da informação, na medida em que a
sociedade tem o direito de conhecer no Judiciário, a história, a estrutura administrativa, o
orçamento e sua aplicação, as metas, o processo eletrônico, o curriculum de juízes, membros
do Ministério Público, defensores e auxiliares judiciários que interferem na relação
processual.
Os prédios do Judiciário onde se instalam sua administração e estrutura jurisdicional
devem ser construídos de maneira a proporcionar o fácil acesso do povo, o sentimento de
acolhimento e igualdade quando a eles se comparece e a funcionalidade, que tem mais
conectividade com praticidade, austeridade e sustentabilidade do que com excentricidades
arquitetônicas.
131
A locomoção de algumas pessoas que procuram o Judiciário também deve ser
viabilizada. Reclama-se, especialmente, do transporte de presos, quase sempre prejudicados
por falta de viaturas policiais. Por conta disso, atos judiciais são adiados e a jurisdição demora
a ser prestada. Opção que se apresenta é o deslocamento do magistrado aos locais mais
distantes da sede do juízo, onde haja comunidades e contingentes populacionais, como ocorre
nos presídios e em povoados ou distritos, nas comarcas de grande extensão territorial. Nesses
casos, inverte-se o fluxo natural do acesso, dirigindo-se o Poder Judiciário ao jurisdicionado,
na forma de justiça itinerante.
Aliás, essa previsão está na Constituição Federal de 1988, quando prescreve a
realização de audiências e demais atos da atividade jurisdicional nos limites territoriais da
respectiva jurisdição, servindo-se de equipamentos públicos e comunitários, e o
funcionamento descentralizado de Câmaras regionais, a fim de assegurar o pleno acesso do
jurisdicionado à justiça, em todas as fases do processo.
59
Além desses canais de aproximação dos órgãos do Poder Judiciário com a sociedade, a
Constituição Federal de 1988 prevê também que
a União, inclusive no Distrito Federal e nos Territórios, criará ouvidorias de justiça,
competentes para receber reclamações e denúncias de qualquer interessado contra
membros ou órgãos do Poder Judiciário, ou contra seus serviços auxiliares,
representando diretamente ao Conselho Nacional de Justiça.
60
Este Conselho,
61
com a sua competência prevista na Constituição Federal, tem
atribuições de controle e fiscalização da atuação administrativa e financeira do Poder
Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes, cabendo-lhe, no que pertine à
temática da acessibilidade:
Art. 103-B – […]
[…]
§ 4º - […]
[…]
II zelar pela observância do Art. 37 e apreciar, de ofício ou mediante provocação,
a legalidade dos atos administrativos praticados por membros ou órgãos do Poder
Judiciário, podendo desconstituí-los, revê-los ou fixar prazo para que se adotem as
providências necessárias ao exato cumprimento da lei, sem prejuízo da competência
do Tribunal de Contas;
59
C.F./1988, op. cit., (Arts. 107, II, §§ 2º e 3º; 115, §§ 1º e 2º; 125, §§ 6º e 7º e 126).
60
C.F./1988, op. cit., (Art. 103, § 7º).
61
O Conselho Nacional de Justiça foi criado pela E.C. n.º 45/2004 e insere-se como órgão do Poder Judiciário.
132
III – receber e conhecer das reclamações contra membros ou órgãos do Poder
Judiciário, inclusive contra seus serviços auxiliares, serventias e órgãos prestadores
de serviços notariais e de registro que atuem por delegação do poder público ou
oficializados, sem prejuízo da competência disciplinar e correcional dos tribunais,
podendo avocar processos disciplinares em curso e determinar a remoção, a
disponibilidade ou a aposentadoria com subsídios ou proventos proporcionais ao
tempo de serviço e aplicar outras sanções administrativas, assegurada ampla defesa.
[…]
VI elaborar semestralmente relatório estatístico sobre processos e sentenças
prolatadas, por unidade da Federação, nos diferentes órgãos do Poder Judiciário;
Esses controle e fiscalização são realizados pelo Conselho Nacional de Justiça, que é
composto por magistrados e representantes do Ministério Público de todas as instâncias,
exceto a militar; de membros da Ordem dos Advogados do Brasil; e por dois cidadãos,
indicados um pela Câmara dos Deputados e outro pelo Senado Federal. É representação
indireta do povo e da sociedade, porém, já é um avanço no processo de acessibilidade.
Para facilitar esse acesso, o CNJ realizou, em 15.10.2008, em Salvador/BA, a primeira
audiência pública, desde o início de suas atividades em 2005, com a presença de 300 pessoas
no Tribunal de Justiça da Bahia, e outra no Maranhão, em 23.10.2008, para ouvir as
reivindicações dos cidadãos e adotar medidas que visem à melhoria da eficiência dos serviços
da justiça naqueles Estados.
62
Outras audiências estão sendo realizadas nas Unidades
Federativas estaduais.
Retornar-se-á ao tema do Conselho Nacional de Justiça mais adiante, quando for
abordada a temática da democratização interna no Poder Judiciário.
Outro aspecto relacionado diretamente à acessibilidade no âmbito do Judiciário alude às
garantias da integridade física e moral daqueles que procuram o aparelho jurisdicional.
Refere-se à segurança que o Estado deve proporcionar às partes, testemunhas, vítimas,
auxiliares judiciais, magistrados, representantes do Ministério Público, advogados públicos e
privados, além de policiais, no exercício de seus direitos e funções.
No âmbito do Direito Penal, a eficácia da apuração da verdade real é, por vezes,
maculada pelo temor das partes envolvidas, que se sentem coagidas e ameaçadas pela
criminalidade organizada, que desafia o Estado e atenta contra a integridade física e moral dos
que participam do processo.
62
BRASIL. Conselho Nacional de Justiça - CNJ. Judiciário de São Paulo propõe 40 boas práticas e objetivos
para modernizar a Justiça. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/index.php?
option=com_content&task=view&id=5330&Itemid=42>. Acesso em: 24 out. 2008.
133
O programa de proteção às vítimas e testemunhas não atende suficientemente à
demanda da sociedade que, por consequência, afasta-se do Estado e recusa a sua proteção,
prejudicando o acesso ao Judiciário.
Os prédios e dependências públicas onde se realizam atos jurisdicionais e são guardados
bens apreendidos, instrumentos e produtos dos crimes, também não têm, em sua grande
maioria, apoio da força policial ou vigilância de suas instalações, ficando à mercê da própria
sorte, diante da turba ensandecida e dos agentes criminosos.
Veem-se, não raro, invasões, agressões, depredações, incêndios e furtos, noticiados
diariamente pela mídia, com danos ao patrimônio público, subtração de bens materiais e
processos, guardados em prédios judiciais, além de agressões a todos os que ali transitam. A
vigilância e a força blicas, seletivamente distribuídas e alocadas junto a bancos e a
estabelecimentos privados, mostram à sociedade a ordem de valores priorizada. Ir aos prédios
e Fóruns da Justiça para postular o seu direito tem causado constrangimento ao cidadão.
Nega-se, assim, o acesso à justiça.
Outra dificuldade para a sociedade acessar o Judiciário refere-se ao contingente humano
que integra esse Poder. A quantidade de servidores do próprio Judiciário, em cada comarca ou
juízo, é insignificante para atender à demanda processual. Apela-se, muitas vezes, para
convênios com os entes públicos mais próximos, provocando suspeitas da própria sociedade,
que nessa colaboração uma forma disfarçada de incursão desses entes no resultado da
prestação jurisdicional.
Acresça-se a isso a enorme diferença vencimental atribuída aos servidores estaduais em
relação aos federais, contribuindo para afastar o recrutamento de quadro qualificado
permanente, ficando os judiciários estaduais como corredores por onde transitam servidores
que, ou se acomodam por diversas circunstâncias ou estão sempre migrando para outros
órgãos do próprio Poder, nas instâncias que remuneram melhor.
Aguarda-se a unidade remuneratória para os servidores do Judiciário. O Supremo
Tribunal Federal já se manifestou sobre a tese da unidade do Poder Judiciário:
A divisão da estrutura judiciária brasileira, sob tradicional, mas equívoca
denominação, em Justiças, é o resultado da repartição nacional do trabalho da
mesma natureza entre distintos órgãos jurisdicionais. O fenômeno é corriqueiro, de
distribuição de competências pela malha de órgãos especializados, que, não obstante
portadores de esferas próprias de atribuições jurisdicionais e administrativas,
integram um único e mesmo Poder. Nesse sentido fala-se em Justiça Federal e
134
Estadual, tal como se fala em Justiça Comum, Militar, Trabalhista,
Eleitoral, etc., sem que com essa nomenclatura ambígua se enganem hoje os
operadores jurídicos.
63
(grifo original).
A relação quantitativa entre juízes, promotores e defensores públicos e o acervo
processual sob as suas responsabilidades também são desproporcionais. No Brasil há, hoje,
5.564 municípios, com Poderes Legislativo e Executivo constituídos, no entanto, não
juízes, promotores e defensores públicos exclusivos para todos esses municípios. Muitos
desses agentes públicos respondem por mais de uma comarca, acumulando tarefas sobre-
humanas. A mesma relação desproporcional entre demandas jurisdicionais e magistrados, por
exemplo, dá-se nos tribunais estaduais, regionais, superiores e no Supremo Tribunal Federal.
A melhoria do acesso ao Judiciário passa pela correção dessa distorção, ampliando a presença
desse Poder e colocando-o lateralmente aos demais.
Por último, destacam-se as iniciativas que o legislador constitucional e o ordinário o
Poder Legislativo; o extraordinário o Poder Executivo; e o complementar e subsidiário o
Poder Judiciário, exercem para ampliar o acesso direto ou indireto à Justiça, mediante normas
substantivas e processuais dirigidas ao direito subjetivo de ação.
Indiretamente, a previsão constitucional de plebiscitos, referendos, iniciativas populares
e vetos, assim como a elaboração de orçamentos participativos previstos por legislações
ordinárias, são contribuições que o Poder Legislativo agrega, para ampliar a acessibilidade ao
Judiciário, na medida em que essa participação democrática, juntamente com a proporcionada
por alguns dispositivos de Medidas Provisórias editadas pelo Poder Executivo, inserem
legitimações ordinárias e extraordinárias para que segmentos da sociedade, cidadãos e grupos
homogêneos, coletivos e difusos possam postular direitos em ações e vias especiais, com
capacidade processual, como no habeas corpus, nas ações civis públicas, nas ações populares,
etc.
O mesmo se diga em relação à legitimação para a proposição da ação direta de
inconstitucionalidade e da ação declaratória de constitucionalidade, que ampliando o rol dos
legitimados, agora possibilita que além dos representantes dos Poderes Legislativo e
Executivo da União, dos Estados e do Distrito Federal, também possam ajuizá-las o
Procurador da República, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, partido
63
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADI n.º 3.367/DF, Relator Ministro Cezar Peluso. Disponível em:
<http://www.stf.gov.br/noticias/imprensa/VotoPelusoADI3367.pdf>. Acesso em: 31 maio 2009.
135
político com representação no Congresso Nacional e confederação sindical ou entidade de
classe de âmbito nacional.
Essas ações de controle da constitucionalidade são mecanismos que possibilitam o
acesso indireto da sociedade a todos os Poderes, inclusive ao Judiciário.
4.1.12 Instâncias extrajudiciais ou diferenciadas para a resolução de
conflitos: a desjudicialização
O amplo acesso ao Poder Judiciário abordado no subtítulo anterior provocou,
outrossim, a sobrecarga do sistema estatal de resolução dos conflitos. “Recrudesceu a
judicialização das relações sociais sem melhorar os mecanismos para efetiva solução das
demandas”.
64
A Constituição Federal consolidou direitos fundamentais. O cidadão desreprimiu as
demandas judiciais contidas e, com isso, o volume de processos no Judiciário aumentou
consideravelmente, piorando a morosidade que caracterizava a imagem desse Poder. Os
direitos conquistados poderiam ser postulados, porém, instaurado eventual conflito, a solução
estatal, com razoável duração do processo (Art. 5º, LXXVIII, C.F./88), negava, na prática, a
efetividade da Justiça.
Algo teria que ser feito no plano processual, na estrutura orgânica do Poder Judiciário
(administrativa e jurisdicional) e na (re)formulação da legislação infraconstitucional
complementar.
Surgiram os juizados especiais cíveis e criminais (Lei n.º 9.099/95); a lei de arbitragem
(Lei n.º 9.307/96); as alterações no Código de Processo Civil, a exemplo da promovida no
Art. 890, na Consignação em Pagamento (Lei n.º 8.951/94); as reformas decorrentes das
Emendas Constitucionais no capítulo do Poder Judiciário; a alteração na Lei de Registros
Públicos, permitindo retificações no registro de imóveis (Lei n.º 10.931/2004) para corrigir
erros na matrícula, por via administrativa e não mais exclusivamente judicial; a legislação da
recuperação extrajudicial da empresa mediante negociação entre credores e devedores,
modernizando o processo falimentar (Lei n.º 11.101/2005); a possibilidade de procedimentos
administrativos para a solução de inventários, partilhas, separações e divórcios consensuais,
64
CARDOSO, Antônio Pessoa. Desjudicialização das relações sociais. Disponível em:
<http://www.amb.com.br/?secao=artigo_detalhe&art_id=708&>. Acesso em: 27 out. 2008.
136
por meio de escrituras públicas lavradas em cartórios (Lei n.º 11.441/07); a alienação de bens
apreendidos, na alienação fiduciária de bens móveis, independentemente da intervenção do
Judiciário; a venda extrajudicial de imóveis financiados e apreendidos (Lei n.º 9.514/97).
Enfim, instrumentos legais que trazem “ao debate experiências que têm por tônica a
descentralização da construção dos marcos regulatórios da sociabilidade”.
65
O desembargador do Tribunal de Justiça da Bahia, Antônio Pessoa Cardoso, sugere
procedimentos que ainda poderiam ser desjudicializados, tais como: o cancelamento de
usufruto; a consolidação ou reversão da propriedade no fideicomisso; a adjudicação
compulsória de propriedade imobiliária; a expedição de alvarás; a cobrança de débitos fiscais
apurados, lançados e inscritos na dívida ativa, a exemplo da Caixa Econômica Federal que
executa extrajudicialmente seus créditos relativos ao financiamento de imóveis.
66
A desjudicialização através de procedimentos extrajudiciais também se implementa
no Direito Tributário, no contencioso administrativo, por intermédio dos Conselhos de
Recursos Tributários; no Direito do Trânsito e Previdenciário, com as suas Juntas Recursais;
no Direito Marítimo, Fluvial e Lacustre, com o Tribunal Marítimo, órgão auxiliar do Poder
Judiciário, vinculado ao Ministério da Marinha; no Direito da Criança e do Adolescente, com
os Conselhos Tutelares; no Direito do Consumidor, nos DECONs e PROCONs; nas Casas
de Mediação de toda espécie; nas Associações, Sindicatos, Federações e Confederações; nos
partidos políticos; nos cartórios; nos Conselhos de Comunidades e Penitenciários; nos
tribunais esportivos; nos órgãos ambientais, militares, educacionais e sanitários; nos
procedimentos da Justiça Restaurativa; no Direito do Trabalho, com as Comissões de
Conciliação Prévia, no CADE; na Comissão de Valores Mobiliários, dentre outros.
Todas essas instituições promovem a solução administrativa de conflitos, convergindo
para si as tensões iniciais dos grupos da sociedade civil. A exemplo da Justiça Arbitral, as
decisões desses grupos poderiam ser definitivas, no âmbito de suas competências, nos limites
que a lei lhes atribuir, e com as adesões prévias e consensuais dos contendores quanto ao
procedimento escolhido, restando ao Poder Judiciário conhecer e decidir apenas sobre aqueles
conflitos que envolverem direitos indisponíveis;
67
quando não houver acordo sobre a
65
BURGOS, Marcelo Baumann. Justiça de proximidade: notas sobre a experiência francesa. Revista da Escola
Nacional da Magistratura, Brasília: Escola Nacional da Magistratura, n. 4, p. 74, 2007. Disponível em:
<http://www.enm.org.br/docs/revista4.pdf>. Acesso em: 27 out. 2008.
66
CARDOSO, Antônio Pessoa, op. cit., 2008, on line.
67
Na definição de direitos indisponíveis entraria o controle de constitucionalidade.
137
utilização da via extrajudicial; quando suscitadas nulidades no procedimento formal e em atos
que impliquem a necessidade da coercibilidade estatal, através do uso da força.
Experiência de vulto no direito comparado são as Maisons de Justice et du Droit (MJD),
instaladas em França, a partir do ano de 1991, e inscritas no Código de Organização Judiciária
Francês, a partir de 1998.
A inovação institucional francesa visava a resolver o problema da violência social no
espaço urbano, caracterizado por conflitos entre jovens, pobres, moradores dos subúrbios e
periferias de Paris e de outras grandes cidades, com o objetivo de aproximar o Direito e suas
instituições do cotidiano dos moradores das áreas consideradas críticas les quartiers
sensibles.
Burgos descreve o modelo alternativo francês para a resolução desses conflitos urbanos,
afirmando que:
[…] na França, a justiça de proximidade tem por finalidade aproximar o Direito da
vida local e o universalismo republicano. Trata-se de um dos muitos remédios
institucionais que vêm sendo experimentados em face do mal-estar provocado por
aquilo que Pierre Bourdieu (1997) caracterizou como a crise da reprodução cultural,
provocada pelo esvaziamento do Estado Welfareano, pela precarização das relações
de trabalho, e pela crescente erosão da legitimidade institucional da escola. Como no
conhecido argumento de Antoine Garapon, as instâncias produtoras de solidariedade
social mergulham em uma profunda crise, e ‘o direito converte-se na última
instância da moral comum em uma sociedade desprovida dela’.
68
Burgos acrescenta que a justiça de proximidade também atua nos Estados Unidos, com
a idéia de que a ordenação do espaço urbano fomentaria a regeneração de uma
cultura cívica perdida, e o braço coercitivo da polícia exprimiria a vontade da
coletividade organizada, reduzindo ou até mesmo eliminando a possibilidade de
conflito.
69
Nos Estados Unidos, continua Burgos,
[…] a nica tem sido a reforma da polícia, presente tanto na experiência da
tolerância zero em Nova Iorque, quanto na do policiamento comunitário
desenvolvido em Chicago. O controle sobre o espaço público é seu alvo, e a
intervenção da polícia é respaldada e amplificada através da criação de canais de
diálogo com as comunidades.
70
Outra experiência recente e desenvolvida com apoio no fundamento constitucional da
solidariedade (Art. 3º, I, C.F./88) e do direcionamento para a harmonia social e a solução
68
BURGOS, Marcelo Baumann, op. cit., 2007, p. 76.
69
BURGOS, Marcelo Baumann, op. cit., 2007, p. 75.
70
BURGOS, Marcelo Baumann, op. cit., 2007, p. 75.
138
pacífica das controvérsias (Preâmbulo da Constituição Federal de 1988), é a ideia de Justiça
Restaurativa, prática de mediação iniciada nos anos 70 do século XX entre réus condenados e
as vítimas de seus crimes, nos Estados Unidos, com formulações teóricas construídas pelo
advogado americano Howard Zehr,
71
a qual propõe uma reformulação do conceito de crime e
de justiça. Brancher, discorrendo sobre o tema, afirma:
Inspirada em modelos de justiça tribal, a Justiça Restaurativa nos desafia a
ressignificar os valores fundamentais que condicionam as atuais práticas de Justiça,
sobretudo no enfrentamento da violência e da criminalidade.
Além do campo da justiça institucional, essas reflexões permitem visualizar e
reconfigurar a forma como atuamos nas atividades judicativas que exercemos
conosco mesmos e com nossos relacionamentos, nas instâncias informais de
julgamentos de que participamos cotidianamente em ambientes como a família,
escola ou trabalho.
Ao refletir sobre as práticas da justiça formal - essencialmente retributiva e punitiva
- a partir de uma ética baseada na inclusão, no diálogo e na responsabilidade social,
o paradigma da Justiça Restaurativa promove um conceito de democracia ativa que
empodera indivíduos e comunidades para a pacificação de conflitos de forma a
interromper as cadeias de reverberação da violência.
72
Segundo Brancher, a Nova Zelândia, que foi a principal impulsionadora desse sistema,
incorporando algumas práticas da justiça ancestral dos aborígenes Maoris, em 1989, incluiu
na sua legislação sobre crianças, jovens e suas famílias, a previsão de que crimes mais graves
praticados por menores de idade, exceto os crimes de homicídio, passariam necessariamente
pelas Family Group Conferences, que são encontros restaurativos envolvendo réus, vítimas e
comunidades.
73
A justiça restaurativa, acrescenta ainda Brancher, amplia o foco da justiça tradicional
retributiva, concentrada nos agentes estatais (o policial, o juiz e o promotor), no acusado e seu
defensor, e voltada para os fatos ocorridos no passado e na punição a ser aplicada, para incluir
a vítima e as pessoas de suas comunidades afetivas, assim como a comunidade afetiva do
infrator, preocupando-se com os danos materiais e psicológicos nelas incidentes, mais do que
com o trauma social produzido pela infração, em abstrato. Com isso, estabelece um
mecanismo de diálogo e comunicação, essencial para a sinceridade, a transparência e a
pacificação social. Pinto entende que esse novo paradigma
71
ZEHR, Howard. Trocando as lentes: um novo foco sobre o crime e a justiça. Tradução de Tônia Van Acker.
São Paulo: Palas Athena, 2008. No original: Changing lenses: a new focus for crime and justice. Scottdale, PA:
Herald Press, 1990.
72
BRANCHER, Leoberto Narciso. Justiça restaurativa: a cultura de paz na prática da justiça. Disponível em:
<http://www.jij.tj.rs.gov.br/jij_site/docs/JUST_RESTAUR/vis%C30+GERAL+JR_0.HTM>. Acesso em: 28 out.
2008.
73
ZEHR, Howard, op. cit., 2008.
139
além de abrir o mosteiro do Direito à interdisciplinaridade, e mais do que isso, à
transdiciplinaridade, o operador jurídico, tanto nos papéis de autoridade (delegado,
promotor, juiz) ou como advogado (inclusive eventualmente atuando como
mediador ou facilitador), terá que conciliar, ao trabalhar com justiça restaurativa, a
tradicional perspectiva dogmático-jurídica, que traz de sua formação de bacharel em
Direito, com uma nova atitude, aberta ao pluralismo jurídico, reconhecendo a
legitimidade do senso comum das pessoas direta ou indiretamente envolvidas no
conflito criminal e que participarão do diálogo e da construção restaurativa, que
trazem dos costumes do cotidiano da vida na comunidade o direito achado na
rua.
[…]
A idéia, então, é voltar-se para o futuro e para restauração dos relacionamentos, ao
invés de simplesmente concentrar-se no passado e na culpa. A justiça convencional
diz: você fez isso e tem que ser castigado! A justiça restaurativa pergunta: o
que você pode fazer agora para restaurar isso?
74
(grifo original).
Para Ness et al., “a justiça restaurativa, como prática comunitária, é primitiva,
remontando aos códigos de Hamurabi, Ur-Nammu e Lipit-Ishtar cerca de dois mil anos
antes de Cristo”.
75
No Canadá, complementa Pinto,
o modelo também é inspirado nas culturas indígenas em que os protagonistas que se
sentam em círculo, utilizam-se de um objeto que é passado de mão em mão
representando a posse da palavra. A reunião tem como objetivo a convergência da
percepção para a solução do conflito.
76
No Brasil, o procedimento criado pela Lei dos Juizados Especiais Criminais, em relação
aos benefícios da composição civil, da transação penal e da suspensão condicional do
processo (Art. 74 e parágrafo único; Arts. 76 e 89, respectivamente, da Lei n.º 9.099/95), é o
embrião da prática restaurativa, mediada por conciliadores, advogados, defensores públicos,
promotores e juízes, com a participação ativa da vítima e do infrator, e que, em perspectiva
evolutiva, poderia descentralizar-se, tornando-se prestação jurisdicional não estatal, pelo
menos até o estágio da execução coercitiva do acordo restaurativo. Para melhor visualização
dos modelos de justiça criminal retributiva e restaurativa, Pinto elaborou formato tabular, nos
termos seguintes:
74
PINTO, Renato Sócrates Gomes. A construção da justiça restaurativa no Brasil: o impacto no sistema de
justiça criminal. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1432, 3 jun. 2007. Disponível em:
<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9878>. Acesso em: 28 out. 2008.
75
NESS, Van et al. Restoring Justice. Cincinatti, Ohio: Anderson Publishing Co., 2002 apud Ibid., 2007, on
line.
76
Ibid., 2007, on line.
140
VALORES
J
USTIÇA
R
ETRIBUTIVA
J
USTIÇA
R
ESTAURATIVA
Conceito estritamente jurídico de Crime
Violação da Lei Penal ato contra a
sociedade representada pelo Estado.
Conceito amplo de Crime - Ato que afeta a
vítima, o próprio autor e a comunidade
causando-lhe uma variedade de danos
Primado do Interesse Público (Sociedade,
representada pelo Estado, o Centro)
Monopólio estatal da Justiça Criminal.
Primado do Interesse das Pessoas
Envolvidas e Comunidade Justiça
Criminal participativa.
Culpabilidade Individual voltada para o
passado Estigmatização.
Responsabilidade, pela restauração, numa
dimensão social, compartilhada
coletivamente e voltada para o futuro.
Uso Dogmático do Direito Penal Positivo. Uso Crítico e Alternativo do Direito
Indiferença do Estado quanto às
necessidades do infrator, vítima e
comunidade afetados desconexão.
Comprometimento com a inclusão e Justiça
Social gerando conexões.
Mono-cultural e excludente.
Culturalmente flexível (respeito à
diferença, tolerância).
Dissuasão Persuasão
PROCEDIMENTOS
J
USTIÇA
R
ETRIBUTIVA
J
USTIÇA
R
ESTAURATIVA
Ritual Solene e Público
Ritual informal e comunitário, com as
pessoas envolvidas
Indisponibilidade da Ação Penal Princípio da Oportunidade
Contencioso e contraditório Voluntário e colaborativo
Linguagem, normas e procedimentos
formais e complexos garantias.
Procedimento informal com
confidencialidade
Atores principais - autoridades
(representando o Estado) e profissionais do
Direito
Atores principais vítimas, infratores,
pessoas da Comunidade, ONGs.
Processo Decisório a cargo de autoridades
(Policial, Delegado, Promotor, Juiz e
profissionais do Direito
Unidimensionalidade
Processo Decisório compartilhado com as
pessoas envolvidas (vítima, infrator e
comunidade) Multi-dimensionalidade
RESULTADOS
J
USTIÇA
R
ETRIBUTIVA
J
USTIÇA
R
ESTAURATIVA
Prevenção Geral e Especial
Foco no infrator para intimidar e punir
Abordagem do Crime e suas Conseqüências
Foco nas relações entre as partes, para
restaurar
Penalização Pedido de Desculpas, Reparação,
141
Penas privativas de liberdade, restritivas de
direitos, multa
Estigmatização e Discriminação
restituição, prestação de serviços
comunitários
Reparação do trauma moral e dos Prejuízos
emocionais Restauração e Inclusão
Tutela Penal de Bens e Interesses, com a
Punição do Infrator e Proteção da
Sociedade
Resulta responsabilização espontânea por
parte do infrator
Penas desarrazoadas e desproporcionais em
regime carcerário desumano, cruel,
degradante e criminógeno ou penas
alternativas ineficazes (cestas básicas)
Proporcionalidade e Razoabilidade das
Obrigações Assumidas no Acordo
Restaurativo
Vítima e Infrator isolados, desamparados e
desintegrados. Ressocialização Secundária
Reintegração do Infrator e da Vítima
Prioritárias
Paz Social com Tensão Paz Social com Dignidade
EFEITOS PARA A VÍTIMA
J
USTIÇA
R
ETRIBUTIVA
J
USTIÇA
R
ESTAURATIVA
Pouquíssima ou nenhuma consideração,
ocupando lugar periférico e alienado no
processo. Não tem participação, nem
proteção, mal sabe o que se passa.
Ocupa o centro do processo, com um papel
e com voz ativa. Participa e tem controle
sobre o que se passa.
Praticamente nenhuma assistência
psicológica, social, econômica ou jurídica
do Estado
Recebe assistência, afeto, restituição de
perdas materiais e reparação
Frustração e Ressentimento com o sistema
Tem ganhos positivos. Suprem-se as
necessidades individuais e coletivas da
vítima e comunidade
EFEITOS PARA O INFRATOR
J
USTIÇA
R
ETRIBUTIVA
J
USTIÇA
R
ESTAURATIVA
Infrator considerado em suas faltas e sua -
formação
Infrator visto no seu potencial de
responsabilizar-se pelos danos e conseências
do delito
Raramente tem participação Participa ativa e diretamente
Comunica-se com o sistema por Advogado Interage com atima e com a comunidade
É desestimulado e mesmo inibido a dialogar
com a tima
Tem oportunidade de desculpar-se ao
sensibilizar-se com o trauma da vítima
É desinformado e alienado sobre os fatos
processuais
É informado sobre os fatos do processo
restaurativo e contribui para a decio
o é efetivamente responsabilizado, mas
punido pelo fato
É inteirado das conseências do fato para a
tima e comunidade
Fica intocável Fica acessível e se vê envolvido no processo
o tem suas necessidades consideradas. Supre-se suas necessidades
Quadro 1 Diferenças entre justiça restaurativa e justiça retributiva
Fonte: Pinto (2007, on line)
142
A Associação dos Magistrados Brasileiros, a Secretaria de Reforma do Judiciário do
Ministério da Justiça e a Escola Nacional da Magistratura, compreendendo a necessidade de
aprofundamento dos meios alternativos de resolução conflitual, realizou, de 7 a 10 de abril de
2008, o Ciclo de Conferências sobre Justiça Restaurativa Trocando as Lentes, acreditando
que a proposta pode e deve ser implantada definitivamente no Brasil.
77
A lentidão do Estado no sentido do reconhecimento das soluções alternativas de
realização da justiça por caminhos extrajudiciais, com eficácia semelhante à dos títulos
judiciais estatais, estimula o surgimento de um poder dual na sociedade, com função judicial
caracterizada, de acordo com Santos, pela luta entre poderes complementares ou paralelos, e
não necessariamente antagônicos, para a resolução de conflitos interclasses.
78
Santos analisa
essa dualidade entre direito e justiça, referindo-se às associações de moradores das favelas das
grandes cidades do mundo capitalista, e cita o exemplo da favela do Rio de Janeiro, a qual
denominou Pasárgada.
79
Essa comunidade, observa o cientista, elegia a associação de moradores que se
encarregava de representar os interesses da comunidade junto ao Estado, mediando a obtenção
de serviços públicos e equipamentos coletivos, promovendo a pacificação no seio da favela,
transformando em instância judicial a resolução de conflitos no seu interior, ratificando as
relações jurídicas e resolvendo as disputas que surgiam delas.
80
Santos explica a dinâmica
desse processo em Pasárgada:
As relações jurídicas se originam usualmente em contratos (vendas, locações etc.)
cujo objetivo é a propriedade, posse e os direitos reais sobre a terra e as habitações
(casas e barracos) ou parte delas. Mas a associação também desempenha funções
com respeito a relações de direito público, concernentes a direitos da comunidade
como um todo frente a algum ou alguns de seus membros. Quando, por exemplo, os
moradores desejam celebrar um contrato, podem ir à associação e entrevistar-se com
o presidente. Vêm, normalmente, acompanhadas por familiares, amigos ou vizinhos,
alguns dos quais servirão de testemunhas. As partes explicam suas intenções ao
presidente, o qual formula perguntas relativas à natureza do contrato e a seu objeto
77
ASSOCIAÇÃO DOS MAGISTRADOS BRASILEIROS - AMB. Magistrados acreditam que justiça
restaurativa é aplicável ao Brasil. 8 abr. 2008. Disponível em: <http://www.amb.com.br/?secao=
mostranoticia&mat_id=12942&>. Acesso em: 27 out. 2008.
78
SANTOS, Boaventura de Sousa. Justiça popular, dualidade de poderes e estratégia socialista. In: FARIA, José
Eduardo (Org.). Direito e Justiça: a função social do judiciário. São Paulo: Ática, 1998, p. 185-205.
79
Pasárgada, na história da Humanidade, era uma cidade da antiga Pérsia e é atualmente um sítio arqueológico
na província de Fars, no Irã, situado a 87 km a nordeste de Persépolis. Foi a primeira capital da Pérsia
Aqueménida, no tempo de Ciro II da Pérsia, e coexistiu com as demais, dado que era costume Persa manter
várias capitais, em simultâneo, em função da vastidão do seu império. Na literatura brasileira, Manuel Bandeira
(1886-1968), consagrou o nome Pasárgada como um lugar ironicamente ideal, em ‘Vou-me embora pra
Pasárgada’, poema de sua autoria. WIKIPÉDIA. Enciclopédia on line. Disponível em:
<http://pt.wikipedia.org/wiki/PAS%C3 A1rgada>. Acesso em: 31 out. 2008.
80
SANTOS, Boaventura de Sousa, op. cit., 1998, p. 200-201.
143
até formar-se uma idéia clara. Então o contrato é posto por escrito e arquivado,
distribuindo-se cópia às partes intervenientes. A intervenção da associação, que
designa como ratificação, é um processo muito sutil e complexo pelo qual a
relação jurídica entre as partes se prevê de uma fonte autônoma de segurança.
Quando rebenta um conflito entre dois moradores, a associação pode ser chamada a
resolvê-lo, dando início a um processo que termina na discussão da questão pelas
partes e pelos moradores em uma audiência dirigida pelo presidente.
81
Esse direito de Pasárgada, consoante expõe Santos, se fosse baseado em um estatuto
legal ou no direito do asfalto, como assim denominado pelo cientista político, seria tão
respeitado pela comunidade como o seria se aplicado pela justiça estatal. Acresce Santos que
não reclamando o direito de Pasárgada validade ou execução fora da comunidade e só
resolvendo conflitos inter-classistas, essa legalidade alternativa não entra em confrontação,
podendo ser rotulada de funcional à dominação burguesa, pela reprodução pacífica e a baixo
custo da força de trabalho, porém, a seu modo de ver, essa organização comunitária atua
como meio de proteção contra as pressões estatais promovidas pelos interesses capitalistas
que visam ao deslocamento das favelas e à apropriação das áreas ocupadas para transferi-las à
especulação imobiliária; constitui um meio de administração alternativa e democrática com a
conivência estatal e contribui para minimizar a brutalidade da reprodução social das classes
trabalhadoras em condições de luta muito difíceis.
82
Concluindo seu estudo, Santos entende
que:
Esta orientação estratégica não pressupõe a recusa da legalidade burguesa
democrática nem a da democracia parlamentar em qualquer lugar em que exista.
Pressupõe, antes, a possibilidade de uma utilização não-burguesa das formas
políticas e jurídicas democráticas que a burguesia soube num tempo impor às classes
dominantes do ancien régime.
83
Souza e Lamounier lembram que “o recurso a julgamentos intuitivos não é apenas um
expediente, mas um requisito inescapável para se tentar antecipar o futuro”
84
, como se
estivesse diante do oráculo de Delfos, na Grécia antiga, comparam eles.
Nesse sentido, essas manifestações culturais de acomodação social que visam à solução
conflitual por todos os meios de mediação devem ser urgentemente estudadas, sistematizadas
e reguladas, para legitimar o controle estatal, evitando assim a deletéria fragmentação da
unidade do poder.
81
SANTOS, Boaventura de Sousa, op. cit., 1998, p. 200.
82
SANTOS, Boaventura de Sousa, op. cit., 1998, p. 201-202.
83
SANTOS, Boaventura de Sousa, op. cit., 1998, p. 203.
84
SOUZA, Amaury de; LAMOUNIER, Bolívar. O futuro da democracia: cenários político-institucionais até
2022. Estudos Avançados. Dossiê Brasil: o país do futuro. Instituto de Estudos Avançados da Universidade de
São Paulo, São Paulo, v. 20, n. 56, jan./abr. 2006. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0103-
4014200600010005&<script=sci_arttext>. Acesso em: 31 out. 2008.
144
Essa unidade não seria o conjunto de todas as partes que representam os núcleos de
fragmentação, mas a gerência normativa e eficaz dessas diversas unidades de poder,
reconhecendo limites e peculiaridades, resolvendo distorções e atuando como uma força de
colmatação e coesão que se impõe como o fundamento de uma soberania política, cujo vértice
seria representado pela sociedade civil, organizada democraticamente pela participação e
solidariedade. Isso é possível e vem sendo implementado. Urge acompanhar a rapidez das
transformações.
No Brasil, normatização de algumas práticas diferenciadas de prestação
jurisdicional, atendendo à peculiaridade da sua formação étnica. Veja-se o caso da justiça
indígena. Dispõe o Estatuto do Índio (Lei n.º 6.001/73): “Art. 57 Será tolerada aplicação
pelos grupos tribais, de acordo com as instituições próprias, de sanções penais e disciplinares
contra os seus membros, desde que não revistam caráter cruel ou infamante, proibida em
qualquer caso a pena de morte”. Freitas afirma que esta é uma norma que
subtrai da justiça comum o julgamento de um delito. E não se pense que é
descumprida. Na verdade, ela é adotada diariamente em dezenas de aldeamentos
indígenas e teve inclusive precedentes de reconhecimento (Caso Basílio) pelo
Tribunal do Júri Federal de Boa Vista, Roraima, em caso de homicídio.
85
Enfim, questão que se formula na construção do processo coletivo e participativo de
desjudicialização estatal das instâncias conflituais é saber quais as hipóteses em que é viável a
elaboração de modelos comunitários judiciais, envolvendo os diversos grupos da sociedade
civil.
se viu que essa experiência é possível e se integrou à práxis e ao ordenamento
jurídico, com ou sem a mediação
86
jurisdicional estatal na formação do consenso integrativo.
O desenvolvimento dessa combinação, inserindo a sociedade autorregulativa (civil) e a
representação estatal (política), acredita-se, é um dos segredos da democracia e que não se
desvelará, senão com experimentalismo e expectativa positiva, em agir constante e aberto,
num processo de argumentação, teorização, desconstrução e reconstrução de paradigmas e
conexões, percebendo que a organização do poder estatal decorreu de ideologias adredemente
elaboradas, visando à convivência social e à dominação de uns sobre os outros e que “há uma
85
FREITAS, Vladimir Passos de. Soluções alternativas: judiciário busca alternativas para combater
morosidade. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/static/text/58759,1>. Acesso em: 31 out. 2008.
86
SALES, Lilia Maria de Morais. Mediação de Conflitos: família, escola e comunidade. Florianópolis:
Conceito Editorial, 2007.
145
coisa mais forte do que todos os exércitos do mundo, e isso é uma ideia cujo tempo chegou”.
87
Olhe-se em volta e veja-se como a sociedade se organiza e como tem resolvido suas
pendências. As massas já não esperam somente pelo Estado; elas se impõem com suas
soluções e seus consensos de adequação.
4.2 Aberturas para a legitimação e a democratização internas no Poder
Judiciário
Até agora foram analisadas algumas manifestações da legitimação e democratização
externas da função judiciária e no Poder Judiciário, mediante a participação e a representação
da soberania popular, ampliando aquele espaço interpretado como restrito e privativo dos
agentes que prestam a jurisdição estatal, com pretensão monopolista e definitiva, investidos
de poder obtido através do concurso público ou por nomeações diversas, além das questões
relativas à acessibilidade aos serviços prestados pelo judiciário.
Pretende-se, em prosseguimento, investigar temas diversos relativos à estrutura interna
do Poder Judiciário, verticalizada, burocratizada e hierarquizada, com repercussões
administrativas e jurisdicionais, apontando críticas e sugestões para a solução dos entraves
que comprometem o desempenho efetivo e democrático do exercício da função judiciária
outorgada pelo povo aos magistrados. A ideia que permeia todo o desenvolvimento desses
tópicos é a de não se permitir que haja mecanismos imunossupressores institucionalizados ou
ideologizados, e que se fomente ao máximo a participação interna dentro do próprio poder,
democratizando a estrutura autocrática, típica do poder burocrático.
4.2.1 Mitigação das garantias constitucionais: vitaliciedade, inamovibilidade
e irredutibilidade de subsídios
Essas prerrogativas constitucionais expressas no Art. 95, incisos I, II e III da
Constituição Federal de 1988, visam a dar efetividade ao princípio da independência do juiz,
o qual, segundo Zaffaroni: Importa a garantia de que o magistrado não estará submetido às
pressões de poderes externos à própria magistratura, mas também implica a segurança de que
o juiz não sofrerá as pressões dos órgãos colegiados da própria judicatura”.
88
87
Frase atribuída a Victor Hugo, escritor francês (26 de fevereiro de 1802 - 22 de maio de 1885). In: DUALIBI,
Roberto. Dualibe das citações. São Paulo: Mandarim, 2000, p. 339.
88
ZAFFARONI, Eugenio Raúl, op. cit., 1995, p. 88.
146
Anteriormente, se fez a distinção entre a independência do juiz e a da magistratura.
89
Para Picardi,
90
a segunda é a condição da primeira e implica autonomia de governo e o poder
disciplinar. É a função de autogoverno do Judiciário. Para Rocha, “quanto ao Judiciário,
considerado como um todo orgânico, as garantias de sua independência constam do Art. 96 e
seus incisos [da Constituição Federal], dotando-o de competência governativa, regimental e
orçamentária”.
91
Mitigar as garantias da vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de subsídios
significa, no desenvolvimento de algumas ideias propostas, flexibilizar a interpretação
daquelas prerrogativas para se viabilizar o processo democratizante na estrutura de poder
dentro do Judiciário.
Por vitaliciedade entende-se como sendo a garantia de que o magistrado não poderá
perder o seu cargo, senão em virtude de sentença judicial transitada em julgado, assegurado o
devido processo legal.
No primeiro grau de jurisdição, a vitaliciedade será adquirida após dois anos de
exercício. Antes disso, a perda do cargo condiciona-se a um processo administrativo, com
deliberação pelo tribunal ao qual o juiz estiver vinculado. A Constituição Federal prevê:
Art. 93 Lei Complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, dispo
sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios:
[...]
IV – previsão de cursos oficiais de preparação, aperfeiçoamento e promoção de
magistrados, constituindo etapa obrigatória do processo de vitaliciamento a
participação em curso oficial ou reconhecido por escola nacional de formação e
aperfeiçoamento de magistrados.
Ocorre, no entanto, por força do Art. 22, inciso I, da Lei Orgânica da Magistratura
Nacional, que os magistrados do Supremo Tribunal Federal, dos Tribunais Superiores, dos
Tribunais Regionais do Trabalho, dos Tribunais Regionais Federais e dos Tribunais de Justiça
Estaduais e Distrital adquirem a vitaliciedade logo ao serem empossados em seus cargos,
enquanto os juízes de Primeiro Grau devem se submeter a um estágio probatório de dois anos
e ainda aos cursos mencionados no inciso IV, do Art. 93, da Constituição Federal.
89
Vide item 2.2.
90
PICARDI, Nicola . L’indipendenza del giudice, Sto. Domingo, 1989. In: Justicia y desarrollo democrático em
Italia y América Latina, UNICRI. Publ. n. 45, Roma, 1992, p. 279 apud ZAFFARONI, Eugenio Raúl, op. cit.,
1995, p. 87.
91
ROCHA, José de Albuquerque, op. cit., 1995, p. 29.
147
Essa diferenciação atinge os magistrados que são escolhidos na cota reservada ao
quinto constitucional para advogados e membros do Ministério Público, uma vez que os
juízes de carreira que têm acesso aos tribunais por força das promoções internas, o fazem
com a vitaliciedade adquirida ao longo das entrâncias por onde passaram.
Os candidatos do Ministério Público, muito embora também tenham vitaliciedade
quando disputam as vagas dos tribunais, por exigência de sua Lei Orgânica, pertencem a uma
carreira distinta, não sendo razoável interpretar aquela vitaliciedade como sendo a mesma
exigida para magistrados de Primeiro Grau.
Os advogados, ao ingressarem nos tribunais, comprovam apenas o exercício mínimo de
dez anos de profissão, não tendo sido avaliados, como regra, por escolas preparatórias para o
exercício da jurisdição.
Alguns defendem que a exigência de dez anos de prática funcional nas suas diversas
áreas de atuação compensa a obrigação do estágio probatório e a frequência a cursos oficiais
dirigidos à magistratura.
Nada mais discriminatório. Aos juízes de carreira também é obrigatória a conclusão de
um período mínimo de atividade jurídica anterior, que é de três anos (Art. 93, inciso I, da
Constituição Federal) e a frequência a cursos oficiais ou reconhecidos por escola nacional de
formação e aperfeiçoamento de magistrados.
Esses cursos visam não somente ao acompanhamento do conteúdo dogmático do
candidato, mas a uma série de avaliações multidisciplinares, inclusive comportamentais. É
mais um controle que o constituinte impôs para a aferição de uma das garantias que, por se
afastar conceitualmente da regra da alternância democrática, deveria ser rigorosamente
observada.
Os processos complexos pelos quais se submetem esses candidatos do quinto
constitucional não impõem, necessariamente, avaliações como as que são realizadas por
aquelas escolas de formação.
Se a preocupação com esses filtros seletivos é dirigida aos juízes de carreira, como um
controle aristocrático do poder, que o seja a todos aqueles que nele ingressam, inclusive no
Segundo Grau de jurisdição, com mais razão, pois exercerão o poder de censura
administrativa e jurisdicional dos órgãos da Primeira Instância. Ao magistrado que obtém essa
148
condição pelo ingresso direto nos tribunais, é também possível que haja o desencontro entre
vocação e aptidão para o exercício de funções colegiadas.
Negar-lhe, eventualmente, a vitaliciedade não implica suprimir a pluralidade defendida
para a composição dos tribunais, mas prevenir-se contra escolhas inadequadas. A mesma
submissão provisória a que se prestam os juízes recém-ingressos na magistratura de Primeiro
Grau poderia ser imposta aos magistrados que iniciam suas carreiras diretamente nos
tribunais. A preocupação da sociedade com a prudência, o saber, a experiência, o equilíbrio e
as aptidões de seus juízes é igual para ambas as situações.
A inamovibilidade é a garantia que o magistrado detém de não ser removido de um
lugar para outro, nem mesmo ser obrigado a aceitar promoções contra a sua vontade, salvo no
interesse público, quando deliberado pelo voto de dois terços, no mínimo, dos membros
efetivos do tribunal a que está vinculado. Essa prerrogativa merece ponderações.
Se quis o constituinte criar mais um mecanismo de reforço da independência do juiz,
evitando que grupos contrariados com a decisão judicial se articulassem no sentido do
afastamento do magistrado do local onde presta a sua jurisdição, gerou, com isso, um núcleo
de poder intocável, insubstituível, temível, não renovável, não reciclável, quase que
insindicável.
A despeito dos juízes de Primeiro Grau estarem sujeitos ao fluxo de uma carreira
funcional, que se estrutura em entrâncias, com graus distintos, sendo natural que busquem
progressivamente caminhar na direção das comarcas mais elevadas nessa classificação, até
ascenderem aos tribunais, cada vez mais frequente magistrados que optam por se
manterem indefinidamente nas mesmas localidades para as quais foram nomeados, em alguns
dos estágios de sua carreira, permanecendo até alcançarem o período para suas
aposentadorias, seja por comodidade, por formação de vínculos familiares locais, por
qualidade de vida, por interesses diversos, seja por perceberem que as suas idades e o
escalonamento da carreira não mais lhes permitem, matematicamente, disputar vagas nos
tribunais.
Imagine um município com dez mil habitantes, onde prefeito e vereadores se alternam
em suas funções a cada quatro anos; onde o corpo policial também acompanha a evolução da
carreira, com promoções constantes; novas gerações se formam; a própria estrutura
geopolítica e territorial é passível de alteração e, em sentido contrário a esse dinamismo, o
149
representante do Poder Judiciário permanece por dez, vinte ou mais anos, como o único a
pronunciar a última palavra, até mesmo em face dos dois outros poderes. Quanto poder por
metro quadrado está enfeixado nas mãos de uma só pessoa? Quem ousará contrariá-lo?
Até mesmo as instituições religiosas, que outrora mantinham seus representantes por
longo período na mesma comunidade, hoje, acompanhando o movimento social, acham por
bem reciclá-los na convivência com outras comunidades.
O ideal seria que fosse estipulado um período máximo de permanência dos juízes nas
comarcas de varas únicas e outro, nas comarcas de múltiplas unidades jurisdicionais, impondo
rodízio entre as diversas varas.
Com a ocorrência dos períodos fatais, seriam oportunizadas, com prioridade, as
remoções para as comarcas ou unidades jurisdicionais disponíveis. Isso resolveria eventuais
distorções e acomodações nocivas à sociedade e ao próprio Poder.
Nos tribunais seria criado o sistema equivalente aos mandatos exercidos nos demais
Poderes, com interstícios variando entre quatro e oito anos. Nesse período, os membros dessas
Cortes poderiam rodiziar-se entre as diversas Câmaras internas. No item 4.2.5, a temática será
abordada mais profundamente.
A irredutibilidade de subsídio é outra garantia que pode ser relativizada, especialmente
se houver consenso mútuo entre o ente público pagador e o magistrado, em situações
específicas.
Suponha-se, por exemplo, a possibilidade de permuta entre magistrados estaduais de
unidades federativas diversas, questão que será apreciada no item 4.2.11. Aprovada a
permuta, poderá ocorrer que um dos magistrados esteja com subsídio superior ao dos juízes
do Estado onde o permutado exercerá suas novas funções. A fim de se evitar pleitos
equiparatórios dos magistrados que exercem a jurisdição no mesmo Estado, o consenso a
ser formulado no processo de permuta possibilitaria essa redutibilidade, enquadrando-se o juiz
permutado no novo organograma funcional e vencimental.
Aliás, a ideia de mandatos para os membros dos tribunais, com possibilidade de retorno
aos seus cargos anteriores, ao final do prazo estipulado, seria perfectibilizada sem maiores
traumas em relação a essas garantias, considerando a relativização que se possa imprimir ao
conceito de imutabilidade dessas prerrogativas.
150
Portanto, a mitigação que se propõe para essas garantias está diretamente relacionada
com a evolução que se possa admitir em relação aos dogmas internos do Judiciário,
especialmente no direcionamento da democratização de seu poder, exercido pelos juízes, os
quais não serão menos independentes, imparciais e legítimos, pelo fato de transigirem com a
sociedade e com os seus pares, sobre uma parcela desse poder.
4.2.2 Subsídio dos magistrados
A adequada remuneração da função jurisdicional é tão significativa que o legislador
constitucional elegeu esse direito como uma garantia do exercício da magistratura, em
consequência do princípio da independência do juiz. A irredutibilidade de subsídios foi
comentada no item anterior (4.2.1). A Constituição Federal assevera que:
Art. 95 – [...]
Parágrafo unico – Aos juízes é vedado:
I exercer, ainda que em disponibilidade, outro cargo ou função, salvo um de
magistério;
II – receber, a qualquer título ou pretexto, custas ou participação em processo;
III – [...]
IV - receber, a qualquer título ou pretexto, auxílios ou contribuições de pessoas
físicas, entidades públicas ou privadas, ressalvadas as exceções previstas em lei;
V – [...]
Esse rigor com o exercício funcional do magistrado impõe restrições, mas em
contrapartida assegura garantias sobre as quais já se expôs.
Poder-se-ia até dizer que outros agentes públicos têm limitações tão rígidas quanto as do
magistrado, sem desfrutar das mesmas prerrogativas. Em parte, a afirmativa é correta, porém,
nenhum deles acumula tanto poder sobre o destino das coisas e das pessoas quanto o
magistrado, embora nem sempre ele tenha essa percepção e ainda cultive uma conduta, muitas
vezes, arredia ao seu poder-dever.
Em razão desse nicho de poderes, o magistrado é passível de fortes incursões externas,
derivadas de todas as fontes de influência e, por isso, precisa de garantias para manter a sua
independência.
Para ser independente e infenso a qualquer pressão ou sedução, o agente público precisa
preservar a sua dignidade. Esse discurso deveria ser extensivo a todos, sem que o cargo,
151
função ou posição na sociedade seja pré-requisito para a sustentação e manutenção da
condição humana. A simples existência do Ser já deveria pressupor esse direito irredutível.
Porém, por constatação empírica e por critérios e cautelas eleitos como necessários para
o equilíbrio da dinâmica das diferenças que, paradoxalmente, existem para realçar o princípio
da igualdade, surgem freios admitidos como satisfatórios para a compensação da correta
utilização do Poder Jurisdicional, dentre os quais, as garantias dos magistrados e as vedações
que lhe são impostas.
O subsídio do juiz, outrora denominado vencimentos, é a fonte e a receita para a sua
sustentação material. Manter íntegra essa fonte, que é a única disponível para a satisfação de
suas necessidades, além da que lhe é facultada pelo exercício do magistério, quase sempre
impossível em virtude do limitado tempo para outras atividades que não as jurisdicionais, é
mister inarredável.
Em passado não muito distante, a magistratura não reunia grandes atrativos, salvo o
idealismo que acompanhava alguns de seus membros. Hoje, a Constituição Federal, no Art.
37, inciso XI, elegeu o subsídio mensal dos Ministros do Supremo Tribunal Federal como o
limite máximo da remuneração de todos os ocupantes de cargos, funções e empregos públicos
da administração direta, autárquica e fundacional; dos membros de qualquer dos Poderes da
União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios; dos detentores de mandatos eletivos
e dos demais agentes políticos e dos proventos, pensões ou outra espécie remuneratória,
percebidas cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer natureza.
Nesse teto remuneratório deve se adequar toda a contraprestação pelo exercício da
função, do cargo ou do emprego público, ativo ou inativo, respeitando ainda os limites
internos ou subtetos de alguns representantes de cada ente ou órgão público (prefeitos,
governadores, deputados e desembargadores).
Além da elevação à condição de paradigma remuneratório do serviço público, a
magistratura também teve seus subsídios protegidos da corrosão do poder real da moeda,
provocada pelos mecanismos inflacionários, garantindo com isso a efetiva irredutibilidade a
que se refere o Art. 95, inciso III, da Constituição Federal, quando a mesma Carta previu, no
inciso X, do Art. 37, a revisão anual dos subsídios.
152
O escalonamento da remuneração de todos os membros do Poder Judiciário, nos seus
diversos graus, instâncias e competências, também recebeu a atenção especial do legislador
constitucional federal, quando assegurou, no inciso XI, do Art. 37, e no inciso V, do Art. 93,
diferenças e percentuais nimos e máximos de 5% e 10%, respectivamente, entre o
paradigma remuneratório do Supremo Tribunal Federal e o subsídio dos membros dos demais
tribunais e juízes de Primeiro Grau. Toda essa preocupação demonstra a intenção do
constituinte com o respeito à independência da função jurisdicional.
Entre os projetos atualmente em tramitação no Congresso Nacional, visando à alteração
da base remuneratória dos magistrados, está a Proposta de Emenda Constitucional (P.E.C. n.º
210/07), que sugere a alteração dos Arts. 95 e 128 da Constituição Federal, para restabelecer o
adicional por tempo de serviço como componente da remuneração das carreiras da
Magistratura e do Ministério Público.
Na justificativa do projeto de lei foi exposto que o modelo remuneratório desenhado
desde as Emendas Constitucionais n.º 19 e 20/98, criando subsídios em parcela única, gerou
descompasso com a realidade dessas carreiras, que são longas, e sua valorização passava,
historicamente, pela diferenciação de remuneração de acordo com o tempo a elas dedicado
pelo juiz ou pelo membro do Ministério Público.
Em verdade, a experiência adquirida não pode ser igualmente reconhecida entre os
magistrados recém-ingressos na carreira ou no serviço público e aqueles que já foram testados
pelo percurso temporal. Atuaria o adicional por tempo de serviço como um reconhecimento
pela experiência profissional adquirida pelo agente público, possibilitando que sejam
diferenciados, pelo tempo de serviço, os ocupantes de mesmo cargo ou mesmo nível na
carreira, sendo recurso técnico de motivação com repercussão na qualidade e na eficiência do
exercício funcional.
Esse adicional seria calculado à razão de 1% por ano de serviço, limitado a 35% ao
longo da carreira. No serviço público esse adicional existia desde 1827 e na magistratura, pela
Lei n.º 21/1947, se possibilitava o pagamento desse acréscimo. Atualmente, esse projeto de
lei encontra-se em fase final de votação no Congresso Nacional.
92
92
ASSOCIÃO DOS MAGISTRADOS BRASILEIROS AMB. O adicional por tempo de serviço na magistratura
nacional. Disponível em:<http://www.amb.com.br/portal/docs/noticias/2008/ATS_estudos.pdf>. Acesso em: 31 dez. 2008.
153
Outra parcela remuneratória importante para a democratização interna dos integrantes
do Poder Judiciário é a criação de um adicional de qualificação por aperfeiçoamento
intelectual do magistrado ao longo de sua carreira.
Ingressando na magistratura mediante concurso público de provas e títulos, além do
acesso aos tribunais pelos critérios já analisados, o magistrado não é mais obrigado ao próprio
aperfeiçoamento, salvo por vaidade pessoal, intelectual ou para obtenção de critérios
promocionais para ascensão na carreira. Ocorre, no entanto, que esses critérios não são
uniformes e o seu peso é relativo, remanescendo como padrão objetivo apenas a fórmula da
antiguidade, que a todos atinge, para os juízes de carreira.
Se a qualidade da prestação jurisdicional está intimamente ligada a diversos fatores,
dentre eles o vel intelectual do magistrado, não é razoável que um juiz que emprega o seu
próprio esforço, além de seus recursos financeiros, para alcançar o aperfeiçoamento funcional,
adquirindo graus de especialização, mestrado e doutorado, perceba remuneração idêntica
àquele que se acomoda com a graduação universitária, esquecida no período remoto de sua
formação.
Para os servidores dos Poderes Judiciário, Executivo e Legislativo, essa diferenciação
remuneratória já é praticada, restando apenas a sua extensão aos magistrados, alterando-se a
Constituição Federal para permitir esse adicional, independente do limite atribuído para o
subsídio da Magistratura.
Enfim, não é importante a manutenção das garantias constitucionais remuneratórias
mínimas para assegurar a independência da função judiciária como também o é a distinção do
esforço pessoal e da consagração temporal no exercício da jurisdição, para que se alcance a
democratização interna dos mecanismos de reconhecimento e legitimidade nesse Poder.
4.2.3 Eleições internas no Poder Judiciário
A constatação de que a teoria e a práxis democráticas de recrutamento dos juízes no
direito comparado e no Brasil mostraram ser a técnica eletiva, adotada como manifestação da
soberania popular, uma prática excepcional,
93
não implica a defesa do mesmo modelo para os
processos de escolhas internas na estrutura orgânica do Poder Judiciário, em relação às
funções de representação tecnoburocráticas.
93
Alguns estados dos Estados Unidos e alguns cantões suíços ainda elegem jzes estaduais e cantonais pelo voto popular.
154
Rocha assinala que “a independência do Judiciário, enquanto organização, pode ser
analisada a partir de dois ângulos: a) Como independência política; e b) Como independência
administrativa”.
94
A independência administrativa, prossegue Rocha,
também chamada de autogoverno da magistratura, consiste na aptidão do Judiciário
de gerenciar com autonomia os elementos pessoais e os meios materiais e
financeiros imprescindíveis ao exercício da função jurisdicional.
No Brasil, o governo do Judiciário é exercido pelos tribunais de maneira autocrática,
o que contradiz o princípio democrático inscrito entre os princípios fundamentais da
Constituição e o derivado seja da definição do Estado brasileiro como democrático,
seja da radicação popular do poder político, como dito no artigo e seu parágrafo
único da Constituição. Há, pois, a necessidade de democratizar o exercício do poder
no interior do Judiciário a significar a participação de representantes de todos os
segmentos da magistratura e da sociedade em sua administração. A independência
administrativa do Judiciário decorre de diversos princípios constitucionais, entre os
quais cabe assinalar o art. 96, que outorga competência privativa aos tribunais para
sua gestão.
95
A abertura ou a ampliação desses poderes para a sociedade e para os membros da
magistratura de Primeiro Grau é clamor que se ouve em diversos fóruns de discussões,
tanto internos (Associação dos Magistrados Brasileiros - AMB; Conselho Nacional de Justiça
CNJ; Associações Classistas), quanto externos (doutrina, mídia, corporações diversas,
outros poderes).
Rocha menciona os chamados Conselhos de Administração do Judiciário, “adotados na
Europa com excelentes resultados para a eficiência, independência e democratização da
instituição”.
96
A seguir, elencam-se alguns exemplos nos quais é possível instituir ou ampliar eleições
para a democratização interna do Poder Judiciário.
4.2.3.1 Composição dos órgãos diretivos dos tribunais
Os órgãos diretivos dos tribunais (Presidência, Vice-Presidência e Corregedoria) são
estruturas de cúpula desses tribunais, com competência para matérias administrativas
pertinentes à função de autogoverno do Poder, além de concentrarem decisões sobre a
organização judiciária interna nos Estados e regiões, repercutindo no acesso ao Judiciário e na
distribuição da prestação jurisdicional.
94
ROCHA, José de Albuquerque, op. cit., 1996, p. 111.
95
ROCHA, José de Albuquerque, op. cit., 1996, p. 112.
96
ROCHA, José de Albuquerque, op. cit., 1996, p. 114.
155
A eleição dos membros desses órgãos, para períodos bienais, dá-se pelo restrito
colegiado que compõe as suas estruturas plenárias, alijando desse processo todo o segmento
de juízes que formam o Primeiro Grau de jurisdição.
É pleito antigo dos magistrados de Primeiro Grau o direito de poderem eleger seus
dirigentes, respeitando a regra de mandatos e alternância nessas funções, como forma de
participarem ativamente da autogestão no Poder Judiciário.
A fórmula constitucional empregada para o recrutamento de juízes através de concursos
públicos, afastando o processo eletivo, talvez tenha sido a semente impregnadora da prática
autocrática dos mecanismos de condução das gestões internas, que caracterizam os tribunais
como órgãos de concentração máxima de poder, infensos à participação da base piramidal de
representação da função jurisdicional.
A pergunta elementar que se formula é: se os membros dos órgãos diretivos dos
tribunais decidem administrativamente sobre assuntos que atingem diretamente os juízes de
Primeiro Grau, por que estes não votam na escolha dos nomes que entendem ser os mais
adequados para a direção daqueles órgãos? Cardoso, desembargador do Tribunal de Justiça
da Bahia, afirma que:
O princípio da transparência não condiz com a submissão de toda uma instituição às
conveniências deste ou daquele grupo, desta ou daquela instituição, pois a escolha
através de eleição pode não ser a melhor forma, mas é a que atende à boa prática
democrática.
O governo dos juízes não pode nem deve permanecer sob o regime da
‘gerontocracia’ sustentado pelo rodízio das cúpulas, no cálculo matemático e,
portanto, violador da cláusula pétrea constitucional. O desembargador que assume o
cargo hoje pode calcular o dia em que fará parte da diretoria do Tribunal de Justiça,
independentemente de qualquer condição pessoal, administrativa ou política.
97
A atipicidade do processo eleitoral para a escolha dos dirigentes dos Tribunais de
Justiça chega ao ponto de restringir até mesmo o universo de candidatos dentre os próprios
desembargadores votantes, limitando os escolhidos aos três mais antigos no tribunal, dentre os
membros do órgão especial, quando este existir.
Espera-se que, em breve, possam todos os juízes votar na escolha dos dirigentes dos
tribunais aos quais são diretamente vinculados, da mesma forma legítima como votam para
97
CARDOSO, Antônio Pessoa. Elegíveis para os Tribunais. Disponível em:
<http://www.amb.com.br/portal/index.asp?secao=artigo_detalhe&art_id=814>. Acesso em: 24 maio 2008.
156
síndico de seus condomínios. Atualmente, mesmo os analfabetos votam para Presidente da
República.
4.2.3.2 Composição do órgão especial dos Tribunais de Justiça
Com o advento da Emenda Constitucional n.º 45, de 8 de dezembro de 2004, que
alterou a redação do inciso XI, do Art. 92, da Constituição Federal de 1988, a composição do
órgão especial dos Tribunais de Justiça passou a ser escolhida através de práticas mais
democratizantes, reservando metade das vagas para os membros mais antigos do tribunal e a
outra metade para eleição dentre todos os membros remanescentes do Tribunal Pleno,
respeitada a regra do quinto constitucional.
Esse órgão especial é formado, nos Tribunais de Justiça com número superior a vinte e
cinco julgadores, por no mínimo onze e no máximo vinte cinco membros, para o exercício das
atribuições administrativas e jurisdicionais delegadas da competência do Tribunal Pleno. O
mandato do eleito será de dois anos.
98
Pleito interno dos desembargadores que atualmente compõem o órgão especial é no
sentido de que os dirigentes do tribunal sejam escolhidos dentre todos eles, indistintamente,
ampliando a quantidade dos que podem ser eleitos, dos três mais antigos para os vinte e cinco
que integram o órgão especial, na sua composição máxima.
O Supremo Tribunal Federal, no entanto, por 7 (sete) votos a 4 (quatro), em apreciação
de ADIn sobre a matéria, manteve o entendimento emprestado pelo Art. 102 da Lei Orgânica
da Magistratura Nacional (LOMAN), restringindo o universo dos eleitos, ao que Cardoso
99
denominou de Conselho de Anciãos.
4.2.3.3 Participação de juízes nos Conselhos da Magistratura
Outra observação sobre a democracia interna dos tribunais é a ausência de juízes de
Primeiro Grau na composição dos Conselhos da Magistratura dos Tribunais de Justiça
estaduais (L.C. n.º 35/79, e Art. 93, inciso XI, da Constituição Federal de 1988).
Se o Conselho da Magistratura é órgão de disciplina, fiscalização e orientação da
magistratura do Primeiro Grau de jurisdição, com funções predominantemente
98
Conforme Art. 5º, caput, da Resolução n.º 16/2006, do CNJ.
99
CARDOSO, Antônio Pessoa, op. cit., 2008, on line.
157
administrativas, inclusive com competência sobre os juízes de paz e os servidores, além de
outras atribuições delegadas pelo Tribunal Pleno, de acordo com a Constituição Federal, a Lei
Orgânica da Magistratura Nacional, as leis de organização judiciária estaduais e os regimentos
internos dos Tribunais de Justiça, é incompreensível que juízes de Primeiro Grau e até mesmo
servidores do Poder Judiciário não integrem o referido Conselho, o qual deliberará sobre
interesses de toda a magistratura estadual e do corpo funcional administrativo.
Da mesma forma como os membros do Conselho são eleitos pelo Tribunal Pleno, sendo
cativos o Presidente, o Vice e o Corregedor, os juízes de Primeiro Grau e os servidores do
Poder Judiciário poderiam eleger representantes, que teriam direito a voto nas matérias que
lhes sejam diretamente relacionadas. Isso seria manifestação expressa da democracia interna
nesses tribunais.
4.2.3.4 Coordenação das Escolas da Magistratura
As Escolas da Magistratura também poderiam ser mais democratizadas. Seus diretores
são escolhidos pelos tribunais aos quais estão subordinadas, dentre os membros dessas Cortes
e, em regra, os coordenadores são indicados pelo diretor escolhido, recaindo as escolhas em
juízes de Primeiro Grau. Razoável seria que esses coordenadores fossem eleitos por toda a
classe dos juízes, mediante critérios pré-estabelecidos, envolvendo a formação intelectual ou a
atividade docente, considerando que serão gestores diretos do processo de formação e
aperfeiçoamento dos magistrados, máxime, após a obrigatoriedade dessa etapa no processo de
vitaliciamento dos juízes, consoante disposição do inciso IV, do Art. 93, da Constituição
Federal de 1988, com redação determinada pela Emenda Constitucional n.º 45, de 8 de
dezembro de 2004.
Ademais, não são poucos os tribunais que adotam como pontuação, para a obtenção de
critérios objetivos nas promoções por merecimento dos juízes de Primeiro Grau, a condição
de exercício dessas coordenadorias, independente do período de permanência nas funções.
Esse critério será abordado em tópico separado, porém, desde já, entremostra-se como fator
discriminatório interno na dinâmica democratizante do Poder, destoando, inclusive, da regra
da objetividade, eis que o elemento subjetivo na escolha é preponderante, não havendo
pressupostos básicos exigidos no curriculum vitae do escolhido nem direito a disputa pelos
juízes, através de processo eleitoral.
158
Para revestir o processo de gestão dessas escolas com alguma roupagem
democratizante, algumas delas criaram subcoordenadores para temas específicos, facultando
aos juízes de Primeiro Grau o direito de escolha de seus representantes pela via eletiva,
porém, com funções estritamente simbólicas ou consultivas, sem qualquer poder decisório.
4.2.3.5 Comissões internas setoriais nos tribunais
Outra ausência do direito democrático de participação ampla na gestão administrativa
tem sido observada na composição dos órgãos setoriais e das comissões internas dos tribunais.
Comissões de adoção estadual ou internacional, de jurisprudência e doutrina, de controle da
atividade notarial, de coordenação das diversas unidades de competências jurisdicionais
específicas, de programas e projetos de gestão, de licitação, enfim, de setores os mais diversos
que administram e propõem normas internas, não contam com a presença de juízes e
servidores do Poder ou, quando muito, têm em sua composição alguns desses membros,
porém, escolhidos autocraticamente, sem a participação eletiva de suas classes.
Mesmo que o processo decisório fique restrito aos órgãos de cúpula, por praxe ou
exercício regular das competências privativas, é salutar que muitos pensem e opinem sobre os
seus destinos e os daqueles que representam, pois serão diretamente atingidos com as decisões
da máquina tecnoburocrática do Poder.
4.2.3.6 Composição das bancas examinadoras em concursos públicos para
servidores do Poder Judiciário e juízes
Atendem também ao princípio da democracia, legitimante do exercício das funções
jurisdicionais e administrativas do Poder Judiciário, a transparência e a participação coletiva
da sociedade nos concursos públicos para ingresso nas carreiras judiciárias, tanto da
magistratura quanto dos que integram as funções tecnoburocráticas administrativas.
Para o recrutamento de juízes, a Constituição Federal previu, no Art. 93, inciso I, a
participação da Ordem dos Advogados do Brasil, em todas as fases do concurso. Se não
participação ampla da sociedade, há pelo menos a certeza de que o constituinte inseriu
segmento importante da população no processo de seleção dos representantes do Poder
Judiciário. Salutar seria que também houvesse a obrigatoriedade da presença dos membros do
Ministério Público, como fiscal da lei e em defesa dos interesses sociais, completando o tripé
participativo do sistema democrático de acesso aos tribunais.
159
O que se propõe é que haja a participação de juízes de Primeiro Grau nas bancas
examinadoras, juntamente com a participação de juízes de Segundo Grau, porém, escolhidos
por seleção ampla, na qual todos os magistrados possam votar nos nomes mais aptos para a
composição desse grupo. Essa oportunidade é de suma importância no processo de
legitimação democrática da escolha dos membros do Poder Judiciário reservado pela
Constituição Federal, considerando que em toda a sua carreira o juiz se submeterá apenas ao
concurso de ingresso, ficando a sua progressão funcional regida, doravante, por regras
internas, nos termos da atual moldura constitucional. Amplia-se, assim, o processo decisório
interno, já limitado pela própria Carta Federal.
A preocupação se torna mais evidente, quando se tem notícias de concursos anulados ou
de reprovável fiscalização na seleção e aferição dos critérios do recrutamento.
Se críticas quanto ao limitado universo daqueles que são aptos a se candidatarem,
com supressão das classes mais desfavorecidas, porque não têm acesso ao ensino de qualidade
e também porque a representação funcional é privativa de bacharéis em direito, o risco de se
formar e se perpetuar grupos isolados de poder seria mais controlado.
Frise-se que concursos que se descuidem desse controle podem proporcionar danos
irreversíveis e duradouros na estrutura orgânica do Poder, considerando a vitaliciedade dos
cargos, o prolongado exercício das funções, a reduzida idade e o nível intelectual dos
aprovados, além da suspeita que rondará sobre a independência desses juízes. Gerações
futuras de concursados, oriundas de outros certames, serão alijadas pela ocupação antecipada
dos cargos mais elevados da carreira e pela impressão negativa e coletiva da sociedade,
despertando dúvidas sobre a legitimação desse Poder.
Em relação aos servidores, os concursos deveriam seguir os mesmos critérios
fiscalizatórios, com representantes dos cargos ocupados, para os quais se recrutam novos
ocupantes.
4.2.3.7 Seleção de magistrados para cursos de pós-graduação e congressos
A designação de magistrados para realizarem cursos diversos, inclusive de pós-
graduação, e participarem de congressos e assemelhados, é outro aspecto do poder interno que
deve e pode ser democratizado. Os beneficiados com essas designações são afastados das
funções jurisdicionais, recebem vencimentos como se estivessem trabalhando, concorrem
160
normalmente nas promoções da carreira, sendo até beneficiados com a titulação alcançada e
ainda desfrutam da possibilidade de interação social e funcional com outros universos da
magistratura. Enfim, acrescem ao seu patrimônio imaterial valores que os diferenciarão ao
longo de suas vidas.
Razoável seria que se formulassem critérios com atendimento ao pleito geral dos
membros da carreira, valorizando a antiguidade na magistratura; a condição de vitaliciedade;
o posicionamento na estrutura funcional; a aptidão do magistrado; os prazos máximos de
afastamento das funções; o merecimento do candidato; o tempo restante para a aposentadoria
compulsória; a obrigatoriedade mínima de continuidade na função, mediante sanções
ressarcitórias de custos; a alternância dos escolhidos, por nível de entrâncias e graus; o
interesse público na temática escolhida; o custeio integral ou parcial das despesas e ajudas de
custo; o local onde se dará a formação postulada; o aproveitamento posterior em prol dos
demais juízes, através da formação de multiplicadores do conhecimento obtido, dentre outras
sugestões.
Em suma, se o processo eletivo não é o modelo adotado pela Constituição para o
recrutamento dos juízes, que o seja ampliando-se inclusive as experiências existentes na
formação do status quo interno do Poder Judiciário, facultando oportunidades reais e efetivas
a todos os seus membros, inclusive aos servidores.
A abertura democratizante e a mobilidade indiscriminada na estrutura orgânica do
Judiciário são elementos adicionais à legitimação do Poder.
4.2.4 Escolha dos membros do Supremo Tribunal Federal e dos Tribunais
Superiores
A forma de escolha dos membros dos Tribunais Superiores e do Supremo Tribunal
Federal tem sido objeto de críticas e sugestões, visando à maior democratização dessa
dinâmica.
Consoante a Constituição Federal, os representantes dos três Poderes da República
participam do processo de escolha desses magistrados, chamados de Ministros, salvo em
161
relação ao Supremo Tribunal Federal,
100
quando somente o Poder Executivo e o Poder
Legislativo intervêm nos resultados.
Os Ministros do Supremo Tribunal Federal e dos Tribunais Superiores são nomeados
pelo Presidente da República. O constituinte federal, talvez por omissão ou deliberada
intenção, evitou mencionar o termo indicação, quando se referiu aos membros do Supremo
Tribunal Federal. Ao utilizar a expressão “escolhidos”, no art. 101 da Constituição Federal,
fê-lo como a sugerir que haveria uma lista de nomes formada por alguma outra instituição
para a escolha derradeira do Presidente da República, o que não ocorre dessa forma
compartilhada, pelo menos em relação ao Supremo Tribunal Federal.
Para esse Tribunal, a Constituição não prevê lista tríplice ou consulta aos membros do
próprio órgão. O Presidente da República é a autoridade quase que absolutamente soberana
para a escolha desses Ministros.
A participação do Poder Legislativo nesse processo, assim como nas escolhas dos
Ministros dos Tribunais Superiores, limita-se à aprovação, pela maioria absoluta do Senado
Federal, dos nomes escolhidos, no caso do Supremo Tribunal Federal, e dos indicados e
escolhidos, na hipótese dos Tribunais Superiores.
Não se tem notícia de desaprovações pelo Senado dos nomes indicados e escolhidos,
por diversas razões, dentre elas, arrisca-se: a praxe de submissão e de “respeito” ao Poder
Executivo; os indicados são nomes acima de qualquer dúvida; o governo e sua base de
sustentação obtêm a maioria absoluta em votações dessas matérias; temor reverencial ou,
simplesmente, limitada percepção política de que os assuntos do Poder Judiciário são
resolvidos pelos acordos de lideranças partidárias em troca de votações mais expressivas no
plano econômico. Ao final, e sempre, prevalece a vontade do Poder Executivo, hipertrofiado.
100
Constituição Federal (1988): “Art. 101 [...] Parágrafo único Os Ministros do Supremo Tribunal Federal
serão nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado
Federal”.
162
No Superior Tribunal de Justiça
101
e no Tribunal Superior do Trabalho
102
uma
maior derivação do poder reservado ao Chefe do Executivo nacional para a escolha dos
membros daquelas Cortes, embora esse compartilhamento se ainda dentro da estrutura
orgânica desses tribunais, num sistema de indicação através de listas tríplices, para os
membros da magistratura de carreira, ou sêxtuplas, para os candidatos pertencentes ao quinto
constitucional. Nesta última hipótese, a Constituição previu a redução das listas para o critério
da triplicidade, antes de submetê-las ao Poder Executivo.
A limitação imposta pelo constituinte aos membros que ocupam os Tribunais
Inferiores (estaduais, regionais ou federais), no caso dos egressos da carreira da Magistratura,
afasta o grande contingente de juízes do Primeiro Grau, condicionando todo o processo de
escolha à estrutura sistêmica de formação desse Poder, caracterizada pela verticalização
interna, com pressupostos que identificam a sua matriz tecnoburocrática aos contornos
assemelhados aos padrões napoleônicos legados pelo modelo francês, que influenciou a
organização judiciária brasileira.
Por esse padrão, a independência do magistrado que aspira à ascensão funcional na
última instância da carreira transmigra do polo individual para o coletivo, o colegiado, o
consensual. Essa dinâmica, em parte, tem seus méritos. É assim, por exemplo, que delibera o
Poder Legislativo. Porém, sempre o risco de que a força do colegiado,
103
conservadora,
porque duradoura, pela própria lógica daquilo que permanece, imponha a moldura na qual
devam as variantes da independência jurisdicional se enquadrar.
101
Diz a Constituição Federal (1988): “Art. 104 O Superior Tribunal de Justiça compõe-se de, no mínimo,
trinta e três ministros. Parágrafo único Os Ministros do Superior Tribunal de Justiça serão nomeados pelo
Presidente da República, dentre brasileiros com mais de trinta e cinco e menos de sessenta e cinco anos, de
notável saber jurídico e reputação ilibada, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado
Federal, sendo: I um terço dentre juízes dos Tribunais Regionais Federais e um terço dentre desembargadores
dos Tribunais de Justiça, indicados em lista tríplice elaborada pelo próprio Tribunal; II um terço, em partes
iguais, dentre advogados e membros do Ministério Público Federal, Estadual, do Distrito Federal e Territórios,
alternadamente, indicados na forma do Art. 94”.
102
Constituição Federal (1988): “Art. 111-A O Tribunal Superior do Trabalho compor-se-á de vinte e sete
Ministros, escolhidos dentre brasileiros com mais de trinta e cinco e menos de sessenta e cinco anos, nomeados
pelo Presidente da República, após aprovação pela maioria absoluta do Senado Federal, sendo: I- um quinto
dentre advogados com mais de dez anos de efetiva atividade profissional e membros do Ministério Público do
Trabalho com mais de dez anos de efetivo exercício, observado o disposto no Art. 94; II- os demais dentre juízes
dos Tribunais Regionais do Trabalho, oriundos da magistratura da carreira, indicados pelo próprio Tribunal
Superior”.
103
“O parlamento vem a ser precisamente o lugar em que são expostos argumentos contraditórios, em que se
processa a persuasão de uns, a reconsideração de outros e a deliberação que, afinal, raramente corresponde
imaculadamente a alguma das opiniões originárias”. SANTOS, Wanderley Guilherme dos, op. cit., 2007, p. 8.
163
Resta a composição minoritária formada pela antiguidade na carreira, mas esta é de
curta duração, porque alcança os magistrados com idade avançada, sobrando-lhes pouco
tempo até a aposentadoria para galgar os degraus finais do exercício funcional, logo sendo
substituídos pelos que são escolhidos pela via do merecimento, na alternância constitucional,
em regra, mais novos. Se ainda assim esses magistrados chegarem aos Tribunais Inferiores
por meio da antiguidade, o controle subsequente poderá vetá-los na formação da lista tríplice
para a escolha dos membros dos Tribunais Superiores, uma vez que exercido por estes
mesmos tribunais.
Esse controle tem sido exercido, atualmente, também, pelas cúpulas dos Tribunais
Superiores e Inferiores, quando consolidam as listas dos nomes que ocuparão as vagas
destinadas ao quinto constitucional, como ocorreu recentemente com as indicações
apresentadas pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para preencher cargo de Ministro
reservado a advogados, no Superior Tribunal de Justiça,
104
e de desembargador, no Tribunal
de Justiça de São Paulo,
105
inclusive, com repercussão na ordem de antiguidade interna nesses
tribunais, uma vez que no exemplo do Superior Tribunal de Justiça, enquanto tramita o
recurso interposto pela OAB contra essa decisão, outras nomeações em vagas abertas
posteriormente foram perfectibilizadas, sob o argumento de que “O Superior Tribunal de
Justiça é um tribunal estratégico, um verdadeiro tribunal da cidadania, atualmente
assoberbado de recursos e que certamente terá dificuldades de funcionamento com a carência
de tão considerável número de ministros”.
106
104
Decisão majoritária do S.T.J., de 12.02.2008, fundamentada no descumprimento do estabelecido no Art. 26,
parágrafo 5º, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, porque nenhum dos indicados pela OAB
alcançou a maioria absoluta dos votos dos Ministros do Tribunal, nos três escrutínios realizados. O Supremo
Tribunal Federal indeferiu liminar requerida pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil no
Mandado de Segurança n.º 27.310, decisão da Min. Ellen Grace, impetrado contra possível ato do Presidente da
República de indicar membros do Ministério Público e da Magistratura para preenchimento de cargos de
Ministros do Superior Tribunal de Justiça. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Disponível em:
<http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=86433> e BRASIL. Supremo
Tribunal Federal. Disponível em: <http://www.stf.gov.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=88890>.
Acesso em: 5 jun. 2008.
105
O Supremo Tribunal Federal manteve, em 10.04.2008, decisão unânime do Tribunal de Justiça de São Paulo,
que devolveu para a seccional de São Paulo, da Ordem dos Advogados do Brasil, lista com nomes de seis
advogados para concorrer à vaga do quinto constitucional, sob o argumento de que não estariam preenchidos os
requisitos constitucionais do Art. 94 (C.F./88), quanto a dois advogados indicados pela entidade. Um responderia
a processo criminal e outro não possuiria notável saber jurídico por ter sido reprovado em cerca de 10 concursos
para a magistratura. ASSOCIAÇÃO DOS MAGISTRADOS BRASILEIROS - AMB. Disponível em:
<http://www.amb.com.br/portal/index.asp?/secao=mostranoticia&mat_id=12972>. Acesso em: 5 jun. 2008.
106
ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL. OAB. Negada liminar em ão da OAB sobre preenchimento de vaga
de ministro do STJ destinada a advogado. Comiso Nacional de Apoio aos Advogados em Icio de Carreira (CNAAI).
Disponível em: <http://www.stf.gov.br/portal/cms/verNoticaDetalhada.asp?idConteudo=88890>. Acesso em: 5 jun. 2008.
164
No Tribunal Superior Eleitoral, os Ministros são escolhidos por nomeação do Presidente
da República, após indicações pelo Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça,
conforme a origem funcional dos nomeados. É o que dispõe o Art. 119 da Constituição
Federal.
107
O poder do Presidente da República nessas nomeações é secundário, vez que são os
próprios membros do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça que
indicam os nomes dos Ministros em exercício nessas Cortes para compor aquele tribunal
eleitoral, assim como os dos advogados, sem participação da Ordem dos Advogados do Brasil
nessa escolha.
Daí o questionamento sobre a legitimação democrática para a escolha dos membros do
Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça.
Aparentemente, o Presidente da República apenas chancela um dos seis nomes
indicados pelos tribunais mencionados para as vagas reservadas a advogados no Tribunal
Superior Eleitoral, porém, na gênese do processo, houve a escolha, antecipadamente, pelo
Chefe do Poder Executivo nacional, dos membros do Supremo Tribunal Federal e do Superior
Tribunal de Justiça. Dá-se, assim, uma espécie de autopoiese do Poder.
Ademais, em todos os tribunais da nação há, em sua composição, um membro egresso
do Ministério Público, o que não ocorre no Tribunal Superior Eleitoral. E, diga-se, por
oportuno, no Tribunal Superior Eleitoral são decididas questões vitais para o desenvolvimento
do processo democrático, atingindo diretamente a representatividade popular no direito ao
voto, à participação política, à partidarização e às suas alianças consensuais, à substituição
extraordinária de representantes eleitos, dentre outros.
Não há, sequer, a aprovação dos nomes dos advogados escolhidos pelo Senado Federal,
como nos demais Tribunais Superiores. É um processo tipicamente autocrático, em
descompasso com a ideia central da democracia.
107
Constituição Federal (1988): “Art. 119 O Tribunal Superior Eleitoral compor-se-á, no mínimo, de sete
membros, escolhidos: I- mediante eleição, pelo voto secreto: a) três juízes dentre os Ministros do Supremo
Tribunal Federal; b) dois juízes dentre os Ministros do Superior Tribunal de Justiça; III- por nomeação do
Presidente da República, dois juízes dentre seis advogados de notável saber jurídico e idoneidade moral,
indicados pelo Supremo Tribunal Federal”.
165
No Superior Tribunal Militar a escolha dos seus Ministros não é, como nos demais,
diferente,
108
a começar pela desigualdade representativa entre as três Forças Armadas que
indicam membros para a composição reservada a militares. O Exército é representado por
quatro oficiais-generais, enquanto a Marinha e a Aeronáutica indicam apenas três, cada uma.
Parece haver nesse critério um componente histórico inalterável no status institucional
das Forças Armadas, vez que a força efetiva na guerra se dava nos campos de batalha, nas
lutas corporais, nos enfrentamentos diretos. Daí porque, em todas as nações, o contingente
humano e instrumental das forças do Exército sempre sobressaiu sobre as demais.
Esquece-se, porém, que não fossem as Reais Esquadras inglesas, francesas e
espanholas, em passado ainda recente, muitos impérios não teriam se consolidado,
principalmente devido ao deslocamento de tropas na saga colonialista da era imperialista.
Atualmente, não é menor a força do Poder Naval. Temem-se mais os grandes submarinos
atômicos, os super porta-aviões, capazes de deslocar combatentes e material bélico das outras
Forças Armadas, enfim, a própria máquina de guerra, do que qualquer outro aparato.
A Aeronáutica, a mais nova entre as forças de combate, não é menos importante para a
defesa da nação. Desde a Segunda Grande Guerra Mundial, a aviação impôs-se como poderio
bélico. Em Hiroshima, Nagasaki, Dresden e em todos os últimos campos de guerra modernos,
a força aeronáutica foi decisiva para os propósitos a que se lançaram. Sua potencialidade de
ataque e defesa talvez seja a mais contundente.
Forçoso concluir, então, que a desigualdade da composição numérica nesse Tribunal
Militar esteja relacionada ao número de militares ativos em cada uma dessas forças,
sobressaindo-se majoritariamente o Exército, seguido da Marinha e da Aeronáutica e,
consequentemente, vinculando a origem das infrações militares a serem julgadas. É um
critério assimétrico, porém, justificável, ante a realidade fática.
Quanto à paridade representativa entre advogados e membros do Ministério Público há,
no entanto, inexplicável diferenciação. Enquanto nesse tribunal têm assento três advogados
108
Constituição Federal (1988): “Art. 123 – O Supremo Tribunal Militar compor-se-á de quinze Ministros
vitalícios, nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a indicação pelo Senado Federal, sendo
três dentre oficiais-generais da Marinha, quatro dentre oficiais-generais do Exército, três dentre oficiais-generais
da Aeronáutica, todos da ativa e do posto mais elevado da carreira e cinco dentre civis. Parágrafo único Os
Ministros civis são escolhidos pelo Presidente da República dentre brasileiros maiores de trinta e cinco anos,
sendo: I- três dentre advogados de notório saber jurídico e conduta ilibada, com mais de dez anos de efetiva
atividade profissional; II- dois, por escolha paritária, dentre juízes auditores e membros do Ministério Público da
Justiça Militar”.
166
dentre os civis, apenas um procurador militar na composição daquela Corte. Portanto, no
Superior Tribunal Militar, não foi respeitada a paridade adotada nos demais Tribunais
Superiores e Inferiores. Juiz militar de carreira, concursado, também um, escolhido
dentre os juízes auditores militares. Mesmo quanto aos advogados, a Constituição Federal não
vincula a escolha a uma lista organizada pela Ordem dos Advogados do Brasil.
Criada no Brasil em 1808, somente com a Constituição de 1934 a Justiça Militar passou
a integrar os órgãos do Poder Judiciário da União, sendo considerada a mais antiga dentre as
demais Cortes de Justiça brasileiras.
Criticados por muitos como corporativistas, em face da especificidade do direito militar,
Dallari entende que
é comum que esses tribunais façam parte do aparato mantido para garantir a
impunidade de militares e de seus associados quando praticarem atos definidos em
lei como crimes. É igualmente grave, e, além disso, contraditória, a manutenção
desses tribunais, inseridos no Poder Judiciário, em sistemas formalmente
democráticos.
109
Nesse aspecto, não se entende razoável a crítica de Dallari, a não ser que se possa
estendê-la também à suposição da existência de uma Justiça do Trabalho com características
corporativas, relacionadas às relações de empregos celetistas, majoritariamente da iniciativa
privada, vez que “a apreciação de causas que sejam instauradas entre o Poder Público e seus
servidores, a ele vinculados por típica relação de ordem estatutária ou de caráter jurídico-
administrativo”,
110
foi subtraída provisoriamente da competência da Justiça do Trabalho,
mesmo após a nova redação que a Emenda Constitucional n.º 45 imprimiu ao Art. 114 da
Constituição Federal.
A ideia de uma organização judiciária focada em um órgão julgador único, no plano
estadual e federal, para as diversas competências infraconstitucionais, no Primeiro Grau de
jurisdição, é costumeiramente defendida nos meios jurídicos, porém, não estudos
sustentáveis que demonstrem a maior eficiência, o menor custo, a maior celeridade
prestacional e uma maior elasticidade democrática em razão disso.
Ao contrário, essa segmentação horizontalizada da distribuição de competências
específicas contribui para distribuir melhor o fluxo de poder no âmbito do próprio Judiciário,
109
DALLARI, Dalmo de Abreu, op. cit., 2007, p. 136.
110
Cf. Liminar concedida pelo S.T.F., com efeito ex tunc, na Ação Direta de Inconstitucionalidade n.º 3.395, de
27 de janeiro de 2005, que concedeu interpretação conforme, ao inciso I, do Art. 114, da Constituição Federal
de 1988.
167
evitando o aparecimento de macrodecisões para questões que requerem conhecimentos
superespecializados.
Uma observação adicional que se faz em relação ao Superior Tribunal Militar é que não
há, na composição do Conselho Nacional de Justiça, um representante desse tribunal,
embora todos os outros órgãos do Poder Judiciário tenham sido contemplados e também se
imponham, à Justiça Militar, as decisões daquele Conselho.
111
Nesse momento, tramita projeto de Emenda Constitucional
112
no Congresso Nacional,
de autoria do deputado Silvinho Peccioli, do Partido Democratas, da representação paulista,
que propõe nova redação aos Arts. 94, 101, 104, 107, 119, 120 e 123 da Constituição Federal,
para alterar a forma e os requisitos pessoais de investidura de membros do Poder Judiciário.
O Supremo Tribunal Federal seria formado por cidadãos com mais de quarenta e cinco e
menos de sessenta anos de idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada, indicados em
lista tríplice elaborada pelo próprio tribunal, com posterior nomeação pelo Presidente da
República, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal, sendo
cinco membros oriundos da Magistratura, com mais de vinte anos de exercício; quatro, em
partes iguais, dentre advogados e membros do Ministério Público Federal, Estadual, do
Distrito Federal e Territórios, obedecido o disposto no Art. 94 da Constituição Federal, e dois
oriundos do Congresso Nacional, com formação jurídica.
Com isso, o poder do Presidente da República para a escolha e nomeação desses
ministros ficaria limitado aos nomes constantes de uma lista tríplice, o que hoje não ocorre. A
composição desse tribunal ficaria também mais democrática, eis que passaria a ser formada
por juízes de carreira, de qualquer grau de jurisdição e tipo de competência; advogados;
membros do Ministério Público de qualquer instância e atribuição; e por cidadãos oriundos do
Congresso, exprimindo a representação do Poder Legislativo. Nesta última hipótese, melhor
redação deveria exigir que o escolhido fosse membro do Congresso Nacional,
prioritariamente, condicionando com isso a possibilidade de que um(a) Deputado(a) Federal
ou um(a) Senador(a) também integrasse o Supremo Tribunal Federal, o que seria mais do que
legítimo, eis que eleito pelo voto popular. Em último caso, inexistente algum pretendente, o
111
Entendimento semelhante foi esboçado pelo ex-presidente do S.T.M., Ministro-General Max Hoertel.
ASSOCIAÇÃO MAGISTRADOS BRASILEIROS – AMB. Informativo da Associação dos Magistrados
Brasileiros, Edição Especial, jul. 2006, p. 1.
112
BRASIL. Câmara Federal. Proposta de Emenda à Constituição Federal nº 128/2007. Disponível
em: <http://www.camara.gov.br/sileg/integras/536971.pdf>. Acesso em: 31 dez 2008.
168
Congresso Nacional, reunido em sua composição plenária, escolheria os nomes, de seu
próprio quadro funcional, ou do universo acadêmico, desde que não sejam, em tal situação,
magistrados ou membros do Ministério Público, ativos ou aposentados.
Outro ponto polêmico da Proposta de Emenda Constitucional reside na alteração da
forma de composição do Superior Tribunal de Justiça.
Com a proposta, pretende-se excluir o terço da representação da Magistratura estadual,
mantendo-se os representantes da Magistratura federal, reservando a estes o contingente de
dois terços das vagas do tribunal e abrindo a possibilidade de concorrência não só para
desembargadores dos Tribunais Regionais Federais, mas também para os juízes do Primeiro
Grau da jurisdição federal. A um tempo os magistrados federais de Segundo Grau se
autodenominaram de desembargadores federais, o que não previu a Constituição Federal, pela
simples leitura dos demais artigos do Capítulo reservado ao Poder Judiciário; excluíram o
Poder Judiciário estadual e incluíram a Magistratura de Primeiro Grau federal.
Para não ser de todo casuística a proposta, salva-se, em favor da democracia interna do
Poder Judiciário, a inclusão dos juízes federais de Primeiro Grau no universo dos
pretendentes, o que é positivo no processo de ampliação da legitimação do poder.
A Associação dos Magistrados Brasileiros já interveio solicitando modificações ao
projeto, no sentido da manutenção da participação da Magistratura estadual; na exclusão do
quinto constitucional e para que a indicação dos candidatos se com a estrita observância à
origem da carreira, da forma que é adotada pelo Tribunal Superior do Trabalho (Art. 111-A,
inciso II, Constituição Federal).
113
As outras modificações propostas por esse Projeto de Emenda Constitucional dizem
respeito à criação de bancas examinadoras para a formação das listas sêxtuplas e tríplices no
processo de escolha dos membros para o preenchimento das vagas reservadas ao quinto
constitucional, nos Tribunais Regionais Federais, Tribunais dos Estados, do Distrito Federal e
Territórios, banca esta composta por membros da classe que disputa a vaga e por magistrados
do tribunal destinatário. Os Tribunais Regionais do Trabalho foram excluídos desse processo.
113
A Associação dos Magistrados Brasileiros ingressou no S.T.F. com Ação Direta de Inconstitucionalidade
(ADI n.º 4.078) contra a Lei n.º 7.746/89, que dispõe sobre a forma de composição do Superior Tribunal de
Justiça, pedindo que o Supremo declare inconstitucional o Artigo , inciso I, da aludida lei, conferindo a esse
texto normativo interpretação conforme a Constituição, para o fim de limitar o acesso às vagas do STJ a serem
preenchidas por juiz ou desembargador aos magistrados de carreira. O relator é o Ministro Eros Grau.
169
Completa-se a proposição da PEC n.º 128/2007, mencionando a obrigatoriedade de
participação da OAB na escolha dos membros oriundos da classe de advogados, na
composição do Tribunal Superior Eleitoral, dos Tribunais Regionais Eleitorais e do Superior
Tribunal Militar, o que até então é inexistente.
Enfim, essa abertura que se propõe ao processo de escolha dos Ministros dos Tribunais
Superiores e do Supremo Tribunal Federal acompanha a lógica do regime democrático, na
qual o povo, diretamente ou através de seus representantes políticos, eleitos ou aceitos como
expressão de grupos classistas identificados com a matéria jurídica ou com a fiscalização da
aplicação do conjunto normativo, pode expressar a sua soberania. Espera-se, em todas as
propostas que surjam, que a Magistratura de Primeiro Grau também possa integrar o rol dos
aptos a serem escolhidos, até porque em maior número na carreira.
4.2.5 Mandatos para os membros dos tribunais
Nos itens anteriores já se iniciou a abordagem da ideia de mandatos ou exercício
provisório das funções jurisdicionais no Segundo Grau de Jurisdição, tanto nos Tribunais
Inferiores como nos Superiores e no Supremo. A proposta sobre a mitigação das garantias da
inamovibilidade e irredutibilidade de subsídios precede ao desenvolvimento deste tópico.
Imagine-se, como início de raciocínio, Tribunais de Justiça cuja composição é formada por
percentuais mínimos em relação à totalidade dos membros da Magistratura de Primeiro Grau,
como são os limites estatísticos nessas Cortes.
114
Admita-se, agora, que a média etária dos magistrados ao ingressarem na Magistratura é
de 33,4 anos,
115
embora, com o fenômeno da juvenilização, muitos juízes aprovados nos
últimos concursos públicos tenham iniciado a carreira com idade entre 24 e 27 anos, fato
constatado em muitos tribunais.
Partindo da premissa de que um magistrado percorre todas as entrâncias de sua carreira
em cerca de vinte anos, aproximadamente, e acrescendo-se esse período à média das idades de
114
ASSOCIAÇÃO PAULISTA DE MAGISTRADOS - APAMAGIS. A magistratura estadual comum de São
Paulo é composta por 2.034 cargos de juiz de Primeiro Grau e 360 de Segundo Grau [mensagem pessoal]. E-
mail recebido de: <secretar[email protected]r.>. Acesso em: 8 jul. 2008.
115
ASSOCIAÇÃO DOS MAGISTRADOS BRASILEIROS - AMB. Pesquisa AMB 2006: a palavra está com
você. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE MAGISTRADOS, XIX. Desenvolvimento: uma questão de justiça. p. 15-18
nov. 2006, Curitiba/PR, p. 9. Disponível em: <http://www.amb.com.br/portal/docs/pesquisa2006.pdf>. Acesso em: 12 jun.
2008.
170
ingresso na Magistratura, presume-se que o juiz integrará os Tribunais Inferiores com idade
próxima dos 53,4 anos. Essa é uma realidade incontestável, já na atualidade.
Como a idade compulsória para a aposentadoria no serviço público é de 70 anos,
conclui-se que o juiz de Primeiro Grau quando tem acesso ao Segundo Grau, permanecerá,
em média, por 17 anos, aproximadamente.
Essa introdução ao tema se faz necessária para que se possa defender a tese da
estipulação de mandatos para todos os juízes que integrarem os tribunais de qualquer
instância. Da mesma forma como se defendeu a ideia de que não é razoável que juízes
permaneçam por longos anos exercendo a jurisdição numa mesma unidade jurisdicional, em
razão da dimensão de seu poder, de seus erros, de seus acertos e da necessidade de revisar a
jurisprudência local, possibilitando que outros magistrados possam interagir com as mais
diversas culturas, renovando e democratizando a prestação jurisdicional, também é necessário
que a permanência de magistrados nos tribunais seja limitada, pelos mesmos motivos.
Ademais, os tribunais têm ampla responsabilidade no aparelho judiciário, sendo
incumbidos não das competências originárias, mas também das recursais, exercendo o
juízo de reforma ou confirmação das decisões de Primeiro Grau, podendo, com isso, firmar
temporariamente a jurisprudência e editar súmulas que haverão de repercutir nos julgamentos
já realizados pela instância inferior.
No plano do autogoverno do Poder Judiciário, as decisões de natureza administrativo-
disciplinar também atingem todos os magistrados do Primeiro Grau, sem que haja
oportunidade para o consenso coletivo da categoria.
Estudo elaborado pela Associação dos Magistrados Brasileiros aponta como motivos
para a limitação do período de permanência dos magistrados nos tribunais e a adoção de
mandatos para os membros dessas Cortes, os seguintes: a imprescindível renovação dos
quadros das cúpulas dos tribunais, favorecendo a criação e a renovação da jurisprudência; a
modernização das práticas gerenciais; a alternância no poder; o desgaste da estagnação; e o
desestímulo dos demais juízes pela ausência de perspectiva de progressão na carreira,
provocando aumento do número de aposentadorias voluntárias e antecipadas, com
171
repercussão no erário.
116
No Direito Comparado, o exemplo das Cortes Constitucionais,
que adotam o sistema de mandatos, conforme quadro demonstrativo abaixo:
C
ORTE
C
ONSTITUCIONAL
M
ANDATO
Corte Austríaca
--
Corte Alemã
12 anos
Corte Italiana
9 anos
Conselho Francês
9 anos
Tribunal Espanhol
9 anos
Tribunal Português
6 anos
Corte Belga
--
Corte Russa
12 anos
Corte Polonesa
8 anos
Corte Húngara
9 anos
Quadro 2 Dados de mandatos nas Cortes Constitucionais
Fonte: AMB (2008, on line)
Zaffaroni acrescenta aos dados acima a experiência de mandatos nas seguintes cúpulas
judiciárias:
117
P
AÍS
M
ANDATO
O
BSERVAÇÕES
Cuba 5 anos Supremo Tribunal
Japão 10 anos
Nas cortes de apelação. Para o Supremo, vige a regra do
afastamento compulsório aos 70 anos.
Equador 4 anos Supremo Tribunal
Honduras 4 anos Supremo Tribunal
Costa Rica 8 anos Supremo Tribunal
El Salvador 9 anos Supremo Tribunal
Venezuela 9 anos Supremo Tribunal
Nicarágua 6 anos Supremo Tribunal
Panamá 10 anos Supremo Tribunal
Bolívia 10 anos Supremo Tribunal
Colômbia 8 anos
Corte Constitucional; Suprema Corte; e Conselho de
Estado.
Quadro 3 Experiência de mandatos nas cúpulas judiciárias
Fonte: Zaffaroni (1995)
116
ASSOCIAÇÃO DOS MAGISTRADOS BRASILEIROS - AMB. O judiciário brasileiro e o direito
comparado: limite de idade para a aposentadoria. Renovação necessária. Disponível em:
<http://www.amb.com.br/portal/docs/noticias/2008/cartilha_compulsoria.pdf>. Acesso em: 14 jun. 2008.
117
ZAFFARONI, Eugenio Raúl, op. cit., 1995, p. 115-116, 121-122 e 126.
172
O obstáculo que pode surgir quanto à questão dos mandatos é no sentido de se definir
qual o destino que terá o magistrado, o membro do Ministério Público, o advogado ou o
militar, após o decurso do prazo para o exercício de suas funções nesses tribunais.
A equação jurídica para a recolocação dos egressos dos tribunais que já ocuparam
cargos públicos em níveis de carreira inferior o é de grande complexidade, considerando
que os seus cargos anteriores podem ser ocupados apenas provisoriamente por outros
membros auxiliares, os militares têm regras próprias que regem a reserva compulsória, e os
advogados, se profissionais autônomos, retornariam as suas bancas advocatícias e, se
ocupantes de cargos ou empregos públicos, seria assegurado o seu retorno a essas colocações.
Ademais, pela duração dos mandatos, pela idade mínima para acesso aos tribunais e
pelo tempo de serviço acumulado ou considerado como tal, situações estas combinadas entre
si, dificilmente não haveria oportunidade para a aposentadoria com vencimentos
proporcionais ou integrais, voluntária ou compulsória, após o período tribunalício.
Outro argumento que se contrapõe a essa ideia é quanto à redutibilidade vencimental do
magistrado. Para tanto, mitigada essa prerrogativa ou garantia, como exposto, os
vencimentos ficariam condicionados ao cargo ocupado no momento do exercício funcional
atual, salvo para fins de aposentadoria, que acompanharia a regra da proporcionalidade ou
integralidade, nos termos dos interstícios legais mínimos.
As dificuldades com o manuseio de processos nos graus inferiores quando o mesmo
magistrado atuou no grau superior, em relação ao mesmo feito, seriam resolvidas com a
declaração de impedimento naqueles outros.
Também não há por que se projetar conflitos interpessoais ou interfuncionais pela
alteração do status quo do magistrado, do membro do Ministério Público ou do advogado,
considerando que não hierarquia entre os ocupantes desses cargos ou funções e o exercício
do Poder Público tem caráter impessoal.
Enfim, a construção da ideia de mandatos para os membros dos tribunais é mais uma
forma de democratizar internamente o Poder Judiciário, evitando que grupos e segmentos de
poder se personalizem e se perpetuem, com o consequente rompimento do mecanismo de
alternância democrática e o enfraquecimento dos sistemas de controle, de percepção da
alteridade jurisprudencial e de aplicação de novas técnicas gerenciais. A duração ideal desses
173
mandatos é uma questão que se propõe. Os parâmetros do Direito Comparado aqui
colacionados são apenas referenciais de experiências estrangeiras.
Convém lembrar, no entanto, que na dinâmica democrática dos outros dois Poderes, o
maior mandato é o de Senador da República, por oito anos. Portanto, razoável que a duração
dos mandatos nos tribunais tenha o mesmo limite adotado para o Senado,
118
excetuando-se no
Tribunal Superior Eleitoral, onde a duração atual dos mandatos atende bem à dinâmica da sua
competência material, e no Conselho Nacional de Justiça, que não é Tribunal, mas integra o
rol dos Órgãos do Poder Judiciário.
Zaffaroni, a despeito de defender a ampliação democrática para os legitimados a
integrarem os tribunais, incorre em aparente paradoxo, no entanto, ao afirmar que
seja como for, em quase todos os países os operadores políticos nomeiam os
integrantes das cúpulas judiciárias, sem qualquer limite formal que supere os
requisitos mínimos de cidadania, idade e título hábil.
Mas a submissão política das cúpulas não é apenas assegurada através das
nomeações, mas, em algumas estruturas, é reforçada mediante a designação
periódica, que quanto mais breve seja o período melhor garante a domesticação dos
juízes.
119
Não parece coerente esse raciocínio. Primeiro, porque, uma vez nomeado, o magistrado
adquire independência jurisdicional, legitimado pelo processo de escolha. Segundo, porque as
cúpulas ou os órgãos judiciários têm independência e autogoverno, constitucionalmente
assegurados, pelo menos no Brasil. Terceiro, porque é exatamente a temporariedade dos
mandatos que assegura o exercício do consenso político e a adequação da jurisprudência às
modificações constantes e emergenciais da sociedade, mais facilmente obtidas através de
colegiados renovados e juízos valorativos atualizados. Por fim, a “domesticação dos juízes” a
que se refere Zaffaroni seria mais efetiva, na hipótese da ocorrência de desvios institucionais,
se os mandatos desses magistrados fossem longos, pois haveria sempre o risco do despertar de
sentimentos atávicos e fidelizações personalizadas, criando um fosso entre a matriz do Poder
nomeante, com suas forças legitimantes, e a realidade factual das novas lideranças.
118
Constituição Federal (1988): “Art. 46 - O Senado Federal compõe-se de representantes dos Estados e do
Distrito Federal, eleitos segundo o princípio majoritário. § - Cada Estado e o Distrito Federal elegerão três
Senadores, com mandato de oito anos”.
119
ZAFFARONI, Eugenio Raúl, op. cit., 1995, p. 121.
174
4.2.6 Idades mínima e máxima de acesso ou nomeação para os tribunais
As idades mínima e máxima para os membros dos tribunais, de qualquer competência,
também deveriam seguir um padrão idêntico, considerando a similitude de responsabilidades,
experiências e maturidade emocional, exigidas para todos eles, quer sejam juízes de tribunais
estaduais, regionais, federais, superiores ou do Supremo.
A Constituição Federal de 1988 previu diversos critérios para o ingresso como membro
desses tribunais, ora condicionando a idades mínima e máxima, ora a um período mínimo de
exercício funcional, ora aos dois critérios simultaneamente, ora a nenhum deles.
No critério etário, o mínimo admitido varia entre trinta e trinta e cinco anos e o máximo
é de sessenta e cinco anos, salvo quanto ao Conselho Nacional de Justiça, que embora não
seja tribunal, integra o conjunto dos órgãos do Poder Judiciário, tendo sido assinalado o limite
de sessenta e seis anos.
Quanto ao critério atinente ao tempo de exercício funcional, o constituinte previu a
exigência mínima de dez anos de efetiva atividade para advogados e membros do Ministério
Público. Para o Tribunal Superior Eleitoral e os Tribunais Regionais Eleitorais, a Constituição
não dispôs sobre período mínimo de exercício funcional para os advogados, mas tanto o
Tribunal Superior Eleitoral quanto o Supremo Tribunal Federal decidiram que deve ser
cumprida a regra do Art. 94 da Constituição Federal, exigindo-se também dez anos de efetivo
exercício funcional.
Para a composição militar do Superior Tribunal Militar também não limites mínimo
e máximo e, para a composição civil, escolhida dentre advogados, juízes auditores e membros
do Ministério Público Militar, previu-se apenas a idade mínima de trinta e cinco anos.
Em relação aos Tribunais de Justiça estaduais e distrital, a Constituição Federal
reservou aos Estados e Distrito Federal a organização de suas Justiças, observados os
princípios estabelecidos na Carta Federal. A matéria, portanto, é regulada pelas Constituições
Estaduais e pela Lei Orgânica Distrital, respectivamente. A seguir, formula-se quadro
esquemático do que está disposto na Constituição Federal, com critérios de idades mínima e
máxima, fundamento legal e outras exigências, para os que pretendem compor os tribunais e o
Conselho Nacional de Justiça.
175
Órgão Qte. de
Membros
Idade
Mínima
Idade
Máxima
Exigências
Composição
Processo
Previsão
Constitucional
STF
Supremo
Tribunal
Federal
11,
vitalícios
Mais de 35
anos
Menos de
65 anos
Exigências:
Notável saber
jurídico e
reputação ilibada.
Composição: Não
há necessidade de
vinculação
anterior a ó rgão
judiciário ou de
classe.
Processo:
Indicação do
Presidente da
República;
Aprovação pela
maioria ab soluta
do Senado;
Nomeação pelo
Presidente da
República.
Art. 101
STJ
Superior
Tribunal de
Justiça
Mínimo de
33,
vitalícios
Mais de 35
anos
Menos de
65 anos
Exigências:
Notável saber
jurídico e
reputação ilibada.
Composição:
I Um terço
dentre j uízes dos
Tribunais de
Justiça, indicados
em lista tríplice
elaborada pelo
próprio Tribunal.
Processo:
O STJ
elabora
lista dentre
os
inscritos.
O
Presidente
da
República
escolhe um
no me da
lista.
O Senado
aprova por
maioria
absoluta.
O
Presidente
da
República
no meia.
II- Um terço, em
partes
Arts. 94 e 104
176
Órgão Qte. de
Membros
Idade
Mínima
Idade
Máxima
Exigências
Composição
Processo
Previsão
Constitucional
Continuação
STJ
iguais, d entre
advogados e
me mbros do
Ministério Público
Federal, Estadual,
do Distrito
Federal e
Território s,
alternada mente.
Para o Ministério
Público exige-se
mais de 10 anos de
carreira. Para os
advogados exige-
se mais de 10 anos
de efetiva
atividade
profissional.
Processo:
O órgão de
classe (OAB
e MP)
elabora lista
sêxtupla.
O STJ reduz
a lista p ara
tríplice.
O
Presidente
da
República
escolhe um
no me.
O Senado
aprova por
maioria
absoluta.
O
Presidente
da
República
no meia.
TST
Tribunal
Superior do
Trabalho
27,
vitalícios
Mais de 35
anos
Menos de
65 anos
Exigências:
Notório saber
jurídico e
reputação ilibada
apenas para os
indicados às vagas
de juiz reservadas
para advogados.
Composição:
I- Um quinto
dentre advogados
com mais de 10
anos de efetiva
atividade
Arts. 94 e 111 -A
177
Órgão Qte. de
Membros
Idade
Mínima
Idade
Máxima
Exigências
Composição
Processo
Previsão
Constitucional
Continuação
TST
profissional e
me mbros do
Ministério Público
do Trabalho com
mais de 10 anos de
efetivo exercício.
Processo: Idêntico
ao do item II do
STJ, salvo quanto
à redução da lista,
que é feita pelo
TST.
II- Os demais
dentre j uízes dos
Tribunais
Regionais do
Trabalho, oriundos
da Magistratura de
carreira, indicado s
pelo próprio
Tribunal Superior.
Processo: Idêntico
ao do item I do
STJ, salvo quanto
à elaboração da
lista, que é feita
pelo TST. Neste
caso, somente os
juízes de carreira
dos Tribunais
Regionais do
Trabalho podem
concorrer
STM
Superior
Tribunal
Militar
15,
vitalícios
Mais de 35
anos, para
os Ministros
civis.
Os
Ministros
militares
são
vinculados à
regra do
posto mais
elevado na
carreira, em
atividade.
Consoante
as normas
militares,
não se
alcança o
posto mais
elevado com
meno s de 35
anos
Menos de
65 anos
(Art. 2º, §
1º,
Regimento
do
Superior
Tribunal
Militar),
para os
Ministros
civis,
extensivo
aos
ministros
militares,
por
jurispru-
dência do
próprio
Tribunal.
Exigências:
Notório saber
jurídico e
reputação ilibada
apenas para
advogados.
Composição:
Quatro o ficiais-
generais do
Exército; três
oficiais-generais
da Marinha e três
oficiais-generais
da Aeronáutica,
todos da ativa e do
posto mais
elevado da
carreira.
Processo: Não há
previsão
constitucional
sobre a indicação
desses militares.
Os Ministros civis
Art. 123
178
Órgão Qte. de
Membros
Idade
Mínima
Idade
Máxima
Exigências
Composição
Processo
Previsão
Constitucional
Continuação
STM
são:
I- Três dentre
advogados de
notório saber
jurídico e conduta
ilibada, com mais
de 10 ano s de
efetiva atividade
profissional;
II- dois, por
escolha paritária,
dentre j uízes
auditores e
me mbros do
Ministério Público
da Justiça Militar.
Processo:
Nomeados pelo
Presidente da
República após
aprovação das
indicações pelo
Senado Federal.
Não há previsão
constitucional
quanto ao q uorum
para a aprovação.
TSE
Tribunal
Superior
Eleitoral
7, com
mandatos de
dois anos, no
mínimo, e
nunca por mais
de dois biênios
consecutivos.
Não há
previsão
constitucio-
nal para as
vagas de
juiz
reservadas
para
advogados.
Jurisprudên-
cias do TSE
e STF
entende m
que vige a
regra do art.
94 da CF
quanto à
exigência de
mais de 10
anos de
efetiva
atividade
profissio-
nal,
independen-
te da idad e
mínima.
Para os
me mbros
Não há
previsão
constitu-
cional.
Para as
va gas
reservadas
ao STJ e
STF,
entende-se
que o
limite é a
idade de 70
anos,
quando se
dá a
aposenta-
doria
compulso-
ria.
Para as
va gas de
juiz
reservadas
para
advogados,
não há
previsão
constitu-
cional.
Exigências:
Notável saber
jurídico e
idoneidade moral
apenas para os
indicados às vagas
de juiz reservadas
a advogados.
Composição: Por
no meação do
Presidente da
República, dois
juízes dentre seis
advogados
indicados pelo
Supremo Tribunal
Federal.
Não há previsão
constitucional d e
indicações pela
OAB.
Processo: O STF
indica os nomes e
o Presidente da
República os
no meia.
Não há previsão
constitucional d e
aprovação pelo
Arts. 94 e 118
179
Órgão Qte. de
Membros
Idade
Mínima
Idade
Máxima
Exigências
Composição
Processo
Previsão
Constitucional
Continuação
TSE
egressos do
STJ e STF,
a regra é a
prevista
para essas
Cortes: mais
de 35 ano s.
Senado .
Os Ministros
oriundos da
Magistratura são
escolhidos,
med iante eleição,
pelo voto secreto
dos membros do
STF e do STJ,
respectivamente,
sendo:
I- três dentre os
Ministros do STF;
II- dois dentre os
Ministros do STJ.
Processo: Não há
previsão
constitucional d e
no meação pelo
Presidente da
República nem
aprovação pelo
Senado.
Pressupõe-se que
eles já se
submetera m a
essas fases.
Não há vaga para
me mbros do
Ministério
Público.
TRF
Há 5
Tribunais
Regionais
Federais no
Brasil.
Mínimo
de 7,
vitalícios
Mais de 30
anos
Menos de
65 anos
Exigências:
Notório saber
jurídico e conduta
ilibada p ara as
vagas de j uízes
escolhidos dentre
advogados.
Composição:
I- Um quinto
dentre advogados
com mais de 10
anos de efetiva
atividade
profissional e
me mbros do
Ministério Público
Federal com mais
de 10 ano s de
carreira;
Processo: Para as
vagas de j uiz
reservadas ao
Ministério Público
Federal e aos
advogados são
elaboradas listas
Arts. 94 e 107
180
Órgão Qte. de
Membros
Idade
Mínima
Idade
Máxima
Exigências
Composição
Processo
Previsão
Constitucional
Continuação
TRF
sêxtuplas por seus
órgãos de classe.
O TRF reduz as
listas para
tríplices e as
remete para
no meação pelo
Presidente da
República.
II- Os demais,
med iante
promoção de
juízes federais
com mais de 5
anos de exercício,
por antigüidade e
merecimento,
alternada mente.
Processo: Embora
não haja previsão
constitucional, os
Regimentos
Internos dos
Tribunais
Regionais
Federais preveem
a elaboração de
listas tríplices,
pelo próprio
Tribunal, dos
inscritos à
promoção para as
vagas reservadas a
juízes federais,
por merecimento,
para escolha e
no meação pelo
Presidente da
República. As
vagas de
antigüidade
também são
preenchidas por
no meação do
Presidente da
República, após
remessa do s
no mes pelo
Tribunal. Não há
listas tríplices
neste caso.
TRT
Há 24
Tribunais
Regionais
do Trabalho
no Brasil.
Mínimo
de 7,
vitalícios.
Mais de 30
anos
Menos de
65 anos.
Exigências:
Notório saber
jurídico e
reputação ilibada
apenas para os
indicados às vagas
Arts. 94 e 115
181
Órgão Qte. de
Membros
Idade
Mínima
Idade
Máxima
Exigências
Composição
Processo
Previsão
Constitucional
Continuação
TRT
de advogados.
Composição:
I- Um quinto
dentre advogados
com mais de 10
anos de efetiva
atividade
profissional e
me mbros do
Ministério Público
do Trabalho com
mais de 10 anos de
efetivo exercício.
Processo: Os
órgãos de classe
estaduais (OAB e
Procuradoria
Regional do
Trabalho)
elaboram listas
sêxtuplas e
remetem ao TRT,
que as reduz para
tríplice,
remetendo-as para
escolha e
no meação pelo
Presidente da
República.
II- Os demais,
med iante
promoção de
juízes do trabalho,
por antigüidade e
merecimento,
alternada mente.
Processo: são
elaboradas listas
tríplices para as
vagas de
merecimento, para
escolha e
no meação pelo
Presidente da
República. O
Presidente também
no meia os j uízes
para as vagas de
antigüidade,
independente de
lista tríplice.
182
Órgão Qte. de
Membros
Idade
Mínima
Idade
Máxima
Exigências
Composição
Processo
Previsão
Constitucional
TRE
Há 27
Tribunais
Regionais
Eleitorais
no Brasil.
7, com
mand atos
de dois
anos, no
mínimo, e
nunca por
mais de
dois
biênios
consecuti-
vo s.
Não há
previsão
constitucio-
nal para os
juízes
indicados da
classe dos
advogados.
Não há
previsão
constitu-
cional.
Para as
vagas
reservadas
a juízes e
desem-
bargado -
res
entende-se
que a regra
é a idade
da aposen-
tadoria
compul-
sória - 70
anos.
Exigências:
Notável saber
jurídico e
idoneidade moral,
apenas para os
indicados às vagas
de juiz reservadas
a advogados.
Composição;
I- Mediante
eleição pelo voto
secreto:
a) de dois juízes
dentre os
desembargadores
do Tribunal de
Justiça do Estado
sede do TRE;
b) de dois juízes,
dentre os juízes de
direito, escolhidos
pelo Tribunal de
Justiça.
Processo: votam
na eleição apenas
os
desembargadores.
II- de um juiz do
Tribunal Regional
Federal com sede
na capital do
Estado ou no
Distrito Federal,
ou, não havendo,
de juiz federal,
escolhido, em
qualquer caso,
pelo Tribunal
Regional Federal
respectivo.
III- Por nomeação,
pelo Presidente da
República, de dois
juízes dentre seis
advogados,
indicados pelo
Tribunal de
Justiça. A OAB
não indica
advogados. Não há
me mbro
representando o
Ministério
Público.
Art. 120
183
Órgão Qte. de
Membros
Idade
Mínima
Idade
Máxima
Exigências
Composição
Processo
Previsão
Constitucional
Tribunais
de Justiça
Estaduais e
Distrital.
Há 27
Tribunais
de Justiça
no Brasil.
Varia
conforme as
Constitui -
ções
estaduais,
distrital ou
Leis de
Organiza-
ção
Judiciária
estaduais e
distrital.
Atualmente,
as menores
composi-
ções são as
dos Estados
do Acre e
do Amapá,
com 9
desembar-
gadores,
cada, e a
ma ior é a
do Estado
de São
Paulo, co m
360
desembar-
gadores,
afora, nest e
último,
vá rios
juízes
substitutos
de 2ª
Instância,
que atuam
como se
fossem
desembar-
gadores.
A
quantidad e
de
desembar-
gadores de
todos os
Tribunais
de Justiça
alcançou o
número de
1.374
me mb ros.
120
Não há
previsão na
Constitu-
ição
Federal. É
competência
da
legislação
residual dos
Estados. A
maioria dos
tribunais
adota a
regra do art.
94 da CF/88
para as
vagas de
desembar-
gador
destinadas à
classe de
advogados e
do
Ministério
Público.
Não há
idade
mínima para
as vagas
destinadas a
juízes de
carreira.
Menos de
65 anos
para as
vagas de
desem-
bargadores
destinadas
a
advogados
e membros
do
Ministério
Público;
Menos de
70 anos
para as
vagas
destinadas
a juízes de
carreira.
Exigências :
Notório sab er
jurídico e
reputação ilibada
apenas pa ra os
indicados às vagas
de desembargador
reservadas a
advogados.
Composição:
a) Por pro moção de
juízes de d ireito da
última ou única
entrância d a
carreira,
escolhidos,
alternadamen te,
por merecimen to e
antigüidade. A
promoção por
me recimento
pressupõ e dois
anos de exercício
na respecti va
entrância e integrar
a primeira quinta
parte da lista de
antigüidade desta,
salvo se não houver
com tais requisitos
quem aceite o lugar
va go.
Processo: Po r
antigüidade, o juiz
ma is antigo na
última ou única
entrância é
nomeado pelo
Presidente do
Tribunal, após a
declaração de
va cância do cargo
de desembargador,
salvo se recusar ou
for preterido, na
forma da legislação
em vigor (LOMAN,
CF).
Por merecimento,
elabora-se lista
tríplice den tre os
ma is votados pelo
Tribunal Pleno.
Arts. 93, 94,
125
120
ASSOCIAÇÃO DOS MAGISTRADOS BRASILEIROS - AMB. Ibrajus divulga estudo sobre o Judiciário.
24 mar. 2008. Disponível em:<http://www.amb.com.br/portal/?secao=mostranoticia&mat_id=12723>. Acesso em: 30
maio 2008.
184
Órgão Qte. de
Membros
Idade
Mínima
Idade
Máxima
Exigências
Composição
Processo
Previsão
Constitucional
Continuação
TJ
Os
desembar-
gadores
estaduais
são
vitalícios.
O Presidente do
Tribunal d e Justiça
escolhe e nomeia
um dos in tegrantes
da lista. Só
poderão concorrer
os juízes que
integrarem a
primeira quinta
parte da lista de
antigüidade.
b) Um quin to dos
lugares s erá
preenchido por
me mb ros do
Ministério Público,
com mais d e 10
anos de carreira, e
por advogados com
ma is de 10 anos de
efetiva a tividade
profissional,
indicados em list a
sêxtupla pelos
órgãos d e
representação das
respecti vas classes.
Processo: Os
órgãos d e classe do
Ministério Público
e da OAB elaboram
lista sêxtupla. Em
muito s Estados esta
lista é formada
pelos no mes mais
votados por toda a
categoria e não
somente p elos
órgãos d e cúpula.
Fo rmada a lista
sêxtupla, o
Tribunal d e Justiça
a reduz p ara
tríplice, por
votação de todos os
seus memb ros,
remetendo -a ao
Governador do
Estado, que
escolherá e
nomeará u m dos
indicados .
185
Órgão Qte. de
Membros
Idade
Mínima
Idade
Máxima
Exigências
Composição
Processo
Previsão
Constitucional
Tribunais
Militares
Estaduais
121
7 vitalícios Adotam a
regra do
Art. 94 da
CF/88 para
as vagas
destinadas a
advogados e
me mbros do
Ministério
Público.
As vagas
destinadas a
oficiais da
Polícia
Militar e do
Corpo de
Bombeiros
sujeitam-se
às regras
militares
dessas
Menos de
65 anos
para
advogados
e promoto-
res.
Menos de
70 anos
para juízes
militares
de
Primeiro
Grau.
Exigências :
Notório sab er
jurídico e
reputação ilibada
para a vaga
destinada a
advogado, co m
ma is de 10 anos de
efetiva a tividade
profissional.
Para a vaga
destinada ao
Ministério Público,
exige-se mais de 10
anos na carreira.
Composição:
Quatro memb ros
dentre oficiais do
último posto n a
carreira d a Polícia
Militar estadual e
do Corpo de
Bombeiros , em
atividade, e três
dentre civis, sendo:
um juiz d e direito
do Juízo Militar
estadual; um
advogado e u m
me mb ro do
Ministério Público
estadual. Há
concurso esp ecífico
para a Magistratura
estadual mi litar de
Primeiro Grau.
Processo: Para as
va gas destin adas a
advogado e
me mb ro do
Ministério Público,
são indicados
nomes em l istas
sêxtuplas,
reduzidas para
tríplices ,
escolhidos e
nomeados pe lo
Governador do
Estado.
Para a vaga de juiz
de direito
.
Art. 125, § 3º
121
A Constituição Federal (Art. 125, § 3º) autoriza a criação de Tribunal Militar Estadual onde o efetivo
militar seja superior a vinte mil integrantes. Atualmente, existe Tribunal Militar Estadual em São Paulo,
Minas Gerais e Rio Grande do Sul.
186
Órgão Qte. de
Membros
Idade
Mínima
Idade
Máxima
Exigências
Composição
Processo
Previsão
Constitucional
CNJ
Conselho
Nacional de
Justiça
15, com
mand atos
de dois
anos,
admitida
uma
recondução
Mais de 35
anos
Menos de
66 anos
Exigências:
Notável saber
jurídico e
reputação ilibada,
apenas para os
indicados pela
Câmara dos
Deputados e
Senado Federal.
Composição:
I- Um Ministro do
Supremo Tribunal
Federal, indicado
pelo respectivo
tribunal;
II- Um Ministro
do Superior
Tribunal de
Justiça, indicado
pelo respectivo
tribunal;
III- Um Ministro
do Tribunal
Superior do
Trabalho, indicado
pelo respectivo
tribunal;
IV- Um
desembargador de
Tribunal de
Justiça, indicado
pelo Supremo
Tribunal Federal;
V- Um juiz
estadual, indicado
pelo Supremo
Tribunal Federal;
VI Um juiz de
Tribunal Regional
Federal, indicado
pelo Superior
Tribunal de
Justiça;
VII Um juiz
fed eral, ind icado
pelo Superior
Tribunal de
Justiça; VIII Um
juiz de Tribunal
Regional do
Trabalho, indicado
pelo Tribunal
Superior do
Trabalho;
IX- Um juiz do
trabalho, indicado
pelo Tribunal
Art. 103-B
187
Órgão Qte. de
Membros
Idade
Mínima
Idade
Máxima
Exigências
Composição
Processo
Previsão
Constitucional
Continuação
CNJ
Superior do
Trabalho;
X- Um membro do
Ministério Público
da União, indi cado
pelo Procu rador
Geral da
República.
XI Um memb ro
do Ministé rio
Público estadual,
escolhido pelo
Procurador Geral
da República,
dentre os nomes
indicados pelo
órgão comp etente
de cada instituiç ão;
XII- Dois
advogados,
indicadas p elo
Conselho Fe deral
da Ordem dos
Advogados do
Brasil;
XIII- Dois
cidadãos, de
notável sab er
jurídico e
reputação ilibada,
indicados um pela
Câmara dos
Deputados e outro
pelo Senado
Federal.
Processo: Os
me mb ros do
Conselho s erão
nomeados pe lo
Presidente da
República, depois
de aprovada a
escolha pe la
ma ioria absoluta do
Senado Federal.
Não efetuad as, no
prazo legal, as
indicações
previstas neste
artigo, caberá a
escolha ao
Supremo Tribunal
Federal.
Não há
representantes da
Justiça Militar no
CNJ.
Quadro 4 Critérios de idades mínima e máxima para ingressar nos tribunais e no Conselho Nacional de Justiça
Fonte: Elaborado pelo autor.
188
4.2.7 Idade para aposentadoria compulsória dos magistrados
A idade limite para a aposentadoria compulsória dos magistrados é outro foco de
discussão no âmbito da democracia interna do Poder Judiciário.
Pela legislação atual, os magistrados são alcançados pela aposentadoria compulsória aos
70 anos de idade, assim como os servidores públicos em geral. Tramita, no entanto, no
Congresso Nacional, Proposta de Emenda Constitucional n.º 457/05, de autoria do Senador
Pedro Simon (PMDB/RS), visando à ampliação desse teto compulsório para 75 anos, para os
servidores públicos, na forma de lei complementar, e acrescenta dispositivo ao Ato das
Disposições Constitucionais Transitórias, com efeitos imediatos à situação dos Ministros do
Supremo Tribunal Federal, Tribunais Superiores e Tribunal de Contas da União.
Entre as críticas a essa Proposta, assinalam-se:
122
- O aumento da idade protela a imprescindível renovação dos quadros das cúpulas dos
Tribunais, produzindo como resultado nocivo a paralisação do processo de criação e
renovação da jurisprudência;
- Prejuízo na modernização das práticas gerenciais;
- O prolongamento do tempo médio de permanência dos Ministros dos Tribunais
Superiores no cargo observa o seguinte resultado:
STF: média passará dos atuais 15 para 20 anos
STJ: média passará dos 17 para 22 anos
TST: média passará dos 18 para 23 anos
- O desgaste da estagnação e o desestímulo pela ausência de perspectiva de progressão
na carreira, com efeito cascata nas instâncias inferiores;
- Casuísmo da proposta, por beneficiar imediatamente os poucos magistrados desses
tribunais, considerando apenas os órgãos do Poder Judiciário, para os fins
comparativos aqui analisados;
- Renúncia fiscal, com prejuízo ao Tesouro Nacional, pela prorrogação do abono
permanência instituído pela EC n.º 41/03, caracterizada pela ausência de contribuição
122
ASSOCIAÇÃO DOS MAGISTRADOS BRASILEIROS - AMB, op. cit., 2008, on line.
189
previdenciária pelo tempo que continuarem em atividade, quando já poderiam obter a
aposentadoria voluntária, e pela contribuição que esses mesmos agentes, uma vez
aposentados, passariam a verter aos cofres do regime previdenciário, por força da
Emenda 41 e da Lei n.º 10.877/2004;
- Condicionamento da permanência no cargo a uma nova sabatina pelo Senado
Federal, com afronta à garantia da vitaliciedade adquirida quando do ingresso
nesses tribunais.
Em outros países, com expectativas de vida mais elevadas, o limite de idade não supera
os 70 anos, e ainda há mandatos nas Cortes Constitucionais. Veja-se, exemplificando:
C
ORTE
C
ONSTITUCIONAL
L
IMITES DE
I
DADE
Corte Austríaca
Corte Alemã
Corte Italiana
Conselho Francês
Tribunal Espanhol
Tribunal Português
Corte Belga
Corte Russa
Corte Polonesa
Corte Húngara
70 anos
68 anos
--
--
--
--
70 anos
70 anos
--
70 anos
Quadro 5 Dados dos limites de idade nas Cortes Constitucionais
Fonte: AMB (2008, on line )
Estudo realizado pela Associação dos Magistrados Brasileiros planilhou os dados
pessoais de todos os Ministros do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça
e do Tribunal Superior do Trabalho, projetando o tempo médio de permanência deles nesses
tribunais, pelo sistema atual de aposentadoria compulsória aos 70 anos, e simulação quanto ao
aumento para 75 anos, resultando nos seguintes dados:
MINISTROS DO STF
A
POSENTADORIA AOS
70
ANOS
A
POSENTADORIA AOS
75
ANOS
Ministro
Data Posse
Data
Aposentadoria
aos 70 anos
Tempo
Permanência
no Tribunal
(aposentadoria
aos 70 anos)
Data
Aposentadoria
aos 75 anos
Tempo
Permanência
no Tribunal
(aposentadoria
aos 75 anos)
Ministro I 17 ago. 1989 Novembro 2005 26 anos Novembro 2020 31 anos
190
Ministro II 13 jun. 1990 Julho 2016 26 anos Julho 2021 31 anos
Ministro III 14 dez. 2000 Fevereiro 2018 18 anos Fevereiro 2023 23 anos
Ministro IV 20 jun. 2002 Dezembro 2025 23 anos Dezembro 2030 28 anos
Ministro V 25 jun. 2003 Setembro 2012 9 anos Setembro 2017 14 anos
Ministro VI 25 jun. 2003 Novembro 2012 9 anos Novembro 2017 14 anos
Ministro VII 25 jun. 2003 Outubro 2022 19 anos Outubro 2027 24 anos
Ministro VIII 30 jun. 2003 Agosto 2010 6 anos Agosto 2015 11 anos
Ministro IX 16 mar. 2006 Maio 2018 12 anos Maio 2023 17 anos
Ministro X 21 jun. 2006 Abril 2024 16 anos Abril 2029 21 anos
Ministro XI 5 set. 2007 Setembro 2012 5 anos Setembro 2017 10 anos
Quadro 6 Dados dos Ministros do Supremo Tribunal Federal
Fonte: AMB. Cartilha (2008, on line)
MINISTROS DO STJ
A
POSENTADORIA
AOS
70
ANOS
A
POSENTADORIA
AOS
75
ANOS
Ministro
Data Posse
Data
Aposentadoria
aos 70 anos
Tempo
Permanência
no Tribunal
(aposentadoria
aos 70 anos)
Data
Aposentadoria
aos 75 anos
Tempo
Permanência
no Tribunal
(aposentadoria
aos 75 anos)
Ministro I 27 jun. 1991 Julho 2008 17 anos Julho 2013 22 anos
Ministro II 7 abr. 1989 Abril 2010 26 anos Abril 2015 26 anos
Ministro III 22 maio 1992 Fevereiro 2018 21 anos Fevereiro 2023 31 anos
Ministro IV 19 jun. 1995 Outubro 2014 19 anos Outubro 2019 24 anos
Ministro V 15 dez. 1995 Junho 2008 13 anos Junho 2013 18 anos
Ministro VI 27 jun. 1996 Abril 2010 14 anos Abril 2015 19 anos
Ministro VII 17 dez. 1996 Agosto 2017 21 anos Agosto 2022 26 anos
Ministro VIII 28 maio 1998 Maio 2022 24 anos Maio 2027 29 anos
Ministro IX 29 jun. 1998 Outubro 2014 16 anos Outubro 2019 21 anos
Ministro X 15 abr. 1999 Maio 2011 12 anos Maio 2016 17 anos
Ministro XI 30 jun. 1999 Novembro 2014
15 anos Novembro 2019 20 anos
Ministro XII 30 jun. 1999 Março 2015 16 anos Março 2020 21 anos
Ministro XIII 30 jun. 1999 Maio 2022 23 anos Maio 2027 28 anos
Ministro XIV 27 out. 1999 Outubro 2022 23 anos Outubro 2027 28 anos
Ministro XV 26 jun. 2001 Outubro 2018 17 anos Outubro 2023 22 anos
Ministro XVI 26 jun. 2001 Julho 2012 11 anos Julho 2017 16 anos
Ministro XVII 29 nov. 2001 Abril 2023 22 anos Abril 2028 27 anos
Ministro XVIII 25 mar. 2002 Outubro 2026 24 anos Outubro 2031 29 anos
Ministro XIX 3 dez. 2002 Agosto 2026 24 anos Agosto 2031 29 anos
Ministro XX 8 maio 2003 Agosto 2018 15 anos Agosto 2023 20 anos
191
Ministro XXI 4 jun. 2003 Setembro 2013 10 anos Setembro 2018 15 anos
Ministro XXII 18 nov. 2003 Fevereiro 2011 8 anos Fevereiro 2016 13 anos
Ministro XXIII 19 ago. 2004 Julho 2014 10 anos Julho 2019 15 anos
Ministro XXIV 3 fev. 2005 Novembro 2012
7 anos Novembro 2017 12 anos
Ministro XXV 9 ago. 2006 Outubro 2026 20 anos Outubro 2031 25 anos
Ministro XXVI 6 set. 2006 Outubro 2027 21 anos Novembro 2032 26 anos
Ministro XXVII 23 maio 2007 Dezembro 2015
8 anos Dezembro 2020 13 anos
Ministro XXVIII 12 dez. 2007 Agosto 2014 7 anos Agosto 2019 12 anos
Ministro XXIX 12 dez. 2007 Março 2022 15 anos Março 2022 20 anos
Quadro 7 Dados dos Ministros do Superior Tribunal de Justiça
Fonte: AMB. Cartilha (2008, on line)
MINISTROS DO TST
A
POSENTADORIA
AOS
70
ANOS
A
POSENTADORIA
AOS
75
ANOS
Ministro
Data Posse
Data
Aposentadoria
aos 70 anos
Tempo
Permanência
no Tribunal
(aposentadoria
aos 70 anos)
Data
Aposentadoria
aos 75 anos
Tempo
Permanência
no Tribunal
(aposentadoria
aos 75 anos)
Ministro I Abril 1991 Março 2013 22 anos Março 2018 27 anos
Ministro II Dez.1995 Julho 2009 14 anos Julho 2014 19 anos
Ministro III Agosto 1996 Março 2012 16 anos Março 2017 21 anos
Ministro IV Julho 1996 Janeiro 2023 27 anos Janeiro 2028 32 anos
Ministro V 25 jul. 1998 Fevereiro 2014 16 anos Fevereiro 2019 21 anos
Ministro VI 14 out. 1999 Novembro 2023 24 anos Novembro 2028 29 anos
Ministro VII 14 out. 1999 Maio 2029 30 anos Maio 2034 35 anos
Ministro VIII 31 maio 2000 Setembro 2022 22 anos Setembro 2027 27 anos
Ministro IX 21 jun. 2001 Dezembro 2022 21 anos Dezembro 2027 26 anos
Ministro X 21 jun. 2001 Maio 2018 17 anos Maio 2023 22 anos
Ministro XI 15 abr. 2002 Setembro 2017 15 anos Setembro 2022 20 anos
Ministro XII 30 dez. 2002 Outubro 2017 15 anos Outubro 2022 20 anos
Ministro XIII 7 ago. 2003 Julho 2035 32 anos Julho 2040 37 anos
Ministro XIV 28 dez. 2004 Outubro 2020 16 anos Outubro 2025 21 anos
Ministro XV 21 fev. 2006 Junho 2012 6 anos Junho 2017 11 anos
Ministro XVI 16 mar. 2006 Outubro 2018 12 anos Outubro 2023 17 anos
Ministro XVII 21 fev. 2006 Março 2031 25 anos Março 2036 30 anos
Ministro XVIII 21 fev. 2006 Julho 2031 25 anos Julho 2036 30 anos
Ministro XIX 17 maio 2007 Agosto 2022 15 anos Agosto 2027 20 anos
Ministro XX 17 maio 2007 Março 2021 14 anos Março 2026 19 anos
Ministro XXI 4 out. 2007 Março 2021 14 anos Março 2026 19 anos
Ministro XXII 4 out. 2007 Novembro 2018 11 anos Novembro 2023 16 anos
192
Ministro XXIII 4 out. 2007 Agosto 2028 21 anos Agosto 2033 26 anos
Ministro XXIV 14 nov. 2007 Junho 2022 15 anos Junho 2027 20 anos
Ministro XXV 14 nov. 2007 Fevereiro 2028 21 anos Fevereiro 2033 26 anos
Ministro XXVI 14 nov. 2007 Maio 2023 16 anos Maio 2028 21 anos
Ministro XXVII
27 mar. 2008 Outubro 2036 32 anos Outubro 2041 37 anos
Quadro 8 Dados dos Ministros do Tribunal Superior do Trabalho
Fonte: AMB. Cartilha (2008, on line)
Portanto, a ideia de alternância no Poder e renovação de práticas gerenciais no âmbito
interno do Judiciário não se compatibiliza com a ampliação do limite de idade para a
aposentadoria compulsória aos 75 anos, quer no Primeiro Grau, quer no Segundo Grau de
jurisdição, sendo fundamental para o processo democrático interno que a função jurisdicional
não seja exercida, necessariamente, pelos mesmos agentes, durante longo tempo, perpetuando
e eternizando as estruturas do Poder e desestimulando o fluxo natural de mobilidade das
novas gerações.
4.2.8 Promoção de magistrados por merecimento: critérios
A Constituição Federal de 1988 previu a promoção por merecimento para magistrados,
nos seguintes termos:
Art. 93 Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá
sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios:
I- […]
II- promoção de entrância para entrância, alternadamente, por antigüidade e
merecimento, atendidas as seguintes normas:
a) é obrigatória a promoção do juiz que figure por três vezes consecutivas ou cinco
alternadas em lista de merecimento;
b) a promoção por merecimento pressupõe dois anos de exercício na respectiva
entrância e integrar o juiz a primeira quinta parte da lista de antigüidade desta,
salvo se não houver com tais requisitos quem aceite o lugar vago;
c) aferição do merecimento conforme o desempenho e pelos critérios objetivos de
produtividade e presteza no exercício da jurisdição e pela freqüência e
aproveitamento em cursos oficiais ou reconhecidos de aperfeiçoamento;
d) […]
e) […]
III- o acesso aos tribunais de segundo grau far-se-á por antigüidade e merecimento,
alternadamente, apurados na última ou única entrância.
[…]
XV – […]
As redações da alínea c” do inciso II e a do inciso III do referido normativo foram
determinadas, em parte, pela Emenda Constitucional n.º 45, de 8 de dezembro de 2004.
193
Até então, as promoções por merecimento, no Primeiro Grau de jurisdição, ou para o
acesso aos Tribunais Inferiores eram regidas, na prática, por critérios unicamente
123
subjetivos,
sendo determinante o conceito pessoal formado pelo magistrado e as suas relações
interpessoais, intersociais e interfuncionais, cultivadas ao longo da carreira.
Não raras vezes os nomes sufragados eram conhecidos previamente, atendendo à
lógica das identificações ideológicas com os grupos internos e dominantes do Poder e
influências as mais diversas.
Excepcionalmente, quando remanesciam vagas não disputadas, normalmente em
comarcas inóspitas ou em unidades judiciárias problemáticas, atendia-se aos menos
aquinhoados.
Visando à maior transparência nessas promoções e à implementação das modificações
introduzidas pela Emenda Constitucional n.º 45, o Conselho Nacional de Justiça editou a
Resolução n.º 6, de 13 de setembro de 2005, com a seguinte redação.
RESOLUÇÃO Nº 6, DE 13 DE SETEMBRO DE 2005
Dispõe sobre a aferição do merecimento para promoção de magistrados e acesso aos
Tribunais de 2º grau.
O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, no uso de suas
atribuições, tendo em vista o decidido em Sessão de 30.8.2005, com aprovação na
Sessão de 13.09.2005, e com base no disposto nos incisos II, III, IV, IX e X, do art.
93 e incisos I e II do § do art. 103-B, ambos da Constituição Federal, com a
redação da Emenda Constitucional 45, de 8.12.2004, publicada no Diário Oficial
da União de 31.12.2004,
RESOLVE:
Art. 1º - As promoções por merecimento de magistrados serão realizadas em
sessão pública, em votação nominal, aberta e fundamentada.
Art. 2º - A promoção por merecimento e o acesso aos Tribunais de grau
pressupõem dois anos de exercício na respectiva entrância ou no cargo e integrar o
juiz a primeira quinta parte da lista de antiguidade, salvo se não houver com tais
requisitos quem aceite o lugar vago.
Parágrafo único. É obrigatória a promoção do juiz que figure por três vezes
consecutivas ou cinco alternadas em lista de merecimento.
Art. 3º - O merecimento será apurado e aferido conforme o desempenho e por
critérios objetivos de produtividade e presteza no exercício da jurisdição e pela
freqüência e aproveitamento em cursos oficiais ou reconhecidos de
aperfeiçoamento.
Parágrafo único: Os Tribunais apresentarão aos votantes, antes da sessão, a lista
de magistrados inscritos contendo os elementos necessários para a aferição.
123
São considerados atualmente Tribunais Inferiores: Tribunais de Justiça Estaduais; Tribunais Militares
Estaduais; Tribunais Regionais Federais; Tribunais Regionais do Trabalho; Tribunais Regionais Eleitorais e
Tribunal Distrital Federal e dos Territórios.
194
Art. 4º - No prazo de 120 (cento e vinte) dias, os Tribunais deverão editar atos
administrativos disciplinando:
I - a valoração objetiva de desempenho, produtividade e presteza no exercício da
jurisdição, para efeito de promoção por mérito;
II - a freqüência e o aproveitamento em cursos oficiais ou reconhecidos de
aperfeiçoamento ou especialização de magistrados que serão considerados para fins
de ascensão por mérito, com a respectiva gradação; e
III - aque sejam regulamentados o inciso I do parágrafo único do art. 105 e o
inciso I do § do art. 111-A, ambos da Constituição, os cursos que serão
considerados para fins de promoção por merecimento com a respectiva gradação,
observados, para efeito de participação nesses cursos, critérios de isonomia e de
razoabilidade, respeitado sempre o interesse público.
Parágrafo único: No prazo referido no caput, os Tribunais deverão enviar ao
Conselho Nacional de Justiça cópias dos respectivos atos.
Art. 5º - Durante o prazo referido no artigo anterior e até que sejam editados os
respectivos atos administrativos, os membros dos Tribunais que participarem dos
procedimentos de votação para promoção por merecimento deverão fundamentar
detalhadamente suas indicações, apontando critérios valorativos que levaram à
escolha.
Parágrafo único: Na ausência de especificação de critérios valorativos, que
permitam diferenciar os magistrados inscritos, deverão ser indicados os de maior
antigüidade na entrância ou no cargo.
Art. 6º - Os membros dos Tribunais que participarem dos procedimentos de
promoção por merecimento deverão, nos termos do artigo 93, II, "e" da Constituição
Federal, analisar as razões apresentadas pelo magistrado inscrito, caso ocorra
hipótese de autos de processo em seu poder além do prazo legal.
Art. 7º - Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.
Ministro NELSON JOBIM.
124
Com fundamento nessa Resolução, os Tribunais Inferiores editaram suas próprias
Resoluções e Portarias regulamentadoras, especificando critérios objetivos e subjetivos a
serem respeitados nas futuras promoções por merecimento.
Dentre os critérios objetivos, surgiram inúmeros que eram tipicamente subjetivos,
porque condicionados a escolhas pessoais dos membros dos tribunais, sem nenhuma regra de
isonomia. Assim é que, havia pontuação para o exercício da função de Juiz de Direito
Auxiliar das Corregedorias Gerais de Justiça; Juiz de Direito Auxiliar da Presidência dos
Tribunais de Justiça; Juiz de Direito Coordenador, Vice-Diretor e Ouvidor dos Fóruns da
Capital e Juiz de Direito no exercício das Diretorias dos Fóruns do interior do Estado.
Provocado por magistrados, o Conselho Nacional de Justiça decidiu afastar esses
critérios, conforme Acórdão cuja Ementa foi lavrada nos seguintes termos:
124
BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Resolução nº 6/2006. Disponível em: <http://www.cnj.
jus.br>. Acesso em: 13 dez. 2008.
195
Procedimento de controle administrativo. Magistratura de carreira. Resolução do
Tribunal de Justiça do Estado do Ceará estabelecendo critérios e pontuação para as
promoções por merecimento. Ato administrativo que, fugindo em parte, dos
parâmetros estabelecidos pela Resolução n.º 65/2005 (sic) do CNJ, fixa alguns
critérios com conteúdos preponderantemente subjetivos violando princípio
isonômico. Pontuação pelo exercício das funções de juiz auxiliar da Corregedoria,
da Presidência ou da direção do ‘fórum’ pela forma subjetiva de escolha, viola os
patamares de igualdade. Revisão parcial do ato. Pedido procedente em parte.
125
Com essa decisão, porém, alguns critérios tidos como objetivos continuaram a ser
adotados, embora com intensa carga de subjetividade, tais como: o exercício de Coordenador
Geral de Escola da Magistratura, o exercício da função de Juiz Eleitoral junto ao Tribunal
Regional Eleitoral, o exercício da função de Juiz Convocado para compor o Pleno do Tribunal
de Justiça e a figuração em listas tríplices de promoções.
Para se alcançar a pontuação pelo preenchimento das condições desses critérios pseudo-
objetivos, é preciso que haja nomeações e designações que atendam unicamente à vontade dos
votantes, magistrados de Segundo Grau. Quando muito, exige-se apenas que os candidatos
pertençam à última entrância da carreira, priorizando a escolha sobre os membros das quintas
partes mais antigas.
São tantos os candidatos para as poucas vagas a que se referem os critérios
mencionados,
126
que o exercício democrático da concorrência apenas legitima o processo de
escolha subjetiva que implicará, para os vencedores, a obtenção de pontuação objetiva sobre
“algo que é subjetivo na raiz”.
127
Não obstante a atribuição de pontuação objetiva a critérios tipicamente subjetivos,
percebe-se também a supervaloração de alguns desses critérios, atribuindo-se notas com pesos
125
A Ementa refere-se à Resolução n.º 65/2005 quando na realidade trata-se da Resolução n.º 6/2005. Presume-
se que tenha havido mero erro de digitação. Trata-se de Acórdão no julgamento realizado em 02.05.2006, no
Procedimento de Controle Administrativo n.º 68/2005, em que são requerentes Michel Pinheiro e Marlúcia de
Araújo Bezerra, Juizes de Direito, e requerido o Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, com o seguinte teor:
ACORDAM os Conselheiros que compõem o Conselho Nacional de Justiça, por maioria de votos, decidiu (sic)
deferir em parte o pedido, para o fim de suspender os itens “b”, “c”, “f” e “i” da Resolução n.º 12/2005 editada
pelo Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, nos termos do voto do Excelentíssimo Conselheiro Relator Marcus
Faver, que reconsiderou o seu voto inicial proferido na sessão do dia 21 de março de 2006. Vencidos, em parte,
os Excelentíssimos Conselheiros Paulo Schmidt, Vantuil Abdala, Douglas Rodrigues, Ruth Carvalho e Oscar
Argollo, que deferiram o pedido em maior extensão, suspendendo também os itens “a” e “e” da Resolução n.º
12/2005. Vencidos, ainda, o Excelentíssimo Conselheiro Joaquim Falcão, que julgava inteiramente improcedente
o pedido.
126
As Escolas da Magistratura possuem apenas 1 Juiz Coordenador; os Tribunais Regionais Eleitorais m
apenas 2 Juízes de Direito escolhidos para a sua composição e raramente convocação para preenchimento
provisório de cargos nos tribunais.
127
Expressão contida no voto divergente do Conselheiro Paulo Schmidt, no Procedimento de Controle
Administrativo (P.C.A.) n.º 68/2005, julgado em 2 de maio de 2006.
196
desproporcionais aos demais, criando, com isso, reservas de pontuação positiva, com poucos
beneficiados.
Outra distorção na avaliação desses critérios objetivos, com força subjetiva, é a não
exigência de um período mínimo no exercício das funções sobre as quais incidirá a pontuação.
Assim é que, durante o ano ou o biênio nos quais as funções pontuadas, em regra, são
exercidas, mais de um juiz obtém idêntica pontuação, na mesma função. Os escolhidos para
essas funções praticamente antecipam suas nomeações para os cargos imediatos da carreira.
Razoável seria, portanto, que alguns requisitos mínimos fossem exigidos para os
agraciados com a pontuação inerente a alguns critérios tidos como objetivos, tais como: título
de mestre ou doutor, para o exercício da função de Juiz Coordenador das Escolas da
Magistratura, além de eleição por todos os magistrados da área de atuação dessas escolas;
ampliação do número de votantes e candidatos para as vagas de juízes de direito junto aos
Tribunais Regionais Eleitorais, estendendo esse direito a todos os juízes que exerçam ou
tenham exercido a jurisdição eleitoral no Estado, porque afeitos à mesma matéria, com prática
e desempenho semelhantes; sorteio de um nome, dentre os juízes que integram o primeiro
quinto da antiguidade na última entrância, para ocupar a vaga de juiz convocado para compor,
provisoriamente, o Pleno do Tribunal de Justiça.
Algumas sugestões são propostas com a finalidade de tornar a avaliação desses critérios
algo o mais próximo possível de um ponto de equilíbrio e justiça, destacando-se:
- Manter inalterada a pontuação atribuída à época da vigência da norma
regulamentadora, respeitando o direito adquirido ante as alterações que vierem a ser
implementadas, sem prejuízo da regra mais favorável;
- Ampliar o rol dos critérios objetivos para abranger toda a dimensão funcional e
intelectual do magistrado, incluindo pontuação para outras áreas de graduação e pós-
graduação multidisciplinar, publicação de livros e artigos científicos, nacionais e
internacionais, inseridos em publicações especializadas ou em obras organizadas em
coautoria, com certificações oficiais e o exercício do magistério em qualquer de seus níveis;
- Dimensionar objetivamente a produtividade do magistrado, consoante a complexidade
de sua unidade judiciária, incluindo outros itens no controle estatístico de produção da gestão
judiciária, tais como: atendimento às partes, aos advogados; treinamentos e convocações
197
oficiais; conhecimento, cumprimento e assinatura de ofícios, expedientes, mandados, alvarás
e congêneres, que implicam tempo trabalhado sem realização de atos judiciais; quantidade de
pessoas ouvidas em cada audiência em vez de simples contagem dos atos audienciais;
ampliação do prazo de desempenho estatístico para incluir a média de toda a produtividade na
última entrância e não somente nos últimos meses; cumprimento de metas coletivas; adesão a
mutirões e esforços concentrados diversos; percentual de processos conclusos e sem
julgamento; percentual de precatórias não devolvidas.
- Padronizar, nacionalmente, esses critérios;
- Reduzir os critérios subjetivos a um limite tal que não ultrapasse, na sua pontuação
máxima, vinte e cinco por cento da totalidade da pontuação objetiva facultada ao candidato;
- Disponibilizar a todos os candidatos a documentação que cada um dos concorrentes
utilizou para comprovar o preenchimento dos requisitos objetivos, imprimindo transparência
absoluta ao processo.
4.2.9 Democratização do Conselho Nacional de Justiça e criação de
Ouvidorias estaduais e distrital
Uchôa, comentando sobre a Emenda Constitucional n.º 45 e o modelo de controle
nacional exercido pelo Conselho Nacional de Justiça, lembra que Dallari assim se expressou
ao referir-se às deficiências democráticas no Poder Judiciário:
Quando se fala em democratização, no caso do Judiciário, isso implica duas
exigências fundamentais: em primeiro lugar, a mudança de atitude do Judiciário no
relacionamento com o povo; em segundo, é indispensável considerar igualmente a
mudança interna do Judiciário, em sua organização e seus métodos.
128
Criado com competência para o controle da atuação administrativa e financeira do
Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes, o Conselho Nacional de
Justiça é órgão do Poder Judiciário,
129
híbrido,
130
que exerce um controle tanto externo como
interno desse Poder.
128
DALLARI apud UCHÔA, Marcelo Ribeiro. Controle do Judiciário: da expectativa à concretização. O
primeiro biênio do Conselho Nacional de Justiça. Florianópolis: Conceito, 2008, p. 55.
129
Constituição Federal (1988): “Art. 92. São órgãos do Poder Judiciário: […] I-A o Conselho Nacional de
Justiça”[...]
130
UCHÔA, Marcelo Ribeiro, op. cit., 2008, p. 76.
198
Na composição do Conselho membros de fora da estrutura judiciária (advogados,
Ministério Público, cidadãos indicados pela Câmara dos Deputados e Senado Federal), assim
como representantes do Poder Judiciário (juízes e ministros de tribunais judiciários). É o que
consta na norma constitucional:
Art. 103-B. O Conselho Nacional de Justiça compõe-se de quinze membros com
mais de trinta e cinco e menos de sessenta e seis anos de idade, com mandato de dois
anos, admitida uma recondução, sendo:
I- Um Ministro do Supremo Tribunal Federal, indicado pelo respectivo tribunal;
II- Um Ministro do Superior Tribunal de Justiça, indicado pelo respectivo Tribunal;
III- Um Ministro do Tribunal Superior do Trabalho, indicado pelo respectivo
tribunal;
IV- Um desembargador de Tribunal de Justiça, indicado pelo Supremo Tribunal
Federal;
V- Um juiz estadual, indicado pelo Supremo Tribunal Federal;
VI- Um juiz de Tribunal Regional Federal, indicado pelo Superior Tribunal de
Justiça;
VII- Um juiz federal, indicado pelo Superior Tribunal de Justiça;
VIII- Um juiz de Tribunal Regional do Trabalho, indicado pelo Tribunal Superior do
Trabalho;
IX- Um juiz do trabalho, indicado pelo Tribunal Superior do Trabalho;
X- Um membro do Ministério Público da União, indicado pelo Procurador Geral da
República;
XI- Um membro do Ministério Público estadual, escolhido pelo Procurador Geral da
República dentre os nomes indicados pelo órgão competente de cada instituição
estadual;
XII- Dois advogados, indicados pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do
Brasil;
XIII- Dois cidadãos, de notável saber jurídico e reputação ilibada, indicados um pela
Câmara dos Deputados e outro pelo Senado Federal.
O déficit democrático no Conselho dá-se, primordialmente, pela forma como são
escolhidos os seus membros. Embora haja a participação dos outros dois poderes da
República, uma vez que os indicados são nomeados pelo Presidente da República, após
aprovação da escolha pela maioria absoluta do Senado Federal, a chancela desses poderes é
tida como mera formalidade. Não há previsão constitucional de lista tríplice para a escolha de
um dos nomes apresentados.
O verdadeiro poder na formação da composição desse Conselho está nas mãos das
cúpulas dos Tribunais Superiores, sendo o reflexo da estrutura verticalizada adotada pela
organização judiciária brasileira. Nesse sentido, corrobora Semer, juiz de direito paulista e ex-
presidente da Associação dos Juízes para a Democracia (AJD):
199
[…]
O CNJ acabou se transformando num grande órgão que pode ser uma grande
corregedoria […] Para a AJD, o problema não é ter pessoas de fora participando. O
problema que coloco outra vez é a questão da verticalização. O conselho foi
formado fundamentalmente por indicações dos tribunais superiores. Então ele foi
montado pela cúpula. Isso não é o controle externo, é o controle da pula sobre a base.
131
Assim é que 60% da composição do Conselho, o equivalente a nove membros, é
escolhida por apenas dois Tribunais Superiores da República (o STJ e o TST) e também pelo
Supremo Tribunal Federal. São os membros desses tribunais que escolhem os seus próprios
representantes e os da Justiça Federal, do Trabalho e da Estadual, de Primeiro e Segundo
Graus.
Estranha-se que, embora o Superior Tribunal Militar se submeta ao controle específico
exercido pelo Conselho Nacional de Justiça, tenha sido completamente esquecido pelo
legislador constituinte, não havendo um representante daquela Corte Superior na
composição desse Conselho.
O perfil hierarquizante desse órgão se completa ao se constatar que outros dois
membros desse Conselho são escolhidos pelo Procurador Geral da República, pessoalmente,
sendo que este, por sua vez, é escolhido e nomeado pelo Presidente da República.
Aliás, essa reciprocidade na concentração de poderes também ocorre na formação do
Conselho Nacional do Ministério Público, quando o texto constitucional previu a presença de
dois juízes, indicados um pelo Supremo Tribunal Federal e outro pelo Superior Tribunal de
Justiça.
132
O temor inicial de grande parte da Magistratura, de que pessoas estranhas à estrutura do
Poder Judiciário poderiam interferir na garantia da imparcialidade dos juízes e da
independência da Magistratura não se concretizou, considerando que, através de sua
composição majoritária, o próprio Poder Judiciário, na sua unidade orgânica, exerce esse
controle interno, sem prejuízo das Corregedorias dos próprios órgãos judiciários.
131
SEMER, Marcelo. Sociedade deve participar do planejamento da justiça. Revista Consultor Jurídico, São
Paulo, 12 jun. 2005, [Entrevista]. Dispovel em: <http://www.conjur.com.br/static/text/ 35411,1>. Acesso em: 22
jul. 2008.
132
Constituição Federal (1988): “Art. 130-A. O Conselho Nacional do Ministério Público compõe-se de quatorze
membros nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado
Federal, para um mandato de dois anos, admitida uma recondução, sendo: [...] IV- dois juízes, indicados um pelo
Supremo Tribunal Federal e outro pelo Superior Tribunal de Justiça” [...]
200
Embora a participação da sociedade nesse processo seja minoritária, o advento do
Conselho é um avanço no mecanismo de controle da atividade administrativa, financeira e
disciplinar dos órgãos do Poder Judiciário, com suas decisões repercutindo e se projetando na
prestação jurisdicional, a qual, pela complexidade humana, não consegue se desvencilhar
totalmente de suas imperfeições.
A padronização imposta pelo Conselho afasta discrepâncias personalistas e tende à
aplicação da equidade administrativa, contribuindo para o alcance da otimização gerencial do
Poder. Cezar Peluso, Ministro do Supremo Tribunal Federal, nesse sentido afirmou:
[…]
De modo que, num juízo objetivo e sereno, como convém à matéria e ao interesse
público, a composição do Conselho cujo modelo não pode deixar de ser
‘pluralístico e democrático’ (ZAFFARONI, 2001, p. 130) – estende uma ponte entre
o Judiciário e a sociedade, de um lado permitindo oxigenação da estrutura
burocrática do Poder e, de outro, respondendo às críticas severas, posto nem sempre
de todo justas para com a instituição, que lhe vinham de fora e de dentro, como ecos
da opinião pública. De fora, DALMO DE ABREU DALLARI pregava:
[…] é necessário estabelecer um sistema de controle. É oportuno lembrar aqui a
atitude de Thomas Jefferson, que defendeu com firmeza a independência dos juízes
e tribunais, mas admitiu que tinha medo do corporativismo dos magistrados, o que
pode significar não uma comunhão de interesses, mas também um
relacionamento afetivo. Daí a conveniência de um órgão controlador, integrado, em
sua maioria, por magistrados, mas também por profissionais de outras áreas
jurídicas, como se tem feito para compor bancas examinadoras de concursos de
ingresso na magistratura. Não se pode esquecer que o Poder Judiciário exerce poder
público, age em nome do povo, embora seus membros não sejam escolhidos por
meio de eleição popular. Por isso é necessário um controle democrático de seu
desempenho, que assegure a obediência às regras legais e a prevalência do interesse
público, mantendo o requisito fundamental, que é a garantia da independência dos
juízes. (DALLARI, 2003, p. 33).
De dentro, o Ilustre Min. CELSO DE MELLO era só mais sutil:
Estou cada vez mais convencido da necessidade de controle externo sobre o Poder
Judiciário. Fiscalização e responsabilidade são princípios do modelo republicano. A
fiscalização externa não compromete o princípio da separação dos Poderes. Ela não
quer dizer que se exercer censura sobre o pensamento dos magistrados. A
independência dos juízes deve ser preservada. Mas ela não é uma finalidade em si
própria. É preciso ter juízes independentes para se poder ter cidadãos livres.
(FOLHA DE SÃO PAULO, 11.04.99).
O Judiciário pode enfraquecer se seus membros falharem gravemente no
desempenho das suas funções. Os magistrados devem se expor democraticamente à
crítica social. Nenhum Poder da República está acima da Constituição, nem pode
pretender que sua fisionomia institucional não possa ser redesenhada. (FOLHA DE
SÃO PAULO, 19.03.99).
[…] entendo que a discussão em torno da fiscalização externa torna-se essencial até
mesmo para conferir legitimidade político-social à atividade do magistrado e evitar
que abusos funcionais, que situações de ilicitude que ocorrem lamentavelmente na
intimidade dos corpos judiciários continuem a ocorrer. É preciso fiscalizar.
(MELLO apud SADEK, 2001, p. 132).
201
O real temor gerado pela presença de não-magistrados no Conselho Nacional de
Justiça está em que sua fiscalização ético-disciplinar, num plano de superposição,
transponha os horizontes constitucionais e legais, transformando-se em instrumento
de dominação política da magistratura. Não se deve baratear tão válida preocupação
de que um controle arbitrário corrompa as condições e garantias de imparcialidade
dos juízes e, como tal, desnature a Jurisdição. Mas não se deve tampouco
sobreestimá-la, nem ceder a puras fantasias, como se não dispusesse o sistema de
mecanismos aptos de defesa, com força bastante para neutralizar riscos teóricos.
Neste passo, vale a pena chamar a atenção para o fato de que a própria Emenda
Constitucional 45/2004 contém provisões adequadas a garantir que o exercício do
poder disciplinar se paute por critérios de rigorosa legalidade. Relembre-se, ainda
uma vez, que a maioria qualificada de membros do Conselho é formada de juízes e,
pois, de pessoas insuspeitas à magistratura, aprovadas e experimentadas no ofício de
aplicar a lei. Donde é lícito crer que tal maioria constitua o primeiro elemento
regulador da retidão e legitimidade do uso do poder de controle atribuído ao órgão.
Acresça-se-lhe a circunstância, não menos significativa, de que a função de
Ministro-Corregedor é destinada ao Ministro representante do Superior Tribunal de
Justiça (art. 103-B, § 5º).
Mas até a minoria, composta por não-magistrados, é tida, sob vigorosa presunção
hominis, por afeita às atividades jurisdicionais, não no caso manifesto dos
representantes do Ministério Público e da advocacia, senão também no dos dois
cidadãos que, indicados pelo Legislativo, devam, à moda dos candidatos a esta Corte
(art. 101 da Constituição da República), possuir ‘notável saber jurídico e reputação
ilibada […]
133
Propõe-se, portanto, para a ampliação democrática da concepção desenhada pela
Constituição Federal para o Conselho Nacional de Justiça, o seguinte:
- A democratização do processo de escolha dos membros do Conselho Nacional de
Justiça, permitindo que cada instância judiciária representada no Conselho seja eleita por seus
próprios membros, mediada a seleção pelas associações classistas específicas;
- A necessária descoincidência entre a posição de Presidente do Supremo Tribunal
Federal, do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal Superior do Trabalho e a de membro
do Conselho, a fim de se evitar o risco de decisões sempre convergentes, desnaturando o
controle específico sobre aquelas Cortes e a concentração de poder;
- A escolha dos cargos diretivos do Conselho (Presidente e Corregedor), por seus
próprios membros, sendo o de Presidente escolhido dentre os membros do Poder Judiciário e
o de Corregedor, dentre o restante da composição;
- A eleição dos representantes do Ministério Público por seus próprios pares, vedada a
acumulação com o cargo de Procurador Geral da República;
133
PELUSO, Cezar. Voto na Ação Direta de Inconstitucionalidade n.º 3.367-1/DF. Disponível em:
<http://www.stf.gov.br/noticias/imprensa/VotoPelusoADI3367.pdf>. Acesso em: 31 maio 2008.
202
- A inclusão de representantes da Justiça Militar, na mesma proporção das demais
competências judiciárias;
- A criação das ouvidorias
134
previstas no § 7º, do Art. 103-B, da Constituição Federal,
como forma de descentralização do recebimento de reclamações e denúncias de qualquer
interessado contra membros ou órgãos do Poder Judiciário, ou contra seus serviços auxiliares,
com composição democrática, sem prejuízo da competência originária do Conselho Nacional
de Justiça para algumas matérias específicas.
4.2.10 Distribuição equitativa de servidores e cargos comissionados nas
unidades judiciárias
Para se obter a prestação jurisdicional, muitos agentes colaboram: o servidor público, o
advogado, o defensor público, o representante do Ministério Público, o juiz.
Por isso, de nada adiantará um juiz-produtor se os outros elos da cadeia produtiva não se
integrarem. Haverá atos judiciais sem serem cumpridos, audiências não realizadas, tudo por
falta de servidores, defensores ou membros do Ministério Público.
No plano estrito do Poder Judiciário, é preciso que haja democratização na distribuição
de servidores efetivos, terceirizados, estagiários e comissionados. Essa equidade se
mediante o levantamento de dados estatísticos por padrão de Unidade Judiciária (varas,
juizados, turmas, câmaras, seções), mensurando e valorando o acervo processual, a
complexidade e a emergência das pretensões e interesses e as peculiaridades do local da
prestação jurisdicional.
Identificados os diversos perfis e necessidades, convém que, implementando a
independência administrativa e o autogoverno da Magistratura, possa o Judiciário
134
A atual Constituição Estadual do Ceará prevê nos Arts. 94, II, e 106 das Disposições Permanentes e no Art.
15 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (A.D.C.T.), a criação do Conselho de Justiça Estadual,
como órgão do Poder Judiciário Estadual, para supervisão administrativa, orçamentária e de acompanhamento da
regularidade do funcionamento dos órgãos da Justiça e do exercício funcional dos magistrados, com a
composição e as atribuições estabelecidas em lei complementar. A inconstitucionalidade desses dispositivos foi
arguída pelas ADIns n.º 136-1 e 251-1, com liminar suspensiva do efeito do Art. 106. A súmula 649 do S.T.F.
dispõe que “ é inconstitucional a criação, por Constituição Estadual, de órgão de controle do Poder Judiciário do
qual participem representantes de outros Poderes ou entidades”.
203
disponibilizar a cada juiz mecanismos para “gerenciar com autonomia os elementos pessoais e
os meios materiais e financeiros imprescindíveis ao exercício da função jurisdicional”.
135
Essa infraestrutura funcional-administrativo-financeira mínima deve ser inerente ao
juízo e não ao juiz, evitando discriminações e personalismos que possam comprometer a
independência do magistrado. O fato é relevante na medida em que, sendo essa competência
administrativa exercida privativamente, ou por delegação legal, pelos magistrados diretores de
Fóruns, cria-se uma relação de poder que compromete a prestação jurisdicional propriamente
dita, se acaso houver desvirtuamento, em face de querelas pessoais.
Imagine-se, por exemplo, uma unidade jurisdicional de onde são remanejados
servidores, sem reposição de substitutos, ao talante exclusivo da autoridade detentora da
competência para tanto. Acresça-se, ainda, a ausência de assessorias especializadas,
normalmente confiadas a ocupantes de cargos ou funções comissionados. Como avaliar,
igualmente, para efeito de desempenho funcional nas promoções por merecimento ou pelo
simples direito ao pleno desempenho de suas funções jurisdicionais, juízes submetidos a
situações distintas? A qualidade e a quantidade da prestação jurisdicional serão as mesmas? A
sociedade estará igualmente satisfeita? E o magistrado, desassistido administrativamente,
agirá com sinergia na Instituição?
Portanto, que se definir, a priori, um quadro funcional fixo e transitório, atendendo-
se a requisitos objetivos mínimos, tecnicamente estabelecidos para cada Unidade
Jurisdicional, sendo isso um direito inerente ao exercício da jurisdição, sem o qual não haverá
efetividade do princípio da isonomia entre os magistrados e os pleitos formulados ao Poder
Judiciário.
4.2.11 Permuta interestadual entre juízes
A permuta entre magistrados estaduais, federais, trabalhistas e militares, vinculados a
tribunais diferentes, é objeto de reflexão no plano da democratização interna do Poder
Judiciário.
O entendimento jurídico atual é o de que apenas juízes federais e trabalhistas podem
efetuar permutas ou remoções entre tribunais diferentes e com a mesma competência
constitucional, enquanto o mesmo não é permitido aos juízes estaduais.
135
ROCHA, José de Albuquerque, op. cit., 1996, p. 112.
204
Algumas observações a esse respeito são formuladas, com argumentação razoável para
a ampliação do posicionamento jurisprudencial. Nesse sentido, alega-se:
- O Poder Judiciário tem caráter nacional e regime orgânico unitário;
- O ordenamento jurídico é idêntico em todo o território nacional;
- O idioma oficial é único;
- Não regras diferenciadoras para o exercício do duplo grau de jurisdição em relação
a todas as instâncias recursais;
- A forma federativa adotada pela Constituição Federal de 1988 atribui autonomia a
todos os Estados, igualmente;
- As prerrogativas constitucionais dos magistrados são as mesmas em todo o país;
- Os juízes não são eleitos e, portanto, não vinculação direta à vontade política do
eleitor;
- A estruturação das carreiras, as regras de ascensão funcional e a fixação de subsídios,
embora se sujeitem ao autogoverno de cada tribunal estadual, obedecem obrigatoriamente a
critérios gerais consagrados na Constituição Federal e tendentes, progressivamente, à
uniformização;
- A mobilidade dos membros do Poder Judiciário é benéfica para a sua organicidade,
assim como para o aperfeiçoamento da função judiciária;
- Não há direitos e deveres absolutos sobre os quais não se comporte a ideia de
relativização, sendo certo que até mesmo a ideia de soberania, una e indivisível, hoje não é
rigorosamente defensável, ante o conceito de universalização de direitos fundamentais e
blocos supranacionais;
- Circunstâncias personalíssimas inerentes ao exercício funcional, tais como a segurança
pessoal do magistrado e a unidade e defesa do núcleo familiar são princípios insertos no texto
constitucional;
- A mitigação da autonomia dos tribunais e a renúncia a direitos funcionais devem
admitir flexibilidade consensual;
205
- A isonomia com os demais membros do Poder Judiciário federal é paradigma e
precedente a ser perseguido.
O Conselho Nacional de Justiça, no julgamento do Pedido de Providências n.º
465/2006, em 8 de agosto de 2006, tendo como requerente a Associação dos Magistrados do
Estado de Goiás, relatado pelo Conselheiro Alexandre de Moraes, a pretexto do tema,
respondeu negativamente à consulta formulada por aquela associação, no sentido da
impossibilidade de remoção por permuta, mesmo com aquiescência das partes, de juízes
vinculados a tribunais estaduais diversos.
Aduziu o Conselho, na oportunidade, que a organização da Justiça Estadual deve
absoluto respeito às regras federalistas da auto-organização, do autogoverno e da
autoadministração (CF/88, Arts. 93, 96 e 125).
Para o Conselho, não há um único Poder Judiciário Estadual, mas sim a Justiça Estadual
como um dos importantes ramos da Justiça Brasileira, exercida pelos Tribunais de Justiça
estaduais e por seus juízes vinculados administrativamente, sem qualquer vaso comunicante
administrativo ou jurisdicional, entre eles.
Assim sendo, entendeu o Conselho que a permuta por remoção entre juízes estaduais de
tribunais diferentes corresponderia à transferência, que é forma de ingresso em carreira
diversa daquela para a qual o servidor público ingressou por concurso, hipótese absolutamente
vedada pelo Artigo 37, inciso II, do texto constitucional. Em sua fundamentação, afirmou o
conselheiro-relator:
[...] os Estados que ingressam na federação perdem sua soberania no momento
mesmo do ingresso, preservando, contudo, uma autonomia política limitada [...]
A adoção da espécie federal de Estado gravita em torno do princípio da autonomia e
da participação política e pressupõe a consagração de certas regras constitucionais,
tendentes não somente à sua configuração, mas também à sua manutenção e
indissolubilidade.
[…]
A autonomia estadual também se caracteriza pelo autogoverno, uma vez que é o
próprio povo do Estado quem escolhe diretamente seus representantes nos Poderes
Legislativo e Executivo locais, e regulamenta, por meio de sua constituição estadual,
seu Poder Judiciário, sem que haja qualquer vínculo de subordinação ou tutela por
parte da União.
[…]
Dessa forma, o caráter nacional do Poder Judiciário […] não se confunde com a
existência de um único ramo do Poder Judiciário estadual, o que flagrantemente
desrespeitaria a forma federativa adotada pelo Poder Constituinte originário.
206
[…]
A remoção a pedido ou a permuta de magistrados de comarca de igual entrância
somente podem ocorrer no âmbito administrativo do Tribunal de Justiça ao qual o
magistrado ou magistrados estejam vinculados, sob pena de centralizarmos uma
Justiça estadual que é Nacional, porém FEDERALISTA.
136
O Supremo Tribunal Federal, porém, na oportunidade do julgamento da ão Direta de
Inconstitucionalidade n.º 3.367-1/DF, relatada pelo Ministro Cezar Peluso, tendo como
requerente a Associação dos Magistrados Brasileiros, e requerido o Congresso Nacional, a
qual questionou, essencialmente, a constitucionalidade da criação do Conselho Nacional de
Justiça, como órgão funcionalmente voltado ao controle da atuação administrativa e
financeira do Judiciário e ao cumprimento dos deveres funcionais dos magistrados, assentou
entre os fundamentos decisórios de improcedência daquela ação,
137
que:
[…]
O pacto federativo não se desenha nem expressa, em relação ao Poder Judiciário, de
forma normativa idêntica à que atua sobre os demais Poderes da República. Porque a
jurisdição, enquanto manifestação da unidade do poder soberano do Estado,
tampouco pode deixar de ser una e indivisível, é doutrina assente que o Poder
Judiciário tem caráter nacional, não existindo, senão por metáforas e metonímias,
Judiciários estaduais’ ao lado de um ‘Judiciário federal’.
A divisão da estrutura judiciária brasileira, sob tradicional, mas equívoca
denominação, em justiças, é o resultado da repartição racional do trabalho da
mesma natureza entre distintos órgãos jurisdicionais. O fenômeno é corriqueiro, de
distribuição de competências pela malha de órgãos especializados, que, não obstante
portadores de esferas próprias de atribuições jurisdicionais e administrativas,
integram um único e mesmo Poder. Nesse sentido fala-se em Justiça Federal e
Estadual, tal como se fala em Justiça Comum, Militar, Trabalhista,
Eleitoral, etc., sem que com essa nomenclatura ambígua se enganem hoje os
operadores jurídicos.
138
(grifo original).
136
BRASIL. Conselho Nacional de Justiça - C.N.J. Pedido de Providências n.º465/2006. Disponível em:
<http://www.cnj.jus.br>. Acesso em: 13 nov. 2008.
137
Acórdão da ADI 3.367/DF: “Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo
Tribunal Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata de julgamento e das notas taquigráficas, por
unanimidade, em afastar o vício formal de inconstitucionalidade da Emenda Constitucional n.º 45/2004, como
também não conhecer da ação quanto ao § 8º, do Art. 125. E, no mérito, por maioria, em julgar totalmente
improcedente a ação, vencidos o Senhor Ministro MARCO AURÉLIO, que a julgava integralmente procedente;
a Senhora Ministra ELLEN GRACIE e o Senhor Ministro CARLOS VELLOSO, que julgavam parcialmente
procedente a ação para declarar a inconstitucionalidade dos incisos X, XI, XII e XIII do Artigo 103-B.,
acrescentado pela emenda constitucional e o Ministro SEPÚLVEDA PERTENCE, que a julgava procedente, em
menor extensão dando pela inconstitucionalidade somente do inciso XIII do caput do art. 103-B. Votou o
Presidente, Ministro NELSON JOBIM. Falaram, pela requerente, o Dr. ALBERTO PAVIE RIBEIRO, pela
Advocacia-Geral da União, o Dr. ÁLVARO AUGUSTO RIBEIRO COSTA e, pelo Ministério Público Federal,
o Dr. CLÁUDIO LEMOS FONTELES, Procurador-Geral da República. Brasília, 13 de abril de 2005. Nelson
Jobim – Presidente. Cezar Peluso – Relator.” BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão da ADI nº
3.367/DF. Disponível em: <http://www.stf.gov.br/noticias/imprensa/VotoPelusoADI3367.pdf>. Acesso em: 12
nov. 2008.
138
BRASIL. STF. ADI n.º 3.367/DF. Voto do Ministro Relator Cezar Peluso. Disponível em:
<http://www.stf.gov.br/noticias/imprensa/VotoPelusoADI3367.pdf.>. Acesso em: 12 nov. 2008.
207
Fundando-se em doutrina de João Mendes Júnior, Castro Nunes, Antônio Carlos de
Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e Cândido Rangel Dinamarco, Cezar Peluso
acrescenta:
[…]
Negar a unicidade do Poder Judiciário importaria desconhecer o unitário tratamento
orgânico que, em termos gerais, lhe a Constituição da República. Uma única lei
nacional, um único estatuto, rege todos os membros da magistratura,
independentemente da qualidade e denominação da Justiça em que exerçam a
função (Lei Complementar n.º 35, de 14.03.1979; Art. 93, caput da CF). A todos
aplicam-se as mesmas garantias e restrições, concebidas em defesa da independência
e da imparcialidade. Códigos nacionais disciplinam o método de exercício da
atividade jurisdicional, em substituição aos códigos de processo estaduais.
Por força do sistema recursal, u’a mesma causa pode tramitar da mais longínqua
comarca do interior do país, até os tribunais de superposição, passando por órgãos
judiciários das várias unidades federadas. E, para não alargar a enumeração de
coisas tão conhecidas, relembre-se que a União retém a competência privativa para
legislar sobre direito processual (Art. 22, inc.I).
Nesse diagrama constitucional, nunca se ouviu sustentar que as particularidades
concretas da estrutura judiciária violassem o pacto federativo. E não se ouviu,
porque perceptível sua natureza nacional e unitária, embora decomposta e
ramificada, por exigências de racionalização, em múltiplos órgãos dotados de sedes
e de âmbitos distintos de competência. Não se descobre, pois, sob esse ângulo, por
que a instituição do Conselho Nacional de Justiça não se ajustaria à organização
constitucional do Poder.
139
E continua Cezar Peluso em seu voto:
Não se quer com isso afirmar que o princípio federativo não tenha repercussão na
fisionomia constitucional do Judiciário. Sua consideração mais evidente parece estar
à raiz da norma que delega aos Estados-membros competência exclusiva para
organizar sua Justiça, responsável pelo julgamento das causas respeitantes a cada
unidade federada (Art. 125) […]
[…]
Não é, como tentei demonstrar, imutável o conteúdo concreto da forma federativa.
As relações de subordinação vigentes na estrutura do Judiciário, dado seu caráter
nacional, como o reconhece a autora (item 51 da inicial), podem ser ampliadas e
desdobradas pelo constituinte reformador, desde que tal reconfiguração não rompa o
núcleo essencial das atribuições do Poder em favor de outro. E foram redefinidas
pela Emenda n.º 45, sem usurpação de atribuições por outro Poder, nem sacrifício da
independência. A redução das autonomias internas, atribuídas a cada tribunal, não
contradiz, sob nenhum aspecto, o sistema de separação e independência dos Poderes.
A Corte cansou-se de proclamar que não são absolutas nem plenas as autonomias
estaduais, circunscritas pela Constituição (Art. 25), porque, se o fossem, seriam
soberanias. […]
[…]
O Conselho não anula, antes reafirma o princípio federativo.
[…]
O Poder Judiciário é nacional e, nessa condição, rege-se por princípios unitários
enunciados pela Constituição, a qual lhe predefine ainda toda a estrutura orgânica,
139
Id. ADI n.º 3.367/DF.
208
sem prejuízo das competências que delega a cada um dos grandes ramos nela
previstos. Seu funcionamento obedece, em todos os níveis, a leis processuais uniformes,
editadas exclusivamente da Uno (art. 22, inc. I), e funcional (art. 93, caput).
140
Percebe-se, assim, que para a criação do Conselho Nacional de Justiça, não se
entenderam como maculados as garantias da independência do juiz e da Magistratura; a
autonomia federativa dos Estados-membros; o autogoverno do Poder Judiciário estadual; as
regras do Direito Administrativo, no tocante à discricionariedade dos atos administrativos
locais; e, enfim, o princípio Democrático do Estado de Direito.
O Conselho surge, inclusive, como instância original ou recursal de questões que
continuam a ser apreciadas pelos Conselhos Estaduais da Magistratura, pelas Corregedorias
de Justiça dos diversos tribunais, pelo Conselho da Justiça Federal (Art. 105, parágrafo único,
inciso I CF/88) e pelo Conselho Superior da Justiça do Trabalho (Art. 111-A, § 2º, inciso II
– CF/88), algumas delas com superposição de atribuições e competências.
O problema nessa polêmica consiste na acomodação jurídica da possibilidade de
permuta ou remoção, entre Estados diferentes, de juízes pertencentes à Carreira da
Magistratura estadual. Vejam-se, então, algumas conceituações administrativas sobre Cargo
Público, Classe, Carreira, Quadro e Cargo de Carreira.
Cargo público é o lugar instituído na organização do serviço público, com
denominação própria, atribuições e responsabilidades específicas e estipêndio
correspondente, para ser provido e exercido por um titular, na forma estabelecida em
lei.
Classe É o agrupamento de cargos da mesma profissão, e com idênticas
atribuições, responsabilidades e vencimentos. As classes constituem os degraus de
acesso na carreira.
Carreira – É o agrupamento de classes da mesma profissão ou atividade, escalonadas
segundo a hierarquia do serviço, para acesso privativo dos titulares dos cargos que a
integram, mediante provimento originário. O conjunto de carreiras e de cargos
isolados constitui o quadro permanente do serviço dos diversos Poderes e
órgãos da Administração Pública. As carreiras iniciam-se e terminam nos
respectivos quadros.
Quadro É o conjunto de carreiras, cargos isolados e funções gratificadas de um
mesmo serviço, órgão ou Poder. O quadro pode ser permanente ou provisório, mas
sempre estanque, não admitindo promoção ou acesso de um para outro.
Cargo de Carreira É o que se escalona em classes, para acesso privativo de seus
titulares, até o da mais alta hierarquia profissional.
141
O preenchimento do cargo público, com a designação de seu titular, dá-se por
Provimento, o qual pode ser originário ou inicial e derivado. O provimento inicial dá-se por
140
Id. ADI n.º 3.367/DF.
141
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 26. ed. atualizada por Eurico de Andrade
Azevedo, Délcio Balesteiro Aleixo e José Emmanuel Burle Filho. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 387-389.
209
nomeação e o derivado, por transferência, promoção, remoção, acesso, reintegração,
readmissão, enquadramento, aproveitamento ou reversão.
142
Segundo Meirelles:
Em razão do art. 37, II, da CF, qualquer investidura em carreira diversa daquela em
que o servidor ingressou por concurso é, hoje, vedada […] a única reinvestidura
permitida sem concurso é a reintegração, decorrente da ilegalidade do ato de
demissão.
143
Com base nesses conceitos, poder-se-ia afirmar que o cargo público (Juiz de Direito), de
carreira (Magistratura Estadual), provido por concurso público (provimento inicial), é único
em todo o país, “pelo princípio da unidade do Judiciário como Poder nacional”
144
e que a
carreira de magistrado estadual é única, embora organizada por leis estaduais distintas.
Se o Supremo Tribunal Federal decidiu que a criação do Conselho Nacional de Justiça é
compatível com a regra constitucional que faculta a cada Estado organizar, fiscalizar e
disciplinar o seu Poder Judiciário, inclusive interferindo nesse processo, não é razoável que
esse entendimento dificulte o direito de esses Estados relativizar a sua autonomia e fazer
constar em suas leis e constituições a possibilidade de permutas e remoções entre juízes
interessados. Eventuais distorções de subsídios e de enquadramentos funcionais seriam
resolvidas com as renúncias pessoais e mútuas, sobre as quais se comentou no item que
abordou a mitigação das garantias constitucionais dos juízes.
A se pensar diferente, também deveria ser proibida a incorporação do tempo de serviço
público, de qualquer espécie, para fins de aposentadoria e demais vantagens, na carreira do
magistrad o, independente da vinculação a órgão ou poder público anterior. Hoje é pacífico
que o tempo de serviço público prestado à administração direta, indireta, autárquica ou
fundacional, de qualquer ente Federal, Estadual ou Municipal, será aproveitado no somatório
do período total de serviço público do beneficiário.
Outros precedentes permissionários para a remoção e permuta entre juízes de tribunais
distintos já ocorreram na Justiça Federal e na Justiça do Trabalho.
Nesse sentido, o Conselho da Justiça Federal regulamentou, mediante Resolução,
145
a
permuta e remoção de Juízes Federais e de Juízes Federais Substitutos da Justiça Federal de
142
Ibid., 2001, p. 392.
143
Ibid., 2001, p. 393.
144
BRASIL. STF. ADI n.º 3.367/DF, op. cit., p. 50.
145
BRASIL. Resolução n.º 8, de 28 novembro de 1989, do Conselho de Justiça Federal. Diário da Justiça,
Brasília, DF, 30 nov. 1989, p. 17.738, Seção I. Disponível em: <http://daleth2.cjf.jus.br/download/res008.pdf>.
Acesso em: 13 nov. 2008.
210
Primeiro Grau, de uma para outra Região, uniformizando os procedimentos atinentes à
matéria, condicionando-as à anuência dos Tribunais Regionais interessados, à identidade de
cargo com mesma natureza e denominação, ao princípio da publicidade e do amplo acesso aos
juízes interessados e à garantia da antiguidade, resolvendo-se as relocalizações por via de ato
administrativo.
Igualmente, o Conselho Superior da Justiça do Trabalho expediu Resolução regulando o
exercício do direito de remoção, a pedido, de Juiz do Trabalho Substituto, entre Tribunais
Regionais do Trabalho,
146
atendendo ao disposto no Art. 93, inciso VIII-A, da Constituição
Federal de 1988, e ao valor, também constitucional, de proteção à família, com regras e
condições, em suma, assemelhadas às adotadas pelo Conselho da Justiça Federal.
Nesses exemplos anteriores, os Tribunais Regionais Federais e do Trabalho também têm
autonomia para o exercício de seu autogoverno, porém, consensualmente, podem decidir
sobre esses deslocamentos funcionais.
O que talvez esteja faltando na organização judiciária estadual seja a criação de um
Conselho das Justiças Estaduais, que funcionaria junto ao Superior Tribunal de Justiça, a
exemplo do Conselho de Justiça Federal, considerando o fato de que o STJ é formado não
por membros egressos da Magistratura Federal, mas também da Estadual, da Advocacia e do
Ministério Público.
De qualquer forma, se diversas são as leis estaduais criadoras de cargos na Magistratura
estadual, o mesmo ocorre na federal e na trabalhista, servindo esses Conselhos como órgãos
de aglutinação entre carreiras semelhantes.
O argumento de que o subsídio dos magistrados estaduais não é semelhante em todos os
Estados, mesmo entre os ocupantes de comarcas da mesma entrância ou complexidade,
também não subsiste, considerando que essa compatibilidade pode ser convencionada pelos
tribunais e beneficiários interessados, dentro de suas autonomias e renúncias pessoais.
Ademais, não tardará para que os Poderes Judiciários estaduais unifiquem em uma mesma
estruturação de carreira a nomenclatura, a classe e os subsídios de seus cargos, inclusive os
critérios de promoção por merecimento. Isso facilitará a operacionalização do princípio da
146
BRASIL. Conselho Superior da Justa do Trabalho. Resolão n.º 21, de 23 de maio de 2006. Disponível em:
<http://informatica.jt.gov.br/pls/portal/docs/PAGE/ASGP/LEGISLACAO/21REMOCAODEJUIZESVERSAOA
TUALIZADADOC>. Acesso em: 13 nov. 2008.
211
unidade do Poder Judiciário, sem perda de autonomias e de distribuição de competências, mas
com a mobilidade necessária para a integração desse ramo do Poder Judiciário nacional.
O Art. 93, inciso VIII-A, da Constituição Federal de 1988, ao dispor que “a remoção a
pedido ou a permuta de Magistrados de comarca de igual entrância atenderá, no que couber,
ao disposto nas alíneas ‘a’, ‘b’, ‘c’ e ‘e’ do inciso II”, mencionou os termos comarca e
entrância, terminologia típica da Justiça Estadual, no entanto, são a Justiça Federal e a do
Trabalho que têm fundamentado suas Resoluções regulamentadoras de permutas e remoções
entre juízes, com base nesse dispositivo.
Quem sabe, quando esse consenso jurídico-político for aceito, possam os Estados-
membros da Federação otimizar a produção jurisdicional e o preenchimento de cargos de Juiz
de Direito vagos em diversos tribunais estaduais, de modo a integrar culturalmente este
grande País, trocar experiências efetivas, suprir uns aos outros em suas deficiências, eliminar
as barreiras coloniais que ainda separam Estados pobres e ricos, sulistas e nortistas,
interioranos e litorâneos, aproximar núcleos familiares, contribuir para o exercício com
segurança da função jurisdicional, “falar a mesma língua e aplicar o mesmo ordenamento
jurídico”.
Tudo é uma questão de interpretação da norma jurídica e de esforço democratizante no
Poder.
4.2.12 Publicização de decisões, acórdãos e despachos: a comunicação
eletrônica
Se para a sociedade, em geral, e as partes envolvidas no processo, em particular, a
publicização de decisões, acórdãos e despachos, inclusive por meio eletrônico, atende ao
princípio do devido processo legal, especificamente, e ao princípio do Estado Democrático de
Direito, para todos o que têm interesse no controle difuso do Poder Judiciário, no plano da
democratização interna desse Poder essa prática favorece a difusão de ideias e informações,
possibilitando a otimização dos serviços judiciários prestados pelos magistrados e servidores
auxiliares.
Embora os atos judiciais tenham características evidenciadas por limites objetivos e
subjetivos, em uma sociedade de massas e pluralista é comum que muitos pedidos sejam
212
semelhantes, assim como as necessidades subjetivas, as pretensões, as resistências e as
declarações dos interessados.
Com base nessa constatação, algumas instituições que atuam junto ao Poder Judiciário –
Ministério Público, Procuradorias Judiciais, Defensorias e Advocacias Públicas elaboram
peças processuais sob a forma de minutas padronizadas, facilitando e socializando o trabalho
intelectual produzido, o que contribui para a formação de um banco de ideias, opiniões,
pareceres, defesas etc., disponibilizado em tempo real na rede eletrônica de computadores,
gerando uma memória institucional atualizada e interativa, reduzindo o tempo e concentrando
esforços para a redação das manifestações processuais.
A introdução do processo judicial eletrônico, criado pela Lei n.º 11.419, de 19 de
dezembro de 2006, possibilitou o uso de meio eletrônico na tramitação de processos judiciais,
comunicação de atos e transmissão de peças processuais, nos seguintes termos:
Art. 1º [...]
§ 2º Para o disposto nessa Lei, considera-se:
I Meio eletrônico qualquer forma de armazenamento ou tráfego de documentos e
arquivos digitais;
II Transmissão eletrônica toda forma de comunicação à distância com a utilização
de redes de comunicação, preferencialmente a rede mundial de computadores;
III Assinatura eletrônica as seguintes formas de identificação inequívoca do
signatário:
a) assinatura digital baseada em certificado digital emitido por Autoridade
Certificadora credenciada, na forma da lei específica;
b) mediante cadastro de usuário no Poder Judiciário, conforme disciplinado pelos
órgãos respectivos.
147
Ainda nos termos dessa Lei,
Art. - Os tribunais poderão criar Diário da Justiça eletrônico, disponibilizado em
sítio da rede mundial de computadores, para publicação de atos judiciais e
administrativos próprios e dos órgãos a eles subordinados, bem como comunicações
em geral.
[...]
§ - A publicação eletrônica na forma deste artigo substitui qualquer outro meio e
publicação oficial, para quaisquer efeitos legais, à exceção dos casos que, por lei,
exigem intimação ou vista pessoal.
147
BRASIL. Congresso Nacional. Lei nº 11.419, de 19 de dezembro de 2006. Dispõe sobre a
informatização do processo judiciário; altera a Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 e dá outras
providências, Brasilia/DF, 2006.
213
Esse avanço tecnológico adotado pelo Poder Judiciário contribuirá para a
desmaterialização do processo, com a sua consequente virtualização, levando a sociedade a
níveis de inclusão digital elevados e complexos, com controles estatísticos os mais diversos,
criando um aparato cibernético com custo social, segurança material e operacionalização,
ainda difícil de se mensurar em toda a sua extensão.
De qualquer forma, tudo caminha para esse rtice. Não retrocesso nesses sistemas
de monitoramento. Convém que se aproveite o que nele de melhor, como a celeridade, a
uniformidade possível, a eficiência na gestão de informações, a mobilidade das pessoas
envolvidas, a interligação com outras redes eletrônicas que têm conexão direta com os
problemas do judiciário (cadastros de veículos, sistema bancário, órgãos fazendários,
cartórios, juntas comerciais, presídios, delegacias, polícias, órgãos públicos em geral,
instituições sociais públicas e privadas, comunidades etc.)
O que é importante nesse novo horizonte processual é que os sistemas de
armazenamento de informações possuam uma gestão tal, que todos os seus usuários
autorizados tenham a mesma disponibilização, inclusive com direito aos dados mais
atualizados e pormenorizados, considerando que os meios físicos de pesquisa ficarão cada vez
mais escassos.
Necessário, portanto, que os tribunais e órgãos que atuam junto ao Poder Judiciário
mantenham atualizados os seus endereços eletrônicos, tornando-os didaticamente acessíveis,
com o maior número possível de informações, disponibilizando ao internauta-operador toda a
variedade de conexões e links que o possibilite realizar consultas e pesquisas sobre os mais
diversos temas do direito.
Nesse sentido, novos profissionais migrados de funções tradicionais ou contratados com
habilidades específicas deverão ser, majoritariamente, os futuros servidores públicos, com
formação multidisciplinar ou estritamente especializada. Serão eles responsáveis não tanto por
gerir pessoas e problemas humanos, mas sistemas complexos de informática, redes de
conexão, máquinas e equipamentos, prestadores de serviços de manutenção dessa parafernália
eletrônica, controles estatísticos e metas produtivas, cada vez mais arrojadas.
O novo sistema de gestão eletrônica do processo judicial depara-se com esse paradoxo:
democratizar pela tecnologia o aparelho jurisdicional, mas não sucumbir diante dessa nova
burocracia eletrônica, que sob a aparência da eficiência e da tecnicidade pode transformar a
214
aplicação da norma jurídica e a efetivação do direito e da Justiça em um novo mito, com o
símbolo da pós-modernidade.
4.2.13 Ampliação e descentralização do acervo bibliográfico dos tribunais:
uma proposta cooperativa
É comum a existência de bibliotecas nos tribunais. O que dizer, então, das comarcas, no
Primeiro Grau de Jurisdição?
É preciso que o acervo bibliográfico do Poder Judiciário seja descentralizado por todos
os seus órgãos, abrangendo não os tribunais e as entrâncias ou juízos das capitais, mas
também as mais longínquas comarcas, normalmente carentes de fontes de consulta,
bibliotecas municipais ou eventos jurídicos, onde se intercambiam livros.
O fato de que a centralização desse acervo o impossibilita o uso por todos os
membros do Judiciário e de seu quadro funcional não é sustentável, na medida em que é
inviável vencer as grandes distâncias somente para realizar pesquisas, considerando a
frequência dessa necessidade e a quantidade de outras atribuições rotineiras de uma unidade
jurisdicional.
Resta então a aquisição individual de livros, com recursos próprios, quando na realidade
os livros adquiridos são utilizados para o desempenho do exercício funcional, que é público.
Para essas unidades judiciárias desassistidas, quando muito, são destinadas apenas
Códigos e compilações de leis, e nada mais. Uma sugestão razoável seria a criação de
bibliotecas regionais, que pudessem servir de suporte às unidades jurisdicionais, porém,
dotando cada uma dessas comarcas ou juízos locais de um acervo mínimo doutrinário, o que
seria socializado, inclusive, com toda a comunidade.
O saber precisa também ser democratizado. A disponibilização de bibliotecas virtuais na
rede de comunicação eletrônica, como já se faz nos Tribunais Superiores e no Supremo
Tribunal Federal, é uma solução viável, sob todos os aspectos.
Negociações poderiam ser realizadas entre editoras e autores para a aquisição de livros,
repertórios jurisprudenciais e informativos que pudessem ser disponibilizados, mediante
contratos comerciais corporativos, o que reduziria custos. Outras obras, do domínio
215
público, poderiam ser acessadas através de uma rede centralizada, mas extensiva aos usuários
periféricos.
Convênios com bibliotecas públicas viabilizariam o acesso de suas obras. Enfim, sem
prejuízo de que a formação de uma biblioteca particular é um dos estímulos para o
desenvolvimento da intelectualidade, a democratização interna no Poder Judiciário também
deve evoluir para que magistrados e servidores possam crescer intelectualmente, tendo acesso
igualmente, independente do grau de jurisdição a que estejam vinculados, a cursos,
congressos, pós-graduações e discussões coletivas diversas, assim como às fontes legislativa e
doutrinária disponíveis nos grandes centros, em regra reservadas apenas aos que galgaram
os últimos degraus da carreira, o que é mais uma deficiência do sistema hierárquico e
verticalizado da estrutura de Poder.
4.2.14 Distribuição equitativa de juízes, desembargadores e ministros nos
órgãos judiciários: critérios e tabelas
Uma das distorções que existem no Sistema Judiciário brasileiro, e que repercute
diretamente na vivência democrática do povo, é a proporção existente entre a população
residente em um Estado ou Região do país, a quantidade de magistrados e a despesa do Poder
Judiciário em relação ao Produto Interno Bruto.
148
Supõe-se, por razoabilidade e lógica estatísticas, que quanto maior é a população de um
Estado ou Região e o seu PIB, maior deverá ser o número de magistrados e a despesa pública
com o Poder Judiciário. O equacionamento dessas variáveis contribui com a distribuição
equitativa da prestação jurisdicional para a população, considerando o volume de processos
sob a responsabilidade de cada magistrado e o custo público para a efetivação da Justiça.
A análise desses números mostra o que Estados ou Regiões investem para o
aperfeiçoamento do seu aparelho judiciário e qual o nível de comprometimento do Poder com
a democratização da Justiça. Algumas conclusões parecem inevitáveis, tais como:
a) um consenso político tácito que sugere a contenção da expansão do Poder,
omitindo-se o Judiciário, o Executivo e o Legislativo, a partir da inércia nas
148
O Produto Interno Bruto (PIB) é a soma de todos os serviços e bens produzidos num período, numa
determinada região. Ele é um importante indicador da atividade econômica. Disponível em:
<http://www.suapesquisa.com/o_que_e/pib.htm>. Acesso em: 2 dez. 2008.
216
propostas reformadoras da Organização Judiciária, na votação de matérias afins e
na liberação de verbas, respectivamente;
b) Esse consenso visa à opção por outras metas de desenvolvimento da sociedade ou,
simplesmente, à atomização e concentração do poder;
c) O Poder Judiciário quer expandir a prestação jurisdicional, mas o sistema
democrático no Executivo e no Legislativo não é consensual, por distorções
políticas;
d) Não há recursos financeiros públicos para essa expansão.
Essas conclusões conduzem à percepção sobre as distorções no sistema federativo
através do qual se estrutura o Poder Judiciário, com resultados na qualidade do padrão
democrático de cada nicho populacional, representado neste estudo pela abertura que se
propõe ao Poder Judiciário para legitimá-lo.
O que não é compreensível é que Estados que têm o Produto Interno Bruto mais elevado
do que outros e contribuam com percentual maior no somatório da riqueza do país, sejam
menos assistidos e providos na organização e funcionamento de seu Poder Judiciário.
Para a coleta de dados estatísticos, esta dissertação valeu-se de informações disponíveis
até maio de 2009, em sites oficiais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, dos
Tribunais de Justiça estaduais, do Conselho Nacional de Justiça, do Conselho da Justiça
Federal e do Tribunal Superior do Trabalho, cotejando os números apresentados e formulando
algumas observações.
Destaca-se o fato de que não uma compilação atualizada e precisa para todas as
variáveis estudadas, considerando que a organização dos dados é feita com base em
informações dos diversos órgãos e que alguns resultados ou são estimativos ou atrasados em
relação ao tempo real. No entanto, são dados que em algum momento representaram a
verdade captada pelos processos estatísticos. Como mencionado em tópicos anteriores,
uma certa despadronização na apresentação dos sites oficiais, dificultando o acesso do
pesquisador. A checagem, por outros meios, mediante consulta direta aos órgãos envolvidos,
também não é tarefa fácil, a despeito de solicitações e incursões nesse sentido.
217
Necessário, portanto, que haja uma padronização na disponibilização dessas
informações, com links que direcionem a dados objetivos, variados e sintéticos, atualizados
com a mesma frequência com que são criadas e condensadas as situações reais, o que hoje é
facilmente possível na dinâmica da informatização dos tribunais.
Atente-se, por exemplo, para a organização da Justiça Estadual. A Tabela 1 lista a
quantidade de cargos de desembargador nos Tribunais de Justiça, relacionados por Estado,
atualizada até 20.11.2008, pelos sites oficiais de cada tribunal estadual; a população residente
nas capitais e nos Estados, contada pelo IBGE, em alguns casos, por estimativa, com posição
em 01.04.2007; a participação de cada Estado na formação do Produto Interno Bruto nacional
e a relação entre a quantidade de desembargadores estaduais e a população residente nas
unidades federativas estaduais. Analisando essas tabelas, formulam-se algumas conclusões,
tomando-se como referência um ou outro Estado, apenas para exemplificação:
- A Bahia é o quarto Estado mais populoso. Tem a sexta colocação na participação do
PIB nacional e representa a pior proporção no resultado da divisão entre o total da população
e o de desembargadores desse Estado, ocupando a 27ª posição no Brasil;
O Ceará tem a oitava maior população do país; a 12ª colocação na participação do PIB
nacional e a 26ª no resultado da divisão entre o total da população e o de desembargadores
desse Estado, perdendo apenas para a Bahia.
Ainda em relação ao Ceará, 15 Estados que têm o PIB menor do que o seu e, ainda
assim, a proporção entre a população e a quantidade de desembargadores nesses Estados é
mais vantajosa do que naquela unidade federativa.
Se forem analisadas as regiões geográficas, observa-se que apenas a Região Sudeste tem
percentual do PIB superior ao da participação na quantidade total de desembargadores do
país. Nas demais regiões, o percentual do PIB é sempre inferior ao percentual do número de
desembargadores, implicando dizer que não relação direta entre a elevação do número de
desembargadores e o crescimento do PIB, pelo menos em termos fáticos. Outra constatação é
a de que apenas nas Regiões Norte e Nordeste o percentual de desembargadores sobre a
quantidade nacional é inferior ao percentual da população residente no país, aferida
regionalmente.
218
Em se tratando de média nacional da proporção (população X desembargador), 13
Estados cujo quantitativo é inferior àquele referencial, excluídos daí todos os Estados
nordestinos, concluindo-se que nas 14 Unidades Federativas restantes menos magistrados
de Segundo Grau na Justiça Estadual para o conjunto da população do que nos demais. Se
forem considerados os dados tabulados pelo Conselho Nacional de Justiça,
149
referente ao ano
2007, cujas variáveis são a quantidade de magistrados estaduais, tanto no Primeiro quanto no
Segundo Grau de jurisdição, além da população total desses Estados e da proporção entre
magistrados e população, formulam-se algumas conclusões:
- A Região Sudeste tem a maior população residente, a maior quantidade de juízes
estaduais e a antepenúltima posição na proporção desses juízes, por 100.000 habitantes,
igualando-se, neste caso, à média nacional;
- A Região Nordeste tem a segunda maior população residente no país, a segunda maior
quantidade de juízes estaduais por região geográfica e a pior média na proporção desses
juízes, por cada 100.000 habitantes, estando abaixo da média nacional;
A Região Centro-Oeste é a que apresenta os melhores números distributivos, se
comparadas a quantidade de juízes de direito, a população residente e a média de juízes por
cada 100.000 habitantes, superando em 33,3% a média nacional, que é de seis juízes estaduais
por cada 100.000 habitantes.
149
BRASIL. Conselho Nacional de Justiça - C.N.J. Indicadores estatísticos da Justiça Estadual, 2007.
Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/images/stories/docs_cnj/relatorios/justiça_ em_numeros_2007.pdf.>
Acesso em: 7 mar. 2009.
219
Tabela 1 Dados estatísticos do PIB, população e quantidade de desembargadores estaduais, por região
R
EGIÃO
UF
P
OSIÇÃO
NO
PIB
N
ACIONAL
/
2006
%
P
ARTICIPAÇÃO
NO
PIB
N
ACIONAL
/
2006
(1)
D
ESEMBARGADORES
E
STADUAIS
20.11.2008
(2)
P
OPULAÇÃO
/
E
STADO
01.04.2007
(3)
P
OPULAÇÃO
/
C
APITAL
01.04.2007
(4)
P
OPULAÇÃO
POR
D
ESEMBAR
-
GADOR
CO DF 8 3,78 35 2.455.903 2.455.903 ** 70.169
CO GO 9 2,41 32 5.647.035 1.244.645 ** 176.470
CO MT 15 1,49 30 2.854.642 526.831..... 95.155
CO MS 17 1,03 29 2.265.274 724.524..... 78.113
NE BA 6 4,07 35 14.080.654 2.892.625 ** 402.304
NE PE 10 2,34 39 8.485.386 1.533.580 ** 217.574
NE CE 12 1,95 27 8.185.286 2.431.415 ** 303.159
NE MA 16 1,21 24 6.118.995 957.515..... 254.958
NE RN 18 0,87 15 3.013.740 774.230..... 200.916
NE PB 19 0,84 19 3.641.395 674.762..... 191.652
NE AL 20 0,66 11 3.037.103 896.965..... 276.100
NE SE 21 0,64 13 1.939.426 520.303..... 149.187
NE PI 23 0,55 15 3.032.421 779.939..... 202.161
NO PA 13 1,87 30 7.065.573 1.408.847 ** 235.519
NO AM 14 1,65 18 3.221.939 1.646.602..... 178.997
NO RO 22 0,55 17 1.453.756 369.345..... 85.515
NO TO 24 0,41 12 1.243.627 178.386..... 103.636
NO AP 25 0,22 9 587.311 344.153..... 65.257
NO AC 26 0,20 9 655.385 290.639..... 72.821
NO RR 27 0,16 7 395.725 249.853..... 56.532
SE SP* 1 33,87 360 39.827.570 10.886.518 ** 110.632
SE RJ 2 11,62 180 15.420.375 6.093.472 ** 85.669
SE MG 3 9,06 140 19.273.506 2.412.937 ** 137.668
SE ES 11 2,23 26 3.351.669 314.042 ** 128.910
SU RS 4 6,62 140 10.582.840 1.420.667 ** 75.592
SU PR* 5 5,77 120 10.284.503 1.797.408 ** 85.704
SU SC* 7 3,93 50 5.866.252 396.723 ** 117.325
TOTAL 100,00 1.442 183.987.291 44.222.829 127.592
Fonte: Elaborada pelo autor. IBGE. Contagem e estimativas da população 2007. População residente em 01.04.2007.
(*) Tribunais que têm Juízes de Direito Substitutos de Segundo Grau, embora sejam Juízes de Primeiro Grau: SP (78); PR
(52); SC (18).
(**) População Estimada.
1. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/home/presidencial/noticia_visualiza-php?id_noticia=1264&id_pagina=1>.
Acesso em 24 nov. 2008.
2. Disponível em sites oficiais dos Tribunais de Justiça: <http://www.tj.(estado).jus.br>. Acesso em: 24 nov. 2008.
3. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/estadosat>. Acesso em: 24 nov. 2008.
4. Disponível
em:<http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/contagem2007/popmunic2007layoutTCU14112007.xls>. Acesso
em: 24 nov. 2008.
220
Tabela 2 Participação regional no PIB nacional – ano base 2006
R
EGIÃO
P
ARTICIPAÇÃO NO
PIB
/
2006
%
CO
NE
NO
SE
SU
8,71
13,13
5,06
56,78
16,32
TOTAL 100,00
Fonte: Tabela 1
Gráfico 1 Participação regional no PIB nacional ano base 2006.
Fonte: Tabela 1.
221
Tabela 3 Quantidade de desembargadores estaduais por região, com percentuais – Posição em: 20.11.2008
R
EGIÃO
D
ESEMBARGADORES
E
STADUAIS
P
ERCENTUAL
%
CO
NE
NO
SE
SU
126
198
102
706
310
8,74
13,73
7,07
48,96
21,50
T
OTAL
1.442 100,00
Fonte: Tabela 1
Gráfico 2 Quantidade de desembargadores estaduais por região, com percentuais – 20.11.2008.
Fonte: Tabela 1
222
Tabela 4 População por região, com percentuais
R
EGIÃO
HABITANTES
PERCENTUAL
%
CO
NE
NO
SE
SU
13.222.854
51.534.406
14.623.316
77.873.120
26.733.595
7,19
28,01
7,95
42,32
14,53
TOTAL 183.987.291 100,00
Fonte: Tabela 1
Gráfico 3 População por região, com percentuais
Fonte: Tabela 1
223
Tabela 5 População por desembargador estadual
R
EGIÃO
HABITANTES
POR
CADA
DESEMBARGADOR
ESTADUAL
CO
NE
NO
SE
SU
104.943
260.275
143.366
110.302
86.237
BRASIL 127.592
Fonte: Tabela 1
Gráfico 4 População por desembargador estadual
Fonte: Tabela 1
224
Tabela 6 Magistrados da Justiça Estadual, por 100.000 habitantes
UF Magistrados h
2
G
8
Acre 49 7 7,5
Alagoas 124 30 4,1
Amapá 68 6 11,6
Amazônia 208 32 6,5
Bahia 601 141 4,3
Ceará 371 82 4,5
Distrito Federal 284 25 11,6
Espírito Santo 430 34 12,8
Goiás 316 56 5,6
Maranhão 261 61 4,3
Mato Grosso 269 29 9,4
Mato Grosso do Sul 193 23 8,5
Minas Gerais 979 193 5,1
Pará 286 71 4,0
Paraíba 267 36 7,3
Paraná 687 103 6,7
Pernambuco 473 85 5,6
Piauí 146 30 4,8
Rio de Janeiro 900 154 5,8
Rio Grande do Norte 226 30 7,5
Rio Grande do Sul 809 106 7,6
Rondônia 125 15 8,6
Roraima 35 4 8,8
Santa Catarina 410 59 7,0
São Paulo 2.363 398 5,9
Sergipe 138 19 7,1
Tocantins 100 12 8,0
GERAL 11.118 1.840 6,0
Fonte: BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Indicadores estatísticos da Justiça Estadual, 2007. Disponível
em: <http://www.cnj.jus.br/images/stories/docs_cnj/relatorios/justica_em_numeros_2007.pdf>. Acesso em: 7
mar. 2009.
Mag
h
2
Onde:
Mag Número de magistrados do Estado.
h
2
Número total de habitantes do Estado dividido por 100.000.
G
8 =
225
Gráfico 5 Magistrados da Justiça Estadual, por 100.000 habitantes.
Fonte: BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Indicadores estatísticos da Justiça Estadual. 2007.
Disponível em: http://www.cnj.jus.br/images/stories/docs_cnj/relatorios/justica _em_ numeros _2007.pdf>.
Acesso em: 7 mar. 2009.
226
Tabela 7 Magistrados estaduais por cada 100.000 habitantes, por região
R
EGIÃO
M
AGISTRADOS
HABITANTES
(
POR
100.000)
MAGISTRADOS
POR
100.000
HAB.
CO 1.062 133 8,0
NE 2.607 514 5,1
NO 871 147 5,9
SE 4.672 779 6,0
SU 1.906 268 7,1
TOTAL 11.118 1.840 6,0
Fonte: Tabela 6
Gráfico 6 Magistrados estaduais por região, com percentuais
Fonte: Tabela 7
Na Justiça do Trabalho as distorções na distribuição do quantitativo de Juízes do
Trabalho também não são diferentes da Justiça Comum. Analisando os números oficiais,
percebe-se que enquanto a média nacional de magistrados trabalhistas é de 1,7 por cada
100.000 habitantes, Estados que têm índice mais de duas vezes abaixo dessa média, como
são os casos do Ceará (0,7) e do Maranhão (0,8), consoante levantamento estatístico
organizado pelo Conselho Nacional de Justiça. Confira-se, nesse sentido, a Tabela 8 a seguir.
227
Se considerados os números fornecidos pelo Tribunal Superior do Trabalho em relação
ao período 2004-2007, as distorções continuam as mesmas, variando apenas em valores
absolutos, posicionando-se os Estados do Ceará e do Maranhão na última e penúltima
colocações, respectivamente, em relação à quantidade de magistrados a cada 100.000
habitantes, abaixo mais do que o dobro da média nacional.
Considerando os PIBs desses Estados e as suas populações, esses são exemplos
indiscutíveis de uma desigual distribuição da justiça no âmbito laboral, repercutindo
profundamente nas relações democráticas do Poder. As Tabelas 9 a 11 demonstram as
diferenças entre os Estados, inclusive quanto ao número de varas, sem qualquer razão objetiva
aparente.
A disparidade que existe na distribuição de juízes por habitante é confirmada pelo total
da despesa efetuada pela União para custeio da Justiça Trabalhista. Emprega-se, portanto,
menos recursos orçamentários nos Estados mais desassistidos de juízes do que nos demais. É
como se a despesa pública não acompanhasse a lógica arrecadadora da receita, nem por
equilíbrio federativo, nem por proporção distributivo-tributária (Tabela 12).
228
Tabela 8 Magistrados da Justiça do Trabalho por cada 100.000 habitantes
Região
UF Mag. h
2
G
8
Rio de Janeiro 329
154
2,1
São Paulo 340
206
1,7
Minas Gerais 273
193
1,4
Rio Grande do Sul 264
106
2,5
Bahia 213
141
1,5
Pernambuco 144
85
1,7
Ceará 56
82
0,7
Pará / Amapá 101
77
1,3
Paraná 165
103
1,6
10ª DF / Tocantins 97
37
2,6
11ª Amazonas / Roraima
56
36
1,5
12ª Santa Catarina 125
59
2,1
13ª Paraíba 64
36
1,8
14ª Rondônia / Acre 55
21
2,6
15ª Campinas 311
193
1,6
16ª Maranhão 49
61
0,8
17ª Espírito Santo 61
34
1,8
18ª Goiás 76
56
1,3
19ª Alagoas 47
30
1,5
20ª Sergipe 30
19
1,5
21ª Rio Grande do Norte 45
30
1,5
22ª Piauí 34
30
1,1
23ª Mato Grosso 64
29
2,2
24ª Mato Grosso do Sul 59
23
2,6
GERAL 3.058
1.840
1,7
Fonte: BRASIL. C.N.J. (2007, on line).
Mag
h
2
Onde:
Mag Número de magistrados da Região.
h
2
Número total de habitantes da Região dividido por 100.000.
G
8 =
229
Gráfico 7 Magistrados da Justiça do Trabalho, por cada 100.000 habitantes
Fonte: BRASIL. C.N.J. (2007, on line)
230
Tabela 9 Magistrados da Justiça do Trabalho a cada 100.000 habitantes 2004/2007 (cargos providos)
Ordem decrescente por magistrados a cada 100.000 habitantes em 2007
R
EGIÃO
M
AGISTRADOS A
C
ADA
100.000
H
ABITANTES
2004 2005 2006 2007
10ª DF / Tocantins
14ª - Rondônia / Acre
24ª Mato Grosso do Sul
4ª Rio Grande do Sul
23ª Mato Grosso
12ª Santa Catarina
17ª Espírito Santo
1ª Rio de Janeiro
13ª Paraíba
6ª Pernambuco
2ª São Paulo
15ª Campinas
9ª Paraná
11ª Amazonas / Roraima
19ª Alagoas
20ª Sergipe
5ª Bahia
21ª Rio Grande do Norte
3ª Minas Gerais
18ª Goiás
8ª Pará / Amapá
22ª Piauí
16ª Maranhão
7ª Ceará
2,17
2,37
1,97
2,06
1,56
1,77
1,61
1,81
1,43
1,51
1,45
1,47
1,48
1,51
1,31
1,60
1,23
1,38
1,24
1,31
1,24
0,81
0,58
0,55
2,45
2,27
2,21
2,31
1,68
1,96
1,67
1,83
1,36
1,57
1,48
1,43
1,46
1,46
1,39
1,58
1,17
1,33
1,26
1,35
1,20
0,80
0,62
0,53
2,64
2,62
2,22
2,28
2,03
2,08
1,73
1,82
1,52
1,55
1,54
1,51
1,44
1,53
1,51
1,50
1,30
1,41
1,35
1,34
1,23
1,02
0,65
0,67
2,62
2,61
2,60
2,49
2,24
2,13
1,82
1,80
1,76
1,70
1,64
1,63
1,59
1,55
1,55
1,55
1,51
1,43
1,42
1,33
1,29
1,12
0,80
0,68
Média 1,48 1,52 1,60 1,70
Tribunal Superior do Trabalho 0,01 0,01 0,01 0,01
Justiça do Trabalho 1,45 1,48 1,55 1,63
Fonte: BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. JT Relatório Geral da Justiça do Trabalho.
Indicadores de desempenho- Coordenadoria de Estatística do TST. Disponível em:
<http://www.tst.gov.br>. Acesso em: 8 mar. 2009.
Nota:
1. Metodologia: Magistrados
Fórmula: Magistrados / Habitantes =
Habitantes ÷ 100.000
Variáveis: Magistrados Cargos providos
Habitantes Fonte: IBGE
2. Em destaque, valores acima da média em 2007.
231
Gráfico 8 Magistrados da Justiça do Trabalho a cada 100.000 habitantes 2004/2007 (cargos
providos)
Fonte: BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. JT Relatório Geral da Justiça do
Trabalho. Indicadores de desempenho- Coordenadoria de Estatística do TST. Disponível
em: <http://www.tst.gov.br>. Acesso em: 8 mar. 2009.
232
Tabela 10 Magistrados da Justiça do Trabalho a cada 100.000 habitantes 2004/2007 (cargos existentes)
Ordem decrescente por magistrados a cada 100.000 habitantes em 2007
R
EGIÃO
M
AGISTRADOS A
C
ADA
100.000
H
ABITANTES
2004 2005 2006 2007
14ª
- Rondônia / Acre
24ª Mato Grosso do Sul
10ª DF / Tocantins
4ª Rio Grande do Sul
23ª Mato Grosso
12ª Santa Catarina
1ª Rio de Janeiro
11ª Amazonas / Roraima
9ª Paraná
17ª Espírito Santo
2ª São Paulo
13ª Paraíba
15ª Campinas
6ª Pernambuco
3ª Minas Gerais
20ª Sergipe
19ª Alagoas
21ª Rio Grande do Norte
5ª Bahia
8ª Pará / Amapá
18ª Goiás
22ª Piauí
16ª Maranhão
7ª Ceará
2,87
2,06
2,60
2,17
1,60
1,87
1,91
1,65
1,50
1,61
1,68
1,63
1,52
1,60
1,40
1,60
1,31
1,42
1,29
1,28
1,31
0,81
0,66
0,63
3,22
2,83
2,80
2,44
2,43
2,15
2,14
1,99
1,95
1,88
1,86
1,89
1,75
1,75
1,61
1,58
1,56
1,53
1,55
1,49
1,42
1,13
0,88
0,74
3,16
2,79
2,74
2,43
2,38
2,11
2,11
1,94
1,93
1,85
1,83
1,88
1,72
1,73
1,59
1,55
1,54
1,51
1,53
1,46
1,40
1,12
0,87
0,73
3,37
2,82
2,76
2,51
2,38
2,15
2,13
1,99
1,94
1,91
1,87
1,87
1,79
1,73
1,61
1,60
1,55
1,53
1,52
1,48
1,42
1,12
0,88
0,73
Média 1,58 1,86 1,83 1,86
Tribunal Superior do Trabalho 0,01 0,01 0,01 0,01
Justiça do Trabalho 1,55 1,80 1,78 1,81
Fonte: BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. JT Relatório Geral da Justiça do Trabalho. Indicadores de
desempenho- Coordenadoria de Estatística do TST. Disponível em: <http://www.tst.gov.br>. Acesso em: 8 mar.
2009.
Nota:
1. Metodologia: Magistrados
Fórmula: Magistrados / Habitantes =
habitantes÷ 100.000
2. Em destaque, valores acima da média em 2007.
233
Gráfico 9 Magistrados da Justiça do Trabalho a cada 100.000 habitantes (cargos existentes).
Fonte: BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. JT – Relatório Geral da Justiça do Trabalho.
Indicadores de desempenho- Coordenadoria de Estatística do TST. Disponível em:
<http://www.tst.gov.br>. Acesso em: 8 mar. 2009.
234
Tabela 11 Varas do Trabalho – situação em agosto de 2008
Região Judiciária Existentes (18.08.2008)
A Serem Criados
(Lei n.º 10.770)
Total de Cargos
Titulares Substitutos Subtotal Titulares Substitutos Subtotal Titulares Substitutos Total
1ª – RJ 132 139 271 2 2 4 134 141 275
2ª – SP 163 161 324 -- -- -- 163 161 324
3ª – MG 137 137 274 -- -- -- 137 137 274
4ª – RS 115 115 230 -- -- -- 115 115 230
5ª – BA 88 97 185 -- -- -- 88 97 185
6ª – PE 61 68 129 -- -- -- 61 68 129
7ª – CE 26 26 52 -- -- -- 26 26 52
8ª – PA e AP 45 45 90 -- -- -- 45 45 90
9ª – PR 81 81 162 5 5 10 86 86 172
10ª – DF e TO 32 53 85 -- -- -- 32 53 85
11ª – AM e RR 32 32 64 -- -- -- 32 32 64
12ª – SC 54 54 108 -- -- -- 54 54 108
13ª – PB 27 33 60 -- -- -- 27 33 60
14ª – RO e AC 32 31 63 -- -- -- 32 31 63
15ª – Campinas/SP 153 153 306 -- -- -- 153 153 306
16ª – MA 21 25 46 -- -- -- 21 25 46
17ª – ES 24 32 56 -- -- -- 24 32 56
18ª – GO 36 36 72 -- -- -- 36 36 72
19ª – AL 19 20 39 -- -- -- 19 20 39
20ª – SE 12 11 23 -- -- -- 12 11 23
21ª – RN 18 20 38 -- -- -- 18 20 38
22ª – PI 11 15 26 -- -- -- 11 15 26
23ª – MT 26 34 60 -- -- -- 26 34 60
24ª – MS 26 30 56 -- -- -- 26 30 56
TOTAL NO PAÍS 1.371
1.448
2.819
7 7 14 1.378
1.455
2.833
Fonte: BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho (2009, on line)
235
Tabela 12 Despesas total da Justiça do Trabalho por habitante 2004/2007
Ordem decrescente (pela despesa por habitante) em 2007.
R
EGIÃO
M
AGISTRADOS A
C
ADA
100.000
H
ABITANTES
2004 2005 2006 2007
14ª - Rondônia / Acre
10ª DF / Tocantins
4ª Rio Grande do Sul
11ª Amazonas / Roraima
12ª Santa Catarina
1ª Rio de Janeiro
1 3ª Paraíba
24ª Mato Grosso do Sul
2ª São Paulo
6ª Pernambuco
3ª Minas Gerais
23ª Mato Grosso
20ª Sergipe
21ª Rio Grande do Norte
9ª Paraná
5ª Bahia
15ª Campinas
17ª Espírito Santo
8ª Pará / Amapá
19ª Alagoas
18ª Goiás
7ª Ceará
22ª Piauí
16ª Maranhão
R$ 51,73
R$ 58,33
R$ 43,83
R$ 48,94
R$ 40,85
R$ 46,33
R$ 44,47
R$ 32,42
R$ 32,22
R$ 34,40
R$ 34,10
R$ 29,18
R$ 35,63
R$ 27,85
R$ 25,98
R$ 26,49
R$ 24,03
R$ 24,88
R$ 26,55
R$ 22,97
R$ 19,65
R$ 15,38
R$ 13,98
R$ 9,52
R$ 57,48
R$ 62,92
R$ 49,25
R$ 52,10
R$ 44,15
R$ 48,26
R$ 47,39
R$ 37,96
R$ 34,21
R$ 36,03
R$ 34,64
R$ 40,56
R$ 39,28
R$ 30,68
R$ 29,77
R$ 29,53
R$ 27,09
R$ 28,40
R$ 28,83
R$ 24,02
R$ 21,83
R$ 17,45
R$ 17,55
R$ 11,37
R$ 68,45
R$ 72,47
R$ 57,76
R$ 56,42
R$ 53,73
R$ 52,57
R$ 53,15
R$ 42,89
R$ 42,40
R$ 42,19
R$ 40,18
R$ 42,13
R$ 46,62
R$ 34,89
R$ 35,58
R$ 33,62
R$ 31,80
R$ 33,66
R$ 32,39
R$ 30,63
R$ 25,97
R$ 20,20
R$ 21,12
R$ 13,97
R$ 76,17
R$ 73,70
R$ 65,46
R$ 60,26
R$ 58,33
R$ 57,00
R$ 55,93
R$ 46,49
R$ 46,41
R$ 45,02
R$ 42,13
R$ 41,26
R$ 40,02
R$ 37,84
R$ 37,74
R$ 35,84
R$ 35,70
R$ 35,27
R$ 33,81
R$ 31,40
R$ 27,48
R$ 20,92
R$ 20,69
R$ 14,67
Média R$ 32,07 R$ 35,45 R$ 41,01 R$ 43,31
Tribunal Superior do Trabalho R$ 2,38 R$ 2,74 R$ 2,66 R$ 2,33
Justiça do Trabalho R$ 33,93 R$ 37,06 R$ 42,55 R$ 45,08
Fonte: BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. JT Relatório Geral da Justiça do Trabalho. Indicadores de
desempenho- Coordenadoria de Estatística do TST. Disponível em: <http://www.tst.gov.br>. Acesso em: 8 mar.
2009.
Nota:
1. Metodologia: Despesa
Fórmula: Despesa / Habitantes =
Habitantes
Variáveis: Despesa refere-se à despesa executada.
Habitantes Fonte: IBGE.
2. Em destaque, valores acima da média em 2007.
236
Gráfico 10 Despesa total da Justiça do Trabalho por habitante 2004/2007
Fonte: BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. JT Relatório Geral da Justiça do Trabalho.
Indicadores de desempenho- Coordenadoria de Estatística do TST. Disponível em:
<http://www.tst.gov.br>. Acesso em: 8 mar. 2009
237
Gráfico 11 Despesa total da Justiça do Trabalho por habitante
Fonte: BRASIL. CNJ (2007, on line)
238
Na Justiça Federal a distorção também é evidente. A Região, com sede na cidade de
Recife e jurisdição sobre os Estados de Alagoas, Ceará, Paraíba, Pernambuco, Rio Grande do
Norte e Sergipe, tem o menor número de juízes por cada 100.000 habitantes, segundo dados
coletados pelo Conselho Nacional de Justiça (Tabela 13).
Ao se comparar os dados do Conselho Nacional de Justiça com os do Conselho da
Justiça Federal, continuam as diferenças no que pertine à quantidade de juízes federais de
Primeiro e Segundo Graus, por Região, acompanhando também a desproporção com o
percentual populacional regional (Tabelas 14 a 18).
Essa discrepância entre as Regiões tem consequências no total das despesas efetivadas,
concluindo-se que o custo per capta da Justiça Federal é diferente, por Região, chegando a
União a despender recursos com a Região em montante equivalente a mais do que o dobro
do gasto com a 5ª Região (Tabela 19).
Nos Tribunais Superiores e no Superior Tribunal Federal, mesmo que se criem
mecanismos legais para conter o conhecimento e o processamento de recursos e ações
originárias
1
, ainda é grande o volume de processos distribuídos a cada um de seus membros.
A criação de novos cargos nos Tribunais Superiores e no Supremo Tribunal Federal ou
a consolidação desta Corte como Tribunal Constitucional são medidas que merecem ser
avaliadas, considerando o incremento do acervo jurisdicional nas instâncias inferiores que, em
grande parte, culmina por alcançar os últimos graus de Jurisdição.
Ao se considerar que 93 magistrados compõem os Tribunais Superiores, sendo que
cinco deles acumulam funções no Tribunal Superior Eleitoral, no Superior Tribunal de Justiça
e no Supremo Tribunal Federal, e que este Tribunal é composto por apenas 11 membros, o
Poder Judiciário, em sua última instância, é representado por apenas 88 diferentes ministros,
excluídos os membros do Conselho Nacional de Justiça, enquanto o Poder Legislativo
Federal, formado pela Câmara e pelo Senado Federal, é composto por 513 e 81 membros,
respectivamente, totalizando 594 parlamentares.
1
No Supremo Tribunal Federal, o instituto da Repercussão Geral e o da Súmula Vinculante, Arts. 102, § e
103-A, da C.F./88, respectivamente, e as Súmulas Impeditivas de Recursos, no STJ e no STF (Lei
11.276/2006), assim como a Lei de Recursos Repetitivos, no STJ (Lei nº 11.672/2008), são algumas das
providências que as reformas na Constituição e nas Leis Ordinárias têm efetivado para diminuir o volume de
processos no STJ e no STF.
239
De imediato, se percebe a desproporção em relação ao Poder Judiciário. Acrescenta-
se, ainda, o fato de que a jurisdição é indelegável, tendo os membros do Judiciário que exercê-
la pessoalmente, salvo a possibilidade de algumas delegações instrutórias.
A Tabela 20 mostra a quantidade de processos julgados no Superior Tribunal de Justiça
desde a sua implantação até dezembro de 2008. Dividindo-se por 33 Ministros – o total da sua
composição -, tem-se a dimensão da carga de trabalho para cada um deles. No Supremo
Tribunal Federal a problemática não é diferente (Tabela 21).
Tabela 13 Magistrados da Justiça Federal por 100.000 habitantes
Região Mag. h
2
G
8
1ª Região 383 681 0,56
2ª Região 240 188 1,28
3ª Região 331 421 0,79
4ª Região 349 267 1,31
5ª Região 144 283 0,51
GERAL 1.447 1.840 0,79
Fonte: BRASIL. CNJ (2007, on line)
Mag
h
2
Onde:
Mag Número de magistrados da Região
h
2
Número total de habitantes da Região dividido por 100.000.
G
8
=
240
Gráfico 12 Magistrados da Justiça Federal por 100.000 habitantes
Fonte: Tabela 13
241
Tabela 14 Número de habitantes por Juiz Federal do Primeiro Grau – posição em 30.03.2008
R
EGIÃO
S
EÇÃO
J
UDICIÁRIA
N.
º DE
J
UÍZES
(1)
N.
º DE
H
ABITANTES
N.
º
H
ABITANTES
POR
J
UIZ
Distrito Federal 52 2.383.784 45.842
Acre 4 686.652 171.663
Amazonas 10 3.311.026 551.838
Amapá 6 615.715 102.619
Bahia 62 13.950.146 225.002
Goiás 34 5.730.753 168.552
1ª
Maranhão 17 6.184.538 363.796
Minas Gerais 105 19.479.356 185.518
Mato Grosso 15 2.856.999 190.467
Pará 19 7.110.465 374.235
Piauí 14 3.036.290 216.878
Rondônia 8 1.562.417 195.302
Roraima 4 403.344 100.836
Tocantins 5 1.332.441 266.488
TOTAL 355 68.643.926 193.363
R
EGIÃO
S
EÇÃO
J
UDICIÁRIA
N.
º DE
J
UÍZES
(1)
N.
º DE
H
ABITANTES
N.
º
H
ABITANTES
POR
J
UIZ
2ª
Rio de Janeiro 182 15.561.720 85.504
Espírito Santo 32 3.464.285 108.259
TOTAL 214 19.026.005 88.907
3ª
São Paulo 266 41.055.734 154.345
Mato Grosso do Sul 21 2.297.981 109.428
TOTAL 287 43.353.715 151.058
Rio Grande do Sul 142 10.963.219 77.206
4ª
Paraná 120 10.387.378 86.561
Santa Catarina 82 5.958.266 72.662
TOTAL 344 27.308.863 79.386
Pernambuco 46 8.502.603 184.839
Alagoas 14 3.050.652 217.904
Ceará 42 8.217.085 195.645
5ª
Paraíba 18 3.623.215 201.290
Rio Grande do Norte 18 3.043.760 169.098
Sergipe 12 2.000.738 166.728
TOTAL 150 28.438.053 189.587
TOTAL GERAL 1.350 186.770.562 138.349
Fonte: BRASIL. Estatísticas da Justiça Federal. Disponível em:
<http://daleth.cjf.jus.br/atlas/internet/HabitanteporJuizINTERNET.htm>. Acesso em: 19 mar. 2009.
Notas:
Total de cargos providos de Juízes Federais e Juízes Federais Substitutos em 30.09.2009. Não inclui os
cargos providos de desembargadores.
IBGE Estimativas populacionais em 2004. As informações de população aqui disponibilizadas são
fornecidas pelo IBGE ao Tribunal de Contas da União.
242
243
244
245
Tabela 17 Justiça Federal de Primeiro GrauVaras Federais e Juizados Especiais Federais.
Atualizado em 30.09.2008.
T
OTAL DE
V
ARAS E
JEF
S
T
RIBUNAIS
R
EGIONAIS
F
EDERAIS
S
EÇÕES
J
UDICIÁ
-
RIAS
L
OCALIDA
-
DES
V
ARAS
C
RIA
-
DAS
V
ARAS
I
NSTALADAS
JEF
S
A
UTÔNO
-
MOS
I
NSTALA
-
DOS
N
ÃO
-
I
NSTALA
-
DOS
V
ARAS
V
ARAS
COM
JEF
A
DJUNTO
1
T
OTAL
DE
V
ARAS
Distrito Brasília* 26 20 2 22 4 0
Acre
Rio
Branco*
4 3 x 3 1 0
Amapá Macapá 3 2 x 2 1 0
Amazonas
Manaus*
Tabatinga*
Subtotal
6
1
7
5
0
5
x
1
1
5
1
6
1
x
1
0
0
0
1ª
REGIÃO
Bahia
Salvador*
Barreiras*
Campo
Formoso*
Eunápolis*
Feira de
Santana*
Guanambi*
Ilhéus*
Itabuna*
Jequié
Juazeiro*
Paulo
Afonso*
Vitória da
Conquista*
Subtotal
23
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
34
15
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
15
2
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
13
17
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
28
6
6
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
246
T
OTAL DE
V
ARAS E
JEF
S
T
RIBUNAIS
R
EGIONAIS
F
EDERAIS
S
EÇÕES
J
UDICIÁ
-
RIAS
L
OCALIDA
-
DES
V
ARAS
C
RIA
-
DAS
V
ARAS
I
NSTALADAS
JEF
S
A
UTÔNO
-
MOS
I
NSTALA
-
DOS
N
ÃO
-
I
NSTALA
-
DOS
V
ARAS
V
ARAS
COM
JEF
A
DJUNTO
1
T
OTAL
DE
V
ARAS
Goiás
Goiânia*
Aparecida
de Goiânia*
Anápolis*
Luziânia*
Rio Verde*
Subtotal
14
1
1
1
1
18
10
0
0
0
0
10
2
1
1
1
1
6
12
1
1
1
1
16
2
2
0
0
0
0
0
0
Maranhão
São Luis*
Caxias*
Imperatriz
Subtotal
7
1
1
9
4
0
0
4
2
1
1
4
6
1
1
8
1
1
0
0
0
0
1ª
REGIÃO
Minas
Gerais
Belo
Horizonte*
Divinópolis*
Governador
Valadares*
Ipatinga*
Juiz de
Fora*
Lavras*
Montes
Claros*
Passos*
Patos de
Minas*
Pouso
Alegre*
São João
Del Rey*
São
Sebastião
do Paraíso*
Sete
Lagoas*
Varginha*
Uberaba*
Uberlândia*
Subtotal
32
2
2
1
3
1
1
1
1
1
1
1
1
1
2
3
54
25
0
0
0
2
0
0
0
0
0
1
0
0
0
1
2
31
2
2
2
1
1
1
1
1
1
1
x
1
1
1
1
1
18
27
2
2
1
3
1
1
1
1
1
1
1
1
1
2
3
49
5
5
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
247
T
OTAL DE
V
ARAS E
JEF
S
T
RIBUNAIS
R
EGIONAIS
F
EDERAIS
S
EÇÕES
J
UDICIÁRIAS
L
OCALIDADES
V
ARAS
C
RIADAS
V
ARAS
I
NSTALADAS
JEF
S
A
UTÔ
-
NOMOS
I
NSTA
-
LADOS
N
ÃO
-
I
NSTA
-
LADOS
V
ARAS
V
ARAS
COM
JEF
A
DJUNTO
1
T
OTAL
DE
V
ARAS
Mato
Grosso
Cuiabá*
Cáceres*
Rondonópolis*
Sinop*
Subtotal
6
1
1
1
9
5
0
0
0
5
x
1
1
1
3
5
1
1
1
8
1
x
x
x
1
0
0
0
0
0
1ª
REGIÃO
Pará
Belém*
Altamira*
Castanhal*
Marabá
Santarém
Subtotal
8
1
1
1
1
12
5
0
0
0
1
6
2
1
1
1
x
5
7
1
1
1
1
11
1
x
x
x
x
1
0
0
0
0
0
0
Piauí
Teresina*
Picos*
Subtotal
6
1
7
5
0
5
x
1
1
5
1
6
1
x
1
0
0
0
Rondônia
Porto Velho*
Ji-Paraná*
Subtotal
4
1
5
3
0
3
x
1
1
3
1
4
1
x
1
0
0
0
Roraima Boa Vista* 3 2 x 2 1 0
Tocantins Palmas* 3 2 x 2 1 0
TOTAL 194 113 54 167 27 0
248
T
OTAL DE
V
ARAS E
JEF
S
T
RIBUNAIS
R
EGIONAIS
F
EDERAIS
S
EÇÕES
J
UDICIÁ
-
RIAS
L
OCALIDADES
V
ARAS
C
RIADAS
V
ARAS
I
NSTALADAS
JEF
S
A
UTÔNOMOS
I
NSTALADOS
N
ÃO
-
I
NSTA
-
LADOS
V
ARAS
V
ARAS
COM
JEF
A
DJUNTO
1
T
OTAL
DE
V
ARAS
2ª
REGIÃO
Rio de
Janeiro
Rio de
Janeiro
Angra dos
Reis
Barra do
Piraí*
Campos
Duque de
Caxias*
Itaboraí
Itaperuna
Macaé
Magé
Niterói**
Nova
Friburgo
Nova
Iguaçu*
Petrópolis
São
Gonçalo*
São João do
Meriti
S. Pedro da
Aldeia
Resende
Teresópolis
Três Rios
Volta
Redonda
Subtotal
56
1
1
3
3
1
1
1
1
7
2
3
2
5
7
1
2
1
1
5
104
39
0
0
2
0
0
0
0
0
5
1
0
0
3
5
0
1
0
0
3
59
8
1
1
x
x
1
1
1
1
x
x
x
2
x
x
1
x
1
1
x
19
47
1
1
2
0
1
1
1
1
5
1
0
2
3
5
1
1
1
1
3
78
9
x
x
1
3
x
x
x
x
2
1
3
x
2
2
x
1
x
x
2
26
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
Espírito
Santo
Vitória**
Cachoeiro
Itapemirim
Colatina*
Linhares*
São Mateus
Subtotal
15
2
1
1
1
20
10
0
0
0
0
10
2
2
1
1
1
7
12
2
1
1
1
17
3
x
x
x
x
3
0
0
0
0
0
0
TOTAL 124 69 26 95 29 0
249
T
OTAL DE
V
ARAS E
JEF
S
T
RIBUNAIS
R
EGIONAIS
F
EDERAIS
S
EÇÕES
J
UDICIÁ
-
RIAS
L
OCALIDADES
V
ARAS
C
RIA
-
DAS
V
ARAS
I
NSTALADAS
JEF
S
A
UTÔNOMOS
I
NSTALADOS
N
ÃO
-
I
NSTALADOS
V
ARAS
V
ARAS
COM
JEF
A
DJUNTO
1
T
OTAL
DE
V
ARAS
3ª
REGIÃO
São
Paulo
São Paulo
Americana*
Andradina*
Araçatuba
Araraquara*
Assis
Avaré*
Bauru
Botucatu
Bragança
Paulista
Campinas*
Caraguatatuba*
Catanduva*
Franca*
Guaratinguetá
Guarulhos
Jales
Jaú
Jundiaí*
Marília
Mogi das
Cruzes*
Osasco**
Ourinhos
Piracicaba
Presidente
Prudente
Registro*
Ribeirão Preto
São Bernardo
do Campo
São Carlos
São José do
Rio Preto
São José dos
Campos
Santo André
Santos*
64
1
1
2
2
1
1
3
1
1
10
1
1
3
1
6
1
1
2
3
2
2
1
3
4
1
9
3
3
6
4
3
7
44
0
0
0
0
0
0
0
0
0
7
0
0
0
0
2
0
0
0
0
0
0
0
0
1
0
1
0
0
2
1
0
3
8
x
x
2
2
1
x
3
x
1
1
x
x
3
1
4
1
1
x
3
x
x
1
3
3
x
6
3
2
4
3
3
3
52
0
0
2
2
1
0
3
0
1
8
00
00
3
1
6
1
1
0
3
0
0
1
3
4
0
7
3
2
6
4
3
6
12
1
1
x
x
x
1
x
1
x
2
1
1
x
x
x
x
x
2
x
2
2
x
x
x
1
2
x
1
x
x
x
1
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
250
T
OTAL DE
V
ARAS E
JEF
S
T
RIBUNAIS
R
EGIONAIS
F
EDERAIS
S
EÇÕES
J
UDICIÁ
-
RIAS
L
OCALIDADES
V
ARAS
C
RIA
-
DAS
V
ARAS
I
NSTALADAS
JEF
S
A
UTÔNO
-
MOS
I
NSTALA
-
DOS
N
ÃO
I
NSTALADOS
V
ARAS
V
ARAS
COM
JEF
A
DJUN
-
TO
1
T
OTAL
DE
V
ARAS
3ª
REGIÃO
São Paulo
São João da
Boa Vista
Sorocaba*
Taubaté
Tupã
Subtotal
1
4
1
1
161
0
1
0
0
62
1
2
1
1
67
1
3
1
1
129
x
1
x
x
32
0
0
0
0
0
Mato
Grosso
do Sul
Campo
Grande**
Corumbá
Coxim*
Dourados*
Naviraí*
Ponta Porã*
Três Lagoas
Subtotal
7
1
1
2
1
1
1
14
5
0
0
0
0
0
0
5
1
1
1
2
1
1
1
8
6
1
1
2
1
1
1
13
1
1
0
0
0
0
0
0
0
0
TOTAL 175 67 75 142 33 0
4ª
REGIÃO
Paraná
Curitiba
Apucarana*
Campo
Mourão
Cascavel
Foz do
Iguaçú
Francisco
Beltrão*
Guarapuava**
Jacarezinho*
Londrina**
Maringá**
Pato Branco*
Paranaguá
Paranavaí
Ponta
Grossa**
Toledo*
Umuarama
União da
Vitória*
Subtotal
21
1
1
3
4
2
2
1
8
6
1
1
1
3
1
3
1
60
16
0
0
1
1
0
0
0
4
3
0
0
0
1
0
2
0
28
1
1
1
1
3
2
1
1
1
1
1
1
1
1
1
x
1
19
17
1
1
2
4
2
1
1
5
4
1
1
1
2
1
2
1
47
4
1
1
3
2
1
1
13
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
251
T
OTAL DE
V
ARAS E
JEF
S
T
RIBUNAIS
R
EGIONAIS
F
EDERAIS
S
EÇÕES
J
UDICIÁ
-
RIAS
L
OCALIDA
-
DES
V
ARAS
C
RIADAS
V
ARAS
I
NSTALADAS
JEF
S
A
UTÔNO
-
MOS
I
NSTALA
-
DOS
N
ÃO
-
I
NSTALA
-
DOS
V
ARAS
V
ARAS
COM
JEF
A
DJUN
-
TO
1
T
OTAL
DE
V
ARAS
4ª
REGIÃO
Rio
Grande
do Sul
Porto
Alegre**
Bagé
Bento
Gonçalves
Cachoeira
do Sul*
Canoas
Carazinho*
Caxias do
Sul
Cruz Alta*
Erechim*
Lajeado**
Novo
Hamburgo
Passo
Fundo
Pelotas
Rio Grande
Santana do
Livramento**
Santa Cruz
do Sul**
Santa
Maria
Santa
Rosa*
Santiago*
Santo
Ângelo
Uruguaiana
Subtotal
24
1
2
1
2
1
5
1
1
2
6
4
3
3
2
2
4
1
1
3
2
71
18
0
0
0
1
0
2
0
0
0
3
2
1
1
0
0
1
0
0
0
0
29
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
3
1
1
3
2
26
19
1
1
1
2
1
3
1
1
1
4
3
2
2
1
1
4
1
1
3
2
55
5
1
2
1
2
1
1
1
1
1
16
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
252
T
OTAL DE
V
ARAS E
JEF
S
T
RIBUNAIS
R
EGIONAIS
F
EDERAIS
S
EÇÕES
J
UDICIÁ
-
RIAS
L
OCALIDADES
V
ARAS
C
RIADAS
V
ARAS
I
NSTALADAS
JEF
S
A
UTÔ
-
NOMOS
I
NSTALA
-
DOS
N
ÃO
-
I
NSTALA
-
DOS
V
ARAS
V
ARAS
COM
JEF
A
DJUNTO
1
T
OTAL
DE
V
ARAS
4ª
REGIÃO
Santa
Catarina
Florianópolis
Blumenau
Brusque*
Caçador*
Chapecó**
Concórdia*
Criciúma
Itajaí
Jaraguá do
Sul
Joaçaba
Joinvile
Laguna**
Lages
Mafra*
Rio do Sul
São Miguel
do Oeste
Tubarão
Subtotal
9
5
1
1
3
1
3
2
2
1
5
1
2
1
1
1
2
41
6
2
0
0
1
0
1
0
0
0
1
0
0
0
0
0
0
11
1
1
1
1
1
1
1
2
1
1
4
1
1
1
1
1
2
22
7
3
1
1
2
1
2
2
1
1
5
1
1
1
1
1
2
33
2
2
1
1
1
1
8
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
0
TOTAL 172 68 67 135 37 0
253
T
OTAL DE
V
ARAS E
JEF
S
T
RIBUNAIS
R
EGIONAIS
F
EDERAIS
S
EÇÕES
J
UDICIÁRIAS
L
OCALIDA
-
DES
V
ARAS
C
RIADAS
V
ARAS
I
NSTALADAS
JEF
S
A
UTÔNO
-
MOS
I
NSTALA
-
DOS
N
ÃO
-
I
NSTALA
-
DOS
V
ARAS
V
ARAS
COM
JEF
A
DJUNTO
1
T
OTAL
DE
V
ARAS
Pernambuco
Recife*
Caruaru*
Garanhuns*
Petrolina*
Salgueiro*
Serra
Talhada*
Subtotal
17
2
1
2
1
1
24
14
1
1
0
0
0
16
1
2
1
1
5
14
2
1
2
1
1
21
3
3
0
0
0
0
0
0
0
5ª
REGIÃO
Alagoas
Maceió*
Arapiraca*
União dos
Palmares
Subtotal
6
1
1
8
5
1
1
7
0
5
1
1
7
1
1
0
0
0
0
Ceará
Fortaleza*
Juazeiro
do Norte*
Limoeiro
do Norte*
Sobral*
Subtotal
16
2
1
2
21
13
1
0
1
15
1
1
13
1
1
1
16
3
1
1
5
0
0
0
0
0
Paraíba
João
Pessoa*
Campina
Grande*
Souza*
Subtotal
5
4
1
10
4
3
0
7
1
1
4
3
1
8
1
1
2
0
0
0
0
254
T
RIBUNAIS
R
EGIONAIS
F
EDERAIS
S
EÇÕES
J
UDICIÁ
-
RIAS
L
OCALIDA
-
DES
V
ARAS
C
RIADAS
V
ARAS
I
NSTALADAS
JEF
S
A
UTÔNO
-
MOS
I
NSTALA
-
DOS
N
ÃO
-
I
NSTALA
-
DOS
V
ARAS
V
ARAS
COM
JEF
A
DJUNTO
1
T
OTAL
DE
V
ARAS
5ª
REGIÃO
Rio
Grande
do Norte
Natal*
Caicó*
Mossoró*
Subtotal
7
1
1
9
6
0
0
6
1
1
2
6
1
1
8
1
1
0
0
0
Sergipe
Aracaju*
Estância*
Itabaiana*
Subtotal
5
1
1
7
4
0
0
4
1
1
2
4
1
1
6
1
1
0
0
0
0
TOTAL
79 55 11 66 13 0
TOTAL
GERAL 744 372 233 605 139 0
Fonte: BRASIL. Estatísticas da Justiça Federal. Disponível em: <http://daleth.cjf.jus.br/atlas/Internet/
QUADRODEVARASFEDERAIS.htm>. Acesso em: 19 mar. 2009.
Notas:
1. Os Juizados Especiais Federais adjuntos fazem parte da estrutura das varas federais, sendo assim não podem
ser computados como Juizados Especiais Federais autônomos.
A- Na 1ª Região existem, além dos computados acima, três JEFs autônomos como serviço destacado (Uberaba
e Uberlândia), que funcionam com juízes e servidores cedidos das varas locais para executar serviços
relativos aos juizados.
B- Os JEFs autônomos da 3ª Região são constituídos por varas-gabinetes. Ex.: JEF de São Paulo capital possui
12 varas-gabinetes, uma secretaria, uma contadoria, um departamento de perícias e um atendimento. Cada
vara-gabinete possui dois juízes, titular e substituto. Ainda na Região, além dos computados, o JEF
cível de São Carlos (SP), que se enquadra na modalidade básica, isto é, o juiz federal e o juiz federal
substituto são designados para atuação temporária. Provimento 259/2005-CJF 3ª Região.
C- Na Região, além das varas computadas, existem também os JEFs avançados, que são extensões de varas
de JEFs, no total de sete, sendo um em Rio Grande (RS), um em Santiago (RS), um em Florianópolis (SC),
um em Curitiba (PR), dois em Londrina (PR) e um em Pitanga (PR). Ainda na Região, além dos
computados, há um JEF itinerante em Rio Grande (RS).
* Seções e subseções judiciárias onde, pela Lei n.º 10.772/03, foram criadas varas.
** Seções e subseções judiciárias onde foram criadas novas varas.
255
Tabela 18 Justiça Federal de Segundo Grau – Quadro de desembargadores
Atualizado em 30.09.2008
T
RIBUNAIS
R
EGIONAIS
F
EDERAIS
T
OTAL
C
RIADOS
P
ROVIDOS
V
AGOS
D
ESEMBARGADORES
D
ESEMBARGADORAS
T
OTAL
1ª Região 27 22 5 27 0
2ª Região 27 19 4 23 4
3ª Região 43 23 18 41 2
4ª Região 27 22 5 27 0
5ª Região 15 14 1 15 0
TOTAL 139 100 33 133 6
Fonte: BRASIL. Estatísticas da Justiça Federal. Disponível em: <http://daleth.cjf.jus.br/atlas/
Internet/QUADRODEJUIZESTRF.htm>. Acesso em: 19 mar.2009.
Tabela 19 Despesa total da Justiça Federal por habitante
Região Dpj h
1
G
7
1ª Região 1.144.667.040 68.086.530 R$ 16,81
2ª Região 789.539.244 18.772.119 R$ 42,06
3ª Região 1.059.311.528 42.093.503 R$ 25,17
4ª Região 1.029.242.470 26.733.877 R$38,50
5ª Região 562.697.634 28.303.682 R$ 19,88
GERAL 4.585.457.914 183.989.711 R$ 24,92
Fonte: BRASIL. C.N.J. (2007, on line)
Dpj
h
1
Onde:
Dpj Despesas total da Justiça Federal
h
1
Número de habitantes da Região
G
7
=
256
Gráfico 13 Despesa total da Justiça Federal por habitante
Fonte: BRASIL. CNJ (2007, on line)
257
258
259
Gráfico 14 Processos distribuídos, julgados e acórdãos publicados no Superior Tribunal de Justiça
Período: janeiro a dezembro/2008.
Fonte: BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Secretaria Judiciária; Coordenadorias; Corte Especial, Seções e
Turmas; Gabinetes de Ministros; Sistema Justiça. Disponível em: <http://www.stj.jus.br/webstj/Processo/
Boletim/verpagina.asp?vPag=0&vSeq=125>. Acesso em: 22 mar. 2009
Nota: Nos processos julgados estão incluídos 51.195 Agravos Regimentais e 28.600 Embargos de
Declaração, totalizando 79.795 feitos.
Tabela 21 Movimento processual no Supremo Tribunal Federal, nos anos de 1940 a 2008
Movimentação
STF
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008
Proc. Protocolados 105.307 110.771 160.453 87.186 83.667 95.212 127.535 119.324 100.781
Proc. Distribuídos 90.839 89.574 87.313 109.965 69.171 79.577 116.216 112.938 66.873
Julgamentos 86.138 109.692 83.097 107.867 101.690 103.700 110.284 159.522 130.747
Acórdãos publicados 10.770 11.407 11.685 10.840 10.674 14.173 11.421 22.257 19.377
Movimentação
STF
1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999
Proc. Protocolados 18564 18438 27447 24377 24295 27743 28134 36490 52636 68369
Proc. Distribuídos 16226 17567 26325 23525 25868 25385 23883 34289 50273 54437
Julgamentos 16449 14366 18236 21737 28221 34125 30829 39944 51307 56307
Acórdãos
publicados
1067 1514 2482 4538 7800 19507 9811 14661 13954
16117
260
Movimentação
STF
1980 1981 1982 1983 1984 1985 1986 1987 1988 1989
Proc. Protocolados 9555 12494 13648 14668 16386 18206 22514 20430 21328 14721
Proc. Distribuídos 9308 12853 13846 14528 15964 17935 21015 18788 18674 6622
Julgamentos 9007 13371 15117 15260 17780 17798 22158 20122 16313 17432
Acórdãos
publicados
3366 3553 4080 4238 5178 4782 5141 4876 4760
1886
Movimentação
STF
1970 1971 1972 1973 1974 1975 1976 1977 1978 1979
Proc. Protocolados 6367 5921 6253 7093 7352 8775 6877 7072 8146 8277
Proc. Distribuídos 6716 6006 6692 7298 7854 9324 6935 7485 7815 8433
Julgamentos 6486 6407 6523 8049 7986 9083 7565 7947 8848 10051
Acórdãos
publicados
3328 3491 3926 4340 4459 3913 3377 3741 3755
3554
Movimentação
STF
1960 1961 1962 1963 1964 1965 1966 1967 1968 1969
Proc. Protocolados 6504 6751 7705 8216 8960 8456 7378 7614 8612 8023
Proc. Distribuídos 5946 6682 7628 8737 8526 13929 7489 7634 8778 10309
Julgamentos 5747 6886 7436 6881 7849 6241 9175 7879 9899 9954
Acórdãos
publicados
4422 7000 7317 7316 7511 5204 6611 6479 6731 5848
Movimentação
STF
1950 1951 1952 1953 1954 1955 1956 1957 1958 1959
Proc. Protocolados 3091 3305 3956 4903 4710 5015 6556 6597 7114 6470
Proc. Distribuídos 2938 3041 3572 4623 4317 4686 6379 6126 7816 7440
Julgamentos 3371 2917 4197 4464 3933 4146 4940 6174 7302 8360
Acórdãos
publicados
3395 2217 2476 3388 4474 3730 3794 5251 6400 7980
Movimentação
STF
1940 1941 1942 1943 1944 1945 1946 1947 1948 1949
Proc. Protocolados 2419 2629 2496 2480 2584 3422 2415 2773 2729 3335
Proc. Distribuídos 2211 2503 2310 2281 2324 2566 2246 2430 2569 3705
Julgamentos 1807 2265 2447 2355 2321 1860 1819 2565 2988 3269
Acórdãos
publicados
1469 2105 2238 2111 2001 1801 1251 1992 2079 2758
Fonte: BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Movimento Processual. Disponível em:
<http://www.stf.jus.br/portal/cms/verTexto.asp?servico=estatistica&pagina=movimentoProcessual>. Acesso em:
22 mar. 2009.
Obs.: Julgamentos – engloba decisões monocráticas e decisões colegiadas
261
4.2.15 Formação de câmaras de interlocução pré-judicial com os diversos
setores sociais e a participação do cidadão magistrado nas
instituições sociais, filantrópicas e agrupamentos coletivos
A conscientização dos direitos e conquistas sociais no plano da democracia participativa
tem levado a sociedade civil a formar grupos auto-organizados de intermediação de conflitos
e proposição de soluções adequadas para as diversas demandas políticas, econômicas, sociais,
culturais, dentre outras. Avelar afirma:
[…] é grande o ceticismo em relação à força do associativismo para avanço no
campo dos direitos sociais. Mas dados e depoimentos que mostram um quadro
animador. Estima-se que hoje são 40 mil conselhos de políticas públicas em todo o
país. Conforme mostra Alexandre Ciconello (ver em: www.oxfam.org.uk) na
administração pública federal 35 Conselhos Nacionais com 400 órgãos
representativos, sendo que 31% são ONGs do campo da defesa dos direitos
humanos, 23% entidades representativas dos interesses patronais e empresariais,
14% vinculados aos movimentos sociais do campo e do meio ambiente, 8% de
movimentos populares urbanos e 10% são entidades religiosas, culturais. As
conferências nacionais promovidas pelo Ministério das Cidades entre 2003 e 2006
envolveram mais de dois milhões de pessoas que produziram em torno de cinco mil
deliberações públicas […]
1
Nesse sentido, aos membros do Poder Judiciário deve ser estimulada, permitida e até
institucionalizada, a participação nesses diversos estratos do tecido social, cujas
consequências positivas seriam:
a) A percepção individual e coletiva de que os membros do Judiciário são seres
humanos, mortais, falíveis, limitados, iguais aos jurisdicionados, sujeitos de direitos e
obrigações, imersos na conflituosidade a que são chamados para solucionar, sendo assim uma
parte do outro e não um ser fracionado, divino ou detentor de uma pureza imaculada;
b) A intervenção na fase pré-judicial do conflito, em função proativa,
intermediando a formação do consenso e contribuindo para o não surgimento do litígio;
c) O exercício regular de seus próprios direitos constitucionais, dentre os quais: a
livre manifestação do pensamento, sem o anonimato, a liberdade de consciência e de crença,
assegurado o livre exercício de cultos religiosos, liberdade de expressão intelectual, artística,
científica e de comunicação, independente de censura ou licença, o direito de reunião pacífica,
independente de autorização, a liberdade de associação para fins lícitos e de criação de
1
AVELAR, Lúcia. Políticas sociais. O Povo, Fortaleza, 9 dez. 2008, p. 7.
262
cooperativas, vedada a interferência estatal em seu funcionamento, todos previstos no Art.
da Carta Federal;
d) A consolidação da democracia participativa através da maturação decorrente
das interseções grupais.
No plano institucional, as Organizações Judiciárias dos diversos ramos do Poder
Judiciário poderiam dispor sobre a criação de Câmaras Pré-Judiciais para a intermediação de
conflitos homogêneos, coletivos, difusos ou de ampla repercussão comunitária, prevendo que
os magistrados atuantes seriam árbitros judiciais com ampla liberdade para a imersão nas
matérias de sua responsabilidade, sem a competência executória do processo, restringindo-se
apenas aos atos homologatórios.
Essa cisão de competências seria um mecanismo de preservação da imparcialidade do
magistrado que, em razão da ampla liberdade de atuação para a composição desses
macroconflitos, sujeitar-se-ia ao risco do partidarismo político, econômico ou ideológico,
comprometendo a continuidade de suas funções judicantes.
Considerando que o elemento político do debate conflituoso nesses grandes temas
assume uma volatilidade que lhe é inerente, o magistrado com essa competência legal também
deveria estar apto ao trato com a dinâmica das acomodações políticas, desde que alcance a
consensualidade possível, reservando-se a competência para conhecer e processar os atos
executórios necessários à efetivação dessas decisões a outros juízes que não tenham
participado do processo homologatório de formação do título judicial, agora com a
formalidade processual necessária ao cumprimento da coisa julgada.
Quanto à participação do cidadão-magistrado em instituições sociais, filantrópicas e
agrupamentos coletivos, também é de vital importância, não por ser direito fundamental
assegurado constitucionalmente, mas por dever, ora cívico, ora estatutário, decorrente do
próprio exercício da cidadania.
Esse, porém, não é o entendimento do Conselho Nacional de Justiça, que decidiu no
sentido da proibição aos magistrados do exercício de funções diretivas junto a diversas dessas
entidades. Assim, decidiu o Conselho Nacional de Justiça:
EMENTA: Pedido de Providências. Vedações impostas aos magistrados. Consulta
formulada por servidor público. Conhecimento. Vigência da LOMAN. Premissa
fundamental. Conforme reiteradas decisões do Supremo Tribunal Federal, estão em
263
plena vigência os dispositivos da Lei Complementar n.º 35/79, particularmente sobre
os deveres e vedações aos magistrados. Matéria, aliás, também já apreciada no CNJ
quando da edição da Resolução n.º 10/05. Regras complementadas pelo Art. 95 e
parágrafo único da Constituição Federal. Prevalência do princípio da dedicação
exclusiva, indispensável à função judicante. o pode o magistrado exercer o
comércio ou participar, como diretor ou ocupante do cargo de direção, de sociedade
comercial de qualquer espécie/natureza ou de economia mista (Art. 36, I da
LOMAN). Também está impedido de exercer cargo de direção ou de técnico de
pessoas jurídicas de direito privado (Art. 44, do Código Civil c/c Art. 36, II da
LOMAN). Ressalva-se apenas a direção de associação de classe ou escola de
magistrados e o exercício de um cargo de magistério. Não pode, conseqüentemente,
um juiz ser presidente ou diretor de Rotary, de Lions, de APAEs, de ONGs, de
Sociedade Espírita, Rosa-Cruz, etc, vedado também ser Grão Mestre da Maçonaria;
síndico de edifício em condomínio; diretor de escola ou faculdade pública ou
particular, entre outras vedações. Consulta que se conhece respondendo-se
afirmativamente no sentido dos impedimentos.
ACORDAM os Conselheiros que compõem o Conselho Nacional de Justiça, por
maioria de votos, em conhecer da consulta, vencido o Conselheiro Eduardo
Lorenzoni e, no mérito, também por maioria, respondendo-a afirmativamente no
sentido dos impedimentos, vencidos, na totalidade, o Conselheiro Oscar Argollo e,
parcialmente, os Conselheiros Germana de Moraes, Eduardo Lorenzoni, Alexandre
de Moraes e Joaquim Falcão.
2
O enclausuramento do juiz, nos termos desse raciocínio, dá-se, inclusive, sem critério
uniformizante, considerando que a decisão permite a direção de Escolas de Magistraturas, que
em alguns casos mantêm cursos de pós-graduação semelhantes aos ministrados por
universidades públicas ou privadas, assim como admite a possibilidade de direção de
associação de classe, excluindo as demais, como se os poderes de gestão nessas corporações
classistas não expusessem o Magistrado a situações distintas da atividade jurisdicional.
O juiz, nos demais exemplos mencionados na referida decisão, poderá até ser membro
de Rotary, Lions, ONGs, Sociedades Espíritas, Maçonaria, APAEs, Rosa-Cruz, Condomínio
residencial ou comercial e, supõe-se, Academias de Letras, científicas, artísticas, culturais,
enfim, desses agrupamentos coletivos que se estabelecem com o objetivo de participar
ativamente do corpo comunitário, visando à integração, ao suprimento e à complementaridade
da atividade social, porém, jamais exercendo a liderança desses grupos, como se estivessem
destinados apenas a funções contemplativas e acessórias no contexto político da organização
social.
Na hipótese da proibição de assumir a função de síndico do próprio condomínio, mesmo
que para gerir assuntos relacionados ao seu patrimônio, ainda assim, o magistrado está
2
BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Pedido de Providências n.º 775/06. Requerente: Leopoldo Pereira dos
Santos Servidor Federal/MT. Requerido: Conselho Nacional de Justiça. Relator: Conselheiro Marcus Faver.
Disponível em: <http://www.cnj.jus.br>. Acesso em: 13 dez. 2008. No mesmo sentido, os Pedidos de
Providências n.º 1.453 e 20081000000148-4.
264
alijado, como se fosse um ser inanimado, susceptível a culas decorrentes da convivência
com o outro.
Esses exemplos mostram, a despeito da lesão a direitos fundamentais essenciais aos
quais se mencionou, como está distante a implementação de uma democracia participativa
no âmbito do Poder Judiciário.
4.2.16 Orçamento participativo
No item 2.2 foi abordado tema relacionado ao orçamento do Poder Judiciário quanto à
sua dependência em relação aos demais Poderes o Executivo e o Legislativo. Agora, cuida-
se da participação interna no orçamento daqueles que formam o Poder Judiciário, quer no
exercício da função jurisdicional – os juízes, quer no seu auxílio – os servidores públicos.
Os tribunais, no exercício do autogoverno, têm autonomia para elaborar, encaminhar à
aprovação, executar e controlar o seu orçamento. É o que está previsto no Art. 99 da
Constituição Federal. Essa é uma das expressões políticas da função Judiciária.
A competência para o encaminhamento da proposta orçamentária do Poder Judiciário é
do Presidente de cada tribunal, consoante o § 2º, incisos I e II, do Art. 99 da Carta Federal. A
gestão desse orçamento e a sua elaboração, no entanto, poderiam ser compartilhadas entre os
magistrados de Primeiro e Segundo graus e entre os servidores do Poder, se autorizadas pelas
leis de organização judiciária e por delegações de competências emanadas dos Presidentes
dessas Cortes.
A descentralização e a coparticipação na gestão do orçamento no Poder Judiciário têm
sido adotadas em vários tribunais da Federação, a exemplo das ações empreendidas em Santa
Catarina, no Espírito Santo e no Rio de Janeiro.
Em Santa Catarina foi empossado, em 02.06.2008, pelo presidente do Tribunal de
Justiça, desembargador Francisco Oliveira Filho, os integrantes do primeiro Conselho de
Gestão, Modernização Judiciária e Políticas blicas Institucionais daquele tribunal,
composto por oito desembargadores e dois juízes, sendo estes o presidente da Associação dos
265
Magistrados Catarinenses e o ex-presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros,
Rodrigo Colaço.
3
No Estado do Espírito Santo, o presidente do Tribunal de Justiça promoveu, pela
primeira vez, em 7 de agosto de 2008, reunião com os Juízes diretores dos Fóruns para
discutir o orçamento participativo do Judiciário para 2009. O objetivo do Tribunal era
promover a gestão continuada, com ações planejadas estrategicamente para que possam ter
efetividade. Segundo o presidente do Tribunal, “a administração de uma Comarca não pode
durar apenas um biênio, é preciso planejar para que possa se refletir no serviço ao público”.
4
Quando ainda desembargador e presidente da Escola Nacional da Magistratura, o atual
Ministro do Supremo Tribunal de Justiça, Luis Felipe Salomão, egresso do Tribunal de Justiça
fluminense, afirmava:
No caso do Rio de Janeiro, nos anos de 2002 e 2003 houve a solicitação da
Associação dos Magistrados (AMAERJ) para que magistrados pudessem participar
da proposta orçamentária e da elaboração do plano bienal.
Como a experiência é pioneira, a verdade é que nós, juízes, ainda estamos
‘aprendendo’ a trabalhar nesse sentido.
[…]
Pioneiro em atos que possibilitaram maior transparência administrativa, o TJ/RJ,
através do Ato Normativo n.º 01/99, instituiu o Centro de Acompanhamento e
Controle de Custos do Poder Judiciário, o qual produz um relatório periódico dos
gastos jurisdicionais e administrativos de todas as Comarcas.
[…]
Fazendo parte também do plano estratégico foram indicados pela Administração do
Tribunal 11 juízes de direito (das diversas regiões do Estado) para colaborarem na
elaboração da Proposta Orçamentária do Tribunal de Justiça/RJ para o exercício de
2003.
17
A AMAERJ intermediou a integração da Secretaria de Planejamento com o (sic)
magistrados, objetivando um orçamento participativo […]
5
Ainda nesse sentido, a Associação dos Magistrados Brasileiros realizou enquete no seu
Portal eletrônico, indagando se o magistrado deveria ser ouvido quando da elaboração da
proposta orçamentária dos tribunais.
O resultado apurado, até 16.12.2008, foi o seguinte:
6
3
ASSOCIAÇÃO DOS MAGISTRADOS BRASILEIROS AMB. TJ/SC empossa seu Conselho de Geso.
Disponível em: <http://www.amb.com.br/?secao=mostranoticia&mat_id=137048>. Acesso em: 16 dez. 2008.
4
GONÇALVES, Silva. Orçamento participativo. Tribunal de Justa do Esrito Santo. 7 ago. 2008. Disponível
em: <http://www.direito2.com.br/tjes/2008/ago/7/orcamento-participativo>. Acesso em: 13 dez. 2008.
5
SALOMÃO, Luis Felipe. Participação da magistratura na elaboração da proposta orçamentária do Poder
Judiciário e a transparência administrativa. Disponível em: <http://www.amb.br/
portal/docs/noticias/salomao_orçamento_271205.doc>. Acesso em: 13 dez. 2008.
266
SIM, por conhecer de perto a realidade do juízo, deveria poder opinar sobre a
aplicação de recursos – 93,07%.
NÃO, essa deve ser uma decisão da Cúpula das Cortes – 3,96%.
NÃO tenho uma opinião formada sobre o tema – 2,97%.
No Direito Comparado, Salomão alude ao exemplo dos Estados Unidos, em que tanto
na elaboração como na destinação do orçamento do Judiciário ampla participação popular,
inclusive, em alguns Estados, com a combinação de recursos públicos e privados para o
custeio dos tribunais.
7
Na Europa, a Associação Europeia de Magistrados para a Democracia e
as Liberdades (MEDEL), instituição que congrega onze países europeus (Alemanha, Bélgica,
Chipre, Espanha, França, Grécia, Itália, Polônia, Portugal, República Checa e Romênia),
propôs a introdução no Estatuto Europeu da Magistratura, de participação dos magistrados na
elaboração do orçamento do Poder Judiciário. Estabelece a proposta:
[...]
3.1. Compete ao Conselho Superior da Magistratura a administração e disciplina da
magistratura, bem como assegurar o seu pluralismo e garantir a independência dos
magistrados.
[…]
3.2. Na sua composição, metade, pelo menos, do Conselho deve ser constituída por
magistrados eleitos pelos seus pares segundo a regra da representação proporcional.
O Conselho incluirá, ainda, personalidades designadas pelo parlamento. Todos os
seus membros devem ser nomeados por tempo determinado.
3.3. O parlamento vota o orçamento da Justiça sob proposta do Conselho Superior
da Magistratura e do Governo.
O Conselho deve dispor de orçamento próprio para executar as suas atribuições.
[...]
8
Portanto, sob o aspecto estrito da participação na elaboração, execução e controle do
orçamento do Poder Judiciário, propugna-se por um processo coletivo para essa gestão, com
interferência de membros da Magistratura de Primeiro e Segundo Graus, em cada ramo do
Judiciário, assim como da representação dos servidores e da Ordem dos Advogados do Brasil,
para que os diversos segmentos que operam na função judiciária possam, representando a
sociedade, influir no direcionamento desse Poder, democraticamente.
6
ASSOCIAÇÃO DOS MAGISTRADOS BRASILEIROS - AMB. Enquete: O magistrado deveria ser ouvido
quando da elaboração da proposta orçamentária dos tribunais? Disponível em:
<http://www.amb.com.br/?secao=enquete &ID=33>. Acesso em: 16 dez. 2008.
7
SALOMÃO, Luis Felipe, op. cit., 2008, on line.
8
ASSOCIAÇÃO SINDICAL DOS JUÍZES PORTUGUESES. Estatuto de Medel Magistrados para a
Democracia e Liberdades. Disponivel em: <http://www.asjp.eu/index.php?option=
com_content&task=view&id=70&Itemid=48>. Acesso em: 13 dez. 2008.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este trabalho não é conclusivo, aliás, como nada o é na seara do conhecimento, das
relações sociais, da ciência, da Justiça e do Poder, pelo menos, no que pertine à exaustividade
e à definitividade de seus argumentos.
Muitos dos temas aqui tratados já foram objeto de estudos ou reflexões precedentes, por
outros investigadores. Algumas ideias são, apenas, aparentemente novas, porque sempre
uma dúvida sobre o que, ousadamente, se atribui por novidade.
Em algum lugar, em um dado momento, alguém, por certo, refletiu sobre o que se
reputa inovação. Essas reflexões constam dos relatos e de obras atribuídas a precursores
diversos, muitos dos quais tidos como delirantes, hereges, subversivos ou, apenas,
iconoclastas, visionários, talvez, simplesmente realistas.
Às vezes, tudo parecia estar onde sempre esteve, aguardando ser desvelado,
simploriamente. Isso vem desmitificar mais uma das complexidades irredutíveis às quais os
criacionistas tanto se apegam.
Em outras ocasiões, percebe-se que o movimento em torno das mudanças ocorridas
surgiu do acaso; do desencantamento com os designes inteligentes”
1
; da formação de novos
paradigmas; da insatisfação cumulativa com as verdades inabaláveis e esclarecidas; da dúvida
com a qual a filosofia e a ciência inseminam os modelos apresentados em sua finitude e
definitividade; do preenchimento das lacunas insondáveis do processo evolutivo.
A experimentação e o aparecimento de novas realidades parecem mostrar a força de
ideias cujo tempo chegou.
2
1
DAWKINS, Richard. Deus, um delírio. São Paulo: Companhia das Letras, 2007, p. 114.
2
“Há uma coisa mais forte do que todos os exércitos do mundo, e isso é uma ideia cujo tempo chegou” ( Frase
atribuída a Victor Hugo, escritor francês, 26 de fevereiro de 1802 – 22 de maio de 1885). DUALIBI, Roberto,
op. cit., 2000, p. 339.
268
A pluralidade das organizações sociais, de seus membros e do Poder que se estruturou
em torno dessa complexidade, máxime, no plano da função judiciária, não comporta mais a
feição de um Estado onipotente na tarefa de composição dos conflitos, com agentes detentores
de poderes perpétuos, divinos, exclusivos, imunes à dinâmica da permeabilidade política que
transcende a tecnicidade dos textos legais, sendo urgente a necessidade de inserção dos
grupos da sociedade civil nesse processo, abrindo-se, no plano externo daquela função, à
multidiversidade de segmentos sociais que possam promover, com eficácia e celeridade, a
pacificação social, e, no plano interno, à alternância e à mobilidade necessárias para
possibilitar a renovação da jurisprudência e de sua aplicação e estimular a participação, gestão
e controle no e do aparelho jurisdicional, por todos os membros dessa estrutura.
Ao Estado, com seus limites materiais, devem ser assegurados, com exclusividade, o
poder coercitivo, o uso da força institucional, a decisão final sobre direitos indisponíveis e o
controle da constitucionalidade, sem prejuízo das composições conflituais que possam ser
alcançadas pelos que optarem pelos serviços estatais jurisdicionais.
A inserção de grupos da sociedade na função jurisdicional, mesmo que apenas no
processo de formação dos títulos executivos, contribui para a legitimação das soluções
jurisdicionais, a celeridade, a redução da ineficácia das decisões, a diminuição de custos, o
melhor aproveitamento e direcionamento das receitas públicas, a aceitabilidade das
composições, a ampliação da participação coletiva no exercício do Poder, a humanização da
Justiça. Evita-se, assim, “o perigo da democracia unidimensional que, na essência, é
antidemocracia”.
3
Até o surgimento das ideias de Locke, Montesquieu e Rousseau, a manifestação do
Poder Político se dava de forma absoluta, convergindo para a pessoa do soberano toda a força
dos grupos de dominação.
A partir daí, irreversivelmente, o poder do Príncipe cede espaço à soberania do Estado,
a qual será exercida, mediante funções, acomodando o poder de administrar, de legislar e de
julgar, porém, não menos representativa de interesses limitados.
As funções do Executivo e do Legislativo, ao longo desse percurso, que remonta às
grandes revoluções iniciadas no século XVIII, tem se legitimado, gradativamente, pela
outorga popular, com ciclos de alternância no exercício do poder.
3
LEITÃO, Valton de Miranda. As entranhas da mídia. O Povo, Fortaleza, 9 ago. 2009, p. 7.
269
A função judiciária e os seus agentes, para que não se sujeitem à simples verbalização
da norma jurídica, definida em outras instâncias, deve implementar a sua própria revolução,
renunciando às Cortes e aos Palácios nos quais foram encastelados pelos primeiros
revolucionários, ampliando o seu poder através da legitimação política que, formal e
materialmente, emana das cartas constitucionais, mas que tem se tornado autoimune ao
controle e à participação do detentor originário do poder – o povo.
Para tanto, essa dissertação analisou a origem desse poder; seu percurso histórico; os
diversos modos de recrutamento dos membros do Judiciário no Direito Comparado e no
Brasil; a estrutura de sua organização, apresentando suas nuances e contradições, apontando
críticas e, ao final de cada tópico, apresentando sugestões.
Muitas das alterações propostas podem ser instrumentalizadas, aproveitando o próprio
conteúdo constitucional. Outras necessitam de modificações nos textos legais e interpretações
adequadas.
Apraz constatar, por fim, que desde a definição da temática deste trabalho até a sua
finalização, muitas das ideias aqui examinadas se transformaram em objeto de estudo,
projetos legislativos e alterações efetivas em alguns setores do Poder Judiciário, como a
demonstrar que a velocidade das mudanças, neste século, torna novas ideias, conceitos e
paradigmas algo tão concreto na sua previsibilidade, quanto etéreo e abstrato no seu
questionamento modificador imediato.
É assim que se mudam as coisas: sonhando, desmitificando, desconstruindo e
reconstruindo, duvidando, comparando, experimentando.
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